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ADILSON MARQUES O reiki segundo o espiritismo Este livro é dedicado a duas almas fraternas e muito especiais em minha vida: O Sérgio Parreli e a Karina Fröner. A vocês, o meu sincero agradecimento. SÃO CARLOS - 2005

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  • ADILSON MARQUES

    O reiki segundo o espiritismo

    Este livro dedicado a duas almas fraternas e

    muito especiais em minha vida: O Srgio Parreli

    e a Karina Frner. A vocs, o meu sincero

    agradecimento.

    SO CARLOS - 2005

  • Introduo

    Para trs, todos vs negadores do

    progresso, para trs, com as vossas crenas

    de uma outra poca. Por que negais o

    progresso e quereis entrav-lo? que,

    querendo vencer, vencer ainda e sempre,

    condensastes o vosso pensamento em artigo

    de f, dizendo Humanidade: sers

    sempre criana, e ns, que temos a

    iluminao do alto, estamos destinados a te

    conduzir. (Mensagem de um esprito

    publicada em Obras Pstumas, de Allan

    Kardec, p. 307)

    Interpreto a mensagem acima como um sinal de que a espiritualidade no

    monoplio de nenhuma religio e nem mesmo de caminhos espirituais codificados, como

    o prprio Espiritismo. O sentido profundo dos valores espirituais encontra-se sempre em

    uma dimenso pessoal e intransfervel. As doutrinas embaam nossa experincia nica com

    Deus e, muitas vezes, at a impede. Elas servem para preparar o nefito para o grande

    mergulho na realidade suprema e inefvel de um Deus vivo, acolhedor e misericordioso,

    mas elas no so ainda a experincia numinosa.

    Gradativamente, o que, a princpio, era para ser um caminho cientfico para auxiliar

    na renovao moral da humanidade, um caminho para a destruio filosfica do

    materialismo atravs da comprovao emprica da vida aps a morte e da comunicabilidade

    natural com os mortos, o espiritismo virou, no Brasil, mais uma religio preocupada

    com doutrinao (catequese) e proselitismo. Esqueceu-se que o lema de Kardec era fora da

    caridade no h salvao e se criou um novo: fora do espiritismo no h salvao.

  • Porm, se retornarmos, sem pr-conceitos, aos livros de Kardec, ns vamos notar

    muitas diferenas entre o que ele denominou como Espiritismo e a prtica medinica

    praticada no Brasil, cujo nome, numa anlise mais acurada, deveria ser chamada de

    kardecismo.

    Muitos adeptos do kardecismo comportam-se como os novos doutores da Lei,

    proclamando-se como os legtimos e nicos representantes do Cristo, e com imunidade para

    emitir opinies pejorativas e preconceituosas contra as demais doutrinas, sobretudo, a

    Umbanda. Muitos apostam no discurso do medo, trocando o inferno dos catlicos pelo

    umbral para intimidar quem freqenta terreiros ou se comunica com ndios e pretos-

    velhos, os espritos selvagens, primitivos e inferiores, como gostam de falar e de

    escrever. Preconceito ou no, quem somos ns para julgar?

    Em nossa modesta opinio, o Deus misericordioso de Jesus abenoa todos os

    caminhos que desejam a regenerao da Terra e a purificao do esprito eterno. E no me

    parece que o desejo de Kardec fosse que se desmanchasse no ar sua racionalidade e o seu

    bom senso, para que, em seu nome, se praticasse o preconceito e o fanatismo religioso.

    Felizmente, e graas a Deus, o Espiritismo est nas Leis da natureza, e ele muito

    mais amplo e complexo que o kardecismo. Talvez este seja o movimento dominante no seio

    do Espiritismo brasileiro, o que nos leva a confundir, freqentemente, Espiritismo com

    kardecismo e nos faz pensar que os demais movimentos espritas sejam dissidncias. Em

    essncia nunca houve dissidncia no movimento esprita. Ocorreu, e continuar ocorrendo,

    o desabrochar de agrupamentos no kardecistas.

    Em outras palavras, o descontentamento com um certo igrejismo kardecista

    originou o racionalismo cristo, movimento que optou em seguir um caminho mais

    cientfico, como o fez Kardec; O preconceito s entidades indgenas, aos pretos-velhos e s

    crianas, originou a Umbanda, tambm chamada, corretamente, de Espiritismo de

    Umbanda, por Zlio de Morais; O desrespeito s demais doutrinas espiritualistas,

    sobretudo, s do Oriente, originou o movimento esprita universalista que, atravs do

    ecletismo criativo, procurou aproximar o pensamento kardequiano da rica e ancestral

    espiritualidade oriental. E assim por diante.

  • Em suma, todos os movimentos acima so espritas, pelo menos no sentido

    proposto nos livros kardequianos, mas no so, necessariamente, kardecistas. O mesmo

    pode ser dito das igrejas batistas, nos EUA, que acreditam na reencarnao e daquelas onde

    se pratica a psicografia.

    Em seu livro Obras Pstumas, livro que muitos kardecistas resolveram classificar

    como no-doutrinrio, Allan Kardec afirma que seria uma utopia pretender que o

    Espiritismo fosse organizado da mesma maneira no mundo todo. O Espiritismo possui,

    obviamente, princpios comuns: a imortalidade da alma, a reencarnao como uma lei

    natural, o fenmeno medinico e a lei da causa e efeito regendo nossas vidas. Porm, sua

    aplicao poder variar sem que a unidade fundamental seja rompida. Alm disso, afirma

    Kardec, que lanar a pedra e o antema, prticas rotinizadas e banalizadas em muitas

    casas kardecistas, uma atitude anti-esprita.

    Em seus livros Kardec no critica nenhum ritual ou objeto ritualstico, ele apenas

    esclarece como eles funcionam. Afirma que sevem para facilitar a concentrao e manter o

    pensamento elevado dos participantes. Com exceo de grupos espiritualistas que cobram

    pelo trabalho espiritual, que praticam magia negra ou que sacrificam animais, nenhuma

    outra prtica espiritualista ou doutrina voltada para a caridade, a s razo kardequiana

    censuraria.

    Assim, como explicar a crtica que muitos livros kardecistas fazem s outras

    doutrinas espiritualistas? Vrios livros, publicados pela FEB ou por editoras espritas, so

    recheados de crticas ao Budismo, ao Hinduismo e, principalmente, Umbanda. Seria essa

    uma atitude kardequiana? Possivelmente no e, muito menos, crist.

    Modestamente, no acredito que Kardec defenderia que se proibisse a manifestao

    medinica de espritos indgenas ou de pretos-velhos. O preconceito que existe no meio

    kardecista em relao a estas entidades to significativo que muitas livrarias espritas

    no deixam expostos os livros dos espritos Ramats e de ngelo Incio, autores espirituais

    que ajudam a desconstruir este preconceito secular dos kardecistas em relao ao trabalho

    sagrado da Umbanda, mas os deixam escondidos para vender queles que os procuram.

  • Porm, acredito que vir o momento em que o importante trabalho das entidades

    espirituais que assumem essa forma simblica nos trabalhos socorristas ser valorizado e

    reconhecido tambm pelos kardecistas. Basta aguardar com resignao e coragem.

    Para resgatar a chama sagrada que iluminou o esprito crtico e inquiridor de Kardec

    e que est na essncia do Espiritismo, necessrio se voltar para o debate profcuo de

    idias e de sentimentos que nos aproximem da divindade, que iluminem a chama eterna que

    se esconde no interior de cada criatura. E a internet essencial neste processo,

    democratizando o acesso aos textos, pois o livro esprita no foi pensado para enriquecer

    autores ou editoras, mas para valorizar a espiritualidade. E esta vive da gratuidade e da

    doao desinteressada. Infelizmente, em volta do grande interesse da populao por temas

    espirituais, formou-se uma rede de editoras publicando livros e revistas espritas,

    unicamente com um objetivo: ganhar muito dinheiro. Uma editora paulista, por exemplo,

    chega a escrever na contra-capa de seus livros que a pessoa que reproduzir seus livros ir

    adquirir carma.

    por causa de tantos barbarismos que est na hora de valorizar o Espiritismo em

    seu sentido original, o kardequiano. Em outras palavras, como uma cincia que possui

    conseqncias filosficas e morais.

    Compreendendo que o Espiritismo kardequiano no religio, conseguimos

    diferenci-lo do kardecismo, uma religio medianmica importante que nasceu, no Brasil,

    derivada dos textos de Kardec, mas que no o Espiritismo.

    Com tal diferenciao, muitos erros de interpretao deixam de existir e quem se

    salva o prprio Espiritismo que pode continuar sua marcha evolutiva, abrindo-se para

    novos temas e discusses transcendentais.

    A leitura atenta e profunda da obra de Kardec nos autoriza a afirmar que, em

    nenhum momento, ele afirma que o Espiritismo uma nova religio ou seita e nem h

    indcios que nos faam afirmar, como corrente no meio kardecista brasileiro, que o

    Espiritismo o futuro da religio ou a religio do futuro. Mais do que novas doutrinas

    que enchem a cabea com teorias sobre Deus, ns necessitamos de experincias que

    revelem a realidade viva de Deus em nosso corao.

  • Assim, compreendendo a distino acima, vamos nos aperceber, por exemplo, que

    nem todo Centro Esprita, apesar do nome, pratica o Espiritismo e que, muitas prticas

    classificadas, rotineiramente, como no-doutrinrias pelo kardecismo, podem e devem

    ser objetos de estudo do Espiritismo, pois so, essencialmente, manifestaes espritas.

    Como afirmou Kardec no livro Obras Pstumas (p. 250), as crenas, tendncias e o

    objetivo do Espiritismo so os seguintes:

    - O elemento espiritual e o material so dois princpios, duas foras vivas da

    natureza, complementando-se e reagindo, incessantemente, uma sobre a

    outra. A misso da cincia o estudo das leis da matria e o espiritismo, o

    estudo do elemento espiritual em suas relaes com o elemento

    material (grifo meu).

    - Sendo o elemento espiritual um estado ativo da natureza, os fenmenos

    espritas so to naturais quanto os que tem sua fonte na matria neutra. E o

    espiritismo uma doutrina filosfica que tem conseqncias religiosas,

    como toda doutrina espiritualista; por isso mesmo toca forosamente s

    bases fundamentais de todas as religies, (...) mas no uma religio

    constituda. (grifo meu)

    Resgatando tais axiomas, possvel compreender que nem todos os movimentos

    kardecistas respeitam os princpios kardequianos que originaram o Espiritismo. Como

    afirmou Kardec: a tolerncia, conseqncia da caridade, que a base da moral esprita,

    lhe faz um dever respeitar todas as crenas. (OP, p. 337) Assim, autores e palestrantes que

    fazem crticas, quase sempre, grosseiras, frgeis e sem fundamento ao Budismo, ao

    Hindusmo e, principalmente, Umbanda, no podem ser classificados como kardequianos

    e muito menos como espritas.

