O GRAFFITI - Operação de migração para o novo data ... · O graffiti Salientamos que o universo...
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O GRAFFITI COMO CONTEÚDO ESCOLAR: TÉCNICAS, ELEMENTOS FORMAIS
Professora PDE: Mariusi Gonçalves da Cruz Área de atuação: Artes
Orientadora: Profª Drª Elisabeth Seraphim Prosser IES vinculada - EMBAP
Programa de Desenvolvimento Educacional
RESUMO: Este artigo busca apresentar o graffiti como uma forma historicamente recente de expressão artística, a partir da inclusão dos elementos constitutivos formais da composição visual como fundamento para a fruição e o entendimento dessa Arte. Por meio do graffiti, objetivamos produzir em sala de aula um “novo olhar”, uma “nova fruição” para Arte como forma de expressão, pois apesar dos conteúdos relacionados ao graffiti encontrarem-se presentes no ensino da Arte, na maioria das vezes ele é tratado apenas enquanto técnica, desconsiderando o estudo de sua composição e estrutura. Procuramos discutir o graffiti como uma expressão artística de importância social, que vem gradualmente tomando espaço visual nos centros urbanos. Linguagem popularmente reconhecida entre os jovens, pois os atinge esteticamente, precisa ser melhor estudado e entendida por meio do ensino da Arte.
Palavras-chave:Graffiti, Composição, Ensino da arte.
ABSTRACT: This paper presents graffiti as a historically recent form of artistic expression. Presents its constituent elements of visual composition as foundation for the enjoyment and the understanding of this Art stile. Through graffiti, we aim to produce in the classroom a "new look", a "new enjoyment" for the Art as a form of expression, since the content related to graffiti are present in Art teaching, most often, treated only as a technique, forgetting its composition and structure. We seek to discuss how graffiti is an artistic expression of social importance, and is gradually taking visual space in urban centers. A language popularly recognized among young people, because it reaches them aesthetically, therefore, it should be best studied and understood through the teaching of Art.
Keywords: Graffiti, Composition, Art Education.
O graffiti e o ensino da arte
Neste artigo discorreremos sobre o graffiti, buscando os elementos nele
contidos e que podem ser estudados enquanto conteúdo escolar. Vale destacar, já
de início, que se trata de conteúdos que chegaram até as escolas por força da
identidade estabelecida entre o graffiti e os jovens nos últimos anos, já que é uma
expressão deles. Percebemos, na nossa experiência profissional, que os alunos
se identificam com as cores vibrantes, estilo e conteúdos do graffiti. Podemos até
mesmo dizer que foram as demandas dos jovens que o levaram para a sala de
aula e não o contrário. Atualmente o graffiti já faz parte do rol de conteúdos nos
currículos escolares; mas, se isso já acontece, o que nos levou a pesquisar este
assunto?
Partimos do pressuposto encontrado em nossa caminhada como professora
da educação básica, na qual verificamos que o graffiti enquanto manifestação do
jovem na atualidade constitui uma temática relevante para o estudo da arte em
sala de aula, pois vem tomando as paredes e os muros das cidades, e também os
muros das escolas. Encanta e surpreende os jovens com suas formas e cores, e
influencia na sua formação visual, provocando e transformando seus olhares. E
pelo fato de a maioria dos artistas de rua serem também jovens estudantes é
impossível a escola ignorar essa recente forma de manifestação artística.
Contudo, essa temática ainda é polêmica. Muitos acham que o graffiti “suja
a cidade” e o entendem como uma forma de expressão ofensiva à ordem social
e/ou destruidora do patrimônio público. Do ponto de vista dos seus autores,
porém, o graffiti é uma forma de participação no meio social que utiliza a arte para
expressar opiniões e posicionamentos de vida, o que faz outros jovens
identificarem-se rapidamente com este estilo. Por isso, este conteúdo é muito
solicitado nas aulas de artes, e só isso já é motivo suficiente para justificá-lo como
conteúdo escolar.
Em nossa reflexão, vimos que o graffiti necessitava de um estudo de seus
conteúdos de composição e consequentemente de um encaminhamento didático.
