O Papel das Igrejas na Redução da Pobreza em Angola

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Transcript of O Papel das Igrejas na Redução da Pobreza em Angola

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    Traduo do Relatrio R 2010: 1

  • O Instituto Chr Michelsen um centro independente de pesquisa em desenvolvimento internacional e polticas pblicas com foco em pases pobres. O Instituto conduz pesquisa bsica e aplicada, nas reas temticas de direitos hu-manos, reduo de pobreza, reforma do setor pblico, resoluo de con-fl itos e manuteno de paz. Enfoque geogrfi co dado a frica do Norte e Sub-sahariana, Oriente Mdio, sia Central e Sudeste Asitico, e Amrica Latina.

    A pesquisa realizada pelo CMI tem como objetivo informar e infl uen-ciar polticas pblicas assim como contribuir para o debate sobre desenvolvimento internacional. O CMI trabalha com uma vasta rede de pesquisadores parceiros e em estreita cooperao com pesquisa-dores no Sul.

  • O Papel das Igrejas na Reduo da Pobreza em Angola

    Sren Kirk Jensen Nelson Pestana

    R 2010: 1

  • Nmero do projecto 27018 Ttulo do projecto Igreja e pobreza em Angola

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    ndiceLISTA DE ABREVIATURAS ....................................................................................................................... IV

    INTRODUO ................................................................................................................................................. 1

    ESTRUTURA ANALTICA ............................................................................................................................ 3 Reduo da pobreza ................................................................................................................................... 3 As Igrejas ................................................................................................................................................... 3 Metodologia ............................................................................................................................................... 4

    CONTEXTO ..................................................................................................................................................... 6 INDICADORES SOCIAIS .................................................................................................................................... 6

    Sade, nutrio, gua e saneamento .......................................................................................................... 7 Educao .................................................................................................................................................... 8

    GOVERNAO ................................................................................................................................................. 9 A ECONOMIA................................................................................................................................................... 9

    A PANORMICA DAS IGREJAS ............................................................................................................... 11 Estatsticas da Igreja ............................................................................................................................... 12 Unidade versus diversidade ..................................................................................................................... 13 Relaes com o Estado e quadro jurdico regulador ............................................................................... 14

    AS IGREJAS E A POBREZA ....................................................................................................................... 16 A IGREJA CATLICA ...................................................................................................................................... 16

    Alvio Emergncia ................................................................................................................................. 17 Actividades para o Desenvolvimento ....................................................................................................... 18 Actividades de Poltica e Advocacia ........................................................................................................ 20

    A IGREJA EVANGLICA CONGREGACIONAL .................................................................................................. 22 Alvio Emergncia ................................................................................................................................. 23 Actividades para o Desenvolvimento ....................................................................................................... 23 Polticas e Advocacia ............................................................................................................................... 24

    A IGREJA METODISTA UNIDA DE ANGOLA .................................................................................................... 25 Alvio Emergncia ................................................................................................................................. 26 Actividades de Desenvolvimento .............................................................................................................. 26 Polticas e advocacia ............................................................................................................................... 27

    A IGREJA EVANGLICA BAPTISTA DE ANGOLA ............................................................................................. 27 Alvio Emergncia ................................................................................................................................. 28 Actividades de Desenvolvimento .............................................................................................................. 28 Polticas e advocacia ............................................................................................................................... 30

    CONSELHO DAS IGREJAS CRISTS EM ANGOLA ............................................................................................. 30 RESUMO ........................................................................................................................................................ 31

    ANLISE DO INQURITO ......................................................................................................................... 33 A PRESENA DAS IGREJAS NA GEOGRAFIA DE ANGOLA ................................................................................. 33 PERCEPO DO NVEL DE POBREZA E FACTORES SUBJACENTES ..................................................................... 34 O PAPEL DAS IGREJAS.................................................................................................................................... 36 FRACO REGISTO DE BENEFICIRIOS ............................................................................................................... 39 RESUMO ........................................................................................................................................................ 39

    CONCLUSO ................................................................................................................................................. 41

  • RELATORIO CMI O PAPEL DAS IGREJAS NA REDUO DA POBREZA EM ANGOLA R 2010: 1

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    Lista de abreviaturas AEA Aliana Evanglica de Angola BMS Baptist Missionary Society (Sociedade Missionria Baptista) CEAST Conferncia Episcopal de Angola e So Tom CEJP Comisso Episcopal de Justia e Paz CEIC Centro de Estudos e Investigao Cientfica CICA Conselho das Igrejas Crists de Angola CIDSE Coopration Internationale pour le Dveloppement et la Solidarit (Cooperao

    Internacional para o Desenvolvimento e a Solidariedade) CIEAC Conselho de Igrejas Evanglicas de Angola Central COIEPA Comit Inter-Eclesial para a Paz em Angola DASEP Departamento de Assistncia Social, Estudos e Pesquisa IEBA Igreja Evanglica Baptista de Angola ICRA Instituto das Cincias Religiosas de Angola IECA Igreja Evanglica Congregacional de Angola IMUA Igreja Metodista Unida de Angola INAR Instituto Nacional de Assuntos Religiosos MICS Multiple Indicator Cluster Survey (Inqurito de grupo a indicadores mltiplos) MPLA Movimento Popular de Libertao de Angola OPSA Observatrio Poltico Social de Angola UCAN Universidade Catlica de Angola UMA Universidade Metodista de Angola UNITA Unio Nacional para a Independncia Total de Angola

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    Introduo Este estudo foi levado a cabo num esforo de colaborao entre o Centro de Estudos e Investigao Cientfica (CEIC) da Universidade Catlica de Angola (UCAN) e o Chr. Michelsen Institute (CMI). O seu propsito fazer uma reviso crtica do papel que as igrejas desempenham, em Angola, na reduo da pobreza no pas. As principais questes da pesquisa abordadas so:

    Que tipo de intervenes que as igrejas levam a cabo em relao prestao de servios bsicos populao?

    At que ponto as igrejas contribuem para a reduo da pobreza em Angola? Um estudo sobre o papel das igrejas na reduo da pobreza em Angola altamente relevante, mas no uma tarefa fcil. Angola tem uma longa histria de violentos conflitos e sofre de alguns dos piores indicadores sociais no continente africano. Ao mesmo tempo, rica em recursos naturais, particularmente petrleo, e tem um enorme potencial para se transformar numa potncia regional. Angola tem sido chamada de Estado falhado com sucesso1 em referncia sua incapacidade de providenciar at os bens pblicos mais essenciais aos seus cidados e, ao mesmo tempo, providenciar uma ordem poltica razoavelmente slida que independente de instituies financeiras internacionais. Esta situao significa que h uma necessidade de actores que providenciem ajuda humanitria (especialmente durante a guerra) e que o debate sobre a escolha de polticas deve vir de dentro. Neste contexto, o papel das igrejas torna-se interessante pois que elas so os actores da sociedade civil de Angola com estruturas organizacionais mais desenvolvidas e com redes de trabalho internacionais mais fortes. A pobreza pode ser abordada a vrios nveis e as igrejas detm um grande potencial para lidarem com todos eles. Enquanto grupo, as igrejas tm uma extensa rede de trabalho mesmo nas mais remotas reas do pas, atravs da qual podem alcanar a maioria da populao, tanto em termos de prestao de assistncia como em termos da compreenso das necessidades reais das pessoas para depois canalizar esta informao at ao governo. As instituies religiosas gozam de alargada credibilidade como as instituies mais fiveis no pas. Um inqurito feito pelo BBC World Service Trust mostrou que 78,3% dos inquiridos tinham confiana ou confiana completa nas instituies religiosas. Isto faz das igrejas as instituies que gozam de mais credibilidade no seio da populao, seguidas de outras instituies significativas, tais como os meios de Comunicao Social e o Parlamento que vm em segundo e em terceiro lugar, respectivamente2. As igrejas tm uma longa histria em Angola, algumas vezes, entrelaada com a histria do colonialismo. A luta pela independncia e os muitos anos de guerra civil foraram-nas a adaptar-se e a relacionar-se com mudanas radicais no campo poltico, social e econmico. Recentemente, tiveram que descobrir qual o seu papel num pas que, pela primeira vez, na sua histria, experimenta um prolongado perodo de paz e, desde 2004, um verdadeiro estrondo no aumento das receitas do Estado, a partir do petrleo e dos diamantes. Estas mudanas na sociedade constituram, por vezes, grandes desafios para as igrejas que tiveram que procurar respostas adequadas pobreza generalizada no pas.

    1 Soares de Oliveira, R. 2007. Sucesso nos Negcios, estilo-Angola: Polticas ps coloniais e o crescimento e crescimento da Sonangol. Jornal de Estudos Africanos Modernos 45: 595619. 2 BBC World Service Trust, Angola Elections Report 2008, June 30, 2008

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    As igrejas so muito diversas e produzir um relatrio sobre o seu papel na abordagem da pobreza enquanto grupo no tarefa fcil. As estatsticas ou so inexistentes ou no completamente fiveis e um grande desafio produzir dados para apoiar a anlise. Assim, este relatrio dever ser visto, menos como um conjunto de respostas definitivas e mais como um ponto de partida para posterior pesquisa sobre as muitas questes levantadas. No obstante, o seu objectivo contribuir com alguns pontos de vista e algumas concluses num campo onde anteriormente foi feita pouca pesquisa, o que ir, esperamos, vir a estimular o debate e mais pesquisa para desafiar as observaes e permitir dar resposta mais cabal s muitas questes levantadas.

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    Estrutura Analtica Para tratar das duas questes da pesquisa foi necessrio, por um lado, operar com uma estrutura analtica que delimita o campo de aco da anlise, atravs da definio de como percebemos a expresso actividades que contribuem para a reduo da pobreza, por outro lado, restringir o objecto da anlise, pois est para alm do alcance deste estudo observar em detalhe o papel de todas as igrejas angolanas na abordagem da pobreza.

    Reduo da pobreza

    Este estudo reconhece a pobreza como um problema multifacetado que pode ser tratado atravs de uma variedade de aces de natureza social, econmica e poltica. Divide estes tipos de aces em trs categorias: alvio emergncia; actividades e polticas de desenvolvimento e actividades de advocacia. Estas so definidas, neste relatrio, como se segue: Alvio Emergncia consiste no conjunto de intervenes que visam o alvio imediato

    de sofrimento causado por eventos externos tais como a guerra ou as calamidades naturais.

    Actividade de Desenvolvimento caracteriza-se pelo conjunto de aces, de mdio (e longo) prazo que visam o melhoramento dos padres de vida das pessoas pobres, sem ou com acesso limitado a servios bsicos, nos domnios da aco produtiva (e.g., na agricultura) da gua, do saneamento bsico, da sade e da educao, entre outros.

    Actividades de Polticas e Advocacia so intervenes visando tratar as causas estruturais da pobreza tais como desigualdades sociais e econmicas, prestao de contas, transparncia, direitos humanos, democracia e participao nas decises que afectam as vidas das pessoas.

