O Espirito Marcial -...

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O ESPÍRITO MARCIAL Uma Introdução à Origem, Filosofia e Psicologia do Kung Fu Marco Natali

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O ESPÍRITO MARCIAL

Uma Introdução à Origem, Filosofia e Psicologia do Kung Fu

Marco Natali

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Índice

Mensagem ......................... 3 Agradecimento .................... 4 Introdução ....................... 5

A História do Kung Fu ............ 7 Os Precursores ................... 14 O Templo Shaolin ................. 19 Evolução do Shaolin .............. 27 As Sociedades Secretas ........... 38 Apólogos do Kung Fu .............. 48 As Normas Budistas ............... 54 Repartindo o que Sei ............. 83 Uma Filosofia Pessoal ............ 84 A Fraternidade Kung Fu ........... 97

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Mensagem Existem pessoas que ao passarem por este mundo faz em de seus ideais a tarefa de levar amor e sensibilida de aos corações que delas se aproximam. Da mesma forma que o jardineiro não consegue tirar das mãos o perfume das flores que colhe, tais pessoas m antêm no semblante a irradiação do amor que exprimem. Que tuas pegadas sobre a Terra sejam marcos precio sos, atestando que por estes caminhos passa um ser human o que se lembra do exemplo do Nazareno e sabe, como ele, num ato de respeito à divindade interior, doar-se com amor em prol de um ideal construtivo e gratificante, que contribui par a fazer de nosso pequenino planeta um mundo melhor.

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Dedicatória: Aos verdadeiros Artistas Marciais, que não se preo cupam em julgar nem em difamar os praticantes de estilos diferentes dos seus. Aos verdadeiros Mestres de Kung Fu que se preocupa m em transmitir valores éticos e morais a seus discíp ulos e não apenas as técnicas físicas.

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Introdução Este livro aborda uma introdução à origem do Espír ito Marcial e, como tal, busca, nas origens do Kung Fu, a primeira e a mais abrangente das Artes Marciais, o lado espiri tual. São citados nos capítulos iniciais fatos sobre a o rigem dos Shaolin somente divulgados no Brasil através da Fra ternidade Kung Fu. Portanto este livro está apresentando ao público conhecimentos que eram mantidos secretos, nessa Fraternidade, até esta data. Os Shaolin são os legítimos pais do Kung Fu modern o e por analogia, das demais artes marciais do Oriente, sejam elas chinesas, japonesas ou coreanas. Mesmo quando há dúvidas na ascendência chinesa das demais artes marciais, essa dúvida limita-se à esfe ra das realizações físicas, pois a nível filosófico e espi ritual, a presença do Zen nas artes japonesas e do Sun nas artes corea nas atesta, sem sombra de dúvida, ao menos a origem filosófica dessas artes. Quanto ao lado psicológico das Artes Marciais, o p úblico brasileiro tem a rara oportunidade de conviver nest as páginas com as Dez Normas Budistas adotadas no Templo Shaol in, comentadas e adaptadas aos tempos modernos. Para enriquecer ainda mais esse cabedal de conhecimentos que corria o risco de ser esquecido p elo tempo, incluí sempre que pude um apólogo que, atendendo ao dito chinês "Um quadro vale mais que mil palavras", tent a ilustrar da melhor forma possível o ponto abordado em cada uma das normas. Quanto à Filosofia da Arte Marcial, só pude oferec er minhas conclusões pessoais, resultantes de minha vi vência na busca de respostas ao sentido da vida. O que não me arvora em mestre de ninguém e sim me inclui na categoria daqu eles que buscam o que é parte das coisas que dependem de mim . Mais uma vez reitero que os objetivos continuam os mesmos: informar ao leitor brasileiro, dentro de mi nhas limitações, a respeito do fascinante mundo das Arte s Marciais, agora abordadas em seu lado psicológico e filosófic o.

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O Espírito Marcial no que tange a mim, é o comport amento estóico diante das críticas do mundo; a aceitação d as coisas que dependem de mim e das que não dependem e a disc iplina na aplicação das ações que dependem de mim, na tent ativa de transformar este pequenino planeta num mundo melhor . Tudo o mais não me pertence, nem minha reputação, nem minha imagem, sequer os livros que escrevi. E a vida assim é uma vida simples. Por você e pelo Kung Fu.

Caixa Postal 442 - Centro 18010-971 - Sorocaba – SP

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A História do Kung Fu

A palavra "Kung Fu" pode ser traduzida como "Maestria" , "Habilidade e eficiência" e "Domínio alcançado com o tempo" .

Os autores mais respeitados a traduzem por "Tempo de Habilidade" e usam-na para designar as pessoas que tenham se de dicado por um longo tempo ao domínio técnico de uma disciplina at é ao ponto em que possam expressá-la com o máximo de habilidade.

No Oriente a palavra Kung Fu nunca é utilizada para designar a arte marcial; dá-se preferência ao uso de dois outros te rmos, a saber:

Wu Shu - (Wu = Guerra e Shu = Arte). Kuo Shu - (Kuo = Nacional e Shu = Arte).

O termo Wu Shu possui uma conotação superior àquela que é

atribuída a Kuo Shu . As palavras Wu Shu servem para designar todas as ar tes guerreiras,

militares ou marciais. Em 1928 o governo chinês adotou universalmente a ex pressão Kuo

Shu para designar as artes marciais de origem chine sa, dessa forma distinguindo-as de suas sucedâneas coreanas e japon esas.

Enquanto a expressão Wu Shu é usada genericamente, englobando todas as artes marciais conhecidas, a expresão Kuo Shu é usada para designar apenas as artes marciais de origem comprov adamente chinesas.

Devido à imensa riqueza do idioma chinês é possível o uso de outros termos para se expressar a arte marcial.

É muito comum a designação "Ch’Uan Shu" para significar um determinado conhecimento marcial ou mesmo um estilo .

O termo Ch’Uan designa a arte do uso dos punhos ou mesmo o boxe chinês - que é o nome usado para designar o Kung Fu em todo o Oriente.

O próprio Bruce Lee usou o ideograma Ch'Uan no fron tispício de sua obra "Chinese Gung Fu, the Philosophical Art Of Self Def ense" .

A palavra Kung Fu (ou Gung Fu em dialeto cantonês) é usada aqui no Ocidente para nomear todas as artes marciais de origem chinesa.

O povo chinês sempre foi possuidor de um grande esp írito

guerreiro, que fez de seu país, em épocas passadas (Dinastia Shang - 1.766 a 1.122 a.C), o país mais poderoso da Terra.

Segundo os historiadores, esse poderio militar se d esenvolveu graças às invasões estrangeiras e às revoluções ent re os senhores feudais e os imperadores chineses.

Naquela época, a imensidão do território chinês era disputada pelos cobiçosos monarcas bárbaros que habitavam as terras vizinhas.

Como levavam semanas e até meses para deslocar as t ropas imperiais para defender as longínquas fronteiras, a família imperial usou o recurso desesperado de delegar poderes aos nobres d a corte.

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Esses nobres, que passaram a ser conhecidos como se nhores

feudais, receberam imensas porções de terras, semel hantes aos condados outorgados à nobreza na Inglaterra medieval.

Dessa forma passaram a receber grande parte das riq uezas produzidas por seus vassalos e metade das colheitas e das extrações minerais, mas eram obrigados a defender suas terras e a vida de seus súditos com seus próprios recursos.

Os senhores feudais se viam obrigados a sustentar i mensos exércitos, que em tempos de paz se dedicavam intens amente às técnicas marciais.

Por volta dos séculos II e III, aconteceram grandes batalhas internas entre os senhores feudais que desejavam ampliar seu s domínios.

Essa época, denominada "Época dos Reinos Combatente s", fez com que milhares de homens se enfrentassem, e as crônic as da época relatam formidáveis batalhas que terminavam com a morte de 70, 80, e até 400 mil homens. Os vencedores não admitiam sobreviventes e aqueles que não pereciam no ardor da batalha eram sumariamente deca pitados.

Antes do advento do Comunismo a China era flagelada pela opressão da classe dominante sobre o povo.

Depoimentos de correspondentes e missionários ocide ntais atestam que antes da Segunda Guerra Mundial a fome imperava entre o povo e era comum a presença de cadáveres flutuando por entre a imensa quantidade de juncos chineses.

O povo com fome não tinha sequer um lugar onde mora r e muitas famílias eram julgadas abençoadas por possuir um ba rco onde viviam amontoadas como ratos.

Houve época em que a vida humana não tinha mais val or e que se matava por um prato de comida. Esse quadro de horrores fazia com que o povo também se interessasse pelo aprendizado de técnicas marciais que fossem út eis para a defesa de si mesmos e de suas famílias.

Para se ter uma vaga ideia do poderio da família im perial sobre a grande massa do povo, basta mencionar que, em deter minada época, com exceção da família do imperador, o povo era obrigad o a se vestir sempre de preto.

Preservando a memória deste tempo de opressões os p raticantes de Kung Fu do mundo todo ainda usam uniforme preto, id entificando-se com o povo chinês.

Durante bom tempo uma das maneiras mais fáceis de i dentificar o falso praticante ocidental de Kung Fu era pela cor de seu uniforme de treino.

Normalmente os treinamentos do Kung Fu são efetuado s de calça e camiseta e o uniforme cerimonial é preservado para ocasiões especiais ou para os mestres.

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Quando o uniforme cerimonial (denominado IFU) possui botões, mangas ou golas de cor branca, indica que o mestre ou o pai do praticante é falecido.

O branco é o sinal de luto na cultura chinesa e usa r uniforme branco ou com partes brancas estando o mestre ainda vivo é sinal de grande ignorância e temeridade do praticante.

Outra coisa a se notar é que, no mundo inteiro, o K ung Fu não usa faixa como sistema de graduação.

O máximo que se admite é o uso de uma faixa de cor única (geralmente vermelha), que será usada por todos os participantes, independente de seu estágio ou grande domínio técni co.

Não tendo faixa e sequer qualquer outro sistema de graduação, o praticante de Kung Fu é avaliado em primeiro lugar por suas realizações em prol da preservação e divulgação de seu estilo, e em segundo lugar pelo número de anos que se dedica à prática do Kung Fu e pelas distinções que tenha obtido em campeonatos e aprese ntações públicas.

A China, mais que qualquer outro país do mundo, sit ua-se numa

posição geográfica de isolamento total. Isolada ao norte pelas amplidões dos desertos da Ma nchúria e da

Mongólia, e para além deles a imensidão gelada da S ibéria, a nordeste pelo Himalaia que vai até o sul e sudeste e a leste pelo oceano Pacífico, os chineses foram forçados a desenvolver sua própria c ultura, sem influências do mundo exterior.

À semelhança de outros povos da antiguidade, os chi neses possuíam um modo de vida relacionado com a natureza e com a vida agrícola.

Quem constata o comportamento mesquinho de certos “ mestres” chineses que ensinam Kung Fu no Ocidente e que adot am a fofoca e o vilipendio como reação habitual aos outros mestres, não consegue entender como pessoas tão ignorantes e primitivas p odem ter antepassados tão ilustres.

Os antigos chineses souberam, como nenhum outro pov o, deduzir dos fenômenos da natureza certas leis e princípios que passaram a fazer parte de uma filosofia de vida e de uma sabedoria e xcepcionais.

Através da observação dos animais criaram exercício s especiais para fortalecimento e agilização do corpo.

Embora na antiguidade (por volta de 4.000 anos ante s de Cristo) esses exercícios fossem usados com o objetivo de pr eservar a saúde, com o correr do tempo foram transformados em estilos de luta e em escolas internas e externas. As internas dedicam-se aos est ilos suaves e as externas aos estilos duros.

Em recordação a essas origens muitos estilos modern os ainda mantêm, em seus nomes, referências aos movimentos d os animais de onde se originaram.

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Por exemplo: "Tong Long" (Louva-a-Deus), "Fei Hok Pay" ou "Bay Hok Pay" (Garça Branca), "Fan Tzi" (Águia), "Fu Jow Pay" (Tigre), etc.

Das séries animais mais conhecidas na antiguidade, destaca-se em importância a "Wu Chin Si" atribuída ao grande médico e anestesista "Hua To" , e que incluía o veado, o macaco, a águia, o urso e o tigre.

É imensa a quantidade de estilos existentes no Kung Fu. Estima-se que só na cidade de Hong Kong existam cerca de 360 estilos.

Essa grande variedade de estilos se deve à imensa p opulação da China (é o país mais populoso do mundo) e à grande antiguidade do Kung Fu (situado historicamente pela primeira vez no ano 2674 antes de Cristo).

Os primeiros estilos foram criados pelos clãs (famí lias) e mantidos como segredo através das gerações.

Era muito comum que, ao herdar um determinado estil o um membro dessa família acrescentasse alguns movimentos por s ua própria conta, e o estilo original sofria diversas alterações de geraç ão para geração.

Com o passar do tempo o mesmo estilo se desmembrava em vários

estilos menores, que por sua vez iriam se dividir e m outros e assim por diante.

As diferentes escolas de Kung Fu recebem na China u ma divisão empírica, que as denomina como Escolas do Norte e E scolas do Sul. Essa denominação surgiu devido ao fator geográfico que influenciou no desenvolvimento dos estilos básicos.

Graças à grande extensão do continente chinês, suas regiões do norte e do sul caracterizavam-se por marcantes dife renças no que tange ao solo e aos acidentes geográficos.

Daí surgir o conceito "Na Kuen Pat Tui" , que em chinês significa: ”Punhos no Sul, pernas no Norte."

Os povos do norte habitavam as montanhas, e, portan to, tinham pernas fortes e se especializaram no desenvolviment o de estilos que fossem favoráveis ao uso dessa predisposição natura l.

Os povos do sul habitavam os pântanos, nas várzeas onde semeavam o arroz e nas barcas atracadas às margens dos rios.

Por força dessas circunstâncias precisavam manter o equilíbrio de forma precária e se tornaram exímios cultores dos e stilos em que predominava o uso dos braços.

Além da influência geográfica que acabamos de exami nar, o Kung Fu se desenvolveu sob as características das religi ões e filosofias mais marcantes de sua cultura.

No início da Era Cristã as escolas budistas originá rias da Índia tiveram grande ascensão dentro da civilização chine sa, passando a ter certa influência política.

Os líderes do Budismo chinês eram agraciados pelo i mperador com cargos públicos.

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Esses fatos perturbaram muito os praticantes da fil osofia taoísta, criada por Lao Tsu, que se viram na contingência de transformar sua filosofia em religião em busca do prestígio que tin ham perdido. Essa transformação do Taoísmo em religião foi tão r adical que, para concorrer com as divindades budistas, foram institu ídos os "Imortais" , que eram semideuses taoístas. Desses imortais, os mais famosos foram os "Oito Imortais Bêbados" , que deram origem ao estilo "Chui Pa Hsien" , mais conhecido como "Estilo dos Bêbados" . Para diferenciar as escolas de Kung Fu de origem t aoísta das de origem budista, foram criados os termos "Nei Chia" (escola interna) e "Wai Chia" (escola externa).

As escolas taoístas (internas) caracterizam-se pelo s movimentos lentos, pela respiração profunda e pelo estudo das energias internas - exemplo: o “T’AI CHI CHUAN” .

As escolas budistas (externas) caracterizam-se pelo s movimentos rápidos e agressivos e pela busca de praticidade em situações de luta - exemplo: o “SHAOLIN” .

Na época da dinastia Chou, os homens estavam cansad os das guerras e revoluções que esfacelavam o império chin ês.

Muitos desses homens foram para os bosques e montan has buscando refúgio na vida solitária e na convivência com a natureza.

Esses ermitãos professavam a filosofia do "Tao" (caminho), daí serem conhecidos como taoístas.

Esse conceito denominado “Tao" não pertence aos taoístas, tendo surgido no alvorecer da civilização chinesa e sendo atribuído ao filósofo Fu Hi.

O conceito original foi ampliado através dos ensina mentos de Lao Tsu (também conhecido por Lao Tse, Lao Zi ou Li Ehr , segundo diferentes dialetos).

As escolas taoístas passaram no decorrer da históri a por três etapas sucessivas e independentes: A fase filosófica (Tao Kia), a fase mágica-alquimista (Tao Kiao) e a fase religiosa (Ching Kia ).

A respeito de fase religiosa, já explicamos anterio rmente que ela surgiu como consequência da influência budista sobr e a cultura chinesa.

A fase mágica-alquimista foi a mais pobre e a mais extensa das fases do taoísmo, fundamentando seus dogmas na cren ça da possibilidade de imortalidade e na fábula da existência de uma er va que a concretizaria.

A erva da imortalidade (Ling Chi Tsao) e a busca do s gênios imortais (Hsien) foram a preocupação maior e a razão máxima que motivou grande parte dos filósofos taoístas nessa fase.

Quanto à fase filosófica, sua base apóia-se na obra “Tao Te Ching” , de Lao Tsu (604-517 a.C).

Nessa obra de grande profundidade e de difícil inte rpretação, o fráter tem a oportunidade de encontrar uma das mais sensív eis contribuições do pensamento chinês.

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Já foi traduzida para o português e existem pelo me nos 12 traduções diferentes ao alcance do público brasileiro nas boa s livrarias. Lamentavelmente muito se perde nessas traduções e embora tenhamos comparado três das melhores versões para p odermos aconselhar sua aquisição ao leitor, nenhuma delas n os satisfez o suficiente.

Essa obra contém muitos ensinamentos que incentivam a meditação, a busca interior e as técnicas respirató rias (mais tarde adotadas no T’Ai Chi Chuan").

Exemplo de citação: "O sábio fecha a boca e os olhos, anula os sentidos e se torna

impenetrável ao mundo exterior, abrindo-lhe apenas o coração."

É lamentável que a maioria dos professores de “T’Ai Chi Chuan" não se interessem em (ou não saibam como) transmitir os conhecimentos da filosofia taoísta a seus alunos.

Ao invés disso, preocupam-se mais com os conceitos taoístas (da fase mágica-alquimista) sobre os métodos de respira ção e mentalização com objetivos de alcançar longevidade.

Um dos conceitos mais populares entre os taoístas d a antiguidade, dizia respeito ao retorno ao "Tao" após a morte.

A morte para eles era uma forma de libertação onde iriam colher os frutos da experiência que acumulavam durante a vida terrena.

Para se acumular o maior número possível de experiê ncias, fazia-se necessário ter uma vida o mais longa possível, por isso cuidavam muito de assuntos relacionados com alimentação, exercícios, higiene, equilíbrio energético do corpo e Medicina.

Incentivavam a fluência da energia do Tao (Chi), at ravés de massagens Tui Ah (ou Do-in), exercícios respiratóri os Chi Kung e da exposição do corpo à luz solar e lunar.

Essa busca da imortalidade contribuiu para o surgim ento dos primeiros conceitos sobre Acupuntura (medicina chin esa com agulhas), no tempo do imperador Huang Ti.

Por volta do ano 120 a.C., surgiu a obra "Huai Nan Tsu" , onde são citadas as técnicas para se obter a vida eterna.

Tais técnicas se baseavam em métodos respiratórios e em ginásticas especiais, em muito semelhantes aos estilos antigos de "T'Ai Chi Chuan" e "Pa Kua".

Inúmeras lendas relatam a história de Chao Tao Ling (34-156 d.C) que teria sido um grande mago alquimista, especiali zado na fabricação de talismãs, tendo criado uma sociedade secreta onde e nsinava Alquimia e a fórmula para a vida eterna. Segundo se conta, teria ascendido aos céus sobre as costas de um tigre em plena luz do dia, le vando consigo a sua esposa e dois dos discípulos mais fiéis.

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Dentre os termos chineses a expressão "Chi" é utili zada para designar a energia do Tao, que se manifesta nas múl tiplas formas do Universo, e que é a responsável pela manifestação d a vida nas diferentes espécies existentes sobre a Terra.

Trata-se de uma energia interna, misteriosa, de nat ureza psicofisiológica, responsável pela manutenção da vi da de todos os seres.

Segundo as teorias da Acupuntura e do Do-ln (temas que serão estudados posteriormente), a doença se manifesta qu ando a energia "Chi" se encontra bloqueada em um dos meridianos (Ching) do corpo.

A ação terapêutica do Do-ln e da Acupuntura consist e em pressionar com os dedos ou puncionar com agulhas esses meridia nos, fazendo com que essa energia volte a fluir novamente.

Segundo os métodos "Noi Kung" e "Chi Kung" das esco las taoístas, o praticante de Kung Fu aprende a centralizar o "Ch i" no "Tai Tien" (Tanden em japonês), um ponto localizado a alguns c entímetros abaixo do umbigo.

Conta-se que alguns praticantes mais experimentados eram capazes de arremessar essa energia a tal ponto que podiam d errubar um adversário a vários metros de distância.

Uma das técnicas mais famosas que emprega o uso des sa energia é a “Tie Sa Chang” , mais conhecida como "Palma de Ferro" .

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Os Precursores

No início da Era Cristã (141 a 203 d.C.) viveu na C hina um grande médico que ficou conhecido como O Pai da Educação Física .

Esse médico, cujo nome era Hua-To, nasceu no Distri to de Po, na Província de Anewei e se tornou muito famoso por se r o primeiro médico cirurgião a usar analgésicos ao realizar suas opera ções.

Mas para os praticantes de Kung Fu, ele merece ser lembrado pela criação de uma série de exercícios que, imitando o comportamento de cinco animais, teria fundamentado a origem de algun s dos estilos de Kung Fu que seriam matrizes dos estilos existentes em no ssos dias.

A famosa série dos cinco animais de Hua-To tinha po r objetivo agir como um preventivo contra as enfermidades e constit uir-se em um método de exercício cotidiano.

Essas séries de movimentos passaram a ser conhecida s sob o nome "Wu-Chi-Si" e, para motivar melhor seus praticantes, acabou po r se tomar um dos primeiros estilos de luta interna.

Segundo registros históricos dessa época, o método de Hua-To consistia em exercícios físicos onde se dava grande importância às práticas respiratórias e que poderiam ter utilidade como defesa pessoal.

A história registrou também que dois de seus discíp ulos (Wu-Pu e Fae-Ya) viveram mais de 90 anos, sem perder um só d ente e mantendo a vista e os ouvidos tão aguçados quanto na juventude . Hua-To praticava regularmente esses exercícios e in sistia em divulgá-los ao povo.

Esses exercícios consistiam num Tchia Dsu (também c hamado Kuen), semelhante aos Tchia Dsu de alguns estilos d e Kung Fu dotados de movimentos amplos ainda existentes em nossos dias. Tchia Dsu são os movimentos formais de cada estilo. Em japonês chama -se Kata.

Esse tipo de movimentação era denominado "Chung Chuan" ou "Cheong Kuen" .

Os movimentos eram suaves, flexíveis e amplos, ao p asso que a respiração era relaxada e natural: o inverso dos es tilos externos onde a respiração era forçada pelos músculos abdominais.

Esses exercícios também tinham a intenção de maneja r a manifestação energética da natureza denominada YING e YANG, servindo de base, portanto, para o surgimento dos estilos in ternos que vieram posteriormente a essa época (T'Ai Chi Chuan, Pa Kua e Hsing I).

Dentro do folclore do Kung Fu, existe um personagem marcante

cujas lendas ainda são narradas pelos mestres de Ku ng Fu no mundo todo.

Esse personagem era conhecido pelo nome de Kwang Ku ng e as histórias sobre ele são contadas em uma obra clássi ca da literatura chinesa denominada "Os Três Reinos" , onde ele é descrito como um

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homem de alta estatura e possuidor de grande força e coragem, o que o tornava um guerreiro temido e respeitado.

Kwang Kung era o soberano de uma vasta região da Ch ina e era muito habilidoso nas artes estratégicas e no Kung F u.

Nesta obra existe uma passagem a respeito de uma oc asião em que Hua-To fez uma operação no braço de Kwang Kung.

Hua-To foi o criador do primeiro medicamento anesté sico conhecido homem. Esse remédio, denominado Ma-Fei-San, permiti a a realização operações mantendo o paciente sob anestesia geral.

Segundo contam os relatos da época, Kwang Kung teri a sido ferido uma flecha e ao tentar retirá-la quebrou-a dentro d o braço.

Hua-To foi chamado para extrair a ponta da flecha e ofereceu a aplicação de seu famoso analgésico para que não hou vesse dor durante a cirurgia, mas Kwang Kung o recusou e preferiu se di strair durante a operação jogando um espécie de xadrez chinês.

Hua-To abriu o braço de Kwang Kung, extraiu-lhe a p onta da flecha, limpou a ferida e costurou as carnes no lugar sem q ue este pronunciasse uma palavra de dor!

Um dos inimigos de Kwang Kung chamado Chou-Chou e q ue

também era soberano de um dos reinos em que a China estava dividida nesse período, ficou espantado com o restabelecimen to rápido de seu inimigo e com a rapidez com que retornou aos campos de batalha.

Algum tempo depois Chou-Chou foi acometido de viole nta dor de cabeça e chamou Hua-To para que a curasse.

Depois de diagnosticar a origem dessa dor Hua-To in formou que seria necessária uma operação e que teria de abrir- lhe a cabeça.

Chou-Chou achou que o médico tinha tramado algum mé todo para assassiná-lo e mandou executar Hua-To.

Tempos depois o próprio Chou-Chou morreria em uma c rise fortíssima de dores de cabeça - provavelmetne de al gum tipo de tumor cerebral.

Go-Ko-Hung (mestre que retém a simplicidade) viveu na China por volta de 254 a 334 d.C, tendo escrito uma obra cham ada "Nuy-Pi-En" (Textos Interiores), que tratava de fórmulas da Alq uimia sobre a transmutação dos metais e fórmulas mágicas sobre o prolongamento da vida.

Entre os métodos de longevidade citados em sua obra incluíam-se os exercícios com práticas respiratórias e mentaliz ações energéticas que seriam adotadas pelas escolas de Kung Fu internas.

Li-Chih-Min transformou o Taoísmo em religião imper ial por volta do ano 300 a 600 d.C.

Essa fase religiosa do Taoísmo surgiu, como já diss emos antes, como uma reação às influências do Budismo.

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Constituíram-se ordens monásticas, com extensa litu rgia, com cânones dogmáticos e grande quantidade de templos e uma série de divindades.

Em sua origem tanto o Budismo como o Taoísmo eram a penas filosofias sem pretensões religiosas.

No entanto, as ramificações que ocorreram após a mo rte de Buda criaram duas escolas principais - a Mahayana (Grande Veículo) e a Hinayana (Pequeno Veículo), das quais, a primeira passou a divinizar a figura de Buda e a admitir conjeturas sobre a vida após a morte e outros conceitos sobre a existência de deuses e da reencar nação.

O sucesso da seita Mahayana trouxe aos monges budis tas um vasto poderio político que provocou um certo ciúme por pa rte das autoridades taoístas que, por suas origens chinesas (o Budismo veio da Índia), exigiam igual número de regalias.

Para ascenderem ao mesmo plano de influência políti ca e social do Budismo, os patriarcas do Taoísmo decidiram transfo rmá-lo em religião e idealizaram uma série de divindades, chegando ao po nto de alegar que o Buda era apenas uma encarnação de Lao-Tse (o criado r do Taoísmo).

Dentre a plêiade de divindades taoístas criadas par a satisfazer a curiosidade popular, as que se tomaram mais famosas foram os "Pa Hsien" ou "Oito Imortais" , que dariam origem a um estilo denominado "Chui-Pa-Hsien" - o estilo dos oito imortais bêbado s.

Historicamente falando a origem desse Tchia Dsu (qu e estudaremos mais tarde), nada tem a ver com a religião taoísta originada no tempo de Li-Chih-Min.

A origem do estilo dos oito imortais bêbados situa- se em um Tchia Dsu da escola Ti Tang, método da China do norte, qu e se baseava em movimentos que deveriam ser usados caso o lutador v iesse a cair ao solo durante uma luta.

