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O Papel Ético do
Educador Ambiental
Vilson Sérgio de Carvalho
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ão
Analisaremos aqui algumas considerações éticas presentes no
campo da Educação Ambiental tanto de ordem teórica como
prática. Para isso conversaremos primeiro sobre os conceitos de
ética e moral relacionando estes com a temática ambiental, uma
vez que a crise ecológica está profundamente enraizada em uma
crise ética. Posteriormente, enfocaremos duas dimensões éticas
associadas à área de Educação Ambiental: A Ética “da” EA
associada aos princípios defendidos pela EA através de seus
principais tratados, acordos e definições a partir de sua legislação;
e a Ética “na” EA relacionada à práxis dos diferentes profissionais
promotores da EA, em seus diferentes âmbitos, que muitas vezes
se guiam por uma ética que se conflitua com a ética “da” EA
anteriormente citada. Por fim, questionaremos a necessidade de
um código de ética da EA e seus reflexos no dia-a-dia do educador
ambiental.
Ob
jeti
vo
s
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja
capaz de:
Aprender mais sobre alguns conceitos-chave como ética e
moral e sua importância na análise do existir humano; Entender a atual crise socioambiental como uma crise
essencialmente ética;
Compreender as implicações éticas envolvidas no pensar e no
fazer da Educação Ambiental através da análise das éticas “da”
e “na” EA; Analisar alguns dos principais reflexos dos conflitos entre as
éticas “da” e “na” EA; Tecer considerações sobre a elaboração de um código de ética
da educação ambiental e suas implicações.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 2
Para ser educador ambiental, é preciso...
O que é preciso para ser ou atuar como um
educador ambiental? De todas as respostas possíveis a
esta questão como um conhecimento aprofundado da
realidade socioambiental onde pretende atuar ou uma
boa facilidade de relacionamento – nenhuma é tão
importante e imprescindível como uma postura ética
adequada a sua realidade. Infelizmente, essa não é
uma das características mais citadas nas listas para
definir o perfil dos educadores ambientais. No entanto,
não resta dúvida que se trata de sua característica mais
essencial e imprescindível. O motivo dessa ausência
talvez esteja na obviedade relacional que esta encerra,
já que, a priori, nas parece absurdo pensar a atuação
de um educador ambiental - que trabalha em prol da
formação de uma consciência ecológica - desligada de
uma atuação ética dirigida a questões ambientais,
agindo como se a mesma inexistisse.
Entretanto, faz-se necessário problematizar essa
obviedade e se perguntar: Até que ponto os
profissionais de Educação Ambiental, estão ou não
agindo eticamente em sua maneira de fazer, ministrar,
aplicar, enfim de trabalhar com Educação Ambiental em
seus locus de atuação; isto é, se perguntar até que
ponto nós educadores estamos ou não agindo
eticamente na Educação Ambiental que temos
proporcionado ao público-alvo (comunidades,
educandos, associações e etc.) com o qual temos
trabalhado? Nesse contexto, caberiam outras reflexões,
como a de que se existiria de fato, e não apenas de
direito, uma ética relativa à Educação Ambiental? Estas
e outras questões constituirão o foco desta aula.
Para tal esta aula se propõe a entender a
relação entre Ética e Educação Ambiental em dois
âmbitos distintos, porem intimamente
Dica do professor
Fique de Olho: O autor irá trabalhar a relação entre Ética e Educação Ambiental a partir de duas dimensões a Ética “na” Educação
Ambiental relativa aos valores, crenças e atitudes dos educadores ambientais e a Ética “da” Educação Ambiental relacionada a ética que a Educação Ambiental enquanto discurso ou legislação pretende instaurar no planeta.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 3
interrelacionados: A Ética da Educação Ambiental,
referindo-me a constituição da nova ética ecológica que
a Educação Ambiental se propõe a instaurar; e a Ética
na Educação Ambiental, que por sua vez, diz respeito a
ética, ou mais especificamente, ao conjunto de valores
sobre o qual esta se sustenta, relacionada a práxis do
Educador Ambiental que atua em seus diferentes
âmbitos – formal, não-formal e informal. A análise
destes âmbitos (referindo-me a ética enquanto fim e a
ética enquanto meio) - construída a partir de
interrogações, e a tentativa de respondê-las através de
algumas reflexões e contribuições teóricas - constitui o
fio condutor dessa aula.
Porque a Crise Ambiental é uma Crise
Ética
Em um de seus últimos livros - A Mudança de
Sentido e o Sentido da Mudança (2000), Pierre Weil
define ética como sendo o "conjunto de valores que
levam o homem a se comportar de modo construtivo e
harmonioso, pois são os valores que determinam as
opiniões, atitudes e comportamentos das pessoas"
(Weil, 2000:133). Nesse sentido, não é exagero afirmar
que a ética exerce uma profunda influência na
qualidade de vida, no desenvolvimento sócio-cultural,
assim como nas relações que a humanidade desenvolve
com a natureza da qual faz parte.
Uma das mais duras constatações percebidas
por cientistas e pesquisadores no final do século XX
refere-se ao distanciamento existente entre os avanços
conquistados no plano da ciência e da técnica, e o
desejável avanço no terreno da ética, que não chegou a
ocorrer na mesma proporção, intensidade e velocidade.
Esse abismo na verdade, é um velho conhecido da
grande maioria dos estudiosos que se debruçaram
sobre a temática da ética e da moral no meio tecno-
Você sabia?
Esse tem sido um dos maiores desafios contemporâneos: Favorecer a que as proporções entre o desenvolvimento ético e o desenvolvimento tecnológico possam um dia se equilibrar.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 4
científico, uma vez que se trata de uma realidade que
tem sua origem já há algumas centenas de anos, tendo
seu ápice na lógica cartesiana e no utilitarismo
baconiano. A maior parte das questões recentes de
ordem ética com as quais temos nos defrontado - que
incluem desde os problemas relativos à bioética
(clonagem, transplante e venda de órgãos, produção de
organismos geneticamente modificados) até os testes
de bombas atômicas na China, Índia e Paquistão - tem
raízes nesses preceitos onde o homem foi e continua
sendo iludido para se enxergar como “medida de todas
as coisas”.
Há praticamente 50 anos atrás, em sua obra
“The New Regional Pattern”, o arquiteto alemão
Hilberseiner defendia, de forma quase previsionária,
que “o futuro parece freqüentemente depender de
soluções técnicas e econômicas, mas os problemas que
temos de resolver são essencialmente éticos. As
técnicas e economias mudam sempre, e muitos
problemas sociais mudam com eles. Não os problemas
éticos, estes permaneceriam os mesmos” (Hilberseiner,
1949: 87). Cinco décadas depois, o raciocínio de
Hilberseiner continua sendo válido, pois, mesmo no
limiar de um novo milênio, é verdade que enquanto as
ciências da técnica e da economia são continuamente
atualizadas e reformuladas para responder novas
exigências sociais; as questões éticas fundamentais
relativas ao bem-estar social e própria qualidade da
vida humana permanecem inalteradas e sem respostas
satisfatórias. A máquina poderia servir como exemplo
clássico para ilustrar essa realidade. Cada vez mais
sofisticada, rápida, digital, compacta e eficiente, ela foi
sendo progressivamente mais aperfeiçoada - do ponto
de vista científico - para cumprir sua função que, direta
ou indiretamente, se voltava para a obtenção de lucro,
através da aceleração da produção; otimização de
serviços rentáveis ou mesmo de sua própria
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 5
comercialização. Perguntas como A quem a máquina
serve? Quem tem acesso à mesma? Quem pode
usufruir de seus benefícios? Ou, ainda, quem tem
responsabilidade pelos possíveis malefícios que possa
vir a causar? se tornaram na verdade, um conjunto de
questões secundárias e, como tais, desmerecedoras de
maior importância em nome de uma entidade
misteriosa qualificada de progresso.