    Apesar de muitos kardecistas se colocarem como os legtimos defensores da pureza

    doutrinria, ns devemos nos lembrar que Kardec (O.P., p. 341) afirmou, categoricamente:

  • , pois, do dever de todos os Espritas sinceros frustrar as manobras da intriga,

    que se podem urdir nos menores centros, como nos maiores. Devero, antes de tudo,

    repudiar, da maneira mais absoluta, quem se colocar, por si mesmo, como um messias,

    seja como chefe do Espiritismo, seja como simples apstolo da Doutrina.

    Como diz a epgrafe que abre este estudo, por que negais o progresso e quereis

    entrav-lo? Que Deus abenoe aqueles que se dedicam ao estudo da Transcomunicao

    Instrumental, da Apometria, das novas terapias vibracionais etc., removendo as cinzas de

    um kardecismo intolerante e entrpico, para irradiar as luzes da espiritualidade viva desse

    momento de regenerao e brandura, onde o mais importante no doutrinar, mas

    (co)mover coraes.

    As siglas que aparecem neste livro so referentes aos seguintes livros:

    LE Livro dos Espritos. Araras/SP: IDE, 138a edio, 2002.

    OE O que Espiritismo. Araras/SP: IDE, 33a edio, 1974. LM Livro dos Mdiuns. Araras/SP: IDE, 59a edio, 2001.

    OP Obras Pstumas. Araras/SP: IDE, 1a edio, 1993.

    EE O Evangelho segundo o Espiritismo. So Paulo: Petit, 1997.

    G A Gnese. Araras/SP: IDE, 3a edio, 1992.

  • Captulo I

    Afinal, o que Espiritismo?

    O Espiritismo , pois, a doutrina fundada

    sobre a existncia, as manifestaes e o

    ensinamento dos Espritos.

    Kardec (O que Espiritismo, p.186)

    Kardec nos afirma que o Espiritismo uma cincia experimental, constituda a

    partir das instrues dadas pelos Espritos sobre todos os assuntos que interessam

    Humanidade e, tambm, atravs das respostas s perguntas que lhes foram propostas, tendo

    sido recolhidas e coordenadas com cuidado (OE, p.186). Tais instrues possibilitaram a

    Kardec produzir trs estudos fundamentais, um de ordem filosfica (O Livro dos Espritos),

    um de ordem moral (O Evangelho segundo o Espiritismo) e um sobre o processo de

    comunicao medinico (O livro dos Mdiuns).

    Porm, devemos nos lembrar que Kardec viveu e escreveu imbudo pelos valores

    dominantes do homem europeu do sculo XIX: o evolucionismo, o positivismo, o

    cientificismo etc. Alm disso, se tais livros abarcaram todos os assuntos que interessavam

    naquele momento da histria europia e ocidental, no significa que outros assuntos no

    possam ser abordados pelo Espiritismo. Ou ser que eles do conta de todos os assuntos

    que interessaram humanidade do sculo XX e dos que interessaro humanidade do

    sculo XXI?

    Ser que Kardec poderia prever que entre outros assuntos, o homem ocidental se

    preocuparia com a preservao do meio ambiente e, relacionado a este tema, com o

    vegetarianismo e com o direito dos animais? Ele poderia prever o surgimento de novas

    terapias vibracionais como os Florais, o Reiki, a Cromoterapia ou a Musicoterapia? Ou que

    o homem dito civilizado demonstraria um interesse gradativo pelas ancestrais filosofias e

  • prticas corporais do Oriente, tais como o Tai Chi Chuan, o Yoga, a Meditao, o Do-In?

    E mesmo no campo do mediunismo, ser que Kardec imaginaria que no sculo XX a

    Umbanda seria renovada, abolindo o sacrifcio de animais e a cobrana pelo trabalho de

    assistncia espiritual ou que haveria uma crescente manifestao medinica de entidades na

    forma de ndios, pretos-velhos, crianas, orientais etc., alm dos famosos mdicos, literatos,

    padres e filsofos? Kardec poderia prever o surgimento da Transcomunicao Instrumental,

    justamente, no seio da Igreja Catlica, no Vaticano? E a Apometria, com o diagnstico de

    outras enfermidades espirituais?

    Em suma, so tantos temas e assuntos espritas que, se Kardec tivesse encarnado no

    sculo XX, teria produzido, ou orientado, muitos estudos segundo o Espiritismo.

    Sendo o Espiritismo uma cincia experimental, tais assuntos apresentados acima,

    todos de interesse da humanidade, no podem ser levados aos Espritos? Ser que estes no

    podem abord-los em reunies medinicas?

    Dentro da lgica e do bom senso kardequiano, tudo leva a crer que sim. Porm,

    consolidou-se, no sculo XX, um movimento kardecista para o qual todo e qualquer

    assunto que no esteja contido nas chamadas obras da codificao no doutrinrio.

    Desse ponto de vista, os Espritos que ousam abord-los so rotulados como

    mistificadores e os mdiuns que os escutam de fascinados.

    Os seguidores de tal movimento insistem em escrever e propagar que a Umbanda

    no Espiritismo, que uma srie de terapias ensinadas por espritos no Espiritismo etc.

    Possivelmente tais escritores nunca leram o artigo o espiritismo entre os druidas,

    publicado em 1858, na revista Esprita, editada pelo prprio Kardec. Se para o codificador

    do Espiritismo at os druidas (que eram tidos como supersticiosos e sanguinrios pelos

    cristos) praticavam espiritismo, porque no os umbandistas e os nossos silvcolas? E se

    at Scrates, que defendia o aborto para controlar o crescimento populacional,

    considerado precursor do espiritismo, porque tanto pavor diante de uma entidade indgena

    ou de um peto-velho?

    Tais contradies s podero ser resolvidas quando reconduzirmos a questo

    esprita para o campo proposto por Kardec: o da Cincia. Compreendendo que o

    Espiritismo um campo de pesquisa experimental onde todos os assuntos da humanidade

  • so objetos de estudo, a doutrinao cai por terra, uma vez que, a cincia tem como meta

    compreender e explicar o mundo. A doutrinao pertence a outro departamento: o da

    religio. Logo, no deve ser pensado como um kardequiano ou um cientista esprita quem

    afirma que um determinado assunto, ainda mais envolvendo a espiritualidade, no seja

    doutrinrio.

    Kardec parece ter profetizado quando afirmou que ao lado da Doutrina Esprita

    podero se formar seitas fundadas ou no sobre os princpios do Espiritismo (O.P., p. 336).

    E o kardecismo , com certeza, a mais importante delas. Mas importante salientar que no

    foi Kardec quem criou o kardecismo. Alis, no custa realar, sempre afirmou que o campo

    de pesquisa do Espiritismo o cientfico e no o religioso. As foras no meio kardecista

    que no aceitam que novos temas sejam discutidos (com o argumento de salvaguardar a

    pureza doutrinria), demonstram apenas que se renderam ao dogmatismo e ao fanatismo.

    Pois sempre mais fcil e cmodo, para se fazer proslitos, manter-se preso s frases feitas,

    decoradas e proferidas exaustivamente do que raciocinar de forma independente e crtica, o

    objetivo maior de Kardec. O Espiritismo proposto por Kardec no est preocupado em

    fazer proslitos e muito menos em doutrinar.

    Em suma, o cientista esprita possui conscincia histrica e sabe que a Histria e o

    mundo se transformam, assim como as imagens que as pessoas tm desse mesmo mundo.

    por isso que h um fosso significativo e quase intransponvel entre a cincia e a religio. A

    primeira feita, sobretudo, com conscincia. Ela dinmica, neg-entrpica, e seus

    mtodos, suas heursticas e seus objetos so sempre renovados, quando necessrios. E

    assim tambm com o Espiritismo, a cincia experimental criada por Kardec, mesmo que

    ele ainda no seja reconhecido pelos donos do saber acadmico e no obtenha recursos para

    pesquisas. Alis, hoje em dia, mais fcil obter recurso para congelar corpos em

    decomposio e esperar o dia em que a cincia poder ressuscit-los, do que para realizar

    pesquisas srias sobre reencarnao e imortalidade da alma.

    Apesar de dinmica, a cincia esprita, ainda hoje, deve seguir o mesmo axioma

    anunciado por Kardec, no Livro dos Espritos:

  • Ela (a cincia esprita) exige um estudo assduo e, freqentemente,

    longo demais; no podendo provocar os fatos, preciso esperar que eles se

    apresentem e, no geral, eles so conduzidos por circunstncias das quais

    nem ao mesmo se sonha. Para o observador atento e paciente, os fatos se

    produzem em quantidade, porque ele descobre milhares de nuanas

    caractersticas que so, para ele, rasgos de luz. Assim o nas cincias

    vulgares; enquanto que o homem superficial no v numa flor seno uma

    forma elegante, o sbio nela descobre tesouros pelo pensamento. (...)

    Portanto, no nos enganemos, o estudo do Espiritismo imenso, toca em

    todas as questes da metafsica e da ordem social, e todo um mundo que

    se abre diante e ns (LE, p. 32. Grifo meu).

    Podemos compreender pela passagem acima que Kardec possui uma mentalidade

    aberta e cientfica, nada dogmtica ou religiosa. Os fatos espritas se produzem em

    quantidade, ele afirma. Se todo um mundo se abre diante de ns, e lembrando que o Livro

    dos Espritos necessitou de seis edies para, finalmente, Kardec concluir que aquele

    estudo estava encerrado, percebe-se que no fcil fazer a cincia proposta por Kardec.

    Diferentemente, porm, o agir doutrinador kardecista. Repetindo, acriticamente, frases e

    palavras fora do contexto em que foram criadas e julgando tudo o que possa renovar ou

    aprofundar o estudo esprita como no-doutrinrio, o kardecismo no faz cincia, apenas

    proselitismo.

    Felizmente, porm, acertam quando se consideram membros de uma religio. a

    religio que se preocupa com doutrinao e catequizao, no a cincia. Diversos assuntos

    no so doutrinrios para o kardecismo, mas interessam ao cientista esprita. Enquanto a

    religio se preocupa em fazer proslitos; a cincia produz e difunde conhecimento.

    Reconduzindo o Espiritismo ao seu devido lugar, o da Cincia, necessitamos

    retomar o papel dos Espritos e o objetivo do Espiritismo, segundo Kardec:

    Os Espritos no esto encarregados de nos trazerem a cincia

    pronta. Seria, com efeito, muito cmodo se nos bastasse perguntar para

  • sermos esclarecidos, poupando-nos assim o trabalho de pesquisa. (...) Os

    espritos no vm nos livrar dessa necessidade: eles so o que so e o

    Espiritismo tem por objeto estud-los, a fim de saber, por analogia, o

    que seremos um dia e no de nos fazer conhecer o que nos deve estar

    oculto, ou nos revelar as coisas antes do tempo (OE, p. 68, grifo meu).

    Kardec deixa claro que o objetivo do Espiritismo fazer cincia, estudando os

    Espritos e que tal cincia no se encontra pronta. nesse sentido que temos que entender a

    expresso codificao. Codificar tambm um ato ativo, que exige trabalho, criatividade e

    criticidade. Quantas pessoas no afirmam que Kardec no teve papel ativo, no criando

    nada, apenas codificando os ensinamentos dos espritos, o que d ao termo codificao

    um sentido quase metafsico e sobrenatural. Kardec foi importante e ativo, inclusive

    manifestando criativamente seu preconceito eurocntrico, fato que foi, inclusive, respeitado

    pela espiritualidade, como veremos adiante.

