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1 O processo de Materização (ou técnica de produção) do microvídeo digital para a internet 1 Daniela Borges da Silva Melo Déborah Ramos de Oliveira Thome Maria Evanilda Tomé Valença Willian Thiago de Almeida RESUMO O presente texto aborda sobre o processo de masterização (ou técnica de produção) da ferramenta microvídeo educacional, tendo como fundamento básico a “teoria cognitiva de aprendizagem multimídia”, de Richard Mayer, por meio da qual, se apresenta os princípios norteadores para a produção de um material multimídia (no caso, o microvídeo), princípios esses, que garantem a apresentação bem estruturada da mensagem, fazendo jus aos três grandes eixos das tecnologias digitais contemporâneas: conectividade, convergência e mobilidade. Como suporte ao tema foco - técnica de produção do microvídeo educacional - o texto também reflete sobre a necessária inovação do processo educativo via tecnologias digitais, sobre as tecnologias móveis, a aprendizagem com mobilidade e microconteúdo, bem como sobre políticas implementadoras de inovação da educação por intermédio dos Recursos Educacionais Abertos (REA) e da centralidade na formação docente, entendendo tais políticas como promotoras da tão necessária autonomia e da autoria docente e discente. Palavras-chave: Inovação Educativa - Microvídeo Educacional – Masterização – REA - Centralidade docente Introdução O presente texto aborda sobre o uso da ferramenta microvídeo como apoio ao ensino/aprendizagem, tendo em vista a relevância do microconteúdo para fins educativos e enquanto mediação informal específica de um conteúdo formal mais amplo. A pretensão é a de refletir sobre os cuidados com a produção de microvídeos educacionais, enquanto objeto de aprendizagem digital interativa. Mais especificamente, o texto enfoca o trabalho de masterização (ou técnica de produção) desta ferramenta na internet, por meio dos “princípios orientadores” de uma apresentação bem estruturada da mensagem, fazendo jus aos três grandes eixos das tecnologias digitais contemporâneas, quando se trata do microvídeo digital: conectividade, convergência e mobilidade. A pertinência do tema se justifica pelo fato de os conceitos “microvídeo”, “microconteúdo” e “aprendizagem com mobilidade” estarem, aos poucos, sendo introduzidos nos debates educacionais, por força da associação desses conceitos às tecnologias móveis. A 1 Artigo, cuja produção foi resultado de um trabalho de pesquisa sobre o “processo de masterização do vídeo e o microvídeo na internet”, desenvolvido durante o curso da disciplina “Desenvolvimento de Conteúdo Educacional baseado na TV Digital Interativa”, ministrada pelo professor Sérgio Ferreira do Amaral, no primeiro semestre de 2015, do curso de Pós-Graduação Stricto Senso, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP.

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O processo de Materização (ou técnica de produção) do microvídeo digital

para a internet1

Daniela Borges da Silva Melo

Déborah Ramos de Oliveira Thome

Maria Evanilda Tomé Valença

Willian Thiago de Almeida

RESUMO O presente texto aborda sobre o processo de masterização (ou técnica de produção) da ferramenta microvídeo educacional, tendo como fundamento básico a “teoria cognitiva de aprendizagem multimídia”, de Richard Mayer, por meio da qual, se apresenta os princípios norteadores para a produção de um material multimídia (no caso, o microvídeo), princípios esses, que garantem a apresentação bem estruturada da mensagem, fazendo jus aos três grandes eixos das tecnologias digitais contemporâneas: conectividade, convergência e mobilidade. Como suporte ao tema foco - técnica de produção do microvídeo educacional - o texto também reflete sobre a necessária inovação do processo educativo via tecnologias digitais, sobre as tecnologias móveis, a aprendizagem com mobilidade e microconteúdo, bem como sobre políticas implementadoras de inovação da educação por intermédio dos Recursos Educacionais Abertos (REA) e da centralidade na formação docente, entendendo tais políticas como promotoras da tão necessária autonomia e da autoria docente e discente. Palavras-chave: Inovação Educativa - Microvídeo Educacional – Masterização – REA - Centralidade docente Introdução

O presente texto aborda sobre o uso da ferramenta microvídeo como apoio ao

ensino/aprendizagem, tendo em vista a relevância do microconteúdo para fins educativos e

enquanto mediação informal específica de um conteúdo formal mais amplo. A pretensão é a de

refletir sobre os cuidados com a produção de microvídeos educacionais, enquanto objeto de

aprendizagem digital interativa. Mais especificamente, o texto enfoca o trabalho de masterização (ou

técnica de produção) desta ferramenta na internet, por meio dos “princípios orientadores” de uma

apresentação bem estruturada da mensagem, fazendo jus aos três grandes eixos das tecnologias

digitais contemporâneas, quando se trata do microvídeo digital: conectividade, convergência e

mobilidade.

A pertinência do tema se justifica pelo fato de os conceitos “microvídeo”,

“microconteúdo” e “aprendizagem com mobilidade” estarem, aos poucos, sendo introduzidos

nos debates educacionais, por força da associação desses conceitos às tecnologias móveis. A

1Artigo, cuja produção foi resultado de um trabalho de pesquisa sobre o “processo de masterização do vídeo e o microvídeo na internet”, desenvolvido durante o curso da disciplina “Desenvolvimento de Conteúdo Educacional baseado na TV Digital Interativa”, ministrada pelo professor Sérgio Ferreira do Amaral, no primeiro semestre de 2015, do curso de Pós-Graduação Stricto Senso, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP.

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geração de jovens estudantes dos dias atuais, também conhecida como “nativos digitais”, mostra-

se receptiva a conteúdos e/ou informações veiculadas em microvídeos, sendo, portanto, uma

oportunidade a ser aproveitada, a fim de proporcionar a essa juventude aprendizagem mais

produtiva. Assim, o tema “microvídeo educacional” possui relevância de estudos, pois, se bem

planejado, produzido e executado, responderá apropriadamente a uma das demandas da

contemporaneidade: a aprendizagem informal e flexível de conteúdos de informação curta e

específica, mais direcionados à complementação e/ou fixação de um conteúdo mais amplo.

Para dar conta do proposto, a fundamentação teórica do tema abordará sobre questões da

inovação na educação, das tecnologias digitais interativas como umas das possibilidades desta

inovação e, em especial, do papel do vídeo e do microvídeo, como importante objeto de

aprendizagem de microconteúdos. Nesse âmbito, a fundamentação também refletirá sobre os

conceitos “tecnologia digital móvel”, “aprendizagem com mobilidade” e, logicamente, sobre os

conceitos de “microvídeo” e “microconteúdo”. Como base nesses fundamentos, apresenta-se, na

sequência, uma reflexão sobre os parâmetros necessários a um projeto (ou técnica) de

masterização vídeos/microvídeos educacionais, à luz da “teoria cognitiva de aprendizagem

multimídia”, de Richard Mayer, por meio da qual, se apresenta os princípios norteadores para a

produção de um material multimídia. Com vistas a sinalizar alguns apontamentos futuros,

apresentam-se, também, algumas reflexões sobre o desafio da concretização do uso das novas

tecnologias digitais em sala de aula, incluindo o vídeo e o microvídeo.

Por fim, esperamos que as reflexões desenvolvidas neste estudo possam, de forma

particular, contribuir para a reflexão maior em prol da necessária relação intercambiante das

novas tecnologias digitais com o processo educativo.

1. Fundamentos Teóricos

1.1. Inovação na Educação e Novas Tecnologias Digitais

O mundo contemporâneo têm vivenciado aceleradas transformações, de modo que os

fenômenos apresentados à sociedade tornam-se rapidamente velhos, provocando o surgimento

de novos paradigmas, os quais produzem novas ideias, novas formas de vida e novas

necessidades. Toda essa avalanche de transformações acaba por apresentar novas demandas às

diferentes esferas da sociedade, dentre elas, a educação. Esta, por sua vez, tem tido como maior

desafio a incorporação do discurso e da prática da inovação, dentre os vários motivos, para se adaptar aos

novos modos de aprender e ensinar dos jovens estudantes de nossa época.

Conforme Maldonato e Dell’ Orco (2010, p 5), historicamente, o termo “inovação” tem

ocupado espaço nas discussões dos economistas, significando “a capacidade de administrar o

conhecimento para gerar vantagens competitivas mediante a produção de novos bens, processos

e sistemas organizacionais”. Entretanto, esses mesmos autores argumentam que, em dias atuais, é

relevante somar aí as “incidências sociais”, de modo que as melhorias possam reconhecidas por

toda a comunidade. Nesse contexto, defendem que a “inovação” deve ser definida como “uma

capacidade de a mente inferir significados inusitados a partir de informações aparentemente

banais”, além de “produzir respostas divergentes e criativas” (Ibid, p. 6), tendo como aspecto

fundamental a resistência ao conformismo e o posicionamento de ideias próprias. Assim,

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segundo eles, é “a diferença que está na base de toda adaptação inovadora”, pois a natureza

humana, ao mesmo tempo em que manifesta uma “tendência para a conservação”, também se

mostra adepta ao “fascínio pela novidade, pela mudança”, atrelando ao conceito de inovação, a

capacidade de encarar a realidade com um olhar insólito, que extrapola o senso comum.

(MALDONATO; DELL’ ORCO, 2010, p. 7). Isso significa defender o pensamento inovador

como aquele capaz de acolher saberes e ações que se entrecruzam e se contrapõem, sempre

voltado para perspectivas à frente de seu tempo, com atitude sempre aberta às transformações, às

descobertas, bem como aos questionamentos e desafios.

