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Matéria, Vol 8, Nº 2 (2003) 167 - 186 http://www.materia.coppe.ufrj.br/sarra/artigos/artigo10297 O Mundo das Imagens Digitais Antonio A. de Carvalho, Romeu R. da Silva, João Marcos A. Rebello, Alexandre F. Viana Programa de Engenharia Metalúrgica e de Materiais (PEMM/ COPPE/ UFRJ) Centro de Tecnologia, Bl. F/210 - 21949-900 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: [email protected] RESUMO O processamento digital de imagens é uma inovação tecnológica de uso ainda recente, mas de crescente expansão em vários ramos de aplicação que utilizam a interpretação de imagens como ferramenta de trabalho. Em sua curta história, tem sido aplicado a praticamente quase todo tipo de imagem, com variados graus de sucesso. O inerente apelo subjetivo de exposição de figuras atrai, porém, a atenção de cientistas e leigos a um nível incomensurável. Abraçando diversos aspectos de óptica, eletrônica, matemática, fotografia e tecnologia computacional, o processamento digital de imagens sofre de misticismos, mal-entendimento e desinformação, como em outros campos multidisciplinares. Diversas tendências tecnológicas prometem estimular o crescimento do campo de processamento de imagens, dentre elas, as câmaras CCD’s (‘charge coupled device’, ou seja, equipamento de carga acoplada) para digitalização. Mais recentemente, as matrizes APS (“Active Pixel Sensors”) que são compatíveis com tecnologias CMOS (“Complementary Metal Oxide Silicon”) comerciais, as quais reduzem drasticamente as dimensões dos equipamentos eletrônicos, prometem reduzir consideravelmente o custo do hardware. O equipamento especializado para digitalização de imagens é, em grande parte, o que transforma um computador comum numa estação de processamento de imagens, já que computadores só podem processar imagens convertidas para a forma digital. As câmaras desempenham papel imprescindível na digitalização de imagens. Dentre as mais difundidas estão os tubos de imagens eletrônicos (a câmara vidicon como principal representante) usados como geradores de imagens de televisão. Porém, mais recentemente, os sensores de imagens de estado sólido com varredura eletrônica, principalmente o CCD, estão ganhando espaço que antes pertencia aos tubos de imagens. Este trabalho tem por objetivo fornecer uma referência bibliográfica básica sobre processamentos de imagem, os equipamentos utilizados para aquisição da imagem e os avanços tecnológicos que estão sendo desenvolvidos nesta área, além de uma breve abordagem de digitalização e processamento de imagens em ensaios não destrutivos. Palavras – chave: Processamento de imagens digitais, aquisição de imagens, dispositivos CCD. ABSTRACT Digital image processing is a new technology of recent application. Nevertheless, it has been increasing in many fields of the science that use image analysis as tool working. So far, it has been applied to almost all types of images, with different levels of success. However, the display of figures has an inherent subjective appeal that immeasurably draws the attention of scientists and lay people. Including several aspects of Optics, Electronics, Mathematics, Photography, and Computational technology, the digital image process is surrounded by mistaken beliefs, wrong comprehension, and unawareness, as any other multidiscipline field. Among the variety of technological tendencies which guaranty to stimulate the development of the digital image process’ field, there are the CCD chambers (charge coupled device) for digitizing analog data.

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O Mundo das Imagens Digitais

Antonio A. de Carvalho, Romeu R. da Silva, João Marcos A. Rebello, Alexandre F. Viana Programa de Engenharia Metalúrgica e de Materiais (PEMM/ COPPE/ UFRJ)

Centro de Tecnologia, Bl. F/210 - 21949-900 Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO O processamento digital de imagens é uma inovação tecnológica de uso ainda recente, mas de crescente expansão em vários ramos de aplicação que utilizam a interpretação de imagens como ferramenta de trabalho. Em sua curta história, tem sido aplicado a praticamente quase todo tipo de imagem, com variados graus de sucesso. O inerente apelo subjetivo de exposição de figuras atrai, porém, a atenção de cientistas e leigos a um nível incomensurável. Abraçando diversos aspectos de óptica, eletrônica, matemática, fotografia e tecnologia computacional, o processamento digital de imagens sofre de misticismos, mal-entendimento e desinformação, como em outros campos multidisciplinares. Diversas tendências tecnológicas prometem estimular o crescimento do campo de processamento de imagens, dentre elas, as câmaras CCD’s (‘charge coupled device’, ou seja, equipamento de carga acoplada) para digitalização. Mais recentemente, as matrizes APS (“Active Pixel Sensors”) que são compatíveis com tecnologias CMOS (“Complementary Metal Oxide Silicon”) comerciais, as quais reduzem drasticamente as dimensões dos equipamentos eletrônicos, prometem reduzir consideravelmente o custo do hardware. O equipamento especializado para digitalização de imagens é, em grande parte, o que transforma um computador comum numa estação de processamento de imagens, já que computadores só podem processar imagens convertidas para a forma digital. As câmaras desempenham papel imprescindível na digitalização de imagens. Dentre as mais difundidas estão os tubos de imagens eletrônicos (a câmara vidicon como principal representante) usados como geradores de imagens de televisão. Porém, mais recentemente, os sensores de imagens de estado sólido com varredura eletrônica, principalmente o CCD, estão ganhando espaço que antes pertencia aos tubos de imagens. Este trabalho tem por objetivo fornecer uma referência bibliográfica básica sobre processamentos de imagem, os equipamentos utilizados para aquisição da imagem e os avanços tecnológicos que estão sendo desenvolvidos nesta área, além de uma breve abordagem de digitalização e processamento de imagens em ensaios não destrutivos. Palavras – chave: Processamento de imagens digitais, aquisição de imagens, dispositivos CCD. ABSTRACT Digital image processing is a new technology of recent application. Nevertheless, it has been increasing in many fields of the science that use image analysis as tool working. So far, it has been applied to almost all types of images, with different levels of success. However, the display of figures has an inherent subjective appeal that immeasurably draws the attention of scientists and lay people. Including several aspects of Optics, Electronics, Mathematics, Photography, and Computational technology, the digital image process is surrounded by mistaken beliefs, wrong comprehension, and unawareness, as any other multidiscipline field. Among the variety of technological tendencies which guaranty to stimulate the development of the digital image process’ field, there are the CCD chambers (charge coupled device) for digitizing analog data.