    E como todo campo cientfico, o Espiritismo tambm deve se aprimorar, mudar de

    paradigmas, de heursticas etc. E, no mbito cientfico, a nica concluso cabal que se pode

    tirar do Espiritismo que h influncia do mundo invisvel sobre o mundo visvel. E que j

    se pode definir algumas das relaes que existem entre eles. Porm, afirmar que o

    Espiritismo j revelou tudo sobre o mundo esprita e que mais nada h para se estudar,

    muita preguia mental. Da mesma forma que afirmar que o correto contatar a

    espiritualidade somente atravs de mdiuns sentados em volta de uma mesa, e que o

    mdium incorporado nunca pode se locomover pelo ambiente de trabalho medinico.

    Tais afirmaes so de ordem metodolgica, e no valores doutrinrios.

    Como j nos referimos, as pesquisas de Kardec trouxeram conseqncias

    importantes, sobretudo para o mbito filosfico e moral. Ou seja: A prova patente da

    existncia da alma, da sua individualidade depois da morte, da sua imortalidade e do seu

    futuro.(OE, p. 70) Isto o mais importante. Todo resto se constitui em mtodos e

  • heursticas que constituem as diferentes modalidades de Psiconomias1, em outras palavras,

    processos de racionalizao e de metodologias para o intercmbio medinico.

    Assim, se os kardecistas s trabalham sentados em volta de uma mesa, no quer

    dizer que outras linhas espritas no possam se organizar de outra forma para recepcionar e

    trabalhar com os irmos desencarnados. Se os kardecistas necessitam de mesas, outros

    agrupamentos necessitam de macas, colchonetes, elementos da natureza etc.

    O importante que h todo um vasto mundo aberto para ser conhecido com o

    advento da cincia esprita. E por isso que Kardec, preferindo seguir seu estudo pelo

    campo da cientificidade, reforou, freqentemente, que h duas coisas no Espiritismo: a

    parte experimental das manifestaes e a doutrina filosfica (OE, p. 78). importante

    ressaltar que ele fala sempre em doutrina filosfica e no em doutrina religiosa. Alm de

    no falar em religio em nenhum momento, Kardec afirma que foi a Igreja Catlica que

    transformou o Espiritismo em religio:

    Pela natureza e veemncia de seus ataques, ela alargou a

    discusso e a conduziu para um terreno novo. O Espiritismo no era

    seno uma simples doutrina filosfica e foi ela mesma que o engrandeceu

    apresentando-o como um inimigo terrvel; enfim, foi ela que o proclamou

    como uma nova religio. Foi uma impercia, mas a paixo no raciocina

    (OE, p. 86).

    Porm, se foi a Igreja Catlica que tentou transformar o Espiritismo em religio,

    fato que o kardecismo assumiu de braos abertos, est na hora de reconduzir a discusso

    para a esfera proposta por Kardec para que a impercia no se torne ainda mais grave e o

    Espiritismo morra de inanio. Est explicito na obra de Kardec que o Espiritismo no

    religio. Assim, todos aqueles que pretendem ser coerentes com o pensamento kardequiano

    1 Assim, o kardecismo, a umbanda, a apometria e a prpria transcomunicao instrumental desenvolvem seus prprios mtodos e heursticas, de acordo com o objetivo que cada modalidade medinica necessita. Todas elas so sistemas singulares para o intercmbio medinico, no sendo possvel afirmar, categoricamente, qual o melhor e qual o pior. Qual envolve apenas espritos superiores e qual est nas mos de espritos inferiores.

  • devem reconduzir o debate sobre o Espiritismo ao seu devido lugar: o domnio da Cincia e

    o da Filosofia. No-doutrinrio querer transformar o Espiritismo em religio. O que o

    kardecismo tem proposto nestes anos todos o que est manchando a pureza doutrinria

    do Espiritismo.

    Em outras palavras, j passou da hora de retomar o pensamento kardequiano para

    que a cincia esprita, ou seja, o Espiritismo, seja aprimorado. Se algum quiser falar que o

    kardecismo a religio do futuro ou o futuro da religio, como se l, rotineiramente, em

    livros, em revista e na internet que fale, mas nunca diga que o Espiritismo a religio do

    futuro, pois religio ele nunca foi e nem o ser. Respeitar a memria e a obra de Kardec

    de fundamental importncia.

    Isso no quer dizer que o Espiritismo no acarrete em significativas e importantes

    conseqncias morais e ticas, pois toda cincia feita com conscincia deve ter tais

    conseqncias. E para que no reste nenhuma dvida, analisemos a passagem abaixo de

    Kardec para desfaz qualquer mal-entendido a esse respeito:

    O Espiritismo est fundado sobre a existncia de um mundo

    invisvel, formado de seres incorpreos que povoam o espao, e que no

    so outros seno as almas daqueles que viveram sobre a Terra, ou em

    outros globos, onde deixaram seu invlucro material. So a esses seres

    que damos o nome de Espritos. Eles nos rodeiam permanentemente,

    exercendo sobre os homens, com o seu desconhecimento, uma grande

    influncia; eles desempenham um papel muito ativo no mundo moral, e,

    at um certo ponto, no mundo fsico. O Espiritismo, pois, est na Natureza

    e pode-se dizer que, em uma certa ordem de idias, uma potncia, como

    a eletricidade o em outro ponto de vista, como a gravitao o em

    outro. Os fenmenos, dos quais o mundo invisvel a fonte, so efeitos

    produzidos em todos os tempos; eis porque a histria de todos os povos

    deles faz meno. Somente que, em sua ignorncia, como para a

    eletricidade, os homens atriburam esses fenmenos a causas mais ou

    menos racionais, e deram a esse respeito livre curso imaginao.

  • O Espiritismo, melhor observado depois que se vulgarizou, veio

    lanar luz sobre uma multido de questes at aqui insolveis ou mal

    compreendidas. Seu verdadeiro carter, pois, o de uma cincia, e no

    de uma religio; e a prova disso que conta entre seus adeptos homens

    de todas as crenas, que no renunciaram por isso s suas convices:

    catlicos fervorosos que no praticam menos todos os deveres de seus

    cultos, quando no so repelidos pela igreja, protestantes de todas as

    seitas, israelitas, muulmanos, e at budistas e brmanes. Ele repousa,

    pois, sobre princpios independentes de toda questo dogmtica. Suas

    conseqncias morais esto no sentido do Cristianismo, porque o

    Cristianismo , de todas as doutrinas, a mais esclarecida e a mais pura, e

    por essa razo que, de todas as seitas religiosas do mundo, os cristos

    esto mais aptos a compreend-lo em sua verdadeira essncia. Pode-se,

    por isso, fazer-lhe uma censura? Cada um, sem dvida, pode fazer uma

    religio de suas opinies, interpretar vontade as religies conhecidas,

    mas da constituio de uma nova igreja, h distncia.

    (...) Procedemos em nossos trabalhos com calma e recolhimento,

    porque uma condio necessria para as observaes e, em segundo

    lugar, porque conhecemos o respeito que se deve queles que no vivem

    mais sobre a Terra, qualquer que seja sua condio, feliz ou infeliz, no

    mundo dos Espritos. Fazemos um apelo aos bons Espritos porque,

    sabendo que h bons e maus, resulta que estes ltimos no vem se

    misturar fraudulentamente nas comunicaes que recebemos. O que tudo

    isso prova? Que ns no somos ateus, mas isso no implica, de nenhum

    modo, que sejamos religiosos.(OE, p. 89 e seguintes. Grifos meus)

    Apesar de ser uma longa citao, ela importante para desfazer qualquer dvida.

    Alis, se Kardec escrevesse tal passagem no sculo XX, possivelmente teria acrescentado a

    Umbanda entre as religies cujos adeptos seriam espritas, pois o umbandista, mais do que

    os fiis de outras religies, acredita nas manifestaes dos Espritos, pois trata-se de uma

  • religio que se utiliza do mediunismo em suas prticas sagradas e em seus rituais. Da no

    fazer sentido a averso de muitos kardecistas Umbanda ou sua necessidade sombria de

    afirmar que a Umbanda no Espiritismo. Na verdade, a Umbanda uma religio esprita,

    pois se fundamenta na manifestao de Espritos. Portanto, o cientista esprita estuda a

    Umbanda e qualquer religio sem preconceitos e no as condena porque utilizam ritos e

    outras prticas religiosas. O Espiritismo no tem ritos ou rituais porque cincia e a

    cincia, por seu carter, deve ter mtodos e heursticas que so sempre colocados em

    discusso e no rituais ou dogmas.

    A passagem abaixo torna ainda mais evidente tal reflexo:

    ... Uma vez que, por toda parte que haja homens, h almas ou

    Espritos, que as manifestaes so de todos os tempos, e que o relato se

    encontra em todas as religies, sem excees. Pode-se, pois, ser catlico,

    grego ou romano, protestante, judeu ou muulmano, e crer nas

    manifestaes dos Espritos, e por conseqncia, ser Esprita; a prova

    que o Espiritismo tem adeptos em todas as seitas. (OE, p. 189, grifos

    meus).

    Est claro na passagem acima que o Espiritismo no uma nova seita e que

    Esprita, na acepo sugerida por Kardec, aquele que acredita na manifestao dos

    Espritos. Assim, como afirmar que o umbandista no Esprita? Somente quem no

    conhece a obra de Kardec pode fazer tal afirmao pueril.

    E um exemplo positivo de como o Espiritismo, como cincia, pode at ajudar na

    renovao dos cultos religiosos, encontramos no pioneiro e transgressor trabalho de Zlio

    de Morais, no incio do sculo XX, no Rio de Janeiro, no qual, baseando-se nos

    ensinamentos dos Espritos, aboliu, na Umbanda, o sacrifcio de animais, a cobrana pelos

    servios socorristas, enfatizou que a Umbanda deve praticar a caridade e seguir o preceito

    cristo da de graa o que de graa recebestes, valorizou as entidades que se manifestam

    como ndios, pretos-velhos e crianas, compreendendo a representao simblica que

    possuem etc., e deu um nome adequado para essa modalidade de socorro medinico que

  • estava ajudando a criar: Espiritismo de Umbanda. Seria um erro se ele a chamasse de

    Kardecismo de Umbanda. Porque a Umbanda e o Kardecismo possuem mtodos diferentes

    de trabalhar com o plano espiritual. So psiconomias distintas. Mas no resta dvida que

    ambas so manifestaes espritas.

    Outro exemplo em relao ao Reiki, uma espcie de passe oriental que virou

    moda no Ocidente, por volta da dcada de 1980, o assunto principal deste livro. Atravs dos

    ensinamentos dos Espritos foi possvel tomar conscincia que esta forma de

    fluidoterapia envolve o mundo espiritual atravs de uma equipe de mdicos

    desencarnados, preparados para esse trabalho socorrista e que tambm deve ser praticada

    atravs da caridade, gratuitamente, e que no qualquer pessoa que pode atender com o

    Reiki, mas quem , em suma, mdium de cura, independente de passar por uma, trs, dez

    ou cinqenta sintonizaes. Quantos aos smbolos, estes nenhuma serventia metafsica

    possuem, mas so ensinamentos morais baseados no Budismo e em outras filosofias

    orientais e servem para dar confiana ao passista e aumentar a f pelo emprego do smbolo.

