O Meio Urbano
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O MEIO URBANO
SILVA, R. S.; LOPES, S.B.
Para intervir com maior possibilidade de sucesso, com eficiência, deve-
se ter como ponto de partida o conhecimento da realidade. No entanto, é necessário
que esse conhecimento ultrapasse a barreira do imediatamente visível e busque, na
dinâmica do objeto, as “leis” gerais que o conduziram, bem como a sua vigência nos
diferentes momentos concretos. Assim, a história recente da cidade brasileira traz
preciosas informações para a apreensão da sua situação atual e para balizar a ação
sobre o meio urbano.
No nosso país, o crescimento desse espaço privilegiado de
aglomeração, pelo menos nos dois últimos séculos, está relacionado com a economia.
Vindo de um modelo agrário – exportador, o Brasil a partir do segundo quarto do
século foi, aos poucos, criando condições para sua industrialização. Destaca-se uma
sequência de fatores conjunturais que a possibilitou, dentre os quais, a crise de 29,
que gerou dificuldades de exportação de produtos agrícolas, as crises internacionais
do café e, principalmente, a dificuldade de importação de produtos industrializados
ocorrida durante a Primeira e Segunda Guerras Mundiais. O capital, até então
predominantemente agrícola, foi se deslocando para o setor industrial substitutivo de
importações. Inicialmente, os investimentos privados ocorreram também nas obras de
infra-estrutura necessárias para esta produção, como a ferrovia, a geração de energia
elétrica e a urbanização de vilas operárias.
Após a Segunda Guerra Mundial, consolidou-se em quase todo o
mundo, um modelo de desenvolvimento que colocou o crescimento econômico como a
perspectiva hegemônica. Nesse período, ocorreram grandes avanços nas estruturas
capitalistas de produção. A Europa, então arrasada pela devastação bélica, recebeu
um significativo aporte de recursos para a sua reconstrução e para o atendimento das
novas demandas de consumo que surgiam. Os Estados Unidos da América, também
recém saídos da guerra, com sua economia forte e estruturada e com seu território
físico ileso, tiveram condições financeiras para implementar o Plano Marshall de
auxílio às nações européias. Esta conjunção de fatores provocou uma retomada de
crescimento sem precedentes na história recente, com um forte incremento do sistema
de produção e de rápida expansão do mercado de consumo, em todos os segmentos
da economia.
Em países periféricos como o Brasil, na ressonância desse processo foi
estabelecida uma política de incentivo estatal às condições para industrialização. Sob
o governo de Getúlio Vargas, concretizou-se o financiamento via Estados Unidos da
América, para a implantação da primeira siderúrgica brasileira, a Companhia
Siderúrgica Nacional – CSN. Dava-se, então, um importante passo na definição do
2
caráter da industrialização com o início da produção do aço e a preparação do
caminho para a implementação das linhas de montagem de automóveis. Esta opção
teve também respaldo dos integrantes da Comissão Econômica para a América Latina
– CEPAL, que defendiam a necessidade de industrialização do país para poder
equilibrar a balança comercial ante a restrição das importações. Visualizava-se,
também, uma consequente ampliação de competitividade brasileira nas relações de
mercado internacionais.
O Estado estruturou-se para essa nova área de investimento do capital
através da implantação de órgãos específicos da indústria, do comércio e das relações
de trabalho (ministérios, comissões especiais e conselhos), da elaboração de políticas
de desenvolvimento e da criação de condições gerais de produção, assumindo dessa
forma a responsabilidade pela implementação e manutenção da infra-estrutura básica
exigida pelo novo modelo de acumulação. Assim a energia elétrica dos grandes
centros, a telefonia, o abastecimento de água, a coleta de esgoto, as ferrovias e parte
do transporte coletivo foram encampados pelo Estado.
Alguns anos depois, já na década de 50, com a posse de Juscelino
Kubitscheck, teve-se a continuidade da fomentação desse processo de
industrialização, pautado no “Plano de Metas” de JK que se propunha: “... acelerar o
processo de acumulação aumentando a produtividade dos investimentos existentes e
aplicando novos investimentos em atividades produtoras” buscando fazer um governo
de “50 anos em 5”.
