O ENSINO RELIGIOSO E A FORMAÇÃO DE SEUS PROFESSORES
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PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE MINAS GERAIS
Pr-reitoria de Pesquisa e de Ps-Graduao
Faculdade de Educao
O ENSINO RELIGIOSO E A FORMAO DE SEUS
PROFESSORES: dificuldades e perspectivas
Maria Cristina Caetano
Belo Horizonte
2007
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Maria Cristina Caetano
O ENSINO RELIGIOSO E A FORMAO DE SEUS PROFESSORES:
dificuldades e perspectivas
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-graduao em Educao da Pontifica Universidade Catlica de Minas Gerais, como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre em Educao. rea de Concentrao: Sociologia e Histria da Profisso Docente. Linha de Pesquisa: Direito a Educao e Polticas Pblicas Educacionais. Orientadora: Prof. Dra. Maria Auxiliadora Monteiro Oliveira
Belo Horizonte
2007
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Maria Cristina Caetano O ENSINO RELIGIOSO E A FORMAO DE SEUS PROFESSORES: dificuldades e perspectivas Dissertao apresentada ao Programa de Ps-graduao em Educao da Pontifica Universidade Catlica de Minas Gerais, Belo Horizonte, ----------------
Prof. Dra. Maria Auxiliadora Monteiro Oliveira
(Orientadora) - PUC Minas
Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury PUC Minas
Prof. Dr. Amauri Carlos Ferreira PUC Minas
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AAGGRRAADDEECCIIMMEENNTTOOSS
A produo de um trabalho como este nunca feita apenas por quem escreve. Muitas pessoas contriburam com idias, palavras, leituras,
correes; outras com uma palavra de incentivo e, ainda outras, at mesmo assumiram minhas atividades, para facilitar um tempo maior de dedicao
ao estudo. Sendo assim, ao finalizar esse trabalho, no poderia deixar de agradecer a algumas dessas pessoas:
A Deus, que, com seu amor de pai, sustentou-me nesta caminhada e deu-
me coragem para enfrentar todos os desafios, provenientes desse tempo.
Congregao do Sagrado Corao de Maria, na pessoa da Terezinha Cecchin, que compreendeu a importncia dessa formao no meu processo
profissional, apoiou-me nesse tempo de estudo e demonstrou pacincia sem precedentes, no desdobramento deste meu trabalho.
minha famlia e minha comunidade de vida, que, em muitos
momentos, compreenderam e aceitaram a minha ausncia.
Professora Doutora Maria Auxiliadora Monteiro de Oliveira, pela amizade, orientao competente e segura. Alm de orientar a pesquisa, ela
consegue promover seus/suas orientandos/as e incentivar cada um de acordo com suas potencialidades. Muito obrigada pela sua dedicao,
prontido, pelo acolhimento aos processos vividos e sentidos e pela sua sabedoria em indicar o melhor caminho, na fase da escrita da dissertao.
Aos professores e direo da escola pesquisada e aos professores das
diferentes instituies da Regio Metropolitana de Belo Horizonte, que ajudaram a compreender um pouco mais a situao do Ensino Religioso,
no contexto escolar. Ao Departamento Arquidiocesano de Ensino Religioso, nas pessoas de Maria Aparecida de Oliveira e Ana Terezinha,
que se disponibilizaram a dar as informaes sobre o Departamento e possibilitaram o meu contato com os docentes.
Aos professores e funcionrios do Programa de Ps-graduao em
Educao da Pontifcia Universidade Catlica Minas Gerais, principalmente ao Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury, que foi o
Parecerista deste Projeto, colaborando com sugestes e bibliografia.
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s pessoas que, atravs de dilogos, via internet, contriburam para o desenvolvimento dessa pesquisa: Ansia de Paula Figueiredo, Llian
Blanck de Oliveira, Srgio Junqueira. E tantas outras que me socorreram com sugestes de referncias, tais como: Amauri Carlos Ferreira e Antnio Francisco da Silva. No posso deixar de fazer um agradecimento especial
a Maria ngela Machado, leitora minuciosa da dissertao e Virgnia Coeli B. de Queiroz Matias com quem partilhei alguns momentos desse
processo.
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RESUMO
O objeto desta pesquisa centra-se no Ensino Religioso. Os captulos que integram este trabalho, assim se apresentam: A Trajetria do Ensino Religioso desde o Perodo da Colnia at a Atualidade; A Histria da Formao/Profissionalizao de Professores no Brasil, sobretudo da Formao dos Professores para o Ensino Religioso; A Pesquisa realizada na Escola Estadual Marlielle; A Investigao feita no Departamento Arquidiocesano de Ensino Religioso. Seu objetivo geral consiste tanto no estudo terico-documental referente ao Ensino Religioso e a formao de seus professores no contexto brasileiro, quanto realizao de pesquisas que retratam a realidade vivenciada pela disciplina, no mbito do Sistema Estadual de Ensino de Minas Gerais. A metodologia utilizada privilegia a pesquisa qualitativa, em interlocuo com a quantitativa, sendo usados como instrumentos: a anlise documental, a observao livre, a entrevista semi-estruturada e o questionrio. Os dados coletados so interpretados luz da Anlise dos Contedos. Os resultados da pesquisa mostram que: o Ensino Religioso se desenvolveu, no Pas, como elemento de doutrinao, ocultando uma dialtica entre a secularizao e a laicidade e disputas entre o pblico e o privado; O Ensino Religioso, mesmo sendo integrante dos currculos das escolas estaduais, de Minas Gerais, est atrelado hierarquia religiosa que, em sntese, indica seus contedos, programas e prticas pedaggicas, orienta e capacita seus professores. Apesar de certas conquistas do Ensino Religioso, como rea de conhecimento, principalmente aps a promulgao da Lei n. 9475/97, no foram resolvidos os problemas e as questes, sobretudo quanto formao/profissionalizao dos seus professores; os gestores das polticas estaduais, assim como os diretores das escolas e os professores de outras disciplinas no reconhecem o significado e a importncia da disciplina em apreo; a disciplina, muitas vezes, serve para complementar a carga horria de professores; a necessidade da formao inicial e continuada de professores para essa rea especfica e, ainda, a participao dos mesmos no Projeto Pedaggico da escola; o modelo de Ensino Religioso a ser priorizado deve contemplar a diversidade e as diferenas scio-religiosas dos alunos. Palavras-chave: Polticas Pblicas para o Ensino Religioso; Formao de professores para o Ensino Religioso; Realidade do Ensino Religioso em Minas Gerais no contexto de uma escola pblica.
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ABSTRACT
The object of this research is centered on the Religious Education. The chapters that are part of this work are presented as follows: The Trajectory of the Religious Education since the Period of the Colony until the Present, The History of Training/Profissionalization of Teachers in Brazil, especially in the training for Religious Education Teachers; The Research Done in the School Escola Estadual Marlielle; The Investigation done in the Department of Religious Education. Its general objective consists both on the theoretical-documentary study concerning the Religious Education and the training of its teachers in the Brazilian context, and the execution of researches that depict the reality experienced by the subject, in the ambit of the State System of Education of Minas Gerais. The methodology used privileges the qualitative research, in dialogue with the quantitative, using as instruments: the documentary analysis, the free observation, the semi-structured interview and the questionnaire. The data collected are interpreted under the Content Analysis. The results of the research show that: the Religious Education developed in the country as an element of indoctrination, hiding a dialect between the secularization and the laic, and disputes between the public and private; The Religious Education, although being part of the curriculums of the state schools of Minas Gerais, is connected to the religious hierarchy that, summarizing, indicates its contents, programs and pedagogical practices, guides and capacitates its teachers. Despite some achievements of the Religious Education as a knowledge dominion, especially after the promulgation of the Law n 9475/97, the problems and matters were not solved, especially concerning the training/profissionalization of its teachers: the managers of the state policies, as well as the principals of the schools and the teachers of other subjects do not recognize the meaning and the importance of the subject considered; the subject, several times, is "useful" to complement the hourly load of teachers; the necessity of initial and continuous training of teachers for this specific area and also the participation of them in the Pedagogical Project of the school; the Religious Education model to be privileged should consider the social-religious diversity and the differences of the students. Key-words: Public Policies for the Religious Education; Training of Teachers for the Religious Education; Reality of the Religious Education in Minas Gerais in the context of a public school.
