O direito na história

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1. O DIREITO NA HISTÓRIA - LIÇÕES INTRODUTÓRIAS 2. A SOBERANIA (ANUÁRIO DIREITO E GLOBALIZAÇÃO) Estudo de História do Direito e do Pensamento Jurídico 1 Em uma breve introdução, ressalta-se o poder de transformação da cidade. Mais adiante, é apresentada uma visão geral do direito antigo, que serve de base para que haja a diferenciação entre o direito propriamente e o direito de civilizações desaparecidas. Há heranças provindas de Roma e Grécia. O direito romano foi reinventado e redescoberto duas vezes: 1) Séculos XII a XV pelos juristas da universidade medieval, glosadores, etc; 2) Século XIX pelos juristas e pensadores alemães. O direito nos impérios orientais: são dados exemplos do uso do direito no Oriente durante a antiguidade. Há manuscritos, códigos inteiros - como o Código de Hamurabi -, além de evidências da existência de direitos egípcio e hitita por volta dos anos 1500 a.C. Constatam-se também, livros da tradição judaica. Na verdade, a perspectiva da jurisdição revela elementos essenciais do direito antigo. Os impérios antigos eram formados por muitas áreas de influência, as quais eram submetidas a poderes militares, independente de sua natureza, campo ou cidade. Nesse aspecto, há uma divisão fundamental dos impérios que é a divisão entre a cidade e campo, notavelmente opostos. Da cidade vem tanto a opressão quanto a liberdade. No ambiente urbano, a vida é diferente, tanto quanto os produtos e instrumentos ali encontrados. Mas, indaga-se a respeito das distinções institucionais entre os dois ambientes. A dinâmica do direito nos impérios antigos provém da disputa fundamental entre cidades e campo, a saber. A cidade é o centro do controle que detém a escrita, os livros, faz o censo e cobra tributos. É, segundo Mumford, um depósito, um reservatório de riqueza. Os impérios antigos, como todo centro de federação de cidades submetidas, necessita de uma rede de administração. No âmbito institucional, tem duas funções centrais: arrancar tributos e manter a paz, interna e externamente. A manutenção da paz, no contexto, era feita mediante a imposição, no sentido militar da palavra, e não no seu sentido jurídico. O campo (''comunidades''), por sua vez, vivem segundo suas próprias regras, caso não haja uma imposição cultural constante. Ali, há uma própria justiça, presidida por um conselho de anciãos, geralmente. A justiça do cadi, como é tratada, tratava das regras cotidianas de relações em um universo de relações comunitárias. O mundo do oriente antigo não é urbana, mas fundamentado no campo e aldeia. A cidade, além de recursos materiais, também apresenta recursos simbólicos, que são, por que não, jurídicos. Exemplos: famílias que comandam a cidade, mortos em memória na forma de monumentos, figura do rei capaz de impor ordem e fazer justiça. Todos esses são elementos de certo respeito e ordem na sociedade. A tradição judaica nos conta sobre uma justiça reconhecida como atributo divino, que não se desvia pelo rico, nem pelo pobre.

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Impérios orientais e Grécia

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1. O DIREITO NA HISTÓRIA - LIÇÕES INTRODUTÓRIAS

2. A SOBERANIA (ANUÁRIO DIREITO E GLOBALIZAÇÃO)

Estudo de História do Direito e do Pensamento Jurídico

1Em uma breve introdução, ressalta-se o poder de transformação da cidade. Mais adiante, é apresentada uma visão geral do direito

antigo, que serve de base para que haja a diferenciação entre o direito propriamente e o direito de civilizações desaparecidas. Há heranças provindas

de Roma e Grécia. O direito romano foi reinventado e redescoberto duas vezes: 1) Séculos XII a XV pelos juristas da universidade medieval,

glosadores, etc; 2) Século XIX pelos juristas e pensadores alemães.

O direito nos impérios orientais: são dados exemplos do uso do direito no Oriente durante a antiguidade. Há manuscritos, códigos

inteiros - como o Código de Hamurabi -, além de evidências da existência de direitos egípcio e hitita por volta dos anos 1500 a.C. Constatam-se

também, livros da tradição judaica.