Numa busca desenfreada pela acumulação de
riquezas, representada através dos ícones do lucro e da
mais-valia, a dimensão social do desenvolvimento
técnico-científico foi durante anos e anos secundarizada
e descartada, só vindo a ser recuperada, muito
recentemente, na segunda metade de nosso século,
pela pressão de grupos internacionais; de uma minoria
de cientistas e pesquisadores conscientes; e da própria
população civil organizada (onde as ONGs vão assumir
um papel fundamental); que começaram a pressionar a
própria razão científica quando em nome desta era
permitido explorar, oprimir e destruir. A apropriação e
uso dos recursos ambientais não escaparam a essa
lógica mercadológica, consumista e destrutiva, onde
possuir e dominar sempre foram palavras de ordem,
marcando de forma profunda as relações entre homem
e meio ambiente através da história. Como aponta Boff
(1996), explicitando o engodo, o sonho do crescimento
ilimitado produziu o subdesenvolvimento de 2/3 da
humanidade, a exaustão dos sistemas vitais e a
desintegração progressiva do equilíbrio ambiental (Boff,
1996: 25).
Por isso, não temo afirmar, de forma convicta,
que a crise socioambiental, reflexo da própria crise
civilizatória com a qual nos deparamos, foi antecipada,
sem dúvida alguma, por uma grave crise de ética. A
ausência de uma postura ética técnico-científica que
pudesse ordenar as ações do homem sobre a natureza,
Dica do professor
Denúncia: O sonho do crescimento ilimitado teve como um de seus resultados mais concretos a destruição ambiental em larga escala. Pesquise mais sobre as diferenças entre progresso e desenvolvimento.
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baseada no respeito mútuo entre esses dois elementos
- no reconhecimento tanto da dignidade humana
quanto do valor da natureza - ajuda-nos a
compreender melhor como o caos supracitado pode
alcançar níveis de tal ordem prejudiciais à própria
continuidade da vida no planeta. Não é por acaso que a
origem da palavra ética, advinda da raiz grega ethos
(costume), é a mesma, refere-se ao local onde o
homem vive, mora ou passa grande parte de seu
tempo.
Ética e moral: semelhanças e diferenças
Existe uma discussão, que acho conveniente
explicitar, referente às diferenças entre os conceitos de
ética e moral. Embora tradicionalmente utilizados como
termos sinônimos, muitas vezes até de forma aleatória,
ética e moral possuem nítidas distinções. Enquanto a
moral é concreta e diz respeito ao nível individual,
prático e prescritivo; a ética é mais social, teórica e
virtual, se constituindo como um campo de análise
filosófica voltada para o estudo dos fundamentos e
validação de comportamentos socialmente reconhecidos
e estimulados (Krüger,1998). Nesse sentido, a moral se
referiria ao conjunto de prescrições admitidas numa
época e sociedade determinada, e o esforço devido
para se conformar a estas prescrições e segui-las; ao
passo que a ética seria a doutrina dos costumes, tendo
como objeto de estudo a qualificação de condutas em
termos do que é bom ou mau (Lalande, 1996; Mora,
1998; Abbagnano, 1998).
Muitos autores concordam com esta
diferenciação, definindo moral como “um conjunto de
prescrições destinadas a assegurar uma vida em
comum de forma harmoniosa”, e ética como “a
avaliação normativa das ações e do caráter de
indivíduos e grupos” (Japiassu & Marcondes, 1996: 93).
Importante
Não se trata, aqui, de criticar a tecnologia ou mesmo a ciência como bodes expiatórios da crise civilizatória, mas sim de destacar como estas têm sido utilizadas a serviço
de um desenvolvimento exclusivamente econômico, onde o lucro é sempre a prioridade-mor.
Dica do professor
Confusão conceitual: Basta tomarmos como exemplo as questões de justiça e moralidade para entender o quanto a prática usual desses conceitos é indiferenciada e de difícil precisão quanto ao uso acertado de uma ou outra. De qualquer forma, é interessante saber que a Filosofia tem uma reflexão diversa para cada uma delas.
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Todavia, mesmo aceitando com reservas essa distinção
no plano teórico, é necessário entender que, na prática,
as questões concernentes à moral e à ética estão
inteiramente imbricadas, sendo, portanto, difícil
precisar uma separação mais rígida entre os dois
conceitos. A moral fornece o conteúdo a ser avaliado
pela ética que, por sua vez, a alimenta estabelecendo,
através de seu julgamento, que tipo de ação ou
pensamento seria moral ou amoral. Reforçando essa
mesclagem conceitual, Kremer-Marketti (1989) nos
recorda, ainda, que, na concepção anglo-saxã, a ética
tem sido definida como a ciência da moral, e a moral,
por sua vez, como uma espécie de ética-normativa
(Kremer-Marketti, A., 1989: 7-8).
Pretendendo não me estender nessa discussão,
faço uma opção consciente pelo uso do termo ética, até
porque, mais do que se voltar para problemas de
normatização, ou mesmo um conjunto de prescrições
morais juridicamente firmadas, as questões que aqui
pretendo enfocar e desenvolver sobre Educação
Ambiental referem-se mais propriamente à temática
dos valores, tanto dos que esta se propõe a disseminar
e enraizar (ética da Educação Ambiental) quanto dos
valores fundamentais que os agentes de Educação
Ambiental (ética na Educação Ambiental) devem
considerar em seu cotidiano de trabalho. Isso não
significa que, em dado momento, o texto não venha a
tecer comentários sobre algumas prescrições mais
estimuladas na prática da Educação Ambiental e/ou que
possam servir para a constituição da chamada ética
ecológica.
A ética “da” educação ambiental
Desde que a Educação Ambiental começa a
despontar no cenário mundial, já nas primeiras
conferências de que temos registro, como a
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Conferência de Estocolmo (1972) - onde ela é elevada
ao estatus de “assunto oficial” por possuir uma
“importância estratégica” - e a Conferência de Tbilisi
(1977) - onde fora destacado como um de seus
objetivos principais a criação de “uma consciência de
interdependência econômica, política e ecológica do
mundo moderno, com a finalidade de acentuar o
espírito de responsabilidade e de solidariedade entre as
nações” (Assis, 1991: 62); a dimensão ética da
Educação Ambiental sempre esteve presente tanto no
âmbito formal (institucional), quanto no âmbito não-
formal (sociocomunitário) (Carvalho, 2002). Neste
item, procuro compreender que tipo de ética é
estimulada e sugerida pela Educação Ambiental, e em
que princípios ela se baseia.
Em diferentes trabalhos que escrevi, tive a
oportunidade de esclarecer que entendo a Educação
Ambiental como “um processo crítico-transformador
capaz de promover no indivíduo um questionamento
mais profundo sobre a realidade ambiental onde este se
encontra inserido, levando-o a assumir uma nova
mentalidade ecológica, pautada no respeito mútuo para
com o meio ambiente e os que nele convivem”
(Carvalho, 2002: 4-5). Esse questionamento mais
profundo diria respeito ao nível mais básico do que
denominei como a Ética “da” Educação Ambiental.
Inspirado em Edgard Morin (1997), podemos chamar
esse nível primário da ética da Educação Ambiental de
uma “auto-ética” que se fundamenta na própria
consciência moral de cada indivíduo.
Note que, a partir da definição de Educação
Ambiental adotada, tudo começa a partir de um
questionamento interior, que, por conseguinte, é
dirigido aos nossos valores e critérios pessoais de agir
no mundo que nos cerca. É fundamental que essa
moral íntima e pessoal do público-alvo, a quem a
Importante
A chamada “auto-ética” que se fundamenta na própria consciência moral do indivíduo
seria o nível primário e essencial da ética. Na Educação Ambiental, este nível seria despertado em relação a uma postura eticamente correta com relação ao ecossistema vital.