Mas como se dá a inovação na educação? Logicamente, em função de sua abrangência, há

várias possibilidades de se inovar nesta área. Maldonato e Dell’ Orco (2010), por exemplo,

apontam, como primeiro passo para inovação na educação, a necessidade de a escola abandonar a

rigidez demasiada de suas ações pedagógicas, políticas e administrativas, em prol de uma

educação flexível e responsável, que traga para si o compromisso pela busca do conhecimento,

tanto com produção de sentidos, quanto com autonomia individual. Para fazer frente a essa

necessidade, a escola deverá se “reinventar”, isto é, passar por um processo de transformação, de

uma prática centralizadora, transmissiva e ditatorial para um fazer pedagógico interativo,

colaborativo e comprometido com o aprendizado, via mediação instigadora do professor. Outra

possibilidade de inovação do processo educativo encontra-se no domínio e manejo adequado da

tecnologia digital, contemplada pelas Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (NTICs),

juntamente com a internet. Trata-se, neste contexto, de pensar o uso das tecnologias disponíveis

no sentido de criar novos espaços para a educação e, desse modo, promover a equidade, isto é, o

senso de justiça e de igualdade para todos. Nesse sentido, trata-se de uma tecnologia como aquela

defendida por Amaral (2015)2, isto é, capaz de contribuir para que o aluno, efetivamente, aprenda, a fim de

aumentar as capacidades humanas. Segundo este autor (idem), uma primeira medida a ser tomada

nessa direção deverá ser a de diferenciar “tecnologia digital para fins de uso em sala de aula” de

“tecnologia digital criada para a navegação”: esta é mais abrangente e, portanto, deve ser

considerada neste seu sentido amplo, para fins educacionais amplos; aquela, está direcionada ao

seu uso em sala de aula, com fins mais restritos e propriamente educativos.3

Neste contexto, a inovação na educação, por meio das tecnologias digitais interativas,

supõe um professor que seja capaz de manejar competentemente a tecnologia digital macro (fins

educacionais) para saber reinventar o seu fazer pedagógico micro, particular (fins educativos).

Entretanto, a concretização do fazer pedagógico particular auxiliado pela tecnologia digital ampla,

só ocorrerá, de fato, mediante tomada de consciência, por parte das instituições e dos

professores, do impacto que o domínio e manejo dessas ferramentas podem provocar no

processo de ensino/aprendizagem. Logicamente, se estamos nos referindo a uma tecnologia cujo

maior propósito é fazer com o que o sujeito aprenda, esta deverá se constituir em muito mais que

mero artefato instrumental, ou seja, deverá ultrapassar o simples uso da técnica pela técnica.

2 Anotações de aula, na disciplina “Desenvolvimento de Conteúdo Educacional baseado na TV Digital Interativa”, ministrada pelo professor Sérgio Ferreira do Amaral, no primeiro semestre de 2015, do curso de Pós-Graduação Stricto Senso, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. 3 Tal diferenciação se faz necessária, pois, apesar de a tecnologia digital ampla e navegável possuir um excesso de material disponível, estes, em grande parte, são carentes de conteúdos de qualidade e que possam ter fins educativos específicos para a sala de aula.

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A esse respeito, fazem-se importantes algumas considerações. Prensky (2010) denomina os

jovens estudantes da atualidade como “nativos digitais”, pois já nasceram com a internet e,

portanto, já trazem em si um conjunto de traços diferenciados das gerações anteriores, traços

esses, próprios e condizentes ao mundo da tecnologia digital e tudo que a envolve. Por conta

dessa nova realidade, esses estudantes apresentam modos de aprender diferentes dos até então

estabelecidos. Ou seja, em vez da absorção mecânica e submissa, os jovens nativos digitais

expressam interesse por formas de aprendizagem significativas, com recursos diversificados de

comunicação, com ambientes que oportunizem a práxis do fazer, a interação colaborativa e a

interatividade. Desse modo, é também intrínseco dessa geração desenvolver as práticas do

“aprender a conhecer” e do “aprender a fazer” (DELORS, 1998), utilizando-se, simultaneamente,

do computador e da internet, bem como das demais mídias disponibilizadas (mídia impressa,

musical, telefônica, jogos, etc.).

Isso requer a reinvenção do fazer pedagógico, já que juntamente com os aprendizes nativos

digitais surge uma nova concepção do aprender e do ensinar. O maior desafio tem sido, portanto,

o da construção de um novo professor capaz de responder a essa nova realidade. Para alguns

autores, o desafio é árduo, porque as dificuldades já começam no fato dos docentes continuarem

“desconectados e mesmo resistentes” às NTICs, por conta do despreparo para conviver e lidar

com elas, uma vez que não são nativos digitais (DEMO, 2011, p. 15), além de que “o preparo

dos docentes brasileiros para a utilização das mídias e dos objetos digitais como materiais

didático-pedagógicos ainda é incipiente”. (SERAFIN; SOUSA, 2011, p. 27). Como já dito, o

problema está justamente no fato de o saber criar e reinventar possibilidades tecnológicas com

fins educativos não se referir apenas a uma questão de uso ou domínio meramente técnico das

novas tecnologias digitais. Muito mais que isso, é necessário que os professores compreendam e

saibam lidar com essa nova cultura de aprendizagem para, assim, ser capaz ressignificar

competentemente novas possibilidades do “ensinar”. Nos termos de Amaral (2015) 4, o entrave

responsável por toda essa problemática encontra-se no fato de a relação “educação” e “novas

tecnologias digitais” ser ainda concebida por uma visão dualista, isto é, numa relação de oposição

e não de interface colaborativa. Para essa visão, as NTICs funcionam apenas como complemento

da educação, como se uma estivesse desconectada outra. Ao contrário, em uma época na qual

nossos jovens estudantes são nativos digitais, é preciso pensar as novas tecnologias digitais como

algo inerente ao processo educativo, algo que, por conta das demandas contemporâneas,

naturalmente já lhe faz parte. Justamente por isso, vale a defesa de Serafim e Sousa (2011, p. 21 e

22), de que a aprendizagem desenvolvida numa relação de interface com a informática não deve

ser confundida com aquelas “confusas formas de se utilizar o computador numa concepção de

reprodução do ensino enciclopédico [...]”. Argumentam esses autores que, se desenvolvida de

forma adequada, a integração das atividades escolares com a multimídia pode gerar muitas

vantagens, dentre elas: a) “dinamização e ampliação das habilidades cognitivas, devido à riqueza

de objetos e sujeitos com os quais permitem interagir”; b) “a possibilidade de extensão da

memória e de atuação em rede”; c) “a democratização de espaços e ferramentas, pois estas

facilitam o compartilhamento de saberes, a vivência colaborativa, a autoria, co-autoria (sic),

4 Ver nota 2.

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edição e a publicação de informações, mensagens, obras e produções culturais tanto de docentes

como discentes”. (SERAFIM; SOUSA, 2011, p. 22).

Tudo isso se consegue com autonomia para agir, acompanhada da autoria e/ou coautoria.

Segundo Bakhtin (2010), quando o sujeito se posiciona criticamente frente a algo, isto é, com

atitude dialógica responsiva, compromete-se responsavelmente com este objeto alvo, tornando-se,

também, um pouco seu autor e/ou seu coautor. Assim, a atitude responsiva tem como maior

fruto a conquista da autonomia no processo de construção do conhecimento. Autonomia que se

refere, conforme Freire (1996), à maturidade do sujeito/aluno em saber fazer suas escolhas, à sua

capacidade de apropriar-se do conhecimento culturalmente produzido, (re)construindo-se. É

nesse sentido que todo e qualquer projeto educativo que se diz comprometido com a real

aprendizagem de seus alunos e, por meio dela, a busca da atitude responsiva, deve estar

empenhado em também transformar seu aluno em gerenciador de si próprio e de seu processo de

aprendizagem, atitude essa, que lhe garantirá a conquista de autonomia como aprendiz.

Toda essa reflexão vem ao encontro das ideias de Serafim e Sousa (2011, p. 21), os quais

defendem que a inserção das novas tecnologias digitais no cotidiano da vida social acabou

cedendo lugar à “multimídia na educação baseada em produção e desenvolvimento, autoria e

potencialidade”. E, neste cenário, destaca-se o uso do vídeo digital como uma das ferramentas tecnológicas

com possibilidade de inovação pedagógica, assunto que será abordado no próximo tópico.

1.2. O vídeo digital e suas possibilidades tecnológicas de inovação na educação

Cardoso (2013) argumenta sobre o fato de, no mundo atual, a palavra impressa ter cada

vez mais cedido espaço à imagem. Segundo ele, em desafio à escola que tradicionalmente tem

privilegiado a linguagem verbal (oral/escrita), “a cultura audiovisual, principalmente a televisiva,

bombardeia o jovem no seu cotidiano por outras linguagens que o seduzem, pois atingem mais o

nível sensorial do que o cognitivo, condicionando o modo como o jovem constrói seu discurso

de forma distanciada da lógica formal ensinada pela escola”. (CARDOSO, 2013, p. 79 e 80).

Com base nessa realidade, Cardoso apresenta um estudo sobre o uso do vídeo como recurso

digital com fins educativos, com o intuito de sugerir formas de aumentar a possibilidade

conversacional dessa ferramenta e, com isso, diminuir a passividade da audiência comum a esse

tipo de recurso. Para desenvolver esse estudo, Cardoso fundamenta-se em vários defensores da

imagem, como recurso pedagógico. Assim, ele reflete sobre as ideias de Wohlgemuth (2005), o

qual atribui à comunicação audiovisual a capacidade de superar a multiplicidade das formas de

expressão em contextos de diversidades étnicas e de linguagem, além de superar as barreiras

produzidas pela dispersão populacional e pelo analfabetismo. Ele também faz referência às ideias

de Burmark (2002), estudiosa defensora do conceito de alfabetização visual, por meio da imagem

veiculada principalmente pelos vídeos. Segundo essa autora, os vídeos reproduzem as melhores

imagens, porque congrega, sinergicamente, “som, música, movimento e palavras”; isso possibilita

“o endereçamento de diferentes tipos de aprendizado alcançando todo aprendiz, aumentando o

foco de atenção do estudante, possibilitando o aprendizado mais rápido, eficaz e uma melhor

memorização.” (BURMARK, 2002, apud CARDOSO, 2013, p. 82).