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LISTA DE ABREVIATURAS
Adm. Administrador
Art. Artigo
Ed. Edio
Org. Organizador
Orgs. Organizadores
PER- Professor de Ensino Religioso
PROF. Professor
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LISTA DE GRFICOS
GRFICO 1 Resultado da EE Marlielle ....................................................................... 210
GRFICO 2 Como os alunos consideraram as aulas em 2005 ................................... 211
GRFICO 3 Disciplina em que os alunos mais aprenderam ....................................... 212
GRFICO 4 Tipo de aula que os alunos mais gostaram em 2005 .............................. 213
GRFICO 5 Tempo de experincia ............................................................................. 266
GRFICO 6 Jornada de Trabalho ............................................................................... 267
GRFICO 7 Hbito de leitura ...................................................................................... 268
GRFICO 8 Uso do computador ................................................................................. 269
GRFICO 9 Local de uso do equipamento.................................................................. 270
GRFICO 10 Motivos que levaram a ser docente do Ensino Religioso ...................... 273
GRFICO 11 Carga horria......................................................................................... 284
GRFICO 12 Cursos de Graduao dos Docentes ..................................................... 286
GRFICO 13 Cursos de Ps-Graduao dos Docentes ............................................. 287
GRFICO 14 Participao no Frum Nacional de Ensino Religioso ........................... 292
GRFICO 15 Situao do docente de Ensino Religioso ............................................ 300
GRFICO 16 Problemas da prtica docente do Ensino Religioso ............................. 301
GRFICO 17 Tcnicas, Recursos e Atividades desenvolvidas pelos docentes ......... 313
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LISTAS DE QUADROS
QUADRO 1: Cursos de Graduao dos Docentes ...................................................... 286
QUADRO 2: Cursos de Ps-Graduao dos Docentes ............................................... 287
QUADRO 3: Situao do docente de Ensino Religioso ............................................... 302
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LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Resultado da EE Marlielle .......................................................................... 210
TABELA 2 Como os alunos consideraram as aulas em 2005 ..................................... 211
TABELA 3 Disciplina em que os alunos mais aprenderam .......................................... 212
TABELA 4 Tempo de experincia dos docentes ......................................................... 266
TABELA 5 Jornada de Trabalho dos docentes ............................................................ 267
TABELA 6 Hbito de leitura ......................................................................................... 268
TABELA 7 Uso do computador .................................................................................... 269
TABELA 8 Local de uso do equipamento .................................................................... 270
TABELA 9 Motivos que levaram a ser docente do Ensino Religioso ........................... 273
TABELA 10 Carga horria ........................................................................................... 284
TABELA 11 Participao no Frum Nacional de Ensino Religioso .............................. 292
TABELA 12 Situao do docente de Ensino Religioso ................................................ 300
TABELA 13 Tcnicas, Recursos e Atividades desenvolvidas pelos docentes............ 314
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LISTAS DE SIGLAS
ABE- Associao Brasileira de Educao
ABESC- Associao Brasileira de Escolas Superiores Catlicas
ACB- Ao Catlica no Brasil
AEC- Associao de Educao Catlica
AEC- Associao de Escolas Catlicas do Brasil
AID- Agency for International Development
ANDE- Associao Nacional de Educao
ANFOPE- Associao Nacional pela Formao dos Profissionais da Educao
ANPAE- Associao Nacional de Profissionais de Administrao da Educao
ANPED- Associao Nacional de Pesquisa e Ps-graduao
ASSINTEC- Associao Interconfessional de Educao de Curitiba - PR
CALADEC- Conferncia Latina Americana de Educao Crist
CAPES- Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior
CEDES- Centro de Estudos Educao e Sociedade
CEP- Controle Estatstico do Processo
CFE- Conselho Federal de Educao
CGT- Confederao Geral dos Trabalhadores
CIER- Conselho de Igrejas para Educao Religiosa
CIER- Conselho de Igrejas para Educao Religiosa
CNBB- Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil
CNEC- Campanha Nacional de Escolas da Comunidade
CNPq- Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico
CONER- Conselho Nacional de Ensino Religioso
CONIC- Conselho Nacional de Igrejas Crists
CONSED- Conselho dos Secretrios de Educao
CPB- Confederao dos Professores do Brasil
CQT- Controle de Qualidade Total
CRB- Conferncia dos Religiosos do Brasil
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CUT- Central nica dos Trabalhadores
DAER- Departamento Arquidiocesano de Ensino Religioso
ENEM- Exame Nacional do Ensino Mdio
ENER- Encontros Nacionais de Ensino Religioso
ERE- Ensino Religioso Escolar
FASUBRA- Federao das Associaes dos Servidores das Universidades
Brasileiras
FCO- Fundao Christiano Otonni
FDG: Fundao de Desenvolvimento Gerencial
FENEN- Federao Nacional dos Estabelecimentos de Ensino Particulares
FENOE- Federao Nacional de Orientadores Educacionais
FMI- Fundo Monetrio Internacional
FONAPER- Frum Nacional Permanente de Ensino Religioso
FUNDEF- Fundo de Manuteno e Desenvolvimento do Ensino Fundamental.
GPER- Grupo de Pesquisa Educao e Religio
GRECAT- Grupo de Reflexo Nacional de Catequese
GRERE: Grupo de Reflexo sobre o Ensino Religioso Escolar.
INEP- Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
LDB- Leis de Diretrizes e Bases da Educao
LEC- Liga do Eleitorado Catlico
MEB- Movimento de Educao de Base
MEC- Secretaria de Educao Superior
OAB- Ordem dos Advogados do Brasil
PCNER- Parmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso
PCNs- Parmetros Curriculares Nacionais
PPP- Projeto Poltico Pedaggico
PROINFO- Programa Nacional de Informtica na Educao
PSDB- Partido da Social Democracia Brasileira
SAEB: Sistema de Avaliao da Educao Bsica
SBPC- Sociedade Brasileira para o Progresso da Cincia
SEAF- Sociedade de Estudos e Atividades Filosficas
SESU/MEC- Secretaria de Educao Superior do MEC
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TREMG- Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais
UBES- Unio Brasileira de Estudantes Secundaristas
UCB- Universidade Catlica de Braslia
UNE- Unio Nacional dos Estudantes
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SUMRIO
1 INTRODUO ........................................................................................................... 17 1.1 Caracterizao da Pesquisa ................................................................................. 17 1.1.1 Definio do Tema ................................................................................................ 17 1.1.2 Objetivo Geral ....................................................................................................... 20 1.1.3 Objetivos Especficos............................................................................................ 20 1.1.4 Problematizaes ................................................................................................ 21 1.2 Metodologia ........................................................................................................... 21 2 O ENSINO RELIGIOSO NA HISTRIA DA EDUCAO BRASILEIRA................... 28 2.1 Reviso Histrica ................................................................................................... 28 2.1.1 Do Perodo Colonial ao Imprio ............................................................................ 28 2.1.2 Perodo da Repblica ........................................................................................... 42 2.1.3 O Estado Novo ..................................................................................................... 60 2.1.4 A Repblica Populista ........................................................................................... 64 2.1.5 A Ditadura Militar .................................................................................................. 77 2.1.6 O advento da Nova Repblica: outras perspectivas a partir de 1985 ................... 90 2.2 O Ensino Religioso no Campo Escolar .............................................................. 105 3 FORMAO E PROFISSIONALIZAO DE PROFESSORES .............................. 115 3.1 Formao/Profissionalizao de professores no Brasil: um breve relato histrico...................................................................................................................... 115 3.2 Formao/Profissionalizao de Docentes para o Ensino Religioso ............. 155 4 A PESQUISA REALIZADA: DADOS COLETADOS............................................... 176 4.1 O Rosto da Instituio Pesquisada ................................................................ 176 4.2 Organizao e Funcionamento Administrativo-pedaggico da Escola Marlielle ...................................................................................................................... 187 4.2.1 Acompanhamento pedaggico ........................................................................... 187 4.2.2 Quanto ao Projeto Poltico Pedaggico da Escola Estadual Marlielle ................ 190 4.2.3 Condies de trabalho do docente ofertadas pelo Estado e pela escola ........... 194 4.2.4 Trabalho interdisciplinar ...................................................................................... 197 4.2.5 Formao em Servio ......................................................................................... 200 4.2.6 Quanto finalidade da escola e perfil dos alunos .............................................. 203 4.2.7 Produtividade Escolar ......................................................................................... 209 4.2.8 Desempenho dos alunos .................................................................................... 214 4.3 O Ensino Religioso nas sries finais do Ensino Fundamental da Escola Estadual Marlielle: dados coletados pela pesquisa ............................................... 217 4.3.1 Mltiplos olhares sobre o Ensino Religioso: as falas de professores e profissionais da Escola Estadual Marlielle ................................................................... 220 4.3.1.1 A incluso do Ensino Religioso no contexto da Escola Pblica ....................... 221 4.3.1.2 Profissionalizao/ formao dos professores do Ensino Religioso ................ 229 4.3.1.3 Concepo de Ensino Religioso ...................................................................... 234 4.3.2.4 Contribuio do Ensino Religioso para formao do discente ......................... 244
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4.4 Depoimentos dos professores de Ensino Religioso da Escola Marlielle ....... 246 4.4.1 Razes da escolha pelo magistrio do Ensino Religioso.................................... 246 4.4.2 Formao do professor de Ensino Religioso ...................................................... 247 4.4.3 Saberes/experincias ......................................................................................... 249 4.4.4 O Sentir do docente de Ensino Religioso ........................................................... 250 4.4.5 Pr-requisitos que devem fundamentar a prtica do docente do Ensino Religioso ...................................................................................................................... 252 4.4.6 Procedimentos didticos e o tratamento dos contedos..................................... 253 4.4.7 As Dimenses da religiosidade, do sagrado, da espiritualidade, da tica e do fenmeno religioso, no contexto da sala de aula ......................................................... 255 4.4.8 Avaliao no Ensino Religioso ............................................................................ 259 4.4.9 Importncia do Ensino religioso para a formao dos alunos ............................. 260 5 O DEPARTAMENTO ARQUIDIOCESANO DE ENSINO RELIGIOSO: UMA VISO MAIS AMPLA SOBRE A DISCIPLINA........................................................................ 261 5.1 Departamento Arquidiocesano de Ensino Religioso: caracterizao, atribuies e competncias ...................................................................................... 261 5.2 A Pesquisa Realizada .......................................................................................... 265 5.2.1 O Perfil dos Professores ..................................................................................... 265 5.2.2 As Percepes dos Professores: suas falas nas entrevistas .............................. 270 5.2.2.1 Razes da escolha pelo magistrio do Ensino Religioso ................................. 271 5.2.2.2 Formao do professor de Ensino Religioso ................................................... 274 5.2.2.3 Saberes/experincias ...................................................................................... 279 5.2.2.4 O Sentir do docente de Ensino Religioso ........................................................ 282 5.3.2.5 Tipo de Ensino Religioso ................................................................................. 302 5.3.2.6 As percepes dos outros profissionais e professores sobre o Ensino Religioso ...................................................................................................................... 304 5.3.2.7 Pr-requisitos que devem fundamentar a prtica do docente do Ensino Religioso ...................................................................................................................... 307 5.3.2.8 Procedimentos didticos e o tratamento dado aos contedos ......................... 311 5.3.2.9 As Dimenses da religiosidade, do sagrado, da espiritualidade, da tica e do fenmeno religioso, no contexto da sala de aula. ........................................................ 319 5.3.2.10 Avaliao no Ensino Religioso ....................................................................... 322 5.3.2.11 Importncia do Ensino Religioso para a Formao dos Alunos ..................... 324 6 CONSIDERAES FINAIS ..................................................................................... 328 REFERNCIAS ........................................................................................................... 334 APNDICE.....................................................................................................................356 APNDICE A: Aes significativas realizadas na prtica docente ....................... 357 APNDICE B: pontos imprescindveis para o magistrio do Ensino Religioso .. 359 Apndice C: DADOS SOBRE O TIPO DE ENSINO RELIGIOSO .............................. 360 APNDICE D: GRFICOS DE PERFIL DOS PROFESSORES DE ENSINO RELIGIOSO ................................................................................................................. 364
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Apndice E: ROTEIRO DE ENTREVISTAS ............................................................... 367 APNDICE f: Roteiro DE Entrevistas ...................................................................... 369 APNDICE G: Roteiro DE Entrevistas..................................................................... 371 APNDICE H: MODELO DE QUESTIONRIO - APOIO PARA A PESQUISA ......... 372 ANEXOS...................................................................................................................... 379 ANEXO A: QUADRO DE CURRCULO DO CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM ENSINO RELIGIOSO, FORMULADO PELO FONAPER ............................................ 380 ANEXO B: QUADRO DE RELAO DE CURSOS DE FORMAO DE PROFESSORES PARA O ENSINO RELIGIOSO ....................................................... 382
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1 INTRODUO
1.1 Caracterizao da Pesquisa
1.1.1 Definio do Tema
Este trabalho1 tem como objeto analisar as Polticas para o Ensino Religioso e
a Formao de Professores, para essa disciplina. Nesta perspectiva, esto
contempladas neste texto: uma retrospectiva histrica dessa rea de conhecimento,
desde seus primrdios at a atualidade; um estudo sobre o Ensino Religioso
Escolar; uma abordagem sobre a Formao de Professores, enfatizando a
Formao de Docentes para o Ensino Religioso; duas pesquisas interligadas, sendo
que uma teve como lcus, uma escola estadual, sediada em Belo Horizonte, e a
outra, realizada no Departamento Arquidiocesano de Ensino Religioso.