    Esta definio analtica das actividades que lidam com a pobreza foi aplicada para providenciar uma viso geral da contribuio das igrejas em Angola para a reduo da pobreza. Foi dada mais ateno s duas ltimas dessas tipologias de interveno por estas serem mais interessantes no presente contexto de paz. O estudo no investigou aspectos psico-sociais e comportamentais de reduo da pobreza. No entanto, foi possvel compreender que isso uma rea central na qual as igrejas podiam desempenhar um papel e que tambm poderia implicar uma discusso terica sobre as diferenas entre tipos de assistncia religiosa ou no religiosa, por exemplo, para ultrapassar um trauma, ou em relao socializao em geral que vai para alm do alcance deste relatrio. Este tambm no tenta perceber o significado da religio ou das igrejas, em Angola, como unidades sociais que fazem parte do tecido social, mas das intervenes assistencialistas ou para o desenvolvimento, levadas a cabo por igrejas, como acima referido.

    As Igrejas

    As igrejas em Angola compreendem um grupo de actores muito diverso e heterogneo. De acordo com o Instituto Nacional dos Assuntos Religiosos h 83 igrejas reconhecidas e 902 no reconhecidas de vrias orientaes3. Est fora do mbito deste relatrio a cobertura de actividades desta multido de igrejas. O foco deste relatrio est, ento, em quatro igrejas e numa rede de igrejas:

    3 Instituto Nacional para os Assuntos Religiosos (2008): Panormica das Religies em Angola Independente, Luanda, p.44.

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    A Igreja Catlica (CEAST) A Igreja Evanglica Congregacional (IECA) A Igreja Evanglica Baptista (IEBA) A Igreja Metodista Unida (IMUA) Conselho das Igrejas Crists em Angola (CICA rede de igrejas)

    As igrejas seleccionadas tm bastante visibilidade e ocupam um lugar central no que se refere reduo da pobreza. A seleco das tradicionais igrejas missionrias catlica e protestante no foi feita para menosprezar ou demonstrar falta de interesse pelo papel de outras igrejas, mas apenas por causa da necessidade de centrar a anlise. Incluir as igrejas de orientao Pentecostal e outros movimentos carismticos teria colocado desafios particulares anlise, por causa da sua definida crena nos dons do Esprito Santo tais como falar vrias lnguas, curar e fazer profecias4. Atravs dos seus 22 membros (16 efectivos, 4 associados e 2 observadores) o CICA traz, indirectamente, outras igrejas para a anlise assim como o inqurito conduzido a 39 igrejas descritas na metodologia. Em verdade, a incluso do CICA na anlise e as referncias ao citado inqurito que foi feito a 39 igrejas, em Luanda, alargam o campo da anlise permitindo-nos, de alguma forma, tirar algumas possveis concluses que vo para alm das cinco unidades principais da anlise. Mas, isto no dispensa a necessidade de estudos aprofundados sobre outras igrejas, tais como, Adventista, Anglicana, Apostlica, Messinica (Kimbanguista e Tocoista), Pentecostal (anteriormente Assembleias de Deus e a Igreja Universal do Reino de Deus) assim como a de perceber o significado de centenas de pequenas igrejas no reconhecidas, o que levar a esclarecer melhor o papel das igrejas em Angola5. Temos pois a esperana de que as nossas concluses estimularo o debate acerca do papel das igrejas na sociedade angolana e posterior pesquisa nestas questes.

    Metodologia

    A metodologia aplicada caracterizada por uma pesquisa de campo exploratria baseada numa mistura de fontes primrias e secundrias e de abordagens quantitativas e qualitativas. Para recolher informao, acerca das actividades das igrejas acima destacadas, foram efectuadas entrevistas semi-estruturadas com representantes dessas Igrejas e outros actores relevantes. Estas foram complementadas com recenso crtica de uma srie de fontes escritas tais como planos estratgicos, projectos, cartas e relatrios de missionrios e artigos de jornais. Foi realizado um inqurito a 39 igrejas para recolher informaes bsicas acerca das percepes das igrejas sobre a natureza da pobreza e sobre seu prprio papel a lidar com ela. Isto complementou a informao qualitativa com alguns dados quantitativos de uma natureza mais geral. Uma descrio detalhada do inqurito e da metodologia de amostragem apresentada como anlise. A pesquisa foi iniciada em 2007 e s ficou concluda em 2009, depois de uma reviso final do relatrio tendo em conta que algumas dificuldades foram encontradas no processo de pesquisa que tiveram que ser resolvidas6. No foi possvel, com os recursos disponibilizados para este estudo, incluir a percepo dos beneficirios dos servios sociais prestados pelas igrejas e at que ponto esses servios ajudam a melhorar as suas condies de vida.

    4 De um ponto de vista racional estas crenas devem ser caracterizadas como anti-desenvolvimento por , em determinados momentos poderem conduzir privao dos direitos humanos bsicos. 5 De interesse particular so talvez as igrejas carismticas e pentecostais (neo-carismticas) que experimentaram um crescimento significativo em frica, nas ltimas dcadas. 6 A equipa inicial de pesquisa experimentou desafios em relao ao peso do trabalho, calendrio e outras questes, foram perdidos dados no processo da pesquisa e os programas adequados para o processamento dos dados no estavam disponveis , isto para mencionar apenas alguns dos problemas. Em 2009 foi contratada uma consultoria de pesquisa (Independent Policy Analysis) para realizar uma reviso final da pesquisa e concluir o relatrio.

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    A seleco das igrejas acima listadas, incluindo apenas aquelas que esto mais engajadas na reduo da pobreza, pode ser criticada por ser parcial em relao ao conjunto das igrejas, at porque h o risco de vir-se a produzir, a partir deste universo, uma concluso positiva, em geral, acerca da contribuio das igrejas para a reduo da pobreza. O estudo no visa providenciar uma concluso geral deste tipo, mas permitir mais detalhes acerca da obra social das igrejas que, para alm da evangelizao, procuram desempenhar um papel activo na sociedade, mesmo se aquela o mago da sua funo. Os nveis variveis de ateno dada s igrejas seleccionadas reflectem as despropores nos tamanhos e nveis de organizao desse universo limitado de igrejas. A Igreja Catlica, por exemplo, afirma representar mais de 13 milhes de pessoas enquanto a IEBA diz que representa 90 mil.

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    Contexto Para melhor compreender e analisar o papel das igrejas na reduo da pobreza, importa ter uma breve viso geral do contexto em que as suas actividades tm lugar, dando a conhecer os principais indicadores sociais e economicos do pas e abordando a questo da governao, chamando a ateno para o facto de que os dados existentes sobreos indicadores sociais no foram mantidos actualizados e so, na maior parte dos casos, baseados em informaes anteriores ao fim da guerra.

    Indicadores Sociais A pobreza generalizada em Angola e foi agravada pelo prolongado perodo de guerra civil o que veio a ter srias consequncias humanitrias. A guerra deslocou cerca de 4,5 milhes de pessoas que abandonaram as suas comunidades para se refugiarem nos maiores centros urbanos do pas ou em pases vizinhos. Isto deixou despovoadas largas reas rurais e deu origem criao de musseques e bairros periurbanos densamente povoados, em particular volta da capital, Luanda. Aps o fim da guerra, em 2002, poucas pessoas regressaram s suas zonas de origem e de acordo com o estudo denominado Multiple Indicator Cluster Inqurito (MICS), de 2001, 66% da populao urbanizada7. Uma grande parte das infraestruturas sociais do pas tais como escolas e hospitais foi destruda, e Angola tornou-se um dos pases do mundo com maior nmero de minas terrestres8, colocadas du rante a guerra que s terminou em 2002. A populao est calculada em 16,1 milhes dos quais mais de dois teros (68%) vivem na pobreza (abaixo de US$ 1,70 por dia) e um quarto (26%) vive em extrema pobreza (abaixo de US$ 0,75 por dia)9. Estes nmeros, no entanto, devem ser interpretados com alguma precauo. Este ndice populacional no seguro e peca com certeza por defeito, pois baseia-se em projeces feitas a partir do censo geral da populao realizado em1970. A certeza destas projeces questionada por um nmero de factores tais como a alta taxa de fertilidade (7 nado-vivos por mulher) 10, o deslocamento causado pela guerra e a pandemia do VIH/SIDA entre outros. O MICS, de 2001, revelou que

    7 INE/UNICEF (2003): MICS Multiple Indicator Cluster Survey Avaliando a Situao das Crianas e Mulheres Angolanas no Incio do Milnio Relatrio Analtico, Maio de 2003, Luanda http://www.unicef.org/angola/mics.pdf . The Multiple Indicator Cluster Survey (MICS) rev o progresso feito atravs do alcance de objectivos e alvos de desenvolvimento para crianas e mulheres. O estudo foi levado a cabo em 68 pases entre 1999 e 2001 incluindo Angola, pelo Instituto Nacional de Estatstica e foi publicado um relatrio analtico em 2003. 8 Landmine Monitor, Angola: http://lm.icbl.org/index.php/publications/display?act=submit&pqs_year=2008&pqs_type= lm&pqs_report=angola&pqs_section 9 Ministrio de Planeamento / Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (2005): Objectivos de Desenvolvimento do Milnio - Relatrio de Progresso 2005, http://mirror.undp.org/angola/LinkRtf/Angola_MDG_ Prog_report_2005.pdf 10 INE/UNICEF (2003): MICS Multiple Indicator Cluster Survey Avaliando a Situao das Crianas e Mulheres Angolanas no Incio do Milnio Relatrio Analtico, Maio de 2003, Luanda, http://www.unicef.org/angola/mics.pdf

    Indicadores sociais seleccionados Populao 16,1 MilhesCrescimento da populao 2,9%Pobreza (% abaixo da linha pobreza nacional) 68%*Esperana de vida nascena 41,7 AnosMortalidade infantil (em 1000 nados-vivos) 154Mortalidade abaixo dos 5 anos (por 1000 nados-vivos )

    260

    Frequncia escolar combinada 25,6%Alfabetizao de adultos 67,4% ndice do Desenvolvimento Humano (de 177 pases)

    162

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    Angola um pas com uma exploso demogrfica, com uma populao muito jovem (85% com menos de 40 anos de idade). Os nmeros do recente registo eleitoral sugerem que o tamanho da populao est em cerca de 20 milhes em 200811. Se esta estimativa estiver certa, indicaria que a projeco do governo de uma populao de 24 milhes em 2020 esta significativamente subestimada 12. A pobreza em Angola revela-se atravs dos baixos e persistentes indicadores sociais, em sectores como sade, educao, nutrio, gua e saneamento que so determinados pelo fraco acesso a servios sociais bsicos. Depois do fim da guerra, o reassentamento de cerca de 4,5 milhes de deslocados internos colocou o sistema ainda sob maior presso. Esta situao manifesta-se na posio de Angola no ndice de Desenvolvimento Humano, do PNUD, onde o pas o nmero 162, num conjunto de 177 pases 13.

