O Sistema Fiscal do Moçambique Pós Independência - Breve Historial

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O sistema Fiscal post-independência Moreira Rêgo O Sistema Fiscal do Moçambique Pós Independência (Breve Historial) Moreira Rêgo Sumário Introdução I. O sistema fiscal moçambicano pós-independência II. Primeira reforma de 1978 A) A resolução 5/77 da Assembleia Popular 1.1. Fins da reforma III. A segunda reforma de 1987 1. Impostos adoptados pela reforma de 1987 A) Directos B) Indirectos, ou sobre despesas 2. Efeitos da reforma IV. A terceira reforma de 2002 1. O sistema tributário de 2002 A) Tipos de impostos da última reforma 1. Tributação directa 2. Tributação indirecta Conclusão Bibliografia 1

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O sistema Fiscal post-independênciaMoreira Rêgo

O Sistema Fiscal do Moçambique Pós Independência (Breve Historial)

Moreira Rêgo

Sumário

Introdução

I. O sistema fiscal moçambicano pós-independência

II. Primeira reforma de 1978

A) A resolução 5/77 da Assembleia Popular

1.1. Fins da reforma

III. A segunda reforma de 1987

1. Impostos adoptados pela reforma de 1987

A) Directos

B) Indirectos, ou sobre despesas

2. Efeitos da reforma

IV. A terceira reforma de 2002

1. O sistema tributário de 2002

A) Tipos de impostos da última reforma

1. Tributação directa

2. Tributação indirecta

Conclusão

Bibliografia

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INTRODUÇÃO

Neste trabalho, abordaremos a matéria relacionada com a história do sistema fiscal

moçambicano post-independência. Trata-se de um breve excursus histórico que apresentará as

três grandes reformas do sistema tributário moçambicano face à realidade social que Moçambique

percorreu desde a independência até aos nossos dias.

Não se trata de um enfoque histórico cabal, mas breves trechos que elucidarão a primeira

grande Reforma Tributária de 1978, a segunda de 1987 e a terceira de 2002, segundo a

nomenclatura de Dr. Ibraimo Ibraimo1, contudo sem querermos sair da linha do nosso professor,

Dr. Teodoro Waty que apresenta seis Reformas, designadamente as de 1978, 1982, 1987, 1997,

1999 e 2003, porém, todas elas serão englobadas naquelas três supracitadas.

Em breve trecho, a Reforma de 1978 visava uma adequação aos princípios constitucionais do

recém-criado Estado moçambicano, como o de justiça social, próprio do Socialismo (art. 13

CRPM) e à qualidade do pessoal profissional existente. Também consta o problema do declínio

das receitas provindas da Contribuição Industrial e do Imposto de Consumo; a de 1987, em função

da implementação do Programa para a Reabilitação Económica, consequência da Reforma

anterior que permitiu o enfraquecimento da colecta e a consequente agravante, que resultou do

mercado paralelo, vulgo “candonga” que tinha debilitado e tornado ineficaz o Sistema Fiscal até

então vigente. Aqui, revitalizou-se a política dos impostos directos. Durante este período, duas

situações ocorreram: a introdução no Sistema Fiscal de Impostos Autárquicos pela Lei 11/97 de

31 de Maio e a Introdução do IVA (Imposto sobre Valor Acrescentado) e do ICE (Imposto sobre

Consumos Específicos)2 e; a última Reforma que só apresenta diferença de datas (2002 e/ou

2003) em função dos autores supracitados, mas mesmo conteúdo, refere-se à aprovação da Lei

Base do Sistema Tributário (15/2002 de 25 de Junho). Nesta, estabelecem-se as bases para a

implementação do novo Sistema de Tributação do rendimento, obedecendo a princípios de

unidade e progressividade, as garantias e obrigações do contribuinte e Administração.