Na verdade, a perspectiva da jurisdição revela elementos essenciais do direito antigo. Os impérios antigos eram formados por muitas

áreas de influência, as quais eram submetidas a poderes militares, independente de sua natureza, campo ou cidade. Nesse aspecto, há uma divisão

fundamental dos impérios que é a divisão entre a cidade e campo, notavelmente opostos. Da cidade vem tanto a opressão quanto a liberdade. No

ambiente urbano, a vida é diferente, tanto quanto os produtos e instrumentos ali encontrados. Mas, indaga-se a respeito das distinções

institucionais entre os dois ambientes. A dinâmica do direito nos impérios antigos provém da disputa fundamental entre cidades e campo, a saber.

A cidade é o centro do controle que detém a escrita, os livros, faz o censo e cobra tributos. É, segundo Mumford, um depósito, um

reservatório de riqueza. Os impérios antigos, como todo centro de federação de cidades submetidas, necessita de uma rede de administração. No

âmbito institucional, tem duas funções centrais: arrancar tributos e manter a paz, interna e externamente. A manutenção da paz, no contexto, era

feita mediante a imposição, no sentido militar da palavra, e não no seu sentido jurídico.

O campo (''comunidades''), por sua vez, vivem segundo suas próprias regras, caso não haja uma imposição cultural constante. Ali, há

uma própria justiça, presidida por um conselho de anciãos, geralmente. A justiça do cadi, como é tratada, tratava das regras cotidianas de relações

em um universo de relações comunitárias.

O mundo do oriente antigo não é urbana, mas fundamentado no campo e aldeia. A cidade, além de recursos materiais, também

apresenta recursos simbólicos, que são, por que não, jurídicos. Exemplos: famílias que comandam a cidade, mortos em memória na forma de

monumentos, figura do rei capaz de impor ordem e fazer justiça. Todos esses são elementos de certo respeito e ordem na sociedade. A tradição

judaica nos conta sobre uma justiça reconhecida como atributo divino, que não se desvia pelo rico, nem pelo pobre.

Grécia - a ruptura de uma ilustração no mundo antigo: a Grécia clássica conhece várias formas de organização e institucionalização,

haja vista as diferenças entre Atenas e Esparta, duas polis gregas. Atenas, objeto de estudo pela notável influência na tradição jurídica ocidental-

moderna, compartilha um elemento fundamental para tal: a laicização do direito e a ideia de que as leis podem ser revogadas pelos mesmos homens

que as fizeram.

A história grega se divide em 3 períodos, pelo autor: 1) arcaico (VIII a 480 a.C); 2) clássico (480 a 338 a.C); 3) helenístico (até 150 a.C,

data da submissão ao Império Romano). São apresentados dados comparativos atenienses, centrados na demografia do período clássico, trazendo o

número de cidadãos (homens adultos livres) - sempre, bem menor que os demais -, mulheres e crianças, escravos e, finalmente, estrangeiros

(metecos). Conforme o desenvolvimento da polis, houve o aumento de todos os sujeitos, até a invasão de Felipe e Alexandre, que provocou um

verdadeiro massacre. Ainda na visão demográfica, o casamento ocorria na média entre os 30 e 40 anos para os homens (após o serviço militar), e

para as mulheres aos 20. No campo jurídico, é interessante ressaltar que, nas relações de família, conhecia-se o divórcio recíproco, com direitos

iguais para homens e mulheres.

Sobre a escravidão ateniense: os escravos nunca foram usados extensivamente na agricultura, mas em serviços domésticos, públicos e

burocráticos. É verdade que os escravos domésticos recebiam quase que um tratamento familiar. Não se diferenciavam os escravos dos livres

simplesmente pelos trajes e/ou modos. O que mais os limitava era a proibição da participação, mínima que seja, na vida política e a incapacidade da

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luta pela cidade. Escravos, na Grécia antiga, eram prisioneiros de guerra e de pirataria, além de seus descendentes. Na verdade, a escravidão não era

natural/inelutável, mas um fato da vida, um acaso.