Como o Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE solicitava que os
projetos deveriam partir de problemáticas encontradas na escola com carência de
estudos, pensamos então no graffiti e na organização dos conteúdos. Surgia
assim a motivação para levantarmos questões em que pudéssemos buscar
elementos para a compreensão desta linguagem de forte penetração popular, a
qual poderia abrir portas para a apreensão de outros conteúdos relativos ao
ensino da Arte, pois, além das suas especificidades como arte de rua, o universo
ao qual pertence o graffiti, favorece o estudo de um grande leque de conteúdos da
linguagem visual.
Além disso, se o graffiti constitui uma expressão que sensibiliza e mobiliza
os jovens, poderia então, tornar-se importante ferramenta para apurar e educar
esteticamente os olhares. Para tanto, buscamos as especificidades artísticas
desta arte de rua e as possibilidades de sua organização enquanto conteúdo.
Verificamos já de início que são poucos os estudos teóricos acerca do graffiti, mas
encontramos muitos sites, matérias de revistas destinadas ao público jovem,
algumas matérias de jornais. Porém, poucos referenciais tratavam do graffiti em
sua organização como conteúdo escolar. Assim, em todo nosso trabalho nos
pautamos principalmente no estudo de Prosser (2010) em alguns autores do
ensino da Arte e em relatos dos próprios artistas grafiteiros.
A importância da organização dos conteúdos de composição e estrutura de
uma obra de arte é fundamental nos encaminhamentos metodológicos, para que
os alunos possam apreender os conhecimentos em foco. Segundo Ostrower
(1989), as relações estabelecidas entre os elementos formais e expressivos das
imagens são de suma importância para sua leitura. A autora expõe sua
experiência em um curso ministrado numa fábrica, no qual partiu do estudo dos
elementos visuais: linha, superfície, volume, luz e cor, até chegar à estruturação
da composição. Nessa experiência, considerou a reflexão do “fazer artístico” e
suas implicações sobre a relevância do conhecimento da arte. Destaca ainda a
grande importância sobre os modos de compor, fruir e entender a arte, assim
como dos elementos de composição. Este estudo aplicativo pode contribuir
sobremaneira para a apreciação estilística do graffiti, a partir de sua singularidade.
Parsons (1992, p. 84) observa que “o leitor tem que ter um conhecimento
sobre a composição da imagem e as formas básicas da sua organização para
entendê-la”. Segundo o autor, para atingirmos um grau elevado da experiência
estética é preciso familiarização com as imagens, e isso é desenvolvido por meio
da individualidade de cada um. Aponta, ainda, que um processo de
desenvolvimento estético acontece em uma sequência ao se observar o modo
como o artista organizou um conjunto de ideias. Segundo ele, deve-se perceber a
temática, a emoção em sua expressividade, a forma, o estilo e o material de
expressão, e considerar a experiência com a arte que cada um traz. É importante,
assim, o professor respeitar o conhecimento prévio do aluno. Porém, a ampliação
do conhecimento sobre os elementos constitutivos da arte o ajudará a ser mais
expressivo em sua produção artística.
Quanto à leitura das imagens, Barbosa (2007, p. 34) explica: “Temos que
alfabetizar para a leitura da imagem. Através da leitura das obras de artes
plásticas estaremos preparando a criança para a decodificação da gramática
visual, da imagem fixa, e [...] a prepararmos para aprender a gramática da imagem
em movimento".
A relação entre o conhecimento e a fruição da arte, para a autora, deve ter
base na leitura das imagens, da percepção dos elementos constitutivos e do
estudo da história da arte. Assim, podemos ampliar o repertório visual e o “olhar”
de nossos jovens. Sendo o visual constante no cotidiano das cidades,
instrumentalizar os jovens e adolescentes para a leitura e a decodificação das
imagens torna-se uma tarefa que a aula de arte deve ter como compromisso..
Foi com base nos referenciais que o livro Graffitti Curitiba, de Elisabeth
Prosser (2010), nos trouxe, que encontramos os conteúdos essenciais e
consolidamos nossa proposta. Sobre o graffiti, especificamente, Prosser (2010, p.
69) afirma: “A própria estética da intervenção urbana é baseada na energia rápida
e intensa obtida pelos seus traços fortes, suas cores contrastantes, suas
mensagens sintéticas, objetivas e diretas e, no caso o graffiti-arte, pelas suas
grandes dimensões”.
