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1 O MITO DO PECADO ORIGINALe o gênesis do ceticismo ético José Luís da Costa Fiori [...] para decidir a disputa que surgiu sobre o critério, devemos ter um critério aceito por meio do qual se possa julgar a disputa; e para ter um critério aceito devemos decidir primeiro a disputa sobre o critério. E quando o argumento se reduz desta forma a um raciocínio circular, encontrar um critério torna-se impraticável [...] Sexto Empírico, Hipotiposis Pirrônicas, II, cap iv (apud POPKIN, 2000, p. 28) ---------------------------- Este trabalho foi escrito no contexto de uma pesquisa mais ampla, sobre o “poder” e a “ética”, e sobre a relação entre a “guerra” e a “ética internacional”. E propõe uma reflexão sobre o tema do “ceticismo ético”, a partir de uma leitura do Gênesis, ou melhor, de uma “exegese lógica” do mito da criação e quedado Homem, segundo o texto clássico do Torá ou Antigo Testamento. 1 Nossa hipótese é que esse texto, de origem mitológica e religiosa, acabou transcendendo seu tempo e sua própria origem, graças à força narrativa da sua aporia do “pecado original”, onde se esconde e desvelam, a um só tempo: 1 Sobretudo o texto dos seus capítulos 1-4, 6-7, 11 e 22, segundo a versão da Bíblia de Jerusalém (1973).

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O MITO DO “PECADO ORIGINAL”

e o gênesis do ceticismo ético

José Luís da Costa Fiori

[...] para decidir a disputa que surgiu sobre o critério,

devemos ter um critério aceito por meio do qual se

possa julgar a disputa; e para ter um critério aceito

devemos decidir primeiro a disputa sobre o critério. E

quando o argumento se reduz desta forma a um

raciocínio circular, encontrar um critério torna-se

impraticável [...]

Sexto Empírico, Hipotiposis Pirrônicas, II, cap iv

(apud POPKIN, 2000, p. 28)

----------------------------

Este trabalho foi escrito no contexto de uma pesquisa mais ampla, sobre

o “poder” e a “ética”, e sobre a relação entre a “guerra” e a “ética

internacional”. E propõe uma reflexão sobre o tema do “ceticismo ético”, a

partir de uma leitura do Gênesis, ou melhor, de uma “exegese lógica” do

mito da “criação e queda” do Homem, segundo o texto clássico do Torá ou

Antigo Testamento.1 Nossa hipótese é que esse texto, de origem mitológica

e religiosa, acabou transcendendo seu tempo e sua própria origem, graças

à força narrativa da sua aporia do “pecado original”, onde se esconde e

desvelam, a um só tempo:

1 Sobretudo o texto dos seus capítulos 1-4, 6-7, 11 e 22, segundo a versão da Bíblia de Jerusalém (1973).

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i) uma incompatibilidade lógica, entre o objetivo divino da

“obediência” e o objetivo humano da “liberdade” e da

“igualdade”; e

ii) um conflito insuperável entre a perspectiva e as posições

assimétricas e hierárquicas, dos três personagens desse

relato bíblico: Deus, o Homem e a Serpente

1. O texto, o contexto, e a difusão

O Gênesis é um dos textos sagrados mais importantes do judaísmo e

do cristianismo, mas também pertence à tradição religiosa do Islã, e

contém elementos de origem persa, e do Zoroastrismo, em particular. Mas

além disso, o Gênesis se transformou, através dos séculos, num “mito”

comum a todas grandes civilizações históricas2 que se formaram à sombra

destas quatro grandes religiões monoteístas.

Sua autoria foi atribuída tradicionalmente a Moisés, o líder egípcio que

teria transmitido ao povo judeu a tradição monoteísta do Faraó Akhenaten,

por volta do XIII a.C.3 Mas hoje considera-se mais provável que o texto –

que se encontra no Torá judaico e no Antigo Testamento cristão – tenha

sido escrito por várias mãos, e em vários momentos, e que sua versão final

seja datada do século V a.C., provavelmente do período do exílio dos

judeus na Babilônia, época em que a comunidade judaica sofreu forte

influência dos costumes e tradições do império persa, em particular da sua

religião oficial, o Zoroastrismo.