No Projeto de Pesquisa, estava prevista, apenas, a realizao de uma rpida
visita ao mencionado Departamento, pois objetivvamos, somente, coletar alguns
dados, junto a sua diretoria, a fim de compreender melhor a realidade do Ensino
Religioso em Minas Gerais.
Contudo, constatamos que, nesse Departamento, encontravam-se 28
docentes, vinculados a diversas escolas estaduais de Belo Horizonte, inclusive 2
ligados escola pesquisada, fazendo um Curso de Atualizao.
Frente a essa realidade, consideramos que no se poderia perder a
oportunidade de obtermos uma viso mais ampla do Ensino Religioso, no mbito de
vrias instituies, situadas em Belo Horizonte.
Com a devida autorizao da direo do citado Departamento, decidimos
fazer uma pesquisa com esses docentes, atravs da aplicao de um questionrio
que envolveu todos eles e da realizao de entrevistas, feitas com 6 desses sujeitos.
1 Neste trabalho optou-se pelo uso da terceira pessoa do singular, contudo, quando se fizer referncia autora desta pesquisa, ser utilizada a primeira pessoa do plural.
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Enfatizamos que a anlise comparativa entre as duas pesquisas realizadas,
evidenciou uma grande similaridade nos dados coletados por elas.
Os motivos, que levaram escolha da temtica pesquisada, nasceram da
experincia como profissional da disciplina em pauta. Ao longo de nossa prpria
histria, pudemos perceber o quanto ser professora de Ensino Religioso exige uma
construo diria.
Constituir-se como profissional dessa rea de conhecimento, sem se ter um
reconhecimento por parte dos gestores das polticas pblicas e mesmo dos diretores
de muitas escolas, exige uma reviso constante da prpria identidade como pessoa
e como educadora. Este fato tem sido constatado por muitos professores e,
particularmente, por ns e por um grupo de professores, ligados a uma escola
pblica do Estado do Esprito Santo. Acontece que esses professores e eu fizemos
concurso, fomos classificados, nos submetemos aos exames, providenciamos os
documentos necessrios para sermos efetivados no Estado.
Entretanto, no dia da assinatura de nossa investidura na profisso, fomos
comunicados de que estvamos impossibilitados de assumir o cargo como
professores de Ensino Religioso, pelo fato de no termos um curso especfico,
dentro da rea. Contudo, paradoxalmente, logo depois, fomos chamados para
assinar um contrato temporrio. Diante do exposto, questionamos o significado
dessa trama: assumir o cargo no poderamos, mas para um contrato temporrio
ramos considerados habilitados. Como a Secretaria de Educao podia exigir,
como critrio de investidura, a concluso licenciatura em Ensino Religioso, se no
Estado no havia a oferta desse curso? Que interesses estavam por trs dessa
posio? Que aparelho ideolgico perpassava essa deciso?
O que ocorreu conosco no se constitui como um fato isolado no Estado do
Esprito Santo. A falta de uma poltica efetiva, relacionada formao e
profissionalizao de professores de Ensino Religioso, no mbito dos Estados, faz
com que, no Brasil, se continue, segundo FONAPER,
[...] a conviver com uma das mais extensas crises ticas, estendendo-se tica profissional; como o caso de grande nmero de profissionais da educao a servio do Ensino Religioso sem alternativas para a garantia de seus direitos individuais e sociais, notadamente em muitas unidades da Federao.
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No perdemos de vista que se trata tambm de um dado cultural, que verificado quando se levanta a origem ou provenincia do Ensino Religioso instalada no Brasil, nos sucessivos perodos da histria da educao e da formao cultural do povo brasileiro (FONAPER, 2004, p. 12).
Meus colegas e eu recorremos, atravs de uma ao judicial, no ano de 2002,
mas no conseguimos levar a causa para frente, porque os advogados, que
procuramos, tiveram dificuldade em transitar, de forma efetiva, na complexidade da
legislao vigente na poca, a respeito do Ensino Religioso, nos mbitos estadual,
municipal e federal, o que dificultou, sobremaneira, seus trabalhos.
Sentimos que a falta de uma poltica efetiva de formao e profissionalizao
de professores para o Ensino Religioso, em nveis nacional e estadual, vem gerando
uma descontinuidade de aes e uma desvalorizao dos docentes. Na verdade, as
polticas pblicas pouco tm feito pelos profissionais da rea do Ensino Religioso. Ao
longo da histria da educao brasileira, percebe-se que o Ensino Religioso foi
tratado como um apndice, sendo tanto discriminado por sua natureza eclesial,
quanto sendo alvo de debates polmicos, sobretudo durante os processos de sua
regulamentao, como disciplina dos currculos escolares.
importante enfatizar que a realidade, vivenciada pelo Ensino Religioso,
desafiadora, mas ainda continua sem uma definio. Portanto, no basta discutir sua
identidade, princpios, finalidades, contedos. preciso aprofundar no mbito da
formao dos professores para essa rea do ensino, abordando-a numa dimenso
mais ampla, tendo em vista as constantes mudanas nas polticas pblicas, o
pluralismo presente no universo escolar, a exigncia de competncia tcnico-
pedaggica, o carter ecumnico dos programas do Ensino Religioso e o contexto
scio-econmico-poltico-cultural brasileiro.
A formao dos professores, para o Ensino Religioso, se constitui como um
dos maiores desafios para os gestores das polticas pblicas, para as instituies
formadoras, para o educador e para a prpria sociedade.
Pensar a formao do docente do Ensino Religioso uma maneira de
contribuir para que ele possa, nos diferentes contextos brasileiros, se constituir, de
fato, como profissional, possuindo os mesmo direitos dos outros professores e tendo
mais autonomia para participar da construo de um projeto educativo, na
perspectiva do fenmeno religioso, como construo sociocultural, veiculadora de
valores ticos e da dimenso da religiosidade.
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Ampliar a reflexo em torno desse objeto de estudo passa pelo desejo de ver
os profissionais do Ensino Religioso assumindo a docncia por seus prprios
mritos, pela sua competncia tcnico-pedaggica e no, simplesmente, atravs da
indicao por parte de autoridade religiosa ou para complementar carga horria de
docentes de diferentes disciplinas. Faz-se urgente, neste contexto, preparar
especialistas estudiosos/pesquisadores do fenmeno religioso em suas constantes
e em sua diversidade de manifestaes culturais, alm de um mediador deste saber
no conjunto de saberes/cincias de que se compe o currculo escolar
(MENEGHETTI, 2002, p. 52).
1.1.2 Objetivo Geral
Analisar a trajetria do Ensino Religioso e a Formao de seus professores,
considerando-se o contexto atual e os documentos normativos, formulados para
esses campos do conhecimento, destacando-se o papel social dessa formao na
vida dos profissionais e os saberes a ela inerentes.
1.1.3 Objetivos Especficos
- Historicizar a trajetria do Ensino Religioso, no Brasil, desde seus primrdios
at a atualidade, dando nfase a sua contextualizao e seus aspectos normativos.
- Descrever, de forma sucinta, uma retrospectiva histrica da
formao/profissionalizao de professores no Brasil.
- Explicitar a capacitao de professores para o Ensino Religioso,
identificando seus retrocessos e avanos.
- Relatar os dados coletados pela pesquisa, realizada nas sries finais do
Ensino Fundamental de uma escola estadual.
- Verificar o papel do Departamento Arquidiocesano do Ensino Religioso, no
que tange a capacitao de professores para o Ensino Religioso.
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- Relatar a pesquisa realizada com professores de Ensino
Religioso,vinculados s diversas instituies estaduais de Belo Horizonte.
1.1.4 Problematizaes
- Como o Ensino Religioso considerado nos documentos normativos e no
contexto atual?
- Como se desenvolve a formao dos professores no contexto da educao
brasileira?
- A formao de docentes para o Ensino Religioso tem conseguido prepar-
los para o exerccio da sua profisso, considerando a multiplicidade de dimenses,
advindas do contexto social, antropolgico e religioso dos alunos?
1.2 Metodologia
Para que a pesquisa se desenvolvesse da melhor forma possvel, tornou-se
necessrio adotar estratgias metodolgicas que orientassem o caminho do
pensamento e a prtica exercida na abordagem da realidade (MINAYO, 2000, p.
16).
Segundo essa autora, a pesquisa :
[...] a atividade bsica da Cincia na sua indagao e construo da realidade. a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e a atualiza frente realidade do mundo. Portanto, embora seja uma prtica terica, a pesquisa vincula pensamento e ao. Ou seja, nada pode ser intelectualmente um problema, se no tiver sido, em primeiro lugar, um problema da vida prtica. As questes de investigao esto, portanto, relacionadas a interesses e circunstncias socialmente condicionadas. So frutos de determinada insero no real, nele encontrando suas razes e seus objetivos (MINAYO, 2000, p. 17-18).
Assim, para a realizao desta investigao optou-se por trabalhar,
sobretudo, com a pesquisa qualitativa, devido ao fato de ela apreender, melhor, a
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multiplicidade de sentidos, presente no campo educacional. Alm disso, esse tipo de
pesquisa ajuda na compreenso de mundo dos sujeitos e entende os fenmenos,
segundo as perspectivas dos participantes, colaborando para situar a interpretao
dos fenmenos estudados.