    E discutir o Reiki fundamental hoje em dia, pois um fato inslito vem acontecendo

    em muitos centros espritas. Muitos kardecistas aplicam, gratuitamente, o passe nos

    dias e horrios de trabalho medinico e, em outros, aplicam o reiki cobrando pela sesso.

    O argumento que utilizam que o passe e o reiki so terapias diferentes. E que, a

    segunda, no envolveria a espiritualidade.

    A falta de esclarecimento sobre o funcionamento da tcnica faz com que enxerguem

    no reiki uma fonte de renda. Cobram para ensinar meia dzia de smbolos sagrados ou

    cobram pela sesso. Mas, a Lei bvia: quanto mais conhecimento, maior a

    responsabilidade. E o esprita aquele que ser mais cobrado, porque detm mais

    conhecimentos sobre os mecanismos da mediunidade e da vida espiritual. Lembremos,

    tambm, que Kardec alertou que a cobrana moral ser ainda maior sobre os mdiuns de

    cura.

    Assim, o kardecista que finge ver diferenas entre o passe e o reiki, visando

    ganhar dinheiro com a imposio das mos, colher, certamente, no futuro, o que semeia no

    presente.

  • Segundo a espiritualidade, o avano do reiki no mundo todo estava previsto para

    o sculo XX, mas que chegou a hora de romper com esse vis mercadolgico que o

    incentivou, resgatando sua verdadeira dimenso sagrada. Da mesma forma que do lazer

    proporcionado pelas mesas girantes, em meados do sculo XIX, Kardec evidenciou a

    existncia de conscincias incorpreas, o mesmo deve acontecer com o reiki.

    Gradativamente, a revelao espiritual chegar a todos os cantos do planeta e o reiki, que

    j at reconhecido pela Organizao Mundial da Sade (OMS), vai se transformar em um

    trabalho de cura espiritual importante, generalizado, porm, gratuito.

    No Brasil, esse fenmeno j comeou. Por volta de 2001, a Espiritualidade que atua

    na ONG Crculo de So Francisco, em So Carlos/SP, esclareceu os mdiuns a esse

    respeito. Se o procedimento adotado no reiki diferente do passe (usa-se macas e a

    pessoa recebe energia deitada; permite-se uma msica ambiente ao fundo e aromas2, por

    exemplo; o paciente no tratado de forma impessoal etc.) a essncia do trabalho a

    mesma. Ou seja, o tratamento realizado pela espiritualidade socorrista que utiliza o

    ectoplasma fornecido pelos mdiuns de cura. E todo o tratamento envolve a questo do

    merecimento.

    No caso dos animais, um dos argumentos utilizados pelos que cobram pelo

    tratamento e defendem a dimenso miraculosa do reiki, a explicao bvia: o animal

    no tem carma. Ele no precisa drenar toxinas do perisprito para o corpo fsico devido aos

    erros pregressos. Assim, o tratamento de nossos irmos menores no envolve a questo do

    merecimento. E por isso que o reiki tambm cura animais e plantas. Mas com o ser

    humano segue a lei numinosa da ao e reao e a cura depende da transformao interior e

    do merecimento do paciente.

    Alm da ONG, j tivemos noticias de outros ncleos onde a espiritualidade j fez

    esse alerta. O esclarecimento j foi feito na cidade de Santa Rita do Passa Quatro, em uma

    das mais conhecidas casas de Umbanda do estado de So Paulo. O mesmo j aconteceu em

    centros espiritualistas de Pernambuco e do Rio Grande do Sul e, possivelmente, em outros

    locais tambm, apesar de no termos conhecimento do fato.

    2 Um irmo indgena (esprito) falava quando aplicvamos reiki em outro local: levem os seus palitinhos de cheiro, referindo-se aos incensos e ao papel importante da aromaterapia.

  • Mas necessrio ressaltar que, quando uma verdade revelada, ela no acontece em

    apenas um nico local. Ela acontece de forma ampla e em vrios locais diferentes.

    Infelizmente, alguns dirigentes de casas kardecistas se recusam em discutir o

    reiki, dizendo tratar-se de assunto no-doutrinrio. Agindo dessa forma apenas impedem

    ou dificultam que a verdade venha tona mais rapidamente. Com a omisso, colocam-se ao

    lado dos mistificadores e das conscincias desencarnadas que no querem que a verdade

    seja revelada, para que o reiki continue sendo pensado como uma terapia miraculosa,

    cara e carregada de misticismo.

    objetivo da espiritualidade superior desmanchar o charlatanismo e a mistificao

    nesta rentvel prtica nova era, como aconteceu, no sculo XIX, com as mesas girantes

    estudadas por Kardec.

    E tudo isso possvel porque, como afirmou Kardec:

    A prpria doutrina que os Espritos ensinam hoje, nada tem de

    nova; se a encontra, por fragmentos, na maioria dos filsofos da ndia, do

    Egito e da Grcia, e toda inteira no ensinamento do Cristo. Que vem,

    pois, fazer o Espiritismo? Ele vem confirmar por novos testemunhos,

    demonstrar por fatos, verdades desconhecidas ou mal compreendidas,

    restabelecer, em seu verdadeiro sentido, aquelas que foram mal

    interpretadas. (OE, p. 188, grifo meu)

    Com esses dois exemplos (e poderamos dar muitos outros) pode-se demonstrar

    como o Espiritismo uma cincia dinmica e extremamente atual. Se Kardec optou, no

    sculo XIX, em estudar a mediunidade, o mundo dos Espritos e o evangelho cristo, nada

    implica que outros temas no possam ser estudados pelo Espiritismo. Nada nos impede de

    fazer um estudo esprita dos livros sagrados do Oriente, por exemplo, estudar o Bhagavad-

    Gita segundo o Espiritismo ou Os Sutras budistas segundo o Espiritismo. Como tambm

    possvel estudar o Reiki, a Apometria, a Umbanda segundo o Espiritismo, seguindo,

  • porm, as recomendaes e cuidados propostos por Kardec, no Livro dos Mdiuns, para se

    fazer o intercmbio medinico. Lembrando mais uma vez Kardec, ele afirmou:

    Muitas pessoas pensam que o Livro dos Espritos esgotou a srie

    de perguntas de moral e de filosofia; um erro; por isso, talvez til

    indicar a fonte de onde se pode tirar assuntos de estudo por assim dizer,

    ilimitados.

    (...) O valor da instruo que se recebe sobre um assunto

    qualquer, moral, histrico, filosfico ou cientifico, depende inteiramente

    do estado do Esprito que se interroga; cabe a ns julgar. (LM, p. 402)

    Est explcito acima que Kardec gostaria que novas pesquisas fossem feitas. Que

    outros assuntos fossem tratados pelo Espiritismo. Alm disso, podemos rever alguns dos

    assuntos discutidos por Kardec, como o caso da civilizao e da evoluo das raas.

    Qualquer estudante de histria ou antropologia sabe que as expresses civilizado e

    primitivo, criadas no sculo XIX, por pensadores europeus, so expresses ideolgicas e

    preconceituosas. No foram os Espritos que as criaram, mas responderam as perguntas de

    Kardec sobre a evoluo das raas de uma forma que fosse possvel ao homem do sculo

    XIX compreender seus ensinamentos. Porm, atualmente, quando a mentalidade dominante

    a da defesa da pluralidade cultural e racial, ou que a diviso dos povos em primitivos e

    civilizados caiu por terra, no s possvel, mas necessrio, retomar esse assunto junto aos

    Espritos, pois, com certeza, nosso estgio evolutivo j nos permite compreender tais

    fenmenos de um ponto de vista diferente, mais complexo e sem os preconceitos

    eurocntricos que se encontram nas entrelinhas da obra de Kardec. Hoje em dia, quem

    ousaria escrever, como o fez Kardec, a frase abaixo:

    O negro pode ser belo para o negro, como um gato belo para um

    gato; mas no belo no sentido absoluto, porque os seus traos

    grosseiros, seus lbios espessos acusam a materialidade dos instintos;

  • podem bem exprimir as paixes violentas, mas no saberiam se prestar s

    nuanas delicadas dos sentimentos e s modulaes de um esprito fino

    (OP, p. 165).

    Para a cincia do sculo XIX, ideolgica e eurocntrica, tal afirmao poderia at

    ser cientfica, mas hoje demonstra puro preconceito. Mas tal passagem infeliz deve

    desmerecer todo o resto de sua pesquisa? claro que no. Alm disso, os prprios Espritos

    deram a pista para Kardec, que vale para os no-espritas (para tirar o argueiro de seus

    olhos), mas, sobretudo, aos espritas (para tirar a trave que carregam nos olhos):

    Alis, no bom contrariar muito bruscamente os preconceitos;

    esse seria um meio de no ser mais ouvido; eis porque os Espritos falam,

    com freqncia, no sentido da opinio daqueles que os escutam, a fim de

    conduzi-los pouco a pouco a verdade. Apropriam sua linguagem s

    pessoas, como tu mesmo o faria, se s um orador um pouco hbil; por isso

    no falaro a um chins ou a um maometano, como falaro a um francs

    ou a um cristo, porque estariam bem seguros de serem repelido (LM,

    367).

    Um bom interprete sabe que esta frase tambm estava sendo endereada a Kardec,

    um europeu positivista que acreditava que o mundo era dividido entre primitivos e

    civilizados, entre inferiores e superiores, que o mundo seguiria um caminho

    inexorvel onde a Europa seria o modelo a ser seguido pelas demais civilizaes, etc. Logo,

    os prprios Espritos no poderiam atacar de frente o preconceito europeu, pois poderiam

    no ser escutados. Imaginem se ao invs de padres, filsofos ilustres, polticos consagrados

    etc., os Espritos que se manifestassem para a codificao fossem ndios, pretos-velhos

    ou orientais usando turbantes? Seriam, como ocorre ainda hoje, taxados de inferiores e de

    mistificadores, e expulsos das reunies medinicas.

  • Para no dar voz s entidades inferiores, na dcada de 1920, a Federao Esprita

    Brasileira publicou em sua revista que os ndios e os pretos-velhos, apesar de virem do

    mundo astral, no se pautam pelo kardecismo. Nesse aspecto, ela tem razo, porque j

    apontamos a diferena entre Espiritismo e kardecismo. O que no se pode afirmar que tais

    manifestaes no so Espritas. Caso contrrio, estaramos dando uma nova conotao ao

    termo criado por Kardec.

    E o fato de Kardec escrever que ilgico admitir que o esprito de um selvagem

    se torne, de repente, sbio e virtuoso, ao desencarnar (OE, p. 117), no significa,

    necessariamente, que o ndio um ser intermedirio entre o animal e o homem ou que o

    atual responsvel pela violncia urbana, como dizem alguns kardecistas3 em suas palestras

    ou escrevem em seus livros.