O praticante do "Chui-Pa-Hsien" executa uma série d e movimentos de grande grau de dificuldade técnica, movendo seu corpo como se estivesse bêbado a ponto de aparentemente perder o equilíbrio e cair no chão.

O sucesso desse estilo foi imitado por outras escol as de Kung Fu externo e em nossos dias existem "estilos do bêbado ", nas escolas "Tai Shing" (estilo do macaco), "Fey-Hok-Pay" (estilo da garça), "Tong-Long" (louva-a-deus) e "Choy Lay Fut" .

No estilo Tai Shing esse Tchia Dsu se caracteriza p or uma mescla dos movimentos do macaco no solo - o corpo do prati cante fica quase ajoelhado e algumas vezes com as costas ou a parte de cima da cabeça no chão.

No Choy-Lay-Fut o Tchia Dsu Chui-Pa-Hsi-En (note a grafia diferente) é transmitido juntamente com uma série de Tchia Dsu avançados denominados: "Sup Pat Law Hon Yik Gun Ching" (sistema interno dos oito budas), "Pa Kua Sum Kuen" (Tchia Dsu dos oito trigramas), "Fey Hok Da Kuen" (Tchia Dsu serpente contra o grou).

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O "estilo do bêbado" tornou-se muito popular em nos sos dias graças ao desempenho do ator chinês Jackie Chan que executou em um de seus filme uma estilização coreografada do Tchia Dsu do bêbado do estilo Tai Shing.

O estilo Hsing I (pronuncia-se Chin i) foi criado p elo general Yueh-

Fei (1102-1141), durante a dinastia Sung. Mais tarde estudaremos com mais extensão a vida des se grande

praticante de Kung Fu e entraremos em maiores detal hes sobre o tema. A peregrinação dos monges budistas e taoístas pelo Tibete trouxe

influências novas para os estilos de Kung Fu chines es. Essas influências foram mais marcantes nas escolas Fey Hok Pay e

Hop Gar. O estilo Fey Hok Pay, também conhecido como "Pay-Ha o", "Bai Hok

Pay", "Hao Chuan" e "Pae Hok" e o estilo Hop Gar se desenvolveram sob as influências do Budismo Vajrayana do Tibete e for am levados pelos monges budistas e tibetanos que peregrinaram por es se país até Cantão, no sul da China.

Chang San Feng (ou Chang San Fong) que também viveu na dinastia

Sung, teria, segundo as lendas, dado origem ao TAi Chi Chuan, o mais famoso estilo interno de Kung Fu. Segundo se conta, teria sido monge budista (embora outros autores o citem como tendo s ido monge taoísta) do mosteiro "Shaolin-Chi" e era um grande especiali sta no método de luta desse mosteiro - o estilo Shaolin.

Narra a lenda que esse monge estava meditando em um templo da montanha de Wu-Tang-Shang e se questionava a respei to das vantagens e desvantagens de se vencer uma luta e qual o signifi cado da vitória em um combate.

No momento em que meditava sobre esses assuntos ouv iu um barulho no pátio do templo e pôde observar pela jan ela uma luta entre um grou e uma serpente.

Observando os movimentos circulares da serpente, qu e se esgueirava pelo chão, escapando habilmente aos movi mentos furiosos do grou, percebeu as vantagens da esquiva e dos movime ntos que diluem a força de ataque do adversário e teria, segundo a le nda, estabelecido as bases para a criação do T'Ai Chi Chuan.

Outras lendas dessa mesma época dizem que Chang San Feng teria criado o T'Ai Chi Chuan a partir de um sonho em que o teria aprendido de certos personagens misteriosos denominados "Homens do Dragão de Fogo".

Observando-se o uso da energia interna na prática d o T'Ai Chi Chuan e a movimentação tipicamente flexível que o d iferencia dos estilos originários em Shaolin, temos razões para crer que Chang San Feng era um monge taoísta e não um monge budista.

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Considera-se Chang San Feng como pai do Nei Kung e a montanha Wu-Tang-Shan é citada como o local de origem dos es tilos "Wu Tang Pai" e "Pa Kua Chuan".

Essas informações fazem parte da obra de Yuan-Ch'U- T'Sai, o "Wu Tang Pa Kua Chuan" , o "Mo-Kik" e o "Lo-Hon-Kuen" .

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O Templo Shaolin Ainda nos tempos de hoje existe um templo budista n a montanha de

Soong Shan, na província de Honan, que foi fundado no início da era cristã e cujos feitos relativos ao desenvolvimento e a pre servação do Kung Fu o tornaram lendário.

Logo após as escadarias de sua entrada principal ai nda existe uma placa onde se pode ler em chinês arcaico os seguint es ideogramas: "Shao-Lin-Chi" , que podem ler traduzidos por: "Templo da Jovem Floresta" ou "Monastério do Pequeno Bosque".

A tradição oral que tem prevalecido na cultura do p ovo chinês afirma que as artes marciais duras (escolas externas) "Wai Chia" se originaram nesse templo.

As artes marciais que ali foram praticadas acabaram por receber o nome de "Shaolin Chua" (arte dos punhos da jovem fl oresta) tornando-se a base sobre a qual seriam estabelecidos os mais de t rezentos e sessenta estilos de Kung Fu que ainda existem em nossos dias .

A origem do templo fundamenta-se em causas exclusiv amente religiosas.

O templo Shaolin era um monastério onde o povo chin ês se refugiava em busca da paz e da tranquilidade necess árias à realização de sua busca espiritual.

O cidadão comum desse período da história da China tinha sua vida nas mãos do imperador, que era um déspota com direi to absoluto sobre seus súditos.

Mas, devido às crendices da época, quando uma pesso a dedicava sua vida à busca espiritual deixava de ser um cidad ão do mundo e o imperador perdia os direitos sobre ele.

Durante a dinastia Wei (398 a 534 d.C.) houve uma g rande conversão

do povo chinês ao Budismo recém-chegado da Índia, e o imperador do norte, Shao Wen, mandou construir o primeiro templo Shaolin por volta de 450 d.C.

Para a construção do templo foi escolhida uma local ização privilegiada na face norte da montanha Soong Shan.

Ao redor da construção do templo os monges plantara m um pequeno bosque com árvores frutíferas e outras plan tas escolhidas e, com o passar dos anos, acabaram por atribuir-lhe o nome de Shaolin.

À medida que a ordem monástica dos Shaolin se desen volveu, foram criados outros templos.

Depois do templo erigido em Honan, o mais famoso te mplo Shaolin foi constituído na província de Fukien por um monge muito famoso chamado Ta-Shin-Sheng.

Diz-se que embora tenha sido em Honan que se criou o estilo Shaolin de Kung Fu, foi em Fukien que este se desen volveu até atingir os elevadíssimos padrões técnicos que lhe deram tanta fama.

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Existiram cinco templos pertencentes à ordem monást ica dos Shaolin, mas devido às dificuldades dialéticas do i dioma chinês, existe alguma divergência sobre suas localizações.

Segundo Wang Lai Sheng, praticante de Kung Fu citad o na obra "Asian Fighting Arts" , os templos se situavam em Honan, Fu Kien, Wu Tang, 0-Weí-Shan e Kwantung.

Segundo outros autores os templos se situavam em Ho nan, Fukien, Ngor Mee, Wu Tang e Kwang-Tung.

A maior problemática dessas divisões é que aos mona stérios de Wu Tang e de O-Wei-Shan os taoístas também atribuem as origens de seus estilos internos.

Ambas as alternativas são citadas aqui mais por uma questão de aprimoramento cultural do leitor, pois esses fatos não possuem maior relevância e não impedem um estudo aprimorado do Ku ng Fu.

Como já disse anteriormente, as técnicas marciais e o Kung Fu já

estavam presentes na cultura chinesa centenas de an os antes do estabelecimento da comunidade budista de Shaolin.

As teorias de maior relevo têm atribuído ao templo de Honan o grande mérito de ter preservado muitos dos conhecim entos marciais originários da China Antiga.

Mas os mesmos historiadores que fazem essas afirmaç ões também são concordes em afirmar que no templo de Honan se dava mais importância às práticas da filosofia e da meditação Ch'An (transmitidas por Bodhidharma), enquanto que no templo do sul (Fukien ) os monges davam grande importância às técnicas marciais e estavam c onstantemente envolvidos nas lutas e nas rebeliões do povo chinês .

Por falta de registros históricos de reconhecida co mpetência, pouco se pode deduzir a respeito do grau de aperfeiçoamen to que o Kung Fu já possuía antes de ser introduzido em Shaolin.

Alguns historiadores com mentalidade mais nacionali sta recusam-se a admitir que o Kung Fu de Shaolin tenha sido criad o a partir dos ensinamentos de Bodhidharma, e afirmam que o estilo Shaolin teria sido gerado durante a dinastia Sung (420-479 d.C.) pelo imperador Chao-Kan-Ying.

Sabendo-se que Bodhidharma só chegaria ao templo po r volta do ano 525 d.C, tais historiadores têm a intenção de n os fazer crer que o Kung Fu já fazia parte dos ensinamentos do templo antes de sua chegada.

Mas tal raciocínio entra em choque com outros fator es que parecem comprovar que o estilo Shaolin tenha sido realmente introduzido por Bodhidharma.

Em comprovação à tese que atribuiu tal feito a Bodh idharma existem as gravuras e ilustrações pintadas em diversas pare des dos templos Shaolin e que podem ser vistas até hoje.

Nessas ilustrações se podem ver monges indianos (te z mais escura) ensinando os monges chineses a lutar.

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Outro argumento de grande peso é a grande superiori dade técnica do estilo Shaolin sobre os outros estilos existente s fora do templo, que acabaram por ser dizimados pelos sobreviventes de S haolin a ponto de hoje em dia muito poucos terem sobrevivido.

Bodhidharma é certamente a figura mais controvertid a no panorama

das artes marciais do Oriente. Sua influência na origem das artes marciais da Chin a, da Coréia e do

Japão é insofismável. Conhecido por Bodhidharma, Bodai Daruma, Daruma Tai shi Ta Mo,

Dart Mor ou Dat Mor, esse monge indiano foi o respo nsável pela criação do Budismo Ch’An, conhecido na Coréia como Sun e no Japão com Zen.

Na Índia o povo possui uma divisão por castas que t em prevalecido desde tempos imemoriais até os dias de hoje. Sendo filho do Rei Sughanda, Bodhidharma pertencia à casta dos Kshastr yias - que era a casta guerreira.

Desejando proporcionar a seu filho a mais esmerada instrução marcial que lhe fosse possível, o Rei Sughanda cont ratou o mais famoso guerreiro da índia para instruí-lo pessoalmente na arte do Vajramushti (leia Vajramushti - A Arte Marcial dos Monges Budistas - livro de minha autoria).

Esse guerreiro famoso por seus feitos militares e p or sua grande bravura chamava-se Prajnatara e se afeiçoou muito a seu discípulo, tendo lhe transmitido técnicas marciais de impressionante eficiência.

Com o decorrer dos treinamentos surgiram fortes laç os de amizade entre mestre e discípulo, e mesmo quando Prajnatara se converteu ao Budismo, (nesse tempo transformado em religião e po ssuindo um conceito filosófico antagônico ao Hinduísmo tradicional), Bo dhidharma não o abandonou e continuou a praticar o Vajramushti sob sua tutela até sua morte (por volta de 520 d.C.)

Devido à sua grande fama como guerreiro Prajnatara foi iniciado nos mais altos mistérios budistas, e acabou por atingir uma vivência espiritual que o fez receber do Abade Punyamitra (vigésimo sex to patriarca do Budismo) a incumbência de continuar a tarefa de div ulgação do Budismo.

Com a morte de Punyamitra, Prajnatara veio a se tor nar o vigésimo sétimo patriarca do Budismo.

Nessa época o Budismo estava perdendo seu prestígio na Índia devido ao surgimento de inúmeras seitas novas que e stavam se afastando dos conceitos filosóficos originais dados por Buda e se perdendo em questões dogmáticas de natureza religiosa.

Prajnatara percebeu a necessidade de reconduzir a f ilosofia budista à sua simplicidade original, e vendo a tenacidade e percebendo nele a firmeza de caráter necessária ao desempenho dessa t arefa, passou a ensinar-lhe o Budismo.

Bodhidharma não era um homem comum, haja vista que seu nome ainda é citado com respeito pelos verdadeiros mestr es de Kung Fu e de Karatê do mundo inteiro.

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Milhares de outros lutadores tiveram grandes atuaçõ es no mundo das Artes Marciais, mas ninguém teve seu nome prese rvado tanto tempo quanto Bodhidharma.

Dado a sua lucidez e pertinácia Bodhidharma entrego u-se de corpo e alma ao estudo dos ensinamentos budistas que lhe er am transmitidos por Prajnatara.

Tendo se dedicado muito à prática da meditação, com eçou a perceber que o domínio da vivência espiritual era m uito mais importante que o domínio do corpo físico e que, embora as técn icas marciais lhe agradassem muito, seu conhecimento não tinha o mesm o valor que o conhecimento e a prática das verdades espirituais.

Bodhidharma compreendia que as técnicas marciais qu e praticava dependiam muito de sua habilidade física e que, qua ndo atingisse idade mais avançada, veria sua capacidade técnica diminui r progressivamente.

Qual a finalidade de praticar-se alguma coisa exaus tivamente, se com o passar do tempo vai se diluindo nossa capacid ade de executá-la com perfeição?

À medida que Bodhidharma evoluía em suas práticas d e meditação, ia superando cada vez mais as manifestações egoísti cas da personalidade, destruindo o próprio ego e emergindo para uma consc iência superior.

Quando sua consciência atingiu um plano mais elevad o, começou a perder o sentimento de individualidade e passou a i dentificar-se cada vez mais com a unidade de todos os seres.

A tal ponto evoluiu Bodhidharma através das prática s de meditação budista, que não mais via a si mesmo existindo sepa radamente da existência de todas as demais pessoas.

Passou a compreender que qualquer ação deve ser fei ta visando o bem comum e não apenas a individualidade (que por s i mesma é egocêntrica e volta-se apenas para a realização de aspirações pessoais egoísticas).

Concluiu então que o homem deve executar seu trabal ho, dar sua contribuição e prestar sua ajuda, com vistas a toda a humanidade e ao bem comum, que favoreça não só ao gênero humano como ta mbém a todas as criaturas vivas (por isso que os budistas são veget arianos).

Dentro dessa dimensão, a luta perdia todo seu signi ficado em termos de agressividade e mérito pessoal, para tran sformar-se em mais um caminho de autoconhecimento que justificava sua apl icação técnica apenas em situações de defesa pessoal, para autopro teção ou para amparo de pessoas mais fracas e desprotegidas.

Lutar sim, mas não para vencer outro ser humano, ou para provar sua capacidade técnica sobre a capacidade de outrem .

Lutar apenas como uma forma de expressar e preserva r a justiça e a harmonia que dão vida às criaturas e asseguram o eq uilíbrio universal.

Com a morte de Prajnatara, Bodhidharma assumiu a co ndição de

vigésimo oitavo patriarca do Budismo e empenhou-se na tarefa que

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recebera de seu mestre: - Reconduzir a filosofia bu dista à sua simplicidade original.

Com esse objetivo Bodhidharma viajou pelos países o nde a filosofia

budista possuía o maior número de adeptos, a saber: Nepal, Tibete e China.

Nesse período o Budismo estava sendo muito difundid o na China, e suas obras básicas haviam sido traduzidas do sânscr ito e do pali para o idioma chinês.

A convite do Imperador Liang Wu Ti, que governava e m um dos reinados estabelecidos durante o período das seis d inastias (no início do sexto século d.C.), Bodhidharma foi à China com a i ntenção de dar prosseguimento à sua missão.

Porém Wu Ti era seguidor de uma linha inovadora do Budismo,

cujas características salvacionistas e ritualística s eram diametralmente opostas ao método de Budismo difundido por Bodhidha rma, que incentivava a busca interior e a meditação.

Além do que, Wu Ti não era um imperador benéfico pa ra seu próprio povo, tratando-o com mãos de ferro e com muito pouc o daquela bondade tão inerente aos ensinamentos budistas.

A respeito da convivência de Bodhidharma com esse i mperador pouco se registrou na história, mas houve um diálog o entre ambos que ficou muito famoso; aconteceu mais ou menos assim:

O imperador era muito presunçoso e julgava que pelo simples fato de ter permitido a divulgação do Budismo sob o seu reinado já se qualificava como um grande benfeitor.

Certa ocasião o imperador contou a Bodhidharma que construíra grandes templos para o Budismo e que nomeara inúmer os monges para cargos políticos de relevo, devendo portanto ter gr andes méritos diante de Buda.

Mas Bodhidharma lhe respondeu que não tinha nenhum mérito por ter feito essas obras.

Surpreso, Wu Ti perguntou o que deveria fazer então para conseguir méritos dignos do Budismo.

- Vossa alteza terá que dormir até o meio-dia , respondeu-lhe Bodhidharma.

Não tendo compreendido nada o imperador aproveitou a primeira oportunidade para consultar os sábios da corte a re speito do que Bodhidharma lhe dissera.

Depois de discutirem entre si, os sábios informaram a Wu Ti que Bodhidharma estava se referindo aos malefícios que o imperador causava ao povo chinês devido a seus atos impensados e prep otentes.

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Concluíram que Bodhidharma lhe recomendara dormir a té ao meio-dia para que, dessa forma, reduzisse pela metade os destratos que costumava cometer diariamente.

Furioso com essa crítica o imperador ordenou que Bo dhidharma fosse trazido à sua presença, mas o monge já havia previsto a cólera de Wu Ti e viajado para o reinado de Wei.

Essa história vem comprovar a grande coragem de Bod hidharma, que não se curvava nem mesmo diante de um tirano qu e dispunha da vida de seus súditos com a mesma facilidade com que muda va seu estado de humor.

No reinado de Wei, Bodhidharma foi acolhido pelos m onges Shaolin que o hospedaram por muitos anos.

Conta-se que nesse local Bodhidharma meditou diante de um muro por nove anos seguidos.

Nesse templo, localizado na face norte da montanha de Soong Chan, existe até hoje uma sala em que está escrito em chi nês arcaico: "Este é o local onde Tamo fitou a parede."

Existe uma lenda na China que conta que quando Bodh idharma

começou sua meditação, caiu em profundo sono devido ao cansaço da viagem, e que quando acordou ficou tão aborrecido c om isso que, pedindo uma faca, cortou fora as pálpebras.

Dessa forma nunca mais seria surpreendido pelo sono enquanto meditasse.

Outra lenda conta que as pálpebras de Bodhidharma f oram enterradas à esquerda e à direita da porta principa l do templo, aos pés das estátuas de ferozes deidades guardiãs que eram comu ns nessa época.

Com o passar do tempo, no local onde foram enterrad as surgiram plantas cujas folhas possuíam aroma agradável e que passaram a ser usadas nas infusões do templo e para a recuperação de inúmeras indisposições.

Essa planta veio a se tomar muito conhecida na Chin a e recebeu o nome de chá.

Após um longo período de meditação que o conduziu a estados de consciência cada vez mais sutis, Bodhidharma chegou à conclusão que de todas as práticas budistas a mais importante para a preservação dos ensinamentos de Buda era a meditação.

Embora compreendesse a importância ética e social d as chamadas "Quatro Nobres Verdades" e da "Senda Óctupla do Reto Caminho" que constituíam o sustentáculo dos dogmas do Budismo, B odhidharma percebeu que sem a prática sistemática da meditação , os dogmas perdiam seu sentido filosófico e a profunda dimensão que Bu da lhes tinha atribuído.

Assim sendo, a prática do Budismo foi totalmente mo dificada e muitos dos rituais foram suprimidos e substituídos pela prática severa da meditação.

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A essa nova concepção Bodhidharma denominou Dhyanna , que em sânscrito significa meditação.

Mas, para os chineses a pronúncia do sânscrito era muito dificultosa e acabou sofrendo modificações fonéticas que mudara m sua pronúncia para Ch'Anna e finalmente Ch'An .

O pensamento Ch'An influenciou profundamente todas as artes orientais.

Monges budistas de inúmeros países iam ao templo Sh aolin para receber upadesa (aconselhamento pessoal) de Bodhidh arma e difundiram o pensamento Ch'An para as mais remotas regiões do Oriente.

O Ch'An é até hoje ensinado no Japão com o nome de Zen e na Coréia com o nome de Sun.

Praticamente todas as mais representativas manifest ações do folclore e da cultura japonesa fundamentam-se no pe nsamento Ch'An (Zen).

Podemos citar a cerimônia do Chá, a arte Ikebana de arranjos florais, a técnica Bonsai de cultivo de árvores anãs, a arte de pintura com a pedra nankin denominada Sumi-E, o teatro Kabuki, o No, et c.

As Artes Marciais japonesas são literalmente insepa ráveis do Ch'An (Zen).

Graças aos esforços de Miyamoto Musashi (Shinmen Mu sashi No Kami Fujiwara No Genshin) (1584-1645) o maior samur ai da história do Japão, que, fundamentado na prática sistemática da meditação Ch’An (Zen), criou o Bushido (Código de Honra dos Samurai s), as Artes Marciais japonesas pautaram seus mais profundos ensinamentos no pensamento Ch'An.

As Artes do Kendo, do Aikido, do Kempo, do Kyudo, d o Judô e outras, estão fundamentalmente ligadas ao Ch'An (Ze n).

Jigoro Kano, criador do Judô, mantinha um monge Zen na Kodokan (Escola Kodo) para ensinar a seus discípulos o verd adeiro valor da disciplina nas Artes Marciais.

Quem examinar as obras de Gishin Funakoshi (o pai d o Karate) vai encontrar inúmeras referências ao Zen.

Quem examinar obras sobre o estilo Goju-Ryu de Kara te verá fotos do célebre mestre Gogen Yamaguchi praticando medita ções Zen sob cachoeiras.

Quem for à ilha de Shikoku em Tadotsu, na prefeitur a de Kagawa assistir aos treinamentos do templo de Shorinji Kem po verá que entre as práticas diárias incluem-se sessões de meditação Ze n.

Também na Coréia houve grande influência da escola Sun (Ch'An) nas Artes Marciais.

Quem examinar as origens dos monges de inúmeros Kih ons (movimentos formais) do Taekwondo, do Hapkido e do Hwarang-do, encontrará neles o nome de monges das seitas Ch'An coreanas.

Os ocidentais jamais poderão avaliar a severidade d as práticas impostas por Bodhidharma aos monges de Shaolin.

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Para se ter uma vaga idéia, basta examinar os progr amas dos templos Zen nos dias de hoje (muito mais suaves que naquele tempo).

Segundo depoimento publicado na obra "The Empty Mirror" , que narra as experiências de um ocidental em um templo Zen do Japão, os monges meditavam das quatro horas da madrugada até as vinte e duas horas, interrompendo sua meditação apenas para aten derem as suas necessidades fisiológicas e cumprirem suas pequenas obrigações diárias.

Dada a severidade das meditações, os monges Shaolin não resistiam e desmaiavam durante sua prática.

Considerando atentamente o estado débil e enfermiço dos monges que limitavam suas práticas físicas aos asanas (pos ições) utilizados na meditação e nos rituais, Bodhidharma começou a ensi nar-lhes o Vajramushti indiano para fortalecê-los e capacitá-l os a suportar com mais eficiência a meditação.

Tratando-se de exercícios com fins espirituais, exi gia-se a prática rigorosamente correta de cada movimento e aos mínim os gestos atribuía-se uma importância fundamental.

Embora considerada uma Arte Marcial Budista por mui tos pesquisadores, o Vajramushti data de época muito an terior ao surgimento do Budismo.

As referências históricas não são exatas, visto que o país de origem do Vajramushti (a Índia), por sua própria filosofia social de extrema religiosidade, nunca deu muita importância aos regi stros históricos.

É interessante notar que o Vajramushti tem sua orig em em época pré-ariana, quando a Índia ainda era habitada pelos drávidas.

Os historiadores situam a civilização dos drávidas como bastante anterior à civilização dos arianos, que teriam inva dido a Índia por volta de 2000 a.C.

Embora menos conhecida que suas congêneres chinesas , japonesas e coreanas, a Arte Marcial Vajramushti é mencionada em quase todos os textos heróicos da civilização dravidiana.

Aliada à técnica física característica de toda Arte Marcial, o praticante de Vajramushti tem a seu dispor o mais r ico cabedal de conhecimentos filosóficos e espirituais que a Índia propiciou ao mundo desde tempos imemoriais.

Nenhuma outra Arte Marcial, seja qual for sua orige m, possui um respaldo histórico mais antigo e abalizado.

O leitor deve basear-se em seu próprio critério par a julgar os pontos mais importantes entre as semelhanças e dessemelhan ças entre os diversos estilos de Kung Fu e o Vajramushti como fo i transmitido por Bodhidharma, segundo os relatos históricos que o te mpo conseguiu preservar.

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Evolução do Shaolin Ao ensinar o Vajramushti aos monges Shaolin Bodhidh arma

transmitiu-o mais como uma prática ascética que com o uma Arte Marcial. O Vajramushti servia para vivenciar certos preceito s budistas

relativos à unidade da mente e do corpo. Os monges que o aprenderam passaram a apreciá-lo ta mbém por

seus recursos defensivos que os protegiam nos longo s e solitários caminhos que percorriam para a divulgação da doutri na.

Alguns historiadores mencionam que para Bodhidharma tanto a meditação como o Vajramushti tinham igual valor dia nte dos objetivos de conhecimento interior.

Tanto isso é verdade que com o tempo a prática do V ajramushti como meio de desenvolvimento espiritual substituiu grande parte da meditação sentada, nas atividades desenvolvidas no templo, fazendo com que o templo Shaolin se tornasse famoso não como um centro de meditação Ch'An, mas como uma escola de Arte Marcia l sem armas.

O Vajramushti ensinado no templo Shaolin era mantid o como segredo, transmitido apenas a uns poucos iniciados que haviam recebido suas vestes monásticas e feito os votos mais elevad os.

A razão para esse procedimento é que o Vajramushti era extraordinariamente eficiente, podendo se tornar pe rigoso nas mãos de pessoas menos esclarecidas e que não possuíssem o c onhecimento de seu verdadeiro significado.

Acredita-se inclusive que tenha permanecido oculto entre alguns poucos iniciados, mesmo quando o templo abrigou ref ugiados políticos por volta da época da dinastia Ming.

Em sânscrito o nome Vajramushti significa: Vajra = Real, Bastão, Cetro, Vara, Direto, Reto, Correto . Mushti = Golpe, Golpe de Punho, Soco, Raio, etc. Atribui-se a criação do Vajramushti ao deus Shiva d a Trindade

Hindu. Essa Trindade é formada por três deuses, a saber: B rahma, o

Criador, Vishnu, o Conservador e Shiva, o Destruido r. A função destruidora de Shiva não deve ser interpre tada no mau

sentido e sim como um processo de transformação. Shiva age transformando e destruindo o que é inútil para que se

manifeste o que é útil e construtivo. Como já vimos anteriormente, embora a cultura dravi diana tenha

sido relegada ao esquecimento após a invasão dos ar ianos, as técnicas do Vajramushti foram preservadas pela casta dos guerre iros (Kshastryia).

Budha o aprendeu como parte de sua educação militar por volta, do ano 500 a.C.

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Segundo depoimento de So Doshin, pai do Shorinji Ke mpo (Kung Fu Shaolin em japonês), ensinado na ilha de Shikoku no Japão, mesmo depois de iluminado, Buda ensinava o Vajramushti como prát ica ascética.

Dado a dificuldade de pronunciar a palavra Vajramus hti os chineses mudaram o nome dessa arte para Lo-Han e mais tarde ela passou a ser conhecida como Nalo-Jan, Arohan e l-Jinsin.

