O principe 1 5

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Eu andava em círculos, como se issopudesse aliviar a tensão do meu corpo.A Seleção parecia emocionante quandoestava lá longe — uma possibilidadefutura. Mas agora? Bem, eu já não tinhatanta certeza.

Censo compilado, números checadosmúltiplas vezes. Os funcionários dopalácio estavam sendo realocados, e asroupas e os quartos das novas hóspedes

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já estavam sendo preparados. A pressãocrescia, empolgante e assustadora aomesmo tempo.

Para as garotas, o processo começaracom o preenchimento dos formulários— milhares a esta altura. Para mim,começou hoje.

Completei dezenove anos. Agora, eupodia participar.

Parei diante do espelho e conferi agravata mais uma vez. Naquela noitehaveria mais olhos sobre mim do que onormal; eu precisava parecer o príncipeautocon ante que todos esperavam. Agravata estava impecável, e eu segui

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para o escritório do meu pai.No caminho, acenei com a cabeça

para os assessores e guardas conhecidos.Era difícil imaginar que em menos deduas semanas os corredores estariamabarrotados de garotas. Bati de maneirarme na porta, uma requisição feita pelo

meu próprio pai. Parecia que eu sempretinha uma lição a aprender.

Bata com autoridade, Maxon.Pare de andar em círculos, Maxon.Você tem que ser mais rápido, mais esperto

e melhor, Maxon.— Entre.Entrei. Meu pai desviou os olhos do

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espelho por um instante para meobservar.

— Ah, que bom que você chegou.Sua mãe virá logo. Está preparado?

— Claro — respondi. Era a únicaresposta plausível.

Ele esticou o braço e apanhou umapequena caixa, que pôs na minha frente,sobre sua escrivaninha.

— Feliz aniversário.Des z o embrulho prateado e dei com

uma caixinha preta. Dentro dela, umpar de abotoaduras novas.Provavelmente ele estava atarefadodemais para se lembrar de que já havia

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me dado abotoaduras no Natal. Ouentão eram os ossos do ofício. Quandoeu fosse rei, talvez também desse umpresente repetido para o meu lho semquerer. Mas é claro que, para chegar aesse ponto, primeiro precisava de umaesposa.

Esposa. A palavra pendeu dos meuslábios por um instante, sem chegar asair. Soava estranha.

— Obrigado, senhor. Vou usá-lasagora mesmo.

— Você precisa dar o seu melhor estanoite — ele disse, afastando-se doespelho. — Todos estão com a Seleção

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na cabeça.Dei um sorriso tenso.— Eu também estou.Pensei em contar a ele como estava

ansioso. Ele já havia passado por isso,a nal. Deve ter tido suas própriasdúvidas naquela época.

Mas é claro que o nervosismo estavaestampado na minha cara.

— Ânimo, Maxon. A ideia é que sejaemocionante — ele me incentivou.

— E é. Só estou impressionado com arapidez com que tudo tem acontecido— respondi enquanto me concentravaem passar o metal pela casa da manga da

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camisa.— Parece rápido para você, mas para

mim foram anos de preparação — eledisse, rindo.

Apertei os olhos e o encarei.— Como assim?A porta se abriu e minha mãe entrou.

Como sempre, o rosto do meu pai seiluminou com a sua presença.

— Amberly, você está estonteante —elogiou, caminhando paracumprimentá-la.

Ela sorriu com seu jeito de sempre,como se não acreditasse que alguémhavia reparado nela, e abraçou meu pai.

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— Não estonteante demais, espero.Não quero roubar a atenção.

Ela se afastou do meu pai e veio naminha direção.

— Feliz aniversário, filho.— Obrigado, mãe.— Seu presente vai chegar —

sussurrou, e depois se dirigiu ao meupai. — Estamos todos prontos, então?

— Sim, certamente — respondeumeu pai, oferecendo-lhe o braço, queela agarrou. Eu caminhei à sombradeles. Como sempre.

— Quanto tempo teremos, Alteza? —um repórter me perguntou.

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A luz dos re etores queimava meurosto.

— Os nomes serão sorteados nestasexta-feira, e as garotas chegarão nasexta seguinte — respondi.

— Está nervoso, senhor? — outra vozindagou.

— Porque vou me casar com umamoça que ainda nem conheço? Tudosob controle — respondi, com umapiscadela que fez a plateia rir.

— Mas isso não o deixa nem umpouco nervoso, Alteza?

Desisti de tentar identi car o rosto domeu interlocutor. Apenas respondi na

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direção de onde veio a pergunta.— Pelo contrário. Estou muito

empolgado.Mais ou menos.— Sabemos que fará uma excelente

escolha, senhor.O flash de uma câmera me cegou.— Aqui, aqui! — outros chamavam.Dei de ombros.— Não sei. Qualquer garota que se

contentar comigo só poderá ser louca.Todos riram mais uma vez, e essa frase

me pareceu uma boa deixa para irembora.

— Com licença. Alguns parentes estão

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aqui de visita e não quero serindelicado.

Dei as costas para os jornalistas efotógrafos e respirei fundo. Será que anoite inteira seria assim?

Corri os olhos pelo Grande Salão —toalhas azul-marinho cobriam as mesas evelas brilhavam forte para realçar oesplendor da decoração — e vi que nãotinha muita escapatória. Em um cantodo salão estavam as autoridades; nooutro, os jornalistas. Nenhum lugar paraeu car quieto e tranquilo. Como eu erao aniversariante, alguém poderia pensarque eu seria o responsável por de nir

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como tudo aconteceria. Mas não eradesse modo que as coisas funcionavam.

Assim que me desvencilhei damultidão, senti o braço do meu pai nasminhas costas e a sua mão a apertar meuombro. Aquela pressão e aquela atençãosúbita me deixavam tenso.

— Sorria — ele ordenou, sem moveros lábios. Obedeci, e ele virou a cabeçana direção de alguns de seus convidadosespeciais.

Percebi o olhar de Daphne, que vierada França junto com o pai. Tivemossorte: a data da festa coincidiu com anecessidade de nossos pais continuarem

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as discussões sobre um tratadocomercial. Sendo ela lha do rei daFrança, nossos caminhos já haviam secruzado algumas vezes, e talvez ela fossea única pessoa fora da minha famíliacom quem eu tinha um pouco deintimidade. Era bom ver um rostoconhecido no salão.

Acenei com a cabeça, e ela ergueu suataça de champanhe.

— Você não pode ser tão sarcásticoem suas respostas. Você é o príncipe-herdeiro. Nós precisamos da sualiderança.

A mão do meu pai apertava meu

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ombro mais do que o necessário.— Perdoe-me, senhor. É uma festa.

Pensei que...— Pensou errado. Espero que na hora

do noticiário você leve as coisas mais asério.

Ele parou de andar e me encarou comseus olhos cinzentos e firmes.

Sorri mais uma vez, sabendo que eleme pedia aquilo por causa da multidão.

— Claro, senhor. Foi um lapso dejulgamento temporário.

Ele abaixou o braço e levou a taça dechampanhe aos lábios.

— Você costuma ter muitos.

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Arrisquei lançar um olhar de enfado aDaphne, que riu, pois sabia muito bemcomo eu me sentia. Os olhos do meupai seguiram meu olhar pelo salão.

— Sempre muito bonita essa garota.Pena que não pode participar do sorteio.

Dei de ombros.— Ela é simpática, mas nunca senti

nada por ela.— Que bom. Seria uma estupidez sem

tamanho da sua parte.Ignorei a maldade do comentário e

continuei:— Além do mais, mal posso esperar

para conhecer minhas verdadeiras

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opções.Meu pai vibrou com a ideia e voltou a

me conduzir pelo salão.— Já é hora de você fazer algumas

escolhas reais na vida, Maxon. Escolhasboas. Tenho certeza de que você achaque meus métodos são rígidos demais,mas preciso que você enxergue aimportância de sua posição.

Segurei um suspiro. Eu tento fazerescolhas. Você é que não confia em mim.

— Não se preocupe, pai. Levo muitoa sério a tarefa de escolher uma esposa— respondi, na esperança de que o tomda minha voz con rmasse o quanto

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aquilo era verdade.— Vai além de encontrar alguém com

quem você se dê bem. Por exemplo,você e Daphne. Muito amiguinhos, masela seria um completo desperdício —ele comentou antes de outro gole, eacenou para alguém que estava atrás demim.

Mais uma vez, tive que controlarminha expressão. Desconfortável com orumo da conversa, meti as mãos nosbolsos e inspecionei o salão.

— Acho melhor começar a circularpelas mesas.

Ele fez que sim com a mão e voltou a

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concentrar-se em sua bebida. Aproveiteipara me retirar rápido. Por mais quetentasse, não conseguia entender o queele queria com aquela conversa. Nãohavia motivo para ele ser tão grosseirosobre Daphne se ela sequer era umaopção.

O Grande Salão reverberava deentusiasmo. As pessoas diziam que todaa Illéa esperava por aquele momento: aemoção de uma nova princesa, aempolgação de ver que em breve euseria rei. Pela primeira vez eu sentiatoda aquela energia e receava que elafosse me esmagar.

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Apertei diversas mãos e aceitei comelegância presentes de que nãoprecisava. Perguntei discretamente a umfotógrafo sobre as lentes de sua câmera.Beijei as bochechas de familiares, amigose de uma boa parcela de completosestranhos.

Por m tive um momento sozinho.Inspecionava a multidão, certo de quehavia algum lugar onde eu deveria estar.Meu olhar parou em Daphne, que veioem minha direção. Estava ansioso parater pelo menos alguns minutos deconversa sincera, mas isso teria queesperar.

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— Está se divertindo? — minha mãeperguntou, ao se aproximar.

— O que parece?Ela correu as mãos pelo meu terno já

meio amarrotado.— Que sim.Abri um sorriso.— É o que importa.Ela inclinou a cabeça levemente, com

um sorriso terno nos lábios.— Venha comigo por um minuto.Ofereci o braço a ela, que aceitou

com alegria, e caminhamos pelocorredor ao som dos cliques dascâmeras.

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— Podemos fazer algo menor no anoque vem?

— Pouco provável. É quase certo quevocê já estará casado. Sua esposa talvezqueira uma comemoração bemso sticada para o primeiro ano de vocêsjuntos.

Franzi a testa, uma liberdade quepodia ter na frente dela.

— Talvez ela também goste detranquilidade.

Minha mãe soltou uma risada mansa.— Desculpe-me, querido, mas uma

garota que se inscreve na Seleção querum jeito de sair da tranquilidade.

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— Você também? — pensei em vozalta.

De fato, nunca tínhamos falado sobre achegada dela ao palácio. Havia umafronteira estranha entre nós. Umafronteira que eu apreciava: fui criado nopalácio, mas minha mãe havia escolhidovir para cá.

Ela parou e me encarou, com umaexpressão calorosa.

— Fiquei encantada com o rosto quevi na tv. Sonhava acordada com seu pai,assim como milhares de garotas agorasonham com você.

Imaginava minha mãe jovem, em

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Hondurágua, com o cabelo trançado nascostas e o olhar ansioso fixo no televisor.Podia vê-la suspirar a cada palavra dele.

— Todas as meninas imaginam comoé a vida de uma princesa — prosseguiu.— Se apaixonar perdidamente, usaruma coroa... Eu só conseguia pensarnisso na semana anterior à divulgaçãodos nomes. Não fazia ideia de que iamuito além.

O rosto dela ficou um pouco triste.— Nem imaginava a pressão a que

estaria submetida ou como teria poucaprivacidade. Ainda assim, ser casadacom seu pai e ter você como lho... é a

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realização de todos aqueles sonhos —concluiu, acariciando minha bochecha.

Ela mantinha os olhos nos meus esorria, mas pude notar lágrimasbrotando. Precisava puxar algumassunto.

— Então você não se arrepende?Ela balançou a cabeça.— Nem um pouco. A Seleção mudou

a minha vida, e da melhor maneirapossível. E é sobre isso que quero falarcom você.

Arregalei os olhos.— Não sei se estou entendendo.Ela soltou um suspiro.

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— Eu era Quatro. Trabalhava emuma fábrica.

Ela estendeu as mãos, com as palmaspara cima, e continuou:

— Meus dedos eram secos e rachados.A sujeira se acumulava debaixo dasunhas. Não tinha boas conexões nemstatus. Nada me fazia digna de serprincesa. E, no entanto, aqui estou.

Encarei-a, ainda sem saber ao certo oque ela queria.

— Maxon, este é o meu presente paravocê: prometo me esforçar para veressas garotas através dos seus olhos. Nãocom os olhos de rainha ou de mãe, mas

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com os seus. Mesmo que você escolhauma moça de uma casta bem inferior,mesmo que os outros pensem que elanão tem valor, sempre escutarei seusmotivos para querê-la. E farei omáximo para apoiá-lo em sua decisão.

Fiquei parado por um momento atécompreender.

— O meu pai não teve esse apoio?Você não teve?

Minha mãe não respondeudiretamente.

— Toda moça que vier terá seus próse contras. Algumas pessoas irão enfatizaro que há de pior em algumas de suas

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opções, e o que há de melhor nasoutras. Essa intolerância não fará omenor sentido para você, mas eu estareiao seu lado, independentemente da suaescolha.

— Você sempre está.— Verdade — a rmou tomando-me

o braço. — Sei que estou prestes a carem segundo plano em relação a outramulher. Mas meu amor por você nuncavai mudar, Maxon.