O objetivo de um estudo qualitativo o de traduzir e expressar o sentido dos
fenmenos do mundo social, reduzindo a distncia entre indicador e indicado, entre
teoria e dados, entre contexto e ao (NEVES, 1996, p. 01). Para que isso ocorra, o
pesquisador precisa visualizar o contexto, se inserindo nele.
De acordo com Bogdan e Biklen
[...] Os investigadores qualitativos freqentam os locais de estudo porque se preocupam com o contexto. Entendem que as aes podem ser mais bem compreendidas quando so observadas no seu ambiente habitual de ocorrncia. Os locais tm de ser entendidos no contexto da histria das instituies a que pertencem (BOGDAN; BIKLEN 1994, p. 48).
No mbito da pesquisa qualitativa, optou-se pela realizao de um Estudo de
Caso que viabilizou apreender as diversas facetas que envolvem a questo
investigada.
Segundo Bogdan e Bilklen (1994, p. 89), o Estudo de Caso consiste na
observao detalhada de um contexto, ou indivduo, de uma nica fonte de
documentos ou de um acontecimento especfico. O Estudo de Caso, segundo
Ludke e Andr (1986, p. 17), o estudo de um caso, que seja simples e especfico.
Para essas autoras, os Estudos de Caso se caracterizam pela descoberta; pela
interpretao em contexto; pela percepo da realidade de forma completa e
profunda; pela variedade de fontes de informao; pela experincia vicria e
generalizao naturalstica; pela representao dos diferentes e conflitantes pontos
de vista, presentes numa situao social; pela linguagem e forma mais acessvel do
que a usada por outros tipos de pesquisa.
Assim, o Estudo de Caso, que se efetivou, colaborou para a interpretao da
realidade, revelando a multiplicidade de dimenses, presentes no cenrio
pesquisado.
Foram estes os instrumentos utilizados para perceber e interpretar os
significados e os sentidos do objeto pesquisado: pesquisa bibliogrfica, anlise
documental, entrevista semi-estruturada e observao livre. A inteno de
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compreender um fenmeno complexo um elemento que torna propcio o emprego
de mtodos qualitativos. De acordo com Neves,
[...] Compreender e interpretar fenmenos, a partir de seus significados e contextos so tarefas sempre presentes na produo de conhecimento, o que contribui para que percebamos vantagens no emprego de mtodos que auxiliam a ter uma viso mais abrangente dos problemas, supem contato direto com o objeto de anlise e fornecem um enfoque diferenciado para a compreenso da realidade (NEVES, 1996, p.5).
A anlise documental, na concepo de Neves (1996. p. 03),
constituda pelo exame de materiais que ainda no receberam um tratamento analtico, ou que podem ser reexaminados com vistas a uma interpretao nova, complementar ou de onde se pode retirar evidncias que fundamentem afirmaes e declaraes do pesquisador.
Ela foi importante neste trabalho, pois ajudou a construir os dados histricos,
referentes ao desenvolvimento do Ensino Religioso e formao de seus
professores, como tambm se efetivou na realizao das pesquisas feitas.
A pesquisa bibliogrfica, segundo Pretti (1995, p 9), conduzida,
principalmente, atravs do uso de materiais escritos. Seu objetivo conhecer e
analisar as principais contribuies tericas, existentes sobre um determinado
assunto, tema ou problema. Esse instrumento proporcionou uma consistncia
terica a este trabalho
De acordo com as pesquisadoras Ludke e Andr (1986, p. 33), a entrevista e
a observao ocupam um lugar privilegiado nas novas abordagens da pesquisa
educacional. O contato pessoal, atravs da observao do pesquisador, com o
fenmeno pesquisado o melhor teste de verificao da ocorrncia de um
determinado fenmeno, permitindo chegar mais perto da perspectiva dos sujeitos e
do significado que eles atribuem realidade que os cerca, ajudando a descobrir
aspectos novos de um problema.
A entrevista tem algumas vantagens sobre outras tcnicas, pois
[...] ela permite a captao imediata e corrente da informao desejada, praticamente com qualquer tipo de informante e sobre os mais variados tpicos. Uma entrevista bem feita pode permitir o tratamento de assuntos de natureza estritamente pessoal e ntima, assim como temas de natureza complexa e de escolhas nitidamente individuais (LUDKE E ANDR, 1986, p. 35).
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Desse modo, o pesquisador deve fazer o maior esforo possvel, para
formular perguntas que: favoream o discurso dos sujeitos entrevistados; que
respondam com exatido quilo que o pesquisador est investigando; que levem o
entrevistado a responder o que acha e no o que o entrevistador tem em mente.
Fez-se a opo em trabalhar com a entrevista semi-estruturada por no exigir
uma ordem rgida de questes, possibilitar aos sujeitos uma maior fluidez ao
discorrer sobre o tema e oferecer amplo campo de interrogaes que pode ser fruto
de novas hipteses.
Para a realizao das entrevistas2, elaborou-se, previamente um roteiro que
serviu como um referencial aberto, buscando respeitar o contedo das falas dos
sujeitos entrevistados. Foram realizadas dezesseis entrevistas com os professores
da instituio, responsveis pelo magistrio de disciplinas, relativas s diferentes
reas do conhecimento, duas entrevistas foram feitas com profissionais do setor
administrativo e duas foram realizadas com os docentes de Ensino Religioso.
Os dezesseis professores das diferentes reas do conhecimento foram
selecionados a partir de suas disponibilidades e os dois profissionais do setor
administrativo foram escolhidos pelo fato de conhecerem a histria da instituio.
Para aos dois professores de Ensino Religioso, no houve opo, pois apenas eles
trabalhavam com a disciplina, na escola pesquisada.
As entrevistas tornaram-se fundamentais no levantamento de dados,
viabilizando uma melhor compreenso da temtica estudada.
No que tange anlise e interpretao dos dados, foi utilizada a
denominada Anlise dos Contedos, pois, atravs dela, segundo Gomes;
[...] podemos encontrar respostas para as questes formuladas e tambm podemos confirmar ou no as afirmaes estabelecidas antes do trabalho de investigao (hipteses). A outra funo diz respeito descoberta do que est por trs dos contedos manifestos, indo alm das aparncias do que est sendo comunicado. As duas funes podem, na prtica, se complementar e podem ser aplicadas a partir de princpios da pesquisa quantitativa ou da qualitativa (GOMES, 2000, p. 74).
Assim, a partir das falas dos sujeitos entrevistados, identificou-se um
conjunto de categorias. Essa atividade significa agrupar elementos, idias ou
expresses em torno de um conceito capaz de abranger tudo isso (GOMES, 2000,
2 O modelo do roteiro da entrevista encontra-se na seo referente aos ANEXOS deste trabalho.
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p. 70).
Dessa maneira, as categorias foram estabelecidas, a partir da classificao
dos dados coletados nas entrevistas. Algumas categorias exigiram subdivises,
devido s especificidades dos temas. Fazer uma anlise temtica, segundo Bardin,
[...] consiste em descobrir os ncleos de sentido que compem a comunicao e cuja presena, ou freqncia de apario podem significar alguma coisa para o objectivo analtico escolhido. [...] O tema geralmente utilizado como unidade de registro para estudar motivaes de opinies, de atitudes, de valores, de crenas, de tendncias, etc. As respostas a questes abertas, as entrevistas (no directivas ou mais estruturadas) individuais ou de grupo, de inqurito ou de psicoterapia, os protocolos de testes, as reunies de grupos, os psicodramas, as comunicaes de massa, etc., podem ser, e so frequentemente, analisados tendo o tema por base (BARDIN, 1995, p. 105-106).
Nessa diviso temtica, os objetivos foram descobrir ideologias, tendncias e
outras determinaes, expressas nas falas dos entrevistados e estabelecer
articulaes entre os dados e os referenciais tericos da pesquisa.
A anlise categorial, segundo Bardin,
[...] pretende tomar em considerao a totalidade de um texto, passando-o pelo crivo da classificao e do recenseamento, segundo a freqncia de presena (ou ausncia) de itens de sentido. [...] o mtodo das categorias, espcies de gavetas ou rubricas significativas que permitem a classificao dos elementos de significao constitutivas, da mensagem (BARDIN, 1995, p. 36-37).
Tanto na pesquisa feita na escola, quanto na realizada no Departamento
Arquidiocesano de Ensino Religioso, foram identificadas as categorias e efetivado
um trabalho de interlocuo da teoria, com a empiria, que demandou um
considervel esforo.
Segundo Gomes,
[...] Nem sempre a tarefa de formular categorias a partir dos dados coletados simples. s vezes, essa tarefa pode se transformar numa ao complexa e isso s pode ser ultrapassado com a fundamentao e a experincia do pesquisador. Por outro lado, a articulao das categorias configuradas a partir dos dados com as categorias gerais tambm requer sucessivos aprofundamentos sobre as relaes entre a base terica do pesquisador e os resultados por ele investigados (GOMES, 2000, p. 74).
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Embora a opo tenha sido feita pela pesquisa qualitativa, na investigao
feita no Departamento Arquidiocesano foi aplicado um questionrio. Como se sabe,
os mtodos qualitativos e quantitativos no se excluem. Autoras como Ludke e
Andr (1986) defendem a idia da combinao de tcnicas quantitativas e
qualitativas, como possibilidade de completar um conjunto de fatos, de enriquecer as
constataes e de validar as descobertas.
Essa combinao de mtodos quantitativos e qualitativos chamada de
triangulao. Segundo Neves (1996, p. 2), a triangulao pode estabelecer
ligaes entre descobertas obtidas por diferentes fontes, ilustr-las e torn-las mais
compreensveis, pode, tambm, conduzir a paradoxos, dando nova direo aos
problemas a serem pesquisados.
O questionrio3 foi aplicado em vinte e quatro sujeitos, vinculados a diferentes
instituies da Regio Metropolitana de Belo Horizonte, e em dois docentes que
pertencem ao quadro da escola pesquisada. Esses docentes se encontravam
fazendo um curso de capacitao no referido Departamento e foram convidados a
participar da pesquisa.