Esta segunda versão da origem do texto bíblico permite entender

melhor a presença, ou simples repetição, no Gênesis, de vários elementos

ou narrativas da tradição mitológica da Babilônia, da Suméria e de Ugarit,

2 “Se fizermos uma pesquisa sobre história e cultura humanas, veremos que toda sociedade possui um código moral cuja concepção se apresenta, na maioria dos casos, com clareza e exatidão. Em praticamente toda sociedade do passado existe uma íntima relação entre esse código moral e a religião dominante. O código de ética é concebido frequentemente como um imperativo, declarado por um legislador divino...” (DAWSON, 2010, p. 117).

3 Freud (1969, p. 18-65).

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como é o caso dos “poemas da criação”, Enuma Elish e Atrahasis; da

“epopeia” de Gilgamesh; ou da história de Atrahasis, epopeia acadiana do

século XVIII a.C. Ou ainda, do mais antigo de todos os “mitos da criação”

conhecidos, de origem suméria, o Eridu Genesis, onde também é contada

a criação do Homem a partir do barro, esculpido pelos deuses que estavam

embriagados e que por esta razão teriam feito um homem repleto de

imperfeições.

A própria história da “queda” de Adão e Eva tem um parentesco

indiscutível com a história de Emkidu, o selvagem esculpido pelos deuses

a partir da argila, e com a história de Shamhat, a prostituta contratada para

seduzi-lo e levá-lo a cometer o que seria talvez a versão mais antiga e

conhecida do “pecado original”. E o mesmo se pode dizer da metáfora da

“árvore” e do seu “fruto proibido”, que aparecem no Gênesis e que também

estão presentes na Epopeia de Gilgamesh, onde seu personagem principal

obtém uma flor que “devolveria ao homem toda a sua força perdida”. Esta

flor, no entanto, acaba sendo roubada pela Serpente, que é uma figura

tradicional e muito presente em toda a mitologia do Antigo Oriente Médio.

Mais além de todas essas semelhanças formais, entretanto, a dívida

mais importante do Gênesis, e de toda a tradição judaico-cristã, é mesmo

com o “monoteísmo ético” do Zoroastrismo ou Masdaísmo, que

considerava que a vida universal do cosmos, e de cada indivíduo em

particular, consistia numa luta eterna entre o Bem (Ahúra-Masda, divindade

suprema e criadora do mundo) e o Mal (Ahriman, a energia negativa,

responsável pelas doenças e pela morte). Zoroastro reconhecia a

existência do livre arbítrio dos indivíduos, que podiam escolher entre o

“bem” e o “mal”, mas no dia do Juízo Final todos seriam julgados por suas

escolhas, e o Bem derrotaria o Mal, definitivamente, no plano cósmico.

Esta perspectiva ética, presente em todo o Zoroastrismo e também no

judaísmo, inscreve o texto do Gênesis como parte importante e indiscutível

do debate que marcou e diferenciou o período da história humana – em

particular no continente eurasiano – conhecido como “era da elevação dos

espíritos”, entre os anos 600 e 300 a.C., aproximadamente. Esse período

corresponde, em grandes linhas, ao apogeu do império persa, ao

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florescimento da cultura helênica, ao despertar da civilização romana e à

grande crise chinesa, que foi a responsável indireta pelo florescimento da

melhor parte da filosofia moral asiática. É nesse “momento” da história

eurasiana que o homem se coloca, pela primeira vez, nestas distintas

latitudes, de forma sistemática e quase simultânea, as mesmas perguntas,

pela origem e destino do universo; pela definição e defesa do

comportamento “virtuoso” dos indivíduos e dos governos; e pelo

“critério”, em última instância, de definição e distinção do “bem” e do

“mal”.4 As mesmas perguntas e várias respostas – muitas vezes

convergentes – que foram sendo dadas a partir daquele período, pelas

quatro grandes religiões monoteístas, de que já falamos, mas também, pela

filosofia moral de Lao Tsé, Confúcio e Sidarta Gautama, e pela ética e pela

filosofia política e jurídica greco-romana.

Depois desse período de imensa fertilidade intelectual da história

humana, é possível resgatar o caminho da difusão cada vez mais ampla e

extensa do Gênesis, logo no início da “era cristã”, quando Philon de

Alexandria propõe e estabelece um primeiro diálogo entre sua

interpretação judaica do Torá e do Gênesis, e a visão da criação do

universo, apresentada por Platão no seu Diálogo de Timeu, “Quaestiones

in Genesim”. A mesma ponte que São Paulo procurou estabelecer com a

filosofia estoica de Sêneca e, três séculos depois, Santo Agostinho

estabeleceu definitivamente com a filosofia platônica, criando um

amálgama intelectual que se prolongaria com a Suma Teológica de Santo

Tomás e que se transformaria no núcleo duro da chamada “civilização

ocidental e cristã”.

