O Senhor das Águias -...

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O Senhor das Águias e as pedras da perdição R.S. Ferreira

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O Senhor das Águias

e as pedras da perdição

R.S. Ferreira

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Dedico este meu livro para todos os meus amigos e parentes que partiram para Calauë, principalmente a Vicentina do Rosário Albuquerque da Silva, que soube passar para os seus netos, o verdadeiro significado do que é ser uma autêntica guerreira.

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o início das eras, enquanto a terra não existia e nenhum mortal ou elfo tinha sido criado, havia na dimensão norte uma águia chamada Ilumar que sobrevoava um céu cinzento e sem vida. Suas

asas tinham uma cor amarronzada. Eram alongadas com diversos detalhes brancos em sua volta. Um longo bico amarelo, garras afiadas com as quais conseguia facilmente agarrar suas presas e um olhar exuberante e aguçado, conseguia avistar a menor de todas as criaturas. Sua altura era de sete metros, pesava cerca de duzentos quilos. Tinha cento e vinte anos, exibia agilidade em seus voos agressivos. Sua força era inexplicável e seu poder irradiava por todos os cantos do universo, podendo criar tudo aquilo que era de seu agrado.

Sozinho, em meio ao nada, Ilumar sentiu a necessidade de uma companhia a quem pudesse confidenciar suas histórias. Assim, Ilumar, com todo seu poder, criou o mago Cesarem, homem de pele branca, rosto fino e olhos azuis, o qual aparentava ter trinta anos de idade e nunca poderia envelhecer, pois Ilumar deu a ele o dom da imortalidade e o designou como seu conselheiro.

Cesarem sobrevoava sobre as costas da grande águia, por todos os lugares. Adorava observar as estrelas que cobriam o céu, pedindo ao seu criador que falasse mais sobre elas. A felicidade era constante nos corações de ambos. O norte se tornou o lugar preferido para visitas, de modo que passaram a estar por lá todos os dias.

Certo dia, Cesarem observou que a grande águia estava infeliz. Preocupado, procurou saber o que estava acontecendo.

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— O que o preocupa, meu senhor? — Me sinto triste, a vida parece não ter sentido sem outros com quem

partilhá-la. — Como assim? Você tem a mim. Fui feito a partir de seu intelecto. — Preciso de um lugar para repousar minhas asas cansadas. E você

ficaria sozinho caso eu fosse embora. Por isso acho pertinente criar um refúgio para você, junto de outros iguais a você para que não se sinta sozinho, como eu.

— Meu Senhor, sou verdadeiro e sincero, sempre cuidei de você, aconselhando-o em todas as suas necessidades, mas desta vez não posso concordar com este seu pensamento.

— Qual seria o motivo de não concordar? Você acha que eu não sou capaz de governar dois mundos? — perguntou Ilumar.

— Não é por isso, meu senhor! — disse Cesarem. — Somos felizes, e não precisamos de outros seres para nos trazer esta felicidade!

— Mas eu não sou! — afirmou Ilumar. — Desculpe-me, mas eu preciso de novos ares, de criaturas com quem dialogar e compartilhar as minhas alegrias!

O coração de Cesarem começou a se fechar diante da escolha de Ilumar, pois nunca imaginou que um dia seu mestre discordaria de algum posicionamento seu.

Ilumar, com a força do bater de suas asas em direção ao vazio, formou as nuvens que pairavam sobre o céu. Pouco a pouco, de dentro das nuvens, foram saindo os animais que passaram a sobrevoar aquele céu, animais de variadas espécies e tamanhos foram surgindo. Havia uma certa hierarquia, desde a menor das aves até a grande águia. Todos eles, sabiam quem era o seu criador de modo que passaram a respeitá-lo e a amá-lo como tal. Ilumar lhes deu o dom do som, fazendo com que os inúmeros animais experimentassem suas vozes em exaltação, o que fez Cesarem tapar seus ouvidos, pois o canto era muito poderoso e chegava a ser doloroso. Assim, foi se criando Calauë, lugar impossível de descrever, pois a grandiosa beleza é indescritível aos olhos mortais. Esse lugar passou a ser a casa de Ilumar, Cesarem e de todos os animais criados.

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Mesmo tendo um lugar para chamá-lo de seu, Cesarem se tornou um homem revoltado; a inveja e o egoísmo tinham germinado no mais íntimo de seu ser, ele sentia saudades de quando convivia unicamente com Ilumar. Ao ver toda a criação, sentia-se inferior. Para ele, era doloroso observar todos irradiando beleza e esplendor. Entretanto, como era um mago, uma de suas virtudes era a paciência, por isso interagia com a criação, simulando um amor entre eles, procurando suas amizades e lhes oferecendo seu conhecimento e seus serviços. Mas não havia coisa alguma que acontecesse em seu reino que Ilumar não enxergasse, pois conseguia enxergar aquilo que o mago ocultava em seu coração.

— O que está acontecendo com você? Vejo que você está diferente, alguma coisa o perturba?

— Como assim, meu Senhor? — perguntou Cesarem. — Nada acontece comigo!

Mesmo conhecendo as mudanças de seu conselheiro, Ilumar resolveu não insistir, dando a Cesarem a liberdade de se expressar conforme era de sua vontade. Porém se entristecia de ver que a inveja e a cobiça tomavam conta de seu conselheiro e amigo.

— Muito bem! Acredito e confio em você! — respondeu Ilumar. — Mas saiba, é melhor que haja um coração aberto e esplendoroso, do que um coração fechado e rancoroso. — Cesarem não entendeu bem essas palavras, dando-lhes as costas, e seguindo em direção ao sul.

Enquanto Cesarem caminhava, uma imagem repentina veio a sua cabeça. Ele sentou em uma das rochas que havia em Calauë, e deixou que lembranças viessem a sua cabeça. “Que momentos felizes eram aqueles em que eu podia sobrevoar nas costas de Ilumar, tendo sua atenção voltada somente para mim, sem me preocupar em perder meu lugar de conselheiro. ” Suspirando, passou a observar a cachoeira ao seu lado, as águas que jorravam eram cristalinas e puras, seu gosto era doce e revigorante. Ao se aproximar, pôde enxergar seu reflexo sobre as águas. Cesarem desejou ter de volta sua vida antiga, prometendo a si mesmo que faria de tudo para que Ilumar voltasse atrás e destruísse a sua

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criação. Com isso, simplesmente arquitetou algo danoso e rude. Assim, começou a criar estratégias que fariam Ilumar se frustrar e se arrepender amargamente de toda sua criação.

Mesmo sabendo do posicionamento de seu conselheiro sobre suas criações, Ilumar decidiu criar seu segundo mundo, aproveitou que Cesarem caminhava nos vales de Calauë, pois sabia de seu sofrimento e não queria que ele presenciasse sua segunda criação. Havia apenas algumas aves próxima dele, nesse momento elas ficaram fascinadas pelo poder que irradiava da grande águia.

No início, era apenas um vazio, não havia nada no espaço, apenas as estrelas criadas pela própria águia. De repente, só se viu sair das narinas de Ilumar uma pequena bola de fogo que, ao pairar sobre o espaço, fazia com que ela crescesse e se tornasse incomensurável. Enquanto desenvolvia, Ilumar batia suas asas, parecia que aquele fogo estava sumindo e ao mesmo tempo ganhando sua forma. A grande águia e algumas das aves foram até esse novo mundo e o ouviram gritar:

— Novo mundo aqui surgiu, vida nova lhes darei. Sobre as montanhas a criar, lindos campos irei brotar.

Ao andar sobre o novo mundo, Ilumar cantava uma nova canção que parecia brotar paz sobre a terra. À medida que caminhava cantarolando, surgiam os capins dos mais verdes, formando o mais belo dos vales. A cada passo que Ilumar dava, caía sobre a terra uma lágrima. As aves que estavam presenciando perceberam que brotava algo sobre a terra, e em questão de segundos surgiram as mais belas árvores, de todos os tipos que se possa imaginar. Novamente, as aves escutavam novos gritos:

— Seres que tanto esperei! Deem-me a alegria de povoar este mundo, que também são seus!

De repente, caiu do céu uma imensa chuva de fogo, e enquanto caía, nenhuma destruição acontecia, o fogo que tocava sobre o vale não sucumbia a relva verde; vários animais pareciam brotar das crateras onde os meteoros haviam caído. Os peixes foram criados por último. Ilumar batia suas asas lentamente em direção às árvores e aos campos, e delas caíam pétalas de flores

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sobre os grandes lagos que cercavam esse novo mundo. Essas pétalas não flutuavam sobre as águas, e, sim, submergiam; e quando se aproximavam do fundo do rio, se transformavam em diferentes tipos de animais aquáticos, que nadavam contra a corrente em direção ao seu criador, para contemplar sua beleza.

Ilumar deu a esse novo mundo o nome de Aldiroön, que significa senhor das árvores e dos bosques; um mundo no qual seres mortais jazeriam e conviveriam em paz e harmonia. A coruja a quem ele chamou Iowä, era dotada de grandes curiosidades, acompanhava de perto a criação deste novo mundo.

— Meu senhor, será que ouvi direito, você disse que este mundo será mortal? — Ela perguntou.

— Ouviu bem, minha cara! — contrapôs Ilumar. — Pensei que este mundo seria como o nosso! — Sim, de fato, algumas coisas que criei são iguais ao nosso mundo, mas

tenho que admitir que outras são diferentes. — respondeu Ilumar. — É preciso que aqueles que criei passem um certo tempo por aqui e depois venham morar em nosso mundo, para que haja aprendizado.

— Mas senhor! Segundo a sua vontade, o senhor pretende criar seres capazes de evoluir com os próprios erros. Eles serão diferentes de nós.

— Sim, serão eles que cuidarão deste mundo e aprenderão com ele! — respondeu Ilumar.

— Sim! Sim! Mas futuramente eles morarão em nosso mundo também? — perguntou Iowä com curiosidade.

— Meu mundo foi feito para eles Iowä, para corações nobres e pequenos. Somente os grandes vencedores conquistarão o prazer de conhecer o meu mundo.

— Mas o que os impede de morarem em seu mundo? Ilumar abaixou a cabeça como expressão de tristeza, fitando o horizonte

como se estivesse olhando para alguém. Concluiu: — Deixemos que o tempo lhe responda esta pergunta!

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Ao criar todos os campos e animais em Aldiroön, Ilumar dividiu esse mundo em doze regiões, sendo que cinco delas pertenceriam aos homens; três aos anões; três aos elfos e um para os grandes centauros e hipogrifos. Enquanto o criador voava em direção ao seu país, juntamente com Iowä, vários meteoros caíram sobre Aldiroön em diferentes regiões. Iowä já imaginava que Ilumar estaria criando todos os outros seres que faltavam para a finalização desse novo mundo. De fato, diversos tipos de criaturas surgiram em cada região, das cinzas das grandes rochas que caíam dos céus.

Os elfos foram os primeiros a surgirem, ainda que estranhos eram os mortais mais belos vistos em todo o mundo de Aldiroön. Eram de estaturas normais e cabelos alongados, orelhas pontiagudas e olhos verdes. A águia determinou que os elfos seriam as criaturas que mais viveriam nesse novo mundo, eles teriam a missão de ensinar aos homens e aos anões a sua origem. Quando todos os elfos foram instituídos, ficaram contemplando o céu e viram a magnífica chuva de meteoros caindo sobre outras regiões de Aldiroön. Um grande corvo negro enviado por Ilumar deu uma empolgante saudação a um dos elfos e lhe disse:

— Salve, grandes elfos, vindos do norte! Ilumar em pessoa me mandou estar aqui para cumprimentá-los.

— Quem é você e quem é Ilumar? — perguntou o elfo. — Sou Yën! O grande corvo que mora no país de Ilumar. — Mas quem é Ilumar? — perguntou o elfo. — Ah! Ilumar é a grande águia que mora no país de Calauë. —

respondeu Yën. — O criador de tudo o que está vendo, o Senhor das Águias e de tudo o que existe.

— E o que é aquilo caindo dos céus? — perguntou o elfo. — É Ilumar criando seus irmãos. — respondeu Yën. — O tempo

mostrará a você o que são estes seres os quais estão sendo criados pela grande ave. O grande Ilumar o escolheu para ser o rei destas regiões. A você lhe foram confiadas três regiões nas quais os elfos viverão. Governe com justiça e humildade, foi por estes atributos que Ilumar confiou este reino a você. Ensine a

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todos os habitantes deste mundo que a grande águia os criou, dando toda a terra de Aldiroön para que a cultive e cuide deles.

— A quem devo ensinar todas estas coisas? — Ensine primeiro aos outros elfos, para que assim eles possam ajudá-

lo. Depois, ensine aos outros irmãos, que você encontrará em outras regiões, estes serão de uma raça diferente da sua, mas iguais perante Ilumar. Você lhes renderá respeito, seu nome será grandioso entre todas as nações. Eles o chamarão Beyën, o grande rei. Além de ser rei, você colocará o nome em cada elfo criado por Ilumar.

— E as outras regiões, terão algum rei? — perguntou Beyën. — Sim! A mim foi dada esta missão de anunciar os reis de sua

determinada região, escolhido por Ilumar. Mas a você foi confiado de ensinar aos seres quem os designou.

Yën sobrevoou em direção oeste. Sobre as terras longínquas, o corvo avistou esses seres criados da mesma maneira que os grandes elfos. Eram seres pequenos e rígidos. Ao chegar, avistou uma criatura de longa barba e cabelos compridos e um brilho que estava em sua volta.

Estando próximo a esse pequeno ser, Yën escutou uma voz leve e aconchegante dentro de si, que dizia: ''É este o meu escolhido”. Parecia a voz do criador, manifestando a sua vontade.

— Salve, senhor dos anões vindos do oeste de Aldiroön. — disse-lhe todo atrapalhado em sua saudação. — Deixe-me apresentar, sou Yën e vim a pedido de Ilumar, a grande águia. O grande Ilumar o escolheu para ser rei destas regiões. Por isso seu nome será Bengar, rei dos anões. Você terá a missão de governar três regiões nos quais os anões foram criados, dando a eles os seus nomes.

— E posso saber como se chamam estas regiões? — perguntou Bengar. — Você também dará o nome a ela. — respondeu Yën. —Governe com

justiça e humildade, o próprio Ilumar lhe pede isto.

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— E por que o próprio Ilumar veio até nós, para dizer tudo isto? — investigou o anão com um tom de zombaria em sua voz.

— Não cabe a você, anão, decidir as vontades de Ilumar. Estou aqui porque ele me enviou como portador desta mensagem. — pronunciou o corvo com o mesmo tom.

Yën então sobrevoou em direção leste e começou a avistar os grandes centauros e hipogrifos que brotavam das terras de Aldiroön. Encantado com sua beleza e ao mesmo tempo assustado com numerosos seres, o corvo a todo momento ficava se indagando, quem seria o rei que governaria estas colinas. Quem Ilumar elegeria? Um hipogrifo, que tinha uma cabeça de águia, mas um corpo que se assemelhava ao de uma égua; ou a um centauro que tinha uma aparência humana, mas com um corpo de cavalo domesticado. Yën escutou uma voz suave em seu coração que pronunciava: “Aqui não haverá realeza, mas todos os habitantes desta província, temerão os humanos aos quais irei designar. ” Mas o grande corvo, como estava próximo, resolveu dar-lhes as boas-vindas.

— Sejam bem-vindos, grandes hipogrifos e centauros. O próprio Ilumar em pessoa me pediu para estar aqui com vocês e saudá-los.

Ninguém deu a menor atenção. — Muito bem, como aqui não haverá rei, cada um deve por si próprio

se autonomear; mas prestem atenção, vocês deverão respeitar e obedecer aos humanos que habitarão no centro de Aldiroön. Sejam fiéis a eles e eles serão fiéis a vocês. — concluiu o corvo, partindo para a região central.

Antes de partir, o corvo presenciou a perfeita harmonia que os centauros e os hipogrifos tinham uns com os outros.

Ao abeirar-se do centro, Yën estranhou a presença de Ilumar imóvel sobre as grandes rochas, o corvo não via nenhum vestígio dos seres humanos na região que a eles seria designada.

— Ora, vejo que nenhum meteoro caiu aqui, realeza! — Para a existência destes novos seres, minha presença se faz

necessária. — respondeu Ilumar, suavemente. — Desta vez será diferente, meu caro Yën!

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Yën percebeu que todas as cinco regiões estavam repletas de buracos feitos pelos castores que viviam no mundo de Aldiroön. Os castores tinham feito todos aqueles buracos a pedido de Ilumar. De repente, começou-se a observar que Ilumar retirava uma de suas penas e depositava sobre o buraco, e logo atrás alguns dos castores o tampavam. Todas as vezes que se retirava uma pena, cresciam duas em questão de segundos. Uma a uma, suas penas eram colocadas sobre os buracos, obtendo um cuidado necessário para cada uma delas, sendo que a cada pena depositada um sorriso se brotava. Ao concluir, Ilumar regressou ao seu posto e gritou:

— Levantem-se, seres de Aldiroön! Cantem! Riam! Se alegrem! Pois o seu dia acabou de chegar!

Yën sentiu um grande tremor, em seguida vários homens e mulheres brotavam sobre as terras de Aldiroön. Após a criação, Ilumar voltou para o seu país, deixando o corvo sozinho para cumprir sua missão. Yën observou alguns nasceram de raças distintas, mas parecia que havia algo em comum entre eles; o corvo não sabia o que era, mas sentiu que eram iguais. Quando sobrevoava as regiões dos humanos, encontrou um jovem do qual, assim como os anões, emanava uma imensa luz que iluminava toda aquela região. Ao se aproximar daquele jovem ruivo, de cabelos curtos e de roupas não tão apropriadas para um rei, Yën curvou-se perante ele.

— Salve, ó raça humana vindas do centro de Aldiroön! O próprio Ilumar em pessoa me pediu para estar aqui com vocês e saudá-los. Logo, logo os elfos virão aqui para vos contar sobre o Senhor das Águias.

— Elfos? São iguais a mim? — perguntou o jovem. — Sim, mas não habitam nesta região. Foram criados no norte. Estou

aqui para proclamar que Ilumar o escolheu para ser o novo rei desta região. Você terá a missão de governar com justiça e humildade, e terás que colocar nomes em todos os humanos aqui viventes. Nomearas também estas terras.

— Está certo, aceitarei o convite. — respondeu o jovem.

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— Muito bem! A partir de hoje, você se chamará Joaquim, o mais valente dos homens. — disse o corvo. — Faz o que lhe disse e governa conforme o anseio de Ilumar. Os centauros e hipogrifos obedecerão a você e o terão também como o seu rei.

O corvo sobrevoou em direção ao país de Ilumar, pressentindo que sua missão tinha sido realizada. Ao aproximar-se de Calauë, encontrou a grande águia que estava perto das mais admiráveis árvores de seu país, devorando algumas de suas maçãs.

— Meu caro Senhor, vim anunciar que finalizei a missão que a mim foi destinada. — disse Yën, olhando nos olhos de Ilumar.

— Muito bem, meu caro, fico feliz por você ter concretizado a minha vontade. Você me mostrou ser um servo bom e fiel para comigo. Por isso estará sempre ao meu lado, como meu mensageiro. — respondeu a grande águia.

Yën fez uma pequena referência e partiu para o sul. Enquanto isso, Cesarem estava pronto para realizar seu plano que

revoltaria a todos. O mago se aproximou primeiramente dos pequenos animais e finalizou suas artimanhas com os gigantescos dragões, que moravam em Calauë. Yën sobrevoava aquelas regiões e viu Cesarem conversando com inúmeros animais. O corvo se escondeu entre as árvores e ouviu vagamente a conversa entre eles.

— Eu sou o eleito, o mais amado de Ilumar. — disse Cesarem andando no meio deles. — Vejam vocês, animais, aves, dragões, enquanto eu, um mago, o mais poderoso. Perceberam que me assemelho com os filhos de Ilumar, o qual ele mais ama. Fui o primeiro a ser criado, vocês foram apenas restos. Eu disse para Ele os criar, aconselhei profundamente para que houvesse mais vida neste lugar. Ilumar fez cada um de vocês com muita má vontade. Agradeçam a mim, porque, se não fosse por mim, eu estaria só para povoar este país. Olhem ao seu redor, sou a única criatura agraciada por Ele com poderes especiais! E a vocês? O que Ilumar lhes deu? Ele não lhes deu nada!

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Yën ficou assombrado em ouvir de Cesarem aquelas palavras impetuosas, e repentinamente notou murmúrios e reclamações vindas de outros animais. E Cesarem continuou:

— É claro que vocês não deixarão passar esta indelicadeza de Ilumar? — E o que você nos aconselha, ó grande mago? — perguntou um dos

dragões. — O que deve ser feito! Discutir com Ilumar e reclamar pelos vossos

direitos. — afirmou Cesarem. Yën, ao ouvir as palavras de Cesarem, retornou para onde Ilumar estava,

e enquanto sobrevoava, vários animais faziam o mesmo caminho. Com toda a sua velocidade, conseguiu chegar primeiro, encontrando Ilumar novamente perto da magnifica árvore.

— Ilumar... grandioso Ilumar. — disse o corvo, com uma certa dificuldade. — Meu caro Senhor, venho aqui para trazer más notícias.

— Pode falar, meu caro. — disse Ilumar. — Cesarem o traiu, meu caro Senhor. Neste momento, estão vindo

diversos animais para prestar contas com o senhor. Yën percebeu que uma lágrima escorria de seus olhos. — Eu já esperava que isso um dia iria acontecer, confiei em Cesarem.

Mas, jamais imaginaria que ele seria capaz de fazer tal crueldade comigo. Bom, deixem que venham até a mim! Resolverei da melhor maneira possível!

De longe, conseguia-se avistar os animais marchando em direção a Ilumar. Yën sentiu um certo temor, e uma grande expectativa para saber qual seria a decisão da grande ave diante das atitudes de Cesarem. Os animais se aproximaram de Ilumar, acusando-o de sua injustiça, pareciam cães raivosos diante do criador.

— Você nos enganou Ilumar! Como pôde ser tão injusto? — disse um dos dragões.

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Yën percebeu que Ilumar não iria reagir diante de tantas acusações, mas observou que a grande águia olhava fixamente para Cesarem; tão profundo era o seu olhar que Cesarem se escondeu atrás da grande árvore.

— Não fui injusto com vocês, meus caros, apenas os criei conforme era a beleza de meus olhos. — disse Ilumar.

— Não acreditamos em você, Ilumar. Você é injusto e cruel. — disse uma das hienas.

— Injusto? Me mostre onde errei ao criá-los? — perguntou Ilumar. — Injusto sim! Criou Cesarem de uma forma e nós de outra. Deu a ele

poderes e a nós nada deu. Como pôde, Ilumar? Yën percebeu que muitos dos animais estavam furiosos com Ilumar,

nem se quer deixavam a grande águia se explicar, enquanto outros não acreditavam em sua explicação. Mas Ilumar agiu sabiamente.

— Venha até mim Cesarem, vamos conversar. A grande águia pousou suas asas sobre a terra para que ele subisse em

suas costas, e num bater de asas, levantou voo, sobrevoando até a montanha de Antürk, a mais alta de Calauë. Ao chegarem no topo da montanha, começaram a dialogar.

— Por que você fez isso comigo, Cesarem? — Não entendo, meu Senhor, o que fiz para o deixar tão abatido? —

perguntou Cesarem. — Não minta para mim e muito menos engane a você mesmo! — disse

Ilumar, enfurecido. — Você provocou uma grande revolta de minha criação, colocou quase todos contra mim, e ainda diz que não sabia de nada?

— Não sei do que está falando? Se acha que fiz tudo aquilo... — Ah, não fez? — perguntou Ilumar. — Muito bem, então olhe em

meus olhos e fale que não fez nada daquilo que estou vendo lá em baixo. Cesarem não se atreveu a olhar para Ilumar. — Muito bem, vejo que perante estes fatos você foi realmente o culpado.

Você não me disse nada, mas seu silêncio revelou-me tudo.

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— Não me arrependo pelo que fiz, Ilumar, apenas queria tua atenção como antes.

— Basta! — disse Ilumar. — O que você fez não tem explicação, sua traição é algo inarrável aos meus olhos. O egoísmo fechou seu coração e nada posso fazer.

— Então, sua ave tola, por que não me destrói e acabamos com isso? — contestou Cesarem.

— Você foi meu conselheiro, a quem de fato, dei a minha atenção e meu amor. Não posso fazer isso, as minhas criações não devem ser destruídas. Quanto a você, terá aquilo que merece, pela tua prepotência e arrogância. — disse Ilumar.

Enquanto regressava, Ilumar ressoou um grande grito que estremeceu todo o país de Calauë. Cesarem teve que tampar os ouvidos perante o berro exasperado e poderoso. Ao chegar próximo da bela árvore e dos animais revoltados, Cesarem percebeu que toda a criação de Calauë estava presente para ouvir aquilo que a grande águia tinha para dizer.

— Meus caros animais que chamei, quero anunciar a decisão que tomei perante alguns dos fatos que aconteceram em meu país. Cesarem me traiu e me disse que não se arrependeu de seus atos. Por isso, perante todos vocês e perante Cesarem, determino que o mago e todos aqueles que ouviram e acreditaram em suas mentiras, sejam expulsos de meu país. Assim está determinado que nunca mais Cesarem colocarás seus pés sobre o País de Calauë; nem ele e nem os outros que acataram tuas mentiras. Por isso nunca mais irei criar, nem aqui em Calauë nem nas terras de Aldiroön um outro mago. Cesarem será o primeiro e o último entre os magos. — pronunciou Ilumar, olhando nos olhos de Cesarem. — Você morará agora em Aldiroön, no sul de meu novo mundo. Habitará nas profundezas das cavernas de Algün, e lá morará com todos aqueles que você envenenou. Esta foi a sua escolha e nada poderei fazer.

Ao terminar, o Senhor das Águias deu as costas para o seu conselheiro e sobrevoou outra direção. Cesarem e outros dos animais que estavam presentes

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escutaram um forte grito de Ilumar, que fez com que todo o mundo de Calauë e de Aldiroön estremecessem.

grito agudo de Ilumar estremeceu os dois mundos. Os seres que habitavam nas terras de Aldiroön taparam os ouvidos ao som do lamento da grande águia. Ilumar desaparecera entre as grandes

montanhas de Calauë, depois de ser desafiado por Cesarem. De repente, um enorme dragão branco apareceu, sobrevoando os céus de Calauë, vindo em direção a Cesarem. A coruja Iowä ficou impressionada com seu tamanho; era maior que todos os outros dragões que moravam no país de Ilumar. O dragão branco se aproximou de Cesarem com a intenção de pegá-lo, mas o mago tentava a todo momento lutar com a fera.

Houve também momentos em que ele fugia, assim como os outros animais que tinham sido expulsos de Calauë. Yën tinha se lembrado daquele dragão, sendo que Ilumar havia mencionado que ele estava morando próximo às montanhas de Erthÿ, e que poucos se beiravam daquelas montanhas, por ser o habitar do grande Eragön. Cesarem fugia e ao mesmo tempo lutava contra o dragão, mas nada podia fazer. Houve um momento em que o dragão o tinha preso em uma das patas, e com a outra estava preparando uma grande bola de fogo. Em questão de segundos, Cesarem já estava dentro dessa bola em chamas, como se estivesse protegido. Nenhuma força natural ou sobrenatural conseguiria tirá-lo de lá. Cesarem a todo momento tentava escapar daquela prisão em que o dragão tinha colocado, mas era inútil. Com toda a sua força, o dragão lançou-o para fora do país de Ilumar. Cesarem caía com uma certa velocidade, os habitantes de Aldiroön puderam testemunhar novos meteoros caindo ao sul. A expulsão estava acontecendo, não foi somente com Cesarem, mas com um terço dos animais que jaziam nas terras de Calauë. Todos começaram a cair na mesma direção que Cesarem, presos dentro da grande bola em chamas. O céu estava

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negro, o mago passava entre as nuvens e uma gigantesca chuva caía sobre o mundo de Aldiroön.

Cesarem desabou próximo às cavernas de Algün, um lugar belo que acabou sendo devastado devido a sua queda. Por esse acontecimento, a floresta começou a se chamar de ‘‘floresta negra’’, o ar ficou poluído, os animais que ali moravam haviam desaparecido. Cesarem passou por uma terrível transformação ao pôr os pés naquela terra. O mago olhava para o céu e via vários animais desabarem sobre as terras de Aldiroön. Quando esses animais tocavam o solo se transformavam em seres míseros e coléricos; de fato, o mal jazia naquele ambiente. Cesarem, fechou seu coração por completo, pensamentos perniciosos vinham a sua mente, com um grande desejo de vingança perante Ilumar.

Os animais que foram expulsos do país de Ilumar se transformaram em seres apavorantes. Muitos deles assumiram formas destorcidas de seu padrão natural.

Enquanto o mago andava sobre a floresta negra, avistou-se um graveto seco jogado, próximo ao tronco das grandes árvores acabadas. O mago pronunciou baixinho palavras estranhas cujo significado apenas ele sabia. Após proferir o encantamento, o graveto começou a crescer tomando a forma de um cajado. Ele lhe deu o nome de Degälion. Depositou nele todos os poderes que recebera no início de sua criação. O vislumbre daquele cajado causava medo, tinha um formato de uma naja. Todo feito em ouro maciço. Em seus olhos, duas grandes pedras vermelhas capazes de seduzir qualquer um que o desejasse.

Cesarem reuniu todos os animais que tinham se rebelado contra Ilumar, e assim começou a colocar seu plano em prática.

— Este será o nosso mundo, por ora moraremos aqui, nas cavernas de Algün até o dia em que tomaremos dele todo o mundo de Aldiroön.

Dito isso, Cesarem adentrou o fundo da caverna, e ali acendeu inúmeras fornalhas cujo calor e fogo pareciam ser controlados por ele, em um ritual macabro.

— Aragün Cervani.

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A montanha estremeceu perante aquele feitiço. Todos que jaziam na floresta negra escutaram um grande barulho vindo das cavernas obscuras.

— Venha a meu encontro, precioso Sgraünd, você será a beleza de meus olhos! O grande guardião destas montanhas.

Seu cajado emitiu uma intensa luz vermelha sobre o abismo. Do fogo e do enxofre, surgiu Sgraünd, medindo seus trinta metros de altura. Era verde com listras negras, seus dentes afiados e olhos amarelados.

— Meu caro Sgraünd, você foi gerando para ser meu guardião. — Estou sempre a servi-lo, ó mestre Cesarem! — disse Sgraünd. Do lado de fora da floresta, Cesarem seguiu em direção à entrada, para

ver se a grande águia estava por perto. Ilumar sobrevoava sobre os ares, aguardando a presença de Cesarem.

— Está feliz? — O que você está fazendo aqui? — perguntou Cesarem. — Como

ousa entrar em meus domínios? — Como assim seus domínios? Esqueceu quem criou este mundo,

Cesarem? — perguntou Ilumar. — Escute bem! Você irá se arrepender de ter me expulsado do país de

Calauë. — gritou Cesarem. — Isto é uma ameaça? — Entenda como quiser! — concluiu Cesarem, dando as costas para

Ilumar. Ele voltou mais enfurecido para a caverna de Algün, sendo que no

caminho bolava algo para destruir toda a criação de Ilumar. Ao se aproximar da entrada da caverna, algo de terrível aconteceu. Os animais que moravam com o mago ouviram um grito que estremeceu toda a floresta negra.

— Crindön Hunganii. Ao pronunciar tais palavras, um denso nevoeiro cobriu toda a floresta.

Do chão, brotavam as mais diferentes criaturas. Podia-se ver um pequeno ser de chapéu, com roupas estranhas, de barbas longas e de mãos afiadas. Eram, de fato, vários duendes moldados a partir de pura crueldade. Várias fadas, de corpos

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esbeltos, de narizes pontiagudos e olhos desejantes, seduzindo facilmente a qualquer mortal. Vários gnomos apareceram, com seus chapéus vermelhos e pontiagudos, uma longa barba não feita, uma cinta marrom e um longo cachimbo preto que escorria em seus pequenos dedos alongados e afiados.

Haviam trolls, com uma pele verde e dura, que pareciam a de um dragão, com várias escamas em seu corpo, com dentes afiados e com um olhar de ódio que estremeceria a quem olhar. Tropas das gigantescas aranhas negras que corriam em direção ao mago. Elas esmagavam tudo o que viam, deixando um rastro de destruição e medo.

Haviam também os demäuros, flutuando em seus corpos magricelos. Usavam capas negras que cobriam os seus rostos, revestiam-se de armaduras, empunhando espadas afiadas. Podia-se ver um grande exército prestando reverência a seu mestre.

Ilumar pediu que Yën fosse até as regiões élficas para falar sobre a queda de Cesarem. Era necessário alertar os habitantes de Aldiroön e lhes revelar quem era de fato o mago negro.

Enquanto sobrevoava, passando próximo ao sul, avistou de longe o grande exército de Cesarem. Ele sobrevoou em direção ao norte ao encontro de Beyën, mas, ao se aproximar, encontrou-se com uma jovem élfa, de cabelos loiros, vestidos de seda branca das mais puras de todo o país, apoiando em sua cabeça um longo cesto repleto de frutas.

— Desejo falar com o rei Beyën, minha cara senhorita, venho em nome de Ilumar.

— Meu caro senhor! O nosso rei não se encontra pelas redondezas. — disse a jovem, com sua voz fanhosa.

— Mas para onde ele foi? — Para as redondezas, meu Senhor! Ele reuniu vários elfos, e foram

ensinar aos povos de Aldiroön sobre Ilumar. Só ficaram algumas mulheres para tomar conta deste local. — respondeu ela tímida.

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— Muito bem, minha jovem. Tempos difíceis estão por vir, por isso preciso encontrar seu rei para alertá-lo.

Despedindo-se da jovem, Yën sobrevoou todos os cantos de Aldiroön em busca do rei para transmitir a mensagem vinda de Ilumar. Encontrou pelo caminho vários elfos que ensinavam aos anões e aos centauros a sua verdadeira origem. Ao sobrevoar em direção aos humanos, encontrou Beyën e mais dois elfos, conversando com alguns deles.

— Salve, meu caro rei, trago-lhe mensagens de Ilumar. — Pode me dizer, o que houve com o grande senhor de Calauë? — A grande águia se encontra abatida, devido à traição de Cesarem. —

respondeu o corvo entristecido. Yën tentou explicar ao rei dos elfos de uma maneira simples e clara, para

que assim pudesse transmitir aos seus companheiros. O rei ficou surpreso ao receber a notícia, deixando transparecer em seu rosto a ira de um elfo traído, pelas ações de um homem a quem deveria demonstrar grande respeito.

— Ouça minhas palavras, meu caro Yën, se este ser deprimente ousar se levantar contra Ilumar e sua criação, eu o farei em pedaços, mesmo que isso custe minha própria existência.

— ntende por que Cesarem o traiu? — perguntou Yën.

— Sim. — respondeu o rei. — Como ele foi capaz de fazer tamanha crueldade?

— Liberdade, meu caro jovem! Algo difícil de se explicar. — disse Yën. — Mas não podemos julgar suas escolhas nem mesmo as das pessoas que optarem por segui-lo.

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— Haverá mais pessoas assim neste mundo? — Tudo dependerá das escolhas de cada um. Ilumar os presenteou com

o poder das escolhas, cabe a vocês julgarem o que é certo ou errado. Mesmo que isso vá contra a vontade de Ilumar.

— Compreendo! Você acha que pode piorar? — perguntou Beyën. — Cesarem já criou um exército para seduzi-los para o seu lado negro,

ou destruí-los, caso o contrariem. É preciso que haja coragem entre os seres e que vençam as tentações que ele provocará em vocês.

— Um exército? — perguntou Beyën. — Sim, por isso estou aqui! Conheço Cesarem e sei que ele terá toda a

paciência para tentar confundir a cabeça de vocês. Não conheço os seus planos de vingança, mas tenho a certeza de que não será nada afável. Preparem-se para lutar, conheçam o inimigo, usem o dom da palavra. E, caso não seja possível, recorram à força.

— Farei o que pediu, meu amigo! — É importante que todos os seres tomem uma certa precaução com os

animais falantes. — Mas por que carecemos de ter esta precaução? — Os animais de Aldiroön não obtiveram a graça na qual fomos

saciados. Todos os animais falantes que você encontrar neste mundo podem ser seguidores de Cesarem. — explicou o corvo. — O que quero dizer é que muitos podem se apresentar para vocês, dizendo ser um dos seguidores de Ilumar! Mas na verdade são escoltas de Cesarem.

— Como você, por exemplo? — Sim. Mas como me conheceu antes, sabe que venho em nome de

Ilumar. — respondeu Yën. — Mas como irei diferenciar estes tipos de criaturas? E se de fato vier de

Ilumar? — Terá que utilizar toda a sabedoria que Ilumar lhe deu. — respondeu

o corvo. — Bom, primeiramente os seguidores de Cesarem são criaturas

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horripilantes, mas que podem se desfigurar, se passando pelos mais belos animais. É preciso pensar em uma maneira que facilite este nosso contato.

Os dois passaram a tarde inteira pensando em uma maneira que pudesse diferenciar as criaturas desse tenebroso ser. Mas o interessante é que, nesse aspecto, o elfo foi mais esperto que o próprio corvo, solucionando o tal problema.

— É bem simples. Você me disse que todos ouviram Cesarem e decaíram-se pelo seu orgulho e prepotência. Pois bem! Como eles decaíram por causa disso, acredito que não tenham mudado estes seus sentimentos!

— Com certeza! Avistei de longe cada um deles e infelizmente não mudaram em nada. — afirmou Yën, sem entender.

— Bingo! Vejo que a obediência não é o ponto forte daqueles imbecis, não é mesmo Yën? — perguntou o elfo, com meio sorriso. — Entendeu agora? Antes que eles se apresentem, terão que nos obedecer por primeiro! Assim, possamos nos persuadir de que eles são enviados por Ilumar.

— Agora estou entendendo! Eles não serão capazes de lhe obedecer! — disse o corvo espantado pela esplêndida sabedoria élfica.

— Esta é a única maneira que me veio à mente. — disse o elfo. — Sua ideia é perfeita. Falarei para Ilumar e a todos que moram comigo

em Calauë. — Anunciarei aqui também sobre este nosso acordo e sobre este temível

mago que desperta os maiores pesadelos em nossos corações. — concluiu Beyën, despedindo de Yën.

Enquanto o corvo regressava para o seu mundo, Cesarem caminhava sobre a floresta em direção à caverna, para dialogar com Sgraünd. Mas algo o preocupava, seu coração endurecido falava mais alto, queria dominar todas as terras de Aldiroön, vingando-se de Ilumar. Ao mesmo tempo, queria seduzir os corações dos humanos e de todos os seres viventes, fazendo-os sofrer como porcos vivos em brasas. Diante da grande serpente, algo terrível despertou em sua mente, fazendo que das trevas ressurgisse uma magia poderosa.

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— Meu caro Sgraünd, preciso que seja obediente ao seu Senhor. — expressou Cesarem, olhando fixamente para a cobra. — Preciso de suas escamas, para uma de minhas maiores criações.

Sem muitos galanteios, a serpente arrancou com seus dentes afiados, um pequeno pedaço de sua escama, dando-a ao mago de bom grado. Próximo ao abismo onde se encontrava Sgraünd, Cesarem, avistou cinco pedras negras sem nenhum valor aparente. Diante do abismo sem fim, ele arremessou as cinco pedras de Ônix e a escama da cobra. Ele chegou a fazer um corte profundo em uma de suas mãos e deixou que algumas gotas de seu sangue caíssem para dentro do abismo. Juntamente com o seu cajado, conjurou um feitiço que ninguém poderia compreender, somente a cobra soube do que se tratava.

— Strangnoüs Arandei. Ao proferir tais palavras, o mago negro impôs suas mãos em direção ao

abismo, liberando uma luz ofuscante e poderosa que saía dos olhos de Degälion. Uma grande explosão eclodiu da caverna, e toda a floresta negra se abalou, estremecendo até a mais alta folha de árvore. O abismo se converteu num visível clarão, fazendo com que Cesarem caísse de costas em direção aos rochedos próximo à entrada da gruta.

Sgraünd deu um grito agudo, devido ao clarão, cegando-o por um momento. De repente, o silêncio habitou aquele lugar e algo surpreendente aconteceu; as cinco pedras que foram lançadas por Cesarem estavam flutuando próximo à beirada do abismo, pareciam estar ligadas a seu cajado por pequenos fios de energia colorida. Eram todas de cristal e possuíam forma retangular. Havia uma pedra roxa, do formato ametista, que faria qualquer rainha nunca jamais ter desejado outra joia além daquela pedra. Outras cores eram vistas, como a pedra azul, do formato das águas marinhas; a pedra verde das esmeraldas; a pedra branca, refinada e afigurada no quartzo e a pedra negra Serendibite.

— A partir de hoje, o mundo irá conhecer o meu poder. As pedras da perdição triunfarão neste lugar.

Ao pegar o seu cajado, Cesarem lançou um feitiço sobre elas.

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— Todos aqueles a quem tocar, estátuas de sal se tornarão. — pronunciou ele com toda a sua ira.

De repente, quatro dessas pedras foram subindo. Elas saíram da caverna. Ao chegar a uma certa altura, cada uma delas foi direcionada e designada a habitar uma certa região. Já a pedra negra Serendibite, ficou com o mago, que a guardou como um verdadeiro tesouro. Nenhum mortal saberia o paradeiro dessas pedras.

O mal começava a surgir sobre todos os povos de Aldiroön. Primeiramente, os centauros e os hipogrifos não conseguiam mais conviver entre si; as brigas crescentes lhes roubaram a paz, e o ódio tomou lugar em ambos os lados. Não havia mais o plantio que outrora era comum e muito menos as fabulosas colheitas de verão. A seca e a fome dominavam todo o mundo. Muitos animais morreram devido às pragas que surgiram, até que todas as criaturas viventes de Aldiroön foram assediadas pela peste. A sombra do medo eclipsou a esperança, vários perderam a fé e a crença em Ilumar. Todo tipo de miséria, sofrimento e violência criaram um mundo no qual o bem se tornou uma loucura, e os elfos, que insistiam em proclamá-lo aos povos, foram mortos e muitos deles desistiram bem antes disso.

O exército de Cesarem começava a ganhar forças, fazendo com que determinadas criaturas passassem a servir fielmente ao mago negro. Alguns povoados foram dominados.

Quando Beyën percebeu que algo de errado estava acontecendo, resolveu retornar ao seu reino, juntamente com outros elfos que tinham escapado da morte. O medo e a covardia debelaram cada elfo que estava nessa missão. Não se podia fazer nada, a pureza e o respeito tinham desaparecido após as criações destas pedras.

Alguns dos elfos conseguiram misteriosamente encontrar uma das pedras, mas, ao tocar nelas, simplesmente viravam estátuas de sal, conforme a maldição. Muito dos humanos não conseguiam abranger as situações ocorridas nas terras de Aldiroön, devido a tantas calamidades agrupadas. Sendo anormal o que estava sucedendo, muitos se assustaram diante dos relatos. Porém, todos os

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reis permaneceram fieis a Ilumar. Com toda brandura, tentavam controlar o máximo que conseguiam, para que o mal não sucumbisse por completo.

Durante anos, o mundo de Aldiroön permaneceu assim, e várias guerras foram surgindo e povos, massacrados, por um mal que era difícil de explicar. Muitos perguntavam sobre Ilumar, e se não haveria sua intervenção para que mal esvanecesse do mundo. Mas nada acontecia, muitos acreditavam que o Senhor das Águias estava morto ou que estaria muito ocupado para ouvir o clamor de sua criação. Mas alguns permaneceram firmes e esperançosos, na expectativa de que um bem surgiria, para os ajudar a enfrentar as trevas. Cesarem decidiu misteriosamente ocultar o seu nome, fazendo com que todos desacreditassem nele, podendo agir mais sabiamente perante todos os povos de Aldiroön.

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o passar dos séculos, as antigas histórias tornaram-se lendas, muitos elfos pararam de anunciá-las devido ao um medo exacerbado. Aldiroön sofreu várias deformações. E um conflito

de ideias tornou a convivência humana um tanto difícil. Na cidade de Caën não era diferente. Os homens que habitavam

naquela cidade, não eram muito de conversar. Pedro Smith, sabia muito bem disso. Mal conseguia dizer um bom dia, sem que as pessoas o esnobassem.

Ele era um homem simples, conhecido por construir as melhores espadas para a realeza e para seus generais. Aparentava ter uns trinta anos de idade, com cabelos negros e de uma postura como a de um guerreiro, forte e robusto. Tinha olhos grandes e negros como o âmbar.

Viúvo, morava com a filha Sara Smithy de dez anos de idade. Era uma menina extremamente alta para a sua idade, com longos cabelos negros, olhos castanhos, brilhantes e alegres, moldados num rosto fino de traços leves. Gostava de correr por todos os cantos de sua casa, sobretudo quando imaginava que sua boneca poderia voar de uma maneira misteriosa.

Pedro chegou em casa exausto devido ao dia de trabalho puxado. Ele caminhou pela sala, indo em direção a cozinha. Ele encontrou com sua filha e lhe deu um beijo rosto. A mesa estava posta para o jantar. Ela havia preparado pães frescos e uma pequena tigela vermelha com molho de Crepän.

— Que belo jantar! — disse ele dando um largo sorriso. — Eu sabia que o senhor iria gostar. — disse a menina, segurando um

pano de prato bordado pelos elfos. — Pelo menos aqueles elfos nos deixaram algo de útil, um verdadeiro

manjar dos deuses.

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— Ainda carrega uma certa mágoa por eles? — Esta mágoa será difícil de ser esquecida! — disse Pedro, tomando um

gole de seu vinho. — São completamente loucos! Como podem falar de Ilumar se nem o conhecemos?

— A vovó conhecia bem aquelas histórias! A senhora Pouty me contou algumas coisas relacionado aos reis do passado! Principalmente de suas aventuras e de como conheceu os elfos.

— Bobagem, minha filha! Pouty também me contava essas mesmas histórias. Me dizia da beleza dos elfos, do modo que eles lutavam em batalhas, e até mesmo das antigas canções.

— Ela fala muito de uma tal de Kalista! Uma feiticeira que morava nas cavernas obscuras!

— Ah, Sim! Ela se enche de orgulho quando fala da morte daquela feiticeira, e de como conseguiu matá-la! Me disse que sua avó segurou em uma espada! — disse Pedro, dando algumas gargalhadas. — Não acredito que sua avó tenha segurado em uma espada! Em algum lugar por aqui, está escondido um livro que sua avó escreveu contando isso, mas nunca o encontrei!

— Talvez tenha acontecido realmente! Parece que até o vovô participou disso também!

— Besteira! Aposto que foi tudo invenção daquela velha senhora para iludir as criancinhas. Como ela poderia conhecer um elfo, se eles estão longe dessas redondezas? Como ela poderia se juntar com aquelas criaturas tão covardes e mentirosas? Não, minha filha, são histórias impossíveis de se acreditar.

Sara sabia da raiva que seu pai nutria pelos elfos, pois suas feições mudavam drasticamente quando mencionava alguma lenda antiga ou das longas batalhas que sua avó Rebeca vivenciara no passado. Ele simplesmente não acreditava nisso.

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Ao passar das horas, Pedro subiu as escadas e caminhou por um pequeno corredor. Seu piso era todo de madeira. Ao aproximar-se do quarto de Sara, encontrou sua filha deitada em sua cama. Ele deu um beijo de boa noite.

— O senhor hoje não contará nenhuma história para mim? — perguntou a menina.

— E qual história a senhorita gostaria de ouvir hoje? — Ah! Sei lá! Conte-me como o senhor conheceu a mamãe! — falou

Sara, dando um pequeno sorriso. — Essa é uma história bonita de se contar. — respondeu Pedro, olhando

para a lua que resplandecia toda aquela região. — Era uma vez, um jovem ferreiro, filho de pais ferreiros, que interagia com o trabalho esforçado, ajudando seu pai na fabricação das espadas reais. Um dia, uma jovem camponesa que gostava de colher flores dos campos de Caën, encontrou com este jovem rapaz. Na verdade, houve um esbarrão entre eles. Aquele ferreiro pediu desculpas para a moça e o ajudou a recolher as suas flores que estavam jogadas sobre o chão. Nossa! Foi amor à primeira vista! Claro que ela também se encantou com a beleza daquele rapaz. Com o coração saindo pela boca, e sabendo onde poderia encontrá-la, aquele jovem tomou a coragem de convidá-la a dar um pequeno passeio, próximo às cachoeiras de Yguän. Foi incrível, conversaram sobre tudo, mas a melhor parte foi quando eles se despediram, um beijo foi lançado entre eles...

Pedro se emocionou. — Mas, por fim, os dois se casaram e ao saber da gravidez de sua esposa,

este jovem chorou muito e abraçou-a fortemente. Foi difícil o seu parto, mas tudo acabou bem. Mas o destino reserva algo que é difícil de acreditar. Após dois anos do nascimento da criança, o rapaz encontrou sua esposa morta, nas ruas de Caën. Nossa, seu mundo se desmoronou, era como se ele tivesse perdido um pedaço de si. Houve choros e angústias durante muito tempo, aquele rapaz nunca mais se apaixonou novamente.

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Pedro não se deu conta de que Sara já estava dormindo e assim finalizou beijando a testa de sua filha. Não sabendo da densidade da hora, decidiu tomar um copo de leite em sua cozinha.

Ao descer as escadas, se surpreendeu com um clarão que vinha da porta dos fundos. Ela era feita de vidro e madeira. Ao abrir a porta, Pedro encontrou um homem magricelo, mas com uma aparência juvenil.

— Quem é você? — perguntou Pedro. — Tenha a calma, não estou aqui para machucá-lo e muito menos para

assustá-lo. — disse o jovem. — Como entrou aqui? — perguntou Pedro, trêmulo perante o rapaz. — Estou aqui, porque o grande Ilumar em pessoa me pediu para estar

com você nesta noite. — Ilumar! Desconheço este nome! Para mim ele nunca existiu, muito

menos este tal de Cesarem como muitos temem por aí. — expressou Pedro, com um certo ar de desprezo.

— Perdeu a fé devido à morte de sua esposa Ana! — Quem revelou estas informações a você? — O Senhor das Águias! Este é quem me revelou sobre você. — Basta! — gritou Pedro. — Ele está morto como tantos outros. No

momento em que estava desesperado, com uma menina de dois anos a criar, ele não se manifestou, nem se quer me acudiu. Tive que me virar sozinho, sem a ajuda dele. Para mim, ele é mais um conto narrado por aqueles malditos elfos.

— De fato, os elfos cometeram um erro, de fugirem perante as calamidades que estavam acontecendo no mundo de Aldiroön. Foram covardes em não continuar a levar o ensinamento que foi passado. Mas o rei Beyën, em sua covardia, foi merecedor da ira de Ilumar e perdeu muitas de suas terras, nas grandes guerras entre humanos e elfos...

— Me poupe de suas histórias insignificantes. — disse Pedro, interrompendo-o.

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— ...mas isso foi resolvido, o rei Beyën se retratou com Ilumar pedindo humildemente perdão a Ele. — continuou o jovem, mesmo com a interrupção de Pedro.

— O que você quer de mim? — Já ouviu falar das pedras da perdição? A famosa e a mais poderosa

criação de Cesarem? — Sim! Segundo as lendas, foi através destas pedras que o mal invadiu

completamente as terras de Aldiroön. — disse Pedro. — O mal ainda continua sobre estas terras, e Cesarem ganhou mais

forças ao construí-las, distribuindo para todo o mundo de Aldiroön. O grande Senhor das Águias o escolheu para ajudá-lo a destruir estas malditas pedras. Você deve partir ainda nesta noite, para Tiän, a região élfica e...

— Está louco? Você acha mesmo que eu irei? Diga ao Senhor das Águias ou a Ilumar, ou o nome que você quiser dar, que não irei participar desta loucura.

Quando Pedro deu as costas ao jovem que estava próximo ao balanço, sentiu seu braço sendo segurado por ele. Ele apertava fortemente, parecia que iria arrancá-lo tamanha era a sua dor.

— Tome cuidado, Pedro! Tem certeza que é esta a sua resposta? Ilumar só quer o seu bem, e se esta for a sua escolha, uma vida poderá se perder. Pense bem! Escolha sabiamente antes que seja tarde demais! — falou o jovem serenamente.

— Me solte! Já me decidi! Agora suma daqui e nunca mais volte em minha casa! — gritou Pedro olhando fixamente para o ilustre convidado.

Ao entrar em sua cozinha, percebeu que estava sozinho e repentinamente observou em seu quintal, o desaparecimento daquele ser misterioso, procurando em cada canto, como um velho em busca de seus pertences. Mas, ao admirar novamente o luar, contemplando a infinidade de estrelas ao seu redor, obteve a certeza de que um simples corvo estava sobrevoando rumo ao céu, como se tivesse a intensão de alcançar o infinito. Ao regressar para a cozinha, sentiu um certo remorso, mas que, perante o degustar

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do leite fresco, vindo das altas montanhas de Caën, esqueceu essa loucura oriunda de um ser incógnito.

Entre as folhagens que cercavam o seu quintal, uma criatura escondida estava escutando toda a sua conversa. Dificilmente de ser visto, mas ágil como uma serpente. Em se tratando de vampiros, Jack era um dos mais espertos, um rapaz jovem e atraente, mas que perante uma terrível maldição se transformou nesta criatura, servindo fielmente a Cesarem. Olhando para ele, não aparentava ser um vampiro. Sua pele era branca como a neve, seu olhar era de um ser malicioso e sua boca estava sedenta por um gole de sangue fresco. Seus cabelos tão brilhantes como ouro batido, escondiam facilmente a sua testa alongada. Seu rosto era robusto, principalmente as suas bochechas que eram altas e largas, demonstrando facilmente uma tonalidade rosada.

Ao observar que Pedro tinha-se retirado, direcionou-se até o seu quintal e se transformou em um morcego cinzento. Ele tinha garras afiadas, olhos vermelhos esbugalhados e dentes pontiagudos, ao ponto de morder qualquer criatura que esbarrasse em seu caminho. Sobrevoou toda a região dos homens, até chegar no sul onde encontraria o seu senhor repousando nas cavernas de Algün. Ao entrar na floresta, percebeu um certo silêncio perante os habitantes, mas tinha a convicção que encontraria Cesarem ao lado de Sgraünd. Ao entrar na caverna, deparou-se com o mago sentado em seu trono de pedra.

— Meu senhor, trago-lhe notícias sobre Ilumar e seus companheiros. — Oras Jack! Até que enfim você foi útil! — disse Cesarem com um

certo tom de ironia. — Mas me diga, o que traz ao seu mestre? Jack percebeu que Cesarem estava comendo alguns besouros frescos,

espetados em uns palitinhos de madeira. — Estava sobrevoando em Caën milorde, e... — Ah em Caën! Vejo que ainda não esqueceu aquele lugar nojento,

onde você morava. — disse o mago, debochando do jovem rapaz. — É a minha casa! Como posso esquecê-la milorde?

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— A sua casa é aqui agora, nas terras negras, morando comigo e com todos de minha criação. — gritou Cesarem, levantando-se de seu trono. — Mas me diga, o que quer?

— Milorde, como estava dizendo, estive sobrevoando a região de Caën e pude escutar uma conversa que nada o agrada.

— Se trata de Ilumar? — perguntou o mago, olhando fixamente para o seu cajado coberto de ouro.

— Acredito que sim, Milorde! Pude ouvir toda a conversa! Ilumar nomeou um homem chamado Pedro, para que aniquilasse com suas pedras...

— Como? Isso é impossível? Se algum tolo tocar em minhas pedras, automaticamente se tornará uma estátua de sal. Durante anos, pude presenciar estes acontecimentos e dar um basta a todas as suas tentativas.

— Me perdoe. Milorde! Sei o tamanho de sua magnitude perante Ilumar, mas se o Senhor das Águias o escolheu, pode ser que esta maldição não o afete. — disse Jack, temendo a reação de Cesarem.

— Seu idiota! Como ousa falar assim de mim? Acha mesmo que Ilumar tem mais poder do que eu? — perguntou Cesarem. Sua ira foi aumentando, ao ponto de mirar o seu cajado em direção a Jack.

— Não, milorde! O senhor tem o maior poder de todo o mundo de Aldiroön. Somente levantei esta hipótese! — disse o vampiro ajoelhado perante o seu mestre.

— Muito bem! Suas informações me valeram alguma coisa! Agora, retire-se e continue vagando e se alimentando das criaturas de Ilumar.

Quando Jack se retirou, Cesarem sentou-se novamente em seu trono. Preocupado perante estas informações, olhou para o seu cajado.

— Meu caro Degälion! Você sabe o que deve fazer. O cajado estava de pé diante de seu mestre e, em questão de segundos,

sobrevoava a floresta negra, em direção a Caën. O interessante era a forma de ele se locomover, não se via o cajado em si, mas uma fumaça negra que flutuava sobre os céus de Aldiroön, numa intensa velocidade.

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Ao amanhecer, Pedro iniciando seu trabalho rotineiro, decidiu levantar

mais cedo para comprar alguns pães cevados na padaria de Claudiüns, um homem baixo e volumoso, faltando alguns cabelos em sua cabeça. Mas o que divertia as crianças daquela região era de ver seu imenso bigode castanho e sobrancelhas malfeitas, com óculos no formato retangular, que o encaixavam perfeitamente.

Ao retornar para casa, encontrou sua filha arrumando a mesa para o café, colocando as mais belas porcelanas esculpidas por mãos humanas. Por sua surpresa, escutou sua filha cantarolar uma canção.

Brilha, brilha, estrela cadente! Tão suave é o seu brilho, e delicada como as sementes.

Sua pedra nos traz brilho, como um ser angelical; Gosto mesmo é de ver, um lindo céu azul de cristal.

Do céu vem caindo, um pedido a nos fazer; Queremos ver seu brilho, como o sol ao nascer,

Vinde a cada noite, para eu contemplar, Brilha, brilha, e nos faz revelar.

Era doce de se ouvir aquela voz angelical. Pedro lembrou-se de sua

esposa quando ela organizava seus afazeres domésticos, parecia uma deusa que cantarolava ao som de sua harpa. Sara abismou-se ao perceber que seu pai estava próximo, ouvindo o seu cantarolar.

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— Já chegou meu pai. — Estava aqui lembrando de sua mãe. Como vocês se parecem. — Sério? Em que me pareço com ela? — Sua mãe tinha uma belíssima voz! Adorava ouvi-la, enquanto

recolhia as flores nas montanhas. Era uma verdadeira rainha que cantarolava para os seus súditos.

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pós o café, Pedro se retirou, dirigindo-se até o seu local de trabalho, para construir algumas espadas para os soldados do rei. Enquanto isso, Sara, ao lavar as porcelanas e guardá-las

dentro do armário, sentiu um frio congelante em seus ombros. Percebeu que a porta dos fundos estava aberta, e logo pôs-se a fechá-la. Após a tarefa diária, subiu para o seu quarto, a fim de brincar com algumas de suas bonecas de porcelana.

Ao passar pela janela da cozinha, Degälion ainda no formato de uma fumaça negra, subiu silenciosamente as escadas até chegar no quarto de Pedro, mas, ao perceber que ele não estava, retornou até o corredor. O cajado de Cesarem obtivera vida naquele momento, rastejando até o quarto de Sara, e se infiltrando debaixo de sua cama. Ela estava de costas para a porta, não percebendo a entrada da serpente.

Degälion estava observando o brincar de Sara, ao ponto de dar o seu bote. A serpente pulou sobre o pescoço da menina, tentando estrangulá-la. Sara se debatia sobre o chão, usava suas bonecas para relutar contra a cobra, mas era difícil de arrancá-la de seu pescoço. Diversas vezes ela esbarrava nos móveis. Ela gritava para ver se alguém a socorria.

Ao escutar os gritos de sua filha, Pedro correu ao seu encontro, mas era tarde demais. Degälion tinha mordido o seu pescoço, transmitindo o seu veneno. Ao encontrar a menina morta jogada ao chão, percebeu a presença da naja que, ao encará-lo, desapareceu rapidamente daquele lugar.

Pedro estava sem chão, desesperado pela morte de sua filha. Tomando a menina em seus braços, e abraçando-a forte, começou a chorar, gritando por ajuda e pronunciando algumas palavras no ouvido da menina. Sara estava jogada ao chão, toda suja de sangue e com o seu corpo endurecido devido ao veneno que circulou por suas veias.

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Passando-se sete dias de luto, a senhora Pouty jazia em ajudar Pedro nos

seus afazeres domésticos. Uma senhora distinta, com uma aparência bem envelhecida, mas que podia tomar conta de si, tendo forças o suficiente para fazer trabalhos pesados e para atividades que dependessem de certas habilidades. Usava um turbante negro que cobria seus cabelos esbranquiçados juntamente com um vestido de renda.

Ao cair da noite, Pedro, estando no quarto de sua filha, olhava para todos os objetos guardados, lembrando da menina que gostava de se sentar próximo a sua cama para brincar com suas bonecas de porcelana. Ao segurar uma destas bonecas, uma lágrima escorreu de seus olhos, fazendo com que o ferreiro se emocionasse perante há tantas lembranças inesquecíveis de sua filha. Enquanto Pedro estava no quarto, ouviu-se um barulho que vinha de sua cozinha. Curioso, logo se pôs a descer os degraus para averiguar quem estava em sua casa sem a sua permissão.

— Ah é você! — exclamou Pedro. A todo momento ele olhava para aquele jovem que o tinha visitado alguns dias atrás.

— Sim, sou eu! Vim até a sua casa para trazer as minhas singelas lamentações.

— Você viu o que aconteceu aqui? — perguntou Pedro, emocionado. — Sim! Por isso estou aqui! Ilumar novamente me pediu para estar aqui

com você nesta noite, para conversarmos... — Onde estava Ilumar quando isso aconteceu? Onde ele estava? —

gritou ele. Houve um momento de silêncio. Pedro olhava para o jovem todo iluminado, mas nenhuma resposta foi lhe dada.

O jovem sentou-se confortavelmente em uma das poltronas que estava na sala. Uma forte luz azul envolvia aquele ser misterioso. A paz estabeleceu-se naquela casa, mas a dúvida pairava sobre o coração do ferreiro. Ele precisava fazer o teste, para saber se de fato este mensageiro veio realmente em nome

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daquele que ele tanto anunciava. Sabendo dos ensinamentos élficos, Pedro estando próximo de sua mesa, derruba propositalmente uma de suas maçãs frescas colhidas nos campos de Bítchën, cidade próxima a de sua redondeza.

— Está vendo a maçã caída no chão? Quero que você a pegue para mim. — disse Pedro. Estava ele todo autoritário, mas ao mesmo tempo sentia-se um certo medo perante aquele rapaz.

— Percebo que és um homem conhecedor e sábio diante dos ensinamentos deixados pelos Elfos! ''Um teste realizado para eu ser testado'', uma realização louvável, eu admito. — respondeu o jovem rapaz, recolhendo a maçã que estava jogada ao chão. — Aqui está a sua maçã!

— Quem é você? — perguntou Pedro, sentando em uma de suas cadeiras.

— Me chamo Yën, e vim para lhe trazer algumas respostas! — respondeu o jovem rapaz, retornando para a poltrona.

— Que respostas? — Por exemplo, a morte de sua filha! Sei que você não é nenhum

ingênuo e sabe quem a matou. Viu a cobra, não? — Eu a vi! E não a encontrei! Como eu queria matá-la, maldita serpente.

— disse ele, emocionado. Sua voz estava rouca. — Era Degälion, o cajado de Cesarem! Alguém revelou a ele que estive

aqui. E o pior, é que ele sabe que você foi escolhido para participar desta missão. Por isso que ele esteve aqui! Ele entrou em seu quarto e não o encontrou. Mas encontrou a sua filha e a matou sem piedade. Mas saiba que você era o alvo principal da chacina de Cesarem.

— Ele queria me matar? — perguntou Pedro, com um tom sombrio. Virou-lhe as costas e foi até a janela. Ele simplesmente encarava o brilho do luar.

— Cesarem não quer a destruição de suas pedras. Ele está tentando matar a todos os escolhidos de Ilumar, principalmente os seus familiares. O mago tem sede do sangue dos humanos.