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More recently, Active Pixel Sensors (APS) compatible to commercial Complementary Metal Oxide Silicon (CMOS) technology, which reduces drastically the dimensions of the electronic equipment, tend to significantly reduce the cost of the hardware. The specialized device to digitize images is mostly responsible for transforming an ordinary computer into a station which process images, because only computers may process images converted to the digital form. The camera plays an indispensable role in digitizing images. Some of the most diffused ones are the electronic image tubes – vidicon camera is the most representative example – used to generate television images. More recently, although, solid state images sensor equipment with electronic scan, mainly the CCD, are being developed and they have also been prevailing over the electronic image tubes. The object of this paper is to provide a basic bibliographical reference about images processing, the required devices to produce images and the technological advances in this field, besides a short approach of digitalization and image processing in nondestructive test. Keywords: Digital image processing, acquisition of images, CCD devices 1 – INTRODUÇÃO 1.1 Visão Humana e Visão Artificial

Os humanos são, antes de tudo, seres essencialmente visuais. Nem todos os animais dependem de seus olhos como nós. Morcegos usam som de alta freqüência, gatos têm olfato apurado, cobras localizam suas presas através da emissão de calor e peixes têm órgãos que detectam campos elétricos. Até mesmo algumas aves, que têm visão acurada, não possuem a configuração da visão humana. Seus olhos estão em lados opostos de suas cabeças, provendo uma cobertura de quase 3600, além de possuírem quatro ou cinco receptores de cor diferentes, enquanto os seres humano, segundo postulado de Thomas Young em 1801, possuem apenas três (vermelho, verde e azul). É difícil imaginar como o mundo parece para esses animais [1]. Há algumas importantes diferenças entre a visão humana e o tipo de informação que ela obtém das imagens quando a comparamos com equipamentos de imagem por computador voltados para finalidades técnicas. A visão humana é, antes de mais nada, qualitativa e comparativa, mais que quantitativa. Exemplificando: julgamos o tamanho relativo e a forma entre objetos, movendo-os mentalmente para, finalmente, compará-los. Isso pode ser mostrado através de testes nos quais o tempo necessário para reconhecer idênticos ou distintos aspectos de mais de uma figura é proporcional ao grau de desorientação ou afastamento entre elas, como mostrado na Figura 1.

Figura 1- Várias vistas de uma figura em 3 dimensões [1].

Seres humanos têm dificuldade para diferenciar cores ou brilhos de caracteres inseridos em imagens, a não ser que se possa posicionar as figuras em questão lado a lado. Só grandes variações de brilho são facilmente notadas.

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Essas características do sistema visual permitem ilusões de ótica variadas (Figura 2). Algumas dessas ilusões permitem aos pesquisadores estudar o sistema visual, outras sugerem caminhos competitivos de se extrair informações empregando recursos computadorizados [1].

Figura 2 - Ilusões de ótica; a) Linhas horizontais de idêntico comprimento; b) Linhas paralelas que parecem convergentes ou divergentes; c) O triângulo do centro parece mais claro que o restante; d) O tom de cinza no centro do quadrado preto parece mais claro que o do centro do quadrado branco [1]. Para a inspeção industrial e o controle de qualidade, a visão artificial surgiu como uma nova e importante técnica que pode proporcionar inspeções de precisão em peças, aumentando significativamente a qualidade do produto. A visão artificial também tem sido utilizada como ferramenta de calibração durante o processo produtivo para corrigir tendências que podem conduzir a peças defeituosas [5]. Uma visão artificial “sente” informação a respeito de uma imagem e a analisa para decidir a respeito de seu conteúdo; o olho, da mesma forma, atua como sensor de imagem, cabendo ao cérebro analisar esta informação e tomar decisão baseada nessa análise. Portanto, um sistema de visão artificial inclui capacidades tanto sensitiva, quanto visual e interpretativa. Um sensor de imagem, como uma câmera vidicon ou um sensor de imagem CCD, nada mais é que um sensor que recebe luz através de suas lentes e as converte em sinais elétricos. Quando um equipamento processador de imagens, como um microcomputador, é empregado, esses sinais elétricos podem ser refinados e analisados para prover uma interpretação da cena geradora dos sinais. Essa informação pode, então, ser usada como orientadora do caminho mais apropriado a ser trilhado. O processo completo de formação, análise e tomada de decisão de imagem é denominado: visão de máquina. Toda essa habilidade é extremamente útil em inspeções e aplicações de controle de qualidade, tais como: • Identificação de formas; • Medição e calibração de distâncias e tamanhos; • Quantificação de movimento. A analogia do sistema humano olho-cérebro é útil na compreensão da visão de máquina, mas nosso sistema é extremamente complexo, além de funcionar a taxas de dados muito diferentes dos sistemas de visão de máquina comerciais. Os humanos são mais flexíveis e, freqüentemente, mais rápidos que as máquinas, entretanto, estas são mais

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consistentes e confiáveis, além de detectarem comprimentos de onda nas faixas do infravermelho e do ultravioleta (Figura 3).

