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O Palco Ilumiado *poemas* Luciano Machado Tomaz

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O Palco Ilumiado

*poemas*

Luciano Machado Tomaz

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"A grande angústia de nosso tempo é um sentimento de excomunhão. Não sentindo em si uma

existência própria, uma atividade própria, o homem precisa desesperadamente de um apoio

exterior, muito mais, e muito mais nervosamente do que as exigências de sua natureza. Um

andaime que lhe falta, ele logo se sente desvairadamente infeliz, como quem, num pesadelo, se

achasse numa sala onde todo o mundo se divertisse em chinês (...) O resultado aí está: uma

sociedade em pânico, que tudo aposta na estridência e na visibilidade; uma sociedade de

aterrorizados que pisa os pobres, os pequeninos, os doentes, na fúria de atingir um estrado em

praça pública, de onde possam fazer, uns aos outros, sinais febris e sem significação. Para a

moça que se debruça ansiosa sobre um figurino, a fim de saber o que deve fazer com seus

próprios cabelos; para o jovem poeta que procura qual é o nome em voga, o livro que deve ser

lido e falado; para a patroa que vai à conferência; para a cozinheira que vai ao carnaval, o que

importa, acima da realidade do cabelo, da poesia, do humanismo e do pandeiro, é entrar no

grande palco iluminado, e pegar a deixa dos outros personagens desse drama confuso, que três

bilhões de atores mal ensaiados representam, durante anos e anos, à luz da desdenhosa

Aldebarã."

GUSTAVO CORÇÃO, “LIÇÕES DE ABISMO”

“Há, neste estrambótico e complicado negócio que é a vida, certos períodos estranhos em que o

homem considera o universo inteiro como uma simples e enorme farsa, ainda que mal vislumbre

em que pode consistir a brincadeira e tenha bastante desconfiança de que esta se realiza à sua

custa”.

HERMAN MELVILLE, “MOBY DICK”

“Que dirán de mi poesía

los que no tocaron mi sangre?”

PABLO NERUDA

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PRÓLOGO

Apontei uma arma para a cara do destino

E apertei o gatilho:

Era a liberdade.

A liberdade é um assassinato.

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ANGELUS PRIMUS

“Ein jeder Engel ist schrecklich”

RILKE

Quando – pergunto – ruiu a escada que

Outrora levou meus lamentos a Deus?

Quando rompeu-se a barreira do silêncio que impus

A mim mesmo e ao mundo? Eu, que só andei

Em busca da dor – por que eu, Sônia? –

E procurei, passo a passo, cândido, esquecer

O que fui: contínuo de um universo falido.

Teu suspiro, diáfano, chega aos tempos primeiros.

Longe, mil línguas de fogo me roçam a pele.

Logo estarás ao meu lado; logo, ainda hoje.

E os que não acreditaram serão perdoados,

Pois retorna ao lar o mau filho, Sônia.

O Dilúvio de suas misérias fecundou a terra:

Está prenha, de amor e desgraça.

A ti, degradada filha de Eva, cabe cuidar-nos!

Consola-te: teu corpo é o campo de batalha.

Tua boca abençoa os homens.

Descansa – ó anjo!

Amanhã dormirás nos braços de Dele.

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NÔMADE

"Já que a ordem do mundo é regulada pela morte, talvez convenha a Deus que não acreditemos

nele e que lutemos com todas as nossas forças contra a morte, sem erguer os olhos para o céu,

onde ele se cala".

ALBERT CAMUS, “A PESTE”

I

Já não posso dormir ou falar,

Por que tudo é imundo

E todo gesto é uma violação.

II

Eles vieram e se acomodaram.

E a mim nada disseram.

Adentraram minha alma e a envenenaram.

III

O preciso momento:

Fluxo de pensamento.

O nômade encontra o lar

No mundo.

IV

Controle, cátedras, corcéis

Espancando a dor e moendo

Carne na máquina do medo.

V

Pensei, aprendi e esqueci.

E me tornei vil

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Pela vontade de lembrar.

VI

Vai mundo!

Corra aos tropeços pelas ruas de Deus!

Flutue imóvel sobre a jangada do universo.

VII

A lógica fascista;

A lógica budista;

A lógica com a vontade de comer.

VIII

Aquele homem ali sentado

Parece imóvel, parece morto.

Parece esquecido, parece esquecer.

IX

O poeta cantou o concreto

Em sua dureza e aridez.

Tirou lágrimas de pedras.

X

O teu beijo é como uma faca.

Tua boca corta meu corpo.

O vermelho dos teus lábios é meu sangue.

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VAMOS!

Precisamos ser rápidos:

O tempo é curto!

A vida termina a cada segundo.

Não temamos a morte,

Mortos estamos há muito.

Vamos! Vamos!

O tempo é curto!

A vida?

A vida é o tempo que temos

Para desperdiçá-la.

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LIBERDADE: UM PRECIPÍCIO

“Meu passo esmaga ruas e verstas.

Que fazer, com o inferno no peito?

Que Hoffmann celestial

Te pôde inventar, maldita!”

VLADIMIR MAIAKÓVSKI

Não preciso olhar teus olhos

Pra entender que a noite será longa,

Que o frio chegará e que teremos chuva hoje.

Pensava em te encontrar

Pela cidade,

Por acaso.

Seria feliz.

Dançaríamos como deuses,

Como homens além-do-homem.

Eu te perderia e te veria

Outras tantas vezes; e

Outra vez diria o que

Sempre ouviste: mais e mais

Morrerias.

Neruda nos falava

Na canção desesperada

Da dura y fría hora que

La noche sujeta a todo horario.

La hora de partir é, agora, nossa.

Pra onde vamos,

O vento nunca dirá.

É só a liberdade: um precipício.

Se possível, quero estar só.

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E farei ao tempo uma oração:

Ai de nós! Amarga onipotência,

Inexorável duração.

E como falhar em nossa vida?

Se nunca pensamos na humanidade,

Ela não existe.

Cuspimos em toda a filosofia,

Pusemos uma pedra sobre a moral

E olhamos a arte de cima.

E agora? Que nos resta?

O amor é uma idéia velha,

Eu sei. Mas como queria

Ouvir o contrário.

Como no cinema, viveríamos

Uma aventura, uma noite,

Um eclipse, e, quem sabe, os

Sorrisos de uma noite de amor.

Mas o tempo chega

E cada segundo é uma morte,

Uma punhalada que espera

Em cada movimento dos ponteiros.

E posso te ver, ainda uma vez,

Sorrindo para o nada

Com o olhar de quem ainda

Não sabe que pode enxergar.

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SOL DO NOVO MUNDO

Lá no alto, topo do mundo:

A vida adentro, a noite escura.

Estradas musicais, rancorosas.

A Moderna homofonia

Sem razão de ser.

Luta de classes na elite,

Clássicos fast food,

Sonhos e sorrisos aqui,

A perder de vista: o céu.

Nosso teatro mambembe,

Imbecil. Pensadores de cabeça quente.

Esplendores e misérias no circo do povo.

Flagrante alegoria de uma comédia sem graça.