— Mas a minha filha não tinha nada a ver com isso. — disse ele saindo da janela. Ele estava com uma voz cansada, repleto de melancolia em sua face.

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— O mago negro não escolhe a sua presa. Ele simplesmente mata. — Simplesmente mata? — perguntou Pedro, com um tom de ironia. —

Poxa vida, ela só tinha dez anos de idade. Não merecia morrer daquela maneira. — Eu compreendo a sua dor e... — Compreende a minha dor? — interrompeu com lágrimas em seus

olhos. — Como você pode entender a minha dor, se você nunca passou por isso? Olhe para você, jamais conheceu a dor de se perder alguém.

— Você tem razão! Eu nunca passei por esses momentos. — disse Yën, levantando-se da poltrona. — Mas consigo sentir muito bem quando os homens perdem seus parentes que tanto amam.

— Cale-se! Por favor! — gritou Pedro. — Não me calo! — gritou Yën. Ele grudou nos ombros de Pedro e

pressionou contra a parede. — Escute aqui. Eu sinto muito pelo que você está passando, mas isso é só o começo das maldades que irão acontecer neste mundo. Cesarem está a cada dia aumentando os seus poderes. Você precisa aceitar o chamado de Ilumar...

— Não! — gritou Pedro, interrompendo-o. — Isso é loucura! Não posso aceitar o que me pede! Está completamente fora do meu alcance achar essas pedras.

— Fora de seu alcance? Como pode pensar dessa maneira? — Eu não sou a pessoa certa para essa missão. — gritou Pedro,

empurrando Yën para trás. Ele conseguiu desencostar da parede fria de sua casa. — O que estou fazendo aqui então? Você é a única pessoa que pode nos

ajudar com essas pedras. É o único que pode tocá-las sem se transformar em uma estátua de sal. — gritou Yën, olhando para os olhos de Pedro. — Será que você poderia ser menos orgulhoso? Pare de ser egoísta e pense mais em todos os habitantes de Aldiroön.

— Não estou sendo orgulhoso e muito menos egoísta. Só não quero participar desta loucura. Vá embora e me deixe em paz.

— Se você não quer fazer isso por Ilumar, pelo menos vingue-se da morte de sua filha e de sua esposa.

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— O que tem haver a minha esposa com tudo isso? — perguntou Pedro, olhando novamente para o estranho rapaz.

— Sua esposa foi morta por um vampiro. Esta mesma criatura foi até Cesarem para entregar você, fazendo com que ele matasse a sua filha.

— Maldito! — gritou ele furioso. Suas mãos estavam extremamente suadas e sua respiração estava a mil.

— Você tem a chance de se vingar de Cesarem! Apenas aceite. Yën olhava para a Pedro. Sua fisionomia havia mudado por completo

quando soube do assassino que havia sugado o sangue de sua esposa. Pedro olhava para o chão, como se estivesse pensando no assunto. Ergueu rapidamente os seus olhos e coçou a cabeça. Alguns fios ficaram grudados entre seus dedos.

— O que devo fazer? Yën sorriu, transbordando de alegria. — Você terá que partir para as terras de Tiän, e lá encontrará o rei Beyën

juntamente com os outros reis do mundo de Aldiroön. — Achei que estava sozinho nesta missão. — Não! É preciso que você se junte aos reis de Aldiroön, por se tratar de

uma missão muito perigosa. — Arthur estará conosco? — O rei Arthur não é digno de estar nela, por isso que Ilumar chamou

você. — Mas os elfos! — exclamou ele, injuriado. — O que tem eles? — perguntou Yën sem entender a sua expressão. — Não os suporto! São seres mentirosos e mesquinhos. — Como pode ter tanta certeza? Por acaso você já conheceu algum elfo? Pedro se calou naquele momento. Ficou alguns minutos refletindo

sobre a possível resposta que poderia dar àquele ser desconhecido, mas nada veio a sua mente.

— Está certo! Qual o nome da criatura que desgraçou a minha vida? — Que criatura? — perguntou Yën, como se não tivesse entendido a

sua pergunta.

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— O vampiro! — gritou. — Qual é o nome dele? — Que diferença isso faz agora? — Eu quero saber o nome dele. — insistiu Pedro. — Me diga? — Jack. Pedro respirou profundamente. — Maldito seja este nome! Eu jurei perante o corpo de minha esposa

que eu o encontraria e o mataria! Mesmo que isto custasse a minha vida! — Ele se nomeia chefe dos vampiros. Ele era um homem igual a você,

mas, diante de uma terrível maldição, se tornou um vampiro! — Que maldição? — Todos os seres que desobedecem às leis de Ilumar, poderão se

transformar em vampiros, porque escolheram de estar à mercê de Cesarem. — Ou seja, se transformam em verdadeiros monstros! — Esta é a aparência de todo aquele que decidir em servir Cesarem! Não

está mais nas mãos de Ilumar as suas escolhas, mas, sim, na do mago. — Houve um pequeno silêncio. Ambos ficaram se olhando. Parecia que as horas não passavam. De repente, Yën deu um salto como se estivesse se lembrado de alguma coisa. — Tenho uma coisa para lhe dar.

Yën retirou dos bolsos um pequeno pedaço de pergaminho velho e entregou para Pedro. Ele estava selado com uma cera vermelha e carimbada com o desenho de uma águia.

— Abra esse pergaminho na hora certa e no momento certo! Dentro dele encontrará uma charada feita pelo Senhor das Águias.

— Como assim uma charada? — Através de sua resposta, você encontrará as pedras da perdição. Cada

rei ganhará a sua charada, e cada um pegará sua pedra conforme for a sua resposta. — disse o jovem, que perambulava pela sala.

— E quando a encontrar o que devo fazer? — Aí está a parte principal! Quando encontrar as cinco pedras da

perdição, deverá levar até a região sul nas cavernas negras de Algün, colocando-

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as na mesa negra e as destruindo com o cajado de Cesarem. Assim o mago perderá todas os seus poderes, ficando vulnerável.

— Vulnerável? — Sim! Sem os poderes, Cesarem não é nada. — disse Yën. — Lembre-

se, pegue somente a pedra que o seu pergaminho lhe indicar. Se você pegar outras pedras que não correspondem ao seu pergaminho, você irá se transformar em uma estátua de sal! Procure logo os elfos e destrua as pedras da perdição! Confiamos na sua bravura e na sua lealdade!

Pedro percebeu que o jovem começava a desaparecer. A luz que o envolvia estava cada vez mais forte, fazendo com que ele desviasse o seu olhar.

Estando sozinho, correu em direção ao seu quarto onde pretendia organizar algumas coisas para a sua longa viagem. Mas, diante do cansaço e da hora tardia, resolveu descansar um pouco. Ele adormeceu, com a certeza de que estaria disposto a enfrentar uma nova jornada.

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o aproximar-se do meio-dia, a senhora Pouty decidiu ficar ao seu lado, até o momento em que selaria seu cavalo e tomaria o seu rumo paras as terras de Tiän. Estando próxima da sala de

estar, sentou-se em uma das poltronas a espera de Pedro para entregar-lhe uma encomenda. Segurava consigo um embrulho pontiagudo e uma carta com uma descrição incompreensível.

— Leve apenas o necessário para esta missão. Principalmente uma espada afiada e um escudo que te proteja perante os ataques. — mencionou ela, ao olhá-lo próximo a escada.

— Estou levando comigo a melhor espada que já pude criar. Veja! Seu punho é feito de ouro maciço, detalhado com algumas pedras preciosas que sobraram para a fabricação de algumas espadas reais. — disse ele, levantando a sua espada.

— Muito bonita! — exclamou Pouty. — É muito mais brilhante do que a de Arthur. Já pensou em algum nome especial?

— Laminada! O que acha? — Merecedor deste nome, já que sua lâmina é de aço cristalizado. Onde

conseguiu? — Estava fazendo uma para o rei, acabei fazendo outra para mim!

Somente Arthur tem uma espada igual a esta. — Cuide bem dela. Muitos homens estão à procura deste aço. Dizem

que não encontram mais deste aço nas terras de Aldiroön. — Ouvi mesmo esses boatos, mas parece que Arthur encontrou

facilmente. — brincou Pedro. — Arthur! Arthur! — exclamou Pouty, repentinamente. — Tome

cuidado com aquele miserável. Você sabe muito bem do que ele é capaz.

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— Sinceramente, eu confio em Arthur. Há tantos anos que trabalho para ele.

— Ele não é digno de minha confiança. — disse Pouty com um semblante desafiador. — Um homem que persegue os aguianos, não merece ser rei.

— São apenas boatos, não temos provas cabíveis de que ele faça essa tamanha crueldade.

— Como consegue ser tão teimoso e tão cabeça dura? — perguntou ela com um tom enfurecido. — Somente os cegos são incapazes de perceber esta realidade. E tem mais! Acredito sinceramente que aquele homem esteja compactuado com Cesarem.

Deixando-a em consideração, Pedro decidiu em não discutir sobre este assunto com a senhora Pouty. Ela poderia estar caducando devido a sua idade avançada. Por isso, resolveu mudar de assunto, deixando para trás aquela conversa impetuosa.

Mas não precisou de muitos esforços para que o rumo desta conversa ganhasse um novo sentido. Próximo a sua mesinha de estar, uma aranha caranguejeira andava sobre o móvel. Era uma criatura extremamente grande para o seu tamanho normal. Pedro começou a se estremecer. Ele olhava para aquele aracnídeo como se estivesse olhando para um mostro do Norte. O suor começou a escorrer sobre o seu rosto e seu coração acelerava a cada momento em que a aranha dava pequenos passos, rumo a sua direção.

Pouty percebeu a sua reação. Ela se levantou e atirou a aranha pela janela. Pedro ficou espantado pela ousadia daquela senhora, mal sabia ela que aquela aranha poderia reaparecer novamente.

— Ainda não perdeu o medo das aranhas? — perguntou ela, sentando-se novamente na poltrona.

— Não! Sempre tive medo delas! Desde criança não as suporto. — Lembro-me que sua mãe me contou uma história que talvez você

ainda não o saiba! — disse ela segurando o misterioso embrulho. — Quando você era um bebê, uma aranha caranguejeira veio visitá-lo, pousando em seu

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rosto. Quando sua mãe percebeu de que ela estava em seu berço, logo a tirou e a matou. Ainda bem que o pior não aconteceu. Talvez seja por isso que você tenha medo das aranhas.

— Não me recordo de ela mencionar esta história. — Nem mesmo ela soube me explicar como que aquela aranha não o

mordeu. — Estranho! — disse Pedro. Houve uma pequena pausa perante a

conversa. Ambos se olhavam como se nada houvesse a dizer. — Então...O que é isso em suas mãos?

— Acabei me esquecendo.... Trago-lhe esta encomenda, juntamente com esta carta. Quero que entregue a Beyën, o rei dos elfos.

— Mas do que se trata? — Somente entregue a ele, por favor! Tenho a certeza que ele saberá o

que fazer! — respondeu ela rudemente. Pedro pegou a encomenda e segurou em seus braços. Percebeu que não

era tão pesada como ele imaginava, mas era algo de extrema importância. Era estranho aquele objeto, algo largo e pontiagudo.

Ao pegar a carta, observou que o seu destinatário estava com as siglas M.S. Mil coisas passaram em sua cabeça, mas nada se encaixava. Qual seria o mistério escondido por detrás dessas iniciais?

Terminada a conversa, despedindo-se da senhora. Pedro amarrou suas bolsas de couro em sua sela e subiu em seu cavalo branco, cavalgando lentamente sobre as ruas de Caën. Ele sabia que não seria nada fácil chegar às terras de Tiän.

Ao cavalgar algumas léguas, pôde perceber a beleza dos campos e das árvores, a grama cortada e aparada, as belas flores desabrochando e se inclinando em direção ao sol que se escondia por detrás das montanhas. Vários tipos de flores eram vistos sobre os campos de Caën. Ao cavalgar mais algumas léguas, sentiu o cansaço gritar mais alto dentro de si, sem ao menos perceber que já estava anoitecendo.

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Não se tinha como fazer uma fogueira devido há falta de gravetos. O campo estava todo aparado, a única coisa que iluminava aquele lugar era a lua que irradiava a região de Caën. O céu estava carregado de estrelas.

Mas algo rodeava aquelas redondezas, fazendo com que Pedro temesse perante o barulho das folhagens, não conseguindo enxergar claramente quem o estava o observando. Parecia algum animal que estava atrás de alguma presa para se satisfazer durante a noite. Pedro subiu em uma árvore, não avistando mais a tal criatura. Ele desceu da árvore e encostou em seu tronco, pondo-se a dormir.

Ao se levantar antes mesmo que o sol ressurgisse em seu caminho,

Pedro continuou a sua jornada, rumo as estradas que o levariam até a região élfica. Em um certo momento, deparou-se com duas placas que estavam sinalizando dois caminhos. Um deles o levaria para a direção norte, já outro, o levaria para a direção oeste. Perante o desespero, decidiu arriscar-se tomando o caminho para a direção oeste, seguindo em direção a Zatüron.

Ao se aproximar da cidadela, deparou-se com um portão de prata. Haviam muros que cercavam toda a cidade. O guarda que estava de vigia percebeu a sua chegada. Ele retirou uma flecha de sua aljava e mirou rumo ao coração do estranho convidado.

— O que quer, camponês? — perguntou ele, com uma voz grave. — Gostaria de falar com o rei Arthur! — exclamou Pedro, temendo

aquele ser apreensivo. — E quem é você? — Sou Pedro Smithy! Filho de Hangar! O ferreiro de Caën. — Ah, sim! O ferreiro que constrói nossas espadas! Já ouvi falar de

você.... É famoso aqui nestas redondezas meu jovem. Você veio a pedido de sua majestade?

— Sim! Estou aqui para novas encomendas! — Está bem! Pode entrar. — pronunciou o guarda da cidadela. — Abra

os portões!

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O portão de prata se abriu. Enquanto entrava na cidadela, sentiu que seu coração iria sair pela boca. Seu nervosismo era tão grande que nada via a sua frente, a não ser o castelo negro de Rochendar, como era chamado pelas redondezas.

Ao descer de seu cavalo e pronto para entrar no castelo, Pedro avistou um hipogrifo que estava preso entre as correntes. Sentiu-se assustado, e, ao mesmo tempo, compaixão por aquele ser todo judiado pelas correntes de ferro. Seu rosto estava em carne viva, havia sangue esparramado sobre o chão.

Dentro do castelo, o ar estava pesado com o cheiro de incenso que impregnava todos os cantos. Havia diversas lanternas negras de ferro pregadas ao longo das paredes. Pedro andava pelos corredores, sentindo uma leve brisa rodopiar os seus cabelos negros.

Um dos guardas tocou a trombeta e anunciou a sua visita. Arthur não era muito de dar boas-vindas, nem ao menos se lembrou do nome a quem estava se dirigindo. Com um olhar de desprezo, permitiu que Pedro se aproximasse de seu trono.

— Você deve ser o ferreiro! Filho de Hangar, eu imagino? — perguntou o rei. Sobre a sua cabeça, havia uma coroa de ouro que escondia as suas franjas ruivas.

— Sim Vossa Graça! Sou Pedro Smithy, o seu ferreiro, construtor das mais belas espadas de todo o seu reino. — disse ele, se ajoelhando perante o rei.

— O que você quer? Sou um homem muito ocupado e não tenho tempo para conversas tolas.

— Meu Senhor! Estou aqui para saber se não poderia liberar uns duzentos homens, para estarem comigo em uma missão.

Puderam se ouvir vários risos de deboche. Arthur riu juntamente com seus homens que estavam de pé, próximo à lareira.

— Por acaso ficou maluco? E qual seria esta missão? Caçar duendes no norte? — perguntou o rei, dando altas gargalhadas.

— Fui convocado por Ilumar a destruir as pedras da perdição! — disse Pedro cheio de coragem e com um tom de ironia.

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Arthur ficou sério naquele momento. Seu rosto parecia a de um cão raivoso que encarava a sua presa. Todos que estavam no salão começaram a ficar calados, ouvindo atentamente a voz de seu rei.

— Não sei de onde você vem, mas espero que você volte para a sua região e que fique por lá. Senão serei obrigado a prendê-lo por demonstrar a esta assembleia a sua fidelidade a Ilumar. Saiba de uma coisa, eu o proíbo a falar novamente sobre estas pedras, ou até mesmo de mencionar sobre esta criatura que não existe. Está me entendendo?

— Sim, Vossa Graça! — Ótimo, agora suma daqui ou não pensarei duas vezes em arrancar a

sua cabeça. Pedro afastou-se rapidamente de Arthur e correu até a direção dos

grandes portões do castelo. Perante as circunstâncias resolveu seguir o seu caminho, estando

determinado a descumprir as ordens reais. O medo aumentava cada passo que ele dava, sobretudo quando via os soldados que estavam a observa-lo enquanto caminhava.

Pedro parou próximo a uma grande coluna de pedra. Ele ouviu uma voz sutil que vinha em direção a do hipogrifo. Era um carrasco vestido com uma longa capa negra. Ele segurava o seu machado que brilhava como prata derretida.

— A pedido de sua majestade o rei Arthur, primeiro de seu nome, regente de toda região central de Aldiroön, rei supremo dos homens e governante das terras longínquas, eu o declaro culpado por ter ajudado na fuga de alguns aguianos que estavam vagando pelo norte. Sua sentença será... a Morte!

Pedro ficou espantado ao ouvir a sua sentença. As pessoas que estavam assistindo, começaram a gritar perante o prisioneiro. Alguns jogavam frutas podres, outros jogavam pedras. O hipogrifo empinou as suas garras e balançou sua cabeça. Ele gritava como uma ave que estava prestes a ser estrangulada.

O carrasco, sem piedade, decapitou o hipogrifo. Seu sangue espirrava por todos lados, escorrendo lentamente sobre aquele chão gelado e acinzentado.

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Pedro saiu daquele lugar. Estava afogado pela dor em ver aquela criatura perder a sua cabeça. Agora sim estava ciente de que Pouty falava a verdade. Conheceu verdadeiramente a face sóbria de Arthur e de seus conselheiros.

Ao sair assustado da cidade real, foi incapaz de perceber que um pequeno pedaço de papel caía sobre os gramados do palácio.

Um dos guardas reais levou-o até o seu rei, dizendo que pertencia ao ferreiro de Caën. Este papel continha as seguintes palavras: “Com carinho, da senhora Pouty”.

O rei percebeu de quem se tratava e ordenou aos seus homens que fossem para a cidade de Caën, para trazerem consigo esta senhora e os aguianos que estavam escondidos.

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o cavalgar para as terras de Tiän, encontrou uma pequena redondeza, onde habitava alguns camponeses e homens que trabalhavam com ferro e aço. Pedro hospedou-se no “unicórnio

relinchante”. Era uma hospedaria antiga, onde havia homens que trabalhavam nela. Havia uma pequena taberna, simples e aconchegante. Os quartos ficavam na parte superior, e a taberna na parte inferior.

Ao descer em direção à taberna, pediu para que trouxessem uma caneca de cerveja caramelada com algumas castanhas. Seu pedido não era um verdadeiro banquete real, mas era a comida e a bebida mais vendida nas terras de Alfegän. Enquanto comia e bebia, reparou que havia um criado que estava exaltado perante a presença de um rapaz. Podiam-se ouvir gritos, que azucrinavam a todos que estavam presentes.

— Percebo que não tem os bréguiimäs suficientes para me pagar! — Quanto lhe devo? — Perante a comida e a cerveja caramelada, deve-me quinze bréguiimäs. — Mas tenho apenas dez! — Então terá que resolver com o dono da hospedaria. — respondeu o

criado alvoroçado. Perante tanta discussão, Pedro aproximou-se daquele criado com sua bolsinha de moedas.

— Aqui estão as cinco bréguiimäs que lhe faltam. Agora deixe-o em paz! Pedro achou estranho a tal criatura que estava diante de seus olhos.

Parecia uma mistura de anão com elfo, no qual, se dava para perceber as características expressivas de um ser que sabia conviver muito bem entre as montanhas. Pequeno, mas com orelhas compridas, um nariz bastante arredondado, olhos perspicazes, roupas avantajadas e coloridas, cabelos

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encaracolados e amarronzados, uma pele lisa e uma afável expressão. Pedro sentou-se à mesa, bem de frente daquela criatura estranha.

— Fico-lhe agradecido, por ter me ajudado com os bréguiimäs. — Meu pai sempre me dizia que devemos ajudar uns aos outros, mesmo

que este outro seja totalmente diferente. — Sábio o seu pai! Houve um longo silêncio. O som dos copos realçava sobre o balcão.

Pedro estava quieto, apenas presenciava o homenzinho que fumava o seu longo cachimbo em silêncio. Finalmente, o silêncio se quebrou.

— Quero prestar os meus serviços a você! Por ser tão generoso ao ponto de pagar a minha dívida!

— Não precisa se preocupar! Desculpe a minha ousadia, mas, o que é você? — perguntou Pedro. Sua curiosidade estava estampada em sua face. Por diversas vezes, ele encarava aquele ser exótico que fumava sem parar, inalando a fumaça que penetrava em seus pulmões.

— Mil perdões! Me chamo Agäz Calção! Sou um elanfö e venho das montanhas do Norte.

— Me desculpe, nunca ouvi falar dos elanfös! — exclamou Pedro tomando um gole de sua cerveja caramelada.

— Vivemos nas regiões de Aquatinta, que se localiza próximo as montanhas do Norte! Moramos dentro de grandes baobás, que refrescam boa parte do vale. Temos comida farta, cerveja à vontade e principalmente, uma lareira que nos aquece contra o frio repentino que surge dentre as montanhas. Não querendo me gabar, mas somos seres bem respeitados, perante os elfos e os anões!

— Um ser tão pequeno, bebendo à vontade nesta hospedaria? — Oras! Tenho trinta e cinco anos, meu caro senhor! Uma idade

bastante respeitada para um elanfö! — disse Agäz dando uma pequena risada. — E como se chama o senhor que salvou o meu pescoço?

— Me chamo Pedro Smithy! Sou de Caën e estou seguindo em viagem para Tiän! — disse ele, retirando de seus bolso um pergaminho velho. Na

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verdade, era um mapa. Só depois de abri-lo que Agäz percebeu o que era realmente.

— Um homem à procura dos elfos, inacreditável de se ver! Eu confesso, é bem raro de se ver esta cena.

Novamente houve um longo silêncio. Pedro tomava sua cerveja e reparava em cada movimento que aquele ser realizava. Percebendo a simplicidade daquela criatura, ousou revelar o seu segredo. Pronunciou de uma maneira discreta, impedindo que outros pudessem escutar.

— Estou em uma missão a pedido de Ilumar! — O grandioso Ilumar, Senhor dos bosques e de todo este mundo? —

perguntou Agäz, pegando algumas castanhas encaracoladas do prato de Pedro. — Sim! Conhece? — Não pessoalmente! São raros os que falaram com ele pessoalmente.

Mas todos os elanfös temem ao Senhor das Águias. — Antes o temia, mas diante de tantos acontecimentos deixei-o de

temer. — Mas para o escolhê-lo assim, algo em você o encantou mesmo não o

temendo. — disse Agäz. — Gostaria de ir com você para esta missão, para honrar o meu compromisso e o meu juramento.

— Não precisa me pagar, já lhe disse que apenas quis ajuda-lo! — disse Pedro, tomando as últimas gotas de sua cerveja.

— Mas faço questão! Não estava indo mesmo para lugar algum. E estando com um homem, poderei viajar mais tranquilamente! Conheço bem as terras de Tiän e o rei élfico, posso lhe apresentar.

Pedro sentiu-se encurralado. Agäz levava a sério seus juramentos e seus compromissos, afinal, os elanfös eram fidedignos aos seus merecedores de sua lealdade. Também seria uma boa companhia, estando ele ao lado de uma criatura que saberia com facilidade chegar às terras de Tiän. Pedro aceitou a oferta e mencionou a ele que partiriam ao nascer da aurora.

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a manhã seguinte, depois de um dejejum tardio, Pedro desceu as escadarias da hospedaria. Para a sua surpresa, Agäz estava de prontidão, esperando-o próximo à taberna. — Acordou cedo! — exclamou Pedro perante o rapaz. — Estou aqui conforme combinado, pronto para uma nova aventura.

— afirmou Agäz. — Os elanfös nunca deixam de cumprir seus juramentos. — Muito bem! Vamos partir! Temos muitas léguas pela frente e quero

chegar logo a estas terras. — disse ele dando ao velho do balcão alguns de seus bréguiimäs.

Ao partirem, Pedro decidiu não cavalgar devido à companhia de Agäz. Ele puxava as rédeas de seu cavalo. Agäz fumava o seu cachimbo, sentindo as folhas de mato verde penetrar em seus pulmões. Ambos admiravam as montanhas do oeste.

Ao conversarem sobre as pedras, perceberam que já estava entardecendo. Pedro resolveu descansar, retirando de sua bolsa alguns de seus suplementos preparados pela senhora Pouty. Enquanto isso, Agäz montava a barraca, cravando sobre a terra os ganchos que a seguravam.

Quando estava quase terminando, Agäz escutou um forte grito rumo ao leste. Ambos correram para aquela direção e se esconderam por detrás das rochas das montanhas. Estava anoitecendo, a lua brilhava constantemente sobre as terras de Alfegän. Sua luz era tão intensa que facilitou a sua visão. Pedro e Agäz notaram a presença do inimigo e temeram os fortes gritos que aquelas criaturas emitiam durante a noite.

— Nossa, o que são eles? — perguntou Pedro assustado perante a esplêndida multidão.

— São os exércitos de Cesarem! — cochichou Agäz. — Estão marchando para a direção sul onde encontrão com o seu mestre.

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— Que mestre? — Oras! Cesarem, é claro! Estão marchando rumo ao seu senhor. — Que seres estranhos! O que é aquilo? — perguntou Pedro. — São os Trolls! Você nunca chegou a ver uma criatura dessa? — Bom! É difícil de ver uma criatura dessa andando por Caën! —

cochichou Pedro, como se estivesse debochando da pergunta de Agäz. — Olhe como eles carregam as suas espadas! Antes, essas criaturas eram

consideradas estúpidas e idiotas. Mas olhe para isso! São agora seres astutos e possuem armas terríveis! Já os Trasgos, não! Esses, sim, são seres lerdos e ignorantes.

— E aqueles quem são? — perguntou Pedro novamente. — Aqueles de capa negra? — Sim! Parecem seres que transportam a morte! — Aqueles são os Demäuros! Dizem que nem tocam o chão enquanto

caminham. São portadores do medo e da solidão. Mas o que eles gostam de verdade é de massacrar os hipogrifos e beber de seu sangue! Alguns gostam de andar em seus cavalos, outros preferem voar em seus dragões!

— E aqueles ali? Parecem ratos vestidos de homem! — Aqueles são os Zoörgs! São rabugentos e arrogantes. Foram criados

um século depois que Cesarem foi expulso de Calauë. Seres nojentos, sem coração. Matam por puro prazer! Preferem matar mais os humanos do que os próprios elfos. São ágeis com as espadas e habilidosos em uma batalha. Seu número cresce a cada dia. Ressurgem nas lamas e nos ardumes dos pântanos.

— Aqueles são os famosos duendes de Duriön? — Sim! São eles! São outros seres que me enojam. São bons no

encantamento, e sobretudo, adoram cogumelos. Mas veja! Carregam consigo uma longa vara e flechas que contêm um veneno mortal. São perigosos quando estão no meio da floresta, mas inofensivo quando estão em campo aberto.

— Quantos você acha que estão marchando? — Bom! Deve haver mais ou menos umas cinco mil criaturas! Um

número bastante pequeno para um grande exército que nos espera! — cochichou

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Agäz com uma voz imperativa. — É, meu amigo! Com certeza, Cesarem já deve ter descoberto que você está atrás de suas pedras! Olhe, abaixe!

Pedro não sabia o porquê daquele alerta, mas percebeu a preocupação do jovem. Ao avistar o céu, enxergou vários morcegos gigantescos e deduziu que seriam os vampiros que estavam seguindo aquele exército.

— Veja os vampiros! Eles não podem nos ver senão estamos mortos! Vamos esperar este exército passar, para assim voltarmos para a nossa estadia.

Ao passar uma hora de extrema agonia e percebendo que o perigo já não estava a suas vistas, resolveram regressar para a sua barraca. Apagaram rapidamente a fogueira que estava iluminando aquele lugar e se aconchegaram em seus longos casacos de ovelha. Temeram a noite toda, pensando que poderiam talvez reencontrar com aquelas criaturas.

Já estava quase amanhecendo quando eles decidiram voltar a caminhar. Após quinze dias de viagem, avistaram uma pequena cidadela nas regiões de Goüan, próximo às terras de Tiän. Era preciso comprar alguns mantimentos para prosseguir a viagem. Resolveram, então, passar por dentro da cidadela élfica para verificar se havia alguma notícia sobre o rei do norte.

Próximo aos grandes portões de prata, havia monstruosas estátuas de mármore, feitas pelos mais antigos elfos de Tiän. Eram verdadeiras obras de arte, contendo uns cinquenta metros de altura, estampadas com a imagem do rei élfico, segurando consigo uma lança em sua mão esquerda e uma flecha com a mão direita. Esta flecha estava sendo mirada para a direção sul.

Ao passar por aquela entrada, encontrou alguns dos elfos que o estavam encarando, parecia que eles nunca tinham visto a raça dos homens. Ao entrar em um pequeno armazém, repararam que havia um senhor elfo que estava próximo ao balcão, encarando-o profundamente.

— O que a raça dos homens está fazendo em nossas redondezas? — perguntou o senhor com uma voz grave.

— Estou à procura de vosso rei! — afirmou Pedro, pegando alguns embrulhos.

— Nosso rei está bem velho para receber problemas dos homens.

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— Eu sei! Sei também que a nossa raça não tem que ficar dando satisfações a vocês. Estou aqui porque alguém me pediu para estar, senão, nem me atreveria a tocar os meus pés nessa terra imunda.

— Você sabe que não é bem-vindo nestas terras! A raça dos homens nos aniquilou completamente. Tirou de nós muitas terras que pertenciam ao nosso rei! A ganância dominou completamente a raça humana!

— Eu sei de toda a história! Não precisava mexer no passado! Apenas me vende estes mantimentos que sairei de sua vista.

Agäz era bem visto por aquelas redondezas, tanto que ao entrar no armazém foi saudado pelo senhor que estava por detrás do balcão. O velho achou esquisito um elanfö estar acompanhado por um homem, mas não se atreveu a palpitar sobre o assunto.

Ao sair daquele armazém, Pedro relatou toda a conversa para o seu mais novo companheiro. Agäz compreendia perfeitamente que a raça dos homens não era bem-vinda naquelas terras.

Ao cavalgar mais algumas léguas, encontraram-se em uma terra diferente. Pedro ficou deslumbrado de tamanha beleza. Uma cidade sobre as rochas, próxima de cachoeiras que jorravam águas cristalinas. Sua grama era aparada e verdinha. Haviam flores exóticas com diversos aromas diferentes.

Suas casas eram feitas de madeiras élficas. Todas elas eram esculpidas com cinzel. Em algumas casas, o louro ganhava destaque, já em outras, eram a arpa ou o arco.

Em cada canto em que eles passavam, havia várias estatuas élficas de mármore, presas sobre os muros de pedra.

— Bem-vindo a Tiän! — disse Agäz. Pedro se encantou por aquele lugar. Diversas árvores que pareciam

tocar o infinito, estavam grudadas em uma das casas. Havia elfos que se escondiam por detrás das árvores. Na verdade, eram crianças que gostavam de escalar, arriscando a própria vida em troca de uma boa diversão.

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Pedro cavalgou lentamente sobre a cidadela, observando cada habitante de Tiän. Eles o encaravam. Sentiram-se ameaçados perante a presença daquele homem.

Ao chegarem na casa real, Pedro desceu de seu cavalo e aguardou os cumprimentos reais. Mas ninguém aparecia. Ambos ficaram parados como se estivessem aguardando o tocar de alguma trombeta. Não havia nenhum guarda que pudesse anunciar a sua chegada, apenas duas estatuas de mármore que enfeitava a frente daquele palacete.

Agäz dirigiu-se até a porta de madeira, com a esperança de que alguém aparecesse. Ele bateu três vezes a aldrava sobre a porta, parecia que a casa estava abandonada. Todos os súditos de Beyën estavam observando discretamente a postura daquele homem e a sensatez do jovem pequenino.

Por fim, as portas se abriram, e de dentro da casa real, surgiu um elfo jovem e robusto, de longos cabelos loiros e de uma aparência não muito amigável. Pedro se sentia incomodado com os olhares severos daquele rapaz. Parecia um lobo encarando a sua presa.

— Gostaria de falar com o rei Beyën. — disse Pedro. — O que um homem faz em meus domínios? — perguntou o jovem elfo

com uma voz imperativa. — Você é Beyën? — Claro que não, meu Senhor! — cochichou Agäz. — Me chamo Turän, filho de Beyën! E você quem é? — Me chamo Pedro Smithy, filho de Hangar! Estou aqui a pedido do

Senhor das Águias. — Como você pode mentir desta maneira? O que o Senhor das Águias

quer com vocês? Humanos idiotas! Vá embora e não voltes mais! — Não sairei daqui enquanto não falar com o seu pai! — Me desafia seu ser imundo! — disse o elfo. Na mesma hora, ele

retirou a espada de sua bainha e ameaçou-o de morte.

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Pedro avistou um senhor de cabelos grisalhos e com uma singela coroa em sua cabeça. Um elfo magricelo e com um rosto bem abatido devido a sua idade avançada.

— Basta, Turän! Ele é meu convidado. — disse o elfo segurando o punho de sua espada.

— Me chamo Beyën da casa Moöncairn. Seja bem-vindo às terras de Tiän.

Pedro ficou admirado em observar a atitude nobre daquele rei. Todos os elfos que ele encontrou pelo caminho foram dignos de desprezo e arrogância.

— Sei o motivo de vocês estarem aqui, e peço humildemente as desculpas cabíveis por esta grande afronta de meu filho! Seja bem-vindo a minha casa! — disse Beyën, deixando os outros elfos surpreendidos.

Ao entrar na casa do elfo, Pedro observou que a maioria dos móveis eram feitos de madeira e pedra. Sentaram-se em uma poltrona totalmente confortável e saborearam algumas torradas malpassadas.

— Espero que vocês gostem daquilo que eu irei trazer. — disse Beyën perante os convidados.

Trouxeram exclusivamente para eles uma pequena vasilha branca de porcelana, detalhada com pequenas flores coloridas. Era um molho acinzentado e apetitoso, exalando um odor extremamente delicado.

— Molho de Crepän! — exclamou Pedro. — Mas como você sabia que eu gostava deste molho?

— Ora! Yën esteve aqui e me contou de seus gostos. — Fico-lhe agradecido! Realmente gosto muito deste molho. — disse

Pedro. Ele simplesmente devorou uma torrada inteira, após mergulha-la no molho.

— Yën é magnifico! Realmente aquele corvo não deixa escapar nenhum detalhe! — disse Agäz, segurando fortemente a sua xícara.

— Corvo? Que corvo? — perguntou Pedro sem entender. — Yën! — exclamou Beyën. — Ele é conhecido como o mensageiro de

Ilumar.

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— Pode até ser o mensageiro de Ilumar, mas quando esteve em minha casa, não estava em seus trajes de corvo. Sua aparência era como a nossa!

— Estranho! Ele sempre se apresentou para nós como um corvo. — afirmou o elfo.

— Ele me pediu para estar aqui para ajuda-los a capturar as pedras da perdição, feitas pelo mago Cesarem.

— E você já deve imaginar quem seja esta tal criatura! — disse o elfo, olhando fixadamente em seus olhos.

— De início eu acreditava que era apenas um mito! Mas depois do que acabei de ver, tenho as minhas dúvidas.

— O que você viu? — O exército de Cesarem marchando para o sul. — disse Agäz,

degustando-se com as torradas. — Ele já deve ter descoberto sobre as pedras! — disse Beyën,

preocupado. — Precisamos estar atentos e reunir o máximo de criaturas possíveis para esta batalha.

— O senhor conheceu pessoalmente o mago milorde? — perguntou Pedro.

— Estive presente em sua queda! Eu o vi caindo do céu como um meteoro que atinge sobre a terra. Já tive a desgraça de o ver em outras oportunidades. Um ser abominável, que queria simplesmente tomar o lugar de Ilumar.

— Mas sua queda aconteceu a milhares de anos, não foi? — perguntou Agäz.

— Por que você acha que estou velho? — disse Beyën, dando uma pequena risada. — Temos que esperar o rei dos anões! Eles chegarão juntamente com algum hipogrifo ou centauro, a quem Ilumar escolher. Somente assim partiremos para a nossa jornada. Enquanto isso, vocês ficarão em um de nossos aposentos. Tomem um banho fresco e descansem. Devem estar cansados devido a longa viagem que acabaram de fazer.

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— Tem razão! Estamos exaustos! — disse Pedro. — Estou há quinze dias galopando em meu cavalo.

Beyën estava acompanhando de dois elfos. Um deles era Turän, o seu filho mais velho. Já o outro, era completamente magricelo. Não aparentava ser um guerreiro, estava mais para conselheiro real.

— Antes de vocês subirem para os seus aposentos, gostaria de apresentar meu outro filho, Mirgän!

— Espero que tenham feito uma ótima viagem! — disse Mirgän. — Não foi das melhores! — disse Agäz. — Mas, estou acostumado. Mirgän, não tinha nenhuma aparência de lutador. Ele era um sujeito

magricelo, de olhos castanhos e cabelos negros. Suas roupas eram alinhadas e suas botas aparentavam estar engraxadas. Parecia ser um sujeito organizado com suas coisas, não aparentava ser arrogante como o irmão. Quem olhasse para ele, não acreditaria na sua capacidade de lutar em altas batalhas. Estava mais para um capitão do que para um soldado.

Após as apresentações, Pedro e Agäz subiram juntamente com alguns dos criados, as longas escadas de madeira. Encontraram camas macias e confortáveis, onde puderam descansar.

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ra uma noite sombria e agitada. O exército de Arthur marchava em direção a Caën. Os soldados estavam apenas cumprindo ordens de seu rei, procurando a todos os cidadãos que se nomeavam serem

seguidores de Ilumar. Eles eram reconhecidos como aguianos, os protetores leais de uma longa tradição.

Havia mais de dois mil homens que caminhavam em direção cidadela. Pareciam leões em busca de suas presas. Ao invadirem a pequena cidade de Caën, puseram fogo em algumas moradias, obrigando os habitantes a revelarem quem estava ocultamente a serviço de Ilumar.

Casas foram arrombadas, pessoas foram degoladas e famílias foram levadas à força, sendo obrigando a se confessarem e a se retratarem perante seu rei. Várias crianças foram mortas pelas espadas reais. Alguns dos cadáveres foram amarrados diante dos portões da cidadela. Outras foram arremessadas ao fogo para serem queimadas como uma simples palha seca que percorre o chão. Muitos foram acorrentados para serem levados a pé até o castelo negro.

A casa de Claudiüns foi invadida por um dos guardas. Ele tentou relutar, mas foi impedido por um outro guarda que estava próximo de sua casa. Foi algemado e levado para as terras de Zatüron. Antes de partir, Claudiüns olhou desesperadamente as labaredas que sucumbiam a sua casa.

A Senhora Pouty ouvia os gritos infernais que rondavam a sua casa. Ela levantou-se de sua cama e vestiu um roupão que estava próximo de sua poltrona. Ela se escondeu na adega, próximo aos grandes galões de vinho.

Um grande número de soldados invadira a sua casa. Pouty foi descoberta e levada até o capitão Wiliam que estava comandando as tropas reais. Ele era considerado o capitão da guarda real. Seu rosto não era nada amigável.

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Tinha uma enorme cicatriz próximo a sua orelha direita. Parecia que alguém havia esfregado o seu rosto em uma brasa ardente.

Ele era um homem arrogante e grosseiro, não sabia respeitar ninguém. Pouty que foi arrastada de uma maneira indelicada. Ele a puxou pelos seus cabelos e a levou em direção ao seu cavalo.

A cidade estava totalmente demolida, muitas casas foram desmanchadas e queimadas devido à fúria de seu rei. Todos os que estavam acorrentados foram caminhando em direção a Zatüron. Pouty foi levada a cavalo.

Após três dias de viagem, muitos deles estavam sedentos e cansados devido às más condições prestadas pelos guardas.

Ao chegarem nos portões da cidade, foram recebidos de uma maneira grotesca. Alguns atiravam pedras sobre os prisioneiros, outros riam e caçoavam das correntes que estavam presas em seus pés. Mas havia outros que não conseguiram compreender o sentido daquela cena.

Todos os prisioneiros chegaram na cidade em farrapo. Eles foram apresentados indignamente perante a população. Ouviu-se, então, a voz de Wiliam que gritava fortemente sobre o seu cavalo.

— Habitantes de Zatüron, vejam! É isso o que acontece por trair o meu rei!

— E o que eles fizeram para trair o nosso rei? — perguntou o rapaz que estava próximo ao portão.

— São aguianos, servidores de Ilumar! — disse Wiliam. — São as criaturas mais imundas de todo este reino.

Claudiüns percebeu a reação de espanto de algumas daquelas pessoas que estavam presenciando aquela cena.

Ao chegar no castelo negro, o rei estava os aguardando. Arthur encontrou-se com Pouty, que foi recebida com um olhar de desprezo. Ela foi levada para uma sala próxima aos aposentos reais, ficando trancafiada até o momento de seu julgamento.

Enquanto isso, Arthur ousou perguntar para cada prisioneiro quem estaria por trás da liderança dos aguianos. Todos os prisioneiros foram torturados pelo rei, alguns foram espancados, outros tiveram as unhas

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arrancadas até falarem a verdade. Claudiüns passou pelo mesmo interrogatório, sendo obrigado a falar a quem ele realmente o servia.

— Diga-me a verdade! — gritou Arthur. — A quem você é leal? A mim ou a Ilumar?

— Não sei o que o senhor está falando! — Sabe, sim! Eu lhe fiz uma pergunta e tenho direito a uma resposta.

Me diga, a quem você serve, seu padeiro imundo? — gritou Arthur com um tom diabólico.

— Acho que o senhor já sabe a minha resposta, não é mesmo? — perguntou Claudiüns cabisbaixo. — Não tem o direito de nos torturar desta maneira.

— Como se atreve a me dar ordens. Por acaso você é o rei? — perguntou Arthur, dando-lhe uma bofetada.

— Me agride porque não suporta ouvir a verdade! Ilumar é o único Senhor destas terras. Para mim, é um sinal de honra em dizer-lhes toda a verdade. Eu sou um aguiano e não me envergonho!

— Você é um tolo! Um imbecil que não sabe de nada... Arthur deu um pequeno estalo em seus dedos. Um de seus criados

trouxe consigo uma bandeja de prata, coberta por um pano vermelho. Ao retirar aquele pano, exibiu com certo prazer, a cabeça do hipogrifo (Esta era a mesma criatura que havia sido decapitada na presença de Pedro). O rei o exibiu perante todos, como se fosse um prêmio.

— Estão vendo! É isso o que acontece com aqueles que não se retratam com o seu rei. — disse Arthur segurando a cabeça do hipogrifo. — Como sabem, sou um rei misericordioso e entendo que muitos podem ter sido seduzido por aqueles malditos elfos. Por isso, hora de se retratarem e clamarem por clemência! Jurem lealmente que irão parar de crer neste ser que sequer vimos. Se fizerem isso, eu os perdoarei! Mais saibam, a partir de hoje, terão que servir a mim e ao meu mestre, a quem eu o sirvo lealmente.

— Quem? O infame Cesarem! — gritou Claudiüns, corajosamente.

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— Seu insolente! Vai pagar caro por falar assim de meu mestre. — disse Arthur, enfurecido. — E chega de conversa fiada, dou a vocês de escolherem quem será o vosso mestre a partir de agora. O mago Cesarem ou a morte?

Algumas famílias, amedrontadas pelo medo, resolveram escolher Cesarem como mestre. Mas havia outros que mantinham a esperança no Senhor das Águias. Juntamente com essas pessoas, Claudiüns revelou definitivamente a sua escolha, deixando o rei extremamente nervoso.

— Eu prefiro a morte a negar o meu mestre! — disse Claudiüns. — Não se preocupe, isso será providenciado. — gritou Arthur, dando-

lhe mais uma bofetada. — Guardas, levem todos para as masmorras. — E o que faremos com eles, alteza? — perguntou um dos guardas. — Prenda-os em correntes e molhem a todos! Essa noite eles

conhecerão realmente o frio das masmorras. Claudiüns estava todo debilitado devido aos tapas e murros levados

pelos soldados. Os que negaram em servir o rei tiveram a companhia dos guardas nas masmorras. Já aqueles que se retrataram perante o rei, foram soltos, levando consigo alguns bréguiimäs para a reconstrução de suas casas.

Arthur dirigiu-se até a outra sala, para encontrar com a senhora Pouty. Ela estava quase desfalecida, quando encontrou com o rei.

— Vejo que você está com sede. A senhora gostaria de um pouco d’água?

— De você não quero nada! — disse ela, sentando em uma cadeira nada confortável. — Quero sair daqui, não fiz nada para merecer esta prisão.

— Tem certeza? Seu passado entregaria facilmente a suas traições. — Que traições? Escute aqui, meu rapaz, se você olhar para o meu

passado, irá encontrar o seu pai nele! Um homem justo, merecedor de todas as honras que se possam imaginar!

— Meu pai era uma vergonha! Ele não podia ver um rabo de saia que logo já se deitava com uma mulher. Foi merecedor de sua morte! Um velho tolo e arrogante.

— Mentira! Mentira! — gritou Pouty, levantando-se rapidamente com um tom enfurecedor. — Seu pai foi para nós o motivo de honra! Soube amar

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profundamente os costumes de seus antepassados. Lutou até o fim contra o mago Cesarem e contra a feiticeira Kalista, dando-lhe a ela o fim que ela tanto merecia.

— Ah, sim! — disse Arthur, dando uma pequena risada maliciosa. — Sei o tamanho de sua honra e lealdade. Quantas mulheres passaram no leito de meu pai? Dez? Cinquenta? Já imaginou quantos bastardos vagam neste mundo? Meu pai foi um tolo, que não soube administrar o seu poder.

— Então você já sabe que tem um irmão? — Um irmão? — perguntou Arthur, debochando-se friamente. —

Devo ter vários! Mas saiba de uma coisa, sou o único a reinar sobre essas terras. Se algum bastardo aparecer querendo reivindicar o meu trono, saiba que eu matarei com a minha espada e pendurarei a sua cabeça em uma estaca.

— Que Ilumar tenha piedade de você e de seus escrúpulos! — Acha que é mais esperta do que eu? Saiba que eu não julgarei por seus

crimes. Se fosse por mim, estaria morta e sua cabeça estaria enfeitando a minha bandeja. Mas há uma outra pessoa que quer vê-la e julgá-la pelo seu passado!

— Quem? — perguntou Pouty, amedrontada. — Ah! Será uma surpresa! — disse o rei ironicamente. — Fique

tranquila, esta noite ele estará por aqui! Até lá, você terá muito tempo para refletir sobre os seus pecados.

Pouty começou a gritar desesperadamente, após a saída do rei. Estava completamente sozinha naquele lugar escuro. O frio dominava cada vez mais aquela sala, somente se via a luz do luar que refletia sobre os longos tapetes vermelhos estendidos no salão.

Ao passar algumas horas, o céu começou a se escurecer, e diversos relâmpagos agudos e monstruosos começaram a cair sobre as terras de Zatüron. Uma longa tempestade de inverno estava próxima daquelas terras. Pouty estava amedrontada, principalmente quando um chumaço de luz resplandeceu sobre a lareira, acendendo-se misteriosamente com um fogo resplandecente. Suas labaredas não se manifestavam com a cor tradicional, mas, sim, com um tom esverdeado, igualando-se à cor das esmeraldas. Pouty ouviu alguém gritar seu

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nome com um timbre de voz desesperador, parecia que estava engasgado ou roco conforme o ruído que repercutia.

Pouty percebeu a densidade das labaredas, presenciando uma cena nunca vista aos seus olhos. Das chamas esverdeadas e escurecidas, surgiu Cesarem com o seu cajado. Sua expressão se igualava à de um cão raivoso. Parecia que a qualquer momento ele iria avançar sobre ela, de tão pavoroso era o seu olhar.

Pouty estremeceu ao revê-lo, jamais imaginaria que encontraria Cesarem no castelo de Rochendar. Ao vê-lo, caiu no chão assustada e logo começou a se desesperar perante tal criatura.

— Você não! Você não! — gritou Pouty. — Ora! Nunca imaginei que a encontraria novamente! A famosa rainha da sabedoria, ou já perdeu este título?

— Deixe-me em paz, seu monstro! Deixe-me em paz! — gritou ela novamente.

— Que modos são esses de tratar o seu milorde! Você sabe muito bem o que eu quero, não sabe?

— Vai embora, não quero vê-lo. Saia daqui! — Não irei embora! Você matou a criatura mais preciosa deste reino.

Um pedaço de mim se desfez! Mas não se preocupe, você irá pagar por sua afronta.

— Eu me orgulho do que eu fiz! Saiba, ser macabro, que se pudesse... acabaria com você agora!

— Nenhuma espada mortal pode me destruir, você sabe disso! — Ah, Cesarem! Você sabe que existe uma que pode te destruir! Pelo

que eu me lembre, você acabou perdendo um dedo com aquela espada. — Maldita! — gritou Cesarem. — Foi você mesmo que arrancou o meu

dedo com ela, sua miserável. — É uma pena eu estar velha, seria um prazer em presenciar sua derrota.

Mas me orgulho de ter presenciado a derrota de Kalista e por participar da sociedade da prata.

— Mas como você é tola! A qualquer momento eu posso trazer Kalista de volta. Foi eu que a criei e posso trazê-la novamente.

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— Sem as pedras isso seria impossível, Cesarem! A quem você quer enganar? A você mesmo? Foi pela fraqueza dos homens que conseguiu capturar suas pedras.

— Logo terei as pedras novamente! — disse Cesarem. — A sociedade da Prata será reerguida! Ilumar já escolheu os seus eleitos

e logo estas pedras serão destruídas! Novamente a paz ressurgirá neste mundo e você estará derrotado! — disse Pouty, dando um pequeno sorriso.

— Mas antes, eu os matarei! — disse Cesarem. — Mas chega de conversa fiada, você sabe o que eu quero, não sabe? Onde está a espada das Oliveiras? Minhas últimas informações foram de que você estaria com ela!

— Não sei do que você está falando! Cesarem inclinou o cajado em direção a Pouty. A todo momento, ela se

debatia contra a parede, derrubando todos os móveis que havia naquela sala. Mas o golpe fulminante foi quando deixou-a flutuando de cabeça para baixo, indo até a sua direção para perguntar-lhe novamente.

— Onde está a espada das Oliveiras? E desta vez, não minta para mim! — Foi devolvida a sua verdadeira dona. — disse Pouty quase

desvanecida. — Como ousas devolver para ela! Eu sou o dono desta espada... — ... a espada pertence a ela e a mais ninguém! — interrompeu. — Isso é mentira! — gritou Cesarem. — Ela pertence a mim! — Faça o que quiser, Cesarem! Eu não me importo mais com suas

palavras. — Basta! Sua velha mentirosa! Os olhos de Degälion ficavam cada vez mais iluminados, emitindo um

forte feitiço que a esmagou entre as paredes. O ar já não penetrava em seus pulmões, o brilho de seus olhos estava desaparecendo. Pouty simplesmente deu um forte suspiro e faleceu deitada sobre os longos tapetes do castelo.

Ao estrangulá-la com seu cajado, Cesarem deu um forte grito, fazendo com que o rei ressurgisse rapidamente dentro do salão.

— Seu idiota! Percebeu a burrada que você cometeu?

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— O que eu fiz para merecer o seu desprezo? — perguntou Arthur, ajoelhando-se.

— Você deixou aquele ferreiro fugir com a minha espada. Devia tê-lo prendido!

— Não me diga que ele estava envolvido milorde? Pedi para que ele regressasse para a sua casa.

— Seu tolo! Está vendo ele aqui agora? Quero que mate todos os que estão trancafiados nas masmorras, entendeu?

— Sim, Milorde! Eu os matarei. — Todos de Aldiroön temerão o seu rei, assim conseguiremos impedir

que os seguidores de Ilumar ajudem a nova sociedade da prata. Vamos aquietar a maioria para que a minoria vença!

— Serão executados antes do pôr do sol, milorde! — Ótimo! Eles irão aprender a como tratar o seu verdadeiro mestre! —

disse Cesarem, dando uma pequena risada sem graça. — E o que faremos com o corpo dela, milorde? — Jogue o corpo dela na mesma cela que os aguianos! Pensarei depois

o que fazer. — Sim, milorde! Ao amanhecer, o rei Arthur incumbiu alguns dos guardas para que

preparassem tudo para a morte dos aguianos. Cesarem pediu para que os guardas fizessem um lugar totalmente

apropriado para aquela execução. Foi preparado um cercado de madeiras resistentes e altamente eficazes, como se fosse uma arena totalmente rodeada de muros elevados.

Claudiüns e os outros prisioneiros foram levados para o centro da arena. A trombeta foi tocada, e um pequeno pronunciamento foi dito para todos de Zatüron.

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— Quero anunciar que estes prisioneiros foram condenados à morte por acreditar fielmente em Ilumar! — gritou Arthur. — Tentei me retratar com eles, dando-lhes uma chance de misericórdia. Mas, infelizmente são tolos o bastante para viver. Preferiram a morte a se retratar com o rei. Por isso, eu os sentencio à morte!

Alguns dos aguianos choravam perante o rei, pedindo clemência por aquele momento. Claudiüns ajoelhou. Parecia que ele estava falando com alguém, como se sussurrasse para si algumas palavras de consolo.

O corpo de Pouty foi jogado na arena. Ao tocar novamente a trombeta, os aguianos perceberam que Cesarem estava no meio deles, dando altas gargalhadas.

— Onde estará Ilumar neste momento de dor? Eu lhes digo, ele deve estar em Calauë cuidando de si e de outros a quem o ama. — disse Cesarem. — Acha mesmo que Ilumar se importa com vocês?

— Não deem ouvidos a esta serpente! — gritou Claudiüns. — Serpengoöu Charskÿ. — gritou Cesarem, emitindo o seu feitiço. Os olhos de Degälion estavam acesos, pareciam dois faróis que

iluminavam a escuridão. De repente, uma imensa labareda saiu dos olhos de Degälion. Sua forma era de uma enorme serpente viva, que andava livremente sobre a arena. Todos os que estavam presos relutaram contra a serpente.

Cesarem fugiu rapidamente, transfigurando-se em uma fumaça negra, rumo à sacada do castelo. Diversos prisioneiros choravam sem parar. Alguns gritavam de dor devido às chamas que sucumbiam seus corpos.

Depois de um certo tempo, os prisioneiros não conseguiam mais resistir às chamas. Todos morreram carbonizados. Aqueles que estavam assistindo à morte dos aguianos, puderam sentir um odor nada agradável que saíam dos corpos.

Cesarem não estava convencido de sua morte. Ele caminhou livremente no meio da arena, fazendo com que a imensa cobra desaparecesse. Sentia o prazer de andar sobre aqueles corpos jogados ao chão. Degälion estava andando

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juntamente com o seu mestre, olhando cada cadáver que havia se queimado. Ele transfigurou-se em uma fumaça negra e partiu para as terras de Tiän.

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gäz não se continha em esperar os novos recrutas. Tentava pensar o mínimo possível nesta longa jornada. Mas nada disso adiantava. Sua ansiedade era monstruosa. Muitos que ali estavam

observaram a sua insistência perante o assunto. Em quase todos os momentos, ele perguntava para Pedro se o restante dos membros havia chegado. Ele era o único a se sentir assim. Todos estavam calmos e pacientes à espera do rei dos anões, e, ao mesmo tempo, ansiosos para saber a quem Ilumar tinha escolhido; um hipogrifo ou um centauro?

Além disso, era preciso estar diante de todos os escolhidos para abrir seu pergaminho. Pedro não entendia muito bem o porquê dessa espera para abrir a sua charada. Se abrisse agora, poderia ganhar mais tempo para descobrir a sua resposta; mas era uma das condições de Ilumar, ele apenas teria que obedecer.

Como era de costume, havia uma grande festa que os elfos preparavam no final da colheita. Estavam próximos do grande dia das “estrelas resplandecestes”, conhecido como “A Festa de Iüan”. Esse nome, foi dado pelos elfos do passado. Uma das noites mais importantes para os aguianos, quando ofuscantemente resplandecia uma grande estrela sobre o céu escurecido, lembrando a eles a grande vitória do Senhor das Águias. Essa estrela ajudou a senhora de Aracuqüe a encontrar Ilumar que estava caído próximo às montanhas do leste.

Pedro comemorava quando era criança juntamente com seus familiares, mas não conseguia compreender o verdadeiro significado.

— Qual é o motivo de grandes comemorações? — Não conhece a história de seu povo? — perguntou Beyën.

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— Lembro-me de que comemorava com minha mãe e com meu pai, mas nunca entendi o verdadeiro significado! Na verdade, perdi meus pais quando era muito novo. Infelizmente, eles morreram de tuberculose. Mas me lembro vagamente de suas histórias e canções. Enfim... continuo sem entender! — respondeu Pedro, olhando a decoração feita pelos elfos.

— Bom! Então não terá nenhum problema se contar novamente esta história! — exclamou Beyën.

— Eu poderia contar? — perguntou Agäz. — Claro que sim! — Bom! Esta história é bastante comentada em Aquatinta! Dizem que,

em uma noite fria de inverno, uma formosa feiticeira azulada encontrou Ilumar caído próximo das grandes montanhas de Aracuqüe. Estava ele todo machucado e ferido. Ninguém sabe mais ou menos o motivo de sua queda. Com isso, ela o levou até a sua casa para curar seus ferimentos. Mas o interessante é que ela não sabia que se tratava de Ilumar, achava que era uma águia qualquer.

— Como assim? Ela não sabia que se tratava do Senhor das Águias? — perguntou ele, incrédulo.

— Não! — disse Agäz. — Senão me engano... Ilumar estava pequeno, no tamanho de uma águia qualquer. Ela imaginava que estava tratando de uma mísera ave que estava perdida entre as montanhas! Nunca passou por sua cabeça que era o senhor dos bosques!

— E, com isso, ela o a levou para a casa! — disse Beyën, franzindo as sobrancelhas.

— Sim! — disse Agäz. — Segundo esta feiticeira, Ilumar tinha morrido alguns minutos, mas depois, retornou misteriosamente a viver!

— Morreu e voltou? — perguntou Pedro. — Parece que sim! — disse o elfo. — Bom! — continuou Agäz. — Dizem que, depois de sua morte,

Ilumar ficou na casa dela por mais três dias! Ele revelou a ela sua verdadeira identidade, dando-lhe a maior e a mais magnifica honra de ser a sua escolhida. E

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durante anos, Ilumar a protege, impedindo que qualquer mal a atinja. Estou certo?

— Está certo! — respondeu o elfo. — Mas chamá-la de feiticeira azulada é demais!

— Bom! Os elanfös de Aquatinta sempre a chamaram assim! Nunca chegamos a conhecer a senhora de Aracuqüe! É verdade que ela tem uma arma para se defender?

— Sim! Uma arma extremamente poderosa! — E que tipo de arma seria essa? — perguntou Pedro. — Ilumar deu a ela uma espada! Todos os homens e elfos a nomeiam

como a espada das Oliveiras, feita das oliveiras de Aracuqüe! Esta espada pode ferir Cesarem! Melhor dizendo, pode até matá-lo!

— Esta é a única espada que pode feri-lo? — perguntou Pedro. — Sim! Tanto que Cesarem está atrás dela, pronto para destruí-la. — E onde ela está? — perguntou Pedro, novamente. — Não sabemos ao certo! Mas acredito que esteja com alguém que você

deva conhecer. — Quem? — Pouty! Lembro-me que ela arrancou o dedo mindinho de Cesarem

com aquela espada. — Nossa! Minha nossa! — exclamou Pedro, espantado. Nesta hora, ele

simplesmente lembrou da encomenda que a Senhora Pouty pediu para lhe entregar.

— O que houve? — perguntou Beyën sem entender. — Ela me pediu para te entregar uma coisa... Pedro correu até o seu quarto para pegar juntamente com seus pertences

o embrulho de Pouty. — Aqui está! Acredito que seja ela.

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— Você carregou consigo uma encomenda muito valiosa! — disse Beyën completamente surpreso. Ele olhava a todo momento para aquele embrulho que estava com as iniciais M.S. — Sim! É a espada de Aracuqüe!

— Esplêndida! Podemos abri-la! — perguntou Agäz. — Não seria uma boa ideia abri-la agora, senhor elanfö! É um objeto extremamente valioso e sedutor! Pode cair em mãos erradas, ou até mesmo, ser roubada pela menor criatura de Cesarem! É melhor não arriscarmos!

— Eu quase perdi a espada! — disse Pedro, espantado. — Melhor dizendo, eu quase entreguei a ele de mão beijada. Não sabia que se tratava de um objeto tão valioso!

— Mas do que está falando? — perguntou o elfo, assustado. — Diante do medo e do desespero, estive no castelo de Rochendar para

pedir ajuda ao rei Arthur. Beyën irritou-se com ele. — Mas que loucura foi essa? Poderia ter colocou em perigo a nossa

missão! — O importante é que você está salvo agora e a “encomenda” está

entregue. Esta noite é motivo de alegria e não de ressentimentos. — disse Agäz, interrompendo a fúria do elfo.

De repente, uma jovem élfica se apresentou no centro do salão. Tinha longos cabelos negros e uma pele totalmente delicada e sensível. Aparentava estar na flor da idade. A beleza dessa jovem remexia o coração de qualquer homem a quem olhasse para ela. Pedro se encantou com seus olhos negros e com seus lábios avermelhados. Vestia um longo vestido verde debruado de branco e usava um colar de prata em volta do pescoço.

— Quero lhe apresentar Eleönora, minha única filha! — disse Beyën. — Muito prazer em conhecê-la, milady! — disse Pedro, fazendo uma

reverência. — Prefiro que não me chame de Milady! Esses títulos correspondem aos

homens e não aos elfos. — disse ela firmemente.

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— Me perdoe! Não quis ofendê-la. — Ora, não foi nenhuma ofensa! — interrompeu o elfo. — Minha filha

irá conosco para a nossa jornada! Embora já tenha pedido várias vezes para ela ficar, mas não adianta. Ela é igual à mãe! Uma cabeça dura!

— A propósito! Não chegamos a conhecer sua esposa! Poderíamos conhecê-la? — perguntou Agäz.

— Minha esposa faleceu há algum tempo — Me desculpe! Eu sinto muito... — Não precisa se desculpar! — disse ele. — Bom! Hoje é dia de festa e

alegria! Fiquem à vontade! Sintam-se como se estivessem em suas casas! Durante toda a noite, houve grandes momentos de festejos e de alegrias.

Os elfos gostavam mesmo de se divertir em plena luz do luar. Houve comida e bebida de melhor qualidade, todos dançavam e se alegravam diante da grande estrela que resplandecia os altos céus.

No dia seguinte, Pedro já conseguia perceber a correria dos elfos para o

segundo banquete. Vários pedaços alces estavam sendo assados juntamente com os carneiros encontrados nas montanhas de Yocän. Uma enorme bandeja de prata decorava aquele lugar, com frutas de diferentes tamanhos e sabores.

Agäz bebia sua cerveja caramelada. Ele andava de um lado para o outro, conversando com diferentes elfos que o conheciam.

— Outro banquete? — perguntou Pedro. — Sim! A festa de Iüan dura três noites seguidas. — afirmou Beyën. — Três noites? — espantou. — Sim! A estrela desaparece daqui a duas noites. É a nossa tradição. — Mas... — começou Pedro. A trombeta tocou naquele momento. Todos olhavam atentamente em

direção ao leste. Havia diversos cavalos que estavam seguindo em direção às terras de Tiän. Beyën se dirigiu até a porta principal de sua mansão e saudou os

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seus novos companheiros de viagem. Pedro observou que havia seis novos anões juntamente com o seu rei. Havia mais três centauros que cavalgavam na mesma velocidade que os anões.