Figura 3 - Visão humana e visão artificial [5].

Na verdade, nenhum sistema é plenamente superior. A visão humana é melhor para cenas a baixa velocidade e na interpretação qualitativa de formas complexas. Um bom exemplo está na inspeção de superfícies pintadas de carrocerias, na detecção de arranhões, áreas com falha de pintura, rachaduras e depressões. Essas mesmas tarefas seriam muito mais difíceis e consumiriam mais tempo empregando-se técnicas de visão de máquina. Por outro lado, a visão de máquina adapta-se melhor a medições a altas velocidades de atributos quantitativos num ambiente estruturado. Como exemplo, pode-se citar as inspeções de componentes microeletrônicos, cuja repetitividade levaria os humanos a erros conseqüentes de fadiga. Outras características da visão de máquina são: • Medições sem necessidade de contato: úteis em peças frágeis ou contamináveis pelo toque; • Precisão: da ordem de 3 µm, ou melhor; • Afastamento da máquina para a peça: até 1 m ou mais e • Baixo custo [5]. 2 - SISTEMA DE VISÃO ARTIFICIAL Todo sistema de processamento de imagem digital pode ser representado por um diagrama de blocos contendo, normalmente, três elementos principais, como mostrado na Figura 4, e que são [6]: • Aquisição da imagem: é a conversão da cena numa representação digital que poderá ser processada por um

computador e ser efetuada por um sistema de sensores especialmente projetado para captar uma cena e prover sua representação digital. Essa aquisição pode envolver a conversão de outro meio, tais como, televisão e filmes gravados em fitas;

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• Processamento da imagem: fornece processamento digital de imagens para produzir um resultado desejado, desde sua intensificação para a exibição melhorada do detalhe de uma cena até o processamento de várias imagens constituintes;

• Exibição da imagem: é a geração de um produto de saída que possa ser visto por um observador humano através de

um meio temporário (monitor de vídeo, por exemplo) ou permanente (filme), todos numa forma analógica convertida a partir de dados digitais.

Figura 4 - Sistema de visão artificial [7].

3 - AQUISIÇÃO DA IMAGEM A aquisição da imagem começa pelo posicionamento correto da fonte de luz, o que permitirá a sua reprodução com o contraste adequado. Típicas fontes de luz são as luzes incandescentes, os tubos fluorescentes, os amarrados de fibras óticas e as luzes estroboscópicas. Feixes de laser são usados em aplicações especiais, além de luzes polarizadas ou ultravioleta. Além de adequada iluminação, exige-se fixação correta da peça [5]. O sistema de aquisição de imagens digitais deve gerar uma representação de uma cena por intermédio da "visão" de algum tipo de sensor cuja saída é analógica. Esta saída deve ser convertida num conjunto de sinais discretizados que possam ser armazenados e processados por um computador. Para isso é necessário um dispositivo sensível a uma das faixas de freqüência do espectro eletromagnético (infravermelho-IR, luz visível, ultravioleta-UV ou raios-X, por exemplo), e cuja saída seja proporcional à integral da energia depositada nele pela radiação incidente. Este sinal analógico será posteriormente digitalizado por um sistema conversor analógico-digital (conversor AD). Um princípio anunciado por Newton (1672), reafirmado por Young (1802) e verificado na prática, afirma que é possível recriar a sensação de qualquer cor misturando as quantidades apropriadas das três cores primárias: vermelho, verde e azul. Este efeito é denominado de visão tricromática. Uma imagem colorida que retrata uma cena como ela seria vista pelo homem pode ser obtida com um sistema de imagem que veja a mesma cena através de três filtros especiais na ordem: vermelho, verde e azul. Esse sistema produziria três imagens digitalmente separadas que poderiam ser reunidas como interpretação de uma única cor. Este fato é também a base da tecnologia usada para criar cores em monitores de computador usando a emissão de três comprimentos de onda de luz em combinações apropriadas. Imagens obtidas por sensores em vários comprimentos de onda simultaneamente são denominadas imagens multi-espectral. Os sistemas de imagens multi-espectrais podem captar dados de imagens em faixas espectrais para as quais o olho humano não é sensível. Sistemas digitais de imagens são freqüentemente usados para adquirir imagens em infravermelho, ultravioleta, etc. A cena vista numa determinada região de comprimento de onda será representada digitalmente como uma matriz de números, onde o valor numérico de cada elemento da matriz está relacionado à

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"luminosidade" da cena naquele ponto, dentro daquela faixa espectral. Uma imagem multi-espectral será representada como o conjunto de matrizes individuais, uma para cada banda espectral colhida pelo sistema de aquisição multi-espectral. Há três grandes categorias de sistemas de aquisição de imagem digital: • Sensores digitais de imagem - esses dispositivos adquirem imagens digitalizadas da cena vista pelo sensor. A saída

desses sistemas podem ser multi-espectrais; • Sistemas de varredura de filmes - esses equipamentos são usados para converter transparências de filmes para

representação digital para processamento por computador. Uma variedade de mecanismos são usados para varrer a transparência ponto a ponto, produzindo uma intensidade digital para cada ponto. Sistemas de varredura de filmes também obtêm imagens multi-espectrais;

• Digitalizadores de vídeo - servem para converter sinais convencionais de televisão da forma analógica para digital,

de maneira a possibilitar o processamento por computador dos dados adquiridos pelos sistemas de câmera de TV. Como exemplo, podemos citar um sinal de vídeo composto de 30 quadros por segundo. Cada quadro analógico constitui uma imagem digital de 512 amostras com 525 linhas, ou seja, altíssima taxa de dados. A idéia básica da digitalização de vídeo envolve o “congelamento“ de um quadro analógico de vídeo seguido da digitalização [6].