Dica do professor
Para recordar A Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental (Conferência de Tbilisi) foi realizada em Tbilisi, capital da Georgia,CEI (Ex-URSS), de l4 a 26 de outubro de l977, organizada pela UNESCO, em cooperação com o PNUMA e constituiu-se num marco histórico para a evolução da EA. Nessa conferência, foram definidos os conceitos da EA, seus objetivos, princípios orientadores e estratégias para o seu desenvolvimento.
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Educação ambiental se dirige, venha a ser calcada em
valores ecologicamente prudentes de se viver no meio
ambiente. É a partir do conjunto de interrogantes,
suscitado pelo processo de Educação Ambiental, que o
homem vai se questionar sobre sua atuação e papel no
habitat onde se insere, percebendo que é possível
aproveitar todos os benefícios que este tem a nos
oferecer, sem necessariamente destruí-lo. Fornecer e
provocar estas interrogações deve fazer parte das
estratégias de qualquer programa de Educação
Ambiental que pretenda alguma eficácia, servindo
inclusive como um analisador de seu sucesso ou
fracasso.
Parar e refletir sobre sua maneira de interagir
com o meio ambiente que a cerca é o primeiro passo
para o desenvolvimento de uma “auto-ética ecológica”.
Platão utiliza um termo interessante, que ora me
aproprio para entender melhor esta idéia: o de “auto-
reforma”. Ou seja, uma reforma interior promovida
pelo próprio indivíduo a partir do grau de
conscientização sobre a realidade a sua volta e o
desenvolvimento de valores ambientais essenciais,
como o direito a vida, o reconhecimento da relação
dependência/interdependência para com o meio
ambiente e o respeito concretizado na conservação e
utilização racional de seus recursos para as gerações
futuras. Sem o desenvolvimento dessa auto-ética
ecológica e a partir desta, sem uma reflexão moral
sobre sua conduta, promovendo a instauração de um
processo de auto-reforma, é praticamente impossível
que exista qualquer tipo de comprometimento mais
profundo com a questão socioambiental. O “fazer pelo
fazer” em vez do “fazer consciente” não tem
sustentação e acaba esmorecendo diante das primeiras
dificuldades. É preciso trabalhar os valores do
educando, dar-lhe motivos e, posteriormente, oferecer
condições para que este entenda seu papel diante da
Dica do professor
Resumindo: Questionamento interior (mudança de valores). Reflexo exterior (mudança de comportamento).
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grave situação ambiental ao seu redor e possa, então,
optar pela defesa de sua causa, assumindo de forma
consciente as responsabilidades decorrentes desta
escolha.
O objetivo central da ética que a Educação
Ambiental pretende disseminar é o de devolver ao
homem sua condição de membro da vida, participante
ativo da teia de inter-relações do ecossistema do qual
faz parte. Ela é a base para a promoção de um novo
contrato natural, a que Michel Serres (1991) faz
referência, onde o homem deve abandonar a relação de
parasitismo para com a natureza e passar a encará-la
como algo mais do que mero pano de fundo, para
desenvolvimento de sua espécie. É ainda essa ética da
Educação Ambiental a responsável por oferecer a
sustentação necessária para que o homem perceba,
como aponta Morin (1998), a íntima interligação de
todo organismo a um ecossistema qualquer, numa
relação básica e fundamental de
dependência/interdependência. Bressan (1980), se
utilizando de um modelo complexo, descreve essa
relação a partir de um processo simultâneo de
“humanização da natureza” e “naturalização do
homem”, tendo em vista que, de forma recíproca, “a
natureza sofre as leis do desenvolvimento e o homem
as leis naturais” (Bressan, 1980: 33).
SOBRE CONSCIENTIZAÇÃO
O termo “conscientização” muito utilizado no
discurso educacional é criticado por diversos
autores, inclusive por Paulo Freire que entende que
ninguém conscientiza ninguém. O que ocorre é uma
passagem da consciência ingênua – que não
significa consciência zero – para uma consciência
crítica. Assim, vale esclarecer que o termo é aqui
utilizado no sentido de uma tomada de consciência
da realidade e/ou do universo que nos rodeia,
possibilitando ao homem se descobrir melhor a si
mesmo e aos outros com quem interage (Barros,
1971, pp. 44-45).
Para pensar
O convite de Serres Em sua conhecida obra “O Contrato Natural”, Serres faz um convite ao ser humano de que abandone uma relação negativa para com a natureza e passe a adotar uma postura mais equilibrada onde a
mudança se faz de parasita a parte integrante. Como você vê esse convite e como entende que a educação ambiental facilitaria uma resposta positiva da população a este.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 11
O fato de o homem não ser passivo - como
grande parte dos animais irracionais - diante da ação
que a natureza exerce sobre ele, agindo,
transformando, adaptando o meio em que vive, não
significa que este tenha necessariamente que assumir
uma postura de dominador ou de plena independência
para com o mesmo. Seja num nível mais micro como o
metabólico, seja num nível mais macro, como o
planetário, o homem depende diretamente do meio em
que vive; bastando imaginar que, se não fosse a
presença de elementos naturais como a hidrosfera, que
resfria o planeta, e a litosfera que filtra os raios solares,
a vida seria inimaginável. O reconhecimento desta
realidade, a partir da formação de uma consciência
ambiental mais ampla, implica a adoção de uma nova
lógica de conduta para com a natureza, que só assume
um significado mais amplo, se fundamenta numa ética
ambiental com profundos reflexos no cotidiano da
sociedade em geral, criando assim uma possibilidade de
se inserir no arcabouço cultural da mesma. Estimulada
e sugerida pela Educação Ambiental, a instauração de
uma ética ecológica vem questionar ainda dois
absurdos: o primeiro, de se pensar uma ética apenas
para o homem; e o segundo, de se pensar uma ética
para o homem e outra para a natureza de maneira
diferenciada. O que se pretende, além de denunciar
esses absurdos, é a implantação de uma “ética
integradora entre todos os seres viventes e suas
relações bioecológicas” (Siqueira, 1991: 17). Ou seja,
uma ética essencialmente da vida em sua plenitude,
enterrando definitivamente o mito da independência
plena e/ou da “autonomia da razão”, amargas heranças
do cartesianismo.
Como analisa Grün (1994), é justamente no
encontro do homo sapiens, agente moral, dotado de
direitos, com a natureza, amoral e sem direitos, que
surge o espaço da ética ecológica. Esta se volta para
Quer saber mais?
É interessante consultar o texto de Grün, M. (1994) – Uma discussão sobre valores éticos em Educaçào Ambiental, para um maior aprofundamento dessa discussão. Leia e faça um resumo, o que poderá ser útil no desenvolvimento de sua monografia.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 12
uma questão elementar, a de que, mesmo sem direitos
legalmente adquiridos, a natureza é dotada de valor, o
que requer que as relações com ela estabelecidas
estejam pautadas em pressupostos éticos de
responsabilidade. O valor a que me refiro não é apenas
o valor financeiro, como quer fazer crer o materialismo
dialético e o capitalismo selvagem, mas sim, seu valor
essencial, enquanto fator básico para o
desenvolvimento do ciclo vital, do qual dependem
milhares de espécies de seres vivos, entre os quais o
homem é apenas um deles (Carvalho, 2002). Com
muita propriedade, Siqueira (1998) vai direto ao ponto
fundamental desta discussão: A percepção de que “a
interdependência do homem e da natureza exige uma
ética que não sobreponha o racional ao irracional, mas
uma igualdade naquilo que é essencial para ambos: a
sobrevivência” (Siqueira, 1991:17).