— Nem o meu por você.Esperava que ela pudesse notar a

sinceridade na minha voz. Era incapazde imaginar uma circunstância que

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ofuscasse minha completa adoração porela.

— Eu sei — disse, e com um gestosuave nos guiou de volta para a festa.

Enquanto éramos recebidos porsorrisos e aplausos no salão, eu pensavanas palavras da minha mãe. Ela era, maisdo que qualquer um que eu conhecia,incrivelmente generosa — umaqualidade que eu me empenharia emadquirir. Assim, aquele presente deviaser mais necessário do que eu podiaimaginar naquele momento. Minha mãenunca me deu um presente que nãofosse bem pensado.

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As pessoas acabaram ficando na festa

por muito mais tempo do que meparecia apropriado. Outro sacrifício quevinha com o privilégio, pensei: ninguémqueria que uma festa no palácioacabasse. Nem o próprio palácio queria.

Deixei o representante da FederaçãoAlemã, que estava bastante bêbado, aoscuidados de um guarda, agradeci todosos conselheiros reais pelos presentes e

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beijei a mão de quase todas as damasque cruzaram as portas do palácio. Ameu ver, tinha cumprido minhaobrigação, e só queria passar umas horasem paz. Só que um par de olhos azul-escuros me interrompeu enquanto eutentava escapar dos foliões retardatários.

— Você tem me evitado — a rmouDaphne, com a voz brincalhona e umsotaque cantado que me fazia cócegasno ouvido. Sempre havia um quêmusical em suas palavras.

— Nem um pouco. É que havia bemmais gente do que eu esperava —repliquei, olhando para trás, vendo o

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punhado de gente decidida a ver o solnascer pelas janelas do palácio.

— Seu pai gosta de espetáculos.Caí no riso. Daphne parecia

compreender várias coisas que eu nuncahavia dito em voz alta. Quanto de mimela compreendia sem que eu me desseconta?

— Acho que ele se superou —comentei.

— Só até a próxima festa — elarespondeu, dando de ombros.

Permanecemos calados por unsinstantes, embora eu sentisse que elaqueria falar mais. Mordendo os lábios,

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sussurrou:— Poderia falar com você em

particular?Concordei, oferecendo-lhe meu

braço, e a conduzi até uma das saletasno nal do corredor. Ela permaneciaquieta, como se guardasse as palavraspara depois que eu tivesse fechado asportas atrás de nós. Apesar de já termosconversado a sós muitas vezes, seucomportamento estava me deixandoapreensivo.

— Você não dançou comigo — eladisse, parecendo magoada.

— Não dancei com ninguém.

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Meu pai tinha insistido em músicoseruditos dessa vez. Embora os Cincofossem muito talentosos, a música quetocavam pedia danças mais lentas.Talvez, se eu tivesse optado por dançar,teria escolhido Daphne. Só que meparecia errado fazer isso enquanto todosme perguntavam sobre a minha futura edesconhecida esposa.

Ela respirou bem fundo e começou aandar em círculos.

— Tenho um encontro assim quevoltar para casa — disse. — Frederick éo nome dele. Já o vi antes, claro.Cavalga muito bem e também é muito

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bonito. É quatro anos mais velho, masacho que esse é exatamente um dosmotivos para meu pai gostar dele.

Ela olhou para mim por cima doombro com um sorrisinho nos lábios.

Respondi com um ar sarcástico:— E onde estaríamos nós sem a

aprovação dos nossos pais?Ela achou graça.— Perdidos, é óbvio. Não faríamos

ideia de como viver.Também ri, grato por ter alguém com

quem fazer piada da situação. Às vezes,essa era a única maneira de lidar com apressão.

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— Mas então, meu pai aprova. Aindaassim, fico pensando...

Ela baixou os olhos, tomada por umatimidez súbita.

— Em quê?Daphne permaneceu imóvel por um

segundo, ainda com o olhar no carpete.Até que cravou aqueles olhos azul-escuros em mim.

— Você é a favor?— A favor do quê?— De Frederick.Comecei a rir.— Não dá para falar, dá? Não o

conheço.

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— Não — ela disse, desanimada. —Não a pessoa, mas a ideia. Vocêconcorda que eu me encontre com essehomem? Que no fim me case com ele?

O rosto de Daphne cou imóvel,como se escondesse algo que eu aindanão entendia. Respondi um poucoconformado e confuso:

— Não cabe a mim aprovar.Tampouco cabe a você — a rmei, umpouco triste por nós dois.

Daphne esfregava as mãos, talveznervosa ou magoada. Eu era incapaz deentender o que estava acontecendo.

— Então você não se incomoda nem

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um pouco? Porque se não for Frederick,será Antoine. Se não for Antoine, seráGarron. Há uma la de homens à minhaespera, e nenhum deles tem comigometade da amizade que tenho comvocê. Mas, no final, terei que aceitar umdeles como marido. E você não seimporta?

Era realmente deprimente.Di cilmente nos víamos mais do quetrês vezes por ano. E eu também aconsiderava minha melhor amiga.Como nós éramos patéticos!

Engoli em seco, procurando a melhorcoisa a dizer.

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— Tenho certeza de que no nal tudovai dar certo.

Sem qualquer aviso, as lágrimascomeçaram a rolar pelo rosto deDaphne. Olhei à minha volta, natentativa de encontrar uma explicaçãoou solução, e me sentia maisdesconfortável a cada momento.

— Por favor, Maxon, diga que vocênão se submeterá a isso. Você não pode— implorou.

— Do que você está falando? —perguntei, desesperado.

— Da Seleção! Por favor, não se casecom uma estranha qualquer. Não me

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faça casar com um estranho qualquer.— É minha obrigação. É assim que

funciona para os príncipes de Illéa.Casamos com plebeias.

Daphne se lançou contra mim eagarrou as minhas mãos.

— Mas eu te amo. Sempre amei. Porfavor, não se case com outra garota semao menos perguntar ao seu pai se eupodia ser uma opção.

Sempre me amou?Engasguei com as palavras. Tentava

descobrir por onde começar.— Daphne, como... Não sei o que

dizer.

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— Prometa que você vai perguntarpara o seu pai — ela implorou, secandoas lágrimas dos olhos, esperançosa. —Adie a Seleção ao menos por temposu ciente para descobrirmos se vale apena tentar. Ou deixe eu participartambém. Eu abro mão da minha coroa.

— Por favor, pare de chorar —sussurrei.

— Não consigo. Não agora que estouprestes a perdê-lo para sempre — disse,antes de enterrar a cabeça entre as mãose começar a soluçar baixinho.

Fiquei ali, como uma estátua, commedo de piorar as coisas. Após alguns

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momentos de tensão, Daphne ergueu acabeça e falou, com olhar perdido:

— Você é a única pessoa que meconhece. A única pessoa que sintoconhecer de verdade.

— Conhecer não é amar — repliquei.— Não é verdade, Maxon. Temos

uma história juntos, e ela está prestes aser destruída. Tudo em nome datradição.

Daphne continuava com os olhos xosno centro da sala, e eu continuava semfazer ideia do que ela estava pensando.Era evidente que eu não costumavaprestar atenção em seus pensamentos.

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Por m, Daphne virou o rosto paramim.

— Maxon, eu suplico, peça ao seu pai.Mesmo que ele diga não, ao menos eutentei tudo o que podia.

Certo de que a minha resposta era amais pura verdade, disse-lhe o queprecisava ser dito:

— Você já tentou, Daphne. Acabou.Cruzei os braços por um instante e

depois soltei-os.— Isso é tudo que nossa história

poderia ser — acrescentei.Seus olhos caram um bom tempo

cravados nos meus. Ela sabia tão bem

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quanto eu que um pedido tãoescandaloso estava muito além dasminhas possibilidades. Percebi que elabuscava em sua mente um caminhoalternativo, mas não havia saída. Elaservia à sua coroa; eu, à minha. E nossasdinastias nunca se cruzariam.

Concordando com a cabeça, eladesabou em lágrimas mais uma vez.Caminhou até o sofá e sentou,abraçando a si mesma. Fiquei parado natentativa de não agravar seu sofrimento.Queria poder fazê-la rir, mas não haviaqualquer graça na situação. Não sabiaque era capaz de partir um coração.

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Com certeza, não gostei de saber.Foi então que me dei conta de que

isso logo se tornaria comum. Eudispensaria trinta e quatro mulheres aolongo dos próximos meses. E se todasreagissem assim?

Bufei de cansaço só de pensar.Ao me ouvir, ela ergueu o olhar. Aos

poucos, a expressão em seu rostomudou.

— Isso não te magoa nem um pouco?— perguntou. — Você não é um atortão bom assim, Maxon.

— É claro que me incomoda.Daphne se levantou e começou a me

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examinar, em silêncio.— Mas não pelas mesmas razões que

me incomodam — ela disse baixinho.Ela caminhava pela sala, com olhos

suplicantes.— Maxon, você me ama.Permaneci calado.— Maxon — ela a rmou, enfática —,

você me ama. Ama.Desviei o rosto; a intensidade do

brilho em seus olhos era forte demaispara mim. Passei a mão pelo cabeloenquanto tentava colocar em palavras oque quer que eu sentia.

— Nunca vi alguém expressar seus

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sentimentos como você acabou de fazer.Não duvido da sinceridade de cada umade suas palavras. Só que não consigodizer o mesmo, Daphne.

— Isso não te impede de sentir. Vocêsó não sabe como expressar. Seu paipode ser frio como o gelo, e sua mãeesconde-se em si mesma. Você nuncaviu as pessoas amarem livremente, e porisso não sabe demonstrar amor. Masvocê sente. Sei que sente. Você me amacomo eu amo você.

Balancei a cabeça devagar, temendoque qualquer sílaba que saísse da minhaboca trouxesse tudo à tona novamente.

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— Me beije — ela ordenou.— Quê?— Me beije. Se você for capaz de me

beijar e ainda assim dizer que não meama, nunca mais tocarei no assunto.

Recuei.— Não. Sinto muito, mas não posso

fazer isso.Não quis confessar o quão literais

eram minhas palavras. Não sabia aocerto quantos garotos Daphne já beijara,mas tinha certeza de que mais que zero.Ela deixou escapar que fora beijada háum par de verões, quando estive naFrança em sua companhia. Bastava. Ela

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tinha mais experiência, e de maneiranenhuma eu iria bancar ainda mais oidiota naquele momento.

Sua tristeza transformou-se em raiva àmedida que se afastou de mim. Elachegou a rir, mas não havia sinal dehumor em seus olhos.

— Então essa é a sua resposta? Vocêestá dizendo não? Você prefere deixarque eu vá?

Encolhi os ombros.— Você é um idiota, Maxon

Schreave. Seus pais sabotaramcompletamente sua personalidade.Mesmo que você tivesse mil garotas

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diante dos seus olhos, não importaria.Você é burro demais para reconhecer oamor a dois palmos do nariz.

Ela secou os olhos e ajeitou o vestido.— Rezo a Deus para nunca mais ver

seu rosto novamente.O medo no meu coração se

transformou e, quando ela começou asair, agarrei-a pelo braço. Não queriaque partisse para sempre.

— Daphne, sinto muito.— Não sinta muito por mim — ela

disse friamente. — Sinta muito porvocê. Você encontrará uma esposaporque é obrigado a isso, mas você já

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conheceu o amor e o deixou partir.Ela soltou a mão num puxão e me

deixou sozinho.Parabéns para mim.

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Daphne cheirava a cerejeiras eamêndoas. Seu perfume era o mesmodesde os treze anos. Ela o usava na noiteanterior e eu ainda podia senti-lo, apesarde ela desejar não me ver nunca mais.

Ela tinha uma cicatriz no pulso, de umarranhão que fez ao tentar subir em umaárvore aos onze anos. Foi culpa minha.Ela não era tão feminina na época, e eua convenci — ou melhor, a desafiei — a

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apostar uma corrida até o topo de umadas árvores que cercavam o jardim.Ganhei.

Daphne tinha pânico do escuro, ecomo eu também tinha meus medos,nunca caçoei dela por isso. E elatampouco caçoava de mim. Pelo menosnão quando as coisas eram importantes.

Ela era alérgica a frutos do mar. Suacor preferida era amarelo. Por mais quetentasse, era incapaz de cantar, mesmoque sua vida dependesse disso. Só queela sabia dançar, então não a ter tiradopara uma dança na noite passadasigni cou mais do que uma simples

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decepção.Quando eu tinha dezesseis anos,

Daphne me mandou um estojo novopara a minha câmera, como presente deNatal. Apesar de eu nunca ter dadoqualquer indício de querer me livrar doestojo antigo, signi cou tanto para mimsaber que ela prestava atenção nas coisasque eu gostava que passei a usar opresente. Eu ainda o usava.

Eu me espreguicei sob os lençóis evirei a cabeça na direção do estojo.Perguntei-me quanto tempo ela teriagasto para escolher o modelo certo.

Talvez Daphne tivesse razão.

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Tínhamos mais história do que eu haviapercebido antes. Mantínhamos umarelação através de visitas espaçadas etelefonemas esporádicos. Por isso, nuncapassou pela minha cabeça que aquilotinha tanto peso.

E agora ela estava no avião rumo àFrança, onde Frederick a aguardava.