Com relação aos traços fortes, referidos pela autora, neles está contido
todo um conteúdo a ser pesquisado, pois a linha na composição pode definir-se de
diferentes maneiras: forte, vigorosa, pontilhada, tracejada, grossa, fina, ondulada,
quebrada, em posição horizontal, vertical etc. Ela define um universo de
sensações, que pode alterar nossa percepção de uma obra. Logo, há uma
complexidade quando estudamos tecnicamente um estilo. Levar essa discussão
para as aulas seria valorizar e entender o graffiti como linguagem expressiva. E
ainda, para compreendermos melhor esta reflexão, Prosser (2010, p. 98) afirma
que “uma abordagem simplista [...] do graffiti pode ser equivocada. É preciso
estudá-lo [...] como um universo complexo de formas, funções e significados”.
No que se refere aos seus aspectos formais, o graffiti constitui um universo de
formas geométricas ou orgânicas, abstratas (raras) ou realistas. Vale lembrar que
além dos elementos de sua composição, podemos levar em conta que esta
representação traz em si, ideias, pensamentos e atitudes.
Além do mais, se o estudo deste estilo contém elementos que desenvolvem
atitudes, que se coloca como linguagem contemporânea, isso se torna o suficiente
para futuramente aprofundarmos a pesquisa em seus aspectos sociais, filosóficos
e estéticos. Nesse sentido, Auma, um artista grafiteiro de Curitiba, apresenta
sugestões e alguns caminhos para o debate sobre a pichação e o graffiti. Aponta
ele que a arte de rua pode ser um instrumento educativo para a formação da
cidadania:
Enquanto nós artistas não tivermos uma preocupação em formar e informar esse cara [o pichador] de que aquilo [o monumento que ele pichou] tem valor histórico, ele não vai tomar consciência. [...] A gente tem que investir não só na escola, mas enquanto artista, ou enquanto mídia (AUMA, citado por PROSSER, 2010, p. 85).
Auma mostra, assim, que a grande responsabilidade da escola e de seus
docentes, na formação dos seus alunos, ultrapassa os conteúdos da arte para
atingir a autonomia e a cidadania.
O graffiti
Salientamos que o universo do graffiti é bastante singular, composto de
vários estilos e técnicas, que recebem uma nomenclatura específica, criada pelos
seus autores. Segundo Souza, Fialho e Araldi (2005, p. 14):
Graffiti é a expressão plástica, representada por meio de desenhos ou mensagens sobre qualquer assunto, feitas com spray, rolinho e pincel em muros ou paredes. Sendo considerado por muitos uma forma de arte, diferente do picho, que tem a função de apenas deixar uma marca. O graffiti é usado por muitos como forma de expressão e denúncia.
O graffiti, como arte de rua, expressa em sua linguagem muito além do
visível. Ele se compõe de técnicas específicas, sendo o desenho e a pintura
usados de formas peculiares. Vimos nas assinaturas, o “fazer”, que desperta o
artista adormecido em muitos jovens, sendo muito trabalhadas e estudadas pelos
artistas, em função dos detalhes e do caráter individual de cada uma. As
assinaturas funcionam como marca expressiva do artista de rua e por isso torna-
se um conteúdo de suma importância e que não pode ser visto rapidamente em
uma ou duas aulas, pois ela requer treino em sua apropriação.
Cabe lembrar que a origem desta manifestação artística é estadunidense e,
muitos dos termos utilizados são naquele idioma. Como a assinatura constitui o
elemento primordial do graffiti, juntamente com os personagens, faremos uma
breve referência às particularidades de alguns estilos de assinaturas (as tags).