    Sade, nutrio, gua e saneamento

    Em 2001, Angola foi considerada como tendo uma das mais altas taxas de mortalidade infantil, abaixo dos 5 anos de idade, em todo o mundo. Nessa altura, 15% dos bebs nascidos morriam antes de completarem 1 ano de vida (150 bitos, em 1000 nados vivos) e at a idade de 5 anos, a cifra subia para 25% (250 bitos, em 1000 nados vivos). Em 2003, a mortalidade, abaixo dos 5 anos, aumentou para 260 em 100014, que a terceira taxa mais alta no mundo e muito acima da mdia na frica Subsaariana, onde se registam 177 bitos, em 1000, por ano15. As taxas de mortalidade so quase iguais nas reas rurais e urbanas, situao pouco usual que reflecte as extremas condies de pobreza em que vivem as pessoas nos bairros e musseques periurbanos. As principais causas que esto por detrs destes nmeros so doenas prevenveis como a malria, doenas diarreicas e infeces respiratrias, entre outras. S a malria responsvel pela vasta maioria desses bitos e os esforos feitos para controlar a doena no tiveram xito. Apenas 10% da populao usava mosquiteiro e destes apenas 2% eram impregnados de insecticida. Em relao s mulheres grvidas o nmero ligeiramente melhor, mas ainda assim muito baixo, com 10% a usarem mosquiteiro tratado16. Tem sido relatado que a incidncia da malria aumentou de 16%, em 2000, para 22%, em 2003, o que significa que a doena continua a ser grandemente ameaadora. Outros indicadores so igualmente alarmantes, tais como a m nutrio crnica que atinge quase 1 em cada 2 crianas (45%), a mortalidade materna, situada entre 1400 e 1700 mulheres, em 100.000 nascimentos17, e o ndice de 19% da populao que trata a gua antes de beber18. Este ltimo indicador pode ter melhorado devido as campanhas relacionadas com o surto de clera, em 2006, que causou mais de 1000 mortes. No entanto, nada indica que a situao geral da gua e saneamento tenha melhorado, apesar da OMS a ter considerado

    11 O registo eleitoral de cerca 8,3 milhes de eleitores (o que corresponde a apenas 40% da populao, segundo uma estrutura etria que considera que 60% desta no atingiu ainda a idade eleitoral) indicia uma populao prxima dos 20 milhes de habitantes. 12 AngoNotcias: Populao angolana atingiu os 16 milhes, postado a 11 de Julho de 2008 em http://www.angonoticias.com/full_headlines.php?id=20320 13 UNDP Human Development Report (2007/2008): Country Fact Sheet Angola, (PNUD, Relatrio de Desenvolvimento Humano)http://hdrstats.undp.org/countries/country_fact_sheets/cty_fs_ago.html 14 Este continua aser o indicador referido pela UNICEF em seus documentos e pronunciamentos. 15 Ministrio de Planeamento / Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (2005): Objectivos de Desenvolvimento do Milnio - Relatrio de Progresso 2005, p. 40-42 16 Ibid. p. 51 17 Ibid. p. 44 18 INE/UNICEF (2003): MICS Multiple Indicator Cluster Survey Avaliando a Situao das Crianas e Mulheres Angolanas no Incio do Milnio Relatrio Analtico, Maio de 2003, Luanda, seco 15.

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    precria, facto que tornou difcil o controlo das actividades durante o referido surto epidmico19. Quanto ao VIH/SIDA, Angola goza de uma taxa de prevalncia razoavelmente baixa, embora como todos os outros dados, este nmero tambm esteja associado a uma certa incerteza. O factor mais frequentemente apontado como uma das razes da baixa taxa de prevalncia a longa guerra que impediu a circulao de pessoas e bens na maior parte do pas. Espera-se, no entanto, que isto venha a mudar tendo em conta a reabilitao das infra-estruturas e o facto de que os angolanos tm quase todos os factores de risco associados a um rpido aumento da sero-prevalncia20.

    Educao

    Os principais problemas no sector de educao tm sido a falta de materiais e infraestruturas escolares, falta de pessoal escolar profissionalizado, baixas taxas de frequncia, entrada tardia na escola e altas taxas de abandono. A baixa frequncia escolar est grandemente relacionada com a pobreza, sendo a taxa de frequncia das crianas de agregados familiares com melhores condies, duas vezes mais alta do que a taxa das crianas dos agregados familiares mais vulnerveis21. Em 2001, 44% das crianas no frequentaram a educao primria obrigatria e 94% no frequentaram o segundo nvel de educao bsica22. O relatrio sobre o progresso relativo ao alcance dos objectivos de desenvolvimento do milnio notava, todavia, uma melhoria significativa nas taxas de matrculas que quase duplicaram entre 2000 e 2003 passando de 1,3 para 2,5 milhes23. Embora o MICS tenha registado uma diferena mnima na taxa de frequncia entre rapazes e raparigas, em 2001, a subida na taxa de matrculas, entre 2000 e 2003, parecia beneficiar substancialmente mais os rapazes do que as raparigas (o nmero de rapazes era maior do que o dobro, enquanto que o nmero de meninas apenas subiu 50%). O MICS registou um tero da populao como analfabeta, com enorme disparidade entre homens e mulheres, assim como entre reas rurais e urbanas, onde os recursos educacionais esto concentrados. Como nota positiva temos a registar que uma maior proporo de angolanos mais jovens sabe ler e escrever, embora seja grande a iliteracia. Dados oficiais, mais recentes, indicam uma frequncia escolar de 4,5 milhes de crianas, em 2009. No entanto, o Ministrio da Educao basea-se apenas no numero de matriculas registadas, neste ano. Mas um facto que continua a haver, por diversas causas, muitas crianas, em idade escolar, fora do sistema de ensino. Por exemplo, a ordem dos Franciscanos (em Angola) que se dedica educao, diz que h, pelo menos 100 mil crianas fora do sistema de ensino, na regio metropolitana de Luanda. Vide www.franciscanos.org.br/v3/misses/notcias/reportagensespeciais/2008/frandre_1310

    19 Organizao Mundial da Sade (2006): Clera em Angola, http://www.who.int/csr/don/2006_05_10/en/index.html 20 Unicef Angola, VIH/SIDA, viso da questo, http://www.unicef.org/angola/hiv_aids.html 21 INE/UNICEF (2003): MICS Multiple Indicator Cluster Survey Avaliando a Situao das Crianas e Mulheres Angolanas no Incio do Milnio Relatrio Analtico, Maio de 2003, Luanda, seco 25. 22 Ibid. 23 Ministrio de Planeamento / Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (2005): Objectivos de Desenvolvimento do Milnio - Relatrio de Progresso 2005, p.30. O Ministrio da Educao fala em 4,5 milhes de crianas no sistema de ensino, com base apenas no numero de matriculas registadas em 2009.

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    Governao Oficialmente, o sistema poltico angolano semi-presidencial mas na realidade um sistema de forte concentrao presidencial24. O Presidente Jos Eduardo dos Santos Chefe de Estado e do Governo, desde 1979. Volvidos dezasseis anos aps ter realizado as suas primeiras eleies legislativas e presidenciais em 1992, o pas voltou a realizar eleies legislativas, em 2008. As eleies resultaram numa vitria massiva do MPLA que conseguiu 191 dos 220 assentos (correspondendo a 86,8%) na Assembleia Nacional 25. Isto habilita o partido maioritrio a mudar a Constituio, de 1992, sem depender dos outros partidos. Esperava-se que as eleies presidenciais tivessem lugar em 2009 mas, em Novembro de 2008, a sua realizao foi condicionada (pelo Presidente da Repblica) preparao e aprovao da nova Constituio26. Neste mesmo ano, Angola foi colocada em 131 lugar, num total de 167 pases, no ndice de Democracia, da Economist Intelligence Unit. O que conduz, nesse ndice, a uma classificao de regime autoritrio. Um dos principais esforos do governo, depois da guerra, foi levar a administrao pblica a todo o territrio nacional, cobertura que possivelmente conduziria a uma melhoria da prestao de servios pblicos. O governo est, tambm, a ensaiar uma descentralizao financeira (ou desconcentrao) atravs da alocao de fundos para serem administrados pelos municpios e do estabelecimento de Conselhos de Auscultao e Concertao Social (CACS) com carcter consultivo e que esto abertos participao da sociedade civil27, segundo um critrio descricionrio do Governador provincial, adminitrador municipal ou comunal28. Apesar destas experincias, Angola continua a ser um Estado altamente centralizado, onde todos os poderes, legislativo, executivo e judicial so controlados, de perto, pela presidncia. Em 2008, a Global Integrity considerou que Angola sofre de uma das piores estruturas anti-corrupo do mundo 29.

    A Economia Angola vem experimentando, desde 2004, uma verdadeira exploso econmica, principalmente originada pelos altos preos do petrleo. De acordo com o Banco Mundial, o crescimento da economia foi, em mdia, de 18,5 por cento por ano, nos ltimos quatro anos30. O FMI estima que o rendimento nacional bruto, per capita, atingiu US$ 4.206, o que quase 5 vezes mais do que o RNB de US$ 848, per capita, em 200331. No h dados disponveis da evoluo da desigualdade do rendimento mas entre 1994/5 e 2000/1 ela deteriorou-se, 24 Christian Michelsen Institute (2006): Civil Society in Angola Inroads, Space and Accountability p.2) http://www.cmi.no/publications/file/?2411=civilsocietyinangolainroads 25 Comisso Nacional Eleitoral, Eleies legislativas 2008, resultados nacionais, http://www.cne.ao/estatistica2008.cfm. A comisso de fiscalizao da Unio Europeia, no seu realtrio final, assinala graves e sistemticas irregularidades, nestas eleies. Alguns dos formaes concorrentes falaram em fraude. 26 RTP (Lusa): Presidente condiciona data de eleies presidenciais aprovao de nova Constituio, 28 de Novembro, 2008, http://tv1.rtp.pt/noticias/?article=150759&visual=3&layout=10 27 Ver Orre, Aslak (2009): Kalandula e os CACS Voz ou prestao de contas, facilidade de comunicao, para uma discusso excelente das aberturas e limitaes dos Conselho de Auscultao e Concertao Social 28 Ver Decreto-Lei 02/07 sobre os Conselho de Auscultao e Concertao Social. 29 Replatrio Global Integrity: Angola 2008, http://report.globalintegrity.org/Angola/2008 30 Banco Mundial (2009): Delegados Renem-se para Discutir a Economia de Angola e o Impacto da Crise Financeira Global, http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/COUNTRIES/AFRICAEXT/ANGOLAEXTN/0,,contentMDK:21997076~pagePK:141137~piPK:141127~theSitePK:322490,00.html 31 FMI (2009): Concluses do Conselho Executivo do FMI 2008 Artigo IV Consulta com Angola, http://www.imf.org/external/np/sec/pn/2009/pn0951.htm