Parte integrante desse projeto institucional de desenvolvimento, o
processo de instalação de um parque industrial, principalmente na região sudeste,
necessitou arregimentar mão de obra para responder a esse novo momento. Nesse
contexto, intensificaram-se os fluxos migratórios entre regiões, do norte e nordeste
para o sul e sudeste, e entre o campo e a cidade. O cenário era de cunho
desenvolvimentista, com o fortalecimento de uma classe média consumidora dos
produtos gerados neste processo.
No entanto, nem as cidades se encontravam suficientemente
preparadas para o fluxo migratório existente neste período, nem o Estado e o
investidor privado priorizavam o correspondente provimento da infra-estrutura urbana.
As localizações guiadas pelo mercado da terra urbana e a ausência de políticas
sociais que considerassem essa expansão acabaram gerando ocupações sem o
fornecimento de serviços de saneamento, de transporte e sem uma política
habitacional consistente, capaz de atender o novo contingente urbano. A busca por
áreas de assentamento de custos mais baixos expandiu as periferias das grandes
cidades, com evidentes comprometimentos da qualidade de vida da população e da
qualidade do próprio meio.
3
Ao mesmo tempo em que a cidade não apresentava condições dignas
de ocupação às camadas mais pobres da população, significava um grande polo de
atração graças à oportunidade de empregos nos setores da economia aquecidos pela
industrialização. Segundo GRIMBERG (1994),
“As áreas urbanas em todo o mundo, são consideradas locais
privilegiados para geração de emprego, para a inovação, para
ampliar as oportunidades econômicas. Os centros urbanos
revelam uma enorme agilidade na construção de uma rede de
relações no plano da economia, da política, da cultura,
conectando zonas rurais, pequenas e médias cidades”.
Nas décadas subsequentes, as grandes cidades, principalmente as do
sudeste, se expandiram e conurbaram com municípios vizinhos, dando origem às
regiões metropolitanas, que se caracterizam por abrigarem complexos sistemas de
relações sociais, econômicas e culturais.
Assim, a situação urbana brasileira desse século, apresentada de forma
resumida, é a de uma contínua concentração do capital e da população, uma
ampliação das disparidades regionais e o crescimento do desemprego e do déficit de
serviços urbanos e de habitação, tudo isso aliado a uma apropriação predatória do
patrimônio ambiental.
A EVOLUÇÃO DA URBANIZAÇÃO NO BRASIL
Os fenômenos de urbanização acelerada e o crescimento demográfico
decorrentes do processo de industrialização podem ser mais bem visualizados através
da coleta de dados estatísticos sobre a dinâmica demográfica. O grau de urbanização
fica evidente quando se constata que a população total do Brasil, entre 1940 e 2010,
cresceu 4,6 vezes e que, nesse mesmo período, a população urbana teve um
crescimento, aproximadamente, três vezes maior (12,5 vezes). Tais valores apontam,
claramente, para o fluxo migratório campo - cidade.
Em um período de 40 anos (entre 1940 e 1980), houve uma inversão na
proporção existente entre as populações rurais e urbanas quando passou-se de 2/3 da
população total em área rural, nos anos 1940, para 2/3 da população total em área
urbana, nos anos 1980. No período de maior intensidade desse processo, as décadas
de 1970 e de 1980, somaram-se 60 milhões de habitantes às populações das cidades.
Atualmente a população brasileira que vive em cidades já representa quase 3/4 da
população total.
Os dados da Tabela 1 ilustram a concentração urbana ocorrida entre
1940 e 2010 e, complementando com a análise do gráfico da Figura 1, fica bem nítida
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a inversão na proporção entre população urbana e rural, que iniciou por volta de 1970.
O gráfico da Figura 2 ilustra a evolução da Taxa de Urbanização no mesmo período,
que iniciou na casa dos 30% em 1940, chegando a aproximadamente 85% em 2010,
apresentando uma tendência de se manter estável para os próximos 20 anos.
Tabela 1 – Análise do crescimento da População Brasileira entre 1940 e 2010, Total e
por situação (Urbana ou Rural), da Taxa de Urbanização e do Índice, tomando-se
como referência a População Urbana de 1940.