Entendida como um fator-chave para a própria
sobrevivência dos seres vivos, tendo como razão
axiológica os valores intrínsecos do homem e do meio
ambiente, a proposição dessa ética - denominada aqui
de ética da ecologia - visa superar a permissiva moral
socioambiental vigente (utilizada para justificar erros
crassos de gestão ambiental), em direção a uma ética
verdadeiramente libertadora e comprometida com o
direito à vida, cada vez mais fragilizado no contexto
atual. É precisamente esta ética que entendo como
passível de ser reforçada e alimentada, a partir de um
sério, amplo e honesto trabalho de Educação
Ambiental, onde seja possível fornecer a cada cidadão
uma espécie de “bússola moral” dirigida a todo e
qualquer modo de interagir do homem com o meio
ambiente, revelando-lhe senão o rumo ideal a seguir,
pelo menos o mais apropriado.
Dica do professor
Como a natureza não tem voz ela fala através do homem, dotado de direitos.
Nesse espaço entre o sujeito moral, e a natureza amoral, surge a ética ecológica.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 13
A ética “na” educação ambiental
Com E. Kant, aprendemos que uma decisão
ética só pode ser resultado de um ato racional, fruto da
evolução humana, pois supõe um discernimento sobre
o bem e mal. Apoiado nesta linha de pensamento
kantiana, é possível apontar a ausência de ética como
prova de irracionalidade (Lalande, 1996: 348-349).
Kant vai afirmar, ainda, e esse é ponto de partida que
gostaria de sublinhar, antes de tratar da ética relativa
ao modus-operandi dos que trabalham com Educação
Ambiental, que o núcleo da ética é descoberto pela
investigação da razão prática, assim distinta da razão
que ele qualifica como pura e teórica. Esse caráter
prático da razão se manifestaria, segundo Kant, na
própria possibilidade de ordenar o mundo dos
fenômenos, através do pensamento, facultando ao
homem decidir sobre o que fazer eticamente, de modo
que coincida com ação livre e não venha a
impossibilitá-la.
Seguindo esse percurso kantiano, e
considerando as idéias anteriormente expostas, é
possível perceber que, enquanto um processo
educativo, o grande desafio da Educação Ambiental,
sem dúvida alguma, é aquele que se passa eticamente,
tanto da ética que ela pretende instaurar, como
elemento catalisador de uma nova lógica de
relacionamento entre o homem e a natureza, quanto do
conjunto de valores dos profissionais que, embora
atuando nessa área, muitas vezes se isolam, evitando
interagir com outras entidades de propósitos
semelhantes; não se desvencilham de viéses político-
partidários mais voltados para a efetivação de
campanhas eleitoreiras do que para a realização de um
trabalho profícuo de Educação Ambiental; ou mesmo
dos que buscam apenas um espaço na imprensa para
autopromoção.
Dica do professor
Aprender com os erros: Mesmo com todo planejamento é evidente que existirão falhas durante a execução dos processos relativos a práxis da educação ambiental. Contudo se a prática da avaliação fosse mais freqüente poderíamos humildemente aprender mais com os erros e futuramente acertar
mais em projetos futuros.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 14
Deve-se levar, também, em consideração que,
independente da prática de trabalho em Educação
Ambiental - tanto o nível micro como dentro de um
internato, através de oficinas de trabalho (Pedrini, A.,
1998); como a nível macro junto a diferentes
comunidades de sete bairros do Rio de Janeiro, vide
Subprojeto de Mobilização Social/Participação
Comunitária do Programa de Educação Ambiental do
PDBG - as pretensões implícitas e explícitas da maior
parte dos objetivos a serem alcançados são sempre de
caráter ético. Isso ocorre, simplesmente, porque o
processo de Educação Ambiental encontra-se a serviço
de uma ética integradora, sendo, portanto, inadmissível
que os meios a serem utilizados para sua aplicação
também não fossem escolhidos e administrados
segundo critérios éticos. A dimensão ética da Educação
Ambiental está presente em qualquer projeto de
atuação na área, desde a sua elaboração inicial, onde
se faz necessário ouvir as demandas da população onde
ela será ministrada e permitir que esta participe do seu
processo de elaboração e adaptação; até o
acompanhamento final dos resultados do trabalho,
onde é preciso aprender com erros, em vez de ignorá-
los, para que estes não se repitam num trabalho
posterior. A questão é que poucos atentam para a
mesma, não lhe assegurando a devida importância.
Movido pelo ideal de que esta venha a ser mais
valorizada, entendo que algumas práticas
metodológicas são fundamentais e devem ser
ressaltadas na práxis do agente de Educação Ambiental
como incentivar a participação, favorecendo o exercício
de cidadania da população envolvida; promover o
diálogo e a solidariedade; manter uma postura de
aprendiz e uma transparência no que concerne ao
desenvolvimento das diferentes fases do trabalho
realizado e dos resultados obtidos com o mesmo. Essas
práticas, por sua vez, estão inevitavelmente calcadas
Dica do professor
Aprender com os erros: Mesmo com todo planejamento é evidente que existirão falhas durante a execução dos processos relativos à práxis da educação ambiental. Contudo, se a prática da avaliação fosse mais freqüente, poderíamos humildemente aprender mais com os erros e futuramente acertar mais em projetos futuros.
Dica de leitura
Vale a pena ler a obra de ENCINAS Crisitiane intitulada Possibilidades de Futuro – Educação Ambiental, Cidadania e Projetos de Transformação e ver como a autora aborda essa temática a partir do trabalho com o lixo.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 15
em valores éticos mais amplos como a igualdade, a
honra, a integridade, a justiça, a liberdade, a
fraternidade e a paz. O que denominei nesta aula de
ética na dimensão ambiental (ética dos meios) refere-
se, de modo particular, à ética dirigida aos valores e
critérios fundamentais, norteadores da práxis do
profissional de Educação Ambiental consciente de seu
papel enquanto agente de transformação de uma
realidade extremamente crítica. São esses valores os
responsáveis pela manutenção corajosa de uma
postura ética diante “dos parcos recursos, da infra-
estrutura desmontada e salários ridículos” (Pedrini,
1998: 70) com os quais o profissional da área é
obrigado a viver.
O fato de reservar especial atenção à dimensão
ética do fazer Educação Ambiental, mais dirigida a sua
prática, advém igualmente do fato de não querer
apresentá-la como uma espécie de “remédio milagroso”
solucionador de todos os problemas ambientais. Assim
como a Educação, de modo geral, pode vir a ser
utilizada como instrumento de controle, deturpação,
seleção, exclusão ou, como diria Brügger, de
“adestramento”; é preciso ter certo cuidado com a
maneira pela qual a Educação Ambiental pode ser
utilizada, a partir das intenções de quem a promove e
das ideologias sobre as quais suas práticas estariam
calcadas (Brügger, 1994), muitas vezes
descompromissadas com um exercício mais consciente
da cidadania (através do desenvolvimento do
pensamento crítico) ou com uma reflexão ética-
ambiental mais ampla e interdisciplinar (Carvalho,
2002). Além disso, deve-se ter muito claro o fato de
que a Educação Ambiental se constitui em uma das
formas de lutar contra a crise ambiental, uma
estratégia a ser utilizada contra a mesma, mas
evidentemente não é a única. Mesmo reconhecendo a
sua importância, enquanto promotora de uma nova
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 16
consciência ecológica, é inegável que desligada de uma
política ambiental mais efetiva acompanhada de uma
legislação rígida; ou de ações voltadas para uma
distribuição de renda mais igualitária, ou ainda para a
construção e manutenção de um contexto político-
cultural favorável, estaremos agindo no “vazio” e longe
de vislumbrar um futuro socioambiental menos
desolador. O trabalho com comunidades carentes tem
revelado essa complexidade, pois é extremamente
complicado se falar em ética ambiental, ou de
prioridade para as questões ambientais, quando não se
tem sequer o que se alimentar.