Também não podemos deixar de citar Moran, grande estudioso e incentivador do vídeo

em sala de aula, como auxílio pedagógico e, portanto, para muito além de mero lazer e descanso.

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Para esse autor (1995, p. 1), o vídeo é importante porque, dentre outras coisas, “aproxima a sala

de aula do cotidiano, das linguagens de aprendizagem e comunicação da sociedade”. Moran

argumenta que um dos sentidos mais explorados pelo vídeo é o “ver entrecortado”, isto é, com

múltiplos recortes da realidade - através dos planos - e muitos ritmos visuais: “imagens estáticas e

dinâmicas, câmera fixa ou em movimento, uma ou várias câmeras, personagens quietos ou

movendo-se, imagens ao vivo, gravadas ou criadas no computador”. Além disso, ele afirma que o

ver também apoia-se no falar, numa forma multilinguística do contar, e isso aproxima o vídeo do

cotidiano comunicativo comum das pessoas. Mas, Moran (Ibid, p. 2) acrescenta que “o vídeo é

também escrita [...] , fixando ainda mais a significação atribuída à narrativa falada”. Em seus

termos, “os textos, legendas, citações aparecem cada vez mais na tela, principalmente nas

traduções (legendas de filmes) e nas entrevistas com estrangeiros”. Enfim, argumenta Moran, o

vídeo nos seduz porque “é sensorial, visual, linguagem falada, linguagem musical e escrita.

Linguagens que interagem superpostas, interligadas, somadas, não separadas”. Sua força

encontra-se justamente aí: porque ele nos atinge “por todos os sentidos e de todas as maneiras”.

(MORAN, 1995, p. 2).

Assim, mediante a pergunta se há possibilidade real de se aprender algo, reter conteúdo e

desenvolver habilidades, a partir de um vídeo instrucional/educacional, Cardoso, baseado em

Novak (2010), responde que este poderá funcionar como “importante ferramenta de auxilio à

aprendizagem”, se estiver inserido num contexto de interação. (NOVAK, 2010, apud

CARDOSO, 2013, p. 81).

1.3. Tecnologia Digital Móvel, Aprendizagem com Mobilidade, Microvídeo e

Microconteúdo

Vivemos em uma época em que os modos de comunicar e informar, somados à pesquisa e

à aprendizagem, independem do compartilhamento físico e presencial, por conta da mediação

estabelecida por algum tipo de tecnologia que possibilita a comunicação, a interação e a

interatividade. Isso passou a ocorrer a partir do momento em que as tecnologias digitais móveis foram

se estabelecendo no meio social, somada a três características muito próprias: conectividade,

convergência e mobilidade. Por tecnologia digital móvel, entende-se todas as possibilidades

tecnológicas oferecidas pelo mercado e que nos permitem o seu uso em diferentes locais e em

qualquer tempo. Assim, quando se fala em tecnologias digitais móveis está se referindo a

dispositivos tais como celulares, smartphones, iPhones, tablets, etc., por meio dos quais, é

possível acessar a internet e todos os demais recursos computacionais. Com os dispositivos

móveis é possível, em diferentes espaços e tempos, ouvir música, falar ao telefone, ler e enviar

mensagens, ler jornais ou livros, navegar na Internet, passar o tempo com um jogo, assistir a um

vídeo, além de interagir em redes sociais. (COSTA; MARINS, s.d.).

Mesmo considerando certas restrições (custo elevado, disponibilidade de rede, padrões de

segurança, entre outros), não há como negar o impacto que as tecnologias digitais móveis vem

causando no mundo e em nosso país. Nas palavras de Squirra & Fedoce (2011, p. 269):

As tecnologias móveis destacam-se entre as mídias interativas, pois além de promoverem a interatividade, contam com recursos de mobilidade e portabilidade. Assim, o usuário passa a ter a comunicação literalmente

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em suas mãos, podendo captar conteúdos e informações do ambiente onde esteja (download), de modo instantâneo, fazendo em seguida o upload dos mesmos para a internet ou para seu banco de dados pessoal, que está arquivado nos bancos de dados na “nuvem”. Os espaços passam a ser geolocalizados e a comunicação acessível em qualquer lugar, em qualquer tempo, em qualquer máquina.

Como resultado, assistimos, cotidianamente, ao aumento do interesse das pessoas por essas

novas possibilidades de conexão/interação, já que, em qualquer tempo e lugar, é possível acessar

informações, bancos de dados, redes sociais, e-mails, produtos e serviços, etc. Com isso, as

tecnologias digitais móveis vêm se estabelecendo no meio social, produzindo uma nova cultura

de interação e compreensão do mundo e, junto dela, produzindo, também, as mudanças de

hábitos.

Além disso, as tecnologias móveis fizeram surgir uma nova realidade para a educação: a

“aprendizagem com mobilidade” ou “aprendizagem móvel”. Souza e Amaral, ao refletir sobre a

“aprendizagem por meio dos dispositivos móveis”, citam O’Malley et al, para o qual, o aprender

por meio da mobilidade refere-se a “qualquer tipo de aprendizagem que acontece quando o

aprendiz não está em um local fixo pré-determinado; ou quando o aprendiz tira proveito das

oportunidades de aprendizagem oferecidas pelas tecnologias móveis.” (O’MALLEY et al, 2003,

p. 6, apud SOUZA; AMARAL s.d., p. 5). Assim, a aprendizagem móvel, além de todos os

atributos já mencionados, promove novas formas de diálogo e de compartilhamento de

conhecimentos e informações entre professores e alunos, além de fazer com que o ambiente

educativo seja mais dinâmico, flexível e atual.

Ainda sobre a aprendizagem com mobilidade, Souza e Amaral (s.d., p. 5) sinalizam para o

cuidado que deve ser tomado na apresentação e produção de conteúdos, por conta das

“peculiaridades dos aparelhos móveis, principalmente aquelas relacionadas ao tamanho reduzido

de tela e de teclado”. Isso porque, da relação intercambiante entre tecnologias digitais móveis e a

aprendizagem com mobilidade surge um conceito que tem se revelado muito importante nos dias

atuais: o conceito microvídeo, enquanto unidade básica de informação, em nosso interesse

particular, o microvídeo com fins educativos. O microvídeo tem sido objeto de convivência das

pessoas, via tecnologias digitais interativas. Pelo fato de a literatura acadêmica ainda não

apresentar definições precisas a respeito do termo “microvídeo”, qualquer definição atual deste

objeto de aprendizagem será oriunda do conhecimento de mundo prático construído a seu

respeito, isto é, a partir das próprias experiências concretas de uso desta ferramenta como, por

exemplo, aquelas vivenciadas pela assistência ou compartilhamento desses microvídeos nas redes

sociais. Assim, o microvídeo tem sido definido como um vídeo ou uma produção audiovisual de

curtíssima duração (estimada em segundos ou minutos). Entre as poucas reflexões que o definem,

há aquela, segundo a qual, o microvídeo pode ser dividido em três categorias5: 1. Duração -

como já mencionado, refere-se ao tempo de duração do microvídeo, podendo este ter desde

segundos até muitos minutos. 2. Fragmentação - está relacionada ao fato de a informação e/ou

5 Com base na apresentação do tema “Microvídeo - definição”, da aula do dia 28/05/2015 - pelos alunos Marisa Coelho P. Santin, Rogério E. Silva Chaves e Edson Stavarengo Jr. - na disciplina “Desenvolvimento de Conteúdo Educacional baseado na TV Digital Interativa”, ministrada pelo professor Sérgio Ferreira do Amaral, no primeiro semestre de 2015, do curso de Pós-Graduação Stricto Senso, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP.

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conteúdo veiculado no microvídeo ter que se apresentar de forma fragmentada e não reduzida.

Por exemplo, ao apresentar um determinado assunto, o faz em vários vídeos pequenos, ao invés

de em um único vídeo em toda sua duração. Para dar conta desse propósito, essa categoria é

dividida e outras três subcategorias: sequenciamento - o conteúdo/informação deve se apresentar

em ordem cronológica e bem definida; escopo – a abrangência ou delimitação do conteúdo a ser

veiculado deve possuir finalidade própria; objetividade - o conteúdo veiculado deve se constituir em

uma proposta rápida e direta, em uma ideia ou um problema bem focado; engajamento - tem a

função de engajar, cativar o espectador para o que será apresentado. 3. Tecnologia - está

centrada na possibilidade de autoria do usuário que possui um dispositivo móvel adequado para

tal. Esta categoria possui duas subcategorias: a mobilidade - por conta de o microvídeo estar

diretamente relacionado às tecnologias móveis combinadas com a internet; a qualidade gráfica –

pelo fato de a produção desta ferramenta ter que se apresentar por intermédio de várias

resoluções.

Assim, conforme Souza e Amaral (s.d., p. 5), “o conteúdo pedagógico a ser veiculado nos

dispositivos móveis deve apresentar características de microconteúdo, para que atenda aos

aspectos de mobilidade, conectividade, design, usabilidade, interatividade, linguagem, entre outros

requisitos”. Para esses autores (Ibid), o termo microconteúdo refere-se àquelas pequenas unidades de

aprendizagem que ocupam pouco tempo e pouco espaço. Isso porque a estrutura de um

microconteúdo realiza-se por meio da metainformação ou de metadados6.

Toda essa realidade tem sinalizado para a relevância do microconteúdo para fins educativos ou

microconteúdo educacional. Afinal, a juventude nativa digital convive naturalmente com uma realidade

que se mostra preparada e aberta às informações veiculadas nesta forma de apresentação: ágeis,

flexíveis, enxutas, objetivas, dialógicas e que dosam diferentes linguagens (verbal, não verbal,

sonora, em movimento, etc.).