Ano População
Urbana
População
Rural
População
Total
Taxa
Urbanização
Índice
População
Urbana
1940 12.880.182 28.383.133 41.263.315 31,21 100
1950 18.782.891 33.161.506 51.944.397 36,16 146
1960 32.004.817 38.987.526 70.992.343 45,08 248
1970 52.904.744 41.603.839 94.508.583 55,98 411
1980 82.013.375 39.137.198 121.150.573 67,70 637
1991 110.875.826 36.041.633 146.917.459 75,47 861
2000 137.755.550 31.835.143 169.590.693 81,23 1070
2010 160.925.792 29.830.007 190.755.799 84,36 1249
Fonte: IBGE / Séries Históricas (2010)
5
Figura 1 – Análise do crescimento da População Brasileira entre 1940 e 2010: Total e por situação do domicilio (Urbano ou Rural)
Fonte: IBGE / Séries Históricas (2010)
Figura 2 – Evolução da Taxa de Urbanização no Brasil de 1940 a 2010 e tendência
para os próximos 20 anos Fonte: IBGE / Séries Históricas (2010)
É importante também trazer o foco de observação para as
especificidades internas. Quando se analisa o processo de urbanização sob a ótica
regional, depreendem-se novos aspectos que permitem um aclaramento dos fluxos
gerados pelas correntes migratórias internas ao país em cada período (Tabela 2).
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Tabela 2 – Análise da evolução da Taxa de Urbanização, no período de 1940 e 2010,
no Brasil e Grandes Regiões.
REGIÃO 1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010
Brasil 31 36 45 56 68 76 81 84
Norte 28 31 37 45 52 59 70 74
Nordeste 23 26 34 42 50 61 69 73
Sudeste 39 48 57 73 83 88 91 93
Sul 28 30 37 44 62 74 81 85
Centro Oeste 22 24 34 48 68 81 87 89
Fonte: IBGE / Séries Históricas (2010)
Na Tabela 2, as setas indicam a relação entre as taxas de cada região e
a taxa de urbanização brasileira, no período considerado. Na análise dos números,
apresentados evidencia-se a importância da região sudeste no processo de
industrialização até o período recente, elevando de forma constante as taxas de
urbanização do país (setas verdes). Observas-se que até a década de 1970 essa era
a única região que apresentava taxas superiores à média nacional. A partir de 1980 a
região Centro Oeste começou a apresentar um rítmo mais intenço de urbanização,
seguido pela Região Sul, a partir de 1991. O gráfico da Figura 2, deixa mais clara esta
análise.
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10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010
TA
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ANOS
EVOLUÇÃO DA TAXA DE URBANIZAÇÃO DAS GRANDES REGIÕES BRASILEIRAS ENTRE 1940 E 2010
Norte
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro Oeste
Figura 03 – Análise da evolução da Taxa de Urbanização nas grandes regiões Brasileiras no periodo entre 1940 a 2010
Fonte: IBGE, Censo demográfico 1940-2010. Até 1970 dados extraídos de: Estatísticas do século XX. Rio de Janeiro: IBGE, 2007 no Anuário Estatístico do Brasil,
1981, vol. 42, 1979
Percebe-se, na análise do gráfico da Figura 2, que embora a Região
Sudeste tenha apresentado, desde 1940 até 2010, taxas de urbanização sempre
7
acima da média nacional, o crescimento no mesmo periodo foi menos drástico que o
apresentado pelas regiões Centro Oeste e Sul (principalmente entre 1970 e 1991).
Isto também fica claro quando analisamos a evolução da contribuição
da população total e urbana das grandes regiões, em relação os valores nacionais.
(Figura 4 e 5). Analisando-se o gráfico da Figura 5, verifica-se que em 1940 a
população urbana no sudeste representava mais da metade da população urbana
brasileira (56%), enquanto que contribuia com menos da metada da população total
(44%, Figura 4).
Nos últimos 70 anos a contribuição da população da região Sudeste
para a população total brasileira vem caindo gradativamente tendo reduzido em 2%.
(Figura 4). Porém, se considerarmos somente a população urbana, esta redução foi
maior, caindo de 56% em 1940, para 39% em 2010. No mesmo período a população
urbana do Centro Oeste, que representava apenas 2% da população urbana nacional,
em 2010 já chegou a 7%. Quanto à população urbana da Região Sul, que reprentava
12% da população urbana nacional em 1940, chegou a 15%, no periodo entre 1980 e
2000, voltando ao patamar inicial em 2010 (12%).