Costuma-se dizer que da Grécia veio pouca coisa na tradição jurídica e que a rigor o Ocidente deve mais a Roma nesta área, o que é um

pouco verdade. Algumas coisas distinguem as duas no campo do direito, em outras palavras, há algumas peculiaridades gregas no âmbito jurídico:

entre os gregos, não existia uma classe de juristas e treinamento jurídico, escolas de juristas, ensino do direito como técnica especial. O direito, a

saber, era aprendido com as experiências de vida, justificando o fato de os gregos se convergirem mais às escolas especiais de retórica, dialética e

filosofia. Havia o costume de aprender de cor alguns textos jurídicos, no entanto. A literatura jurídica era fonte de instrução e prazer. Sobre as

técnicas jurídicas: próprias do logógrafo, redator de discursos forenses. Sobre o direito: devia ser aprendido vivenciando-o, as leis, por exemplo,

fazendo parte da educação do cidadão. As discussões sobre justiça são discussões sobre a justiça na cidade, entre cidadãos iguais.

No âmbito institucional: não havia cargos públicos especializados, ou seja, não havia uma burocracia propriamente dita. Os julgadores,

assim, eram leigos. Deste modo, os discursos eram essencialmente persuasivos, aproveitando-se da falta de formação especial daqueles que

julgariam a situação jurídica - como em um tribunal do júri. Até os dias atuais, nota-se a diferença de argumentação perante a um júri, quando

comparado ao discurso feito frente ao juiz togado.

Alguns temas fundamentais que corroboraram ao direito: 1) a entrada dos sofistas no debate filosófico determina que a filosofia se

concentre nas coisas humanas, no universo da liberdade. Discute-se a última, além da política, ética, etc. A filosofia, através dos sofistas, vai refletir

controladamente sobre a lei. 2) o principal ponto: os gregos descartaram de algum modo a ideia de que as leis são reveladas pelos deuses

exclusivamente, ou são tradições herdadas. A positivação do direito e sua disponibilidade exigem dos gregos uma primeira reflexão clássica sobre a

natureza da lei e da justiça.

Com o desenvolvimento das cidades e das instituições da polis, o centro da vida se deslocada da família (comunidade) para a cidade, e já

não são suficientes as decisões levadas a cabo pelos juízes de aldeia, velhos, sábios e prudentes. O familismo tende a ser amoral em termos políticos,

segundo Banfield. Para os gregos, a cidade não pode depender da justiça do cadi, do respeito pessoal aos sábios e mais velhos, apesar de que a

experiência no âmbito jurídico ainda importasse.

Sobre a construção de uma solidariedade cada vez mais universal: a simples solidariedade de sangue ou tradição é incapaz de gerar um

amplo espaço público, uma polis ou uma democracia. A solidariedade cívica exige regras universais, que valham para todos os casos. Adeptos ao

Estoicismo, os estóicos, no final do século IV a.C adiante, competem por um salto qualitativo rumo a universalidade. Se acima da familiar, há a cívica,

existe, portanto, a possibilidade de uma solidariedade cosmopolita, ainda mais universal. Os estóicos vão pregar uma cidadania universal, um

pertencimento ao gênero humano, influenciando Roma - jus gentium.

As formas de resolução de controvérsias: há duas espécies de órgãos de jurisdição em Atenas. Para crimes públicos, portanto mais

severos, o julgamento é feito por grandes tribunais de dezenas ou centenas de membros - A Assembleia de todos os cidadãos, repartidos nos demos,

elegia o Areópago, grande conselho de supervisão. Ao lado do Areópago, havia a bulé, um conselho de 400 cidadãos que exercia o governo. Para

casos menos importantes, apelava-se para os Heliastas, assembleia judicial propriamente, que funcionava em grupos (dicastéria).

Os tribunais eram, frequentemente, utilizado com fins políticos, pois a havia confusão de leis, ausência de juristas e facciosidade. No

tribunal, era necessário que se provasse, além da lei (direito), o fato. Havia, também, outras resoluções, leis, deliberações que valiam como lei. Nos

moldes de hoje, não havia burocracia propriamente dita, apesar de escritos. Nem tampouco execução judicial - nada de polícia judiciária. Nos

tribunais, a respostas eram sempre sim ou não, culpado ou inocente. Qualquer cidadão podia se apresentar ali para defender seu ponto de vista, já

que o ato de receber dinheiro para defender alguém era considerado indigno. O advogado não existia propriamente ainda - apenas a partir do

desenvolvimento do direito canônico do século XVIII, era visto como um cúmplice.