Ora, uma vez que a microaprendizagem, por meio do microconteúdo, é vista com bons

olhos pela geração de jovens estudantes dos dias atuais, há que se aproveitar deste “nicho de

aprendizagem” envolvendo essa juventude em um processo mais saudável e produtivo de

aprendizagem. Assim, a aposta é a de que um projeto de microconteúdo bem planejado,

masterizado e executado possa vir ao encontro da máxima, segundo a qual, a tecnologia deve

contribuir para o aprender bem e com qualidade.

Assim, é justificável que o tema “microconteúdo educacional” esteja, aos poucos, sendo

introduzido nos debates educacionais, fazendo associação aos conceitos de “aprendizagem com

mobilidade” e de “microaprendizagem”7. (SOUZA; AMARAL, s.d.). É dessa maneira que o

microconteúdo educacional, por seu formato de apresentação em microvídeos, acaba

“ganhando” a nova geração com algo que lhe interessa e lhe é importante.

Desse modo, o microconteúdo educacional poderá se adequar ao conceito de

microaprendizagem móvel, uma vez que este conceito é particularmente apropriado “à

aprendizagem informal, em atividades específicas, nas quais os aprendizes estão mais interessados

6 Segundo Mori e Carvalho (2004, p. 1), originalmente, o termo “metado” vem do latim, de modo que a expressão ‘metá’, possui o significado de ‘além’, ‘através de’ ou ‘sobre’, remetendo a expressão “metadado” ao sentido de “dado sobre outros dados”. 7 Microaprendizagem: “uma modalidade de aprendizagem que envolve aspectos da didática e da educação, cujo foco está direcionado para o nível micro, em especial, microconteúdos ou micromídia (recursos de mídia em tamanho micro)”. (SOUZA; AMARAL, s.d., p. 6).

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em conteúdos de informação curtos e específicos, do que no acesso a um sólido corpo de

conhecimento sobre determinada disciplina”. (SOUZA; AMARAL, s.d., p. 7). Da mesma forma,

também poderá responder adequadamente às características das tecnologias digitais móveis, pois

se refere a um modo de apresentação do conteúdo que envolve pouco tempo e espaço, além de

fácil e sucinto. Só assim, os “microconteúdos constituir-se-ão em elementos inovadores de

práticas pedagógicas dessas novas modalidades de aprendizagem, que se voltam ao atendimento

das exigências do ritmo de vida dinâmico e veloz e do entrelaçamento de aspectos

multiplataforma e multitarefa dos dispositivos móveis, como o celular, o smartphone, o tablet”.

(SOUZA; AMARAL, s.d., p. 8).

Por fim, Souza e Amaral (s.d., p. 6) argumentam que a concretização da aprendizagem

efetiva, por meio da mobilidade, bem como do “desenvolvimento de competências nos

aprendizes” depende, essencialmente, de uma mudança de postura no sentido de “repensar as

próprias concepções de aprendizado”, as quais devem estar inseridas no contexto de uma

concepção sociointeracionista, de Vygotsky8.

2. O processo masterização de microvídeos com vistas ao microconteúdo

educacional

A importância da relação entre e microvídeo e microconteúdo educacional é esclarecida

por Souza e Amaral, para os quais:

[...] produzir microconteúdo educacional requer o estabelecimento de um processo de produção que envolva uma dinâmica inovadora fundamentada em aspectos pedagógicos e semióticos, nos quais esteja contemplado o atendimento às especificidades e à natureza dialógica da linguagem hipermídia, visando à compreensão e à assimilação do caráter híbrido, manifestado pelas hipermídias. (SOUZA; AMARAL, s.d., p. 10 e 11).

A citação acima reforça o fato, segundo o qual, em qualquer trabalho de produção de

vídeo instrucional direcionado à aprendizagem, a veiculação de conteúdos educacionais carece de

“princípios orientadores” que garantam a apresentação bem estruturada da mensagem, fazendo

jus aos três grandes eixos das tecnologias digitais contemporâneas: conectividade, convergência e

mobilidade. São esses princípios que orientem o design apropriado aos objetivos pretendidos,

favorecendo a interatividade, facilitando a aprendizagem, sendo atraente para manter a empatia e

conseguir competir com as distrações do ambiente móvel. Assim, neste tópico, abordaremos

sobre os parâmetros necessários a um projeto de masterização (ou técnica de produção) de microvídeos

instrucionais, com vistas ao microconteúdo educacional.

8 O Sociointeracionismo (que alguns também denominam “Construtivismo”) defende que a aprendizagem se dá pela interação do sujeito com o meio e com o objeto a ser aprendido, um modificando ao outro. Ou seja, todo aprendizado se dá por meio da mediação interativa, desenvolvida em um percurso que Vygotsky denomina Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) em relação com outros dois momentos: o de desenvolvimento real e o de desenvolvimento potencial. Assim, a ZDP constitui-se na distância entre aquilo sabe fazer sozinho, sem a ajuda de outros (conhecimento real) e aquilo que ele ainda não sabe e, portanto, precisa aprender (conhecimento potencial). (VYGOTSKY, 1884).

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10

Afinal, o que é masterização? Durante algum tempo, o termo masterização, esteve, de

maneira geral, relacionado à conceituação apresentada por Décourt (2003, p. 1), significando o

“processo de fabricação de CDs”. Sob esta ótica do contexto musical, a masterização tem sido

também definida como a prática de inserção harmoniosa de todos os elementos sonoros para que

sejam, de certo modo, agradáveis de ouvir e, portanto, estejam em condições de serem gravados

em CDs. Em outras palavras, nesse processo de produção do CD, o produtor deverá fazer com

que todos os elementos envolvidos sejam complementares, isto é, não destoem, nem se

destaquem um em relação ao outro.

Mas, nos últimos tempos, esse conceito de masterização ganhou nova abrangência, de

modo que, hoje em dia, este também tem sido utilizado em vários outros contextos, dentre eles,

no contexto da educação, no âmbito da produção de vídeo, áudio e afins. Com isso, pode-se

afirmar a constituição de uma nova concepção, uma nova ressignificação do conceito de

masterização, quando empregado na técnica de produção de vídeos educativos,

independentemente de sua extensão ou tamanho. Assim, o termo masterização, quando utilizado

na educação, recai no contexto da produção de vídeos ou microvídeos. Dessa forma, este

conceito tem sido entendido como uma maneira de “balancear” todos os elementos presentes no

material que produzido, tais como: cores de fundo, roupa dos participantes do vídeo, volume do

áudio, qualidade da imagem, tamanho do arquivo final, entre outros. O entrelaçamento

harmonioso de todos esses elementos fará com que o produto final - o vídeo/microvídeo a ser

assistido - contribua para que o sujeito usuário tenha uma experiência satisfatória no sentido de

alcançar com mais propriedade a aprendizagem do conteúdo nele veiculado. Para que isso ocorra,

o processo de masterização deve acontecer antes, durante e depois da produção do vídeo,

diferentemente da produção do CD onde ele acontece somente após a gravação dos

instrumentos e vozes.

Por outro lado, não há como negar a realidade, segundo a qual, muitos professores têm

dificuldade em desenvolver as atividades de ensino/aprendizagem dos conteúdos, com seus

alunos, por meio do uso das novas tecnologias digitais, fato que pode contribuir para o insucesso

da aprendizagem. Logicamente que essa dificuldade dos professores se estende também para o

uso pedagógico do vídeo como ferramenta educativa (principalmente, do microvídeo, por ser

caracterizar em uma “novidade”), especificamente, no que tange ao cuidado com o trabalho de

masterização ou produção desta ferramenta digital interativa. Como já mencionado, dentre as

ações necessárias para o alcance da eficácia do uso do vídeo com fins pedagógicos (e, do mesmo

modo, de microvídeos) está o empenho em fazer desta ferramenta muito mais que mero

entretenimento. Em consonância a essa realidade, temos a denúncia de Mayer (2001)9,

apresentada por Serafim e Sousa (2011), do “desenho”10 mal produzido dessas ferramentas, por

conta da ausência de um projeto e de um roteiro adequados. Assim, “quando a mensagem é

pobremente desenhada, os alunos têm mais dificuldade em compreendê-la, sendo a carga

cognitiva extrínseca elevada”; por outro lado, “quando a mensagem está bem estruturada e

9 MAYER, R. Multimedia learning. New York: Cambridge University Press, 2001. 10 O termo “desenho” não significa, necessariamente, a ilustração de uma imagem ou algo, mas, sim, uma forma de projeto. No caso, deste trabalho, o termo “desenho” está relacionado ao conceito de “design”, que significa designar, desenvolver um plano ou projeto.

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11

apresentada, a carga cognitiva é minimizada”. (MAYER, 2001, apud SERAFIM; SOUSA, 2011,

p. 26).

Em função de tudo isso, Cardoso (2013), com base Ritter et all (1988), reflete sobre um

conjunto de fatores que justificam o necessário cuidado com o preparo dos vídeos, logicamente,

podendo esses orientar o processo de masterização também de microvídeos. Dentre esses

fatores, destacamos: a) a necessidade de seleção e ordenação do conteúdo veiculado,

considerando os conhecimentos prévios de base dos aprendizes (a maturidade para aprender); b)

a necessidade de se preocupar com a dosagem das informações, de modo que essa seja adequada

à capacidade de processamento do sujeito aprendiz, evitando, assim, a sobrecarga cognitiva.