Isto ajuda a entender, em parte, o fato surpreendente de que mesmo

depois da revolução científica moderna, dos séculos XVI e XVII, e ainda

depois da “revolução darwinista”, do século XIX, o texto do Genesis tenha

resistido e tenha sido divulgado de forma cada vez mais extensa,

4 “Se por um lado não é muito evidente a existência de uma moralidade pré-religiosa, por outro não há dúvida sobre a existência de uma pós-religiosa. Na medida em que o Homem se torna crítico em relação à religião dominante, aparece, em toda civilização avançada, uma nova necessidade de se elaborarem sistemas filosóficos e novas interpretações da realidade, com seus códigos de ética correspondentes” (DAWSON, 2010, p. 118).

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mantendo-se como uma referência e uma influência universal, que acabou

transcendendo sua própria “visão criacionista” da origem do universo e do

Homem.

E uma hipótese central deste trabalho é exatamente que a resistência ao

tempo do texto do Gênesis deveu-se à sua preocupação e à forma como

trata o problema da origem e da natureza do “bem” e o “mal”, muito mais

do que às suas duas narrativas da criação do Homem.

2. A narrativa bíblica

A história da criação divina do Homem e do universo é narrada duas

vezes, e de forma diferente, nos dois primeiros capítulos do Gênesis (Gen

1, 1-31, e Gen 1, 1-25). Hoje, os especialistas consideram que o texto das

duas narrativas têm origens distintas, e muito provavelmente foram

escritos em momentos diferentes. Tudo indica que a data da “segunda

narrativa” seja muito anterior à da “primeira narrativa”, tese reforçada por

sua semelhança com o outro “mito da criação” a que já nos referimos, o

mito de Eridu Genesis. Apesar disso, a tradição e o senso comum

costumam misturar e sobrepor estes dois textos, como se eles fizessem

parte de uma mesma narrativa. Um erro que foi imortalizado pelo célebre

afresco de Miguel Angel, pintados no teto da Capela Sixtina, no Vaticano,

que reúne numa mesma sequência pictórica passagens extraídos das duas

histórias b´biblicas, desconsiderando suas diferenças profundas e

essenciais.

A tônica do “primeiro relato” da criação divina do Homem está posta no

“poder da palavra” de Deus, capaz de criar os céus e a terra, os animais e

os homens, a partir do nada, e através de sua simples designação. A

criação é feita de forma sequenciada ou evolutiva, durante seis dias que

culminam com a criação do homem, no momento em que Deus diz:

“Façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança , e que eles

dominem sobre os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos,

todas as feras e todos os répteis que rastejam sobre a terra” (Gen 1,26”)

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Nesta primeira versão da história bíblica, depois de criar o homem e a

mulher, Deus lhes ordena: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra

e submetei-a; dominai sobre os peixes do mar, as aves dos céus e todos

os animais que rastejam sobre a terra” (Gen I, 27-28). Nesta primeira versão

da criação, Deus não impõe ao homem nenhum tipo de proibição, ameaça

ou punição, apenas o manda dominar o mundo, como se o Homem fosse

um instrumento ou uma prolongação do seu “poder absoluto” sobre o

universo e todas as suas “coisas”.

O foco do “segundo relato”, entretanto, é diferente e se concentra no

problema da origem divina da moral e da ética, concentrando-se na relação

entre três novos elementos que não aparecem na primeira narrativa: a

“árvore do conhecimento do bem e do mal”; a proibição divina de que o

homem prove do seu fruto, e a “serpente”, que cumpre papel decisivo no

desenvolvimento da história, porque introduz a possibilidade da

“desobediência”. Primeiro, Iahweh Deus modela “o homem com a argila do

solo, insuflando em suas narinas um hálito de vida e o homem se torna um

ser vivente” (Gen2, 6-7). Em seguida, Deus coloca o homem no seu Jardim

do Éden, onde havia plantado um pomar, e no nome meio do pomar “a

árvore do conhecimento do bem e do mal” (Gen 2, 9). Por fim, Deus cria a

mulher, a partir da costela de Adão, e só então introduz a primeira grande

novidade desta segunda narrativa: a “proibição”, e sua exigência de

obediência incondicional do homem, sob pena de punição com a morte:

“Podes comer de todas as árvores do jardim. Mas da árvore do

conhecimento do bem e do mal não comerás, porque no dia que dela

comeres terás que morrer” (Gen 2-16).5 Só depois Deus criou todos os

demais seres vivos e, finalmente, Eva, a mulher. E “os dois estavam nus, o

homem e sua mulher e não se envergonhavam” (Gen2, 25), ou seja, não

tinham culpa, nem medo, e nem vergonha.