— Meu caro Senhor, me chamo Thomas Soavalys, filho de Aboneu! — pronunciou um dos centauros. — Este é o meu filho Tebas... e este é Marcus, um grande guerreiro! Todos nós estamos aqui porque Ilumar nos escolheu.

— Bem-vindo a Tiän, meus nobres cavalheiros! — disse o elfo sorridente.

— E vocês, anões? Como se chamam? De onde vieram? — perguntou Pedro.

— Me chamo Alamuc Alahaison, o rei sobre a grande colina de Miricän! Dono de diversas cavernas de ouro e de pedras preciosas. Sou filho de Thor, descendente de Bengar. Estes aqui são os meus filhos Azac e Treno, já este é Alamac e Claüer, regentes de nossa companhia. E estes aqui são Petrus e Carvalho, anões de alta qualidade.

— Todos vocês irão partir conosco? — perguntou ele novamente. — Dos meus homens, somente Carvalho irá retornar! Ele voltará para

avisar aos outros de nossos planos e conduzir as minhas tropas para a grande batalha! — disse o anão, com um aspecto descontente. — E posso saber quem é o homem que me pergunta?

— Me chamo Pedro Smithy, filho de Hangar! — Que tolice de Ilumar confiar esta missão aos homens! São fáceis de

serem corrompidos, podem levar esta missão a um verdadeiro desastre. Será que você aguenta as pedras da perdição, filho de Hangar? — perguntou Petrus, injuriado.

— Como assim aguentar as pedras? — Vejo que o rei dos elfos ainda não contou para o nobre rapaz, a

respeito das pedras! — disse Alamuc. — E o que deveria saber sobre elas? — perguntou Pedro.

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— Escute aqui! Muitos homens colocaram esta missão a perder devido ao poder que estas pedras carregam. É um fardo muito pesado para um homem! Sua mente poderá ser corrompida e seu corpo ficará extremamente fadigado, devido às inúmeras torturas que elas provocam. Posso dizer a você, meu rapaz, é uma dor insuportável. — praguejou Petrus.

— Devemos confiar na escolha de Ilumar. — Beyën tinha a voz gelada. — Não se deve julgar ninguém antes mesmo de conhecê-lo! Não seja precipitado! A precipitação é a fraqueza dos homens, mas é a fortaleza do inimigo.

— Muito bem! Chega dessa conversa fiada! — disse Agäz, como se estivesse querendo finalizar o assunto.

Azac pareceu tão petulante como um anão podia ser. — Ora! Veja o que temos aqui! Um elanfö em nosso meio! Vejo que

Ilumar soube caprichar bem em suas escolhas. Pedro olhou seriamente. — Saiba, anão, que ele foi o único a não ser chamado por Yën! Houve um momento de silêncio. Os anões ficavam encarando Pedro a

todo momento. Alamuc novamente pronunciou. — Quando partiremos? — No nascer da aurora do quarto dia de Iüan! — disse o elfo. — Nossa! Daqui a dois dias! Está louco! Temos que partir logo. —

gritou Alamuc, juntamente com os outros anões. — Eu sinto muito! Não posso deixar de comemorar com o meu povo o

grande dia de Iüan. Pôde-se ouvir um pequeno cochicho entre os anões. Muitos não

concordaram com esta partida tão tardia que Beyën estava planejando. Depois de muita conversa, os anões acataram as decisões de Beyën.

Ao anoitecer, uma grande fogueira estava sendo preparada para a segunda noite de pura comemoração. O ar do grande salão de Tiän estava repleto de fumaça, com os cheiros de pães ázimos e carnes assadas. Suas paredes estavam

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adornadas de estandartes. Dourado, cinza, amarelo, azul: uma harpa gigante para os Moöncairn, um bode com longos chifres para os Alahaison, um cavalo coroado para os Soavalys e dois cachimbos cruzados para os Calções. Estes eram o símbolo de suas casas. Pedro era o único que não tinha nenhum símbolo na parede, já que sua família não era tão importante assim para ter um brasão.

Contos e canções ressoaram naquela noite. A comida estava farta, diversas variedades de carnes estavam expostas, pronto para serem servidas. Treno, filho de Alamuc, presenciou um diferente ritual, em que os elfos em torno da fogueira começavam a entoar uma célebre canção.

Noite mais bela! Noite mais linda!

Onde o céu é o alvo, da estrela mais bonita. Ilumar ressurgiu, Ilumar já nasceu!

Doce brilho do luar, resplandece o seu cantar.

Houve trevas no passado, há luz em seu presente; Vida nova aqui surgiu, vencedor da grande serpente.

Noite bela de Iüan, nasceu o salvador! Brilha nos céus uma estrela, cheia de esplendor.

Brigastes com a antiga Serpente, mas fostes achados por uma linda mulher;

Cuidados vos deu, recuperando como quer Coroastes com brandura, seu gesto de mulher,

Dando a ela a armadura e a espada de Aracuqüe Honrando-a como se deve e protegendo-a como o quer.

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Brilha, brilha, ó grande estrela de Iüan! No céu apresentastes como estrela da manhã;

Brilha, brilha, ó grande estrela de Iüan! No céu apresentastes como estrela da manhã;

Assim eles riam e cantavam diante da fogueira. Beyën não perdeu a oportunidade de se expressar perante os convidados.

— Nesta noite! A sociedade da prata se reergue novamente, com o único intuito de destruir as pedras da perdição...

— Viva Ilumar! Viva Ilumar! — gritaram os outros elfos. — Por isso! — continuou Beyën. — Precisamos ser fortes para

novamente aguentar as torturas de Cesarem! Mas esta noite, vamos comemorar a vitória de Ilumar!!

Todos os elfos aplaudiam e cantavam novas canções. Pedro estava com alguns membros desta nova sociedade, conversando discretamente sobre o pronunciamento de Beyën.

— Reerguer? A sociedade da prata já existia? — Parece que a sociedade da Prata já existia há muitos anos! — disse

Agäz. — Muito antes de vocês nascerem. — disse Thomas, segurando consigo

um copo de madeira com cerveja caramelada. — A primeira sociedade da prata matou uma feiticeira poderosa! Ela era a guardiã destas pedras.

— Uma feiticeira poderosa? — perguntou Petrus. — Nunca ouvi falar a seu respeito!

— Quem é ela? — perguntou o elanfö. — Uma mulher sombria, cujo nome muitos elfos se negam a

pronunciar! — disse Thomas, tomando um gole de sua cerveja. — Seu nome era

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Kalista! Uma praga sobre esta terra. Lembro-me de que seu pai estava juntamente com o rei, quando destruiu esta feiticeira.

— Meu pai? — perguntou Pedro. — Tem muitas coisas que você não sabe, Pedro. Mas eu espero que um

dia você venha a descobrir! — disse Thomas. A noite estava apenas começando, festas e alegrias pairavam naquele

lugar. Os anões não eram muito de festas, mas adoravam comer aquelas carnes rechonchudas, com bastante molho de Crepän.

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pós uma longa conversa com os centauros, Pedro andou sozinho pelos jardins da mansão. Próximo àquela casa, enxergavam-se as grandes florestas que cercavam aquela

região. A única coisa que se podia observar era a escuridão que pairava sobre aqueles bosques.

De repente, sem que ninguém pudesse perceber, a grande estrela de Iüan iluminou um pequeno pedaço da floresta. Pedro ficou curioso. Ele se encheu de coragem e decidiu caminhar para dentro da floresta sombria.

Ao chegar no centro da floresta, ele se deparou com um pequeno pinheiro seco em chamas, com formosas labaredas brancas e transparentes. Os olhos de Pedro se ofuscaram perante o seu brilho. Houve uma voz que começou a se manifestar. Parecia que ela estava saindo daquelas chamas ardentes que envolviam todo o pinheiro.

— Pedro! Pedro! Pedro! — pronunciou aquela voz docilmente. — Ouço a sua voz, mas não o vejo! Quem é você? — Sou eu, Ilumar! Pedro ficou assustado. Não sabia o que fazer e muito menos o que falar

para o Senhor das Águias. Ele simplesmente se curvou perante o pinheiro em chamas.

— Não tenha medo de mim! Não farei nada de mal a você! Apenas gostaria de trocar algumas palavras.

— Estou ouvindo! — Fiquei muito aborrecido por você ter ido para as terras de Zatüron!

Seu lugar era em Tiän e não em Zatüron. Muitas pessoas foram mortas em Caën devido ao seu desespero.

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— Me desculpe, meu Senhor! — disse Pedro, se ajoelhando na grama molhada. — Eu estava com medo e fui até ele para me aliviar desta minha dor. Mas só encontrei a desgraça!

— Conheço seus sentimentos! Não o culpo por ter feito estas escolhas! Apenas gostaria de ajuda-lo com os seus medos. Procure-me quando sentir medo e eu estarei ao seu lado, pronto para protegê-lo.

Pedro curvou-se novamente. — Você precisa voltar para a casa de Beyën! Diga a ele que o próprio

Ilumar está pedindo para partirem logo! Quanto mais rápido melhor! — Sim! Eu o direi! — A propósito! É importante que vocês construam uma enorme jaula

com grades de ferro. Vocês irão precisar dela nesta viagem. Quanto mais rápido estas pedras forem destruídas, mais rápido será a libertação deste mundo. Vá e não demore a regressar.

A voz de Ilumar estava desaparecendo, como se ele estivesse bem longe daquelas redondezas. Ouvia-se vagamente o seu pronunciar.

Pedro ficou fascinado por aquela experiência, jamais poderia imaginar que encontraria com o Senhor das Águias. Ao olhar para o pinheiro, percebeu que ele não estava mais seco pelo inverno. Suas folhas estavam verdes e suas raízes estavam mais espessas que de costume.

Pedro correu em direção a casa de Beyën para anunciar a mensagem de Ilumar. Enquanto caminhava, ouvia-se uma voz que o chamava vagamente pela floresta.

— Pedrooo! Pedrooo! Pedro pensou que era novamente Ilumar que o estava chamando. — Estou aqui! Uma fumaça negra aproximou-se de suas costas. Pedro ficou paralisado

naquele momento, ouvindo atentamente aquela voz roca que saía dos galhos de uma árvore.

— Conheço seus segredos! Conheço o seu coração! Sei que não é capaz de lutar.

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— Quem está aí? — perguntou Pedro, segurando fortemente a sua espada.

— Uma voz que grita na sua consciência! Pedro sentiu que estava sendo observado por alguém, parecia que a

floresta estava encarando-o. De repente, se deparou com uma cobra enrolada sobre um tronco de uma árvore. Seus olhos avermelhados o encaravam. Pareciam duas brasas de fogo ardente.

A floresta estava escura, somente as estrelas iluminavam aquele lugar sombrio. Degälion novamente pronunciou algumas palavras, parecia que a morte estava ao seu lado.

— Conheço os seus medos! Conheço a sua história! Sei que é um covarde.

Diversas aranhas começaram a sair daquela árvore. Pareciam que elas estavam agitadas, completamente desnorteadas. Pedro simplesmente caiu de costas em direção às raízes das árvores.

— Como é fraco! Você teme a menor criatura deste mundo! Imagina quando encontrar com as minhas criaturas?

Pedro ouviu uma voz longínqua que gritava fortemente seu nome. Pelo timbre daquela voz, parecia ser a de Agäz, que o procurava pela floresta.

— Desista, Pedro! Você não é capaz de suportar as minhas pedras. Seu coração logo se corromperá no simples ato de enxergar o brilho delas. Você é um fraco! Você é um tolo! Você é um fraco!

Havia uma criatura escondida entre as árvores. Sua túnica era negra e seus cabelos eram acinzentados. Ela estava encostada no tronco de uma árvore. Parecia que o estava encarando com seus olhos diabólicos. Pedro ficou reparando aquela criatura, mas logo a perdeu de vista, principalmente quando sentiu a mão de Agäz tocar levemente seus ombros.

— Pedro! Venha, há coisas horríveis nesta floresta! Ao olhar em direção da mesma árvore em que estava Degälion, percebeu

que não havia mais ninguém.

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Assustado, continuou o seu caminho sem pronunciar uma palavra. Agäz ficou curioso perante o seu profundo silêncio. Nada se ouvia até chegar aos jardins da mansão.

Ao chegar no local da festa, sentou-se em uma cadeira e pediu para que Agäz chamasse o elfo para transmitir a mensagem. Podia-se observar o medo em seus olhos. A presença de Degälion e de Cesarem fez com que ele se assustasse.

Ao aproximar-se de Pedro, o elfo percebeu que ele estava pálido. — O que houve? — Estive andando na floresta, e encontrei-me com Ilumar! — O quê? Mas como? — perguntou Beyën, sem entender. — Esteve com o grande senhor dos bosques? — perguntou Agäz. — Sim! Ele me disse que devemos partir o mais rápido possível! Não

podemos perder mais tempo! — Mas onde o encontrou? — perguntou Beyën. — Ele apareceu em forma de labaredas sobre uma árvore seca!

Precisamos partir Beyën, confie em mim! — Claro que confio! Mas por que você está tão assustado assim? Ilumar

lhe causou medo? — Uma outra coisa apareceu para mim naquela floresta! Eu vi a mesma

cobra que matou minha filha. — Ele está nas redondezas! Precisamos partir logo. — suplicou Agäz. O rosto de Beyën mudou completamente. Ele simplesmente parou com

a festa e pronunciou algumas palavras para os seus convidados. — Meus caros amigos, a festa terá que ser interrompida! A sociedade da

prata terá que partir logo destas terras! Cesarem ronda estas redondezas. Ele sabe onde nos encontrar. Amanhã à tarde, partiremos em rumo a nossa jornada.

Todos ouviram atenciosamente e começaram a se preparar. Primeiramente, foram os elfos que se organizavam os seus suplementos, preparando alguns pães ázimos e folhas de hortelã para ajudar na digestão. Já os anões, como não gostavam muito da comida élfica, preparavam alguns pães recheados com carnes.

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Na manhã seguinte, antes mesmo de partirem, reuniram-se em um grande salão, para determinar a rota que deveriam tomar. Os anões estavam ansiosos, embora Carvalho estivesse mais atento nas orientações de seu rei.

Os elfos aguardavam a misteriosa charada de Ilumar, mas se surpreenderam ao se deparar com aquele pequeno pedaço de pergaminho, totalmente amarelado e envelhecido. Ao abrirem o pergaminho, ficaram apavorados, discutindo entre si.

— Não há nada escrito aqui! — pronunciou Beyën, segurando o pergaminho.

— Mas como? Não temos uma direção? — perguntou o elanfö. — Como partiremos agora? Não tem como continuar desta maneira! —

disse Azac, juntamente com os outros anões. — Calma! Calma! Isto já aconteceu. — disse Beyën, olhando para os

anões. — Lembro-me das primeiras charadas da antiga sociedade da prata! Eu já imaginava que Ilumar não iria facilitar.

— E qual é a sua sugestão, senhor elfo? — perguntou Alamuc. — Sugiro, senhor anão, que preste mais atenção no pergaminho que

estou segurando! — disse Beyën, mostrando para o anão o pedaço de pergaminho. — Este material foi feito nas altas montanhas de Zaräcuk.

— E o que isso significa? — perguntou Agäz. — Significa que nesta montanha ressurge o primeiro brilho do luar! Ela

ilumina por excelência aquelas montanhas para depois iluminar toda a nossa região.

— Sim! Sim! Já ouvi disser que é nestas montanhas que a lua adormece enquanto o sol resplandece. Mas o que tem a ver tudo isso? — perguntou Thomas.

— Precisamos levar este pedaço de pergaminho até estas montanhas, e através do brilho da lua de sangue, conseguiremos enxergar esta charada!

— Lua de sangue? — perguntou Pedro.

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— Sim! Após sete dias da festa de Iüan, nas montanhas de Zaräcuk, a lua se torna avermelhada. E através dela conseguiremos enxergar o que está escrito neste pergaminho. — disse o elfo.

— Mas então precisamos partir logo! — exclamou Agäz. — O mais rápido possível! Afinal, a lua de sangue se manifesta apenas

em uma noite. E não queremos perder este momento. — disse Beyën. Todos começaram a se levantar e a dialogar ao mesmo tempo. — Antes de partir, temos outra coisa para resolver! — disse Pedro,

fazendo com que sua voz ressoasse sobre o salão. — O que temos para resolver, filho de Hangar? — perguntou Turän. — Ilumar me pediu mais uma coisa! Precisamos levar conosco uma

jaula. — Uma jaula? Mas por quê? — perguntou Eleönora. — Não sei o motivo. Apenas me disse que precisamos levar uma jaula

com grades de ferro. — Se Ilumar pediu, devemos obedecer a ele! — afirmou Beyën. — Mas há um grande problema! — disse Alamuc. — Partiremos hoje,

como faremos para construir uma jaula em poucas horas? — Sei que vocês são ágeis com a madeira e o ferro. Acredito que não terá

nenhum problema em construir esta cela, não é mesmo, senhor anão? Se precisarem de ajuda, os elfos irão ajudar. — disse Beyën.

Alamac e os outros anões começaram a trabalhar. Todos ajudaram na construção desta jaula, inclusive Azac, que sabia manusear suas ferramentas. Fizeram-na rapidamente no formato de uma carruagem, facilitando para o seu transporte. Muitos não entenderam o motivo, mas, mesmo assim, estavam dispostos a obedecer às ordens de Ilumar.

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rthur comandava o exército de Cesarem. Todas aquelas criaturas estavam atentas a cumprir as ordens de seu rei. Havia um imenso exército de zoörgs que estavam sedentos de sangue,

todos gritavam ao mesmo tempo, exalando medo aos homens que moravam próximos daquelas redondezas. Arthur estava em uma das torres do castelo, juntamente com Wiliam e alguns de seus soldados.

— Meus caros amigos! A sociedade da prata está prestes a partir para capturar as pedras de nosso mestre! Todos eles se consideram dignos de tocar nelas, mas isso não pode acontecer! — gritou Arthur, ouvindo atentamente os gritos assustadores das diversas criaturas. — Por isso, decreto aqui, perante todos vocês, a morte de todos os aguianos. Dei a cada um desses vermes a oportunidade de se retratarem! Mas eles não me ouviram, preferiram lutar a se remediar. Tempos de guerra cairão sobre Aldiroön e saibam que não irei me descansar até ver a cabeça de todos os membros da sociedade da prata pregadas em estacas de ferro sobre os portões da cidadela. Seus corpos serão queimados como um ato de misericórdia.

Pôde-se ouvir um grande clamor. Todos estavam gritando fortemente por Cesarem e pelo seu poder magnânimo.

O céu estava fechado, nuvens carregadas cobriram aquele lugar, facilitando a vida dos vampiros e dos Trolls. Ambos são incompatíveis a luz solar. Não eram somente as criaturas de Cesarem que estavam marchando rumo à guerra. Havia soldados aliados, que estavam seguindo fielmente as ordens de seu rei.

Cesarem apareceu como uma fumaça negra próximo aos soldados do rei. Todos os vampiros que estavam naquelas redondezas, compareceram perante seu mestre. Jack estava na frente, conduzindo todas aquelas criaturas que se curvavam na presença de Cesarem.

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— Escutem bem, todos vocês! Toda a sociedade neste momento está partindo para as montanhas de Zaräcuk. Não consegui descobrir o porquê, mas algo me diz que uma de minhas pedras está naquele lugar! Por isso, voem o mais rápido possível para aquelas montanhas e matem todos! Se eles forem para outra direção, eu os perderei de vista! Algumas aranhas que moram no bosque adormecido, já estão sabendo da invasão! Mas não confio muito nelas, são criaturas extremamente ignorantes e tolas. Poderão falhar na captura daqueles seres malditos! — disse Cesarem, completamente enfurecido. — Dou a vocês sangue élfico, sei que muitos gostam de saborear o doce gosto daquele sangue! Jack estará no comando. Obedecendo a ele estarão obedecendo a mim! Agora vão e me tragam a cabeça deles!

As tropas de Cesarem marchavam para as diferentes regiões. Seu exército invadia diversas cidades, matando a todos os que atreviam a entrar em seu caminho. Diversos homens lutavam para proteger suas famílias que eram atormentadas por aquelas criaturas. Houve momentos em que suas cabeças rolavam em direção ao fogo para serem queimadas. Os zoörgs não tinham piedade dos homens, gostavam de decapitá-los após os períodos de batalhas. Diversas crianças morreram naquela noite sombria. Os vampiros não perdiam tempo em sugar o sangue daqueles inocentes.

Cesarem continuava em Zatüron, juntamente com Arthur. Ele caminhava sobre os belos carpetes que enfeitavam o salão principal. Ao se aproximar do trono real (conhecido como o trono da justiça), Cesarem fixou um olhar demoníaco sobre o rei. Arthur ficou paralisado. Ele simplesmente ficou escutando as poucas palavras que o mago emitia.

— Vejo que você é leal ao seu mestre! Você prometeu e cumpriu aquilo que conversamos.

— Meus homens estão marchando conforme as suas ordens, milorde! — Eu sei! — disse Cesarem com um tom agrosseirado. — Saiba de uma

coisa, se você faltar com sua palavra, meu juramento será desfeito. — Não, milorde! — Você se daria muito bem como um vampiro, sabia disso?

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— Milorde! Tenha piedade! Eu não quero ser um vampiro. — disse Arthur, ajoelhado.

— Então continue sendo leal a mim! Você não irá se arrepender! Realizarei todos os seus sonhos e todos os seus desejos se continuar a me servir. Todo o mundo de Aldiroön será seu!

— Será feita a sua vontade, milorde! — Eu espero que sim! — disse Cesarem em um tom penetrante. — Seu

exército irá cumprir as minhas ordens conforme o combinado. — Todos eles lhe obedecerão, Milorde! — disse Arthur, beijando a mão

de Cesarem. — Assim espero! Senão o pior irá acontecer ao seu reinado! Depois dessa ameaça, Cesarem partiu rapidamente para o sul,

escondendo-se por detrás das nuvens, em forma de uma fumaça negra.

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stavam todos prontos para partir. A sociedade da prata estava finalmente formada com inúmeros guerreiros, alguns valentes e confiantes, mas outros temerosos perante a fúria de Cesarem. A

sociedade continha quatro elfos (Beyën, Turän, Eleönora e Mirgän); seis dos anões (Alamuc, Azac, Alamac, Claüer, Treno e Petrus). Carvalho tinha regressado para as terras dos anões, orientando todo o exército de Alamuc.

Havia também dois centauros (Thomas e Tebas) e o jovem elanfö juntamente com Pedro. Todos eles partiram para as montanhas de Zaräcuk, próximo à floresta adormecida. Essas montanhas não ficavam muito longe de Tiän. Beyën não gostava muito de frequentar aquelas montanhas, era muito perigoso passar entre os bosques. Mas esse era o único caminho para se chegar ao topo de Zaräcuk.

Marcus retornava para as suas terras, levando uma mensagem a todos os centauros que o aguardavam.

Após sete dias de viagem, a floresta começava a surgir. Todos cavalgavam lentamente. Era completamente impossível acelerar o seu ritmo, já que os pôneis dos anões não eram tão bons assim para uma andaria. Quando estavam próximos à entrada da floresta, Beyën parou seus companheiros para avisá-los do perigo que estava por vir.

— É preciso que vocês saibam de algumas coisas, antes de entrarmos naquela floresta.

— O que um anão precisa saber sobre este lugar? — perguntou Azac. — Esta floresta é perigosa! Sobre o chão, encontra-se uma pequena

fumaça, que ao ser inalada pode nos colocar em um sono profundo. — E como faremos para passar? Olha o nosso tamanho! — gritou

Petrus, insatisfeito.

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— Eu sei do tamanho de vocês! — afirmou Beyën, franzindo as sobrancelhas. — Deixem amarrados seus pôneis. Daqui para a frente, vocês anões e o jovem elanfö virá em nossos cavalos.

Ao amarrarem seus pôneis, alguns subiram sobre os cavalos dos elfos e outros nas costas dos centauros. Agäz escolheu estar com Pedro, relembrando os primeiros dias em que o encontrou.

— Fiquem atentos! Dizem que algumas criaturas de Cesarem moram nestas redondezas. — disse Beyën. — Quero que todos estejam com suas espadas em mãos e ataquem qualquer criatura que se mover naquela floresta. E mais uma coisa! Silêncio total! Vamos ver se passamos por aquele bosque sem sermos notados.

Estando eles na entrada do bosque, perceberam uma fumaça branca que pairava sob os cascos dos cavalos. Todos ficaram temerosos. Muitos tampavam o seu nariz para não inalar aquela fumaça áspera, que deslizava sobre os capins. Demorou algumas horas para se chegar próximo às montanhas de Zaräcuk.

Todos os homens e elfos desceram de seus cavalos, amarrando-os próximos a uma grande árvore de seringueira. Já Agäz e os anões, foram carregados por alguns dos centauros. Todos eles continuaram a subir aquele extenso despenhadeiro de pedras pontiagudas e perigosas. Em cada canto em que subiam, encontravam diversas dificuldades, principalmente as grandes rochas com que se deparavam pelo caminho.

Ao chegarem no topo da montanha, depararam com um longínquo horizonte. Todos ficaram em silêncio por alguns minutos.

No interior da montanha, encontraram diversas cachoeiras que exalavam um odor adocicado. Em torno da montanha, havia flores de diferentes formas e tamanhos. Agäz ficou impressionado com as inúmeras árvores que estavam próximas da cachoeira. Havia uma que estava plantado entre as rochas, recebendo a força das águas que caia da cachoeira. Nada acontecia com ela, embora muitos pensaram que ela não poderia durar muito tempo, já que a sua madeira estava apodrecendo.

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Estava tudo pronto para o descobrimento da charada de Ilumar, apenas bastava que a lua de sangue surgisse sobre a montanha de Zaräcuk. Beyën encontrou próximo de uma caverna uma mesa de pedra feita dos mais preciosos cristais, pertencentes aos antigos elfos que moravam naquelas redondezas. Parecia que aquela mesa brilhava devido à forte luz que refletia do luar.

— Logo a lua ficará vermelha! Vamos aguardar. — disse Beyën, enquanto colocava o pergaminho sobre a mesa.

Todos ficavam olhando para o céu, aguardando o grande momento. Não demorou muito tempo para se presenciar a metamorfose do luar. Parecia que uma grande camada avermelhada estava cobrindo-a, perdendo completamente o seu brilho angelical.

As montanhas ficaram escuras, não se podia enxergar nitidamente o horizonte que o envolvia. Apenas a mesa de pedra brilhava constantemente. Beyën enxergou nitidamente as pequenas letras que estavam ocultas em seu pergaminho.

Todas as mães têm. Sem ele não tem perdão.

Com ele se pronuncia João, mas sem ele não tem como dizer anão.

Some no outono e aparece no verão. De dia e de noite, sempre estão no coração.

Todos ficaram assustados com a charada, não conseguiam imaginar qual seria a sua resposta. Pedro pediu para que Beyën relesse várias vezes, até que pudessem memorizar.

— Nossa! Mas o que será? — perguntou Agäz. — Não sei, mas algo tem a ver com nossas terras. — afirmou Eleönora.

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— Com certeza! Mas pode estar relacionado a alguma montanha, cidade ou caverna. Não sabemos ao certo! — exclamou Beyën, olhando para o pergaminho. — O que precisamos é da resposta, assim conseguiremos decifrar.

Agäz ficou por diversas vezes quebrando a cabeça. Ele tentava se lembrar de algumas charadas contadas pelo seu pai, mas nada vinha a sua mente a respeito desta. Parecia estar bem mais complicada do que de costume. Antigamente, ele se divertia com estas charadas, mas agora tudo era diferente. Se ele transmitisse alguma resposta errada, poderia atrasar o objetivo da jornada.

Todos ficaram pensando na resposta desse grande enigma. Depois de um certo tempo, Agäz deu um grande salto adiante. Parecia que a resposta havia brotado misteriosamente em sua cabeça.

— É claro, como fui tolo! — O que houve, Agäz? — perguntou Eleönora. — A resposta! Eu acho que já sei qual é... — Então nos diga! — exclamou Beyën, interrompendo-o. — O Til, esta é a resposta! — O Til? Que raio de resposta é esta? — resmungou Treno. — Não sei se tem algum significado, mas esta é a resposta! — disse

Agäz, com uma expressão aliviada. — Tem todo o significado! — exclamou Eleönora, eufórica. — Sim! Tem, sim! — disse Beyën, com um semblante harmonioso. —

Meus caros amigos! A primeira pedra da perdição se encontra nas terras de Tiüan, próximas a Tiän.

— Mas estas terras devem ser gigantescas, como iremos encontrá-la? — perguntou Pedro.

— Ilumar nos proporcionou uma resposta, mas com dois lugares fáceis de se localizar. A primeira delas é as terras de Tiüan, sendo ela de fato uma região que não tenho o que reclamar. Mas juntamente com esta resposta, temos um outro lugar que se encontra naquelas terras! — respondeu o elfo.

— As cavernas negras de Tiurän! — pronunciou Mirgän.

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— Isso mesmo, meu filho! Só há uma caverna com estas iniciais. Um lugar perfeito para procurar a primeira pedra. Precisamos partir ainda esta noite.

— Está louco! Acabamos de chegar. — exclamou Alamuc, juntamente com outros anões.

— Estas terras não são confiáveis! Não podemos perder mais tempo! Precisamos partir o mais rápido possível. — afirmou Beyën com voz zangada.

— Está certo, partiremos ainda esta noite! — disse Agäz. Os anões estavam completamente irritados com Agäz. Parecia que ele

estava dando ordens inapropriadas. Mas, para não criar confusões, decidiram acatar as ordens de Beyën.

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o descerem o despenhadeiro, encontraram novas dificuldades. Havia momentos em que a terra estava totalmente volumosa e úmida devido a neblina que cobria os seus capins.

Ao chegarem próximo dos cavalos, Beyën novamente deu as contínuas ordens, conforme foram orientados na entrada do bosque. Cavalgaram lentamente fazendo o mínimo de barulho possível para não serem percebidos ou notados por qualquer criatura que estivesse naquela floresta. De repente, Claüer deu um forte espirro, assustando a todos que estavam a sua volta.

— Quieto! Não faça barulho. — disse Tebas. — O que eu posso fazer? Sou alérgico a crina de centauros. — disse

Claüer, limpando as narinas em um pano amarelado. Ouviram-se, então, diversas pegadas vindo em sua direção. Não se sabia

ao certo o que era, mas todos ficaram temerosos com aquele barulho infernal. — Corram! Corram! — gritou Beyën, segurando fortemente as rédeas

de seu cavalo. Todos começaram a correr em uma mesma direção, querendo sair

rapidamente daquela floresta. Enquanto estavam próximos à saída, depararam-se com uma enorme aranha que bloqueava o seu caminho.

Beyën logo tirou a espada de sua bainha para matá-la, mas havia outras delas que estavam sobre as árvores. Pedro estava completamente aterrorizado ao presenciar aquela cena, nunca passou em sua cabeça que existiriam aranhas daquele tamanho.

— Tomem cuidado para não inalarem a fumaça! Desçam de seus cavalos e lutem! — gritou Beyën perante os seus companheiros.

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Com as ordens do rei élfico, todos tiraram suas espadas da bainha e começaram a atacar suas presas. Os anões não puderam descer dos cavalos, devido à fumaça branca que estava sobre chão.

Pedro estava temeroso com aquelas criaturas, a maioria das vezes houve mais fuga do que matança.

Ao perceber que Agäz havia sido capturado por uma aranha, Pedro se encheu de coragem e subiu rapidamente na árvore para salvar o seu amigo. Foi difícil chegar no topo, haviam muitas teias que atrapalhavam o seu percurso.

Pedro se deparou com a aranha que o tinha capturado. Engolindo o seu medo, ele arrancou sua espada e apunhalou sobre o peito daquele ser assustador. A aranha começou a cair daquela imensa árvore, levando consigo alguns galhos que se quebraram com a força de sua queda.

Agäz estava desacordado devido à picada da aranha. Pedro retirou aquelas teias que o envolviam e começou a dar leves tapas no rosto de Agäz, tentando acordá-lo daquele pesadelo.

— Estou aqui, meu amigo, nada há de acontecer com você! Eu prometo! Pedro desceu lentamente aquelas árvores, segurando Agäz em suas

costas. Diversas aranhas foram mortas, todas elas estavam jogadas sobre aquele

gramado verde. Já outras desapareceram entre a fumaça, destruindo tudo o que encontravam pela frente.

— Subam em seus cavalos, vamos sair daqui antes que apareçam novas companhias. — gritou Beyën enquanto guardava a sua espada.

Ao saírem do bosque adormecido, puderam encontrar os pôneis que estavam amarrados. Um silêncio repentino pairou sobre aquele lugar, apenas podia-se ouvir um leve sussurro das árvores que balançavam rumo ao vento.

Eleönora olhou rapidamente aquele céu cinzento e observou que haviam diversos vampiros que sobrevoavam a entrada do bosque.

— Vampirooo! — gritou Eleönora. — Rápido! Todos com suas espadas na mão. — gritou Beyën, retirando

a espada da bainha.

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Diversos vampiros começaram a vir em sua direção, atacando toda a sociedade da prata. Diversas flechas foram disparadas. Algumas delas acertavam a garganta dos vampiros, outras delas, acertavam os seus olhos.

Turän acertava o coração deles com uma espadada. O sangue dos vampiros espirrava sobre a sua face, deixando-o extasiado diante das inúmeras mortes que aconteciam naquela noite. Alguns dos anões decapitavam com seus machados. Outros arrancavam seu coração, como um boi em pleno abate. Azac arrancou sem piedade o coração de um deles, enfiando a sua espada de aço.

Jack pedia para os vampiros recuarem, mas foi surpreendido por uma das flechas de Eleönora. O vampiro começou a cair, já que uma de suas asas foram atingidas.

Jack não foi o principal alvo de Eleönora. Havia um outro vampiro que estava juntamente com ele, sobrevoando o norte. Ele se chamava Tony e foi atingido também por uma flecha negra. Estava caído próximo a uma árvore que dava de entrada ao bosque. Ele era alto, de cabelos castanhos e com uma postura completamente ereta e expansiva. Tinha cento e dez anos, mas com uma aparência de vinte e cinco. Suas orelhas eram pontiagudas, seu nariz era um pouco empinado e seus lábios eram carnudos e avermelhados. Usava roupas de seda, tipicamente costuradas pelos elfos.

Diversos vampiros conseguiram escapar. Muitos tentaram ajudar Jack, mas os anões estavam próximos a ele, segurando os seus machados afiados. Eleönora aproximou-se da criatura, olhando atentamente os seus traços masculinos encobertos por uma máscara monstruosa. Ao retirar uma de suas flechas, mirou diretamente no coração do vampiro. Pedro gritou antes mesmo de ela atirar, correndo rapidamente para a sua direção.

— Não faça isso! Chega de morte por esta noite. — Precisamos matá-lo! — gritou Eleönora mirando a sua flecha. — Não! Não precisamos. Ele pode nos orientar e nos contar sobre os

planos de Cesarem.

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— Guarde as flechas, minha filha! Pedro está coberto de razão! Chega de mortes por hoje. — disse Beyën.

— Mas o que faremos com ele e com o outro que caiu? — perguntou Turän cheio de cólera.

— Vamos prendê-los! Talvez essa jaula foi feita para prender estes assassinos. — disse Pedro.

Beyën, concordando com esta ideia, pediu para que seus filhos levassem os novos prisioneiros para a cela, trancafiando-os para que não pudessem fugir. Turän estava indignado com esta ideia, queria presenciar a morte daqueles seres que eram sinônimos de indignação.

— Vamos ficar aqui esta noite! — exclamou Beyën se sentando sobre as rochas negras. — Não estamos em condições de partir! Acredito que todos nós estamos exaustos devido à luta desta noite! Amontem uma fogueira, porque a noite será bem fria.

Beyën deu as ordens a Turän e a Mirgän, para recolherem alguns pedaços de lenha que se encontravam na entrada do bosque. Ambos partiram para encontrar alguns gravetos secos que estavam além da floresta.

Ao encontrar um grande pedaço de lenha, Turän desafiou o seu irmão, pedindo a ele que cortasse aquela lenha envelhecida. Mirgän não conseguia pegar no machado, parecia que aquele objeto escorregava facilmente de suas mãos.

— Como você é fraco! Não sabe sequer manusear um machado? Como você vai lutar contra seus inimigos desta maneira? Me responde? — gritou Turän com um olhar severo.

— Deixe-me em paz! Você sabe muito bem que não sei manusear uma espada, muito menos um machado.

— Para quem você puxou? Hem? Seu fracote! — gritou Turän com uma voz seca. — Nenhum descendente de nossa família foi desta maneira! Nem a nossa mãe era tão fraca assim como você! Você parece mais uma andorinha.

— Por que você é assim? Por que você gosta de humilhar as pessoas desta maneira? — perguntou Mirgän, soltando o machado.

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— Eu que lhe pergunto, por que você está aqui? Não sabe lutar! Não sabe cortar! Não sabe brigar! Devia ter ficado em casa com sua esposa e com seu filho. Esta missão é para homens corajosos como eu, e não para fracotes como você!

— Basta! — gritou Mirgän, dando um forte empurrão em seu irmão. — Não estou aqui para ouvir seus desaforos, estou aqui para recolher a lenha que nosso pai nos pediu. Se você não acredita em mim, não posso fazer nada, meu irmão. Fique aí com sua força inata e me deixe em paz!

Mirgän afastou-se rapidamente de seu irmão. Ao retornar, encontrou-se com Eleönora que estava recolhendo alguns gravetos para a fogueira. Mirgän pediu para que ela fosse ajudar Turän com a lenha que eles haviam encontrado.

Beyën percebeu que havia algo de errado com o seu filho. Os outros membros perceberam a mesma coisa, mas decidiram não se intrometer. Ao acenderem a fogueira, Beyën se aproximou de Mirgän, sentando-se ao lado de seu filho.

— O que houve? — Nada não, meu pai! Estou apenas aqui lembrando do meu filho e de

minha esposa que deixei em Tiän. — Sente falta deles? — perguntou Beyën. — Muita! — Aconteceu alguma coisa que você não quer me contar! Eu o conheço

e sei que este não é o motivo de você estar assim! Mirgän ficou calado por alguns momentos, observando as labaredas da

fogueira. — O senhor acha que me pareço com o senhor, meu pai? — perguntou

Mirgän. — Mas é claro que sim! Por que me pergunta? — Turän me falou algumas coisas de que eu não gostei.

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— Você e seu irmão brigando novamente! Desde pequenos vocês só sabem brigar! — disse Beyën. — Não ligue para o que seu irmão fala. Você sabe como ele é.

— Meu pai! Acredita mesmo que sou um verdadeiro guerreiro? Beyën deu uma leve risada sem graça. — Mas é claro que você é! Sei que você é um fracasso em manusear uma

espada, mas existem outras maneiras de vencer a vida. Aprenda uma coisa, meu filho! Um verdadeiro guerreiro não é apenas um lutador que com sua espada derruba e massacra seus inimigos. Mas é aquele que no dia-a-dia consegue lutar, sendo fiel nas pequenas coisas. Este sim meu filho, merece todas as honras cabíveis que você possa imaginar.

— Mas, meu pai! Não consigo compreender o porquê de eu estar aqui! Não sou bom com as espadas, e muito menos com a força bruta!

— Tem razão! Você não é bom com as espadas! Mas olhe em sua volta, cada um tem aquilo que é de mais precioso a nos oferecer. E você sempre puxou a mim! Não nas guerras e nas matanças, mas sim, na simplicidade de buscar a cada dia este bem mais precioso. — disse Beyën. — Não fique assim, eu acredito em você e espero que você faça o mesmo!

Mirgän voltou a sorrir novamente. Parecia que as palavras de seu pai o haviam encorajado novamente.

Enquanto isso, a lua brilhava incessantemente sobre o norte. Parecia que ela estava tão próxima que se podia enxerga-la a várias léguas de distância, avistando qualquer criatura que aparecesse de surpresa. Pedro acordou perante a madrugada. Ele ouvia barulhos de passos que vinham da entrada da floresta, mas não conseguiu enxergar nitidamente devido às altas árvores que a cobriram.

Havia um duende que estava escondido por detrás das sequoias. Ele estava se preparando para atirar uma de suas flechas envenenadas. Seu arco não era como a dos elfos. Ele era fino, parecia uma longa vara de madeira.

Enquanto o duende colocava a sua flecha envenenada dentro da vara, um forte barulho surgiu naquelas regiões. Parecia ser de algum animal faminto que estava à procura de suas presas.

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De repente, aquela criatura apareceu diante do duende. Era um animal grande e violento, com uma pelagem branca e diversas listras negras que enfeitavam o seu corpo. O duende se assustou com a presença do tigre de bengala e logo atirou uma de suas flechas em direção ao animal. O veneno penetrou-lhe o corpo e logo ele caiu sobre a relva molhada.

Ao passar alguns minutos, misteriosamente o tigre se levantou. O duende ficou sem entender o que havia acontecido, já que suas flechas são infalíveis ao encanto. O tigre novamente correu em sua direção. O duende tentava a todo momento lutar contra aquela criatura, mas não conseguia suportar a sua força e o seu poder. Ele foi rasgado pelos dentes do felino, seu peito foi aberto e seu coração foi cruelmente mastigado.

Pedro ficou assustado, não sabia o que estava acontecendo na entrada do bosque. Pensou de se aproximar para ver o que estava acontecendo, mas decidiu ficar próximo de seus companheiros. Logo o silêncio tomou conta daquele lugar, os barulhos tinham cessado e uma leve brisa veio tocar os seus cabelos. Nesta hora, Pedro adormeceu tranquilamente, sem se preocupar com a fera que o cercava.

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iversos vampiros conseguiram escapar das flechas pontiagudas de Eleönora. Todos eles sobrevoavam apressadamente em direção às cavernas de Algün, para relatar os acontecimentos e as

perdas ocorridas durante aquela noite. A maioria dos vampiros estavam ansiosos em chegar logo nas cavernas negras, com o medo de se surpreenderem com a luz ofuscante do amanhecer.

Ao chegarem próximos da entrada da caverna, depararam-se com Cesarem segurando uma pequena caixa de madeira, com alguns detalhes em sua volta. Todas as criaturas malignas, principalmente os vampiros, sabiam do conteúdo daquela caixa, mas preferiram esquivar-se para não deixarem o seu senhor ainda mais irritado.

Cesarem ficou assustado com a presença daquelas criaturas, principalmente quando se deparou com a ausência de Jack e de outros de seus vampiros.

— O que vocês fazem aqui? Eu não pedi para atacarem a sociedade? — perguntou Cesarem, guardando sua caixa valiosa.

— Nós os perdemos, milorde! — disse Patrick, completamente amedrontado. — Fomos emboscados por eles!

— Eu não quero desculpas! Quero a cabeça de todos os membros daquela maldita sociedade. — gritou Cesarem.

— Estávamos em menor número! — disse Sônia, tentando amenizar a ira de seu mestre. — Não havia nada que pudéssemos fazer!

— Escapei com vida, milorde, por muito pouco estaria morto. — disse Patrick, com a cabeça curvada para baixo.

— Seria melhor que tivesse pago com ela! Seu imprestável! — disse Cesarem, completamente enfurecido. — E Jack, onde está?

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— Jack foi capturado por eles, milorde! Perdemos ele de vista também! — respondeu Patrick, completamente amedrontado.

— E onde eles estão agora? — Nós os deixamos na entrada da floresta adormecida! — respondeu

Sônia. — E as aranhas, não atacaram? — perguntou Cesarem se apoiando em

seu cajado. — Parece que sim, milorde, mas muitas foram mortas! — respondeu

Patrick. — Imprestáveis! Aranhas caranguejeiras, quem se importa com elas?

São fracas para enfrentar qualquer exército. — disse o mago enfurecido, sentando-se em seu trono de pedra. — Será que o serviço ficará todo para mim? Eu que terei que ir à entrada do bosque adormecido para realizar a tarefa que era para vocês cumprirem? Logo a sociedade aparecerá novamente. Espalhem a notícia! Quem me trouxer a cabeça deles, ganhará uma recompensa.

— Que tipo de recompensa, milorde? — perguntou Patrick. — Darei qualquer coisa que a pessoa desejar! — disse Cesarem. —

Agora, sumam da minha frente e façam algo de útil. Pôde-se presenciar a fúria de Cesarem, todos estavam medrosos perante

o furor de seu mestre, fugindo desesperadamente para a direção leste onde se encontravam algumas tropas que marchavam para a guerra.

Estando sozinho com o seu cajado, transfigurou-se novamente em uma fumaça negra e partiu para o norte.

Na manhã seguinte, no nascer da aurora, a sociedade da prata estava se

organizando para continuar sua viagem. Mas antes de partirem, Eleönora ficou responsável por alimentar as tais criaturas. Todos os vampiros são enjoados para

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se alimentar. Naquela ocasião, havia somente pães ázimos que os elfos gostavam de carregar.

— Comam estes pães! É a única coisa que temos para comer. — disse Eleönora.

— Não comemos isso! Alimentamos apenas de sangue! Se houver isso dentro de sua mochila, agradeceremos muito. — disse Tony, ironicamente.

— É isso o que vocês irão comer! Não irão mais se alimentar com o sangue dos inocentes. Voltarão aos seus hábitos alimentares. Pão e água!

— Nãoo! Nãoo! Por favor não faça isso! — implorou Tony. — Se quiserem, posso trazer um gole de vinho! Ele é suave, talvez

matará a sede de vocês! — Sangue! Queremos sangue! — gritou Tony, completamente

desesperado. — Não é mesmo, Jack? Em nenhum momento, pode-se ouvir a voz de Jack. Parecia que ele

estava hipnotizado, observando a notável beleza de Eleönora. Em sua visão, uma forte luz ofuscante saía por detrás da jovem, fazendo com que seus olhos se fechassem perante o imenso clarão. Estava totalmente distraído, só conseguiu ouvir as últimas palavras de seu amigo.

— Jack! Jack! — disse Tony, sacudindo-o. — Diga! — pronunciou Jack, voltando a si. — Ouviu o que ela disse? Não teremos sangue para nos alimentar!

Somente pães ázimos e água! Como sobreviveremos? — Garanto que conseguiremos nos adaptar! — disse ele, concordando

com Eleönora. — Está se sentindo bem? — disse Tony, sacudindo seu amigo

novamente. — Acorda para a vida! Comíamos pães quando éramos “normais”. Agora não somos mais deste tipo.

— Não posso fazer nada! É somente isso o que temos. — disse Eleönora encabulada com os olhares de Jack. — Agora com licença, tenho mais coisas a fazer.

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— Pelo menos pede para nos cobrir com um pano! Não podemos suportar os raios do sol. — disse Tony.

O pano foi providenciado, cobrindo-os lentamente ao ponto de não serem atingidos pelos raios do sol. O pior não era tanto a luminosidade, mas sim, o calor forte que eles estavam passando, principalmente por estarem debaixo dos panos negros, sendo este o único que os elfos carregavam. Era totalmente escuro, impedindo que as luzes do sol ofuscassem os seus olhos.

Estava tudo pronto para partir. Todos os cavalos estavam selados e a sociedade da prata estava ansiosa para deixar aquele lugar. Era um tédio ficar observando a entrada da floresta, principalmente tendo a grande possibilidade de aparecerem novas criaturas sanguinárias.

Agäz finalmente despertou depois de ter sido atacado por aquelas aranhas. Sua lealdade a Pedro aumentou ainda mais. A amizade entre eles tornou-se algo inenarrável depois que ele salvou a sua vida.

Ao cavalgarem algumas léguas, pôde-se ouvir a voz de Beyën que estremecia os horizontes. Ele alertava os seus companheiros conforme a gravidade do perigo.

— Devemos ficar mais atentos com os nossos inimigos! Daqui para a frente, encontraremos alguns obstáculos que podem atrasar nossa busca.

— Passaremos em nossas terras, meu pai? — perguntou Eleönora. — Não! Embora estejamos nas terras de Tiüan, não passaremos em

casa. — E por onde passaremos? — perguntou Agäz. — Passaremos pelas estradas de Draiüs, até chegarmos no pântano das

quatro almas. É algo perigoso, mas não podemos perder mais tempo. — Já ouvi falar deste pântano! Iremos morrer se passarmos por lá! —

resmungou Alamuc. — Depende de por onde passar! — respondeu Beyën, tranquilamente.

— Não se preocupe, passaremos sem sermos percebidos. Mas fiquem atentos, não sabemos como o inimigo ira agir.

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— Mas meu pai, as estradas de Draiüs é perigosa! Passar por aquelas montanhas é arriscado demais! — disse Eleönora.

— Suas estradas são estreitas, repletas de curvas! — disse Alamuc. — Sem contar a sua altura! É perigoso demais! — disse Petrus,

resmungando juntamente com os outros anões. — Não temos outra saída! — gritou Beyën. — Se passarmos para o

caminho de casa, ganharemos mais cinco dias de viagem. Pedro concordou com Beyën neste sentido, embora estivesse com um

certo anseio de passar por aquelas estradas. Ouvia-se falar muito mal delas, quase nenhuma criatura gostava de passar nas montanhas de Draiüs.

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Ÿ

o cavalgarem rumo às montanhas, tiveram que passar em uma pequena floresta desconhecida. Nesta floresta, havia algumas casas de madeira em cima de gigantescas árvores que cercavam

aquele lugar. Parecia que estavam abandonadas, não se ouvia ninguém, apenas o cantar dos pássaros.

Mas algo surgiu na mata, correndo em direção ao rei. Estava totalmente abatido, com suas vestes rasgadas e com sua respiração ofegante. Parecia que ele estava fugindo de alguém.

— Meu senhor! Ainda bem que o encontrei. — disse o jovem elfo. — Quem é você? — perguntou Turän, descendo de seu cavalo. — Sou Radnör Morguÿ e moro nestas redondezas! — E o que você quer com meu pai? — perguntou Turän novamente,

impedindo que o jovem aproximasse do rei. — Turän, deixe-o passar! — disse Beyën seriamente. — O que

aconteceu aqui? — Todos os que estavam aqui, inclusive meus familiares, foram levados

pela guarda real! O rei Arthur está julgando também os elfos por serem aguianos. Muitos foram mortos, majestade.

— Mas como? Eu sou o rei destas regiões! Arthur não tem nenhum poder sobre estas terras.

— Dissemos isso a eles, mas não nos escutaram! Gritavam a todo o momento que Arthur será agora o novo rei destas redondezas!

— Arthur está conseguindo dominar todo mundo! — disse Agäz. — Impossível! Sujeito miserável. — resmungou Alamuc, eufórico. — A desgraça veio sobre estas terras! Diversos zoörgs aliados com

alguns dos soldados de Arthur, vieram para nos massacrar! — disse Radnör.

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— Eu disse que os humanos são fracos! — exclamou Turän, olhando diretamente para Pedro.

— E como você fugiu? — perguntou Pedro. — Consegui escapar com a ajuda dos Trasgos! Eles são péssimos como

guardas. — Criaturas imbecis! Não são capazes de vigiar nem seu próprio

umbigo! — disse Agäz. — São lerdos mesmo! Por isso consegui retornar! — Está seguro agora, meu jovem! Estamos partindo para Tiüan em

busca das pedras da perdição. Gostaria de ir conosco? — perguntou Beyën — Claro que sim! Tenho a esperança de encontrar-me com Arthur e

salvar a minha família. — Então, suba aqui em meu cavalo. Não podemos perder mais tempo.

— disse Beyën. Enquanto cavalgavam, ouvia-se a conversa que Beyën tinha com aquele

elfo desconhecido. Eles falavam das mortes que aconteceram no norte e das guerras que estavam surgindo em toda Aldiroön.

Radnör era um jovem simples, de cabelos loiros e com vestes de segunda mão. Aparentava ser um lutador. Ele sabia muito bem como utilizar o seu arco e sua flecha.

Ao anoitecer, decidiram descansar um pouco. Eles acenderam uma fogueira para se esquivar do frio. Beyën arrumou algumas roupas para Radnör, já que as dele estavam em más condições para o uso. Todos eles comiam um pedaço de carne assada e pães ázimos.

— O mundo de Aldiroön não está mais seguro. — disse Radnör, comendo alguns pães ázimos. — Várias guerras estão acontecendo! O leste quase foi todo atacado. Sem contarmos a região central, que já dominada por Arthur.

— Precisamos lutar! — disse Turän. — Com certeza! — exclamou Radnör. — Os centauros e os hipogrifos

estão lutando para que o exército de Cesarem não tome conta totalmente

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daquelas regiões. Mas eu ouvi dizer que alguns dos humanos estão ajudando estes centauros.

— Humanos? Que humanos? — perguntou Pedro, devorando um pedaço de carne.

— Parece que são alguns dos soldados que se negaram a servir o seu rei. Eles simplesmente montaram sua própria cavalgaria!

— Então estamos falando de um exército! — exclamou Petrus, ascendendo o seu cachimbo.

— Parece que sim! Um grande exército por sinal. — respondeu Radnör. — Muitos dos humanos não concordaram da maneira rude de Arthur governar. Muitos deles foram decapitados, apenas por questionarem a maneira injusta de como rei estava liderando. Por isso, muitos deles abandonaram seu posicionamento e criaram a sua cavalaria!

— Os cavaleiros da justiça. — sussurrou Agäz. — Sim! Eles mesmo! — disse Radnör. — Já os conhecia? — Ouvi alguns rumores em Aquatinta! Mas não imaginava que era

comandada por homens, principalmente por antigos soldados de Arthur! — Parece que esses cavaleiros colocaram o mesmo nome do trono em

que Arthur se senta. — sussurrou Treno. — Sim! — disse Radnör. — Eles acreditam que o trono jamais se

corromperá com as maldades de seu rei. Por isso, honraram com esse nome. — E de quantos guerreiros estamos falando? — perguntou Pedro,

olhando fixadamente para o elfo. — Ouvi dizer que eram uns dez mil homens, mas não sei se isso é

verdade. — Pelo menos há homens de bravura e de lealdade! — exclamou Pedro

olhando para Turän. — Tudo indica que sim! Mas é preciso que todas as criaturas de

Aldiroön lutem bravamente! Ou então, o mal dominará todas essas terras! — disse Beyën, seriamente.

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— Os zoörgs estão a cada dia se multiplicando nas lamas e nos ardumes dos pântanos! — disse Radnör. — Senão apressarmos logo, temo que nem mesmo os cavaleiros da justiça conseguirão aguentar o exército de Cesarem.

Enquanto todos estavam conversando próximo à fogueira, Eleönora como sempre estava à disposição de seus prisioneiros, levando a eles alguns de seus suplementos. Jack estava totalmente agradecido pelo gesto da jovem, nunca imaginaria que seria tratado tão bem pelos elfos.

Tony ficava enfurecido quando ela se aproximava. Jack olhava para ela de uma forma diferente. Ele ficava animado quando Eleönora se aproximava de sua jaula.

— Vejam o que trouxe para vocês! Um pedaço de carne assada com alguns pães. Experimentem!

Tony sentiu náuseas ao olhar para aquele prato. Parecia que ele iria vomitar quando olhou diretamente para aqueles pães. Mas com Jack foi diferente. Ele não conseguia sentir mais o sabor das carnes, mas mesmo assim, ele decidiu degustar o belo prato que a jovem preparou com tanto prestígio.

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a manhã seguinte, continuaram a caminhar em direção às estradas de Draiüs. Quando por fim chegaram, Pedro sentiu um certo temor em olhar para aquelas estradas estreitas. Era o único

caminho que se podia encontrar para descer as montanhas. Sua altura era incomensurável. Muitos mencionaram a sua altitude, principalmente a gravidade de se despencar delas. Poderiam morrer antes mesmo de chegar ao chão. Os vampiros ficaram desesperados. Havia neblina em todos os cantos das montanhas, qualquer passo falso que eles tomassem poderiam despencar para o abismo.

Os anões não conseguiam enxergar nitidamente, sentiram um certo temor, embora eles não demonstrassem isso para a sociedade. De fato, nada se enxergava em sua volta, somente as estradas de pedra e uma cerca de madeira que ficava sobre as suas bordas. Lentamente, cavalgaram sobre as estradas. Podia-se ouvir o canto alarmante de algumas águias que ressoavam sobre aquelas montanhas.

— Cuidado! Fiquem atentos! O inimigo pode estar por aqui. — gritou Beyën perante o forte vento que percorria os horizontes.

— Que Ilumar nos proteja! Não consigo ver nada! — disse Thomas, segurando sua espada.

Enquanto desciam, podia-se ouvir um barulho que ressoava sobre as montanhas. Uma voz pairava sobre o vento. Muitos não compreendiam o seu significado e muito menos sabiam quem estaria gritando daquela maneira. A montanha estremeceu, fazendo com que vários pedregulhos caíssem sobre eles. Novamente a voz cantarolava uma canção, que era inexplicável de se traduzir.

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Beyën achava que se tratava de uma linguagem élfica antiga, mas logo percebeu que estava errado. Novas pedras foram caindo, dificultando a trajetória de seu caminhar. A sorte deles era que a maioria das pedras caíam por caminhos já percorridos.

Algumas estradas foram arrancadas pelas pedras que desabavam sobre a alta montanha. Muitos ficaram se questionando quem seria a tal criatura que estaria cantarolando sobre o topo da montanha. Ninguém conseguiu enxergar nada devido à neblina.

— Cuidado! Cuidado! Alguém quer nos matar. — gritou Agäz. No topo da montanha, estava Cesarem, lançando seus feitiços sobre as

rochas. O interessante era o modo de como ele atiçava os seus encantos. Ao pronunciar um deles, Cesarem batia fortemente o seu cajado sobre as rochas, fazendo com que elas estourassem, despencando rapidamente em direção as estradas.

Foi um verdadeiro sufoco atravessar as estradas de Draiüs. Por diversas vezes, a jaula quase tombou, deixando os vampiros completamente apavorados. Thomas acelerava o seu passo, estimulando os outros a cavalgarem rapidamente até concluírem o seu percurso.

Por fim, conseguiram escapar. Atravessaram rapidamente o desfiladeiro em plena segurança. Cesarem novamente se transfigurou em uma fumaça negra. Jamais poderia perder de vista a sociedade da prata.

Ao cavalgarem algumas léguas, depararam-se com uma vista que nada os agradava. Estavam se aproximando do pântano das quatro almas, um lugar completamente assombroso. De fato, o próprio nome já era algo apavorante. Ele foi batizado assim devido às mortes que aconteciam, sobretudo depois do desaparecimento de quatro homens que estavam cavalgando naquela região.

O céu que estava todo coberto de nuvens negras. Os anões mal podiam enxergar devido à vasta escuridão.

— Que lugarzinho mais horroroso! — disse Mirgän, cavalgando em seu cavalo.

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Era um lugar totalmente sombrio com árvores que estavam praticamente mortas. As águas estavam todas estagnadas em sua volta, transmitindo um odor infernal. Alguns dos anões tamparam as suas narinas devido ao mal cheiro.

Cesarem estava acompanhando-os. Ele se escondeu por detrás das árvores do pântano. Com o seu cajado, Cesarem pronunciou um novo feitiço.

— Grincon Cevalla. Ao invés do feitiço sair pelos olhos de Degälion, escorregou-o pelo seu

tronco, até chegar ao chão. Podia-se ver a luminosidade indo em direção às grandes árvores que estavam próximas da sociedade. Suas raízes começaram a ter vida. Todos estavam pasmados quando tiveram que lutar contra aquelas árvores.

Agäz foi levantado pelos pés, ficando de cabeça para baixo. Alguns anões foram levantados pelos braços. Todos ficaram curiosos perante a cena ocorrida. Nunca puderam imaginar que havia tipos de árvores que mexiam as raízes. Logo os centauros reagiram. Eles pegaram suas espadas e começaram a lutar contra as árvores secas. Alamuc cortou algumas raízes com seu machado.

Enquanto uma raiz era cortada, misteriosamente surgiam mais três. Todas elas atacavam a sociedade. Beyën deu um forte grito que deixou a todos incomodados perante aquela cena.

— Que droga, parece até feitiçaria! Não conseguiremos cortar essas raízes com nossas espadas.

Beyën correu até o seu cavalo, desembrulhando o pacote que tinha recebido de Pedro. Era a mais bela das espadas, estando ela coberta por uma forte luz avermelhada que sinalizava que o perigo estava próximo. Ao avistar de longe a espada das oliveiras, Cesarem saiu correndo para se esconder entre as árvores. Ao utilizá-la, Beyën conseguiu acabar com o feitiço que estava sobre aquelas árvores.

— Isto é obra de Cesarem! — gritou Beyën, segurando a espada das oliveiras.

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— Como pode ter certeza? — perguntou Mirgän. — Esta espada cortou de fato as raízes! Ela destrói tudo aquilo que vem

de Cesarem. — Devemos então tomar cuidado! — disse Tebas, segurando o seu

arco.— Podemos ser surpreendidos novamente, pela tal criatura. Ao atravessarem o pântano, Alamuc ainda estava com um certo receio

de encontrar algumas outras criaturas que não fossem tão amigáveis. Por isso, ele cavalgou segurando fortemente o seu machado.

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pântano das quatro almas estava longe de suas vistas. Só se viam no horizonte as grandes florestas de Kÿen, pertencentes às regiões de Tiüan. Ela era completamente fechada, formada em

boa parte por árvores de grande porte, situando-se próximas umas das outras. Antes que eles entrassem, Beyën saltou-se de seu cavalo e o amarrou em uma árvore.

— Quero que todos fiquem aqui! Venham comigo apenas Eleönora e Turän.

— Por acaso o rei de Tiän está devendo alguma coisa nestas terras? — resmungou Petrus, enquanto descia de seu pônei.

— Digamos que nestas terras, não sou muito bem-vindo! — respondeu Beyën com um sorriso seco.

— Ora! Mas por quê? Você não é o rei de todo o norte? — perguntou Claüer completamente confuso.

— Sou! Mas infelizmente há alguns elfos que discordam do meu título. — disse Beyën. — A floresta é o único caminho para as cavernas de Tiurän. Garanto que esses elfos que discordam do meu reinado estarão escondidos entre as matas. É melhor que nós três sejamos capturados do que todos vocês.

— Aquele louco já deve estar sabendo que estamos aqui! — disse Eleönora, olhando para o seu pai.

— Tomem cuidado! — disse Radnör, seriamente. — Aquele que se diz rei sobre o norte, é completamente ganancioso pela sua riqueza.

A grande maioria não conseguia compreender o que Eleönora e Radnör queriam dizer.

— Não se preocupe, tomaremos cuidado! — disse Beyën, segurando fortemente no braço de Radnör. — Mas antes de partir, quero que fique

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combinado uma coisa! Se no segundo dia de Tiüan eu não retornar, quero que Pedro e Agäz corram para me procurar.

— Mas por que nós? Digo, por que não toda a sociedade da prata? — perguntou Pedro.

— Não quero colocar toda a sociedade em risco! E vocês são mais ágeis e espertos. Saberão nos ajudar...

— Eu conheço os elfos destas terras, principalmente o senhor destes bosques. — interrompeu Radnör.

— Ótimo! Então você irá acompanhar Pedro e Agäz. — disse o elfo com um leve sorriso. — Aguardem até o amanhecer do segundo dia. Todos atravessem a mata, mas somente os três poderão voltar para nos procurar!

Beyën desapareceu em plena mata. Enquanto caminhavam, ouviram barulhos estranhos vindo em sua direção. Eleönora estava pronta para atirar uma de suas flechas. Mas algo inesperado aconteceu. Sem que eles o percebessem, estavam cercados por um grande exército de elfos que miravam suas flechas para sua direção. Beyën tentou se identificar, mas não obteve tanto sucesso. Suas mãos foram amarradas e sua boca foi amordaçada. Ao caminharem até o centro da floresta, avistaram o reino de Tiüan. Havia diversas casas sobre as rochas, cachoeiras que desabavam sobre os penhascos e um céu rosado, que fazia contraste com um azul celeste.

— Nós iriamos morar aqui! — cochichou Eleönora para o seu irmão. Estando eles próximos das rochas, avistaram uma mansão feitas de

pedras cristalinas. Ao entrarem nela, depararam-se com um jovem elfo sentado sobre um trono de cristal, degustando algumas frutas que estavam sobre uma bandeja de prata. Parecia ser um rei, principalmente quando Turän observou a sua coroa de ouro que estava cobrindo as raízes de seus longos cabelos negros.

— Ora! Ora! O que temos aqui? Se soubesse que você viria, estaria mais apropriado.