Nessa direção, dentre os esforços em se adequar a esses cuidados com o trabalho de

masterização/produção de vídeos (ou microvídeos) educacionais, Cardoso (2013, p. 85)

menciona os seguintes parâmetros destacados por Leaser (1996): 1) “existência de um conteúdo

relevante para o grupo-alvo; 2) adequação do estilo e a densidade da informação; 3) apresentação

do assunto em sequências lógicas; 4) relação com os outros cursos já existentes; 5) oferta de uma

motivação inicial; apresentação eficiente do problema; 6) apoio ao aprendizado com recursos

estruturais”. Também com base em Leaser, esse mesmo autor (Ibid) reflete sobre as

possibilidades de veiculação de conteúdos em vídeos/microvídeos educacionais, sendo algumas

delas utilizadas por meio de: a) um apresentador ou um professor; b) uma entrevista com duas

pessoas, que, com perguntas e respostas, explorem determinado tema; c) de discussões em grupo

em que o tema a ser aprendido seja debatido por alguns participantes; d) representações gráficas

e/ou imagens narradas a fim de apresentar o conteúdo. Por fim, Cardoso faz referência a

Pfromm Netto (2001), segundo o qual, roteiristas e outros envolvidos com a criação de vídeos

devem, antes de tudo, perguntarem se, com aquela produção, será possível garantir a real

aprendizagem. Neste caso, cairiam bem as seguintes questões: É possível que as pessoas possam

aprender algo por meio do vídeo proposto? Ele será utilizado num contexto adequado e de

forma adequada? Possibilita o aprendizado de forma mais eficiente do que outro meio ou em

menos tempo? Favorece a retenção do conteúdo apresentado? Estimula o aprendizado e a busca

por mais informações, além do pensamento crítico e/ou a solução de problemas? (CARDOSO,

2013).

Por conta de todas essas questões, Mayer, defende uma teoria cognitiva de aprendizagem

multimídia, isto é, uma teoria que estuda o processo de aprendizagem por meio de palavras e

imagem, como é o caso do vídeo e, por extensão, do microvídeo. Assim a pretensão maior desta

teoria é a de refletir sobre quais seriam as melhores estratégias e/ou os melhores meios de

desenvolver o processo de aprendizagem, quando se utiliza palavras e imagens. Como esclarecem

Almeida et al (2014, p. 1005), esse estudo oferece orientações de resoluções de problemas do tipo

“para quem, como, quando e em que sequência se devem utilizar imagens e palavras de forma a

alcançar melhores resultados no aprendizado”, além de ajudar “compreender os mecanismos que

são efetuados pelo aluno para a recepção da informação, sua veiculação pelas áreas sensoriais e

encefálicas que o fazem ter a compreensão do que é informado”. Esses autores (Ibid), com base

em Mayer (2005)11, defendem cinco processos cognitivos importantes, que o aprendiz deve

11

MAYER, R. et al. The Cambridge handbook of multimedia learning. New York: Cambridge University Press, 2005.

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12

utilizar, para que as informações obtidas a partir de texto ou imagem produza aprendizagem

eficiente. São eles:

1. Selecionar as palavras relevantes para o processamento na memória operacional verbal; 2. Selecionar imagens significativas para o processamento na memória operacional visual; 3. Organizar as palavras selecionadas em um modelo verbal; 4. Organizar as imagens selecionadas em um modelo visual; 5. Integrar as representações verbais e visuais com um conhecimento prévio. (ALMEIDA ET AL, 2014, p. 1006).

O intuito de promover a melhor aprendizagem possível, a teoria cognitiva de aprendizagem

multimídia, de Mayer, apresenta princípios norteadores do processo para a produção de um

material multimídia. E sendo o microvídeo digital (foco deste trabalho) um objeto de

aprendizagem desta natureza, a técnica de sua produção (masterização) deve também levar em

conta esses princípios. Dentre os autores que refletem sobre esses princípios, destacamos

Almeida et al (2014). Vejamos:

Princípio multimídia: Este princípio defende que aprendizagem será mais eficaz se, ao invés de

apenas palavras, houver a combinação de palavras (discurso escrito e falado) e imagens que podem

ser estáticas (ilustrações e fotos) ou dinâmicas (animações e vídeos).

Princípio da contiguidade ou da proximidade: Defende que processamentos supérfluos são

reduzidos quando a apresentação do objeto de aprendizagem multimídia apresentar o texto

verbal (falado/escrito) próximo da imagem que ele descreve, tanto geograficamente (no espaço)

como cronologicamente (no tempo). Por isso, este princípio subdivide-se em “contiguidade

espacial” e “contiguidade temporal”. A contiguidade/proximidade espacial defende que as

imagens e as palavras se apresentem próximas uma da outra, numa mesma página ou écran. A

contiguidade/proximidade temporal defende que esses elementos sejam apresentados

simultaneamente (ao mesmo tempo), ao invés de sucessivamente (primeiro um, depois outro,

etc.). Nas palavras de Almeida et al, essa integração temporal/espacial harmoniosa do texto com

a imagem ausenta o interlocutor de “usar seus recursos cognitivos para uma busca visual na

página ou em páginas distantes, facilitando o armazenamento de informações na memória

operacional e a conexão mental”. (MAYER, 2001, apud ALMEIDA ET AL, 2014, p. 1007).

Princípio da modalidade: Defende que a aprendizagem será mais eficiente numa combinação

de animação e narração/fala, do que de animação e texto escrito. A vantagem da relação

animação e narração falada se justifica nos dois principais canais sensoriais - o visual e o auditivo:

com o texto narrado, a informação entrará pelo canal auditivo; com a informação da imagem,

pelo canal visual, de modo que não haverá sobreposição de informações em um mesmo canal.

Princípio da coerência: Defende que “quanto mais simples e objetiva for a apresentação do

conteúdo, mais livre ficará a memória operacional para processar um número maior de

conhecimento”. (ALMEIDA ET AL, 2014, p. 1007). Assim, se os elementos da mensagem

multimídia (palavras, imagens ou som) forem relevantes para o assunto a ser aprendido, devem

permanecer; se forem estranhos, deverão ser descartados.

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13

Princípio da redundância: Este princípio aproxima do princípio da coerência, pois propõe a

lógica da objetividade no lugar de redundância ou repetições de informações. Nos argumentos de

Almeida et al, uma apresentação multimídia com excesso de informações redundantes “provoca

uma sobrecarga cognitiva, pelo fato de a memória operacional processar um material instrucional

que não adiciona contribuição na compreensão do conteúdo”. Assim, a proposta é que, quando

houver a possibilidade de a aprendizagem ser comprometida por conta da sobrecarga de

informações repetidas (animação, narração e texto, ao mesmo tempo), a proposta é a de conciliar

apenas a animação e a narração falada. (ALMEIDA ET AL, 2014, p. 1007). Isso deverá ocorrer

quando houver redundância, o que não significa afirmar que a escrita deve ser descartada em

todas as situações, já que, como vimos em Moran (1995, p. 2), “o vídeo é também escrita”.

Afinal, como se tem discutido em reflexões acadêmicas, resguardadas as devidas “recomendações

apontadas por especialistas em microaprendizagem e aprendizagem com mobilidade, bem como

as restrições referentes aos aspectos de usabilidade (tamanho de tela e teclado) e conexão móvel

(tarifas, velocidade, etc.)”, o discurso da vez, ao invés de fomentar ações dualistas e dicotômicas

(do tipo “melhor/pior”, “bom/ruim”), aponta para as possibilidades de ações convergentes e

intercambiantes.

Princípio da sinalização: Defende que a aprendizagem é mais efetiva quando se direciona a

memória operacional do aprendiz, procurando focar sua atenção ao aprendizado pretendido, por

meio de sinais ou pistas que indiquem o que deve ser analisado. Almeida et al (2014, p. 1007)

explicam que esses sinais podem ser diversos e se apresentam da seguinte forma: “a) números no

texto e na imagem, indicando a etapa do processo; b) uso da cor, de tal forma que a cor da

palavra seja correspondente a algum elemento da imagem; c) aumento da voz, pelo professor, ao

explicar um determinado conteúdo, chamando a atenção para uma informação em particular; d)

dar ênfase às palavras-chave; e) destacar as informações mais importantes, sublinhadas ou em

negrito, diferenciadas das demais informações presentes no material”.

Princípios da antecipação e da segmentação: Almeida et al (Ibid) ainda fazem referência a

outros dois princípios de Mayer (2005): o princípio da antecipação - propõe que o conteúdo

multimídia deve ser apresentado da informação mais abrangente para os detalhes; o princípio da

segmentação - defende que, para uma mensagem de múltiplos meios favorecer a aprendizagem, esta

deverá se apresentar em forma de segmentos, ao invés de em uma unidade contínua e única.

Como argumentam Souza e Amaral (s.d., p. 8), “fragmentar o conteúdo educacional para torná-lo

mais adequado aos dispositivos e artefatos tecnológicos de características móveis” não significa

restringir o microconteúdo educacional “a uma ideia de medida, ou de tamanho, mas, sim, a uma

unidade, a um módulo, e como tal, é dependente do contexto ao qual está inserido”.

Além de tudo isso, os princípios de Mayer auxiliam no sentido de que, no caso de uma

produção de microvídeo, o produtor fique atento, por exemplo, ao tipo de texto que ele deve

redigir, quem vai apresentar este conteúdo, a maneira que este conteúdo será apresentado

(narração, animação, texto) e o público que assistirá ao material (jovens, adultos, idosos,

profissionais, estudantes, etc.). Por fim, especialmente sobre a consideração do público alvo, a

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produção de microvídeos deve considerar que a realidade deste público, no geral, é de não

possuir rede wifi, fator preponderante para o acesso às informações por meio do celular e com

conexão de internet. Isso justifica o já afirmado, sobre o fato de os microvídeos não poderem ser

muito longos (poucos minutos). Também por isso, a masterização deverá ser pensada de modo

que o microconteúdo veiculado seja, de certa maneira, agradável de ouvir e de assistir, por estar

fazendo jus a um tamanho que lhe é coerente para ser acessado de qualquer lugar.