Durante a dinastia Ming um monge chamado Kwok Yuen peregrinou

por toda a China pesquisando os estilos antigos de Kung Fu, tendo introduzido no templo certos conhecimentos marciais que mais tarde foram ampliados, somados a certos rudimentos do Vaj ramushti e classificados em cinco diferentes estilos: Tigre, G rou, Leopardo, Serpente e Dragão.

Os Manchus invadiram a China e dizimaram a dinastia Ming,

obrigando os oficiais do exército chinês a fugirem ou serem mortos. Muitos desses oficiais se ocultaram nos templos bud istas, por

serem territórios apolíticos e independentes do Est ado chinês. Os templos Shaolin foram dos mais procurados devido as suas

localizações privilegiadas e devido as suas grandes dimensões. Durante esse período os estilos desenvolvidos por K wok Yuen

passaram a ser ensinados ao povo com o nome de Kung Fu Shaolin, com o propósito de possibilitar-lhes defenderem-se dos em issários corruptos do governo invasor Manchu.

A grande eficiência desse estilo tomou-o muito famo so, passando a ser utilizado nas demonstrações públicas do templo e nas comemorações do ano novo chinês, juntamente com a Dança do Leão.

Mas entre os monges mais adiantados permanecia ocul to o verdadeiro Vajramushti, que, como um recurso à medi tação e ao desenvolvimento espiritual passou a ser chamado em chinês Ch'An Tao Chuan - "A Arte dos Punhos do Caminho da Meditação".

A grande dificuldade em se traçar as origens histór icas do Kung Fu está na pronúncia diferente dos nomes chineses, dev ido aos dialetos e as modificações pelas quais passou o idioma chinês arc aico até chegar a seus padrões modernos.

Devido a essas e outras dificuldades não conseguimo s determinar com exatidão a época em que teria vivido Kwok Yuen mas, pelos referenciais históricos que possuímos, podemos situ á-lo entre a dinastia Yuan (1268-1368) e a dinastia Ming (1368-1644). |

A respeito dele conta-se a seguinte história: O jovem Yuen da Província de Yen-Chou, aprendeu os exercícios de

Ta Mo (Bodhidharma) no Mosteiro Shaolin com o auxíl io do monge Hung-Yun.

Depois de aprendê-los converteu-os em setenta e dua s séries de técnicas marciais.

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Mas seu desejo de aprender as técnicas marciais do Kung Fu antigo o levou a viajar por toda a China em uma época de c onstantes guerras.

Certa ocasião o jovem Yuen enfrentou um ancião cham ado Li-Ch'Eng na cidade de Lanchow, de quem se tornou gran de amigo.

Li-Ch'Eng havia sido um grande lutador em seus anos de juventude e se tomara famoso por ter sido mestre do guerreiro Pai-Yu-Feng.

Baseado nessa experiência aumentou suas setenta e d uas séries originais em 172 Tchia-Dsu, divididos em cinco grup os diferentes.

Cada um desses grupos passou a se identificar com u m animal, a saber: a Serpente, o Tigre, o Dragão, o Leopardo e o Grou.

Cada grupo de Tchia-Dsu com o nome de um determinad o animal possuía suas características próprias. j

Os Tchia-Dsu do Dragão cultivavam o espírito e a ca pacidade de estar alerta; executavam-se sem a aplicação de forç a, enfatizando-se a respiração e a concentração na parte baixa do abdôm en, em movimentos longos, fluentes e contínuos.

Os movimentos do Tigre serviam para fortalecer o co rpo (ossos, músculos e tendões); seus movimentos eram curtos e bruscos, dando-se ênfase à força e à tensão dinâmica.

As técnicas do Leopardo desenvolviam a força, com m ovimentos rápidos, inteligentes e imprevisíveis.

O estilo da Serpente desenvolvia o Chi (energia int erna), era usado a partir do controle espiritual e cultivava a resistê ncia, através da respiração lenta, profunda e harmoniosa, dando prioridade aos golpes desferidos com a ponta dos dedos.

Os movimentos do Grou visavam o desenvolvimento do autocontrole e do caráter.

Com esses novos conhecimentos Yuen e seu amigo Pai- Yu-Feng retomaram ao templo Shaolin.

Pai-Yu-Feng já tinha 70 anos e resolveu aderir à vi da monástica, adotando o nome Ch'ln-Yueh (Lua do Outono), querend o demonstrar que conseguira realizar um antigo sonho já no outono da vida.

A Kwok Yuen (Chueh Yuan), se atribuem as seguintes palavras: "Sem o Chi não existe força. Um lutador que grite e lance sua mão com ferocidade , não tem

verdadeira força em seu golpe. Um verdadeiro lutador não é espetacular, mas seu pu nho é pesado

como uma montanha. Isso acontece porque ele possui Chi. Depois de muita prática o Chi pode ser focalizado s obre qualquer

ponto de ataque que se deseje. A vontade domina o Chi que pode ser localizado em q ualquer ponto

instantaneamente."

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Quando os oficiais Ming se ocultaram nos templos Sh aolin, despertaram a ira dos governantes manchus, que se e mpenharam arduamente em tentativas para destruir os templos.

Na época da dinastia Ching foram feitos diversos at aques ao templo principal, mas sem sucesso, pois suas paredes eram inexpugnáveis, tendo mesmo diversos metros de espessura em alguns pontos .

O templo sofreu longos cercos, semelhantes ao que v itimou o templo de Jerusalém, mas sobreviveu facilmente devi do a auto-suficiência dos monges, que plantavam seus próprios alimentos e podiam resistir interminavelmente.

Mas, da mesma forma que a Inconfidência Mineira, o templo Shaolin também teve seu traidor.

Despeitado por não ter acesso aos exercícios origin ais de Bodhidharma e motivado por vultosa quantia e pela o ferta de um cargo político de relevo, um monge de categoria inferior chamado Ma Ning Yee tramou sua traição com o apoio de três oficiais do governo Manchu, a saber: Chan Man Yu, Cheung Ching Chow e Wong Chun M ay.

Ma Ning Yee envenenou a água do templo e o incendio u no vigésimo quinto dia do sétimo mês do décimo segundo ano do r einado de Yung Cheng (1733 d.C).

Enquanto o fogo aumentava Ma Ning Yee abriu as port as para os soldados manchus que rapidamente dizimaram todos os sobreviventes que encontraram e destruíram o que ainda restava.

Conseguiram fugir apenas cinco dos mestres e quinze discípulos. Dentre os quinze discípulos apenas seis tiveram seu s nomes

guardados pela história, quer por sua fama como pos suidores de grandes habilidades nas Artes Marciais, quer por seus feito s heróicos nas infrutíferas tentativas de derrubar os invasores ma nchus.

Foram eles: Hung Hee Kung e Luk Ah Choy, que criaram o estilo H ung Kuen,

mais tarde conhecido como Hung Gar. Fong Sai Yuk, que criou um estilo baseado no movime nto dos cinco

animais de Shaolin. Tse Ah Fook, Fong Weng Chun e Tsung Chin Kun, que f oram

grandes lutadores e cujos feitos heróicos são até h oje narrados em histórias do folclore chinês.

Quanto aos cinco mestres que escaparam, seus nomes eram: Cheen Sin, Fung To Tak, Mui Hin, Ng'Mui e Pak Mey.

Os exercícios que Bodhidharma ensinou no templo Sha olin

passaram a ser conhecidos como "As Dezoito Mãos de Lo-Han" , (Shih-Pa-Lo-Han-Sho) e foram descritos em uma obra chamada "O Livro da Transformação Muscular" (I Chin Ching) em dois volumes, dos quais apenas um sobreviveu.

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Baseado no "Shih-Pa-Lo-Han-Sho" o imperador Tai-Tzu da dinastia Sung criou trinta e duas formas de punho longo e se is formas de deslocamento.

Infelizmente muitos dados sobre a filosofia budista e as Artes Marciais chinesas se perderam devido à ausência de referencial histórico.

Foi o escritor Tao-Yuan quem mencionou o nome de Bo dhidharma pela primeira vez, e isso ocorreu no ano 1004, ou s eja, quase quinhentos anos após sua morte.

As primeiras referências históricas à capacidade ma rcial dos

monges do templo Shaolin citam o primeiro imperador da dinastia T'Ang, que venceu a Wang Chin Chung graças à ajuda de três monges lutadores chamados Chih Tsao, Hui Nang e Tsan Tsun.

Graças às proezas desses monges o templo Shaolin to rnou-se famoso como um centro de cultura marcial.

Outra referência menciona que o general Yueh Fei cr iou as técnicas do Chin-Na (Cento e Oito Técnicas de Apresamento e Torção) a partir dos ensinamentos que teve do monge Jao Tung do templo S haolin.

Tem sido despertada a curiosidade de inúmeros leito res, que tem nos escrito para saber como eram feitas as iniciaçõ es dos pretendentes a se tornarem discípulos dos templos Shaolin.

A esse respeito têm sido relatadas inúmeras lendas que, infelizmente, não podem ser comprovadas historicame nte.

Mas vamos contar algumas delas apenas para cultura geral de nossos leitores.

Segundo relatos antigos, os novos discípulos eram a dmitidos no templo no início da primavera, que coincidia com o tempo das grandes chuvas.

Nesses dias os pais que desejavam que seus filhos s e tornassem monges, os levavam ao pátio frontal às escadarias d o templo e lá os deixavam sozinhos aguardando que os monges os convi dassem a entrar.

Essas crianças tinham em média de 7 a 12 anos de id ade. Considerando-se a dispersividade que caracteriza as crianças dessa

idade, imagine como eram rigorosos os testes que de screverei a seguir. Os monges não abriam logo as portas do templo (às v ezes

demoravam alguns dias) e as crianças eram obrigadas a suportar ao relento o sol e as chuvas torrenciais que costumava m cair nesse período.

Muitas das crianças abandonavam a espera e voltavam para suas casas.

Outras crianças eram conduzidas de volta por seus p róprios pais que não suportavam vê-las sofrer.

Embora não abrissem as portas os monges observavam o comportamento das crianças e iam selecionando aquel as que

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consideravam suficientemente disciplinadas para sup ortar as árduas exigências do templo.

Quando as portas se abriam os monges mandavam de vo lta para casa as crianças que consideravam que não suportari am seus ensinamentos.

As demais crianças eram admitidas no primeiro pátio interno e conduzidas a uma grande mesa onde já estava sentado um velho monge (geralmente o patriarca do templo).

Quando se sentavam à mesa eram observados seus comportamentos.

Se pediam comida (podiam estar há três dias sem com er) eram servidas e depois mandadas para suas casas, pois er a considerado indecoroso pedir comida ao invés de aguardar o mome nto de serem servidas.

Se corressem para a mesa avidamente ou apressadamen te demais, também eram dispensadas.

Às que passavam por esse teste era dado uma tigela sem fundo, uma grande bolacha seca achatada (do tamanho do fun do da tigela) e era servido o chá.

O procedimento correto era forrar o fundo da tigela com a bolacha para que pudesse ser servido o chá sobre ela.

As crianças que não o faziam eram dispensadas sumar iamente, pois não eram consideradas suficientemente inteligentes para aprender os ensinamentos do templo.

Se a criança agisse corretamente colocando a bolach a no fundo da tigela, mas começasse a tomar o chá antes do monge idoso que estava sentado à mesa, era mandada de volta para casa, poi s o respeito aos idosos era de grande importância na cultura chinesa .

Supondo que o garoto conseguisse superar esses test es, ainda enfrentaria outros.

Logo em seguida a essa fase lhe era entregue uma va ssoura e lhe ordenavam que varresse um determinado pátio.

Mal ele tivesse terminado de varrer surgia algum mo nge com os pés enlameados e sujava todo o lugar que havia sido var rido.

Assim que o monge porcalhão desaparecesse por uma p orta qualquer surgia o monge que lhe havia ordenado que varresse o lugar e o interpelava mais ou menos assim:

- Eu não mandei que você varresse esta sala? Olhe s ó que imundície! Você é um vagabundo que não obedece às o rdens que recebeu!

Se o garoto resmungasse que já tinha varrido ou que depois que tinha varrido tinha vindo um cara e sujado tudo out ra vez, era mandado embora, pois não tinha suficiente dedicação ao trab alho para permanecer no templo.

O garoto deveria abaixar a cabeça e continuar a var rer sem proferir nenhuma palavra.

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Este teste da varredura era repetido diversas vezes como prova da humildade, da paciência e da perseverança do postul ante. Havia uma variante desse teste em que o monge que mandara o p ostulante varrer retornava e afastava um painel que dava para outra sala tão grande quanto a primeira.

Em seguida interpelava o garoto perguntando por que não varrera a outra sala também.

Se o menino respondesse que não lhe tinham ordenado que varresse a outra sala era sumariamente dispensado.

Seu procedimento deveria ser de extrema humildade, deveria abaixar a cabeça e continuar a varrer sem retrucar.

Pessoalmente não creio que nenhum garoto ocidental superasse satisfatoriamente esta prova, a menos que tivesse s ido previamente instruído sobre como deveria se comportar.

Depois que superava os testes iniciais o postulante era submetido a

todo tipo de provação, e executava todas as tarefas menos agradáveis do templo por longo período.

Buscar água era uma tarefa penosa, pois os baldes e ram propositadamente imensos e mesmo quando vazios bast ante pesados.

Havia também as tarefas da cozinha que eram muito d esagradáveis, quando não monótonas e exaustivas.

As tarefas de limpeza incluíam lavar as latrinas, r etirar a poeira dos imensos arabescos e baixos-relevos que existiam por quase todas as paredes do templo, cuidar das folhas e das ervas da ninhas dos vários jardins, lavar escadarias e corredores imensos, etc .

Durante esse período inteiro o postulante passava p or periódicas humilhações por parte dos estudantes mais avançados , todas elas com a intenção de testar-lhe a fibra moral e a paciência.

E todas essas tarefas e testes que eram impostos ao s garotos não os livravam de cumprirem outras obrigações relacion adas com as práticas budistas e com o estudo das doutrinas ensinadas no templo.

Dormia-se poucas horas cada noite e trabalhava-se a rduamente. Quando começava a espelhar certa frustração ou cans aço, um

monge se aproximava dele e lhe indagava há quanto t empo estava no templo.

Geralmente os garotos respondiam que estavam lá há muito tempo, em parte porque não lhes era dado acesso a nenhum c alendário que lhes permitisse saber há quanto tempo lá estavam; em par te porque estavam desejosos de iniciar a prática do Kung Fu que só er a permitida a alunos mais avançados.

Mas se a resposta fosse essa, o aluno era deixado e ntregue a seus afazeres por mais alguns meses.

A resposta certa seria: - Há bem pouco tempo estou aqui. (Mesmo que já fizesse alguns anos que lá estivesse.)

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Esta resposta era considerada correta porque diante dos dogmas do Budismo a manifestação material no mundo que nos ce rca é ilusória (Maya = Ilusão) e também é ilusório o conceito de tempo e de espaço.

Não era obrigatória a prática do Kung Fu, mas se o jovem passasse

em todos os testes que descrevemos até agora e mani festasse desejo de aprender o Kung Fu Shaolin, seu desejo seria escarn ecido e ignorado por muitos meses.

Depois desse abandono inicial passavam-se alguns me ses e ele era convidado a participar das aulas de Kung Fu.

Nas primeiras aulas era mais ou menos usado como um saco de pancadas e as surras eram duríssimas.

Se demonstrasse ter fibra, superando essa fase inic ial que tinha sua duração determinada pelo comportamento do postulant e então seria recebido como um discípulo de Shaolin, mudando a co r das vestes e o comportamento que recebia dos demais.

Muitas de suas tarefas diárias eram transferidas ao s postulantes menores e passava a receber incumbências de maior r esponsabilidade.

Seus estudos dentro das doutrinas do templo eram ma is profundos, e maior o número de matérias estudadas.

As práticas ritualísticas e o período de meditação eram ampliados. Já não tinha que se alimentar na cozinha junto com os postulantes

menos graduados, passava a frequentar as mesas dos refeitórios. Era transferido para os dormitórios superiores. Até que recebesse as vestes amarelas e prestasse os votos

monacais o postulante não cessava de ser submetido a testes periódicos que, embora menos humilhantes, não deixavam de ser bastante exigentes.

Além dos testes de habilidade física e marcial havi a os testes de habilidade artística - geralmente caligrafia e comp osição poética.

Havia também os testes de doutrina budista e de med icina oriental (os monges eram excelentes acupuntores e massagista s).

Quando evoluía em seus estudos aprendia vários idio mas e ajudava na tradução de textos budistas de origem pali ou sâ ncrita.

O trabalho na lavoura também era obrigatório e todo monge tinha que fazer seu estágio na cozinha aprendendo auto-su ficiência na arte culinária.

Cada um desses assuntos exigia um teste de avaliaçã o. Segundo a tradição chinesa o homem Kung Fu teria qu e se

distinguir em pelo menos cinco áreas do conheciment o humano. Ele deveria saber se exprimir no idioma chinês tant o oralmente

como por escrito de maneira impecável. Ele deveria possuir uma caligrafia de rara beleza q ue chamasse a

atenção de quantos a vissem.

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Ele deveria ser capaz de se exprimir em versos, de conhecer poesia e os textos clássicos com alguma profundidade.

Ele deveria se exprimir em alguma forma de arte com grande habilidade - geralmente desenho ou pintura.

Ele deveria conhecer os rudimentos da lavoura e da arte culinária e ser capaz de transmitir tais conhecimentos às pesso as do povo que necessitassem deles.

Ele deveria ser hábil no uso das agulhas da Acupunt ura, e na falta delas ter conhecimentos suficientes da Medicina ori ental para poder tratar um paciente aplicando dedos habilidosos sobre os po ntos dos meridianos de energia utilizados na Acupuntura.

Ele deveria ter uma consciência política e econômic a para poder desempenhar o papel de educador diante do povo, seg undo os melhores procedimentos da tradição de Confúcio.

Ele deveria possuir sólidos conhecimentos das doutr inas religiosas, mormente o Budismo e o Taoísmo, para poder doutrina r e esclarecer dúvidas a respeito de tais assuntos.

Ele deveria ser capaz de defender a si mesmo e aos desamparados que recorressem ao seu auxílio.

Ele deveria ter noções de sobrevivência em condiçõe s inóspitas, na selva e em terrenos desconhecidos, devendo ser capa z de localizar ervas medicamentosas, preparar infusões curativas, coloca r no lugar ossos quebrados, preparar beberagens e poções.

Dentre os atributos que acabo de citar, o homem Kun g Fu tinha que

se destacar em pelo menos cinco deles. A falta de pelo menos cinco dessas qualidades o des qualificaria

como praticante de Kung Fu, mesmo que se tratasse d e um habilidoso lutador.

Há que compreender que para a tradição chinesa, dev ido às influências de Confúcio, a cultura geral de um home m era muito mais respeitada que sua capacidade de lutar.

Recentemente foi mencionado na obra "Chinese Boxing Masters and Methods", de autoria de Robert Smith, o professor C heng Man-Ch'lng, famoso praticante de Tai Chi que tinha a alcunha de Mestre das Cinco Excelências.

Com isso o povo chinês lhe prestava homenagens trat ando-o como um mestre cujos conhecimentos comparavam-se com os grandes mestres da antiguidade.

Ingressar no templo Shaolin exigia uma atitude muit o séria e uma

forte intenção de vontade que predispusesse o postu lante a todo tipo de provação.

As pessoas não entravam no templo meramente na inte nção de aprender o Kung Fu.

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O templo Shaolin era, antes de tudo, uma escola de filosofia e religião e as pessoas que nele ingressavam o faziam com o objetivo de alcançar a realização espiritual.

Se alguma pessoa lá entrasse apenas com objetivos m arciais acabaria por se lamentar amargamente, pois não pode ria mais sair a menos que atingisse um nível de proficiência espiri tual ou marcial extraordinários.

Aos monges que se dedicavam exclusivamente aos estu dos doutrinários e às práticas espirituais era facultad a a saída do templo desde que em missões administrativas ou de caridade.

Mas aos monges que haviam escolhido o caminho da Ar te Marcial somente era permitida sua saída caso se distinguiss em de maneira incomum na arte de lutar.

Se fosse capaz de vencer os instrutores dos cinco e stilos principais do templo poderia requerer a prova do corredor da m orte.

O corredor da morte era assim chamado porque nele h avia cento e oito bonecos de madeira que eram acionados pelo pes o de quem se atrevesse a penetrá-lo.

Tais bonecos eram confeccionados por artesãos habil idosos de maneira que, se o praticante escapasse dos golpes d esferidos pelo primeiro, certamente teria que enfrentar o segundo e assim por diante.

Cada golpe de defesa ou ataque desferido contra um dos bonecos gerava reações de ataques dos outros.

Se o monge que os enfrentasse conseguisse sobrevive r ao corredor, deveria levantar a urna arredondada incandescente p ara poder sair.

Essa urna pesava aproximadamente 225 quilos e era c olocada em um pedestal especialmente confeccionado, de maneira que automaticamente abria a imensa porta situada ao fim do corredor.

Essa porta não podia ser aberta a não ser dessa man eira. A cada monge era permitida a prática de, no máximo, dois desses

estilos, dessa forma o desconhecimento dos outros t rês estilos (sem falar no Vajramushti), garantiriam a sobrevivência do tem plo caso o monge se transformasse num renegado que traísse seus conheci mentos.

Nas laterais da urna havia em alto-relevo as figura s dos cinco animais que simbolizavam os cinco principais estilo s do templo.

Era mantido fogo acesso no interior da Urna durante todos os dias do ano e sua superfície externa atingia uma tempera tura tão elevada que onde fosse tocada a carne grudava e ficava impressa a figura do animal que estivesse gravado naquele ponto.

Quem quer que tivesse superado os 108 bonecos do co rredor da morte teria que levantar a urna para poder sair, e como a roupa dos monges era de seda (altamente combustível), o monge se via obrigado a retirar a parte de cima de suas vestes e, de torso nu, erguer a pesadíssima urna com os ante-braços e mudá-la de pedestal.

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A porta permanecia aberta por uns poucos momentos, e se o monge desmaiasse no processo ou não se atirasse para fora com certa rapidez, arriscava-se a perder todos seus esforços.

Por uma questão de respeito às artes que praticara, o monge procuraria tocar na urna em pontos que contivessem a figura dos animais que representavam os estilos que havia praticado, d e maneira a ostentar em seus braços por toda a vida o desenho deles.

Evidentemente não basta a mera força física para se conseguir erguer um objeto de tão grande peso, e nem eram suf icientes apenas técnicas marciais aprendidas no templo para se venc er os 108 bonecos do corredor da morte.

Eram necessárias práticas mentais apuradas para que se desenvolvessem certos poderes (hoje chamados parano rmais), que permitiriam a realização de tais feitos extraordiná rios.

Certamente você já ouviu falar a respeito de pessoa s, aparentemente frágeis, que carregam pessoas com o dobro de seu pe so e até pianos imensos por ocasião de grandes incêndios.

Depois que cessa o fogo essas pessoas percebem que em condições normais não seriam capazes de realizar ta is esforços.

Experiências têm comprovado que pessoas em condição de hipnose profunda são capazes de levantar imensos pesos e de se submeterem a imensas dores sem senti-las.

Os monges Shaolin eram treinados em métodos avançad os de Yoganidra transmitidos por Bodhidharma, que lhes pe rmitiam realizar essas proezas todas e outras ainda mais impressiona ntes.

O Yoganidra é uma técnica transmitida através do Yo ga e do Vajramushti, que permite ao praticante atingir dire tamente seu subconsciente de lá tirando forças para realizar ta refas que, sob condições comuns, seriam consideradas impossíveis.

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As Sociedades Secretas Depois da destruição do templo Shaolin os sobrevive ntes se

espalharam por toda a China e passaram a incentivar o povo a criar frentes revolucionárias com o objetivo de expulsar os Manch us do poder.

Tal meta nunca foi atingida, mas os diversos grupos acabaram por dar origem a Fraternidades Secretas, Sociedades e I rmandades que cultivaram o Kung Fu ocultamente durante muito temp o.

Essas Sociedades Secretas eram conhecidas como Hung Mun, Hung Tong ou simplesmente Tríades.

Mais popularmente os membros delas eram conhecidos como Tong. Convém lembrar que o Kung Fu também era praticado f ora do

templo Shaolin e que muitas das Fraternidades Tong eram fundadas por lutadores de Kung Fu que apesar de não descenderem da linhagem de Shaolin, também estavam interessados em tirar os Ma nchus do poder.

Esses lutadores faziam longas viagens demonstrando suas habilidades nas localidades onde passavam e arregim entando adeptos para suas Fraternidades.

Muitos desses lutadores eram hábeis médicos, pois o conhecimento de Acupuntura e Do-ln eram transmitidos pelos mestr es de Kung Fu.

Ocultos sob a personalidade de médicos, esses lutad ores tinham facilidade para arregimentar elementos para os Tong .

O poderio dos Tong estendeu-se por toda a dinastia Ching, finalizando apenas com a constituição da República em 1912.

Por essa época os Tong não estavam mais interessado s no poderio Manchu e sim na invasão dos ocidentais - portuguese s, espanhóis, ingleses e franceses que, aos olhos deles, estavam dividindo a China e pervertendo suas tradições.

Pelo fim do século XVIII o ópio chinês era muito co biçado pelos europeus, e o incentivo brutal que os ocidentais im puseram ao povo chinês para aumentar a produção desse tóxico acabou por aumentar o vício e o consumo entre os chineses.

Os Tong, por serem mais politizados que o resto da população, se revoltaram com esse estado de coisas e iniciaram um movimento de resistência e guerrilha que acabou resultando na fa mosa revolta dos Boxers.

Entre as inúmeras pequenas revoluções geradas pelas Fraternidades Tong podemos citar a tentativa de ass assinato do Imperador Kia-Ching perpetrada pela Fraternidade da Razão Cel este, que era uma facção da Sociedade do Lótus Branco.

Esse imperador era um déspota que se divertia assis tindo as torturas de seus prisioneiros.

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Em 1813 a Seita dos Nenúfares Brancos começou um gr ande movimento revolucionário contra os Manchus.

Por volta de 1840, como represália ao novo acordo q ue os ingleses

firmaram com o governo corrupto chinês, referente à importação de ópio, os Tong destruíram todo o carregamento dos ingleses .

Por seu turno os ingleses invadiram Nanking tendo c onquistado a cidade em 1842.

Essa revolta foi conduzida por Hung Siu Chuan (1812 -1864), que pertencia ao grupo étnico dos Hakka, de onde surgiu o famoso estilo Tong Long.

Hung Siu Chuan converteu-se ao Cristianismo e deu o rigem à "Seita dos Adoradores de Deus" .

Daí o nome da revolta, pois Hung Siu Chuan tentou e stabelecer uma nova sociedade na China que denominou "O Reino Celeste da Paz" , em chinês "Tai Ping Tien Kuo" .

Embora os Tong não se unissem a essa seita devido à s oposições religiosas, apoiavam-se devido as semelhanças de in tenções políticas.

Os Tong eram exímios lutadores treinados nas artes, do Kung Fu e das armas chinesas, sendo hábeis praticantes das té cnicas da espada, da lança e dos machados gêmeos.

Eram facilmente distinguidos entre o povo, pois em revolta com a ordem Manchu que obrigou o povo a cortar o rabicho característico dos Ming, usavam seus cabelos compridos ou cortados à m aneira dos ocidentais.

Apesar de suas inúmeras vitórias, os Tai-Ping (Hung Siu Chuan e seus seguidores) foram finalmente vencidos pelo gen eral Tseng Kuo Fan, que uniu suas forças ao exército inglês estrategica mente dirigido pelo comandante Gordon, que era apelidado de "Comandante Chinês", por ser um lambe-botas do governo estabelecido.

Graças ao esforço conjunto desses dois exércitos Na nking foi reconquistada e 100.000 homens da Seita dos Adorado res de Deus foram exterminados a golpes de espada.