Os soldados tiraram a mordaça de Beyën. — Se eu avisasse que iria aparecer, talvez a guarda estaria muito mais

preparada! Não é mesmo Rianckÿ, filho de Cräzis.

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— Não sei! Depende muito do meu bom humor. — Isso são modos de falar com o vosso rei? — gritou Turän, furioso. — Calma, meu filho! Já estou acostumado com as rebeldias de alguns

elfos. — disse Beyën, tentando controlar aquela situação. — Rebeldia? Está insinuando algo? — perguntou Rianckÿ, levantando-

se de seu trono. — Foi apenas um comentário, nada mais! — Sei muito bem de seus comentários sórdidos. — disse Rianckÿ,

ironicamente. — A propósito, o que o rei de Tiän faz em meus domínios? Não me diga que veio contestar as suas terras!

— Embora estas terras me pertençam, porque foram me dadas pelo próprio Ilumar! Não estou aqui para contestar nada. — afirmou Beyën. — Estávamos apenas atravessando estas terras para visitar alguns parentes. Nada mais.

— Muito bem! — exclamou Rianckÿ sentando-se novamente em seu trono. — A mim você não me engana. Sei que você não tem nenhum parentesco nestas terras! Esqueceu que sou o rei delas?

Beyën ficou calado. Rianckÿ aguardava a sua resposta mas resolveu não insistir.

— Muito bem! Você está preso por suas mentiras. Soltarei você e sua família até que me revele a verdade, mesmo que eu tenha que esperar um século.

— Você não pode prender um rei! — gritou Turän. — Aqui, o rei sou eu! — disse Rianckÿ com um tom de ironia. —

Guardas! Levem-nos daqui e os mantenham salvos. Não se podia fazer nada. Rianckÿ era um elfo duro de coração e não se

dobrava por qualquer conversa fiada. Todos foram levados até as masmorras. Ao serem presos por aquelas grades de ferro, Eleönora sentou-se no chão e começou a mexer em algumas pedras que estavam jogadas próximo a cela.

— E agora? O que faremos? — perguntou ela. — A única coisa que nos resta é aguardar o nosso resgate. — disse

Beyën. — Sei que Agäz possui pequenas pernas mas saberá nos ajudar. Os

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elanfös são ágeis e difíceis de serem vistos. Pedro também é esperto, saberá como nos tirar daqui.

Beyën sabia da pontualidade dos elanfös. Não se tinha esperança de que eles aparecessem antes do segundo dia de Tiüan.

Enquanto isso, a sociedade da prata preparava a sua refeição. Havia

carne de coelho e pães ázimos naquela noite. Todos comiam rapidamente. Pedro se dirigiu até a cela onde estavam os prisioneiros. Por diversas

vezes ele tentava descobrir os nomes daquelas criaturas, mas era difícil de conversar com elas. Eleönora era a única pessoa que conseguia conversar com eles, mas, mesmo assim, Pedro novamente arriscou-se a trocar algumas palavras.

— Vocês não irão mesmo me dizer como se chamam? — Não temos nomes para você! Somos seres da noite e da escuridão. —

disse Tony, ironicamente. — Veja como fala comigo! Por acaso lhe fiz algum mal? — Ah! E não fez? — perguntou Tony. — Estamos presos aqui há mais

de uma semana! Quase fomos mortos e você ainda está me dizendo que não fizeram nada? Por que não nos solta logo de uma vez? Somos um fardo pesado para vocês.

— Chega! Não está vendo que ele está querendo ser amigável? — repreendeu Jack — Não ligue para ele, é um tolo! Estamos apenas famintos e cansados. Se o senhor puder nos oferecer um pedaço de carne, eu ficaria muito agradecido.

— Claro! Estou aqui para isso! Ao dar-lhe um pedaço de carne, Pedro percebeu que Jack estava

degustando vagarosamente a sua comida. Tony nem sequer olhou para ela. — O que vocês fizeram para estarem assim? — perguntou ele,

ousadamente. — Infelizmente, para estarmos dessa maneira, infligimos algumas leis

de Ilumar. — disse Jack.

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— E o que vocês fizeram? — Ora! O que cometemos não é de sua conta! Seu humano intrometido.

— gritou Tony, furioso. — Basta! Não se esqueça que eu também fui um humano no passado.

— disse Jack, com o mesmo tom de voz. — E eu um elfo! Que importância tem isso? — perguntou Tony. — Se não quiserem me contar, tudo bem! — exclamou Pedro,

segurando a sua raiva perante o insulto que acabou de receber. — Eu cometi um erro absurdo! Infelizmente matei um homem. Mas

prefiro não entrar em detalhes, sinto vergonha pelo que fiz e espero que um dia Ilumar me perdoe.

— Ilumar! Maldito Ilumar! Nos abandonou enquanto estávamos nos transformando nestas malditas criaturas. Ele deveria ter nos ajudado. — resmungou Tony, enquanto Agäz se aproximava de sua jaula.

— Não! Procuramos isso e merecemos este castigo. — disse Jack. — Mais ainda há uma esperança! Apenas precisamos acreditar. — disse

Agäz. — Bom! É preciso descansar! Está tarde e logo o sol irá aparecer.

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o amanhecer do segundo dia de Tiüan, a sociedade da prata estava à espera de Beyën e de seus filhos. Muitos acharam estranho a demora dos elfos, já que eles são tão pontuais como o de costume.

Todos os membros da sociedade da prata passaram entre a floresta, deixando para trás os três escolhidos de Beyën. Radnör conduzia os dois jovens para o reino de Tiüan. Ao passarem pela mata, avistaram a mansão de cristal.

— Entrem pelos fundos enquanto eu distraio os guardas de Rianckÿ. — disse Radnör.

Pedro e Agäz correram em direção aos fundos da mansão. Havia outros guardas que estavam de vigia naquela manhã. Eles não sabiam muito bem o que fazer, já que a porta estava sendo vigiada por soldados. Ao olharem para todos os cantos, depararam-se com uma árvore que estava encostada em uma das janelas da mansão.

— Vamos subir na árvore e entrar por aquela janela. — cochichou Agäz. Rapidamente, os dois escalaram a árvore sem serem notados. Ao

passarem pela janela, Pedro e Agäz andavam escondidamente sobre os grandes salões.

Haviam diversas estátuas esculpidas de bronze que lembravam os elfos do passado. Suas paredes estavam adornadas de estandartes. Todas elas com o mesmo símbolo: Uma gaivota amarela segurando um ramo de oliveira. Ambos olhavam para cada canto e se deparavam com o vazio, parecia que ninguém morava naquele lugar.

Pedro e Agäz ouviram um barulho. Havia dois guardas que estavam se aproximando do salão. Eles se esconderam debaixo de uma imensa mesa de pedra. Ela estava coberta por um pano escuro, bordado com brasões a sua volta.

— Precisamos proteger Beyën e seus filhos. Eles não podem fugir!

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— E iremos proteger! — disse um dos guardas. — Mas estamos com sede e um pouco de vinho não faz mal a ninguém, não acha?

— Rianckÿ ficará zangado conosco! — Nosso rei está descansando! Venha, ele não vai se importar se

bebermos um gole do seu vinho. — Onde estão as chaves? — Estão aqui comigo! Não se preocupe, voltaremos logo. Pedro e Agäz saíram rapidamente de seu esconderijo. Começaram a

seguir os guardas que estavam indo em direção à adega. Eles sequer notaram que estavam sendo seguidos, muito menos por um elanfö que mal conheciam. Havia diversos barris de vinho que estavam sobre uma prateleira de madeira. Podia-se sentir o odor fresco que penetrava suas narinas. Ambos os elfos bebiam e comiam sem parar. Sua sede era incontrolável.

Horas e horas se passaram. Ambos os guardas que estavam bebendo adormeceram lentamente. Debruçaram-se sobre a mesa e se esquecerem de seus prisioneiros.

Agäz correu em direção aos guardas enquanto Pedro estava escondido atrás de uma das colunas da mansão. Depois de um certo tempo de procura, Agäz finalmente conseguiu pegar as chaves. O sono deles era tão pesado que sequer notaram a presença de um elanfö em plena luz do dia.

Rapidamente, encontraram o caminho para as masmorras. Depararam-se com Beyën que estava à sua espera, já que Eleönora e Turän estavam ainda adormecidos. Beyën ficou mais aliviado quando olhou para os dois rapazes.

— Finalmente, meus amigos, mas como conseguiram passar? — perguntou Beyën.

— Podemos falar sobre isso depois! Há guardas rondando por aqui. — sussurrou Pedro, enquanto abria a cela.

Ao acordarem Eleönora e Turän, partiram silenciosamente daquele lugar. Era difícil passar pelos guardas, principalmente estando eles de prontidão na porta da mansão. Não sabiam o que fazer, poderiam ser presos a qualquer momento.

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Agäz pensou em descer pela mesma árvore em que eles entraram, mas era difícil de se aproximar novamente daquele salão. Havia guardas agora por toda a casa, todos estavam correndo em direção às masmorras.

Pedro teve uma ideia. Ele rapidamente tirou uma corda que estava guardada em sua bolsa e amarrou-a em uma das colunas. Todos desceram pela janela. Nenhum guarda conseguiu avistar Beyën e seus recrutas. Todos correram em direção à saída da floresta. A sociedade da prata estava aguardando a presença de seu rei.

Agäz correu em direção a uma árvore que se encontrava no centro da floresta. Começou a fazer pequenos sinais para que Radnör retornasse.

Jack emitiu um sorriso no rosto quando Eleonora se aproximou de sua jaula.

— Fico feliz em revê-la! — exclamou Jack. — Agora terei com quem conversar!

— Até parece que você não conversava com ninguém desta floresta! — disse Eleönora brincando com o jovem.

— Nem todos são iguais a você! — afirmou o rapaz. Eleönora ficou sem graça. Ela subiu em seu cavalo. Todos voltaram a cavalgar. Após um dia de viagem, encontraram as

cavernas negras de Tiurän. Antes de se chegar à entrada da caverna, observaram as duas grandes colunas talhadas, sobre um arco feito de pedras rochosas.

Eles escutaram um barulho quando amarravam as rédeas em uma árvore. Havia trasgos que adentravam a caverna, carregando consigo alguns dos cavalos que estavam mortos.

Todos olharam em volta da caverna, parecia uma enorme oca, sobre cujo topo se podia presenciar a finura de suas pontas. Ela continha várias torres a sua volta e diversas rochas sobre o chão. O céu estava todo coberto por nuvens negras, uma forte tempestade estava por vir.

Ao entrar na caverna, ouviam-se vários ruídos que vinham do subsolo. Barulhos infernais que estavam a todo momento gritando: “Matar! Matar! Precisamos matar! ”. Ao descerem os pedregulhos, encontraram alguns Trasgos que estavam andando de um lado para o outro, pareciam baratas tontas.

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Beyën reparou que havia uma forte luz ofuscante que saía por detrás das rochas. Uma luz verde que pairava sobre as pedras. Em volta dessa luz, haviam várias estátuas de sal de diversas criaturas.

— Vejam! Parece que Cesarem não confia nem mesmo em suas criaturas. — exclamou Eleönora.

— Com certeza é uma das pedras! — disse Petrus, tentando se desviar das rochas.

— Como faremos para pegar, meu pai? — perguntou Mirgän. — É preciso distrair os Trasgos, enquanto vou até ela. — disse Beyën

sem nenhuma criatividade. — Somente eu posso pegar naquela pedra! Agäz jogou uma pedra sobre as rochas, fazendo com que muitos dos

Trasgos ouvissem e corressem na direção do barulho. Todos eles ficaram escondidos, ouvindo aquelas criaturas insignificantes gritarem consigo aquela frase insuportável.

Beyën seguiu em direção à luz esverdeada. Ele encontrou diversas estátuas de sal que o impediam de se aproximar daquela pedra. “Não podia-se quebrar nenhuma daquelas estátuas, talvez elas voltassem a viver” - pensou Beyën.

Ele finalmente conseguiu se deparar com a primeira pedra da perdição. Ela era conhecida como a pedra verde das esmeraldas. Estava faltando um pequeno pedaço, mas nada tirava o seu brilho.

Ao segurá-la, parecia que a felicidade estava desaparecendo e o peso desta pedra estava se manifestando. Beyën se desesperou naquele momento, começando a se contorcer sobre o chão escurecido.

No momento exato em que Beyën pegou a pedra, nas cavernas de Algün, Sgraünd despertou de seu sono profundo. Ele soltou um grito que estremeceu toda a floresta negra. A todo momento, ele pronunciava: “Pegaram-na! Pegaram-na! Como ousa pegar a pedra de meu senhor! ”. Havia uma ligação profunda de Sgraünd com as pedras.

Cesarem logo ficou sabendo de que um intruso estava pegando uma de suas pedras. Degälion transmitiu a mensagem que vinha das cavernas negras de Algün. Ele encheu-se de cólera, e, rapidamente, transfigurou-se em uma fumaça

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negra, partindo para as cavernas de Tiurän. Cesarem não sabia onde estava a primeira pedra. Sgraünd o conduzia.

Um forte grito se dirigiu ao leste onde se encontravam os vampiros. Parecia que o seu mestre os estava chamando. Todos voaram rapidamente para o norte. Jack e Tony ouviram também os gritos incessantes de Cesarem. Ambos ficaram desesperados em ouvir aquela voz.

— Não aguento mais! Basta! — disse Jack tampando os seus ouvidos devido aos gritos de Cesarem.

— É nosso mestre que nos chama! — disse Tony, alvoroçado. Claüer estava vigiando. Ele ficou abismado quando olhou para a jaula

dos vampiros. Ambos pulavam como leões selvagens. Jack o chamou. Ele estava completamente transfigurado, parecia que seus dentes iriam sair pela boca.

— Cesarem está vindo! Corra para dentro da caverna e avise a todos! — gritou Jack.

— Está louco! Isso é traição! — gritou Tony, surrando seu amigo. — Não permitirei que Cesarem cometa mais um de seus crimes. —

disse Jack, enquanto Claüer corria em direção à caverna. Beyën gritava constantemente enquanto segurava a pedra, fazendo com

que os trasgos ouvissem o seu gemido. Todos tiraram suas espadas da bainha e atacaram as criaturas que viviam nas cavernas de Tiurän. Muito dos trasgos foram mortos, enquanto outros eram difíceis de serem derrotados. Eleönora correu em direção ao seu pai que estava abatido. Enquanto todos relutavam, Claüer gritou fortemente a mensagem dos vampiros.

— Vamos embora! Cesarem está se aproximando. Coram! Corram! Todos saíram daquele lugar. Eles corriam em direção às ruínas (que

ficava próxima a saída). Beyën ficou para trás. Eleönora e Turän ajudavam o seu pai a escapar. Diversas flechas foram atiradas e diversos trasgos caíam sobre o chão. Turän não perdia tempo e cortava a garganta daqueles miseráveis.

Beyën saiu daquela caverna, juntamente com seus filhos. Todos subiram em seus cavalos e partiram para o sul, se escondendo entre as árvores para não serem capturados por nenhuma criatura das trevas.

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Cesarem vinha com toda a sua fúria em direção às cavernas de Tiurän. Ao perceber que alguns dos trasgos estavam do lado de fora à procura da sociedade, soltou uma imensa bola de fogo, atingindo a todos que estavam sobre as rochas.

— Seres estúpidos! Ignorantes! Merecem morrer no fogo e no enxofre. — gritou Cesarem.

Sem saber o que fazer, Cesarem se dirigiu até o topo da caverna onde aguardava a presença de todos. Não demoraram muito para chegar. Havia uma imensa quantidade de criaturas que estavam na entrada da caverna. Parecia um ninho de cobras que germinavam sobre a terra. Cesarem olhava para o horizonte e apreciava a quantidade de criaturas que estavam ao seu redor.

— Quero que todos vocês corram atrás daqueles porcos nojentos! Eles não podem ficar com a minha pedra. Quem o encontrar me comunique. Ganhará uma recompensa quem me trouxer as suas cabeças! Eu quero a minha pedra de volta! — gritou ele perante a sua corja.

Foi a maior confusão naquele momento, todos saíram alvoroçados à procura do ladrão que havia roubado a pedra de seu mestre. Alguns não sabiam quem era esse sujeito medíocre, mas para não haver erros, foram de dois em dois para esta caçada.

Enquanto isso, a sociedade da prata estava bem longe daquelas redondezas. Estavam cavalgando próximo às regiões de Alfegän.

Havia uma pequena floresta, onde os pássaros cantavam livremente e as águas conseguiam descer a nascente. Todos estavam tão temerosos que sequer perceberam o cair da noite. O céu continuava negro, os elfos não sabiam para onde estavam andando. Eles estavam perdidos pela floresta.

Beyën estava diferente. Seu semblante estava abatido e sua respiração fumegava devido ao cansaço excessivo.

— Precisamos abrir mais uma charada! — disse ele, ofegante. — O senhor está bem, meu pai? — perguntou Mirgän, preocupado. — Estou sim! Apenas um pouco cansado, nada mais do que isso. — E qual charada abriremos agora? — perguntou Petrus.

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— Por que não abrimos logo a charada dos anões! — disse Alamac, impaciente.

— Não! Apenas daríamos mais voltas. Como estamos próximo das regiões dos homens, é para lá que iremos! Pedro, abra a sua charada. — disse Beyën sentando-se em uma daquelas rochas desconfortadas.

Pedro estava empolgado, finalmente aquele papel seria aberto. Mas surpresas sempre são agraciadas, principalmente se tratando das charadas de Ilumar. Novamente, puderam se deparar com mais uma dificuldade. O papel não estava em branco como o da primeira vez, apenas estava escrito com uma linguagem diferente. Ninguém conseguia entender, parecia ser uma língua morta que muitos dos homens utilizavam no passado. Beyën não era muito expert nesse idioma, sobretudo pelo pouco contato que ele tinha com os humanos no início da criação.

— O que faremos agora? — perguntou Pedro, segurando aquele papel. Todos sabiam, inclusive ele, que não existiria nenhum homem que conseguisse decifrar aquelas palavras.

— Devemos partir para as montanhas de Aracuqüe! Lá encontraremos as respostas que tanto esperamos. — afirmou Beyën.

— Está louco! Quer nos levar para a morte? — disse Treno, que sabia muito bem das histórias de seus ancestrais.

— Morte? Você não acha que está sendo um pouco precipitado? — perguntou Beyën.

— E você não acha que está sendo maluco em nos levar até Aracuqüe! Para cairmos direto nas garras da feiticeira azulada! — gritou Alamuc, andando de um lado para o outro.

— Feiticeira azulada? Até você Alamuc! Pensei que você teria um pouco mais de juízo. Você não passa de uma cabeça dura! — gritou Beyën, levantando-se daquele assento desconfortante.

— Está me insultando? — perguntou ele aos gritos. — Cavalheiros! Por favor! — exclamou Thomas, seriamente. — Não

percebem que estamos diante da pedra da discórdia? Ela está fazendo com que

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vocês não entrem em um acordo, mas que fiquem a noite inteira discutindo sobre este assunto! É isso que ele quer, nos dividir!

— Conheço a história da feiticeira azulada! Já que ela cuidou de Ilumar, acredito que ela não nos fará mal algum. Não acham? — perguntou Agäz.

— Essa história pode ser falsa! — gritou Azac, intrometendo-se no assunto.

— Mas não é! — afirmou Beyën, ofegante. — Eu a conheço, e sei que não é uma ameaça para nós. Ela irá nos ajudar, confie em mim!

— Não sei se podemos! — disse Alamuc com um tom severo. — Se Bengar estivesse aqui, garanto que me escutaria! — disse Beyën

enquanto sentava novamente. — Bom! Digamos que partiremos para esta montanha e encontremos

esta feiticeira azulada! Ela saberia traduzir a charada? — perguntou Pedro. — Com certeza! Aquela senhora é para nós toda a fonte de nossas

inspirações. Digo mais! Ela é a auxiliadora dos aguianos. — afirmou Beyën. — Uma verdadeira guerreira, podemos dizer assim! — disse Agäz,

sequentemente. — Bom! Então não temos nada a perder. — disse Pedro, olhando

diretamente para Beyën. — Faremos então uma votação, o que a maioria decidir está decidido.

— disse Agäz. — Aqueles que não querem ir até as montanhas de Aracuqüe, levantem a mão!

Alguns braços foram levantados, já que a maioria deles eram dos próprios anões. Mas havia um que não queria estar naquelas redondezas. Tony levantou o seu braço voluntariamente, concordando com os anões de não passarem naquele lugar.

— Muito bem! Sete não querem passar por Aracuqüe. Imagino que o restante queira passar pelas montanhas e encontrar com a feiticeira azulada! — exclamou Agäz.

Eram dez contra sete. Jack, ao contrário de seu companheiro de cela, gostaria de estar juntamente com a feiticeira azulada. De fato, foi uma votação

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justa. Os anões (com toda a sua arrogância), acabaram acatando a ideia de Beyën em querer atravessar aquelas montanhas.

A noite estava quase no seu fim, podia-se ouvir o cantarolar dos pássaros que saíam alvoroçados de seus ninhos. Beyën não conseguia mais dormir. Ele agonizava apenas por segurar a pedra. Sua respiração era ofegante, havia momentos em que ele delirava, parecia que alguém falava dentro de sua cabeça. Era uma voz rouca que lhe dizia palavras que o desmotivavam. Houve momentos em que ele se levantou para não ser atormentado por aquela voz.

Antes do sol aparecer, os vampiros surgiram como uma fumaça negra. Como Beyën estava acordado, alertou a todos os membros da sociedade que os vampiros estavam por perto. Todos lutaram contra aqueles vampiros.

Os anões pegaram os seus machados e decapitaram algumas daquelas criaturas. Radnör atirava diversas flechas contra o inimigo. Algumas delas acertavam o seu coração, outras, eram vistas pregadas em suas gargantas. Alguns dos vampiros carregavam suas espadas. Esses eram guerreiros que lutavam fielmente no passado.

Eleönora a todo momento tentava ajudar seu pai, mas era preciso ficar próximo da jaula senão os vampiros que estavam presos poderiam fugir. Tony a todo momento pedia ajuda, mas cada vampiro que se aproximava era golpeado pelas flechas pontiagudas de Eleönora. Pedro nunca imaginou que haveria tantos vampiros a serviço de Cesarem. Muitas vezes, a esperança deixava o seu coração. Todos relutavam, mas, a cada momento em que um morria, dez apareciam sobrevoando suas cabeças.

Beyën estava escondido, mas era fácil de o encontrar. A luz que saía da pedra iluminava toda a floresta. Sônia logo encontrou o elfo com o intuito de o matar. Ela pensava que, se o matasse, conseguiria chamar o seu mestre para pegar sua pedra. Ela também estava interessada na recompensa prometida por Cesarem. Mas, no momento do ataque, um lobo feroz pulou sobre o seu pescoço, rasgando sua garganta por inteiro. Seu sangue espirrava sobre as matas. O focinho do lobo estava coberto de sangue.

Havia outros lobos que estavam na floresta. Eram animais imensos, com longos pelos marrons e olhos que brilhavam como brasas. Seus dentes eram

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poderosos e sua cauda era grande e peluda. Todos ajudaram a sociedade da prata. Eles massacravam o inimigo e comiam seus corações.

De repente, o sol apareceu. Muitos vampiros derreteram com a luz da manhã. Houve outros que explodiram no ar. Alguns conseguiram escapar, se escondendo por debaixo das árvores. Cesarem sabia de tudo o que estava acontecendo. Ele rapidamente se dirigiu para a floresta em forma de uma fumaça negra.

Mas antes de tocar seus pés sobre aquele chão empoeirado, lançou consigo um feitiço que imediatamente tampou todo o céu. O sol não se manifestava mais devido às nuvens negras que cercava aquela redondeza. Todos começaram a ficar preocupados, sobretudo Beyën que segurava consigo a sua joia mais preciosa. Mas a pedra o torturava, por diversas vezes havia pensamentos de desistência em sua mente.

Novamente, alguns dos vampiros regressaram para a floresta. Desta vez, preferiram estar nas alturas em forma de morcegos. Logo aquela fumaça negra arriou sobre a terra, e, de dentro dela, saía Cesarem juntamente com seu cajado que brilhava como ouro derretido.

— Ora! O que temos aqui? Um bando de porcos miseráveis com seus cachorros imundos! Acham que vocês me dão medo?

— Saia daqui! Senão teremos que mata-lo. — gritou Pedro com toda a sua bravura.

— Matar-me? Que piada mais sem graça para esta manhã sombria. — sorriu o mago descaradamente.

— Será que você se esqueceu disso! — disse Pedro tirando consigo a espada das oliveiras.

Cesarem ficou parado. Ele não tinha nenhuma reação diante da espada das oliveiras. O medo contagiou os seus olhos, fazendo com que tremesse perante aquele poder.

— Eu só quero a pedra! Prometo deixar vocês vivos se a entregarem para mim.

— Venha aqui pegar se for capaz? — disse Pedro. — Como se atreve a me desafiar! — gritou Cesarem.

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— Tenho autoridade para isto! Ilumar nos presenteou com esta honra. Venha pegar e garanto que será o seu fim.

Cesarem estava furioso. Lançava diversos feitiços que vinham dos olhos de Degälion. Pedro conseguia se defender apenas com a lâmina que estava em chamas. Seu fogo era ardente, mas era incapaz de queima-lo.

Pedro se desviava algumas vezes de seus feitiços. Todos os membros da sociedade estavam dispostos a ajudá-lo. Mas qualquer movimento que eles fizessem, os vampiros poderiam atacar novamente.

Entretanto algo de diferente aconteceu. Enquanto Pedro se desviava dos feitiços de Cesarem, vários relâmpagos começaram a se surgir. Muitos dos vampiros ficaram apavorados, fugindo daquele lugar. Diversos raios caiam novamente. Desta vez, podia-se presenciar seu desabamento próximo daquelas redondezas. Cesarem ficou sem entender o porquê daqueles raios, já que ele estava controlando aquele tempo impetuoso.

Com a fuga dos vampiros, Cesarem ficou encurralado. Toda a sociedade estava disposta a ajudar Pedro com aqueles feitiços. Cesarem ouviu vários gritos que vinham do céu, principalmente no momento em que um dos raios atingia a terra. Ele sabia muito bem de quem eram aqueles gritos, aliás, ele já ouviu várias vezes em Calauë no momento de sua queda. Cesarem era o único que podia escutar.

— Saia daqui! Saia daqui! — gritou Cesarem, caindo de costas sobre as rochas.

De repente, vários focos de luz começaram a se surgir entre as nuvens escuras. O sol conseguia se manifestar, trazendo consigo o doce calor da primavera. Parecia que o feitiço de Cesarem estava se desfazendo, sobretudo quando um vento impetuoso veio em sua direção. Cesarem se transfigurou em uma fumaça negra e fugiu para o norte. Todos ficaram mais aliviados quando viram o mago negro fugindo daquela maneira.

Ao partirem para as montanhas de Aracuqüe, puderam perceber o belíssimo sol que brilhava por detrás das colinas, já que muito dos lobos que estavam com eles desapareceram ao longo de sua jornada.

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racuqüe, como era belo aquele lugar! Podia-se presenciar as suas montanhas que estavam além do horizonte. Estas montanhas se encontravam na região de Pamän, próximo de Alfegän.

Ao entrarem na floresta de Alterdän, continuaram a se deparar com as montanhas de Aracuqüe. Elas eram altas e extensas, cercadas por diversas rochas e árvores de oliveiras que davam o seu airoso cheiro amadeirado.

Havia também uma pequena estrada em volta da floresta. Era um caminho obscuro, cujo destino muitos ignoravam. O único que sabia era Beyën que estava orientando toda a sociedade. Ele estava completamente abatido.

— Estas estradas irão nos levar até ela! Por aqui! — disse o elfo, ofegante.

Eles cavalgavam lentamente por aquelas estradas. Ao chegarem na outra margem da floresta, se depararam com uma pequena casa de madeira escondida entre as árvores. Sua madeira era escurecida, a porta era amarelada e suas janelas eram feitas de vidro comum.

— Bem-vindos à casa da senhora de Aracuqüe! — disse Beyën. — Esta senhora consegue se esconder muito bem! Por que tanto

mistério? — perguntou Alamuc, acariciando sua barba amarronzada. — Ela se esconde para que Cesarem não a encontre! São ordens de

Ilumar! Vai querer reivindicar as suas ordens agora? — perguntou Beyën. — Não! Apenas estava curioso! — Sei muito bem de suas curiosidades. — resmungou Beyën. — Será que ela não está? — perguntou Agäz, batendo diversas vezes na

porta. — Ela deve estar nos campos! Cuidando de alguns animais. — disse

Beyën.

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— Ora! Teremos que esperar ela regressar? Odeio esperar! — bufou Turän, sentando-se em um dos tocos de madeira.

— Não diga isso! Esperar é uma das virtudes mais preciosas que existe. É bom que enquanto nós esperamos, renovamos as nossas forças. — disse Agäz, sentando-se no gramado fresco da floresta.

Enquanto todos estavam conversando, Pedro ouviu uma voz doce e suave que vinha em outra direção. Ele caminhou lentamente em direção àquela voz. Havia uma mulher que estava cantarolando uma canção antiga. Ela estava em um campo repleto de tulipas. Pedro ouvia sua canção atentamente, e, ao mesmo tempo, tentava se aproximar para enxergar a famosa senhora de Aracuqüe. Sua canção era mais ou menos assim.

Doce Ilumar! Doce Ilumar! És para mim a pupila de meus olhos.

Grande é o seu poder, e magnifico é o seu saber. Derrubaste Cesarem, devido ao seu orgulho. Mas agora nos protege, debaixo de suas asas!

Doce Ilumar! Doce Ilumar!

É maior que Cesarem, e vencedor da serpente. Criaste várias águias em seus mundos,

mas somente um, é o senhor delas!

Voa livremente, em busca de um novo horizonte! Onde o sol ressoa, iluminando cada canto do poente,

trazendo vida a todos que o esperam! Doce Ilumar! Doce Ilumar!

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Houve um certo momento em que ela parou de cantarolar. Havia avistado Pedro que estava escondido entre as tulipas. Ela se aproximou do rapaz.

Aparentava ter uns trinta anos de idade. Tinha cabelos longos e escuros, trazendo consigo uma pequena tiara de prata. Seus olhos eram azuis e sua face era rosada. Usava um vestido longo, da mesma cor de seus olhos.

— Estava os aguardando! Mas onde estão os outros? — Todos se encontram na entrada de sua casa, minha senhora! — disse

Pedro, temeroso. — Por que você está com medo? Sabe que não lhe farei nenhum mal. — Há muitos boatos sobre a senhora de Aracuqüe. Eu não a conheço

verdadeiramente. — Boatos mentirosos, eu suponho! Mas tudo bem, logo nos

conheceremos melhor. Ao caminharem em direção à casa, depararam-se com alguns dos anões

que estavam dormindo. Eles estavam exaustos, caminharam longas léguas para chegar em Aracuqüe. Mas logo despertaram. Ficaram impressionados pela beleza daquela mulher.

— Trouxeram o mal para a minha casa? — perguntou a mulher. — Sim, minha senhora! — disse Beyën, seriamente. — Desculpe-me, mas a senhora não nos disse como se chama? —

perguntou Pedro. — Me chamo Miriam Schoënstënt. A senhora de Aracuqüe, como

muitos me chamam! — Conhecemos por outro nome! — resmungou Alamuc. — A feiticeira azulada, não é mesmo? Saiba senhor dos anões, que este

apelido foi dado por Cesarem! — Mas por qual motivo? — perguntou Agäz. — Para colocar medo nos corações dos homens. Muitos fogem de mim,

mas esquecem que eu sou a protegida e que posso defendê-los. Poucos me procuram, preferem enfrentar Cesarem com suas próprias forças do que se refugiarem a mim.

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— Agora entendo as iniciais M.S. daquele embrulho. — disse Pedro, ao entrar naquela pequena casa de madeira.

— Que embrulho? — perguntou Miriam. — Minha Senhora! Pouty lhe devolveu a espada das oliveiras

juntamente com esta carta. Infelizmente, tivemos que abrir o embrulho para lutar com Cesarem. — disse Beyën, sentando-se em um pequeno tronco que estava próximo a mesa.

— E fizeram bem! Onde ela está? Pedro logo tirou-a de sua bainha. A espada estava em chamas quando

entregou para a sua verdadeira dona. — Vejo que Pouty cuidou muito bem dela! Vou guardá-la em seu antigo

lugar. Ao cair da noite, todos estavam exaustos. Poucos puderam

experimentar o sopado de Miriam. Parecia que a fome não estava gritando dentro deles, apenas queriam uma rede para descansar.

O único que não conseguia dormir era Beyën. Ele não conseguia fechar seus olhos segurando aquela pedra. Miriam percebia o sofrimento de seu amigo. Ela o chamou para dentro de sua cozinha. Ambos tomaram um gole de chá verde e comeram algumas torradas.

— Sei que você está sofrendo! Reconheço o peso deste fardo! Mas te peço, Beyën, demonstre para todos um novo olhar.

— Como assim? — Ora, Beyën! Não reparou que todos olham para você com um olhar

de medo? Todos estão temerosos, sem esperança e sem vida! Tente mostrar a alegria que é segurar esta pedra, de responder ao chamado de Ilumar. Olhe para Pedro e para os outros escolhidos! Você acha que eles estão felizes por vê-lo assim? Estão completamente amedrontados, pensando de como será a sua vez!

— É difícil suportar esta dor! A pedra suga todas as minhas forças. — Por isso mesmo! Já está na hora de você parar com esse seu gesto

mesquinho e clamar para que Ilumar lhe dê a força necessária para suportar este

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seu sofrimento. Não é nenhuma novidade meu amigo! Você já carregou esta pedra antes e passou pela mesma experiência. Nada mudou?

— Não posso dar este fardo para Ilumar! Ele confiou a mim. — Admiro sua bravura! E me surpreendo com as suas tolices! — disse

ela, sentando-se em uma cadeira que estava próximo de sua mesa. — Mas saiba, se pedirmos sua ajuda garanto que Ele nos ouvirá. O socorro não desfaz a bravura de ninguém Beyën, pelo contrário, a bravura só é enriquecida quando o socorro é utilizado.

— Está certo, minha senhora! Tentarei ser mais leve com os meus companheiros. — disse Beyën, com um pequeno sorriso em seus lábios.

Durante a madrugada, havia uma outra pessoa que não conseguia dormir. Pedro se levantou e encontrou-se com Miriam e Beyën que estavam conversando na cozinha. Ele carregava consigo a sua charada, com o intuito de ela traduzir aquele enigma.

Ao entregar para Miriam, percebeu que ela conseguia compreender aquelas palavras incompreensíveis que estavam escritas em seu pergaminho.

Zatüron! Zatüron! Com mil montanhas levantou, mas apenas um a governou!

Sobre o trono senta-se um rei! Algo negro se esconde, como uma sombra no horizonte!

Mas lá o encontrará, aquilo que mais desejar. Ao ouvir estas palavras, Pedro sentou-se em uma cadeira e ficou

refletindo sobre o enigma. — Estamos perdidos! — Pedro exclamou. — Como entraremos no

castelo negro para pegar a pedra? Onde ela estará? — Calma! Para tudo tem uma solução. — respondeu Miriam. — Sabemos muito bem que Cesarem não sabe onde está essa pedra. —

disse Beyën.

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— Sim! Então será bem provável que não esteja guardada com Arthur. Pode ser que nem mesmo o rei de Zatüron saiba que uma das pedras esteja em seus domínios. — disse Miriam, tomando um gole daquele chá esverdeado.

— Mas há algo que não consigo compreender! Como que Cesarem não sabe onde se encontram as próprias pedras?

— Não contou a história para os seus companheiros? — perguntou Miriam, olhando diretamente para Beyën.

— Achei que não poderia tocar neste assunto! É algo particular entre os dois.

— Mas você deveria ter contado a eles! — disse Miriam, molhando novamente sua garganta com aquele chá. — É preciso entender uma coisa, muitos acham que Ilumar os abandonou, mas isso não é verdade. Muitas vezes sentimos que estamos só, mas é nítida a sua presença.

— Não consigo compreender. — disse Pedro. — Já ouviu falar do Pactuns de Áquilá? Bom, pelo que vejo ainda não!

Aconteceu alguns anos atrás, antes mesmo de você nascer. Quando surgiu a primeira sociedade da prata, Ilumar sempre nos ajudava, se manifestando inteiramente para nós. Tanto que Beyën chegou a conhecer o Senhor das Águias. Mas Cesarem, sentindo-se incomodado com tudo isso, decidiu bancar o esperto. Ele conversou pessoalmente com Ilumar, expressando a sua indignação. Sabe qual foi o seu pedido?

— Não! — exclamou Pedro. — Foi para que o Senhor das Águias não se manifestasse mais, já que a

missão era confiada inteiramente a nós. — disse Miriam, tomando novamente um gole daquele chá. — Mas o que podemos dizer da sabedoria de Ilumar, sendo Ele o mais inteligente de todas as aves? Ele ouviu o pedido de Cesarem e resolveu aceitar esta oferta, mas com uma condição!

— Qual condição? — Cesarem não poderia mais saber onde estaria a suas pedras. Ambos

fecharam o acordo, e nomearam este dia como o Pactuns de Áquilá, ou como

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queira dizer, o Pacto da Águia. Assim, nunca mais se esqueceram de cumprir seus juramentos.

— E esse juramento está sendo comprido? — perguntou Pedro. — Pela parte de Ilumar sim, tanto é que vocês até hoje não viram o

Senhor das Águias pessoalmente. Mas Cesarem sempre consegue quebrar alguma coisa.

— Um mentiroso! — resmungou Beyën. — Realmente, Cesarem não sabe onde estão as suas pedras. Mas

Sgraünd sempre o informa quando alguém consegue tocar nelas. Por isso, Pedro, quando pegar aquela pedra, saia correndo! Cesarem virá com toda a sua fúria atrás dela e matará aquele que se atrever a tocar em suas pedras.

— Mas como entrarei naquele castelo? Os guardas de Arthur são espertos e têm olhos de águia. Não deixam passar nada e nestas alturas o rei deve estar atrás de mim.

— Tem razão, ele está atrás de você! Mas ele está em desvantagem! A maioria de seus soldados não estão mais em Zatüron. Estão todos cavalgando juntamente com o exército de Cesarem. Destruindo casas e aldeias, dominando algumas regiões de Aldiroön. Por isso, não podemos perder mais tempo, o mal se espalha, mas o bem triunfará sobre este mundo. Amanhã gostaria de lhe entregar algo que irá ajudá-lo a entrar no castelo negro de Rochendar. Bem, senhores, já está bem tarde e amanhã precisamos acordar bem cedo. Boa noite a todos!

Pedro observou que já estava quase amanhecendo. Retornou para o seu quarto, mas não conseguiu dormir. Estava curioso em saber qual seria o objeto que a senhora de Aracuqüe iria apresentar.

Ao amanhecer, todos estavam mais dispostos para enfrentar a longa jornada. Os únicos sonolentos eram Pedro e Beyën que mal conseguiram descansar. Todos estavam curiosos em saber qual seria o próximo destino. Os anões ficavam perguntando se já haviam revelado aquela charada, mas ninguém chegou a dar muita atenção a eles.

Pedro dirigiu-se até o quarto de Miriam. Ela estava sentada em sua cama, olhando atentamente para um colar que estava esticado sobre o colchão.

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— Quero entregar este colar para você! Talvez você nunca tenha ouvido falar dele, mas há outras criaturas que o conhecem muito bem.

— O colar das sete estrelas do oriente! — exclamou Pedro. — Isso! Já ouviu falar dele? — Apenas em contos e canções! Mas não conheço o seu poder. Ele era feito de pedras azuis e brancas. Parecia que suas pedras não

pertenciam a este mundo. Havia sete pedras engajadas sobre o colar. Ele era banhado a ouro. Suas correntes eram finas e brilhavam como espelhos ao sol.

— Ele é seu! — disse Miriam. — Meu? Mas por que eu deveria usá-lo? — Este colar foi me dado de presente pelo próprio Ilumar! Garanto que

o ajudará a entrar no castelo de Rochendar. — E o que ele faz? — perguntou Pedro, enquanto abria o fecho do colar. — Coloque-o que você verá! Pedro sentiu um certo temor em colocar aquele colar. Ele não gostava

muito de objetos mágicos ou coisas parecidas. Preferia não se envolver com nada que estivesse relacionado à magia. Mas Miriam insistiu. Pedro colocou aquele colar em seu pescoço e percebeu que nada havia mudado. Andou sobre o quarto e nada acontecia.

— Minha Senhora! Está quebrado. Não consigo notar nenhuma diferença estando com o colar.

— Tem certeza disso? — perguntou Miriam, sorridente. — Sim! Nada mudou. Consigo enxergar nitidamente o sol sobre as

montanhas, a cama de madeira e até mesmo o espelho. — É mesmo? E o que você vê no espelho? Era algo inacreditável. Pedro caiu no chão de susto em se deparar com o

espelho. Percebeu que sua imagem não era refletida. Parecia que o quarto estava vazio, dando apenas para refletir os objetos que estavam sobre um pequeno armário de madeira.

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Miriam não conseguiu enxergá-lo. Ela não presenciou a expressão de sua face. Pedro rapidamente tirou aquele colar, devolvendo espontaneamente para a sua verdadeira dona.

— Não posso ficar com ele! É demais para mim. — Então lhe emprestarei para que você consiga passar entre os guardas.

Estando invisível, ninguém irá impedi-lo de pegar a pedra. — Nem mesmo Cesarem? — perguntou Pedro. — Muito menos Cesarem! Ele jamais poderá o ver! Foi para isso que

este colar foi feito. Lembra que lhe contei que Cesarem sabendo onde estava as suas pedras, ele corria para a nossa direção com o intuito de nos deter?

— Sim! — afirmou Pedro. — Então! Foi para isso que Ilumar me deu este colar. Para que Cesarem

não viesse com suas surpresas e com seus truques baratos. Esse colar nos ajudou muito a resgatar algumas pedras.

— Inacreditável! — disse Pedro, segurando aquele colar. — Mas tenha cuidado! Cesarem não poderá vê-lo, mas, se estiver

segurando uma de suas pedras, creio que ele o verá e o matará sem piedade. Por isso, resolvi acompanhar vocês nesta jornada. — disse Miriam. — Mas, antes, gostaria de te pedir um favor!

— O que quiser, minha senhora! — Poderia guardar a minha coroa dentro de sua mochila! — disse ela,

retirando aquele objeto de sua cabeça. — Foi dada pelo próprio Ilumar, e não posso perdê-la enquanto estiver com vocês.

— Ficará segura, minha senhora! — disse Pedro, guardando em sua mochila.

Ao voltarem para a sala, imediatamente começaram a rever os planos. Era preciso discutir o modo deles entrarem em Zatüron, sem serem apreendidos. Beyën e alguns elfos ficaram mais aliviado ao saberem que Miriam iria acompanhar nesta jornada. Os anões foram os únicos a discordar. Todos eles estavam rabugentos.

Enquanto todos selavam seus cavalos, Miriam aproximou-se da gaiola onde estavam os vampiros. Ela olhava profundamente para cada um deles.

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— Antes mesmo de chegar a Zatüron, é necessário que libertemos estes vampiros!

— Mas por quê, minha senhora? — perguntou Radnör. — Sei que eles cometeram crimes bárbaros, mas não pode nos

acompanhar desta maneira! Um está indo de bom grado, mas o outro, por pura obrigação. Quem somos nós para interferir em sua liberdade?

— São todos criminosos. Não podemos soltá-los! — disse Alamuc. — Concordo! Eu sei que eles são criminosos. Mas eles não precisam nos

seguir desta maneira. Aliás, eles já estão pagando pelos seus atos. Ser um vampiro mestre anão, é o pior castigo que Cesarem pode oferecer! A pessoa não tem mais liberdade para nada, apenas o de servir ao seu mestre. — afirmou Miriam, tocando nas grades de ferro.

— É uma atitude meio tola! Mas creio que a senhora tenha razão! Não podemos levá-los desta maneira. — exclamou Eleönora.

— Devemos soltá-los agora? — perguntou Radnör. — Não! Agora não é o momento. Conversaremos sobre isso no

caminho. Vou precisar de um certo tempo para que tudo fique esclarecido. — disse Miriam.

Miriam subiu em seu cavalo e partiu juntamente com a sociedade da prata, para as terras de Zatüron. Ao se distanciarem das montanhas de Aracuqüe, presenciaram um belíssimo sol de primavera. Sua luz tocava levemente a todos os que cavalgavam naquela estrada deserta. Havia gramados em sua volta e árvores que cobriam boa parte da floresta.

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o cavalgarem algumas léguas, podiam-se ouvir os cochichos dos anões. Eles falavam que queriam logo descansar. Todos estavam longe de Aracuqüe e sequer perceberam que estava anoitecendo.

— Que região seria esta? — perguntou Treno. — Não faço a menor ideia! — disse Beyën. Miriam olhou para o horizonte. Havia diversas montanhas. Todos

olhavam para elas, reparando na quantidade de aves que sobrevoavam aquela região.

— As montanhas de Karëny! — exclamou Miriam. — Por que há tantos corvos sobre a montanha, minha senhora? —

perguntou Treno. — Essas montanhas abrigam diversas aves! Sua floresta é muito extensa. — Teremos que entrar novamente em uma floresta? — perguntou

Petrus, olhando para a montanha. Miriam acenou com a cabeça. — Sei que os elfos e os homens gostam de andar na floresta. Mas nós

não estamos tão acostumados assim. Vivemos nas profundezas das cavernas, com o nosso ouro e a nossa prata. Algumas vezes escalamos montanhas mas evitamos as florestas. — resmungou o anão.

— Bom! Espero que esta missão o ajude a tomar gosto pelas matas. — disse Radnör, com um certo tom de ironia.

— Bem! Bem! — exclamou Beyën, com um tom de voz que parecia estar separando uma briga. — Entraremos novamente na floresta, mas não nesta noite. As matas são perigosas, e a esta hora, poderemos encontrar seres que não estão a nosso favor. Iremos acampar na entrada da floresta. Pelo menos lá conseguiremos enxergar as árvores com a ajuda do brilho do luar.

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Ao se aproximarem da entrada da floresta, encontraram diversas árvores. Seus troncos eram gigantescos. Pareciam pequenas formigas comparadas às longas raízes ostentadas pelo chão.

— Bem-vindos à floresta das quatro rosas do oriente! — disse Miriam, com um ar sorridente.

— Inacreditável! — exclamou Pedro, olhando ao seu redor. — Nunca tinha visto estas árvores.

— Nem eu mesmo sabia delas! — afirmou Beyën. — Essas árvores são raras mesmo. Devem medir uns cinquenta metros,

senão me engano! — disse Miriam, se aconchegando próximo de uma delas. — Bem, ficaremos aqui esta noite! Amanhã a conheceremos melhor.

Preciso que alguém encontre um pouco de lenha para fazermos uma fogueira. — disse Beyën.

— Eu ficarei responsável pela caça! Estou morrendo de fome. — disse Alamac, segurando fortemente o seu machado.

— Eu irei acompanha-lo na caça. — afirmou Eleönora. — Muito bem! Radnör e Mirgän, por favor, encontrem lenha para nós!

Assim ficaremos mais quentes até o amanhecer. Alguns dos anões estavam quase dormindo quando a fogueira foi acesa.

Beyën estava em um lugar distante, sentindo os mesmos tormentos de antes. Ele segurava fortemente aquela pedra, esperando que as dores cessassem.

Miriam estava próxima da jaula dos vampiros. Ela caminhou em direção a eles, como um vento entre as cinzas. Seu olhar era impactante. Por diversas vezes, Jack tentava desviar-se para não ser interrogado.

— Estão preparados para serem soltos? — A senhora irá nos libertar? — perguntou Tony, surpreendido. — Não vejo o porquê de vocês estarem presos. Não posso obrigá-los a

nos seguir. — disse Miriam, serenamente. — Além do mais, imagino que estas grades de ferro estejam machucando vocês.

— A senhora sabe que odiamos os ferros! Sequer podemos tocá-los. — afirmou Tony, enfurecido.

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— Eu sei! Eles queimam profundamente a pele de um vampiro. — Então nos solte! — exclamou Tony. — Sim, eu irei! Mas antes preciso falar com seu amigo. Jack franziu as sobrancelhas. — O que a senhora quer comigo? — Antes de soltá-lo, quero que você saiba de uma coisa! Você não está

aqui por acaso. Ilumar o escolheu para que pudesse pegar a última pedra da perdição, que está nas cavernas de Algün. Creio que você já viu aquela pedra!

— Tem razão, eu já a vi! Mas por que a mim? Eu sou um assassino,

merecedor de sua fúria! — Ilumar é justo e misericordioso! Agora, em se tratando de escolhas, é

um mistério que será difícil decifrar. — disse Miriam. — Saiba de uma coisa! Eu não lhe peço para nos seguir, muito menos em troca de sua liberdade. Mas peço a você, que coloque a mão em sua consciência e faça aquilo que seu coração esteja lhe dizendo.

— Vampiros são ocos! Não consigo sentir meu coração! — Não consegue ouvir nada? — Sinto que preciso ficar com vocês... devo proteger Eleönora. Sei que,

se retornarmos também, Cesarem irá nos matar por traição. Eu ajudei a sociedade a escapar da caverna de Tiurän, avisando a todos que o mago negro estava por vir.

— Compreendo! Seu coração palpita aceleradamente quando Eleönora está por perto. Isso você não pode me negar, não é verdade?

— É verdade! Desde a primeira vez que a vi, não consigo tirar meus olhos dela. Parece que há algo nela que me traz toda a felicidade. Entende?

— Claro que sim! — exclamou Miriam. — Mas estaria disposto em enfrentar o perigo para resgatar a última pedra da perdição?

— Não tenho nada a perder! Apenas quero sair desta gaiola insuportável.

Miriam estava com a chave na mão. Ela se dirigiu até a fechadura para abrir a cela onde os vampiros estavam presos.

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Finalmente puderam sentir o doce frescor da liberdade. Todos eles se transformaram em grandes morcegos que sobrevoavam ao redor da floresta.

Beyën ficou inteiramente preocupado em saber que seus prisioneiros estavam soltos. Todos os anões reclamavam da atitude de Miriam. Turän ficou colérico quando avistou os vampiros sobrevoando aquele céu escurecido. Todos começaram a discutir. Foi difícil debater com os anões, parecia que eles estavam com a voz da razão. Alamuc tentava acalmar seus companheiros, mas era difícil manter o controle. Turän gritava a todo momento, dizendo que os vampiros iriam procurar Cesarem para revelar os segredos da sociedade.

Jack apareceu novamente. Ele trazia consigo uma rosa azul que havia recolhido na floresta. Parecia que ele estava sozinho, não se via Tony sobrevoando a floresta.

— Para você, minha dama! — disse Jack, se transfigurando na fisionomia de um homem.

— Para mim! — exclamou Eleönora. — O que fiz para merecer este gesto tão nobre?

— Não precisa de gesto algum para ganhar uma flor! Apenas fico feliz em ver um sorriso em seus lábios.

Ao olhar novamente para a flor, Eleönora percebeu que suas pétalas haviam mudado de cor. Estavam avermelhadas, expelindo um diferente odor em seu perfume.

— Onde você conseguiu essa rosa? — perguntou Eleönora. — Bem no centro da floresta! Havia quatro delas, então resolvi pegar

uma para você. — Não acredito! — exclamou Miriam completamente espantada. —

Você pegou uma das quatro rosas do oriente? Agora teremos que chamar esta floresta de três rosas do oriente!

— Então, terei que devolvê-la para a floresta. — Sossegue, meu rapaz, estava apenas brincando! Nascerá uma nova

rosa em seu lugar. Muitos rapazes já pegaram diversas vezes esta rosa do oriente, e sempre nasceu outra em seu lugar.

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— E por que a rosa muda de cor? E de cheiro? — perguntou Eleönora. — Muitos dizem que a rosa muda de aparência devido ao sentimento

que a pessoa carrega. Como é você que está segurando, a rosa transmite aquilo que você está sentindo.

— E o que o vermelho simboliza? — perguntou ela novamente. — Amor! Simplesmente amor! Eleönora ficou sem palavras naquele momento, apenas esperou que

uma nova conversa pudesse ressurgir novamente. Turän aproximou-se do vampiro e jogou-o no chão. Todos ficaram

espantados com esta atitude. Ninguém sabia o verdadeiro motivo que o levou a fazer isso.

— Escute aqui, seu vampiro imundo, eu não permito que você venha com estas intimidades com a minha irmã! Você não passa de um assassino maldito!

— Chega! — gritou Eleönora, enfurecida. — Ele está querendo apenas se retratar. Deixe o vampiro em paz, está me ouvindo?

— Ele é um criminoso, Eleönora! Um vampiro que logo sugará seu sangue! São criaturas traiçoeiras e perversas.

— Basta Turän! — gritou Beyën. — Não podemos condenar este homem. O que ele fez, cabe a Ilumar o julgar. E digo mais, vocês serão muito bem-vindos à sociedade da prata estando agora em liberdade.

— Mas, meu pai... — Já disse, Turän! Eu sei o que estou fazendo. — gritou Beyën. Turän saiu enfurecido de perto deles, sentando-se próximo de Mirgän e

de Rianckÿ que estavam longe daquela discussão. — E Tony? Ele ficará conosco? — perguntou Agäz. — Tony percebeu que Cesarem está querendo mata-lo! Mesmo assim

foi difícil de convencê-lo a ficar conosco. Sabe como ele é, orgulhoso como sempre. — respondeu Jack. — Logo ele irá aparecer.

— Que seja! — exclamou Miriam. Todos estavam em volta da fogueira se aquecendo contra o frio. Miriam

aconselhou a todos para que descansassem o máximo possível, já que haveria um

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longo caminho a ser percorrido. Jack e Eleönora não conversaram mais depois daquele imprevisto.

Tony regressou de seu voo. Ele aconchegou-se em volta da fogueira para escapar do frio. Turän preferiu ficar afastado de todos. Ele ainda continuava irritado pela libertação dos vampiros. Todos estavam dormindo tranquilamente enquanto Pedro se contorcia no chão.

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edro estava tendo um pesadelo. Ele via um homem com vestes negras, tentando convencê-lo a desistir daquela loucura. Ouvia vozes e gritos. Havia diversas aranhas que estavam ao

lado deste homem. Pedro se sentiu ameaçado quando olhou para elas. Seu pavor era tão grande que o fez despertar.

Pedro estava assustado. Seu coração estava prestes a sair pela boca. Sua respiração estava ofegante. Ele se levantou e ouviu uma voz que vinha do horizonte. Era doce e suave, cantarolava uma canção completamente diferente. Era mais ou menos assim.

Doce arco íris, sobre as montanhas aparecestes,

Pétalas preciosas das flores de aurora, Traga até a mim, a joia mais preciosa,

A quem eu tanto quero para a minha vida que se aflora.

Desejo aquele a quem me prometestes, Sendo ele o mais belo dos homens, Para assim a minha vida eu andar,

E com certeza, ao meu Senhor eu agradar. Aquela foz era magnânima. Parecia que o som ressoava sobre as árvores.

Tomando-se de coragem, seguiu aquele som impactante, atrevendo-se a andar sobre a floresta.

Ao caminhar alguns metros, encontrou uma pequena cachoeira de águas cristalinas. Havia algumas rochas em sua volta. Sobre elas estava sentada uma mulher, vestida de linho branco e de cabelos encaracolados da cor dos

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girassóis. Ela brilhava como uma estrela cadente. Suas bochechas eram rosadas e seus olhos eram azuis.

Pedro se aproximou dela. A moça logo parou de cantar. — Ora! Vejo que o meu senhor me trouxe o homem a quem tanto

procurava! — Quem é você? — Não importa saber quem eu sou! Apenas gostaria de experimentar

um beijo seu. Será que terei essa honra? Pedro franziu as sobrancelhas e respirou profundamente. — Claro que sim! Diante de tanta beleza, meu coração disparou no

momento em que a vi. — Que galanteador é você! Gosto de homens que exibem seus

sentimentos. Mas antes, gostaria de saber algo que está em segredo? — Se está em segredo, por que revelar? — perguntou Pedro se

aproximando da jovem. — É algo que irá agradá-lo! — respondeu a mulher. Pedro deu um leve sorriso e voltou a respirar profundamente. Ele não

parava de olhar para os olhos da jovem. — Então me diga! — Já ouviu falar de Jack? Um vampiro sanguinário

que adora devorar os pescoços dos homens? Pedro começou a ficar sério. Seu olhar era frio e amargo. — Nem me fale deste nome! Aquele desgraçado acabou com a minha

vida. Ele matou a minha mulher e denunciou-me a Cesarem! O mago arrancou sem piedade a vida da minha filha.

— Este mesmo! Sabia que ele está próximo de você? — disse a mulher, passando os seus dedos sobre a boca.

— Como assim? — Jack é o vampiro que trouxe a rosa para Eleönora! O outro vampiro

se chama Tony, um tolo, podemos dizer assim. Mas o seu querido Jack está lá, dormindo quase perto de você. Como você não percebeu isso?

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Pedro entrou em um estado de cólera. Seu coração palpitava sem parar, deixando a sua respiração ainda mais ofegante. Ele retirou a sua espada da bainha para ir ao encontro do assassino de sua esposa. A mulher segurou em seu braço, impedindo que ele retornasse para a entrada da floresta.

— Você se esqueceu de uma coisa. E o meu beijo? — Como pode pensar em beijos? Estou ao lado do assassino de minha

esposa! — Eu sei disso e compreendo a sua dor! Mas quero receber a minha

paga. — Não sei se devo. Mal nos conhecemos! — Ora! Deixe de bobagens! Apenas me beije e estará tudo resolvido. Pedro estava a um passo de satisfazer o desejo daquela mulher. Seus

lábios estavam quase próximos aos dos dela, sua respiração estava ofegante e seus olhos brilhavam diante de sua beleza.

De repente, pôde-se ouvir um ruído sobre a mata. Parecia o rugido de um leão selvagem que estava solto na floresta. Ele corria rapidamente para a sua direção. Novamente, o tigre de bengala apareceu entre as matas. A misteriosa mulher agarrou o pescoço de Pedro, temendo aquele animal.

Ouviam-se também várias vozes no meio da floresta. Eleönora estava chamando-o. Pedro gritava o nome dela, dizendo que estava próximo à cachoeira. De repente, uma flecha veio em sua direção, atingindo um dos troncos que estavam próximos aos pedregulhos. Pedro não entendia nada.

A mulher começou a sair correndo em direção às matas que cobriam a floresta. O tigre desapareceu de suas vistas, dando a impressão de que estava atrás daquela mulher. Beyën aproximou-se de Pedro e deu-lhe uma bofetada.

— Está louco? Você sabe com quem estava falando? — Com uma mulher perdida na floresta! — respondeu Pedro. — Como pode ser tão tolo assim? — gritou Beyën. — Aquela mulher

era uma fada, seguidora de Cesarem. — Fada? Como assim? Ela estava vestida de branco? Tão forte era o seu

brilho que parecia uma estrela que tinha caído sobre a terra!

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— Elas fazem isso mesmo só para enganar os homens! São loucas por um beijo, mas entre os seus lábios se esconde um veneno mortal. A única coisa que elas desejam é a morte dos homens.

— Espero que o tigre consiga pegá-la! — exclamou Eleönora. — O que ela queria? — perguntou Radnör. Pedro lembrou-se daquela conversa. Ele saiu correndo em direção à

entrada da floresta. Ninguém entendia o que estava acontecendo, apenas correram atrás de Pedro para tentar esclarecer.

Jack estava deitado próximo à fogueira. Ele acordou rapidamente quando sentiu ser arrastado pelo pescoço. Pedro dava diversas bofetadas no rapaz. Seu sangue escorria pela relva, deixando a todos preocupados perante aquela situação. Muitos tentavam segurar Pedro pelos ombros, mas era difícil agarrá-lo. Sua raiva era imortal.

— Maldito! Seu vampiro imundo! — gritou Pedro. — Você matou a minha esposa e a minha filha, não matou?

Pedro jogou Jack no chão. Ele bateu a cabeça em um dos rochedos que estavam próximos de uma árvore. Seus cabelos estavam repletos de sangue, era nítido de se ver o ferimento. Jack não reagiu em nenhum momento. Ele sabia muito bem das acusações que lhe estavam sendo dirigidas. Tony tentou defender seu amigo, mas a força de Pedro era ainda mais duradoura.

— Eu vou te matar seu maldito! — gritou Pedro, tirando consigo a sua espada que estava em sua bainha. — Confesse que as matou!

— Já chega, por favor! — gritou Eleönora. — Eu vou refrescar sua memória, seu imundo! — gritou Pedro,

segurando o vampiro pelo colarinho. — Minha esposa chamava Ana e foi assassinada por um ser desconhecido. Quando a encontrei, ela estava pálida sem sangue algum, com marcas de mordidas em seu pescoço. Quando Yën foi me visitar ele citou o seu nome, falando-me que você foi o responsável pela morte de minha esposa. Já a minha filha, você foi até a caverna de Cesarem para falar com ele e disse que Ilumar havia me escolhido. Degälion veio em nossa casa e matou sem piedade a minha filha!

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— Eu não sabia o que estava fazendo! Fui obrigado a fazer tudo isso! — gritou Jack.

— Eu jurei perante o corpo de minha esposa que me vingaria de sua morte. — gritou Pedro com sua espada na mão.

— Não permitirei que faça isso, Pedro! — exclamou Eleönora. — Deixe de ser tola! O sangue dessas criaturas precisa escorrer sobre

esta terra. — gritou Alamac. — Se você quiser eu posso ajudá-lo! — disse Turän, segurando sua

espada. — Eu devia ter deixado Eleönora mata-lo naquele primeiro dia em que

o encontrei. Como fui tolo! — gritou Pedro. — Basta! Afastem os dois! — gritou Miriam, pedindo para que os

centauros os separassem. Dificilmente, conseguiram afastar os dois daquele momento. Jack estava

todo machucado devido às pancadas recebidas de seu agressor. Pedro estava colérico naquela noite, parecia que nada o acalmava.

De repente, uma fumaça negra passou pelas suas costas. Pedro ouvia diversas vezes uma voz que parecia uma brisa no horizonte. Seu desejo de vingança aumentava a cada momento após ouvir aquela voz. Sua respiração estava cada vez mais ofegante e suas mãos suavam sem parar.

— Mate-o! Mate-o, Pedro! — dizia a voz. — Fraco! Não é capaz de vingar a morte de sua própria esposa?

Miriam e os dois vampiros escutavam nitidamente aquela voz. Eles sabiam muito bem de quem se tratava. Miriam tirou a espada das oliveiras de dentro da bainha. Ela estava em chamas.

— Apareça, seu covarde! — gritou Miriam. — Quer ser a guerreira aqui? Eu sei que você uma medrosa. Por isso que

Ilumar a protege. — disse Cesarem aparecendo-se diante a todos. — Você continua sendo um tolo, não é mesmo Cesarem? O que faz

aqui? — perguntou Miriam. — Apenas quero o que me pertence! A pedra verde das esmeraldas. Miriam franziu as sobrancelhas.

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— Ah! Eu não disse que você continua sendo um tolo. Cesarem caminhou em direção de Pedro. — Vamos, Pedro, vingue-se! Será que você não é capaz de ser um

homem de verdade? — Cale-se! — gritou Miriam, enfurecida. — Não dê ouvidos a esta

criatura Pedro. Ele só quer te enganar. — Enganar? Quem será que está enganado vocês? — respondeu

Cesarem olhando para os vampiros. — Mostre para eles que você é um homem de fibra e de coragem, e não um tolo que dá ouvidos a uma mulherzinha que se banca a regente desta sociedade! Vamos, vingue-se!

— Ele me enganou! Me fez fazer tudo isso! — gritou Jack. — Ora! Faça o favor, Jack! Você fez isso porque era de seu agrado. Em

nenhum momento o obriguei a fazer nada. Não me venha bancar o coitadinho nesta hora! — disse Cesarem. — Vamos Pedro, mate-o!

Pedro estava completamente dividido. De um lado, sua ira estava gritando desesperadamente pelo sangue daquele vampiro. Mas, do outro, ouvia sigilosamente a voz de Miriam que tocava profundamente a sua razão. Suas mãos estavam completamente suadas, ele precisava tomar uma decisão rapidamente. Ouvindo a voz da razão, Pedro mirou sua espada em direção a Cesarem para atacá-lo.

