O CEMITÉRIO DE VIANA DO CASTELO - Francisco Queiroz ... · outro na cerca do extinto convento dos...

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O CEMITÉRIO DE VIANA DO CASTELO

História, Arte e Património

Um ano antes da lei de 1835, que obrigava ao estabelecimento de cemitérios públicos separados das igrejas e afastados das povoações, já se previa em Viana a construção de dois cem itérios paroquiais: um num quintal junto ao extinto convento de Santa Ana e outro na cerca do extinto convento dos Agostinhos. Contudo, em 1835, o Governo colocou à disposição da Câmara a mata do extinto convento de Santo António, para ali se fundar um cemitério que servisse as duas paróquias urbanas de Viana. Apesar da dita mata já ser murada e arruada, a Câmara alegou falta de meios monetários para estabelecer o cemitério. Diversas vicissitudes fizeram o assunto cair no esquecimento, até à chegada de uma nova vereação, em 1839. As obras, que implicaram a construção de um muro d ivisório na antiga mata do convento, decorreram ao longo de 1840. O s prim eiros enterram entos datam de Janeiro de 1841. Contudo, em Agosto desse ano, a própria Câmara decide mudar o cem itério para o Campo de Santo António, que era terreno municipal. Apesar de ter sido elaborado um orçamento, essa mudança não foi concretizada.

O cem itério na antiga mata do convento manteve-se em funcionamento até Maio de 1842, mas viria a ser interditado, por ordem do Governador C iv il, com a justificação de não estarem concluídas as obras necessárias.Temporariamente, os falecidos em Viana voltavam a poder ser sepultados em espaços fechados, agora nos claustros dos conventos de Santo António e do Carm o, e no cem itério da Ordem Terceira de S. Francisco, que era a sua antiga igreja, situada junto ao extinto convento de Santo António. De facto, quando, em 1840, a Câm ara de Viana procedia às obras para estabelecer o cem itério público, a Ordem Terceira requereu licença para te r cemitério privativo. Mandou então abrir, na sua antiga igreja, cinco grandes frestas na parede virada ao norte, duas seteiras no telhado e um “grande pórtico” virado ao sul. A licença para que este espaço fechado servisse de cem itério foi dada em Setembro de 1842, atendendo a ser bem ventilado, ficar fora da cidade e próxim o ao cem itério público. Em Setembro de 1843, e ainda com o cem itério municipal interditado, foi pedida licença para benzer este cem itério inicial da Ordem Terce ira .T rês anos depois, foi dada autorização para se benzer um altar com o Santo C risto , que havia sido ali colocado.

Em Fevere iro de 1844, após as obras de beneficiação, foi levantada a interdição a enterramentos no cemitério municipal, tendo a Câmara pedido ao Governo a concessão da igreja do convento de Santo António, para servir como capela mortuária. Foi também planeada uma comunicação entre a referida igreja e o cemitério municipal, como forma do dito cem itério v ir a te r maior aceitação junto do povo, até porque, segundo um relato de 1845 “os enterramentos das pessoas pobres” estavam a ser feitos “gratuitamente em redor da capela das Almas” e “a da maior parte dos ricos” no extinto convento do Carm o e no cem itério dos Terceiros de S. Francisco. Por isso, no início da década de 1850, o cem itério municipal não teria ainda grande utilização.

O cemiterio privativo da Ordem Terceira de S. Francisco esteve dentro da sua antiga igreja até ao Verão de 1855, quando, devido a uma epidemia de cólera, o Governador Civil mandou fechá-lo. Neste contexto de mortandade, o cem itério municipal recebeu obras à pressa e foi reinaugurado. Em Agosto desse ano, a Câmara pôde finalmente tom ar posse do terreno desejado para ab rir com unicação entre a igreja do extin to convento e o cem itério .

Em Abril de 1856, e porque o cem itério dos Terceiros não tinha as condições previstas na lei, o Governo ordenou que este deveria permanecer fechado e, no prazo de 5 anos, todos os restos m ortais exumados. O s Terce iros recorreram e, porque queriam m anter um cem itério privativo a todo o custo, optaram por transferir o cem itério para a sua horta, invocando o facto de se permitirem cem itérios privativos no Porto. Em Outubro de 1857, o Governo deu licença para este novo cemitério e, em Maio de 1858, foi aprovada a planta, elaborada por António Martins do Couto Viana. Porém, em Setembro desse ano, as obras estavam suspensas, por desentendimento com os mestres pedreiros. Em Fevereiro do ano seguinte , as obras te rão sido retom adas, com base num orçam ento de 840$000 .

Por esta altura, grande parte do cem itério municipal estava sem uso, pois a Câmara ainda em 1857 fazia o "arrendamento do roço da mata". Porém, já ali se viam algumas lápides e o volume de inumações neste cem itério começava a ser regular.

A licença de utilização para o novo cem itério da Ordem Terce ira chegou em Novembro de 1859, altura em que este foi benzido, apesar dos primeiros enterram entos datarem,de A b r il desse ano. Em Maio de 1860, fo i ap rovado o re sp e c tivo regu lam ento .