4 – EQUIPAMENTOS Há vários tipos de equipamentos que usam sensores para aquisição de imagens digitais, sendo os mais importantes os tubos de imagens e os equipamentos do estado sólido fotosensiveis. Dentre os tubos de imagens, destaca-se o vidicon, e entre os equipamentos do estado sólido, o CCD e o CID [6]. 4.1 - Vidicon Os tubos vidicon são freqüentemente utilizados para adquirir imagens em aplicações com sensores à distância. Estes tubos são feitos de vidro e numa das extremidades existe um canhão que produz um feixe de elétrons para varredura da imagem cuja projeção é feita na extremidade oposta a qual dispõe de uma superfície fotosensivel, como é mostrado na Figura 5. A superfície fotosensivel serve para construir uma formação de cargas elétricas na superfície posterior, proporcional à quantidade de luz incidente na parte frontal - externa - do material fotosensivel. O feixe de elétrons varre, inicialmente, a parte posterior do fotocondutor, carregando-a negativamente (cátodo). Quando a luz de um modelo é focalizada na superfície externa, sua condutividade aumenta nas áreas iluminadas e a parte interna torna-se mais positiva, devido à transferência de elétrons para a parte externa. Um feixe de elétrons varre então a carga elétrica distribuída linha a linha, repondo elétrons nas regiões onde a carga negativa estava reduzida devido à exposição à luz. As flutuações na corrente do feixe de elétrons causada pela reposição de cargas diminuídas são proporcionais à intensidade de luz e lidas por um resistor de carregamento. Os pulsos de corrente serão lidos como sinais de vídeo, que após serem quantizados e amostrados produzirão uma imagem digital bidimensional, que é disponibilizada ao computador para processamento [6].

Figura 5 - Tubo de imagem – Vidicon [1].

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4.2 - CCD (Charge Coupled Device) Esses equipamentos são compostos de elementos discretos de imagem em silício (“fotossítios”), num único “chip” de circuito integrado, cuja voltagem de saída é proporcional à intensidade da luz incidente. São classificados em dois arranjos geométricos: sensores de varredura em linha e em área. O primeiro consiste de uma fila de “fotossítios” que produz uma imagem bidimensional através do movimento relativo do detetor em relação à cena. Por exemplo, são usados extensivamente em sistemas de varredura de imagem (“scanners”) com base plana. A tecnologia usada nos sensores de imagens do estado sólido é baseada principalmente nos equipamentos de carga acoplada, ou CCD’s. Como se pode ver na Figura 6(a), um típico sensor CCD de varredura em linha contém uma fila de “fotossítios”, duas portas de transferência empregadas para transportar os conteúdos dos elementos formadores de imagens para os denominados registradores de transporte, e uma porta de saída usada para transferir os conteúdos dos registradores de transporte para um amplificador. O amplificador produz um sinal de tensão proporcional ao conteúdo da fila de “fotossítios”. O sensor de área consta de uma matriz de “fotossítios”, sendo, assim, capaz de capturar imagens completas, como os tubos de vidicon. Sensores de varredura em área são similares aos sensores de varredura em linha, exceto que os “fotossítios” são arranjados em forma matricial e uma combinação de porta/registrador de transporte separa as colunas de “fotossítios”, como se pode ver na Figura 6 (b). Os conteúdos dos “fotossítios” ímpares são seqüencialmente enviados para os registradores de transporte vertical e, logo após, para os registradores de transporte horizontal. O conteúdo desse registrador alimenta um amplificador, cuja saída é uma linha de vídeo. Aumentando-se a quantidade de ‘sítios’ de carga, aumenta-se a resolução (Figura 6) [2].

Figura 6 – Sensor CCD; a) Em linha; b) Em área [2].

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O CCD ainda pode ser visto como um arranjo fixo, de estado sólido, de fontes de potencial distribuída em linha ou numa superfície normal, retangular ou quadrangular. Cada fonte acumula carga elétrica proporcional à intensidade da luz incidente. Uma imagem é obtida expondo-se o arranjo a uma cena desejada e criando-se uma distribuição bidimensional de potencial elétrico armazenado dentro de cada fonte. A imagem analógica é captada pela leitora e digitalizado o potencial dentro de cada fonte [2]. Os equipamentos de imagens do estado sólido baseiam-se no efeito fotoelétrico e na formação de elétrons livres na região de silício iluminada – atingida por fótons (Figura 7) [3]. Os fotoelétrons produzidos num local são aprisionados na fonte de potencial mais próxima e são transferidos como um ‘pacote de cargas’ para o fundo de uma série de elementos até alcançar o terminal externo [4].

Figura 7 - Aquisição de imagens por CCD [3]. O processo de leitura é realizado seqüencialmente. A primeira fonte de potencial de cada linha é “lida” através de um conversor analógico/digital e o potencial elétrico ao longo de cada linha é deslocado de uma posição. Após o potencial da primeira fonte ter sido digitalizado, todos potenciais remanescentes transferem seus potenciais elétricos ao vizinho imediato. Esse processo continua seqüencialmente até todas as fontes de cada linha terem sido lidas e digitalizadas (Figura 8) [6].

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Figura 8 - Processo de leitura no CCD [6].