    Nem todo ndio selvagem e nem todo aquele que vive nos grandes centros

    urbanos civilizado. Alm disso, sabendo da existncia da reencarnao, quem pode

    afirmar que muitos civilizados no necessitaro encarnar em aldeias indgenas ou que

    muitos ndios, hoje encarnados na Terra, j no foram ilustres civilizados, vivendo a

    personalidade de filsofos, cientistas ou reis na Europa? E, no Livro dos Mdiuns, quando

    Kardec afirma que apenas os espritos superiores so capazes de realizar reunies no

    desdobramento e manter a conscincia do que foi discutido, ser que ele tinha

    conhecimento que vrios antroplogos descrevem que tal fato ocorre tambm em vrias

    comunidades indgenas, isoladas territorialmente? Se soubesse, talvez no faria tal

    afirmao ou no daria margem para se pensar que os povos indgenas so,

    necessariamente, inferiores ou selvagens.

    Curiosamente, o kardecismo resgatou o valor do povo celta ou dos druidas,

    classificados pelos antigos cristos como povos sanguinrios e selvagens. Tudo isso

    porque a espiritualidade revelou que Allan Kardec4 teria sido o nome que Denizard

    Hipollyte Leon Rivail teve em uma de suas encarnaes. Ser que teremos que esperar a

    3 Um livro kardecista muito famoso traz a seguinte informao doutrinria: a de que os ndios so os brbaros que invadem, atravs da reencarnao, o mundo civilizado, sendo, assim, os responsveis pela violncia urbana. 4 Um livro famoso e facilmente encontrado nas livrarias e bancas espritas chama-se Allan Kardec: o druida reencarnado, de Eduardo Carvalho Monteiro. O livro revaloriza o conhecimento desse antigo povo que habitou a Glia, mas que foi estigmatizado pelos romanos e pelos cristos.

  • espiritualidade revelar alguma encarnao indgena ou africana de algum apstolo do

    kardecismo para a ancestralidade indgena e a dos africanos tambm no ser resgatada e

    valorizada?

    Sabendo que o meio scio-cultural apenas mais um cenrio onde o Esprito eterno

    encontra as condies mais ou menos favorveis para o seu aprimoramento moral,

    emocional e intelectual, ou seja, onde representa mais uma personalidade nesse jogo

    fascinante que a reencarnao, no faz sentido acreditar no evolucionismo linear que

    condicionou a cincia no sculo XIX. Curiosamente, se a prpria cincia materialista j

    abandonou esta forma de pensar, porque ela deve permanecer na cincia esprita?

    Assim, fazer tais questionamentos aos Espritos, mesmo sabendo que eles no

    sabem tudo, pois so apenas as almas das pessoas que deixaram seu envoltrio terrestre,

    no desmerecer Kardec ou manchar a pureza doutrinria, como pensam alguns

    kardecistas, mas compreender que a histria dinmica, que os temas se atualizam e que o

    Espiritismo deve acompanhar tal processo.

    Kardec, ao contrrio de Conte (o criador do Positivismo ou Doutrina Positivista e,

    posteriormente, o criador da religio Positivista, um culto novo ou um sistema de f sem

    Deus), no se preocupou em fundar uma nova igreja. A religio kardecista foi criada por

    alguns seguidores de Kardec, que retiraram a dimenso experimental de sua obra e a

    transformaram em um sistema de f, infalvel e inabalvel.

    Na obra de Kardec h uma dimenso moral subseqente que, hoje em dia, seria

    mais adequado tratar como dimenso tica. Podemos dizer, tambm, que existe uma

    religiosidade, ou, em uma linguagem moderna, uma espiritualidade em sua obra, mas no,

    necessariamente, uma religio.

    E mesmo no texto publicado na Revista Esprita, de dezembro de 1868, no qual

    Kardec defende que o Espiritismo religio, devemos procurar interpretar com mais

    cuidado tal texto e contextualiz-lo para no deturp-lo. Kardec, com seu rigor lgico-

    positivista, enfatizou que h duas concepes para o vocbulo religio. Um no sentido

    clssico de religare, ou seja, enquanto uma comunidade de sentimentos, princpios e

    crenas, na qual h laos morais que unem mentes e coraes. nesse sentido tambm que

    antroplogos contemporneos estudam o marxismo, por exemplo, e o classificam como

  • uma religio poltica, pois uma doutrina que agregou e ainda agrega mentes e coraes,

    constituindo-se em um sistema de F dos mais fanatizados e intolerantes.

    Nesse sentido mais amplo, o Espiritismo seria uma religio. Mas Kardec enfatiza

    que h o sentido mais restrito e usual, em que o vocbulo religio significa uma espcie de

    culto, onde h a necessidade de uma casta sacerdotal, hierarquias, rituais etc. Por no ter

    esse segundo sentido, Kardec enfatiza que melhor denominar o Espiritismo como uma

    doutrina cientfica.

    Hoje em dia com a distino entre as expresses religio e religiosidade esta

    polmica parece estar resolvida. Assim como no se confunde mais autoritarismo com

    autoridade, poucas pessoas confundem religio com religiosidade. E talvez nem mesmo a

    palavra religiosidade se sustente por muito tempo. O frei Leonardo Boff em seu livro

    espiritualidade: um caminho de transformao faz uma distino entre religio e

    espiritualidade, demonstrando como esta se relaciona s qualidades do esprito humano

    para alm das crenas, dogmas e rituais. Apesar de distintas, religio e espiritualidade

    podem se relacionar e conviver. E uma pessoa, mesmo sem ter religio, pode alcanar um

    alto grau de espiritualidade se procura pautar sua vida por valores como o amor, a

    pacincia, a tolerncia, o perdo etc.

    Hoje em dia, no meio kardecista, existe o rito de apenas ler os chamados livros

    recomendados. Seus fiis procuram sempre consultar as autoridades kardecistas para

    saber quais os livros que podem ou no ser lidos. E, curiosamente, j h grupos que no

    recomendam nem os livros de Kardec. Dizem que Obras Pstumas, O que espiritismo

    e A Gnese no fazem parte dos livros da codificao esprita e que no devem ser lidos.

    Outros dizem que mesmo os livros da codificao so difceis e que o nefito deve se

    instruir a partir das apostilas escritas por algum kardecista experiente. Ou seja, agem

    como se estivssemos na Idade Mdia.

    Analisando algumas dessas apostilas, produzidas por centros espritas de So

    Carlos, encontrei passagens curiosas. Por exemplo, em uma delas afirma-se que entidades

    que se manifestam como orientais e passam orientaes pautadas pela cincia ou filosofia

    do Oriente so mistificadoras. Ser? Onde Kardec escreveu isso? Com certeza, o alvo dos

    autores da apostila era o esprito Ramats, uma espcie de Leonardo Boff ou de Herbert

  • Marcuse do espiritismo. Uma pedra no sapato daqueles que defendem a pureza

    doutrinria.

    A prtica descrita acima no me parece ser importante para se defender a pureza

    doutrinria. Ao contrrio, parece servir para se evitar a insurgncia da criatividade e da

    verdadeira f racionalizada. Parece uma defesa da obedincia cega, da mediocridade e da

    acomodao.

    No toa que muitos livros cujos autores afirmam se devotar cincia esprita no

    passam, em uma leitura mais profunda, de textos para o proselitismo religioso kardecista. E

    se lembrarmos que Jesus h dois mil anos em nenhum momento anunciou uma igreja, mas

    o Reino de Deus e a necessria transformao interior, no faz sentido acreditar que ele

    defendeu o Kardecismo como o nico consolador. Mesmo aps toda a mudana scio-

    econmica, poltica, educativa e espiritual, sua mensagem continua a mesma: a

    transformao interior que importa e no a embalagem externa. E como afirmou o Buda, as

    doutrinas so meios e no fins. E o Kardecismo ao invs de se ver como mais um possvel

    caminho para a salvao, se coloca como a prpria salvao, condenando todas as demais

    alternativas como irracionais, supersticiosas, fascinadas, obsedadas etc.

    O discurso kardecista carece de cientificidade. um discurso eminentemente

    voltado para doutrinao e para fazer proslitos. Mas se queremos redirecionar o

    Espiritismo para o campo cientfico necessrio, antes de tudo, discuti-lo

    epistemologicamente. a discusso que procuraremos apresentar no prximo captulo.

  • Captulo II

    A cincia esprita e sua cientificidade

    Do ponto de vista epistemolgico, h

    uma dicotomia entre fato e valor, quer dizer,

    no h uma ponte de dedutibilidade entre

    ambos: de um fato no se segue um valor;

    tampouco de um valor se segue um fato. (...)

    No obstante, na vida real, fato e valor no

    se dissociam.

    Hilton Japiassu. O mito da neutralidade

    cientfica. P. 41.

    Apesar de todas as evidncias, no temos ainda como afirmar, categoricamente, a

    sobrevivncia e a eternidade da alma, ou afirmar que o fenmeno medinico , de fato, a

    comunicao entre o plano material e o espiritual, e no uma psicopatologia. Para ns,

    espritas, a reencarnao no uma teoria, um fato. Alis, ns no cremos em espritos.

    Nos temos certeza que eles existem. Mas como (com)provar tudo isso cientificamente?

    No basta dizer que a cincia esprita diferente da cincia materialista, pois ela

    seria fruto da revelao dos espritos. S esse argumento no basta para se fazer cincia.

    Por outro lado, os espritas precisam seguir o caminho contrrio ao dos marxistas. Se estes

    ltimos queriam chegar ctedra para transform-la em plpito de pregao doutrinria, o

    que, realmente, conseguiram fazer durante boa parte do sculo XX, o cientista esprita

    necessita buscar a neutralidade cientifica como valor, no sentido weberiano, para que

    consiga se ater a uma certa objetividade e se distinguir de suas derivaes empricas

    (psiconomias) que so tambm seus objetos de estudo. O Espiritismo deve sempre se dirigir

    razo. Seus derivados empricos (kardecismo, umbandismo e outros ismos) podem e

    devem se dirigir ao corao.

  • Como afirma Hilton Japiassu, um dos significativos estudiosos da cincia

    contempornea, mais fcil conceituar a cincia do que defini-la. Mas uma coisa parece

    consenso, hoje em dia: no existe uma definio objetiva e, muito menos, neutra do que

    cincia. Os conhecimentos ditos objetivos e racionalizados esto sempre engendrados pela

    ambincia scio-cultural e histrica. por isso que a razo cientfica mutvel, histrica e

    varivel. E mesmo as revelaes espirituais no so imunes ao tempo e s injunes do

    contexto em que so transmitidas pela espiritualidade.

    Vimos, no captulo anterior, que o preconceito eurocntrico de Kardec foi

    respeitado pela espiritualidade. Sua obra est to impregnada pela mentalidade e pelo

    imaginrio do homem europeu do sculo XIX, como todas as revelaes anteriores, seja na

    poca de Buda, de Scrates, de Moiss, de Jesus ou qualquer outra. As revelaes so

    sempre contextualizadas pela conscincia histrica de cada poca.