Figura 04 – Análise da evolução da contribuiçao relativa de cada região brasileira na população total do Brasil no periodo entre 1940 a 2010
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960, 1970, 1980, 1991, 2000 e 2010.
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Figura 05 – Análise da evolução da contribuiçao relativa de cada região brasileira na população urbana do Brasil no periodo entre 1940 a 2010
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1960, 1970, 1980, 1991, 2000 e 2010.
As regiões Sudeste e Centro Oeste tiveram em comum, o crescimento
gerado por fluxos migratórios, embora decorrentes de diferentes causas. No sudeste,
especialmente no triângulo formado pelas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e
Belo Horizonte, a oferta de trabalho urbano, gerada no processo de industrialização,
atraiu imigrantes nordestinos e nortistas. Já na região Centro Oeste a imigração teve
como causa principal a expansão da fronteira agrícola do país. Num segundo
momento, houve a emancipação dos núcleos rurais acelerando ainda mais a
urbanização dessa região.
Outro fator responsável pelo desencadeamento de processos
acelerados de crescimento urbano foi a criação das cidades para desempenharem o
papel de sedes institucionais e administrativas, tais como Brasília nos anos 60 e
Palmas em Tocantins na década de 90, e a implantação dos pólos petroquímicos nas
décadas 70 e 80.
Oliveira e Oliveira (2011) apresentam algumas reflexões sobre os o
fenômeno da mobilidade populacional que vem ocorrendo no Brasil desde as últimas
décadas do Século XX. Do ponto de vista das migraçãoes internas o período entre
1960 e 1980 se destacou pelo grande volume de deslocamentos da população
brasileira migrando do campo para a cidade, o que constituiu um processo de
9
intensificação da urbanização (ERVATTI, 2003). Segunda a autora estes movimentos
caracterizaram a Região Nordeste e os estados de Minas Gerais, Espirito Santo Santa
Catarina e Rio Grande do Sul como áreas de expulsão ou emigração, equanto que o
núcleo industrial (Estados de São Paulo e do Rio de Janeiro), contituiam áreas de
atração ou forte imigração populacional.
Esses deslocamentos, típicos da primeira fase da transição
demográfica quando as taxas de fecundidade eram altas e a
mortalidade começava a declinar, gerando excedentes
populacionais que favoreciam a migração do campo para a
cidade, começaram a perder importância no Brasil a partir dos
anos 1980. (OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2011)
A este respeito, Oliveira e Oliveira (2011) destacam que nos últimos
anos da década de 1980 e nos anos 1990 observou-se uma diminuição no volume da
migração do campo para a cidade, dando lugar a novos fluxos migratórios: as
migrações a curta distância e as direcionadas às cidades médias. Salientam ainda que
o Censo Demográfico de 1991, já havia apontado algumas transformações no
comportamento dos fluxos, que antes predominavam no Brasil. Nesta época já foi
observada a redução das migrações do Nordeste para o Sudeste e, também, algumas
reversões nos saldos migratórios das Unidades da Federação.
Segundo Rossato (1993), outro aspecto que pode ser observado na
análise do crescimento demográfico urbano no Brasil, é a chamada “macrocefalia”,
onde se verifica o crescimento acelerado dos grandes centros urbanos e a redução
progressiva da população relativa das pequenas cidades. Isso ocorreu, num período
de 20 anos, entre 1970 e 1990, nas nove regiões metropolitanas do país. Belém,
Fortaleza, Salvador, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, praticamente dobraram
sua população nessas duas décadas. São Paulo, Rio de Janeiro e Recife, embora
sejam as maiores, apresentaram, em 1996, os menores índices de crescimento entre
as metrópoles. Todas essas áreas já representavam, em1996, aproximadamente 40%
da população urbana do Brasil e seu crescimento foi marcado pelos intensos
movimentos migratórios que ocorreram de forma inter e intra–regional.