Encerro meus olhos pasmos na tela que atrai.

Contemplo, com um escândalo comportado,

Teorias estúpidas: retalhos de pensamentos amputados.

Procuro e alcanço a salvação num cigarro barato.

A única liberdade (ainda) é fumar...

A agonia dos que não tem mais nada me arrebata.

Sei-me estrangeiro e banal, mas não covarde.

Política em versos é covardia,

É não dar a cara ao soco.

Arte limpa, politicamente limpa:

Slogan do novo fascismo, travestido de rigor.

Ossos amontoados proclamam o direito à vida,

Ossos que nunca viveram.

São grandes estátuas berrando dinamismos

No caos do pântano onde todos se afogam.

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VOLVER

“Dónde está el niño que yo fui,

Sigue adentro de mí o se fue?”

PABLO NERUDA

Aquele lugar inóspito:

Amável, maldito,

Esquecido na infância.

Perdido para o homem

Crescido.

Nas escadas escuras,

Cheias de pó,

A saudade da vida do corpo,

Da vida de menino,

Da vida um pouco coisa

Que era boba e boa,

Da verdade desconhecida.

A cabeça dói,

O suor é a única verdade.

Caminho no escuro e sonho.

Sonho a beleza materna,

Sonho a inocência do amor

E realizo a impotência humana.

A criança que criava liberdades

Condenada a uma vida de papel.

Inebriada pelo orgulho de não ser um rato...

Como tantos outros.

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CAMINHADA PELA PRAÇA DA ESTAÇÃO

Cada passo é uma pedra.

Cada pessoa, um deserto.

Passo por ela, uma porta:

Um fim de tarde num poema concreto.

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A TERRA PASSA

No escuro, penso:

América livre,

Doce delírio.

Peço desculpas.

Tudo em ti

Foi desespero.

Casados e sós:

Vida e morte.

Pelas antenas

Do rádio

Chegam notícias

Da queda do muro

De nossa solidão.

Preciso lavar-me,

Limpar tua boca,

Limpar teu olhar,

Limpar teu adeus.

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OS HERDEIROS

Toda a minha liberdade feita de sangue:

Felicidade artística do que não sou.

O mundo brada, aos quatro ventos, que me perdeu.

Eu, desatento, miro a alegria ao longe.

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JANEIRO PELA JANELA

O mês de janeiro,

Chuvoso e quente:

Brasileiro.

O mais forte,

Mais duradouro.

Com dias de século,

Janeiro sem fim.

Esgota-me.

O suor no fim da tarde

Gotejando sobre o papel branco.

A humanidade passiva,

Esperando o carnaval.

31 dias

De um vagar fantasma.

Tudo morto e úmido.

A chuva morna

E os trovões secos

Não amenizam

O tédio.

A roda da fortuna parada.

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As parcas adormecidas.

Tudo parado.

Terremotos distantes

Soam canções de ninar.

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AVE MARIA

“Quivi perdei la vista e la parola;

nel nome di Maria finí; e quivi

caddi, e rimase la mia carne sola”.

DANTE, “PURGATÓRIO”

Não sei se devo seguir uma estrela

Ou ficar aqui parado, estupefato

Diante de tanta grandeza.

Esta vida não me atrai e

O amor é muito frágil

Para que ensine

Alguém a viver.

Ela sabe que não pode amar.

Eu insisto na possibilidade,

Minhas teorias que falham:

Com Maria, é tudo incerteza.

A palavra é violação;

O poeta, violador.

Procuro os pensamentos certos

No bolso do casaco.

Mas não estão lá,

Já cruzaram os oceanos.

Alcanço a cidade em sonho

E rezo a um deus que dorme

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Em um canto da rua, seminu.

Sei que há uma prece na memória,

Que a criança recitara e mãe ouvira,

Que pede a paz na hora da morte.

Não consigo trazê-la à tona.

Com Maria, é tudo incerteza.

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O PENSAR POEMA

Criação de versos, idéias...

Criação de mundos, desmundos.

Coração e pulso e sangue e dor.

Criação de dor.

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A CHEGADA

Foi na madrugada em que acordei de mãos atadas.

O fogo queimava tudo o que outrora fora doce,

Mas já se acabava, era o amanhecer...

Cheguei após a vida, e por toda a morte estarei aqui.

Receberam-me os bons homens, que pereceram na terra,

E outros ainda, que a ela se dirigiam.

Cheguei portador de letras, de datas, de horas...

Ao amanhecer nada terei.

Saquearam-me a alma, a razão e a história,

Encontro-me despido de humanidade.

Levar-me-ão a Deus, e meu desespero nascerá.

Minha espera, a última gota de sangue:

Sangue morto e podre, solidão.

Sangue lânguido, grande pecador.

A divina bestialização e o abandono...

Vieram me levar.

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CIDADE DA TARDE

Ruas inusitadas,

Enfumaçadas e belas.

O caminho de uma tarde.

Um sábado jogado na cara.

Belo Horizonte é uma janela

Voltada para o nada.

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ACORDAR NO VELHO MUNDO

Sozinho, no quarto imenso, neste sábado de nuvens secas:

Contemplo, pasmo, o meu rosto no espelho... ainda jovem.

Um dia ele será passado: existirá ainda na memória (talvez?)

E nas fotografias que eu odeio tirar.

E estarei velho e não terei aprendido nada.

Saberei que morrer é como contar o tempo,

É algo que fazemos, mas que não tem nenhum sentido.

Penso em encontrar ainda a velha casa em que cresci;

O avô com a certeza de Deus; o pai com a luta no sangue.

E eu, eu mesmo, tão vil, tão indigno: escravo de ideias que não são minhas.

Escrevendo linhas pobres por medo de sentir.

Ah! Porque não deixar que o universo passe sem saber de nós?

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ÀS PORTAS DO CAOS

Adormeço enfim, sobre o que agora desaba.

Toda cor acorda com o vento, e eu o vejo.

Tudo é cor, é caos, é sonho e dor.

Todos aqui clamam e choram.

Choram pelas vidas esquecidas,

Deixadas sozinhas, no calvário da dor.

Clamam por alguma virtude perdida,

Que as ruínas do passado esconderam.

Finalmente a luz; o sub-céu...

Unidade disforme, renascer,

Refazer um homem.

Deus? Ou algo que o valha?

Desfeito o nó atado a muito, minha alma:

Lacuna recém preenchida com o eu.

Vejo as portas do lugar de onde vim,

Convidado a entrar no eterno, acabar...

Voltar eterno, amargo; amar...

Eterna dor, amargo, e vão amar.

Embriagam-me, arrancam algo de mim,

Não vejo; nada mais vejo.

Ele esconde-se sob escombros de uma rosa,

Sim, eu o vejo. E nada mais posso ver.

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Entro assim para o nada,

Esperando a chegada

De um eterno amanhecer.

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O PERDÃO

Em todas as minhas horas,

Só a luta foi virtude;

Cego pela Tua perfeição,

Perdi tudo o que não tinha.

Embriaguei-me por não ser como Tu...