Para a socióloga Anna Waehneldt (1996), a
especificidade da Educação Ambiental se dá na
viabilização do conhecimento do meio ambiente em sua
totalidade - através de seus diferentes aspectos e de
suas relações de interdependência - a partir do exame
da realidade local, com base nas situações vivenciadas
no cotidiano da população. Assim, baseada no estudo
de problemas práticos do dia-a-dia, ela pretende a
adoção de “uma nova postura ética solidária” em
relação ao meio ambiente. Pela definição de Waehneldt,
fica explícito o motivo pelo qual o processo de Educação
Ambiental deve estar calcado sobre princípios éticos
que despertem a responsabilidade ambiental, pois, caso
contrário, dificilmente este poderá favorecer ao
indivíduo um exercício mais amplo de cidadania, que se
caracterize através de atitudes participativas e
ecologicamente conscientes, ou seja, atitudes
Educação ou Adestramento? A Educação Ambiental promovida sem o devido cuidado ético pode ser entendida como adestramento segundo Paula Brügger. A dimensão ética, portanto, não apenas amplia a Educação Ambiental sob esse ponto de vista, mas sim dá sentido a mesma, uma vez que diante de sua ausência ela sequer pode ser assim qualificada.
EDUCAÇÃO OU ADESTRAMENTO?
A Educação Ambiental promovida sem o devido
cuidado ético pode ser entendida como adestramento,
segundo Paula Brügger.
A dimensão ética, portanto, não apenas amplia a
Educação Ambiental sob esse ponto de vista, mas sim
dá sentido à mesma, uma vez que diante de sua
ausência ela sequer pode ser assim qualificada.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 17
adequadas à constituição de um meio ambiente
equilibrado e saudável. É preciso estar muito atento às
práticas de trabalho - estratégias de aproximação,
atuação e mobilização - que temos utilizado no campo;
refletindo, entre outras questões, se existe um
distanciamento entre o discurso ético e democrático e
uma prática anti-ética e autoritária.
É essencial que o educador ambiental procure se
questionar não uma, mas quantas vezes forem
necessárias, se realmente ele está assumindo uma
postura de aprendiz, daquele que está na comunidade
e/ou instituição em primeiro lugar para ouvir e
aprender sobre a realidade onde pretende atuar, e não
daquele que vem apenas para ensinar, pois já sabe
tudo; se realmente ele está favorecendo uma atitude
de diálogo com a população, ou simplesmente traz
soluções prontas, desconsiderando as sugestões da
comunidade em relação a um projeto já elaborado por
sua equipe; lembrando que este tipo de atitude sugere
uma comunicação de igual para igual e nunca de quem
vem de fora para dizer o que é certo ou errado, se
dizendo “o dono da verdade”. Qualquer falta nos
pontos assinalados é, no mínimo, comprometedora, se
não for fatal, para o trabalho com Educação Ambiental.
Querer ser ouvido e respeitado implica, em
primeiro lugar, ouvir e respeitar o outro. Isto parece
uma afirmação banal para alguns, mas é estranho
comprovar como práticas elementares são inteiramente
dispensadas. Surge daí a necessidade, em minha forma
de entender a questão, cada vez mais urgente, de que
sejam estabelecidas as bases para um código de ética
do educador ambiental, isto é, de um conjunto de
procedimentos básicos fundamentais para garantir a
dimensão ética do processo de Educação Ambiental na
práxis de seus agentes promotores. Manifestada, por
exemplo, no respeito fundamental aos valores culturais,
Dica de leitura
O Desafio da Ética Ambiental: Para explorar mais as
discussões dessa página é interessante a leitura da obra de GRÜN Mauro– Ética e Educação Ambiental ,publicado pela Papirus, São Paulo: 1996.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 18
sociais, morais e religiosos do locus de atuação onde o
processo de Educação Ambiental está sendo
implementado. Ou, ainda, na garantia de que a
população tenha a possibilidade de participar do
processo de Educação Ambiental em suas diferentes
fases, podendo se defender ou mesmo lutar pelos
benefícios que o projeto e/ou programa de Educação
Ambiental se propôs a gerar; além de uma série de
outras disposições relativas ao próprio trabalho de
pesquisa e implementação de políticas nessa área.
O estabelecimento desse código, que deveria ser
pensado, repensado e efetivado com a participação dos
diferentes setores envolvidos (órgãos ambientais,
associações, ONGs, universidade, conselhos e outros)
permitiria explicitar melhor o próprio cunho
interdisciplinar e político da Educação Ambiental, que
envolve, sem dúvida alguma, uma complexidade de
processos relativos à participação social,
representatividade, legitimidade e tomada de decisão;
muitos destes insinuados nas entrelinhas do artigo 225
da Constituição Federal ou na Lei 9795 referente à
Política Nacional da Educação Ambiental. Sabemos que
a Educação Ambiental tem uma história recente e que a
mesma ainda está amadurecendo, sendo pertinente
uma série de críticas em relação à mesma. Entretanto,
defendo que, enquanto não iniciarmos esse processo de
regulamentação ética - adiando esse processo -
estaremos contribuindo para que a Educação Ambiental
continue sendo desacreditada nesse país, em vez de
buscarmos aperfeiçoá-la, para a dignificação do próprio
trabalho que temos realizado.
OUTROS DESAFIOS...
Segundo Léon Olivé (1997), o grande desafio
ético desse novo século será a tentativa de conciliar
direitos grupais locais - relacionados ao grupo no qual
os indivíduos estão inseridos, como uma comunidade
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 19
ética que luta pela preservação de sua língua, por
exemplo, com direitos globais e coletivos - que dizem
respeito aos direitos do indivíduo, tendo por base seu
pertencimento a uma coletividade, como o direito de
um cidadão votar em uma autoridade de seu país
(Olivé, 1997: 2). Essa dificuldade de conciliação, em
termos de direitos culturais, tem sido motivo de
preocupação de cientistas e pesquisadores sociais,
chegando-se a aventar a hipótese de que, cada vez
mais, os conflitos internacionais sejam baseados
fundamentalmente em contradições culturais e não em
conflitos ideológicos e econômicos como se previa. De
fato, temos presenciado em diferentes partes do globo
– como a África, a Região dos Bálcãs (Albânia e
Sérvia), e mais recentemente na Índia - uma
multiplicação de conflitos étnico-culturais de graves
proporções, apoiados pela ambição política e pela
indústria armamentícia.
Como aponta Latouche (1994), em função de
um modelo avassalador de desenvolvimento que
pretendeu a substituição de toda cultura tradicional
pela industrialização, a cultura “tornou-se, no fundo,
sinônimo de atraso, de retardamento mental” (id.,
p.75). Tentativas de preservação da biodiversidade
cultural são encaradas como barreiras inúteis e
retrógradas contra a força do progresso globalizador,
imposição de novos tempos, onde globalizar é preciso,
e viver é mera conseqüência. O que era proposta se
torna então axioma símbolo de modernização. Daí
originam-se os questionamentos típicos, no caso da
América Latina, onde essa resistência cultural se faz
sentir de forma pujante, se esta atingiu ou chegará um
dia a atingir o tão almejado estágio da modernidade
(Ibañez, J., 1996). Sob essa lógica, não importam os
avanços democráticos, as inovações tecnológicas, a
redução do analfabetismo e a aceleração dos processos
de urbanização e industrialização latino-americana, mas
sim o fato de que a mesma nunca pode se globalizar
Dica do professor
Como esclarece Touraine, a distância entre uma economia globalizada e culturas isoladas acabam gerando frutos extremamente negativos que vão da destruição de culturas à violência social. Entretanto, como veremos nas páginas seguintes, existem alternativas e a Educação Ambiental tem um papel importante
nessa direção (Touraine, 1998: 202).