Os dados de 1996, no entanto, apontam para uma diminuição no ritmo
de crescimento de algumas áreas metropolitanas acompanhado por um nítido
fortalecimento das cidades médias, principalmente as dispostas ao longo dos eixos
rodoviários que irradiam das metrópoles.
10
O urbanista espanhol, Borja (1994) alerta para a importância das
cidades médias no cenário da urbanização brasileira:
“A contaminação atmosférica, sonora e da água, as
dificuldades de mobilidade, o desperdício energético, os
impostos cada vez maiores, pressupõem custos de tal ordem,
tanto públicos quanto privados, que vai se preferir investir em
cidades menores”.
A complexidade dos problemas urbanos é agravada nos países com
desequilíbrios na distribuição de renda, como é o caso brasileiro. Parte significativa da
população é excluída do acesso aos bens e serviços coletivos e sobrevive em
condições precárias de saneamento básico, de moradia e de transporte. É importante
citar que o percentual de exclusão é mais acentuado nas regiões metropolitanas.
Dessa forma, as cidades médias têm hoje o seu valor acentuado, por
um lado, pela existência de uma enorme dificuldade de se reverter o déficit de infra-
estrutura na vida metropolitana e, por outro, pelo avanço da rede informatizada de
comunicação que diminuiu a importância da estratégia locacional nos
empreendimentos empresariais.
Dados do Censo de 2010 reforçam esta ideia, indicando que houve
alteração no comportamento dos deslocamentos de população na década passada. As
evidências empíricas sinalizam que são as cidades com menos de 500 mil habitantes
as que mais crescem no País, o que demonstra a influência da migração, muito
embora as grandes cidades continuem concentrando parcela expressiva da população
(aproximadamente 30%). Esse fenômeno vem ocorrendo nas últimas três décadas, na
distribuição populacional no Brasil. Os municípios com 500 mil habitantes ou mais
aumentaram em quantidade quando comparados com o ano de 2000, passando de 31
para 38. Outro aspecto a ser destacado é que o ritmo de fragmentação do território,
nos anos 2000, foi menos intenso que nas décadas passadas, tendo sido instalados
58 municípios, contra 501 nos anos 1980 e 1016 nos anos de 1990.
Os impactos da concentração da população nas cidades maiores,
ocorrida mais intensamente no período entre 1940 e 1980, aparecem ilustrados nas
Tabelas 3 e 4, onde foram classificados os aglomerados humanos por tamanho e
cruzados nas matrizes com a quantidade de assentamentos (Tabela 3) e com a
quantidade de população (Tabela 4). Percebem-se um aumento de aglomerados
urbanos mais populosos (acima de 2000 habitantes) e o consequente aumento da
população ocupando aglomerados urbanos maiores (acima de 20.000 habitantes).
11
Embora tenha havido uma alteração nos padrões de deslocamento da
população nas últimas décadas, em relação ao movimento campo – cidade, reflexos
ocorridos na época de intensa urbanização ainda são percebidos hoje. No Censo de
2010 o IBGE adotou a classificação dos Domicílios em Aglomerados Subnormais, para
identificar um conjunto constituído de, no mínimo, 51 unidades habitacionais (barracos,
casas etc.) carentes, em sua maioria de serviços públicos essenciais, ocupando ou
tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou
particular) e estando dispostas, em geral, de forma desordenada e densa (IBGE 2010).
Tabela 3 – Distribuição relativa dos aglomerados (%) – Brasil: 1940-1980
Categoria de Tamanho (habs)
1940 1950 1960 1970 1980
Até 500 40,93 37,17 33,01 32,45 27,65
501 a 1.000 23,17 23,48 22,00 19,62 15,99
1.001 a 2.000 17,33 17,58 17,47 16,80 16,50
2.001 a 5.000 11,67 12,87 15,54 15,84 17,96
5.001 a 10.000 3,71 4,80 5,78 6,97 9,28
10.001 a 20.000 1,84 2,21 3,29 3,84 5,59
20.001 a 50.000 0,78 1,27 1,79 2,71 4,04
Acima de 50.000 0,46 0,61 1,12 1,77 2,88
Total 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
Tabela 4 – Distribuição da população recenseada nos aglomerados urbanos (%)-Brasil-
1940-1980
Categoria de tamanho (habs)
1940 1950 1960 1970 1980
Até 500 4,05 2,88 1,87 1,22 0,67
501 a 1.000 6,13 4,76 3,25 2,09 1,15
1.001 a 2.000 8,99 7,08 5,07 3,24 2,34
2.001 a 5.000 13,14 11,11 9,85 7,37 5,72
5.001 a 10.000 9,45 9,49 8,19 7,20 6,49
10.001 a 20.000 9,17 8,79 9,42 8,02 7,65
20.001 a 50.000 8,57 10,69 11,46 12,32 12,63
Acima de 50.000 40,50 45,20 50,89 58,24 63,45
Fonte: ROSSATO (1993) / IBGE – Anuário Estatístico de 1984.