Perdi a razão, me fiz homem.

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DESESPERO...

Hoje vi um pássaro sobrevoando o amanhecer.

E nesse triste devaneio, percebi que não havia vida,

Que já não sabia viver.

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SOLIDÃO

A vida é assim: tão certa e tão só,

Tão santa, incapaz de existir.

Veneno de outros, derramado em nós.

Só existe mundo, gente, Ser...

Palavras vazias como “vazio” e “solidão”.

Meu canto não supera, nada diz:

Como cantar sem nada dizer?

Digo Deus e nada digo.

Digo tu , nós, silêncio...

Uma ilha sem mar, sem espaço ou tempo.

Canto vago na noite eterna das coisas,

Enfim: tudo coisas, caos... vida assim.

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ACORRENTADO

I

Que importa o espaço?

Que importa onde estou?

Eu, que sempre fui estrangeiro

Em meu próprio corpo.

Eu, que há muito

Não tenho identidade com o mundo.

Para mim os lugares,

Tais quais as formas de um prelúdio de Chopin,

Desmancham-se em meio ao oceano

De meus sentimentos esquecidos.

Não! Não importa onde estou:

Belo Horizonte, Paris ou Pequim.

Que diferença faz?

São só espaços cheios de consciências:

Consciências de inconsciência.

Espaços de solidão.

II

Estou cheio de medo,

Sou escravo do medo.

Um medo brasileiro,

Sincero e contido.

Olho em volta: tudo morto.

Meu sonho é dor.

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Estou cheio de medo,

Sou filho do medo.

Medo que é o porto

Onde sempre chego,

Após longas noites...

Noites de fuga e amor.

Estou cheio de medo,

Sou o medo do medo.

Tenho um medo besta.

Medo bastardo e podre,

Filho das mais nobres idéias

E do mais pérfido terror.

Estou cheio de medo.

Sou o Deus do medo.

III

Viro a página, reviro a vida,

Escrevo um verso...

Escrevo um poema

Sobre a dignidade humana.

Mas já não tenho esperança,

Já transpus a porta.

Talvez o poema possa

Ser tudo o que não fui,

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Ou, talvez, não será nada.

Se for o que não fui,

Ficará tudo como está.

Se não for nada,

Talvez as coisas melhorem.

E se um dia o universo acabar,

Louvarei, com fé, a Deus.

IV

Não, não há pátria para mim.

Não há solo em que eu possa pisar

E não sentir correntes e bolas de ferro

Atadas a meus pés.

Não há sossego, não há cansaço,

Só uma dor que parece dor,

Mas que, às vezes, é boa.

Daquelas dores que nos lembram

Que corre sangue em nossas veias.

Que vivemos como deuses,

Mas podemos sangrar, podemos sofrer.

É uma daquelas dores que trazem à consciência

O conhecimento, esquecido, de que não é por natureza

Que vivemos ajoelhados,

Mas porque temos muito peso nas costas.

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V

Açoita-me, à noite, um sentimento insano.

Sob a noite, descanso.

Sinto o passar das horas,

O naufrágio austero do tempo.

Sei que a liberdade é um sonho,

Não um caminho.

Percebo que não sou livre,

Pois sou igual aos outros,

E os outros não conhecem a liberdade.

Para além de meus versos

Ainda sou capaz de levar comigo um sorriso,

Nobre ao menos em sua consciência de ser apenas

Humano...

De ser apenas devir.

VI

Mas se a vida é apenas realidade,

Por que dizem que devo ser feliz?

A felicidade não é real;

Não é senão a vontade humana

De não ser humana.

VII

Minhas correntes sólidas,

Espessas e fortes como eu.

Entrego-me à palavra:

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Com meus versos avessos a métricas,

Sussurro aos ouvidos de Deus

Minha poesia desesperada.

VIII

Tenho tido muita tosse.

E, no fim das contas,

A única liberdade é tossir.

Tossir, tossir...

Até que rasgue o universo,

Junto com meus pulmões.

IX

Ah, meus amigos!

Só posso lhes dizer que vivi,

Porque hoje me sinto morrer.

Não sei bem se morro,

Ou se meu corpo adormece apenas.

Estou acorrentado, sempre estive,

Sempre estaremos.

Já não sou capaz de dizer mais nada.

Já não tenho versos para o último poema.

Hoje, estou absolutamente objetivado,

Não sou menos coisa que minha camisa,

Talvez seja até mais.

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Tento me vingar,em vão,do mundo

Tão alheio às minhas agressões,

Tão sóbrio e tão cruel.

Ah, meus amigos!

Mas vejo minha euforia aumentar,

Meu coração dilacerado por uma grandeza sem fim.

E torno a ser homem, torno a ser sangue.

Amarrem-me a quatro cavalos,

Despedacem-me, e então verão

Meu sangue anônimo correndo nas ruas.

Eu, órfão de ciências,

Adotado por metafísicas não-científicas.

Eu, que nunca fui o que vocês quiseram,

Que já não sou o que posso querer.

Eu, que fui ao inferno...

E me apaixonei.

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NUNCA MAIS

Ondas de silêncio gritam na noite:

O eterno morreu! O homem é livre!

Mas não há homem. O homem está morto.

O silêncio ainda o proclama...

Porém só existe silêncio...

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POÉTICA

I

A palavra não dita que teima em existir

No coração dos loucos.

O pôr-do-sol sonhado, jamais vivido.

O grito insano de quem tem tudo a dizer.

O silêncio de quem sabe que tudo é nada.

A vida, com o véu rasgado, correndo nua

Pelas ruas de uma grande cidade:

O existir.

II

Não me atraem os acrobatas do verbo

Com a fórmula perfeita para um poema bom.

A eles, prefiro a mediocridade lírica

Dos que não tem nada a dizer.

O comentário sobre a tragédia cotidiana.

III

“Tenho meu dever,

e o orgulho de o pôr de lado,

Como tantos outros.”

RIMBAUD

Poesia fugaz, eterna.

A cor das vogais...

Os ais.

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Uma vida valendo a pena.

Os universos: infernos

Líricos, lúcidos.

Embriaguez do moderno:

Tempos caducos.

Ciências: religiões.

Ciências: paixões.

Ciências, tendências,

Razões...

Tênue luz: o sol.

Deus, brincando, poeta.

Deus brincando Rimbaud.

IV

“A tragédia em cena já não me basta.

Quero transportá-la para minha vida."

ARTAUD

“A arte”, dizia o professor,

“É o constante aprimoramento

Do olhar sobre o belo.

A arte burguesa é

A cristalização que encarcera esse olhar.”

Com a poesia, aprendo a não ter medo:

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Não é preciso ver.

Os poetas não têm olhos,

Contemplam o mundo audível,

Sentem o real com a palma das mãos.

Com a poesia, aprendo que ela não deve conter-se,

Deve explodir em todas as possíveis impossibilidades

Da linguagem, ou não será poesia: morrerá.

Com a poesia, aprendo o não trivial, o não humano.

O demasiado humano.

Aprendo o amor e o desamor.