4.2.1 - Aplicação do Sensor CCD CCD’s propiciaram o surgimento de uma linha de câmaras do estado sólido compactas e robustas tanto para emprego na televisão quanto na digitalização de imagens. Essas câmaras são livres de distorções geométricas e altamente lineares na sua resposta à luz. A freqüência de varredura utilizada nos CCD’s pode ter um valor elevado, como na televisão com 30 tomadas por segundo, ou um valor muito pequeno, como no caso da captura de imagem empregada na astronomia e de microscópios fluorescentes, onde a intensidade baixa de luz predomina [4].

4. 3 - CID (Charge Injection Device) Similar ao CCD exceto pelo fato de os “sítios” de carga não terem seus potenciais transferidos para os vizinhos durante a leitura feita pelos registradores [5]. No CID, cada “sítio” de pixel tem duas fontes de potencial adjacentes (Figura 9). Elas são separadas por uma camada isolante de óxido metálico. Cada eletrodo de um pixel está interligado aos demais eletrodos dos outros pixels na mesma coluna ou mesma linha. Portanto, um único pixel pode ser endereçado selecionando-se suas linhas e colunas [4]. Quando ambos eletrodos num “sítio” de pixel são mantidos com voltagem positiva, os fotoelétrons anular-se-ão embaixo deles. Este é o modo integrado. Se todas linhas e colunas são mantidas positivamente, todo o “chip” acumulará imagem. Quando um eletrodo é levado a zero ou abaixo de zero volt, os fotoelétrons acumulados mudarão para uma posição abaixo do segundo eletrodo, ainda positivo. Essa mudança cria um pulso de corrente no circuito externo conectado ao segundo eletrodo. A intensidade do pulso reflete a quantidade de carga fotoelétrica acumulada, que permanece no poço após o deslocamento. Esse é o modo não destrutivo de saída de impulsos. O pixel pode ser lido repetidamente mudando-se a carga de um lado para o outro sem perdê-la [4]. Quando o segundo eletrodo também é levado a zero ou abaixo de zero volt, os fotoelétrons acumulados são deslocados, injetados no substrato subjacente, produzindo um fluxo de corrente no circuito externo. Novamente, a intensidade do pulso de corrente reflete a quantidade de carga acumulada. Entretanto, esse processo esvazia o poço de elétrons. Daí ser chamado modo destrutivo de saída de impulsos (leitura). É usado para preparar o ‘chip’ para integrar nova imagem [4]. O circuito no interior do “chip” controla a voltagem nos eletrodos de colunas e de linhas conforme necessário para integrar uma imagem e fazer a leitura destrutiva ou não-destrutiva. O último tipo de leitura permite que se observe a imagem repetidas vezes sem apagá-la. CID’s são preferidas em situações onde há severas condições de iluminação e ambientais por serem menos susceptíveis aos danos provocados por brilho intenso e radiação [4].

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Figura 9 - Sensor CID [4].

4.4 – Vantagens dos Sensores de Estado Sólido • Mais rapidez para mudança de imagem (1/10.000 segundo) e possibilidade de congelamento de imagem; • Alta sensibilidade: capaz de detectar, numa situação limite, a energia de um elétron; • Resposta espectral superior a dos sistemas com vidicon ou filme; • Alta precisão geométrica na imagem colhida graças à posição fixa de cada fonte de potencial; • Equipamentos mais simples, leves e mais simples por não requererem partes mecânicas ou feixes de elétrons; • Alta confiabilidade; • Resposta radiométrica extremamente linear: pixels com até 12 bits [2]. 5 - PROCESSAMENTO DE IMAGEM 5.1 - Digitalização: Amostragem e Quantização Uma imagem digital é a representação de uma cena por meio de pontos, onde cada ponto corresponde a uma área da cena com uma determinada intensidade de cor. Vários aspectos estão envolvidos na geração da representação digital particular de uma cena. O primeiro é a freqüência de amostragem, que consiste na discretização da cena real contínua. A freqüência de amostragem espacial ou resolução espacial determina o número de amostras que é obtido por unidade de comprimento, vertical ou horizontal, do sensor (por exemplo 100 pontos por polegada), e, portanto é um parâmetro que determina o número de pontos por linha ou coluna do sensor. Se o sensor tiver 1 polegada quadrada a imagem do exemplo dado teria 100x100 pontos (10000 pontos) no total. O segundo aspecto a ser considerado é a representação da intensidade de cinza ou cor: quantização ou resolução radiométrica. Como os computadores funcionam em sistemas binários, a representação de resolução em profundidade de cor é realizada da seguinte maneira:

Imagem em preto em branco: 21 – [0 1] (1 bit) • • Imagem com 4 níveis de cor: 22 – [01 10 00 11] (2 bits), e assim sucessivamente.

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Uma resolução freqüentemente adotada em níveis de cinza é 256 (28), representando uma resolução portanto de 8 bits (1 byte). Na Figura 10, um único bit foi usado para representar a intensidade de cada posição: quando é zero, significa negro, e um, branco. Na Figura 11, a intensidade de 1 foi para 8 bits, ampliando os valores de intensidade de 1 para 256.

Figura 10 – Imagem digital formada por um único bit [6].

Figura 11 – Imagem digital formada por oito bits [6].