Os crimes de ação pública dependia da ação privada, pois não havia promotoria de acusação. A denúncia não era apenas uma notícia,

mas uma petição, início de um processo. A liberdade de processar era inerente à democracia: ''Os crimes públicos eram denunciáveis por qualquer

um, já que inexistia órgão público de acusação.'' Assim, a democracia dependia de que um cidadão se sentisse atingido por uma ação delituosa de

outro e tomasse o interesse de denunciá-lo ao tribunal. ''A ideia era que todo cidadão se sentisse indignado com qualquer ilícito, mesmo sem ser a

vítima.''. As penas, muitas vezes, eram desproporcionais aos crimes, segundo padrões modernos. Castigos, multas, feridas, morte, exílio. O

ostracismo, exílio por 10 anos da polis, era uma válvula de escape para livrar-se dos indesejados pela população.

A lei positiva - o centro do debate filosófico: A maior novidade da experiência grega é: a promulgação da lei e sua revogação nada terem

de divino (são assuntos humanos). Não significa que a sociedade em si não fosse religiosa, ou que a condução da política fosse feita sem vinculação

com o sagrado. O direito, nesse momento, já não precisa ser revelado divinamente para valer e nem é preciso invocar a vontade dos deuses para

deliberar sobre as leis. Este processo é a laicização do direito.

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Pensando no império que se forma, no multiculturalismo existente, e na civilização grega voltada para o mar, esse povo entra em

contato com uma diversidade de povos muito grande. É dito que a ''helenização'' do oriente próximo, por seu turno, redundou também na

''orientalização'' grega. As próprias diferenças entre as cidades gregas faz com que se compreenda o direito co um espírito comparativo e flexível. Os

gregos desenvolvem as formas consensuais de trocas e influenciam mais tarde a grande flexibilização do direito romano.

Drácon, Sólon e Clístenes: As Leis e Constituições de Drácon (621 a.C) marcam a escritura das leis na Grécia, e são feitas a partir de um

processo revolucionário. Elas colocam fim à solidariedade familiar e obrigam ao recurso aos tribunais nas disputas entre clãs. O grande propósito é

abolir a justiça familiar, fonte de sangrentos conflitos. As Leis de Sólon (594-3 a.C) suprimem a servidão por dívidas, suprimem a propriedade dos

clãs, mudando a estrutura social das famílias gregas. Limita-se o poder do Areópago, criando o tribunal do Heliastas e dicastérios. Reformas de

Clístenes (508-2 a.C) ampliam o princípio representativo, fazem a divisão territorial em demos (distritos), entre outras medidas.

Neste cenário é que muitas instituições públicas e privadas foram sendo conhecidas, imitadas e adaptadas, ou conservadas na memória

pela tradição romana. A filosofia grega transmitiu a dialética e retórica, encontrando-as tanto na Roma clássica, quanto na Idade Média. Na Grécia,

ainda, promoveram-se os debates acerca do justo e da justiça, que ultrapassaram a discussão sobre normas, escritas ou não.

Roma: A divisão da história romana abrange o direito arcaico, ações da lei, período clássico, processo formular, e período tardio (pós-

clássico), cognitio extra ordinem. Portanto, há a associação da periodização e a divisão do perfil dominante no processo civil. Roma conheceu 3

grandes regimes constitucionais. A monarquia eletiva ''divinamente'', não hereditária; A república que vai de 509 a.C a 27 a.C; Império que se divide

em Principado, Diocleciano e Dominato. Em todos, manteve-se sempre a aristocracia, sistema esse denominado como misto: assembleias,

magistraturas, restrições de algumas funções para algumas classes. A cidadania foi estendida lenta e gradualmente. Primeiro, aos habitantes da

Itália, depois a todos os habitantes do império. A cidadania era dada a grupos e não individualmente.

As resoluções de controvérsias eram feitas de 3 maneiras distintas: ações da lei, no período arcaico. O centro do saber jurídico está na

figura dos pontífices. Segundo, processo formular, em que a produção direito está na mão dos pretores ao lado dos juristas. Finalmente, cognição

extraordinária, destaque para o imperador e seus juristas como atores da nova ordem.