As inúmeras revoltas geradas pelos Tong acabaram po r culminar num dos maiores levantes da história chinesa, a Rev olta dos Boxers.

Esse nome foi dado pelos ingleses, pois na impossib ilidade de verter satisfatoriamente o idioma chinês, chamavam os praticantes de Kung Fu de Boxers, numa analogia ao esporte de orig em inglesa.

Portanto, para os ingleses o Kung Fu era o Boxe Chi nês e o praticante de Kung Fu era chamado de Boxer.

No final do século XIX a Imperatriz Tseu-Hi (chamad a pelos ingleses de Imperatriz Dowager), fez um acordo com os estran geiros e com o auxílio deles dizimou os membros do Partido Reformista Libe ral, conquistando seu lugar no poder e em pagamento cedendo grandes á reas do território chinês.

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Como a imperatriz era da raça Manchu, os Manchus co meçaram a insuflar sentimentos patrióticos exacerbados entre o povo chinês, numa tentativa de lançá-los contra os estrangeiros, faze ndo-os esquecer dos desmandos de sua governante.

Para se ter uma idéia desses incentivos à revolta, reproduzimos a seguir o texto de um dos cartazes que foram afixado s em Pequim na noite em que se iniciou a revolta.

"O Santo Imperador Chu Hung Tang avisa a todos os d iscípulos de

Buda: Morte aos Demônios do Oeste que oprimem nosso país escarrando sobre nossos deuses e roubando nossas riquezas. O g rande momento já foi escolhido pelo destino. O céu não permitirá que aqueles que violaram tantas sepulturas para abrir caminho para suas máqu inas de ferro e que tomaram à força as terras dos filhos do céu, escape m à condenação de seus crimes. Insolentes como são, esses bárbaros nã o recuam diante de nada. É por essa razão que nós, membros da Sociedad e Harmoniosa do Punho Fechado, membros da Arte Marcial Chinesa, da Justiça e da Concórdia, o convidamos a massacrá-los sem piedade no cair desta noite."

A sociedade Tong responsável pela revolução dos Box ers era a

Fraternidade do Punho da Concórdia (Yi Ho Kuen em c hinês), que era filiada à Seita dos Grandes Punhais e à Seita dos N enúfares Brancos.

Mas o processo todo teve origem muito antes, com Ch u Hung Tang, líder que reuniu lutadores de diferentes estilos e formou um formidável exército.

Originário da cidade de Sze Chui na Província de Sh antung, Chu Hung Tang era estudioso de Medicina e Kung Fu, tend o aberto sua casa a quem quer que desejasse praticar Kung Fu e reunindo especialistas marciais que deram origem ao estilo Yi Wu Kuen (Arte dos Punhos da Justiça e da Concórdia) .

Em sua seita a ênfase era exclusivamente dedicada a o Kung Fu, sem que se ensinasse conceitos filosóficos ou políticos , mas posteriormente Chu Hung Tang adotou alguns princípios políticos da Seita Pa Kua e da Seita do Lótus Branco.

Com a aceitação dessa conceituação nova os ânimos d e seus alunos se tornaram mais politizados e agressivos, c ulminando com a formação da Sociedade da Justiça e da Concórdia, Yu Wu Mun em chinês.

Essa Sociedade altamente nacionalista e avessa aos estrangeiros, tinha dois princípios que a norteavam, a saber:

- Ajude o pobre e lute contra os estrangeiros. - Se encontrar uma desigualdade em seu caminho empr este sua mão

como ajuda.

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Esse ato de emprestar a mão nada tinha a ver com a atitude cristã de dar a outra face, muitas vezes significava empresta r um punho irado de um hábil praticante de Kung Fu.

Por sinal, parte de suas vítimas eram os chineses c onvertidos ao Cristianismo, que era muito malvisto devido à sua o rigem estrangeira.

A guarda imperial não os impedia de atacar as igrej as e aos chineses cristãos, pois também tinha certo preconceito a res peito dessa cultura estranha.

Chu Hung Tang tinha apenas 300 homens em sua seita, mas um golpe hábil do destino aumentou suas fileiras em ma is de mil homens.

Fiéis a seus dois princípios, os homens da Sociedad e da Justiça e da Concórdia ajudaram o povo por ocasião de uma inu ndação ocorrida em Sze Shui, o que lhes trouxe centenas de novos adept os.

Chu Hung Tang tinha um amigo de infância que se tom ou monge budista e era forte praticante de Kung Fu.

Esse monge, chamado Bun Ming organizou uma filial d a Sociedade na cidade de Cheung Chin.

Com o auxílio desse monge, Chun Hung Tang estabelec eu uma estratégia de expansão que funcionava mais ou menos assim:

Enviava 50 homens a uma nova região para fundar uma espécie de Mosteiro e uma Escola de Kung Fu.

Na continuidade os frequentadores dessa comunidade eram convidados a participar de uma Sociedade Secreta de voluntários, que era organizada mais ou menos nos mesmos padrões das org anizações dos Tai Ping.

O objetivo dessas organizações era a derrubada da I mperatriz Manchu Tseu Hi e a expulsão dos estrangeiros do ter ritório chinês.

Os treinamentos nas escolas de Kung Fu da organizaç ão eram duríssimos, os homens treinavam horas e horas todos os dias e se especializavam no uso da lança e da espada.

O começo da revolta foi bastante prosaico. No Condado de Ping Yuen o povo estava passando fome e mais uma

vez, fiéis a seus dois princípios, um grupo de home ns da Sociedade Secreta resolveu assaltar um armazém dos bárbaros e strangeiros e repartir os alimentos entre o povo.

Mas o grupo era muito pequeno, e seis dos homens fo ram presos e condenados à morte.

Os outros elementos do grupo procuraram Chu Hung Ta ng e lhe pediram que os salvasse.

Chu Hung Tang uniu-se a Bun Ming e com 200 homens a tacou a guarnição estrangeira vencendo-a e repartindo a com ida entre os pobres.

O Governador do Condado foi avisado e mandou suas t ropas contra os revolucionários, mas elas foram derrotadas.

Os revolucionários haviam se preparado para a batal ha através de banhos especiais que as antigas tradições do Kung F u acreditavam produzir invulnerabilidade, e como nenhum dos homen s foi ferido ou

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morto nas duas escaramuças, passaram a acreditar qu e suas fórmulas de invulnerabilidade haviam funcionado.

Em agradecimento à vitória, foi realizada uma cerim ônia budista e para obter o favorecimento dos deuses em suas futur as batalhas, adotaram mais cinco normas morais, a saber:

- Não contar vantagens nem ter presunção. - Respeitar os pais e anciãos. - Não cobiçar nem invejar. - Não roubar. - Não adulterar. Nessa altura dos acontecimentos os adeptos da Socie dade Secreta

já eram 20.000 e estavam espalhados por toda a Chin a. A tradição diz que mais da metade deles praticavam o Kung Fu. Em maio de 1898 foi realizado um conselho secreto d os mestres de

Kung Fu. Estavam em assembléia: Fao Kan Tzi, famoso mestre Shaolin que tinha mais d e 2.000

discípulos e que pertencia à Tríade dos Tong. Che I Chai, mestre de Hsing I que tinha vencido o f amoso mestre da

Palma de Ferro. Li Tsung, o mais famoso mestre de Pa Kua daquela ép oca. Chen Ting Hua, conhecido pelo apelido de "Cobra Inv encível", feroz

lutador de Hsing I. Mestre Hung, que tinha mais de 5.000 discípulos fan áticos no estilo

Pa Kua. Feng yu Hsiang, mestre de Hung Gar e dirigente da S ociedade

Secreta "União pela Grande Espada". Tsu Hsin Wu, criador da escola do sul "Tsu Jen Men" , especializada

na arte de guerrilha Su Tzu e no estilo Shuai Chiao . Chan Ti San, discípulo do grande mestre Ho Yuen Chi a, que por

estar doente não pôde comparecer. É curioso notar que Bruce Lee interpretou no filme "Fists of Fury"

(Fúria do Dragão, no Brasil), o papel de aluno de H o Yuen Chia vingando a morte de seu mestre, que foi envenenado pelos japon eses.

Essa reunião tinha por objetivo reunir a força dess es mestres para derrubar o poder Manchu representado pela imperatri z e expulsar os estrangeiros.

Essa reunião dos mestres foi muito importante para o desenvolvimento do Kung Fu, visto que a união em pr ol de um objetivo comum - derrubar os Manchus e expulsar os estrangei ros - criava união entre mestres e fazia cessar as guerras entre difer entes estilos.

Como consequência dessa união de forças, nesse mesm o ano principiou a revolta dos boxers, mas devido a traiç ões internas (mestres menores invejando e fofocando contra os que se dest acavam já havia

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naquela época) e outros fatores, esse início da rev olta foi muito conturbado e muita gente foi capturada e executada.

Os estrangeiros já eram muito influentes politicame nte, e se valiam dessa influência para impor drásticas medidas de re pressão e de controle militar, que acabaram minando a resistência inicial dos boxers e forçando a captura de milhares de lutadores.

Só na cidade de Pequim foram executados 3.000 desse s lutadores. Conta-se que os carrascos recebiam prêmios em dinhe iro caso

vencessem o concurso diário de cortar as cabeças. Os mais afoitos chegavam a cortar mais de sessenta cabeças por

dia. Considerando que levasse dez minutos para retirar o prisioneiro do

calabouço, sessenta execuções representava para o c arrasco dez horas de trabalho diário, sem parar sequer para as refeições .

E havia vários carrascos trabalhando ao mesmo tempo . Mas a coisa não parou por aí. No ano seguinte (1899 ), os boxers se

reagruparam e estavam ainda mais motivados devido à s execuções de seus companheiros.

Nessa altura dos acontecimentos, a Sociedade da Jus tiça e da Concórdia de Chu Hung Tang já contava com milhares de adeptos, que eram sistematicamente doutrinados para odiar os est rangeiros.

A matança inicial dos boxers só serviu para exacerb ar ainda mais os ânimos esquentados e a revolta acabou por escapar d o controle dos mestres.

Embora a maioria dos mestres envolvidos tivesse um comportamento ético e pautassem suas ações dentro d e um determinado padrão moral, seus subordinados estavam sedentos de sangue e não queriam mais saber de obedecer ordens.

Levados pela avalanche provocada pela sede de vinga nça e pelo ódio aos estrangeiros, a tentativa dos mestres em c ontrolar a turba, falhou.

Contra suas ordens e em oposição aos princípios mor ais do Kung Fu, muitos inocentes pagaram pelos pecadores.

Os homens religiosos, mesmo os padres cristãos e os pastores das missões protestantes da China, jamais haviam sido m olestados pelos praticantes de Kung Fu, pois eram considerados home ns de paz.

Da mesma forma, eram respeitadas as instituições as sistenciais e de caridade que acolhiam idosos e crianças órfãs.

Mas os boxers desprezaram os conselhos de seus mest res e criaram uma carnificina sem par na História da China, destr uindo igrejas, escolas e hospitais, matando religiosos, médicos, mulheres, a nciões, crianças e doentes que estivessem nessas instituições. Em 1900 - conhecido como o "Ano da Revolta dos Boxers" - os revolucionários já ocupavam quase toda Pequim.

Embora a revolta de 1900 tenha sido extremamente cu rta (durou de junho a agosto apenas), centenas de combates foram travados e milhares de atrocidades perpetradas.

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Embora chamada de Revolta dos Boxers, a revolução j á não pertencia aos boxers, pois a população havia se uni do e com a proposição de apoiá-los cometia grandes morticínios, numa reva nche vingativa e cega pelos muitos anos de opressão e penúria.

O grosso da revolta iniciou no dia 20 de junho de 1 900, forçando o governo a tomar drásticas medidas para sobreviver.

No dia seguinte ao início da revolta, (21 de junho) o governo declarou oficialmente guerra aos estrangeiros.

Com a tomada de Pequim as fraternidades e sociedade s secretas organizaram desfiles para demonstrar suas forças.

Entre outras participaram do desfile as Sociedades Tríades, a Sociedade do Lótus Branco, os Turbantes Amarelos e a Unidade da Grande Espada.

Por ocasião dos desfiles das Fraternidades que toma ram Pequim, os ocidentais haviam se refugiado dentro das muralhas da cidade velha.

Por trás dessas muralhas havia tropas ocidentais. Os comandantes ingleses eram muito orgulhosos de se us feitos

militares nas colônias e estavam acostumados a cont er revoltas populares e mesmo rebeliões armadas na Índia.

Suas tropas eram especialistas em lidar com situaçõ es denominadas "Carga de Cavalaria Ligeira" .

Faziam parte dos batalhões ingleses sediados em Peq uim várias tropas indianas "Gherkas", compostas por temíveis l utadores Singhs, especialistas na luta corpo-a-corpo e no manejo do punhal ondulado (Kriss).

Havia também as tropas de combatentes argelianos, o s Zuavos, ferozes e calejados soldados com muita prática em g uerra de guerrilhas.

Os regimentos ingleses e franceses uniram-se e atac aram os revoltosos, mas foram derrotados.

Mesmo seus fuzis e baionetas não eram páreo para as lanças e espadas dos praticantes de Kung Fu.

Muitos mestres e lutadores famosos se davam ao luxo de enfrentar os soldados estrangeiros fortemente armados, usando apenas os seus punhos nus.

As perdas chinesas foram mínimas, ao passo que o ex ército estrangeiro foi inteiramente dizimado, sobrando ape nas uns poucos homens.

Embora o povo chinês estivesse orgulhoso da vitória , os mestres sabiam que o pior ainda estava por vir, e que dific ilmente teriam condições de enfrentar as armas pesadas dos ocidentais.

No dia 11 de julho os regimentos alemães chefiados pelo Conde Waldersse entrou em batalha com os boxers.

Esses regimentos alemães eram formados por soldados prussianos, experientes em inúmeras batalhas, chamados Bandebur gueses e tendo como emblema a Águia Alemã.

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Era uma tropa de elite onde só eram admitidos homen s com mais de um metro e noventa de estatura, que passavam por te stes de admissão que exigiam suprema força e coragem.

Era a Águia contra o Dragão. Os ocidentais eram homens fortes, enormes, superequ ipados,

obedecendo a uma formação que os dispunha em falang es de combate já testadas incontáveis vezes e respaldadas em técnica s militares cientificamente estudadas.

Os chineses eram miúdos e subnutridos, usando armas rudimentares: facas, paus, pedras, enxadas, corrent es, etc.

A batalha durou apenas uma hora e os alemães foram forçados a recuar com seus poucos sobreviventes.

Até essa batalha com os alemães os ocidentais ainda não tinham usado suas armas de fogo de maior alcance, porque a chavam que feria sua honra usar armas sofisticadas contra uma plebe dest reinada, desarmada e pertencente a uma raça inferior.

Mas tendo em vista as derrotas sofridas os ocidenta is perderam seu amor à honra e começaram a usar plenamente todos os recursos bélicos que dispunham.

Em desespero de causa os chineses invadiram os muse us e se apossaram de todos os tipos de armas de fogo antiga s em que conseguiram pôr a mão.

E armados de umas poucas escopetas, trabucos e pist olas antigas

tentaram atacar as muralhas da cidade antiga onde o s ocidentais se abrigavam.

Graças à ajuda de um velho canhão que disparava bol as de fogo de mais de 100 quilos conseguiram abrir brechas nas mu ralhas e por elas tentaram passar.

Mas as armas mais sofisticadas dos ocidentais os im pediram e foram mortos aproximadamente quinze dos grandes mes tres e mais de 1.000 boxers.

No dia 14 de julho chegaram os reforços pedidos pel os ocidentais. Constava de tropas americanas, européias e japonesa s, que logo ao

chegar ocuparam a cidade de Tien-Tsin. No dia 14 de agosto o exército ocidental chegou em Pequim, com

8.000 homens fortemente armados, mais de cem canhõe s e 20 metralhadoras de longo alcance.

O cerco dos boxers a Pequim durou cinquenta e dois dias. Enfrentaram bravamente as tropas aliadas e perecera m

gloriosamente em batalha defendendo o direito à lib erdade de seu povo e a necessidade de preservar seus valores culturais con tra o estrangeiro predador.

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Não era a primeira e nem seria a última vez que oci dentais invadiram outros países e outros povos, impedindo-os de exerc erem sua liberdade na escolha de seus governantes e na preservação de sua cultura.

Os boxers conseguiram resistir durante treze dias a té serem dizimados completamente no dia 27 de agosto de 1900 .

Pereciam com eles dezenas de estilos de Kung Fu que desapareceram para sempre por terem sido mortos seu s mestres e praticantes mais destacados.

Jamais saberemos como seria hoje o Kung Fu se algun s desses mestres tivessem conseguido sobreviver.

Com eles morreram segredos marciais insubstituíveis e técnicas primorosas, que provavelmente nunca mais serão reen contradas.

Participaram dessa revolta: de um lado os mestres d o Kung Fu, os membros das Fraternidades, das Tríades e das Socied ades Secretas e, por outro lado soldados bem nutridos, fortemente armado s e exemplarmente treinados da Alemanha, Argélia, Áustria, França, Ín dia, Inglaterra e Japão.

A resistência chinesa era dirigida por homens de fe rro como o General Feng-Yu-Hsiang que comandava o célebre bata lhão Ta-Tao-Tui.

Este e outros generais pereceram lutando ombro a om bro com seus

soldados diante das armas de fogo mais sofisticadas de outros países. Durante muitos anos o Kung Fu foi banido da China, tendo sido

preservado por uns poucos aficcionados que o pratic aram em segredo até há poucas décadas, quando novamente foi liberado e conquistou seu lugar ao sol.

O General Feng-Yu-Hsiang criou um famoso lema para sua tropa de revolucionários, lema esse que motivaria Bruce Lee a criar outro lema de grande impacto. Vejamos:

O lema de Feng-Yu-Hsiang: Quando combatemos Usamos as balas de nossas armas Quando acabam as balas Usamos as baionetas Quando se quebram as baionetas Usamos as coronhas dos fuzis Quando se quebram as coronhas Usamos nossos punhos Quando cortam nossos punhos Nós os mordemos O lema de Bruce Lee: Aproxima-te do Jeet Kune Do Com a idéia de dominar a vontade.

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Esquece a vitória ou a derrota; Esquece o orgulho e a dor. Deixa teu adversário arranhar tua pele E esmaga a carne dele; Deixa-o esmagar tua carne E fratura-lhe os ossos; Deixa-o fraturar seus ossos E toma a vida dele! Não te preocupes em escapar ileso Deixa tua vida diante dele.

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Apólogos do Kung Fu O Kung Fu, a título de propiciar uma formação moral a seus

praticantes, cultiva em sua tradição um sem-número de apólogos que, tais como as parábolas do Cristianismo primitivo, transm item profundos ensinamentos.

A título de ilustrar como são esses apólogos, a seg uir narro alguns deles na esperança de que o leitor saiba apreciá-lo s e consiga extrair deles os ensinamentos especiais que ocultam.

A Especialização Marcial Há muito, muito tempo, quando a ilha de Okinawa per tencia aos

chineses e os okinawenses aprendiam técnicas de Kun g Fu que mais tarde dariam origem ao Karate (se não acredita, leia os l ivros de Ginchin Funakoshi), morava nessa ilha um velho mestre chinê s que transmitia sua arte com muito desvelo e carinho.

Dentre os inúmeros discípulos desse mestre havia tr ês que eram seus alunos prediletos.

Desses três, um havia se dedicado exclusivamente às técnicas de luta com as pernas e se tornara muito famoso como " O Homem da Perna de Ferro".

Outro gostava apenas das técnicas manuais e se toma ra eficientíssimo no uso dos braços e das mãos, granje ando fama como "O Homem dos Punhos de Aço".

O terceiro não se especializou em técnica alguma, c ontentava-se em seguir plenamente os ensinamentos do mestre e dedic ava-se tanto às técnicas de perna, quanto às técnicas de mão.

Por não se ter especializado em nada, não era famos o como os outros dois e embora querido por seu mestre, perman ecia na obscuridade e era pouco conhecido.

Com o passar dos anos, o velho mestre vendo chegar o fim de seus dias, convocou o povo a ouvir suas últimas palavras .

Como era um homem probo e caridoso as pessoas de su a aldeia vieram ouvi-lo.

Nessa sua última mensagem conclamou todos à prática da caridade e da fraternidade, incentivou-os a continuarem prat icando o Kung Fu como forma de cultura física e recurso para defender a i lha de possíveis invasores.

Em seguida fez vir à sua presença seus três alunos favoritos e apresentando-os ao povo disse-lhes que se um dia ti vessem problemas com algum mau elemento que ameaçasse suas vidas ou seus bens, confiassem a defesa da ilha a esses seus três discí pulos. Terminando de dizer estas palavras, expirou.

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No banquete que foi realizado após o passamento do mestre (os chineses comemoram a morte com festas e banquetes), foram dados lugares de honra aos dois lutadores famosos, pois s eus feitos eram muito conhecidos e as canções e danças da ilha reproduzia m muitas de suas histórias.

O terceiro lutador conseguiu um lugar afastado entr e os alunos menos conhecidos do mestre.

Os anos foram se passando e os dois lutadores famos os cada vez venciam adversários mais poderosos e mais e mais au mentavam a fama que possuíam.

As crianças corriam atrás deles nas ruas gritando s eus nomes; quando iam ao mercado os comerciantes lhes oferecia m presentes e dinheiro.

Todos se sentiam honrados em hospedá-los e alimentá -los. O terceiro lutador continuou desconhecido. Todos os dias pela

manhã abria os portões do quintal da casa do mestre , onde continuou a morar e recebia aqueles que o procuravam para apren der Kung Fu, ensinando-os com o mesmo carinho que costumava ter quando o mestre era vivo.

Às vezes um dos dois lutadores famosos, o "Homem dos Punhos de Aço" ou o "Homem da Perna de Ferro" vinha à academia e era recebido com muita alegria pelos alunos que os convidavam a ensinar suas técnicas prodigiosas.

Os anos foram se passando e certo dia a ilha foi in vadida por um bando de salteadores chineses chefiados por um band ido feroz, exímio praticante de Kung Fu.

Esse bandido atacava as aldeias, matava aqueles que resistiam, aprisionava os sobreviventes, arrancava-lhes as rou pas, saqueava o que podia e em seguida incendiava as casas.

Os sobreviventes, nus e humilhados, iam às aldeias próximas pedir socorro.

De todos os lados chegavam as mesmas notícias - ass assinatos, saques e incêndios destruindo as aldeias por toda a ilha.

Então o povo se lembrou das recomendações do velho mestre e saiu à procura dos dois lutadores famosos.

Conseguiram encontrar o "Homem da Perna de Ferro" e pediram sua proteção.

O "Homem da Perna de Ferro" era muito confiante, pois tinha vencido grandes adversários e tinha uma perna tão r ápida que nenhum outro lutador especialista em pernas conseguia supe rá-lo; procurou o bandido e o desafiou para uma luta.

O povo estava com ele e confiantes em sua habilidad e armaram-se de paus e pedras e cercaram o bando.

A luta começou, o bandido enfrentava o "Homem da Perna de Ferro" e seus asseclas lutavam com o povo.

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O bandido lançou alguns golpes com a perna que fora m

prontamente defendidos pelas pernas e joelhos de se u adversário, que prosseguiu arremessando-lhe chutes tremendamente po derosos e praticamente indefensáveis.

Sua técnica de pernas era tão superior que se dava ao luxo de florear, dando saltos no ar, giros, chutes repetido s com a mesma perna, etc.

O bandido era um lutador muito experiente e conheci a inúmeras técnicas do Kung Fu; adotou a defensiva e passou a observá-lo.

Notou que seu adversário mantinha os braços quase a bertos para melhorar seu equilíbrio de pernas; notou também que ele executava até as defesas com os pés, canelas e joelhos.

Lançou-se à frente e encurtou a distância até poder tocá-lo com os punhos, iniciando um ataque poderoso com golpes sim ultâneos de punhos, cotovelos, calcanhar, mãos e pontas dos ded os.

Atingido por essa saraivada de golpes o "Homem da Perna de Ferro" tentou se afastar para poder ter espaço para desfer ir seus chutes poderosos, mas quanto mais se afastava mais o bandi do se lançava para a frente encurtando a distância e atingindo-o pesadam ente com as mãos.

Em desespero tentou golpes com joelhos e pisões cur tos, mas os golpes com os punhos eram muito rápidos e atingiam- lhe a cabeça, esmagando-lhe as orelhas, os lábios, os dentes, o n ariz e os olhos.

Tentou se afastar mais rápido para poder chutar, ma s quando conseguia se afastar o bandido o empurrava desequil ibrando-o e prosseguindo com a saraivada de socos.

Dessa maneira foi acuado contra o canto de uma casa onde, impedido de usar as pernas, foi surrado até morrer.

Quando o povo viu que o famoso "Homem da Perna de Ferro" tinha morrido fugiu apavorado, com o bando em seus calcan hares.

Diversos mensageiros saíram em busca do "Homem dos Punhos de

Aço" e contaram-lhe o que tinha acontecido suplicando-l he que os auxiliasse.

O "Homem dos Punhos de Aço" sorriu com superioridade: - Então o "Homem da Perna de Ferro" havia sido vencido por um bandido especialista no uso das mãos não é?

Ninguém era suficientemente bom com os punhos para enfrentá-lo. Havia vencido dezenas de adversários que eram exími os lutadores

com as mãos, venceria o bandido com facilidade... Quando acharam os bandidos a luta recomeçou. O bandido encarou seu adversário e imaginou que com o o anterior

este também era especialista no uso das pernas, res olveu acabar logo com a coisa, encurtando a distância e partindo para uma série de golpes de punhos.

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O "Homem dos Punhos de Aço" adorou essa aproximação, o bandido estava vindo de encontro a seus punhos pode rosos, capazes de varar uma parede de pedras.

Cada soco que o bandido lhe dava era habilmente def endido e desviado.

Mas o bandido era um lutador experiente e logo perc ebeu que jamais venceria aquele oponente apenas desferindo golpes c om seus punhos.

Começou a guardar uma certa distância do adversário , afastava-se o suficiente para que os punhos do "Homem dos Punhos de Aço" não pudessem atingi-lo.

Quando o "Homem dos Punhos de Aço" tentava encurtar a distância, esquivava-se e fugia do ataque linear.

Quando não conseguia evitar o encurtamento da distâ ncia tentava apresar os braços do adversário e aplicar-lhe torçõ es.

Começou a observar atentamente o seu jogo de perna e notou que nunca desferia golpes com as pernas, nem possuía um jogo de pernas eficiente.

Começou a usar suas pernas contra ele e em determin ado momento conseguiu derrubá-lo com a rasteira circular poster ior.

Assim que o "Homem dos Punhos de Aço" caiu no chão o bandido pulou em cima dele e aplicou-lhe uma chave de braço .

O herói nunca tinha lutado no chão, e não sabia o q ue fazer, tentou ainda uns socos desesperados mas teve seu braço dir eito deslocado à altura do cotovelo, em seguida foi asfixiado pelo b andido que o matou.

Ao perceberem que o "Homem dos Punhos de Aço" havia sido morto o povo debandou apavorado.

O povo da ilha não sabia mais o que fazer, havia ai nda o terceiro

aluno do mestre falecido, mas se os outros dois que eram verdadeiros heróis, famosos por suas lutas, nada haviam consegu ido contra o bandido, o que conseguiria o outro lutador que era apagado, nunca havia realizado grandes feitos, não possuía técnicas mirabolantes e nem havia vencido grandes adversários?