Com a poesia, aprendo a não ser um só.

Aprendo a morte do ego, o egoísmo:

A solidão.

Com a poesia, aprendo a liberdade:

Que despedaça e identifica, que cria e destrói,

Que é doce e amarga.

Com a poesia, aprendo a morte:

Justificativa máxima para tudo,

Eterna possibilidade distante.

Com a poesia, aprendo o poema:

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Objeto raro, lição complexa;

Aprendo Rimbaud, aprendo Artaud.

V

À noite,

Todos os gatos são pardos,

Todas as mulheres são doces

E todos os poetas são Poe.

VI

"La desce a Noite

Onde se pressente

Um longo destino de sangue"

APOLLINAIRE

A Poesia concreta sempre intrigou-me:

Um poema é tão abstrato quanto um círculo,

Tão imaterial quanto uma alma.

A poesia concreta da alma às formas,

Da Luz à alma.

Concretiza-se no efêmero.

Não morre.

Imortal, não endurece.

Continua poesia:

Tênue gozo humano.

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CENÁRIO

Olhos tontos,

Sonhos fortes.

Sobre a mesa

Um conhaque.

Um espanto,

Um acalanto.

Sobre a mesa

Um conhaque.

Rostos pálidos,

Nuevo tango.

Sobre a mesa

Um conhaque.

Filme francês,

Nouvelle vague.

Sobre a mesa

Um conhaque.

Versos fracos,

Poeta louco.

Sobre a mesa

Um conhaque.

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Inverno triste,

Mulher bela.

Sobre a mesa

Um conhaque.

Arre!

Por que diabos

Sou incapaz de tragá-lo?

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CENÁRIO II

Contas que tenho de fazer,

Lágrimas a derramar: um deserto.

O poder dos loucos,

Anjos insanos, desvairados, poetas.

Fecho a porta, derramo o vinho sobre a mesa posta.

Meu sangue derramado pela humanidade, humano demais.

Contas a pagar.

Dívidas com Deus.

Retratos na parede da sala,

Rostos que desconheço, ameaçadores.

Vidas cheias, dores astrais.

Desperto.

Vejo-me: universo.

Caligrafia trêmula, sombria.

Uma sinfonia: a quinta de Mahler.

Um filme: Visconti, Thomas Mann, Aschenbach.

A morte, a paixão: sentimentos.

A música, arte-mor.

Sobrevivo efêmero, desgastado e belo.

Escrevo: que me resta?

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A HORA DA VIDA

É segredo, o que não é liberto.

E insano, o que não é igual.

É cego o que não vê

E nulo o que não é visto.

É cansado o que faz

E indigno o que deixa ser feito.

É feita de mortes a hora da vida,

Que torna podre o nobre amor.

É triste o que está perfeito

E desvairado o que busca.

É tão inusitada a existência,

Pois sempre nos deixa sós.

É pérfido o criador,

Que fez tudo para seu deleite.

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RESTOS

Ah, se não tivesse perguntado sobre as coisas deste mundo,

De tudo o que é morto estúpido e bom.

Na vida colérica de ratos infames: homens, sangue e dor.

Meu passado único e inesgotável, fim em si mesmo, em mim.

Se pudesse dizer a inconstante palavra que me fere os lábios; ah se pudesse!

Aquela humanidade usurpada me confortaria como os braços de uma mulher,

[ou como a fúria de um deus.

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POESIA DO ESQUECIMENTO

“As gerações dos mortais assemelham-se às folhas das árvores,

que, umas, os ventos atiram no solo, sem vida; outras, brotam

na primavera, de novo, por toda a floresta viçosa.

Desaparecem ou nascem os homens da mesma maneira”.

HOMERO, “ILÍADA”

Dizer sobre tudo o que não foi,

Algo que o dia nunca irá saber:

As migalhas do tempo à espera da unidade;

Os homens sem olhos dizendo mentiras.

Eu nasci de um mundo novo,

Admirei, entorpecido, às virtudes mais vãs.

Agora só faço olvidar, por opção, todo o humano.

Não penso em nada, sequer na noite...

Vejo o fogo dos novos dias a arder.

Apagar a luz de um céu imerso em estrelas,

E trazer de volta a natureza o amargo perdão humano:

É essa a nossa missão.

Sempre fomos desgarrados, nosso legado é a terra,

Nossa hora é de esquecer...

De tudo o que foi, o que fomos?

Nenhuma vida é sincera para amar.

O homem? Só homem...

Alguém que, no nada, vive,

E se esquece da incapacidade de no nada viver.

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APENASMENTE MORRE

Só Freud explica.

Só Jesus Salva.

Só o homem peca.

Só a fome mata.

Só a ilusão alegra.

Só a solidão sufoca.

Só os mortos gritam.

Só a ciência prova.

Só a mentira é provável.

Só a loucura liberta.

Só a liberdade pesa.

Só o instante existe.

Só a existência é triste.

Só o tempo é humano.

Só a humanidade é tempo.

Só a humanidade é alma.

Só a alma morre.

Só o corpo é eterno.

Só a eternidade vale à pena.

Só a morte redime.

Só a dor desperta.

Só a loucura é sã.

Só a tragédia engrandece.

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OUTRAS CANÇÕES

Das sombras fiz meu lar,

E no teu olhar vi a solidão.

No chão joguei as lágrimas,

As lástimas e o perdão.

Do pão restou-me o céu.

De um mar de mel, a escassez.

Desfez-se sonho do ópio,

A loucura e o cio da embriaguez.

Outra vez vi o medo,

E em segredo chorei.

Cruzei invernos e sóis,

Para enfim perecer.

Voltar a crer? Jamais!

Quero estar entre as flores.

Deixarei temores para trás

E não tornarei a amar.

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TRANSE

Dedicado a Glauber Rocha e sua Solitária alma inquieta.

No alto desta noite escura e triste

Estendo meu frágil corpo

Sob um luar disperso em nuvens negras.

Bebo inconstância nas amargas fontes da razão

E me entrego à incerteza do todo e do nada.

Adormeço e acordo mil vezes a cada segundo

Sem perceber a fria ausência da morte em mim,

Perdôo-me por não pensar a ausente e parto, enfim,

Para afogar-me no solitário transe das almas inquietas.

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O CONFORMISMO

Calmamente, a noite chega.

Caminhamos com firmeza,

De braços dados com a solidão:

Esquecemos... é o que se pode fazer.

“O mundo será sempre assim”,

Sussurram em uníssono...

Os que temem gritar.

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RITUAL DOS TOLOS

Andar sem saber da estrada,

Caminhar, lugar-comum.

Sentam-se e bebem

E esquecem.

Vento soprando no rosto,

Sorriso alegre, bobo.

Destroça a vida,

O homem que pensa.

Se me permitem, digo:

Somos todos bufões,

Cansados e sem esperança.

E continuamos...

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CAMINHOS DE MAÇÃ

“Tienes líneas de luna, caminos de manzana”.

PABLO NERUDA

A noite rasga a cidade, a volúpia se levanta.

Para cantar (amor?), errados e belos,

Corpos desabrocham. Desde seios,

Suores nascem, encantam.