1. Do período arcaico à idade clássica: Não é o tempo da jurisprudência clássica; alguns pontos importantes: magistraturas passam a ser

anuais, o poder político e exercido de maneira mista (elementos oligárquicos), o senado é vitalício. Este não pode ser confundido com uma

assembleia de representantes (como é atualmente), mas um conselho de anciãos (cidadãos sábios) responsável pela ligação da cidade com sua

história. Em casos especiais executava o senatus consultus e opinava sobre negócios. As assembleias sim tinham uma função ''legislativa'',

principalmente durante a República. As magistraturas eram cargos eletivos para funções determinadas e sempre pelo prazo de um ano, por exemplo

cônsules, censores, questores, pretores, etc.Estes emitiam editos. Os pretores participavam do poder geral de mando e detinham os poderes

especiais de disciplina e de dizer o direito. Os pretores eram encarregados de administrar a justiça, isto é, fazer com que conflitos fossem resolvidos

ordenada e pacificamente pelo iudex (juiz). Havia pretor urbano, pretor peregrino, cada um especializado em uma área do direito civil. Os pontífices

eram sacerdotes funcionários autorizados a usar as fórmulas legais e a interpretá-las. Apenas eles poderiam interpretar a Lei das XII Tábuas, apesar

de que a mesma fosse escrita. O que determina o perfil do direito romano arcaico é que ele só se aplica aos romanos, cidadãos, descendentes dos

quirites. Enquanto não for ampliada a cidadania para qualquer habitante do império (212 d.C.), os não-romanos ficam excluídos do âmbito de

validade das regras de propriedade, do casamento e de família do ius civile.

Em suma, o direito arcaico era positivo e abstrato: cheio de fórmulas que precisavam ser pronunciadas no lugar certo pelas pessoas

certas, e estas eram os pontífices. O formalismo do direito arcaico contribui para sua laicização. Algumas obrigações do direito romano dependiam

de tais formalidades: o nexum, o sponsio, etc.

2. O processo formular e o período clássico: O processo formular é o ambiente ideal para o desenvolvimento da jurisprudência clássica.

Criado pela Lex Aebutia e firmado pela Lex Iulia. A flexibilização do direito civil, em geral, dá-se dentro do processo formular, assim como a entrada

da retórica grega e dos princípios de direito natural ou de direito dos povos. O personagem principal era o pretor urbano e o peregrino. O processo

se divide em duas fases: a in iure, ocorre perante o pretor, o magistrado propriamente dito. Tarefa do pretor: organizar a controvérsia,

transformando o conflito real num conflito judicial, ou seja, não é o julgamento, mas a administração da justiça; a segunda fase é a in iudicium, na

qual a controvérsia se desenvolve frente a um iudex. Observação: Nem juiz, tampouco pretor são juristas, estes, colaboradores de várias maneiras,

mas que não fazem parte do aparelho judiciário.

3. Cognitio extra ordinem: Ao contrário do processo formular, a divisão de tarefas entre pretor e juiz vai desaparecer. O resultado será

uma valorização dos juristas, a centralização dos poderes de julgamento em um único órgão e a novidade do recurso ou apelação. O cognitio nasce

ao lado do processo sem substituí-lo. Trata-se de uma intervenção de fora da ordem jurídica normal: provinda do príncipe. Surge essa forma

concentrada, que gradativamente, torna-se um juiz supremo.

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A maior diferença entre o processo formular e a cognição extraordinária é a centralização do direito pela segunda. Não há mais

diferença entre juiz e pretor. O príncipe é um delegado (inferior) do imperador, e seu julgamento é um decretum.

Os autores do direito romano: pretores e juristas: A laicização da jurisprudência (que é diferente de democratização, haja vista que são

apenas alguns que se dedicam ao direito e tornam-se juristas) se consolida a partir do século IV a.C. Plebeus começam a ter acesso ao colégio de

pontífices e as leis se reduzem a escritos, as formulas dominadas por mais gente. Os juristas são aristocráticos, fidalgos, não fazem parte de uma

profissão, e sim prestam serviço à cidade, dando conselhos aos pretores, amigos, clientes, entre outros. O que eles fazem é uma honra, dignidade.

Agem como peritos, não eram magistrados, pretores ou juízes, pois tanto podiam dar conselhos aos particulares sobre negócios e contratos, como

podiam preparar a seu pedido as operações e documentos ou suas minutas. Ninguém se tornava, em Roma, jurista por concurso simplesmente. o

direito era ensinado se o cidadão tivesse talento e interesse (além de pertencer à classe social adequada). Na República, no entanto, são criadas

escolas e há um maior aprimoramento de uma técnica jurídica especial. No período clássico romano, os juristas conheciam tanto a tradição romana,

no que diz respeito às leis e fórmulas, quanto um mínimo da filosofia grega vulgarizada em termos de retórica e dialética.