A aplicao desse instrumento teve em vista:
- ampliar a viso sobre o saber que fundamenta o trabalho do docente de
Ensino Religioso, nos campos da teoria/prtica;
- apreender os sentidos de sua formao/profissionalizao;
- traar o perfil do professor de Ensino Religioso.
Os dados, coletados pelo Questionrio, contriburam para o aprofundamento
e para a anlise do que foi explicitado nas entrevistas4 realizadas, ampliando a
interpretao e a compreenso dos materiais obtidos.
Tendo em vista o grande nmero de dados, coletados pela pesquisa, optou-
se por no apresent-los, integralmente, no corpo do texto. Assim, alguns dados
encontram-se disponveis na parte referente aos Apndices e Anexos.
Para se viabilizar uma adequada compreenso didtica, esta Dissertao est
dividida em captulos que mantm, entre si, grande interlocuo.
O Captulo 1, que consiste na Introduo, est subdividido em duas partes:
Caracterizao da pesquisa e Metodologia utilizada.
3 O modelo do questionrio encontra-se na seo APNDICES. 4 O modelo da entrevista encontra-se na seo APNDICES.
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O Captulo 2, intitulado O Ensino Religioso na Histria da Educao
Brasileira, tambm est subdividido. A primeira parte, denominada Reviso
Histrica, apresenta a trajetria do Ensino Religioso, desde o perodo Colonial at a
atualidade e a segunda parte, intitulada O Ensino Religioso no Campo Escolar,
evidencia, de forma sucinta, uma viso sobre o Ensino Religioso na rea da
educao.
O Captulo 3 denominado Formao e Profissionalizao de Professores.
Na sua primeira parte, intitulada Formao/Profissionalizao de Professores no
Brasil um breve relato histrico, procedeu-se a uma sucinta retrospectiva dessa
temtica. A segunda parte, Formao/Profissionalizao de Docentes para o Ensino
Religioso, explicita os avanos e os recuos no campo especfico desse objeto.
O Captulo 4, intitulado A Pesquisa Realizada na Escola Estadual, enfoca,
inicialmente, a caracterizao da instituio pesquisada, atravs de uma breve
genealogia e se organiza da seguinte forma: O Rosto da Instituio Pesquisada;
Organizao e Funcionamento Administrativo-pedaggico da Escola Marlielle e O
Ensino Religioso nas Sries Finais do Ensino Fundamental da Escola Estadual
Marlielle. Esta ltima parte est dividida em: Mltiplos Olhares sobre o Ensino
Religioso: as falas de professores e profissionais da Escola Estadual Marlielle e
Depoimentos dos Professores de Ensino Religioso da Escola Marlielle nos quais
so explicitados os dados, coletados pela entrevista.
O captulo 5 cognominado O Departamento Arquidiocesano de Ensino
Religioso: uma viso mais ampla da disciplina. Este captulo contempla quatro
partes: O Departamento Arquidiocesano de Ensino Religioso: caracterizao,
atribuies e competncias; A Pesquisa Realizada, O Perfil dos Professores, As
Percepes dos Professores: suas falas nas entrevistas.
Finalmente, so apresentadas algumas Consideraes Finais.
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2 O ENSINO RELIGIOSO NA HISTRIA DA EDUCAO BRASILEIRA
2.1 Reviso Histrica
2.1.1 Do Perodo Colonial ao Imprio
O Ensino Religioso, no mbito da escola brasileira, insere-se na trajetria
histrica da educao e se processa, sobretudo, atravs das relaes, estabelecidas
entre o Estado e a Igreja Catlica.
Nos trs primeiros sculos da histria do Brasil, a unio entre Igreja e Estado
caracterizava-se pelo regime do Padroado, acordo celebrado entre o monarca de
Portugal e o Sumo Pontfice, no qual estavam confirmadas prerrogativas concedidas
ao rei, tendo em vista a propagao da f catlica.
Atravs da unio entre Imprio e Igreja e sob o regime em vigor, o do
Padroado, Imprio e doutrina catlica do-se as mos para promover uma ao
colonizadora no Brasil, marcada pela submisso e pela docilidade, sintonizadas e
favorveis aos objetivos da metrpole, visando tanto explorao da riqueza da
terra, quanto pregao e propagao do Evangelho. Nessa perspectiva,
defendia-se a idia de que Deus, o rei e o senhor local agiam como um pai que
protege, resolve os problemas, ampara e impe. Alm disso, o monarca portugus,
considerado uma pessoa sagrada, pela uno divina, governava a Igreja nos seus
territrios, por delegao pontifcia e indicava, pessoalmente, os eclesisticos para
funes de liderana na Igreja.
Sobre esse poder do rei, comenta Azzi,
[...] no exercido em virtude de nenhum direito humano, mas apenas pelo privilgio da escolha divina. O monarca o eleito de Deus; e por fora dessa eleio gratuita, seu poder humanamente incontestvel. O poder real , assim, considerado como um dom, como uma graa divina. pela graa de Deus que o monarca ocupa sua posio de chefia poltica sobre o povo. [...] O fortalecimento do poder real era considerado imprescindvel, na medida em que a figura do monarca emergia como um verdadeiro baluarte na defesa da unidade e da ortodoxia catlica. Conseqentemente, nos
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primeiros sculos do perodo colonial, os eclesisticos se destacam como verdadeiros apologistas do poder real, e seus intransigentes defensores. Em virtude do direito de padroado, a sacralidade do rei portugus se tornava ainda mais consistente, em vista da delegao recebida por parte do Pontfice Romano para implantar a f nas novas terras descobertas. Por essa razo, antes de viajar para o alm-mar, os religiosos missionrios iam a Lisboa prestar ao monarca o juramento de fidelidade (AZZI, 1987, p. 39.40).
A vivncia do Padroado garantia ao Imperador poderes muito amplos de
censura e de fiscalizao sobre as decises e atividades eclesisticas. At mesmo a
cobrana dos dzimos eclesisticos era feita em nome do rei.
Deve-se enfatizar que a evangelizao brasileira, realizada sob a gide do
Padroado, se processou de modo violento, sem considerar a cultura e as
especificidades dos povos africanos e indgenas.
[...] O carter guerreiro do discurso evangelizador fez tambm com que os missionrios no tivessem interesse real em conhecer e respeitar a cultura dos outros aos quais foram enviados: africanos e indgenas. [...] A Igreja que evangelizou o Brasil foi uma Igreja em p de guerra. Ora, a guerra mobiliza as pessoas, para conquistar, dilatar, expandir, propagar. Na guerra, o que importa a disciplina: da o carter imposto e disciplinrio de toda a catequese durante o antigo sistema colonial, da tambm o lugar central ocupado pela doutrinao (HOORNARERT, 1992, p. 27).
Essa sociedade, que foi sendo configurada no Brasil, possibilitou, de incio, a
expanso colonial e a formao da aristocracia rural. O povoamento da terra era
alvo do projeto colonial, apresentado como uma obra divina da poltica
mercantilista e ideolgica, priorizada pelos conquistadores.
Esse desenvolvimento colonial era influenciado pelo contexto internacional. A
Europa passava por revolues no mbito do pensamento e da epistemologia e,
principalmente, sofria os desdobramentos da Reforma Protestante, que deu origem
ao nascimento de outras Igrejas Crists e, entre vrias conseqncias, instaurou a
questo da intolerncia religiosa. A Portugal e Espanha foi atribuda a tarefa de
preservao dos princpios catlicos, frente expanso do protestantismo.
Assim, resgatou-se o modelo da Igreja catlica,
[...] denominado cristandade, que comeava a sofrer abalos no continente aps desfrutar de uma hegemonia absoluta desde o sculo IV. Esse modelo remontava ao perodo em que Constantino oferecera favores especiais Igreja e ao momento da oficializao do cristianismo como religio do Estado romano nos tempos de Teodsio, nas ltimas dcadas do sculo IV.
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Assim, a f catlica foi incorporada ao Estado, e o monarca passou a ser considerado, a partir de ento, protetor da Igreja (MOURA, 2000, p. 19).
Portanto, o princpio condicionador da evangelizao foi o Padroado, que teve
suas razes ligadas ao conceito mais amplo de cristandade. Fundamentalmente,
cristandade indica a utopia de construir uma sociedade integralmente crist, ou
seja, a religio crist deve penetrar todos os segmentos da vida tanto do cidado
como da coletividade (MATOS, 2001, p. 97).
Atravs de tal modelo, a conquista e a catequese, na Colnia, foram
consideradas obras religiosas, devocionais, nas quais Igreja Catlica e Estado se
tornaram parceiros. A religio, na maioria das vezes, era utilizada para interesses
polticos e econmicos, prejudicando, assim, o projeto de evangelizao e
cerceando a liberdade da Igreja e de seus representantes no anncio do Reino de
Deus e na sua dimenso proftica. No de estranhar que, em semelhante
situao, a Igreja fosse instrumentalizada em funo do projeto imperial portugus.
O incio da obra evangelizadora e educacional, no Brasil, se deu com a
chegada de seis jovens jesutas que desembarcaram com Tom de Souza, o
primeiro governador-geral, em 27 de maro de 1549, na Bahia. Pe. Manoel da
Nbrega foi o superior dessa primeira comunidade da Companhia de Jesus. A
finalidade principal da obra missionria dos inacianos, na colnia, foi restabelecer os
bons costumes entre os que j eram cristos, converter os gentios f catlica e
faz-los obedientes s autoridades civis.
Segundo Saviani,
[...] Chegando colnia brasileira os primeiros Jesutas cumpriram mandato do Rei de Portugal, D. Joo III, que formulara, nos Regimentos, aquilo que poderia ser considerado a nossa primeira poltica educacional. O ensino jesuta ento implantado, j que contava com incentivo e subsdio da coroa portuguesa, constitui a nossa verso da educao pblica religiosa. Essa situao se consolidou com o estatuto da redzima instituda em 1564 (Cf. MATTOS, 1958, p. 275) mediante a qual um dcimo da receita, obtida pela coroa portuguesa, na colnia, se instalou no pas, primeiro na verso do plano de Nbrega, que eu chamaria de pedagogia brasileira, pois procurava se adequar s condies especficas da colnia, e depois, na verso do Ratio Studiorum5 cujos cnones foram adotados por todos os colgios jesutas no mundo inteiro (SAVIANI, 2005, p. 30 - 31).