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 20
completamente, ou melhor, pensar unicamente de
forma global para atuar localmente, sem lhe opor a
idéia de um pensar local culturalmente enraizado.
O fato é que a temida pressão
globalizante/ocidentalizante não conseguiu atingir seu
objetivo dominador em termos culturais como se
imaginava. Sim, os latino-americanos usam jeans, os
japoneses dominam cada vez mais o sotaque inglês, e
os grandes shoppings invadiram quase todos os
recantos do planeta. Entretanto, se essas
manifestações características de um pensar globalizado
nos fazem questionar sobre onde estaria nossa
identidade cultural, a tão temida “pasteurização
cultural” não aconteceu, o pensar e o agir local ainda
possuem sua força influenciando e impondo padrões de
comportamento. O choque entre a torrente globalizante
versus as barreiras da identidade local parece resultar
numa espécie de fusão entre local e global, onde ambos
são ressignificados, tanto na figura do local globalizado
quanto do global localizado, relativizando ações
uniformizadoras.
Por trás de toda essa conjunção cultural -
movida não apenas por um pensar global imposto, mas
também simultaneamente pela resistência que a ela se
faz, se traduz através de diferentes processos de
mesclagem cultural, geradores de novas identidades
mestiças e territorializações interculturalmente
determinadas, onde as ambivalências local x global,
particular x geral, convivem num cenário multifacetado
de culturas híbridas (Canclini, 1997) - o que está em
jogo, na verdade, é a conquista de eqüidade e justiça
social, onde os desiguais não sejam igualados, mas que
as diferenças sejam consideradas, proporcionando aos
mais diferentes grupos a possibilidade de exercerem
sua cidadania local com igualdade de condições (apesar
da existência de fronteiras). Entre as várias
Quer saber mais?
Por mais forte que sejam as forças globalizantes, sempre haverá resistências diretas e indiretas à hegemonia cultural única. É interessante para o educador ambiental, ou não, conhecer os focos de resistência de uma comunidade, uma vez que neles residem a força local.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 21
possibilidades de responder a esse desafio no campo
dos direitos sociais, três propostas se consolidaram
com o passar do tempo: o universalismo, o relativismo
e o pluriculturalismo. A primeira delas, o universalismo,
é pautada em concepções universais construídas com
base em conceitos gerais tais como autonomia,
liberdade, dignidade e necessidades básicas. O critério
para aceitação de uma norma qualquer na proposta
universalista é o de aceitá-la como universal, isto é,
entendê-la como aceitável para qualquer sujeito
racional independente de sua língua ou nacionalidade, o
que, em outras palavras, implicaria uma imposição
hegemonicamente definida de um mesmo sentido
dominante para diferentes culturas. Seria como a
utilização de qualquer um desses conceitos, como o de
“autonomia”, por exemplo, como se este
correspondesse, na lógica do pensar global, a um único
entendimento do que ele significa ou poderia vir a
significar em termos de conceituação e aplicabilidade
local.
Contrária a essa postura universalista, surge em
cena o relativismo, que enxerga o princípio da
universalidade como insuficiente para resolver alguns
problemas sociais mais concretos, já que situações
desenvolvidas do ponto de vista ético e moral
envolveriam valores e normas específicas dos
diferentes grupos envolvidos. A posição relativista,
portanto, entende que a moral deva ser baseada em
valores específicos, do ponto de vista do sistema
relevante para os indivíduos que participam da mesma;
como se o local fosse indubitavelmente mais
importante que o global. Para Olivé (1997), a aceitação
da proposta relativista, sem maiores reservas,
apresenta sérios riscos como a justificativa de qualquer
tipo de ação, desde que se conte com valores locais
adequados à mesma (tudo é válido); a vinculação de
questões de direitos humanos apenas em contextos
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 22
particulares e específicos e, principalmente, a
obstaculização de políticas de cooperação mútua, já
que se salientam-se as diferenças, e não as
semelhanças entre membros de culturas diferentes.
Buscando um caminho mais equilibrado entre
um relativismo que exacerba o pensar e o agir local
ignorando a vontade geral; e o universalismo, que
ignora as particularidades locais; a proposta do
pluriculturalismo tem encontrado grande aceitação no
campo do direito internacional, por entender a lógica
das sociedades compostas de comunidades e culturas
diversas, garantindo o reconhecimento de direitos tanto
das entidades coletivas como dos direitos de grupo,
sem anular a possibilidade de que sejam estabelecidos
direitos básicos invioláveis entre grupos diferentes.
Buscando fugir ao antagonismo criado por ilusões
universalistas e obsessões identitárias (Touraine, 1998:
197), a postura pluricultural se utiliza dos termos
respeito e o diálogo aparecem como forças motrizes de
suas estratégias, procurando valorizar o
reconhecimento de membros de culturas diferentes
como sujeitos capazes de construir acordos sobre as
condições mínimas para uma interação intercultural,
que envolveriam, por sua vez, a constituição de limites
que ninguém poderia ultrapassar (nem mesmo o
Estado), como em uma democracia de fato.
O pluralismo cultural alimenta, ainda, a idéia de
uma interpretabilidade cultural de grupos diferentes, a
partir de sua teia cultural própria. A interpretabilidade,
como parte dos processos de adaptação cultural, já
vistos anteriormente, tem por fim o favorecimento de
interações transculturais, onde a resolução de
problemas comuns entre membros de culturas
diferentes se baseia em discussões acordadas levando
em consideração as perspectivas dos diferentes
participantes envolvidos e não em conceitos universais
Quer saber mais?
Democracia: Helsen a define, identificando-a como “uma sociedade em que a ordem social é realizada por quem está submetido a esta ordem, isto é, o povo. Significa identidade entre governantes e governados, entre sujeito e objeto do poder, governo do povo sobre o povo” (Kelsen, H., 1993: 35).
Importante
Pluralismo Cultural:
A interpretabilidade cultural baseada no respeito à cultura alheia talvez seja uma das grandes vantagens do pluralismo cultural. Proposta que vem ganhando cada vez mais adeptos.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 23
preestabelecidos. Certamente, esses mecanismos de
adaptação, favorecidos por acionamentos
interpretativos, ajudam a explicar a presença das
descontinuidades culturais e a possibilidade da
coexistência, em diferentes graus, de múltiplos
reconhecimentos e pertencimentos culturais em uma
mesma cultura local (Velho, 1996). É bem possível que
esses acionamentos interpretativos possam favorecer,
ainda, o que Touraine sugere como solução para
reduções dos conflitos entre o global e o local, ou seja,
uma comunicação intercultural que impeça possíveis
auto-segregações e a adoção de políticas autoritárias
(Touraine, 1998).
Defendo a idéia de que a manutenção de um
ambiente equilibrado, fator essencial à sobrevivência, o
educador ambiental também assume um papel
fundamental no sentido de garantir esses
reconhecimentos interculturais sem ignorar a
importância de preservar a cultura local. Através dos
diferentes processos de conscientização ambiental,
trabalhados nos mais diferentes projetos de Educação
Ambiental, é possível não apenas desenvolver políticas
de valorização do espaço local, mas entender a
urgência de problemáticas globais e até planetárias,
buscando um caminho de conciliamento e adaptação
necessária entre agendas globais e práticas locais de
atuação, onde o meio ambiente é entendido como elo
comum de interligação.
O QUE A EDUCAÇÃO AMBIENTAL TEM A VER COM
A QUESTÃO DA DIVERSIDADE CULTURAL?