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    passando de 0,52 a 0,62, no ndice de Gini, o que muito alto pelos padres internacionais. A exploso econmica dos anos recentes parece no ter modificado esta situao porque no foram institudos quaisquer mecanismos significativos de redistribuio32. Uma massiva linha de crdito de US$ 2 mil milhes, para apoiar investimentos pblicos, foi assinada com a China, em 2004, e foi alargada com mais 2,5 mil milhes, em 200733. O ambiente externo positivo facilitou a aplicao pelo governo de duas polticas chave: uma poltica de estabilizao macroeconmica intervencionista que fortaleceu o Kwanza e colocou a inflao sob controlo e um ambicioso programa de investimentos pblicos, enfatizando a reabilitao de infraestruturas. Um dos maiores desafios macroeconmicos para Angola tem sido como gerir os inesperados e substanciais lucros do petrleo que excedem, grandemente, a capacidade de absoro do pas. Em paralelo com o aumento do PIB, o oramento nacional tambm aumentou. As despesas oramentadas entre 2005 e 2008 aumentaram mais do que o dobro e as despesas visando os sectores sociais tambm aumentaram substancialmente e alcanaram 35% das despesas totais do oramento em 200734. A limitada capacidade de absoro da economia, contudo, no permitiram a execuo completa destes ambiciosos oramentos, em particular, em relao a gastos de capital. Em 2007, apenas 65% das despesas de capital oramentadas foram efectivamente utilizados35. Devido aos seus enormes recursos naturais, como segundo maior produtor de petrleo da frica Subsaariana e quarto maior produtor mundial de diamantes, a longa guerra, o dfice democrtico e os fracos indicadores sociais, Angola um verdadeiro exemplo do paradoxo da abundncia. Como veremos nas seces seguintes, esta situao foi abordada por algumas igrejas e ainda est para se ver se Angola ser capaz de ultrapassar a maldio dos seus recursos. A produo de novas e melhores estatsticas sobre indicadores sociais ser uma parte importante para combater a maldio pois que correntemente estas so de natureza muito pobre. Isto pode no reflectir de forma justa os esforos do governo e com certeza no ajuda o mesmo a desenhar fortes polticas para a reduo da pobreza. A publicao dos resultados do MICS III e do inqurito IDR sobre receitas e gastos dos agregados familiares esperada com muito interesse pois estes inquritos podero fornecer algumas respostas e indicaes para orientar as intervenes sociais nos prximos anos.

    32 PNUD 2007/2008 Relatrio de Desenvolvimento Humano http://hdrstats.undp.org/indicators/147.html e conversaes com o Economista Branko Milanovic do Banco Mundial e o economista nos Escritrios dos Pases Baixos para a Anlise de Oiltica Econmica , Hugo Rojas-Ramagosa. 33 Para uma excelente viso geral das relaes entre Angola e China ver: Campos, Indira eVines, Alex (2007): Angola e China Uma Parceria Pragmtica, Documento apresentado na Conferncia do CSIS, http://www.csis.org/media/csis/ pubs/080306_angolachina.pdf 34 Segundo dados oficiais dos relatrios de oramentos do Ministrio das Finanas: Relatrio de Fundamentao (http://www.minfin.gv.ao/docs/dspOrcaPass.htm e http://www.minfin.gv.ao/docs/dspPropostaOrcam.htm e FMI (2007): Angola: 2007 Artigo IV Consulta, p. 17 http://www.imf.org/external/pubs/cat/longres.cfm?sk=21422.0. 35 Ministrio das Finanas (2007): Oramento Geral do Estado 2007 Balano Geral da Execuo, p. 25, http://www.minfin.gv.ao/fsys/OGE_BALANCO_2007FINAL4.pdf

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    A panormica das igrejas Nesta seco descrevemos a panormica das igrejas em Angola para providenciar uma compreenso da complexidade deste grupo de actores e da escolha feita de nos centrarmos no papel das igrejas tradicionais. Providenciar uma viso geral das incontveis maneiras pelas quais o Cristianismo tem sido interpretado por diferentes denominaes, em diferentes partes do mundo, no tarefa fcil e Angola no excepo a esta regra. Antigo missionrio em Angola, Lawrence W. Henderson descreveu a igreja em Angola como um rio largo com vrias correntes36. Conforme mencionado, h quase mil igrejas conhecidas em Angola, das quais apenas 83 obtiveram reconhecimento do Estado. Segundo Henderson: olhar para a longa lista das igrejas reconhecidas e no reconhecidas em Angola, contudo, no d uma imagem clara da igreja em Angola37. Este autor identifica como principais correntes da igreja em Angola, a Catlica, a Protestante, a Apostlica, a Messinica e a Pentecostal38. O ponto principal de Henderson, como Cristo e missionrio em Angola, durante vinte e dois anos, que, apesar da diviso das igrejas, em Angola, a igreja uma s. A principal contribuio de Henderson para este estudo , no entanto, ajudar a ver por alto a complexa panormica das igrejas em Angola. Neste relatrio, olhamos, principalmente, para as igrejas Catlica e Protestante e, dentro do grupo alargado das igrejas protestantes, escolhemos trs das mais antigas igrejas missionrias em Angola. O Conselho das Igrejas Crists em Angola (CICA) alm das trs igrejas em anlise tambm inclui igrejas de outras correntes da classificao de Henderson, tais como a Igreja Kimbanguista em Angola (Messinica), vrias igrejas Apostlicas, assim como a Diocese Anglicana de Angola. A Igreja Catlica enquanto igreja mundial forte a igreja mais visvel e dominante em Angola. Tem a histria mais longa, a organizao e presena mais forte e afirma ter o maior nmero de membros entre as igrejas. Historicamente, a Igreja Catlica estava firmemente associada ao regime colonial atravs do Padronado e da Concordata; este foi um acordo que garantia o seu reconhecimento como religio oficial e lhe concedia um conjunto particular de privilgios em relao s demais confisses. A Igreja Metodista Unida em Angola (IMUA) , como a Catlica, parte de uma organizao mundial que est dividida em conferncias anuais, o que corresponde s dioceses na Igreja Catlica. H duas conferncias anuais em Angola: a do Leste e a do Oeste. A Conferncia do Leste da IMUA particularmente bem organizada e a igreja tem razes histricas no grupo tnico Kimbundu. A Igreja Evanglica Congregacional (IECA) a igreja protestante mais significativa em Angola. O seu estatuto de segunda mais importante igreja est, talvez, a ser posto em causa, pela rpida expanso das igrejas Pentecostais, mas ela tem uma histria muito mais antiga em Angola. Alm disso, ela tem um foco explcito e muito forte na melhoria das condies sociais da sociedade de que faz parte. A IECA tem sido historicamente associada ao planalto central de Angola e ao grupo tnico Ovimbundu. A Igreja Evanglica Baptista (IEBA) a igreja protestante com a misso mais antiga em Angola e, actualmente, ainda se encontra bastante fortemente organizada e presente em 10 das

    36 Henderson, Lawrence W (1991): A Igreja em Angola: Um Rio de Muitas Correntes, em The Pilgrim Press, Cleveland, Ohio, p. 410) 37 Ibid. 38 A essa lista poderia incluir-se a corrente Anglicana que est, tambm, presente em Angola

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    18 provncias, do pas. A IEBA tem as suas razes na parte norte de Angola e no grupo lingustico Bakongo ainda apoiada activamente pela Sociedade Missionria Baptista que fundou esta igreja, em Angola. A IECA e a IEBA so igrejas congregacionais, o que significa que tm uma estrutura democrtica e descentralizada; a liderana da igreja eleita pelos seus membros, enquanto na Igreja Catlica, os Bispos so nomeados pela Santa S, em Roma. A IMUA parece situar-se algures entre as duas, pois tambm pratica a eleio dos seus Bispos, mas em casos especficos permite que a escolha seja vitalcia. Os bispos angolanos de ambas alcanaram esta posio incomum, demonstrando de alguma maneira uma governao autocrtica39.

    Estatsticas da Igreja

    Para acrescentar alguma compreenso sobre as igrejas includas neste relatrio e providenciar algumas estatsticas bsicas sobre essas igrejas, foi includo o quadro, abaixo que consolida a imagem dominante da Igreja Catlica e de muitas denominaes protestantes mais pequenas. Quadro 1: Viso geral de dados chave das igrejas seleccionadas e das associaes de igrejas Nmero

    declarado de membros

    Presena nas 18 provncias

    Tamanho do clero

    Ano do incio da misso

    Igreja Catlica 13.775.781 18 2936 1491IECA 1.000.000 15 800 1881IMUA 190.000 18 283 1885IEBA 90.000 10 100 1878CICA (combinados) 5.000.000 Dados no

    disponveisDados no

    disponveis 1977

    (fundao) necessrio, contudo, ser cuidadoso quando se interpretam estatsticas acerca de diferentes denominaes eclesiais pois que, frequentemente, estas tm como base diferentes critrios e prticas. Por exemplo, a Igreja Catlica baseia o seu nmero de membros nos baptismos e pratica o baptismo de bebs. O nmero de Catlicos , portanto, mantido actualizado pela deduo do nmero de mortes ao nmero de baptizados e acrescentando o nmero de novos baptizados, sem ter em conta se eles praticam activamente, ou no, a religio40. Outras denominaes tm diferentes formas de contar os seus membros que, talvez reflectindo mais realisticamente o nmero de pessoas que aderem denominao, torna a comparao difcil. Alguns lderes de igrejas podem ter-se sentido pressionados a empolar o nmero dos seus membros por causa (directa ou indirectamente)da exigncia legal, de um nmero mnimo de fieis, para a obtenso do seu registo41 ou simplesmente para ganhar prestgio. Isto, combinado com nveis mais altos ou mais baixos de capacidade organizativa para efectivamente registar membros, e a falta de estatsticas oficiais, mesmo elementares, (o ltimo censo em Angola realizou-se em 1970) apela a um cuidado extra quando se olha para estes nmeros. Uma entrevista com o presidente do CICA ilustrativa deste aspecto. Ele calcula que o nmero combinado dos membros das 22 igrejas integrando o CICA possa ser volta de 5 milhes, mas admitiu que presentemente no existem estatsticas detalhadas de membros nas igrejas que fazem parte do CICA. E acrescentou que a organizao planeava realizar um registo de membros em 2010. O Instituto Nacional de Assuntos Religiosos (INAR) tambm, se abstem

    39 http://www.flumc.info/cgi-script/csArticles/articles/000006/000689.htm 40 Uma tendncia tambm conhecida no contexto dos pases nrdicos onde as igrejas nacionais registam um grande nmero de membros passivos como crentes. No entanto, muitos desses membros passivos contribuem indirectamente para a vida da igreja e para o conjunto do seu capital simblico. 41 Vide mais abaixo.