Neste momento surge a figura central da “segunda narrativa” da

criação: a figura da “Serpente”, que se tornará responsável pela “queda” e

pelo chamado “pecado original”. A desobediência ou pecado de Adão e

5 A Bíblia de Jerusalém (1989, p. 33-34).

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Eva, que é repassado para o resto da Humanidade, pelo resto dos tempos,

segundo a interpretação canônica desse texto. Mas tudo acontece porque

a “Serpente” questiona o “imperativo categórico” de Deus, ao propor uma

interpretação alternativa da “proibição divina” e da sua ameaça de punição

com a “morte”: “Então Deus disse que vós não podeis comer de todas as

árvores do jardim? (Gen2, 1) [...] Não, não morreis!: Mas Deus sabe que no

dia em que dela comerdes, vossos olhos se abrirão e vós sereis como

deuses, versados no bem e no mal” (Gen3, 4 e 5).

Eva e Adão cedem ao argumento e escolhem comer o fruto da árvore

proibida, entrando em contato com o “conhecimento do bem e do mal”, o

que fez com que seus olhos se abrissem imediatamente, e “os dois

percebessem que estavam nus”, (Gen3, 7). Surge aí o sentimento da culpa,

medo e vergonha, quando Deus os chama e os pune: “Iahweh Deus

chamou o homem: “Onde estás?”, disse ele. “Ouvi teu passo no jardim”,

respondeu o homem; “tive medo porque estou nu, e me escondi.” Ele

retomou: “E quem te fez saber que estavas nu? Comeste, então, da árvore

que te proibi comer!” (Gen3, 9-13). Segue-se então a maldição eterna da

Serpente, da Mulher e do Homem, antes que os dois últimos sejam banidos

para sempre do Jardim do Éden. Começaria aí, então, a história da

Humanidade. Nesse momento começa a história real dos seres humanos,

porque seria exatamente esta “desobediência”, e esta “punição” que

teriam transformado o homem num ser mortal, obrigado a trabalhar para

sobreviver e se reproduzir, perseguido pelo sofrimento da culpa e pelo

medo da própria morte.

A partir do momento da “queda”, clarifica-se a relação entre o “Criador”

e a sua “criatura”, ao desvelar-se sua natureza assimétrica e hierárquica.

Dentro desta relação, Deus é quem possui o “conhecimento do bem e do

mal”, e é quem arbitra e pune, de forma cada vez mais precisa e exigente,

através de todo o texto do Torá, ou do Antigo Testamento, cabendo ao

Homem obedecer. Uma intervenção ético-normativa quase permanente,

semelhante às intervenções de Alá, em todo o Alcorão, e dirigidas ao seu

“povo islâmico” ( Islã = “submissão” ou “obediência” ), só que neste caso,

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através da mediação do profeta Maomé6. Assim mesmo, apesar da

hierarquia inquestionável e da intervenção continuada de Deus na vida

quotidiana do seu “povo escolhido”, os homens seguirão desobedecendo

e pecando, a despeito das sucessivas alianças estabelecidas por Deus,

sucessivamente, com Noé, Abraão e Moisés. Por isso, mesmo depois da

expulsão de Adão e Eva do Paraíso, Deus se arrependerá de haver criado

o Homem, e o punirá com o Dilúvio, que abre o caminho para uma nova

tentativa de “refundação” da humanidade, a partir de Noé.

Nesta passagem do Gênesis, Deus lamenta-se e arrepende-se

profundamente de haver criado um “ser mau”: “Iahweh viu que a maldade

do homem era grande sobre a terra, e que era continuamente mau todo

desígnio de seu coração. Iahweh arrependeu-se de ter feito o homem sobre

a terra, e afligiu-se o seu coração. E disse Iahweh: “Farei desaparecer da

superfície do solo os homens que criei – e com os homens os animais, os

répteis e as aves do céu – porque me arrependo de os ter feito […] Chegou

o fim de toda carne, eu o decidi, pois a terra está cheia de violência por

causa dos homens, eu os farei desaparecer da terra” (Gen2, 6, 7, 13).