Há, também, a codificação da jurisprudência clássica, através, por exemplo, do Codex Gregorianus e Codex Hermogenianus. Em 438 é

publicado o Código Teodosiano, que, adotado no Ocidente, veio a influenciar muitas compilações posteriores feitas nos reinos bárbaros a partir do

século VI. Deste modo, é o desaparecimento da jurisprudência clássica a consequência do desaparecimento das instituições de resolução de

controvérsia às quais estivera ligada.

Fontes do direito romano: editos, decreta, mandata e opinião de prudentes.

Juristas e filosofia: Há a helenização dos romanos. A filosofia grega participa do pensamento jurídico romano, através do gosto pela

justificação racional, não apenas tradicional, da familiaridade de todos os homens, do cosmopolitismo, do direito natural e do direito dos povos, além

dos debates sobre as relações entre a vida pública, cidade, direito e justiça.

O direito privado romano - casa e família: a importância do direito privado romano está diretamente ligada ao papel que a família

desempenha. O direito privado é um sistema de regras pelo qual se mantém unida a família como unidade produtiva. Existem regras de sucessão,

regras de propriedade, de matrimônio, etc. Os romanos parecem não ter desenvolvido a pessoa jurídica, pois as suas funções são cumpridas pela

instituição familiar. Há um sistema paternalista, em que o pai é o patrão e decide tudo.

A alta idade média: A partir do ano 1000 dá-se um renascimento do Ocidente especificamente dentro das universidades, e ali surge a

cultura jurídica que não cessa de se transformar até hoje. Em outras palavras, desde os séculos XI e XII assiste-se a uma diferenciação funcional do

direito, como não se vira antes.

As invasões: Trata-se, nesta parte, do grande número de invasões às regiões pertencentes à Roma pelos bárbaros. O modo de vida

romano tradicional fora minado quando os imperadores centralizaram as funções judiciais e legislativas. Foi um período de crise social, econômica e

política. Houve uma barbarização crescente e contínua. É o fim da civilização romana. A partir daí, romanos e bárbaros vivem lado a lado, sem se

misturar. Separação essa evidenciada pela proibição de casamentos inter-raciais (que derivavam também de divergências religiosas).

Com o desenvolvimento dos reinos bárbaros, há o fenômeno progressivo da ''pessoalidade das leis'', isto é, redução da imparcialidade

da norma, visto que a lei se aplicava conforme a etnia. Aos francos se aplicava o direito franco, aos romanos o romano e sua tradição. De modo que

com todo o desenvolvimento do direito medieval, sobreviverá durante séculos a noção da possibilidade da existência simultânea, no mesmo

território, de ordens jurídicas paralelas, aplicáveis a grupos de pessoas distintas.

O direito nos reinos bárbaros: Há grandes disputas entre os francos, visigodos, ostrogodos, etc. Nesse mundo dividido, duas ordens de

direito se estabelecem: o direito dos bárbaros e o direito romano bárbaro (direito romano vulgarizado).

1. O direito costumeiro dos bárbaros: Resulta da consolidação dos costumes. Exemplo: Lei Sálica. A lei é, na verdade, uma consolidação

dos costumes. Em um mundo marcado pela violência, a sanção não era relacionada à privação da liberdade, mas multas e indenizações, nunca pagas

ao Estado, e sim à vítima e sua família. A leitura da Lei Sálica é uma viagem a uma sociedade em que a sofisticação conceitualizante do direito cede

passo à coleção de casos especiais e aos costumes. Em sumo, as referências ao furto ou roubo compõem quase um terço da lei.

2. O direito romano dos bárbaros (lex romana barbarorum): Os reinos bárbaros tentaram, também, conservar alguma coisa do direito

romano. A edição de um direito romano vulgar tinha significação política importante, pois era a garantia de legitimidade do poder e de aceitação.

Trata-se, nesta parte, dos vários conjuntos de leis vigentes nos reinos bárbaros do início da idade média. Dá-se destaque aos visigodos, que se

basearam diretamente no Codex Theodosianus, mantendo uma relação direta com a tradição romana. Assim, de alguma maneira, conservou-se

alguma memória do direito romano, como, afinal de contas, alguma memória da civilização romana.