E nem se incomodaram em chamá-lo. Enquanto isso o bando de facínoras progredia em seu avanço

devastador, arrasando as aldeias por onde passavam. Mas os rumores das atrocidades cometidas pelos band idos e a

notícia da morte dos dois heróis do Kung Fu chegara m ao terceiro lutador. Certa manhã reuniu os alunos da academia e disse-lh es: "- Hoje nosso treinamento será diferente. Peguem as armas e sigam-

me." Não tiveram que andar muito para achar os bandidos. A luta

começou rápida e não tardou para que ambos os chefe s se enfrentassem. Quando o bandido começou a lutar com ele imaginou q ual seria a

especialidade de seu adversário - pernas ou punhos?

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Arriscou alguns chutes e estes foram habilmente def endidos e revidados à altura; resolveu mudar de tática, lanço u alguns socos e estes também foram defendidos e devolvidos.

Lançou-se à frente tentando encurtar a distância, m as foi rechaçado por uma saraivada de golpes certeiros que penetrara m em sua guarda pelo centro de seu corpo.

Tentou agarrar as mãos do adversário e ficou surpre so em descobrir que ele era liso e sabia esquivar-se com admirável habilidade.

Começou a socar com força, mas o lutador ao invés d e defender formalmente seus golpes desviava-os para fora com h ábeis movimentos com os cotovelos, somados a um sutil giro de cintur a.

O bandido reparou que seu adversário completava seu s ataques com apresamento de seus braços seguidos de revides formidáveis.

Outro detalhe interessante é que cada braço que exe cutava uma defesa estava lançando um ataque quase que simultan eamente.

Tentou dar alguns chutes para aumentar a distância mas suas pernas eram bloqueadas antes mesmo que os pés saíss em do chão.

O lutador bloqueava soltando golpes curtos com o ca lcanhar sobre a coxa, joelho e canela do bandido.

Tentou aplicar um golpe de torção mas o rapaz esqui vou-se num giro completo pelo outro lado e acabou por prender- lhe o pulso direito com mão de ferro.

Quando puxou o pulso a fim de se livrar, o adversár io dobrou o pulso arremessando o cotovelo da frente e caindo so bre ele com todo o peso do corpo.

O impacto no peito foi enorme e quebrou várias cost elas, fazendo com que sentisse gosto de sangue em sua boca.

Ainda tentou ensaiar vários golpes, mas cada vez qu e arremessava um ataque era atingido na área de seu corpo que est ivesse menos defendida, começou a cansar-se, a abaixar a guarda e a apanhar feio.

Não demorou muito tinha deslocado o ombro e o torno zelo, logo mais desabou ao chão e não mais conseguiu se levant ar.

Quando os outros bandidos viram que o chefe estava fora de combate, perderam o espírito da batalha e da melhor forma que puderam trataram de fugir.

A essas alturas o povo começou a se juntar em volta do lutador e de seus alunos e fizeram uma festa para comemorar a ex pulsão dos bandidos e a descoberta de um novo herói do Kung Fu.

Influências Taoístas As influências taoístas se faziam mais marcantes na s Artes Internas,

tais como o TAi i Chi Chuan, o Hsing I e o Pa Kua. Não havia um código específico para os praticantes das Artes

Marciais, o que se recomendava era a prática do Cam inho (Tao) e os estudos do "Tao Te Ching”.

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O Tao Te Ching é a obra fundamental do Taoísmo. Influências Budistas Diante da necessidade de impedir que os aprendizes de Shaolin

usassem seus conhecimentos de Kung Fu com más inten ções, o Monge Kwok Yuen, o grande recodificador de Shaolin que vi veu por volta do século XVI, instituiu as "Dez Normas Budistas".

A cada uma dessas normas acompanham vários apólogos , dentre os quais alguns foram selecionados e serão descritos n este livro.

Esses apólogos estão incluídos logo após a interpre tação de cada uma das Dez Normas Budistas que transcrevemos a seg uir.

As Normas Budistas 1 - O praticante de Kung Fu deve treinar sem interr upção. 2 - O praticante de Kung Fu deve usar suas técnicas apenas para

defesa pessoal. 3 - O praticante de Kung Fu deve respeito a todos o s mestres de

Kung Fu e a todos os discípulos que praticarem o Ku ng Fu há mais tempo que eles.

4 - O praticante de Kung Fu deve ser amigo de seus colegas e

demonstrar em suas atitudes bondade e honestidade. 5 - O praticante de Kung Fu deve evitar demonstraçõ es de técnicas,

mesmo que para isso tenha que recusar um desafio. 6 - O praticante de Kung Fu jamais deve ser agressi vo ou ter

maneiras rudes. 7 - O praticante de Kung Fu jamais deve comer carne ou provar

bebidas alcoólicas. 8 - O praticante de Kung Fu deve conter seus impuls os sexuais. 9 - O praticante de Kung Fu não deve ensinar suas t écnicas a

ninguém que não seja budista. 10 - O praticante de Kung Fu tem que se imunizar co ntra a cobiça, a

agressividade e a fanfarronice.

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As Normas Budistas

Neste capítulo interpretarei com brevidade cada uma das Normas Budistas e incluirei um apólogo que elucide sua apl icação.

1 - O praticante de Kung Fu deve treinar sem interru pção. Praticar a todas as horas do dia é um velho conheci mento, sempre

presente na vida dos grandes ases do Kung Fu ou de qualquer outro esporte.

Conta-se que Bruce Lee durante suas aulas escolares colocava as mãos sob a carteira e pressionava com força para tr einar os músculos do antebraço. Quando assistia televisão à noite Bruce aproveitav a os intervalos comerciais para treinar os braços com halteres. Linda Lee conta que quando ele tomava banho de chu veiro ficava na posição Kin Nheung Mah do estilo Wing Chun para tre inar as pernas e os joelhos. São muito conhecidas as artimanhas utilizadas por esportistas famosos para incluir técnicas de treinamento nos mo mentos mais comuns de seu dia-a-dia.

O famoso homem forte Charles Atlas, costumava carre gar tampinhas de garrafa e pregos em seus bolsos para amassar e e ntortar entre os dedos enquanto viajava de ônibus.

Muitos jogadores de beisebol costumam levar uma bol inha de borracha em seus carros e se dedicam a apertá-las c om as mãos enquanto esperam os semáforos abrirem, dessa forma exercitan do os músculos do braço. O atleta Francisco José D'Urbano, campeão brasilei ro de Kung Fu em sua categoria, costuma praticar flexões de calej amento entre uma e outra aula ministrada na União Nacional de Kung Fu. A superação é a marca do campeão, se você faz apena s o que o instrutor manda, você jamais será nada além de um medíocre lu tador.

"Certo jovem chinês, desejoso de aprender as técnic as do Kung Fu Shaolin, submeteu-se aos testes de admissão do temp lo e em seguida foi encaminhado à presença do mestre.

Diante do mestre pôs-se a descrever sua ansiedade e m tomar-se um lutador poderoso, seus desejos com relação à Arte M arcial, sua admiração pela arte de chutar, socar, saltar, lutar, etc.

Quando terminou de falar o mestre permaneceu algum tempo em silêncio e depois lhe explicou que o valor no Kung Fu não está na força e no poder e sim no conhecimento.

O garoto continuou a insistir em sua admiração pela s técnicas de luta.

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O mestre lhe contou a respeito de um touro que entr ou em uma loja de louça e pisoteou os vasos e as cerâmicas finas, reduzindo tudo a cacos.

O menino continuou a elogiar as técnicas que havia presenciado e os lutadores que havia conhecido.

O mestre insistiu que as ambições dele eram demasia das e que se quisessem aprender tudo aquilo, uma vida só não bas taria.

Ele respondeu que não tinha muito tempo, que tinha pressa e que queria aprender mesmo que fosse umas poucas técnica s.

Mais uma vez o mestre o aconselhou a meditar no tou ro da loja de louça fazendo-o ver que podia se transformar nesse touro, e que acabaria por destruir ao mundo a seu redor como o touro dest ruiu a loja.

Mais o jovem continuou a insistir mais e mais em ap render as técnicas que desejava.

O mestre então lhe propôs uma última prova antes de ser admitido aos ensinamentos marciais do templo.

A prova consistia em amassar uma folha de papel tra nsformando-a em uma bola e depois alisá-la novamente e recomeçar outra vez, transformando-a novamente em bola e alisando e pros seguindo assim até que o papel se reduzisse a tiras; deveria então peg ar outra folha e recomeçar.

Esse exercício deveria ser feito diariamente por do ze horas, durante três anos.

Terminados os três anos o jovem retornou à presença do mestre e este indagou:

- Praticou continuamente durante doze horas diárias como lhe foi recomendado?

- Sim; respondeu o jovem. - Então pode ir embora - respondeu o mestre. - Seu aprendizado

terminou. O jovem ficou muito aborrecido e decepcionado, pois tinha seguido

à risca as instruções do mestre. À custa de muito sacrifício tinha praticado doze ho ras diárias e

agora o mestre se recusava a lhe ensinar o que tant o queria. Sentiu-se enganado e culpou o mestre por ter lhe ro ubado três anos

de sua vida. Voltou para casa e assim que chegou, seu irmão que estava no

banho pediu-lhe que lhe esfregasse as costas. Começou a esfregar as costas do irmão mas teve que parar, pois

descobriu que por onde passava sua mão a carne se a bria e jorrava sangue..."

2 - O praticante de Kung Fu deve usar suas técnicas apenas para

defesa pessoal.

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Uma pessoa que sabe Kung Fu tem superioridade físic a sobre as pessoas que não aprenderam técnicas de defesa pesso al, independente de sua estatura e peso.

O que você pensaria se visse um adulto espancando u ma criança? Nessa mesma proporção, um praticante de Kung Fu que use sua

superioridade técnica para subjugar alguém que desc onheça as técnicas de defesa pessoal, age como um adulto que espanca u ma criança.

Da mesma forma que é de se esperar que um adulto nã o abuse de sua estatura para infligir castigos físicos a uma c riança, também é de se esperar que um praticante de Kung Fu não abuse de s eus conhecimentos técnicos para espancar qualquer pessoa, seja adulta ou não, seja maior em estatura ou não.

Aliás, o Código Penal Brasileiro condena qualquer pessoa que mate seu adversário usando golpes desferidos com as mãos nuas, mesmo que o adversário esteja armado.

Os antigos afirmavam que o Kung Fu tinha por objeti vo transmitir ensinamentos de autodisciplina e autoconhecimento, não devendo jamais ser usado contra outro ser vivo (seja homem ou anim al).

"O Rei Suan da dinastia Chou era um guerreiro valen te e muito

poderoso. Certa vez ouviu falar do grande Mestre Po-Kung-Hi e de sua grande

fama; decidiu-se a procurá-lo e medir suas forças c om ele. Quando chegou diante de Po-Kung-Hi perguntou-lhe qu al era sua

especialidade, em que técnica era mais forte. Po-Kung-Hi respondeu:

- Posso arrancar a perna do gafanhoto e impedir que a cigarra abra suas asas.

Espantado, o Rei Suan lhe disse: - Sou capaz de atravessar o couro de um rinoceronte com um só

golpe de meus punhos. Como é que você, capaz de fei tos insignificantes é mais famoso do que eu?!

Po-Kung-Hi respondeu: - Aprendi de Tze-Shang-Chi, que era tão forte que j amais houve

outro lutador como ele, mas cujas proezas nunca for am vistas por alguém, pois não gostava de se exibir."

Um dos melhores livros sobre Artes Marciais traduzi do para línguas ocidentais é o "Karate-Do My Way of Life" , de Gichin Funakoshi - o criador da palavra Karate.

Nessa obra o autor relata que quando estava com oit enta anos foi surpreendido por um assaltante que tentou roubá-lo, em um dia de chuva em que carregava em sua mão esquerda um saco conten do uma lancheira vazia e alguns livros, e na mão direita um guarda-c huva.

Tal fato ocorreu enquanto voltava para casa e camin hava entre as estações Otsuka e Hikawashita, em Tóquio.

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O marginal arrebatou-lhe o guarda-chuva das mãos e tentou golpeá-lo com a ponta.

Funakoshi agachou-se e com a mão direita agarrou fi rmemente os testículos do adversário.

O guarda-chuva caiu no chão na hora e o rapaz começ ou a gemer parecendo que ia morrer.

Funakoshi termina esse relato dizendo: "... Eu tinha feito o que constantemente tinha dito a meus jovens

discípulos para nunca fazerem... Não me senti muito orgulhoso de mim mesmo." Citado do "Karate-Do My Way ofLife" , Kodansha International, First Paperback Edition, 1981 - Página 112.

Essa pequena história mostra a grandeza de Funakosh i, que foi um

grande artista marcial e que pregava a seus discípu los a segunda norma budista.

3 - O praticante de Kung Fu deve respeito a todos os me stres de Kung Fu e a todos os discípulos que praticarem o Ku ng Fu há mais tempo que eles.

A tradição do Kung Fu relata que as escolas marciai s da velha China eram administradas dentro de um sistema quase famil iar.

O mestre era considerado como um pai e sua esposa c omo mãe. Os alunos mais antigos eram tidos como irmãos mais velhos e

tratados com todo o respeito. As pessoas que iniciavam o treinamento juntas trata vam-se umas às

outras como irmãs. Os discípulos que entrassem depois delas eram trata dos como

irmãos mais novos e mereciam toda a atenção e prest imosidade. Dentro desse espírito de fraternidade os outros mes tres eram

também respeitados por seus conhecimentos e mesmo q ue dois mestres não se dessem entre si, seus discípulos os respeita riam igualmente e jamais fariam críticas ao outro mestre.

Foi esse respeito mútuo que garantiu a sobrevivênci a do Kung Fu até nossos dias, e quando os mestres de Kung Fu dei xarem de se respeitar dessa maneira, ou se permitirem criticar a outros m estres diante de seus alunos, estarão contribuindo para o desaparecimento do Kung Fu.

"O discípulo Li certa vez perguntou ao Mestre Shiu se tinha ouvido falar no Mestre Pu Hao, cuja técnica era inferior e de origens desconhecidas.

Mestre Shiu respondeu que nunca havia ouvido falar em Mestre Pu Hao, mas que conhecia Mestre Hao, que era um mestre respeitável e que, embora possuísse poucos conhecimentos técnicos, con tribuía muito para a preservação dos verdadeiros conhecimentos do Kung Fu."

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4 - O praticante de Kung Fu deve ser amigo de seus colegas e demonstrar em suas atitudes bondade e honestidade.

Ser amigo de alguém, principalmente de um colega de treinos,

implica em interessar-se genuinamente pela outra pe ssoa. Quando somos amigos de alguém, nos interessamos por seu

progresso, nos entristecemos quando percebemos que não consegue seus objetivos, nos sentimos felizes quando vemos o suce sso que consegue alcançar.

É muito importante que o praticante de Kung Fu deix e de ser infantil em seu comportamento com relação aos colegas.

O praticante infantil é aquele que perde um tempo p recioso criticando colegas de treino.

O praticante infantil adora corrigir os outros, sem dar a devida atenção à correção das próprias falhas.

O praticante infantil quando se torna bom de luta, começa a esnobar os colegas de treino, não os cumprimenta mais, não responde a seus cumprimentos, toma atitudes orgulhosas com relação a todos.

O praticante infantil não sabe substituir as fofoca s que ouve pela realidade que vê.

O praticante infantil não compreende que não é impo rtante ser o melhor de sua escola.

O praticante infantil não compreende que a verdadei ra Arte Marcial não consiste em vencer aos outros e sim em VENCER A SI MESMO.

Vencer a si mesmo implica em dominar os sentimentos de superioridade, os comportamentos egoístas e substit uir o desejo de ser melhor que os outros pelo interesse sincero em ser bondoso, amigo e leal com os companheiros, não só de sua academia como da s academias que ensinam estilos diferentes do seu.

Esse tipo de batalha é a mais difícil de todas, mas a vitória final obtida com essa luta é a maior de todas.

"Nos tempos antigos havia dois praticantes de Kung Fu chamados Li

e Ping, que desde crianças haviam praticado juntos, tendo se tomado grandes amigos.

Certo dia resolveram tatuar seus braços com a mesma tatuagem como símbolo da amizade que os unia, dessa forma se tomaram irmãos e se juraram fraternidade enquanto vivessem.

Devido a razões de família, separaram-se e não mais se tornaram a ver.

Com o tempo tomaram-se adultos e seguiram caminhos diferentes. Embora ambos continuassem a treinar o Kung Fu com r egularidade

e persistência, Li se tomou famoso comissário de po lícia enquanto Ping tomou-se um jogador.

Uma ocasião Li foi enviado a uma cidade distante pa ra deter uma gangue de traficantes que mantinha um cassino ilega l.

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Li invadiu o cassino e enfrentou a todos os bandido s que lá estavam, tendo vencido brilhantemente graças a seu domínio do Kung Fu.

Em seguida teve que enfrentar o chefe da gangue que se ocultara em uma sala especialmente reforçada.

Com algum esforço Li conseguiu penetrar na sala e e nfrentá-lo. Quando começou a lutar Li percebeu que se tratava d e seu grande

amigo Ping, mas como cada um lutava pelo que julgav a ser seu dever brigaram durante horas.

Finalmente Ping conseguiu vencer a Li e quando o se u amigo estava caído no chão ensanguentado, abraçou-o fortemente e chorou muito.

Como todo praticante de Kung Fu conhece profundamen te Acupuntura, Ping tratou de seu amigo até que se rec uperasse plenamente.

Quando Li já estava bom, Ping o acompanhou e se ent regou à justiça.

5 - O praticante de Kung Fu deve evitar demonstrar suas técnicas, mesmo que para isso tenha que recusar um desafio.

Esta regra foi criada para impedir que as técnicas do Templo Shaolin

fossem aprendidas por algum praticante de Kung Fu d e outro estilo que as poderia usar com propósitos menos elevados.

Como praticante de Kung Fu você se torna responsáve l pelo que sabe e não deve transmitir seus conhecimentos indis criminadamente.

Se você ensina o que sabe a alguém e esse alguém fa z mau uso do que aprendeu, você é o responsável.

Além do que, muitos praticantes de Kung Fu transmit em seus conhecimentos não com a intenção de ajudar seus dis cípulos, e sim com o desejo de se sentir importante, por orgulho das téc nicas que aprendeu.

"Antigamente vivia próximo ao lago Ching-Hai um jov em monge que possuía grande habilidade em Kung Fu.

Sendo tão hábil na arte de lutar esse monge era mai s ou menos convencido e orgulhoso.

Seus colegas monges gostavam muito dele e por amiza de o advertiam que deveria controlar seu temperamento e que essa sua habilidade pessoal não deveria tomar conta de sua m ente, havendo coisas muito mais importantes na vida.

Não sendo burro, o monge compreendeu que seus amigo s tinham razão e dedicou-se a seus estudos, à leitura de liv ros de Filosofia e à prática da meditação.

No outono do ano seguinte, realizou-se uma grande c ompetição de Kung Fu em Sagan-Ushu e o monge obteve autorização para par¬ticipar dela.

Chegando ao local das competições enfrentou todas a s classes de lutadores; desde outros monges muito habilidosos em Kung Fu, a

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guerreiros de terras distantes exímios praticantes de outras modalidades marciais.

Devido a sua grande habilidade foi sagrado campeão e iniciou a viagem de regresso.

Quando já caminhava há algum tempo, encontrou um lu tador que o desafiou a lutar.

Orgulhoso como estava por ter vencido a todos no ca mpeonato, o jovem monge esqueceu-se da quinta regra e aceitou o desafio.

Lutaram durante várias horas, até que o monge conse guiu vencer seu adversário mas, como havia anoitecido e estava cansado depois de tanta luta, decidiu dormir à margem do caminho. Com o raiar do Sol reiniciou sua caminhada de volta ao monastério.

Em determinado momento foi reconhecido por outros v iajantes que o convidaram a almoçar com eles. Quando terminou de almoçar um deles o convidou a l utar.

Sem poder recusar teve que enfrentá-lo. A luta tomou-lhe apenas meia hora, mas atraiu espec tadores e assim

que terminou de lutar um deles o atacou de surpresa , fazendo com que tivesse que lutar de novo.

Nem bem liquidou com seu novo oponente, se agachou para pegar sua bagagem, foi novamente desafiado e nesse moment o se recordou da quinta regra e dos conselhos de seus colegas monges , percebendo que onde quer que fosse sempre haveria alguém que o des afiaria.

À medida que lutava com o novo adversário, percebeu que este não era tão bom quanto os anteriores, o que lhe permiti u enfrentá-lo enquanto pensava em tudo que estava acontecendo.,

Foi então que os conhecimentos filosóficos que havi a estudado e as meditações que havia feito vieram a sua mente.

Chegou à conclusão que o EU INTERIOR era muito mais importante que o EU EXTERIOR.

Compreendeu que as vitórias que tinha obtido agrada vam apenas a seu EU EXTERIOR, a seu EGO, a seu orgulho infantil.

Compreendeu que o Kung Fu era a arte de vencer aque le impulso infantil de demonstrar aos outros sua grande habili dade.

Então passou a abrir a sua guarda, a não defender o s golpes do adversário e a deixar-se vencer.

Quando vencido foi ridicularizado e abandonado por todos, que passaram a seguir o novo campeão.

Caído no chão e ensanguentado pelos golpes de seu a dversário, que para ele teria sido tão fácil de vencer, o monge so rria feliz.

Não queria mais ser um grande campeão de Kung Fu, p ois sabia que o caminho de sua vida estava na meditação e no estu do.

Com a derrota aprendeu que o Kung Fu era o TEMPO DE HABILIDADE para converter seu Eu em algo profundo e muito grande.

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Sua habilidade continuava a mesma, continuava apto a defender-se em alguma ocasião de perigo, mas agora poderia sent ir satisfação com outras coisas além de sua capacidade de lutar.

Apanhou suas coisas e voltou ao templo."

6 - O praticante de Kung Fu jamais deve ser agressivo o u ter maneiras rudes.

O verdadeiro mestre de Kung Fu deve se esforçar por ter um

controle pleno sobre si mesmo, evitando os comentár ios desairosos sobre os outros mestres, evitando os desafios e os compor tamentos rudes e mal-educados.

"Vivia em uma pequena aldeia chinesa o Mestre Chan, famoso por

seus conhecimentos do estilo Shaolin, do estilo Ton g Long, por sua habilidade nas técnicas dos Oito Deuses Bêbados e p elo domínio da Palma de Ferro e das dezoito armas chinesas.

Em sua juventude havia sido um invejoso, sempre cal uniando outros mestres que tinham conseguido mais fama que ele.

Apesar de toda a sua habilidade no Kung Fu, sua mai or arma ainda era a fofoca, a maledicência, o desprezo.

Seus alunos, por confiarem nele, acreditavam que tu do que dizia era verdadeiro e passaram também a desprezar os outros mestres.

Esses outros mestres sabiam do procedimento do mest re Chan, mas não lhe queriam mal, simplesmente tinham pena dele.

Quando os discípulos desses mestres lhes perguntava m a respeito do Mestre Chan, estes lhes respondiam que se tratav a de um mestre muito valente, pena que fosse tão infantil e não soubesse respeitar a seus colegas.

Alguns mestres chegavam mesmo a recomendar sua esco la a pessoas que moravam próximas à sua região, recomend ação essa que Mestre Chan seria incapaz de fazer a respeito deles .

A valentia de Mestre Chan era muito grande. Certa v ez entrou sozinho na caverna de um grande urso negro que assu stava a população da vila, enfrentando a fera e saindo de lá com ele morto. Certo dia estava andando pela rua quando um ancião se aproximou dele e lhe disse:

- O senhor é um grande mestre e possui habilidades espantosas, mas por que, ao invés de perder tempo falando mal d e outros mestres, o senhor não enfrenta os três monstros que estão assu stando o povo?

Mestre Chan estranhou a interpelação e perguntou qu ais eram os três monstros.

O ancião explicou que havia um grande tigre rondand o o povoado e que já havia comido três homens.

Mestre Chan pegou suas armas e saiu em busca do tig re, matando-o a golpes de lança e punhal.

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Voltou ao povoado, procurou o ancião e lhe disse: - Já matei o tigre, qual é o próximo monstro? O ancião lhe contou que havia uma grande serpente q ue se ocultava

no caminho da aldeia atacando os viajantes. Mestre Chan pegou sua corrente articulada e foi atr ás da serpente,

matando-a. Quando voltou à aldeia perguntou ao ancião qual era o terceiro

monstro. O ancião respondeu: - Você é o terceiro monstro. Mestre Chan ficou furioso e ergueu seu poderoso pun ho para

fulminar o pequeno ancião. Mas o ancião continuou a falar: - Você é um grande mestre, para você é muito fácil me tirar a vida,

minha técnica não é suficiente para enfrentá-lo, ma s mesmo que você me mate continuará sendo o terceiro monstro, pois sua língua é ferina e venenosa e o mal que ela faz apaga todo bem que sua arte consegue fazer.

Mestre Chan abaixou seu punho e foi-se embora, pass ou toda a noite pensando, no dia seguinte juntou algumas roup as e caminhou até a montanha onde meditou durante três meses.

Enquanto meditava na montanha reparou que quando o vento forte derrubava os troncos vigorosos e acariciava as folh agens flexíveis, a chuva matava a sede dos dois.

Compreendeu que a chuva era mais sábia que o vento, e que todas as pessoas, boas ou más, com grandes ou com medíocr es conhecimentos, continuavam a merecer a luz do Sol e a água da chuv a.

Retornou à aldeia e o povo de lá ficou surpreso qua ndo viu que havia se modificado, suas maneiras eram as de um ho mem cortês e se comportava com amabilidade em relação a todos os ou tros mestres, mesmo com aqueles a que julgava ser superior."

7 - O praticante de Kung Fu jamais deve comer carne ou provar bebidas alcoólicas.

Esta norma se divide em duas partes, a primeira ref ere-se ao não

comer carne, a segunda ao não provar bebidas alcoól icas; trataremos cada uma dessas partes de cada vez.

Mesmo apesar de certas pessoas, por não serem budis tas não julgarem que seja errado comer carne, existem outra s razões para não comê-la.

Devemos um certo respeito ao nosso corpo e afinal d e contas, o corpo é o instrumento de que nos utilizamos para a prática do Kung Fu.

Existem muitas razões para não se comer carne e pod emos situá-las em dois contextos diferentes: o contexto espiritual e o contexto fisiológico.

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Se você teve oportunidade de ver a série Kung Fu na televisão deve ter reparado que Kwai Chang Caine, o personagem pri ncipal, não comia carne.

Nenhum monge budista come carne, visto que um dos p receitos do Budismo ensina a não fazer mal a ser algum.

Esse é um contexto espiritual envolvendo o ato de n ão comer carne, que é adotado por centenas de escolas filosóficas d o mundo todo desde a mais remota antiguidade.

Se você não come carne está na companhia de Alex Ca rrel, Are Werland, Bergson, Bernard Shaw, Brandt, Buda, Cerva ntes, Darwin, De Rose, Descartes, Diógenes, Éder Jofre, Einstein, Ep icuro, Epiteto, Gandhi, Jean Rostand, Jesus, Kant, Krishnamurti, Lao Tse, L eonardo da Vinci, Maeterlinck, Olegário Candeias, Ovídio, Pitágoras, Platão, Plutarco, Rousseau, Ruskin, Russell, Ryner, Santaiana, São Cl emente de Alexandria, São Francisco de Assis, São João Crisóstomo, Schopp enhauer, Schweitzer, Sócrates, Spencer, Spinoza, Tertuliano, Thoreau, Tolstoi, Voltaire, Weiss, William James, Zamenhoff, e milhar es de outros grandes homens. Portanto, seja esperto, não coma carne.

Veja bem que se você não tem bom senso, não o forço a nada, se decidir continuar a comer carne ou se decidir deixa r de comê-la o critério é seu, mas como verificará neste capítulo, existem ex celentes razões para deixar de comer carne.

As obras fundamentais das culturas mais espirituali zadas do mundo condenam o consumo da carne. Citando o Mahabharata:

"Pode haver alguém mais cruel e egoísta do que aque le que aumenta a carne de seu corpo comendo a carne de inocentes a nimais?