Queremos, desde já, referir que seguiremos a linha orientadora do Dr. Ibraimo Ibraimo por

apresentar de forma sintética as três Reformas e, ainda, por a sua síntese não pôr em causa as

1 Ibraimo Ibraimo, O Direito e a Fiscalidade, p. 90ss2 Teodoro Waty, Introdução ao direito Fiscal, p.210ss

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diversas Reformas que ocorreram até a última, a de 2002. Apesar disso, não prescindiremos da

referência bibliográfica do Dr. Waty.

Para a elaboração deste trabalho recorremos a livros e entrevista com pessoas que viveram a

época post-independência e sentiram o pulsar das Reformas ocorridas, principalmente a de 1987.

Seguiremos uma metodologia que facilitará a leitura deste opúsculo.

Desde já, o nosso tema tratará de abordar o sistema fiscal dando enfoque à primeira Reforma

(I), à segunda Reforma (II) e à terceira Reforma (III).

Não se trata do cúmulo de toda a história do direito fiscal post-independência, mas uma

ilustração das situações que ocorreram até a última Reforma.

Moreira Rêgo

I. O SISTEMA FISCAL MOÇAMBICANO PÓS-INDEPENDÊNCIA

A proclamação da Independência total e completa de Moçambique e a adopção do socialismo

em 1977 trouxe uma grande virada para o sistema fiscal que se pretendia de justiça social. Por

assim dizer, como era de esperar em contradição com o sistema anterior, tornou-se inadequado

com o sistema fiscal colonial que não se baseava nos princípios de justiça social, o que implicava

uma tributação pesada sobre os rendimentos de trabalho, cujas taxas eram consideravelmente

elevadas. Só para ilustrar, até à data da independência, as estatísticas mostram que 82% do valor

das despesas era financiado pelas receitas fiscais.

Ademais, a saída dos portugueses originou um declínio na Administração fiscal em termos de

pessoal qualificado, queda na produção de bens, sabotagem nas empresas privadas e indústrias

ora existentes e um assalto às propriedades privadas.

Em resultado desta situação nefasta, os impostos vindos ou que dependiam destes

organismos ficaram de certo modo inexistentes, porquanto estes mesmos impostos dependiam de

lucros das indústrias e sociedades ou empresas comerciais.

Assim, a queda da produção industrial causou igualmente a queda nas cobranças em

impostos de produção e de consumo, daí a impossibilidade de manter as receitas ora atingidas

(entenda-se no tempo colonial, ou antes da independência).

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II. A PRIMEIRA REFORMA TRIBUTÁRIA DE 1978

A necessidade de garantir o funcionamento dos sectores sociais, nomeadamente a saúde e a

educação trouxe para o Estado moçambicano a problemática dos meios para assegurar a

realização das receitas para os objectivos de justiça social traçados (os supracitados), cuja

exequibilidade não passa de simples sonho, mas de concretização.

Desde logo, o sistema clamava por uma Reforma. Reforma que se concretizou em Fevereiro

de 1978, que se basearia nos princípios de política fiscal definidos na Resolução 5/77 da

Assembleia Popular (AP) que incluía taxas progressivas e outras medidas que visavam a

prossecução da justiça social.

A) A RESOLUÇÃO 5/77 DA ASSEMBLEIA POPULAR

O princípio da legalidade e a observância das normas constantes da Constituição

evidenciavam uma profunda razão para a Reforma (Cfr. Art. 13 CRPM), pois dispunha que o

rendimento e a propriedade privada estavam sujeitos a impostos progressivos, fixados segundo os

critérios de justiça social.

Ainda, a Resolução supracitada, enquadrava os impostos adoptados na política orçamental do

país assentes na política económica da “ideologia” concebida, virada à solução de problemas

sociais de todo o povo, na defesa da soberania e numa economia centralmente planificada em

que o sector público tinha papel preponderante na arrecadação de receitas do Orçamento Geral

do Estado.

1.1. FINS DA REFORMA

Os objectivos que a Reforma visava assentavam, em suma, na arrecadação de receitas com

base numa fórmula que fizesse face às exigências orçamentais. Analiticamente destaca-se:

- simplificação do processo de captação do rendimento das empresas, retendo-o no

processo de circulação de mercadorias e facturação de serviços;

- manutenção da contribuição industrial e do Imposto Complementar apenas como

impostos correctivos;

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- fusão das diversas formas de tributação do Rendimento do Trabalho num só imposto,

estabelecendo-se taxas progressivas nos termos da Constituição vigente.