Iahweh envia então “o Dilúvio , as águas, sobre a terra, para exterminar

debaixo do céu toda carne que tiver sopro de vida” (Gen2, 6, 17).

Depois do Dilúvio, Deus transmite a Noé e sua esposa a mesma ordem

que havia dado a Adão: “Sejam fecundos e multipliquem-se sobre a terra”

(Gen2, 8, 17-18). Mas logo no início desta nova Aliança, Noé é obrigado a

amaldiçoar seu próprio filho Cam, responsável pela primeira

desobediência e o primeiro pecado pós-Dilúvio. E o mesmo voltará a

acontecer depois da Aliança de Deus com Abraão, o protótipo bíblico do

“homem obediente” a Deus, o que não impede Abraão de mentir mais de

uma vez, começando pelo faraó do Egito, a quem entrega sua esposa como

se fosse apenas sua meia-irmã, por covardia, para evitar sua própria morte.

Por fim, depois da fuga do Egito e da nova Aliança estabelecida por Deus

com Moisés, a quem entrega a tábua com os seus Dez Mandamentos, é o

6 É interessante observar a presença igualmente constante da ideia de “hierarquia”,

“obediência” e “autocontenção”, também na filosofia moral de Lao Tsé e Sidarta Gautama , mas sobretudo nos Analectos, de Confúcio.

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próprio povo judeu que matará Moisés, e permanecerá politeísta por mais

cinco ou seis séculos, até seu exílio na Babilônia, quando entra em contato

com o Zoroastrismo e é escrita a versão do Gênesis que conhecemos, junto

com as partes mais significativas do Pentatêutico.

Do nosso ponto de vista, o ponto central desta “segunda narrativa” é a

a questão da escolha humana entre a “obediência“ e a “desobediência” ao

“mandamento” de Deus. De um lado, Deus impõe ao Homem uma

proibição, a proibição do “conhecimento do bem e do mal”. Do outro lado,

o Homem opta pela “desobediência”, e desobedece porque deseja ter

acesso – em última instancia – ao “critério” de distinção entre o que é

“certo” e o que é “errado”, do ponto de vista moral. O problema lógico é

que esta própria “desobediência” supõe a possibilidade e a liberdade de

escolher, como veremos no próximo passo desta reflexão.

3. Para uma “exegese lógica”

i) Na Proposição nº 13 (da Primeira Parte, “Sobre Deus”), da Ética de

Spinoza, o autor apresenta um argumento contundente a propósito

da “indivisibilidade de uma substância infinita”, que acaba por ter

um efeito demolidor sobre a narrativa bíblica da criação divina do

Homem.7 Para Spinoza, existiria uma contradição lógica insuperável

num “ato divino” de criação de um ser finito a partir de um ser

infinito, porque se isto ocorresse teriam que existir simultaneamente

vários seres infinitos, ou então, o único ser infinito existente teria

deixado de ser infinito, colocando em questão a própria existência

de um ser infinito. Este mesmo problema lógico reaparece quando

se olha para Deus como um “poder absoluto”, e não apenas como

uma “substância infinita”. Porque o “poder” envolve – por definição

7 “Proposição 13. Uma substância absolutamente infinita é indivisível. Demonstração: com efeito, se fosse divisível, as partes nas quais se dividiria ou conservariam a natureza de uma substância absolutamente infinita ou não a conservariam. Se consideramos a primeira hipótese, existiriam, então, várias substâncias de mesma natureza, o que é absurdo. Se consideramos a segunda hipótese, então, uma substância absolutamente infinita poderia deixar de existir, o que também é absurdo” (Spinoza, 2007, p. 29)

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– uma “relação” entre seres ou entidades que compartem e disputam

um mesmo objeto ou objetivo, e neste sentido ele não pode ser

absoluto.8 Portanto, pode-se concluir logicamente, que se Deus

fosse um “poder”, ele não poderia ser “absoluto”, ou então, se ele

fosse “absoluto”, ele seria qualquer outra coisa, menos um “poder”.