Arrastei-me para fora da cama earranquei a camisa amassada e a calça doterno para tomar uma ducha. Tentavasilenciar meus pensamentos enquanto aágua lavava os resquícios do meuaniversário.

Mas não conseguia pôr de lado a

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denúncia perturbadora que ela haviafeito sobre os meus sentimentos. Seráque eu não conhecia o amor? Será queeu o havia provado e descartado? Sesim, como lidaria com a Seleção?

Conselheiros corriam pelo paláciocom pilhas de formulários de inscriçãopara a Seleção; todos sorriam para mimcomo se soubessem de algo que euignorava. De tempos em tempos, umdeles me dava tapinhas nas costas oucochichava palavras de incentivo, comose sentissem que eu repentinamentecomeçara a duvidar da única coisa comque sempre havia contado e que tinha

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aguardado minha vida inteira.— O lote de hoje é muito promissor

— dizia um deles.— O senhor é um homem de sorte —

assegurava outro.Mas enquanto as pilhas de formulários

cresciam, eu só conseguia pensar emDaphne e em suas palavras afiadas.

Eu deveria estar estudando os númerosdo relatório nanceiro que tinha naminha frente. Em vez disso, estudava omeu pai. Por acaso ele havia mesabotado? Havia me criado de formaque eu não tivesse qualquer noção doque signi cava um relacionamento

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amoroso? Já havia reparado no modocomo tratava minha mãe. Havia afetoentre eles, senão paixão. Não seria isso obastante? Não teria que ser esse o meuobjetivo?

Olhava para o nada, perdido empensamentos. Talvez, na cabeça dele,buscar algo além disso faria com que eutivesse muita di culdade em enfrentar aSeleção. Ou talvez eu cassedecepcionado por não encontrar algoque mudasse a minha vida. Então eramelhor mesmo eu nunca mencionar queessa era minha única esperança.

Por outro lado, talvez não fossem esses

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seus planos. As pessoas são o que elassão. Meu pai era rígido, era como umaespada a ada pela pressão de governarum país que sobrevivia a guerras eataques rebeldes constantes. Minha mãeera como um cobertor, compassivadevido à infância carente e semprebuscando proteger e reconfortar.

Eu sabia que, no fundo, era maisparecido com ela do que com ele. Nãoque isso me incomodasse, masincomodava meu pai.

Assim, talvez o seu plano fosse mesmofazer de mim uma pessoa incapaz deexpressar os sentimentos, parte do

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processo para me endurecer.Você é burro demais para reconhecer o amor

a dois palmos do nariz.— Acorde, Maxon.Virei rápido a cabeça na direção da

voz do meu pai.— Sim, senhor?Sua expressão era de cansaço.— Quantas vezes preciso dizer? A

Seleção consiste em uma escolha sólidae racional. Não é mais umaoportunidade para você car sonhandoacordado.

Um engravatado entrou na sala eentregou uma carta para o meu pai. Eu

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ajeitava uma pilha de folhas batendo-ascontra a mesa.

— Sim, senhor.Ele leu a carta enquanto eu o

observava.Talvez.Não.No nal das contas, não. Ele queria

fazer de mim um homem, não umamáquina.

Bufando, ele amassou o papel e oatirou no lixo.

— Malditos rebeldes.

*

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Passei a maior parte da manhã seguintetrabalhando em meus aposentos, longede olhares curiosos. Eu me sentia muitomais produtivo quando cava sozinho. Ese não conseguisse ser produtivo, aomenos não havia quem me castigasse.Suspeitei que aquilo não duraria o diainteiro diante do chamado que recebi.

— O senhor me chamou? —perguntei ao cruzar a porta do gabinetede meu pai.

— Aí está você — ele disse com osolhos arregalados. Esfregou as mãos econtinuou:

— Amanhã é o grande dia.

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Tomei fôlego.— Sim. Precisamos repassar o formato

do noticiário?— Não, não — ele apoiou a mão nas

minhas costas, fazendo com que meendireitasse imediatamente, e meconduziu em frente. — Será bastantesimples: introdução, um papo rápidocom Gavril e depois transmitimos osnomes e os rostos das moças.

Concordei com a cabeça.— Parece... fácil.Quando nos aproximamos da

escrivaninha, ele pôs a mão sobre umagrossa pilha de pastas.

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— Aqui estão elas.Olhei para baixo. Encarei a pilha.

Engoli em seco.— Agora, mais ou menos umas vinte

e cinco entre elas possuem qualidadesevidentemente perfeitas para uma novaprincesa. Famílias excelentes, laçosvaliosos com outros países. Algumas sãoapenas exuberantes.

Estranhamente, ele me deu umacotovelada brincalhona no peito, e meafastei para o lado. Nada daquilo erabrincadeira.

— Infelizmente, nem todas asprovíncias tinham algo digno de nota a

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oferecer. Então, para que as coisasparecessem mais aleatórias, incluímosessas regiões para dar um pouco mais dediversidade à Seleção. Você verá quetemos até algumas Cinco no pacote.Nada abaixo disso, porém. Precisamoster alguns parâmetros.

Repeti mentalmente suas palavras.Todo esse tempo eu pensei que aescolha seria feita pelo acaso ou entãopelo destino... E era apenas o meu pai.

Ele correu o polegar pela pilha comtanta força que as bordas das pastas securvaram para cima.

— Quer dar uma espiada? — propôs.

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Olhei novamente para a pilha. Nomes,fotos e qualidades. Todos os detalhesessenciais estavam ali. Ainda assim, eusabia que o formulário não dizia o queas fazia rir ou pôr para fora seus segredosmais obscuros. Ali estava umacompilação de atributos, não de pessoas.E, com base naquelas estatísticas, eramminhas únicas opções.

— Foi você quem as escolheu? —perguntei, desviando o olhar dapapelada e encarando-o.

— Sim.— Todas elas?— Basicamente — disse com um

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sorriso. — Como falei, há algumas aíapenas pelo espetáculo, mas acho quevocê tem uma leva bastante promissora.Bem melhor do que a minha.

— Seu pai também escolheu as suasopções?

— Algumas delas, mas naquela épocaa coisa era diferente. Por que pergunta?

Puxei pela memória.— Então era isso que você queria

dizer, não é? Quando falou que aSeleção consumiu anos de trabalho dasua parte?

— Bem, precisávamos garantir quecertas garotas teriam a idade adequada, e

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tínhamos várias opções em certasprovíncias. Em todo caso, con e emmim, você vai amá-las.

— Vou?Amá-las? Como se ele se importasse.

Como se aquilo não fosse apenas maisuma maneira de a coroa, o palácio e elepróprio prevalecerem.

De repente, seu comentário infelizsobre Daphne ser um desperdício fezsentido. Para ele, não importava se euera próximo de Daphne por ela serencantadora ou uma boa companhia;para ele, ela era a França. Não era sequerum ser humano. E como meu pai já

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tinha o que precisava da França,Daphne era inútil aos seus olhos. Aindaassim, se ela tivesse se mostrado valiosa,estou certo de que ele jogaria fora todaaquela amada tradição para obter seusns. Mas como isso não aconteceu, ele

quis manter todo o processo em suasmãos.

Ele soltou um suspiro.— Que cara é essa? Pensei que você

fosse car entusiasmado. Não quer nemdar uma olhadinha?

Endireitei o paletó e respondi:— Como você disse, não é hora decar sonhando acordado. Verei as

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garotas junto com todos os demais.Com a sua licença, preciso terminar deler seu projeto de emenda.

Parti sem esperar sua aprovação, mastinha certeza de que minha resposta erajusti cativa su ciente para que medeixasse sair.

Talvez não fosse exatamente umasabotagem, mas com certeza parecia umaarmadilha. Encontrar uma garota dequem eu gostasse de verdade entre asdúzias que ele escolheu a dedo? Qualera a chance de isso acontecer?

Tentei me acalmar. A nal, eleescolhera a minha mãe, e ela é uma

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mulher maravilhosa, linda e inteligente.Mas isso aconteceu aparentemente semtanta interferência. Mas as coisas eramdiferentes agora, segundo ele.

Entre as palavras de Daphne, asintromissões do meu pai e meuspróprios medos, cada vez maiores, passeia lamentar a Seleção como nunca.

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Faltavam apenas cinco minutos parao meu futuro se desenrolar diante dosmeus olhos, e eu estava prestes avomitar a qualquer momento.

Uma maquiadora muito gentil secavao suor da minha testa.

— O senhor está bem? — perguntouenquanto agitava o lenço.

— Estou apenas chateado porquenenhum dos tons de batom que você

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tem ali combina comigo.Minha mãe às vezes dizia: “não é meu

tom”. Não sabia bem o que signi cavaaquilo.

Ela achou graça, assim como minhamãe e sua maquiadora.

— Acho que estou bem — falei àmoça, ao me olhar no conjunto deespelhos atrás do estúdio. — Obrigado.

— Eu também — minha mãe disse, ecom essas palavras as duas maquiadorasse retiraram.

Eu brincava com um dos potinhos demaquiagem na tentativa de não pensarsobre o que se aproximava.

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— Maxon, meu amor, você está bemmesmo? — minha mãe perguntou semolhar para mim, vendo meu re exo noespelho.

Devolvi o olhar.— É só... que...— Eu sei. É estressante para qualquer

um, mas no m das contas, é só ouvir osnomes de um punhado de garotas.Apenas isso.

Respirei fundo e z que sim com acabeça. Era uma maneira diferente deencarar as coisas: nomes. Era esse oacontecimento do dia. Uma lista denomes, nada mais.

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Respirei fundo outra vez.Ainda bem que eu não tinha comido

muito naquele dia.Dei meia-volta e caminhei até meu

assento no estúdio, onde meu pai já meaguardava.

Ele balançou a cabeça.— Recomponha-se. Você parece

péssimo.— Como você conseguiu passar por

isto? — perguntei em tom de súplica.— Encarei tudo com con ança,

porque eu era o príncipe. E você fará omesmo. Por acaso preciso lembrá-lo deque você é o prêmio?

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Seu rosto manifestava o mesmo enfadode antes, como se eu já devesse terentendido a situação.

— São elas que competem por você— continuou. — Não o contrário.Nada mudará em sua vida, apenas teráde lidar com um punhado de garotaseufóricas por algumas semanas.

— E se eu não gostar de nenhuma?— Então escolha a que odiar menos.

De preferência, alguma que seja útil.Não se preocupe quanto a isso. Vouajudá-lo.

Se a intenção dele era me tranquilizar,não deu certo.

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— Dez segundos — veio o anúncio.Minha mãe tomou seu assento e deuuma piscadela reconfortante.

— Lembre-se de sorrir — meu paipediu, e se virou para as câmeras com arconfiante.

De repente, o hino estava tocando eeu ouvia as pessoas falarem. Tinhaconsciência de que devia prestaratenção, mas todo o meu esforço seconcentrava em manter uma expressãocalma e alegre.

Não entendi muita coisa até escutar avoz familiar de Gavril.

— Boa noite, Majestade —

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cumprimentou, e senti um frio nabarriga até me dar conta de que ele sedirigia ao meu pai.

— Gavril, é sempre um prazer vê-lo.— Ansioso por causa do anúncio,

Majestade?— Ah, sim. Ontem estive no salão

onde o sorteio foi realizado e vi algumasdas escolhidas. São todas adoráveis.

Meu pai agia tão naturalmente, tão àvontade.

— Então Vossa Majestade já sabequem são? — perguntou Gavril,eufórico.

— Só algumas, só algumas.

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Uma mentira completa tirada damanga com uma facilidade incrível.

— Por acaso ele compartilhou essasinformações com Vossa Alteza?

Agora Gavril falava comigo. A luzre etida em seu broche piscava àmedida que ele gesticulava.

Meu pai se virou para mim, pedindocom os olhos para que eu sorrisse. Foi oque fiz, e respondi:

— Não, de jeito nenhum. Vouconhecê-las ao mesmo tempo que aspessoas em casa.

Droga. Deveria ter dito vou conhecer assenhoritas, não conhecê-las. Elas eram

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hóspedes, não animais de estimação.Mereciam destaque. Sequeidiscretamente o suor das mãos nascalças.

— Majestade — Gavril voltou-se paraa Rainha —, algum conselho para asSelecionadas?

Observei minha mãe. Quanto tempolevou para ela adquirir tanta composturae car tão impecável? Será que semprefoi assim? Com um único gesto ela eracapaz de derreter até Gavril.

— Aproveitem a última noite comouma garota normal. Amanhã,independentemente do que virá, a vida

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de vocês mudará para sempre. E umconselho antigo, mas valioso: sejamvocês mesmas.

— Sábias palavras, minha rainha, sábiaspalavras. E agora vamos revelar as trintae cinco jovens escolhidas para a Seleção.Senhoras e senhores, unam-se às minhasfelicitações para as seguintes lhas deIlléa!

Observei os monitores. O emblemanacional apareceu na tela e um pequenoquadrado no canto mostrava meu rostoao vivo. O quê?! Minhas reações seriamvistas o tempo todo?

Minha mãe segurou a minha mão, fora

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do ângulo da câmera. Inspirei. Expirei.Inspirei de novo.

Só um bocado de nomes. Nada demais. Não é como se estivessemanunciando uma garota só e pronto.

— Senhorita Elayna Stoles, deHansport, Três.

Gavril lia os nomes em uma cha,enquanto eu me empenhava em abrirmais o sorriso.