Pequenos pedaços de sonhos,

Aqui e ali, que fazem feliz

A quem concede encontros.

Puro desejo, oculto no sorrir.

Primavera batendo à porta,

Raparigas à janela, à sombra,

Em flor, pisando folhas mortas

Do outono que passou.

Paraíso posto, às pressas,

Cá no mundo.

Cobrindo de versos

Corações vagabundos.

Estas noites não esperam manhãs,

Só fazem deslizar docemente

Por longos caminhos de maçã.

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No vagar dos homens,

Ébrios esta noite,

Não há nada a censurar.

Eles vão ao léu,

Pó no rosto, pé na estrada.

Vida ao vivo, bar em bar.

Nesta terra, onde doutos não podem reinar,

Pois terra de loucos, motivo de festa:

Reino de céus em cores de mar.

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TARDE DE ESTUDOS

No fim do século, à noite,

Eu passeava pelos jardins de Deus.

Sobrevivente da história.

O vento, o vento, o vento:

O vento soprava a alma,

A alma despedaçava.

Afogada em números,

Inundada.

Imunda.

A alma humana.

O “homem-mundo”:

Deduções.

Lá, a terra morre.

Aqui, vive o caos.

Lá, a vida canta.

Aqui, o amor grita:

Agoniza.

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COSMOGONIA

Ouçam: o rio passa.

Corre com a velocidade do pensamento.

Deus está a cismar: “O que pensam os homens?”

Cansado de cismar, esquece.

Esquece de si mesmo

E torna-se o mundo.

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OS DEMÔNIOS

Hoje acordei lúcido. Uma palavra gritava em minha cabeça:

“Liberdade!”, “liberdade!”, gritavam os demônios de minha alma.

Ser humano: ser vaidade. Conquista futura da ausência.

Ardia-me o rosto. Eu pecava em cada olhar, em cada gesto.

Desde cedo aprendi a ofender a minha humanidade.

É certo que, não sendo santo, não fui hipócrita.

Um trago no cigarro que estava sobre a mesa e o universo retornaria

Impossível e trágico, recheado de cores rivais e harmônicas.

Dilacera-me o peito a pergunta que, à noite, foi feita por algum deus:

- “O que faz o homem tão grande e ao mesmo tempo tão medíocre?”

- “Liberdade!”, teimavam os demônios.

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SOBREVIVO

Sobrevivo, mesquinho aos olhos de todos.

Como um lagarto, sobrevivo.

Atento a tudo o que já não é possível.

Olhos insanos de minha alma, constantemente

Provocados pelo dinamismo das vidas triviais das gentes.

Sobrevivo, como que por uma vontade sádica de Deus:

Sou capaz de desfazer-me de mim mesmo

Como de uma roupa velha que já não serve.

No meio da noite, a força,

Mãe de toda vaidade, superável e triste,

Persegue os cães vadios que dormem na calçada.

Eu, do alto de meu inferno, sobrevivo.

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O OUTRO

Eu não me importo!

E a certeza de não me importar

É o que me mantém vivo no absurdo.

Em mim, uma máquina vazia:

Sem mundo, sem medo.

Não me importo!

Só me seduz o tempo.

Inexoravelmente livre,

Herdeiro de toda liberdade.

Realmente, não me importo!

Homem puro que sou, que fui...

Soberano da dor e escravo de vermes.

Sonho uma triste valsa

Para almas e nomes vãos.

Não me Importo!

Minha vida despojada, elevada aos céus,

Idéia digerida por alguém que não eu.

Não um eu, não um ser.

Não me importo, francamente,

Não me importo!

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EPITÁFIO PARA RIMBAUD

Onde estão os nossos deuses?

Acaso cantam, agora, canções do exílio?

Acaso exalam, tristes, suas divindades?

Talvez escrevam cartas de terras distantes...

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RAPSÓDIA PARA O FRACASSO

“Then, what is life? I cried”

SHELLEY

I

Corri pelos campos gritando blasfêmias,

Perguntando aos deuses sobre a vida.

Desejei ausências, odiei mistérios.

Agora renego tudo, quero apenas viver.

Os homens cantam, dançam, esquecem.

Os homens morrem, desencantam e calam.

Só nos restam o silêncio e a vontade de gritar.

II

Carros oprimem,

Cidades oprimem,

Amores oprimem.

Permanece tudo quieto,

Tudo morno.

Tudo morto até que surja o ato:

A explosão da dor humana,

Daqueles que ainda não desistiram.

Então tudo ferve, impera o caos.

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III

Casas queimando, crianças queimando:

Corações em chamas.

Olhos secos, sem lágrimas.

O choro virá depois.

Quando houver tempo

O choro virá.

IV

Cuidaremos da terra, ela sobreviverá.

Levantem os mortos, eles trabalharão.

Cuidaremos da terra, cantaremos,

Daremos flores às nossas mães.

V

Corpo: só existe o corpo.

A eterna potência, o bem maior.

O corpo não pode morrer.

Nos corpos repousam os deuses.

VI

Coberto por imundices, num gozo pleno:

A dor.

O hino absoluto: o grito!

Elas desejam viver.

Devemos matá-las?

Não, ainda não.

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A tortura é o maior dos prazeres.

Ajoelhados, escravos de máquinas,

Criamos a nova divindade.

Pusemos no o fracasso no altar.

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O AMOR NAS CAIXAS DE CHOCOLATE

O amor existe,

Não há dúvida.

Está nas caixas de chocolate:

O amor bombom.

O amor passa,

Desfila pelas ruas,

Está nos pés:

O amor sapato.

O amor embriaga.

Ébrio, vagueia sem rumo

E chega ao vinho:

O amor uva.

O amor é caos,

É arma: fere, mata

E destrói cidades:

O amor guerra.

O amor apaixona,

Cheio de luz e desejo.

Personifica:

O amor mulher.

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PASSEIO

Belo Horizonte é uma cidade ímpar,

Ensimesmada: Janela aberta para o espelho.

Lugar de acasos, de vida afora,

Suores e noites de paz.

Renasce todo dia

Saída de dentro do sol.

Herdeira de Minas, canções de Milton:

Sinos errantes e cristos pagãos.

Terra de calçadas, de olhares baixos,

De seres que rastejam, com a cabeça na lua.

Horizontes azuis, telhados de fogo e tapetes de asfalto.

Cumprimentos gentis, com pé-atrás.

Timidez que vem a calhar.

Sabe seu destino: esconde-o.

Serras de silêncio circundando o livre-arbítrio.

Pudores e excessos temperando a multidão errante.

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RENDIÇÃO

Viajo, dormindo, ao inferno;

O inferno em mim,

O inferno nos outros.

Escondo escândalos em minhas mãos.

Escorrem entre meus dedos,

Sou humano como Cristo:

O Deus que perdeu.

Sou vil e amável e não sei o que devo,

Ou, sequer, o que quero fazer,

Vago...

Tento descrever...

Em versos...

A dor...

Que tenta ser...

Que é maior.