ii) Estes dois argumentos atingem em cheio toda e qualquer leitura

e interpretação literal da “primeira narrativa” bíblica da criação do

Homem. No entanto, não afetam o núcleo duro da discussão ética do

“segundo relato”, em particular da história da desobediência ou

“pecado original” de Adão e Eva. No segundo texto, como já vimos,

são introduzidos três elementos novos e cruciais: i) a “a árvore do

conhecimento do bem e do mal”; ii) a “proibição” de acesso humano

aos seus frutos; iii) e, finalmente, a “serpente”, personagem decisivo

para a compreensão da própria “proibição divina”, e do ato de

“desobediência” humana. Aqui, o importante é que nem a metáfora

da “árvore”, nem o “mandamento divino” esclarecem a natureza

específica do “conhecimento proibido”, nem a materialidade do fruto

proibido, ou seja, o conteúdo particular do “fruto do bem”, e do

“fruto do mal”. Uma ausência que não é casual e parece sugerir que

a “proibição divina” não envolvia de fato um conteúdo material

determinado; envolvia algo mais abstrato que poderíamos chamar

de “conhecimento do critério”, ou segredo da “arbitragem” entre o

“bem” e o “mal”. Um “critério ético que aparece desta forma como

sendo o primeiro ou o principal instrumento do “poder divino”.

Como a “obediência” seria a principal característica e obrigação

humana, o verdadeiro elemento diferenciador das duas pontas mais

visíveis da relação entre Deus e o Homem. Agora bem, para que se

possa efetivar essa “relação ética” entre Deus e o Homem, é

necessário que se dê mais um passo lógico, sem o qual seria

impossível conceber o “ato de desobediência” de Adão e Eva.

8 “Em termos estritamente lógicos, o ‘poder’ é uma relação que se constitui e se define, tautologicamente, pela disputa, e pela luta contínua, pelo próprio poder. Em qualquer nível de abstração, e em qualquer tempo ou lugar, independente do conteúdo concreto de cada relação de poder em particular” (FIORI, 2014, Prefácio, p. 18).

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Porque qualquer ato de desobediência supõe a existência de uma

escolha, e portanto, de pelo menos uma alternativa que seja

conhecida, e que esteja disponível, para que as partes envolvidas

possam tomar sua decisão e fazer sua escolha. Neste sentido,

radicalizando o argumento, se pode dizer do ponto de vista lógico

que a relação bíblica entre Deus e o Homem supunha desde o início

a existência de um terceiro elemento (o “terceiro incluído”) porque

se ela fosse apenas “binária”, e se restringisse a Deus e ao Homem,

não haveria a possibilidade da desobediência, e não haveria

tampouco como conceber e conhecer o “mal”..

iii) Isto não acontece, entretanto, com a “segunda narrativa” da

“criação e queda” do Homem, porque ela introduz um terceiro

elemento na relação entre Deus e o Homem: a “Serpente”, que vem

a ser exatamente a portadora desta “alternativa crítica”. É a Serpente

que oferece ao Homem uma explicação da “proibição divina”, ao

mesmo tempo que lhe disponibiliza uma “alternativa” e uma razão

para sua “desobediência”. Neste sentido, é a Serpente quem cria a

possibilidade humana da “crítica” e da “escolha”, ainda que neste

caso particular, tenha sido a escolha pelo “pecado”, do ponto de

vista divino. Tão ou mais importante do que isto, a Serpente só

consegue criar a possibilidade lógica da “desobediência” porque é

ela quem separa (demônio = “aquele que separa”) e individualiza,

simultaneamente, as figuras de Deus e do Homem. Sem a existência

da “alternativa”, não poderia haver a “diferença”, ou pelo menos ela

não poderia ser concebida ou conhecida pelo Homem, que seguiria

imerso para sempre na “substância absolutamente infinita e

indivisível” de Deus, como diz Spinoza.

iv) Deus impõe “obediência” ao Homem sem detalhar nem

explicar-lhe as razões de sua proibição, enquanto a Serpente

oferece ao Homem uma explicação da “proibição divina” e,

simultaneamente, um objetivo concreto e atraente para que ele

desobedeça o mandamento divino. A desobediência daria acesso ao

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Homem ao conhecimento do “critério” de distinção entre o “bem” e

o “mal”, e o conhecimento desse “critério ético” abriria seus olhos

e o faria “como os deuses”. “Deus sabe que no dia em que dele

comerdes, vossos olhos se abrirão e vós sereis como deuses,

versados no bem e no mal” (Gen 3, 5). Ou seja, a Serpente propõe ao

Homem que “escolha” a “desobediência”, em nome da “igualdade”.