— Ah! Como você é tolo, Pedro. Morre de medo de enfrentar um vampiro inofensivo! — disse ele com um tom de ironia. — Oh! Acabei esquecendo, você tem medo de uma simples aranha, não é mesmo?

— Vai embora! Seu maldito. — gritou Pedro. — Só irei embora, com minha pedra! — disse Cesarem acariciando o

seu cajado. — A propósito! Como está conseguindo sobreviver com minha pedra, Beyën? Está gostando de ser torturado por ela?

Cesarem começou a rir diante de Beyën. Todos repararam naqueles dentes podres e encardidos. Miriam não conseguia mais suportar a sua presença. Ela levantou a sua espada em direção ao céu e pronunciou um palavreado que somente Cesarem conseguia compreender.

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— Lux Gládio. Sua espada emitiu uma forte luz ofuscante que iluminou toda a floresta

escurecida. Era tão forte aquela luz que parecia que a terra estava tremendo. Todos conseguiram fechar rapidamente os seus olhos, exceto Cesarem que caiu de costas. Ele não suportava aquela luz que saía da espada. Cesarem se transfigurou em uma fumaça negra e fugiu para o norte.

Ao passar o efeito da luz, Miriam correu em direção a Pedro e fez com que ele soltasse rapidamente de sua espada.

— Sei que você está bravo com Jack! Ele pode ter errado, sim, mas acredito que mereça uma segunda chance!

— Chance? Ele deu chance para a minha mulher e para minha filha? — perguntou ele, com um certo olhar de desprezo. — Escute aqui! Em respeito a Miriam e a Eleönora eu não lhe farei mal algum. Mas tenha a certeza de que nunca terá o meu perdão! Você terá de mim apenas o meu desprezo.

Jack ficou sem reação naquele momento, não sabia o que dizer para ele e para todos da sociedade. Apenas ficou calado diante de sua culpa e envergonhado perante aqueles que estavam a sua volta. Tony ficou ao lado de seu amigo. Ele tentou convencer Jack de fugir para o norte, mas ele resolveu ficar. Não podia desfazer o trato que havia feito com Miriam.

Eleönora pensou em falar com ele, mas achou melhor que ele descansasse um pouco. Miriam acalmou a todos que estavam eufóricos.

— Agora que já passou o pior! Vamos todos dormir para que consigamos chegar em perfeito estado às terras de Zatüron! — disse Miriam.

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o início do amanhecer, antes do sol surgir sobre as montanhas, Miriam chamou a todos para se levantar, já que era preciso continuar a cavalgar em busca da segunda pedra. Todos

estavam meios sonolentos devido a confusão que aconteceu na noite anterior. Dormiram tão tarde que sequer sentiram o prazer de descansar. Mas era preciso sair rapidamente. Eles não podiam ficar na floresta até o anoitecer. Poderia ser perigoso, já que Cesarem sabia onde estavam.

Todos cavalgaram, passando por diversos obstáculos que encontravam pelo caminho. Era preciso ter um maior cuidado, já que havia fadas escondidas na floresta.

Estando eles próximos do castelo de Rochendar, decidiram descansar um pouco. Eles se acomodaram em um pequeno gramado que ficava ao lado de um córrego estreito. Todos daquela cidadela sabiam que a floresta das quatro rosas do oriente daria de frente para a cidade de Zatüron. Diversos guardas ficavam de vigia sobre os muros da cidadela. Eles não permitiam que nenhum estranho passasse por aqueles portões.

Miriam observava cada movimento dos guardas. Ela estava escondida atrás de uma árvore que dava de frente para os portões da cidadela.

Ela retornou e chamou a todos que estavam próximos do córrego. — Preciso que vocês fiquem aqui! Somente Pedro irá comigo. — Ora essa! Agora uma mulher quer mandar em nossa sociedade! —

retrucou um dos anões. — Não quero mandar em nada! Apenas espero que vocês compreendam

que não podemos falhar! Se todos nós entrarmos na cidadela, seremos capturados. — afirmou Miriam.

— Nem mesmo a mim? — perguntou Beyën.

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— Muito menos você! Você está segurando uma das pedras, não conseguiria lutar sendo torturado por ela. Apenas Pedro e eu! — reforçou-a segurando os ombros de Beyën.

— E posso saber como irão entrar no castelo? — perguntou Alamuc. — Acredite! Se eu ficar aqui lhe explicando tudo o que planejo, não

entraremos esta noite. A noite estava próxima, o sol estava adormecendo e a lua começa a

pairar sobre o céu. Pedro e Miriam cavalgavam em direção ao castelo, ultrapassando todos os arbustos que encontravam no caminho. Ela estava revestida com uma capa azul, cobrindo literalmente todo o seu corpo.

Ao se aproximar-se dos portões da cidadela, Miriam pediu para que Pedro amarrasse seu cavalo e continuasse a cavalgar juntamente com ela. Quando estava prestes a subir, foi interrompido pela senhora de Aracuqüe.

— Quero que saiba de uma coisa antes de entrar naquele castelo! Primeiramente, é preciso que você saiba do poder que tem este colar. Como você já sabe, ele te deixa invisível até mesmo diante de Cesarem. Mas quero que fique atento a algo que irei lhe dizer. O colar não imune você enquanto estiver com a pedra!

— Como assim? — Quero dizer que... enquanto estiver com a pedra, todos poderão

enxergá-lo! Por isso, quero lhe pedir uma coisa. Fuja o mais rápido possível quando encontrar a pedra. Cesarem será informado por Sgraünd e irá atrás de você!

— Não se preocupe, conseguirei trazê-la com os devidos cuidados! — disse ele, corajosamente.

— Assim espero! Você não sabe o fardo que irá carregar. Quando segurar aquela pedra, lembre-se de coisas boas que aconteceram em sua vida. — disse Miriam. — Não quero assustá-lo de forma alguma, mas é preciso que você saiba o que está por vir. Magia das trevas, sempre serão das trevas!

— Eu tenho coragem! Eu quero arriscar! Pela minha esposa e pela minha filha. Eu quero acabar com o mal deste mundo!

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— Eu sei disso! Sei também que tem coragem, senão teria negado o chamado de Ilumar. — disse Miriam. — Saiba de uma coisa, todos os que são chamados por Ilumar e que aceitam com bravura, recebem gratuitamente o dom da coragem! O Senhor das Águias sabe muito bem que seus escolhidos necessitarão dela e somente ela poderá mover suas criaturas! E você possui esta coragem! Agora coloque o colar e lembre-se do que lhe disse!

— Mas, minha Senhora, o castelo é imenso! Onde irei procurar a pedra? — Não serei capaz de responder esta pergunta, mas quero que fique

atento às pequenas manifestações que acontecerão naquele castelo! Tenha a certeza que Ilumar irá lhe mostrar o caminho certo. Apenas confie!

Ao colocar o colar, Pedro tinha desaparecido como uma fumaça que se apluma para o horizonte. Ele estava invisível, incapaz de ser observado por qualquer criatura. Estando eles de frente aos grandes portões de Zatüron, encontraram dois guardas que estava na entrada. Todos eles estavam armados. Um dos guardas segurava uma longa espada afiada, enquanto o outro segurava o seu arco.

— Onde você pensa que vai? — perguntou um dos guardas. — Estou indo visitar o nosso rei! Onde mais eu iria? — De onde você é? — perguntou ele novamente. — Venho de terras longínquas, onde suas montanhas são famosas e suas

terras são árduas no plantio. Apenas gostaria de conhecer o famoso castelo negro de Rochendar e se possível o nosso rei!

— Sua majestade está bem ocupado e não tem tempo para receber camponesas como você! — disse novamente o mesmo guarda.

— Deixe-a passar! A ordem era para barrarmos elfos e anões e não uma humana. — disse o outro guarda que estava encostado nos muros da cidade.

— Mas você não acha estranho? A essa hora da noite querendo entrar na cidadela?

— Por acaso ela tem aparência de ser perigosa? Deixe a donzela entrar e não crie confusão! — respondeu o guarda.

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— Muito bem! Você tem a nossa permissão para entrar na cidadela! — respondeu o primeiro guarda com uma voz irônica e zangada. — Mas nada de importunar o nosso rei! Ele já está cheio de problemas para resolver!

Pedro sentiu um certo alívio em poder passar pelos portões Zatüron. Miriam estava ciente de que não podiam demorar. Alguém poderia descobrir que ela era a senhora de Aracuqüe.

Ao cavalgar lentamente sobre aquelas ruas, sentiram um certo arrepio. Parecia que o vento não estava ao seu favor. Miriam virou o seu rosto para trás e cochichou algumas palavras.

— Cesarem está aqui! Eu consigo senti-lo e garanto que ele também me sentirá. Por isso, não demore. Procure o mais rápido possível esta pedra, para logo partirmos daqui.

Enquanto estavam se aproximando do castelo, ouviam-se alguns rugidos que pairavam sobre o ar. Miriam olhou para o céu e avistou diversos demäuros que sobrevoavam com seus dragões em volta do castelo. Eles eram criaturas extremamente cegas perante a noite não conseguiam avistar nada sem o auxílio de seus dragões.

Miriam conseguiu passar pelos portões do castelo. Não havia guardas naquela noite e os dragões não conseguiram sentir o seu cheiro. Ambos desceram de seu cavalo. Miriam segurou fortemente a sua espada e andou alguns passos em direção à escadaria principal.

— Procure o mais rápido possível a pedra! Não sei se conseguirei distraí-los por muito tempo.

— Minha Senhora! Não pensa em enfrentá-los? Pensa? — Tentarei distrair Arthur e Cesarem, enquanto isso corra e encontre

logo a pedra! — disse Miriam, arrastando consigo sua capa azul. Pedro correu em direção ao castelo. Ao andar pelo salão principal,

encontrou-se com o rei sentado sobre o trono da justiça. Ele segurava um pequeno pedaço de pergaminho antigo, tentando compreender as míseras palavras que estavam escritas.

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Pedro ficou irritado ao vê-lo sobre o trono de ouro. Ele pensou em matá-lo com sua espada, mas era preciso percorrer todo o castelo para encontrar a tal pedra, antes mesmo de Cesarem aparecer.

Ele procurou em todos cantos. Salas e quartos foram revistados, mas nada foi encontrado. Era impossível de encontrar aquela pedra. O castelo era imenso, havia inúmeros lugares que ainda precisavam ser investigados. Pedro correu de um lado para o outro. Atravessou diversos salões cobertos de seda, com longos tapetes persas a sua volta. Após tanto procurar, Pedro se sentou em um banco de madeira que estava no corredor do castelo. Ele olhava de um lado para o outro, pensando onde mais poderia procurar aquela pedra.

Mas algo de incrível aconteceu. No final do corredor, havia algumas luzes que piscavam sem parar. Pedro ficou curioso e seguiu em direção a elas. Ao passar pelos salões, encontrou diversos vagalumes que piscavam sem parar. Eram insetos gigantescos, pareciam besouros que voavam em torno do castelo. Pedro não tinha medo deles. Ele admirava aquelas criaturas que iluminavam durante a noite. De repente, aqueles insetos se aglomeraram entre si e sobrevoaram em direção ao corredor principal.

Pedro seguiu aqueles insetos. Ele desceu os estreitos degraus de pedra em espiral que se encontrava próximo a adega.

O frio habitava naquele lugar escuro e esquecido por todos. Ao descer o último degrau, pôde ouvir alguns murmúrios que ecoavam aquele lugar.

Ele estava nas masmorras do castelo, cercado de amplas grades de ferro e com algumas tochas que iluminavam aqueles longos corredores. Ao andar por cada canto da escuridão, escutava-se uma voz diferente. Pedro parou por alguns segundos para ouvir aquela voz.

— Olhem quantos vagalumes há neste lugar! Será que estão fugindo de algo? — perguntou uma voz delicada, vindo ao norte daquele calabouço.

— Talvez querem fugir do frio ou nos fazer companhia! — disse uma outra voz que parecia ser de uma senhora. — Diante deste frio, fico totalmente preocupada com o Radnör! Será que ele está bem?

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— Ele está bem! Não se preocupe com ele. Apenas me entristeço de não vê-lo mais em meus braços.

Pedro correu em direção à jaula, tirando o colar de seu pescoço. Ao encontrá-los, deparou-se com uma élfa que estava acompanhada de seus pais. Eles eram bem velhos. Cabelos longos branqueados e orelhas alongadas. Estavam vestidos de uma maneira simples e desconfortável. Pareciam trapos velhos que foram jogados pelo carcereiro do castelo.

— Vocês são o Sr. e a Sra. Morguÿ? — perguntou Pedro. — Como nos conhece? Por acaso sabe algo de nosso filho? Como

conseguiu entrar aqui? É um dos guardas do palácio? — perguntou o velho que estava sentado em uma pedra dura e congelante.

— São muitas perguntas para pouco tempo! Conheço seu filho e sei da alegria que ele irá sentir de saber que sua família ainda está viva. — respondeu Pedro preocupado, esperando que surgisse de surpresa algum guarda real.

— Mas ficará triste em saber que amanhã mesmo, antes do meio dia, estaremos mortos! Irão nos enforcar por sermos aguianos. — disse o velho.

— Se os vagalumes me trouxeram até aqui, foi para impedir a sua morte. Libertarei todos vocês deste calabouço para que possam gozar de mais anos de suas vidas!

— Mas como você pegará a chave? — perguntou a élfa. — Deixe comigo! Não será difícil. — respondeu ele, colocando

novamente o colar em seu pescoço. Os elfos ficaram surpresos em observar a tamanha magia que rodeava

aquele rapaz. Jamais imaginariam que existiria um colar que fazia as pessoas desaparecerem.

Pedro andou por cada canto daquele lugar sombrio, até que um único vagalume piscou incessantemente abaixo das escadas. Ao aproximar-se encontrou um guarda que estava dormindo sobre a mesa. Ele estava embriagado. Havia uma garrafa de vinho Tiäneza sobre a mesa, que estava completamente vazia.

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Pedro avistou as chaves que estavam penduradas na parede. Ele as pegou e correu em direção à jaula.

— Prontos, estão livres! — disse Pedro mais uma vez tirando o incessante colar.

— Meu caro jovem, não sabemos como agradecer! — disse o senhor elfo.

— Mas como sairemos daqui? — perguntou a donzela. — Vejam! Alguns dos vagalumes estão se dividindo. Siga-os e assim

estarão longe deste castelo. — disse Pedro. — Antes de partir, gostaria que o senhor entregasse este pequeno objeto

para meu filho. Diga a ele, que estaremos aguardando em nossa casa! — disse a senhora, retirando algo de seu bolso. Era um pequeno medalhão feito das folhas de sabugueiro. Pedro guardou em um de seus bolsos.

— Entregarei, sim! Agora corram e não olhem para trás. — disse Pedro, colocando novamente o colar no pescoço.

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edro correu em direção aos vagalumes que estavam ansiosos para lhe mostrar uma outra coisa. A família de Radnör subia as escadas rumo à adega. Eles desapareceram das vistas de Pedro.

Ao passar por diversos caminhos ocultos, Pedro percebeu que estava em um jardim todo florido. Havia diversas árvores a sua volta e diferentes esculturas que lembravam os reis do passado.

De repente, todos aqueles vagalumes que estavam com ele repousaram sobre uma rocha. Ela estava próxima de uma das árvores que se encontrava no jardim. Ao aproximar-se da rocha, Pedro percebeu que ela era diferente das outras. Ela estava trincada, emitindo uma leve luz que saía de dentro dela.

— Essa rocha parece que está oca! — disse Pedro, batendo nela. Percebendo que havia algo de diferente, Pedro decidiu quebrar a rocha

com um soco. Sua mão começou a doer naquele momento e seus dedos começaram a ficar inchados. Uma luz azul começava a surgir. Era tão forte o seu brilho que fez com que Pedro caísse de costas sobre os gramados do castelo.

— Eu a encontrei! A famosa pedra azul das águas marinhas. Sua respiração estava acelerada. Jamais imaginaria que a encontraria

naquele lugar. O jardim estava deserto. Alguns demäuros sobrevoavam aquele lugar.

Eles não conseguiram avistar a pedra de seu mestre. Enquanto isso, Miriam entrava pelos portões do castelo. Suas colunas

estavam enfeitadas com alguns estandartes. Seus desenhos eram os mesmos, uma cobra verde enrolada em uma espada. Era o símbolo que Arthur havia criado para simbolizar o seu reinado.

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Ao caminhar no castelo, Miriam encontrou-se com Arthur que estava sentado em seu trono. Ele estava comendo algumas castanhas em uma bandeja de prata. O rei ficou assustado ao encontrar-se com Miriam.

— Quem é você? E como você entrou em minhas propriedades? — Sou Miriam! Estou aqui a pedido de Ilumar! — disse ela, tirando a

espada de sua bainha. — Como se atreve a estar diante de mim? Sua camponesa imunda! —

disse Arthur aos berros. Cesarem apareceu por detrás de Miriam sem que ela o percebesse. — Não sei se chamaríamos isso de coragem. Nominaria mais como uma

estupidez! — afirmou ele, acariciando o seu cajado. — Mas isso não ficará assim! Guardas! — gritou Arthur. Nenhum dos guarda estava por perto. Miriam disparou através de sua

espada um jarro de luz ofuscante. Ela atingiu o rei, fazendo com que ele desmaiasse. Cesarem ficou furioso, parecia que seus olhos iriam pular de seu crânio de tão apertados que eles estavam.

— Como ousa atacar o seu rei desta maneira, sua feiticeira! — gritou Cesarem, transfigurando-se em uma fumaça negra.

Miriam desabotoou rapidamente a sua capa. Enquanto Cesarem vinha em sua direção, ela continuava de costas como se nada tivesse acontecido. De repente, Miriam deu um salto de costas, passando por cima daquela fumaça. Cesarem se transfigurou em sua forma natural e correu em direção de Miriam para enfrentá-la.

A espada das oliveiras começou a brilhar. Sua luz ofuscava os olhos de Cesarem, mas, mesmo assim, o mago ousou a lutar. Miriam pulou em cima do inimigo. Sua espada se debatia com o cajado. Diversos feitiços saíram dos olhos de Degälion. Miriam desviava de todos eles, pulando de um lado para o outro para não ser atingida.

Cesarem conseguiu prendê-la com um de seus encantos. Miriam ficou imóvel, não conseguia pegar a sua espada que estava jogada próxima ao trono.

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Por diversas vezes, Cesarem começou a esbofeteá-la. Seu sangue começou a sair de suas narinas, esparramando-se pelo chão.

Cesarem parou de agredi-la no momento em que ele ouviu os gritos de Sgraünd. Novamente alguém estava segurando a sua pedra. Os gritos aumentavam constantemente.

— Milorde! Milorde! Mais uma pedra foi capturada no castelo de Rochendar.

Cesarem ficou assustado, jamais imaginaria que sua pedra estaria tão próxima a ele.

— Foi por isso que você veio! Para capturar mais uma de minhas pedras. — disse ele enfurecido.

Cesarem se transfigurou em uma fumaça negra e saiu alvoroçado pelas janelas do castelo.

Miriam ficou preocupada. Ela não sabia o que fazer diante daquela situação. Seria impossível de se encontrar com Pedro naquele momento, o castelo era imenso e os demäuros estavam vigilantes, prontos para atacar.

Pedro começou a gritar quando segurou a pedra. Sua tortura era incomensurável. Ele se contorcia por diversas vezes e ouvia inúmeras vozes que o atormentavam. Pedro não tinha forças para se levantar. Parecia que aquela pedra havia sugado toda a sua energia.

Sua respiração estava ofegante e seu coração batia aceleradamente. O suor escorria em sua face e a angustia dominava completamente os seus olhos negros. De repente, Pedro ouviu uma voz que vinha acompanhada pela brisa do horizonte.

— Vamos, Pedro! Levante-se, não deixe que esta pedra o domine. Seja mais forte do que ela!

Tomando toda a coragem, Pedro se levantou e sentiu que suas pernas estavam bambas. Seu corpo estava pesado devido à magia negra. Alguns passos foram dados, mas não era o suficiente para fugir das garras de Cesarem. Todos estavam a sua procura, havia diversos demäuros que sobrevoavam o jardim.

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Alguns vampiros andavam de um lado para o outro, procurando Pedro sobre os arbustos.

Um dos vampiros aproximou-se dele. Pedro sentiu as mãos de Patrick tocar o seu ombro. Ele estava completamente transfigurado, parecia um demônio em forma de gente. Seus olhos estavam esbugalhados e seus dentes afiados, estava quase pronto para dar uma mordida.

Em questão de segundos, Patrick foi arremessado em direção a uma árvore. Pedro ficou surpreso quando se deparou com Jack que lutava contra o vampiro. Eles sobrevoavam o céu, se debatendo nas imagens esculpidas que estavam pregadas nas paredes.

Patrick estava repleto de sangue. Seu nariz estava quebrado e sua face estava toda desfigurada depois dos murros que havia recebido. Jack estava com a cabeça sangrando. Ele bateu em uma estátua que estava próximo à entrada do jardim.

O céu estava completamente negro, parecia que uma forte tempestade iria cair sobre aquelas terras. Havia um outro vampiro que estava próximo de Pedro. Ele rapidamente segurou o seu ombro, deixando Pedro completamente assustado.

— Vamos, meu rapaz! Você precisa sair deste lugar. — gritou Tony. — O que você faz aqui? Como conseguiu me ver? — perguntou Pedro,

sussurradamente. Ele estava com dificuldades para respirar. — Eu não o vejo! Estou vendo somente a pedra em suas mãos. — disse

Tony. — Estou aqui para ajuda-lo, e para leva-lo até Miriam, antes que Cesarem apareça.

Pedro deixou-se ser conduzido. Tony segurou fortemente em seus braços e o levou para fora do jardim.

Quando eles estavam na entrada do jardim, um outro vampiro pulou em cima deles. Tony soltou dos braços de Pedro e começou a lutar. O vampiro tentava morder o seu pescoço. Parecia que ele queria rasgar a sua artéria com seus dentes. Tony foi mais forte do que ele e o jogou sobre o portão do jardim.

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Ele segurou o pescoço daquele vampiro. Tony deu uma forte dentada, que fez com que o seu sangue jorrasse sobre os gramados do castelo. Ele arrancou a cabeça do inimigo e jogou para longe, caindo em direção a uma pequena fonte que estava no centro do jardim. Tony segurou no braço de Pedro e o levou para fora do jardim.

Enquanto isso, Miriam correu para o lado de fora do castelo. Ela se

deparou com um dos demäuros que vinha em sua direção. Miriam segurou a sua espada em chamas. Seu brilho fez com que os olhos do dragão ofuscassem, perdendo completamente a sua direção.

Ela cortou a cabeça do dragão com sua lâmina. Os dois caíram sobre aquele chão escurecido. Quando Miriam se aproximou do demäuro que estava caído ao chão, percebeu que o dragão havia o esmagado. Ela correu em direção ao seu cavalo toda suja de sangue.

Miriam encontrou-se com Pedro. Ele subiu rapidamente em seu cavalo. Ambos cavalgaram em direção aos portões da cidadela. Tony sobrevoava ao lado deles com a mesma velocidade.

Cesarem chegou alvoroçado sobre os jardins do palácio. Ele procurou em cada canto e nada o encontrou.

Um dos demäuros gritou para o seu mestre. Cesarem ouviu os seus gritos e voou para a sua direção. Ele destruía tudo o que estava a sua frente. Parecia um furacão incontrolável. O demäuro apontou em direção aos portões da cidadela. Todos voaram para aquela direção, com a esperança de encontrar com o ladrão que roubou a sua pedra.

Miriam implorava para o seu cavalo correr o mais rápido possível. Jack apareceu entre eles e voava na mesma intensidade que o seu amigo. Pedro observava o que estava acontecendo ao seu redor.

Miriam olhou para trás e cochichou algumas palavras que os vampiros não conseguiram escutar.

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— Seja forte e corajoso! Não tenha medo desta pedra! Ilumar está conosco, acredite! Não escute estas vozes, ela quer apenas voltar para o seu mestre.

Pedro ouvia a voz de Miriam, mas não conseguia aguentar a dor que o sucumbia. Ninguém conseguia olhar a sua expressão. Ele estava cansado de tudo aquilo.

Todos conseguiram atravessar os portões da cidadela. Eles estavam arreganhados. Os guardas que estavam vigiando seus portões ficaram surpresos pela correria daquela mulher.

Cesarem ficou furioso. Ele estava sobre os muros da cidadela. Ele jogou seu cajado de uma altura relevável, caindo em pé sobre as estradas que davam acesso a floresta. Cesarem deu um forte grito que estremeceu toda a muralha.

— Serpengoöu Charskÿ. Degälion se transformou em uma imensa cobra de fogo e arrastou-se

sobre a floresta. Todas as árvores estavam em chamas. Beyën fugiu daquele lugar, juntamente com toda a sociedade. Miriam batia diversas vezes as rédeas em seu cavalo. Ele corria o mais depressa possível, tentando fugir daquela criatura em chamas. A serpente estava quase se aproximando. Pedro sentiu o seu calor. Ele quase se queimou em suas labaredas.

Mas algo de extraordinário aconteceu. Uma forte chuva começou a cair sobre aquelas terras, com relâmpagos e trovões, apagando boa parte das labaredas que consumiam os matagais. Todos os demäuros e vampiros tentavam se esconder dos fortes raios que caiam próximos do castelo. Degälion perdeu as suas forças e voltou magicamente para as mãos de seu mestre.

Cesarem continuava furioso. Ele retirou uma faca que estava guardada em suas vestimentas e esfaqueou os dois guardas que estavam vigiando a entrada da cidadela. Ambos foram jogados como carnes para serem comidos pelos vampiros.

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Miriam conseguiu escapar das garras de Cesarem. Ela encontrou-se com Agäz que estava todo preocupado. Tony ajudou os elfos a descerem Pedro de seu cavalo. Ele estava rígido e não correspondia ao seu chamado.

— Pedro! Pedro! Meu querido, pode soltar um pouco esta pedra. Tire o colar para que eu possa te ver. — disse Miriam, serenamente.

Pedro soltou aquela pedra, deixando-a sobre o gramado da floresta. Em seguida, ele abriu o fecho do colar. Ele tirou de seu pescoço. Todos perceberam que ele estava ofegante e abatido. Seus olhos estavam avermelhados, seus cabelos cobertos de poeira e sua roupa toda rasgada. Sua mão estava inchada devido aos socos que deu sobre a rocha. Todos tentavam perguntar algo para ele, mas era inútil. Parecia que ele estava hipnotizado.

Enquanto ele olhava para o vazio, Radnör se aproximou dos outros membros para saudá-los.

— Ainda bem que conseguiram escapar, estava preocupado! Imagino que Cesarem estava bem perto de vocês.

— Tudo saiu como eu esperava! Conseguimos sair com vida daquele lugar. — disse Miriam.

— Ainda bem! — exclamou Radnör. — Sabem de uma coisa? Estive andando na floresta enquanto Miriam estava no castelo. Eu encontrei um corpo estendido no chão.

— Um corpo? — perguntou Beyën, sentando-se no gramado. — Sim! Parece que a donzela, ou melhor dizendo, a fada que queria

matar Pedro com um de seus beijos, foi pega pelo tigre. — Nossa! — exclamou Agäz, com uma cara de espanto. — O felino

conseguiu então? Esperto ele, não? — Sim! Ele foi muito esperto! Mas ao mesmo tempo é estranho. — disse

Radnör. — Como assim? — perguntou Agäz. — Ele apenas o a matou, não quis comer a sua carne! Tigres somente

matam suas presas para depois se degustarem delas. E ele não fez isso, simplesmente a matou!

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— Olhando para este ponto, Radnör tem razão! Há algo de estranho! — exclamou Eleönora.

— Bom! Pelo menos ela está morta! O que precisamos mesmo é abrir mais uma charada de Ilumar e não ficarmos aqui nos preocupando com coisas insignificantes. — disse Beyën, entediado.

— Muito bem! Qual das charadas devemos abrir agora? — perguntou Alamuc, cruzando os seus braços.

— Bem! Acho que poderíamos seguir em frente e tomar o rumo para as terras dos anões. — afirmou Beyën. — Todos concordam?

Ninguém se manifestou, apenas os anões que estavam contentes de pisarem em suas terras. Afinal, já fazia meses que Alamuc não tinha contato com ninguém.

— Muito bem, senhor anão! Abra o seu pergaminho e nos revele mais uma charada. — disse Beyën.

O rei dos anões abriu aquele pergaminho que estava guardado dentro de seu sapato (um lugar estranho de se guardar seus pertences, mas eles achavam seguros e confiáveis).

Ao abrir, percebeu que algumas das palavras estavam borradas com algum tipo de mancha negra. Era difícil de entender o que estava escrito.

— Ora! Ora! O que temos aqui? — disse Alamuc. — Então qual é a charada? — perguntou Agäz. — Não consigo compreender muito bem! Parece que está escrito em

uma antiga língua dos anões! Conhecida como Arrarän. — Nossa! — exclamou Beyën. — É uma língua bem antiga! Sabe

traduzir? — Sim! Acho que sim! Mas preciso de um certo tempo. Talvez até

amanhã cedo conseguirei decifrar este mistério. — Muito bem! Pelo que parece, iremos descansar aqui esta noite! —

disse Beyën olhando para todos. Pedro acordou misteriosamente. Ele se levantou como se nada tivesse

acontecido. Parecia que o transe tinha desaparecido, mas as dores persistiam em

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seu corpo. Sua mão estava enfaixada. Recebia todo o cuidado de Eleönora que tinha certas aptidões com os medicamentos naturais dos elfos. Pedro se dirigiu a Radnör e deu-lhe um abraço apertado.

— Quero lhe entregar uma coisa! — disse ele, retirando de seu bolso o pequeno medalhão de sabugueiro. — Ela o aguarda em sua casa!

Os olhos de Radnör ficaram lacrimejantes e sua respiração estava acelerada diante daquele medalhão. Todos ficaram surpresos pela emoção de Radnör.

— Como conseguiu encontrá-los? — Estavam os três presos nas masmorras, às vésperas de sua morte.

Iriam ser enforcados ao nascer do sol! Mas de uma forma misteriosa, fui levado até eles!

— E como eles estão? — Agora eles estão bem! Acredito que eles conseguiram escapar. —

afirmou Pedro. — Você não sabe o quanto pedi para que Ilumar os libertasse! — Pois bem! Acredito que Ilumar atendeu o seu pedido. Eles estão livres

agora e esperam por você. — Se quiser, pode ir, Radnör! Não tem nenhum compromisso com esta

sociedade. — disse Miriam. — Não posso! Agora vou até o fim. Principalmente agora que a minha

família foi liberta. Meu compromisso é com Ilumar. Depois que tudo isso acabar, poderei retornar para a minha casa e ficar com a minha família. — disse ele, enxugando novamente as suas lágrimas. — Obrigado! Você fez aquilo que eu não consegui fazer!

Ao terminarem a conversa, Pedro segurou novamente aquela pedra. Ele se deitou próximo à fogueira e suportou as temíveis dores que seu corpo poderia sucumbir. Todos estavam exaustos, inclusive os anões que fizeram questão de dormir de barriga vazia.

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ra ainda de madrugada, quando Cesarem retornou para o castelo. Ele continuava irritado com os membros da sociedade da prata. Caminhava de um lado para o outro. Sua respiração estava

ofegante ao se lembrar daquele episódio. Seus olhos ficaram vermelhos como brasas e sua face transfigurada. Parecia um demônio andando pelo castelo.

— Como pude ser tão idiota! Como pude deixar que eles fugissem daquela maneira? — gritou Cesarem para si mesmo.

Degälion dizia algumas coisas para o seu mestre. Cesarem ficou mais calmo quando ouviu a voz de seu cajado.

Arthur apareceu no salão. Ele estava inconformado por ter sido o alvo dos feitiços emitidos por Miriam. Cesarem deu um pulo em sua direção e o agarrou-o pelo pescoço. Arthur não conseguia compreender o motivo daquela violência.

— Por acaso está me traindo, sua majestade? — gritou Cesarem. — Claro que não, milorde! — exclamou Arthur. Ele estava sendo

sufocado. — Ora! Por que será que uma de minhas pedras estavam por aqui? Em

pleno castelo! Bem abaixo do meu nariz! Você a escondeu de mim? — perguntou Cesarem aos berros.

— Não, milorde! Eu juro pelo meu reinado que não estou sabendo de nada. — disse ele estremecido perante a fúria de seu mestre.

— Talvez você queira experimentar o doce prazer de ser um vampiro! Lembre-se que eu posso transformá-lo em um estalar de dedos!

— Não, milorde! Eu juro, não sei de nada. Não sei como aquela pedra veio parar aqui.

— Não importa de quem é a culpa! — gritou Cesarem soltando o pescoço de Arthur. — Eu quero que todos se mobilizem para achar aqueles

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porcos malditos! Mande todos os seus soldados para seguirem os rastros deles! Não quero nenhum vivo, entendeu?

— Sim, senhor! Mas se eu mandar todos, ficarei sozinho aqui! — Não me interessa! — gritou Cesarem. — Estamos em uma guerra e

não estou a fim de perder. Faça o que eu mandei! Arthur ficou indignado da maneira em que Cesarem falou com ele.

Ambos procuraram Wiliam para dar as ordens precisas. Todos os soldados, inclusive ele, deveriam partir à procura da sociedade da prata. Wiliam não gostou muito daquelas instruções, mas resolveu não desacatar as ordens de seu rei.

Eles partiriam ao amanhecer, marchando rumo ao oeste. Já Cesarem resolveu partir para o norte.

O frio continuava a pairar sobre as regiões de Zatüron. Todos os anões

tentavam se encolher ao máximo para se esquivar do frio. A fogueira já havia se apagado, os pequenos pedaços de pano já não davam conta de esquentar seus corpos robustos. Todos estavam exaustos, sequer acordaram para acender uma nova fogueira ou para procurar algum abrigo próximo às árvores da floresta.

Era por volta das três da manhã, quando Agäz, não aguentando mais o frio, decidiu se levantar um pouco para procurar um lugar mais aconchegante para se aquecer daquela ventania. De repente, uma voz pairou sobre o ar. Parecia que ela estava vindo do sopro das árvores.

— Os elanfös são bondosos como os elfos, mas desconfiados como os anões! — disse aquela voz roca e sonolenta.

— Quem está aí? — perguntou Agäz. — Os elanfös são nojentos e burrões! Nem sabem com quem estão

falando! Eu sou a voz que grita neste mundo. Posso lhe mostrar tudo o que quiser ver!

— Mas não o vejo! Onde você está? — perguntou ele novamente.

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— Em todos os lugares e ao mesmo tempo aqui! Tenho algo a lhe mostrar. Pelo que conheço de sua história, você não é tão grandioso assim. A bebida sempre o acompanhou, deixando o seu pai totalmente desapontado. Por isso, quero levá-lo a um episódio de sua vida e lhe contar o que de fato aconteceu!

Agäz teve a sensação de que seu corpo se movia no ar. Uma forte luz saía das pedras da perdição. Ninguém se sentiu incomodado com o brilho delas.

Em questões de segundos, estava ele em sua casa sentado em sua velha poltrona. Enquanto caminhava, encontrou-se com um adolescente que estava deitado sobre a rede. Ao se aproximar daquela criatura, levou o maior susto de sua vida. Percebeu que era ele mesmo que estava deitado, cochilando tranquilamente em seu quarto em plena tarde de primavera.

— Agäz! Agäz! — gritou uma voz feminina. — Desça meu filho, seu pai está chegando!

— Não quero, minha mãe! Me deixa dormir! — Você sabe como o seu pai adora ser recebido na porta de casa, depois

de um longo dia de trabalho, não sabe? — disse novamente a sua mãe. — Agäz! Agäz!

Nada se ouvia a não ser os roncos que o jovem elanfö dava em seu quarto.

Agäz descia lentamente as escadas. Ele encontrou a sua mãe esperando o seu esposo na porta de sua casa. Agäz se emocionou ao rever a mãe. A senhora Calção não conseguia ver o seu filho na beira da escada. Ele estava invisível.

Quando o senhor Calção se aproximou, beijou suavemente a sua esposa e sentiu a ausência de seu filho.

— Onde está meu garoto? — Está em seu quarto, dormindo! — Mas a esta hora? Não é possível que ele continue dessa maneira. Ele

sabe muito bem que eu gosto de vê-lo me esperando, principalmente quando tive um dia conturbado como o de hoje.

— Jorge! O garoto está crescendo, sabe disso! — disse a senhora elanfö, segurando seu chapéu.

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— Por isso mesmo! Prefere ficar bebendo com os amigos a ficar com o seu velho pai. Ele precisa sair para este mundo! Fazer novas amizades e enfrentar novas aventuras como eu fiz quando era garoto. Foi assim que nos conhecemos, se lembra?

— Claro que sim! Mas é muito perigoso para o garoto! — Perigoso nada! Você trata ele como se fosse uma criança. Ele tem

idade suficiente para enfrentar uma quinzena de dragões! — Quanta tolice, Jorge! Não vejo importância nisso! — Mas é importante para mim! Ver meu filho enfrentando dragões é

sinônimo de orgulho! Eu soube enfrentar um dragão quando era mais novo, por que ele não enfrentaria?

— Não era um dragão! Era uma Hidra que dormia nas montanhas. — É como se fosse um dragão. — disse Jorge. — Mas isso não importa!

Será que eu não estarei vivo para ver meu filho honrando toda a família Calção? Uma lágrima escorria dos olhos do Sr. Calção, deixando Agäz

emocionado e ao mesmo tempo culpado perante aquela situação. — O que tenho em casa? Um filho beberrão que não sabe honrar o seu

pai. Por Ilumar, que vergonha tenho de meu filho! Que vergonha! — Pai! Pai! — gritou Agäz desesperadamente, mas ninguém o escutava. De repente, ele sentiu que o seu corpo estava sendo sugado. Parecia que

alguém estava trazendo ele de volta para a floresta. Quando ele regressou, Agäz começou a gritar pelo seu pai. Pedro e Miriam despertaram-se.

— O que houve? Por que tantos gritos? — perguntou Miriam, assustada.

— Vocês não vão acreditar! Eu vi o meu pai e minha mãe agora há pouco! — exclamou Agäz totalmente descontrolado.

— Como assim? Seus pais não estão mortos? — perguntou Pedro. — Sim! Mas estive agora mesmo em minha casa. Estava deitado na rede

e ao mesmo tempo estava assistindo toda a cena. Como foi triste em ver o sofrimento de meu pai! Como pude ser tão rebelde? — perguntou ele, emocionado.

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— Mas como isso aconteceu? — perguntou Pedro. — Eu não sei! Parecia magia. De repente estava lá! — Pedro! Mostre-me a pedra. — ordenou Miriam. Quando ele tirou a pedra de seu bolso, percebeu que ela estava

luminosa. — Veja! Foi a pedra que o levou para este lugar. Ela pode ter inventado

ou até mesmo distorcido a história. — Com que intuito? — perguntou Pedro. — De torturar aqueles que a conduzem! — disse Miriam. — Não só

aquele que conduz, mas os que estão a sua volta! — Mas a cena era real. Existiu de fato! — afirmou Agäz que enxugava

os seus pequenos olhos. — E como era esta cena? — perguntou Miriam. — Apenas lembro-me de meu pai sentado em uma cadeira. Ele

conversava com a minha mãe. Ele estava chorando e falava do péssimo filho que ele teve. Aquilo partiu meu coração! Não sabia que eu era a vergonha da família e que estas missões importavam tanto para ele.

— E quem disse que você foi a vergonha da família? — perguntou ela novamente.

— Eu ouvi ele dizendo isso! — afirmou Agäz. — Você mesmo me disse que estava deitado em seu quarto quando essa

cena aconteceu! — disse Miriam. — Quem nos garante que foi realmente assim? Essa pedra tem um dom de fazer as pessoas desviarem de seus caminhos e ainda confundir a cabeça dos homens.

— A senhora acha que ela poderia estar mentindo? — perguntou Agäz. — Se foi ela que o levou, eu acredito que ela esteja distorcendo toda a

história. — Mas meu pai queria que eu participasse de uma aventura! Quando

ele era novo, percorreu este mundo à procura de novas aventuras. E quando crescia, ele sempre me contava de suas histórias. Tanto que ele morreu e sequer me viu enfrentar dragões ou serpentes, como era de seu agrado. Eu ficava apenas

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bebendo com os meus amigos e dava altas gargalhadas de suas histórias. Acabei me tornando um vagabundo. Tanto que conheci o Pedro desta maneira, bebendo na hospedaria depois da morte de meu pai, lembra-se?

— Sim! Você me disse que não estava indo para lugar algum. E eu por ter pago aquele criado, jurou-me em me seguir!

— Queria honrar aquilo em que meu pai acreditava! Por isso aceitei o seu convite. Queria provar para mim mesmo que eu podia enfrentar todos os monstros que aparecessem na minha vida. — disse Agäz, emocionado.

— E você está honrando! Foi muito corajoso de sua parte querer nos acompanhar. Seu pai ficaria muito orgulhoso com esta atitude! — afirmou Miriam. — Mas fique tranquilo, muitas coisas foram distorcidas e garanto que seu pai nunca se envergonhou de você. Mas temo que essas pedras queiram brincar com nossas mentes e nos torturar o máximo possível, até que um desista desta jornada. Devemos tomar o maior cuidado! Amanhã cedo, alertaremos os outros.

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odos se levantaram quando o sol ressurgiu por detrás das colinas. Muitos deles estavam animados para continuar a caminhada, inclusive os anões que não viam a hora de estarem

em suas terras. Alamuc estava preocupado com Carvalho, nenhum corvo havia trazido notícias.

Agäz continuava sonolento. Ele não conseguiu dormir depois daquela noite agitada. Miriam logo procurou Beyën e a todos que estavam próximos a ele. Era preciso contar o que havia acontecido na noite anterior. Todos ficaram apavorados, inclusive os centauros que não compreendiam o motivo desta perseguição repentina.

— E o que a Senhora acha, diante de tudo isso? — perguntou Thomas. — Acredito que todos nós seremos testados, até que um desista e volte

para casa. — Quer dizer que seremos torturados também? — perguntou

Eleönora. — Praticamente sim! Claro que não podemos comparar com os que

carregam a pedra. Mas todos nós iremos experimentar um pouco deste sofrimento. — afirmou Miriam.

— Precisamos ser fortes! — reforçou Beyën. — A propósito, conseguiu decifrar a charada?

— Sim! Consegui decifrá-la ontem à noite. — respondeu Alamuc, levantando-se de seu assento.

Ao pegar aquele pequeno pedaço de papel, o anão começou a pronunciar as palavras misteriosas descritas por Ilumar.

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Se me agride com muita força, posso até estourar. Corto o seu dedo e faço você sangrar! Mostro o seu rosto e o seu caminhar!

Estando espatifado, dificilmente conseguirei devolver o seu olhar! — Estranho! — disse Miriam. — Como assim estranho? É isso que está escrito aqui. — resmungou

Alamuc. — Pode até ser que esteja escrito. Mas mesmo assim é muito estranho.

— respondeu Miriam. — Essa charada já foi pronunciada um dia pelo seu pai! O grande Thor!

— Sim! Me lembro bem! — disse Beyën. — Senão me engano, elas nos levarão para as cavernas de Espëlhim.

— Espëlhim? — perguntou Agäz. — Sim! São as altas cavernas dos anões. Toda feita de pedras brancas,

que por sinal, são belíssimas. Mas quando é belo demais, devemos sempre nos desconfiar! Há um grande perigo naquelas cavernas. — disse Beyën.

— Que tipo de perigo, meu pai? — perguntou Eleönora. — Aquelas pedras são como espelhos! Refletimos quando passamos em

frente delas. Podemos nos perder facilmente senão tivermos atenção necessária. — Ela é quase um labirinto! Toda cercada de espelhos. Já estive naquele

lugar com o meu pai, e posso dizer que é algo de assustador. Muito escuro e frio, parece que a morte mora naquele lugar! — disse Alamuc.

— Mas, para entrarmos, precisaremos da chave! — exclamou Miriam. — Elennÿ nökity. — disse Beyën. — Sim! A grande estrela da noite! — exclamou Alamuc. — Ela está em

meus domínios. Meu pai antes mesmo de morrer, disse-me que foi um custo resgatá-las. Me fez prometer em seu leito de morte, que eu deveria proteger aquela chave.

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— E como foi! — afirmou Beyën. — Temo que alguém pegue aquela chave. Você precisa avisar Carvalho para que a proteja. Não podemos arriscar.

— Mas por que tanto alvoroço assim? — perguntou Agäz, coçando a sua cabeça.

— Se perdemos aquela chave, não conseguiremos entrar naquelas montanhas! Saiba senhor elanfö que por detrás daquelas montanhas, esconde-se um feitiço de proteção! Por isso que ela é trancada. Somente o rei daquela região é que tem o total direito de possuir aquela chave. — disse Beyën, ofegante.

— Aquela chave já foi de Cesarem um dia! Ela não abre apenas aquelas montanhas! — disse Miriam, com um olhar misterioso. — Com certeza, Cesarem quer ela de volta!

— Como avisaremos Carvalho para proteger aquela chave? — perguntou Alamuc.

— Não se preocupe com isso! Apenas escreva a mensagem! — disse Beyën. — Mirgän é muito bom para encontrar corvos. Ele vai achar um para você.

O anão correu até aos seus pertences e encontrou um pedaço de pergaminho velho. Ele começou a escrever a sua mensagem, informando sobre a sociedade da prata e sobre a chave que ele deveria proteger.

Thomas estava juntamente com os seus filhos. Ele guardava alguns mantimentos em uma pequena bolsa feita de coro de dragão. Pedro não entendia o que ele estava fazendo.

— Creio que não iremos para as terras dos anões! — exclamou Thomas. — Mas por quê? — perguntou Miriam. — Minha senhora, precisamos nos dividir! Preciso voltar para as

minhas terras e ajudar o meu povo que se compadece. — Quanta tolice! — exclamou Beyën em alto tom. — Você acha mesmo que é uma grande tolice socorrer a quem precisa?

— gritou Thomas, furioso. — Essa sociedade não pode se desfazer! Não podemos nos separar! —

gritou Beyën.

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— E quem criou essa regra? — perguntou Thomas. — Por acaso estou preso a esta sociedade?

— Calma! Calma! Tudo tem solução. — afirmou Miriam. — Lembra da última vez que a sociedade resolveu se separar? A senhora

sabe muito bem que isso pode acontecer novamente! Podemos falhar como na primeira vez! — gritou Beyën.

— Eu sei Beyën! Estava lá quando isso aconteceu. Mas creio que não acontecerá novamente. É preciso arriscar! — disse Miriam. — A propósito, será muito bom que eles retornem.

— Como assim? — perguntou Beyën, dando um leve sorriso sarcástico. — Quero que você peça aos hipogrifos que me procurem nas terras dos

anões! — disse Miriam, olhando diretamente para Thomas. — Diga a eles que venham em bandos!

Thomas franziu as sobrancelhas. — Há muitos anos que nós não conversamos mais com os hipogrifos! — Para o bem desta sociedade, o senhor irá engolir este seu orgulho e

conversará com o chefe deles. Apenas diga que Miriam, a senhora de Aracuqüe, o aguarda na terra dos anões e que por obediência convoquem um certo número de hipogrifos para me ajudarem nesta missão! A guerra não é só nossa, mas de todos que moram neste mundo.

— Está certo, minha senhora! Mandarei o seu recado. — disse Thomas, cabisbaixo.

— Sei que os hipogrifos têm um certo apreço por mim, não irão me negar este favor!

Todos estavam perplexos pela partida dos centauros. O clima estava pesado depois que Beyën discutiu com Thomas. Ambos não se despediram depois daquelas gritarias. Todos os centauros partiram para o leste, deixando para trás os membros da sociedade da prata.

Beyën subiu em seu cavalo. Todos eles estavam prontos para continuarem com o seu percurso. Mas havia um pequeno detalhe que precisava ser resolvido. O sol estava irradiante, iluminando toda a floresta. Havia uma boa

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parte do caminho que não era coberto por árvores, apenas por gramas frescas e capins serrados. Não havia nenhuma possibilidade de os vampiros se esconderem por debaixo das árvores como era de costume.

— Bom, o que faremos agora? — perguntou Eleönora. — Vamos deixá-los para trás, não nos fazem falta! — disse Turän. — Não vejo a necessidade de deixá-los para trás! Apenas não poderão

nos acompanhar. Mas acredito que quando estiver anoitecendo eles irão nos encontrar. Não é mesmo, Jack? — perguntou Eleönora, com um sorriso seco.

— Claro que sim! Eu prometo. — disse ele devolvendo o sorriso. — Por mim, estaríamos longe desses morcegos imundos! — retrucou

Pedro, olhando incessantemente para Jack. — Eles não podem nos abandonar. Lembre-se de que a vontade de

Ilumar permanece sobre esta sociedade. Jack precisa pegar a última pedra que se encontra nas cavernas de Algün. Não se esqueça disso! — afirmou Miriam.

— Maldita hora em que Ilumar os escolheu! — gritou Pedro, subindo furiosamente em seu cavalo.

— Não ligue para eles, meu rapaz! Esperaremos vocês na região de Balsën, próximo a Reniën. Vamos pegar um barco na ilha Ramã e continuar o nosso percurso. Aguardamos vocês por ali! — disse Miriam, subindo em seu cavalo branco.

— Esperaremos por vocês! — reforçou Eleönora, abraçando Jack fortemente. — Não nos abandone!

— Claro que não! Nos aguarde, minha princesa! Antes mesmo que o sol se esconda por detrás das montanhas, estarei próximo de você. — disse ele, tocando nos cabelos de Eleönora.

Quando ela subia em seu cavalo, seus olhares se cruzavam e pouco a pouco estava ela longe daqueles seres que desapareciam no meio da floresta. Cavalgaram lentamente, passando por diversos lugares. Vários povoados em Bítchën receberam a sociedade da prata. Alguns ficaram aliviados em saber que eles estavam vivos (embora houvesse alguns boatos de que Cesarem os tivesse matado).

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Algumas mulheres que gostavam de retirar a água do poço, ofereciam livremente suas jarras de barro. Os anões aproveitaram para abastecer os seus odres de couro que estavam secos há dois dias. Eles estavam sedentos. Ainda bem que os vampiros não estavam por perto. Ninguém daquelas redondezas apreciava a companhia daquelas criaturas.

Ao cavalgarem mais algumas léguas, encontraram a região de Balsën. Ao caminharem sobre a floresta, depararam-se com um bando de Zoörgs que estavam caminhando sobre a mata. Todos os zoörgs correram em direção a eles, como cães em busca de alimento. Todos estavam dispostos a ganharem a recompensa prometida por Cesarem, por isso retiraram as suas espadas e começaram a lutar.

Ao ouvirem as ordens de Miriam e de Beyën, começaram a correr em direção às criaturas.

Radnör atirava sem parar as suas flechas pontiagudas, acertando a cabeça de alguns dos zoörgs. Seu sangue negro esparramava sobre os gramados da floresta. Alguns deles chegaram a perder os seus olhos com uma das flechas de Radnör. Muitos tentavam defender Beyën que estava escondido por detrás de uma rocha, camuflada de arbustos.

Miriam pedia para Pedro se esconder juntamente com Beyën. Mas sua teimosia gritava mais alto dentro de seu ser. Com muita dificuldade, conseguia lutar bravamente. Com sua coragem e com suas habilidades, Pedro destroçou o crânio de um dos zoörgs que estava quase próximo de o apunhalar. Se não fosse Agäz para alertá-lo, aquela criatura teria apunhalado sem piedade as suas costas.

Os anões dilaceravam o peito dos zoörgs sem piedade. Com seus machados e suas lanças, lutavam corajosamente contra aquelas criaturas que jaziam nas trevas. Já Agäz, lutava ao lado de seu amigo, segurando uma pequena espada que tinha ganhado de Miriam, pouco antes de saírem de Aracuqüe.

Muitas mortes foram presenciadas. O sangue dos zoörgs estavam escorrendo nas vestimentas dos anões. Miriam ficou ao lado de Beyën, protegendo-o contra os ataques daqueles ratos assassinos.

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Eleönora estava atirando as suas flechas. A todo momento, os zoörgs caíam em sua direção, segurando a flecha que ultrapassava o seu peito. Mas houve um momento em que as flechas se acabaram, deixando-a encurralada.

Ao aproximar-se do pôr do sol, Jack apareceu ao encontro de Eleönora e arrancou sem piedade a cabeça de alguns deles. Foi uma verdadeira chacina naquele lugar, mas todos conseguiram se sair bem, lutando bravamente contra aquelas criaturas.

— Você apareceu! — exclamou a élfa. — Eu não falei que iria aparecer? — disse Jack, limpando o sangue que

estava em sua testa e tirando a poeira de seus cabelos. — Voei o mais rápido possível! Algo me dizia que aqueles ratos imundos estavam por perto.

— Agradeço pela sua ajuda! — disse ela apertando as mãos de Jack. — Será que minha adorável dama não gostaria de passear comigo? —

perguntou Jack, olhando para os olhos de Eleönora. — E para onde iriamos, senhor vampiro? — perguntou ela de uma

forma desconfiada. — Não me chame assim! Não gosto que me apelidem por aquilo em que

me transformei! Chame-me pelo meu nome, acho bem melhor. — disse ele, com um tom deselegante.

— Me desculpe! Então, senhor Jack, para onde iremos? — Andar pelo campo! Sabe, conversar um pouco! — Está certo! Acho que depois desta ajuda, nada mais justo do que

conversar!

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odos estavam sentados em volta de uma fogueira quando Eleönora começou a caminhar com Jack. Ambos estavam próximos de um penhasco para contemplar o sol que se escondia

por detrás das montanhas. Ele brilhava com um certo frescor, de tal modo que sequer conseguia queimar a pele de Jack, apenas seus olhos eram ofuscados pelo pequeno brilho que saía entre as montanhas. O céu estava coberto de nuvens. A luz do sol refletia sobre elas e seu contraste deixava as nuvens rosadas.

Ambos se sentaram em um gramado aparado, reparando em cada movimento que o sol projetava sobre as montanhas.

— Nossa, como é lindo! — exclamou Eleönora. — Imagino mesmo! É uma pena que eu não possa olhar muito para a

luz do sol, meus olhos não suportam muito esta claridade! — disse Jack, olhando para o rosto de Eleönora.

— Não sabe o que está perdendo! É maravilhoso! — Garanto que não estou perdendo nada! O brilho do seu olhar muito

mais impactante do que a do sol que se esconde por detrás das montanhas. — disse ele, sorrindo.

— Como você consegue ser tão galanteador nestas horas? — Com você, eu não tenho o tempo certo! Apenas o presente me

satisfaz! Jack segurava algumas flores que havia arrancado enquanto caminhava. — Dou-lhe essas flores, para a mais bela rosa do meu precioso jardim!

— disse ele. — Obrigada! — disse ela, sem graça. — Nunca recebi flores! A não ser

aquela que você me deu na floresta.

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— Nunca recebeu uma flor? Eu seria um louco se não desse uma rosa para você! Melhor dizendo, daria todas as flores deste mundo só para fazê-la sorrir!

Eleönora deu um sorriso sem graça. Ela rapidamente mudou de assunto. — Me conte mais sobre você! — O que gostaria de saber? — Como você se transformou em um vampiro? — Eu não gosto muito de tocar nesse assunto! — afirmou Jack,

cabisbaixo. — Mas posso lhe contar com uma condição! — Que condição? — Depois que eu contar a minha história, quero saber mais de você! — Saber o quê? — perguntou ela. — Não sei! Talvez alguma coisa que a deixou triste algum dia. — Muito bem! Pode ser! — Uma tristeza sendo compartilhada com uma outra! Mais do que

justo! — disse Jack, sorrindo. — Antes de contar, me promete que você não irá me julgar pelo que eu fiz?

— Prometo! Será o nosso segredo. — disse Eleönora, segurando as mãos do vampiro.

— Eu.... Eu... matei um homem! — disse ele, cabisbaixo. — Você matou um homem? Mas como? — Eu morava em Caën alguns anos atrás! Trabalhava em uma padaria,

mas não comparecia nos meus dias de serviço. Na verdade, eu era também um péssimo padeiro. Uma vez o dono me chamou e me mandou sair daquele lugar. Passei fome, meus bréguiimäs haviam acabado. Andava de um lado para o outro e ninguém me ajudava. Mas uma nova proposta surgiu em minha vida! Um homem com vestimentas negras apareceu na minha frente e me ofereceu os bréguiimäs de que eu tanto precisava, em troca de um assassinato.

— Em troca de um assassinato? Que pedido estranho? — Sim! Eu também achei estranho essa proposta. Eu poderia matar

qualquer pessoa em troca de dinheiro. Eu estava desesperado, precisava de

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alguns bréguiimäs para me sustentar. Estava passando fome e frio e ninguém me ajudava. Por isso, na calada da noite, tomei a coragem e saí pelas ruas estreitas de Caën. Matei um velho que passava por aquelas estradas. — Jack nesta hora ficou em silêncio. Ele enxugou as lágrimas e continuou a contar. — Ele era comerciante e vendia alguns tecidos naquela redondeza. De repente, senti o meu corpo se transfigurar. Aquele homem de preto apareceu diante de mim com o seu cajado de ouro. Me condenou a servi-lo pelo resto de minha vida. Agora estou preso a ele e nada poderá me libertar!

— Maldito Cesarem! — gritou Eleönora. — Tem momentos que ele me chama! Sou torturado todo dia. — E você não tem esperança de que tudo isso irá acabar? — Como? A magia dele é muito poderosa! Estou amaldiçoado e

certamente não haverá mais volta para o crime que eu cometi! — Mas Ilumar é muito mais poderoso! — afirmou Eleönora. — E você

está mudando! Está conosco agora! — E você não imagina o quanto estou satisfeito com isso! Queria muito

dizer que estou feliz, mas a maldição não me permite ter estes sentimentos. Mas saiba! Meu coração começou a se estremecer enquanto estava perto de você! Eu sinto agora, Eleönora, uma forte dor no peito. Eu já havia sentido isso há alguns anos!

— E o que isso significa? — Acho que isso é amor! — disse Jack, olhando nos olhos claros de

Eleönora. — É isso, EU TE AMO! — O quê? — Eu te amo, Eleönora! — Me ama? — perguntou ela. — Como você pode saber disso? Acabou

de me dizer que não consegue ter sentimentos! — Antes de me tornar este monstro, pude experimentar o amor! Eu sei

o que estou sentindo! — disse Jack, tocando em seu peito. — E foi por esse amor que você traiu a confiança de Pedro? A mulher

com quem você se relacionou no passado morava em Caën?

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— Prefiro não falar sobre isso! — disse Jack, desviando o seu olhar. — Diga-me — insistiu Eleönora. — Não! — gritou Jack. — Por favor, não insista! Eu não quero falar

sobre este assunto. Por acaso você duvida de meus sentimentos? — Não! — afirmou ela. — Apenas não esperava que fosse dessa

maneira! — E de que maneira estava esperando? — perguntou Jack, curioso. — Bem! Acho que não é o momento de falarmos disso agora! — disse

Eleönora, angustiada. — Melhor dizendo, acho melhor não falarmos mais sobre isso!

— Não importa! — disse ele, segurando as mãos de Eleönora após ter dado um beijo nelas. — Esperarei o tempo que for preciso para você se decidir.

— Obrigada! — E a sua história? Já disse a minha, agora quero ouvir a sua! — Muito Bem! — disse Eleönora, dando um pequeno sorriso angelical.

— Acho que a pior tristeza que ocorreu em minha vida, foi quando perdi a minha mãe! Infelizmente, estava eu dormindo, quando percebi um barulho que rangeu toda a casa. Ninguém acordou. Mas eu acordei e encontrei a minha mãe andando pela casa. Parecia que ela não estava ciente do que fazia, tanto que ela batia nas paredes com os olhos fechados. Acredito que ela estava dormindo enquanto andava. Mas de repente, percebi que ela tranquilamente abria a porta principal e caminhava silenciosamente nos gramados do jardim. Eu era apenas uma criança, não sabia o que fazer! Meu pai sequer estava em casa naquela noite. Eu fiquei angustiada em me deparar com ela daquela maneira!

— Continue! — Eu vi a minha mãe pulando dentro de um precipício e morrendo com

a sua queda! Foi horrível vê-la esticada sobre as rochas! — disse ela, emocionada. — E o pior é que não fiz nada!

— Mas você não sabia o que estava acontecendo! — exclamou Jack, tocando nos ombros de Eleönora.

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— Eu sei disso! Eu carrego essa culpa dentro de mim, e nada poderá mudar esse sentimento. — disse ela, enxugando as lágrimas.

— Entendo! — disse Jack, dando um pequeno sorriso. — Mas fique tranquila! Agora que sabemos um do outro, conseguiremos superar juntos estes momentos nada agradáveis!

|Ambos não perceberam que a lua já iluminava aquele céu escurecido. Eleönora ficou angustiada quando percebeu que já era tarde demais. A sociedade poderia estar a sua procura, já que o vampiro havia também desaparecido. Ao aproximar-se de seu pai, Eleönora percebeu que ele estava sendo torturado pela pedra. Beyën apenas olhava para o vazio, tentando não demonstrar a sua dor para aos outros.

No cair da madrugada, Pedro e Beyën não conseguiram dormir. Ambos sentiram as mesmas angústias por segurarem aquela pedra. Enquanto todos estavam dormindo, aproximaram-se da fogueira para se aquecerem daquela noite fria de inverno. Havia diversas conversas que pairavam em volta da fogueira. Mas houve um assunto que precisava ser esclarecido.

— O que houve com a sua pedra? Por que ela está faltando um pedaço? — perguntou Pedro.

— Ela foi quebrada por Cesarem! — E por que Cesarem faria isso? — Para Kalista! — afirmou o elfo. — A outra metade desta pedra estava

no colar desta feiticeira. — E o colar foi destruído? — Nunca mais o vi! Não sei a que rumo ele tomou. Pode ser que esteja

com Cesarem ou foi destruído por Ilumar! — Ilumar! Ilumar! — disse Pedro, repetidamente. — Beyën, diga-me!

Quem é de fato Ilumar? — Por que você me pergunta isso? — Sei que você estava no início da criação! E segundo as lendas élficas,

Yën revelou a você quem é de fato Ilumar.

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— Como acabou de dizer, estive sim no início da criação! Tanto é que vi Cesarem cair do alto céu, juntamente com seus animais. — disse Beyën, ofegante. — Contudo, me surpreende em ver um jovem humano, que nem se quer tocava no nome de Ilumar, querer agora saber da verdade! Você quer mesmo que eu te conte sobre Ele?

— Depois que eu conversei com Ele, próximo a sua casa, me interessei em saber sobre o Senhor das Águias!

— Sim! — afirmou o elfo. — Você mudou completamente depois daquela noite.

— Por isso que eu preciso saber mais sobre ele! — disse Pedro. — Acho que mereço esta resposta!

— Merece! — suspirou Beyën. — Lembro-me que Yën veio até a mim para me contar sobre Cesarem! Mas não foi somente dele que a conversa se estendeu! Ilumar é o senhor de tudo! Ele criou o mundo de Aldiroön e também o seu mundo, conhecido como “Calauë” e...

— Sim! — disse Pedro, interrompendo. — Essa parte eu conheço! Mas há coisas ocultas que não foram reveladas.

— Tem razão! — disse o elfo. — Ilumar é filho do grande Elöhi! Um grande senhor que mora em Calauë.

— Elöhi? — perguntou Pedro. — Quem é ele? Você já o viu? — Ninguém chegou a conhecê-lo! Nem mesmo Cesarem o viu

enquanto morava em Calauë. Dizem que ele aparece somente para Ilumar. — Mas e a sua aparência? Sua forma? — perguntou Pedro, confuso. — Dizem que não tem aparência! É um ser misterioso que mora sobre

as montanhas de Calauë! Parece que seu habitar é exatamente no norte, onde Ilumar gostava mais de sobrevoar com Cesarem!

— E mesmo assim aquele mago tolo não conseguiu enxergá- lo? — Parece que Elöhi não confiava muito em Cesarem! O grande senhor

já alertava Ilumar sobre isso! Tanto que quando o Senhor das Águias criou este mundo, já havia certas desconfianças que Cesarem iria trai-lo. — disse Beyën. — Por isso Ilumar chegou a perguntar para ele qual seria a sua opinião em criar os

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dois mundos. E como conhecemos Cesarem, ele não concordou, afirmando cada vez mais a ideia de Elöhi sobre a possível traição.