    Em suma, em matria de cincia ou de revelao espiritual, no h objetividade

    absoluta. A linguagem, os temas, os modelos de um conhecimento tcnico ou valorativo

    so sempre o reflexo da imagem do mundo no qual se originaram. Em outras palavras, ela

    uma interpretao sempre passvel de mudanas, pois sempre marcada pela cultura em

    que se insere. E Kardec soube disso, pois sempre afirmou que o Espiritismo s surgiu no

    momento em que a civilizao ocidental estava pronta para compreend-lo. Isso no quer

    dizer, porm, que o Espiritismo deve se manter preso racionalidade do sculo XIX.

    essa crena, arraigada no meio kardecista, que conduz facilmente mistificao e no o

    contato medinico com espritos que desejam discutir outros assuntos diferentes daqueles

    que integram os livros da codificao.

    E se o Espiritismo no obra de um nico indivduo, nem a revelao miraculosa

    feita pelos espritos, ele necessita do trabalho constante de vrios experimentos medinicos,

    de onde surgem inovaes conceituais e teorias. Caber ao cientista esprita fazer escolhas,

    correr riscos e adotar atitudes crticas. Mas isto deve ser feito com estudo srio e no com

    pr-conceitos.

    O cientista esprita aquele que consegue transitar por todas as disciplinas

    espritas, ou seja, pela Umbanda, pelo Kardecismo, pelo Universalismo, pela Apometria

    etc, estudando, pacientemente, seus mtodos e prticas medinicas, anotando os

  • conhecimentos que produzem para que, finalmente, possa apresentar, de forma reflexiva, os

    resultados de sua pesquisa. Em suma, estudando e comparando as diferentes psiconomias,

    poder produzir um saber inteligvel, porm, sempre falvel. Isto o Espiritismo.

    Assim, cada uma das disciplinas espritas pode cooperar para a elaborao de uma

    sabedoria espiritual (Psicosofia) que ajude o homem moderno a suprir sua alienao

    anmica, sem desrespeitar a autonomia de cada disciplina. O conhecimento e as certezas

    do Kardecismo bastam para o kardecista, assim como o conhecimento e as certezas da

    Umbanda bastam para o umbandista. Mas, para o Homo spiritualis, sero tais

    conhecimentos e certezas suficientes? aqui que o Espiritismo deve promover o discurso

    do esprito sobre ele mesmo, e construir uma animagogia5 (educao espiritual) dialgica e

    processual para o homem encarnado. O valor supremo da alma no pode surgir de um nico

    ponto de vista. Deve sempre estar aberto s novas possibilidades de conhecimentos

    objetivos e ticos.

    Os pressupostos axiolgicos da cincia esprita foram apresentados por Kardec e

    ainda permanecem vlidos. E, se do ponto de vista epistemolgico, o mais adequado, hoje

    em dia, falar na existncia de prticas cientficas, no faz sentido as pessoas que orientam

    a poltica cientfica no Brasil no aceitar o Espiritismo, pois este possui critrios que o

    validam como uma prtica cientfica sobre a realidade espiritual. E tambm capaz de

    formular tcnicas para a coleta de dados, para no ficar apenas no domnio da pura

    especulao, como tambm constituir um corpo terico de contextualizao e construir seus

    objetos cientficos.

    O valor cientfico dos produtos intelectuais do Espiritismo evidente. E, se na

    ordem do saber contemporneo, a atividade cientfica deve ser diversa do senso comum, da

    percepo imediata, das atividades ideolgicas e isentas de achismos, o Espiritismo,

    como campo de pesquisa, muito mais cientfico do que a Pedagogia e muitas das Cincias

    Humanas hoje existentes.

    Talvez o maior erro do Espiritismo foi crescer misturado ao kardecismo, um de seus

    derivados empricos. Da mesma forma que o cientista da educao no deve se confundir 5 Alternamos, freqentemente, os prefixos anima e psique de propsito. Com o prefixo anima pretendemos realar a dimenso da alma encarnada, enquanto, com o prefixo psique, ressaltamos o esprito, ou seja, o ser desencarnado.

  • com o professor ou legitimar, ideologicamente, um ou outro sistema pedaggico, o cientista

    esprita precisa colocar entre parnteses sua convico e participao em uma das diferentes

    psiconomias existentes, caso contrrio, corre o risco de perder sua processualidade

    cientfica e ficar o tempo todo fazendo pregao doutrinria, como fazem os marxistas.

    Se, por definio, toda atividade cientifica encontra-se em estado de constante

    inacabamento, ou seja, a produo cientifica acabada um absurdo epistemolgico, a

    confuso kardecismo/Espiritismo dificulta o avano da cincia esprita.

    No mbito cientifico, tudo objeto de discusso. Nem todo conhecimento

    perenemente vlido. Todo critrio absoluto de verdade um absurdo do ponto de vista

    cientfico. E por isso que a atividade cientifica baseia-se no campo frtil do pluralismo

    conceitual. Um parmetro universal de objetividade mais adequado para proselitismo

    religioso e no para se fazer cincia. por isso que quando alguns pesquisadores espritas

    se questionam sobre a diviso clssica proposta por Kardec em pensar o ser humano como

    tendo um corpo fsico, um perisprito e um esprito, os kardecistas entram em campo

    fechando a discusso, afirmando que qualquer outra proposta seria no-doutrinria. Para

    eles, se Kardec escreveu que so trs, so trs e ponto final. No importa se atravs da

    clarividncia ou de outras tcnicas se descobriu outras dimenses. Tal dogmatismo no

    pode ser chamado de cincia esprita.

    E por que o Espiritismo ainda no obteve cidadania acadmica, se ele constri o seu

    objeto cientfico seguindo, pari passu, o que defende a epistemologia contempornea?

    Vejamos o que diz Japiassu no livro O mito da neutralidade cientfica:

    O objeto real existe independentemente de nosso conhecimento,

    quer pensemos nele quer no. Contudo, a cincia no se interessa pelo

    objeto real em seu estado bruto. O objeto real s se torna objeto cientfico

    quando for retirado de seu estado natural, vale dizer, quando for

    construdo, elaborado, pensado por uma teoria, ou seja, enquadrado

    por um ponto de vista terico. Em outras palavras, o simples acontecer

    s atinge o nvel do conhecimento cientfico quando for reconstrudo

    teoricamente. (p. 28)

  • No isso o que o Espiritismo faz em relao reencarnao ou mediunidade?

    Aqueles que no acreditam nos argumentos espritas que devem provar, ou melhor, negar

    a existncia da reencarnao ou provar que a mediunidade uma farsa.

    Nesse sentido, quando um rgo de fomento pesquisa ou uma Faculdade impede

    que uma pesquisa acadmica sobre tais assuntos seja realizada, est agindo com m-f e

    impedindo o avano da cincia. Como justificar pesquisas sobre congelamento de corpos,

    sobre marxismo, sobre contos de fadas e proibir uma pesquisa sobre reencarnao?

    O Espiritismo universal como toda cincia e estuda as manifestaes espirituais

    objetivas. Mas importante diferenci-lo do kardecismo para que possa adquirir sua real

    cientificidade. O kardecismo objeto de estudo do Espiritismo e este no deve ser usado

    para legitimar aquele.

    O kardecismo pode anunciar profecias, dizer que o nico caminho para

    favorecer a paz entre os homens, ser o consolador prometido pelo Cristo etc. O kardecismo

    pode emitir juzos de valor que no so enunciados cientficos, o Espiritismo no.

    Com tal diferenciao, as manifestaes espritas (ou causadas pelos Espritos)

    podem se tornar, realmente, objetos cientficos. Mas quando o objetivo fazer proslitos,

    ento o campo de atuao passa a ser o religioso, seja pelas vias do kardecismo, da

    umbanda ou um outro qualquer, mas deixar de ser cientfico e, portanto, da esfera do

    Espiritismo.

    Foi por isso que, antes de afirmar que existem Leis que regem o intercmbio entre o

    mundo visvel e o invisvel, Kardec procurou reunir um nmero significativo de evidncias

    sobre a existncia de tal mundo invisvel. E hoje em dia elas so ainda em maior

    quantidade. Porm, no foi o Espiritismo que as produziu. O Espiritismo as estuda.

    Porm, hoje em dia, nenhum cientista acredita que a partir da experincia possvel

    deduzir teorias e leis, como fez Kardec e toda a cincia newtoniana-positivista do sculo

    XIX. As reflexes epistemolgicas contemporneas, sobretudo, a partir da teoria da

    relatividade de Einstein, afirmam que a cincia uma construo. Ou seja, sem a ajuda

    de um quadro terico formado por princpios e conceitos escolhidos subjetivamente, no

  • possvel fazer a observao. Em suma, a teoria define, anteriormente, o que pode ser

    observado.

    O que ocorreu tambm na obra de Kardec, mesmo que este no tenha percebido.

    Kardec anunciou que um fato novo necessitava de conceitos novos, mas foram os seus

    novos conceitos que lhe permitiram enxergar de outro ngulo um fenmeno arcaico e

    rotineiro em todo o mundo. Foi a sua teoria que o ajudou a concluir que o intercmbio com

    o mundo espiritual no possui nada de sobrenatural ou maravilhoso, sendo um processo

    natural e regido por Leis tambm naturais.

    Tal constatao, ao contrrio, no desmerece a obra de Kardec, mas a humaniza. O

    que importante para podermos transcender o positivismo impregnado no Espiritismo de

    Kardec, tornando-o ainda mais cientfico, ou seja, compreendendo que a cincia

    processual e necessita da criao de categorias e conceitos explicativos, e que estes no so

    estanques, mas histricos, pois um significado pode se esgotar ou se esvaziar com o tempo.

    Esta conscincia histrica ajuda a desconstruir o racionalismo ingnuo, do tipo

    positivista. fcil constatar que Kardec foi um Esprito criativo e anticonformista. Porm,

    se o seu Espiritismo eminentemente lgico, ele carece de psicologia, sociologia e

    antropologia cultural para ser, realmente, cientfico, abrindo-se, sem medo,

    provisoriedade terica, to em evidncia na cincia contempornea.

    A observao direta, fato considerado cientfico no sculo XIX, no to direta

    assim. Como nos lembra o epistemlogo Japiassu, a expresso este copo dgua s na

    aparncia uma observao direta e particularizada. Em sua essncia encontramos

    implicados dois conceitos: copo (matria extensa) e gua (elemento lquido). Em suma,

    toda observao decorre de um conhecimento terico anterior, que o prprio contexto

    possibilitador da observao.

    E qual foi o contexto onde Kardec fez suas observaes? Quais foram os conceitos

    que ele tomou emprestado para observar os fatos espritas? Ser que a diviso trina

    (esprito, perisprito e corpo fsico) proposta por Kardec d conta da interpretao de novos

    fatos espritas surgidos no sculo XX? Todos esses pontos so temas para o cientista

    esprita discutir, mas, por enquanto, podemos nos ater s leis descobertas por Kardec e

    que continuam atuais. A primeira que:

  • Os Espritos no podendo responder seno sobre o que sabem,

    segundo seu adiantamento, e, alm disso, sobre o que lhes permitido

    dizer, porque h coisas que no devem revelar, visto que no dado,

    ainda, ao homem tudo conhecer. (...) Sobre muitas coisas, ele no pode

    dar seno sua opinio pessoal, que pode ser justa ou falsa. (...) Haveria,

    pois, imprudncia e leviandade em aceitar sem controle tudo o que vem

    dos Espritos (O.E., p. 122).