5 Ratio significa plano, ordem, regra, razo, etc.; Studiorum significa estudos. Ratio Estudiorum pode ser traduzido por Ordem e Maneiras dos Estudos. Publicado em 1599, associava-se poltica catlica portuguesa como um conjunto de normas, que definiam saberes a serem ensinados e condutas a serem inculcadas, e um conjunto de prticas que permitiam a transmisso desses saberes e a incorporao de comportamentos, normas e prticas (HANSEN, 2000, p.13).
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A partir de 1550, com a criao das primeiras escolas jesuticas, o Ensino
Religioso comeou a despontar no cenrio da educao brasileira. Os Jesutas
fundaram as Escolas de Meninos para os gentios, nas quais estudavam, tambm, os
rfos trazidos de Lisboa e os filhos de ndios e mamelucos, que sabiam a lngua da
terra, sendo que estes ltimos eram preparados para a catequese. Ali aprendiam
boas maneiras, primeiras letras e, s vezes, recebiam fundamentos de
humanidades.
Os colgios, criados pelos inacianos, possuam objetivo essencialmente
religioso, de contedo literrio e de mtodo escolstico, oferecidos aos filhos das
famlias portuguesas e, mais tarde, aos clrigos, numa educao clssica,
humanstica, acadmica e abstrata.
Essas instituies ofereciam o curso elementar, no qual se ensinava a ler,
escrever e contar. Posteriormente, era ofertado o curso de gramtica ou de
humanidades, predominando o Latim. Estimulava-se o aprendizado do tupi ou
lngua geral. Terminado o curso de Letras, iniciava-se o de Artes, o de Fsica, de
Metafsica e de tica. Para os postulantes ao clero, foi introduzido o curso de
Teologia (durao de quatro anos), que se dividia em Teologia Moral e Teologia
Especulativa ou Dogmtica. Assim, priorizando uma educao de cunho humanista,
os Jesutas realizaram o trabalho de expanso da f catlica.
Ao longo do Perodo Colonial, pode-se constatar que a educao jesutica foi
marcada por um carter disciplinador, dando nfase catequese. As expresses
culturais e os valores religiosos, peculiares cultura dos nativos e dos negros, foram
considerados, muitas vezes, como empecilhos propagao da verdadeira f.
Nessa perspectiva, a educao jesutica, ento instaurada, tinha como premissa
bsica a adeso cultura portuguesa e aos princpios do catolicismo.
Paiva (2000) esclarece o contexto escolar, ento vivenciado:
[...] o colgio plasmava o estudante para desempenhar, no futuro, o papel de vigilante cultural, de forma que a prtica, mesmo desviante, pudesse ser recuperada. O colgio era a adeso cultura portuguesa. Lendo a gramtica do colgio, entenderemos a gramtica da cultura. Sublinho aqui as linhas-mestras do Ratio Studiorum, o cdigo pedaggico dos jesutas. A destinao do homem e de todos os seus atos para Deus, compreenso prpria de uma sociedade teocntrica, funda a viso pedaggica. A religiosidade, pois, d forma a esses atos. Em outras palavras, os atos so compreendidos como funo de um mundo religioso e expresso em linguagem religiosa. O princpio estrutural a autoridade hierarquizada Deus como princpio e fim do que decorrem a centralizao, a
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uniformidade e a invarincia. A disciplina se torna, a, instrumento capital: disciplina de costumes, disciplina acadmica, disciplina asctica. [...] preciso treinar as pessoas a agir de acordo com o plano divino. O proposto pela pedagogia jesutica era a prtica das virtudes, o amor das virtudes slidas (PAIVA. 2000, p 49-50).
Portanto, o Ensino Religioso na Colnia, compreendido e efetivado como
ensino da religio, privilegiava o contedo doutrinrio como parte integrante do
currculo escolar, salvaguardando as verdades fundamentais da f catlica e,
conforme Severino,
[...] os princpios de uma tica individualista e social fundada na suprema prioridade da pessoa sobre a sociedade. A qualidade moral dos indivduos repercutir necessariamente sobre a qualidade moral da sociedade. Todo o investimento da evangelizao, em sentido estrito, como da educao, sob inspirao crist, se deu historicamente nesta linha. Foi por isso mesmo que o Cristianismo e a Igreja conviveram pacificamente com situaes sociais de extrema opresso, com a escravido, a explorao no trabalho etc. como se estas situaes independessem da vontade do homem, bastando que as conscincias individuais se sentissem em paz, nada se podendo fazer contra estas situaes objetivas (SEVERINO, 1986, p. 71).
Por volta de 1750, Portugal comea a participar dos novos rumos culturais e
cientficos, em curso na Europa, desde o sculo XVI. Com o movimento do
Renascimento, faz-se uma ruptura com o passado medieval e assiste-se ao incio de
um irreversvel processo de secularizao da sociedade. Matos explica:
[...] essa tendncia reforada com o racionalismo do sculo XVIII, conhecido na histria como a poca do iluminismo. Toda a ateno se volta para o homem como indivduo, e sua capacidade cognitiva sumamente valorizada. Desenvolve-se um esprito crtico aos tradicionais dogmas da f e s autoridades que os sustentam e defendem. Semelhantes correntes manifestam-se fortemente na Inglaterra, onde verificamos tambm suas primeiras aplicaes prticas (a Revoluo Industrial), mas na Frana que vigoram com maior intensidade e recebem sua expresso filosfica mais elaborada. A nota caracterstica de seu contedo o anseio por liberdade em todos os setores da atividade humana. E isso em detrimento da tradicional submisso religiosa e aceitao dos poderes estabelecidos... Tambm no campo religioso essas idias tm sua ressonncia, dando origem ao desmo (Deus existe, sim, mas se mantm distncia, e no influi efetivamente no cotidiano dos homens e da natureza). Cresce um indiferentismo ou at ceticismo em relao s formas religiosas convencionais e particularmente instituio eclesistica. A maonaria, surgida na Inglaterra em 1717, torna-se um instrumento eficaz na divulgao da mentalidade racionalista (MATOS, 2001, p. 283-284).
Com o objetivo de modernizar o Estado portugus e tir-lo do isolamento em
relao s outras naes europias, o Marqus de Pombal (1750-1777), apoiado
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pela burguesia urbana, revestida de seu novo potencial econmico, empreende uma
Reforma, reduzindo a influncia da aristocracia rural e da hegemonia eclesistica
que, em sua opinio, eram entraves ao progresso do Pas. O Estado, considerado
sacral, deveria ceder lugar a um Estado leigo, moderno e civil. Sob a influncia de
Pombal, a Igreja, em todos os seus nveis, passou a ser mantida sob controle e
dominao do Estado. De acordo com Nery, Pombal objetivava
[...] introduzir a sociedade lusitana e brasileira na modernidade europia, liderada pela Inglaterra. As bandeiras levantadas eram progresso e cincia, trazendo consigo o modelo ideolgico do racionalismo iluminista, a maonaria, as doutrinas galicanas, dos jansenistas 6 e as do liberalismo poltico-religioso. A idade da razo emergia com fora, provocando uma crise na idade da f ou cristandade (NERY, 1993, p. 8).
Pombal considerava que os Jesutas tinham um poderoso domnio sobre os
territrios lusos. O afastamento dos inacianos desse poder significaria, para ele, a
libertao do Estado, com possibilidade de instaurar uma ordem poltica moderna e
plenamente autnoma. Em vista disso, vrios questionamentos foram feitos, at
chegar expulso oficial da Companhia de Jesus dos domnios portugueses, em
1759, sob a alegao de serem os inacianos traidores do Rei e dos seus Estados.
No perodo retratado, a pedagogia catlica manteve sua hegemonia, que foi
pouco impactada, mesmo aps a expulso dos jesutas em 1759 e os conseqentes
reflexos da Reforma Pombalina, no Brasil, consubstanciados na instaurao das
Aulas Rgias7, que introduziram a primeira experincia de instruo pblica
(SAVIANI, 2005).
Por ocasio de sua expulso, esses religiosos mantinham quarenta e trs
misses, localizadas nos pontos mais importantes do Brasil: escolas de ler e
escrever em quase todas as povoaes e aldeias, por onde se espalhavam suas
residncias, alm dos estabelecimentos de ensino secundrio, entre colgios e
6 Movimentos e doutrinas que compem o quadro caracterizado como anti-romantismo universal. Esses movimentos e doutrinas repercutiram na orientao filosfico-religiosa de vrios pases, inclusive, no Brasil. Dentre eles: o Jansenismo, que pretende restaurar a disciplina eclesistica primitiva; o Galicanismo, que desde o sculo XVII havia submetido a Igreja ao Estado, pretende o enfraquecimento dos poderes do papa. A autonomia dos bispos franceses, a nacionalizao da Igreja na Frana, o que concorreu para o fortalecimento do Regalismo (FIGUEIREDO, 1996, p. 21), ou seja, fortalecimento do poder real, em detrimento da autoridade papal, visando assegurar ao monarca as condies de realizar a modernizao econmica do reino. 7 As Aulas Rgias eram aulas avulsas das diversas disciplinas, anteriormente objeto de ensino regular.
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seminrios. Todas essas obras foram entregues aos Franciscanos e Beneditinos
que, tambm, no tinham a simpatia do Governo pombalino, pois eram contrrios s
novidades do movimento iluminista (JUNQUEIRA, 2002a, p.21). Comeava, assim,
uma nova orientao, igualmente catlica, formulada por padres de outras ordens
religiosas, com destaque para os oratorianos8 (SAVIANI, 2005, p. 31).
O historiador Laerte Ramos de Carvalho explicita que
[...] o objetivo da reforma pombalina nos estudos foi o de criar a escola til aos fins do Estado e nesse sentido, ao invs de ela preconizar uma poltica de difuso interna e externa do trabalho escolar, o Marqus de Pombal pretendia organizar uma escola que, antes de servir aos interesses da f, servisse aos imperativos da Coroa (CARVALHO, 1978, p 140).
Sobre a Reforma feita por Pombal, Junqueira (2002a) enfatiza que
[...] a reforma pombalina foi acompanhada pela mudana na filosofia da educao por uma de carter iluminista. A nova concepo foi caracterizada por um cunho nacionalista, reformista e progressista, contudo no repudiou o catolicismo. Na realidade, reimplantou a tradio humanista na rea pedaggica, com a valorizao dos professores leigos, que passaram a ser considerados exemplos para toda a sociedade (JUNQUEIRA, 2002a, p. 21).