— Mal sabia ele que estava sendo testado! — exclamou Pedro. — Sim! — afirmou o elfo. — Ilumar é bastante inteligente comparado

com Cesarem. Nomeou-o até como conselheiro para ficar mais fácil de testá-lo! Mas há uma coisa que não consigo compreender.

— O que? — perguntou Pedro. — Por que será que Elöhi não impediu que Ilumar criasse Cesarem? Ele

sabia que aquele mago iria traí-lo! — exclamou Beyën. — Eu não sei! — disse Pedro olhando para as labaredas da fogueira. —

Talvez tudo isso precisasse acontecer. — Pode ser que sim! Não sabemos ao certo o que nos aguarda

futuramente. — Sabemos sim! — exclamou Pedro. — Nós iremos viver ou morrer

por essas pedras. Basta termos paciência para saber o nosso destino. — Não sei se vou aguentar. — disse Beyën, olhando para o vazio. Seus

lábios estavam ressecados e sua respiração, ofegante. — Imagine quando as cinco pedras estiverem reunidas! Iremos implorar pela morte em vez de segurá-las.

— Não vamos nos desesperar com o futuro! Vamos viver um sofrimento por dia e lutar para que não fiquemos loucos com esses truques baratos. Lembre-se do que está escrito no seu brasão!

— Pois é na fraqueza que a força se manifesta! — sussurrou Beyën. — Isso! — exclamou Pedro. — Pois é na fraqueza que a força se

manifesta! — Você tem razão! Eu preciso parar de ter medo. Está no meu sangue

esta força de querer lutar. — disse o elfo. — Bom, tentarei descansar um pouco e aconselho a você fazer o mesmo!

Pedro acenou com a cabeça e se aconchegou próximo às rochas.

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ram novamente três da manhã quando uma das pedras se despertou. Expelia um forte brilho que irradiava toda a floresta. Ninguém acordou, inclusive Pedro que a segurava entre seus

ombros. Eleönora descansava tranquilamente próximo de seu pai, que por um

segundo tentava se proteger daquele frio ameaçador. Ela estava coberta com alguns cobertores. Jack havia doado voluntariamente o seu cobertor para ela, já que ele não precisaria se proteger do frio.

Enquanto Eleönora dormia, surgia em sua mente um sonho nada agradável. Estava ela no mesmo lugar e no mesmo instante que sua mãe resolveu pular daquele precipício. Eleönora presenciou cada momento em que ela se debatia nas paredes como se fosse uma barata tonta prestes a morrer.

Mas para a sua surpresa, encontrou-se com Cesarem que a estava conduzindo para o penhasco. Sem dúvida, a mãe de Eleönora estava enfeitiçada por ele. Os olhos de Degälion estavam vermelhos e brilhantes. Algumas palavras foram pronunciadas. Eleönora não conseguia compreender o seu verdadeiro significado.

Cesarem não parava de encará-la. O ódio dominava completamente todo o seu ser. Eleönora simplesmente reparava aquela cena que havia contado para Jack. Ela começou a desesperar quando viu sua mãe caindo do penhasco.

— Você matou sua mãe, Eleönora! Como pode fazer tamanha brutalidade? Que mal ela fez a você para merecer a morte? — disse Cesarem, ironicamente.

— Maldito! Você a matou! Como pude ser tão estúpida ao ponto de pensar que eu era a culpada! — disse ela, expelindo lágrimas de ódio.

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— É isso que irá acontecer com cada um que se atrever a entrar em meu caminho! Será que é tão difícil de vocês aceitarem o meu pedido? Apenas quero as minhas pedras e nada mais!

— Nunca! — gritou Eleönora. — Ora! É uma troca justa! As minhas preciosas pedras pela vida

medíocre de vocês. Ainda está em tempo de escolher! — disse ele, apoiando em seu cajado. — Você quer que aconteça com você a mesma coisa que aconteceu com sua mãe?

— Por Ilumar! Não irei traí-lo. — gritou Eleönora. — Muito Bem! Você escolheu a pior parte e agora terá que enfrentar as

consequências. Com o seu cajado, Cesarem enfeitiçou a mente de Eleönora. Ela

simplesmente se levantou e começou a andar pela floresta. Diversas vezes ela se debatia sobre as árvores que a machucavam profundamente. Jack conseguiu despertar quando ouviu os galhos sendo quebrados pela própria Eleönora que caminhava sem direção. Ele não entendia muito bem o motivo de ela estar se debatendo, mas mesmo assim, resolveu segui-la durante a noite.

Enquanto isso, no sonho, Cesarem pulava de um lado para o outro, cantarolando uma pequena canção improvisada.

Ande! Ande para o abismo da morte! Lá encontrarás o seu descanso.

Você desejou desta maneira e agora terá o seu ganho! Ela tentava a todo momento lutar contra aquele feitiço, mas de nada

adiantava. Eleönora caminhava em direção ao abismo. Jack percebeu que ela estava enfeitiçada. Ele correu em sua direção para tentar impedir que alguma coisa acontecesse com sua amada. Mas não foi o suficiente. Eleönora pulou naquele abismo infernal, rumo às rochas pontiagudas de Balsën.

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Jack ficou desesperado em ver a sua amada caindo naquele precipício. Ele rapidamente se transfigurou em um morcego e voou para a direção de Eleönora. Ambos estavam caindo. Por diversas vezes, Jack se desesperou por não conseguir alcançar a sua amada.

Depois de muito esforço, Jack conseguiu segurá-la pelo braço. Ele colocou Eleönora em suas costas e a segurou em suas pernas para que ela não caísse novamente. Cesarem ficou furioso com Jack por ter salvado Eleönora. Ele rapidamente desapareceu daquele pesadelo repentino.

Eleönora havia se despertado. Ela estava assustada em se deparar com aquele abismo a sua volta. Ao descerem próximo à floresta, Eleönora deu um forte abraço em Jack como sinal de gratidão.

— Você me salvou! — exclamou Eleönora. Sua respiração estava ofegante e seu coração batia a mil por hora.

— Eu te disse que nunca iria abandoná-la — disse Jack com um pequeno sorriso em seus lábios. — Sempre irei protege-la! Mesmo que custe a minha vida, eu sempre a protegerei!

Após ouvir esta fala tão afetuosa, Eleönora atreveu-se a dar um beijo naquele vampiro. Ele estava totalmente transfigurado em sua forma humana. Jack ficou sem reação naquele momento, apenas aproveitou o doce lábio daquele ser angelical.

Após aquele momento, Eleönora o abraçou e expressou pequenas palavras que o deixaram bastante satisfeito.

— Ficarei eternamente grata por ter salvado a minha vida! Agora sei que seus sentimentos são verdadeiros e sinceros.

Jack a levou novamente para o centro da floresta. Todos continuavam a dormir em seu sono profundo. Eleönora novamente deitou-se próximo de seu pai que estava tremendo de frio. Jack ficou acordado a noite inteira para proteger a sua amada. Ele havia reparado que as pedras estavam se apagando pouco a pouco. Seu alívio maior foi quando as pedras se apagaram completamente.

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Ao amanhecer, todos estavam bem-dispostos para continuarem com a sua longa viagem. Eleönora dirigiu-se até ao seu pai e contou tudo o que havia acontecido na noite anterior.

— Foi ele, meu pai! O assassino de nossa mãe! — Eu já imaginava isso! — disse Beyën, suspirando. — Ela não caiu por

acaso! Foi um feitiço que a jogou em meio as pedras. — E como você descobriu isso? Como Cesarem pôde entrar assim em

seu sonho? — perguntou Agäz, intrometendo no assunto. — Foi a pedra! — gritou Jack, longinquamente. — Como sabe que foi ela? — perguntou Beyën. — Eu vi uma luz incessante que saía de sua pedra! Quando trouxe

Eleönora de volta para a floresta, esta luz se apagou! — Ela pode estar mentindo! — disse Agäz. — Quem poderia estar mentindo? — perguntou Miriam. — A pedra! Ela pode ter distorcido toda a história! Como aconteceu

comigo naquela noite. — Mas, nesse caso, por que estaria mentindo? — perguntou Eleönora.

— Afinal, ela revelou-me quem foi o assassino de minha mãe! — Concordo! — afirmou Miriam. — Não teria o porquê, neste caso, de

ela estar mentindo! Cesarem se apresentou neste sonho e teve o poder de manifestar a realidade dos fatos.

— Ou não? — perguntou Agäz. — Quem nos garante que essa visão não foi apenas para deixar Eleönora mais colérica do que antes?

— Não creio que Cesarem apareça para aliviar a dor de alguém! — disse Miriam. — Tanto que ao revelar este segredo tirou toda a culpabilidade que Eleönora sentia perante a morte de sua mãe!

— É verdade! — afirmou Eleönora. — Percebam o quanto ele é medíocre. Cesarem sequer pensa no que faz!

— exclamou Beyën. — Acredito que desta vez a pedra esteja falando a verdade. — Bom, isso será um grande mistério para ser descoberto. — disse

Pedro, impaciente. — Agora, por favor, vamos continuar a nossa viagem!

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Todos partiram sem demora, atravessando boa parte da floresta. Os vampiros novamente tiveram que esperar. Não havia árvores o suficiente para os proteger da luz do sol.

Ambos encontraram uma caverna no meio da floresta e se esconderam até o nascer do luar. Tony estava curioso em relação a um episódio ocorrido no castelo negro de Rochendar. Eles estavam se aquecendo em volta da fogueira quando a conversa começou a pairar.

— E Patrick? Conseguiu matá-lo? — Lutamos muito naquela noite! Ele conseguiu me machucar e até

mesmo me ferir, mas acredito que ele voltou para casa com alguns arranhões. — disse Jack dando um pequeno sorriso.

— Quer dizer que ele está vivo? — Sim! Ele conseguiu escapar! Cesarem estava por perto e o ajudou a

fugir. — Fico imaginando a raiva que Cesarem passou por ter ajudado Patrick

a escapar da morte! — disse Tony, dando profundas gargalhadas. — Pensei a mesma coisa! — disse Jack, rindo juntamente com seu

amigo. — Mas não foi fácil lutar contra ele! — Claro! Ele sabe como se defender muito bem e você sabe disso! — Mas não tenho medo dele! Lutarei mais uma vez se for preciso. —

disse Jack apreciando o brilho da fogueira.

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pós dois dias de viagem, a sociedade da prata finalmente havia chegado às ilhas de Ramã. Todos desceram de seus cavalos e os soltaram para que pudessem retornar para algum vilarejo.

Alamuc e alguns outros anões conseguiram, através de um cobrador, um navio de madeira. Ele era todo esculpido pelos elfos. Havia várias velas que cobriam toda a proa do barco. Eram grandes e pesadas, com tamanhos e modalidades diferentes. Todos entraram no navio.

Estava quase anoitecendo, era preciso abandonar aquelas ilhas para enfrentar mais quatro dias de viajem à beira-mar.

Cesarem estava escondido próximo à grande montanha de “Eigÿ” onde o sol parecia tocar sobre as árvores vastas da floresta. Ele sabia muito bem onde estava toda a sociedade.

Cesarem não estava só. Havia uma grande cauda que estava adentrando ao mar. As águas estavam agitadas. Os anões achavam estranho aquele movimento do mar.

O céu começou a ficar escurecido, parecia que uma forte tempestade estava prestes a desmoronar. O vento era incontrolável, tanto que Radnör e Turän tiveram que amarrar as velas, senão poderiam perdê-las contra a ventania.

Mas eles não estavam tão preocupados com a agitação do mar ou daquele vento cabuloso sobre as velas, e sim, do surgimento repentino de Sgraünd, que, com toda sua fúria e sua glória, tentava a todo custo destruir o navio.

Todos tentavam impedir que a serpente os devorasse. Eleönora e Radnör atiravam flechas contra ela, já Turän e Mirgän tentavam atingi-la com suas espadas. Alguns do anões enfrentavam com seus machados, outros tentavam conduzir o navio.

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Pedro e Beyën queriam muito ajudá-los, mas estavam sem forças para enfrentar aquela serpente. Miriam tentava os proteger com a espada de Aracuqüe, que, por sinal, brilhava perante o mal que habitava as ondas.

— Veja! — disse Miriam apontando para o leste. — Cesarem está controlando-o.

Os olhos de Degälion estavam brilhantes enquanto Miriam o apontou. Sgraünd era ágil com sua cauda. Ele chicoteava sobre a proa do navio. Muitos gritavam para tentar impedir aquela cobra.

Próximo de Cesarem, um furacão de fogo apareceu sobre a montanha. Ele ficou assustado em se deparar com aquela manifestação que vinha dos altos céus. Não havia nenhum tipo de ventania que aquele furacão pudesse se manifestar, apenas um calor incessante que escorria de suas labaredas.

Cesarem não conseguia mais controlar Sgraünd com o seu cajado, era preciso agora enfrentar aquele furacão que o estorvava de realizar os seus planos. Uma luta aconteceu naquele lugar, a todo momento o mago negro se desviava das pequenas gotas de fogo que caíam do furacão. Ele tentava a todo custo sugar com o seu cajado, mas não conseguia.

Sgraünd lutava contra a sociedade. Eleönora conseguia acertar algumas de suas flechas em sua pele escamosa, deixando ainda mais fraco e mais acessível à dor. Já os vampiros, estando eles transformados em morcegos, lutavam bravamente contra a serpente, deixando-a desnorteada.

Um forte grito foi dado de algum lugar. Somente Miriam conseguiu escutar aquele grito majestoso.

As águas começaram a se agrupar, dando forma a um ser desconhecido. Ele tinha o formato de um velho barbudo, mas com uma força que parecia a de um deus. Ele se dirigiu até Sgraünd e lutou contra ele. Ambos rolavam ao mar.

— Preparem as velas! — gritou Miriam. — Vamos aproveitar o vento para sairmos daqui!

Todos correram para se preparar, inclusive alguns dos anões que estavam se direcionando para o leme. O vento estava favorável para eles partirem, tanto que em poucos minutos, estavam longe daquela imensa agitação.

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Percebendo que não era mais capaz de lutar, Cesarem transfigurou-se em uma fumaça negra e fugiu daquele lugar, levando consigo sua cobra de estimação. Partiram sem longas pompas, voando para a direção sul, rumo às cavernas de Algün.

Já o “príncipe das águas”, como foi nomeado por Miriam, desapareceu bruscamente, levando consigo as belas histórias que aconteceram ao longo desta tarde sombria. O furacão em chamas também desapareceu, se elevando aos céus e se escondendo por detrás das nuvens que estavam carregadas.

Ao passar alguns minutos, as nuvens foram rasgadas pelo vento e um belo luar resplandeceu. As águas estavam mais calmas e uma grande escuridão invadiu aqueles mares. Apenas o reflexo da lua iluminava o oceano.

Ao se aproximar do convés, Pedro olhou em sua volta e subitamente começou a se contorcer como se estivesse possuído por algum espírito das trevas. Seus olhos ficaram avermelhados e sua voz estava corrompida.

A pedra emitia um forte brilho que iluminava todo o convés. Pedro começou a pronunciar algumas palavras.

— Acham mesmo que conseguiram me vencer? Acreditam mesmo que eu não posso encontrá-los? Seus tolos! Eu logo os pegarei e esmagarei um por um, até sentirem a dor que tanto desejo. Irão gritar desesperadamente de dor e de agonia! E eu, como um servo misericordioso, matarei todos vocês para aliviar de suas dores!

Miriam correu em direção a Pedro para o ajudar. Ao aproximar-se dele, tocou em seus ombros e percebeu que ele estava gelado.

— Pedro! — gritou Miriam — Pedro! O que houve? — Não toque em mim! — gritou Pedro, empurrando a mão de Miriam

com uma certa brutalidade. — Como se atreve a tocar em mim! Maldita camponesa!

Miriam pegou a espada das oliveiras. Ela emitia uma forte luz que envolvia a todos que estavam presentes.

— Eu o liberto de todo o mal que aqui se encontra! Volte para a escuridão do abismo e não nos atormente mais!

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Pedro se contorcia no chão. Seu tormento crescia a cada momento em que Miriam mostrava a sua espada.

Sua pedra foi lançada ao vento. Por pouco ela não caiu no mar. A luz de sua pedra se apagou, deixando a todos mais aliviados perante os tormentos de Cesarem. Pedro estava mais calmo. Sua consciência estava retornando aos poucos. Muitos que estavam presentes puderam ouvir um grito agudo que vagava sobre os mares.

— Cesarem terá uma noite difícil! — disse Miriam. Ela guardou a sua espada e estendeu uma de suas mãos em direção a Pedro. — Você está bem?

— Ele voltará! — disse Pedro, estremecido. — Ele irá nos matar! Ele irá nos matar!

— Ele está querendo nos amedrontar! — exclamou Miriam. — Não podemos nos amedrontar! Devemos continuar firmes! Ilumar está conosco.

— Como sabe que ele está conosco? — perguntou Pedro em alta voz. — Será que estou ficando louco? Não percebe que ele nos abandonou desde o início desta missão?

— O que você está dizendo, Pedro! — disse Miriam. — Você não viu o que acabou de acontecer? O furacão de fogo? O príncipe das águas?

— Acha mesmo que foi Ilumar? — perguntou Pedro dando uma pequena risada irônica. — Eu não acredito que ele esteja aqui para nos ajudar! Ele nos deu esta missão e nos abandonou!

— Como pode ter tanta certeza assim? — Porque eu não sinto ele próximo de mim! — gritou Pedro. — E o que você sente? — Quer saber mesmo o que eu sinto? Um ódio mortal de tudo o que

estou passando. Maldita hora em que aceitei em participar desta loucura! Poderia agora estar próximo de minha lareira, tomando um copo de cerveja caramelada. Mas não! Estou eu aqui neste fim de mundo, segurando uma pedra que me atormenta dia e noite! — disse ele ofegante, expelindo de seus olhos uma pequena lágrima.

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— Você está fora de si, Pedro! — disse Miriam. — Eu entendo o seu fardo, mas isso não te justifica de falar desta maneira! Você tem a liberdade para partir quando quiser.

— Eu já pensei em partir! — gritou Pedro. — Em abandonar tudo isso! Mas agora não posso abandoná-los. Sou um homem de palavra, o que prometi está prometido.

— Acalme-se, Pedro, tudo ficará bem... — começou Miriam. — Cale a boca, Miriam! — gritou Pedro. — Cale a boca! Não aguento

mais ouvir a sua voz. Todos ficaram em silêncio naquele momento. Miriam respirou

profundamente e segurou Pedro pelo braço. Seus olhos ficaram lacrimejantes. — É melhor que você descanse um pouco! Você precisa recuperar as

energias! Não está falando por si mesmo, mas sim pela pedra que a conduz. — Ora! Me deixe em paz! Pedro saiu furioso daquele lugar, levando consigo a sua pedra. Radnör

tentou se aproximar de Miriam depois daquele acontecimento, mas ela estava aparentemente bem. Ela não parava de encarar o horizonte. Parecia que o barulho das ondas estava acalmando a sua mente.

Enquanto isso, os anões estavam empolgados em retornar para a suas terras. Todos eles estavam reunidos no convés, cantarolando está seguinte canção.

Para a casa iremos voltar! Rever nossos amigos e novamente descansar.

Pela glória de nossos reis do passado! Majestoso é Ilumar,

Por dar para nós esta oportunidade, de poder nos revigorar.

A lua nos ilumina ao regressar! As águas nos conduzem à beira-mar!

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O vento sopra para nos levar! Já Ilumar nos orienta para o nosso bem-estar!

Grande és tu Ilumar, por estar conosco!

Nos protegendo com vossas asas e nos guiando ao nosso socorro. De ti espero apenas a confiança,

Porque seu amor já está conosco! Foi um momento de glória e esplendor. Puderam se divertir e se distrair

ao longo da viagem. Os dias se passaram rapidamente. Todos estavam cansados em se

deparar com o mar a sua volta. Alguns dos anões ficaram enjoados com o baque das ondas. Aldirän tinha as águas mais claras de toda o mundo de Aldiroön, dando para ver nitidamente todas as criaturas que viviam sobre o mar. Diversas sereias nadavam próximo do navio. Algumas mandavam beijos para os elfos, principalmente para Radnör que estava próximo da polpa.

Passando-se quatro dias de viagem, puderam descer nas regiões de Ilücan, terras pertencentes aos anões do oeste. Todos caminhavam lentamente sobre a neve fresca que cobria toda a terra. Havia um metro de profundidade. Alguns dos anões tiveram dificuldades em atravessar aquela geleira. Aquela neve havia caído na noite anterior. Eles pisavam em pedras, plantas e buracos que estavam escondidos por debaixo de sua crosta.

Era um frio insuportável. A princípio começaram a tremer e seus dentes batiam sem parar. O vento uivava por detrás das montanhas. Todos sentiram que seus corpos estavam sendo queimados pelo frio.

Todos estavam agasalhados. Os anões usavam couro de urso para se proteger. Miriam usava uma lã azul com pele de carneiro, enquanto os outros usavam um colete feito com peles de lhama.

— Por Ilumar! Quanta neve. — disse Agäz. — Nunca vi tanta neve assim! — exclamou Alamac.

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— Meu corpo está endurecido! — disse Petrus. — E o pior é que falta muito para chegarmos em Gilcän. Temos muitas léguas a nossa frente!

— Não vamos nos desanimar! — disse Miriam. — O frio passará logo! Se andarmos mais rápido, podemos nos aquecer.

Todos acompanhavam o ritmo de Miriam. Eles caminharam por cinco dias sobre a neve, escondendo-se em cavernas durante a noite.

Ao chegar em Gilcän, encontraram diversos homens que estavam

lutando contra o exército de Cesarem. Havia poucas criaturas das trevas. A maioria delas estavam mortas sobre a neve. Seu sangue negro misturava-se com o branco, ressoando um contraste duvidoso. Alguns diziam que seu sangue era realmente escurecido, outros enxergavam um tom de púrpura que realçava toda a neve.

A cidade estava toda destruída, diversas casas tinham sido queimadas e vários dos anões estavam mortos. Muitos tentaram se defender, mas a lança dos demäuros e dos zoörgs gritaram mais forte do que os machados dos anões. A maioria deles jaziam de barriga para baixo. Seu sangue se misturava juntamente com o sangue dos zoörgs.

Alamuc e os outros anões choravam sem parar diante de alguns cadáveres que eles conheciam. Alguns eram parentes distantes. Havia outros que eram amigos de longas datas.

Carvalho apareceu rapidamente. Ele estava com alguns ferimentos no corpo. Ele curvou-se perante o seu rei e o saudou. Começou a contar sobre o ataque surpresa que receberam na noite anterior.

— Eu estava descansando em minha casa, quando ouvi a trombeta ressoar! De início, eu não entendi muito bem! Só fui entender depois de ver uma das flechas dos zoörgs atingindo um de meus soldados.

— E o que você fez? — perguntou Alamuc.

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— Convoquei todos para lutarmos diante daquele exército! Infelizmente, perdemos alguns de nossos homens, mas conseguimos derrotar aqueles malditos zoörgs.

— E você recebeu a minha mensagem? — Sim! — afirmou. — Recebi antes mesmo da batalha! Acho que a

intenção dos demäuros era de pegar algo de precioso em sua casa! Eles ficaram como urubus em torno dela.

— E eles conseguiram? — Não, senhor! Fiquei na porta vigiando juntamente com vinte anões

de minha inteira confiança. Matamos todos aqueles que queriam invadir a sua casa. Nossas espadas ficaram sujas de sangue. Nenhum demäuro conseguiu enfrentar a fúria de meu machado.

— Entendo! Infelizmente, houve muitas mortes por aqui! — disse Alamuc. — Mas reconheço que todos foram dignos de minha admiração. Morreram sendo leais ao seu rei! Continue no seu posto e me avise se acaso acontecer alguma coisa!

— Sim, senhor! — Ah! Mais uma coisa! Queime os corpos! — Sim, senhor! — disse Carvalho, retornando para a entrada da cidade. Alamuc andava em direção a sua casa, juntamente com todos os

membros da sociedade da prata. Ao chegarem próximo do portão de ferro, encontraram um homem esbelto e atraente. Ele vestia uma cintilante cota de malha negra e flexível por cima de várias camadas de couro fervido. Segurava um elmo negro. Parecia que estava todo manchado de sangue.

— Salve a magnífica senhora de Aracuqüe, a protegida de Ilumar! — disse o jovem guerreiro, ajoelhando-se perante Miriam.

— Salve nobre cavaleiro. Não nos conhecemos? — Creio que não milady. Me chamo Felipe! Fui convocado a estar aqui

com vocês nesta noite! — Ah, sim? E quem o convocou, senhor dos cavalos? — perguntou

Petrus.

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— Alguém que é muito mais majestoso do que a grosseria dos anões! — disse Felipe, encarando os olhares rudes dos anões.

— Esse sujeito acabou de me insultar! — gritou Petrus, segurando o seu machado.

— Não só a você meu irmão, mas a todos os anões! — gritou Alamac. — Senhores! Por favor, nada de brigas e descontentamentos! Chega de

mortes por hoje. — disse Miriam, tentando amenizar a ira dos anões. — Estou reconhecendo este elmo de algum lugar! Por acaso não seria

de Arthur? — perguntou Pedro. Felipe franziu as sobrancelhas. — Sim! Mas como você sabe disso? Por acaso você era algum dos

empregados do castelo? — Mais ou menos! — disse Pedro, dando um leve sorriso. — Eu fazia

as espadas dos guerreiros e sobretudo a do rei! Lembro-me de quando fiz este elmo.

— Você é Pedro? — perguntou o rapaz. — Filho de Hangar? — Sim! Eu sou! Mas quem são vocês? — Éramos soldados do rei Arthur! — exclamou Felipe. — Mas

decidimos abandoná-lo! Ele estava sendo injusto com seus súditos. Estava matando a todos, principalmente os aguianos.

— Ah sim! Vocês são os cavaleiros da justiça! — disse Pedro. — Sim senhor! Estamos ajudando algumas regiões contra o exército de

Cesarem. O Mal está se alastrando a cada dia. — Ficarão conosco esta noite? — perguntou Alamuc, com uma voz

ranzinza. Felipe respirou profundamente. — Infelizmente, não! Teremos que partir para o leste. As tropas

inimigas irão atacar as regiões de Criptön. Os hipogrifos irão morrer senão formos para lá!

— Como você sabe que eles irão atacar o leste? — perguntou Alamuc.

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— Recebi uma mensagem de Thomas agora pouco! Ele me pede o meu auxílio para se juntar com o exército dos centauros.

— Que bom que eles chegaram bem! — disse Eleönora. — Pelo que parece os centauros voltaram a ter uma amizade com os

hipogrifos. — disse Agäz. — Parece que sim! — disse Felipe. — Mas, com tantas batalhas, o

melhor seria se juntarmos para enfrentar o inimigo. Os aguianos estão morrendo, senão destruírem logo esta pedra, o mundo de Aldiroön estará perdido.

— Com certeza! — afirmou Miriam. — Não permita que nenhum sangue aguiano seja derramado novamente!

— Tentarei defender os aguianos, minha Senhora! Felipe levou um susto quando viu os dois vampiros se aproximarem das

grades de ferro. Ele retirou sua espada da bainha, com a intenção de cortar as cabeças daquelas criaturas.

— Seres nojentos e traiçoeiros! — gritou Felipe. — O que vocês fazem aqui?

— Não! — gritou Eleönora. — Como pode pensar em matá-los? — E por que não os mataria? São seres da noite, gostam de sugar o

sangue das criaturas de bem! — Mas mesmo assim não poderá matá-los! — afirmou Eleönora,

segurando o braço de Felipe. — Como não? A senhorita vai defender um vampiro? Essas criaturas

malditas? — Como assim malditas? — perguntou Eleönora. — Eles não passam de assassinos! — gritou Felipe. — Sanguessugas! A

própria perdição de Aldiroön! Melhor dizendo, os amaldiçoados de Cesarem! Eleönora franziu as sobrancelhas. — Nomes e mais nomes! — disse ela. — Saiba, senhor dos cavalos, que

infelizmente o senhor os enxerga de uma maneira precipitada.

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— Minha jovem! Saiba que até hoje não consegui enxergar nada de bom nessas criaturas. Em todas as batalhas, sempre tem um vampiro para me atormentar!

— Mas eles são diferentes! — disse Miriam. — Meu caro Felipe, acredite ou não, mas esses dois vampiros já salvaram a sociedade da prata das garras de Cesarem!

— Mas como? — Nas cavernas de Tiurän, enquanto Beyën capturava uma das pedras

este nobre rapaz avisou a todos que Cesarem estava por perto. — disse Miriam se apoiando em Jack. — E Ilumar o escolheu para pegar a última pedra em Algün. Por isso, você terá que nos defender, inclusive estes dois vampiros.

Felipe coçou a sua cabeça e respirou profundamente. — Bom! É uma loucura tudo isso, mas acatarei a suas ordens! Após longas discussões, todos os cavaleiros da justiça partiram rumo ao

leste. Todos os membros da sociedade da prata estavam descansando em colchões macios. Eles se esconderam de baixo de cobertores que os ajudava a se proteger daquele frio.

Ao passar algumas horas, Miriam se levantou e começou a passar pelos aposentos. Todos se levantaram no meio da madrugada.

— Meus amigos! É hora de partir. Agasalhem-se bem, porque iremos agora para as cavernas de espëlhim, rumo a mais uma pedra da perdição!

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esarem retornava para as cavernas de Algün. Ele estava enfurecido. Ao chegar na caverna, Sgraünd deu um salto em direção ao abismo. A serpente estava ferida. Ela simplesmente se

escondeu entre as rochas para tentar aliviar um pouco a sua dor. Cesarem andava de um lado para o outro. Ele não conseguia acreditar

que havia sido derrotado. Seu sangue subiu à cabeça. Houve momentos em que ele gritava consigo mesmo, destilando pelos quatro cantos a sua ira imortal.

Degälion arrastou-se em direção ao seu mestre e começou a falar em uma língua diferente. Ambos começaram a conversar na linguagem moörgan. Era uma linga antiga que os elfos usavam para se comunicar entre eles.

— Meu Senhor! Como pretende ser rei? Como pretende governar toda Aldiroön se Arthur continua a governar? — perguntou Degälion.

— Como assim? Arthur é apenas um escravo! Ele somente realiza as minhas vontades!

— Mas como o senhor pode ser rei se já temos um? — Mas eu sou o rei! — afirmou Cesarem. — O senhor não poderá ser rei enquanto Arthur estiver no trono de

Zatüron! Só há um senhor capaz de governar este mundo. Arthur está respondendo há um título que não lhe é confiado! Enquanto um viver, o outro não poderá governar!

— Maldição! — gritou Cesarem. — Como pude ser tão tolo desta maneira!

— Meu senhor! Aconteça o que acontecer, o meu mestre saberá o que fazer!

Cesarem saiu como um furacão em chamas. Ele voava sem parar, passando por diversas regiões.

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Enquanto isso, o rei Arthur andava de um lado para o outro. Ele estava

sozinho, olhando para a imensa escuridão que pairava sobre as terras. Era o sinal de mais uma nova tempestade de inverno. Diversos relâmpagos caíam nas terras de Zatüron. Arthur ficou assustado pelos clarões que iluminavam todo o seu castelo.

Cesarem chegou de repente, entrando pelas janelas do seu quarto. Ele andou sobre os corredores do castelo, descendo lentamente algumas escadas que davam acesso ao salão principal.

Arthur levou um susto quando viu Cesarem encostado sobre uma das colunas do castelo. Ele não entendia o motivo daquela visita repentina. Cesarem ficava a todo momento observando as atitudes de seu rei. Ele sabia que Arthur estava amedrontado com sua presença.

— Um belo trono! Não acha? — perguntou Cesarem, olhando para o trono vazio.

— Sim, meu senhor! É um belo trono! — Que pertence a um rei! — afirmou Cesarem. — Um rei que

governará toda Aldiroön um dia! — É isso que eu espero, milorde! — disse o rei dando uma risada

ingênua. — E acredite, se isso acontecer, todos serão obrigados a se prostrarem diante de ti.

— Será mesmo? Acho que isso nunca irá acontecer! — Como assim, milorde! Como pode perder a esperança desta

maneira? — Eu nunca perdi a esperança, seu tolo! Eu sei que iremos vencer!

Acabaremos com Ilumar e exterminaremos os aguianos, como deve ser feito! Cesarem sentou-se no trono da justiça. Ele olhava para o seu cajado

como se estivesse adorando aquela imagem. — Aconteceu alguma coisa, milorde? — perguntou Arthur. — Aconteceu sim! Existe uma criatura que está me prejudicando.

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— Quem, milorde? — Você! — disse Cesarem continuando a encarar o seu cajado. — Você

é o estorvo que atrapalha os meus planos! — Como assim, milorde? — disse Arthur com uma voz tremula. —

Não posso ser esta criatura! Sempre o servi e ajudei a matar os aguianos. — De fato, você me foi bastante útil! Um servo bom e fiel! Mas apenas

um deve governar. — disse Cesarem, olhando fixadamente para Arthur. — Não preciso mais de você!

Arthur respirou profundamente. Seus olhos começaram a brilhar. — O senhor me prometeu o reinado supremo de Aldiroön! Me

prometeu o trono da justiça durante toda a eternidade! Me prometeu o ouro e a riqueza dos anões. As montanhas dos elfos e as florestas dos centauros.

— Ora! Eu menti! — exclamou Cesarem, dando uma pequena risada irônica. — Uma coisa que eu sei fazer muito bem! Mentir!

— Mas como? — disse o rei expelindo algumas lágrimas de ódio. — Eu dei a minha vida pelo senhor!

— Cale a boca! — gritou Cesarem. — Eu lhe dei muitas coisas! O que mais você quer?

— O senhor me prometeu mais! Muito mais! — gritou Arthur. Sua pele começara a se avermelhar de cólera.— Como pode mentir desta maneira? Como ousa enganar o seu rei?

— Eu não tenho rei! — gritou Cesarem. — Você não é nada! Nunca foi um nada! Você é apenas um verme e nada mais do que isso!

— Milorde.... Por favor... Cesarem rapidamente cortou a garganta de Arthur com uma adaga que

estava guardada em seu roupão. O sangue escorria lentamente, sujando os carpetes que estavam próximos do trono.

Arthur começou a agonizar. Tentava cobrir seu ferimento com uma de suas mãos, impedindo que o sangue saísse pelo corte. O rei olhava para Cesarem, como se estivesse implorando pela sua misericórdia.

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Cesarem agachou-se diante do rei e observou a sua morte dolorosa. Degälion arrastou-se como vento, seguindo em direção ao seu mestre. Passou pelos pés de Cesarem e se sujou com o sangue fresco que escorria pelo chão.

— Degälion! — disse Cesarem, pausadamente. — Jantar! A serpente aumentou o seu tamanho e se arrastou em direção a sua

presa, devorando-a em questões de segundos. Após a sua refeição, Degälion aproximou-se de seu mestre que estava sentado sobre o trono. Ele rastejou até chegar no pescoço de Cesarem.

— Muito bem, meu precioso! — disse Cesarem, acariciando levemente a cabeça de Degälion. — Agora serei o único a governar Aldiroön.

Degälion caiu sobre o chão e se transformou em um cajado de ouro. Cesarem tomou-o para si, desaparecendo daquele lugar sombrio.

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iriam andava de um lado para o outro. Ela aguardava alguns dos anões que estavam ainda se arrumando. Quase todos estavam sonolentos. Os únicos que estavam dispostos eram

Agäz (que rapidamente vestiu a sua roupa de pano acinzentado) e o rei dos anões, que estava acordado há bastante tempo.

Alamuc desceu juntamente com Miriam e Agäz para uma cripta que ficava aos fundos de sua casa. Agäz se surpreendeu ao ver o tamanho daquelas enormes paredes que cercavam aquele lugar. Eram pedras negras, de espessuras alongadas. Parecia que a luz do sol nunca havia chegado a tocar naquele lugar. Ao descer diversas escadas, encontraram uma imensa fortuna.

Agäz nunca chegou a ver tanto ouro em sua vida. Havia tantas joias que até as estátuas de pedra estavam enfeitadas de rubi e cristais. Próximo a estas estátuas, estava guardado um baú de madeira, todo talhado de pedras preciosas. Alamuc abriu aquele baú. Dentro dele havia uma pequena rocha espessa, com um formato de um hexagrama.

— Aqui está, minha senhora! A chave que tanto precisamos! — disse Alamuc.

— Elennÿ nökity. — disse Agäz inseguro, não sabendo muito bem falar a linguagem élfica. — Por Ilumar! É esta a grande estrela da noite?

— Ela mesma! — disse Alamuc. — Carvalho conseguiu protegê-la muito bem! Se as criaturas de Cesarem a tivessem capturado, não conseguiríamos entrar naquelas cavernas.

— Precisamos guardá-la bem! Não sabemos o que iremos encontrar pelo caminho. — disse Miriam.

Agäz franziu as sobrancelhas. — Que estranho! — exclamou Agäz. — O quê? — perguntou Miriam.

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— Meu pai também teve uma caixa de madeira como esta! — disse Agäz. — Ninguém podia tocar naquela caixa!

— Como assim? Os elanfös não são de guardar ouro! Eles gostam de esbanjar como os anões!

— Nem tanto, Miriam! — disse Alamuc. — Eu não entendia muito bem! — disse Agäz. — Ele guardava alguma

coisa de precioso! Nem mesmo a minha mãe podia tocar nela. Era apenas ele e a caixa.

— E onde está essa caixa? — perguntou Miriam. — Está em Aquatinta, nos porões de minha casa! — Você nunca chegou a ver o que havia dentro dela? — perguntou

Alamuc. — Nunca! Mesmo depois da morte de meu pai, essa caixa ficou lá!

Intacta! Ninguém ousou tocar nela. — Estranho.... Muito estranho... — disse Miriam. Alamuc pegou a chave e apertou com sua mão. Suas pontas se abriram

como uma flor que acabava de desabrochar. — A chave realmente está intacta! — disse Alamuc. — O que me preocupa agora não é tanto a chave, mas o monstro que

habita naquelas cavernas. — disse Miriam. — Que monstro? — perguntou Agäz. — Um Tikbalang! — disse Miriam, olhando para os olhos de Agäz. Agäz não sentia mais as suas pernas depois de ouvir aquele nome. Todos

os elanfös tinham um certo medo de encarar aquela criatura. Tanto que Miriam não parava de olhar para ele, caso necessitasse de socorrê-lo.

— Sei do medo que os elanfös tem dos Tikbalangs. — disse Miriam, com um olhar dócil. — Não se preocupe, não deixarei que nada aconteça com você! Eu prometo!

— A senhora conhece bem os elanfös! — disse Agäz, dando um pequeno sorriso assustado. — E o anão? Já viu a fera que mora nestas cavernas?

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— Não! Somente meu pai chegou a ver a tal criatura! Ele me proibiu de entrar naquela caverna sozinho.

— Os anões têm a fama de serem rabugentos, egoístas e mesquinhos. Mas sabem responder muito bem às ordens de seus superiores. — disse Miriam. — Bom, pelo menos sabemos que aquelas montanhas nunca mais foram abertas e que o mal ainda reside nelas.

— Tenha a certeza de que não foram abertas! — afirmou Alamuc. — Esta chave estava guardada há anos, ninguém jamais tocou nela.

Após a conversa, todos subiram novamente aquelas escadas. A maioria da sociedade estava aguardando próximo à lareira.

Alamuc segurava aquela chave. Ele guardou dentro do bolso e colocou o machado sobre as costas. Todos caminharam em direção às montanhas de espelhim, enfrentando firmemente o frio que os afligia.

Caminharam durante três dias, passando por diversos vilarejos que encontravam em seu caminho.

Ao aproximarem das montanhas de Espëlhim, Agäz se deparou com algo que nunca havia visto antes. Uma enorme estátua estava guardando a entrada da caverna.

— Quem é o anão? — perguntou Agäz, esforçando-se a olhar para o topo da estátua.

— Meu pai! — respondeu Alamuc. — Ele fez questão de construir esta estátua para homenagear o dia em que ele encontrou uma das pedras da perdição.

Ao se aproximarem da entrada principal, perceberam que havia uma fechadura no formato de uma estrela. Ela estava toda coberta pela neve. Alamuc retirou a neve e encaixou a sua chave que estava fria em seus bolsos. Ao girar três vezes, os portões da caverna se abriram, expelindo um vento forte que vinha do interior da montanha.

Todos acenderam suas tochas e começaram a explorá-la, encontrando diversos tipos de rochas que eram impossíveis de se localizar. As mais diferentes de todas, eram aquelas que pareciam a de um espelho. Traziam consigo uma

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substância que dava a elas está clareza e este brilho, fazendo com que o reflexo se manifestasse perante todos que se colocassem em seu caminho.

A caverna estava repleta destas pedras. Qualquer pessoa poderia se confundir com o seu reflexo. Houve até relatos de que muitos dos anões do passado se perderam por vagar diversas vezes à procura de ouro e ferro.

Todos estavam temerosos. Primeiramente pelos espelhos que cercavam aquela caverna e consequentemente pelo mal que vagava pelas trevas.

— Devemos tomar cuidado! — disse Beyën. — Não vamos despertar o monstro que vive na escuridão.

— Mas por onde começar? — perguntou Mirgän. — Olha o tamanho deste lugar!

— Vamos até o lugar onde a encontrei pela primeira vez! — disse Beyën. — Talvez Ilumar o tenha guardado lá novamente.

Todos seguiram Beyën para o desfiladeiro. Ambos começaram a subir diversas escadas que eram estreitas e úmidas. A caverna estava congelada. Diversas vezes tiveram que reacender algumas das tochas que se apagava devido ao vento vigoroso que vinha por detrás das montanhas.

Ao chegarem próximos ao topo, encontraram mais dessas pedras em forma de espelhos e uma bagunça imensurável de capim seco e pergaminhos velhos.

— Pelo que parece, o mostro já esteve aqui! — disse Carvalho segurando uma das tochas.

— Ele está acordado! — disse Petrus. — Temos que achar logo essa pedra.

Agäz novamente estremeceu. Vigiava a todo instante para que o monstro não aparecesse de surpresa e os devorasse. Ele segurava fortemente a sua espada. Estava preparado para atacar, caso o monstro aparecesse de surpresa. Ao se aproximar do lugar esperado, não encontraram nenhum vestígio da pedra, somente trapos que estavam jogados ao chão e rochas pontiagudas que pareciam facas afiadas.

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— E agora? O que faremos? — perguntou Carvalho, que estava próximo de Beyën.

— Teremos que nos separar! — respondeu Beyën. — Está louco! — exclamou Alamuc. — Você esqueceu que há uma fera

solta por aí? Olhe ao seu redor! Estamos em um labirinto cheio de espelhos. — Podemos nos perder para sempre! — disse Agäz. — Por acaso você tem outra ideia que seja melhor do que a minha,

senhor anão? — gritou Beyën, se sentindo atormentado pela pedra. — Não há outra escapatória a não ser se nos separarmos e procurarmos essa maldita pedra.

— Beyën tem razão! — concordou Miriam. — Vamos nos separar! — Eu e Eleönora vamos subir mais um pouco! — disse Beyën. — Já

vocês, se separem e andem por toda a caverna. Vamos nos encontrar na entrada! Quem encontrar a pedra primeiro chame o rei Alamuc para que ele possa pegá-la.

— Sim, Beyën! — disse todos. — Boa sorte a todos! — concluiu Beyën, deixando eles para trás. Muitos não conseguiam compreender qual direção deveriam tomar.

Pareciam ratos confusos, completamente desordenados. Senão fossem as orientações de Pedro, todos ficariam parados, sem fazer nada.

Beyën subia juntamente com sua filha as longas escadas rochosas. Eles se depararam com mais um pavimento. Era o último deles. Eleönora olhava cada canto daquele lugar. Fazia diversos movimentos minuciosos para não ser descoberta.

De repente, surgia-se alguém na escuridão. Parecia ser um homem forte e robusto, com pelos no corpo. Sua cabeça era algo de assustador. Era como se fosse um cavalo possuído. Seus olhos eram vermelhos e esbugalhados, dentes parecidos com os de um duende e garras afiadas, ao ponto de cortar qualquer rocha que estivesse em seu caminho. Ele emitia um som que parecia ser a de um cachorro louco, encarando-os sem cessar. Eleönora estava prestes a atirar uma flecha naquela criatura.

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— Você irá atirar em mim! Filha de Beyën! — disse o Tikbalang. — Vejo que os elfos não mudaram seu modo de agir! Só pensam em resolver as coisas com seus arcos e suas lanças! Nunca usam mesmo a cabeça para dialogar! Neste aspecto vocês imitam muito os anões! Resolvem as coisas com brutalidade.

— Ora! Ora! Quanto tempo não o vejo, Sr. Creptan! — disse Beyën. — É Criptan, seu tolo! — disse ele irritado. — É verdade! A última vez

que você me viu, foi quando me trancafiou nesta caverna maldita! — Quem é ele, meu pai? — perguntou Eleönora segurando seu arco, ao

ponto de disparar a qualquer momento. — É um dos seguidores de Kalista! Um grande guerreiro. Sabe muito

bem manusear uma espada, por isso não atire! — cochichou Beyën, bem próximo aos ouvidos de Eleönora.

— Está com medo, não é mesmo, Beyën? — disse o monstro, que babava de uma forma anormal. — Sabe que eu posso mata-lo agora mesmo! Não sabe?

— Antes terá que passar por cima de mim! — respondeu Eleönora colérica perante as ameaças.

— Ora! Não brinque comigo! Seu pai sabe muito bem com quem está falando. Por isso, é melhor que abaixe o seu arco, sua fadinha do norte. — disse ele, segurando a sua longa espada.

— Eu vou lhe mostrar quem é a fadinha do norte! — disse Eleönora segurando firmemente o seu arco, pronta para atirar.

— Não faça isso! Acalme-se e deixe-me resolver essa situação! — disse Beyën, segurando o braço de sua filha. — Estamos aqui, para encontrar algo que me pertence!

— Algo que lhe pertence? — perguntou o monstro. — Nada pertence aqui, seu elfo imundo! Sei muito bem o que você quer! Mas a pedra pertence a Cesarem. É a ele que eu devo a minha lealdade!

— Então você sabe onde ela está? — perguntou Beyën. — Está falando daquela ali! — disse Criptan rindo, apontando para a

parede.

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A pedra estava presa entre as rochas, emitindo um brilho que ofuscava os olhos de todos os que estavam naquele lugar. De início, Beyën não conseguiu enxergá-la. Ela estava camuflada juntamente com as outras rochas.

— Então! Não vai se atrever a pegar? — perguntou Criptan, ironicamente. — Ah! Como pude me esquecer? Você não pode, não é mesmo? Como eu também não posso!

— Eu preciso dela! — disse Beyën, cheio de coragem. — E quando eu destruir, terei o gosto de ver a sua raça sendo banida desta terra.

— Então, antes que aconteça isso, terei que mata-lo! — disse Criptan, correndo em direção a Beyën.

Beyën guardou consigo a sua pedra. Ele retirou a sua espada da bainha e começou a lutar contra aquela criatura. Eleönora disparava algumas de suas flechas. O Tikbalang conseguiu se desviar de quase todas elas. Ele correu na direção de Eleönora e arrancou o seu arco. Ela estava desarmada. Seu arco foi lançado para o abismo e suas flechas foram quebradas com o impacto das pedras. Diversos gritos foram dados por ela, para que a sociedade pudesse se manifestar.

Beyën lutava contra aquele monstro. Ele estava se sentindo incapacitado para lutar, já que a sua pedra não parava de atormentá-lo. Suas espadas se cruzavam sem parar. Elas brilhavam quando se debatiam.

Beyën não conseguia suportar a força daquele monstro. De repente, a espada de Beyën foi arremessada para longe. Ela se debatia sobre as rochas escurecidas.

Beyën estava desarmado. O Tikbalang agarrou o pescoço do elfo. Criptan conseguiu levanta-lo até a altura de seu ombro. Seus pés não tocavam mais o chão. Ao bufar em seu rosto, expressou poucas palavras, deixando-o extremamente desesperado.

— Agora você ficará comigo, preso nesta maldita caverna! Eleönora pulou em cima daquele monstro, agarrando-o em suas crinas.

Mas ele era bem mais forte do que ela. Criptan arremessou Eleönora em direção aos pedregulhos. Ela bateu a cabeça fortemente e seu sangue esparramou sobre as rochas.

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Enquanto Eleönora gritava, seu pai segurava o braço daquela criatura. A espada de Criptan brilhava sem parar. De repente, a lâmina pálida atravessou sem piedade o peito do elfo. Beyën fechou os olhos e sentiu o sangue subir pela sua boca. Ao abrir os olhos, sentiu que o seu corpo estava sendo lançado contra o vento. Beyën sentiu uma dor imensa com o impacto das rochas.

Quando novamente olhou para o Tikbalang, percebeu que a sociedade da prata começava a se manifestar. Primeiramente, foram os vampiros que pulavam em cima daquela criatura. Eles não paravam de morder o seu pescoço, expelindo uma grande quantidade de sangue que jorrava por quase toda a caverna. Logo vieram os anões com seus machados, que cortavam sem piedade as pernas daquela criatura. Mas o golpe de misericórdia foi dado pela espada das oliveiras. Miriam apunhalou o seu coração, fazendo com que a espada transpassasse seu peito.

O Tikbalang estava morto. Todos empurraram aquela criatura em direção ao abismo. Ele caiu de uma altura extremamente alta, desaparecendo na escuridão. Eleönora estava com sua testa toda suja de sangue. Ela aproximou-se de seu pai. Beyën estava agonizando naquele momento. Parecia que o ar não penetrava mais os seus pulmões. Ele fazia força para sugar o pouco de ar que ainda restava.

— Meu pai! — gritou Eleönora. — Meu pai! Não me deixe. — Eu nunca irei deixá-los! — disse Beyën, olhando para os seus três

filhos que estavam próximos de seu corpo. — Me perdoe! — disse Eleönora, emocionada. — Me perdoe, por não

tê-lo salvado. — Mas você já me salvou! — disse Beyën, tentando respirar. — Não se

preocupe! Eu vou ficar bem! — Lutou bravamente, senhor elfo! — disse Alamuc, que se aproximava

cada vez mais de Beyën. — Você foi para nós motivo de muita honra! — Não foi a espada que me trouxe até aqui. Mas foi a honra de servir

Ilumar. — disse Beyën, dando um pequeno sorriso. — Eu... tenho um desejo que gostaria de compartilhar com todos vocês.

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— Pode nos dizer! — disse Miriam, que enxugava suas lágrimas em um pequeno pedaço de pano.

— A partir de hoje, Pedro assumirá toda a sociedade da prata! Garanto que se sairá melhor do que eu!

— Não fale besteiras! — disse Pedro, segurando a mão do elfo. — Ninguém substituirá o grande Beyën, rei de toda o norte.

— Meu rapaz! Desde o momento em que esteve em minhas terras, percebi a grandeza de sua coragem! — disse o elfo pausadamente. — Um verdadeiro líder é capaz de abandonar as suas terras para lutar por algo em que acredita. Assuma a liderança desta sociedade e me deixe morrer feliz.

Pedro acenou com a cabeça, dando uma resposta positiva. Beyën deu um leve sorriso.

— Eu nunca imaginei que isso pudesse acontecer! — disse Miriam, toda emocionada.

— Por que você está chorando, Miriam? Sabe que não estou indo definitivamente! Ilumar irá me acolher em suas asas e me levará para o seu outro mundo. — disse Beyën, olhando para a senhora de Aracuqüe. — Você se lembra o que me disse em sua casa? Que eu precisava transmitir para os outros a felicidade de seguir e de fazer as vontades de Ilumar? Por isso, não chore! A morte é só o começo, todos nós teremos que passar por ela algum dia. Somente assim, conseguiremos desfrutar em Calauë.

Miriam deu um beijo na mão esquerda do elfo. Beyën segurou fortemente a sua pedra que estava iluminada.

— Encerro aqui o desejo de Ilumar! Mas haverá outros que concluirão com a sua vontade!

— Por favor, meu pai, não nos deixe. — disse Mirgän, chorando. — Eu amo muito vocês, meus filhos! Mas é preciso partir! — disse ele,

expelindo algumas lágrimas. — Meus olhos escurecem e não consigo sentir mais o meu corpo. — Beyën deu uma pequena pausa e em seguida olhou atentamente para o anão. — Alamuc! Ali se encontra a terceira pedra da perdição! Seja forte, meu amigo!

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— Meu pai! O senhor precisa largar esta pedra! — disse Turän, enxugando as suas lágrimas.

— Deixe-me ficar com ela. Eu sei que logo irei me transformar em uma estátua de sal! — disse ele sorrindo, apertando consigo a pedra em seu peito. — Agora não me importa mais nada! Seguro esta pedra, como sinal de vitória e de conquista. Nenhum cavaleiro conseguiu chegar tão longe como esta sociedade.

Beyën estava sem ar e sua voz estava esvanecida. Ele estava ficando pálido devido à quantidade de sangue que estava perdendo. Ouviam-se poucas palavras naquele lugar. Apenas um doce sussurro do vento que vinha do interior da caverna, tocando levemente os cabelos de Eleönora que chorava pela morte de seu pai.

Beyën se transformou em uma estátua de sal. Suas mãos começaram a ficar endurecidas e seu corpo adquiriu um certo brilho que irradiou quase toda a caverna. Seu corpo estava se desmanchando. O vento que pairava no interior da caverna levou suas cinzas para o horizonte. A única coisa que permaneceu no chão, foi a pedra verde das esmeraldas. Ela brilhava constantemente, expelindo a sua riqueza enganadora.

Como Beyën estava morto, era por tradição passar para o próximo filho de sua linhagem. Não se sabia ao certo quem seria o escolhido. Todos aguardavam algum sinal de Ilumar para ver quem seria o próximo a tocar naquela pedra.

Depois de muitas lágrimas, Turän se aproximou da pedra com a intenção de pegá-la. Miriam logo soltou um grito que assustou a todos que estavam ali sentados.

— O que você vai fazer? Está louco! — Está pedra me pertence! — gritou Turän, tirando a espada da bainha. — Como pode ter certeza? Ilumar por acaso lhe disse algo? —

perguntou Miriam. — Não há outra criatura que possa carregar esse fardo! — Não há outra criatura? Por acaso você esqueceu que tem um irmão?

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— Mirgän! — gritou Turän, enxugando as suas lágrimas. — Ele não sabe nem pegar em um machado, imagina se será capaz de carregar uma preciosidade dessa?

— Ele tem o mesmo sangue que você! — disse Miriam. — Eu não permitirei que ele carregue a pedra que meu pai custou tanto

para carregar! — Não perceberam que a pedra está controlando vocês novamente! —

disse Agäz. — Ela está querendo deixar todos irritados! — Não me importa mais nada! A pedra é minha e de mais ninguém! —

disse Turän, que rapidamente pegou a pedra que estava caída. Turän sentiu uma imensa dor que transpassava a sua alma. Era tão forte

aquele momento que por diversas vezes ele se jogava ao chão para tentar aliviar aquela dor. Não aguentando mais aquelas torturas, arremessou para longe aquela pedra que o atormentava. Ele tentava recuperar as forças. Parecia que a pedra havia sugado toda a sua energia.

Turän não conseguia mais mexer as pernas. Seus braços estavam endurecidos e sua respiração estava ofegante. Uma forte luz envolvia todo o seu corpo. Sua pele estava se transfigurando em grãos. Rapidamente, o processo aconteceu. O elfo estava endurecido. Uma nova estátua enfeitava aquele lugar. Seu corpo se desmanchava com o vento que sucumbia as montanhas.

Eleönora e Mirgän estavam arrasados. Eles acabavam de perder as duas pessoas mais importantes de sua vida.

Miriam aproximou-se do único herdeiro, capaz de assumir o trono de Tiän. Ela se ajoelhou e sussurrou algumas palavras para Mirgän que estava sentado próximo aos rochedos.

— Seja forte, meu rapaz! Turän infelizmente caiu em tentação, querendo a pedra para si! Agora sabemos que Ilumar o escolheu para carregar a pedra que Beyën trazia desde Tiüan.

Ao ouvir o sussurro de Miriam, o elfo se levantou lentamente e se dirigiu ao encontro daquela pedra. Ao pegá-la com uma certa desconfiança, sentiu um tremendo calafrio que o fez estremecer completamente.

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A dor gritava em todo o seu corpo. Mirgän caiu sobre as rochas. Ele se contorcia de dor e de agonia. Diversas vozes penetravam em sua mente, dizendo palavras que sucumbiam a sua alma.

Ao se levantar com uma certa dificuldade, Mirgän olhou para todos que estavam a sua volta. Ele deu um leve sorriso esforçado e guardou a pedra no bolso. Alamuc conseguiu pegar a pedra branca, totalmente afigurada no quartzo. O anão sentiu as mesmas dores do elfo ao tocar naquela pedra.

Todos tentavam sair daquele lugar. Mas era difícil, devido aos espelhos que os atrapalhavam. Depois de algumas horas perambulando na caverna, finalmente conseguiram escapar.

Alamuc conseguiu trancar novamente a caverna. Ele levou consigo a chave que rapidamente fechou as suas pontas.

Eleönora chorava sem parar. Ela recebeu de Jack uma flor de gérbera toda cor de rosa, retirada recentemente de um pequeno jardim que estava próximo ao vale.

— Dou-lhe esta flor, para a mais bela rosa do meu precioso jardim! — disse Jack, dando um leve sorrindo.

— Obrigada! — disse Eleönora, dando um abraço. — Por que deixei a covardia me dominar daquela maneira?

— Você fez o máximo que podia para ajudá-lo! — disse Jack, olhando fixamente nos olhos de Eleönora. — É preciso continuar a viver! E agora, mais do que nunca, é preciso dar sentido para essa missão.

— Estou completamente desanimada! Não tenho forças para continuar...

— Se seu pai estivesse aqui, garanto que ele falaria a você para continuar a missão pela qual ele tanto lutou! — disse Jack. — Não podemos desistir agora! Estamos a um passo do fim! Estarei sempre ao seu lado. Irei ajudá-la nos momentos de sua fraqueza.

Enquanto eles conversavam próximo ao vale, Miriam reparou que havia alguns hipogrifos a sua espera. Thomas realmente passou o seu recado, já que eles estavam à espera da senhora de Aracuqüe. Ao se ajoelharem perante a dama,

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começaram a relinchar. Todos os hipogrifos permitiram que os membros da sociedade da prata pudessem voar em suas costas (eles eram criaturas frescas, não permitiam que homens ou elfos subissem nelas para voarem. Mas como era algo importante, deram a permissão).

— Rápido! Subam nas costas dos hipogrifos e vamos para o leste. — gritou Miriam.

Havia oito deles, tanto que cada hipogrifo levava duas pessoas. Todos começaram a voar, sobretudo os anões que sentiram um certo medo por estarem nas alturas. Mas havia um hipogrifo que retornava sozinho. Eleönora se sentiu amargurada. Ela percebeu que ali seria o lugar das duas pessoas que ela acabava de perder.

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entauros, seres fascinantes, mas extremamente selvagens. Criaturas que romperam com os hipogrifos devido ao poder de uma das pedras da perdição. Mesmo perante este rompimento,

decidiram ajudar nesta batalha. Os centauros trouxeram consigo um número elevado de soldados e de armas. Várias catapultas foram feitas, com a ajuda de homens e de elfos que estavam vivendo naquelas redondezas.

A cavalaria estava presente. Os cavaleiros da justiça se aproximaram com mais de dois mil homens a serviço de seu regente. Todos eles aguardavam o exército de Cesarem que marchava dia e noite, com o intuito de exterminar os hipogrifos e apoderar-se daquelas terras. Mas não eram apenas as criaturas de Cesarem que marchavam. Havia também o exército de homens que marchavam no meio deles, servindo fielmente às ordens de seu rei. Felipe ficou indignado em ver a raça dos homens lutar a favor de Cesarem, mas a maioria deles eram sujeitos tolos, que sempre ouviam as ordens de Arthur.

O exército se aproximava. Vários arqueiros estavam à frente, prontos para dispararem as flechas negras criadas pelos Zoörgs. Já do outro lado, um grande exército de centauros estava à frente. Eles eram fortes guerreiros. Estavam decididos a exterminar qualquer criatura que entrasse em seu caminho. Marcus gritava a todo instante. Ele dava ordens aos centauros. Todos estavam preparados para a grande batalha que estava por vir.

— Fiquem firmes! — gritou Marcus, segurando a sua espada. — Lanceiros à frente, arqueiros atrás. Hoje muito sangue será derramado, por isso não temam o inimigo! Coragem, guerreiros, coragem!

Enquanto eles se preparavam, uma flecha negra vinha na direção de um dos centauros, acertando o seu peito. Marcus ficou extremamente irritado com aquela situação. Ele autorizou o seu exército a lutar com bravura.

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A batalha havia começado. Vários demäuros sobrevoavam em cima de seus dragões, aniquilando alguns dos hipogrifos que estavam ajudando os centauros. Alguns deles carregavam consigo um chicote preto, com diversas lâminas em sua volta. Muitos dos hipogrifos perderam a cabeça devido a esse chicote que estalava sobre o seu pescoço.

Diversos homens que estavam a serviço de Felipe presenciaram aquela cena macabra. Todos ficaram extremamente coléricos, ao ponto de mirarem suas flechas em direção aos demäuros. E assim aconteceu. Diversos demäuros foram massacrados pelas flechas pontiagudas dos cavaleiros da justiça. Muitos deles caíram de seus dragões com uma flecha cravada no peito.

Alguns dos Zoörgs foram esmagados pelas pedras que as catapultas emitiam ao longo da batalha. Os Trolls e os demäuros foram também atingidos pelas rochas. Ambos voaram juntamente com a força das pedras.

Havia alguns zoörgs que conseguiam lutar bravamente. Diversos centauros foram degolados pelas suas espadas. Suas cabeças foram lançadas contra o vento. Algumas delas foram cravadas em estacas de prata. Muitos deles foram mortos, juntamente com alguns dos hipogrifos. Havia centauros que estavam sem a crina, outros estavam servindo de alimento para os zoörgs. Os demäuros aproveitavam a morte dos hipogrifos para sugar o seu sangue.

Depois de um longo tempo de batalha, o fim estava próximo. O exército de Cesarem estava totalmente exterminado. Felipe comemorava juntamente com os seus guerreiros a vitória prometida.

Enquanto isso, a sociedade da prata sobrevoava os cadáveres que estavam jogados ao chão. Diversas criaturas estavam estendidas, juntamente com as suas espadas mergulhadas em sangue.

Miriam ficou arrasada ao ver tantos corpos dilacerados. Ela desceu do hipogrifo e se aproximou de Felipe, que estava com a testa toda enfaixada.

— Vencemos, minha senhora! — disse ele todo sorridente. — Sim! — disse Miriam. — Vencemos a batalha, mas não a guerra! O

exército de Cesarem é bem mais elevado do que estes aqui. A maioria deles se encontram no sul. Todos eles estão protegendo as cavernas de Algün.

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— Eles não querem que nos aproximemos dela, com o medo de destruirmos as pedras. — disse Pedro.

— Isso mesmo! — afirmou Miriam. — Mas nós precisamos entrar nela! Por isso, convoquei a todos para lutar contra o exército de Cesarem. Virão homens e elfos, centauros e hipogrifos, todos irão lutar com o único objetivo. Salvar o mundo de Aldiroön das garras infernais de Cesarem.

— E quando será isso, minha senhora? — perguntou Felipe. — Em breve! Por isso preparem seus homens, porque a verdadeira

guerra está por vir. — E onde estão Beyën e Turän que não vieram com vocês? —

perguntou Thomas. — Digamos que eles cumpriram a sua missão! — disse Miriam, com um

semblante entristecedor. Thomas ficou paralisado. Todos que estavam próximos tiveram a

mesma reação. Muitos ficaram questionando a morte dos dois elfos, mas Miriam não queria entrar em detalhes, já que Eleönora estava próximo a eles.