    Tal constatao demonstra toda dificuldade que se impe na comunicao

    medinica. No possvel confiar, cegamente, no que os Espritos falam. Muitos

    kardecistas acreditam piamente que s os Espritos superiores se comunicaram com

    Kardec e que, hoje em dia, qualquer novidade transmitida por Espritos mistificadores.

    Curiosamente, o prprio Kardec no to ingnuo e afirma que no possvel

    comprovar a identidade dos Espritos da codificao. No h como provar se foram

    realmente Scrates, Fenlon, Napoleo etc. os Espritos que usaram tais nomes famosos em

    suas comunicaes. Kardec no se cansou de dizer que os Espritos inferiores gostam de

    tomar emprestado nomes conhecidos e reverenciados. Assim, mais importante o contedo

    da mensagem e no o nome que o Esprito utiliza para se comunicar (L.E., p. 30).

    Outra lei importante, anunciada por Kardec, foi a seguinte:

    As comunicaes com os Espritos devem sempre ser feitas com

    calma e recolhimento; no se deve jamais perder de vista que os Espritos

    so as almas dos homens e que seria inconveniente deles fazer um jogo e

    um objeto de divertimento. (...) Um outro ponto igualmente essencial a

    considerar que os Espritos so livres; eles se comunicam quando

    querem, com quem lhes convm e tambm quando podem, porque tem

    suas ocupaes. Eles no esto s ordens e ao capricho de quem quer que

    seja, e no dado a ningum faze-los vir contra a sua vontade. (...) do que

  • procede, resulta que toda a reunio esprita, para ser proveitosa, deve,

    como primeira condio, ser sria e reservada, que tudo deve a se passar

    respeitosamente, religiosamente, e com dignidade, se se quer obter o

    concurso habitual dos bons Espritos. (...) Os bons Espritos vm nos

    instruir para nossa melhoria e nosso progresso, e no para nos revelar o

    que no devemos ainda saber, ou aquilo que no devemos aprender seno

    pelo nosso trabalho. Se bastasse interrogar os Espritos para obter a

    soluo de todas as dificuldades cientificas, ou para fazer descobertas ou

    invenes lucrativas, todo ignorante poderia tornar-se sbio

    gratuitamente, e todo preguioso poderia se enriquecer sem trabalhar.

    (...) fora do que pode ajudar ao progresso moral, no h seno incerteza

    nas revelaes que se podem obter dos espritos. (O.E., p. 124)

    Se os Espritos revelam novas informaes apenas no tempo certo, quando o ser

    humano, em tese, encontra-se preparado para compreender tais revelaes, significa que,

    com o passar do tempo, novas revelaes podero ser feitas. Por que acreditar que o mundo

    parou no sculo XIX? Quem conhece um pouco da histria do kardecismo no Brasil sabe

    da polmica gerada pela obra Nosso Lar, do Esprito Andr Luiz, psicografado por Chico

    Xavier. Durante muito tempo gerou celeuma por apresentar a erraticidade dos Espritos

    de uma forma nada errante, atravs de colnias planejadas e gerenciadas, onde se estuda,

    trabalha, h alimentao, transporte, hospitais etc. At hoje se encontra na internet artigos

    kardecistas afirmando que tudo no passou de animismo de Chico Xavier, pois nada

    disso se encontra nas obras bsicas da codificao. A impresso que se tem que alguns

    kardecistas se agarram obra de Kardec como algumas seitas se agarram ao Antigo

    Testamento, difundindo uma mentalidade neofbica, assustadora e intolerante.

    Porm, em suma, se no podemos acreditar cegamente em tudo o que os Espritos

    dizem, tambm no devemos ser to paranicos e negar tudo, aceitando apenas o que se

    encontra nos livros de Kardec, como se eles fossem o registro da Verdade absoluta. Alis,

    at os livros de Kardec j sofrem censura, como tivemos oportunidade de salientar.

    por isso que no podemos perder de vista, como afirmou Kardec:

  • O Espiritismo est fundado sobre a existncia dos Espritos, mas

    os Espritos, no sendo outros que as almas dos homens, desde que h

    homens, h Espritos; o Espiritismo no o descobriu, nem os inventou. Se

    as almas ou Espritos podem se manifestar aos vivos, por que isso est

    na natureza, e desde ento deveram faz-lo de todos os tempos. (O.E., p.

    187)

    Em suma, toda manifestao de Espritos, seja qual for o meio escolhido, esprita,

    independente de concordarmos com o seu contedo ou no. O mximo que podemos fazer

    interpretar tal contedo. E, no campo da moral, o que o Espiritismo impe pela

    constatao, o seguinte:

    A necessidade da prtica do bem e de no fazer o mal. uma

    cincia de observao que, repito-o, tem conseqncias morais, e essas

    conseqncias so a confirmao e a prova dos grandes princpios da

    religio; quanto s questes secundrias, ele as deixa conscincia de

    cada um. (O.E., p. 94)

    Ou seja, a pessoa que descobre que a vida no se extingue com a morte fsica passa

    a ser mais cuidadosa em seu cotidiano, passa a se relacionar com outras pessoas de uma

    forma mais solidria e compreensiva. O Espiritismo realiza, atravs do estudo, o que

    muitas vezes a Experincia de Quase Morte (EQM) realiza atravs da dor. Quantas pessoas

    que retornam de tais experincias vivenciam uma verdadeira metania, transformando-se

    completamente e dando muito mais valor vida e aos relacionamentos solidrios. No

    podemos nos esquecer tambm da prtica chinesa que relatamos em nosso livro Dharma-

    Reiki chamada Hsuan Hsueh em que o discpulo preparado para uma viagem astral

    consciente. Aps o seu retorno ao mundo fsico, transforma, normalmente, sua forma de

  • encarar a vida e passa a tomar mais cuidado com os seus atos para no prejudicar as

    pessoas.

    No toa que a mxima moral de Kardec fora da caridade no h salvao

    (O.E., p. 106). Em nenhum momento ele fala que fora do Espiritismo no h salvao. E

    nem fala como deve ser a prtica do bem. Assim, porque seria no-doutrinrio praticar o

    bem atravs do Reiki, da Cromoterapia, da Apometria ou de qualquer outra tcnica

    espiritual, anmica ou medinica? Se elas so prticas que envolvem a espiritualidade,

    sobretudo o Reiki e a Apometria, elas so, necessariamente, espritas. Se elas s acontecem

    devido presena da equipe socorrista formada por mdicos desencarnados, so formas de

    caridade eminentemente espritas. Talvez no sejam kardecistas, mas a um outro assunto.

    Devemos nos lembrar que o Espiritismo, como afirmou Kardec:

    No descobriu nem inventou os Espritos, nem descobriu o mundo

    espiritual, no qual se acreditou em todos os tempos; somente ele o prova

    por fatos materiais e o mostra sob sua verdadeira luz, livrando-o dos

    preconceitos e das idias supersticiosas que engendram a dvida e a

    incredulidade. (O.E., p. 149)

    Assim, quem somos ns para julgar quais so as formas, tcnicas ou a aparncia

    perispiritual que os Espritos podem utilizar para praticar a caridade. Por exemplo, muitas

    casas espritas no permitem a manifestao de entidades indgenas nuas ou vestidas, de

    orientais com turbantes na cabea etc. Este fato, puro preconceito kardecista, no um

    axioma da cincia esprita. Ao contrrio, o verdadeiro cientista esprita ir estudar tais

    manifestaes singulares, pois sabe que o mundo espiritual no formado apenas por

    filsofos, padres e mdicos.

    E, ao que se refere a alguns fatos espirituais polmicos, ou que tendem ao

    fantasioso, mas que no podem ainda ser explicados pelo Espiritismo, Kardec mais uma

    vez mostra seu bom-senso e coerncia:

  • No nos apressemos, entretanto, em rejeitar a priori tudo o que

    no compreendemos, porque estamos longe de conhecer todas essas leis, e

    que a Natureza no nos disse ainda todos os seus segredos. O mundo

    invisvel um campo de observao ainda novo, do qual seria presuno

    pretender haver sondado todas as profundezas, ento que novas

    maravilhas se revelam sem cessar aos nossos olhos. (O.P., p. 76)

    Com base nessa afirmativa, ser que Kardec agiria como os kardecistas em relao

    s entidades indgenas, Transcomunicao Instrumental ou Apometria, taxando tudo a

    priori de impureza doutrinria? Ou no mediria esforos para estudar tais fatos espritas?

    O cientista esprita sabe que a questo da identidade (do Esprito comunicante) ,

    por todos os ttulos, secundria, e haveria puerilidade a isso ligar importncia, como

    afirmou Kardec. Porm, no mediunismo kardecista, nem sempre tal recomendao levada

    a srio. Quantos no so os dirigentes que impedem que uma entidade que se manifesta

    como ndio ou como um ex-escravo possa dar sua mensagem? H locais que apenas

    aceitam receber mensagens de espritos que se identificam como mdicos, literatos,

    filsofos, padres etc. Tal prtica no encontra justificativa na obra de Kardec. Alm disso,

    como o Espiritismo cincia, deve ser objeto de estudo a comunicao de tais entidades. E

    como afirmou Kardec, os espritos falam sobre todos os assuntos que interessam

    humanidade. E este um outro ponto importante que diferencia o Espiritismo do

    kardecismo. Neste ltimo, na maioria dos casos, os Espritos s podem confirmar o que

    todos j sabem para no ferir a pureza doutrinria.

    E a bacia semntica do Espiritismo? Ela deve ser confinada ao sculo XIX para ser

    doutrinria? claro que no. Kardec no afirma que para os espritos superiores a idia

    tudo, e a forma no nada? E que dentro de uma mesma cincia pode haver vrios

    sistemas? (O.P., p. 33 e 34). A lngua se atualiza, assim como os conceitos e os sistemas.

    Em suma, enquanto o kardecista v tudo o que no conhece como no-

    doutrinrio, o cientista esprita v em todas as manifestaes medinicas novas luzes e as

    estuda sem pr-conceitos. Possivelmente, Kardec ao afirmar que h pessoas que

    encontram perigo por toda a parte e em tudo que no conhecem, estava profetizando o

  • que aconteceria no seio do kardecismo, a religio derivada de sua profunda obra cientfica e

    filosfica.

    Em resumo, o objetivo da cincia esprita estudar a realidade espiritual e a

    mediunidade naquilo que elas so e no naquilo que gostaramos que elas fossem,

    deturpando os fatos em favor de certos interesses doutrinrios.

  • Captulo III

    O reiki sem mistificao

    Ningum pode destruir esta verdade: Deus est

    dentro de voc. Saiba descobri-Lo e ter

    conquistado a felicidade.

    Pastorino

    Pedi e se vos dar; buscai e achareis; batei

    porta e se vos abrir; pois todo aquele que pede,

    recebe, e quem procura acha e se abrir quele

    que bater porta.

    So Matheus (7:7 a 11)

    Mas pedi sinceramente, com f, fervor e

    confiana; apresentai-vos com humildade e no

    com arrogncia, sem o que sereis abandonados s

    vossas prprias foras, e as quedas que sofrereis

    sero a punio de vosso orgulho. este o

    sentido destas palavras do Cristo: buscai e

    acharei, batei e se vos abrir.