- agravamento das taxas dos impostos sobre o lucro das empresas;

- simplificação da legislação fiscal em vigor3

A Reforma foi materializada pelos Decretos do Conselho de Ministros, que tinham

prerrogativas para definir as bases da política fiscal. (art. 44 al. d) CRPM), DC. nos 2/78 que

aprovava o Código do Imposto de Circulação e 4/78 que introduzia alterações do Código dos

Impostos sobre Rendimentos.

O Imposto do Consumo, que agravava a contribuição dos produtos supérfluos em detrimento

dos produtos de primeira necessidade foi alterado pelo Decreto-Lei 27/76.

Dentro dos moldes da Resolução 5/77 da AP introduziu-se o Imposto de Reconstrução

Nacional (IRN) com tendências a ser temporário, Imposto de Circulação e, por fim, foi revisto e

alterado o Código dos Impostos sobre o Rendimento.

Todavia, esta Reforma funcionou eficazmente até 1983 com reflexo no PIB que passou de 9%

em 1976 para 16% em 19834.

Porém, em 1984, o PIB baixou para 13%, o que demonstrou a inadequação do sistema

adoptado à realidade da época. Tal situação deveu-se porque o sistema estava concebido para

vigorar num ambiente de paz e segurança social onde o mercado oficial fosse controlado pelo

Estado. A não ser assim, dos estudos feitos em 1986, notou-se que o estado detinha 30% do

controlo tributário em detrimento dos 70% que escapavam, debilitando deste modo a economia

nacional e tornando o sistema fiscal cada vez mais ineficaz.

Aliás, houve muita indiferença nos contribuintes para com o fisco, pois a cobrança não incidia

sobre o mercado paralelo, vulgo “candonga”, daí os prejuízos enunciados, que não satisfaziam os

objectivos preconizados na Resolução 5/77.

Ainda, o agravamento das receitas públicas e a inadaptação das receitas fiscais à economia

prejudicou o Estado na aceleração progressiva do PIB. Quer dizer, a redução da distribuição das

riquezas pelo Estado por via dos impostos era notável por seguintes causas:

- graves distorções na estrutura económica e comercial;

- inadequação do sistema tributário que não incidia sobre o mercado paralelo;

3 Cfr. Ibraimo Ibraimo, Um Contributo para a Fiscalidade, p. 92 e Teodoro Waty, Introdução ao Direito Fiscal, p. 2114 O Dr. T. Waty considera que o enfraquecimento deste período seja o fim da primeira Reforma enquanto que o Dr. I. Ibraimo não. Este faz uma fusão de períodos. Vide Waty, Introdução ao Direito Fiscal p. 211.

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- progressiva deterioração da economia por causa da guerra.

As consequências deste sistema não tardaram, pois dificultavam a captação de excedentes

gerados pelos agentes económicos, factor que fez com que do lado da procura aumentasse cada

vez mais o dinheiro e do lado da oferta, os preços oficiais não correspondessem o valor da oferta.

Por conseguinte, assistiu-se ao nascimento da candonga.

Neste período, importa referir a queda da matéria colectável e o crescimento excessivo dos

lucros, rendimentos de transacção tributáveis das pessoas singulares no mercado oficial.

De todo o exposto, em função das situações demonstradas, impunha-se nos fins de 1986, a

alteração do sistema tributário e a moralização do Direito fiscal, sendo este instrumento

fundamental do conjunto das normas do Direito Financeiro e a reactivação das leis universais da

economia que se circunscreviam no domínio dos preços, câmbios, salários, créditos e outros.

Desta feita, uma nova Reforma se exigia para repor a situação à normalidade.