— Mas me diga! Onde está a sua charada? — perguntou Pedro. — Está aqui! — disse Thomas, mostrando o pedaço de pergaminho. — Bom! Esta é a última charada. — disse Miriam. — Espero que

consigamos desvendá-la. Com as ordens de Pedro, o pergaminho foi aberto e mais uma charada

estava prestes a ser pronunciada. Mas, novamente, Ilumar conseguiu surpreendê-los. Não havia nada escrito no pergaminho, apenas alguns rabiscos na parte inferior do papel. Era tão pequeno que mal se podia enxergar.

— Não consigo ler! — disse Thomas. — E agora? O que iremos fazer? — perguntou Tebas. — Calma, gente! Para tudo tem uma solução! — disse Agäz. Ele retirava

de seus pequenos bolsos uma lupa antiga. — E então! O que está escrito? — perguntou Marcus.

— Cəɍvanƨ ɸ Ѧlquiɳɳ. — E o que isso significa? — perguntou Tebas.

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— Eu não sei! — exclamou Thomas.— Já ouviu falar esta palavra, Eleönora?

— Não! — disse ela. — Não sei o que significa! — E você, Mirgän? — perguntou Thomas, novamente. — Também não! — Radnör? Conhece? O elfo fez apenas um gesto com a cabeça, como se não soubesse de nada. — Pelas barbas de Bengar! Estamos perdidos! — exclamou Carvalho. — Ora, por favor! — disse Pedro. — Vamos nos controlar! Talvez essa

linguagem não seja dos elfos. — Acredito que seja dos próprios centauros! — disse Miriam. — Os

antigos centauros pronunciavam algumas palavras esquisitas. No fundo queriam imitar os elfos, mas acabou não dando muito certo! Conhece alguém que possa traduzi-las para nós?

— Existe um velho homem que mora próximo às redondezas! — disse Thomas. — Ele conviveu com alguns dos centauros que sabiam falar esta linguagem, talvez ele possa nos ajudar!

— E você? Não sabe pronunciar esta linguagem antiga? — perguntou Agäz.

— Não! — afirmou ele. — Meus antepassados nunca me ensinaram! Talvez eles tenham percebido que não serviriam mais para mim, depois que ela deixou de existir.

— Sabe onde localizá-lo? — perguntou Pedro. — Sim! Ele mora em um pequeno povoado nas regiões de Jatüan. Não

é muito longe daqui, iremos gastar uns dois dias de viagem. — Muito bem! — disse Pedro. — Prepare alguns de seus cavalos,

porque partiremos ainda esta noite. Thomas ficou confuso. Ele não sabia o que fazer perante aquele pedido.

Aliás, como ele iria explicar para Pedro, que naquelas terras não haveria nenhum cavalo disponível. Qualquer pessoa saberia que na terra dos centauros, não

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haveria nenhuma espécie de cavalo, a não ser eles que já nascessem daquela maneira.

Mas depois de um certo tempo, Thomas acabou se lembrando de que havia alguns cavalos que estavam soltos pelos campos. Eles pertenciam aos homens que morreram ao longo da batalha. Rapidamente, os cavalos foram trazidos para os membros da sociedade.

Ao cair da noite, cavalgaram lentamente em direção às terras de Jatüan. Todos estavam exaustos, mas decidiram continuar firmemente até chegarem em um certo vilarejo, próximo daquelas terras. Passando pela entrada, encontraram uma certa hospedaria. Diversos centauros trabalhavam naquele lugar.

Era uma noite chuvosa, a maioria deles estavam ensopados. Todos decidiam se hospedar. Eles queriam se aquecerem em volta da lareira. A hospedaria se chamava “centauros e ferraduras”. Ela era feita de madeira e palha, com um acabamento integralmente adaptado e com diversos criados que trabalhavam dia e noite, dando um melhor atendimento a todos que passavam por aquelas redondezas.

Alguns dos anões sequer subiram em seus quartos. Eles avistaram uma pequena taberna, próximo a um quartinho cheio de vassouras velhas. Todos tomaram um gole de cerveja caramelada. Como era delicioso sentir o doce sabor daquele líquido gelado, descendo goela adentro. Havia muito tempo que eles não sentiam o aroma daquela bebida. Felipe sentou-se à mesa com eles e logo começou a conversar. Ele estava bebendo a mesma bebida pedida pelos anões.

— Me preocupo com o mundo de Aldiroön! Muitas cidades foram destruídas e dominadas pelo exército de Cesarem.

— Eles que não se atrevam a invadir o oeste! — disse Claüer com a barba toda encharcada de cerveja. — Meu machado irá rolar sobre seus pescoços.

— Sua cidades e montanhas poderão estar na listagem de Cesarem. A propósito, suas montanhas escondem diversas joias de Aldiroön. — disse Felipe.

— Algumas delas estão sendo vigiadas por diversos anões guerrilheiros. — afirmou Carvalho. — Não se atreverão de lutar contra eles.

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— Algumas terras dos humanos e dos elfos foram dominadas! — disse Felipe. — Eu estava lá, protegendo os seus portões, quando de repente apareceram diversas catapultas e bombas que explodiram os muros de algumas das cidadelas. Tivemos que fugir, porque o número deles era maior. Mas garanto, que fiz muitos Zoörgs e demäuros conhecerem profundamente o fogo de Algün.

— Seres nojentos! — disse Treno. — Merecem mesmo morrer. — Mas Cesarem está cada vez mais poderoso! — disse Azac. — Se não

destruirmos logo estas pedras, os corações das criaturas de Ilumar se corromperão com o poder emitido por elas.

— Sim! — afirmou Petrus. — Ilumar poderá ser esquecido e Cesarem se tornará o único senhor destas terras.

— Isso não poderá acontecer! — exclamou Felipe. — Porque senão todos os aguianos serão mortos.

— Isso não irá acontecer! — afirmou Alamuc, segurando a sua caneca de cerveja. — Cesarem terá que passar em cima de meu cadáver, antes de tomar todo o mundo de Aldiroön.

Diversas conversas aconteceram naquela noite. Ao se passarem algumas horas, resolveram descansar um pouco para recuperar as suas energias. Pedro já estava dormindo. Ele estava deitado no chão, em cima de uma pequena palha coberta por lençóis (não havia muitas camas naquele lugar). Pedro acordava por diversas vezes, tentando se acomodar naquele chão gelado.

Houve um momento em que Pedro se despertou por completo. Ele viu sair de sua pedra uma sombra negra que pairava sobre o quarto. Ficou assustado, mas preferiu ficar no quarto para ouvir aquela sombra.

— Pedrooo! Pedrooo! — disse a sombra com uma voz roca e asquerosa. — O coração dos homens é fácil de ser corrompido!

— Quem é você? — Eu sou aquele que habita nas sombras obscuras de Algün! — disse

ele novamente. — Como pode ser tão tolo assim! Não percebe que está com uma das pedras mais poderosas deste mundo? Como você ainda não fugiu com ela?

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— Não posso negar que já me passou este desejo! — disse Pedro, olhando para a sua pedra. — Mas não posso trair a sociedade da prata, e muito menos Ilumar!

— Ilumar! Como pode ser fiel a ele? Sequer está ajudando-o nesta missão? Como pode pensar no Senhor das Águias, se nem ao menos ele pensa em você? Fuja, Pedro, para bem longe e se torne o ser mais poderoso desta terra. Muito mais poderoso de que Ilumar.

— Para onde eu irei? Onde me esconderei? — Para as cavernas negras de Algün, juntamente com Cesarem! — Não! — gritou Pedro. — Não irei me refugiar com Cesarem, o

infame! Estou aqui para cumprir a minha palavra. Destruir definitivamente esta pedra que tanto me atormenta.

— Você pensa mais na lealdade, não é mesmo? — disse a sombra, que andava de um lado para o outro. — Você não irá quebrar a sua palavra se interagir sozinho! Não precisa desta sociedade que está sempre impondo algo a você. Você pode destruir a pedra sozinho. Mas acho melhor você ficar com ela. Não se esqueça de que a pedra pode transformá-lo no ser mais poderoso deste mundo. Muitos irão se curvar perante a sua presença. Então, o que me diz?

— O meu maior desejo é de sair daqui e de voltar para Caën. Posso reconstruir aquela cidade com o poder desta pedra. — disse Pedro, ofegante. — Mas não posso trair o meu povo, e muito menos a sociedade que me acolheu muito bem!

— Seu idiota! — gritou a voz. — Pare de ouvir o seu coração e escute a voz da razão! Não percebe que você poderá fazer tudo isto sozinho?

— Se eu pudesse fazer isso sozinho, Ilumar não teria me escolhido. Sempre irei precisar do outro. — disse Pedro. — Posso lhe garantir que uma amizade verdadeira é muito mais poderosa do que está pedra que estou segurando. Não conseguirei fazer nada sozinho, sem a ajuda de meus companheiros.

— Ah! Continua sendo um tolo! Espero que Cesarem o mate.

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— Mas antes disso, eu o matarei primeiro! — gritou Pedro. — Agora suma daqui e me deixe em paz!

— Não poderei partir sem antes lhe mostrar uma coisa! — disse a sombra. — Fique tranquilo, aposto que irá gostar do que vou lhe mostrar!

— De você não quero nada! Saia daqui agora! — gritou Pedro. Nada se podia fazer. Estava ele todo envolvido por aquela sombra. Pedro

sentiu que seu corpo estava flutuando no ar. Em questão de segundos, estava ele na cozinha de sua casa. Pedro olhava de um lado para o outro, tentando acreditar que aquilo estava realmente acontecendo.

De repente, apareceu uma mulher em sua frente. Ela tinha cabelos negros e olhos castanhos. Vestia um longo vestido verde com detalhes em sua volta. Eram lírios amarelos. Parecia ter sido costurado pelos elfos antigos. Sua face era encantadora.

Pedro reconheceu na hora aquela mulher. Ele sabia que era a sua mãe que estava caminhando pela cozinha. Pedro ficou abismado e ao mesmo tempo emocionado de rever a sua mãe que há muito tempo havia falecido.

Ela não estava sozinha na cozinha. Cesarem apareceu diante de seus olhos. Ele andava juntamente com Degälion que se rastejava sobre o chão de madeira. Pedro seguiu-o.

Ao se aproximar da sala, Pedro percebeu que havia uma criança sobre o berço. Parecia que ele estava dormindo tranquilamente. Cesarem acariciou levemente o rosto daquele bebê. Ele sentia a sua pele lisa deslizando entre seus dedos. De repente, Cesarem retirou de seu roupão uma aranha caranguejeira. Parecia um demônio em forma de bicho.

Pedro ficou assustado ao perceber que Cesarem havia colocado aquela aranha no rosto da criança. Por diversas vezes, a aranha andava pelo corpo do bebê. Cesarem desapareceu com Degälion.

Pedro correu na direção do berço ao ouvir os berros daquela criança. Sua mãe apareceu rapidamente, indo ao encontro de seu filho. Ao se deparar com aquela aranha, Rebeca se assustou.

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Pedro não conseguiu enxergar a reação de sua mãe, muito menos a atitude dela perante aquela criatura. Sentiu que seu corpo estava sendo puxado de volta para o seu quarto.

Em questão de segundos, Pedro estava sentado em cima daquela palha seca, completamente assustado pela cena ocorrida.

— Maldito seja, Cesarem! — gritou Pedro. Radnör escutou os berros que vinham do quarto de seu amigo. Ele correu até a sua direção para averiguar o que estava acontecendo.

— O que houve? — Maldito Cesarem! — gritou ele novamente. Sua face estava

avermelhada devido a sua fúria. — Maldito seja o infame dos infames! — O que aconteceu? — Foi ele desde o princípio! Foi ele quem colocou a aranha em cima de

mim. — Que aranha? — Uma aranha caranguejeira! Se hoje eu tenho medo delas, é graças

àquele maldito. Ele desgraçou a minha vida! — Como você sabe disso? Acaso ele lhe mostrou? — Sim! — disse Pedro. — Viajei para o passado, graças à pedra! — Como pode acreditar nela? Não se esqueça de que Agäz teve a mesma

experiência e foi enganado! — Mas comigo foi diferente! — disse Pedro, extremamente irritado. —

Eu estava em minha casa! Eu vi quando o mago colocou sobre mim aquela aranha! Por que ele estaria me enganando?

— Eu não sei! — disse Radnör. — Mas é uma possibilidade! — Não! — afirmou Pedro. — Ele queria era mesmo me mostrar!

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a manhã seguinte, todos estavam dispostos a continuar o seu caminho. Felipe havia recebido um corvo logo de manhã, dizendo que eles precisavam partir para uma outra região.

Ele se dirigiu até a sociedade que estava reunida na taberna. Todos estavam com seus canecões cheios de cerveja caramelada. Eles também comiam alguns amendoins torrados, juntamente com alguns pães cevados.

— Precisarei partir! O exército de Cesarem irá atacar daqui a três dias a cidade de pedra.

— Petrunski! — sussurrou Pedro. — Ela fica nas regiões de Caën. — Sim! — afirmou ele. — Todos os guerreiros estão se dirigindo para

aquela cidadela para proteger seus muros e seus portões. Precisarei de mais homens para lutar! Teria como você liberar uns dos seus para virem comigo?

— Está louco! Se Beyën estivesse aqui, jamais concordaria com isso! — gritou Pedro.

— Mas ele não está! — afirmou Felipe. — Agora é você que deve decidir! Afinal de contas, não é você o líder desta companhia?

— Sim! Mas não posso decidir por eles! — exclamou Pedro, dando uma pequena pausa em sua fala. — Alguém gostaria de ajudá-lo?

— Não acredito que você irá deixar que alguns membros desta sociedade partam desta maneira! — exclamou Eleönora. — Meu pai jamais permitiria tal escolha.

— Seu pai tinha seus motivos! — disse Miriam. — Mas não vejo o porquê desta discussão! Todos nós estaremos lutando contra Cesarem, estando aqui ou não!

— Eu ficarei! — disse Eleönora. — Eu irei! — disse Radnör. — Sou bom com as flechas!

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— Dos meus homens poderão ir Carvalho, Petrus, Claüer e Alamac. — disse Alamuc. — São os meus melhores soldados.

— E vocês, vampiros? — perguntou Felipe. — Algum de vocês se disponibiliza a lutar conosco?

— Eu irei! — disse Jack, olhando profundamente para os olhos de Eleönora.

— Se ele for, eu também irei! — disse Tony, que segurava o ombro de seu amigo.

— Acredito que Marcus irá com você! — disse Thomas. — Muito bem! — exclamou Felipe. — Preparem-se, homens! Porque

iremos enfrentar uns cinco mil soldados de Cesarem. Miriam ficou abismada pela quantidade de Zoörgs que iria lutar contra

a raça dos homens. Era um número extremamente elevado para ser derrotado, dificultando a todos que estavam dispostos a lutar contra aquelas terras.

Houve um certo momento em que todos puderam se despedir. Pedro sempre tocava na mesma tecla, dizendo para eles se encontrarem nas terras de Elgön após a batalha.

Eleönora não gostou muito da atitude de Jack. Seria uma loucura dele lutar ao lado dos homens, pensou ela. Jack poderia ser morto tanto pelos Zoörgs como também pelos próprios humanos, já que ele poderia ser confundido com algum guerreiro de Cesarem.

Uns partiram para o norte e outros para o sul. Apenas os vampiros permaneceram na hospedaria, se escondendo do sol que irradiava toda aquela região.

Ao cavalgar algumas léguas, encontraram o pequeno vilarejo nas regiões de Jatüan. Havia um belíssimo riacho que cruzava aquele povoado, com gramas ao seu redor e flores com diversos tipos de aromas. Ao caminharem pelo vilarejo, encontraram diversos tipos de centauros e elfos que viviam em plena harmonia. Alguns trabalhavam juntos na colheita, outros, na plantação de café, no ouro e no minério, eram sempre unidos nos serviços braçais.

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Ao atravessarem uma pequena ponte de madeira, encontraram ao fundo de uma árvore, uma pequena casa feita de tijolos. Lá havia um homem, com uma aparência bem envelhecida, que se apoiava em sua bengala de madeira. Ao recebê-los em sua casa, ofereceu-lhes alguns pães ázimos e uma xícara de chá de ervas verdes. Seu nome era Randuque, um sujeito mesquinho que fugiu da terra dos homens para não ser escravo de seu rei. Na verdade, ele não gostava de nenhum, apenas dos centauros que não cobravam impostos exagerados para viver.

— Eu sei muito bem o que esta palavra significa! — disse Randuque, sabendo de toda a história. — O que me surpreende é que o senhor não fale esta língua!

— Como lhe disse, meus antepassados não me ensinaram! — disse Thomas. — Mas me fale, o que isso significa?

— Cəɍvanƨ ɸ Ѧlquiɳɳ! — disse Randuque. — Significa, a árvore de glória!

— E o que isso poderá nos ajudar? — perguntou Agäz. — Muito, senhor elanfö! — disse o velho. — As árvores de glória

adoram saborear as águas deste reino. Este pergaminho foi feito de seus troncos. Se eu não estiver enganado, apenas é preciso molhá-lo para que seus segredos sejam revelados.

Thomas saiu correndo, segurando o pergaminho entre os dedos. Dirigiu-se até ao riacho que se encontrava próximo daquela casa. Ele mergulhou o papel, com a esperança de que alguma coisa pudesse acontecer.

Ao retirar, reparou que as letras estavam aparecendo, como se elas estivessem sido marcadas pelo fogo. Todos foram até a sua direção e ouviram atentamente mais uma charada de Ilumar.

Ra! Ra! Tu! Si! Ra! Ra! Tu! Si! Grandes montanhas são vistas e apreciadas!

Mas apenas uma deve ser glorificada.

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Fata é o meu nome! Deixo a todos estremecidos,

Com o meu forte grito, que soa como um vento pelos montes! Ra! Ra! Tu! Si! Ra! Ra! Tu! Si!

— Fatäin! — afirmou Thomas, preocupado. — Conhece aquela região? — perguntou Eleönora. — Sim! — respondeu ele. — E por que a preocupação? — perguntou Agäz. — Não é a região que o preocupa tanto, senhor elanfö! — disse

Randuque. — O que o preocupa e a próxima montanha que vocês terão que enfrentar!

— Annapurma! — exclamou Thomas. — É dela que esta charada está nos dizendo?

— Sim, senhor! — afirmou Randuque. — E o senhor sabe o que encontrará nela? A própria fúria de Cesarem!

Thomas estava ciente do que iria encontrar naquelas montanhas, principalmente se tratando de Elöc, um antigo demônio e devorador de centauros.

Ao se despedirem de Randuque, partiram para as regiões de Fatäin. Eles iriam gastar sete dias para chegar até as montanhas. Os centauros estavam temerosos de se encontrarem com a tal criatura. Thomas sabia das lendas antigas, contadas de seus ancestrais e de seu pai, que enfrentou bravamente as sombras de Annapurma.

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stava quase anoitecendo quando todos os soldados se preparavam para a batalha. A cidade estava inundada de pessoas que corriam de um lado para o outro, tentando se proteger

daquele mal que iria invadir a qualquer momento os muros de pedra. Havia, mais ou menos, três mil homens que estavam dispostos a enfrentar com bravura e a lutar firmemente contra o exército de Cesarem. Todos estavam de prontidão em cima dos muros, aguardando os ataques dos zoörgs.

Para a surpresa de todos, surgiram longinquamente os cavaleiros da justiça, que traziam consigo seus arcos com flechas pontiagudas e lanças compridas, prontas para serem usadas em batalhas. Todos os cavaleiros que se aproximavam da cidade ficavam encantados de observar as pedras que as cercavam.

Todas as casas eram feitas de mármore, com janelas redondas e portas alongadas. Em algumas delas havia um pequeno jardim com poucas flores a serem exibidas, apenas algumas margaridas e girassóis que se direcionava para o nascer da aurora.

Felipe se aproximou do portão de pedra e gritou para os cavaleiros que estavam sobre os muros.

— Abram os portões da cidadela! Queremos ajudar os habitantes de Petrunski a derrotar os zoörgs.

— Quem são vocês, seres vindos do leste? — gritou uma voz vinda da multidão. — Por acaso são espiões das terras dos centauros?

— Somos guerreiros! — gritou Felipe. — Por acaso, já ouviu falar dos cavaleiros da justiça?

— Os cavaleiros da justiça? — gritou o homem novamente. — Já ouvimos falar deste nome! Por acaso você é Felipe?

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— Sim, sou eu! Estamos aqui para ajudá-los a enfrentar as trevas que virão!

— Abram os portões! — disse novamente a voz desconhecida. — Estes homens merecem ser recebidos com todas as honras desta cidadela.

Ouvia-se um grande estrondo ao abrirem os portões. Parecia que ele estava enferrujado, devido ao bizarro barulho que vinha das engrenagens. Ao entrarem na cidade, repararam que havia um homem vindo em sua direção como se estivesse ao ponto de saudá-los. Ele era baixo e moreno, cabelos negros e encaracolados, com uma aparência amigável, mas extremamente adiposo. Usava vestes coloridas, embora estavam encardidas devido à poeira que pairava sobre aquele lugar.

— Bem-vindos à cidade de pedra! Estávamos aguardando vocês. — Trouxe os meus homens para lutar contra este exército maldito! —

disse Felipe, tirando o elmo de sua cabeça. — A propósito, como se chama o senhor que abriu os portões desta cidadela?

— Me chamo Abreu! Filho de Alfeu, descendente dos Pontanólis. — Vejo que o seu sangue é nobre perante os cavalheiros! — disse Felipe.

— A casa Pontanólis servia fielmente aos primeiros reis de Aldiroön. — Sim! — afirmou Abreu. — Nossos antepassados serviram até mesmo

o rei Joaquim no início da criação. Contudo, fomos despejados pelo atual rei. Mas agora ele está morto.

— Morto? — perguntou Petrus. — Sim! Seu corpo desapareceu em uma noite chuvosa. Alguns lordes

que participam do conselho encontraram sangue no carpete. Sua coroa estava jogada próximo ao trono da justiça.

— Quem o matou? — perguntou Carvalho. — Não sabemos ao certo! Mas o lorde Perez jurou ter visto no céu uma

fumaça negra saindo de seu castelo. Ele suspeita que seja o próprio Cesarem o autor desse crime.

— E por que Cesarem iria matá-lo? — perguntou Radnör. — Não teria o porquê de ele fazer isso. Afinal, Arthur servia a ele fielmente!

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— Cesarem é um ser totalmente misterioso! — disse Abreu. — Mas tenha a certeza, senhor elfo, nunca queira cruzar o seu caminho, senão cabeças irão rolar!

Ao cair da madrugada, antes mesmo que o galo cantasse como de costume, o exército dos zoörgs marchava longinquamente em direção à cidadela. Eles tocavam as suas trombetas como um trovão em meio a tempestade. Diversos vampiros marchavam juntamente com eles, com seus olhos avermelhados e com suas gargantas sedentas de sangue fresco.

Jack e Tony estavam sobrevoando o céu cinzento, enquanto o exército de Cesarem se aproximava. Ao chegarem nos muros da cidadela, foram recebidos de uma forma grosseira. Era compreensível a atitude dos humanos, já que eles nunca viram um vampiro lutar ao lado de sua raça.

Felipe teve que gritar alto para um dos soldados que estavam prestes a cortar a cabeça de Jack.

— Parem! Eles estão conosco! — Como assim estão com vocês? — perguntou o soldado. — Eles foram escolhidos por Ilumar. Irão nos ajudar a destruir a pedra. — Como um vampiro pôde ser escolhido? — perguntou ele novamente.

— São seres desprezíveis! — Mas estes não são! — disse Felipe. — Podem confiar! — Felipe! — gritou Jack. — O exército de Cesarem está se

aproximando! São muitos deles e acredito que não conseguiremos vencer! — Iremos lutar até o fim! — afirmou Felipe. — Mesmo que eu venha a

perder a minha vida! Todos nós sabemos o risco que estamos enfrentando. Não seremos covardes perante a fúria de Cesarem.

— Apenas os zoörgs estão marchando? — perguntou um dos soldados. — Não! — disse Tony. — Mas vampiros e duendes! Por isso tomem

cuidado, principalmente com os duendes. — gritou o vampiro, para que todos pudessem escutar. — Suas flechas são mortais!

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— É muito fácil você dizer isso! — gritou um dos soldados. — A única coisa que pode lhe matar é uma estaca em seu peito. Cabe a nós morrermos envenenados!

— Aí que você se engana! — respondeu Jack, com o mesmo tom alterado. — Nós vampiros podemos morrer também com o veneno dos duendes. Claro que, para nós, o veneno demora mais para penetrar em nosso corpo. Só estou querendo alertá-los do veneno que se esconde por detrás daquelas flechas.

Podia-se ouvir o barulho das lanças que tocavam o chão a cada momento em que os zoörgs marchavam. Era algo assustador. Todos estavam preocupados e temerosos, esperando o pior que estava por vir.

De repente, o silêncio pairou sobre aquele lugar. Só se podia ouvir o vento que vinha ao sul, ressoando bravamente sobre os homens que estavam com suas flechas, prontas para atirar. Mais uma vez a corneta foi tocada, dando o aviso para o ataque dos zoörgs. Em uma só voz, podia-se ouvir o exército de Cesarem que cantarolava um pequeno verso criado entre eles. Era mais ou menos assim.

Zoörgs! Zoörgs! Zoörgs! Zoörgs! Somos invencíveis!

Destruímos tudo o que está em nossa frente! Principalmente a raça dos homens que será destruída sem

misericórdia! Zoörgs! Zoörgs! Zoörgs! Zoörgs!

O medo pairou sobre os corações dos homens. Alguns tentavam fugir,

mas eram impedidos por Felipe que estava à frente da batalha. Por alguns minutos, antes mesmo de as flechas serem disparadas, Radnör segurava em seu peito o medalhão de sabugueiro dado por seus pais, na noite em que eles foram libertados. Não se podia negar a angústia que estava em seu peito,

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principalmente sabendo que talvez pudesse ser morto, devido à pequena quantidade de homens que estavam lutando em favor daquelas terras.

De repente, pôde-se avistar uma flecha que pairava sobre o ar. Ela vinha de encontro aos homens que estavam apenas observando os movimentos de seus inimigos. Um dos zoörgs atirou deliberadamente, atingindo o peito de um dos soldados que caiu dos muros de pedra. Então Felipe encheu-se de uma ira sanguinária e soltou um grito que abalou a todos que estavam presentes, dando aos arqueiros a liberdade de poderem atirar. Mas o inimigo não era tão ingênuo assim. Eles arremessaram por diversas vezes vários chumaços de pedras que saíam de suas catapultas, indo de encontro aos muros que os protegia. Alguns dos Zoörgs conseguiram invadir a cidadela com a ajuda dos Trolls, que derrubavam sem piedade as pedras que os cercavam.

Então Felipe, percebendo a presença do inimigo, atirou-se de encontro ao zoörgs. Grande foi o estrondo do choque entre os dois. Ardeu com mais intensidade a fúria dos homens que golpeava, com uma certa rapidez, o pescoço do inimigo. Seu sangue escorria sobre o chão com uma certa brutalidade. Alguns dos zoörgs tentavam apertar o ferimento para estancar o sangue que vazava entre o corte. Mas o ferimento era tão profundo que suas mãos eram incapazes de segurar o seu jorrar de sangue.

O comandante dos zoörgs caminhava bem no centro da tropa. Ele atirou a sua lança sobre o peito de Abreu. O sangue escorria por todo o seu corpo. Ele caiu próximo dos portões da cidadela e morreu de braços abertos. Alguns dos homens atiravam nos Trolls que caíam deliberadamente sobre alguns duendes que estavam de prontidão para disparar seu veneno. Ouviam-se longinquamente os gritos de Felipe que tentava ajudar os homens que estavam feridos ao chão.

— Sigam-me! Sigam-me! Levantem-se, guerreiros da justiça! — Não temam a escuridão! — gritou Carvalho que segurava fortemente

o seu machado. Uma grande sombra desceu sobre as nuvens escuras. Eram os vampiros

que se atiravam de uma forma grosseira sobre o pescoço pulsante dos homens.

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Jack e Tony tentavam a todo instante relutar contra aquele ataque infernal, deixando diversos vampiros decapitados.

— Atirem em seu peito! — gritava Tony totalmente transfigurado em um morcego demoníaco.

Quando um dos homens acertava o coração de um vampiro, este rapidamente secava e se contorcia no chão. Diversas vezes essa cena acontecia, mas alguns dos zoörgs não permitiam tão facilmente a morte de um vampiro. Algumas vezes eles entravam na frente deles ou enfrentavam com suas espadas, derramando o sangue dos humanos. Os anões derrubavam com uma certa tranquilidade os vampiros que vinham em sua direção. Eles acertavam o coração daquelas criaturas com seus machados.

Diversos homens estavam sendo mortos, diminuindo a quantidade de guerreiros que estavam lutando contra o inimigo. Algumas mulheres e crianças estavam desesperadas dentro de seus esconderijos que ficavam debaixo da rua central, próximo a uma fonte de pedras brancas.

Alguns de seus cavaleiros jaziam mortos ao redor da cidade, ou então, dominados pela loucura de seus cavalos, tinham sido levados para além das montanhas.

— Protejam os portões! — gritou Felipe no alto da muralha. Os homens tentavam proteger os portões. Eles seguravam com toda a

força para impedir o ataque dos zoörgs. Mas, perante o cansaço excessivos dos homens, os zoörgs conseguiram derrubar os portões de pedra, matando a todos que estavam por perto.

A cidade de pedra estava dominada pelos zoörgs. Alguns dos homens resistiram até o fim, esperando as novas ordens de seu comandante.

Felipe estava desesperado, embora não passasse esses sentimentos para os seus companheiros. Todos os homens demostravam sinais de desesperança perante a batalha. Alguns largavam a suas espadas como se estivessem se rendendo, outros se ajoelhavam pedindo misericórdia. Felipe ficou espantado ao ver aquela cena. Parecia que seus homens estavam mais desesperados do que ele. Não havia mais solução para aquela batalha.

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De repente, ouvia-se longinquamente o som da corneta. Próximo às montanhas do norte, onde as árvores pareciam ser mais extensas e seus campos mais livres, com relvas que se dobravam com o nascer da aurora, surgiu um grande exército de elfos conduzidos por um ser majestoso.

Rianckÿ cavalgava em seu unicórnio. Ele soube que a cidade de pedra iria ser atacada pelos zoörgs. Ao se aproximar da cidadela, deu-lhes as ordens cabíveis para que os elfos pudessem atirar.

— Atirem! Atirem! — gritou o elfo. — Não quero nenhuma criatura de Cesarem viva!

Foi uma verdadeira matança. Os zoörgs tentavam fugir dos elfos, mas eram encurralados devido à esperteza e à agilidade que eles tinham com as flechas. A maioria dos zoörgs foram decapitados pelas espadas dos elfos e pelos machados não tão delicados dos anões. Seu sangue escorria sobre a cidade de pedra.

Alguns dos zoörgs continuavam a disparar as suas flechas. Todos os elfos se protegiam com seus escudos de aço e aproveitavam para atirar uma saraivada de flechas contra o inimigo.

Os trolls tentavam proteger os zoörgs, mas eram mortos pela quantidade de flechas que acertavam seus corpos. Todos eles caíram um ao lado do outro, esmagando alguns duendes que estavam por perto. Os elfos aproveitavam a queda e os decapitavam para garantir a sua morte.

Alguns dos duendes tentavam reagir contra o seu inimigo, mas eram surpreendidos pelas flechas dos homens. Alguns deles caíam dos muros de pedra com uma flecha no crânio. Os duendes tentavam envenenar os elfos, mas eram decapitados por suas espadas de aço.

Os vampiros tentavam ajudar os duendes e os zoörgs, mas eram surpreendidos pelas flechas dos elfos. Muitos deles recebiam uma flecha no coração, caindo em direção aos pedregulhos da cidadela.

Alguns vampiros pegavam pelo braço dos elfos e os levavam as alturas para que despencassem. Tony tentava impedir aquele ato, mas era segurado por

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outros vampiros que estavam lutando. Novamente aquela cena se repetia. Muitos dos elfos foram mortos por caírem de uma altura extremamente alta.

De repente, quando diversos vampiros estavam nas alturas, uma luz apareceu. O sol começava a surgir por detrás das montanhas, trazendo consigo o doce calor da primavera. A maioria dos vampiros explodiram no ar. Muitos deles tentavam se esconder, mas eram surpreendidos pelos raios do sol. Jack e Tony estavam escondidos quando o sol apareceu.

Os elfos e os homens aproveitaram a fraqueza dos vampiros e começaram a disparar uma saraivada de flechas no peito do inimigo. Muitos deles gritavam de dor ao ter o coração perfurado.

Os zoörgs continuavam a lutar. Muitos pulavam em cima dos elfos para lhes perfurar o peito. Felipe tentava impedir os zoörgs e atirava a sua espada na cabeça do inimigo. Os homens que estavam vivos atiravam diversas flechas contra os zoörgs. Muitos caíram dos muros de pedra. Alguns dos homens atiravam as lanças contra o peito daquelas criaturas. A dor era insuportável, gritos se espalhavam pelo ar depois que uma flecha atingia o peito do inimigo.

Rianckÿ lutava junto com o seu exército. Ele apunhalava o peito dos vampiros com um só golpe. Sua força era surpreendente. Diversos zoörgs foram decapitados pela força de sua espada. Diversos elfos pulavam em direção ao inimigo e os esquartejavam de uma maneira sangrenta. Muitos tentavam fugir daquele ataque fulminante, mas não tinham tempo para escapar. Os elfos eram mais espertos do que o inimigo.

O exército dos zoörgs estava diminuindo. A esperança havia retornado aos corações dos homens. Parecia que o mal estava sendo aniquilado por completo da cidade de pedra, embora todos soubessem que um grande exército estava concentrado no sul, juntamente com Cesarem.

Todos os zoörgs estavam mortos. A cidade estava destruída. Todas as mulheres e crianças que estavam escondidas puderam respirar o ar puro novamente. A cidade estava repleta de cadáveres que se amontoavam sobre a calçada. Todos ficaram surpresos pela quantidade de guerreiros que havia morrido.

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Alguns começaram a comemorar a grande vitória conquistada, outros choravam diante de seus parentes que lutaram na guerra.

Alguns elfos prepararam uma grande fogueira para queimar os corpos. Diversos homens ajudavam os elfos. Já os corpos dos inimigos eram expostos como sinal de vitória. Alguns homens preferiram arrancar a cabeça dos zoörgs e colocá-las em estacas de prata para exibirem como troféu.

Enquanto eles ajudavam uns aos outros, Rianckÿ se aproximou de Felipe e lhe saudou com um gesto rude.

— Você é Felipe? O senhor dentre os homens? — Sim! — afirmou ele com a cabeça. — E você, quem é? — Me chamo Rianckÿ! O senhor dos elfos e rei de todo o norte. — Como assim? — perguntou Felipe. — Pelo que eu conheço o rei dos

elfos era Beyën! — Que agora está morto! — disse o elfo de uma forma sagaz. — Como chegou até aqui? Como soube que as terras dos homens

seriam atacadas? — Embora eu não goste muito da raça dos homens, fui enviado a estar

aqui! — Por quem? — perguntou Felipe. — Uma ave chamada Yën esteve em minhas terras, contando-me desta

guerra que iria acontecer! De início, não concordei em estar aqui, mas depois de tantas mortes que aconteceram entre o meu povo, decidi reunir o máximo de elfos possíveis para lutarem nessa guerra.

— Precisamos partir para o sul! — disse Felipe, segurando o braço de Rianckÿ. — As pedras da perdição precisam ser destruídas e nós estaremos lá para que o exército de Cesarem não nos venha atrapalhar.

— Não sei se devo! — disse Rianckÿ, extremamente irônico. — O corvo me disse que era somente aqui que deveríamos estar! Não quero arriscar a vida de meus homens por uma simples superstição criada por Beyën.

— Acha isso uma superstição? — gritou Felipe, apontando para os cadáveres dos zoörgs. — Você não enxerga os aliados de Cesarem? Não sei o que

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aconteceu entre você e Beyën, mas o mundo não precisa sofrer com a briga de vocês! As pedras existem e precisam ser destruídas. Precisamos nos reunir para que o mal não habite neste mundo. Precisamos de vocês!

— E o que você pensa em fazer? — Distraí-los! — disse Felipe. — Essa é a única maneira que eu

encontrei para destruir a pedra! Dar tempo a eles! — Não sei se o exército de Cesarem é tão tolo desta maneira! —

exclamou Rianckÿ. — Você acha mesmo que só distraí-los resolverá o problema? — Devemos tentar! — afirmou Felipe. — Por favor, precisamos de

vocês! Lembre-se das antigas alianças. — Que aliança? — gritou Rianckÿ. — Os homens e os elfos sempre

brigaram em busca de terras! A ganância dos homens sempre esteve ao seu lado. Vocês sempre invejaram das nossas riquezas.

— Mas antes disso, havia uma aliança! — disse Felipe. — Sempre lutamos e morremos juntos. Esqueça um pouco do passado e reafirme novamente esta aliança conosco. Para salvarmos este mundo, precisamos estar unidos novamente.

— Se eu aceitar, não será por vocês. Será pelo meu povo que está se padecendo no norte.

— Muito bem! Será que podemos lutar juntos novamente? Rianckÿ demorou muito para responder. Ele olhava para o seu exército

que estava parado próximo aos muros. — Vocês terão a minha ajuda! Meus arcos e minhas espadas são seus!

Mas não espere que eu fique contente por lutarmos juntos novamente. Faço isso pelo meu povo. — disse Rianckÿ, indo ao encontro de seu exército.

Estando prestes ao jazer do poente, Radnör andava de um lado para o outro, apreciando a fogueira que estava acessa ao redor dos elfos.

Ele estava satisfeito por ter conseguido se salvar desta batalha. Todos eles comiam e bebiam, cantarolando uma canção, que por sinal, foi inteiramente improvisada. Era mais ou menos assim.

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Ao redor da fogueira alegra o meu coração;

Porque conseguimos vencer a grande tripulação.

Foi difícil a vitória

mas com suor conquistamos; Vencemos o inimigo

que tanto vem nos atormentando.

Guerreiros da Justiça! No qual nós confiamos.

Guerreiros de Tiüan! Ao qual nós veneramos.

Lutastes com bravura e lealdade,

deixando o inimigo completamente a vontade, de lutar com a coragem que vos convém!

Ao nascer da aurora aqui estaremos, Juntamente com Ilumar festejemos;

esse grande dia da derrota de Cesarem, que está prestes a chegar!

Ouviam-se várias risadas gostosas entre elfos e homens. Nem parecia

que eles estavam brigados diante dos acontecimentos passados. Radnör se aproximou de Felipe que estava conversando discretamente com Rianckÿ, próximo aos barris de cerveja caramelada.

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— Precisamos partir amanhã mesmo para o sul! — disse ele seriamente. — Não podemos perder tanto tempo assim! — disse Jack,

aproximando-se deles. — Afinal, gastaremos quinze dias para chegar ao sul! — Não se preocupe! — disse Felipe. — Amanhã mesmo partiremos

para lá! — Fiquei sabendo que a senhora de Aracuqüe convocou a todos para

lutar contra esse exército? É verdade? — perguntou Rianckÿ. — É verdade! — afirmou Felipe. — Todos nós iremos lutar para vencer

o mal que habita este mundo. — Um grande exército de anões está marchando a dois dias a nossa

frente! — disse Carvalho que estava próximo a eles. — Logo a guerra começará! — Por isso, precisamos partir antes do nascer da aurora! — disse Felipe.

— Para dar tempo de chegarmos e matarmos a grande tropa de Cesarem!

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edro cavalgava em seu cavalo. Eles estavam próximos das montanhas do Leste, onde a neve no inverno encharcava seus altos picos. Miriam olhava para elas, apreciando as três

montanhas que estavam além do horizonte. Ao se aproximarem, perceberam que elas estavam em forma de fileiras,

unidas entre si. Havia uma que se destacava mais dentre as outras. Agäz teve a sensação de observar o seu topo se escondendo entre as nuvens do céu.

— Bem-vindo senhores, às regiões de Fatäin! — disse Thomas. — Especialmente para as três grandes montanhas do Leste.

— Como são belas... — afirmou Agäz que não cansava de olhá-las. — ...principalmente aquela do meio.

— Annapurma! — disse Thomas. — É a montanha mais famosa desta região. Entenderam agora a charada? Grandes montanhas são vistas e apreciadas, mas apenas uma deve ser glorificada.

— E como entraremos nela? — perguntou Mirgän. — Estamos próximos de sua entrada! — respondeu Thomas que olhava

fixamente para o vazio. Era preciso deixar os seus cavalos para continuar a viagem, embora

Thomas conseguisse passar facilmente entre as estreitas estradas de Annapurma. Eles amarraram as rédeas de seus cavalos em um pequeno toco de árvore

que estava perdida entre o pasto e começaram a caminhar em direção à montanha. Ao chegar na entrada, perceberam que havia duas estátuas de pedra. Eram esculturas grandes que relembravam os antigos centauros. Entre elas, havia um caminho que os levaria para dentro da gruta.

Um forte grito soou e a montanha estremeceu. As rochas estavam prestes a cair de tamanho era o estrondo que saia do corredor escuro da caverna.

— Elöc despertou! — exclamou Thomas. — Elöc despertou!

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— Quem é Elöc? — perguntou Treno. — Um antigo demônio que mora dentro destas montanhas! — disse ele

tremule. — Ele gosta de devorar qualquer tipo de centauro ou hipogrifo. Todos desta região o temem!

— Não tenha medo! — disse Miriam. — Iremos entrar na caverna discretamente. A criatura não irá perceber a nossa presença.

— Como passar despercebido diante dos olhos de um minotauro? — perguntou Thomas. — Já viu o tamanho daquela criatura? É maior do que um filhote de dragão.

— Conseguiremos passar por ele! — afirmou Miriam, toda cheia de esperanças. — Iremos lutar se for preciso, mas não podemos deixar a última pedra naquele lugar.

— Com certeza, minha senhora! — disse Thomas. Elöc era temido por todos que moravam naquela região. Muitos

viajantes desviavam o seu caminho só para não se encontrar com a tal criatura. Ao entrarem na montanha, experimentaram o frio que saía do interior

de suas rochas. A escuridão dominava aqueles corredores. A cada passo que eles davam, surgia um barulho entre as pedras. Todos

ficaram temerosos, pensando que poderia surgir alguém na escuridão. Enquanto eles caminhavam, um foco de luz apareceu no interior da

montanha. Ela estava bem no centro da caverna, iluminando boa parte dos pedregulhos que estavam a sua volta. Ao se aproximarem da luz, perceberam que haviam várias estatuas embutidas entre as rochas. Diversas colunas de pedras enfeitavam aquele lugar. Eram tão extensas que pareciam tocar o céu.

Agäz ficou apavorado ao se deparar com algumas das estátuas que estavam próximas a ele.

— Por Ilumar! Que criatura são essas? — Vocês ainda não perceberam? — perguntou Azac. — São estátuas

daqueles vampiros! — Mas como elas vieram parar aqui? — perguntou Treno. — Antigamente, antes de Elöc ser criado, os vampiros se escondiam

aqui para fugirem do sol. — disse Tebas. — Por isso, fizeram várias estátuas para

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marcarem seu território. Mas com o surgimento de Elöc, todos fugiram para não contrariarem a criatura.

— Então todos tem medo desta criatura? — perguntou Agäz, andando próximo das estátuas.

— Os Trolls nem tanto, mas também não são tão tolos de enfrentá-lo! — afirmou Thomas.

Algo se aproximava. Os barulhos de suas pegadas eram algo assustador, fazendo com que a montanha se estremecesse. Todos se esconderam atrás de algumas rochas para não serem vistos pela tal criatura.

— Hum! Hum! Sinto cheiro de centauro! — falou Elöc com uma voz grave. — Hum! Há humanos aqui também!

Ao ouvirem isso, começaram a olhar entre si, com medo de que Elöc descobrisse de que eles estavam por perto. De repente, um forte barulho ressurgiu novamente. Agora era o soar de algumas pedras sendo destruídas com o seu enorme chicote de fogo.

Ao se aproximar da rocha em que Thomas estava escondido, Agäz deu um forte grito que desviou a atenção de Elöc. Ele virou para a sua direção. Olhava com uma certa intensidade para Agäz, deixando-o apavorado diante de seus olhos avermelhados.

— Quem é você que ousa entrar em minha montanha? — perguntou Elöc, furioso.

— Eu.... Eu... sou um elanfö! — gaguejou Agäz. — Elanfö? Nunca ouvi falar de vocês? — Moramos em uma pequena região do norte! Não somos tão famosos

assim! — E posso saber o que um pequenino faz por aqui? Você não teme a

morte? — Eu entrei enganado aqui! Não sabia que vossa senhoria morava aqui! — Mentira! — gritou Elöc. — Todo o mundo de Aldiroön sabe que as

montanhas de Annapurma pertence a mim! — Eu não sabia! — disse Agäz. — Me... Me.… perdoe se ofendi!

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— Continua mentindo! Sei que você está acompanhado por centauros e humanos. — gritou Elöc, olhando para os olhos de Agäz. — Eu lhe darei mais uma oportunidade para viver. Onde eles estão?

— Eu.... Eu... não sei o que vossa realeza quer dizer! — Eu sinto o cheiro deles! Se você não me disser, terei que quebrar todos

os seus ossos, até que a verdade saia de seus lábios! Agäz ficou apavorado perante a expressão emitida por Elöc. Ele se

aproximava cada vez mais. Elöc chicoteava o ar. Agäz temia a tal criatura. Ele era gigante perante os seus olhos. Tinha por volta de seus cinco metros de altura. Dois chifres que enfeitavam a sua cabeça e olhos verdes que emitiam o terror. Dentes pontiagudos que pareciam ser de um cão e unhas afiadas que combinavam com suas mãos. Suas orelhas eram caídas para o lado direito de sua cabeça.

Enquanto ele se aproximava, Miriam surgiu no meio dele. Ela saiu de seu esconderijo e foi ao encontro da criatura. Ela segurava a sua espada, que emitia um forte brilho azul que ofuscava os olhos de Elöc.

— Ora! Ora! — exclamou Elöc. — A senhora de Aracuqüe em minhas terras! Vai me dizer que entrou enganada aqui também?

— Conheço você, criatura de Cesarem! E não temo o seu poder. — Como você é tola! — disse Elöc. — Acha mesmo que é poderosa, só

porque é a favorita de Ilumar? Eu destruo Ilumar com uma chicotada! — Você engana a si mesmo com a força de Ilumar! — Ilumar é um fracote! — gritou Elöc. — Forte mesmo é o meu mestre

Cesarem, que construiu as pedras da perdição! — Que por sinal, estamos atrás dela! — disse Agäz impulsivamente,

deixando a todos de boca aberta. Agäz percebeu de imediato o erro que ele acabava de cometer. Elöc deu

uma risada profunda e logo dirigiu-se a Miriam. — Então é por isso que todos vocês estão aqui! Para capturar a pedra de

meu senhor? — Não cabe a você julgar o que estamos fazendo aqui! — gritou

Miriam. Ela estava colérica.

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— Tem razão! Não cabe a mim! — disse Elöc, com um tom irônico. — Mas cabe ao meu senhor em saber, já que ele é o dono desta pedra!

Miriam estava abismada ao observar a última pedra. Elöc mostrou claramente onde ela estava, deixando Agäz ainda mais pensativo diante do problema que eles iriam enfrentar.

A pedra estava sobre o cabo do chicote, fixada em seu topo. Miriam percebeu que Elöc segurava cuidadosamente o seu chicote, já que a pedra poderia transformá-lo em uma estátua de sal.

— Como você conseguiu a pedra? — perguntou Miriam. — Acho que foi o próprio Ilumar que me deu! — exclamou Elöc, dando

boas gargalhadas. — Simplesmente estava dormindo e, quando acordei, encontrei a pedra em meu chicote.

— E... E... por que não avisou o seu mestre? — perguntou Agäz, que continuava a gaguejar de medo.

— Eu sempre soube de minhas capacidades! Sempre fui fiel a meu mestre. Mas como dar a ele, diante da esplêndida beleza que enriqueceu este lugar? Meus olhos jamais puderam contemplar a magnitude desta pedra! Por isso, resolvi ficar com ela, protegendo-a com todas as minhas forças!

— Exijo que você a devolva para mim! Ser desprezível! — gritou Miriam.

— Mas é claro! — respondeu Elöc. — Com uma condição! Que a senhora de Aracuqüe venha aqui pegar!

Miriam sabia que não podia tocá-la, senão a maldição cairia sobre ela. Com um gesto simples com a mão, Miriam pediu para aqueles que estavam escondidos a lutar contra a tal criatura.

Diversas flechas foram lançadas em direção de Elöc, deixando-o cada vez mais perdido perante a quantidade de guerreiros que surgiram por detrás das rochas.

— É por isso que eu sentia cheiro de centauro! — gritou Elöc, olhando diretamente para Thomas.

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Todos começaram a lutar ao mesmo tempo com a criatura. Seu medo e desespero ficaram para trás. A coragem dominava os seus corações. Todos os anões que estavam na caverna se atiraram sobre as patas do minotauro.

Elöc ficou ferido. Seu sangue escorria e manchava todo o chão da caverna. Ele exibia uma cor diferente. Parecia ser meio prateado, como o sangue dos unicórnios.

Miriam também tentava atingi-lo com a espada das oliveiras, já que ela estava toda resplandecente. Era difícil de se aproximar da fera, devido ao seu chicote que estalava sobre as rochas.

Sem que os anões percebessem, o chicote de Elöc estalou sobre uma das rochas que se encontrava sobre o teto da caverna. Uma enorme pedra caiu próxima à de Treno. Todos ficaram abismados, principalmente o rei dos anões que saiu correndo em direção ao seu filho.

Eleönora estava preparada para atirar em Elöc. Enquanto ela mirava, a criatura corria em sua direção. Uma flecha foi disparada, atingindo sem piedade o olho esquerdo de Elöc. Ele começou a sangrar novamente. Gritava de dor e de agonia.

— Meu olho! Meu olho! — gritava a fera desesperado, debatendo-se sobre as colunas da caverna.

Aproveitando da cegueira de Elöc, Pedro atirou sobre o seu peito a espada das oliveiras. A lâmina atravessou o seu coração, fazendo com que a criatura caísse de costas, agonizando até morrer.

Todos correram em direção a Alamuc que chorava sobre o cadáver de seu filho. Azac segurava o ombro de seu pai. Em nenhum momento suas lágrimas escorreram. Ele tentava se conter diante da forte emoção de ter perdido o seu irmão.

Agäz ficou desesperado em ver aquela cena. O corpo de Treno estava completamente esmagado pelas rochas.

— Me perdoe, meu filho! Me perdoe! — gritava Alamuc, segurando a mão de Treno.

— É preciso aceitar com bravura a sua morte, meu pai! — disse Azac. — Que os nossos antepassados o acolham em seu trono real!

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Todos tentavam reconfortar Alamuc perante a sua perda, mas sua dor era tão forte que o fez ficar surdo perante as palavras singelas que muitos de seus companheiros tentavam transmitir.

Thomas se aproximou do chicote que estava estendido ao chão. A pedra ametista estava cintilante, deixando os olhos do centauro ofuscados perante o seu brilho. Ao tocar na pedra, Thomas gritou, ao ponto de se contorcer de agonia.

— Thomas! Thomas! — gritou Miriam, que saía correndo em sua direção. — Seja forte! Não tenha medo de segurá-la.

Todos os guardiões da pedra começaram a sentir a mesma tortura que envolvia o centauro. Miriam estava ciente de que isso iria acontecer, já que as pedras estavam juntas novamente.

Cesarem voou em direção à caverna de Annapurma, depois de ter ouvido Sgraünd dizer que a última pedra tinha sido localizada. O mago negro estava no sul, preparando o seu exército para lutar contra os guerreiros. Ele iria demorar um dia inteiro para chegar ao seu destino, mas estava determinado de impedir que as pedras saíssem daquele lugar.

Miriam, sabendo da situação, começou a motivar os seus companheiros. Ela pedia para eles arrumarem as suas coisas, antes que Cesarem aparecesse de surpresa.

— Rápido! — disse ela toda afobada. — Precisamos partir logo, antes que Cesarem apareça!

— Aquela maldita cobra já deve ter comunicado sobre a pedra! — disse Mirgän ofegante, sentindo ainda um pouco daquela dor.

— Sim! Sim! — exclamou Miriam, com um tom acelerado. — Por isso, precisamos partir logo daqui! Pedro, Thomas, levantem-se!

— E meu filho, ficará aqui para alimentar os urubus? — perguntou Alamuc, com um tom agrosseirado.

Miriam olhava para os olhos do anão. Ela se aproximou dele e estendeu a sua mão, como se estivesse apoiada em seus ombros. Seus olhos estavam lacrimejantes. Ele curvou a sua cabeça e ficou em silêncio.

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— Você sabe que não podemos fazer mais nada! Ele morreu como um verdadeiro guerreiro. Honrou a sua palavra e a honestidade de seu pai. Se ele estivesse entre nós, garanto que ele iria lhe pedir para continuar a lutar contra este mal que está prestes a se acabar. Eu entendo a sua dor, mas não podemos desistir agora!

Alamuc deu um beijo na testa de seu filho e agarrou o braço de Miriam que a conduziu até a saída da montanha. Ao se aproximar das estátuas de pedra, avistaram ao longe os cavalos que permaneciam amarrados. Todos correram para a mesma direção.

O céu estava começando a ficar escurecido. Diversas nuvens cinzentas e pesadas cobriam aquela região. Mas, para a surpresa de todos, havia alguns demäuros que sobrevoavam tardiamente em torno da montanha. Pareciam que eles estavam à procura de algo.

Pedro e o restante dos companheiros se esconderam entre as rochas, ao ponto de não serem observados. A sorte deles era que as criaturas de Cesarem não avistaram os seus cavalos que estavam próximos à montanha.

Ao correrem discretamente em direção aos cavalos, pôde-se ouvir um grito desesperador que vinha de alguns dos dragões que estavam sobrevoando juntamente com os demäuros. Era agudo o seu som, deixando alguns membros da sociedade desesperados perante a tortura que era manifestada.

Ao subir em seu cavalo, Pedro começou a gritar para que todos pudessem escutar.

— Vamos! Vamos! Antes que as criaturas nos achem e queira nos devorar!

— E para onde iremos agora? — perguntou Azac. — Para o sul! — gritou Pedro. — Vamos acabar logo com isso!

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céu continuava cinzento enquanto toda sociedade da prata cavalgava para o sul. Cesarem estava furioso, principalmente quando chegou nas cavernas de Annapurma e se deparou com

Elöc estendido ao chão. Ele saiu como um furacão em direção a sua presa. Miriam sabia que Cesarem iria procurar a sociedade. Ela teve a ideia de

passar pela floresta Trintÿ, onde as árvores são espessas e as folhagens são repletas de grandeza.

Pedro desceu de seu cavalo e começou a observar cada canto daquele lugar. Ele tinha medo de encontrar com algum duende perdido na floresta.

— Ficaremos por aqui esta noite! — disse Pedro. — Amanhã partiremos mais cedo do que de costume.

— Eu preciso mesmo descansar! — falou Thomas, ofegante. — Não estou aguentando mais este fardo.

— Eu já nem sei mais o que estou sentindo! — exclamou Pedro. — Meus olhos permanecem nas trevas, não aguento mais tanta tortura!

— Estamos quase chegando, aguentem firme! — estimulou Agäz, sentando-se próximo a eles.

— A dor está mais forte do que das outras vezes! — insistiu Mirgän, com um tom desesperador. — Temo que não conseguirei chegar até Algün para ver a sua destruição!

— Não diga bobagem! — exclamou Eleönora. — Se você não aguentar, quem carregará a pedra que foi designada ao nosso pai?

— Eu sei que não haverá outro! Mas não estou aguentando mais! Parece que meu corpo está sendo perfurado por espinhos que penetram na minha alma.

— De todos nós! — resmungou Pedro. — Vocês precisam se alimentar! — disse Miriam. — Não se

preocupem, eu irei preparar alguma coisa para vocês!

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Enquanto Eleönora preparava uma fogueira para se protegerem do frio, Miriam conseguiu encontrar bem no meio da floresta, um cordeiro que estava praticamente desfalecido. Ela o agarrou pelas patas e a levou consigo, com o intuito de assá-lo ao fogo. Eleönora ajudou a retirar os seus pelos, enquanto Agäz assava algumas partes do cordeiro.

Todos puderam degustar a sua carne vermelha. Ela estava com um leve gosto de hortelã e ervas raras do oriente. Miriam as temperou assim, para que tivessem um sabor mais delicado e apetitoso. Ao terminarem o jantar, todos os que estavam carregando a pedra sentiram uma certa melhora. Pedro resolveu descansar um pouco, deitando-se próximo à fogueira.

No dia seguinte, todos se levantaram para continuar com a extensiva viagem. Os portadores da pedra permaneciam calados, sentindo as dores impulsivas de seu sofrimento. Mirgän não aguentava mais aquela tortura. Seus olhos lacrimejavam. Ele sentia uma certa dificuldade para respirar. Já Alamuc sentia um certo calafrio. Ele estava abatido. Sua barba estava repleta de poeira com folhas secas pregadas ao seu redor.

Enquanto todos se arrumavam, Agäz estava embrulhando em uma folha de bananeira, o restante da carne que tinha sobrado na noite anterior.

Ao subirem em seus cavalos, Pedro deu um forte grito que encorajou a todos que estavam ao seu redor.

— Vamos, guerreiros de Ilumar! Estamos prestes a colocar um fim em tudo isso. Em nome daqueles que morreram nessa batalha, iremos honrá-los com a coroa da justiça!

Todos partiram em disparada para as terras de Elgön que ficavam próximas à floresta negra. O percurso demorou doze dias. Todos souberam enfrentar as torturas emitidas pelas pedras.

Ao se aproximarem das regiões de Elgön, Eleönora se deparou com Jack

que voava para a sua direção. Ela desceu de seu cavalo e deu um beijo em seu

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vampiro. Jack ofereceu-lhes algumas flores que tinha recolhido no caminho, enquanto caminhava para o sul.

— Dou-lhe essas flores, para a mais bela rosa... — ... do meu precioso jardim! — concluiu Eleönora que segurava

aquelas flores. Eles estavam no alto da montanha, avistando toda a floresta negra.

Havia diversos rochedos ao seu redor e matos que enfeitavam o seu topo. O vento era tão impetuoso, que a poeira dançava sobre o ar. Por diversas vezes, a sociedade da prata se escondia entre as rochas para não ser vista pelos demäuros. Eles sobrevoavam com seus dragões o topo da montanha para averiguar se algo de estranho estava acontecendo.

— Precisamos pensar em um plano para atravessar a floresta negra. — disse Pedro.

— O pior não é a floresta negra, mas sim o exército de Cesarem. — alertou Felipe. — Veja lá embaixo, deve ter uns cem mil zoörgs esperando para o ataque.

— Cem mil? Muito mais! — exclamou Eleönora. — Imagine quantos devem estar escondidos na floresta negra! —

exclamou Alamuc. — Qual será o nosso plano? — perguntou Agäz. — O que precisamos fazer é distrair o exército de Cesarem, enquanto

os portadores da pedra correm em direção às cavernas de Algün. — disse Felipe, segurando o seu elmo.

— Eu irei conduzi-los até a caverna. — disse Miriam. — Eu sei como chegar lá em segurança.

— Ótimo! — exclamou Felipe. — Não temos muito tempo. — E os nossos exércitos? Onde estão? — perguntou Eleönora. — Estão a caminho! — respondeu Felipe. — Tivemos que deixá-los

para trás para encontrar vocês. Mas não se preocupem. Eles devem estar se aproximando das regiões de Elgön.

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— Enquanto caminhávamos, avistamos o exército de centauros e hipogrifos marchando para o sul. — disse Eleönora.

— Ótimo! — exclamou Felipe. — Eu recebi um corvo antes de chegar nessas regiões. — disse Alamuc.

— Meu exército está a caminho. Creio que eles estão passando pelas montanhas de Brÿ. Logo estarão por aqui.

— Aos que estão carregando a pedra, sejam ágeis como as serpentes e rápidos como os furacões. Não temos muito tempo. Essa será a nossa única oportunidade. — afirmou Felipe.

Enquanto todos conversavam, surgiu sobre o céu negro, o infame Cesarem. Ele ressoava um grito desesperador, alertando a todos de sua chegada.

— Eles estão sobre o topo da montanha! — gritou Cesarem. Todos os membros da sociedade avistaram o grande exército que

estavam se aproximando das montanhas de Elgön. Felipe tirou sua espada da bainha e colocou a sua cota de malha negra juntamente com a sua armadura. Seu elmo e sua espada brilhavam como prata derretida.

— Hora de lutarmos sociedade! Que Ilumar esteja conosco. — gritou Felipe, descendo a montanha.

Todos acompanharam Felipe rumo ao exército dos zoörgs. Ao descerem da montanha, ficaram aguardando o seu exército que estava a poucas léguas de distância. Cesarem estava diante de suas tropas. Eles marchavam em direção a Pedro, batendo seus calcanhares sobre o chão e tocando por diversas vezes os seus tambores.

Em pleno contraforte norte nas encostas mais baixas, surgiu o exército de elfos que eram comandados por Rianckÿ. Seu exército tinha triplicado devido aos soldados de Beyën que tinha se ingressado para ajudar nessa batalha. Já no contraforte oeste, ficaram o exército de homens e anões que tinham aparecido, tocando suas trombetas e se organizando para enfrentar o exército de Cesarem.

— Ridículos! — gritou Cesarem, diante de todos. — Bando de homens ridículos! Acham mesmo que irão me vencer? Meu exército muito mais poderoso do que cem mil homens em uma guerra. Querem mesmo morrer? Darei a vocês

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mais uma oportunidade, sendo esta a última! Me devolvam as minhas pedras e eu os livrarei da morte!

Ao se aproximar da frente de seu exército, Pedro emitiu um forte grito: — Se chegamos até aqui, jamais iremos desistir! Vida longa a Ilumar! — Vida longa a Ilumar! — gritou o seu exército. Todos começaram a correr em direção às tropas de Cesarem.

Primeiramente, foram os homens a atacar. Seu ódio pelos zoörgs era frio e amargo. Suas espadas brilhavam incessantemente perante a luz que era pouco refletida dos horizontes. Mas sua ira era imortal, principalmente no momento em que eles apunhalavam o peito do inimigo. Já os elfos atiravam uma saraivada de flechas e cada uma brilhava ao voar, atingindo os corações dos vampiros. Cem de seus lanceiros desceram de seus cavalos e começaram a atacar.

Diversos demäuros sobrevoavam em seus dragões, conseguindo desarmar algumas tropas que estavam empurrando suas catapultas. Eles eram destroçados com o baque fulminante das patas dos dragões. Os vampiros lutavam contra Tony. Alguns deles eram mortos, perdendo a sua cabeça. Seus gritos eram ensurdecedores, deixando alguns anões perplexos perante a terrível cena.

Os zoörgs corriam ao encontro dos homens com suas lanças. Todos eles usavam uma cota de malha negra com um elmo em sua cabeça. Muitos deles pulavam em cima dos homens e os esfaqueavam até a morte. Eles bufavam como um touro enlouquecido. Suas espadas negras eram o triunfo de suas vitórias. Diversos anões eram esquartejados facilmente por suas lâminas. Os zoörgs atiravam suas lanças sobre o peito dos inimigos e arrancavam seus corações de uma maneira violenta. Alguns deles mastigavam o coração estacado em suas lanças. Eles faziam isso para provocar a raça dos homens. Alguns demäuros chegaram a lutar contra os elfos. Eles usavam um elmo negro pontiagudo e luvas com a mesma tonalidade. Com suas espadas bastardas, arrancavam a cabeça de seus inimigos e jogavam em direção aos homens que ali lutavam.

Alguns demäuros lançavam sobre o peito dos hipogrifos uma espada de duas pontas, fazendo com que caíssem em sua direção. Eles abriam o peito dos

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hipogrifos com sua adaga e arrancavam o seu coração para servirem de alimento. Outros bebiam o seu sangue prateado que escorria sobre o seu corpo.

Alguns zoörgs atiravam as suas flechas com os seus arbalestes. Diversos homens foram feridos em seu peito. Outros caíam de seus cavalos com uma flecha cravada na perna. Os vampiros aproximavam destes feridos. Eles aproveitavam para sugar o seu sangue. Alguns deles dilaceravam o peito do inimigo para comer suas entranhas.