Aqueles que desejam possuir boa memória, beleza, vi da longa com saúde perfeita, força física, moral e espiritual, d evem abster-se de alimentos animais.

Virtude das mais sublimes consiste em não matar ani mais. Quando se pode obter facilmente tão copiosa quantid ade de

alimentos daquilo que cresce espontaneamente na ter ra, cometerás tão grande ato de crueldade como matar animais para enc her teu estômago e experimentar um pequeno prazer do paladar? Compara o homem que come com o animal que é comido. Um goza o prazer de comer que dura alguns momentos e o outro é desprovido de todos os prazeres da vida."

Citando os Vedas: "Não mateis nenhuma criatura viva, seja por alimen to, seja por prazer.

Não se mate nenhum animal para teu prazer, vê a har monia na Natureza e empresta tua mão auxiliadora a todas as criaturas vivas.

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Todos aqueles que permitam a matança de animais, as sim como os que os matam, cortam, preparam, vendam suas carnes ou as cozinhem, sirvam ou comam, serão por igual considerados assas sinos."

Citando a Bíblia:

"Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão seme ntes, as quais se acham sobre a face da Terra, e todas as árvores em que há fruto que dê sementes; servos-ão para alimento." Gên.,1:29.

Citando as palavras de Gandhi:

"Deveríamos comer não a fim de agradar ao paladar, mas sim para

manter o corpo em bom funcionamento. Qualquer quant idade de experiências é demasiado pequena e nenhum sacrifíci o é demasiado grande para alcançara sintonia com a Natureza.

Há uma grande verdade na afirmação de que o homem s e transforma naquilo que come.

Quanto mais grosseira fora alimentação, mais grosse iro será o corpo.

O gosto se adquire, não nasce conosco. Nenhuma das delícias culinárias do mundo chega ao d eleite que o

apetite proporciona. Um homem faminto comerá um pão seco com o maior pra zer, ao

passo que quem não tem apetite recusa o melhor dos doces. Os alimentos devem ser ingeridos como um dever, com o um

remédio, a fim de sustentarmos o corpo e não exclus ivamente para satisfazer o paladar.

Acho que ninguém, pelo que sei, tem comido tanta fr uta quanto eu. Vivi seis anos exclusivamente de frutas, frescas e secas, e sempre

tive uma provisão bem abundante de frutas como part e da minha dieta habitual.

Para conservar a saúde as frutas e os legumes fresc os têm que constituir a parte principal da nossa dieta.

Muitas vezes me regalei comendo folhas de nabo, de cenoura, de rabanete e de amendoim.

A fruta fresca é boa para comer, mas basta uma pequ ena quantidade para regular o organismo.

Trata-se de um artigo caro e sua utilização excessi va, pelos que têm mais recursos, priva os pobres e os enfermos de um alimento de que necessitam mais do que os abastados."

Citando outros pensadores: “Os vegetais constituem alimentação suficiente para o estômago e

no entanto o recheamos com vidas valiosas" - Sêneca.

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"A Gula tem causado mais mortes do que a espada." - Salomão. "Zaratustra, o sábio profeta, só comia frutas." - Plínio. “Os antigos egípcios preferiam morrer a profanar o ventre comendo carne.” - Orígenes. “Os poucos filósofos vegetarianos fizeram mais pelo bem da humanidade do que todos os demais filósofos modernos.” - Nietzsche. “Os mesmos animais que você não atreveria a beijar quando vivos, por nojo, servem quando mortos, para que encha sua panç a.” - Paul Richard. “Pitágoras sentia tal compaixão pelos animais que q uando via um pescador puxando uma rede comprava todos seus peixe s para lançá-los novamente à água, aproveitando para discursar às pe ssoas que se encontrassem na praia sobre a monstruosa atividade de matar animais e comê-los.” - Porfírio. "A carne dos animais não nos foi dada como alimento , por isso quando os matamos tornamo-nos réus de crime de morte e expomo -nos a morrer do mesmo modo, pois deixamos de ser humanos." - Triptolemo. "Entre os que se alimentam apenas de frutas, difici lmente se encontram ladrões, assassinos, ditadores e aduladores, ao con trário do que acontece entre os que comem carne." - Diógenes. "Nem um só dos argumentos usados contra o vegetaria nismo resiste a um exame honrado e sincero." - Alexis Carrel. "Reconhecer a verdade da doutrina de Jesus e não pr oceder de acordo com ela, continuando a matar e a devorar animais, é uma covardia e hipocrisia farisaicas." - Carlos Brandt. "É da alimentação cárnea que derivam todos os demai s vícios." - Santo Agostinho “Um dos maiores prazeres de Leonardo da Vinci consi stia em ir à feira comprar patos e outras aves para restituí-las à lib erdade.” - Giovanni Bollraffio. “É incrível que não se encontre entre nós nenhum pr egador que faça ouvir um protesto contra o vergonhoso hábito de se alimen tar de carne.’’ - Voltaire.

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Agora que você teve a oportunidade de apreciar o pa recer de algumas das mentes mais lúcidas da história da huma nidade, vou citar trechos da obra "Porque o Hindu é Vegetariano" , de autoria de Swami Abhedananda:

"Porque se come carne? Por necessidade de nutrição? Não; bastam-nos os vegetais, cereais, legumes, etc. Por conveniência de saúde? Não também; em média os vegetarianos são mais sadio s que a

maioria dos comedores de carne. Porque então se com e carne?! Pelo hábito, transmitido de geração em geração, por ignorância, por

falso comodismo, por displicência moral. Nos primórdios da humanidade a agricultura era desc onhecida e os

povos nutriam-se de frutas, nozes e demais produtos vegetais que encontravam em abundância.

Quando houve escassez de frutas e nozes os homens p assaram a comer de tudo que deparavam ao redor.

O problema da subsistência premente antepunha-se ao da alimentação normal.

Nada sabendo do cultivo da terra e não dispondo mai s de produtos vegetais em quantidade suficiente as tribos selvage ns passaram a comer animais (aves, répteis e insetos).

Algumas pessoas acreditam que quem não come carne f ica fraco e indisposto para o trabalho, faltando-lhes coragem e energia.

Ê mais um engano. Já ouviram falar dos "Sikhs", soldados indianos veg etarianos, que

são os combatentes mais fortes e bravos do exército inglês? O regime vegetariano proporciona grande resistência física e

orgânica, além de moderação no temperamento. Geralmente se confunde temperamento agitado e viole nto com

coragem e força. Muita gente acredita que um tigre ou um lobo sejam mais fortes que

um cavalo, um búfalo ou um elefante. Um tigre pode matar um cavalo, um búfalo ou um elef ante, sem

todavia possuir a força muscular e a resistência fí sica que caracterizam os animais herbívoros e que lhes possibilita carregar pesadas cargas por longas distâncias.

Um tigre pode matar até um elefante, mas não conseg ue erguer troncos que pesam centenas de quilos.

Ferocidade é uma coisa e força muscular é coisa bem diferente. Devemos saber distinguir uma da outra. A fonte da força está no reino vegetal; não na carn e. Se comer carne é condição para adquirir força, por que os que a

comem preferem carne dos animais herbívoros ao invé s da dos carnívoros?

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Entre os animais ocorre que os carnívoros são mais irrequietos que os herbívoros. O mesmo ocorre entre os homens: os c omedores de carne são mais nervosos, têm menos domínio próprio do que os vegetarianos.

A natureza calma, equilibrada e de autocontrole é s inal de progresso espiritual, o que vem provar que o alimento animal não é adequado ao desenvolvimento superior.

Aí está por que os comedores de carne acham tanta d ificuldade em concentrar a mente: para eles é praticamente imposs ível meditarem na natureza espiritual e divina do homem.

Por isso os indianos que conhecem os segredos da Es piritualidade opõem-se absolutamente ao regime cárneo.

Toda vez que matamos qualquer animal para nossa ali mentação ou por prazer, somos egoístas.

É por causa de um egoísmo extremo que não reconhece mos os direitos dos animais.

Esta forma de egoísmo é a raiz de todos os pensamen tos e ações perversas.

O que nos faz egoístas e nos favorece o apego ao eu inferior é o mal; o que nos liberta para o altruísmo é o bem.

O que nos fecha em nós próprios impedindo-nos de se ntir a unidade do espírito é a ignorância humana; o que abre nossa vida espiritual e permite-nos contemplar a Divindade dentro das forma s animais é a Sabedoria Divina."

“Certa feita o Papa sentiu compaixão pelo rigor das regras da Ordem dos Trapistas que proíbe que os monges dessa irmand ande se alimentem com carne.

Enviou então um emissário com o objetivo de autoriz ar o Geral da ordem a revogar essa regra e a permitir o consumo d e carne uma vez por semana.

Em resposta o Geral da Ordem dos Trapistas enviou a o Papa uma delegação de gordos frades que agradeceram a boa in tenção do Papa, mas rogaram que não introduzisse nenhuma alteração em s uas regras.

Todos da comitiva estavam muito bem nutridos e o ma is novo deles tinha 83 anos..."

Três diferenças fundamentais separam o homem da abj eta confraria dos carnívoros, dos necrófagos e dos carniceiros.

A primeira delas é a conformação da arcada dentária dos carnívoros e do homem.

Os dentes dos carnívoros apresentam-se pontiagudos, alongados e com separação distinta entre si.

É óbvia a finalidade desse tipo de dentição: apresa r, rasgar e despedaçar a carne.

Não se incluem entre as finalidades dos dentes dos carnívoros o ato de triturar a carne.

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Isso ocorre porque muito pouco da atividade digesti va do carnívoro acontece na boca do animal. A maior parte desse pro cesso ocorre ao longo do estômago e do tubo digestivo.

É que outra das diferenças fundamentais que separam o homem do carnívoro consiste no tamanho da abertura da boca e da garganta, que é bem diferente entre eles.

Repare por exemplo no cão; o tamanho de sua boca é imensamente maior que a boca do homem, desde que se tome por pr oporção relativa o tamanho de seus corpos.

E o pescoço? Você já reparou na proporção do pescoço de um cão? Parte da razão desse tamanho desproporcional (em re lação ao resto

do corpo), está no fato que o cão possui uma grande abertura na garganta (goela), que lhe permite engolir grandes pedaços de carne sem triturá-los.

Já o homem, que tem a seu dispor uma abertura propo rcionalmente menor, se vê obrigado ao consumo sistemático de peq uenos bocados de alimentos.

Daí a conformação de seus dentes ser mais apropriad a à intensa mastigação e trituração dos alimentos, dando início a uma importante parte do processo digestivo quando o alimento ainda está em sua boca.

Os carnívoros, tais como o cão, não necessitam mast igar o alimento, apenas cortá-lo e engoli-lo em grandes pedaços, qua se que imediatamente.

Os caninos dos carnívoros são alongados, fortes e p ontiagudos; são usados para prender e despedaçara carne.

O exame da constituição dentária do homem moderno r evela que ele possui todas as indicações de um animal estritament e herbívoro.

O estômago dos animais carnívoros possui dez vezes mais ácido clorídrico, usado na digestão de tecidos cárneos e ossos, que o do homem.

A terceira e mais importante diferença fundamental entre o homem e os carnívoros está no formato e proporção do tubo d igestivo.

É sabido que a carne se putrefaz com facilidade, va i daí a necessidade de expeli-la com rapidez antes que as i mpurezas que se originam no processo de seu apodrecimento envenenem o organismo do carnívoro.

Os animais carnívoros têm os intestinos relativamen te curtos, para que a carne ingerida não permaneça dentro deles mui to tempo.

Ao passo que o homem possui intestinos finos e alon gados, as divisões do intestino grosso do homem, em cólon asc endente, transversal e descendente, curva sigmóide e reto, encontram-se apenas em alguns primatas.

Além do mais, a disposição interna do tubo digestiv o forma no homem como que pequenas bolsas, onde o alimento fic a retido por mais tempo do que seria saudável se fosse carne.

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Em poucas palavras: carnívoro ingere a carne e pouc o tempo depois a excreta, livrando-se em tempo das substâncias noc ivas geradas por seu apodrecimento.

Ao passo que o homem, considerando-se entre outros fatores o tamanho de seus intestinos, demoraria muito mais pa ra excretar os resíduos da carne, permitindo dessa forma que eleme ntos perniciosos fossem absorvidos.

Outra diferença que distingue os animais carnívoros dos animais vegetarianos é o mecanismo de transpiração.

Os carnívoros permanecem em suas cavernas durante o dia e saem para caçar ao anoitecer, não possuindo glândulas su doríparas em sua pele (transpiram através da língua), ao passo que os ani mais herbívoros, como o homem, o cavalo, a vaca, a zebra, o antílope, etc ., permanecem sob o sol para colher seus alimentos e portanto suam através da pele.

Outro detalhe interessante é que os herbívoros sorv em a água que bebem sugando-a com a boca, ao passo que os carnívo ros a ingerem com a língua.

A aqueles que se espantam com a importância que dei à permanência da carne no organismo humano, aconselho a seguinte experiência:

Ingira uma colher de caroços de mamão e verifique e m suas fezes o tempo que demoram para serem excretados.

Não me espantaria se alguns de vocês verificassem s urpresos que os caroços só começariam a aparecer nas fezes cinco , dez ou mesmo quinze dias depois de ingeridos.

Agora experimentem deixar um pedaço de carne sobre uma mesa durante cinco, dez ou quinze dias e vejam o que aco ntece (é bom lembrar que a temperatura do corpo é bastante superior à te mperatura ambiente, de modo que o apodrecimento é ainda mais rápido).

Acho que as conclusões a que chegou são bastante ób vias - deixo ao bom senso a decisão a tomar.

Lembre-se: "Não tomar uma decisão também é tomar uma decisão." O Dr. Mac Callum, eminente patologista, especialist a em pesquisas

sobre toxinas produzidas pela putrefação intestinal , declarou o seguinte: "A função do colón é transportar e descarregar os r esíduos inócuos

de uma alimentação imputrescível. Restos pútridos d e carne transformam o colón numa larga porta por onde um exército de su bstâncias tóxicas penetra na corrente sanguínea, tornando-se causa de degeneração e moléstia em todos os órgãos do corpo, causando, ent re outras, arteriosclerose, cirrose hepática, algumas formas d e nefrites, anginas do peito e demência senil.

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Causam perda de eficiência ao fígado e ás glândulas de secreção interna, ocasionando acúmulo de venenos no sangue, endurecim ento das artérias, mudanças degenerativas nos nervos, nos músculos, no coração e outros órgãos, além de menor resistência vital e senilidad e prematura."

A área de terra utilizada para produzir colheitas p ara o consumo humano, alimenta proporcionalmente catorze vezes ma is pessoas do que quando é utilizada para produzir alimento para anim ais que, por sua vez, serão abatidos e utilizados como alimento.

O animal que se alimenta com as plantas produzidas num acre de terra, até chegar na idade de abate, terá consumido 800 mil calorias produzidas por essas plantas e seu cadáver irá forn ecer apenas 200 mil calorias.

Tais fatos demonstram que, em termos de produção al imentar é um imenso desperdício econômico e social investir-se n a produção da carne ao invés de fazê-lo em plantas comestíveis.

Quanto ao teor protéico, sabe-se que o cadáver do a nimal nos devolve apenas uma pequena parcela das proteínas qu e ingere, na forma de carne.

Veja as tabelas abaixo:

Quantidade de proteína consumida na alimentação dos animais, comparada com a quantidade que eles devolvem como alimentação humana em leite e carne, bovina e suína. PROTEÍNA CONSUMIDA PELOS ANIMAIS 100% PROTEÍNA DEVOLVIDA NA FORMA DE LEITE 23% PROTEÍNA DEVOLVIDA PELA CARNE DE PORCO 12% PROTEÍNA DEVOLVIDA NA CARNE BOVINA 10%

Calorias (combustível alimentar) consumidas na alimentação dos animais, comparadas com as calorias que eles devolvem como alimentação humana em leite, ovos e carne. CALORIAS CONSUMIDAS PELOS ANIMAIS 100% CALORIAS DEVOLVIDAS NA FORMA DE LEITE 15% CALORIAS DEVOLVIDAS EM OVOS 7% CALORIAS DEVOLVIDAS EM CARNE 4%

Podemos concluir facilmente que comer carne é um ab surdo fisiológico; produzir carne para o consumo é econom icamente e socialmente inviável, constituindo-se em fator agra vante da fome mundial, pois utiliza área útil ao plantio, reduzindo em 14 vezes o potencial dessa área no que tange às possibilidades alimentares que ofereceria caso fosse utilizada para plantas comestíveis.

Jean Mayer, nutricionista de Harvard, calcula que r eduzindo-se em 10% a produção de carne, se produziria cereal sufic iente para alimentar 60 milhões de pessoas.

É alarmante saber que 80 a 90 por cento de todo cer eal produzido é usado para alimentar animais de corte.

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Os cientistas afirmam que é o consumo de carne a ma ior causa da fome em nosso planeta.

A carne é o alimento mais antieconômico que o homem consome, visto que o custo de meio quilo de proteína da carn e é VINTE VEZES mais alto do que o da proteína vegetal igualmente (ou ma is) nutritiva.

Sem falar que (segundo as tabelas que acabou de ver ) das proteínas e calorias com que são alimentados os animais de co rte, apenas 10% são recuperadas no consumo da carne.

Um acre de terra usado para criação de gado fornece apenas 450 gramas de proteína, ao passo que essa mesma área us ada para a plantação de soja produz 7.700 gramas!

Isto significa que, enquanto milhões de pessoas do mundo estão morrendo de fome, os carnívoros estão estragando va sta quantidade de terras, água e cereais para produzir a carne que co nsomem.

Muitos cientistas dizem que a solução para a crise de alimento no mundo é gradualmente substituir a dieta carnívora p ela dieta vegetariana.

Diz Pinkus: "Se fôssemos vegetarianos eliminaríamos a fome do m undo. As crianças nasceriam e cresceriam bem nutridas e v iveriam uma

vida mais saudável e mais feliz. Os animais seriam livres para viver naturalmente co mo crianças

selvagens e não forçados a reproduzir artificialmen te, para serem engordados com o alimento que pessoas famintas deve riam estar comendo e serem em seguida mortos para agradar o pa ladar dos carnívoros responsáveis por esse estado de coisas."

Compare as seguintes informações: CARNÍVOROS SERES HUMANOS 1) Com garras Sem garras 2) Sem poros na pele; transpiram pela língua para resfriar o corpo

Transpiram através de milhões de poros na pele

3) Dentes caninos frontais afiados para dilacerar a carne

Ausência de dentes caninos frontais afiados

4) Glândulas salivares pequenas na boca (não necessárias para pré-digerir frutas e cereais)

Glândulas salivares bem desenvolvidas, necessárias à pré-digestão de cereais e frutas

5) Saliva ácida; nenhuma ptialina para pré-digerir cereais

Saliva alcalina com muita ptialina para pré-digerir cereais

6) Ausência de molares para triturar os alimentos Molares para triturar os alimentos

7) Ácido clorídrico no estômago para digerir músculos animais, ossos duros, etc.

Ácido estomacal vinte vezes mais fraco do que o dos carnívoros

8) Comprimento dos intestinos de apenas três vezes o tamanho do corpo, a fim de eliminar rapidamente a carne em estado de putrefação

Comprimento dos intestinos de doze vezes o tamanho do corpo, pois as frutas, cereais, legumes, etc. não apodrecem tão rapidamente e, portanto, podem ser eliminados do corpo mais lentamente

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Quando você come carne se torna responsável pela fo me no mundo, pela morte de milhares de crianças desnutridas e pe lo desespero de mães que não têm culpa pelo apetite voraz e necrófago qu e o domina!

Pense a respeito, aja com a dignidade de um ser hum ano. Como você pode se permitir ter uma mãe e um pai, ou mesmo ser

uma mãe ou um pai para uma criança se você assassin a a mãe e o filho de outras pessoas apenas para satisfazer seu paladar h ediondo?

Não seja covarde, enfrente e domine seu apetite! Com a palavra o Dr. Owen Parrett:

"Nos últimos cinquenta anos escolhi uma dieta que n ão inclui carne

(nenhum tipo de carne, nem mesmo de peixe ou galinh a). Amo a vida e desejo viver tanto quanto possível. Os dias que correm são agitados e significativos e desejo saber o

que está para acontecer. Já passei da idade bíblica dos setenta e sou grato a Deus pelo fato

de ainda considerar os dias por demais curtos para tudo que desejo fazer. Ainda mantenho como médico uma satisfatória cliente la e gosto de

me entregar a outras atividades, mesmo que durante os poucos minutos que me sobram livres todos os dias.

A maioria de meus pacientes com a minha idade está aposentada, porém não tenho intenção de aposentar-me tão cedo.

Depois de estudar cientificamente e observar a doen ça e suas causas durante muitos anos, cheguei à convicção de que se eu tivesse comido carne durante minha vida, estaria agora muit o decrépito para poder exercer a prática da Medicina.

Um médico deve estar em condição de pensar claramen te e ter reserva de resistência e energia nervosa.

O finado Dr. Alexis Carrel, ganhador do Prêmio Nobe l em 1912, reconheceu que a eficiência das células em prover n utrição e eliminar resíduos era o que determinava o envelhecimento dos tecidos.

Ele prolongou a vida de um pedaço de coração de gal inha banhando-o em um líquido nutriente que também elimi nava o resíduo.

Tanto sucesso alcançou ele que o pedaço de coração de galinha foi mantido vivo desde 1913 a 1947.

Depois de 34 anos foi atirado em uma fossa, onde mo rreu. O Dr. Carrel provou que a duração da vida depende e m grande parte

da eliminação de resíduos e da nutrição das células . Se pudéssemos regularmente eliminar todos os resídu os de nosso

corpo e propiciar-lhe nutrição adequada, poderíamos facilmente desfrutar de vida longa.

Se o líquido que banha nossas células estiver carre gado com resíduos a vida será encurtada.

A Bíblia revela que dez gerações antes do Dilúvio o homem vivia em média 912 anos.

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Após o Dilúvio o homem começou a comer carne, o que encurtou a vida das dez gerações seguintes para uma média de 3 17 anos.

Há alguns anos, o Dr. Irving Fisher, professor da U niversidade de Yale, provou que quando atletas VEGETARIANOS princi piantes competiam com os melhores atletas dessa Universidade, esses n ovatos possuíam mais que o dobro da resistência dos atletas que com iam carne.

Johnny Weismuller, o Tarzan dos filmes e campeão mu ndial de natação havia, enquanto vegetariano, batido 56 reco rdes mundiais, depois disso passou a se alimentar de carne devido à insis tência de seu treinador que julgava a dieta vegetariana insuficiente em pro teínas.

Enquanto carnívoro, apesar de seus grandes esforços e de sua participação em inúmeras competições, não conseguiu quebrar mais nenhum recorde durante um período de cinco anos.

Como os anos haviam se passado e não mais havia con seguido nenhum outro destaque na prática desse esporte, tod os julgavam que já havia dado tudo que tinha para dar.

Foi então que Weismuller trocou de treinador e volt ou a uma dieta vegetariana, que depois de algumas semanas o levou a bater mais seis recordes mundiais.

Por que isso? A carne contém resíduos que o animal deveria ter el iminado. Uma pessoa que come carne carrega-se com resíduos d a carne -

quando esses resíduos atingem as células do corpo p rovocam fadiga e envelhecimento.

Entre os produtos residuais do corpo destacam-se a uréia e o ácido úrico.

O bife contém cerca de dois gramas de ácido úrico e m cada quilo. Quando a carne é cozida os resíduos se apresentam c omo um

extrato solúvel em forma de caldo de carne que muit o se assemelha à urina quando analisado.

Essa presença do ácido úrico explica o rápido aumen to de energias que a carne parece dar, exatamente como no caso do café.

O ácido úrico muito se assemelha â cafeína em seus efeitos sobre o corpo.

A carne sólida leva várias horas para ser digerida e durante esse tempo o estimulante desaparece manifestando-se entã o uma diminuição de energia.

Outro perigo a que se expõem aqueles que comem carn e é a doença no gado.

A esposa de um capataz de um grande rancho contou-m e que uma das novilhas contraiu pneumonia, o que fez com que fosse conduzida rapidamente a um matadouro e retalhada para venda.

O Dr. John Harvey Kellog disse, ao tomar parte de u m jantar vegetariano: "É confortador fazermos uma refeição e não termos de nos preocupar com o que possa ter causado a morte do no sso alimento."

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Um amigo me contou que sua esposa compareceu a um b anquete e pediu um prato vegetariano; a seu lado estava um ho mem que também pediu um prato vegetariano.

Este lhe perguntou: - Desculpe-me, mas a senhora é vegetariana? - Sim - respondeu ela - e o senhor? - Não - retrucou o homem - sou fiscal de alimentos. Ninguém melhor que os fiscais conhece o número das doenças

entre animais sacrificados para a alimentação. Quando eu era estudante de Medicina os professores nos davam

provetas para serem usadas no cultivo de bactérias que provocam doenças humanas como a febre tifóide e a peste bubô nica.

Mandavam-nos preparar caldo de carne, colocar um po uco em cada proveta e contaminá-lo com essas perigosas bactéria s.

O caldo de carne era perfeito para esses germes e e les se multiplicavam aos milhares.

Li em meu compêndio de Pediatria, de autoria do ren omado Dr. Emmet Holt, que se dois cães forem presos com corre ias e alimentados um a água e o outro a caldo de carne, o cão que se ali mentou com água viveria mais tempo que o outro.

Isso porque o caldo de carne não contém qualquer pr opriedade nutritiva se dele for extraída a gordura, contendo porém resíduos urinários que rapidamente envenenam o cão.

A carne é o mais putrefaciente de todos os alimento s, quando se deteriora nos intestinos pode tornar a pessoa mais seriamente doente do que qualquer outra espécie de alimento.

Este fato permite compreender por que os membros de algumas tribos africanas raramente são atacados de apendici te ou câncer, pois raramente comem carne até se transferirem para as c idades onde essas doenças se tomam comuns entre eles.

Quanto ao consumo da carne de aves, preste muita at enção a estes fatos:

Foi descoberto que o câncer nas aves domésticas apr esenta várias formas.

Além da forma usual em que os tumores cancerosos sã o encontrados, há uma forma transmissora em que a ave pode viver de maneira natural, sem o menor sinal de câncer, embor a seja capaz de infectar outras aves.

Esta forma de câncer é tão difícil de descobrir que a única maneira pela qual os pesquisadores podem finalmente determi nar se uma ave contraiu a doença é incubar um ovo da ave suspeita durante quatorze dias.

Depois dessas duas semanas a casca é esterilizada, o ovo é cuidadosamente quebrado, sendo removido o embrião.

Do embrião é retirado o fígado, sendo injetada uma pequena porção do mesmo em outra ave.

Caso se forme um tumor canceroso no local da inocul ação sabe-se, então, e somente então, que a ave que pôs o ovo est á com a doença.

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Praticamente não existe a mínima possibilidade de q ue um Fiscal de Alimentos isole todas as aves enfermas e muito meno r probabilidade de que o consumidor esteja apto a fazê-lo quando escol her frangos para si mesmo e sua família.

Tão generalizada está a doença entre as aves abatid as para consumo que o Dr. Eugene Oakberg escreveu em um jor nal:

"As conclusões a que chegamos deve considerar a pos sibilidade de

que todas as aves domésticas apresentam lesões micr oscópicas básicas do linfoma."

Isto está em conformidade com a declaração de Ellen G. White: "As pessoas estão continuamente comendo carne que e stá cheia de

germes da tuberculose e do câncer. A tuberculose, o câncer e outras doenças fatais são assim

transmitidas." O Dr. Newburg, da Universidade de Michigan, técnico de nutrição

das forças armadas, durante a última guerra critica va muito a dieta cámea dos soldados americanos.