    Evangelho segundo o espiritismo

    Por isso vos digo: das riquezas de origem

    inqua fazei amigos, para que, quando estas vos

    faltarem, os amigos vos recebam nos

    tabernculos eternos.

    Jesus

  • Este captulo foi organizado a partir das respostas obtidas com a espiritualidade que

    atua na ONG Crculo de So Francisco, entre os anos de 2002 e 2005. At onde sabemos,

    atuam na casa as seguintes correntes espirituais: as indgenas, os pretos-velhos, as crianas,

    as entidades mdicas (muitas so mentores da chamada Associao Mdico-Esprita), e trs

    linhas de espritos orientais (uma do extremo oriente, uma da ndia e outra representando,

    simbolicamente, os antigos povos Persas6). Atualmente, o trabalho teraputico da ONG

    tem se pautado na oferta de quatro servios complementares: o ensinamento e aplicao de

    Reiki, as aulas de Yoga, a difuso do Kefir, um cogumelo de origem tibetana importante

    para regularizar o funcionamento dos intestinos, e cursos para o cultivo de plantas

    medicinais.

    Fomos orientados para procurar organizar as informaes abaixo na forma de

    perguntas e respostas, o que facilita a compreenso do leitor. o mtodo adotado nos livros

    de Ramats e de muitos outros autores espirituais, alm do prprio Livro dos Espritos,

    escrito por Kardec.

    A ordem estabelecida para a apresentao das questes no representa,

    necessariamente, a ordem em que as perguntas foram feitas espiritualidade.

    Devemos lembrar que tais respostas, obtidas na ONG, foram tambm confirmadas

    pela espiritualidade que atua em outras casas, aumentando, assim, nossa confiana de que

    atravs da gratuidade e da preocupao com o aprimoramento espiritual que o Reiki deve

    ser difundido, sem mistrios, mistificaes e charlatanismos.

    Pergunta 01 necessrio ser sintonizado no Reiki para se enviar boas energias e auxiliar

    na recuperao de enfermos?

    Resposta - Para se enviar energia so necessrias trs coisas: o pensamento elevado, a

    vontade de ajudar o prximo e o amor desinteressado. Todo o resto instrumento ou

    muletas criadas pelos homens, em todos os tempos, para auxiliar neste processo. Poucos

    6 Segundo alguns videntes, estes espritos so negros, altos e usam um pequeno chapu de forma ovalar e um manto colorido que desce dos ombros at os ps. Segundo uma entidade indgena, so espritos que no encarnam mais na terra e trazem os remdios e os instrumentos que necessitam diretamente do mundo espiritual, sem precisar manipular as formas etricas dos elementos da terra, como fazem nossos irmos indgenas.

  • esto preparados para acreditar no poder mental que possuem. Poucos sabem que a mente

    uma poderosa usina. Poucos sabem que possvel direcionar nossa energia para diferentes

    fins, inclusive ajudar na cura de um irmo enfermo, desde que este tenha o merecimento

    para ser curado atravs da imposio das mos, pois nenhuma tcnica, incluindo o Reiki,

    capaz de transcender a Lei do carma e o livre-arbtrio.

    Todos, cristos ou no, sabem que a plantao livre, mas a colheita ser sempre

    obrigatria. O que no significa que Deus seja punitivo, apenas que existe uma verdadeira

    justia csmica regendo o universo.

    A energia utilizada no Reiki a mesma que o ser humano, nas mais diferentes e

    distantes culturas e civilizaes, aprendeu a manipular, dando nomes diferentes e utilizando

    formas distintas para tanto. Assim, o que menos importa o nome da tcnica. Porm, todas

    sempre funcionaro quando apresentar as trs condies bsicas: pensamento, vontade e

    amor.

    Pergunta 02 A cada dia aparecem novas pessoas dizendo que canalizaram smbolos.

    Muitos so patenteados, inclusive. Mas pelo exposto, eles no seriam, ento, necessrios?

    Resposta Esse processo que voc descreve fruto do orgulho e do egosmo humano.

    Deus no pra de criar um s segundo e nunca repete uma s criao. E, apesar disso, ele

    nunca assinou nenhuma de suas criaes. S o homem orgulhoso e egosta pensaria em

    patentear um smbolo que canalizou. Esse smbolo pode, de fato, ter existido no passado

    e a pessoa, em um estado ampliado de conscincia, obtido atravs da meditao, pode

    acessar este smbolo criado em algum tempo remoto. A prpria pessoa pode ter utilizado tal

    smbolo em alguma encarnao, em algum ritual da comunidade em que viveu. Voc

    mesmo no via o crucifixo de So Damio7, mesmo sem o conhecer na atual encarnao?

    Como j dissemos, no passado, o homem criava instrumentos que o auxiliavam a

    manter seu pensamento concentrado e canalizar sua vontade. Mas hoje, com a evoluo

    7 O esprito comunicante se refere ao crucifixo bizantino que ornava a capela de Assis, onde So Francisco teve suas primeiras revelaes espirituais. Durante muito tempo vi tal crucifixo em minha mente, sem saber o que o mesmo significava. Quando soube que eu j havia sido um franciscano, por volta do sculo XVI, e ao descobrir que a imagem mental que eu via representava um cone franciscano, nunca mais a vi.

  • mental e moral j alcanada, pode prescindir de tais elementos grficos, principalmente,

    quando utilizados para charlatanismo e mistificao.

    Pergunta 03 E os canalizadores que afirmam que foram seres de outros planetas, que

    foram extraterrestres que lhe transmitiram os smbolos e que os mesmos lhes falaram para

    no divulg-los para qualquer pessoa, pois seria muito perigoso, transformando, assim, o

    smbolo em uma mercadoria cara e disputada, avidamente, pelos adeptos das seitas Nova

    Era?

    Resposta Para aquele que paga, h sempre aquele que vende. O charlatanismo s existe

    porque ainda h pessoas que gostam de ser enganadas. Se o canalizador tem essa vontade

    de canalizar um smbolo que o possa tornar famoso, que d para ele criar um novo

    sistema de Reiki e, alm disso, ganhar dinheiro comercializando o smbolo, tudo isso far

    com que ele atraia para o seu lado conscincias desencarnadas zombeteiras ou

    mistificadoras. No ao acaso que vo aparecer seres de altssima evoluo espiritual,

    afirmando serem de outros planetas, com formas bizarras como lagartos e outros bichos, e

    vo transmitir ao canalizador smbolos com nomes apropriados para filmes de fico

    cientfica e vo dizer, obviamente, para ele guardar o smbolo com muito cuidado.

    Vo dizer, para estimular a vaidade do mdium, que so smbolos valiosos e que

    servem para curar cncer ou outras doenas que, se no podemos afirmar que so

    incurveis, podemos garantir que, dependem, sobretudo, do merecimento do paciente. Sem

    a reforma ntima, tais enfermidades, que so as colheitas dos erros do passado, no so

    curadas.

    As toxinas astrais que as originam s podem ser drenadas a partir do Amor ou da

    Dor, quando so, ento, drenadas para o corpo fsico na forma de graves enfermidades. Por

    isso no importa se o smbolo foi transmitido por Buda, dr. Lagarto, Saint-Germain,

    Jesus ou outro esprito que diz ter vindo de Srius ou de Jpiter... A toxina ser drenada

    pelo suor do trabalho amoroso ou pela dor da expiao.

    E por que dizem que so smbolos valiosos? Porque servem para a mistificao,

    para estimular o orgulho e o egosmo do mdium invigilante que o canalizou. Jesus e So

  • Francisco usaram algum smbolo para curar? No. Eles usavam apenas o grande poder

    mental que possuam e contavam com o amparo da espiritualidade superior.

    Pergunta 04 - Mas por que ao mentalizarmos um dos smbolos do Reiki, automaticamente,

    sentimos a energia fluindo e se dirigindo para o paciente? Esse fenmeno sensorial no

    seria um indcio de que os smbolos funcionam?

    Resposta Em nenhum momento falamos que os smbolos no funcionam. O que estamos

    comentando que no h necessidade de sintonizao como vocs fazem nos cursos de

    Reiki, com tantos apetrechos esotricos e rituais. No fundo, ser sempre a vontade, o

    pensamento e o amor que esto agindo na movimentao da energia. A vontade, o

    pensamento e o amor antecedem o desenho do smbolo.

    Vamos esclarecer como funciona a comunicao entre o esprito (mente) e o

    crebro. Em primeiro lugar, vocs devem saber que o ser humano no pensa atravs de

    palavras. E, para se transmitir uma idia, o ser humano necessita converter o seu

    pensamento em um sistema de cdigos. Este sistema pode ser na forma de sinais ou

    imagens simblicas, como no caso do Reiki e de tantas outras prticas orientais, ou na

    forma de palavras, que tambm so smbolos8.

    Em qualquer um dos casos, para funcionar, necessria a decodificao, ou seja, a

    interpretao da mensagem. por isso que a pessoa que no conhea o smbolo e no saiba

    para que o mesmo funciona, no vai sentir nada, no vai enviar energia. Ele no tem ainda a

    chave para decodificar a mensagem. Seu crebro e seu subconsciente no sabem

    decodificar o smbolo. Ao contrrio, o iniciado vai movimentar sua energia vital, sua

    bioenergia, porque associou ao smbolo, imagem grfica, uma funo. Ou seja, ele sabe

    que ao desenhar um determinado smbolo ele deve dar um comando inconsciente para o seu

    duplo-etreo liberar a energia. Ele est substituindo a palavra por um outro smbolo, por

    uma imagem.

    8 No texto tcnica de comunicao esprita, de Herminio C. Miranda, este pesquisador nos informa que: Se o pensamento deve ser expresso em palavras h que fazer a escolha da lngua; se for em imagens, preciso decidir quanto forma, cor, ao tamanho e ao processo de divulgao. E dessa mesma forma que os smbolos do Reiki funcionam.

  • Pode acontecer tambm da pessoa j ter entrado em contato com aquele smbolo em

    outra encarnao. Da, apesar de no se lembrar, ele est gravado em seu perisprito. Assim,

    mesmo sem ter passado por um ritual inicitico, a energia ser liberada quando desenhar o

    smbolo, pois sua mente inconsciente ou seu subconsciente aprendeu, no passado, como

    decodificar a mensagem.

    Agora, mesmo o iniciado no Reiki, que passou pelo ritual inicitico, que aprendeu

    os infinitos sistemas de Reiki, mas que desenha os smbolos sem se concentrar e sem

    vontade, no ir manipular nenhuma energia. Nada ir acontecer.

    A criao de smbolos uma forma de codificao. E como o ser humano ainda no

    capaz de viver sem smbolos para se comunicar, eles so muito teis. E qualquer um pode

    criar um smbolo e, se for do tipo malandro, correr para patentear e inventar uma histria

    bem mistificadora para ganhar um bom dinheiro com o seu smbolo sagrado.

    Como j salientamos, no Oriente, esta sabedoria de como a comunicao funciona

    milenar. E o homem ocidental descobriu isso, recentemente. No se diz que uma imagem

    vale mais do que mil palavras? A decodificao de