O pânico tomou conta da raça dos homens, principalmente quando avistaram o capitão real comandando os soldados do rei Arthur. Havia homens que brigavam entre si, derramando o seu sangue sobre as rochas e lutando bravamente para satisfazer as ordens de seu rei. Felipe correu em direção a Willian, segurando uma cimitarra de aço. Os dois começaram a se debater com suas espadas. Felipe odiava as atitudes de Willian desde a época em que ele trabalhava no castelo de Rochendar.

Agäz ouvia apenas os estralar da espada de Felipe. Diversos golpes aconteceram, até o momento em que Felipe rasgou a barriga de William, como um boi em pleno abate. Seu sangue jorrava sobre o chão e suas tripas saiam de seu corpo. William caiu duro em cima de algumas pedras. Seu corpo foi lançado juntamente com os zoörgs que estavam mortos. Felipe correu para uma outra direção, a fim de ajudar os aguianos.

Rochas foram lançadas das alturas pelos demäuros e vampiros que estavam transformados, sugavam o sangue de alguns guerreiros. Já os Trolls, gostavam mesmo de estarem próximos dos anões. Eles destroçavam os pequeninos com seus troncos de árvores. Os elfos ajudavam os anões com suas flechas. Alguns deles usavam as suas cimitarras, degolando com uma certa dificuldade alguns dos trolls.

Algumas rochas foram lançadas pelas catapultas dos homens, atingindo o peito dos Trasgos. Eles caíam sobre o pequeno exército de duendes. Diversos homens e elfos acabavam sendo envenenados pelas flechas dos duendes, mas nada os impedia de os atirar em seus corações, afinal, o veneno penetrava em seu corpo de uma forma demorada, levando alguns minutos para morrer.

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Os anões lutavam bravamente. Alguns deles decapitavam com uma certa facilidade os vampiros, outros já esquartejavam os demäuros, que derramavam o seu sangue negro sobre as rochas. Suas capas negras estavam cada vez mais escuras, sobretudo quando eles eram decapitados pelos anões.

Os anões vestiam suas armaduras brilhantes que iluminavam a escuridão. Petrus e Carvalho andavam sempre juntos, acertando seus machados na cabeça dos duendes. Eles expeliam um sangue amarelado.

De repente, ouviam-se os gritos de Alamuc, que conduzia o seu exército até a floresta negra.

— Rápido! Não quero que nenhuma criatura de Cesarem esteja viva! Matem todos!

Eleönora atirava diversas flechas. Jack estava com ela. Eles conseguiram derrotar com uma certa facilidade, uma pequena quantidade de Zoörgs que estavam próximas as montanhas de Elgön. Já Radnör gostava mesmo era dos trasgos. Ele atirava sem piedade sobre a cabeça deles que caiam em direção aos vampiros. Mirgän acompanhava a sua irmã, embora ele não conseguia lutar contra o inimigo.

Jack também o defendia, principalmente quando um vampiro se aproximava de Mirgän para sugar o seu sangue. Mas o que o elfo gostava mesmo de observar era a quantidade de centauros e hipogrifos que estavam lutando nesta batalha.

Thomas ajudava os hipogrifos que estavam em perigo. Já Tebas e Marcus, lutavam com o seu exército, que derrubavam de uma maneira sagaz, algumas árvores que estavam em seu caminho.

Diversas flechas com fogo foram disparadas. Os zoörgs atiravam contra os hipogrifos, fazendo com que estes se queimassem em pleno ar. Muitos deles caíam em direção aos anões que lutavam próximo as montanhas. Alguns demäuros atiravam as suas flechas em chamas contra os centauros. Muitos deles corriam desesperadamente em busca de ajuda.

Rianckÿ lutava junto com os elfos. Ele cortava sem piedade a cabeça dos zoörgs que pulavam em cima dele. Diversos elfos marchavam rumo à floresta

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negra. Todos caminhavam lentamente. Eles se escondiam atrás de seus escudos prateados, enquanto os zoörgs disparavam uma saraivada de flechas negras.

Os anões marchavam com os elfos. Alguns deles eram puxadas pelas renas em suas carruagens com foices. Diversos duendes morriam decapitados com as foices dos anões.

Enquanto isso, Cesarem lutava com Miriam. A espada das oliveiras estava luminosa naquele dia. O mago negro usava o seu cajado para se defender, principalmente dos feitiços arremessados por Miriam que saíam de sua espada. Houve um certo momento em que Miriam não estava mais aguentando os truques baratos de Cesarem. Ela estava atordoada pelos encantos do cajado.

Pedro correu até a sua direção. Ele pegou das mãos de Miriam a espada das oliveiras e assumiu a luta que ela estava enfrentando. Cesarem começou a falar uma linguagem diferente enquanto lutava. Parecia ser uma língua antiga, proferida pelos homens do passado.

De repente, a terra estremeceu. Todos os que lutavam tiveram que cessar por alguns segundos, até o momento em que a terra pudesse parar de tremer.

Após alguns minutos, Sgraünd aparece com toda a sua glória, atormentando a todos que estavam ao seu redor.

Pedro percebeu que ela andou por debaixo da terra e ressurgiu devido ao chamado de seu mestre. Mas não era somente isso que estava acontecendo. As mesmas palavras emitidas por Cesarem, fizeram com que as pedras se despertassem, deixando Pedro ainda mais indefesso perante os feitiços lançados pelo mago.

Todos os que seguravam a pedra se contorceram naquele chão gelado e sem vida. A espada das oliveiras foi jogada próximo aos rochedos. Miriam conseguiu pegar a sua espada que estava toda iluminada.

Ao se aproximar de Pedro para matá-lo, Cesarem foi arremessado para longe, por uma luz que vinha sobre as colinas do norte. Um forte clarão estava vindo sobre o céu, deixando a todos curiosos perante o esplendido fenômeno que era difícil de ser controlado.

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Para a surpresa de todos, Ilumar apareceu com toda a sua glória e esplendor, deixando a todos perplexos de tamanha beleza. Surgiram também alguns dos animais que moravam em Calauë. Parecia que eles marchavam diante de seu senhor.

Ao avistar o Senhor das Águias, Cesarem começou a gritar como um louco, correndo até a sua direção.

— O que você faz aqui, sua ave tola? Por acaso está aqui para ajudar estes porcos imbecis?

— Ouço atentamente a voz daqueles que mais precisam de mim! — disse Ilumar. — E nesta hora, Pedro precisa de mim

— Precisa de você? Ele não é homem o suficiente para lutar sozinho? — Pedro é capaz de lutar sozinho contra você. — afirmou Ilumar. —

Mas ele nunca estará sozinho nesta batalha sanguinária que você proporcionou com a sua prepotência.

— Prepotência? Por acaso ele o chamou para estar aqui? — Eu o chamei! — gritou Miriam, segurando a sua espada. — Típico das mulheres! Nenhuma nasceu para enfrentar o inimigo.

Elas só sabem correr para as asas de Ilumar. — Não me provoque, Cesarem. — gritou Miriam, encostando a ponta

de sua espada no pescoço do mago. — Você sabe muito bem do que eu sou capaz. — Eu só quero as minhas pedras. — gritou Cesarem. — Você não tem nenhum poder aqui, Cesarem! — gritou Ilumar. —

Muito menos o direito de escolher! — Ousa me desafiar? — perguntou Cesarem, batendo o seu cajado no

chão. Degälion se transformou em uma cobra peçonhenta que não parava de encarar os olhares de Pedro.

— Deixe o garoto em paz! — gritou a águia. — Se é a mim que você quer, então venha!

Cesarem correu ao encontro de Ilumar. Todos perceberam que no meio do caminho o mago tinha se transfigurado em uma fumaça negra, voando até a direção de Ilumar. O senhor das águias também saiu de onde ele estava, voando

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até a direção de Cesarem. O que muitos não esperavam era que Ilumar também se transfigurasse em uma fumaça branca, indo de encontro ao seu inimigo.

Ao se encontrarem, a terra estremeceu e muitos dos guerreiros caíram devido ao forte tremor. Sgraünd tentava ajudar o seu mestre, mas foi impedido por uma criatura que sobrevoava o céu. Eragön, o grande dragão branco, desceu até a floresta negra para enfrentar a impetuosa serpente de Cesarem.

Diversos elfos puderam contemplar a grande batalha de Ilumar e Cesarem. Havia momentos em que Cesarem o lançava sobre as rochas das montanhas, deixando o Senhor das Águias completamente ferido devido à sua queda mirabolante. Mas Ilumar a todo momento se aproximava de Cesarem. Parecia que as duas fumaças dançavam sobre o ar, esbarrando nas grandes árvores e pedras que cercavam aquele lugar.

Sgraünd tentava a todo momento enforcar com sua cauda, a cabeça de Eragön. Muitos que observavam, tinham a impressão de que a grande serpente estava conseguindo dominar o dragão de Calauë. Mas Eragön conseguia se desfazer das armadilhas de Sgraünd, e com suas enormes patas, batia sem piedade na face da serpente. Houve um momento em que o dragão branco conseguiu ferir o peito de Sgraünd, mas a serpente continuou a lutar contra ele.

Enquanto isso, Pedro correu em direção a Miriam. Ela estava reunindo todos os que seguravam a pedra. O único que não estava presente era Alamuc, que já estava os aguardando na entrada da caverna. Jack deu um beijo em Eleönora e em seguida começou a correr junto com os seus companheiros. Quando Pedro olhou para trás, percebeu que Degälion o estava seguindo, a fim de os morder e capturar as pedras de seu mestre. Miriam gritava, apressando a todos que estavam com a pedra.

— Rápido! Degälion se aproxima! Corram! Corram! Ao entrarem na floresta negra (estando eles quase próximos das

cavernas de Algün), Jack foi surpreendido por um dos vampiros que o agarrou e o arremessou para longe. Quando ele se levantou, percebeu que era Patrick que estava sobrevoando aquele céu cinzento. Ao se transfigurar em um morcego, correu ao encontro de seu inimigo, jogando-o sobre as árvores.

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— Corram na minha frente! Eu já alcanço vocês! — gritou Jack, que voava para a direção do vampiro.

Ao encontrá-lo, Jack começou a espancá-lo. A todo momento, as duas criaturas se debatiam entre as árvores, fazendo com que elas caíssem em direção aos duendes. Patrick conseguiu derrubá-lo.

O vampiro agarrou o pescoço de Jack e o prensou sobre a árvore, deixando-o sem ar. Patrick avistou uma flecha envenenada de algum duende que havia perdido pelo caminho. Ele apunhalou sem piedade a barriga do vampiro. Jack começou a gritar. Sua dor era insuportável.

Tony se aproximou por trás de Patrick e esfaqueou o seu coração com uma adaga de prata. O vampiro começou a se secar e a morrer diante de seus olhos.

Percebendo que era uma flecha envenenada que estava na barriga de seu amigo, Tony olhou profundamente nos olhos de Jack.

— Não conte nada a Eleönora! Nós dois sabemos o que acontece quando um vampiro tem um contato direto com o veneno dos duendes. Eu te peço, poupe a dor de minha amada em saber do fim que me espera.

— Você precisa se cuidar! — ordenou Tony. — Não! Ainda tenho um certo tempo! Preciso cumprir a missão que me

foi confiada. — disse Jack, retirando a flecha de sua barriga. — Preciso pegar a última pedra da perdição!

— Você não está em condições.... — começou Tony com os olhos lacrimejantes. Ele segurava nos ombros de Jack com a intenção de leva-lo para longe da floresta.

— Não! — gritou. — Eu preciso! Minha vida não está mais em minhas mãos. — disse ele, segurando no braço do amigo.

— Então... acho que isso é um adeus, não é mesmo? — perguntou Tony. Jack deu um leve beijo na cabeça de seu amigo. — Cuide de Eleönora por mim. Não deixe que nenhum mal venha

perturba-la. — Seus olhos se encheram de lágrimas.

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Tony fez um gesto com a cabeça e ficou em silêncio. Jack despediu de seu amigo e voou para as cavernas de Algün.

Ao chegar na porta principal da caverna, Jack percebeu que Miriam estava ao lado de Pedro, tentando levantar de sua queda.

Pedro estava imóvel. Ele ouvia vozes sem parar. Seu tormento era incomensurável. Parecia que suas forças haviam cessado. Seus pés não conseguiam mais sustentá-lo ao chão.

Diversos zoörgs vieram em sua direção. Todos estavam com suas espadas sujas de sangue, sedentos de uma ira imortal. Miriam puxou sua espada e atirou-se sobre eles. Pedro estava invulnerável naquele momento, todos estavam lutando para que o inimigo não interviesse na destruição das pedras.

Ao olhar para o horizonte, Pedro avistou uma garotinha que estava vindo em sua direção. Seu rosto era familiar, parecia muito com sua filha que retornava dos mortos. Ele ouvia atentamente os sussurros da menina. Sua voz estava profunda e obscura.

— Desista, meu pai! O senhor não vai conseguir. Fique com a pedra e fuja daqui.

— Não! — gritou Pedro. — Você não é minha filha! — Serei o que você quiser, se você me tirar daqui! — disse a menina. —

Não seja tolo, Pedro. Você tem toda a fonte de poder em suas mãos, basta querer que tudo isso acabará. Fique com a pedra!

— Tem razão! Tudo isso irá acabar. Mas não será do jeito que você quer! Pedro se levantou, antes mesmo que a cobra pudesse atacar. Foi tão

rápido aquele momento, que só se ouvia a menina gritar desesperada em direção da serpente.

— Pegue a pedra, Degälion!

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edro correu para dentro da caverna. Ele percebeu que havia algumas estatuetas feitas de pedras negras, com figuras que pareciam ser das criaturas de Cesarem. Alamuc entrou junto

com eles, deixando o seu exército para trás. Eles lutavam contra os demäuros que protegiam aquele lugar. Miriam continuou a lutar contra os zoörgs que apareciam de surpresa.

Enquanto todos estavam próximos da mesa negra, Jack voou em direção ao abismo. Era escuro aquele lugar. Parecia que o abismo não havia fim. Ao chegar até a outra margem, encontrou uma caixa de madeira que estava escondida sobre as rochas. Ao abrir a caixa, deparou-se com a pedra serendibite, a preferida de Cesarem. Ela emitia um brilho que ofuscava os seus olhos. Ao pegá-la, sentiu que seu corpo estava extremamente pesado, deixando a todos preocupados perante o abismo que ele tinha que atravessar.

Jack voou rápido em direção à mesa, perdendo algumas vezes o controle do corpo. Muitos achavam que ele iria cair no abismo devido às torturas que ele recebia da pedra. Ao se aproximar da mesa negra, colocou a pedra junto com as outras. Elas emitiam um forte brilho, que iluminava cada canto da caverna.

Diversos demäuros que estavam lutando nas regiões de Elgön, contemplaram o brilho que saia da floresta negra. Todos partiram para a mesma direção, sobrevoando em cima de seus dragões para impedir que as pedras fossem destruídas.

Degälion se aproximou rápido, com o intuito de novamente pegar as pedras de seu mestre. Ele era o único que poderia capturar, já que ele era o verdadeiro criador, a fonte de todo o poder de Cesarem. Pedro avistou a naja em pleno clarão. Seu semblante parecia a de um demônio enfurecido.

Enquanto todos lutavam contra a cobra, Miriam apareceu de surpresa e apunhalou-a com a espada das oliveiras. Degälion gritava de dor. Parecia que ele

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estava chamando pelo seu mestre de tamanho era o seu desespero. Ao aproximar-se da cabeça de Degälion, Miriam pisoteou-a com o seu calcanhar, deixando a cobra completamente destroçada.

Todos ficaram surpresos diante daquela cena. Ninguém podia imaginar que o cajado de Cesarem poderia ser destruído pela espada das oliveiras. Com a morte de Degälion, o cajado voltou a sua forma natural.

Enquanto lutava com Ilumar, Cesarem sentiu que seus poderes estavam diminuindo. Ele decidiu retornar às cavernas de Algün, para salvar o seu cajado das mãos dos homens. Miriam segurava o cajado em suas mãos. Ao aproximar-se da mesa, entregou-o para Pedro.

Todos ouviram um forte grito que vinha da floresta negra. Parecia ser de alguma criatura que estava desesperada diante das espadas dos homens.

— Jack! Jack! Fuja, meu rapaz, não quero que você fique perto desta caverna quando as pedras forem destruídas. — disse Miriam, tampando seus olhos com uma de suas mãos.

— Mas por quê, minha senhora? — Não é momento para explicações. Apenas obedeça-me! — gritou

Miriam. Jack transfigurou-se em um morcego. Ele voou ao encontro de

Eleönora. Ela estava bem distante da floresta negra, quase próxima das colinas do norte.

Pedro estava prestes a destruir a pedra. Era apenas questão de segundos, para que Cesarem fosse derrotado. Tudo o que ele precisava fazer era bater o cajado em cima das pedras da perdição.

Mas algo o segurava. Seus braços ficaram rígidos, parecia que algum feitiço estava sobre ele. Pedro gritava de dor e de agonia. Cesarem entrou na caverna e começou a brigar com ele. Pedro ficou desnorteado com os ataques de Cesarem, principalmente com fumaça que saía do abismo.

Ao segurá-lo no pescoço, Cesarem ameaçou jogá-lo para dentro do abismo. Seu cajado ficou jogado próximo à mesa de pedra. Pedro ficou agoniado perante a face de Cesarem. Parecia um demônio em forma de gente.

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— Achava mesmo que irá me vencer, seu tolo! — gritou Cesarem. — Como pode Ilumar gostar tanto de vocês? Não passam de vermes hipócritas que vagam sobre este mundo em busca de ouro e de poder.

Ilumar apareceu na entrada da caverna. Seu olhar era desafiador. Cesarem estava dando altas gargalhadas enquanto segurava Pedro pelo pescoço.

Alguns membros estavam desesperados com as ameaças de Cesarem. Miriam não conseguia enxergar muito bem o que estava acontecendo devido às luzes que vinham da pedra.

Enquanto todos estavam preocupados com Pedro, no interior da caverna, um forte estrondo aconteceu. A luz que iluminava a caverna se apagou e a força de Cesarem estava desaparecendo. Já a fumaça que desnorteava aquele lugar, desaparecia conforme o vento a empurrava para fora.

Ao olharem para o altar, pôde-se avistar apenas a poeira quente que pairava sobre o ar. As pedras finalmente foram destruídas junto com o cajado que estava destroçado nas mãos de Mirgän. Uma lágrima escorria dos olhos de Miriam, finalmente o mal estava aniquilado.

Cesarem gritava de dor e de agonia. Pedro foi lançado para longe. Seus ouvidos estavam estralando devido ao barulho infernal que saía dos lábios de Cesarem.

Ilumar aproximou-se do mago e proferiu algumas palavras. — Finalmente, Cesarem, você foi derrotado! Aqui encerram as suas

vitórias diante do sangue derramado. Você está condenado a viver nas profundezas de Algün, onde há trevas em seu presente e tristeza em seu passado. A partir de agora, tudo está consumado!

Cesarem sentiu a terra estremecer. O abismo estava se abrindo mais e mais, ao ponto de começar a sugar as criaturas que acompanhavam o mago negro. Todos os que estavam na floresta e nas regiões de Elgön começaram a ser puxados para o abismo.

O exército de elfos contemplaram o momento em que vários demäuros estavam sendo arremessados com seus dragões até as profundezas de Algün.

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Diversos zoörgs também foram sugados, ao ponto de serem massacrados pelas rochas que se encontravam na entrada da caverna. Os trolls e os trasgos foram aniquilados, já que a maioria conseguiu escapar, fugindo em direção às terras do norte.

Os vampiros foram sugados. Alguns deles se debatiam nas estátuas que Cesarem adorava colecionar; outros eram esmagados pelas árvores que se encontravam no centro da floresta.

Eleönora segurava os braços de Jack. Ele estava sendo puxado junto como os outros vampiros. Tony também se segurava em alguns galhos. Seu medo crescia, sobretudo quando ele via um monstro sendo sugado para dentro do abismo.

Cesarem estava intacto, duro como uma pedra. Apenas observava suas criaturas sendo puxadas para dentro do abismo.

Sgraünd estava também sendo sugando. A serpente estava fraca devido à destruição das pedras. Mas antes que Sgraünd fosse sugado, Eragön pisoteou-o em sua cauda, deixando a cobra indefesa diante de seus ataques. Por fim, o dragão branco de Calauë expeliu sem piedade sobre a face negra de Sgraünd, o seu fogo ardente. Sgraünd desfaleceu na hora, devido ao calor infernal de suas chamas.

Sgraünd foi arrastado até as cavernas de Algün, levando consigo algumas árvores que se encontrava no centro da floresta. Todos os que estavam na caverna se esconderam, principalmente Ilumar que os protegia debaixo de suas asas. A grande serpente vinha com uma certa velocidade, atingindo em cheio o seu senhor que estava próximo do abismo. Cesarem caiu juntamente com Sgraünd, desaparecendo no meio da escuridão.

Com a queda de Cesarem, o abismo se fechou. Todos os que estavam em volta respiravam tranquilamente, sentindo o ar fresco penetrar em seus pulmões. Ilumar desapareceu da caverna sem ao menos se despedir.

Pedro saiu daquele lugar. Ele se sentou em um dos rochedos que se encontrava do lado de fora da caverna. Ele se alegrou com a felicidade dos anões. Parecia que suas comemorações não se cessavam, tamanha era a sua alegria.

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Diversos elfos compareceram naquele lugar. Todos se uniram para tentar socorrer os guerreiros que estavam feridos e moribundos, ajudando principalmente aqueles que se encontravam bem na entrada da caverna.

Pedro avistou Agäz longinquamente. Ele estava mancando, todo sujo de sangue, segurando a sua espada. Ao aproximar-se dele, deram-lhe um abraço. Agäz sentiu o estralar de seus ossos.

— Estive com Eleönora! — disse Agäz, completamente sereno. — Ela precisa de você! Corra o mais rápido possível até as colinas do norte!

— Ela está bem? — Sim! Ela apenas precisa de você. Pedro subiu em um cavalo que estava próximo a caverna. Ele partiu em

disparada até as colinas do norte, em busca da jovem princesa.

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sol estava ressurgindo por detrás das montanhas. Pedro corria em seu cavalo, ao encontro de Eleönora que estava abatida. Ao encontrá-la, percebeu que ela estava sentada sobre a rocha,

olhando para o vazio. Algumas lágrimas escorriam de seus olhos. Suas roupas estavam empoeiradas e sua voz estava trêmula. Pedro

tentou acalmá-la, mas o nervosismo gritava ainda mais forte. Ao passar um certo momento, seus lábios pararam de tremer e sua voz saía livremente.

— Jack está ferido! Eu não sei mais o que fazer... — Acalme-se! O que aconteceu? — Eu não sei! — disse ela em prantos. — Ele simplesmente caiu como

uma pedra. Ele começou a gritar pelo seu nome. Eu tentei procura-lo, mas não o encontrei...

— Acalme-se! — disse Pedro, interrompendo-a. — Onde ele está? — Está ali! Próximo aquela árvore! — disse ela apontado para a árvore.

— Irei buscar alguma coisa para ele comer, enquanto isso, faça um pouco de companhia até que eu retorne.

Pedro respirou profundamente, aceitando o pedido de Eleönora. Ao andar alguns metros, encontrou-se com Jack jogado ao chão. Sua respiração estava ofegante, seu olhar estava sereno e sua voz saía como uma brisa leve em busca de sentido.

Ao sentar-se próximo a ele (tendo que se agachar por completo devido a sua voz baixa e roca), pôde ouvir com uma certa dificuldade, o desabafo daquela criatura.

— Eu fracassei com Ilumar! — disse ele, emocionado. — Mereço estar com Cesarem nesta hora de minha dor!

— Como pode se culpar desta maneira? Você conseguiu vencer o maligno, ajudou-nos a trancafiar aquele crápula em sua caverna!

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— Mas eu fracassei com todos! Com Eleönora, e, principalmente com você! Peço que me perdoe pelo que eu fiz com sua filha e com sua esposa. Espero que Ilumar me perdoe pelos meus crimes!

— O perdão é algo que se conquista! E você conquistou de uma maneira nobre. Todos gostam de você, sabe disso. — disse Pedro, segurando nas mãos do vampiro, que gemia de dor. — Não se preocupe! Garanto que Ilumar já lhe deu o seu perdão! Enquanto a mim, não tenho o que perdoar!

— Tem sim! — afirmou ele. — Eu matei a sua esposa e sua a filha! Não conseguirei descansar enquanto não ouvir o seu perdão!

Eleönora se aproximava cada vez mais dos jovens rapazes. Ela trazia consigo uma vasilha cheia de pães ázimos e frutas frescas. Parecia que ela tinha acabado de colher de algum pomar, próximo daquelas redondezas. As maçãs estavam avermelhadas e as uvas doces. Pedro segurou com força o braço de Jack.

— Se é de meus lábios que gostaria de ouvir o meu perdão, certamente que você ouvirá. Eu o perdoo de todo o meu coração e de toda a minha lealdade. Não cabe a mim julgá-lo pelos seus crimes, principalmente pelos atos do passado!

— Você não sabe a alegria que estou sentindo dentro de mim! — disse ele, ofegante. — Agora posso partir em paz! Como é bom sentir o perdão, principalmente quando recebemos de pessoas que tanto admiramos.

— Fique em paz, meu amigo! — disse Pedro, expelindo algumas lagrimas. — Espero que você sobreviva a este momento difícil de sua vida.

Pedro se levantou e percebeu que alguma coisa estava acontecendo com o vampiro. Uma gotícula de luz resplandecia em volta de seu corpo, deixando-o cada vez mais iluminado perante a relva que o encobria.

Jack estava sendo libertado de sua forma vampiresca. Ele voltou a ser um humano como era de seu desejo.

— Posso partir agora! Ilumar realmente me perdoou. — disse ele, com os olhos lacrimejantes.

— Como você pode pensar desta maneira! — disse Eleönora em prantos. — Não percebe o quanto estou sofrendo com a sua partida?

Jack procurava ar para os seus pulmões.

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— Minha rosa do meu jardim! — disse ele, tocando levemente o rosto de sua amada. — Estarei sempre ao seu lado, em todos os momentos de sua vida! Acredita em mim?

— Como poderei senti-lo, se meu coração ficará fechado com a sua partida!

— Estarei sempre ao seu lado! No ar em que respira... no céu que te ilumina... e principalmente em seu peito que agora sangra com a minha partida.

— Não me deixe, eu lhe peço! Não tome caminhos por onde não poderei segui-lo!

— Não me peça uma coisa que não posso lhe dar! — exclamou Jack, moribundo. — Você se lembra do primeiro dia em que nos conhecemos? Você estava prestes a me matar com uma de suas flechas. Graças a Pedro, não fui morto naquela noite. Mas posso lhe dizer com todo a minha sinceridade, que você fincou a mais preciosa flecha em meu coração, sendo esta, o amor que recebi. Nunca me esquecerei dos momentos que vivemos juntos, dos momentos de tristeza e principalmente das nossas alegrias. Seja feliz, somente assim, alegrará o meu coração, minha pequena rosa do meu precioso jardim...

Jack fechava seus olhos lentamente. O ar não penetrava mais em seus pulmões, deixando-o cada vez mais enrijecido. Pedro se emocionou ao ver aquela cena. Seu peito estava mergulhado de puro arrependimento. Mal podia-se lembrar daqueles momentos de raiva que passou ao lado de Jack.

Eleönora continuou a chorar. Ela o abraçava e o beijava, acariciando suas franjas que estavam endurecidas devido ao sangue que estava em seus cabelos. Agäz se aproximou de Pedro, junto com outros elanfös que haviam lutado na guerra. Todos se curvaram diante do corpo de Jack, como sinal de honra e lealdade.

Ao olhar para o horizonte, Pedro avistou um pássaro negro que estava se aproximando, como se estivesse saído por detrás das montanhas. Ao pousar sobre a árvore, perceberam que era Yën que estava ofegante, devido ao seu voou-o acelerado.

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— Sinto muito pela morte de Jack. — disse o corvo, olhando para Eleönora.

— Ele lutou bravamente. — afirmou Agäz. — Lutou como os homens do passado. — disse Yën, olhando para o

corpo de Jack. — Venho trazer uma mensagem de Ilumar ao jovem ferreiro de Caën.

— A mim? — perguntou ele, espantado. — Diga-me! — O Senhor das Águias o aguarda sobre o topo daquela montanha! Ele

deseja muito conversar com você! — Diga a ele que logo subirei a montanha. — disse Pedro, enxugando

as lágrimas. Ao ouvir as ordens de Pedro, Yën curvou-se respeitosamente e partiu de

uma forma acelerada até o topo da montanha. Todos ficaram surpresos com esta convocação, afinal não era todo o dia que o Senhor das Águias chamava alguém desta maneira. Pedro estava nervoso. Seu coração palpitava sem cessar e sua mente não descansava.

Ao pegar sua mochila, subiu em direção à montanha. Enquanto caminhava, pensava em diversas coisas que poderia falar com Ilumar.

Ao aproximar-se do topo, percebeu que Ilumar estava conversando com Yën, como se estivessem trocando certas confidências. Ao perceberem que o rapaz estava por perto, Yën sobrevoou em direção à floresta negra para socorrer aqueles que estavam feridos.

Pedro não tinha reação naquele momento, apenas admirava a grandeza de Ilumar que o encarava de uma maneira afetuosa. Uma lágrima escorria em seu rosto. Pedro correu em direção a Ilumar. A emoção era forte perante o abraço que ele recebia do Senhor das Águias. Parecia que o mundo não existia mais sobre seus pés. Ele sentia o leve toque de suas penas encostando em seu ouvido. Já a face de Ilumar repercutia sobre os seus ombros afadigados.

— Por que nos abandonou? — perguntou Pedro. — Por que nas horas de meus tormentos você não apareceu para me socorrer?

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— Como pode ter a certeza de que abandonei? Estive sempre ao seu lado, como lhe prometi!

— Esteve ao meu lado? — perguntou ele novamente, com um olhar espantoso. — Estive sozinho em meio às trevas, meus olhos estavam na escuridão e mesmo assim não esteve ao meu lado.

— Pedro! Pedro! — exclamou Ilumar. — Você acreditou que eu iria aparecer nas grandes aves que sucumbem este céu? Acreditou mesmo que eu iria aparecer de uma maneira gloriosa, apenas para manifestar o meu poder? Como pode ser tão tolo em não me enxergar a sua volta.

— E onde o Senhor estava? — perguntou Pedro olhando para os olhos de Ilumar.

— Eu estava com você desde o momento em que saiu de Caën, seguindo viagem para as terras élficas! — disse Ilumar. — Eu estava com você na aurora em que surgia e nas estrelas que o conduziam. Eu estava com você nas estradas de Draiüs, quando preparava a neblina para não serem capturados. Se não fosse por ela, vocês não teriam passado! Eu estava com você no castelo de Rochendar, quando pegou a pedra. Eu estava com você nas matas. Matei fadas e duendes para protegê-lo! Eu era o tigre de bengala que corria atrás das criaturas mágicas de Cesarem! Sim, eu estava com você!

— Você era o tigre? — perguntou Pedro perplexo diante desta revelação.

— Você quase morreu envenenado por uma fada, que estava próxima da cachoeira! Se eu não aparecesse, ela conseguiria roubar facilmente um beijo seu e você estaria morto neste momento! Ainda bem que consegui destruí-la, senão, ela voltaria só para te matar!

— Perdoe-me, senhor! Não sabia que você estava nestas pequenas criaturas!

— Não acreditou nas pequenas e muito menos nas grandes! — afirmou Ilumar. — Não acreditou em mim quando o furacão de fogo apareceu sobre as montanhas de Eigÿ! Não confiou em mim quando o príncipe das águas apareceu para vos ajudar!

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— Me perdoe, meu Senhor! — disse Pedro, ajoelhando-se diante de Ilumar.

— As pedras o cegaram meu rapaz! Infelizmente, você não conseguiu me ver desta maneira! Não julgue aquilo que não é capaz de enxergar! Porque a cegueira um dia irá aparecer, mas a dor de se sentir só é menos dolorida do que a incapacidade de enxergar que existe alguém ao seu lado, pronto para protegê-lo.

Pedro observou que a águia andava de um lado para o outro, como se estivesse observando cada canto de Aldiroön. Mas a angústia bateu em seu peito novamente, seu coração palpitava acelerado ao ponto de sair pela boca.

— E agora? O que farei? Devo partir para Caën? — Não! — afirmou Ilumar. — Você irá para Caën algum dia, mas não

por esses dias. — Para onde irei então? Cesarem agora está morto e creio que a

sociedade não precisará mais de mim! — De fato, a sociedade será desfeita ainda nesta noite! — disse Ilumar.

— Quanto a Cesarem, creio que haverá uma outra maneira dele regressar a este mundo. Algumas criaturas conseguiram escapar para o norte, e outras para o leste. Mas isso não importa. O importante é que você parta ainda nesta noite para as terras de Zatüron!

— Zatüron? Como irei para aquelas terras se sou odiado por ela? — Você será o novo rei daquelas terras e de toda Aldiroön. — Como posso ser rei se em minhas veias não corre o sangue real? — O sangue real corre em suas veias, meu rapaz! — afirmou Ilumar. —

Você não é filho de Hangar, o ferreiro de Caën! Você é filho de Eduardo, pai de Arthur, antigo rei de Aldiroön!

— Como posso ser filho de um rei? — O rei Eduardo II participou da primeira sociedade da prata, junto

com sua mãe Rebeca! Os dois se apaixonaram e ela teve você após a morte de Kalista! Mas conforme o destino, os dois não ficaram juntos! Você é o verdadeiro herdeiro, o filho mais velho de Eduardo! Por isso que o chamei para esta missão!

— Quer dizer que Arthur era o meu irmão?

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— Sim! — afirmou Ilumar. — Arthur não era digno de ser rei! A cobiça e o poder dominaram facilmente o seu ser, por isso não o chamei. Você não percebeu nada? Não percebeu quando Jack lhe pediu o perdão?

— Ele se transformou em um homem normal! — exclamou Pedro com um ar de surpreso.

— Não foi apenas isso que aconteceu! Ele foi perdoado de todos os seus crimes e você concedeu este perdão a ele! Todo o rei de Aldiroön, desde seus ancestrais até os seus sucessores tem esse poder de perdoar em meu nome. Somente desta maneira, poderá ser desfeito todo o feitiço de Cesarem.

Para a sua surpresa, Miriam apareceu como um passe de mágica. Pedro estava distraído que nem se quer percebeu que a senhora de Aracuqüe subia a montanha. Miriam curvou-se diante do Senhor das Águias e sorriu abertamente.

— Perdoe-me, se interrompi sua conversa! — exclamou Miriam. — Mas Yën me disse que estava à minha espera?

— Sim! — disse Ilumar. — Quero lhe fazer uma proposta. — Que tipo de proposta? — Quero que a senhora venha morar comigo em Calauë! — Devo deixar este mundo? — Se for de vosso agrado? — insistiu Ilumar. — Será muito bem-vinda

se aceitar o convite. — É muito difícil deixar este mundo. — suspirou Miriam. — Como a

nossa vida é misteriosa. Alguns meses atrás, estava em minha casa, olhando para as montanhas de Aracuqüe e cuidando das flores de meu jardim. Hoje estou aqui, sobre o topo desta montanha para decidir o meu destino. — Miriam deu uma pausa em sua fala. Ela olhava ao seu redor, sobretudo para o horizonte. — Como poderei negar um pedido tão majestoso como este de conhecer o seu mundo? Acredito que não tenho mais nada a fazer por aqui. O que me foi confiado já foi resolvido.

— A senhora será tratada como uma verdadeira rainha! — afirmou Ilumar.

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Houve um pequeno silêncio. Miriam olhava para Pedro como se ele fosse uma flor de seu jardim. Antes que ela subisse nas costas de Ilumar, Miriam deu a ele os seus objetos mais valiosos.

— Entrego a você, filho de Rebeca, a espada das oliveiras e o colar das sete estrelas do oriente. Creio que será de maior serventia para você do que para mim. Afinal, não precisarei delas em Calauë!

— Obrigado, minha Senhora! — disse Pedro, abraçando-a fortemente. — Mas tenho comigo uma coisa que lhe pertence.

— Ah, sim! E o que é? — Espere, deve estar por aqui! — disse Pedro procurando algo em sua mochila. — Aqui está! Sua coroa!

— Vejo que a guardou muito bem! Pedro fez um leve gesto com a cabeça. — Você é um bom homem Pedro, merece ser feliz. — disse Miriam. —

No início foi incrédulo, desprezando os elfos e até mesmo o próprio Ilumar. Mas ao longo desta jornada, percebi que um novo homem surgiu das cinzas. Adquiriu conhecimento e lutou pela sua coragem.

— Sobre aquele dia no barco, eu queria... — Esqueça, Pedro. O que passou, passou. — disse Miriam. — Mande

meu abraço para todos! Infelizmente não poderei me despedir! Miriam subiu nas costas de Ilumar. Pedro simplesmente sacudiu a

cabeça, como sinal de que o recado iria ser transmitido. — Governe com justiça e misericórdia este mundo, o qual lhe confio!

— disse Ilumar, dando-lhe um grande salto ao céu, voando rumo a Calauë. Pedro descia aquelas montanhas. Parecia que seus pés não

acompanhavam o ritmo de seu corpo, sua pulsão estava a mil, perdendo o ar que penetrava em suas narinas.

Ao descer a montanha, percebeu que havia vários elanfös que estavam próximos da árvore. Os elfos cantarolavam uma pequena canção, deixando a todos emocionados.

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Mil estrelas a cantar, a doce perda do luar! Morreste nas batalhas, enfrentastes as trevas,

mas levastes consigo a essência de nossas almas, que tanto chora pela vossa partida.

Que Ilumar acolha-te em vossas asas!

Que os reis do passado, te recebam com toda a gratidão! Porque enfrentastes a serpente, e com ela, toda podridão!

Alegre-se Aldiroön, todos os povos, alegrai-vos,

porque mais uma estrela brilha neste céu iluminado! A saudade, nós teremos! O luto, enfrentaremos!

Mas as lembranças, jamais esqueceremos! — Bela canção, não acha? — disse Radnör, aparecendo de surpresa. —

Acredito que esta canção seja adequada para este momento de vitória! — Tem razão! — afirmou Pedro. — Agora sim, podemos respirar o ar

da liberdade! — E Rianckÿ, onde está? — perguntou Agäz. — Foi morto pelo inimigo! — disse Radnör. — Os elfos levaram seu

corpo para ser enterrado em sua mansão. Confesso que foi admirável a sua atitude. Agiu como um verdadeiro líder a comandar a sua tropa!

— Sim! Ele acabou trazendo mais soldados para nos ajudar! Merece ser enterrado como um rei! — disse Agäz, que inspirava através de seu cachimbo, as folhas de mato-verde.

— E os outros membros da sociedade, como estão? — perguntou Pedro. — Todos os anões conseguiram sobreviver! Já Tebas, filho de Thomas,

está ferido, mas já foi socorrido! — disse Radnör, que experimentava um pouco do fumo de Agäz. — E os guerreiros que seguravam a pedra, como estão?

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— Todos conseguiram sobreviver! Confesso que foi difícil destruir aquelas pedras. Senão fosse Mirgän com sua coragem, o mago negro as roubaria novamente. — disse Pedro.

— Todos nós ficamos sabendo de sua coragem! Parece que os elfos que seguiam Rianckÿ, agora servirão o futuro rei de Tiän! — disse Radnör. — A união voltou novamente a reinar sobre aquelas terras.

— E você? Voltará para Caën? — perguntou Agäz. — Pelo que eu soube, só há ruínas naquela cidadela. — afirmou Radnör,

dando mais um trago das folhas de mato-verde. — Caën será reconstruída com a ajuda do meu povo! — disse Pedro. —

Mas, conforme as ordens de Ilumar e também pelos ancestrais de meu pai, serei o novo rei de Aldiroön!

Todos ficaram surpresos perante a notícia. — O novo rei? — perguntou Radnör. — Saiba que estou mais surpreso do que você. — disse Pedro, dando

um leve sorriso. — Eu já imaginava. — afirmou Agäz. — Gostaria de morar comigo no castelo de Rochendar? — Sempre o servi, meu nobre amigo! Mas não posso sair de Aquatinta!

Lá é a minha casa, meu lar! — exclamou Agäz. — Não consigo imaginar não estando naquele lugar. Como posso me separar da minha lareira, dos meus objetos que eram de meu pai e dos meus amigos que moram a minha volta? Como posso me separar do campo, das flores e da lua que ilumina toda Aquatinta?

— Entendo! Saiba que Zatüron sempre irá acolhê-lo. — disse Pedro, dando um abraço em Agäz. — Mesmo na distância, a amizade permanece!

— Não será nada fácil governar Zatüron. — contestou Radnör. — Existem lordes que estão querendo sentar no trono da justiça.

— Tenha cuidado. Ouvi dizer que são capazes de fazer de tudo para se apoderar daquele trono. Há boatos de que o Lorde Perez tentou envenenar o rei Arthur para pegar o seu reinado. — disse Agäz, com o cachimbo nos lábios.

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— Os lordes de Zatüron não são tão confiáveis. — afirmou Radnör. — Principalmente os conselheiros reais.

— A mim, eles não irão fazer nada de mal. Não serei como Arthur. — O problema não está na pessoa que governa e sim no poder que

aquele trono carrega. — afirmou Agäz. — Mas tenho a certeza que você sairá muito bem.

— Tiän sempre servirá o novo rei, que governa sobre o trono da justiça. — comentou Radnör.

— A aliança será refeita! — disse Pedro. — Elfos e homens, unidos novamente em plena harmonia!

Houve diversas homenagens e despedidas. Agäz acompanhou os elanfös que estavam de partida. Todos eles estavam ansiosos para regressar as suas terras, principalmente para levar a boa notícia de que Aldiroön estava liberta.

Antes mesmo de Agäz partir, Pedro lhe deu um broche de ouro, que pertencia a sua mãe. Foi um meio que ele encontrou para que o elanfö lembrasse desta aventura. Pedro abraçou-o fortemente e perdeu-o de vista perante a multidão de elanfös que estavam caminhando para o norte.

Os outros membros da sociedade estavam indo ao seu encontro, todos eles sabiam que Jack havia falecido. Tony voou até a sepultura de seu amigo, e assim, chorou ao lado de Eleönora. Uma forte dor bateu em seu peito, a única coisa que passava em sua mente era a cena de seu amigo todo ferido pela flecha dos duendes.

Enquanto isso, Pedro se reuniu com outros membros da sociedade. — Meus amigos! A sociedade da prata encerra-se por aqui! O mal que

habitava este mundo acabou desfalecendo. Agora Aldiroön é livre! Todos os aguianos poderão respirar o doce ar da liberdade. Me despeço de todos, saibam que as terras de Zatüron estarão de braços abertos para os amigos de Ilumar.

— Digo o mesmo ao senhor dos homens, agora, rei de Aldiroön! — disse Mirgän, fazendo uma pequena referência ao rapaz.

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— Nós anões seremos gratos aos reis do passado e aos reis que nos ajudaram a cumprir esta missão! — disse Alamuc, segurando o seu cachimbo. — É uma pena em não ter me despedido de Miriam e do jovem elanfö. Estava me acostumando com aquele rapazote. — comentou Thomas, que dava altas gargalhadas com os outros membros da sociedade.

A única que estava cabisbaixa era Eleönora. Ela olhava para o vazio. — Não se entristeça, senhora de Tiän! Não conseguimos compreender

o grande mistério desta vida! Garanto que o senhor Jack, como o meu irmão, já devem estar experimentando as plenitudes de uma nova vida. Ambos devem estar bebendo vinho na grande mesa de Ilumar. — disse Azac, que beijava de uma maneira rígida, uma das mãos de Eleönora.

— Assim espero, senhor anão! Somente assim, conseguirei confortar o meu coração!

Eleönora subia em seu cavalo juntamente com o seu irmão. Ambos partiam para o norte, ao lado de alguns elanfös que tinham ficado para trás. Todo aquele exército de elfos marchava rumo às terras de Tiän, juntamente com Radnör que galopava em seu cavalo. Alguns dos elfos que moravam em Tiüan acabavam seguindo o futuro rei daquelas terras, deixando para trás toda a ofensa e o rancor que permaneciam em sua memória.

Pedro retornou juntamente com Felipe e seu exército, todos eles estavam dispostos a servir o futuro rei de Zatüron, prometendo a sua lealdade e fidelidade à raça dos homens.

Um grande exército de anões partia para o oeste, juntamente com o rei Alamuc e seus companheiros. Centauros e Hipogrifos partiam para a outra direção, finalmente a discórdia tinha abandonado o coração dessas criaturas e a paz voltou a reinar novamente.

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o se passarem quinze dias da guerra dos poderes, os habitantes de Zatüron acolheram o seu mais novo rei. A cidade estava enfeitada com diversos papéis coloridos e flores que realçavam

as colunas de pedra. Havia numerosos garrafões de vinho e cerveja caramelada. Diversas carnes sendo preparadas pelos homens e pães trazidos pelos elfos.

Os elanfös eram experientes com as guloseimas. Trouxeram diversos tipos de doces amarelados, pirulitos amanteigados e balas que se derretiam facilmente ao serem mastigados.

Pedro estava em seus aposentos se preparando para o grande momento. Sem que ele o percebesse, uma pequena criatura apareceu de surpresa.

— Você veio, meu nobre amigo! — Não podia faltar neste momento tão importante da nossa era! —

disse Agäz, abraçando-o fortemente. — Vejo que está usando o broche que era de minha mãe! — Para estas ocasiões, é preciso me trajar bem! — Fico feliz em ter os meus amigos comigo nestas comemorações. — Por algumas horas, a sociedade se reunirá novamente para coroá-lo

como o nosso novo rei! Beyën iria gostar deste dia! — disse Agäz, dando uma pequena pausa em seu pronunciamento.

— Não somente ele! Mas a senhora Pouty, meus pais, e todos aqueles que morreram fiéis ao Senhor das Águias!

— Garanto que eles estão felizes em algum lugar, juntamente com o meu pai e minha mãe, que sonhavam em me ver em alguma aventura!

— Enquanto eu viver, o mal não entrará mais sobre estes muros e em nenhuma parte deste mundo!

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— Será uma missão difícil meu amigo! O mal sempre existirá para as pessoas que escolhem o seu caminho! Se todos fizerem a sua parte... com pequenos gestos de bondade... Aldiroön voltará a ser o que era antes.

— E assim será! Meu nobre amigo! Havia inúmeras canções que atraíam os ouvidos de Agäz. Sua conversa

encerrou provisoriamente, até o momento em que ele se infiltrou na sacada do castelo, para se deliciar com as canções cantaroladas pelos elfos. Pedro aproximou-se de Agäz e ouviu o som de suas harpas. Pareciam anjos que tocavam sobre o céu ensolarado.

Havia outros que dançavam em volta da fogueira, presenciando cada movimento delicado conforme o enredo de suas canções. Em uma delas, Radnör cantava suavemente, deixando a todos maravilhados pela sua melodia. Diversos reis do passado cantarolavam esta canção.

Sobre os reis de outrora aqui estamos, juntamente com os anões festejamos,

este grande dia de celebração!

Os elfos cantarolaram diversas canções! Os anões resmungaram com os seus palavrões,

e os homens serenaram com suas paixões.

Festejemos habitantes de Aldiroön, bebamos e comamos,

pois a carne está assando, a cerveja espumando, o vinho se deliciando,

e os convidados, todos dançando!

O sol ressurge sobre a encosta da montanha,

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as estrelas sobre um céu escurecido, e a brisa que voa livremente sobre o céu,

procura abrigo sobre as rochas encardidas!

Aos reis de Zatüron nós nos curvamos, aos de Tiän nós respeitamos,

aos de Miricän nós festejamos, e aos de Aldiroön nós veneramos!

Dia de festa e alegria! Doce é a lua que nos ilumina,

perante este céu que nos contagia! Doce é esta terra que nos acolhe, a liberdade que nos aflora, sobre o brilho do luar!

Cantem habitantes de Aldiroön,

cantem livremente, porque o mal já se passou! A tortura nos deixou,

e a coragem nos reanimou. Todos os elfos bebiam e comiam, juntamente com os anões que estavam

responsáveis a servir o vinho aos convidados. Já Agäz, estando na sacada, observou algo que o fez ficar surpreso, sobretudo quando viu um rapazote dançando ao lado dos elfos, bebendo diversas canecas de cerveja caramelada e comendo algumas carnes que eram servidas.

— Ora veja! Estou eu enganado ou aquele rapazote se parece com Tony? — Não está enganado! — disse Pedro, entrando novamente em seu

quarto. — De fato, é ele que está dançando! — Em plena luz do dia? Comendo de nossa comida e bebendo de nossa

bebida? Como pode um vampiro dançar daquela maneira? Ele está esbanjando-se de alegria!

— Tony não é mais um vampiro!

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— Como assim, não é mais um vampiro? — Ele veio até a mim e me pediu perdão. Eu simplesmente o perdoei!

Aconteceu a mesma coisa com Jack, antes mesmo dele morrer. — O feitiço foi desfeito! — exclamou Agäz. — Mas qual foi o seu pedido

de perdão? Ele não fez nada para você? — Traiu o nosso mundo e o seu rei! — disse Pedro. — Claro que houve

mais coisas, mas prefiro não comentar. Enquanto desciam as escadas do castelo, Pedro observava o grande salão

com diversos convidados que estavam a sua espera. Ao aproximar-se de seu trono, todo repleto de ouro e diamantes, avistou a grande águia que estava vindo na sua direção. Ao lado de Ilumar, estava Miriam, toda sorridente perante os convidados que estavam a cumprimentá-la. Pedro sentou-se em seu trono, e ouviu atentamente as palavras emitidas pelo Senhor das Águias.

— Grande dia de glória para todos de Aldiroön! O mal repousa em sua tumba e os filhos desta geração contemplarão a justiça em abundância! Hoje coroaremos um novo rei de Zatüron, que irá governar com justiça e lealdade a toda a raça dos homens!

Pedro ficava admirado pela felicidade contagiante que as criaturas emitiam dentro do salão. Muitos aplaudiam, outros cantarolavam e havia outros que tocavam algum instrumento para demonstrar a sua gratidão.

As colunas do castelo estavam adornadas de estandartes com o desenho de uma águia em chamas com uma coroa em sua cabeça. Ele estava todo bordado com uma linha amarela, sobre um pano avermelhado. Suas cores eram parecidas com ouro derretido e carmesim. Eles se mexiam de um lado para o outro, conforme o sentido do vento.

Enquanto isso, Miriam aproximou-se do novo rei de Zatüron e o coroou, deixando a todos emocionados perante a inusitada cena.

— Chegou o grande dia do rei! — disse Ilumar. — Como os reis do passado, o momento chegou a todos os povos de Aldiroön! A partir de hoje, ele se chamará Pedro Smithy Arynon, no qual, honrará o sobrenome de seus ancestrais. Que o nosso rei seja abençoado ao longo de seu reinado!

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— Que a paz volte a reinar sobre estas terras! — gritou Miriam, perante a assembleia.

Foi um grande momento de alegria, quando todos puderam se curvar diante de seu novo rei. Diversos fogos foram lançados ao céu, a comida voltou a ser servida e a dança animava aquele salão. Homens e elfos unidos novamente e uma nova aliança estava entrelaçada com os centauros e hipogrifos, que festejavam este dia glorioso.

Enquanto os homens festejavam, Miriam andava sobre o jardim, reparando cada movimento dos anões. Alguns deles estavam alcoolizados, se deitando nos gramados frescos e adormecendo embaixo de algumas árvores. Ao dar algumas voltas, encontrou-se com Eleönora sentada em um banco de madeira. Ela estava comovente, parecia que seu olhar estava fixado em um vazio negro e obscuro.

— Bela comemoração, não acha? — perguntou Miriam. — Sim! Parece que os anões estão se divertindo! — respondeu Eleönora,

expressando um leve sorriso. — Parece que sim! Na verdade, eles se divertem é na bebida! Não

gostam muito de dançar como os elfos! — disse Miriam, sentando-se ao lado dela. — Você está infeliz com alguma coisa?

— Não consigo parar de pensar em Jack! Sei que meu luto ainda é recente e que devo aprender a suportar a minha dor! Mas nessa hora, é como se meu coração estivesse sendo rasgando por inteiro na ausência daquele que se partiu!

— Ele está bem! — disse Miriam, levantando-se rapidamente. — Está se adaptando ao seu novo lar.

— Tem visto e... — começou Eleönora, sendo interrompida pelo vazio. Miriam simplesmente desapareceu. Parecia que ela tinha sumido pelo

ar. Eleönora ficou admirada pela sua partida, sobretudo quando encontrou ao seu lado, uma rosa amarelada com um pequeno pedaço de pergaminho envelhecido. Lá continha a seguinte frase:

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DOU-LHE ESTA FLOR, PARA A MAIS BELA ROSA DO MEU PRECIOSO JARDIM!

Os olhos de Eleönora começaram a se lacrimejar. Sua boca ficou seca e sua pulsação acelerava a cada momento em que ela relia o bilhete.

Após ter ficado um bom tempo sentada sozinha, resolveu partir para o norte juntamente com o seu irmão. Ilumar partiu juntamente com Miriam, retornando novamente para Calauë.

Assim se inicia o reinado de Pedro, com diversas canções e melodias, histórias sendo contadas, amigos a sua volta e conhecidos que começaram a fazer parte de sua vida.

Após um ano de seu reinado, Pedro cavalgou até as regiões de Caën para

rever a sua velha cidade. Ele se deparou com a sua antiga casa que estava em perfeito estado. Algumas janelas estavam soltas, mas não se compara com os estragos que havia em diversas partes da cidadela.

Ao entrar em sua moradia, reparou que os móveis estavam empoeirados, permanecendo no mesmo lugar que os tinha deixado antes mesmo de partir. Mas havia algo de diferente. Pedro percebeu que no chão de sua sala, havia um pequeno buraco. Era difícil de imaginar como este buraco havia aparecido no chão de sua sala, poderia ter sido algum inseto ou até mesmo alguma criatura humana que entrou em sua casa para se esconder da chacina de seu antigo rei.

Dentro deste buraco, havia um livro escondido. Ele era todo vermelho por fora, feito de couro de dragão e dentes de rinoceronte. Suas páginas estavam todas amareladas, mas era nítido de se compreender o que estava escrito. Pedro sabia que se tratava do diário de sua mãe que estava desaparecido ao longo destes anos. Ao sentar-se em sua poltrona, começou a folhear algumas páginas.

— Os relatos da primeira sociedade da prata! — exclamou Pedro, admirado pelas letras rechonchudas de sua mãe.

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I

Os Elanfös

Em algumas partes deste livro, relato aos meus leitores as histórias dos elanfös. Por meio delas, podemos descobrir um pouco de sua personalidade e de sua convivência nas regiões de Aquatinta. Diversas histórias foram contadas sobre os elanfös, muitas canções foram dirigidas a esse povo que prefere simplesmente estar em seu lar, em volta de suas fogueiras, aquecendo-se do frio repentino.

Entretanto, muitos podem interessar em saber mais sobre essas criaturas surpreendentes, embora não tenha relatado profundamente sobre eles nas histórias aqui contadas. Para esses leitores, descrevo aqui algumas notas sobre os pontos mais importantes da vida dos elanfös.

Muitos devem estar se perguntando de onde vieram os elanfös. Qual é a origem deste povo tão sensato? Quando eles foram criados? Para que objetivo? De fato, são tantas perguntas que queremos esclarecer a você que nos acompanhou nesta longa jornada.

Segundo as lendas do Norte, relatadas e escritas por Beyën, rei dos elfos e protetor dos pergaminhos antigos, os elanfös surgiram há três eras, após as criações de Ilumar. Não se tem nada registrado de como os elanfös realmente existiram. Há boatos de que essas criaturas nasceram de dentro de longas raízes de árvores, fechadas por uma bolsa de folhagens e lama ao seu redor. Já outros elfos, mencionam que eles surgiram de uma paixão repentina de um elfo com uma anã. Muitos relatam que seu amor era proibido. Há boatos de que essa anã foi expulsa de suas terras, mas nada disso é possível de se confirmar.

Em ambos os casos, suas origens se dirigem às montanhas de Dríÿ, onde surgiram os primeiros elanfös. Essas montanhas se encontram próximo às regiões de Tiän, que hoje são um marco histórico para aquela população. Mas os elanfös não ficaram por muito tempo naquelas montanhas. Houve fome naquela

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época, muitas de suas colheitas foram perdidas pelas pragas que vieram do sul. A peste negra dominou aquele lugar e muitos dos elanfös morreram sem os mantimentos necessários para a sua sobrevivência. Sabendo da agonia de seu povo, o rei dos elfos preparou uma outra região que seria designada especialmente para eles.

Jorge, pai de Agäz, estava no meio daquele povo sofrido, onde o mal definidamente os estava acompanhando. Ele era apenas uma criança, quando viu seu pai morrer de uma forte dor no peito, devido a peste negra que se alastrava de uma maneira totalmente alarmante. A família Calção acompanhou, juntamente com outros elanfös, as ordens de seu rei. Todos foram morar nas regiões de Aquatinta, próximo às grandes montanhas do leste, onde construíram suas casas dentro das frondosas árvores de baobás. Suas madeiras eram firmes, mas não impediam que o frio das montanhas entrasse em suas casas.

As terras de Aquatinta se estendiam por 140 milhas desde as grandes montanhas do leste até as cataratas de Ruffis, e 160 milhas desde os rochedos no norte até os charcos do sul. Embora Aquatinta não fosse uma região tão visitada assim, era maravilhoso contemplar o pôr-do-sol que se escondia por detrás das montanhas. Seu gramado era aparado, havendo longas estradas de pequenas pedras agudas. Próximo de suas casas, havia uma extensa plantação de trigos e uvas, sendo elas, as mais famosas de todo o mundo de Aldiroön. Eles comercializavam a sua colheita em troca de alguns bréguiimäs que ajudava para a compra de algumas ferramentas para o seu plantio, e nunca se atreveram a caçar algum animal, nem mesmo por hobby.

Os elanfös são criaturas discretas, mas numerosos outrora do que hoje em dia. Sua fisionomia era completamente diferente se comparada a um humano normal. Tinha um jeito rude como os anões, mas completamente sensato como os elfos. Suas orelhas eram compridas e pontiagudas, seu nariz era bastante arredondado, seus olhos eram claros e perspicazes, suas roupas eram totalmente avantajadas e coloridas, seus cabelos eram encaracolados, com uma pele lisa e clara como as dos elfos. Seus dedos eram grandes e rechonchudos e seu corpo não tinha um certo porte. Todos eles tinham uma pequena corcova em suas

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costas, nada exagerado. Usavam sapatos de couro de dragão, que combinavam literalmente com suas vestimentas.

Gostavam de tomar chá após o pôr-do-sol, ao lado de sua lareira, juntamente com seus amigos. Mas, à noite, preferiam tomar cerveja caramelada, ou até mesmo um bom vinho, nas tabernas de Aquatinta. Seu hobby era de se sentar em sua poltrona e ler um bom livro. As mulheres gostavam de ler estórias românticas, escritas por elfos, e por homens. A maioria das mulheres eram experientes com as guloseimas. Faziam diversos tipos de doces, desde pirulitos com formatos extravagantes, até as mais belas tortas de maçã. Todas elas usavam um vestido farto, com lenços amarrados em sua cabeça de cor distinta para distinguir os laços familiares entre elas. As mulheres da família Calção usavam lenços azuis, simbolizando o brasão de seus antepassados.

Nenhum dos elanfös tinha barba como os anões, neste ponto, puxaram nitidamente para os elfos. Mas eram seres pequeninos, do mesmo tamanho que um anão. Sua altura era variável, indo de 90 centímetros a 1 metro e 30 centímetros na nossa medida. Raramente conseguiam chegar a 1 metro e 40 centímetros, mas eles cresceram muito, comparados com os elanfös do passado.

Os elanfös gostavam da paz e de tranquilidade, mas eram seres justos e nobres que, quando algo os ameaçava, não fugiam de batalhas. Adoravam deitar em suas redes de folhas de bananeira enquanto estavam cansados, tinham uma vida simples, jamais sentiram inveja daquilo que não poderiam obter. Eram criaturas curiosas, gostavam de colecionar pedras multicoloridas. De fato, os elanfös são criaturas admiráveis de se conviver. A maioria deles conseguem chegar a uma idade extremamente avançada 187 anos segundo os pergaminhos antigos de Aldiroön.

II

Sobre a cerveja caramelada

A cerveja caramelada é uma bebida típica de todo o mundo de Aldiroön. Esta cerveja sacia nitidamente o desejo escaldante das criaturas que habitam neste mundo. Segundo os relatos dos homens, tudo começou no início da

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segunda era, quando diversos barris de cerveja vieram para a região centro oeste, a mando de alguns dos anões que transportavam diretamente do norte.

Sua composição nada mais é do que sorvete de chocolate derretido com açúcar mascavo, nozes e avelãs triturados, algumas gotas de mel, chantilly, e claro, a cerveja natural. Alguns adoram enfeitar a borda do copo com hortelã, mais isso não é tão importante, embora os elanfös adorem os seus copos enfeitados. Esta cerveja recebeu este nome devido a sua composição de ser incrivelmente açucarado. Com isso, batizaram-na de cerveja caramelada.

III

Sobre o molho de Crepän

O molho de Crepän foi criado pelos elfos na primeira era, quando houve a estrondosa guerra entre os homens, em busca das terras do oriente. Como os elfos não tinham um certo tempo para preparar a sua própria comida, chegaram a triturar algumas sardinhas, juntamente com alguns cogumelos e hortelãs, formando uma espécie de sopa para comerem com pães ázimos durante o jantar.

Após a guerra, a comida se espalhou para todos os cantos de Aldiroön. A maioria dos elfos saboreia este apetitoso cardápio que é hoje tradicional em suas refeições na forma de molho. Mas não é somente nas mesas de família que este molho é degustado. Diversas tabernas oferecem o Crepän como acompanhamento, principalmente nas noites frias de inverno.

IV

A respeito das folhas de mato-verde

O mato-verde é uma planta usada por diversos homens e senhores das montanhas. Eles inalam o fumo desta planta extraído de suas folhas, através de um cachimbo de madeira artesanal.

Diversos elanfös apreciam este habito de fumar, tanto que alguns deles cultivam em seus jardins alguns pezinhos desta planta esverdeada.

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Não se sabe ao certo de onde elas surgiram, mas muitas canções criadas pelos elfos nos direcionam as regiões de Terän, localizada nas encostas das montanhas. Estas terras pertencem aos anões, sendo eles os primeiros a fumarem destas folhas, além de disseminar o costume entre os outros povos.

Hoje, a maioria da população faz uso destas folhas com o objetivo de estreitar os laços de amizade experimentando o doce aroma desta planta do Oeste.

V

A respeito do trono da justiça

O Trono da justiça foi criado no início da primeira era, pelo rei Joaquim juntamente com alguns ferreiros e lenhadores de Zatüron. Sua estrutura é feita de madeira, coberta com ouro derretido. Seu encosto contém duas asas gigantes, simbolizando o voo de Ilumar. Seu assento é todo aveludado com fios de prata.

No alto do encosto, um grande dragão foi desenhado, simbolizando a força e a grandeza do reinado. Em sua frente, há duas quimeras desenhadas a ouro, revestidas de pedras preciosas. Elas simbolizam a proteção para aqueles que se sentam no trono. Somente os reis e alguns de seus conselheiros tiveram acesso a esta preciosidade. Todos de Aldiroön sempre comentaram do trono da justiça. Foram criadas diversos poemas e canções para relatar a magnitude de seu poder.

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Rafael da Silva Ferreira nasceu no dia 2 de setembro de 1989, na cidade de Alfenas, no interior de Minas Gerais. Quando tinha 18 anos, começou a desenvolver vídeos e a trabalhar com informativos no movimento Aliança de Misericórdia em Alfenas. Alguns anos depois, começou a escrever em seu blog, levando entretenimento para seus leitores. Trabalhou de projetista durante quatro anos, em uma empresa terceirizada da Cemig. Durante cinco anos cursou o bacharelado de Psicologia na Universidade José do Rosário Vellano. Nesse período, surgiu o seu primeiro livro O Senhor das Águias e as pedras da perdição, que levou três anos para ser finalizado.