O menor elemento componente de uma imagem digital é denominado de “picture elements“ ou, abreviadamente, pixel ou pel (Figura 12). A escolha do número de ‘bits’, por pixel, a serem digitalizados num sistema de aquisição de imagem – quantização – está relacionada com a taxa de transferência de dados e a capacidade de armazenamento dos mesmos. Quanto mais bits por pixel, maior será o tempo de transmissão até o aparelho de exibição de imagem (caso das espaçonaves interplanetárias), e maior será a quantidade de memória necessária para armazenar a imagem. Já para determinar a menor resolução espacial detectável por um sistema digital em particular, leva-se em conta a ótica do sistema de aquisição de imagem e a freqüência de amostragem com que se discretiza uma imagem analógica de distribuição contínua. Ainda há que se levar em conta a resolução espectral. Resume-se no número de bandas espectrais – verde, vermelho, azul, infravermelho, etc – formadoras de uma imagem captada. A Figura 13 exemplifica uma mesma imagem com quantização (intensidades de cinza) e resolução espaciais (número de pixels) variadas [6], mostrando a importância de ambas na qualidade da imagem.

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Figura 12 – Digitalização de uma imagem [3].

Figura 13 – Importância da resolução (R) e da quantização (Q) na qualidade da imagem. As imagens superiores foram quantizadas com 256 níveis de cinza, enquanto que as inferiores foram quantizadas com 4 níves. As imagens da esquerda foram amostradas com 128 pontos, enquanto as da direta foram amostradas com 512 pontos.

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5.2 - Processamento no Domínio do Espaço Refere-se à imagem digital no seu plano bidimensional, ou seja, a um agregado de pixels que compõem uma imagem; os procedimentos operam diretamente sobre os pixels. Matematicamente uma função de tratamento de imagens no domínio do espaço pode ser definida como:

g(x,y) = T [f(x,y)] (Eq. 1) onde f(x,y) é a imagem de entrada, g(x,y) é a imagem processada e T é um operador de f, definido na vizinhança de (x,y) [3]. Uma das principais aplicações dessa formulação está baseada no uso de máscaras ou filtros, que nada mais são que pequenas matrizes cujos coeficientes determinam a natureza do processo. A seguir citamos alguns exemplos dessas aplicações. • Expansão de contraste – aumenta a faixa de variação dos níveis de cinza. Utilizada normalmente em imagens cujos

níveis de cinza estão concentrados em torno de um determinado valor - baixo contraste (Figura 14). • Filtro passa-baixa – normalmente utilizado para atenuar o efeito visual produzido por ruído. Entretanto, os

"pequenos" detalhes (freqüências relativamente altas) da imagem podem ser destruídos ou distorcidos. Produz nestas regiões um efeito visual semelhante ao de um espelho embaçado.

• Filtro passa-alta – realça as bordas e pequenos detalhes de uma imagem, aumentando a nitidez, contrariamente ao

passa-baixa (Figura 15); • Filtro mediana – elimina total ou parcialmente ruídos de imagem, como os filtros passa-baixa, sendo mais

interessante que este para exame visual e medições em imagens (Figura 16);

Figura 14 - Expansão de contraste: (a) Forma da função de transformação; (b) Imagem de baixo contraste; (c) Resultado da extensão de contraste; (d) Resultado de um thresholding [2].

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Figura 15 – Imagem de uma retina; (a) imagem original; (b) imagem após aplicação de um filtro passa-alta para realçar detalhes de interesse, mas denegrindo o contraste [2].

Figura 16 – (a) Imagem original; (b) Imagem com ruído impulsivo; (c) Resultado da aplicação de filtro de média (passa-baixa); (d) Resultado da aplicação de filtro mediana [2].

5.3 - Processamento no Domínio da Freqüência O procedimento de um processamento de imagens no domínio da freqüência envolve basicamente as seguintes etapas: transformação de Fourier da imagem no domínio do espaço para o domínio da freqüência, aplicação de um filtro ou uma máscara para filtrar as baixas ou altas freqüências e, em seguida, executar-se a transformação inversa de Fourier, voltando-se a ter a imagem no domínio do espaço [3]. As imagens são funções bidimensionais, não periódicas ou quase periódicas. Além disso, estas funções são discretas e têm o domínio finito (bordas das imagens). Assim foi necessário criar um algoritmo de transformação discreta e bidimensional, chamada 2D-FFT ou simplesmente FFT (Fast Fourier Transform). Esta transformada é chamada de rápida, porque o algoritmo usa internamente algumas simetrias e simplificações para facilitar o cálculo matemático. A

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transformada de Fourier é aplicada a imagens bidimensionais para processamento de imagens, seleção de características ou estruturas de interesse para medição e compressão de imagens.

6 - APLICAÇÕES E AVANÇOS TECNOLÔGICOS Os campos de aplicação dos sensores de imagem CCD são os mais variados e diversos, como visto anteriormente. A partir de agora, exibem-se algumas das suas aplicações mais recentes e interessantes no ramo de ensaios não destrutivos. 6.1 - Inspeção Radiográfica com Imagens Os sistemas de inspeção em tempo real vêm substituindo as radiografias convencionais com filme graças às limitações deste ensaio, sendo as principais: a inadequação para a produção em linha e o tempo reduzido normalmente necessário para inspecionar e avaliar os resultados. A Figura 17 representa um esquema do exame radiográfico convencional com emprego de filme [9].

Figura 17 - Radiografia com filme [9].

Na Figura 18, tem-se a radiografia em tempo real, onde os raios-X emergentes do objeto são intensificados ao passarem através do intensificador de imagens, por sua vez e na ordem, sucedido pela câmera, que converte luz em sinais elétricos, pelo monitor, pelo reprodutor de imagem e, finalmente, pelo processador de sinais de vídeo.

Figura 18 - Radiografia em tempo real [9].