O projeto pombalino se constituiu como um processo autoritrio de
aculturao dos ndios, atravs da imposio da lngua portuguesa e da adoo de
costumes lusos. Somente depois da decretao do subsdio literrio9, em 1772,
que as Aulas Rgias, do ponto de vista quantitativo, atingiram a amplitude dos
tempos jesuticos anteriores. Essas aulas s foram implantadas doze anos aps a
expulso dos inacianos e se constituram, reitera-se, como a primeira experincia de
ensino pblico no Pas. Foram criticadas, sobretudo, pelo seu carter fragmentado,
pelo pouco investimento do Estado e pela continuidade do ensino jesutico, em
termos da organizao didtica e curricular (OLIVEIRA, 1993).
No Seminrio Sacerdotal de Olinda (1800), atravs da ao de Dom Jos
Joaquim da Cunha de Azevedo Coutinho, bispo de Olinda, as reformas pombalinas
tiveram uma aplicao mais sintonizada com a realidade brasileira, atravs da
8 A pedagogia oratoriana, sistematizada por Verney, influenciou a reforma do ensino Luso e criou uma nova metodologia para o ensino do Portugus e do Latim que, por ser mais simples e funcional, atendia aos interesses da burguesia. OLIVEIRA, M. Auxiliadora Monteiro. O Ensino da Filosofia no 2 Grau da escola brasileira: um percurso histrico, at a realidade mineira dos anos 80. 1993. p. 34) 9 Subsdio literrio era um imposto sobre a aguardente.
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adoo de uma postura mais crtica diante da realidade da terra e de seu povo. O
proco deveria ser um homem totalmente aberto s novas perspectivas da cultura
moderna, imbudo das idias filosficas, racionalistas e cientficas, orientando o povo
para que pudesse trilhar os novos caminhos do progresso humano.
A proposta educacional de Azevedo Coutinho estava ligada ao
reconhecimento das riquezas naturais do reino, visando a sua futura explorao
econmica. Para tanto, era necessria a formao de filsofos naturalistas - os
cientistas da poca - dispostos a se interiorizarem para que os recursos brasileiros
nos reinos mineral, da flora e da fauna fossem inventariados (ALVES, 2000, p. 68).
Ele se preocupou em dar essa formao para os padres, j que eles deviam estar
onde se encontravam suas ovelhas e deveriam ser possuidores de conhecimentos
sobre o uso das plantas medicinais.
Para levar prtica as aspiraes renovadoras de Azevedo Coutinho, o plano
de estudos do referido colgio-seminrio pernambucano compreendia cinco
matrias, que se sucediam cronologicamente, na ordem seguinte: Gramtica Latina
(visava busca do entendimento, na apreenso da razo das coisas, e lngua
latina, construda sobre a base da lngua nacional), Retrica (utilizava os clssicos
latinos, valorizava as manifestaes literrias da lngua nacional, em especial a
poesia de Cames, incorporava a Histria e a Geografia), Filosofia (estudava
filosofia natural - Fsica experimental, desenvolvida ao lado da Lgica, da Metafsica
e da tica, e, no segundo ano, a Qumica), Geografia (abrangia contedos de
Aritmtica, Trigonometria e lgebra elementar) e Teologia (teortica ou especulativa,
seguida da Teologia prtica ou moral).
A difuso dos princpios iluministas, no Brasil, acirrou a crise do sistema
colonial, nos meados do sculo XVIII, pois despertou um sentimento de
questionamento generalizado entre o povo, do qual alguns padres tornaram-se
porta-vozes, assumindo a bandeira dos direitos humanos e da busca pela
liberdade. Preconizava-se, atravs do clero liberal, uma desvinculao da Igreja dos
interesses polticos da Metrpole, fazendo-se uma crtica radical ao regime colonial.
Nesse perodo, cresceu no Brasil a conscincia de sua submisso aos
interesses e necessidades da Metrpole, despontando a convico de que a
transformao da ordem social e poltica abriria novas perspectivas para a Colnia.
Com esse esprito, assiste-se ocorrncia de diversos movimentos nativistas (a
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Inconfidncia Mineira, de 1789 e a Revoluo Pernambucana, de 1817), nos quais
participaram numerosos representantes do clero e dos religiosos, reforando a idia
de que a Colnia poderia ter um status bem diferente, podendo, inclusive, suplantar
a Metrpole no campo econmico e conquistar sua independncia.
Do ponto de vista cultural e educacional, o Brasil encontrava-se numa posio
de marginalizao. A escola pblica estava completamente abandonada. Entre a
expulso dos Jesutas, em 1759, e a decretao do subsdio literrio, em 1772,
para fomentar as denominadas Aulas Rgias, houve negligncia das autoridades
pblicas com a educao colonial. Somente com a chegada da famlia Real
Portuguesa, em 1808, foi estimulada a organizao de uma estrutura de educao
para a elite. No era de interesse do Governo, ento instaurado, estabelecer um
sistema nacional de ensino, que integrasse seus graus e modalidades e atendesse
s necessidades das classes menos favorecidas.
Algumas escolas superiores foram criadas, sendo regulamentadas as vias de
acesso aos cursos, especialmente por meio do ensino secundrio e dos exames de
ingresso aos estudos de nvel superior. Mas verifica-se que, at s vsperas da
Independncia, o atendimento oficial era feito para resolver as necessidades do
momento, sem qualquer plano diretor.
Com relao ao Ensino Religioso,
[...] continua sendo de carter mais privativo, domstico e de templos. O clero sai fortalecido como funcionrio do governo, mas se enfraquece como hierarquia da Igreja. Acentua-se o fosso entre o catolicismo tradicional popular luso-brasileiro, leigo, medieval, social, familiar e sincrtico e o catolicismo renovado, isto , romano, clerical, tridentino, individual, sacramental e aliado do poder (NERY, 1993, p. 9).
No ano de 1820, eclodiu em Portugal a Revoluo constitucionalista e os
Constituintes exigiram a volta imediata do rei de Portugal, que estava em sua Corte,
no Brasil. Dom Joo VI deixou, no Brasil, seu filho Dom Pedro e partiu para Portugal,
em 25 de abril. Chegando Metrpole, a Corte desejosa de fazer o Brasil voltar a
seu anterior status de colnia, fez com que ele ordenasse a Dom Pedro I ir para
Portugal, mas este reagiu s determinaes, com o famoso Fico, rebelando-se
contra as ordens portuguesas.
A corte lisboeta, imediatamente, tentou substituir o Governo de Dom Pedro,
por outra regncia, presidida pelo arcebispo da Bahia. Esse fato acabou precipitando
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a independncia do Pas, que se concretizou no dia 07 de setembro de 1822. Criou-
se, a partir de ento, a Monarquia Constitucional, que se traduziu na implementao
do Imprio do Brasil (1822-1889). Contudo, o Pas continuava unido a Portugal,
tanto pelos laos com a famlia imperial Bragana, quanto pela herana cultural. A
Igreja Catlica passou a se constituir como a depositria da religio oficial do
Estado.
Nessa poca, como a escravido persistia, a populao negra era muito
grande, iniciou-se, ento, um movimento poltico, com a finalidade de promover o
branqueamento da raa brasileira, atravs da instalao paulatina de colnias de
imigrantes em algumas regies do pas.
Sob o comando do Imperador, prosseguiram as aes que objetivavam
construo de uma nova nao. Em 1824, D. Pedro I outorgou a Primeira
Constituio Poltica do Imprio do Brasil. Essa lei maior recebeu influncia liberal,
mas no se constituiu como democrtica. Garantia direitos civis (de cidadania) aos
brasileiros brancos, mas no aos ndios e escravos, e direitos polticos (de voto),
apenas aos brasileiros que tinham, no mnimo, renda de 100 mil ris anuais,
instituindo o denominado voto censitrio.
Outro aspecto relevante, no texto dessa Constituio Imperial, est centrado
na confirmao e na legitimidade do poder da Igreja. O texto proclamava que Pedro I
era Imperador do Brasil por graa de Deus e unnime aclamao dos povos. No
captulo sobre o Poder Executivo, o Art. 102 estabelecia as seguintes atribuies
para o Imperador:
[...] nomear bispos e prover os benefcios eclesisticos (inciso II) e conceber, ou negar, o beneplcito aos decretos dos conclios e letras apostlicas e quaesquer outras constituies eclesisticas que se no appozerem Constituio; e procedendo approvao da Assemblia, se contiverem disposio geral (Inciso XIV). (BRASIL, 1824, p. 2)
O Artigo 5 afirmava que a religio catlica era a religio oficial do Imprio e o
Art. 103: [...] o Imperador antes de ser acclamado prestar nas mos do Presidente do Senado, reunidas as duas Cmaras, o seguinte Juramento Juro manter a Religio Catholica Apostlica Romana, a integridade, e indivisibilidade do Imprio; observar, e fazer observar a Constituio Poltica da Nao Brasileira, e as Leis do Imprio, e prover ao bem geral do Brasil, quanto em mim couber. (BRASIL, 1824, p. 2)
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O Artigo 141 enfatizava que os Conselheiros de Estado deveriam prestar um
juramento de manter a Religio Catholica Apostlica Romana. O captulo que trata
da inviolabilidade dos Direitos Civis e Polticos dos Cidados Brasileiros (Art. 179)
determinava que ningum pode ser perseguido por motivo de Religio, uma vez
que respeite a do Estado, e no offenda a Moral Pblica (BRASIL, 1824, p. 2).
Essa Constituio, no seu Art. 179, Inciso XXII, embora tenha estabelecido
que a instruo primria gratuita fosse aberta a todos os cidados, no teve, na
prtica, seu cumprimento efetivado. Assim, o chamado ensino primrio, segundo
Junqueira (2002 a), ficou a cargo das provncias que, devido aos seus oramentos
escassos, tiveram grandes dificuldades de implement-lo de forma adequada.
Nos anos de 1826 e 1827, ocorreram debates em torno da educao escolar
popular. Nessa ocasio, o deputado liberal-radical, Janurio Cunha Barbosa,
apresentou um projeto de organizao da educao escolar, composto de escolas
elementares, secundrias e superiores que no foi aprovado. Esse texto foi
reapresentado, mas sofreu tantas emendas que, quando obteve aprovao como lei,
em 15/10/1827, estava reduzido apenas manuteno das aulas avulsas pblicas
de primeiras letras, as j referidas Aulas Rgias, para meninos e meninas. Alm
disso, adotou a estratgia do Ensino Mtuo como a forma de organizao das aulas
de primeiras letras, para as localidades mais populosas (HILSDORF, 2003).