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    em considerar este tipo de estatsticas com o argumento de que tentar apresentar nmeros exactos em relao filiao de vrias confisses religiosas ou a percentagem de instituies com a maior representatividade seria arriscado, considerando a falta de dados estatsticos oficiais em relao ao tamanho da populao e volatilidade na esfera religiosa. 42 Estas questes so importantes e devem ter-se em mente, especialmente num tempo de grande flutuao de membros entre as igrejas (envolvimento numa igreja diferente daquela em que se foi baptizado) e mltipla filiao como membro (frequncia de mais do que uma igreja, ao mesmo tempo). Isto deve-se, em grande parte, expanso Pentecostal no continente africano, que um desafio, em particular, para o registo das igrejas que consideram seus membros todos os passivos, como o caso da Igreja Catlica43. Isto d-nos, no entanto, uma viso panormica em que a Igreja Catlica, a par de um movimento protestante marcado por um alto grau de diviso ou diversidade, aparece como altamente predominante, quando se incluem diversos indicadores e no apenas como consequncia da sua relativa fora organizativa e apoio internacional.

    Unidade versus diversidade

    Uma das principais caractersticas que definem o panorama das igrejas em Angola est entre a unidade da Igreja Catlica e a diversidade das outras denominaes/igrejas. A unidade da Igreja Catlica deve-se sua estrutura fortemente hierrquica com todos os bispos sendo nomeados pela Santa S, em Roma, embora as Conferncias Episcopais desempenhem um papel na nomeao dos candidatos. Em certos momentos isto levou a desafios dentro da Igreja Catlica de Angola, mais recentemente em Cabinda, onde os padres e membros da igreja protestaram de forma vigorosa contra a nomeao de um Bispo oriundo da grande Angola em vez de um Bispo originrio do enclave. Algum grau de pluralidade na Igreja Catlica devido presena de um grande nmero de institutos religiosos que so grupos, dentro da Igreja, compostos predominantemente por padres, freiras (irms) e leigos consagrado (separados em institutos masculinos e femininos) que no fazem parte da estrutura geogrfica diocesana44. A principal actividade dos institutos religiosos fazer trabalho missionrio, apoiando a evangelizao e, frequentemente, tm uma dimenso internacional com representaes em muitos pases. Tm, igualmente, um forte perfil social gerindo hospitais, escolas e outras instituies sociais. Os institutos religiosos so, algumas vezes, chamados, tambm, ordens ou congregaes religiosas45. Este ltimo o termo geralmente mais usado em Angola e , assim, usado neste relatrio. No entanto, no se dever confundir com o significado de congregao que, no contexto protestante, se refere aos membros locais de uma determinada igreja. As congregaes esto formalmente sujeitas autoridade do bispo da diocese em que operam, nomeadamente quando apoiam a estrutura diocesana (por exemplo gerindo parquias). Fora da funcionam como unidades semi-autnomas dentro da Igreja Catlica, operando com uma certa distncia dos Bispos pois tm sistemas de relatrios paralelos e acesso a fundos externos.

    42 Instituto Nacional para os Assuntos Religiosos (2008): Panormica das Religies em Angola Independente, Luanda, p. 15 43 De acordo com o frum PEW (que baseia a sua anlise na Base de Dados World Christian) os Pentecostais representam mais de 20% da populao de Angola http://pewforum.org/surveys/pentecostal/africa/. 44 Para compreender a estrutura organizativa da Igreja Catlic a importante ter em mente o facto de que as mulheres no podem tornar-se padres. A actividade litrgica (celebrao da missa) principal actividade da Igreja , portanto, realizada apenas por homens. Isto processa-se, essencialmente, atravs da estrutura diocesana onde um Bispo preside a um territrio geogrfico dividido em parquias, onde um padre realiza os servios religiosos. 45 Encontrar explicao (algo acerca dos votos)

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    A diversidade das igrejas de orientao protestante grande e tem origem tanto na tradio missionria como nos conflitos inter-denominaes e discrdias no processo de escolha dos lderes da igreja, resultando em fraces das anteriores igrejas unidas com alcance e capacidade organizacional enfraquecidos. As igrejas Metodista e Baptista so exemplos disto. A Metodista experimentou umadiviso durante o processo da conferncia Anual de Leste (num processo formalmente reconhecido pela reunio da Conferncia Geral, nos Estados Unidos, em 1984) quando grupos apoiando candidatos episcopais diferentes dos escolhidos se separaram, formando igrejas dissidentes 46. A disputa foi incentivada pelo Bispo da Conferncia Anual de Angola (em risco de diviso) que se ops ao processo, levando a tenses com os Metodistas de Malanje. A Igreja Baptista foi introduzida por diferentes movimentos missionrios em Angola e foi dividida logo de incio mas, de acordo com o INAR, esta igreja ainda se dividiu em mais faces que se constituram em igrejas dissidentes, formadas em 1987 e 199047. Diversidade no necessariamente um atributo negativo e, como Henderson argumenta, permite provavelmente, que estas igrejas se adaptem melhor cultura angolana. As disputas descritas nesta seco ilustram a evidncia da liderana dessas instituies, ao serem desafiadas pelas suas estruturas de governao e, talvez, sejam um efeito colateral da limitada cultura democrtica, em Angola. necessrio, contudo, reforar essas estruturas e promover a unidade na diversidade (um dos objectivos do CICA) se o objectivo for contribuir para a reduo da pobreza como definido neste relatrio. Isto necessrio em particular em relao ao reforo da voz da sociedade civil e do estabelecimento de freios e contrapesos democrticos.

    Relaes com o Estado e quadro jurdico regulador

    Como ltima parte da caracterizao do panorama das igrejas, em Angola, apresentamos, de forma breve, o quadro jurdico que regula as igrejas, na sua relao com a autoridade administrativa de tutela. As relaes entre as igrejas e o Estado foram afectadas pela adopo da ideologia marxista-leninista, depois da independncia, em 1975. Em 1987, as relaes igreja-Estado foram melhoradas, de forma significativa, com o reconhecimento formal de 12 igrejas. Subsequentemente, a liberdade de religio foi reforada na Constituio de 1992 e logo, nesse ano, 50 igrejas conseguiram ser reconhecidas. Simultaneamente, o nmero de igrejas cresceu significativamente, mas entre 1992 e 2000, apenas 20 igrejas foram reconhecidas e, desde ento, o processo parece ter estagnado. Actualmente, o nmero de igrejas reconhecidas, pelo Estado, de 83 igrejas e estima-se que ascende a 902 as igrejas no reconhecidas 48. O reconhecimento de uma Igreja da responsabilidade do Ministrio da Justia, com assistncia tcnica do Instituto Nacional dos Assuntos Religiosos que tutelado pelo Ministrio da Cultura. Um quadro jurdico efectivo regulador do processo de reconhecimento foi estabelecido pelo Decreto 46/91, revisto e substitudo, em 2004, pelo Decreto 2/04. O requisito mais importante para uma igreja ser reconhecida a apresentao de 100 mil assinaturas dos seus membros, pelo menos, em dois teros das 18 provncias do pas. No est claro quais as vantagens para as igrejas que optam pelo reconhecimento mas o INAR tem

    46 GBGM News Archives: A Igreja Metodista Unida de Angola: http://gbgm-umc.org/africa/angola/angolumc.html. De acordo com o INAR o nome da igreja dissidente Igreja Metodista Episcopal Independente Africana de Sio (Independent African Methodist Episcopal Zion Church) a qual foi reconhecida pelo estado em 1992 (INAR, p. 33). No est claro se esta a mesma que a Igreja Metodista Episcopal Africana de Sio de que h relatos de actividade missionria em Angola http://www.amez.org/news/index.php. 47 Igreja Evanglica Baptista Livre em Angola (formada em 1987 e reconhecida em 1992) e a Unio Evanglica Baptista em Angola (formada em 1990 e reconhecida em 1994). INAR (2008), p. 33 48 Instituto Nacional para os Assuntos Religiosos (2008): Panormica das Religies em Angola Independente, Luanda, p. 4.

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    algumas preocupaes quanto ao facto de poderem existir igrejas numa situao irregular durante muitos anos, sem registo, pois a lei no estipula uma funo disciplinar pedaggica sobre a criao e existncia de instituies religiosas49. Esta preocupao fundada na observao de que existem algumas igrejas legalizadas cujas prticas constituem um verdadeiro atentado vida e aos direitos humanos enquanto outras, com projectos de interesse de uma perspectiva social e de solidariedade, esperam durante anos antes que a sua autorizao seja determinada.50. A questo , no entanto, a de saber se o Estado vir a pr mais nfase no estabelecimento ou clarificao dos potenciais benefcios para as igrejas que procuram o reconhecimento formal, em vez de optar por aces disciplinares contra as igrejas no reconhecidas (informais). necessrio encontrar um equilbrio na regulao da actividade religiosa, pois que para se praticar a liberdade de pensamento e de crena, no pode haver controlos e critrios muito apertados, pois estes poderiam, na prtica, trabalhar contra o exerccio desses direitos fundamentais que o Estado reconhece e deve respeitar. Por seu lado, as igrejas devem aceitar claramente respeitar as leis que venham a prevenir os atentados aos seus direitos fundamentais. Num pas como Angola, com fracas infra-estruturas e baixos nveis de organizao, os requisitos para o reconhecimento oficial supra-mencionados so, provavelmente, demasiado exigentes para a maioria das igrejas informais, o que leva estas a no procurarem alcanar o reconhecimento, deixando a situao de facto arrastar-se, por muitos anos. Para uma igreja que pretende ter um impacto significativo sobre a pobreza uma certa presena geogrfica, nmero de membros e nveis de organizao so necessrios e em muitos casos, igualmente, uma relao com o Estado. Est claro que muitas pequenas e no reconhecidas igrejas desempenham um papel na sociedade e possivelmente tm um impacto na reduo da pobreza mas, como indicado na seco sobre a metodologia, fica fora da abrangncia do presente estudo analisar este aspecto.

    49 Ibid. p. 29 50 Ibid. p. 18

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    As Igrejas e a Pobreza Nesta seco analisamos o papel especfico que cada uma das igrejas seleccionadas desempenha para a anlise em termos de reduo da pobreza, como definido na estrutura analtica.