Não há como assumir uma postura ambiental ética se
a cultura local não for preservada e valorizada. Além
disso, a promoção de intercâmbios culturais favorece
a troca de experiências e ajuda a entender como
pessoas de diferentes localidades têm lidado com a
questão ambiental.
O meio ambiente é entendido no campo dos conflitos
culturais como um elo fundamental de interligação.
Não importam as diferenças, uma vez que o meio
ambiente é o elo comum.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 24
Existe uma clássica parábola, contada e
recontada por educadores e ambientalistas, que serve
bem para fundamentar esse argumento final, e revelar
que há mais do que paixão temática, no que ele deixa
transparecer. A metáfora em questão, que tem nas
ovelhas e leões - ambientalmente situados - seus
personagens centrais, também, poderia servir para
explicitar a lógica de nosso bordão inicial, em termos
de quando ele se faz necessário e em que sentido deve
ser questionado e readaptado em função das demandas
socioculturais.
As ovelhas sempre tiveram medo de leões por
razões óbvias, elas são devoradas por eles. Entretanto,
responda com sinceridade, seria possível uma
negociação entre ovelhas e leões? O que tornaria os
leões sensíveis a ponto de deitar-se ao lado de uma
ovelha, fazer um acordo com ela e depois respeitá-lo. A
resposta ambiental é muito clara: tanto o leão como a
ovelha não querem que a floresta pegue fogo, tanto um
quanto o outro não querem que as águas de uma
grande enchente inundem suas casas, tanto um quanto
o outro querem proteger seus filhotes.
Esta lista interminável de seres vivos que lutam
pela vida reflete não só como no âmbito ecológico
interdepender não significa necessariamente depender,
mas também como as diferenças podem ser
respeitadas em favor da continuidade da vida. Em
outras palavras, por maior que seja a diversidade e a
estratificação social, ecologicamente estamos
interligados pela existência comum num mesmo planeta,
nosso único lar.
Para refletir
O que sugere a metáfora? Todos somos diferentes, fazemos partes de culturas diferentes, temos valores diversos, mas o importante é que todos precisamos lutar pela nossa única casa, o planeta terra. E isso será feito a partir do diálogo entre essas
diferenças pautado numa postura ética através da qual diferentes lados sejam respeitados e valorizados.
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 25
EXERCÍCIO 1
A palavra “ética” é oriunda da raiz grega “ethos” que
significa costume, mas também se refere a:
( A ) Ambiente;
( B ) Etnia;
( C ) Trabalho;
( D ) Desvio;
( E ) Representação.
EXERCÍCIO 2
Proposta de valorização da diversidade cultural que
defende a interpretabilidade cultural de grupos
diferentes a partir de elementos de sua própria teia
cultural:
( A ) Ecumenismo;
( B ) Culturalismo;
( C ) Pluriculturalismo;
( D ) Relativismo;
( E ) Universalismo.
EXERCÍCIO 3
Diferencie a Ética “da” e a Ética “na” Educação
Ambiental.
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 26
EXERCÍCIO 4
Como você vê a possibilidade da elaboração de um
Código de Ética do Educador Ambiental?
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
____________________________________________
RESUMO
Vimos até agora:
O que é preciso para ser ou atuar como um
educador ambiental? De todas as respostas
nenhuma é tão importante e imprescindível
como uma postura ética adequada a sua
realidade;
A Ética da Educação Ambiental refere-se a
constituição da nova ética ecológica que a
Educação Ambiental se propõe a instaurar; e
a Ética na Educação Ambiental, que por sua
vez, diz respeito a ética, ou mais
especificamente, ao conjunto de valores sobre
o qual esta se sustenta, relacionada a práxis
do Educador Ambiental que atua em seus
diferentes âmbitos – formal, não-formal e
informal;
Pierre Weil define ética como sendo o
"conjunto de valores que levam o homem a
se comportar de modo construtivo e
harmonioso, pois são os valores que
determinam as opiniões, atitudes e
comportamentos das pessoas" (Weil,
2000:133). Nesse sentido, não é exagero afir-
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 27
mar que a ética exerce uma profunda
influência na qualidade de vida, no
desenvolvimento sócio-cultural, assim como
nas relações que a humanidade desenvolve
com a natureza da qual faz parte.
Uma das mais duras constatações percebidas
por cientistas e pesquisadores no final do
século XX refere-se ao distanciamento existente
entre os avanços conquistados no plano da
ciência e da técnica, e o desejável avanço no
terreno da ética, que não chegou a ocorrer na
mesma proporção, intensidade e velocidade.
As técnicas e economias mudam sempre, e
muitos problemas sociais mudam com eles.
Não os problemas éticos, estes
permaneceriam os mesmos” (Hilberseiner,
1949: 87);
O sonho do crescimento ilimitado produziu o
subdesenvolvimento de 2/3 da humanidade, a
exaustão dos sistemas vitais e a
desintegração progressiva do equilíbrio
ambiental (Boff, 1996: 25).
A crise sócio-ambiental, reflexo da própria
crise civilizatória com a qual nos deparamos,
foi antecipada, sem dúvida alguma, por uma
grave crise de ética;
Enquanto a moral é concreta e diz respeito ao
nível individual, prático e prescritivo; a ética é
mais social, teórica e virtual, se constituindo
como um campo de análise filosófica voltada
para o estudo dos fundamentos e validação
de comportamentos socialmente reconhecidos
e estimulados (Krüger,1998);
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 28
Muitos autores definem moral como “um
conjunto de prescrições destinadas a
assegurar uma vida em comum de forma
harmoniosa”, e ética como “a avaliação
normativa das ações e do caráter de
indivíduos e grupos” (Japiassu & Marcondes,
1996: 93);
Mesmo aceitando com reservas essa distinção
no plano teórico, é necessário entender que
na prática, as questões concernentes a moral
e a ética estão inteiramente imbricadas,
sendo, portanto difícil precisar uma separação
mais rígida entre os dois conceitos. A moral
fornece o conteúdo a ser avaliado pela ética,
que por sua vez a alimenta estabelecendo,
através de seu julgamento, que tipo de ação
ou pensamento seria moral ou amoral;
Esse questionamento mais profundo, diria
respeito ao nível mais básico do que
denominei como a Ética “da” Educação
Ambiental pode ser chamado ainda de nível
primário da ética da Educação Ambiental, de
uma “auto-ética” que se fundamenta na
própria consciência moral de cada indivíduo.
Parar e refletir sobre sua maneira de interagir
com o meio ambiente que a cerca é o
primeiro passo para o desenvolvimento de
uma “auto-ética ecológica”;
Sem o desenvolvimento dessa auto-ética
ecológica e a partir desta, sem uma reflexão
moral sobre sua conduta, promovendo a
instauração de um processo de auto-reforma,
é praticamente impossível que exista qualquer
tipo de comprometimento mais profundo com a
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 29
questão sócio-ambiental. O “fazer pelo fazer”
ao invés do “fazer consciente” não tem
sustentação e acaba esmorecendo diante das
primeiras dificuldades;
O objetivo central da ética que a Educação
Ambiental pretende disseminar é o de
devolver ao homem sua condição de membro
da vida, participante ativo da teia de
interrelações do ecossistema do qual faz
parte;
Estimulada e sugerida pela Educação
Ambiental, a instauração de uma ética
ecológica vem questionar ainda dois
absurdos: o primeiro, de se pensar uma ética
apenas para o homem; e o segundo, de se
pensar uma ética para o homem e outra para
a natureza de maneira diferenciada. O que se
pretende, além de denunciar esses absurdos,
é a implantação de uma “ética integradora
entre todos os seres viventes e suas relações
bioecológicas” (Siqueira, 1991: 17). Ou seja,
uma ética essencialmente da vida em sua
plenitude, enterrando definitivamente o mito
da independência plena e/ou da “autonomia
da razão”, amargas heranças do
cartesianismo.