Todos esses aspectos, sobre a constituição do microvídeo e do microconteúdo

educacional, reforçam o fato de que, como qualquer objeto de aprendizagem, este deve: a)

“guardar relação estreita com os traços caracterizadores da hipermídia” com sua “natureza

híbrida (linguagens sonora, visual e verbal)”; b) possuir “arquitetura hipertextual e alinear”; c)

possuir “extensibilidade de nós e nexos associativos”; d) possuir interatividade (interface que

favoreça a participação ativa); e) apresentar-se de forma indivisível e, portanto, com conteúdo

autocontido, sem ser superficial; f) integrar “tecnologias que são capazes de produzir e

disponibilizar som, fala, ruído, gráficos, desenhos, fotos, vídeos etc..” (SANTAELLA, 2011b,

apud SOUZA; AMARAL, s.d, p. 9). Com isso, o microconteúdo estará contribuindo para “apoiar

atividades de aprendizagem, envolvendo estudantes, professores, pesquisadores, gestores e outros

atores e agentes que interatuam no desenvolvimento de novas aprendizagens”. (Ibid, p. 4).

3. Sobre o desafio da concretização dos objetos digitais de aprendizagem (dentre

eles, o do microvídeo) com fins educativos: apontamentos futuros

Vimos que as tecnologias móveis podem facilitar a participação colaborativa e a criação de

novos conhecimentos em diversos contextos educacionais, possibilitando ao educando e ao

professor tomarem parte no processo de ensino/aprendizagem. Vimos também que o vídeo e/ou

o microvídeo, enquanto objeto de aprendizagem, figuram-se entre as tecnologias móveis como

fator preponderante de inovação. Por fim, vimos o quanto o processo de masterização ou técnica

de produção desses objetos de aprendizagem pode ser relevante ao professor na concretização,

efetividade e eficácia desta ferramenta em prol da aprendizagem dos alunos.

Resta, nesse sentido, o compromisso em viabilizar, no discurso e na prática, políticas

efetivas que propiciem a tão discutida reinvenção da escola, rumo à inovação da educação. Neste

tópico, destacaremos duas dessas políticas de ação: dos REA (Recursos Educacionais Abertos) e

da Formação Docente.

3.1. A inovação na educação e reinvenção da escola via exploração de Recursos Abertos

de Aprendizagem (REA)

Dentre todas as possibilidades de ações em busca da inovação na educação, destacamos a

necessidade de implementação de políticas públicas que fomentem o acesso legal aos Recursos

Educacionais Abertos (REA12), contribuindo, assim, para o exercício da criatividade, da

autonomia e da autoria docente e discente.

12 Do termo inglês, “Open Educational Resources” (OER). Segundo Santos (2013, p. 21), trata-se de um termo criado inicialmente no evento promovido pela UNESCO, ocorrido Massachusetts Institute of Technology (MIT), em 2002, denominado “Fórum on the Impact of Open CourseWare for Higher Education in Developing Countries”.

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Conforme esclarece Santos (2013, p. 21), os REA são também conhecidos como objetos de

aprendizagem, termo definido por (Wiley, 2000) “como um pequeno componente instrucional que

pode ser reutilizado em diferentes contextos de aprendizagem”. Santos também explica que, a

partir desta definição, Wiley, em consonância como o movimento de “software livre” e de

“código aberto”, criou o temo “conteúdo aberto” com o intuito de “promover a ideia do uso de

conteúdos educacionais abertos em diferentes contextos por diferentes professores e alunos e

migrando por vários contextos”. (WILEY, 2000, apud SANTOS, 2013, p. 21). Com base nessas

explicações, Santos (Ibid) destaca a definição de REA aceita pela UNESCO, a saber: […] recursos

de ensino, aprendizagem e pesquisa que estejam em domínio público, ou que tenham sido disponibilizados com uma

licença de propriedade intelectual que permita seu uso e adaptação por terceiros.(UNESCO, apud SANTOS,

2013, p. 21). Ainda, conforme o referido documento desenvolvido pela Unesco (2011, p. 34), os

REA “podem incluir cursos completos, partes de cursos, módulos, livros didáticos, artigos de

pesquisa, vídeos, testes, software, e qualquer outra ferramenta, material ou técnica que possa

apoiar o acesso ao conhecimento”.

Em suma, o REA constitui-se em um material aberto e, como tal, pode ser manejado,

transformado, adaptado, por professores e alunos, segundo sua realidade e suas necessidades.

Parte daí, a ideia segundo a qual qualquer recurso digital poder ser reutilizado para o aprendizado.

É por isso que se atribui a um REA termos como “reuse” (aquilo que se apresenta disponível

para tal), “revise” (propondo adaptações), “remixe” (misturando materiais diferenciados) e

“redistribua” (também fazendo a sua parte, colaborando).

Como se vê, a tão almejada autonomia docente está também atrelada a essa demanda

atual de se investir em uma cultura que propicie ao profissional/professor desenvolver a

criticidade dialógica, a participação ativa e a ação autoral. Só por esse caminho ele será capaz de

transformar materiais de outros em produção própria, além de colaborar para que outros

aprendam com sua nova produção. Em outras palavras, o processo de ensino/aprendizagem terá

um ganho maior, se o trabalho de formação docente acolher também o movimento REA.

Entretanto, para que um material publicado seja um REA, isto é, possa ser reutilizado,

transformado e compartilhado, deverá possuir uma licença para tal. A esse respeito, Santos cita

Butcher, para quem “o elemento chave que distingue um REA de qualquer outro recurso

educacional é a sua licença”, ou seja, a permissão legal que possibilita seu reuso e sua adaptação

“sem necessidade de solicitar a permissão do detentor dos direitos autorais”. (BUTCHER, 201,

p. 34, apud SANTOS, 2013, p. 21).

Uma das licenças que regulamentam o uso de REA refere-se ao “Copyright”13. Neste caso,

todos os direitos são reservados e, portanto, seu uso se dá de forma mais restrita, pois

determinados conteúdos ou recursos não poderão ser livremente utilizados, remixados,

transformados. Por outro lado, há a licença “Creative Commons (CC)”14 - uma das modalidades de

licença mais utilizadas nos REA porque preserva apenas alguns direitos. (SEBRIAM, 2015). Por

conta disso, trata-se de uma licença muito presente em diversos buscadores, já que permite, a

13 O autor que possui uma licença Copyright tem o direito de ser o único a reproduzir, publicar e vender o material produzido por certo período de tempo. Caso outras pessoas queiram fazer uso deste material, elas devem pedir autorização ao detentor desse produto. 14 Para utilizar uma licença CC não é necessário qualquer registro, a CC não dispõe de nenhuma forma de determinar o que foi, ou não foi disponibilizado nos termos de uma licença CC. Se tiver qualquer dúvida a este respeito deve contatar diretamente o titular dos direitos de autor, ou tentar contatar o site onde encontrou o conteúdo.

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qualquer usuário, buscar e utilizar um conteúdo aberto ali publicado sem correr riscos de plágio

ou uso indevido de imagem. Neste caso, o professor poderá se utilizar, avaliar, reconstruir e

reutilizar os recursos de aprendizagem disponibilizados para, juntamente com os alunos, em uma

constante construção, tornar-se autor de seus próprios trabalhos, no caso do tema deste artigo, de

seus próprios vídeos/microvídeos.

Ressalta-se que, atualmente, é possível contar com diversos sites que disponibilizam esses

recursos/objetos de aprendizagem abertos com o intuito de auxiliar os professores. Como

exemplo, podemos citar: a Agência Pública de Reportagens e Jornalismo15; a Rede Educa da

Tecnologia para a Educação16; o Currículo + da Secretaria do Estado de São Paulo17; o portal E-

Unicamp, da Universidade Estadual de Campinas/SP18; o Portal da Secretaria de Educação de

São Paulo19; o Programa Índio Educa20, dentre outros sites. Esses sites foram detectados em uma

pesquisa desenvolvida por Santos (2013), a fim de mapear a realidade do uso de REA no Brasil.

Esta pesquisadora concluiu que, além de iniciativas particularizadas como as acima citadas, “o

movimento REA no Brasil parece também desabrochar por meio de iniciativas governamentais”,

em geral, com denominações tais como “objetos de aprendizagem, conteúdo digital e objetos educacionais”,

e tendo o objetivo de “disponibilizar recursos gratuitamente para uso público de modo a

melhorar o ensino e a aprendizagem”, apesar desses recursos ainda carecerem de “uma política

mais clara de direitos autorais e reutilização dos recursos”. (SANTOS, 2013, p. 77).

Por fim, ao que parece, em dias atuais marcadamente afetados pelas tecnologias digitais e

a internet, também se encontra nos REA umas das possibilidades promissoras da autonomia e da

autoria docente e discente, bem como da possibilidade de acionar a aquisição do conhecimento

pelo caminho da inovação criativa. Isso porque seu uso, como recursos de aprendizagem, torna

qualquer processo de produção ético e, por sua vez, aberto para outras produções, incluindo-se aí

a produção de vídeos. Desse modo, os REA representam a máxima, segundo a qual, “não se

pode criar sem liberdade de criar”. (DEMO, 2010, p. 109). 21

Porém, há que se ressaltar que o uso competente e produtivo de um REA depende da

competência tecnológica do professor, isto é, de “acompanhar as novas tecnologias e lidar com

elas produtivamente”. (DEMO, 2011, p. 23). Encontra-se aí, um dos maiores desafios da

educação atual, pois as dificuldades já começam no fato de muitos desses profissionais, por não

serem nativos digitais, apresentarem resistência às NTICs, por conta de estarem desconectados

dela e, consequentemente, estarem despreparados para conviver e lidar com elas. (DEMO, 2011).