Por último, mostra-se uma representação do sistema digital de imagem com CCD, onde os raios-X provenientes do objeto incidem numa tela fluorescente, sensível aos raios-X, como ocorre nas telas de entrada e saída do intensificador de imagens da Figura 18, e são convertidos em luz visível. Estes, por sua vez, atingem a câmera CCD refrigerada,

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fornecendo, por fim, sinais ao computador que reconstruirá e exibirá a imagem (Figura 19). O CCD é refrigerado para atenuar ruído. Neste esquema não temos a instantaneidade da imagem, mas um atraso de poucos segundos – tempo suficiente para transformar as cargas do CCD em imagens.

Figura 19 - Radiografia com CCD [9].

Na Tabela 1 [9], é apresentada uma comparação sucinta dos três modos de se inspecionar objetos por radiografia.

Técnicas de Imagem Características Filme Tempo real CCD

Faixa de energia Combinação filme-tela cobre toda a faixa

Bom para baixa e média faixa

Telas fluorescentes intercambiáveis

adequadas para certa faixa

Qualidade da imagem Boa Inferior à c/ filme Boa Tamanho da tela Normalmente 35 x 43cm ou

todo o filme Diâm. 300mm Ilimitada

Tempo para criar imagem

20min (carregar, expor e processar o filme)

Instantâneo Poucos segundos

Processamento de imagem

Impossível Limitada Várias

Aplicação e mobilidade

Totalmente portátil Não portátil Limitadamente portátil (ainda)

Custo e vida Muito barato, exceto os filmes

Mais caro. Vida limitada do tubo.

Mais caro de todos. Vida elevada.

Tabela 1 – diferentes métodos de radiografar um objeto [9].

No caso particular de raios-X com energia entre 1 e 20 MeV, a alta taxa de penetração torna possível ensaiar objetos espessos, porém com baixo contraste de imagem. Para solucionar esse problema o sistema deve proporcionar máxima eficiência de detecção e contraste de imagem e mínimo nível de radiação difusa. Cabe mencionar que parte do sistema, constituída da interface digital e do computador com software para processamento de imagem, fica numa sala protegida da radiação, enquanto o resto – do detetor de raios-X ao controlador – permanece na região irradiada.

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Também o sensor fica instalado num abrigo metálico preenchido de gás refrigerante, mantendo a temperatura no nível de –350C. Isso permite a redução de ruído e o acréscimo do tempo de acumulação até 15 minutos, pontos importantes na exposição de amostras espessas ou quando a dose de radiação incidente na tela cintilante é baixa. A sensibilidade do contraste, bem como a resolução e o brilho da tela obtida poderão ser melhorados pelo uso de novos materiais fosforescentes. 6.2 - Neutrongrafia de Superfícies de Compósitos de Aeronaves A neutrongrafia é considerada como técnica de ensaio não destrutivo complementar à radiografia convencional e, como tal, bem adequada na detecção de pontos de umidade e corrosão aprisionados, especialmente nas estruturas de aeronaves [8-10]. Dentre os mais importantes testes não destrutivos realizados num componente de grande significância estrutural (o leme do estabilizador vertical), somente o ultra-som com transmissão direta e a neutrongrafia foram capazes de identificar grandes áreas de hidratação, e só o último identificou pequenas áreas de umidade retida e hidratação, mostrando-se superior aos demais, principalmente após a comprovação física das dimensões dos defeitos detectados nos testes destrutivos realizados em seguida. A maior desvantagem da neutrongrafia é a baixa resolução de imagem, as vantagens são o bom contraste de imagem, o tempo reduzido de exposição, a boa linearidade e a manipulação dos dados da imagem. A configuração radioscópica típica constitui-se de: fonte de nêutrons, objeto, tela cintilante, espelhos, lentes e câmera CCD (Figura 20). Para reduzir o tempo de inspeção, desenvolveram-se técnicas de radiografia e radioscopia, esta principalmente, que com os avanços da câmera CCD – pela primeira vez usada na nêutron radioscopia em 1990 – e da tecnologia de refrigeração tornaram o uso de CCD prático e possível economicamente.

Figura 20 - Neutrongrafia utilizando CCD [10].

6.3 - Tomografia de Nêutrons em Um Reator de Pesquisa Com Baixa Potência Para a reconstrução tomográfica tridimensional do interior de uma amostra são necessárias imagens tomadas de diferentes ângulos. Portanto, no esquema da Figura 21 foi instalado uma mesa giratória conduzida por um motor de passo conectado a um sistema de controle de movimento computadorizado. Este sincroniza o movimento da mesa com a posição do detetor, que, nesse caso, deve apresentar os requisitos que o sensor CCD possui: alta eficiência (para permitir a obtenção de, no mínimo, uma tomografia diária com 200 imagens cada, apesar do baixo fluxo de nêutrons – 1,3.105n/cm2.s); posicionamento reprodutível e exato (o emprego do filme não atenderia porque a troca do mesmo causaria um deslocamento, comprometendo a exatidão); manipulação fácil (o sensor CCD produz imagens digitalizadas, evitando a

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digitalização externa, como o “escaneamento” de filmes); alta resolução espacial; linearidade; “dynamic range”; mobilidade do equipamento de imagens de um lugar para outro [11].

Figura 21 – Nêutron tomografia utilizando CCD [11].