— Senhorita Tuesday Keeper, deWaverly, Quatro — continuou.

Ainda com cara de eufórico, eu meinclinei para meu pai.

— Estou passando mal — cochichei.

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— Apenas respire — ele respondeuentre os dentes. — Você devia terolhado ontem. Eu sabia.

— Senhorita Fiona Castley, dePaloma, Três.

Olhei para minha mãe, que sorriu:— Muito bonita — comentou.— Senhorita America Singer, de

Carolina, Cinco.Ouvi a palavra Cinco e me dei conta

de que aquela era uma das escolhasaleatórias do meu pai. Nem conseguiver a foto, já que o meu plano eraapenas olhar na direção dos monitores esorrir.

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— Senhorita Mia Blue, de Ottaro,Três.

Era muita coisa para absorver.Memorizaria seus nomes e rostos maistarde, quando a nação inteira nãoestivesse vendo.

— Senhorita Celeste Newsome, deClermont, Dois.

Levantei as sobrancelhas, mesmo semver a foto dela. Se era Dois, devia seruma das importantes, então eu precisavaparecer impressionado.

— Clarissa Kelley, de Belcourt, Dois.Sustentei o sorriso enquanto a listagem

avançava, a ponto de minhas bochechas

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doerem. Só conseguia pensar o quantoaquilo era importante para mim — umagrande parte da minha vida estavatomando rumo agora — e eu nãoconseguia me sentir feliz. Se eu mesmotivesse sorteado os nomes de um sacoem uma sala fechada e visse seus rostossozinho, antes dos demais, as coisasseriam muito diferentes.

Aquelas garotas seriam minhas, a únicacoisa no mundo que poderia me dar essasensação.

Mas elas não eram.— Aí estão elas! — anunciou Gavril.

— Essas são as nossas belas candidatas

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para a Seleção. Ao longo da próximasemana, elas serão preparadas para aviagem ao palácio, e todosaguardaremos ansiosos por essa chegada.Sintonizem no noticiário da semana quevem, uma edição especial dedicadaexclusivamente a apresentar essasmulheres espetaculares. Príncipe Maxon— ele disse, voltando-se para mim —,meus parabéns. São jovens estonteantes.

— Estou sem palavras — comentei,absolutamente sincero.

— Não se preocupe, senhor. Estoucerto de que as garotas irão falar muitoquando chegarem na próxima sexta-

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feira.Gavril então encarou a câmera e

exclamou:— E você em casa, não se esqueça decar ligado nas últimas notícias da

Seleção aqui, no canal da rede pública.Boa noite, Illéa!

Tocaram o hino, apagaram as luzes, eeu finalmente pude relaxar.

Meu pai se levantou e deu umapalmada firme nas minhas costas.

— Bom trabalho. Você se saiuin nitamente melhor do que euesperava.

— Não faço ideia do que aconteceu.

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Ele riu, junto com um punhado deconselheiros que permaneciam noestúdio.

— Eu disse, lho, você é o prêmio.Não há motivo para estresse. Nãoconcorda, Amberly?

— Garanto, Maxon, que as moças têmmuito mais com que se preocupar doque você — minha mãe con rmou,acariciando meu braço.

— Exatamente — meu pai disse. —Estou morrendo de fome. Vamosdesfrutar das nossas últimas refeiçõestranquilas.

Levantei-me e comecei a caminhar

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devagar. Minha mãe acompanhou meupasso.

— Que confusão — sussurrei.— Vamos pegar as fotos e formulários

para você estudar à vontade. É comoconhecer qualquer outra pessoa. Encarea situação como se você fosse passar otempo com algum de seus outrosamigos.

— Não tenho muitos amigos, mãe.Ela deu um sorriso compreensivo.— Eu sei, camos um pouco

con nados aqui — concordou. — Bem,pense em Daphne.

— O que tem ela? — perguntei, um

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pouco impaciente.Minha mãe não notou.— É uma garota, e vocês sempre

foram amigos. Finja que é a mesmacoisa.

Olhei para a frente. Sem perceber,minha mãe aliviou um dos grandesmedos no meu coração, ao mesmotempo em que despertou outro.

Desde nossa briga, sempre quepensava em Daphne, não queria saber seela e Frederick estavam se dando bemou se eu sentia falta da sua companhia.Só conseguia pensar em suas acusações.

Se eu fosse apaixonado por ela, com

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certeza estaria pensando em todas as suasqualidades. Ou então, durante oprograma, enquanto Gavril anunciava asSelecionadas, eu teria desejado que seunome aparecesse ali de algum jeito.

Talvez Daphne tivesse razão, e eu eramesmo incapaz de demonstrar amor deverdade. Ainda que fosse o caso, estavacada vez mais certo de que não aamava.

Uma parte de mim se alegrou porsaber que eu não estava perdendo umaoportunidade. Poderia começar aSeleção de coração aberto. Só que outropedaço de mim lamentava. Se eu de

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fato não tivesse compreendido meussentimentos, ao menos poderia me gabarde um dia ter amado alguém, de terconhecido o amor. Mas eu ainda nãofazia ideia. Imaginei que essa fosse aintenção desde o início.

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No fim das contas, não vi osformulários. Tinha muitos motivos paranão fazer isso, mas o que me convenceude verdade foi achar que seria melhorcomeçarmos da estaca zero quando nosconhecêssemos. Além disso, se meu paihavia se preocupado tanto com osdetalhes de cada candidata, talvez eunão quisesse fazer a mesma coisa.

Mantive uma distância confortável

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entre mim e a Seleção... até o eventocruzar a minha porta.

Enquanto circulava pelo terceiroandar na sexta de manhã, ouvi o risomusical de duas garotas na escadariaprincipal do segundo andar. Uma vozempolgada exclamou:

— Você acredita que estamos aqui?— e ambas riram.

Soltei um palavrão e corri para ocômodo mais próximo. Haviam me ditoalgumas vezes que eu conheceria todasas garotas de uma só vez, no sábado.Não explicaram a importância disso,mas eu suspeitava que tinha a ver com a

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maquiagem. Se uma Cinco pusesse ospés no palácio sem qualquer ajuda...bom, eu acho que ela não teria grandeschances. Talvez isso deixasse as coisasmais justas. Saí discretamente do meuesconderijo e voltei para o quarto,tentando esquecer aquele episódio deuma vez.

Mas, de novo, enquanto eu caminhavapara deixar algo no escritório do meupai, ouvi a voz oscilante de uma garotaque eu não conhecia, causando umsobressalto por todo o meu corpo.Voltei para o quarto e limpeimeticulosamente todas as lentes da

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minha câmera, e organizei todo o meuequipamento. Pretendia me manterocupado até o cair da noite, quando eusabia que as garotas estariam em seusdormitórios e eu poderia circularlivremente.

Essa era uma das minhas característicasque dava nos nervos do meu pai. Eledizia que eu o deixava nervoso porandar tanto pra lá e pra cá. O que eupoderia fazer? Eu penso melhor de pé.

O palácio estava quieto. Se eu já nãosoubesse, não poderia adivinhar quetínhamos tamanha companhia. Talvez ascoisas não parecessem tão diferentes se

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eu não focasse nas mudanças.Enquanto caminhava até o m do

corredor, fui interrompido por vários “ese?” que me atormentavam. E se eu nãoconseguisse amar nenhuma das garotas?E se nenhuma delas me amasse? E seminha alma gêmea não tivesse sidoescolhida para participar, em favor deuma garota mais útil de sua província?

Sentei nos degraus da escada e apoiei acabeça sobre as mãos. Como eu poderiafazer isso? Como poderia encontraralguém que eu amasse, que me amasse,que meus pais aprovassem e o povoadorasse? Sem contar que ela precisava

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ser inteligente, atraente e talentosa;precisava ser alguém que eu poderiaapresentar a todos os presidentes eembaixadores com quem cruzássemos.

Repeti a mim mesmo que devia merecompor, e pensar nos “e se?”positivos. E se fosse maravilhosoconhecer essas garotas? E se todasfossem encantadoras, divertidas e lindas?E se exatamente a garota que euquisesse agradasse ao meu pai, superandotodas as nossas expectativas? E se meupar perfeito estivesse naquele momentodeitada em sua cama, desejando omelhor para mim?

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Talvez... Talvez a Seleção pudesse setornar tudo aquilo com que haviasonhado antes, quando ela ainda não eratão real. Era minha chance de encontraruma companheira. Por muito tempo,Daphne fora a única pessoa em quepodia con ar. Ninguém mais entendiabem nossas vidas. Mas, agora, eu poderiacompartilhar meu mundo com outrapessoa, e seria a melhor experiência detodas, porque... porque essa pessoa seriaminha.

E eu seria dela. Estaríamos semprejuntos. Ela seria para mim o que minhamãe é para meu pai: seu porto seguro, a

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calma que o mantém com os pés nochão. E eu poderia ser seu guia, seuprotetor.

Levantei e comecei a descer asescadas, con ante. Só precisava meagarrar a esse sentimento. Disse a mimmesmo aquilo que a Seleção seria paramim: esperança.

Já estava sorrindo quando cheguei aoprimeiro andar. Não estava exatamenterelaxado, mas determinado.

— ... sair — clamava uma voz frágil,que ecoava pelo corredor. O que estavaacontecendo?

— Senhorita, vá para seu quarto

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agora.Espiei o m do corredor e vi, graças à

luz da lua, um guarda bloqueando apassagem de uma garota — uma garota!— para o jardim. Estava muito escuro,então eu não pude distinguir muito bemsuas feições, mas seus cabelos eramvermelhos e brilhantes, como umamistura de mel, rosas e sol.

— Por favor.Sua angústia parecia crescer a cada

momento e seu corpo tremia. Então meaproximei, ainda tentando decidir o quefazer.

O guarda disse algo que não pude

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compreender. Continuei a avançar, sementender muito toda aquela cena.

— Eu... não consigo respirar — eladisse antes de cair nos braços do guarda,que precisou soltar seu bastão parasegurá-la. Ele parecia um poucoirritado.

— Deixem-na sair! — ordenei assimque cheguei até eles.

Danem-se as regras. Eu não podiapermitir que aquela garota sofressedaquela maneira.

— Ela desmaiou, Alteza — explicou oguarda. — Queria sair.

Eu sabia que os guardas estavam

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apenas tentando nos manter emsegurança, mas o que eu podia fazer?

— Abram as portas — ordenei.— Mas... Alteza...Encarei-o com o olhar sério.— Abram as portas e deixem-na sair.

Agora!— Imediatamente, Alteza.O guarda ao lado da porta a

destrancou. Notei então a moça oscilarnos braços do outro guarda, na tentativade se reerguer. Assim que as portas seabriram, uma lufada do vento morno edoce de Angeles nos envolveu. Quandoa moça sentiu o vento em seus braços,

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começou a se mexer.Cruzei a porta e observei-a cambalear

pelo jardim. Seus pés descalçosproduziam sons secos ao bater no chãode cascalho. Nunca havia visto umagarota de camisola antes. Embora aquelajovem em particular não estivesse muitograciosa no momento, ainda assim elame fascinava de um modo estranho.

Percebi que os guardas também aobservavam e fiquei incomodado.

— Voltem aos seus postos — disse emvoz baixa.

Os dois limparam a garganta eviraram-se de costas, para o corredor.

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— Fiquem aí até que eu os chame —instruí-os antes de avançar pelo jardim.

Mal podia vê-la, mas era capaz deouvi-la. Ela arfava; dando a impressãode estar soluçando. Tive esperança deque não fosse esse o caso. Por m, eladeixou-se cair sobre a grama, com acabeça e os braços apoiados em umbanco de pedra.

Ela não pareceu notar minhaaproximação, então esperei ali por unsmomentos até que ela levantasse oolhar. Depois de um tempo, comecei ame sentir um pouco constrangido.Imaginando que ela ao menos gostaria

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de me agradecer, tomei a palavra:— Está tudo bem, querida?— Eu não sou sua querida — ela

replicou, lançando um olhar de raiva.As sombras ainda a ocultavam, mas seucabelo brilhava ao facho de luar queescapara das nuvens.

Entretanto, rosto visível ou não, capteiplenamente suas intenções com aquelafrase. Onde estava a gratidão?

— O que eu z para ofender asenhorita? Por acaso não lhe deiexatamente o que queria?

Ela não respondeu. Deu-me as costase retomou o choro. Por que as mulheres

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demonstravam tamanha propensão àslágrimas? Não quis ser grosseiro, mastive que perguntar:

— Com licença, querida, mas vocêvai continuar chorando?

— Não me chame assim! Não soumais querida para você do que as outrastrinta e quatro estranhas que vocêmantém aqui nessa jaula.

Sorri comigo mesmo. Uma das minhasmaiores preocupações era a de queaquelas garotas tentassem o tempo todome mostrar suas virtudes, na tentativade me impressionar. Atormentava-me apossibilidade de passar semanas

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conhecendo uma garota, escolhê-la e,depois do casamento, descobrir umapersonalidade nova e insuportável.

E ali estava alguém que não dava amínima para quem eu era. Ela estavame dando uma bronca!

Caminhei ao seu redor enquantopensava em suas palavras. Perguntei amim mesmo se minha mania de circulara incomodava. Se sim, será que eladiria?

— Sua a rmação é falsa. Todas vocêssão queridas por mim.