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CANTO DOS CORVOS

Canos e águas,

Luto e dor.

América sangrada:

Desalento, um túmulo.

Que desejam?

Nossas almas?

América sangrada:

Latina e frágil.

Repleta de revoltas

Contidas e débeis.

Acasos te destroçam,

América sagrada,

Mãe dilacerada.

Que fizemos de ti?

Nós, os mortos,

Não fomos também

Os assassinos?

América sangrada,

Acaso não queres morrer?

Mas se toda a tua vida

Foi feita de mortes.

Se no mar do teu sangue

Há sempre Pilatos

Lavando as mãos.

Estranhos se banham

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Deliciam-se, te mancham.

América deflorada

Num estupro universal.

Que mais te podem fazer?

Pobre puta, tão amada:

Geni do mundo.

Não morrerás!

Pois ainda há fogo

E há memória.

Há memória

E há fogo.

E as chagas abertas

Hão de fazer recordar

A necessidade da luta,

O amargo prazer de lutar.

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OURO PRETO

Cidade alta, louca.

Fumegando traços,

Construindo laços,

Beijando bocas,

Caminhando...

Com passos largos

Pelas ladeiras,

Lugares calmos

Onde a vida voa.

Cantos Gerais,

Não de Neruda,

Mas das Minas.

Dois universos.

Museu a céu aberto,

Ancorada em dores

Escravas,

Que sofrem.

Terra da chuva,

Da mácula do tempo.

Sobrevive nova

E ébria.

Do outrora,

Se alimenta:

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É eterna.

Templo barroco,

Encerra o belo

E o grotesco,

E algo mais:

O paradoxo,

A divindade.

Lugar-comum

Da humanidade,

Da poesia

Ignorante e

Sem verdades.

Instantes mortos

Em cada casa:

A vida pára,

O querer espera.

As cruzes pesam,

Os santos sonham

Uma morte vã.

Os homens calam

Quando sabem

Que não podem gritar.

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PONTO DE CORTE

Poema é tiro no escuro.

O canto coisa, o papo reto.

Açoita a pele, o verso incerto:

Palavra pedra, falar duro.

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GUERRA

I

Não me sinto bem,

A cabeça dói, estou enfermo.

Tirem daqui toda a humanidade!

Preciso ficar só para não morrer.

Minhas mãos estão inchadas,

Tenho febre e uma ânsia de embriagar-me

E enlouqueço

Cortando os pulsos

Com uma lâmina fria.

II

Podemos crer que Deus é justo,

Que os átomos sentem

E que “impossível” é uma palavra vazia.

O vento não saberá de nós.

III

O pó pregado ao chão da velha casa.

A religião, que trazia vida a tudo.

A lembrança que é pesada demais.

Infância distante, acenando adeus.

IV

Ia pelo caminho o velho homem,

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Odiava o futuro que teimava em existir.

A vida caminhava junto, invencível.

A morte esperava à frente, com olhos maternais.

V

Veneno de cobras.

Rasgos no tempo,

Nas botas sujas

Na lama

Da guerra.

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LUTO

Quando penso na morte,

Penso em violência.

Não na violência da noite,

Ou na violência das armas,

Mas na fria violência do silêncio.

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HEREDITARIEDADE

A geração de meu pai

Habitava lugares inalcançáveis.

A minha alcança lugares inabitáveis.

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O SONO

I

A minha vida inteira tem sido, sobretudo, um grande sono.

Não importando se estou a velar ou a dormir, estou sempre dormindo.

Dos sonhos que tive, os mais fantásticos, tive-os acordado,

Os mais reais, dormindo.

Seguro uma pedra em minha mão e ela parece feita de pó,

Desfaz-se...

Sonho constantemente com uma bela mulher que amo,

E, no sonho, ela existe tanto quanto eu mesmo.

Seria capaz de sentir com sua alma.

Em sonho, não existo e sou Deus.

Aqui, sou um verme pleno.

II

Eis a vida nua!

Eis a questão não colocada!

O limpar o corpo de um cadáver!

Se me erguesse de meu sono

Seria para morrer.

III

Um poema como um soco no estômago.

Um poema como um cachorro doente

Numa esquina qualquer.

Um poema incapaz, apolítico.

Um poema que arranque olhos, apocalíptico.

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Um poema concreto que desmanche no ar.

Um poema vivido.

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DIA DE OMBROS MOLHADOS

Uma constatação: chove.

Terça-feira, água fria.

Um dia de ombros molhados

Nas goteiras do universo.

Dia de homens cansados,

Que arrastam por aí o cadáver

Sem se preocupar;

Sem saber da verdade da chuva.

Tragédias no noticiário, doce sabor

Da desgraça alheia.

Cama quente, chocolate quente

Pra trazer o bom humor.

Pela janela, ônibus lotados de

Gente úmida.

Fumaça do cigarro aquecendo o corpo,

Os pulmões mofados;

Celas em forma de lar que abrigam

Letrados.

Carreiras aqui e ali.

Cheiro de mulher.

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Uma transa para esquecer da lama

E chafurdá-la melhor.

Uma criança, em trapos,

Correndo na chuva,

Brincando de Deus,

Pedindo esmolas

No fundo do mundo.

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FUTURO

As novas ordens trazem consigo um novo caos,

Que dá nova esperança aos velhos homens.

Homens que construirão um futuro

Igual ao novo passado,

Farão novas vitórias,

Para os eternos guerreiros.

Que hão de criar novas guerras

Para derramar novo pranto,

Dos novos olhos tristes

Que sofrem com a antiga dor.

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SEM COR

Entrei pela porta do tempo.

Noites claras, mãos despedaçadas

Sob meu olhar atento.

Teima em existir minh’alma , calada.

Resisto a ti, ó tormento!

Meu retorno vão, atroz

Ao triste som, tua voz.

Negra razão, meu pensamento.

Homem máquina,

Sangue quente,

Mente e dor.

No papel, minha pena

Traz à vida ardente,

Meu querer sem cor.

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DA DOR DE LEMBRAR

A memória nos esmaga,

Carregamos nos ombros

A tristeza de toda a vida:

A história humana.

Quem dera poder ter

Uma amnésia

Ao fim de cada dia.

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IMAGINAÇÕES TORTAS

Lá vem o futuro!

Não o vêem?

Lá vem o futuro.

Tempo desconstruído,

Cheio de culpa e paz.

E me pego perguntando:

"Por que esta invenção?"

Não há resposta.

Silenciosamente, os fantasmas

Dançam ao meu redor.

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O CÃO NA RUA

Um cão na rua

No meio de todos

Do nada

Ao léu

Escuta passos

O cão

À noite

Sonhando gatos

Brincando fomes

E chutes no rabo

Um cão na rua

O cão na rua

A morte no cão

A carne crua

O pneu

Esmagando

Sonhos e cães

Na vala

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AFOGADOS

Corra!

Eles não podem te alcançar...

E sonhamos, e sobrevivemos...

Louvamos o vinho e acendemos cigarros

Enquanto esperávamos a humanidade chegar

E ocupar aquele lugar vago na mesa

Para nos dizer que a liberdade é uma grande puta

Que nos engana desde sempre

Com uma divindade qualquer.