De acordo com Prosser (2010), a tag é uma assinatura, é o próprio nome
(geralmente um pseudônimo) do seu autor, uma marca. É a sua assinatura
personalizada e pode conter mensagens sutis e, por vezes, enigmáticas. Pode
incorporar as iniciais do artista ou outras letras. Outra forma é o bomb, em que o
grafiteiro usa letras rápidas em duas dimensões, às vezes gordas e arredondadas,
às vezes angulosas. Nele são utilizadas normalmente duas cores. A primeira, que
cobre toda a letra; e depois outra, com a qual é feito o contorno. Já o Wild Style se
apresenta como um estilo mais complexo de assinatura: as letras são distorcidas e
vêm acompanhadas com a adição de setas e outros elementos, o que as tornam
assinaturas de difícil leitura. O Grafite 3D é aquele que passa a ideia de
profundidade, com o uso de sombras. Para esta modalidade, o grafiteiro ou writer
precisa ter uma técnica bastante apurada e destreza na combinação de cores e de
formas (PROSSER, 2010). Para a autora, o tag reto (Fig. 1) é uma criação
brasileira. É escrito rapidamente, cheio de ângulos, os quais, segundo os artistas
de rua, são fruto de elaboração, estudo e certos cuidados na sua realização (como
o tamanho e a distância entre as letras, a direção e a forma dos traços etc.),
portanto envolvem critérios artísticos. Como já dissemos, as assinaturas são
expressões personalizadas, logo não se copia, mas se pode explorar o “próprio”
tag, criando. Pode-se dar ênfase nos critérios descritos em relação ao tamanho,
distância, direção e forma do traçado da assinatura. O uso da linha quebrada é
predominante, e resulta em várias angulações e linhas curvas como detalhes do
estilo. O movimento é quebrado e se direciona para a esquerda e direita:
Figura 1 - CRYSE, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 99. Foto: Elisabeth S. Prosser.
Figura 2 - TRIBAL, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 100. Foto: Elisabeth S. Prosser (2010).
Figura 3 - MAICO, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 100. Foto: Elisabeth S. Prosser (2010).
A tag apresentada na Figura 2 é considerada bem simples. É
construída apenas por traços, feitos rapidamente e geralmente em locais não
autorizados. Na Figura 3, verificamos a fusão das letras com números. . Toda a
assinatura tem uma identidade própria. Uma assinatura não se copia, é algo que
deve fluir com naturalidade, treino e tempo. Pode-se orientar e destacar critérios
de tamanhos e direções das letras, a espessura e tipos das linhas (quebradas,
ondulada, mistas) etc. Se o aluno preferir, pode escolher um apelido, desenhar as
letras isoladamente e depois uni-las.
Pode-se solicitar que os alunos experimentem maneiras de assinar seu
nome ou pseudônimo no estilo apresentado acima, usando poucas letras. Quanto
maior o repertório de informações visuais oferecido aos alunos, melhores serão as
condições para os resultados. Oferecer um tempo ao final da aula para que
possam compartilhar e mostrar seus trabalhos é fundamental, pois o graffiti é um
modo social de expressão e destaca-se no coletivo.
O bomb ou throw-up, apresenta poucas linhas em uma ou duas cores, as
formas podem ser consideradas mais orgânicas. Linhas angulosas ou curvas,
geralmente fechadas, resultando formas variadas, letras arredondadas, gordas ou
em forma de bolhas. Há variação de tamanhos e nas direções.
Figura 4 - MICKAY, CRESPO, HINOCENTE e outros, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 101. Figura 5 - MICKAY, MEL e outros, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 101. Figura 6 - GILR45 MNC, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 101. Fotos: Elisabeth S. Prosser (2010).
Na Figura 4, podemos observar as tags de vários artistas de rua. Na Figura
5, observamos setas, corações e um personagem de olhos fechados, sombreado
por cores mais fortes. Na Figura 6, a assinatura recebe um tratamento especial: as
letras apresentam texturas, algumas estrelas, listas concêntricas, bolinhas etc.
Outro tipo de assinatura é o wild style, que avança em sua complexidade
em relação às anteriores, os estilos de letras vão ficando mais complicados e
criativos, tanto no seu desenho e formatos quanto para sua leitura. As letras, além
de sombreadas, se entrelaçam umas às outras. Apesar da diversidade e da
distorção, há uma unidade de formas e coerência estilística (Fig. 7).
Figura 7 – KEES. Curitiba.
Foto: Elisabeth S. Prosser (2010).
Na Figura 8, a assinatura apresenta grandes mudanças visuais, como o uso
de cores em nuanças, a combinação das cores e texturas, volumes e
profundidade através das sombras, texturas e figura e fundo definidas. É como se
a assinatura saísse do próprio muro, e como se fosse observada por um
personagem à esquerda.