Sim, eu estava tentando me esquivarde tudo relacionado à Seleção, mas isso

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não queria dizer que aquelas garotas nãofossem especiais aos meus olhos.

— Trata-se simplesmente de descobrirquem há de ser a mais querida —completei.

— Você disse mesmo “há de ser”? —perguntou ela, cética.

— Receio que sim — respondi comum risinho. — Perdoe-me. É fruto daminha educação.

Ela murmurou algo ininteligível.— Perdão?— É ridículo! — gritou.Céus, como ela era geniosa. Meu pai

não devia saber muito a seu respeito.

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Com certeza, nenhuma garota com taldeterminação entraria no grupo se elesoubesse. Sorte dela que fui eu — e nãoele — a vir ajudá-la. Ela já teria sidomandada para casa cinco minutos atrás.

— O que é ridículo? — indaguei,embora estivesse certo de que ela sereferia àquela situação. Nunca tinhavisto algo assim.

— O concurso! Tudo! Você nuncaamou ninguém na vida? É assim quequer escolher sua mulher? Você é baixoa esse ponto?

Aquilo doeu. Baixo? Sentei no bancopara facilitar a conversa. Queria que

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aquela garota — quem quer que elafosse — compreendesse o meu lado,como as coisas eram pela minhaperspectiva. Tentei não me distrair comas curvas da sua cintura, quadris epernas, ou mesmo com a aparência deseus pés descalços.

— Entendo que possa dar essaimpressão, que tudo possa ser vistocomo entretenimento barato — disse,concordando com a cabeça. — Masmeu mundo é muito fechado. Nãoconheço tantas mulheres. As poucas queconheço são lhas de diplomatas, egeralmente temos pouquíssimos assuntos

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em comum. Isso quando falamos amesma língua.

Sorri à lembrança dos momentosconstrangedores durante os longosjantares sentado ao lado de uma jovem aquem teria que fazer sala, mas comquem não podia conversar porque osintérpretes estavam ocupados tratandodos negócios. Olhei para a garota,esperando que ela risse comigo dosmeus problemas. Como seus lábios serecusaram a se mexer, limpei a gargantae continuei:

— Sendo essas as circunstâncias —disse, esfregando as mãos de nervosismo

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—, nunca tive a oportunidade de meapaixonar.

Ela pareceu se esquecer de que eu nãotinha autorização para me envolver comninguém até aquele momento. Fiqueicurioso. Na esperança de não estarsozinho, articulei minha pergunta maisíntima.

— E você?— Tive — ela respondeu, com uma

mistura de orgulho e tristeza na voz.— Então você teve muita sorte.Fixei o olhar na grama por uns

instantes. Prossegui, pois não queriaprolongar aquela situação que deixava

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clara a minha vergonhosa falta deexperiência.

— Minha mãe e meu pai se casaramassim e são muito felizes. Tenhoesperança de alcançar a felicidade, deencontrar uma mulher que toda a Illéapossa amar, alguém que possa ser minhacompanheira e me ajude a receber oslíderes de outras nações. Alguém queseja amiga dos meus amigos e minhacon dente. Estou pronto para encontrarminha esposa.

Até eu notava o desespero, aesperança e o desejo em minha voz. Adúvida voltou a se insinuar. E se

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ninguém ali pudesse me amar?“Não”, disse a mim mesmo, “isto vai

dar certo.”Observei a garota, que à sua maneira

também parecia desesperada.— Você realmente acha que aqui é

uma jaula?— Sim, eu acho — retrucou. E

acrescentou, um segundo depois: —Majestade.

Achei graça.— Eu mesmo já pensei nisso mais de

uma vez. Mas você deve admitir que éuma jaula muito bonita.

— Para você — ela emendou

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rapidamente. — Encha sua jaula commulheres brigando pela mesma coisa eveja que legal é.

— Mas já ocorreram discussões porminha causa? Será que vocês nãopercebem que sou eu que faço aescolha?

Não sabia se devia me sentir animadoou preocupado. Em todo caso, erainteressante pensar nisso. Talvez, se euconhecesse uma moça que me desejassemuito, acabaria desejando-a também.

— Na verdade, não é bem assim. Elasbrigam por duas coisas. Algumas porvocê, outras pela coroa. E todas pensam

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já saber o que falar e fazer para que suaescolha seja óbvia.

— Ah, sim. O homem ou a coroa.Receio que algumas não saibam ver adiferença — comentei, balançando acabeça e baixando o olhar para a grama.

— Boa sorte com isso — foi seucomentário cômico.

Só que não havia nada cômico nasituação. Era a confirmação de outro dosmeus maiores temores. Mais uma vezfui vencido pela curiosidade, emborativesse certeza de que ela mentiria.

— E você, pelo que luta?— Na verdade, estou aqui por

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engano.— Engano?Como era possível? Se ela tinha se

inscrito, se fora escolhida e viera porlivre e espontânea vontade...

— É, mais ou menos. Bem, é umalonga história...

Uma história que eu precisariaconhecer mais cedo ou mais tarde.

— ... Estou aqui. E não estou lutando.Meu plano é aproveitar a comida atévocê me chutar — completou.

Não pude evitar. Explodi emgargalhadas. Aquela garota era a antítesede tudo o que esperava. Até ser

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chutada? Estava ali pela comida? Porincrível que pareça, eu estava gostandodaquilo tudo. Talvez as coisas fossemsimples como minha mãe dissera; euconheceria as candidatas aos poucos,como tinha sido com Daphne.

— O que você é? — perguntei. Elanão devia ser mais do que Quatro, vistoseu entusiasmo pela comida.

— Como? — ela perguntou, sementender o que eu quis dizer.

Não quis insultá-la, de modo quecomecei pelo alto.

— Dois? Três?— Sou Cinco.

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Então essa era uma das Cinco. Sabiaque meu pai não caria muito feliz emsaber da minha gentileza com ela, masfoi ele quem a deixou entrar, afinal.

— Ah, sim. Então a comida deve serum bom motivo para ficar.

Soltei mais uma risada e tenteidescobrir o nome daquela jovem tãodivertida.

— Sinto muito, não consigo ler seubroche no escuro.

Ela inclinou levemente a cabeça. Parao caso de ela perguntar por que eu nãosabia seu nome ainda, comecei a pensaro que soaria melhor: uma mentira —

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dizer que tinha muito trabalho e nãohavia conseguido memorizar todos osnomes — ou a verdade — dizer queestava tão nervoso com toda a situaçãoque adiei aquilo até o último segundo.

Que, por acaso, tinha acabado depassar.

— Meu nome é America.— Muito bem, perfeito — disse, com

um sorriso. Se dependesse do nome, nãoacreditava que ela pudesse servir. Era onome do antigo país, uma nação teimosae problemática que transformamos emalgo mais forte. Mas, pensando bem,talvez tenha sido esse o motivo de meu

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pai deixá-la entrar: para mostrar quenão tinha medo ou preocupações comnosso passado, mesmo que os rebeldes seapegassem tolamente a ele.

Para mim, a palavra tinha um quêmusical.

— America, minha querida, esperomuito que encontre algo nesta jaula porque valha a pena lutar. Depois de tudoisso, não posso deixar de imaginar comoseriam as coisas se você realmente seesforçasse.

Levantei do banco, ajoelhei-me a seulado e tomei sua mão. Felizmente, seuolhar estava xo em nossos dedos, não

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em meus olhos. Se ela visse meu rosto,notaria como quei boquiaberto quandoeu en m a vi pela primeira vez. Asnuvens se abriram no momento exato, ea lua iluminou completamente seurosto. E como se não bastasse ela sercapaz de me enfrentar e não ter medode ser ela mesma, America tinha umabeleza impressionante.

Sob seus cílios grossos surgiam olhosazuis como o gelo, uma cor fria parabalancear as chamas de seus cabelos.Suas bochechas eram macias e estavamum pouco coradas por causa do choro.Seus lábios, suaves e rosados, abriram-se

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um pouco enquanto ela inspecionavanossas mãos.

Senti uma palpitação estranha no meupeito, como a luz de uma lareira ou ocalor da tarde. Aquela sensaçãopermaneceu alguns momentos comigo,brincando com as batidas de meucoração.

Critiquei a mim mesmo mentalmente.Que previsível era eu car tãoencantado pela primeira garota pela qualtinha autorização de nutrir algumsentimento. Era tolice, rápido demaispara ser verdade. Expulsei o calor demim. Ao mesmo tempo, porém, não

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queria dispensá-la. O tempo diria se elaera digna de estar no páreo.Evidentemente, America era alguémque eu precisaria conquistar, e issolevaria tempo. Mas eu começarianaquele exato momento.

— Se isso a deixar feliz, possoinformar aos funcionários que vocêprefere car no jardim. Assim, vocêpode vir aqui à noite sem serincomodada pelos guardas. No entanto,acho que seria bom se houvesse sempreum deles por perto.

Eu não precisava importuná-larevelando a frequência dos ataques

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rebeldes. Se ela mantivesse um guardapor perto, ficaria bem.

— Não... não sei se quero algo quevenha de você — ela soltou a mãogentilmente e cravou os olhos na grama.

— Como quiser.Fiquei um pouco decepcionado. Que

coisa horrível eu teria feito para que elame rejeitasse daquele jeito? Talvezaquela garota fosse inconquistável.

— Você vai voltar para dentro daqui apouco?

— Sim — sussurrou.— Então vou deixá-la com seus

pensamentos. Haverá um guarda perto

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da porta esperando.Queria que ela tivesse o tempo que

fosse necessário, mas temia que umataque inesperado ferisse alguma dasmeninas — mesmo aquela, que parecianutrir uma verdadeira aversão a mim.

— Obrigada, errr... Alteza.Sua voz deixava entrever certa

vulnerabilidade, e então percebi que oproblema talvez não fosse eu. Talvez elasó estivesse sobrecarregada com todos osacontecimentos a seu redor. Comoculpá-la por isso? Decidi me exporoutra vez à rejeição.

— Querida America, você poderia

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me fazer um favor? — perguntei,tomando novamente sua mão. Ela melançou um olhar cético. Algo em seusolhos me dizia que ela procurava averdade em mim, e que não desistiriaaté conseguir.

— Talvez.Seu tom me deu esperanças e abri um

sorriso.— Não conte isso às outras.

Tecnicamente, não devo conhecê-lasaté amanhã. Não quero irritar ninguém.

Funguei um pouco, e logo mearrependi. Às vezes, minha risada era apior.

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— Embora não possa dizer que seusgritos tenham qualquer semelhança comum encontro romântico, não acha? —concluí.

En m America sorriu para mim,brincalhona.

— Nem de longe! — disse, paradepois respirar fundo e a rmar: — Nãocontarei.

— Obrigado.Deveria ter me contentado com seu

sorriso e ido embora. Mas algo em mim— talvez minha criação, sempre voltadaa avançar, a conquistar — me forçava adar um passo a mais. Ergui sua mão até

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meus lábios e beijei-a.— Boa noite.Parti antes que ela tivesse chance de

me criticar ou que eu zesse qualquerburrice.

Quis olhar para trás e ver sua reação,mas seria incapaz de suportar se medeparasse com qualquer indício dedesgosto. Se meu pai pudesse ler meuspensamentos naquele momento, cariabastante insatisfeito. Àquela altura,depois de tudo, eu precisava ser maisduro.

Ao chegar à porta, dirigi-me aosguardas:

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— Ela precisa de um tempo sozinha.Se não entrar em meia hora, peçam-lhedelicadamente para entrar.

Olhei ambos nos olhos para ter certezade que haviam captado a mensagem.

— Também seria conveniente quevocês evitassem falar disso com aspessoas. Entendido?

Os dois zeram que sim com acabeça, e eu segui para a escadariaprincipal. Enquanto caminhava, ouvium dos guardas cochichar:

— O que significa “conveniente”?Soltei um suspiro e continuei a subir

as escadas. Quando cheguei ao terceiro

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andar, praticamente corri até meuquarto. Eu dispunha de uma imensasacada, que dava para os jardins. Nãoarrisquei sair e ser pego no agra,espionando, mas fui até as portas devidro e puxei a cortina.

America permaneceu lá por cerca dedez minutos, e foi acalmando-se aospoucos. Observei-a secar o rosto, limpara camisola e entrar. Considerei apossibilidade de dar um pulo até ocorredor para que nos encontrássemosoutra vez “sem querer querendo”. Maspensei melhor. Ela estava nervosa eprovavelmente fora de si. Se eu queria

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ter ao menos uma chance, teria queesperar pelo dia seguinte.

O dia seguinte... quando trinta equatro outras garotas seriam postasdiante de mim. Ah, como fui burro deesperar tanto. Fui até a minha mesa edesenterrei a pilha de chas para estudaras fotos delas. Não sei quem teve a ideiade pôr os nomes no verso, eracompletamente inútil. Peguei umacaneta e transcrevi os nomes na frente.Hannah, Anna... Como seria capaz dedecorar tudo aquilo? Jenna, Janelle,Camille... Sinceramente? Seria umdesastre. Precisava aprender pelo menos

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alguns nomes. De resto, con aria nosbroches até memorizar todos.

Porque eu ia conseguir fazer isso. Edireito. Era minha obrigação. Precisavaprovar que podia ser um líder e tomardecisões. Do contrário, quem con ariaem mim como futuro rei? Como opróprio rei confiaria em mim?