Assim, há muito que se fazer. Dentre todas as possibilidades de ações de fomento à inovação na

educação, Amaral (2015)22 destaca a centralidade docente como essencial e urgente, uma vez que

demanda a implementação e, principalmente, a ação de políticas efetivas de formação do

professor e, por extensão, do aluno, considerando também aí, que “um dos sentidos da educação

e da formação é a construção da autonomia socialmente edificada e exercida de forma

qualificada”. (COSTA; MARINS, s.d., p. 2). É sobre esse assunto que abordaremos na sequência.

15 Disponível em: http://apublica.org/. Último cesso: 28/06/2015. 16 Disponível em: http://www.arede.inf.br/. Último cesso: 28/06/2015. 17 Disponível em: http://curriculomais.educacao.sp.gov.br/. Último cesso: 28/06/2015. 18 Disponível em: http://ggte.unicamp.br/e-unicamp/public/. Último cesso: 28/06/2015. 19 Disponível em: http://portal.sme.prefeitura.sp.gov.br/Main/Home/Index/. Último cesso: 28/06/2015. 20 Disponíveis em: http://www.indioeduca.org/. Último cesso: 28/06/2015. 21 Para saber mais sobre o uso adequado dos REA, acesse o link: http://mira.org.br/o-que-e-rea/. 22Ver nota 2.

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3.2. Por uma política centrada na formação docente

Serafim e Sousa (2008) defendem a posição, segundo a qual, para que a autoria

tecnológica docente seja possível, o professor precisa estar ciente de sua necessidade,

compreendendo o processo de transformação das tecnologias como algo positivo e que pode

agregar benefícios à sua prática pedagógica. Nesse sentido, o trabalho em sala de aula auxiliado

pelas tecnologias digitais precisa ser fruto de um projeto inovador, produzido em um contexto de

mudança de paradigma da escola, mudança essa, especialmente materializada no papel do

professor. Afinal, o domínio e o manejo adequado das NTICs, por parte do professor, ao

contrário de se referir a apenas uma opção, é condição sine qua non para que esse profissional se

constitua no docente dos novos tempos. E o professor necessário e condizente ao mundo atual é

aquele que, frente às tecnologias novas, se apresenta com uma “cabeça” também renovada ou, no

mínimo, com um espírito aberto às inovações. No tocante ao trabalho com as novas tecnologias

digitais em sala de aula, este professor, para agir de modo renovado, não poderá simplesmente se

apropriar do material físico envelhecido dos conteúdos e o transportar para a tecnologia. Muito

pelo contrário, será importante que ele utilize as tecnologias em favor das informações e em

conjunto com os alunos. Isso porque a tecnologia não está aí para substituir a pedagogia, da

mesma forma que as novas tecnologias desenvolvidas nos dias atuais não se coadunam com

“pedagogias velhas”. Assim, para que a competência do professor expresse a necessária relação

“tecnologias novas” com “cabeças renovadas”, muito mais que o mero uso dos equipamentos

tecnológicos disponíveis, o professor precisa saber o que fazer com essas ferramentas,

considerando, como já dito, a nova cultura de aprendizagem, característica dos alunos dos dias

atuais. E esse fazer pedagógico do professor passa necessariamente pelo abandono da “prática

tradicional do ‘especialista em dar aulas’, em prol de um profissional que maneja e gerencia

competentemente sua ação, sendo a aula apenas um dos instrumentos disponíveis”. (SERAFIM;

SOUSA, 2011, p. 26).

Portanto, faz-se necessária uma política de formação que insira adequadamente o

professor no mundo das novas tecnologias. Em nossa concepção, um projeto de formação

docente adequado deverá considerar os três aspectos principais apontados por Santos et al:

(1) acesso à informação; (2) mudança do paradigma educacional

centrado no professor, para outro, centrado no aprendiz – que busca informação, se autoriza e que produz conhecimento colaborativamente; e (3) transformações perceptivo-cognitivas por parte do novo tipo de leitor, que se forma na cibercultura – o "leitor imersivo" de formas

híbridas de signos. (SANTOS ET AL, 2012, p. 3).

Porém, o fato é que, em grande parte das propostas ou iniciativas de formação docente, o

que transparece é que o material humano diretamente responsável pelo ensino/aprendizagem dos

conhecimentos tecnológicos necessários não está humanamente interessado e/ou preparado para

considerar o modo de aprender dos professores. Como já dito, uma das explicações disso está no

fato de as propostas atuais de desenvolvimento das novas tecnologias na educação continuarem

sendo concebidas por uma visão dualista. (AMARAL, 2015)23. Também como já vimos, por essa

23 Veja nota 2.

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visão, “novas tecnologias” e “educação” são colocadas numa relação de oposição, em vez de

pensá-las como intercambiantes, numa relação de interface, fazendo com que as novas

tecnologias sejam consideradas fora do processo educativo e vice versa. Emergem daí

interpretações do tipo “é preciso inserir as novas tecnologias na educação” ou “a educação de

hoje precisa lançar mão das novas tecnologias disponíveis” (algo de fora, que não é intrínseco,

sendo trazido para dentro). Tal cenário justifica a condução de práticas de formação docente cujo

desenho ilustra um professor ultrapassado, que não sabe, mediante a um técnico que domina as

novas tecnologias e, portanto, a autoridade capaz de lhe ensinar a novidade. Como resultado

temos que, na maioria das vezes, as equipes responsáveis pela capacitação docente não

demonstram considerar que, assim como qualquer outro aluno, o professor também deve ser

visto como sujeito aprendiz que não se encontra esvaziado de suas condições, de suas referências

e de suas necessidades.

E, imbuída nessa crença, a formação tecnológica docente tem sido conduzida de modo

que os professores tenham que se submeter a um ambiente de laboratório que em nada se adequa

e/ou respeita as suas realidades, enquanto aprendiz. E esse modo exageradamente técnico de

pensar, planejar e desenvolver a formação tecnológica dos professores acaba confirmando a

concepção das novas tecnologias como algo que está fora do processo educativo, sendo apenas

um adendo, um puro artefato técnico. Com isso, em vez de promover a efetiva aprendizagem,

acaba-se por reforçar ainda mais a resistência desses profissionais.

Toda essa reflexão denuncia a necessidade premente de uma política séria que centralize

docência, por meio do qual, se possa exigir que a condução da formação tecnológica do professor

seja também ressignificada. Isto é, que esta formação seja pensada e conduzida com o mesmo

cuidado, respeito e consideração que se tem pensado para a formação dos alunos, de maneira que

se dê também ao professor o devido tempo para aprender, respeitando esse seu novo e desafiante

processo de formação.

Em suma, o primeiro passo para romper com a visão equivocada da tecnologia em

relação à educação está em conceber que, no mundo atual, as novas tecnologias é algo intrínseco

ao processo educativo, algo que, por conta das demandas contemporâneas, naturalmente já lhe

faz parte. Só dessa forma será possível ressignificar a condução da formação docente com relação

às novas tecnologias, de modo que se rompa com essa prática hostil de formação até então

desenvolvida. Afinal, em um cenário de formação docente que seja dialógico, responsivo e

colaborativo não cabe um modelo de formação que conceba um professor que aprende e um

técnico que ensina. Ao contrário, no processo de concepção, planejamento e aplicação de um

curso de capacitação docente a respeito das novas tecnologias deverá estar envolvida uma equipe

interdisciplinar, por meio da qual, diferentes áreas, cada uma com seus conhecimentos próprios,

poderão contribuir para a aprendizagem em seu todo. Como consequência, abre-se espaço para

um ambiente de empatia, propício ao aprender interativo, dialógico, além de criar um ambiente

propício para a autonomia e a autoria.

3.2.1. Algumas iniciativas

Como vimos anteriormente, aos poucos, o Brasil tem apresentado iniciativas propícias a

uma política de movimento REA, disponibilizando, gratuitamente, recursos para uso público de

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forma a melhorar o ensino e a aprendizagem. Essa iniciativa vem ao encontro de uma concepção

das novas tecnologias como inerentes ao processo educativo e, consequentemente, com um

modo ressignificado de conduzir a formação docente, no que tange ao conhecimento e ao uso de

tecnologias digitais, incluindo aí, os vídeos/microvídeos.

Dentre as ações governamentais observadas e que almejam uma formação docente de

qualidade podemos citar o Curso de Capacitação semipresencial “Tecnologias na educação:

ensinando e aprendendo com as TIC24”, proposto pelo MEC, via Portal do Professor. Trata-se de

um curso de 100 horas, inserido no Programa Nacional de Formação Continuada em Tecnologia

Educacional (ProInfo Integrado) que, em regime de cooperação entre a União, os Estados, o

Distrito Federal e os Municípios, integra o PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação - de

nosso país. Conforme consta no “Guia do Cursista” do referido curso (TORNAGHI; PRADO;

ALMEIDA, 2010, p. 7), esse programa (ProInfo Integrado) tem como um de seus objetivos

“promover a inclusão digital dos professores e gestores escolares das escolas de educação básica e

comunidade escolar em geral”. (TORNAGHI; PRADO; ALMEIDA, 2010, p. 9).