As autópsias efetuadas nos corpos dos soldados core anos mortos em batalha não apresentavam endurecimento das artér ias. As razões: a dieta coreana fundamentava-se em vegetais e cereais .

Uma preocupação médica muito comum é como as pessoa s poderão absorver proteína suficiente se não comerem carne.

O Prof. Rose da Universidade de Illinois, considera do uma grande autoridade mundial no campo da proteína, diz que:

"Menos de vinte e cinco gramas por dia é tudo que a pessoa

necessita." Se um homem não comer carne, nem ovos, nem leite, a inda assim

absorverá a média de 83 gramas de proteína por dia. O Dr. Register e o Dr. Hardinge, ambos atuantes no campo da

nutrição humana, afirmam que o consumo de frutas va riadas fornece proteína suficiente para satisfazer as necessidades do corpo.

A evidência prova que a carne é um fator desnecessá rio no programa de alimentação e pode introduzir no corpo substâncias capazes de aumentar as doenças crônicas, as infecções e as moléstias degenerativas.

Durante a Primeira Grande Guerra, em 1918, a Dinama rca ficou bloqueada por mar e por terra, passando por grande falta de alimentos.

Criar gado para o abate seria estúpido, pois repres entaria uma perda de 90 por cento do alimento ministrado para sua eng orda.

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O Dr. Hindehede, notável autoridade em nutrição foi chamado urgentemente pelo Rei da Dinamarca para achar uma s olução para o caso.

A nação foi colocada em um regime sem carne durante um ano. Muitos médicos julgaram que tal medida seria calami tosa, mas os

efeitos provaram ser altamente benéficos, propician do um recorde mundial no índice de mortalidade baixa, diminuindo as taxas anuais de falecimentos em 34 por cento, além de uma acentuada diminuição no índice de doenças.

O retorno à alimentação cárnea no ano seguinte elev ou o índice de mortalidade ao nível anterior à guerra.

Minha mesa é abastecida com uma variedade de alimen tos deliciosos e a falta de carne jamais me preocupa.

Depois de estudar as doenças em animais no laborató rio, o efeito de uma dieta com carne em meus pacientes durante muito s anos, seria realmente difícil eu passara comer carne novamente.

Estou plenamente de acordo com o notável nutricioni sta da John Hopkins University, Dr. McCollum, que expressou sua opinião de que qualquer pessoa que decida eliminara carne de sua d ieta sentir-se-á muito melhor.

Um dos fráteres da Fraternidade Kung Fu me enviou u ma fotocópia

de um artigo de jornal com o seguinte texto, que tr anscrevo a seguir:

"O País da Longevidade Quatro Mil Chineses com Mais de Cem Anos

O número de chineses com mais de 100 anos é de 3.76 5, dos quais

75 por cento são mulheres, informa o diário de expr essão inglesa "China Daily" .

A região com maior número de centenários é Xinjiang , no noroeste do país, onde a percentagem dos favorecidos pelo De us da longevidade é de 65 por cada milhão de pessoas, acrescenta o jorn al.

A notícia indica que nessa região os centenários te ndem a ser vegetarianos, cultivando a sua própria verdura e te ndo começado a trabalhar desde muito jovens.

Os centenários entrevistados consideram que o traba lho diário é uma das chaves para preservar a saúde.

A China, sociedade basicamente rural e industrialme nte pouco avançada, tem cerca de 1.050 bilhões de habitantes e um dos maiores índices de longevidade."

Quanto à segunda parte da sétima regra budista, os livros de Medicina informam que a ingestão de qualquer bebida alcoólica, mesmo em pequenas proporções, destrói os neurônios, desca lcifica os ossos, lesa as fibras nervosas e os vasos cardíacos, irrita a m ucosa gástrica,

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desarranja os rins, elimina a vitamina B, diminui o oxigênio do sangue, podendo, quando em grande dose, provocar a cirrose hepática.

Mas a questão da ingestão de bebidas alcoólicas não é tão simples assim. Trata-se de uma doença e deve ser encarada c omo tal.

Na continuidade de minhas pesquisas assisti algumas reuniões dos Alcoólicos Anônimos e ouvi depoimentos de rara inte nsidade emocional e rico conteúdo humano.

Se você ouvisse falar de uma doença que estivesse a tingindo nosso país e vitimando 4 milhões de pessoas, afetando-as a ponto de torná-las loucas durante algumas horas todos os dias, isso lh e causaria um certo espanto, não é?

Pois fique sabendo que o alcoolismo é uma doença qu e provoca a loucura em determinados períodos e que as pessoas v ítimas dessa doença prejudicam cerca de 20.000 pessoas no Brasil todos os dias, afetando a vida social e empresarial desta nação com custos in calculáveis.

Segundo a A.A.A., a doença do alcoolismo ataca uma a cada treze pessoas que bebem e é a terceira doença do mundo em número de mortes.

Somente na cidade do Rio de Janeiro uma estimativa situa a existência de trezentos mil alcoólatras.

Sabendo-se que cada alcoólatra afeta e prejudica o comportamento de pelo menos cinco outras pessoas em média, temos um milhão e quinhentas mil pessoas prejudicadas diariamente só no Rio de Janeiro.

O alcoolismo é uma doença progressiva e, como tal, é acionada pelo primeiro gole ingerido.

Estive em reuniões da A.A.A. ministradas em diferen tes locais, mas notei que estava sempre presente um pequeno outdoor eletrônico que piscava de forma intermitente e onde estava escrito : "Evite o primeiro gole."

Outro cartaz que está sempre presente diz: "Um é muito e mil não é suficiente."

Espantei-me da lucidez da sétima regra budista que diz que não se deve PROVAR bebidas alcoólicas.

Se você provar, já tomou o primeiro gole, não é? Diz também a A.A.A.: "Não adianta tentar convencer um alcoólatra a

largar a bebida, até que ele mesmo reconheça a sua incapacidade perante o álcool."

O alcoólatra começa bebendo socialmente, mais tarde passa a beber habitualmente e depois começa a perder o controle e a beber sob qualquer pretexto.

Nenhum esportista que se preza ingere bebidas alcoó licas e isso inclui os praticantes de artes marciais, mesmo que os anúncios dos fabricantes de bebidas mostrem o contrário na telev isão. Não provar, evitar radicalmente o primeiro gole é a melhor atitude em relação ao álcool.

8 - O praticante de Kung Fu deve conter seus impulsos sexuais.

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Quando analisamos esta norma temos que compreender que ela foi estabelecida para ser adotada pelos Artistas Marcia is do Templo Shaolin, que eram Monges e portanto haviam feito votos de ca stidade.

Em se tratando de pessoas comuns de nossos dias, se ria exigir demais impor a total abstinência sexual, mesmo porq ue seria praticamente impossível cumprir essa regra vivendo dentro do mun do.

No entanto, podemos observar que é comum a prática de abstinência sexual entre os esportistas profissiona is, haja vista as famosas "concentrações" dos jogadores da Seleção Br asileira.

A energia sexual quando contida por um ato da vonta de pode ser sublimada em realizações físicas (e/ou intelectuais ) de excepcional performance.

Isso não significa que o praticante de Kung Fu não deva permitir uma livre expressão de sua sexualidade, e sim que d eve manter um controle sobre ela.

O que se recomenda é que se evitem os exageros que contribuem mais para tornar o homem escravo de seus instintos do que senhor de si mesmo.

O relacionamento sexual deve ser encarado com norma lidade, não se deve atribuir-lhe uma importância desproporciona l e nem se deve permitir-lhe que ocupe nossa mente a todos os momen tos.

É fato notório que os grandes gênios de todas as ép ocas possuíam intensa sexualidade e muitos autores consideram a s ublimação dessa sexualidade como um dos fatores que conduziram esse s homens a suas grandes realizações.

"Conta-se que dois monges caminhavam às margens de um rio discutindo certos pontos da Filosofia Budista, quan do deles se aproximou uma mulher e perguntou-lhes se não podiam carregá-l a até a outra margem do rio, pois não desejava molhar suas vestes.

Um dos monges, sem titubear, tomou a mulher em seus braços e a levou até a outra margem, depositando-a no chão, re tomando à margem de onde partira e continuando a discussão filosófica n o ponto em que havia sido interrompida, como se nada houvesse acontecido .

Diante dessa atitude o outro monge ficou muito espa ntado e censurou o companheiro:

- Você não sabe que somos proibidos de nos aproxima rmos de uma mulher e que jamais podemos tocá-las ?!

O outro respondeu: - Eu a carreguei para o outro lado mas a larguei lá , você continua

carregando-a." 9 – O praticante de Kung Fu não deve ensinar as suas té cnicas a ninguém que não seja Budista.

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A transmissão completa dos ensinamentos de um estil o de Kung Fu é responsabilidade difícil que preocupa os mestres conscientes de seus deveres.

Evidentemente que esta norma também deve ser interp retada, levando em conta o sistema de valores vigentes em n ossos dias.

Na antiguidade os mestres não se permitiam sequer f azer demonstrações públicas. Deixavam isso a cargo de se us discípulos.

Fazer demonstrações em primeiro lugar era sinal de certo orgulho pessoal, indigno de um verdadeiro mestre. Em segund o lugar permitia que o público aprendesse movimentos mais adiantados que tinham que ser preservados.

Alguns dos mestres mais qualificados do Kung Fu mod erno ainda atendem a esse dever e raramente fazem demonstraçõe s públicas.

Embora não se exija que os discípulos sejam budista s, é de primordial importância que se verifique a lealdade e o caráter de um praticante antes que se lhes permita o aprendizado de técnicas mais avançadas.

As pessoas mudam com o tempo e os brasileiros em ge ral são multo volúveis e emocionais, julgando seus mestres pela o pinião dos outros mais que por sua própria.

A violência é um fator marcante entre nosso povo, m ormente se observarmos que temos entre nós um dos maiores índi ces de criminalidade registrado em todo o mundo.

Se um professor não for suficientemente responsável na escolha de seus discípulos, acabará por disseminar sua arte en tre pessoas menos qualificadas que perpetuarão a violência e a discór dia entre seus alunos.

Recomenda-se especial cuidado com professores que f alem mal de outros professores ou de outros estilos. Em geral t rata-se de pessoas que tentam esconder nas críticas a própria incompetênci a.

Essa recomendação é especialmente verdadeira no que se refere a fofoqueiros de origem chinesa. O fato de um pratica nte de Kung Fu ser chinês não o transforma em um mestre nem traz digni dade a quem não a possui (mesmo que se auto-intitule mestre).

Muitos estilos de Kung Fu desapareceram no passado devido a dificuldade de se selecionar discípulos criteriosos que os preservassem.

Na intenção de preservar os conhecimentos milenares do Kung Fu sem permitir que um só elemento se tornasse deposit ário de toda a técnica, o Templo Shaolin nunca ensinava todo seu e stilo a um só praticante, preferindo transmitir técnicas parciais a cada discípulo, dessa forma assegurando a unidade do Templo.

O mundo se encontra num estado caótico em que imper am a guerra e a violência.

Aqueles que moram nas grandes cidades não possuem m ais a liberdade de se moverem em segurança pelas ruas, se m correrem o risco de um assalto ou de uma atitude mais violenta por p arte das pessoas que lá convivem.

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O Kung Fu e as demais Artes Marciais são armas pode rosas que não devem ser colocadas nas mãos de pessoas menos prepa radas.

Aquele que ensina apenas as técnicas físicas do Kun g Fu isoladas do contexto filosófico e espiritual característico dessa arte, está apenas demonstrando ser um medíocre que semeia a violência no mundo.

Que mundo estamos construindo para nossos filhos se semeamos indiscriminadamente a violência?

Ê necessário que aprendamos a combater a violência em sua origem dentro de nós, antes que ela se manifeste através d e nossos atos.

Para isso temos que compreender que o que nos torna violentos é o orgulho.

Estamos semeando a violência quando nos orgulhamos do estilo de Kung Fu que praticamos, quando nos orgulhamos do no sso Mestre, quando nos orgulhamos de nossa técnica, quando nos orgulhamos de nossa força física, quando nos orgulhamos de nossa nacionalidade, etc.

E por que isso? Porque quando achamos que aquilo que sabemos é melh or que

aquilo que os outros sabem, estamos adotando um com portamento de superioridade que impõe um certo desprezo para com o conhecimento dos demais, e isso é sinal de uma grande inferioridade nossa.

Temos que aprender a respeitar as demais pessoas, e isso inclui aprender a respeitar o estilo e os padrões de compo rtamento das demais pessoas.

Esse aprendizado de convívio harmonioso e tolerante é a marca do praticante de Kung Fu amadurecido e idôneo.

Quando permitimos que a semente do orgulho penetre em nosso coração, estamos abrigando o ódio e a discriminação dentro de nós.

Nesse momento o Kung Fu que cultivamos cessa de ser uma expressão da arte e passa a ser uma expressão da vi olência.

E seremos piores que aqueles de quem falamos mal, m enores que aqueles que expressam modalidades de Kung Fu distin tas da nossa.

É muito fácil criticar, adotar um comportamento des denhoso com relação a outros estilos e comportar-se de maneira orgulhosa diante dos praticantes de outras modalidades.

Isso é tão fácil que qualquer idiota pode fazê-lo ( e geralmente faz mesmo!).

É de se esperar que um praticante de Kung Fu tenha mais dignidade e adote um comportamento menos infantil.

"Certa feita vários Mestres e seus discípulos fizer am uma demonstração de Kung Fu.

Como é usual nessas ocasiões, os mestres se colocar am em fita indiana e ingressaram no pátio onde seria realizada a demonstração na ordem de sua antiguidade (Kung Fu = Tempo de Habili dade).

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Porém um discípulo fanfarrão e presunçoso adiantou- se e colocou-se ao lado de seu professor, ou seja, mais â frente que um mestre de outro estilo que possuía muito mais tempo de treino que e le.

E passou a olhar o outro mestre com um ar de superi oridade como se possuísse o mesmo nível que ele.

O mestre o interpelou e lhe disse: - Cheguei onde cheguei porque venci meu orgulho, ao passo que

seu orgulho venceu você."

10 - O praticante de Kung Fu tem que se imunizar contra a cobiça, a agressividade e a fanfarronice.

Todos os comentários feitos na interpretação da nor ma anterior são

também válidos para a compreensão desta norma. Nada mais ridículo que um artista marcial que se pr eocupe com

faixas, diplomas e carteirinhas de estudante. Quantos atletas de grande potencial encerram suas p ossibilidades

por desistirem da oportunidade de estudar com um ve rdadeiro mestre, para se prenderem a outros "mestres" menos sérios a penas por serem chineses ou por venderem diplomas.

Já dizia Bruce Lee que a faixa serve apenas para se gurar as calças. Uma pessoa que se dedica às Artes Marciais deve pos suir um desejo

sincero de evoluir tanto como lutador quanto como p essoa. Antigo provérbio chinês diz que o maior guerreiro é aquele que vence a si mesmo: só conseguimos vencer a nós mesmos quando dominamos nossos impulsos de orgulho, de fanfarronice, de querer ser mais que os outros.

A humildade é a marca do verdadeiro campeão. Um cam peão muito papudo é logo esquecido e seus feitos diminuídos.

Embora muito do desempenho técnico do Artista Marci al dependa de sua dedicação aos treinos, não devemos nos esquecer que o destaque na Arte Marcial em geral é reservado a pessoas cujas c ondições físicas hereditárias sejam superiores.

Por si só isso deveria ser motivação suficiente par a que o praticante dessas modalidades cultivasse a humildade, visto qu e ninguém é responsável por suas condições hereditárias.

Nada mais honroso que ver o forte protegendo o frac o, o poderoso socorrendo o oprimido, o virtuoso amparando o débil .

A preocupação do Artista Marcial não deve ser torna r-se mais forte que os demais nem vencê-los, e sim tornar-se mais f orte diante de si mesmo e vencer-se a si, ao invés de tentar vencer o s outros.

Muitos já ouviram falar da pecadora que foi atirada aos pés de Jesus para que fosse apedrejada conforme ditava antiga le i mosaica.

A resposta de Jesus foi: "- Aquele de vós que não pecou que atire a primeira pedra." Parafraseando a Jesus pergunto: Quem possui suficie nte domínio

sobre si mesmo para que possa presumir ser melhor q ue os outros?

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As vitórias do mundo são sem valor, pois tudo fenec e diante da morte; aquele que é forte hoje será fraco amanhã; s e os fortes de hoje não ensinam com seus exemplos a proteção dos fracos, qu em os protegerá amanhã quando se tornarem fracos eles mesmos?

"Na Província de Hopei viveu um camponês chamado Li -Ne-Jam que,

apesar de ser pobre e humilde, era um profundo conh ecedor do Kung Fu. Um dia foi assistir a demonstração de dois famosos heróis, os

irmãos Tai-Ling-Pang e Tai-Lung-Pai, mas não se imp ressionou muito, pois percebeu que sua própria arte era superior.

Ao invés de fanfarronear-se, guardou para si mesmo esses sentimentos e não falou a respeito nem se exibiu.

Um dos irmãos percebeu que aquele camponês pobre e maltrapilho não se impressionara com a exibição e o seguiu.

Quando Li-Nem-Jam estava novamente trabalhando no c ampo, aproximou-se por trás e o agarrou fortemente tentan do demonstrar toda sua força.

Li-Ne-Jam o atirou ao ar facilmente, arremessando-o longe. Surpreso com tamanha habilidade, o homem se ergueu e pergunt ou-lhe como o fizera.

- Pura sorte, respondeu Li-Ne-Jam e continuou a tra balhar..." Excetuando-se os fráteres filiados à Fraternidade K ung Fu, esta é a

primeira vez que o público brasileiro tem a oportun idade de conhecer as Dez Normas Budistas do Templo Shaolin.

Você, leitor deste livro, é um privilegiado por ter tido essa oportunidade.

A questão é: acabamos de estudá-las; o que faremos com esses conhecimentos?

Como aplicaremos essas normas em nossa vida prática , em nosso dia-a-dia?

Procure estabelecer um plano de trabalho visando a adaptação destas normas à sua própria realidade.

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Repartindo o que Sei

Quando do preparo deste livro, um instrutor do esti lo Wing Chun que tem me auxiliado com grande valor e denodo nos últimos meses, instou comigo para que incluísse minha filosofia pe ssoal como fechamento desta obra.

Não acredito, nunca acreditei, que alguém seja capa z de levar outra pessoa ao conhecimento da verdade.

O máximo que os grandes avatares, os gurus e os mes tres têm conseguido fazer é apontar o caminho por onde trilh aram, sem que ninguém tenha, até onde eu saiba, conseguido percor rer o mesmo caminho através de outrem.

Não acredito nessa história de mestres e discípulos . Sou daqueles que crêem que o mestre está dentro de cada um.

Tenho tentado fazer ver isso às pessoas que me busc am em procura do conhecimento.

Mas, toda vez que insisto em que a pessoa deva pens ar por si mesma e preparar-se por seus próprios meios, movido por suas próprias experiências, as pessoas desanimam.

Toda vez que digo que minha experiência serve apena s a mim e a ninguém mais, sou interpelado por alguém que não co nsegue dar o primeiro passo.

Ao examinar o que sei, verifico que tudo que sei já existe no mundo, já foi dito por muitos e que não necessito omitir m inhas próprias percepções, visto que são de domínio público e aque les que comigo convivem sabem como penso.

Assim sendo, as conjeturas de que trato a seguir de screvem mal e porcamente a filosofia de vida que adotei para mim mesmo e que representa o resumo de minhas pesquisas dentro da s abedoria do Kung Fu, e de meus autores prediletos (Boécio, Buda, Epi curo, Epiteto, Han Ryner, Marco Aurélio e Sêneca).

Não sou o melhor nem o mais virtuoso dos homens, po rtanto esta não é a melhor nem a mais virtuosa filosofia de vid a.

Se decidir adotá-la, talvez você possa encarar a vi da com o mesmo pragmatismo e objetividade com que a encaro; talvez não.

O risco é todo seu. De qualquer modo, será sempre uma escolha sua e, co mo tal, sua

responsabilidade exclusiva. Afinal, já dizia La Bruyère: "A vida é uma tragédia para os que

sentem e uma comédia para os que pensam." Antes de examiná-la, procure se lembrar de que O QU E VOCÊ SABE

NÃO TEM VALOR ALGUM, O VALOR ESTÁ NO QUE VOCÊ FAZ C OM O QUE SABE.

De que lhe aproveita saber discutir estas teorias s e não for capaz de demonstrá-las em suas próprias atitudes e ações?

O exemplo não é a melhor maneira de ensinar, É A ÚN ICA MANEIRA!

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Uma Filosofia Pessoal Escolhi "Uma Filosofia Pessoal" como título, por várias razões. Primeira - Sendo UMA Filosofia Pessoal, significa que existem

outras. Segunda - Sendo Uma FILOSOFIA Pessoal, significa que não se trata

da verdade absoluta, visto que filosofia é a busca da verdade, não a verdade em si mesma.

Terceira - Sendo Uma Filosofia PESSOAL , significa que pode atender totalmente às necessidades de mais alguém.

Isto claro, comecemos: Seja o que for que faço, faço-o porque é justo dian te de meu

entendimento e não porque há alguém que possa premi ar-me ou castigar-me na proporção de minhas ações.

Ao esforço para conformar os atos de minha vida ao meu pensamento, chamo de virtude.

A única recompensa da virtude é a própria virtude. Se penso numa recompensa não sou virtuoso, pois a p rincipal

característica da virtude é o desapego. Creio firmemente que a virtude desapegada cria a fe licidade. Aquele que tenta ser bom porque quer ganhar o céu, não é bom, é

como a prostituta que se vende. Aquele que evita ser mau porque não quer ser conden ado ao

inferno, não deixa de ser mau, é um covarde que se comporta porque teme. É típico do fraco colocar a responsabilidade de sua própria

felicidade sobre os ombros de alguma coisa externa a si mesmo. Os ombros favoritos são os de Deus. Convido o leitor a considerar atentamente este pens amento de

Epicuro: "Deus, ou quer impedir os males e não pode, ou pode e não quer, ou

não quer nem pode, ou quer e pode. Se quer e não pode, é impotente: o que è impossível em Deus. Se pode e não quer ê pervertido: o que, do mesmo mo do, é contrário

a Deus. Se nem quer nem pode, é bisonho e impotente: portan to nem sequer

é Deus. Se pode e quer, o que é a única coisa compatível co m Deus, de onde

vêm então os males? Por que razão não os impede?!" De qualquer maneira não cabe aos homens julgar a De us, pois

sequer têm meios de provar sua existência e não se julga algo que não existe.

Nem perco tempo portanto, e me atenho às coisas que me pertencem e as ações que posso fazer.

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Visto que é impossível ao homem conjeturar sobre a natureza de Deus, dedico minha atenção à natureza que é a expre ssão da inteligência responsável pelas coisas serem como são e não de ou tra forma.

Percebo logo de início que meus poderes sobre ela s ão limitados e que se não a respeito, por ela mesmo pereço.

Só culpa a natureza pelo que lhe acontece, aquele q ue baseia sua opinião num falso sistema de valores que o faz conf undir o que lhe pertence com o que não lhe pertence.

A morte nada significa, pois enquanto vivo ela não existe e quanto ela chega eu cesso de existir.

Para mim, ser feliz é viver o aqui e agora, sem ape gos e sem culpa. O que me permite ser feliz é minha capacidade de esco lher.

Han Ryner diz: "A felicidade é um estado de espírito em que me sin to perfeitamente

livre de todas as servidões e em perfeito acordo co migo mesmo." Sêneca conta: "O homem feliz é aquele para quem não existe nem ou tro bem nem

outro mal senão o bem e o mal da alma; que pratica a honestidade e se satisfaz com a virtude; que não se deixa exaltar ne m abalar pelos acontecimentos fortuitos; que não conhece maior bem que o que ele próprio se pode proporcionar, para quem o verdadeir o prazer é o desprezo do prazer."

Epicuro afirma: "Nunca é cedo nem tarde demais para cuidar de si me smo; aquele

que diz que ainda é cedo ou que é tarde demais para filosofar, está dizendo que ainda não é tempo ou que já não dá mais tempo d e ser feliz.

A felicidade consiste em se obter aquilo que se des eja e em evitar aquilo que não se deseja; as pessoas infelizes são aquelas que: ou não conseguem aquilo que desejam ou não conseguem evita r o que desejariam evitar. Conquiste a felicidade evitando considerar como suas as coisas que não dependem de você."

O mundo tem apenas duas espécies de coisas: aquelas que

dependem de mim e aquelas que não dependem. Depende de mim apenas meu pensamento e, através do

pensamento, gero minhas opiniões, minhas atitudes, meus apegos e minhas ações.

Não dependem de mim meu corpo, meus bens materiais, minha reputação e tudo que não seja gerado por meu pensam ento.

As coisas que dependem de mim, me pertencem, são li vres, nada as impede.

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As coisas que não dependem de mim, não me pertencem e estão sujeitas às vicissitudes da vida.

Se considero minhas as coisas que não me pertencem, sou um ladrão e necessariamente serei infeliz, sofrerei, f icarei perturbado, descontente com o mundo e com os homens.

Se aprendo a considerar minhas apenas as coisas que são minhas, e a considerar do mundo o que pertence ao mundo, ning uém jamais será capaz de me aborrecer, não ficarei descontente com ninguém, não poderei culpar os outros por minha infelicidade, não farei coisas que sejam contra minha vontade, não terei nenhum inimigo, nem serei vítima de nenhum dano ou perda.

Esforço-me para compreender estas coisas com perfei ção pondo-as em prática diante dos fatos da vida, sem me deixar influenciar pelas aparências.

Pergunto-me sempre: - Isto que está me acontecendo se relaciona com as coisas que dependem de mim ou com as coisas que não dependem de mim e, se a resposta determinar que as coisas qu e estão me acontecendo não são coisas que dependem de mim, ace ito que nada me significam.

Um antigo diálogo apócrifo que teria, segundo dizem , ocorrido entre Deus e Epiteto diz o seginte:

"Teu corpo não passa de argila mas também te dei um a porção de

mim mesmo: o poder de pensar e escolher, tomando de cisões sobre as coisas dos sentidos.

Se não negligenciares estes poderes e neles te apli cares, jamais te verás obstado ou embaraçado, jamais terás de que te lamentar, jamais terás que censurar ou lisonjear alguém.

Contenta-te com estas coisas." Sêneca, em uma de suas cartas a Lucílio, conta que Demétrio

Poliocerta destruiu a cidade de Estilbao, matou sua esposa e filhos e depois lhe perguntou se havia sofrido alguma perda.

Estilbao respondeu: "Todos os meus bens estão comigo. Nada perdi do que era meu."

Possuo as faculdades que me permitem compreender qu e sou parte de um todo e que compete a mim, como parte, ceder l ugar ao todo.

Cabe a mim ver que as coisas que me cercam são ou i sentas de impedimento, pertencendo ao domínio de minha vontad e, ou sujeitas ao impedimento e dependente da vontade do mundo.

Não desperdiço energias me aborrecendo e me preocup ando com as coisas que não dependem de mim; prefiro transferir minhas energias para evitar crer que dependem de mim as coisas que depen dem do mundo.

Meus desejos são os limites que estabeleço para mim mesmo. Quando desejo alguma coisa limito minha capacidade de ser feliz, a

minha chance de conseguir o que desejo.

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Minhas aversões também são desejos e limitam minha capacidade de ser feliz, a minha chance de me livrar daquilo q ue não desejo.

Tanto é infeliz aquele que não consegue ter o que d eseja, quanto aquele que não consegue evitar aquilo a que tem ave rsão.

É fácil ser feliz, basta que deseje apenas aquilo q ue dependa de mim e que tenha aversão apenas às coisas que dependa de mim evitar.