12
Segundo análise do IBGE (2010), no ano do último censo 6% da
população do País (11.425.644 pessoas) morava em aglomerados subnormais, que se
distribuia em 5,6% dos domicílios particulares ocupados no Brasil (3.224.529
domicilios). Estes aglomerados se concentravam em grande parte na Região Sudeste
(49,8% dos domicilios nestas condições), e os estados de São Paulo e do Rio de
Janeiro, com 23,2% e 19,1% dos domicílios do País, respectivamente, eram os que se
destacavam. Os estados da Região Nordeste continham 28,7% do total de domicilios
em aglomerados subnormais (9,4% na Bahia e 7,9% em Pernambuco), enquanto que
a Região Norte concentrava 14,4% dos domicilios (10,1% só no Estado do Pará). As
regiões com menos ocorrências de domicilios em aglomerados subnormais em 2010
foram a Sul (5,3%) e Centro-Oeste (1,8%).
Segundo dados do Censo 2010, 88,2% dos domicílios em aglomerados
subnormais estavam em Regiões Metropolitanas com mais de 1 milhão de habitantes
e apenas 11,8% destes domicílios estavam em municípios isolados ou Regiões
Metropolitanas com menos de 1 milhão de habitantes (IBGE 2010). Os gráficos da
Figura 6 ilustram bem esta situação. Ainda na análise dos gráficos da Figura 6,
observa-se que os resultados são distintos quando se considera os municípios
isoladamente. Neste caso, 44,8% dos domicílios particulares ocupados em
aglomerados subnormais estavam em municípios com mais de 1 milhão de habitantes,
enquanto 55,2% estavam em municípios com menos de 1 milhão de habitantes.
Verificou-se, também, em 2010, a presença de domicílios em aglomerados
subnormais em cidades de médio porte, embora que em número menor, se
comparados com as a cidades mais populosas.
O processo de crescimento acelerado da população urbana brasileira e
a falta de planejamento integrado, principalmente nas grandes metrópoles, dão sinais
inequívocos de insustentabilidade, tais como, aumento de aglomerados subnormais,
espalhamento urbano, problemas de mobilidade (poluição, consumo de recursos não
renováveis, congestionamentos e acidentes), degradação dos recursos naturais
(hidricos e de vegetação), entre outros.
As cidades de médio porte, onde esses impactos não chegaram a níveis
tão elevados quanto os das metrópoles, devem ser beneficiadas por um planejamento
“preventivo” em lugar do planejamento “corretivo”. As tendências atuais de
crescimento das cidades médias, principalmente as localizadas em pontos de fácil
comunicação com os centros maiores, mostra uma alteração na curva histórica do
processo migratório, e reforça a necessidade da atenção do Estado para uma política
mais efetiva quanto a habitação, o uso do solo, a mobilidade urbana, a preservaçao de
áreas verde e recursos hidrícos e os serviços de infraestrutura urbana.
13
Figura 6 – Analise dos domicilios ocupados existentes em Aglomerados Subnormais por classe de tamanho da população dos domicílios segundo as Regiões
Metropolitanas e os municípios - 2010 Fonte: IBGE 2011 - Censo Demográfico 2010: Aglomerados Subnormais
Bibliografia
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IBGE 2011 - Censo Demográfico 2010: Aglomerados Subnormais
IBGE. Séries Históricas, 2010. URL: http://seriesestatisticas.ibge.gov.br
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ROSSATO, R. Cidades brasileiras: a urbanização patológica. In: Revista Ciência & Ambiente, vol. 7,1993,
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