Figura 8 - GNEZIS, CIÚME, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 102. Foto: Elisabeth S. Prosser (2010).
Outra particularidade que encontramos no graffiti é sua relação com as
Histórias em Quadrinhos, por conta da criação dos personagens. Ao olharmos os
muros, estabelece-se um diálogo contundente entre nós, observadores, e os
personagens criados pelos artistas. Os personagens, juntamente com as
assinaturas, são marcas expressivas e fazem parte do graffiti. Alguns são
adaptados das histórias em quadrinhos, da charge e da caricatura, outros são
inspirados no estilo das HQs, com seus contornos e traços sintéticos (Figs. 9-11).
Figura 9 - DOSE, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 108. Figura 10 - SIEL, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 109. Figura 11 - BAYCROC, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. 131. Fotos: Elisabeth S. Prosser (2010).
O graffiti artístico ou de livre figuração – envolvem tanto assinaturas
elaboradas quanto os personagens.
A partir dos elementos estudados, encontrados no graffiti, foram propostas
atividades com os alunos, em sala de aula. Algumas propunham a criação de
personagens. Os desenhos a seguir (Figs. 12-17) foram feitos com os alunos da
7ª série do ensino fundamental e demonstram, ainda, uma forte ligação com a
realidade. Nota-se, desde já, uma busca pela distorção, especialmente se
considerarmos as proporções da cabeça e do corpo. Isso já aponta para uma
personalização do personagem. A estilização característica do graffiti é algo a ser
alcançado pelos alunos, individualmente, mediante a busca do próprio traço, da
expressão pessoal, com muito treino e experimentação, que o aluno pode realizar
fora da sala de aula, como o fazem os grafiteiros.
De modo geral, os artistas de rua treinam a sua assinatura, criando novas
maneiras de escrevê-la. Vale lembrar dos “caderninhos” carregados de
assinaturas e desenhos que muitos alunos trazem nas mochilas. Destacamos que
este treino espontâneo é também o grande aliado nosso, pois ao fazê-lo nossos
alunos adquirem noções básicas do desenho, de composição e de concentração.
Podemos verificar nos desenhos a seguir, o quanto esta expressão pessoal
é marcada em sua singularidade.
Figuras 12-17 – Desenhos realizados por alunos de 7ª série do Ensino Fundamental, com base no estudo do graffiti e seus personagens. Escola Estadual Tânia Varella Ferreira, Maringá, 2011, sob orientação da Profª Mariusi Gonçalves.
A atividade realizada para a criação dos personagens acima, chamou
atenção quanto aos resultados, pois os alunos ao observarem seus desenhos e a
produção de seus colegas de sala fizeram comentários bastante relacionados aos
conteúdos, se referindo aos detalhes visuais do desenho como: as proporções, os
tipos de linha, volume, a expressão dos olhos. O que contribuiu para o ensino de
detalhes bastante técnicos.
Outra técnica muito usada na arte de rua é o estêncil (ou máscara), pois
permite uma atividade rápida, mas de grande resultado expressivo. Esta técnica
permite um trabalho diretamente sobre os muros, paredes e outros suportes. A
máscara é um modelo recortado em papelão ou em folhas de acetato, que é
colocado sobre a parede e leva um jato de spray ou é pintado com um rolinho. Ao
se tirar o estêncil, fica a figura recortada.
FIGURA 13 – DIMAS (INTERLUX), Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. ??. Foto: Elisabeth S. Prosser (2010).
FIGURA 14 – DESTRO, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. ???. FIGURA 15 – INTERLUX, Curitiba. In: PROSSER, 2010, p. ???. Fotos: Elisabeth S. Prosser (2010).
Com o estêncil, são realizadas muitas intervenções urbanas,
frequentemente combinando-o com as do graffiti (spray, rolo, canetão, etc.).
Sendo nosso propósito na pesquisa levantar os conteúdos que o grafite traz,
não poderíamos deixar de mencionar algumas técnicas artísticas desta atividade
de rua, destacando-se o desenho, a pintura e o estêncil.