Se faço com que aquilo que desejo dependa apenas de mim mesmo, vivo livre e feliz, nada lamentando do que me venha a ocorrer e contra nada me insurgindo.

Se me deixo prender pelas coisas externas, que não dependem de mim, vejo-me forçosamente dependente e sujeito a im pedimentos; tomo-me escravo daqueles que têm poder sobre o que desej o; serei necessariamente injusto por reclamar mais do que me pertence.

Nada afeta o que me pertence. As únicas perturbaçõe s que podem me atingir são formadas pela minha opinião.

Tudo quanto existe mudará dentro de um instante e n ão mais existirá.

O UNIVERSO É MUTAÇÃO, A VIDA OPINIÃO. A ÚNICA VERDADE IMUTÁVEL É QUE TUDO MUDA. Por exemplo, se gosto de um vaso, procuro me lembra r que gosto de

uma coisa que se quebra e quando se quebrar, não so frerei. Quando inicio qualquer ação, examino a que natureza pertence. Se vou tomar um ônibus procuro me lembrar do que co stuma

acontecer num ônibus: algumas pessoas se acotovelam ; outras falam e riem alto; umas correm na frente e tomam o lugar de outras; existem cobradores mal-educados; outros que roubam no troco ; motoristas que arrancam antes que eu suba, ou antes que eu tenha t empo de descer completamente.

Assim, pois, constato que, se minha intenção é toma r o ônibus, estou sujeito a todas essas coisas (não dependem de mim) e que, se eventualmente elas me acontecerem, isso não me impe dirá de conservar-me em harmonia com as circunstâncias.

Quando surge algum contratempo recordo imediatament e que foi minha intenção andar de ônibus conservando meu pens amento em harmonia, e que não o manterei em harmonia se me ab orrecer com as coisas que acontecem.

A realidade nunca chega a mim como ela é, antes pas sa pelos meus sentidos e o que vejo dela é a exata proporção do q ue meus sentidos me permitem ver.

Mesmo o que meus sentidos percebem não chega até mi m porque tem antes que passar pela interpretação de minha me nte.

Assim, sendo percebo que o que sei da realidade é m inha interpretação da realidade.

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Não são pois os acontecimentos da vida que me pertu rbam, e sim as opiniões que formo a respeito desses acontecimentos .

Se me torno infeliz, triste ou perturbado, não culp o a ninguém por isso, mas somente a mim mesmo e a minhas opiniões.

Não me orgulho de qualidades que não me pertencem. Se me orgulho dizendo: "- Tenho um belo carro.", es tou me

orgulhando de algo que pertence apenas ao carro. O que é meu então? O saber apreciar a beleza que vejo, pois é o que de pende de mim. Não desejo que as coisas aconteçam segundo minha vo ntade (afinal

elas não dependem de mim); a não ser na exata propo rção do que depender das coisas que dependem de mim.

Como quero continuar a ser feliz, aprendo a aceitar as coisas como vierem.

A doença é um impedimento para meu corpo (que não m e pertence), mas não para minha opinião.

Observando a vida percebo que as coisas se impedem umas as outras, mas não são empecilhos a mim.

Em face de qualquer acontecimento pergunto-me quais as forças que possuo e que podem ser utilizadas eficientement e nessas circunstâncias.

Quando me habituo a pensar e agir assim, as aparênc ias das coisas perdem a capacidade de me conduzirem à infelicidade .

O mundo me empresta certas coisas, mas como não faz em parte das coisas que me pertencem nunca serão realmente minha s.

Nunca perco nada, apenas devolvo ao mundo. Meu filho morreu? Ele foi devolvido. Minha mulher me abandonou? Ela foi devolvida. Minha casa foi tomada? Bem, não é isso o mesmo que devolvido? "Mas quem a tomou não presta!" , você me dirá; mas eu lhe digo: "a

mim, que importa se as mãos pelas quais o mundo que me deu essas coisas, as retome?"

Quando o mundo me dá alguma coisa eu a uso, mas com o algo que não é meu, como fazem os hóspedes de uma estalagem.

Se espero que minha mulher, meus filhos e meus amig os vivam para sempre, estou desejando que me pertençam coisas que não me pertencem.

Quando encontro alguém chorando porque o filho mudo u para longe ou morreu, cuido para que minha imaginação não faça com que eu perceba o fato erroneamente.

Percebo imediatamente que não é o que ocorreu que e ntristece essa pessoa, porque o que a entristece é a opinião que e la formou a esse respeito.

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Percebo também que essa pessoa não dedicou parte de sua vida a criar uma filosofia pessoal que a sustentasse, e po rtanto não aprendeu a enfrentar essa situação.

Assim sendo, procuro agir com caridade e concordar com ela e a consolar, mas mantendo-me atento para não permitir que a dor dela contamine a ideologia que me dará apoio em circunst âncias semelhantes.

Quando algo de ruim me acontece, penso desta maneir a: "Nenhuma das coisas que estão me acontecendo podem me afetar;

talvez possam afetar este corpo, as posses materiai s que o mundo me emprestou, minha reputação, a esposa que me foi dad a, os filhos que me foram dados, mas nada me afeta a menos que eu o per mita."

Não tenho a presunção de ser respeitado pelos demai s, pois isso

não me pertence. Não espero receber consideração dos demais, pois is so não me

pertence também. Sei que não é possível permanecer fiel aos meus pri ncípios e ao

mesmo tempo ter a pretensão de ser amado e estimado pelo mundo. Não me aborreço com as pessoas, porque se pretender que elas não

me aborreçam estarei pretendendo que elas não comet am erros, pensem da forma certa e adotem as atitudes certas e nada d isso me pertence.

Se desejo que meus desejos não sejam desapontados, isso está em meu poder, pois basta que queira aquilo que possa t er.

Só é senhor de si aquele que é capaz de dar ou tira r aquilo que é capaz de dar ou tirar.

Aquele que procura a liberdade perfeita não deve de sejar nem recusar nada que dependa dos outros ou perderá sua liberdade e se tornará um escravo.

Todo aquele que jamais se envolve numa luta que não possa vencer, é invencível.

Mesmo que alguém me injurie, me provoque ou me soqu e, jamais conseguirá me causar mal, porque o mal está na mane ira com que considero estas coisas.

Se alguém me provoca, sei que é minha opinião a res peito de mim mesmo que me provoca.

Se alguém me ofende é a opinião que tenho a respeit o de mim mesmo que me ofende.

Não permito que as coisas que vêm de fora (e portan to não dependem de mim), me entristeçam ou me tomem infeli z.

Mantendo-me dentro destes princípios, controlo a mi m mesmo e me torno capaz de ser feliz.

Ao adotar a busca da sabedoria como minha meta de v ida, sempre soube que seria ridicularizado pelos que são incapa zes de avaliar a profundidade desses conhecimentos.

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Mas a opinião dos outros não me pertence, portanto não me perturbo com esses preconceitos.

Contento-me em buscar a sabedoria, não quero parece r sábio e nem ser tomado como sábio.

Ninguém consegue me desconsiderar pois não depende de mim as opiniões dos outros.

Apenas eu posso me considerar e me honrar, pois ape nas a minha opinião me pertence.

Não há lugar em mim para a inveja e o ciúme, pois é tolice pretender ter as coisas que não me pertencem.

Melhor que ser um general ou um presidente, é ser s enhor de mim mesmo, e isso só é possível me desapegando de todas as coisas que não dependem de mim.

Mesmo que queira ajudar a meu próximo, nada posso f azer para ajudá-lo, pois nada do que lhe possa dar pertence a mim ou a ele.

Sabendo o que me pertence e o que pertence ao mundo noto que jamais poderei dar aos outros alguma coisa que eles já não possuam.

Visto que depende de mim apenas minha opinião e vis to que minhas atitudes e ações dependem de minha opinião, percebo que existem ações que dependem de mim e ações que não dependem de mim .

Depende de mim portanto a decisão de conquistar ben s materiais para mitigar as necessidades das pessoas que amo e de meu próximo.

Mas o fato dessas ações dependerem de uma decisão m inha não significa que tenha a obrigação de fazê-las, pois n ão pertencem nem às pessoas que amo nem ao meu próximo as ações que me pertencem (que eu posso fazer).

Que procuram as pessoas que amo e meu próximo? Minh as posses? Meus esforços?

Ou preferirão eles um amigo modesto, mas sincero? S e me respondem argumentando que só serei um bom pai e um bom cidadão se produzir riquezas para o engrandecimento de minha f amília e de meu país, lhes responderei que o engrandecimento das famílias e das pátrias se faz pela soma da integridade de seus membros, e que tra z muito maior proveito à sociedade um só cidadão honrado mesmo qu e de posses modestas, que muitos cidadãos cheios de posse mas c orruptos.

Se de alguma forma eu ceder na aplicação destes pri ncípios, estarei colocando nas mãos dos outros a minha felicidade.

Compreendo que ao utilizar esta filosofia não me pe rmito usar certos recursos que poderiam me trazer coisas que não me p ertencem e, por agir assim, não serei avaliado pelos demais em pé de igu aldade e portanto não merecerei as honras que são outorgadas pelo mundo.

Não elogio a ninguém, não cortejo a ninguém, não la mbo as pessoas que estão no poder; assim sendo, não mereço dessas pessoas a mesma consideração que dedicam aos que agem dessa maneira .

Não pretendo, pois, conquistar as honras dos que ag em dessa forma.

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Afinai, se as honrarias do mundo têm esse preço, se rão elas honradas?

Nunca serei justo se pretender ter as coisas pelas quais não paguei. Por quanto se vende um jornal? Se alguém, pagando alguns trocados, recebe um jorna l e eu, nada

pagando não recebo jornal algum, não posso consider ar que esse alguém tenha levado alguma vantagem sobre mim.

Da mesma forma que esse alguém tem o jornal, eu ter ei os trocados que não gastei.

Da mesma forma, se não recebo honrarias do mundo é porque não paguei por ela o preço que vale em salamaleques, co rtejos e elogios. Nada me sobrou em lugar dessa honra? É claro que sim: a liberdade de não cortejar aqueles a quem não desejo cortejar e a lib erdade de não sofrer a insolência e a soberba daqueles que outorgam a honr aria.

Para que possa manter a coerência para com minha id eologia é preciso que aprenda a medir os outros da mesma form a que meço a mim mesmo. Quando morre o filho de alguém é comum que s e diga:

"Essas coisas acontecem." Mas, quando morre seu próprio filho essa mesma pess oa dirá: "Ai de mim, aconteceu-me uma desgraça!" Tenho que ser coerente e evitar agir dessa forma. N ão é possível que

eu tenha dois pesos e duas medidas. Da mesma forma que medir o meu próximo medirei a mi m mesmo. Fica fácil distinguir entre as coisas que dependem de mim e as que

não dependem de mim, basta perceber que as coisas q ue dependem de mim são todas ações interiores e as que não depende m de mim são todas ações exteriores.

São ações interiores meus pensamentos, minhas opini ões, meus desejos, minhas inclinações e minhas aversões.

São ações exteriores meu corpo, meus bens, minha re putação, as honras e dignidades que recebo do mundo, e todas as coisas que não são ações interiores.

As ações interiores são livres em sua própria natur eza, nada pode detê-las nem criar obstáculos a elas.

As ações exteriores, por não dependerem de mim são, já por sua própria natureza, fracas e sujeitas a obstáculos e inconvenientes que podem impedi-las.

Não tenho o direito de julgar o que ocorre com meu corpo e com minhas ações exteriores como fatos bons ou maus, po rque não cabe a mim julgar o que ocorre às coisas que não me perten cem.

Nada do que ocorre ao que me pertence pode ser bom ou mau. É simplesmente indiferente.

As pessoas que julgam o que ocorre com as coisas qu e não lhes pertencem, vivem aflitas e perturbadas, enfrentam o bstáculos e vivem a se queixar.

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Antes de iniciar qualquer ação, examinarei a ação q ue a precedeu e a que se seguirá, dessa forma o entusiasmo do começo não me abandonará quando os obstáculos aparecerem.

Quem deseja se tornar um lutador tem que examinar a tentamente as ações que precedem esse objetivo e as ações que o s ucedem e, se ainda assim achar que o objetivo vale o esforço, lançar-s e a ele sem esmorecer.

Quem deseja se tornar um lutador tem que ingerir al imentos que não lhe agradam, tem que cortar as guloseimas e os refr igerantes, tem que treinar arduamente, faça frio ou calor, tem que se sujeitar às exigências de seu técnico, sejam elas agradáveis ou não.

Quando lutar poderá quebrar as mãos ou as costelas, poderá beijar a poeira do chão, levará muitas pancadas e nem por is so terá vitória assegurada.

Se assim mesmo ainda deseja se tornar um lutador, d eve persistir nesse caminho.

Mas se a pessoa tenta esse caminho sem considerar t odas essas coisas, será como um garoto que não sabe o que quer e nunca chegará a ser nada, porque a nada terá se dedicado com todo o seu propósito.

As pessoas devem considerar a consistência do assun to a que pretendem se dedicar e verificar se suas naturezas oferecem recursos para tanto.

Quem quer ser um lutador tem que considerar a força de seus braços e de suas pernas, sua agilidade e outras con dições físicas.

Mesmo que você queira se dedicar à busca interior, ao autodomínio e à espiritualidade, terá que ficar atento e trabal har, haverá de vencer certos apetites, abandonar a companhia de certas pe ssoas, não mais merecerá a consideração de uns e certamente ganhará o desprezo de outros.

Se eu tiver que visitar alguém, previamente conside rarei o que me pode acontecer; talvez essa pessoa não se encontre em casa, talvez não possa receber-me, talvez bata com a porta em minha cara, talvez finja não perceber minha presença e, se mesmo assim tiver o d ever de visitá-la, aceitarei o que tiver que aceitar e não direi:

"Não pensei que isso aconteceria comigo." Porque só um homem que não busca o autodomínio se q ueixa de

coisas que não dependem dele. Todos os meus deveres se prendem à relação de deter minação que

se impõe sobre mim. É meu dever cuidar de meu pai e suportar suas adver tências e

reprimendas. Se alguém disser: "Mas ele é um mau pai!" , responderei:

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- A natureza por acaso determina que todos os pais sejam obrigatoriamente bons?

A natureza determina que haja um pai para que possa haver um

filho, mas isso não implica que para que haja um fi lho o pai tenha que ser bom.

Tenho que cumprir minha obrigação em relação ao meu pai e não me cabe a tarefa de julgar as ações dele e sim cumprir minhas responsabilidades em relação àquele que a natureza me determinou por pai.

Mesmo que seja um mau pai, ele não poderá me ferir, pois serei ferido apenas segundo minha opinião; se eu não quis er, ninguém me ofenderá.

Dessa forma atendo a minhas obrigações relativas ao s vizinhos, ao meu próximo e a mim mesmo, tratando cada qual com o respeito que a ele se deve.

Não perco tempo conjeturando sobre o futuro e tenta ndo adivinhar quais os desígnios que o mundo me reserva nos dias por vir.

Seja qual for o evento que me suceda, saberei como enfrentá-lo pois, se não for por uma coisa que dependa de mim, não se rá nem bom nem mau.

Procuro, sim, evitar preconceitos, desejos ou avers ões, pois essas coisas me impedirão de chegar à percepção de que to dos os acontecimentos são indiferentes, pois está em meu p oder fazer deles o uso certo, o que ninguém poderá impedir.

Não deixarei a sorte decidir sobre aquilo que é meu dever. Minha reputação não me pertence, pois depende das o piniões de

outras pessoas. Ninguém é senhor da própria reputação, e por melhor que seja um

homem, sempre haverá alguém que não o respeita e nã o o ama. O próprio Cristo foi traído por dois de seus apósto los; um em cada

seis o traiu. Não devo pretender melhor sorte. Se alguém me diz que outrem fala mal de mim, dir-lh e-ei: "A pessoa que fala mal de mim não conhece todos os meus outros

defeitos, senão não teria mencionado somente estes. " Quando alguém me prejudica ou fala mal de mim, proc uro me

lembrar que o faz achando que está fazendo o que é certo. Não devo esperar que as pessoas façam o que me pare ce certo e

sim que façam o que parece certo a elas. Se a pessoa que me julga baseia seu julgamento numa má

interpretação a meu respeito, o prejudicado é ela, visto que está enganando a si mesma.

Se alguém julga erroneamente um fato, não é o fato que se prejudica e sim a pessoa que a esse respeito engana a si mesm a.

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Partindo desse princípio aprendo a suportar a fofoc a, que é o esporte nacional do brasileiro.

Todos os fatos têm dois ângulos, devendo ser maneja do apenas por um desses ângulos.

Se meu irmão age de forma injusta, não manejo a sit uação pelo ângulo da injustiça que foi cometida. Prefiro manej ar a situação pelo ângulo que o torna meu irmão e, lembrando-me que fo i criado junto comigo e dos bons momentos que passamos juntos, sab erei suportar a injustiça.

É, preciso que eu aprenda a ver as coisas como elas são, raciocinando através da noção do que depende de mim e do que não depende de mim.

Se alguém se lava rapidamente, não devo julgar que se lava mal e sim que se lava em pouco tempo.

Se alguém bebe grande quantidade de cerveja, não de vo julgar que age mal e sim que tem a capacidade de beber em gran de quantidade.

Afinal de contas, não dependem de mim as ações das outras pessoas e também cabem a elas as opiniões que venha m a formar a respeito de suas ações.

Quando procedo dessa forma, baseio-me nos princípio s que conheço plenamente e não nas aparências dos fatos q ue presencio.

Quando assumo diante da vida um papel que esteja ac ima de minhas forças, não só desempenho indignamente esse papel c omo perco a oportunidade de fazer o que posso fazer com habilid ade e mérito.

A proporção dos bens materiais deve ser para cada u m como a medida do sapato em relação ao pé.

Você dificilmente se moveria livremente se seus sap atos fossem maiores que a necessidade de seus pés.

Quando me contento com pouco, não me excedo, mas se passo

desse ponto, sou arrastado cada vez mais por minhas ambições até um precipício.

Da mesma forma que os adornos de um sapato podem se r tão sofisticados que se perca de vista a sua função de proteger o pé, não há limites para aquilo que excede as medidas.

Quando pediam a Sócrates que indicasse um filósofo, ele, que era o maior filósofo da Grécia, indicava um outro, sem qu e por isso se sentisse diminuído.

Se alguém disser que não sei nada não me perturbare i com isso, afinal de contas os carneiros não mostram aos pasto res quanto capim comem, mas demonstram o que comeram através da lã q ue trazem sobre si.

Não tenho que mostrar teorias às pessoas, prefiro d emonstrar, através de meus atos e realizações, o que estes pri ncípios têm feito por mim.

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Mesmo quando satisfaço às necessidades de meu corpo apenas através de frutas e hortaliças, mantendo uma dieta útil e sadia, não me vanglorio disso.

Mesmo quando controlo minha vontade de tomar cervej a e bebo apenas água, não digo aos outros que bebo apenas ág ua.

Ao invés de adotar um comportamento presunçoso dian te dos pequenos atos de disciplina que imponho a mim mesmo , procuro me lembrar que os pobres e os miseráveis, diante de su as aflições são muito mais contidos, pacientes e econômicos do que eu.

Se me exercito com proveito no cumprimento destas r egras, é para meu proveito e crescimento pessoal e não para mostr ar-me ou vangloriar-me diante dos outros.

Considero as privações que imponho a mim mesmo como exercícios de autodisciplina e não como alarde diante do mundo .

A palavra responsabilidade significa a habilidade d e dar a resposta (resposta + habilidade).

Não a resposta no sentido de responder a uma pergun ta e sim a resposta no sentido de reação aos fatos da vida.

A maioria das pessoas acredita que são prejudicadas ou beneficiadas por causas externas, nunca por si mesm as.

Aquele que procura o caminho da virtude e merece se r reconhecido como sábio, se caracteriza por esperar todo o benef ício e todo o prejuízo de si mesmo.

Não cabe a mim censurar ninguém, louvar ninguém, ac usar ninguém, culpar ninguém e nem considerar-me como me lhor que os outros, pensando que sei alguma coisa ou que sou al guma coisa.

Quando alguma circunstância me impede ou me reprime , procuro em mim mesmo as razões.

Se alguém me elogia, sei rir de mim mesmo por dentr o e se sou censurado, não me defendo.

Todos meus desejos se voltam para as coisas que dep endem de mim e tenho aversão apenas às coisas que não depend em de mim.

Minhas emoções se demonstram livremente e não me im porto se me julguem tolo ou ignorante.

Acima de tudo vigio a mim mesmo como a um inimigo, pois o maior mal que me sobrevém é aquele que é capaz de surgir de mim mesmo.

Sei que o maior lutador é aquele que vence a si mes mo. Você só se torna senhor de si quando reconhece, atr avés de suas

ações, que as coisas que não dependem de você são i ndiferentes. Ao fazer isso você se torna livre; ninguém poderá f orçá-lo a fazer o

que não quer ou impedi-lo de fazer o que quer. Não terá, pois, motivos para se queixar de ninguém. Procure se lembrar que o oprimido que se queixa, te m a intenção de

se tomar opressor. A prisão, a pobreza e todas as coisas exteriores, s ó conseguem

diminuir a liberdade de seu corpo e de suas ações, não impedem portanto

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a sua vontade se você não adotar a loucura de prete nder aquilo que não depende de você.

Os tiranos só têm poder sobre aquilo que lhe é supé rfluo. Se esta Filosofia lhe parecer satisfatória, aceite estas regras para si

mesmo como modo de conduta e disciplina de vida, re speite-as como se fossem leis e não consinta em transgredi-las.

Não se preocupe com o que dirão a seu respeito; afi nal de contas, o que dizem faz parte das coisas que não dependem de você.

Por quanto tempo ainda vai deixar para depois a ace itação da tarefa de cumprir estas regras e viver de acordo com a raz ão?

Já conhece estes princípios, o que quer mais? Que outro mestre está esperando para responsabilizá -lo pela demora

em trilhar o caminho do auto-aperfeiçoamento? Pare de adiar sua decisão a respeito destes princíp ios, pare de jogar

para o futuro o início de seus esforços ou acabará por viver e morrer como um homem ignorante.

Faça com que aquilo que sua razão aponta como sendo o melhor seja para si uma lei inviolável.

Seja o que for que se apresente em seu caminho, lem bre-se que agora é a hora da luta e que não pode adiar mais o combate contra si mesmo.

Mesmo que seja derrotado num desses combates, só se rá um perdedor ou um vencedor dependendo do que aprendeu dessa derrota para usar em suas lutas futuras.

Esta é a batalha de sua vida, melhorar-se em cada c ombate, não cedendo a nada senão à razão.

Mesmo não sendo ainda senhor de si mesmo, procure v iver como alguém que almeja tornar-se senhor de si mesmo.

Os homens poderão lhe matar, é verdade, mas jamais poderão lhe ferir.

Agora você não tem nada mais a temer, pois aprendeu uma FILOSOFIA PESSOAL e sabe que a única coisa que lhe pertence é a sua vontade que forma sua opinião e atitudes diante do mundo.

Aprenda a caminhar para onde é o seu lugar e chegue lá com alegria, porque se você não aprender a fazer isso o destino o levará lá do mesmo jeito, mas lá você chegará como culpado e mesmo que não o queira.

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A Fraternidade Kung Fu A Fraternidade Kung Fu é uma instituição a serviço dos praticantes e

simpatizantes da arte marcial Kung Fu, cujos objeti vos, em seguida relacionados, visam o desenvolvimento integral do s er humano.

Nossos associados formam uma sociedade fraternal co mposta pela associação de pessoas interessadas no estudo e pres ervação dos conhecimentos filosóficos e marciais do Kung Fu.

Muito mais que uma arte marcial, um esporte ou uma técnica de defesa pessoal, o Kung Fu é uma maneira de viver e se fundamenta em métodos e técnicas capazes de influir positivamente na vida de seus praticantes, enriquecendo-lhes a existência e contr ibuindo para o sucesso em todos os campos do conhecimento humano.

As Vantagens de Sua Filiação Filiando-se à Fraternidade Kung Fu você tem a oport unidade de

reorganizar a sua vida através de métodos e técnica s especiais que lhe proporcionarão os elementos necessários para conseg uir o máximo de satisfação e realização pessoal em todas as áreas d e sua existência.

Você receberá uma orientação pessoal que lhe permit irá transformar todos os setores de sua vida em experiências de suc esso.

Independente dos estudos que tenha feito e, até mes mo se não teve oportunidade de estudar, desde que saiba ler, você está em condições de obter todas as vantagens e privilégios de sua filia ção individual e exclusiva.

Filiando-se à Fraternidade Kung Fu você recebe apos tilas que lhe transmitirão de forma gradual e sistemática, precio sos conhecimentos das técnicas físicas e mentais do Kung Fu.

Objetivos 1 - O ensino de técnicas marciais do Kung Fu, seu e studo através de

cursos especialmente preparados (cursos livres na m odalidade ensino à distância ou por correspondência), de aulas ao vivo e de revisões para aperfeiçoamento sistemático sob a tutela de profess ores credenciados pela União Nacional de Kung Fu.

2 - A preservação dos conhecimentos ancestrais do K ung Fu, transmitidos de mestres a discípulos através de inú meras gerações.

3 - O auto-aprimoramento moral do praticante de Kun g Fu e das pessoas que, mesmo não sendo praticantes, interessa m-se pelo aperfeiçoamento de si mesmas.

4 - O autoconhecimento, mediante o estudo e a aplic ação de técnicas psicológicas que permitem uma maior integr ação da personalidade e consequente melhoria das relações i nterpessoais.

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5 - A edificação de uma vida melhor, através da prá tica de métodos originais centralizados no desenvolvimento dos pote nciais individuais existentes em todo ser humano.

6 - O estudo das leis universais, aplicando esses c onhecimentos no desenvolvimento dos diversos setores da existência.

Os Estudos Os estudos da Fraternidade Kung Fu são subdivididos em graus

progressivos. O primeiro nível de ensinamentos compreende o grau de postulante.

É o primeiro grau de Estudos Básicos. Este primeiro nível se desenvolve através de oitent a apostilas

enviadas em vinte remessas que incluem, entre outro s, os seguintes assuntos:

Como obter flexibilidade através dos exercícios esp eciais do Kung Fu - Como construir seu próprio Moodjong - O primei ro movimento do estilo Wing Chun completo, incluindo aplicações - A s 108 técnicas do Moodjong - O primeiro movimento completo do estilo Ch'An Tao Chuan - Como usar a Espada Shaolin num Tchia Dsu completo c om mais de 100 movimentos - Como fazer você mesmo seu próprio Nunc haku - Os nomes chineses dos movimentos do Estilo Wing Chun - Os pr incipais movimentos do Nunchaku - Como criar uma Associação de Kung Fu em sua própria cidade, etc.

A história do Kung Fu - O templo Shaolin - Como usa r o seu tempo para realizar coisas que deseja - Ensinamentos tran scendentais do Budismo -Técnicas de Disciplina e Meditação do Kung Fu antigo - Segredos de Auto-Aperfeiçoamento e desenvolvimento pessoal - Como planejar e modificar seus objetivos de vida - A Esp iritualidade Kung Fu - Como Meditar - Como estabelecer metas - Lendas e Ap ólogos dos antigos Mestres de Kung Fu - A evolução pessoal através do método de Autoverificação - As técnicas de Meditação favorita s dos chineses e tibetanos - As normas budistas dos antigos templos do Kung Fu - A Sabedoria Milenar e sua aplicação na vida diária - O Dharma, etc.

Após concluir este nível, nossos filiados recebem i nformações a respeito dos outros níveis.

Para obter maiores informações, você pode visitar a home Page da Chinese Boxing Society / Fraternidade Kung Fu, ou e screver para:

- [email protected] , ou [email protected] - Caixa Postal 442 – CEP 18010-971 – Sorocaba - SP Home page: http://cbskungfu.host-ed.net/