Então pudemos sair e atravessar as paredes

E as idéias.

E todo o conhecimento que tínhamos nos bolsos,

Oferecemos como esmola a um mendigo imundo.

Então choramos, como no teatro, com as almas entrelaçadas...

E fizemos amor.

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SOBRE OS HOMENS

Canto, por meio de uma voz emancipada,

Canções que dizem que não existo.

Tudo o que faço (ou penso fazer?),

Já não faz parte de mim.

“Que sou eu então?”,

A poesia pergunta.

A realidade se cala e olha para o chão.

Tudo o que nos forma já não é nosso.

As vozes emancipadas se calam

Ao chegar ao fundo do frio abismo do silêncio.

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DO AMOR

Todas as noites

Sou devorado por duas mulheres:

Uma devora-me o corpo.

A outra, os sonhos.

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JANELAS

Na poesia o tempo é falso,

Como estátuas de cera.

Cada passo é de uma vida pulsante

Inimaginável aos olhares alheios.

Um estado de imensidão

Que destrói toda a certeza

E abala as frágeis almas.

Não se deve amar, pois, a poesia,

Mas odiá-la com fervor

Por ser ela tão pura.

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... E A REVOLUÇÃO?

Quero esquecer o mundo por enquanto,

Deitado na poltrona reclinada,

Nos braços da mulher que me ampara.

Quero rasgar suas vestes e cobri-la de amores.

O que excita a alma é o melhor do corpo.

Minhas tolas, queridas, infames:

Mulheres do mundo, mulheres de todos.

Esquecem que tenho

Amor vazando pelos poros e

Conheço sonhos e perversões mil.

Tenho carências que mostrar,

Súplicas que pronunciar.

Mordo os lábios ao pensar em dizer:

Não acharei ouvidos, não se atreverão a entender.

Passarão, passarei, passarinho.

“Larga disso, homem!”,

Gritos de Deus ao pé do ouvido.

Tudo pensado em minha cabeça:

Universos, cores, prazeres e, sim,

A urgência de dizer que sinto e que

Perco a mim mesmo na boca de alguém.

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LADEIRAS

Ladeiras que sobem e descem,

Que carregam as dores,

As vidas e os amores

De quem as sobe e desce.

Ladeiras vivas,

Que vivem e sonham,

Que nascem e morrem

Em corações errantes.

Ladeiras tristonhas,

Em dias de chuva.

Que choram e clamam

Por alguma virtude.

Ladeiras em vãos momentos

Deixados em outros passados,

Que vêem os homens do alto

Rodando ladeira abaixo.

Ladeiras eternas,

Eternidades vividas.

Lágrimas contidas

Nesse digno sofrer.

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E TODOS SÃO EU

Eu queria ter uma aposta para ganhar

E o direito de esquecê-la.

Queria ter um caso particular,

Uma luminária acesa em uma mesa de luxo.

Queria ser o gole de conhaque na noite fria

E a fumaça do cigarro que dá força aos solitários.

Na noite, acaba o tempo, acorda a vida,

Dorme o dia, sob escombros.

Adormeço e sou todos.

Acossado, sou liberdade.

Ofendido, sou gratidão.

Usurpado, sou doador.

Planetas e mistérios em minha cabeça que dói.

Cabeças de prego no tabuleiro de jogo da criança.

Eu, sentado ao lado dos amigos mortos.

Todos eles com o mesmo rosto:

A face partida ao meio por uma cicatriz terrível.

E todos são eu.

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O SEGREDO DA VIDA

Tenho a boca seca.

Um irresistível cheiro de mulher preenche o ar.

Estou bêbado.

Bêbado das desgraças do mundo,

Bêbado das paixões que me devoram.

Passei a vida a desencontrar-me,

Tenho sido, até agora, o que nunca quis.

Já não reconheço a humanidade.

Eu quero reinventar o homem

Torná-lo novamente humano,

Sujo e vil.

A verdade não está na História.

O segredo da vida esconde-se

Nos olhares medíocres.

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FACA NO TEMPO

“Elle est retrouvée.

Quoi ? - L'Eternité.

C'est la mer allée

Avec le soleil.”

RIMBAUD

I

O deserto quente.

A frieza da alma.

Vida criando dores,

Sonhando eternidades.

Amanhece. Luz!

Palco iluminado,

Teatro do tempo:

Soberbo.

Apaga o medo

O dia de sol.

Homens criando seiva,

Árvores sangrando.

II

Podes ver?

Criei asas e vi o mundo.

A liberdade é fantasia.

Palhaços incautos,

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Devorando significado,

Caminhamos sozinhos.

III

Linguagem:

Um fantasma pisoteado.

O discurso sem poder,

Desordenado.

O tempo, ainda ontem,

Dilatado.

A metafísica brincando

De saber.

IV

O fim do caminho

Amanhã de manhã.

Enferma, a vida

Bate à porta.

Tem sede,

A boca seca.

O caminho escurece.

De negras nuvens,

A tempestade cai.

A vida pálida:

Com o medo na alma.

O medo da vida

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Na alma do homem.

V

O homem social

Morto, atemporal.

Escada abaixo

A vida caminha,

Dança e cria mundos.

Povo é mentira.

Indivíduo, ficção.

Só resta o encanto

Do que não foi.

Vã alegria.

Pelo tempo,

Aos tropeços:

Humanidade tecendo

Teias.

Pelo avesso,

A vida avança.

A descrença cresce,

Eis a nossa herança.

Abismo, ismo, ismo,

Humanismo tolo.

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Uma história sem fim,

No fim da história,

Esperando alguém.

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HINO

Cantai homens!

Acaso esquecem

Da dor que sentiram?

Da alegria de poder

Dançar sobre o abismo?

Não são os deuses,

A natureza,

Ou a morte.

Sois vós!

Os responsáveis...

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FACAS: UMA SÓ VÍSCERA.

Ouvimos erros,

Nos dizem não.

Cálice e corpo,

Alma e morte,

Pulso e sangue.

Grandes magos

Da vida séria,

Estéril.

Proclamem,

Agora,

A dor.

A vida enfim:

Contam histórias,

Vivem verdades

Eternas.

Antigas.

Pedras sobre túmulos

E facas: uma só víscera.

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LIÇÕES DE HISTÓRIA

O universo do verso

Tornado o avesso

Da obra escrita.

Palavra cuspida,

Encarnada no corpo

Do artista.

O ato pensado,

O contrário da ação

Pensante.

O poema fraco,

Deleite burguês

No ócio.

O teatro da vida,

Seco e trágico

Sonho trivial.

Paraíso perdido.

Nas portas do inferno,

A esperança morta.

Agoniza, enfim,

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A fé no Deus

Feito coisa por nós.

A verdade

Passa ao largo

Pela história morta.

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POLÍTICAS

Camaradas! Boicote ao efêmero hoje à noite.

Não se percam nas mulheres, na vida.

Cuspam não arte que não é capaz de matar.