Em finais de 1860, a capela m ortuária do cem itério municipal estãva^m cõnstrüçao^u ja Construida. Quanto à do cem itério da Ordem Terce ira , em Janeiro de 1863 estava a ser concluída, tendo sido benzida em 28 de Novembro de 1864. No cem itério dos Terceiros, há registo de obras em anos posteriores, como a plantação de ciprestes e a reconstrução e acrescentamento de catacumbas (em meados da década de 1870), ou o alargamento do (recinto cemiterial, na sequência do realinhamento da actual Rua Dr.Tiago de Almeida (em finais do século X IX ) . No cem itério municipal, na sua secção de não católicos, viria a serl (estabelecido um pequeno cem itério britânico, em 1876.

Em term os de concepção espacial, o C em ité rio de Viana do C aste lo foi claram ente influenciado pelo elitista Cem itério da Lapa, no Porto, sobretudo atendendo à secção nortd de jazigos-capela, uma das mais extensas, mais homogéneas e interessantes do país. No tabuleiro inferior da secção da Ordem Terceira, a disposição das catacumbas e seus remated denotam influência galega.

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O s primeiros túmulos de certa dimensão do Cem itério de Viana do Castelo, quer na parte municipal, quer na da Ordem Terce ira de S. Francisco , são da década de 1860. A té aos prim eiros anos do século X X , foram aqui edificados monumentos de bastante interesse, que reflectem a evolução do gosto e espelham diversos aspectos da sociedade vianense do período romântico. Pela sua monumentalidade, pela importância artística, ou por outros motivos, destacam-se, entre outros: na secção do fundo do cemitério, onde avulta ao centro a capela mortuária, a capela-obelisco de Ana Cândida Furtado de Mendonça Dantas [ I ] , de 1868, e a outra do mesmo género erguida em 18 7 1 no extrem o oposto da secção, mandada constru ir por Sebastião da Silva Neves [2], e ainda a capela da família Barbosa e Silva [3], na secção lateral de capelas, as de José de Sá Sotom aior Leones [4 ], Maria C ru z Azevedo [5], Gaspar Falcão de C astro [6 ], Conselheiro Mendes Veloso [7 ], e Fernando António Zamith [8]; nos quarteirões centrais os jazigos em forma de baldaquino de Belchior Soares da Silva [9], e de Manuel Pereira da Rocha Viana [10], o jazigo da Madre Maria da Conceição [ I I ] , cuja veneração pode ser aferida pelos numerosos ex-votos existentes no in terio r da capela-mortuária, e ainda os vários pedestais encimados por estátuas alegóricas: Fé, Esperança, Caridade, Gratidão, e Saudade, quase todas da Fábrica de Cerâm ica das Devesas; na secção da Ordem Terceira, a capela simulando uma ruína, de José Caldas [12], e o jazigo da família Velho Barreto [13 ], proveniente do capítulo do antigo convento de Santo Antón io . Refira-se ainda, por serem típicos da região de Viana, os guarda-ventos em madeira, com decoração na bandeira, de vários jazigos-capela, e ainda algumas grades e portões em ferro de jazigos. Relativamente à simbologia presente nos túmulos, existe uma apreciável quantidade de atributos ligados à navegação, simbologia médica e m ilitar, e aquela mais típ ica do Romantismo (saudades, perpétuas, dormideiras, serpentes mordendo a cauda, ampulhetas aladas, mochos, foices da m orte, etc .), assim como alguma heráldica.

The Cem etery ofViana do Castelo is clearly the combined cem eteries, Municipal and Brotherhood of Saint Francis. Besides being contiguous, they have a common history, since the mid-nineteenth century.

If on one hand, the C ity Council and before the 1835 law which required the establishment of public cem eteries separated from churches already provided for the construction of two parish cem eteries, on the other, as already proceeded the necessary w o rk to implement the municipal cem etery in Saint Anthony Field, in 1840, the Brotherhood required a license to have a private cemetery. Due to various vicissitudes, only on O ctober 1857 did the government give permission to proceed with the existing cem etery of the brotherhood. By this time, much of the municipal cem etery was not totally in use. However, there could be seen some tombstones and the volume of burials in this cem etery began to be regular.

In late I860, the m ortuary chapel of the municipal cemetery was under construction or already built. As for the cemetery of the Brotherhood, in January 1863 was being completed, having been blessed in Novem ber 28, 1864.

In term s of landscaping, theViana do Castelo Cem etery was clearly influenced by the elitist Lapa Cemetery, in Porto, especially the northern section of vaulted chapels, one of the largest, most homogeneous and interesting of Portugal. On the lower deck of the Brotherhood section, the arrangement of the niches and th e ir trim denote Galician influence.

CÂMARA M UNICIPAL VIANA DO CASTELO

Texto e imagens: Francisco Queiroz Colaboração: Luís Moura Serra Planta: Catarina Talina Design: mbrázio