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O direito medieval feudal: No ocidente medieval, há a separação entre duas esferas de poder: o eclesiástico e o secular. Há, assim,

disputas de poder entre papa e imperador, entre os estamentos (clero e nobreza). A fraqueza econômica, militar e política impedia o surgimento de

um único senhor, ou de um ente soberano incontrastável em extensão e duração. Entretanto, meio a este contexto, há a sofisticação das ideias,

debates em universidades, um ambiente de expansão material e comercial. A sociedade medieval é dividida em ordens e estamentos. O direito é um

direito de ordens. Havia dois sistemas de relações: propriedade feudal (entre senhores - vassalagem) e senhoria (apropriação da renda da terra -

senhor - servo). Existe, paralelamente, um sistema de justiça feudal e senhorial. A justiça é o centro da vida jurídica. O direito feudal, a partir de um

momento, passa a ser também compilado por escrito.

O direito inglês e sua origem feudal: A Inglaterra tem uma tradição de direito real determinada não pela universidade mas pela forma

do juízo e pelos precedentes. Isto dificultará a romanização do seu direito. O Common-Law é o sistema desenvolvido pelas cortes reais, contra os

costumes locais que não conseguem impor-se em todo o reino, não conseguem ser o direito comum de todo o reino. A língua adotada era uma

forma de francês (Law French). Os juízes não aprendiam direito na universidade, mas em corporações profissionais. A técnica jurídica especial era

ensinada apenas aos que já apresentavam uma formação em ciências humanas, como filosofia e história. Com o passar do tempo, constituiu-se um

sistema de regras e de tribunais separados: as cortes de equidade (equity courts).

2A soberania através da História: Estado e Soberania foram noções que caminhavam juntas/imanadas desde o século XVI até o fim do

século XX, uma não existia sem a outra. Mas, pergunta-se, há a possibilidade de existência de um Estado não soberano no futuro?

Noção: A noção de soberania foi sempre vista como uma qualidade do poder. Estado soberano era aquele que não dependia de outro

Estado, ou seja, um instituto independente politicamente. O direito se preocupa mais com a noção formal de soberania. No século XX, Estado

Soberano é aquele que se encontra direta e imediatamente subordinado à ordem jurídica internacional.

Grécia e Roma: Na Grécia, a soberania já é encontrada, tendo em vista a existência das Cidades Estados, que tinham como o fim a auto-

suficiência. Não existia, ainda, a palavra ''soberania''. Havia uma certa igualdade de poder entre as polis, haja vista Atenas e Esparta. A igualdade do

fato, portanto, se resumia a uma igualdade jurídica. A existência de um meio cultural homogêneo com valores semelhantes na Grécia Antiga também

contribuiu para o desenvolvimento do DIP (Direito Internacional Privado).

Em Roma, o DIP vai quase desaparecer, vez que vai surgir um único Estado supranacional. Para que exista um DIP, é preciso que haja

uma pluralidade de Estados. O DIP romano é, portanto, supranacional e não internacional. O mais próximo do último é o jus gentium, direito aplicado

pelo pretor.

Idade Média: É na Idade Média que a palavra ''soberania'' vai surgir, assim como se começa a esboçar a noção jurídica. M.David trata a

limitação do poder do rei como uma das características da soberania. O juramento que seria um meio de ligar os súditos ao monarca, além de uma

demonstração de autoridade da Igreja sobre o poder temporal. O elo passa a ser pessoal, e não territorial, pois. O francês ainda postula que desde o

final do século XII já existem as palavras ''soberania'' e ''soberano''; e antes disso, mesmo com a inexistência da palavra, já se tinha noção, fato

evidenciado pela palavra autoritas, para designar autoridade suprema. O latim (superanus) revela a ideia de primazia, mas que também pode invocar

um certo de grau de superioridade. Superanus ou Superioritas surgem quando tiveram início as lutas entre os senhores feudais e a realeza,

imperador e papado. Não se pode esquecer que a noção de soberania vai destruir as relações feudais, daí autores modernos afirmarem que ela vai

privilegiar a classe burguesa.