Detive-me nos destaques. Celeste...Lembrei-me do nome. Um dos meusconselheiros mencionara que ela eramodelo e até chegou a me mostrar umafoto dela de maiô nas páginas reluzentesde uma revista. Tratava-seprovavelmente da candidata mais sexy,

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e eu certamente não a julgaria mal porcausa disso. Lyssa saltou aos meus olhos,mas não de uma maneira positiva. A nãoser que ela tivesse uma personalidadecampeã, não estava no páreo. Talvezfosse uma atitude medíocre da minhaparte, mas era tão ruim assim quererisso? Ah, Elise. Pelos traços exóticos deseus olhos, ela devia ser a garota quemeu pai disse ter familiares na NovaÁsia. Só por isso já era forte na disputa.

America.Detive-me sobre sua foto. Seu sorriso

era absolutamente radiante.O que lhe fez abrir um sorriso tão

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luminoso naquele dia? Eu? Será que ossentimentos que nutria por mim naqueledia — fossem quais fossem — já tinhampassado? Ela não pareceu muito feliz emme conhecer. Mas... até que sorriu aofinal.

Recomeçaria com ela pela manhã. Eunão sabia bem o que buscava, masmuito do que me parecia certo estavapresente naquela foto. Talvez sua forçade vontade ou sua honestidade; talvez apele suave das costas de sua mão ou seuperfume... O que eu sabia com certezaé que queria que ela gostasse de mim.

Como exatamente conseguiria isso?

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Segurei a gravata azul. Não. Acreme? Não. Será que todos os dias euteria esse trabalho para me vestir?

Queria passar uma boa primeiraimpressão às garotas — e uma boasegunda impressão a uma delas —, eaparentemente estava convencido deque tudo dependia de escolher a gravatacerta. Deixei escapar um suspiro.Aquelas garotas já estavam me

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transformando em um poço deestupidez.

Tentei seguir o conselho da minhamãe e ser eu mesmo, com os defeitos etudo. Escolhi a primeira gravata quetinha pego, terminei de me vestir eajeitei o cabelo para trás.

Saí do quarto e dei com meus paiscochichando junto à escadaria.Considerei a possibilidade de ir pelaescada dos fundos, para não osinterromper, mas minha mãe fez umgesto para que me aproximasse.

Assim que cheguei até eles, minhamãe começou a esconder as mangas da

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minha camisa e me virou de costas paraajeitar a parte de trás do paletó.

— Lembre-se de que elas estão comos nervos à or da pele — ela disse. —O melhor a fazer é deixá-las se sentindoem casa.

— Aja como um príncipe — insistiumeu pai. — Lembre-se de quem vocêé.

— Não há pressa para decidir —minha mãe comentou, e tocou minhagravata. — Bela escolha.

— Mas não mantenha aqui ninguémque não queira. Quanto mais rápidochegarmos às verdadeiras candidatas,

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melhor.— Seja educado.— Seja confiante.— Apenas converse.Meu pai bufou.— Isso não é uma brincadeira.

Lembre-se disso.Minha mãe se distanciou um pouco

para me olhar de cima a baixo.— Você vai ser ótimo.Em seguida, ela me puxou para si e

me abraçou. Depois se afastou de novopara ajeitar minha roupa.

— Muito bem, lho. Vá em frente —meu pai disse, apontando para as

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escadas.— Estaremos à sua espera na sala de

jantar.Senti uma tontura.— Ah, sim. Obrigado.Fiz uma breve pausa para tomar

fôlego. Sabia que eles queriam ajudar,mas conseguiram desmantelar toda atranquilidade que eu havia construído.Repetia a mim mesmo que se tratavaapenas de um olá, e que as garotastinham as mesmas expectativas que eu.

E então me lembrei de queencontraria America mais uma vez. Nomínimo, seria divertido. Com isso em

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mente, avancei escada abaixo rumo aoprimeiro andar e ao Grande Salão.Respirei fundo e bati à porta antes deabri-la.

Lá, atrás dos guardas, o bando degarotas me esperava. Os ashes dascâmeras espocavam à medida que cadareação minha e delas era captada. Sorripara seus rostos esperançosos. Fiqueimais calmo só de notar que todaspareciam contentes por estar ali.

— Majestade.Olhei para trás e me deparei com

Silvia, que terminava sua reverência.Quase me esquecera de que ela estaria

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presente para instruir as garotas sobre oprocedimento, como zera comigoquando eu era mais jovem.

— Olá, Silvia. Se não se importa,gostaria de me apresentar a essas jovens.

— Absolutamente — ela disse quasesem fôlego, antes de fazer uma novareverência. Às vezes ela era tãodramática.

Inspecionei os rostos em busca do fogodaqueles cabelos. Demorou um pouco,por causa da distração que o brilho depraticamente todos os pulsos, pescoços eorelhas do salão causava. A nal aencontrei, em uma das leiras mais ao

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fundo; ela me olhava de um jeitodiferente das outras. Sorri, mas em vezde devolver o gesto ela pareceu confusa.

— Senhoritas — comecei —, se nãolhes incomodar, chamarei cada uma devocês para me conhecerindividualmente. Estou certo de queestão com fome, assim como eu, demodo que não tomarei muito do seutempo. Por favor, perdoem-me sedemorar para gravar seus nomes. É quehá muitas de vocês.

Algumas riram. Fiquei feliz porperceber que era capaz de identi carmais garotas do que tinha imaginado.

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Caminhei em direção à jovem na pontada primeira leira, e estendi a mão. Elaa tomou entusiasmada, e ambos fomospara os sofás que eu sabia que estavam láexatamente para aquele fim.

Infelizmente, Lyssa não era maisatraente pessoalmente do que na foto.Ainda assim, ela merecia o benefício dadúvida, então conversamos mesmoassim.

— Bom dia, Lyssa.— Bom dia, Alteza.Ela abriu um sorriso tão largo quequei com a impressão de que suas

bochechas deviam doer.

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— O que está achando do palácio?— É lindo. Nunca vi algo tão lindo.

Aqui é muito lindo. Poxa, já tinha ditoisso, né?

Respondi com um sorriso.— Está tudo bem. Fico feliz por você

estar tão encantada. O que você faz emcasa?

— Sou Cinco. Toda a minha famíliatrabalha exclusivamente com esculturas.Há estátuas incríveis aqui. Muito lindas.

Tentei ngir interesse, mas ela não meempolgava nem um pouco. Ainda assim,não podia abrir mão de uma delas semum bom motivo.

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— Obrigado. Hum, quantos irmãosvocê tem?

Após alguns minutos de conversa emque ela usou a palavra lindo não menosdo que doze vezes, sabia que não haviamais nada que eu queria saber sobreaquela menina.

Era o momento de seguir em frente,mas sabia que seria crueldade mantê-laali sabendo que não havia chancealguma para nós. Decidi que começariaa fazer os cortes já no salão. Seria maisjusto com as garotas. E talvezimpressionasse o meu pai. A nal, elequeria que eu zesse algumas escolhas

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de verdade na vida.— Lyssa, muito obrigado por seu

tempo. Assim que eu terminar de falarcom todas, você poderia car um poucomais para conversarmos de novo?

Ela corou.— Com certeza.Levantamos. Eu me sentia péssimo por

ela ter entendido errado meu pedido.— Poderia chamar a próxima moça,

por favor? — pedi.Ela fez que sim com a cabeça e

inclinou o corpo em uma reverência,para depois chamar a moça ao seu lado.Reconheci de imediato que se tratava

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de Celeste Newsome. Um homemprecisava ser muito tapado paraesquecer aquele rosto.

— Bom dia, senhorita Celeste.— Bom dia, Alteza — ela disse,

fazendo uma reverência.Sua voz era doce, e logo me dei conta

de que muitas daquelas garotas podiamme deixar fascinado. Talvez aquelapreocupação de não amar nenhumadelas não fosse o verdadeiro problema.Talvez eu caria apaixonado por todaselas e seria incapaz de escolher.

Apontei-lhe o assento à frente domeu.

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— Parece que você é modelo.— Sim — ela respondeu animada,

radiante por ver que eu já sabia algosobre ela. — Principalmente de roupas.Dizem que tenho um bom corpo paraisso.

Naturalmente, essas palavras melevaram a conferir o tal corpo. Nãohavia como negar que era incrível.

— Gosta do seu trabalho?— Ah, sim. É fantástico como a

fotogra a consegue capturar uma fraçãode segundo de algo maravilhoso.

Fiquei animado.— Com certeza. Não sei se você sabe,

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mas eu sou um grande fã de fotografia.— É mesmo? Precisamos fazer uma

sessão de fotos um dia desses.— Seria ótimo.Ah, as coisas estavam indo melhor do

que o esperado. Em dez minutos eu jáhavia eliminado uma candidataabsolutamente sem chances, eencontrado outra com um interessecomum.

Poderia ter continuado com Celestepor mais uma hora, mas se quiséssemoscomer, eu realmente precisava meapressar.

— Minha querida, sinto muito

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interromper nossa conversa, mas precisoconhecer todas esta manhã —justifiquei-me.

— Claro.Ela levantou-se e prosseguiu:— Estou ansiosa para terminar nossa

conversa. Espero que em breve.O jeito que ela me olhou... Não sabia

explicar. Fiquei vermelho na hora, demodo que precisei abaixar um pouco acabeça para esconder a cor das minhasbochechas. Tive que respirar fundoalgumas vezes para me concentrar napróxima garota.

Bariel, Emmica, Tiny e tantas outras

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passaram batidas. Até o momento, amaioria tinha se mostrado agradável ebem portada. Só que eu esperava muitomais que isso.

Foram necessárias mais cinco garotasaté que algo realmente interessanteacontecesse. Quando dei um passo paracumprimentar a morena esbelta quevinha na minha direção, ela estendeu amão.

— Olá, meu nome é Kriss.Olhei para sua mão aberta e estava a

ponto de apertá-la quando ela recuou.— Ah, não! Era para eu ter feito uma

reverência — o que ela fez, balançando

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a cabeça inconformada enquantolevantava.

Eu ri.— Me sinto tão idiota. Fui capaz de

errar a coisa mais básica.Seu sorriso ofuscou a gafe, e devo

reconhecer que era bem charmoso.— Não se preocupe, minha querida

— assegurei, enquanto indicava seuassento. — Já fizeram muito pior.

— Mesmo? — sussurrou, empolgadacom a notícia.

— Não darei detalhes, mas sim. Pelomenos você tentou ser educada.

Seus olhos se arregalavam à medida

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que ela inspecionava as outras moças,imaginando quem teria sido grossacomigo. Fiquei feliz por ter optado peladiscrição, já que alguém me chamara de“baixo” na noite anterior, e ninguémpoderia saber disso.

— Então, Kriss, me conte sobre suafamília.

Ela deu de ombros.— Normal, acho. Vivo com minha

mãe e meu pai, e ambos são professoresuniversitários. Às vezes penso emlecionar também, embora erte com aliteratura. Sou lha única, condição quesó agora começo a aceitar melhor. Por

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anos implorei por um irmão aos meuspais. Eles nunca quiseram.

Sorri. Era difícil ser sozinho.— Tenho certeza de que queriam

concentrar todo o amor em você.Ela achou graça.— Foi isso que os seus pais lhe

disseram?Congelei. Ninguém ainda havia feito

uma pergunta sobre mim.— Bom, não exatamente. Mas

entendo sua sensação — contornei.Estava a ponto de retomar as questões

que havia preparado quando ela foi maisrápida.

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— Como está se sentindo hoje?— Tudo bem. Um pouco

sobrecarregado — deixei escapar, talvezcom honestidade demais.

— Pelo menos não precisa usarvestidos — ela comentou.

— Mas pense em como seria divertidose eu os usasse.

Ela soltou uma gargalhada e eu mejuntei a ela. Imaginei Kriss ao lado deCeleste, comparando-as. Kriss tinha umar muito positivo. Terminei nossaentrevista sem formar uma ideiacompleta dela, uma vez que ela sempreme punha no foco da conversa. Mas

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notei que era uma pessoa boa, namelhor acepção da palavra.

Passou-se quase uma hora até chegar avez de America. No intervalo entre asprimeiras garotas e ela, eu já haviaconhecido três candidatas bem fortes —Celeste e Kriss entre elas, as quais eusabia que seriam as preferidas dopúblico. Porém, a garota logo antes deAmerica estava tão longe de servir paramim que acabou por apagar essas boasimpressões. Quando America selevantou e veio em minha direção, era aúnica pessoa que eu tinha em mente.

Algo em seus olhos revelava certa

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malícia, proposital ou não. Pensei no seucomportamento na noite anterior epercebi que ela era uma revoluçãoambulante.

— America, certo? — brinqueiquando ela se aproximou.

— Sim, sou eu. E sei que já ouvi seunome antes, mas poderia refrescarminha memória?

Achei graça e a convidei para sentar.Inclinei-me para ela e sussurrei:

— Você dormiu bem, minha querida?Seu olhar me dizia que eu estava

brincando com fogo, mas seus lábiostraziam um sorriso.

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— Ainda não sou sua querida. Masdormi. Assim que me acalmei, dormimuito bem. Minhas criadas tiveram queme derrubar da cama. Estavaconfortável demais — ela confessou essaúltima parte como se fosse um segredo.