    A Igreja Catlica No h dvida de que a Igreja Catlica a igreja dominante em Angola. Ultrapassa a maior denominao protestante na proporo de 13 para 1, pelo que, mesmo que apenas 25% dos seus membros registados sejam activos, continuar ainda a ser trs vezes maior do que a maior denominao protestante. Esta igreja tem, tambm, uma estrutura organizativa que no se compara a nenhuma das igrejas protestantes e est presente em Angola h mais de 500 anos. Em relao aos nveis de organizao e representao geogrfica, h 18 dioceses catlicas em Angola conduzidas por um bispo (ou um arcebispo nas trs arquidioceses: Luanda, Lubango e Huambo). As 18 dioceses esto divididas em 208 parquias servidas por um total de 587 padres diocesanos. Alm disso, existem 97 ordens religiosas que contam com 423 padres e 1926 irms, dirigindo 136 misses e 15 centros missionrios. No total, a Igreja Catlica tem, em Angola, quase 3000 padres e irms ao seu servio51. As congregaes religiosas formam uma importante estrutura de apoio paralela (ver a seco acima sobre unidade vs. diversidade) que acrescenta uma fora significativa Igreja Catlica, tanto em relao evangelizao como s actividades sociais que lidam com ou reduzem a pobreza. Algumas das pessoas entrevistadas no decorrer deste estudo enfatizaram a contribuio das congregaes femininas. A explicao que foi dada para isso nas entrevistas foi que j que as mulheres no podem ser ordenadas padres e, em consequncia, no ficam to ocupadas com a liturgia (celebrao de missas) elas tm um foco mais forte na caridade e nas actividades sociais. H tambm um maior nmero de congregaes femininas do que masculinas em consequncia do facto de haver mais homens na estrutura diocesana, a trabalhar, por exemplo, como padres paroquiais. H 71 congregaes femininas e 26 masculinas representadas em Angola. O nosso estudo no investigou o trabalho desta riqueza de congregaes em detalhe mas historicamente, as congregaes realizaram um trabalho social muito significativo. Assim, as estatsticas missionrias, de 1974, assinalavam a existncia de 11 hospitais, 60 dispensrios, 12 maternidades e 2 leprosarias, espalhadas por Angola inteira, cobrindo 400 mil doentes52. Este vasto trabalho foi destruido pelas contingncias da proibio e expropriao da obra social das igrejas do perodo marxista-leninista (1975-1990) e pela sanha da guerra civil (1975-2002) mas est, desde ento, em recomposio e reconstruo. Durante as entrevistas que foram feitas, em Maro de 2007, foi pedido a representantes da Igreja Catlica que nos indicassem trs congregaes femininas e trs masculinas com os perfis sociais mais activos, da resultando a seleco seguinte (por ordem alfabtica): Congregaes Femininas: Dominicanas do Rosrio, MDR (Missionrias Dominicanas do Rosrio): Esta

    congregao trabalha em questes tais como justia e paz, educao, sade e promoo social.

    51 Anurio Catlico de Angola e So Tom 2009 Ano da Visita do Papa Bento XVI a Angola, Luanda. 52 Muaca, Eduardo Andr, 2001, Breve Histria da Evangelizao de Angola, Luanda, CEAST, p. 121.

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    So Jos de Cluny, SJC (Irms de So Jos de Cluny): Uma das maiores e mais antigas congregaes em Angola (comeou a sua misso em 1883) trabalhando em questes tais como educao, sade e promoo social.

    Teresianas, STJ (Irms Teresianas): Trabalham em educao e sade por exemplo, dirigindo o hospital da misso do Cubal, na provncia de Benguela.

    Congregaes masculinas: Espiritanos, CSSP (Padres do Esprito Santo): A mais antiga congregao masculina,

    chegada em 1866 e a quem foi dada a responsabilidade dos esforos da evangelizao. Actualmente, trabalha nas reas de educao, justia e paz, entre outras.

    Salesianos de Dom Bosco, SDB: Uma presena muito activa com foco na educao, sade, formao profissional e reintegrao social.

    Verbitas, Svd (Verbo Divino): Esta congregao tem o seu foco na educao e sade e gere orfanatos para crianas de rua.

    necessrio acrescentar a esta lista os Dominicanos que tm a seu cargo o Centro Cultural Mosaiko, uma das mais progressistas organizaes de direitos humanos em Angola. Dentro da estrutura diocesana, os Bispos criam comisses para cuidar de questes especficas nas suas dioceses e a nvel nacional. Contudo, estas comisses so, frequentemente, suportadas por congregaes. Alguns dos temas das comisses incluem questes sociais, sade, educao, famlia, juventude, ecumenismo, migraes e muitas mais, dependendo de cada diocese. O mais relevante para esta anlise a Caritas, a Comisso de Justia e Paz e o movimento para a Promoo das Mulheres Catlicas em Angola (Promaica). H enormes diferenas tanto a nvel de organizao como de actividade entre as diferentes comisses e entre dioceses em particular em relao s reas sociais. Factores determinantes para isto parecem ser o empenho pessoal do Bispo e o acesso a fundos.

    Alvio Emergncia

    A Igreja Catlica esteve grandemente envolvida no Alvio Emergncia causada pela guerra e pela deslocao de mais de 4,5 milhes de pessoas. O principal instrumento nesta fase foi a Caritas, a organizao humanitria da Igreja Catlica. A Caritas foi estabelecida em Angola em 1970 e foi uma das poucas organizaes de ajuda humanitria a trabalhar durante todo o perodo dos 27 anos de guerra civil. As principais actividades envolviam distribuio de comida, medicamentos, roupas e material agrcola53. A Caritas, para dar resposta crise humanitria que assolou o pas, foi, em grande medida, suportada pelas agncias estrangeiras congneres e pela Caritas Internacional54. Enquanto os fundos, compreensivelmente, eram providenciados por fontes externas, a Igreja Catlica contribuiu, nesta fase, com a sua rede de trabalho e sua presena local pois que continuava, mesmo quando os trabalhadores humanitrios fugiam. Durante os longos anos de guerra, foi a nica instituio com presena constante no todo do territrio nacional. A este propsito, um artigo do Washington Post, de 2001, um ano antes da guerra terminar, descreve o papel da Irm Maria Jos, encarregada da Caritas, na diocese de Malanje, no centro-norte de Angola, onde cuidava ento de 15.730 (das 15.863) crianas rfs e guardava os sacos de milho, feijo e arroz, num armazm da igreja55 que tinham sido fornecidos pelo Programa Alimentar Mundial, das Naes Unidas, para os distribuir pela populao carenciada. O articulista vai ao ponto de afirmar que, no vazio de liderana causado pela guerra, as igrejas

    53 Entrevista com pessoal do programa Caritas: Eusbio Amarante, Paulo Abel e Laura da Costa, Maio de 2007 54 O Cardeal Dom Alexandre do Nascimento foi, durante vrios anos, presidente da Caritas Internacional. 55 In Angola, Church Surrogate State; Missionaries Fill Void in Vital Services, The Washington Post, 22 de Maro de 2001 (Em Angola, a Igreja Estado Substituto; Missionrios Preenchem Vazio em Servios Vitais)

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    e as agncias humanitrias funcionavam como um Estado de substituio, providenciando comida, empregos, habitao e at orfanatos para o grosso dos 12 milhes de pessoas de Angola56. As misses, geridas pelas congregaes religiosas, desempenharam igual papel, durante a guerra, como foi o caso das irms Teresianas, a frente do Hospital da Misso do Cubal, na provncia de Benguela. No perodo ps guerra e com o fim da emergncia que esta originava, tem havido esforos de assistncia de menor monta, relacionados com calamidades naturais, nomedamente as cheias recorrentes. Em 2007, a Caritas Luanda respondeu s chuvas torrenciais e inundaes de Luanda distribuindo utenslios de cozinha entre outras coisas57. A Caritas Ondjiva (na provncia do Cunene, sul de Angola) tambm se envolveu na resposta s recentes inundaes nesta regio. Historicamente, a Igreja Catlica sempre desempenhou um importante papel na resposta a crises humanitrias provocadas, quer por calamidades naturais, quer pela guerra e ainda mantm capacidade para responder a incidentes menores, quando h disponibilidade de fundos. Assim, a igreja aliviou o sofrimento dos cidados mais pobres e mais afectados pela guerra. Embora o impacto verificado aqui no tivesse alcanado os nveis relatados pelo Washington Post, no deixou de ser substancial, sobretudo pela ausncia do Estado. Conforme est dito, com mais detalhe, na seco sobre polticas e advocacia, os Bispos tambm contriburam, em sentido poltico, para pr fim ao conflito.

    Actividades para o Desenvolvimento

    A Igreja Catlica desempenha um papel significativo, em particular, nos sectores como a sade e a educao que so grandemente apoiados pelas congregaes religiosas. Actividades relacionadas com a agricultura, gua e saneamento so os principais projectos levados a cabo pela Caritas Angola e pelas Caritas diocesanas. Depois do fim do conflito armado, a Caritas tem trabalhado de forma rdua na reorientao do seu foco passando das actividades de emergncia para as actividades orientadas para o desenvolvimento58. Educao A Caritas Angola est a levar a cabo um projecto de alfabetizao, num esforo para mitigar o impacto da falta de professores, a nvel das aldeias. O projecto-piloto est a decorrer na Diocese de Malanje e visa formar pessoas para se habilitarem a ensinar populao local a ler e a escrever e a ficar integrada no sistema normal de ensino. 137 professores foram formados e do aulas a mais de 3000 alunos, com vista a integrao destes no sistema normal de ensino59. Programas significativos de alfabetizao esto a ser realizados, igualmente, nas provncias de Benguela, Lunda Norte e Lunda Sul onde milhares de pessoas aprendem a ler e a escrever todos os anos. A Igreja Catlica gere um nmero significativo de orfanatos, em todo o pas como, por exemplo, o Centro Arnold Janssen, em Luanda, que foi criado, em 1993, pela congregao do Verbo Divino (ver pgina 19). Este centro oferece abrigo, comida, tratamento mdico e escola a crianas de rua de Luanda com o objectivo de as reintegrar nas suas famlias60.

    56 Ibid., nfase dos Autores 57 Cafod apoiou um projecto para ajudar as vtimas das chuvas em 2007. Este papel da Caritas Angola j vem do periodo colonial, altura em que esta se notabilizou pela ajuda prestada s populaes pobres dos musseques vitimas das grandes chuvas dos anos 1960. 58 Entrevistas com pessoal do programa Caritas: Eusbio Amarante, Paulo Abel e Laura da Costa, Maio de 2007 59 Entrevistas com tcnicos da Caritas, Maio de 2007. 60 Missionrios do Verbo Divino, Relatos da Misso, Uma passagem da rua para casa, http://www.verbodivino.pt/relatos_missao/relatos3.html