Uma explicação e uma proposta que revelam, ao mesmo tempo, a

natureza assimétrica e hierárquica da relação entre Deus e o Homem,

a partir do momento em que surge a figura da Serpente. Neste

sentido, Adão e Eva desobedecem a Deus ao optar por sua própria

“liberdade”, e é esta “escolha”, pela “liberdade de escolha”, que se

transformará no “pecado original” da Humanidade9. De um lado,

portanto, se colocam o “imperativo categórico” e a valorização da

obediência incondicional, que se transformam na primeira de todas

as virtudes agostinianas; e do outro, o desejo da “liberdade” e da

“igualdade”, que leva o Homem à desobediência, à rebeldia e ao

“pecado original”. Aliás, o próprio mito da origem da Serpente

reproduz esse modelo, uma vez que o Demônio também surge de

outra “rebelião igualitária” ocorrida no “mundo dos anjos”, onde

Lúcifer, o “anjo mau”, quis igualar-se a Deus e foi banido do céu. Ou

seja, uma vez mais, a desobediência de Lúcifer envolvia uma relação

de poder, e sua rebelião envolvia o mesmo desejo de igualdade com

Deus que moveria Adão e Eva na direção do “pecado”.

v) Neste ponto, esconde-se a contradição fundamental da

“segunda narrativa” bíblica da “criação e queda” do Homem, que

chamamos de “aporia do pecado original”: o mesmo ato de Adão e

Eva pode ser lido, simultaneamente, como uma “desobediência” e

como um “ato de liberdade”; como um “defeito” e como uma

“virtude”; como um “pecado original” e como uma “opção original”

9 Do ponto de vista estritamente lógico, o “pecado original” não foi cometido para ser perdoado, ou para ser eliminado. Sua falta de materialidade e de especificidade indica que não ele não foi feito para não ser cometido; pelo contrário, ele foi concebido para permanecer e atuar como um freio atemporal, que assumiria na história humana a forma variável do “medo” e da “culpa”, que limitam o impulso individual e coletivo na direção da liberdade e da igualdade, e reforçam todos os mecanismos de manutenção e reprodução da ordem estabelecida.

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do Homem, pela “liberdade” e pela “igualdade” (com Deus ou com

qualquer outro “senhor”). Depende do “critério” ou da posição em

que se coloque o “juiz” dentro desta relação trinária, que é o

verdadeiro sujeito desta narrativa e desta lição ética do Gênesis.

4. A título de conclusão

Este trabalho se propôs a realizar uma exegese lógica e uma

interpretação ética da narrativa bíblica da “criação e queda” do Homem, tal

como ela aparece nos dois primeiros capítulos de Gênesis. Partiu do

reconhecimento da existência de duas versões distintas, do mesmo ato de

criação divina do Homem, contadas de forma sequencial, quase como se

fossem partes de uma mesma narrativa, sem sê-lo.

A primeira versão desta história está focada no “poder de Deus”, que

cria o universo a partir do nada, uma contradição lógica insuperável,

segundo o argumento de Spinoza sobre a “indivisibilidade das substâncias

infinitas”. Por isso o trabalho se debruça sobre a “segunda versão” desta

mesma história, que trabalha com a ideia da proibição divina do acesso

humano à “árvore do conhecimento do bem e do mal”.

É nesta segunda narrativa que se explicita melhor a dimensão

assimétrica e hierárquica da relação entre Deus e o Homem, através do

imperativo da obediência, que é imposto ao Homem sem que se esclareça

seu motivo, nem se especifique sua materialidade. Duas questões

fundamentais são trazidas ao primeiro plano da narrativa, pela figura da

Serpente, que oferece ao Homem uma explicação da proibição divina, e um

motivo para que ela seja desobediência.

Por fim, a análise do texto desta segunda narrativa nos levou a

deduzir logicamente que o mesmo ato de desobediência de Adão e Eva

poderia ser lido – de forma simultânea e contraditória – como um ato de

“liberdade” e como uma escolha pela “igualdade”. Daí, deve-se concluir

que um mesmo ato ou decisão humana pode ter várias avaliações éticas,

simultâneas, conflitivas, e excludentes. E que uma mesma pessoa possa

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escolher o “bem” e estar fazendo o “mal”, e possa estar “pecando”,

quando está praticando a “virtude”.