— Fico feliz em saber que você estavaconfortável, minha... — ah, eu precisavaromper com essa mania ao lidar com ela— ... America.

Deu para notar que ela gostou do meuesforço.

— Obrigada.O sorriso então sumiu do seu rosto e

ela se entregou aos seus próprios

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pensamentos, enquanto mordia o lábio edava voltas com as palavras em suacabeça.

— Mil desculpas por ter sido grossa —ela disse a nal, desviando os olhos dosmeus. — Enquanto eu tentava dormir,tomei consciência de que, embora asituação me pareça estranha, não possoculpá-lo. Não é sua culpa que eu tenhame metido em tudo isso, e essa históriade Seleção não é ideia sua.

Que bom que alguém percebeu.— Além disso — continuou —, você

me tratou com simpatia naquelemomento de dor, enquanto eu fui, bem,

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péssima.Ela balançou a cabeça para si mesma e

eu senti meu coração acelerar.— Poderia ter me expulsado ontem

mesmo, mas não o fez. Obrigada —concluiu.

Sua gratidão me comoveu, porque eusabia que ela estava muito longe de sermentirosa. E isso me levou a um temaque eu teria que abordar se quisessefazer algum progresso. Inclinei-me aindamais em sua direção, apoiei os cotovelossobre os joelhos, em uma postura mais àvontade e mais intensa da que adotaracom as outras.

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— America, você tem sido muitosincera comigo até agora. É umaqualidade que admiro profundamente.Vou pedir-lhe que responda umapergunta, se não for um incômodo.

Ela aquiesceu com a cabeça, emborahesitasse.

— Você diz que está aqui por engano.Isso me faz supor que não quer car. Háalguma possibilidade de nutrir qualquertipo de... sentimento amoroso por mim?

A sensação foi de que ela brincou comas ondas em seu vestido por horas antesde responder. Aguentei aquiloconvencido de que ela não queria

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parecer afoita demais.— Vossa Majestade é muito gentil —

Sim. — e atraente... — Sim! — eatencioso — SIM!

Eu sorria feito um idiota, isso eracerto, de tão feliz que estava por saberque ela havia visto algo positivo emmim depois da noite passada.

Ela continuou em um tom de vozmais baixo:

— Mas tenho motivos muitopertinentes para achar que não.

Pela primeira vez, agradeci meu paipor ter me treinado a não perder acompostura. Soei bastante razoável ao

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perguntar:— Poderia explicá-los?Ela hesitou novamente.— Acho... acho que meu coração está

em outro lugar.E as lágrimas despontaram em seus

olhos.— Por favor, não chore! — implorei

em voz baixa. — Nunca sei o que fazerquando as mulheres choram!

Ela riu da minha falta de jeito elimpou o canto dos olhos. Fiquei felizem vê-la assim, aliviada e autêntica. Éclaro que havia alguém à sua espera.Uma garota tão real fatalmente seria

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logo arrebatada por um jovem esperto.Eu não conseguia imaginar como elatinha vindo parar no palácio, mastampouco aquilo era problema meu.

Tudo o que sabia era que, mesmo seela não fosse se tornar minha, gostaria dedeixá-la com um sorriso no rosto.

— Você quer que eu lhe deixe voltarpara seu amado hoje? — propus.

Ela abriu um sorriso amarelo.— Esse é o problema... Não quero ir

para casa.— Mesmo?Recostei-me na poltrona e passei a

mão no cabelo enquanto ela ria mais

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uma vez de mim.Se America não queria estar comigo

nem com o outro, então o que queria?— Posso ser totalmente sincera com

você?Por favor. Fiz que sim.— Preciso car aqui. Minha família

precisa de mim aqui. Mesmo que medeixasse car apenas uma semana, jáseria uma dádiva para eles.

Então ela não lutava pela coroa, maseu ainda possuía algo que lheinteressava.

— Você quer dizer que precisa dodinheiro?

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— Sim.Pelo menos ela teve a decência de se

envergonhar.— Também há... certas pessoas na

minha província — prosseguiu com umolhar cheio de signi cado — que eu nãoaguentaria ver no momento.

Precisei de um segundo para me darconta do sentido daquilo tudo. Os doisnão estavam mais juntos. Ela aindagostava dele, mas ele não lhe pertenciamais. Assenti com a cabeça diante dasituação. Se eu pudesse escapar daspressões do meu mundo por umasemana, certamente faria o mesmo.

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— Se me permitir car, mesmo quepor pouco tempo, podemos fazer umtrato.

Eis uma coisa interessante!— Um trato?O que diabos ela poderia me dar em

troca?Ela mordeu os lábios.— Se me deixar car... — ela fez uma

pausa e respirou. — Tudo bem, veja só.Você é o príncipe. Fica ocupado o diainteiro ajudando a administrar o país etal, e agora tem que encontrar tempopara escolher uma entre trinta e cinco,ou melhor, trinta e quatro garotas. É

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pedir muito, não acha?Embora soasse como uma piada, ela

acertou em cheio as minhaspreocupações, com uma precisãoabsoluta. Concordei com suas palavras.

— Não acha que seria muito melhorse tivesse alguém aqui dentro? Alguémpara ajudar? Tipo... uma amiga?

— Uma amiga?— Sim. Se me deixar car, posso

ajudar. Serei sua amiga. Não precisa seincomodar em correr atrás de mim. Jásabe que não sinto nada por você. Maspode falar comigo a qualquer momentoe tentarei ajudar. Ontem à noite você

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disse que estava em busca de umacon dente. Bem, posso ser essa pessoaenquanto não encontrar a de nitiva. Sequiser...

Se eu quiser... Eu não parecia ter muitaopção, mas ao menos poderia ajudaraquela garota. E talvez desfrutar umpouco mais de sua companhia. E, claro,meu pai caria pasmo se soubesse queeu usava uma das garotas para talnalidade... o que me fez gostar muito,

mas muito mais daquela proposta.— Conheci quase todas as garotas

deste salão e não penso em outra queseria uma amiga melhor que a senhorita.

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Será um prazer deixá-la ficar.Notei a tensão se desfazer em seu

corpo. Apesar de saber que seu carinhoestava fora de meu alcance, não podiadeixar de tentar.

— Você acha que eu ainda possochamá-la de “minha querida”? —perguntei em tom de provocação.

— Sem chance — cochichou.Não sei se ela estava falando sério ou

não, mas tomei suas palavras como umdesafio.

— Continuarei tentando. Nãocostumo desistir.

A expressão em seu rosto parecia

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quase irritada, mas não era bem isso.— Você chamou todas de “minha

querida”? — perguntou apontando parao resto das garotas com a cabeça.

— Sim, e todas parecem ter gostado— respondi com ar alegre e orgulhoso.

O desafio ainda estava presente em seusorriso quando ela falou:

— É exatamente por isso que eu nãogostei.

America se levantou, pondo m àentrevista. Não pude deixar de carimpressionado com ela mais uma vez.Nenhuma das outras quis acabar logocom a conversa. Inclinei a cabeça, gesto

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que ela retribuiu com uma reverênciamalfeita antes de seguir seu caminho.

Sorria comigo mesmo pensando emAmerica. Comparava-a com as outras.Ela era linda, ainda que um poucorústica. Era uma beleza incomum, epude reparar que ela não tinhaconsciência disso. Ela não parecia ternenhum ar de realeza, embora talvezhouvesse algo de nobre em seu orgulho.E, claro, ela não nutria qualquer desejopor mim. Ainda assim, não conseguiame livrar do impulso de ir atrás dela.

E foi assim que a Seleção me prestouseu primeiro favor: com America no

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palácio, eu teria a chance de tentar.

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A atmosfera de Angeles estava

tranquila. Permaneci imóvel por unsinstantes, ouvindo o som da respiraçãode Maxon. Estava cada vez mais difícilencontrá-lo em um momento calmo efeliz de verdade. Aproveitei aquelaocasião ao máximo, agradecendo por eleestar, aparentemente, em sua melhorforma enquanto estávamos a sós.

Desde que a Seleção conta com só seis

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garotas, ele tem estado mais ansioso queno começo, quando as trinta e cincochegaram de uma vez. Imaginei quetalvez ele tivesse pensado que teria maistempo para fazer suas escolhas. E devoreconhecer, apesar de me sentirculpada, que era por minha causa queele tinha esse desejo.

Príncipe Maxon, herdeiro do trono deIlléa, gostava de mim. Ele me falou nasemana passada que se eu dissesse, semnenhuma ressalva, que me importavacom ele assim como ele se preocupavacomigo, toda essa história decompetição estaria acabada. Eu até

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considerava essa ideia, ficava imaginandocomo seria pertencer a Maxon.

Mas o problema é: Maxon não mepertencia, para começo de conversa.Havia mais outras cinco meninascomigo — meninas com quem ele saíae cochichava coisas —, e eu não sabia oque pensar disso. E também havia o fatode que aceitar Maxon significava ter queaceitar uma coroa, uma ideia que eutendia a ignorar, até por não saber aocerto como isso me afetaria...

E, claro, havia Aspen.Tecnicamente, ele não era mais o

meu namorado — terminou comigo

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antes de o meu nome ser sorteado paraa Seleção —, mas quando surgiu nopalácio como um dos guardas, todos ossentimentos que eu tinha tentado deixarpara trás encheram meu coração. Aspenera meu primeiro amor. Bastava olharpara ele para saber... que eu era dele.

Maxon não sabia que Aspen estava nopalácio, mas sabia bem que haviaalguém da minha província que eudesejava esquecer, e estava, muitogentilmente, dando-me tempo parasuperar a situação enquanto tentavaencontrar outra pessoa com quem elepudesse ser feliz, caso eu nunca fosse

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capaz de amá-lo.Conforme ele mexia a cabeça

devagar, respirando sobre meus cabelos,eu pensava: como seria se eusimplesmente amasse Maxon?

— Sabe quando foi a última vez queolhei de verdade para as estrelas? —perguntou ele.

Estávamos deitados sobre uma toalhano jardim. Aconcheguei-me mais para olado dele, tentando me manter aquecidanaquela noite fria de Angeles.

— Não faço ideia.— Um tutor me fez estudar

astronomia há alguns anos. Quando

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vemos as estrelas mais de perto,percebemos que na verdade elas têmcores diferentes.

— Calma lá. A última vez que vocêolhou para as estrelas foi para estudá-las?E a diversão?

Maxon riu.— Diversão. Vou ter que espremê-la

entre as votações do orçamento e asreuniões do comitê de infraestrutura.Ah, e a de nição das estratégiasmilitares, no que, aliás, eu sou péssimo.

— E no que mais você é péssimo? —perguntei, passando a mão em suacamisa engomada.

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Meu carinho encorajou Maxon amudar de posição e fazer pequenoscírculos em meu ombro.

— Por que quer saber isso? —perguntou, fingindo irritação.

— Porque ainda sei tão pouco sobrevocê. E você parece ser perfeito emtudo. É bom ter uma prova docontrário.

Ele se apoiou sobre um cotovelo efixou os olhos no meu rosto:

— Você sabe que não sou.— Mas está quase lá — respondi.Nossos corpos se tocavam de leve.

Joelhos, braços, dedos.

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Maxon balançou a cabeça com umsorriso nos lábios.

— O.k., o.k. Não consigo planejarguerras. Sou péssimo nisso. E acho queseria um cozinheiro horrível. Nuncacozinhei, logo...

— Nunca?— Talvez você já tenha notado a

multidão de pessoas que trabalham paramanter a sua barriga cheia de bolos edoces... Por acaso, são eles que mealimentam também.

Achei graça. Em casa, eu ajudava apreparar praticamente todas as refeições.

— Mais — pedi. — No que mais

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você é ruim?Ele me abraçou forte, e pude ver um

segredo brilhar em seus olhos castanhos.— Descobri uma coisa

recentemente...— Conte.— Descobri que sou um completo

fracasso em car longe de você. Umproblema muito grave.

Sorri.— Você já tentou?Maxon fingiu pensar.— Bem, não. E não espere que eu vá

começar.Rimos baixo, abraçados. Era tão fácil,

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nesses momentos, me imaginar assimpelo resto da vida.

O farfalhar das folhas e da gramaanunciava a chegada de alguém. Emboranossa situação fosse completamenteaceitável, quei um pouco encabulada eme sentei rapidamente. Maxon fez omesmo assim que o guarda contornou acerca para chegar até nós.

— Alteza — disse, inclinando acabeça. — Perdão pela intromissão,senhor, mas é imprudente permanecerdo lado de fora por muito tempo a essahora da noite. Os rebeldes podem...

— Compreendo — concordou

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Maxon, com um suspiro.— Já entraremos.O guarda nos deixou, e Maxon virou-

se para mim.— Outro defeito meu: estou perdendo

a paciência com os rebeldes. Estoucansado de lidar com eles.

Maxon se levantou e me ofereceu amão. Segurei a mão dele e reparei nafrustração em seus olhos. Passamos pordois ataques de rebeldes desde ocomeço da Seleção: um dos nortistas,que eram apenas baderneiros, e outrodos sulistas, que eram assassinos. Mesmocom minha experiência mínima, eu

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podia compreender seu cansaço.Maxon recolheu a toalha e começou a

sacudi-la. Era claro que ele não estavafeliz com aquele m antecipado danoite.

— Ei — eu disse, fazendo-o olhar emmeus olhos. — Eu me diverti.