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    O sistema oficial de educao em Angola era originalmente dividido em quatro anos de escolaridade primria obrigatria (1 4 classe), seguidos de quatro anos de educao intermediria bsica (5 8 classe) e quatro anos de educao secundria (9 12 )61. Por todo o pas, a Igreja Catlica, apoiada pelas congregaes, gere escolas de diferentes nveis62. Algumas dessas escolas so operadas em conjunto com o Estado que financia os salrios dos professores63. Na educao secundria, a par de outros, o Instituto de Cincias Religiosas de Angola (ICRA) desempenha um papel importante. Lecciona da 9 12 classe e forma educadores sociais, assim como professores de Educao Moral e Cvica. O ICRA a nica instituio em Angola que oferece estas duas formaes, em Luanda, Kwanza Norte, Malange, Huambo e Huila. O Estado, pela importncia do seu papel e da formao ministrada, reconhece os cursos e co-financia os salrios dos professores. No Lubango, o departamento regional do ICRA (cobrindo as dioceses do Lubango, Ondjiva, Namibe e Menongue) inscreveu 501 alunos, entre 1996 e 2004, dos quais 112 terminaram a sua formao64. O nmero de formados corresponde a 38% dos estudantes admitidos entre 1996 e 2000, o que sugere uma taxa de cumprimento relativamente baixa que se deve a trs factores conjugados; os baixos nveis de preparao dos sub-sistemas anteriores, os elevados ndices de desistncia e os nveis de exigncia da instituio. O ICRA complementado pelo Instituto Superior Joo Paulo II (ISUP-JPII) que providencia formao superior em Servio Social e em Educao Moral Cvica. O director desta instituio o notvel pregador dominicano, Frei Joo Domingos. A Igreja Catlica tem, igualmente, a Universidade Catlica de Angola (UCAN) que abriu em 1997 e tem actualmente 3739 estudantes. A Universidade tem quatro faculdades: Direito, Economia e Gesto, Engenharia Informtica e Cincias Humanas (em Luanda). A UCAN alberga, igualmente, o Centro de Estudos e Investigao Cientfica (CEIC) que trabalha em vrias reas incluindo economia, ambiente, cincias sociais, pobreza e direitos humanos. Sade Neste sector, um dos projectos com o estandarte da Caritas, desde 1996, o projecto Angotrip visando o combate doena do sono (Tripanossomase Humana Africana) em trs provncias do norte de Angola (Zaire, Uge e Kwanza Norte). A doena do sono uma crescente e sria ameaa sade pblica, em Angola65 e o seu controlo est includo como um dos Objectivos de Desenvolvimento do Milnio, para Angola (Objectivo 8.3)66. A Caritas opera trs dos cinco centros de sade, em duas das trs provncias do Norte (dois centros foram destrudos pela guerra, em 1998, e no foram reabilitados) onde aproximadamente 100 pessoas so tratadas anualmente. Com uma estimativa de 8.000 novas infeces, por ano, esta uma contribuio limitada, mas nem por isso menos importante, para combater a doena. Desde 2006, os salrios do pessoal do projecto tm sido pagos pelo governo.

    61 Em 2003 este sistema foi reformado e agora compreende 6 anos de educao primria obrigatria e 6 anos de educao secundria dividida em dois nveis. INE/UNICEF (2003): MICS Multiple Indicator Cluster Survey Avaliando a Situao das Crianas e Mulheres Angolanas no Incio do Milnio Relatrio Analtico, Maio de 2003, Luanda, seco 25. 62 No foi possvel estabelecer o nmero exacto de escolas catlicas a operarem no pas. O Anurio Catlico de Angola e So Tom lista 36 escolas, mas parece que este nmero est muito abaixo do nmero real de escolas. 63 No h dados disponveis sobre o nmero de alunos que esto a frequentar essas escolas. 64 Arquidiocese de Lubango, servios pastorais, Instituto de Cincias Religiosas de Angola: http://www.lubangoarquidiocese.catholic.net/templates/?id=6. 65 A doena do sono transmitida pela mosca Tsetse e afecta o sistema nervoso central resultando em confuso, distrbios sensoriais e fraca coordenao. A doena fatal, se no for tratada. Em 2004, aproximadamente, 100.000 pessoas foram infectados e havia cerca de 8.000 novos casos por ano (MinPlan/PNUD, 2005, p. 55) 66 Ministrio de Planeamento / Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (2005): Objectivos de Desenvolvimento do Milnio - Relatrio de Progresso 2005, http://mirror.undp.org/angola/LinkRtf/ Angola_MDG_Prog_report_2005.pdf

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    Outra rea abordada pela Caritas Angola a do VIH/SIDA. Aqui, a Caritas forma conselheiros e distribui tratamento anti-retroviral com apoio da Caritas Alem. A Caritas diocesana de Benguela tem sido activa, tambm, em abordar a pandemia do VIH/SIDA atravs da educao para a preveno, com o apoio dos Catholic Relief Services (Servios Catlicos de Auxlio). Entre outras coisas este trabalho incluiu a realizao de uma conferncia apoiada pelo Bispo da Diocese de Benguela67. Como j foi mencionado, as congregaes religiosas da Igreja Catlica tambm desempenham um importante papel nas actividades para o desenvolvimento. Na rea da sade, as irms Teresianas dirigem o hospital diocesano do Cubal na provncia de Benguela. Durante a guerra este era o nico hospital entre Benguela e Huambo que tinha a capacidade de levar a cabo cirurgias. O seu trabalho especializado em tuberculose e nutrio emprega um pessoal de 247 empregados. Entre 2001 e 2005, 24.107 pessoas foram hospitalizadas e 4.168 cirurgias foram realizadas. A taxa geral de curas foi de 89,1%. Foram tratadas de tuberculose 5.744 pessoas e dessas 56, 6% foram curadas. Em Pediatria registaram-se 6.895 internamentos e foram curadas 71,5% dessas crianas68.

    Actividades de Poltica e Advocacia

    Depois da independncia de Angola (1975), a Igreja Catlica tem desempenhado um significativo papel ao tratar de questes polticas. As trs principais reas de interveno tm sido (1) paz e reconcialiao, (2) democracia e (3) justia socio-econmica. Os bispos tm usado a sua Conferncia (CEAST) de forma activa para publicarem declaraes ou Cartas Pastorais mas, crescentemente, estes esforos tm vindo a ser apoiados pelas congregaes como os Dominicanos, atravs do seu o Centro Cultural Mosaiko e pela Comisso Episcopal para Justia e Paz (CEJP). A CEAST apelou fortemente (e frequentemente em conjunto com as igrejas protestantes) para a paz e a democracia durante o conflito armado e essa atitude provocou, muitas vezes, reaces de protesto por parte do Estado, acusando-a de abusar da sua posio na sociedade para interferir em questes polticas69. Nos primeiros anos de independncia, a Igreja Catlica estava principalmente preocupada com a sua sobrevivncia no contexto de um regime marxista-leninista mas, j em 1976, comeou, tambm, a exprimir a sua preocupao com a guerra70. Paz e reconciliao continuaram a ser abordadas pelos bispos, mas a partir dos finais dos anos oitenta, os apelos foram intensificados com apelos directos aos lderes do MPLA e da UNITA. Durante toda a dcada de noventa, a Igreja Catlica reagiu aos eventos da guerra aplaudindo os acordos de paz e lamentando os seus fracassos. Em 1999, no contexto do fracasso do protocolo de Lusaka, foi criada a iniciativa ecumnica COIEPA (Comit Inter-Eclesial para a Paz) por um nmero de igrejas crists e, em 2000, a CEAST organizou o Movimento Pro Pace, que promoveu uma importante conferncia sobre a paz. A conferncia foi transmitida em directo pela estao de rdio da Igreja Catlica, a Rdio Ecclesia, quebrando o silncio pblico em relao paz. A comunicao social estatal criticaram vivamente a conferncia, caracterizando-a como um frum para "aqueles que queriam a paz a qualquer preo"71 mas, ao mesmo tempo, o Presidente da Repblica, num reconhecimento tcito da sua importncia, pediu a 4 ministros que dela participassem.

    67 CRS Angola e Caritas Benguela (2007): Projecto de Educao de Preveno da SIDA da Caritas, Junho de 2007, http://pdf.usaid.gov/pdf_docs/PDACJ750.pdf 68 Hospital Diocesano Nossa Senhora da Paz (2005): Relatrio final, relatrio de projecto interno para os CRS Angola. 69 Ver CEAST (1998): A Igreja em Angola Entre a Guerra e a Paz Documentos Episcopais 1974 1998 e Comerford, Michael G. (2005): O Rosto Pacfico de Angola Biografia de um Processo de Paz (1991 2002). 70 CEAST (1998): A Igreja em Angola Entre a Guerra e a Paz Documentos Episcopais 1974 1998, p. 48 71 Comerford, Michael G. (2004): Vozes alternativas: o movimento angolano para a paz http://www.c-r.org/our-work/accord/angola/alternative-voices.php

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    Depois do fim da guerra, a CEAST manteve o foco na necessidade de democratizao, tema que havia j abordado em vrias outras cartas pastorais e retomado, mais recentemente, em 2005 e 2008. A ltima carta sobre essa matria foi publicada apenas alguns meses antes da realizao das eleies legislativas, de Setembro de 2008, e apelou para eleies livres, justas e acima de tudo pacficas. Foi, tambm, dado um enfoque crescente situao econmica e social do pas, com realce para relao paradoxal entre o forte crescimento econmico e a generalizada pobreza, resultando num apelo uma melhor distribuio da riqueza do pas. Neste sentido, foi um marco a carta pastoral de 2004, Angola a Caminho da Esperana que articulou a necessidade de melhorias nos padres de vida dos angolanos comuns e abordava tambm a questo do petrleo e a maldio dos recursos. Em 2006, a carta pastoral, Por uma Justia Econmica deu seguimento questo do paradoxo da abundncia e a maldio dos recursos, apresentando os nmeros das receitas do petrleo e dos diamantes e os indicadores sociais, apelando para uma maior transparncia e mais investimentos nos sectores sociais chave, tais como a sade e a educao, para prossecuo do bem pblico. A Comisso Episcopal de Justia e Paz (CEJP), que presidida por um padre da Congregao Espiritana, providenciou apoio tcnico para a elaborao da ltima carta pastoral e, subsequentemente, usou a sua publicao como uma plataforma para mais trabalho poltico sobre o oramento nacional e as indstrias extractivas. Isto teve como resultado outras publicaes sobre o processo oramental, em 200672, uma anlise detalhada do contedo do oramento, de 200873, e um documento sobre o sector do petrleo que foram lanados em 200874. A CEJP foi, tambm, responsvel pela realizao de uma srie de conferncias Pro Pace locais que visavam levantar a questo e sensibilizar as pessoas para as eleies e respectiva legislao eleitoral de forma a aumentar a tolerncia poltica na corrida s eleies. As comisses diocesanas de justia e paz esto cada vez mais a olhar para os recentemente criados Conselhos de Auscultao e Concertao Social (ver seco sobre contexto p. 9) como espaos para a participao em processos polticos a nvel local. Este tipo de actividades foi financiado por membros do grupo de trabalho da Caritas/CIDSE Angola, assim como pela Unio Europeia. Outro actor chave dentro da Igreja Catlica em relao a poltica e advocacia o Centro Cultural Mosaiko, da Congregao Dominicana que especializado na promoo dos direitos humanos para a construo de uma Angola mais pacfica. Criado em 1995, o Mosaiko trabalha numa srie de questes relacionadas com direitos humanos, nomeadamente formao em Direitos Humanos, para organizaes da sociedade civil, agncias do governo e instituies de segurana e ordem pblica. Esta organizao tem estado muito envolvida em questes de direitos de terra e usa tanto a mediao como procedimentos jurdicos para resolver as questes75. A Semana Social que o Mosaiko organiza, em nome da CEAST, consiste na realizao de uma conferncia pblica, de mbito nacional. A conferncia que tem lugar, de trs em trs anos tambm inclui uma srie de conferncias nas dioceses que do desenvolvimento ao tema central. Foram realizadas trs Semanas Sociais Nacionais tratando de questes sociais candentes, em 1999, 2003 e 2007, respectivamente. A ltima tratou o tema da justia social e reuniu 300 participantes76. O Mosaiko gere uma biblioteca que est localizada na sede, em Viana, arredores de Luanda. A biblioteca, frequentada por cerca de 2500 usurios anualmente, uma das bibliotecas de literatura sobre cincias sociais e