A implementação e resultados do Projeto Graffiti na Escola
No que se refere à implementação desta pesquisa, relataremos a seguir
algumas impressões do processo. A experiência ocorreu entre setembro e
dezembro de 2011, em um Colégio Estadual de Maringá, Paraná. Os caminhos
percorridos durante a aplicação do projeto foram sistematizados de acordo com as
etapas dos conteúdos propostos na Unidade Didática, especialmente elaborada
para tal, sendo os mesmos ainda básicos para este estudo.
Planejamos as aulas com as seguintes abordagens: apresentação e relato
do Projeto Graffiti na Escola, justificativa junto aos alunos sobre a necessidade do
estudo, apresentação dos conteúdos relativos aos elementos estruturantes da arte
visual e de composição, tags – estilos reto e simples, bombs, e graffiti 3d, criação
das assinaturas, criação de personagens, técnica do estêncil.
Apesar da disposição de conteúdos descrita, não foi seguido um roteiro
rígido, mas as aulas ocorreram conforme as necessidades dos conteúdos que
eram abordados. Enfatizamos, no entanto os estudos de composição nas
assinaturas, a criação de personagens e as técnicas de desenho e de estêncil.
Após as atividades realizadas pelos alunos, tanto na elaboração de assinaturas
quanto na criação de personagens, o projeto foi finalizado com uma pequena
exposição dos trabalhos nos corredores da escola.
Em nosso contato inicial, os jovens alunos mostraram-se entusiasmados e
interessados. Observamos que o olhar e as opiniões dos estudantes em relação
ao graffiti são bastante controversas e ocasionam acirradas discussões, às quais
não podemos nos furtar, pois um dos objetivos das atividades com esse estilo de
arte é justamente fomentar a discussão e a reflexão. Há sempre a polêmica do
que é graffiti artístico e o que é “picho”, o que resulta em uma conversa frutífera
sobre o que é arte e o que não é. Os temas abordados nas discussões giraram em
torno de questões como vandalismo, liberdade de expressão, direitos e deveres.
Desenvolvemos as aulas em uma turma única da 7ª Série do Ensino
Fundamental no período noturno, composta de mais ou menos 25 alunos, dos
quais apenas 5 meninas, todos em uma faixa etária que variava entre 15 e 18
anos. Muitos trabalhavam durante o dia e estudavam à noite.
Segundo a orientação pedagógica da escola, a turma apresentava muitas
faltas e desinteresse em relação aos conteúdos em geral o que acabou sendo
superado, pelo menos nas aulas de arte. Logo de início todos demonstraram
interesse pelo estilo, e os caderninhos de treinos de assinaturas e desenhos logo
começaram aparecer. Isso nos aproximou bastante. Havia preocupação de minha
parte, para que o assunto não se limitasse às discussões sobre “pichação”, um
assunto recorrente o tempo todo.
Logo na primeira aula, os alunos mostraram-se curiosos para saberem o
que iriam estudar antes de fazermos um graffiti. Começamos pelas assinaturas e,
como estratégia, optei por uma conversa sobre a maneira de ser de cada um. Este
espaço de conversa foi muito importante na criação das assinaturas, pois todos se
sentiram mais à vontade e criativos com as atividades. Verificamos que uns
necessitavam de um tempo maior para as descobertas, e outros, mais
experientes, resolviam mais rápido. Os caderninhos de desenhos passaram a nos
auxiliar. Ainda que fosse uma criação individual, uns acabavam emprestando ao
colega algum estilo de letra, ou criavam-se estilos sobre as propostas que os
“caderninhos” traziam.
Sempre ao início das aulas era preciso dar um espaço para que cada um
pudesse contar o que observou, quanto à arte de rua, no caminho para o trabalho
ou para a escola. Era interessante ver como muitos descreviam em detalhes os
graffiti vistos pela janela do coletivo ou do carro. Assim, os contextos sociais que
propiciam a difusão desse estilo eram discutidos e, partindo daí, os elementos de
sua composição e estrutura artística.
Optamos por não dissociar os elementos de composição da obra,
estudando-os à parte: partimos dos contextos para chegar a tal estudo. Os alunos
sugeriram e acatamos a ideia de fotografarem os graffiti do próprio bairro,
trazendo-os para discutir sobre eles na sala de aula. Sugeriram, também, que na
apresentação das imagens fotografadas se deveria fazer uma leitura visual do
graffiti em questão. Foi muito bom vermos que o vocabulário expressivo em sala
de aula foi mudando aos poucos. Termos como: a composição, a linha, as cores, a
forma, a expressão, o contexto, artistas de rua, arte coletiva, começavam a fazer
parte do linguajar daqueles jovens.