Nessa lei de 15 de outubro de 182710, foi feita a primeira referncia ao Ensino
Religioso, vinculado a uma legislao, relativa organizao da educao escolar,
que determinou tanto a criao de escolas de primeiras letras em todas as cidades,
vilas e lugares mais populosos do Imprio, quanto a regulamentao dos salrios
dos professores. Esse documento normativo visava promulgar o inciso XXXII, do Art.
179 da Constituio Imperial.
Em 1834, foi editado o Ato Adicional que modificou a Constituio de 1824,
estabelecendo que as Provncias assumissem o ensino primrio e secundrio, e o
poder central se encarregasse, apenas, do ensino superior ou acadmico, referente
10 Art 6. A lei determina que em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos haver escolas de primeiras letras que forem necessrias. O nmero delas e sua situao sero indicados pelos presidentes em conselho, obtidas as cmaras municipais respectivas. Nela os professores ensinaro a ler, escrever, as quatro operaes de arithmtica, prtica de quebrados [...] e os princpios de moral crist e da doutrina da religio catholica e apostlica romana, proporcionados compreenso dos meninos; preferindo para as leituras e Constituio do Imprio e a histria do Brasil [...] (HISTRIA da Educao no Brasil, 1827, p. 2).
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aos ministrados nas Faculdades Mdicas e Jurdicas. O ensino primrio no era
pr-requisito na seqncia da escolarizao hierrquica das matrias e das sries;
nfase era dada s matrias de humanidades (JUNQUEIRA, 2002a, p. 22).
Quanto ao ensino superior, pode-se afirmar que se reduzia a um nmero
escasso de escolas isoladas, destinadas formao de profissionais liberais,
sobretudo no mbito do Direito, e constata-se que no havia uma organizao
adequada de um sistema de ensino (PILETTI, 1996).
Durante o Imprio, o Brasil obteve sua independncia poltica. Mas no se
tornou uma nao livre do ponto de vista econmico porque, por um lado, ficou sob
o domnio do imperialismo ingls e, por outro, passou a depender da Frana. Nessa
poca, os princpios de liberdade e de igualdade eram proclamados, mas
mantinham-se a escravido e a excluso social de amplos setores do povo.
Problemas como a impopularidade do Imperador, a oposio ao seu governo,
o aumento da dvida do Pas junto a bancos ingleses, os acontecimentos polticos
internos de Portugal, decorrentes da sucesso de Dom Joo VI, que morreu em
1826, tornaram impraticvel a permanncia de Dom Pedro I, no Brasil. Por isso, ele
abdica, em 7 de abril de 1831, em favor de seu filho Dom Pedro II e retorna a
Portugal.
Aps a partida do Imperador, instituda uma Regncia (1831-1840), pelo
fato de o nico herdeiro ao trono, Pedro de Alcntara, ser menor de idade. Nesse
momento, o comando poltico da nao passou para os liberais.
A Igreja, ento, continuava exercendo influncia sobre o Estado, ancorada em
um movimento que pode ser chamado de regalista, nacionalista e liberal. Entre os
anos de 1826 e 1842, segmentos significativos da Igreja Catlica Nacional
desligaram-se da autoridade papal, ou ficaram formalmente unidos S Romana. O
Papa era reconhecido como chefe honorfico da Igreja Catlica de todos os pases,
mas sem possuir uma efetiva autoridade na Igreja nacional. O Imperador tinha
amplos poderes sobre a Igreja, considerada como nacional. Assim, a Igreja passou
a ser submissa ao Estado e, aos olhos do governo, ela constitua-se como uma
Igreja brasileira, mais ligada ao Estado do que Santa S.
O movimento reformista, liderado pelo clero liberal, especialmente pelos
Padres Diogo Antnio Feij e Padre Manuel Joaquim do Amaral Gurgel, pretendia
fazer uma ampla reforma na Igreja Catlica no Brasil. Pensava-se que a moralizao
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e a elevao cultural dos padres eram a condio primeira para a Igreja se renovar.
Nessa perspectiva, a Igreja poderia ajustar seus quadros institucionais e tornar-se
um importante sustentculo para a moral pblica. Essa reforma tinha, como base, os
princpios regalistas, que deveriam ser levados a efeito pelo prprio poder civil, uma
vez que a religio oficial dependia do Estado.
Segundo Matos (2002), outro movimento deve ser destacado nessa poca.
Trata-se do ultramontano, movimento conservador que atuou at meados do sculo
XIX, defendendo maior aproximao com Roma e maior sintonizao com as
diretrizes do Conclio de Trento (1545-1563) e, posteriormente, com as do Conclio
Vaticano I (1869-1870). Seus integrantes propugnavam uma Igreja mais
centralizadora, com ntidas preocupaes doutrinrias e disciplinares. Exemplos
desse posicionamento se traduziram na Encclica Quanta Cura (1864),
acompanhada do catlogo que continha oitenta condenaes ao mundo moderno, a
declarao da Infalibilidade Papal, expressa no Conclio Vaticano I, e a concepo
tridentina de sociedade perfeita, pela qual j no se aceitava uma subservincia da
Igreja ao Estado. Para os adeptos e defensores dessas tendncias romanizadoras, o
centro de toda a vida da Igreja estava na pessoa do Papa, representante direto de
Deus na terra. Defendiam o princpio de que a unio Igreja-Estado no podia resultar
em um enfraquecimento do poder espiritual. Assim, era necessrio existir harmonia
entre Trono e Altar, no devendo ocorrer invaso indbita do poder civil em reas
especificamente eclesisticas.
Na sociedade civil brasileira de meados do sculo XIX percebia-se,
igualmente, um movimento centralizador em torno da figura de Dom Pedro II. As
idias abolicionistas, burguesas, liberais e republicanas cresceram no segundo
Imprio, sobretudo aps a Guerra do Paraguai (1865-1870), pois os militares,
estimulados pelas vitrias obtidas, exigiam uma maior participao na vida poltica.
No cenrio mais amplo, assiste-se, no perodo do Segundo Reinado, a uma
nova fase evolutiva do capitalismo industrial, que apregoava a necessidade de
expanso do mercado consumidor, das idias liberais da Revoluo Francesa e das
idias humanitrias. No Brasil, essas mudanas provocaram o questionamento a
respeito do trabalho servil, como um regime social e economicamente desvantajoso,
que impedia o avano da modernizao da sociedade.
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O processo de industrializao, instalado de forma precria e sob a tutela da
Inglaterra, o avano da urbanizao e as mudanas conjunturais no capitalismo
foram fatores que provocaram, gradualmente, o enfraquecimento do regime
escravocrata no Brasil. Mesmo assim, os setores conservadores, ligados aos
latifundirios, resistiram abolio, enquanto o governo Imperial procurava uma
soluo definitiva para o problema. A libertao dos escravos s foi concretizada em
1888, depois de muita luta interna, que contou com o apoio incisivo da Inglaterra,
segundo a qual o trfego no mais se constitua como atividade rentvel.
monarquia, a partir de ento, foram feitas crticas acirradas, sobretudo dos
setores dominantes da agricultura nacional. O Imprio no conseguiu solucionar os
graves problemas de ordem scio-econmica. Aumentaram as queixas quanto ao
carter centralizador da monarquia e questionava-se, tambm, a posio do Imprio
com sua religio obrigatria.
Nessa poca, a idia de progresso dominava o esprito da elite brasileira e o
setor econmico interno. Os ideais republicanos, a influncia do positivismo, do
iluminismo, do liberalismo e do cientificismo no processo de modernizao da cultura
brasileira serviram, segundo Severino, de:
[...] suporte poltico para todo um programa de reformas sociais: abolio dos privilgios aristocrticos, separao da Igreja do Estado, instituio do casamento e registro civil, secularizao dos cemitrios, abolio da escravatura, libertao da mulher atravs da instruo para que desempenhasse seu papel de esposa e de me, e a crena na educao enquanto chave dos problemas fundamentais do pas (SEVERINO, 1986, p.66).
Nesse contexto, o Episcopado viu seus poderes temporais serem diminudos.
Simultaneamente, cresceu a idia da necessidade de uma Igreja independente do
Estado, sobretudo em conseqncia das reformas decorrentes do Conclio Vaticano
I que promoveram a romanizao do clero brasileiro.
Pode-se constatar que, ao longo das fases colonial e imperial, o Regime do
Padroado e do Regalismo foram mantidos, conferindo religio catlica tanto os
privilgios junto Coroa, quanto o monoplio do ensino. Nesse contexto, a
concepo de educao priorizada ancorava-se no iderio humanista-catlico.
Assim, no mbito escolar eram ministradas aulas de religio, visando
evangelizao, na perspectiva da cristandade, e a seleo de contedos, a serem
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ministrados, foi orientada por uma fiel ortodoxia.
Analisando o contexto poltico-educacional, Severino explica que:
[...] no processo ideolgico da poltica educacional desenvolvida pelo Estado brasileiro, caracterstica a utilizao do iderio catlico como concepo de mundo, exercendo a funo ideolgica para a sustentao e a reproduo desse modelo de sociedade. A cosmoviso catlica serviu de ideologia adequada para a promoo e a defesa dos interesses da classe dominante ao mesmo tempo em que fundamentava a legitimao, junto s classes dominadas, dessa situao econmico-social, objetivamente marcada pela explorao e dominao da maioria por uma minoria (SEVERINO, 1986, p. 70).
No cenrio da poca, o desenvolvimento do sistema educacional, do pas, foi
sendo desenhado de forma precria, devido carncia de uma poltica educacional
e econmica brasileira, servindo, ao contrrio, de reforo para a reproduo da
ideologia dominante e das condies econmico-sociais existentes. A maioria da
populao vivia marginalizada e excluda do acesso educao formal.
Objetivando minimizar essa situao na rea educacional, foi veiculada uma
legislao que permitia a qualquer cidado o direito de abrir escolas. Essa medida
obteve resultados, pois foi empregado o denominado Mtodo de Ensino Mtuo,
concebido por Lancaster, bastante u