Ele concordou com a cabeça.— É sério — continuei, me

aproximando. Ele segurou a toalha comuma das mãos e passou o braço livre emvolta da minha cintura. — Devíamosfazer isso outras vezes. Você podia medizer quais são as cores de cada estrela,porque eu realmente não consigo ver

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diferença de uma para outra.Maxon sorriu, triste.— Gostaria que as coisas fossem mais

fáceis às vezes. Normais.Virei para ele e o abracei. Maxon

soltou a toalha e retribuiu o gesto.— Odeio ter que lhe revelar isso,

Alteza, mas mesmo sem os guardas vocêestá bem longe de ser normal.

Sua expressão cou mais relaxada, masainda séria.

— Você iria gostar mais de mim se eufosse normal — falou.

— Sei que é difícil para vocêacreditar, mas eu realmente gosto de

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você do jeito que você é. Só preciso demais...

— Tempo. Eu sei. E estou prontopara dar o tempo necessário a você. Sógostaria de ter certeza de que você vaimesmo querer estar ao meu ladoquando esse tempo acabar.

Desviei o olhar. Aquilo eu não podiaprometer. Toda hora, eu olhava para omeu coração e comparava Maxon eAspen, mas nenhum deles se sobressaía.A não ser, talvez, quando eu estavasozinha com um deles. Neste exatomomento, por exemplo, eu estavatentada a prometer a Maxon que caria

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a seu lado no final.Mas eu não podia.— Maxon — sussurrei, após notar que

ele estava se sentindo rejeitado por eunão ter respondido. — Não posso dizerisso. Mas o que posso dizer é que queroestar com você. Quero saber se hápossibilidade de... de... — gaguejei, semsaber ao certo como me expressar.

— Nós? — Maxon sugeriu.Sorri, feliz por ver como tinha sido

fácil para ele me entender.— Sim — prossegui. — Quero saber

se há a possibilidade de existir um“nós”.

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Ele ajeitou meus cabelos para trás dosombros.

— Penso que as chances são bem altas— afirmou, sem rodeios.

— Também penso. Só... tempo, tudobem?

Maxon fez que sim com a cabeça.Parecia mais feliz. Era assim que euqueria terminar nossa noite, comesperança. Bem, talvez com algo mais.Mordi os lábios e me virei para ele comolhos desejosos.

Sem hesitar nem um segundo, ele seinclinou e me beijou. Foi um beijoterno e suave, que me deixou com a

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sensação de ser adorada, e com vontadede outro. Eu poderia ter cado ali porhoras, só para ver se conseguia aplacaraquela sensação, mas Maxon recuoucedo demais.

— Vamos — disse ele em tom debrincadeira, enquanto me puxava para opalácio. — Melhor entrar antes de osguardas virem atrás de nós com cavalose lanças.

Assim que Maxon me deixou nasescadas, o cansaço tomou conta de mim.Eu praticamente me arrastava até osegundo andar e ao canto onde estavameu quarto quando, de repente, quei

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totalmente desperta de novo.— Ah! — disse Aspen, também

surpreso em me ver. — O fato de euter pensado que você estava no seuquarto esse tempo todo provavelmentefaz de mim o pior guarda do mundo.

Sorri. As garotas da Elite eramobrigadas a dormir com pelo menosuma de suas criadas no quarto. Eu nãogostava muito da ideia, de modo queMaxon insistiu em manter um guarda devigia à minha porta para o caso de umaemergência. O problema era que, namaioria das vezes, esse guarda eraAspen. Saber que quase todas as noites

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ele estaria bem ali na minha porta medava uma sensação estranha de alegriamisturada com terror.

Aquela tranquilidade momentânealogo desvaneceu quando Aspen se deuconta de por que eu não estava sã esalva enrolada nos cobertores. Elelimpou a garganta, tenso:

— Vocês se divertiram?— Aspen — cochichei, olhando em

volta para ter certeza de que ninguémestava perto —, não que bravo. Façoparte da Seleção e as coisas são assim.

— E como eu vou ter chance dessejeito, Meri? Como posso competir com

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ele se você raramente fala com osguardas como eu?

Fazia sentido, mas o que eu podiafazer?

— Por favor, não se irrite comigo,Aspen. Estou tentando resolver tudoisso.

— Não, Meri — ele disse, retomandoa voz terna de antes. — Não estouirritado com você. Eu tenho saudade devocê.

Ele não ousou pronunciar as palavras,mas seus lábios se mexeram: “eu teamo”.

Me derreti.

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— Eu sei — respondi, pondo a mãoem seu peito e me permitindo esquecerpor um instante tudo o que estávamosarriscando ali. — Só que isso não mudao lugar onde estamos nem o fato de euser da Elite agora. Preciso de tempo,Aspen.

Ele ergueu a mão até a minha eassentiu com a cabeça.

— Isso eu posso dar. Só... tenteencontrar um tempo para mim também.

Eu não queria começar a explicarcomo isso seria difícil. Apenas abri umsorrisinho antes de recolher a mão.

— Preciso ir.

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Ele me observou caminhar até oquarto e fechar a porta.

Tempo. Eu vinha pedindo muitotempo ultimamente. Tinha a esperançade que, se tivesse tempo su ciente, tudoia se resolver.

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— Não, não — respondeu a rainhaAmberly, rindo. — Tive apenas trêsmadrinhas apesar de a mãe de Clarksonter sugerido que eu tivesse mais. Sóqueria minhas irmãs e minha melhoramiga, que, por acaso, eu conhecidurante a Seleção.

Estiquei o pescoço para olhar paraMarlee e quei feliz de ver que elatambém me olhava. Antes de chegar ao

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palácio, eu tinha para mim que em umacompetição com um prêmio tão grandenão haveria como alguma das meninasser simpática. Marlee me acolheu logoque nos conhecemos. Desde então,sempre estamos juntas. Nunca brigamos,a não ser aquelas nossas pequenasdiscussões.

Umas semanas atrás, Marlee comentouque talvez não quisesse car comMaxon. Quando a pressionei paraexplicar melhor aquilo, ela se fechoutotalmente. Não estava brava comigo —isso eu sabia —, mas aqueles dias desilêncio me deixaram bem solitária.

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— Quero sete madrinhas — disseKriss. — Quer dizer, se Maxon meescolher e tiver um supercasamento.

— Bom, eu não quero madrinhas —replicou Celeste. — Elas só servem paradesviar a atenção dos outros. E comotudo vai ser televisionado, quero todosos olhares voltados para mim.

Aquilo me subiu o sangue. Eram rarasas vezes que conseguíamos conversarcom a rainha Amberly, e lá estavaCeleste: a praga que arruinava omomento.

— Eu gostaria de incorporar algumastradições da minha cultura ao casamento

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— acrescentou Elise, com a voz calma.— As garotas da Nova Ásia usamvermelho na cerimônia, e o noivoprecisa levar presentes para os amigos danoiva como agradecimento pordeixarem-na se casar com ele.

— Me lembre de ir no seu casamento.Adoro presentes! — soltou Kriss.

— Eu também! — exclamou Marlee.— Senhorita America, você está tão

calada — disse a rainha Amberly. — Oque deseja para o seu casamento?

Eu estava completamentedespreparada para responder, minhasbochechas coraram.

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Só tinha imaginado um tipo decasamento na minha vida, e eleaconteceria no Posto de Serviços daprovíncia da Carolina depois de umasessão de burocracia.

— Bem, só pensei no momento emque meu pai me entrega ao noivo. Sabequando ele toma sua mão e põe na mãodo seu futuro marido? É a única partepor que eu sempre quis passar deverdade. — Por mais embaraçoso queaquilo pudesse parecer, era a verdade.

— Mas todo mundo faz isso —reclamou Celeste. — Não é nemoriginal.

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Deveria ter cado com raiva depoisdessa provocação, mas dei de ombros:

— Quero ter certeza de que meu paiaprova totalmente a minha escolha noúnico momento realmente importanteda minha vida.

— Que bonito — comentou Natalieenquanto bebia chá e olhava pela janela.

A rainha Amberly soltou uma leverisada:

— Tenho certeza de que aprovará.Não importa quem seja.

Essa última frase foi ditarepentinamente, como se a rainhativesse percebido no meio da fala a sua

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sugestão de que Maxon seria oescolhido.

Fiquei pensando se ela achava isso, seMaxon contara a ela sobre nós.

Logo depois, o assunto do casamentomorreu, e a rainha nos deixou para irtrabalhar em seu quarto. Celesteestacionou em frente àquele televisorenorme e as outras garotas começaram ajogar cartas.

— Foi divertido — disse Marlee,enquanto nos sentávamos à mesa. —Acho que nunca tinha visto a rainhafalar tanto.

— Ela está começando a se empolgar,

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acho. — Eu não tinha comentado comninguém o que a irmã da rainhaAmberly me dissera sobre as muitastentativas frustradas da rainha de teroutro lho. Adele tinha previsto que airmã seria mais carinhosa conosco assimque o grupo diminuísse, e acertou.

— O.k., você tem que me contar:você não tem mesmo nenhum outroplano para o seu casamento ou apenasnão queria revelar?

— Não tenho mesmo — assegurei. —É difícil para mim planejar umcasamento tão grande, sabe? Sou umaCinco.

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Marlee balançou a cabeça.— Você era uma Cinco. Agora é

Três.— Certo — concordei, lembrando do

meu novo rótulo.Nasci em uma família de Cincos —

artistas e músicos que geralmenteganhavam mal — e, embora odiasse osistema de castas, gostava do que faziapara ganhar a vida. Era estranho pensarem mim como uma Três, imaginar umacarreira de professora ou escritora.

— Chega de estresse — falou Marlee,como se pudesse ler meus pensamentos.— Você não precisa se preocupar com

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isso ainda.Eu estava a ponto de contrariá-la,

quando fui interrompida por um gritode Celeste.

— Vai! — berrou, batendo o controleremoto no sofá antes de apontá-lo para atv de novo. — Argh!

— É impressão minha ou ela estápiorando? — cochichei com Marlee.Observamos Celeste bater no controleremoto de novo e de novo até desistir emudar de canal manualmente. Comeceia achar que, se eu tivesse nascido umaDois, aí sim teria com que mepreocupar.

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— Acho que é estresse — Marleecomentou. — Você notou comoNatalie tem estado, sei lá... maisdistante?

Fiz que sim com a cabeça, e olhamospara as três meninas jogando cartas.Kriss sorria ao embaralhar as cartas,enquanto Natalie examinava as pontasde seu cabelo e de vez em quandoarrancava um o. Ela tinha um ardistraído.

— Acho que todas nós estamossentindo isso — confessei. — Ficou maisdifícil relaxar e curtir o palácio agoraque o grupo é tão pequeno.

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Celeste resmungou algo e nos viramospara olhá-la, mas logo voltamos àposição inicial quando ela nos pegouespiando.

— Licença — disse Marlee, mudandode lugar. — Acho que vou ao banheiro.

— Pensei na mesma coisa. Vamosjuntas? — propus.

Com um sorriso, ela balançou acabeça para negar.

— Vai na frente. Vou terminar o cháprimeiro.

— Tudo bem. Já volto.Saí do Salão das Mulheres,

caminhando devagar por aquele

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corredor magní co. Eu duvidava quealgum dia chegaria a me acostumar como espetáculo que era aquele castelo.Estava tão distraída que, ao dobrar umaesquina, trombei com um guarda.

— Ops! — exclamei.— Perdão, senhorita. Espero não tê-la

assustado.Ele me segurou pelos cotovelos para

que eu recuperasse o equilíbrio.— Não — a rmei, rindo. — Está

tudo bem. Eu devia olhar melhor poronde ando. Obrigada por me segurar,soldado...

— Woodwork — completou, fazendo

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uma breve reverência com a cabeça.— Eu sou America.— Eu sei.Sorri e suspirei. É claro que ele sabia.— Bom, espero que da próxima vez

que nos trombarmos seja apenas nosentido figurado — brinquei.

— Positivo. Tenha um bom dia,senhorita — ele respondeu.

— Você também.Voltei e contei a Marlee sobre a

minha trombada vergonhosa com osoldado Woodwork. Avisei a ela paraolhar por onde anda. Ela soltou umagargalhada.

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Passamos o resto da tarde sentadasperto das janelas, conversando sobre asnossas casas e as outras garotas ebebendo chá sob a luz do sol.

Era triste pensar no futuro. Cedo outarde, a Seleção chagaria ao m, eembora eu soubesse que Marlee e eucontinuaríamos próximas, sentiria faltade conversar com ela todos os dias. Elafoi a primeira amiga de verdade que zna vida e gostaria de tê-la sempre aomeu lado.

Enquanto eu tentava curtir aquelemomento, Marlee olhava pela janelacom um ar sonhador. Tentei imaginar

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no que ela estaria pensando, mas estavatudo tão sereno que não quis perguntar.

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Copyright © 2013 by Kiera CassTodos os direitos reservados. O selo Seguinte pertence à Editora Schwarcz S.A. Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da LínguaPortuguesa de 1990,que entrou em vigor no Brasil em 2009. título original The Princepreparação Nathália Dimambrorevisão Juliane Kaori e Larissa Lino Barbosaisbn 978-85-8086-682-7 Todos os direitos desta edição reservados àeditora schwarcz s.a.

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Sumário

CapaO príncipe Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6A elite Capítulo 1

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Capítulo 2Créditos

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