    72 CEAST, CEJPM, Sector de Justia Econmica (2006): Relatrio de Anlise do Processo Oramental em Angola, Luanda 73 CEAST, CEJPM, Sector de Justia Econmica (2008): Anlise do Oramento Geral do Estado 2008, Luanda, Junho de 2008 74 CEAST, CEJPM, Sector de Justia Econmica (2009): Transparncia no Sector Petrolfero Angolano 2002/2006, Luanda, Abril de 2008 75 ReliefWeb: http://www.reliefweb.int/rw/RWB.NSF/db900SID/YZHG-6ZYRY8?OpenDocument 76 Agencia Angolapress: http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/sociedade/Livro-sobre-Justica-Social-apresentado-hoje-Luanda,a212625b-4ab0-4675-a765-673c5140c1a5.html

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    humanas mais usadas, em Luanda. Tambm produz e emite cerca de 90 programas de rdio anuais, sobre questes de direitos humanos e cidadania77. Como vimos, nesta seco sobre actividades especficas da Igreja Catlica, esta intervm numa srie de diferentes formas que abordam a pobreza. No entanto, no h uma viso dominante para a reduo da pobreza e a coordenao das actividades das diferentes congregaes e comisses fraca. A Igreja Catlica poderia ter um maior impacto se existisse tal coordenao e se fosse dada mais ateno monitorizao e avaliao dos resultados e impactos das suas actividades. Algumas avaliaes externas (isoladas) tm sido realizadas (principalmente, das actividades financiadas por doadores) mas ajudaria muito mais, se a Igreja Catlica institucionalizasse tal procedimento para todas as suas actividades e cronstruisse uma viso clara sobre a sua contribuio para reduo da pobreza, em Angola. Do mesmo modo que uma abordagem mais incisiva da advocacia e da continuao do dilogo com as autoridades acerca das posies adoptadas nas cartas pastorais poderia produzir um impacto mais significativo.

    A Igreja Evanglica Congregacional A Igreja Evanglica Congregacional em Angola (IECA) est presente em 15 das 18 provncias atravs de assembleias provinciais ou snodos78 que, por sua vez, so subdivididos em pastoratos e congregaes79. Segundo o Director do programa social da IECA h 2900 congregaes servidas por 800 dirigentes espirituais (160 pastores, 260 diconos e 380 diaconisas)80. A IECA tem uma estrutura democrtica sendo o seu rgo superior a Assembleia-geral com competncia para eleger o Secretrio-geral que o chefe da Igreja. Tem estreitas ligaes com a Igreja Unida de Cristo, nos EUA (antiga Direco Americana das Misses Estrangeiras que fundou a igreja em Angola) e membro do Conselho Mundial das Igrejas, da Aliana Mundial das Igrejas Reformadas, da Conferncia das Igrejas de Toda a frica, e do Conselho das Igrejas Crists em Angola. O Secretrio-geral da IECA, Rev. Augusto Chipesse, divide a histria da sua igreja em trs fases. A primeira vai desde a fundao da Igreja, por missionrios americanos, em 1880, at ao desencadear da guerra civil, depois da independncia, em 1975. Este perodo caracterizou-se pelo crescimento, com a fundao de muitas misses, escolas e hospitais atravs do programa Melhoramento do Povo (Improvement of the People). A igreja era fundamentalmente uma igreja rural. O segundo perodo decorre de 1975 ao fim da guerra civil, em 2002. Esta fase comeou com a partida de aproximadamente 300 missionrios e caracterizou-se pela destruio de tudo o que havia sido construdo na fase anterior. A igreja reorientou-se e tornou-se, em grande medida, uma igreja urbana. A terceira fase iniciou em 2002 e caracteriza-se pelo restabelecimento da igreja, em tempo de paz, mas tambm pelo desejo de intervir a favor da melhoria das das difceis condies de vida da populao pobre. A IECA opera com um plano estratgico tendo o primeiro decorrido de 2003 a 2007 e o presente cobre o perodo de 2008 a 201281. Actualmente, a IECA conta com a assistncia de um missionrio da Igreja Unida de Cristo, dos EUA.

    77 Centro Cultural Mosaiko (2009): Contribuio do Centro Cultural Mosaiko promoo de uma cultura de direitos humanos em Angola. 78 A IECA no est presente na Lunda Norte, no Zaire e no Uge. 79 Congregao neste contexto um grupo local da igreja que no se deve confundir com o uso da palavra no contexto Catlico (ver pgina 15). 80 O nmero de diconos de: http://www.oikoumene.org/en/member-igrejas/regions/africa/angola/evangelical-congregational-igreja-in-angola.html que reporta nmeros mais baixos para pastores e congregaes, mas isto poder ter mudado, visto que o website apenas foi actualizado em Janeiro de 2006. 81 Igreja Evanglica Congregacional em Angola (2007): Plano Estratgico 2008 2012, Lubango, Setembro de 2007, pg. 6.

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    Alvio Emergncia

    Com a sua zona dominante no planalto central de Angola entre as populaes Ovimbundu, a IECA foi profundamente afectada pela guerra. Por altura da independncia, o nome da presente IECA era ainda Conselho das Igrejas Evanglicas de Angola Central (CIEAC) e alguns dos principais lderes, incluindo o Secretrio-geral, da altura, fugiram para as matas, com a UNITA, em Fevereiro de 197782. Mais tarde, nesse mesmo ano, a CIEAC elegeu um novo Secretrio-geral e mudou o seu nome para IECA, o que assinalou uma mudana de uma denominao regional para uma denominao nacional, como o fizeram muitas outras igrejas protestantes. Nos anos ulteriores, a IECA estabeleceu-se em 15 provncias. Desde o eclodir da guerra e at 1991 (o que pode ser descrito como a fase da guerra fria da guerra civil angolana) a IECA suspendeu todas as suas actividades sociais. Em1991, a IECA decidiu reiniciar o seu trabalho social e criou o Departamento de Assistncia Social, Estudos e Projectos (DASEP). O DASEP iniciou um ambicioso projecto de emergncia. As actividades de emergncia dirigem-se principalmente para as consequncias da guerra, nas provncias mais fortemente afectadas, tais como Huambo, Bi e Benguela mas tambm noutras provncias, tais como Kwanza Sul, Bengo, Hula, Kuando Kubango e Namibe83. No perodo de 1991 ao fim da guerra, em 2002, essas actividades tiveram ocasionalmente que ser suspensas, devido intermitncia do cessar-fogo e subsequente intensificao da guerra. A IECA tambm deu resposta a situaes de emergncia causadas pelas cheias, em 2001, visando 9.000 pessoas com grandes necessidades, incluindo a distribuio de comida, por um perodo de seis meses, no Dombe Grande (Benguela) com a assistncia da Aco das Igrejas Reunidas. A IECA mantm o seu estado de prontido para acudir emergncia, para reduo do impacto de calamidades naturais84.

    Actividades para o Desenvolvimento

    Um aspecto que define a IECA que ela promove uma perspectiva de misso holstica que de forma especfica articula a aco social como parte integrante da evangelizao. uma pequena igreja em comparao com a Igreja Catlica, mas a maior denominao protestante. Em contraste com a Igreja Catlica , ela seguiu uma estratgia centralizada , coerente, abrangendo todas as actividades da igreja desde 2003. As reas principais de interveno so

    Educao, formao e capacitao Sade e VIH/SIDA Desenvolvimento sustentvel Gnero, mulheres e crianas Paz, justia e reconciliao

    Educao A IECA orgulha-se da sua tradio de ensino em Angola. Nos finais do sculo XIX, o Instituto Currie para rapazes e a Escola de Meios para raparigas, no Dondi, na provncia do Bi foram criados por missionrios da primeira igreja evanglica em Angola. Estes eram o vrtice de uma pirmide de centenas de escolas de aldeia e atraram atenes para as suas

    82 Henderson, Lawrence W (1991): A Igreja em Angola: Um Rio de Muitas Correntes (The Church in Angola: A River of Many Currents), The Pilgrim Press, Cleveland, Ohio, pg. 380 83 Igreja Evanglica Congregacional em Angola (2007): Plano Estratgico 2003 2007, Huambo, Novembro de 2002, pg. 9 84 Entrevista com o Director do DASEP, Luis Samacumbi, Maro de 2009

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    realizaes acadmicas e inovaes agrcolas85, contribuindo para a formao das elites angolanas proto-nacionalistas e nacionalistas, do planalto central. No perodo imediato ao ps-guerra, de 2003 a 2008, a IECA construiu e reconstruiu um nmero de escolas, em vrias cidades e de instalaes de antigas misses rurais e estabeleceu acordos ou protocolos com o Ministrio da Educao. Presentemente, a IECA administra 58 escola, onde as aulas so ministradas por 591 professores, cujos salrios so pagos pelo Estado. Cerca de 21.000 alunos esto inscritos nas escolas primrias e secundrias da IECA86. Respeitando a sua tradio, a IECA esfora-se por fazer das suas escolas modelos para o resto da sociedade e presentemente algumas delas so financiadas pelo Dille/Dunbar Fund for Schools for Angolan Young Women (fundo para escolas de raparigas angolanas ). As aulas a ministradas incluem disciplinas como alfabetizao, nutrio, sade, costura, agricultura, direitos humanos e gesto de pequenos negcios, alm de formao em informtica, quando existe energia elctrica.87. A IECA tambm ministra cursos de alfabetizao, com 75 professores, cobrindo um grupo de 1500 pessoas, em 5 provncias (Luanda, Benguela, Bi, Hula e Cuando Cubango). O grupo alvo composto por adultos fora do sistema formal de educao que aprendem a ler e a escrever para ficarem habilitados a participarem nas decises que afectam suas vidas. Oito centros de formao profissional esto tambm a operar em 5 provncias (Kwanza Sul, Huambo, Benguela, Bi e Hula). Sade A IECA administra 5 hospitais, nas provncias do Huambo e Bi, com cerca de 300 camas cada e 8 postos de sade locais. Os postos de sade oferecem testes de sade, tratamentos bsicos e encaminhamento para hospitais. Atravs dos postos de sade a igreja tambm participa em campanhas de vacinao e mais de 3000 crianas foram vacinadas, em 20 aldeias88. A IECA forma assistentes de sade no Lubango e parteiras tradicionais em trs provncias em colaborao com o Estado. 80 parteiras tradicionais receberam formao nas trs provncias. A IECA tem dado crescente ateno ao problema do VI