Torturemos a beleza em praça pública.

Um brinde:

À colônia!

À máquina!

Ao universo!

Ao Palco!

À primavera!

A todos os deuses mortos!

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MADRUGADA NOS OLHOS

Outro caminha em mim nesta manhã.

Um outro, que se apossa de minha dor,

Devora meus sonhos e ri de meu desejo.

Ele tem a verdade do belo

E carrega na alma a tragédia do mundo.

Meus olhos fecham e sinto seu corpo.

Tenho a verdade do homem

E carrego na alma os prazeres do mundo.

Ouço delicadezas e pecados,

Sinto abraços e lábios:

Pudores violados, metades de mim.

Ele foge, seduzindo.

Sigo-o.

“Onde vai?”, indago.

O olhar me escapa.

Tem um olhar de céu:

Tem a madrugada nos olhos

E os deuses na boca.

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TEORIA DA HISTÓRIA

O homem social

Morto, atemporal.

Escada abaixo,

A vida caminha,

Dança e cria mundos.

Povo é mentira.

Indivíduo, fantasia.

Só resta o encanto

Do que não foi,

Vã alegria.

Pelo tempo,

Aos tropeços:

Humanidade tecendo

Teias.

Pelo avesso,

A vida avança.

A descrença cresce,

Eis a nossa herança.

Abismo, ismo, ismo,

Humanismo tolo,

Uma história sem fim

No fim da história,

Esperando alguém.

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LA BELLE HÉLÈNE

“Das Ewig-Weibliche

Zieht uns hinan.”

GOETHE

Encontro-me em ti, retorno a mim:

Idas e vindas, num furor ébrio,

E teimo. Temo sempre, o fim.

Retorno ao zero, sem equilíbrio.

No fim de tudo há um festim,

Espetáculo difuso, amor apenas:

Avançamos misturando nossas pernas.

Mergulho em teu vestido de cetim.

Procuro ainda teu rosto, Helena!

Cansado de fitar o espelho,

Cansado de inspirar pena.

Vivo; sem o teu apelo,

Morro em cenas obscenas.

Agarro, em sonho, teu cabelo.

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O PALCO ILUMINADO

Prólogo ..................................................................................................................... 3

ANGELUS PRIMUS ............................................................................................... 4 Nômade .................................................................................................................... 5

I ........................................................................................................................... 5 II .......................................................................................................................... 5 III ......................................................................................................................... 5

IV ........................................................................................................................ 5 V .......................................................................................................................... 5 VI ........................................................................................................................ 6 VII ....................................................................................................................... 6 VIII ...................................................................................................................... 6

IX ........................................................................................................................ 6

X .......................................................................................................................... 6 Vamos! ..................................................................................................................... 7

Liberdade: um precipício ......................................................................................... 8 Sol do novo mundo ................................................................................................ 10 Volver ..................................................................................................................... 11 Caminhada pela praça da estação ........................................................................... 12

A terra passa ........................................................................................................... 13 Os Herdeiros........................................................................................................... 14

Janeiro pela janela .................................................................................................. 15 Ave Maria............................................................................................................... 17 O pensar poema ...................................................................................................... 19

A Chegada .............................................................................................................. 20 Cidade da Tarde ..................................................................................................... 21

Acordar no velho mundo ........................................................................................ 22

Às Portas do caos ................................................................................................... 23

O Perdão ................................................................................................................. 25 Desespero... ............................................................................................................ 26

Solidão ................................................................................................................... 27 Acorrentado ............................................................................................................ 28

I ......................................................................................................................... 28 II ........................................................................................................................ 28 III ....................................................................................................................... 29 IV ...................................................................................................................... 30 V ........................................................................................................................ 31

VI ...................................................................................................................... 31 VII ..................................................................................................................... 31 VIII .................................................................................................................... 32

IX ...................................................................................................................... 32 Nunca Mais ............................................................................................................ 34 Poética .................................................................................................................... 35

I ......................................................................................................................... 35

II ........................................................................................................................ 35 III ....................................................................................................................... 35 IV ...................................................................................................................... 36 V ........................................................................................................................ 38 VI ...................................................................................................................... 38

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Cenário ................................................................................................................... 39

Cenário II ............................................................................................................... 41 A hora da vida ........................................................................................................ 42 Restos ..................................................................................................................... 43

Poesia do Esquecimento ......................................................................................... 44 Apenasmente morre ............................................................................................... 45 Outras canções ....................................................................................................... 46 Transe ..................................................................................................................... 47 O Conformismo ...................................................................................................... 48

Ritual dos tolos ....................................................................................................... 49 Caminhos de maçã ................................................................................................. 50 Tarde de Estudos .................................................................................................... 52 Cosmogonia ........................................................................................................... 53 Os Demônios .......................................................................................................... 54

Sobrevivo ............................................................................................................... 55

O Outro .................................................................................................................. 56

Epitáfio Para Rimbaud ........................................................................................... 57 Rapsódia para o fracasso ........................................................................................ 58

I ......................................................................................................................... 58 II ........................................................................................................................ 58

III ....................................................................................................................... 59 IV ...................................................................................................................... 59

V ........................................................................................................................ 59 VI ...................................................................................................................... 59

O amor nas caixas de chocolate ............................................................................. 61

Passeio .................................................................................................................... 62 Rendição ................................................................................................................. 63

Canto dos Corvos ................................................................................................... 64

Ouro Preto .............................................................................................................. 66

Ponto de corte ......................................................................................................... 68 Guerra ..................................................................................................................... 69

I ......................................................................................................................... 69

II ........................................................................................................................ 69 III ....................................................................................................................... 69

IV ...................................................................................................................... 69 V ........................................................................................................................ 70

Luto ........................................................................................................................ 71

Hereditariedade ...................................................................................................... 72 O Sono .................................................................................................................... 73

I ......................................................................................................................... 73 II ........................................................................................................................ 73 III ....................................................................................................................... 73

Dia de Ombros Molhados ...................................................................................... 75 Futuro ..................................................................................................................... 77 Sem cor................................................................................................................... 78 Da dor de lembrar................................................................................................... 79

Imaginações tortas .................................................................................................. 80 O cão na rua ........................................................................................................... 81 Afogados ................................................................................................................ 82 Sobre os Homens ................................................................................................... 83

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Do Amor ................................................................................................................ 84

Janelas .................................................................................................................... 85 ... E a revolução? .................................................................................................... 86 Ladeiras .................................................................................................................. 87

E todos são eu ........................................................................................................ 88 O Segredo da Vida ................................................................................................. 89 Faca no tempo ........................................................................................................ 90

I ......................................................................................................................... 90 II ........................................................................................................................ 90

III ....................................................................................................................... 91 IV ...................................................................................................................... 91 V ........................................................................................................................ 92

Hino ........................................................................................................................ 94 Facas: uma só víscera. ............................................................................................ 95

Lições de história ................................................................................................... 96

Políticas .................................................................................................................. 98

Madrugada nos olhos ............................................................................................. 99 Teoria da História ................................................................................................. 100 La Belle Hélène .................................................................................................... 101