Como analisa Grün (1994), é justamente no
encontro do homo sapiens, agente moral,
dotado de direitos, com a natureza, amoral e
sem direitos, que surge o espaço da ética
ecológica. Esta se volta para uma questão
elementar, a de que, mesmo sem direitos
legalmente adquiridos, a natureza é dotada
de valor, o que requer que as relações com ela
estabelecidas estejam pautadas em pressupos-
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 30
tos éticos de responsabilidade;
Entendida como um fator-chave para a
própria sobrevivência dos seres vivos, tendo
como razão axiológica os valores intrínsecos
do homem e do meio ambiente, a proposição
dessa ética - denominada aqui de ética da
ecologia - visa superar a permissiva moral
sócio-ambiental vigente (utilizada para
justificar erros crassos de gestão ambiental),
em direção a uma ética verdadeiramente
libertadora e comprometida com o direito a
vida;
enquanto um processo eminentemente
educativo o grande desafio da Educação
Ambiental, sem dúvida alguma, é aquele que
se passa a nível ético, tanto da ética que ela
pretende instaurar, como elemento
catalisador de uma nova lógica de
relacionamento entre o homem e a natureza;
quanto do conjunto de valores dos
profissionais que embora atuando nessa área,
muitas vezes se isolam; não se desvencilham
de viéses político-partidários, mais voltados
para a efetivação de campanhas eleitoreiras
do que para a realização de um trabalho
profícuo de Educação Ambiental; ou mesmo
dos que buscam apenas um espaço na
imprensa para auto-promoção.
A dimensão ética da Educação Ambiental está
presente em qualquer projeto de atuação na
área, desde a sua elaboração inicial, onde se
faz necessário ouvir as demandas da
população onde ela será ministrada e permitir
que esta participe do seu processo de
elaboração e adaptação; até o acompanhamento
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 31
final dos resultados do trabalho, onde é
preciso aprender com erros, ao invés de ignorá-
los, para que estes não se repitam num
trabalho posterior;
A ética na dimensão ambiental (ética dos
meios), refere-se, de modo particular, a ética
dirigida aos valores e critérios fundamentais,
norteadores da práxis do profissional de
Educação Ambiental consciente de seu papel
enquanto agente de transformação de uma
realidade extremamente crítica;
O fato de reservar especial atenção à
dimensão ética do fazer Educação Ambiental,
mais dirigida a sua prática, advém igualmente
do fato de não querer apresentá-la como uma
espécie de “remédio milagroso” solucionador
de todos os problemas ambientais. Assim
como a Educação de modo geral, pode vir a
ser utilizada como instrumento de controle,
deturpação, seleção, exclusão, ou de
adestramento;
Mesmo reconhecendo a importância da EA,
enquanto promotora de uma nova consciência
ecológica, é inegável que desligada de uma
política ambiental mais efetiva acompanhada
de uma legislação rígida; ou de ações
voltadas para uma distribuição de renda mais
igualitária, ou ainda para a construção e
manutenção de um contexto político-cultural
favorável, estaremos agindo no “vazio” e
longe de vislumbrar um futuro sócio-
ambiental menos desolador;
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 32
Ela pretende a adoção de “uma nova postura
ética solidária” em relação ao meio ambiente.
Pela definição de Waehneldt fica explícito o
motivo pelo qual o processo de Educação
Ambiental deve estar calcado sobre princípios
éticos que despertem a responsabilidade
ambiental, pois caso contrário, dificilmente
este poderá favorecer ao indivíduo um
exercício mais amplo de cidadania;
É essencial que o educador ambiental procure
se questionar não uma, mas quantas vezes
forem necessárias, se realmente ele está
assumindo uma postura de aprendiz, daquele
que está na comunidade e/ou instituição em
primeiro lugar para ouvir e aprender sobre a
realidade onde pretende atuar, e não daquele
que vem apenas para ensinar. Querer ser
ouvido e respeitado implica em primeiro lugar
ouvir e respeitar o outro;
É cada vez mais urgente o estabelecimento
das bases para um código de ética do
educador ambiental, isto é de um conjunto
procedimentos básicos fundamentais para
garantir a dimensão ética do processo de
Educação Ambiental na práxis de seus
agentes promotores. Manifestada por
exemplo, no respeito fundamental aos valores
culturais, sociais, morais e religiosos da locus
de atuação onde o processo de Educação
Ambiental está sendo implementado;
Segundo Léon Olivé (1997), o grande desafio
ético desse novo século será a tentativa de
conciliar direitos grupais locais - relacionados
ao grupo no qual os indivíduos estão inseridos,
como uma comunidade ética que luta pela pre-
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 33
servação de sua língua por exemplo -; com
direitos globais e coletivos - que dizem respeito
aos direitos do indivíduo, tendo por base seu
pertencimento a uma coletividade, como o
direito de um cidadão votar em uma
autoridade de seu país (Olivé, 1997: 2);
Como aponta Latouche (1994), em função de
um modelo avassalador de desenvolvimento
que pretendeu a substituição de toda cultura
tradicional pela industrialização, a cultura
“tornou-se no fundo, sinônimo de atraso, de
retardamento mental” (id., p.75). Tentativas
de preservação da biodiversidade cultural são
encaradas como barreiras inúteis e
retrógradas contra a força do progresso
globalizador, imposição de novos tempos;
Por trás de toda essa conjunção cultural -
movida não apenas por um pensar global
imposto, mas também simultaneamente pela
resistência que a ela se faz, se traduz através
de diferentes processos de mesclagem
cultural, geradores de novas identidades
mestiças e territorializações
interculturalmente determinadas, onde as
ambivalências local x global, particular x
geral, convivem num cenário multifacetado
de culturas híbridas (Canclini, 1997);
Dentre as várias possibilidades de responder
a esse desafio no campo dos direitos sociais,
três propostas se consolidaram com o passar
do tempo: o universalismo, o relativismo e o
pluriculturalismo. A primeira delas, o
universalismo, é pautada em concepções
universais construídas com base em conceitos
gerais tais como: autonomia, liberdade,
dignidade e necessidades básicas;
Aula 7 | O papel ético do educador ambiental 34
Contrária a essa postura universalista, surge
em cena o relativismo, que enxerga o
princípio da universalidade como insuficiente
para resolver alguns problemas sociais mais
concretos, já que situações desenvolvidas do
ponto de vista ético e moral envolveriam
valores e normas específicas dos diferentes
grupos envolvidos;
Buscando um caminho mais equilibrado entre
um relativismo que exacerba o pensar e o
agir local ignorando a vontade geral; e o
universalismo, que ignora as particularidades
locais; a proposta do pluriculturalismo tem
encontrado grande aceitação no campo do
direito internacional, por entender a lógica
das sociedades compostas de comunidades e
culturas diversas, garantindo o
reconhecimento de direitos tanto das
entidades coletivas como dos direitos de
grupo, sem anular a possibilidade de que
sejam estabelecidos direitos básicos
invioláveis entre grupos diferentes;
O pluralismo cultural alimenta, ainda, a idéia
de uma interpretabilidade cultural de grupos
diferentes, a partir de sua teia cultural
própria. A interpretabilidade tem por fim o
favorecimento interações transculturais, onde
a resolução de problemas comuns entre
membros de culturas diferentes se baseia em
discussões acordadas levando em
consideração as perspectivas dos diferentes
participantes envolvidos, e não em conceitos
universais pré-estabelecidos;
Defendo a idéia de que a manutenção de um
ambiente equilibrado, fator essencial à
sobrevivência, o educador ambiental também