Em uma rápida análise das atividades do referido curso foi possível perceber o

compromisso de sua equipe de planejamento e de capacitação para que a aprendizagem dos

professores (não somente os técnicos, mas também eles!) fosse construída nas bases sólidas da

reflexão da pesquisa e da elaboração próprias, assim como defende Demo (1997)25. Ou seja, que

este curso de capacitação promova a pesquisa e elaboração produzidas com mão própria, fazendo

a devida inter-relação da teoria com a prática, isto é, o pensar e o agir, num processo sucessivo de

ação-reflexão-ação-reflexão. Por exemplo, durante todo o curso observa-se o cuidado para que a

aprendizagem dos alunos/professores seja desenvolvida num processo de intercâmbio entre os

conceitos e a(s) prática(s) que o(s) justifica(m). Como se coloca em uma das reflexões da atividade

2.1, da Unidade 226, trata-se de uma proposta que promove “uma espécie de meta-

aprendizagem”, isto é, vai se aprendendo sobre como se aprende no próprio processo de aprender. Em outras

palavras, trata-se de um processo em que, em termos piagetianos (CASTRO, 2001), o

professor/aprendiz vai construindo sua aprendizagem pela interação com o meio em que atua,

realizando-se de modo progressivo. Casal (2013) corrobora com essa ideia, defendendo que, se

no mundo de hoje não se comporta pensar a aprendizagem dos alunos nativos digitais sem seus

computadores, tablets, celulares, redes sociais e as www, há que se pensar em uma direção

comum e intercambiante entre as influências educacionais tecnológicas e práticas, de modo que a

união entre o construtivismo e a tecnologia se dê de forma natural.27

Portanto, trata-se de uma proposta de formação docente que se preocupa com o

profissional enquanto aluno que deve aprender, para, com isso, ser capaz de incentivar, promover

e desenvolver essa prática em sala de aula (intenção demonstrada na atividade 2.6 - Planejamento

de uma atividade com hipertexto virtual para os alunos). Confirma-se, assim, o propósito de fazer

24 Veja o curso completo em: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/storage/materiais/0000011620.pdf. Último acesso: 13/06/2015. 25 Segundo Demo (1997), o grande compromisso da educação e, ao mesmo tempo, o seu grande desafio, está em inserir, no espaço de aprendizagem, a prática do aprender pela pesquisa e pela elaboração próprias. 26 A Unidade 2 trata do tema “Internet, Hipertexto, Hipermídia”, no link: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/storage/materiais/00000620.pdf. 27

Casal (2013) chega a mencionar o conceito “construtivismo tecnológico”, porém, argumenta que o uso deste

termo é quase um excesso, dada a dificuldade de se ter um ensino construtivista atual sem o uso da tecnologia.

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com que o aprendiz vá construindo suas aprendizagens por meio da vivência consciente, em um

ambiente onde tanto o acertar como o errar fazem parte do processo de aprender. E essa

“vivência consciente” de “pensar sobre o agir”, conduzida por um encaminhamento de “meta-

aprendizagem”, proposto neste curso de capacitação, com certeza, só trará benefícios ao processo

em construção de aprendizagem dos docentes, constituindo-se, assim, em uma proposta

exemplar de capacitação que centraliza a docência. Também é possível perceber que as ações

propostas neste curso apresentam um estilo de linguagem devidamente dialógico, com todas as

reflexões e explicações necessárias, como numa espécie de tutorial, assim como ocorre com a

atividade em que se oferecem todas as orientações para a criação do Portfólio/Blog (p. 97 e 98).

Propostas como a do curso acima mencionado e que promovem as práticas do acertar do

errar como essenciais do processo de aprender acabam também favorecendo o ambiente

instigador de produções criativas e inéditas. Desses contextos, sobressaem professores corajosos

e motivados que, em meio dos tantos posicionamentos contrários e pessimistas que povoam o

ambiente escolar, quebram as regras e ousam transitar com seus alunos por novas experiências de

aprender/ensinar. Esses professores colocam-se à frente do processo educativo arcaico que

insiste em permanecer, quase que numa “luta contra a maré”, porque já estão convencidos da

necessidade de mudança, já enxergam as novas tecnologias como algo inerente ao seu fazer

pedagógico. Como exemplo, temos o relato de uma experiência desenvolvida por uma professora

da rede pública do Estado de São Paulo, com alunos do 3º ano do Ensino Médio, conforme

descrito abaixo:

1. A referida professora desafia esses seus alunos a refletir, ensinar e aprender sobre alguns temas

polêmicos de nossa época, tendo, cada um, a liberdade para escolher o tema que mais lhe chamou

a atenção. A partir da escolha do tema de sua preferência, deveria fazer pesquisas sobre o mesmo.

Cada aluno teve que pesquisar no Google28 as informações necessárias, escrevendo o que

entenderam sobre o assunto, resultando, ao final, em uma produção de um texto de opinião29,

escrito no Word.

2. Após todos os textos terem sido devolvidos aos seus respectivos donos, com as devidas

correções da professora, esta solicitou que cada um resumisse o assunto de seu texto e, em

seguida, o transformasse em um o texto audiovisual. Para essa atividade, a professora promoveu

uma reflexão sobre a clareza que as imagens devem apresentar e, no caso de inserção de som, a

necessidade de o mesmo também ser claro e limpo; além disso, a professora também refletiu com

eles sobre a necessidade de o conteúdo da mensagem estar dentro do contexto e cumprir com o

foco do tema em questão.

3. A proposta, na verdade, era que o resultado desse trabalho fosse a produção de um pequeno

vídeo nos moldes de um microconteúdo educacional, usando um aplicativo chamado “movie

28 A escolha do Google como site de busca neste trabalho de pesquisa se deve principalmente por se tratar um dos mais conhecidos entre professora e os alunos envolvidos. 29 Texto de opinião pelo fato de a turma estar estudando o conteúdo “Texto de opinião”, em cumprimento do currículo da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.

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maker”30. Para isso, os alunos agruparam segundo a semelhança de seus temas para, juntos,

produzirem o microvídeo educacional, utilizando-se de seus conhecimentos das novas

tecnologias digitais. Cada grupo de alunos passaria ali a ideia geral do tema foco, considerando o

que fora escrito em seus textos de opinião.

4. Para dar conta do proposto, alguns desenharam partes para serem apresentadas no vídeo;

outros usaram imagens da internet. Nesse momento, foram alertados sobre os cuidados que

devem ser tomados ao se usar uma imagem ou texto retirados da internet para não se constituir

como plágio e estar protegido de processos judiciais, além de se refletir sobre o que é autoria e a

necessidade da competência autoral, nos dias atuais. Também durante o desenvolvimento do

trabalho de produção do vídeo foram discutidas questões sobre a proibição do uso de imagens

sem autorização prévia, da necessidade de cuidado com o processo de masterização (ou técnica

de produção) desses vídeos, principalmente, de vídeos com finalidade educativa.

Como não poderia ser diferente, a produção dos vídeos ficou muito aquém do que

deveria ser um vídeo educativo desenvolvido por um especialista no assunto. Entretanto, ainda

assim, é possível perceber a capacidade de síntese dos alunos na estruturação do microvídeo

como ferramenta de aprendizagem. Além de que, um olhar pedagógico não verá apenas o vídeo

em si, mas, também, o tipo de exploração realizada e pensada no processo de produção.31

Apesar da simplicidade e do amadorismo do trabalho realizado, os frutos apareceram: os

alunos sugeriram o uso das ferramentas proporcionadas pelas novas tecnologias para a escrita do

roteiro de um game, onde se colocaria as fases, como alcançá-las e o que se conquistaria em cada

uma. Além disso, o que importa é que, dentre os objetivos deste trabalho realizado com os alunos

fazendo uso das novas tecnologias, está a busca da motivação para o estudo, fazendo jus a um

ambiente veloz que dispensa a monotonia, além do fato de estar indo ao encontro de uma

característica própria dos estudantes nativos digitais que é poder colocar a “mão na massa”, ou

seja, aprender fazendo e com a devida mediação do professor para, assim, preservar a qualidade

da aprendizagem. O importante de tudo isso foi o protagonismo dos alunos e da professora no

desenvolvimento dos projetos, além dessas produções funcionarem como objetos colaborativos

de aprendizagem. No final, promoveu-se o conhecimento dialogicamente, de modo que tanto

alunos como a professora aprendessem com prazer para dar sentido à aprendizagem.

Considerações Finais

O presente teve como objeto de estudo a produção de microvídeos educacionais,

enquanto objeto de aprendizagem digital interativa, enfocando, mais especificamente, o trabalho de

masterização (ou técnica de produção) desta ferramenta na internet, tendo como fundamento mais

30 “Movie Maker” é um recurso do Windows que permite criar filmes e apresentações de slide no computador, podendo também incluir sons. Para mais explicações, acesse o link http://windows.microsoft.com/pt-PT/windows-vista/Make-a-movie-quickly-in-Windows-Movie-Maker-Aut. 31 A título de demonstração, apresenta-se uma amostra de um dos vídeos produzidos no link: Movie Maker Corrupção https://youtu.be/sPpln7rgEeQ.

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direcionado a “teoria cognitiva de aprendizagem multimídia”, de Richard Mayer, por meio da

qual, se apresenta os princípios norteadores para a produção de um material multimídia.

As reflexões desenvolvidas confirmaram a relevância do microvídeo educacional,

enquanto ferramenta veiculadora de microconteúdos e da “aprendizagem com mobilidade”, no

contexto das tecnologias móveis. Confirmaram também a importância e necessidade de o

microvídeo educacional e tudo que o envolve ser uma oportunidade a ser aproveitada para que se

aprenda de forma produtiva, uma vez que os jovens estudantes “nativos digitais” mostram-se

receptivos a essa ferramenta e às aprendizagens que ela promove, por suas características de

informalidade, flexibilidade, objetividade, simplicidade e sedução.

Além disso, as reflexões travadas também apontaram, como possíveis políticas

propulsoras da concretização do uso das novas tecnologias digitais em sala de aula (incluindo o

vídeo e o microvídeo), o fomento à exploração dos Recursos Abertos de Aprendizagem (REA) e

a projetos que centralizem formação docente, a exemplo de algumas iniciativas que caminham

nessa direção.

Em suma, todas as ideias permeadas no decorrer do texto sinalizaram a necessidade de reinvenção e inovação, em resposta às demandas atuais, como um dos maiores desafios da educação contemporânea.

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