Idade Moderna: Ainda, é na Idade Média que a noção de soberania vai ser firmar devido ao advento do capitalismo, inexistente

autônomo a um Estado Moderno: ''o capitalismo não existe sem o Estado''. A soberania, nessa perspectiva, sempre teve um aspecto econômico. A

teoria da soberania moderna postula que esta só surgiu com o fim do feudalismo. Jean Bodin, no século XVI, já afirma as características de ela ser

perpétua e absoluta. Mas, admite que ela só é limitada pelo direito natural e pelo direito das gentes.

Não se pode esquecer do papel que o Absolutismo desempenha no processo histórico da soberania. Ele irá consolidar o Estado Moderno

e transforma a sociedade internacional em uma sociedade interestatal. O Estado é unicamente o Estado-soberano.

Idade Contemporânea: Em 1713, o Tratado de Utrecht, prega pelo equilíbrio estatal europeu. Ele é uma espécie de compromisso entre

a soberania e o princípio do interesse coletivo. Visa a não dominação da Europa por uma única potência (que significa a diminuição da igualdade

jurídica internacional, ou seja, da soberania dos demais Estados). No entanto, no contexto pós-revolucionário, Napoleão vai quebrar com esse

equilíbrio por um certo momento. Haverá uma disputa ideológica entre soberania nacional e soberania popular. A partir da segunda década do

século XIX, a Europa passa a ser governada por um Diretório. Com o Congresso de Troppau, em 1820, há um desrespeito à noção de soberania, haja

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vista que há a proibição, no mundo europeu, de um governo oriundo de um movimento revolucionário. A volta ao contexto do equilíbrio europeu

acontece anos mais tarde. Da Rev. Francesa à 1ªGM, há a ideia da soberania nas relações internacionais.

O direito vai afirmar que o Estado não pode se obrigar a nenhuma norma jurídica que não tenha emanado de sua vontade. Não existe

soberania absoluta, mas um voluntarismo jurídico. O próprio Bodin já afirmava que havia a limitação da soberania em termos de direitos naturais e

direitos das gentes. Não existe Estado absoluto. ''Estado'' só tem sentido quando há uma sociedade internacional.

Após a 1ªGM, a ideia de soberania absoluta vai aparecer nos Estados Totalitários (URSS e Alemanha). É notado que o número de Estados

foi, gradativamente, crescendo. O número de soberanias cresceu, mas não a ideia de igualdade (conduz a regra de não interferência), a mais

importante consequência da soberania.

A soberania e as organizações internacionais: Carta da ONU prega o respeito à soberania. Art. 1 fala na igualdade de direitos e na

autodeterminação dos povos. Falar em igualdade é mencionar soberania, pois só existe aquela se houver esta. A soberania tem um aspecto interno,

relacionado à autodeterminação de direitos, isto é, na não interferência externa sobre os três poderes; e um aspecto externo, relacionado à

independência nos direito de convenção, igualdade jurídica, legação e respeito mútuo. Existem alguns pontos que ferem o princípio da soberania,

como: 1) aparecimento de micro Estados; 2) direito de retirada da ONU: uma vez participante, não há saída; 3) países de terceiro mundo têm

dependência econômica em relação às potências; 4) aparecimento de entidades econômicas supranacionais, como a União Europeia.

A era da globalização: Globalização econômica significa que as fronteiras entre os países perdem importância, quando se trata de

decisões sobre investimentos, produção, oferta, procura e financiamentos. As consequências são uma rede cada vez mais densa de entrelaçamentos

das economias nacionais, uma crescente internacionalização da produção. A globalização também abarca os mercados de trabalho, aumentaram as

migrações de mão-de-obra entre os países. Esse fenômeno mostra que o Estado perdeu controle de sua economia devido ao volátil capital

especulativo, etc. A noção de soberania se transforma, assim, cada vez mais em uma palavra oca. É o início do desaparecimento do Estado e de sua

noção soberana.

Últimas características: Não significa ausência de limites, mas apenas a faculdade de autodeterminar-se, obrigando-se apenas àquilo

que exclusivamente decidir; há uma estreita relação entre a noção de soberania e o poder constituinte: soberano é o Estado que não está submetido

a outro e, que, por isso, pode elaborar sua própria Constituição, criando órgãos, determinando competências e definindo direitos e obrigações a seus

cidadãos.