Esta aporia ética do Gênesis só se explicita no seu “segundo relato”

da criação Homem, e depois da introdução do “terceiro incluído”, ou seja,

a figura da Serpente, que dá visibilidade ao “triângulo original”, constituído

por Deus, pelo Homem e pela própria Serpente. E é este triângulo, e sua

disputa pelo conhecimento, pela liberdade e pela igualdade que explicam

a impossibilidade lógica de um “critério ético” único ou universal capaz de

servir de base consensual para a definição, a arbitragem e a punição do

“mal”, e para a definição, a promoção e a defesa do “bem”. Por cinco

motivos fundamentais e complementares:

i) primeiro, porque todas as relações humanas envolvem uma

“estrutura triangular”, mínima e irredutível, e ao mesmo tempo

assimétrica e hierárquica, como no caso do Gênesis;

ii) segundo, porque as três pontas deste triângulo valorizam e

disputam os mesmos valores fundamentais: poder, liberdade e

igualdade;

iii) terceiro, porque dentro desse triângulo elementar, e em qualquer

outra variação desta estrutura, o aumento do poder, da liberdade

e da igualdade de uma de suas três pontas implicará perda da

soberania, da autonomia e da diferença das outras duas pontas;

iv) quarto, porque ao ocorrer uma mudança na correlação inicial

entre as três pontas, a mais poderosa delas seguirá tendo o

poder de impor seu “critério”, sua “arbitragem” e sua “punição”,

inclusive com o banimento dos “rebeldes”; e

v) quinto, finalmente, porque o lado mais poderoso deste triângulo

mantém sempre em suas mãos o poder do medo e da culpa, que

submete e serviliza os demais.

O que o Gênesis ensina é que essa contradição só se estabelece e é

irredutível porque todos os três lados ou perspectivas desse “triângulo

original” compartem os mesmos objetivos ou valores essenciais, o que

permite que possam negociar e estabelecer acordos éticos transitórios. O

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que é impossível é que estas negociações ou acordos eliminem a

assimetria, a hierarquia e o conflito insuperável de interesses envolvidos

na criação, interpretação e arbitragem de todo e qualquer “critério” ou

“fundamento” ético que se proponha ser universal10. É mais fácil imaginar

“negociação ética” entre indivíduos, sociedades ou civilizações

inteiramente diferentes (os “bárbaros”)do que entre indivíduos e

sociedades que compartem os mesmos valores (os “incluídos”)e

competem dentro das mesmas estruturas de poder.

Foi a força narrativa e sintética dessa aporia que transformou o

Gênesis num “mito ético civilizacional”,11 e transformou esse “mito ético”

num “arquétipo universal”:12 o arquétipo da luta sem fim e sem quartel,

entre a “obediência” e a “liberdade”; entre o “imperativo ético” e a

“rebeldia”. Do se possa concluir,, finalmente, que o “pecado” e a “virtude”

podem estar contidos num mesmo “ato”, numa mesma “escolha”, e numa

mesma “decisão”, como aconteceu com a “desobediência” bíblica, que

pode ser lida e julgada como tendo sido o “pecado original” do Homem, e

também, simultaneamente, como tendo sido o primeiro “grito de

liberdade”’ e “igualdade”, da Humanidade.

Bibliografia

10 Esta leitura e conclusão do Gênesis apontam na direção do mesmo “ceticismo moral” defendido por Trasímaco, nos Livros I e II da Republica de Platão, onde a “ética” aparece como um instrumento útil e dependente do interesse e do poder dos mais fortes.. 11 “O mito serve sempre de instância normativa para a qual apela o orador. Há no seu âmago alguma coisa que tem validade universal. Não tem caráter meramente fictício, embora originalmente seja, sem dúvida alguma, o sedimento de acontecimentos históricos que alcançaram a imortalidade através de uma longa tradição e da interpretação enaltecedora da fantasia criadora da posteridade” (JAEGER, 2001, p. 68).

12 “O conceito de arquétipo, que constitui um correlato indispensável da ideia do inconsciente coletivo, indica a existência de determinadas formas na psique, que estão presentes em todo o tempo e em todo lugar. A pesquisa mitológica denomina-as ‘motivos’ ou ‘temas’; na psicologia dos primitivos elas correspondem ao conceito das représentations colletives de Levy-Brühl e no campo das religiões comparadas foram definidas como ‘categorias da imaginação’, por Hubert e Mauss. Adolf Bastian designou-as bem antes como ‘pensamentos elementares’ ou ‘primordiais’” (JUNG, 1976, p. 51-52).

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FIORI, J. L. História, Estratégia e Desenvolvimento. São Paulo: Editora

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Outubro de 2016