A avaliação final foi realizada por meio de painéis visuais, e mediante a
discussão do conteúdo com o grupo sobre a produção e seu processo. No debate,
foi possível levantar outras possíveis relações entre o graffiti e os aspectos
curriculares essenciais da disciplina de arte. Não foi possível a pintura de graffiti
no muro da escola, como era previsto, por questões administrativas.
Concluímos que a arte de rua possibilita uma grande articulação com os
conteúdos escolares, sendo que a carga de conhecimentos e informações que
traz é abrangente e vasta.
No que se refere aos aspectos formais, o graffiti constitui um universo de
formas orgânicas, geralmente assinaturas ou personagens. Quanto às mensagens
que veicula, traz em si ao mesmo tempo, como mencionado, ideias, pensamentos
e atitudes, geralmente de resistência ou de protesto, mas também de identidade e
humor. Por isso é preciso proporcionar aos alunos estes conteúdos em toda sua
expressão, que guarda muitos aspectos sociais, filosóficos e estéticos. É preciso
discutir esta arte contemporânea como prática vinculada à sociedade, assim como
as técnicas empregadas na sua elaboração.
Cabe ao professor se assumir como facilitador da fruição desta arte,
estimulando o aluno a deixar o papel de espectador e reprodutor apenas, e
possibilitar a ele a construção do próprio discurso conceitual. Como professora
PDE, tentamos organizar um pouco estes conteúdos com os quais os jovens têm
afinidades. Sem dúvida, isso possibilitará o transitar entre as muitas faces da
realidade e do aqui e agora, às quais o graffiti tanto se relaciona.
Valorizar e estudar o graffiti enquanto expressão artística se faz necessário
e a escola só tem a ganhar, pois, a partir desta linguagem contemporânea, é
possível trabalhar com outros tantos conteúdos que se referem à história da arte e
à realidade dos nossos jovens.
Acreditamos que a arte de rua, na sua contemporaneidade, deve ser
compreendida em toda a sua complexidade e contexto. Construída por diferentes
técnicas e materiais, ela é veículo de um discurso conceitual, por isso não pode
ser simplesmente observada e reproduzida. Cabe aos educadores serem os
facilitadores da fruição dos educandos, estimulando-os a deixarem o mero papel
de espectadores e possibilitando a eles, assim, a construção do seu próprio
discurso conceitual. A interação que a arte de rua permite é intensa, sendo
conteúdo educativo em todo o seu contexto cultural, inclusive pelas relações de
tempo e espaço que traz.
Preocupamo-nos, na implementação do presente projeto, em explorar este
conteúdo em sua atualidade, com o qual os jovens apresentam afinidades e que,
até mesmo, tanto reivindicam. Este conteúdo possibilita transitar por diferentes
temas e, consequentemente, permite uma nova reflexão sobre as práticas
escolares, a partir das manifestações artísticas produzidas em nossa época e à
nossa volta, ouvindo assim, o que os alunos têm a dizer e a expressar.
Portanto, não há como a escola ficar alheia a esta expressividade
carregada de indicativos sociais e artísticos e que está nos arredores das escolas.
Cabe então entender o graffiti como expressão artística de um grupo social e que
precisa ser considerado em toda sua amplitude. Isso mostra não ser mais possível
a escola deixar essa manifestação social ser abordada de forma excludente e
reducionista. Sabe-se que o graffiti não é um “fazer” apenas por lazer ou rebeldia,
mas um “fazer” intenso com muitos significados, portanto faz-se necessário
valorizá-lo enquanto expressão do nosso tempo. Nesse sentido, a escola só tem a
ganhar com a incorporação e a problematização do graffiti enquanto conteúdo
curricular do ensino da arte, pois o envolvimento dos jovens com esta prática
artística os tem levado ao aprofundamento dos estudos, principalmente em
direção aos cursos superiores de Artes Visuais e Design Gráfico.
REFERÊNCIAS
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http://www.stamperia.com/tecniche