6.4 - Teste de Dureza Móvel Medidas de dureza in loco são cada vez mais necessárias, principalmente nas peças de grandes dimensões e nas posições de difícil acesso. O emprego dos durômetros portáteis atuais esbarram na escolha de qual método e instrumento usar em cada aplicação, além da medida de dureza considerada ser obtida quando a peça não sofre mais a pressão do perfurador. Em alguns casos, o entalhe desaparece completamente devido à elevada maciez do material – associada ao módulo de Young. A TDT (“Through Diamond Technique”) é uma técnica que permite a tomada de dureza com instrumento portátil, através do entalhe provocado na peça por um diamante Vickers, sem deixar de aplicar a carga (Figura 22). Para isso, é necessário iluminar o diamante, usando um LED “light-emiting diodes”, e medir, na borda exata do entalhe, sob carga de 50N, os valores das diagonais do diamante impresso na peça. Um sistema ótico constituído de lentes especiais e filtros, ajustados para o vermelho emitido pelo LED, garante a máxima resolução. Os raios de luz, então, chegam finalmente no sensor CCD, que informará ao computador as leituras das medidas dos entalhes, cujos valores definitivos serão determinados [12]. Dessa forma, os valores de dureza obtidos corresponderão aos do teste Vickers, a não ser pelo fato de também medir materiais elásticos, impossíveis de serem levantados pelos métodos convencionais. Graças, então, à vídeo-câmera, pode-se determinar com exatidão a região da peça afetada pela ação do entalhe do diamante.

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Figura 22 - Ensaio de dureza com CCD; (a) Aço; (b) Fio de aço; (c) Teflon; (d) Cerâmica [12].

6.5 - Teste Visual à Distância no Interior de Vaso de Pressão Desde a década de 70, o teste visual à distância (RVT – “Remote Visual Testing”) encontra-se disponível, comercialmente, usando boroscópios, fibroscópios e vídeoboroscópios – instrumentos herdados da área médica – em vários ramos industriais, tais como, inspeções em motores de aeronaves, geradores de vapor nucleares, e tubulações farmacêuticas, além de fiscalização de contrabando em fronteiras [13]. Um dos fatores incentivadores do uso do RVT em substituição aos trabalhos com emprego de seres humanos foi a numerosa quantidade de mortes e acidentes devido aos riscos relacionados a calor, falta de oxigênio, presença de fumos tóxicos e falhas eletromecânicas em serviço. Obtiveram-se economias de US$5.000 a 50.000 pela substituição de ensaios, antes realizados por seres humanos, agora executados por sistemas com câmeras. Adicionalmente, consegue-se inspeções mais rápidas, seguras e documentadas [13]. Além disso, a preferência dos consumidores por equipamentos eletrônicos de filmagem menores, mais leves, de melhor qualidade e de menor custo que os já existentes criou uma demanda preenchida pelos sensores CCD, lentes miniaturas, processadores e armazenadores de imagens ,que acabaram por se tornar disponíveis no mercado de Ensaios Não Destrutivos (NDT), dentre os quais o RVT. A Figura 23 exibe a ação, ampliada, de uma ferramenta de inspeção visual no interior de um vaso.

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Figura 23 - Ensaio visual com CCD [13].

7. CONCLUSÕES Os avanços nos sistemas de imagens digitais, dentre eles, a melhoria nos mecanismos de processamento e a descoberta dos sensores de estado sólido, tornaram possíveis a automação de processos antes fatigantes, ou até mesmo impossíveis de serem realizados por seres humanos. Como resultado desse desenvolvimento, teve-se um aumento na confiabilidade de peças e equipamentos, a redução do custo e um aumento da produtividade, gerando produtos de melhor qualidade e mais competitivos. 8. AGRADECIMENTOS • Ao CNPq e a CAPES pelo apoio financeiro. 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] RUSS, J. C., Image Processing Handbook, 2a edição, U.S.A., C.R.C. Press, 1995. [2] GONZALEZ, R. C., WOODS, R. E., Digital image Processing, 1a edição, U.S.A, Addison-Wesley Publishing

Company, 1992. [3] SILVA, R. R., Processamento de Imagens Radiográficas e Análise de Defeitos em Cordão-de-Solda, Tese de

M.Sc., COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro 1999. [4] CASTLEMAN, K. R., Digital image Processing, New Jersey, Prentice-Hall, 1996. [5] Nondestructive Evaluation and Quality Control, Metals Handbook, 3a edição, Vol. 17, 1994. [6] GREEN, W. B., Digital image Processing, New York, Van Nostrand Reinhold Company, 1983. [7] American Society for Nondestructive Testing, Nondestructive Testing Handbook, 2a edição, Vol. 8, 1993. [8] American Society for Nondestructive Testing, Nondestructive Testing Handbook, 2a edição, Vol. 9, 1995. [9] PURANIK G. G., TOWNSEND N. J., Imaging in Radiographic Inspection, 15th World Conference on Non-

Destructive Testing, Roma, 15-21 Outubro 2000.

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Matéria, 8,2 (2003) Antonio A. de Carvalho, Romeu R. da Silva, João Marcos A. Rebello, Alexandre F. Viana

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[10] LEWIS W. J., BENNETT L. G. I., et al., Neutron Radiograpy of Aircraft Composite Flight Control Surfaces, 15th World Conference on Non-Destructive Testing, Roma, 15-21 Outubro 2000.

[11] KÖRNER S., SCHILLINGER B., et al., Neutron Tomography on a Low Power Research Reactor, 15th World

Conference on Non-Destructive Testing, Roma, 15-21 Outubro 2000. [12] FRANK S., Transpyramidal Indentation Viewing – New Possibilities for mobile hardness testing, 15th World

Conference on Non-Destructive Testing, Roma, 15-21 Outubro 2000. [13] PELLEGRINO B. A., Remote Visual Testing (RVT) For Internal Pressure Vessel Inspection, NDT.net, Vol. 3, No.

8, Agosto 1998.