III. A SEGUNDA REFORMA DE 1987

Dadas as circunstâncias da guerra e a preocupação em minimizar os seus efeitos para

melhorar o estado da economia nacional foi lançado em 1987 o Programa de Reabilitação

Económica (PRE). Este programa consistia numa série de acções nas áreas de formação dos

preços, de taxa de câmbio, alteração da política e legislação fiscal e outras estruturais e

administrativas, visando melhorar a eficiência dos agentes económicos, aumentar o

abastecimento e a produção e ajudar a restabelecer o equilíbrio financeiro.

Por assim dizer, a Reforma implicava a revogação da Resolução 5/77, cujos princípios já não

solucionavam os problemas da altura, pela Lei 3/87 que fixava novos princípios em que deveria

assentar o sistema fiscal de modo a:

- aumentar a elasticidade das receitas em relação ao crescimento do PIB;

- alargar a base tributária.

Porém, mantiveram-se os seguintes Impostos: sobre o Rendimento de Trabalho, sobre Lucro

de Empresas, sobre as Transacções e sobre o Consumo e Importação, e alterou-se:

- a amplitude e a base de incidência dos impostos sobre o consumo e importação, com

objectivo de captar para o Estado de forma selectiva os proveitos anormais que em

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condições de novos preços e salários se encontravam nas mãos de um número

reduzido de cidadãos;

- a gravosidade do imposto sobre transacções – imposto de circulação – repercutindo sobre

o consumidor, obrigou a partilhar com o Estado uma porção maior dos lucros realizados

pelo sector comercial;

- a redistribuição da tributação dos rendimentos do trabalho fazendo com que: os

trabalhadores do estado ficassem isentos, a adaptação das taxas não desvirtuasse o

significado do aumento salarial;

- o imposto complementar que passou a incidir sobre os rendimentos de trabalho;

- a sujeição das empresas estatais ao regime geral dos impostos;

- o IRN, passando a designar-se Imposto de capitação e;

Criou-se o calendário fiscal que introduziu o sistema de cobranças antecipadas em lugar de

sistemas de correcção.

Em 1988, completou-se a Reforma adoptando-se algumas medidas adicionais no domínio

aduaneiro. (DC 20/78).

1. IMPOSTOS ADOPTADOS PELA REFORMA DE 1987

Com a Reforma de 1987, o sistema fiscal da RPM passou a integrar: Impostos Directos e

Impostos Indirectos dos quais se destacam:

A) DIRECTOS:

- Contribuição industrial, incidente sobre os lucros da actividade Comercial;

- Imposto sobre os Rendimentos de Trabalho, Secção A e B;

Secção A: incidente sobre remunerações;

Secção B: incidente sobre o valor da produção e dos serviços.

- Imposto Complementar, incidente sobre o rendimento global de pessoas singulares,

rendimento de aplicação de capitais (singulares e colectivos) e sobre rendimento de

trabalho independente.

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B) INDIRECTOS, OU SOBRE DESPESAS

- Imposto de Circulação, com incidência sobre todos os bens e serviços;

- Imposto de Consumo, incidente sobre produtos nacionais e importados;

- Direitos Aduaneiros;

- Outros impostos cuja situação concreta o justificasse como a sisa, imposto do selo, o

imposto sucessório, etc.

2. EFEITOS DA REFORMA

Em concordância com os objectivos da elasticidade das receitas em relação ao crescimento

do PIB, o nível da fiscalidade alterou a situação até então existente, passando-se da tributação

que abrangia os produtos transaccionados no mercado não oficial. Assim, os impostos de

consumo passaram a ter relevância deveras decisiva e eficaz. Contudo, os mesmos significavam

maior sacrifício do rendimento das populações.

Entretanto, a adequação do sistema de liquidação e cobrança e a correcção do calendário

fiscal como antecipação da cobrança da Contribuição Industrial através da tributação das mais-

valias nas exportações e da Contribuição Industrial provisória possibilitaram a arrecadação em

tempo útil dos impostos devidos, atestando os resultados benéficos de uma escalonação dos

impostos no tempo e no espaço dada a pontualidade com que as obrigações fiscais passaram a

ser cumpridas. Isto atenuou o índice de evasão e contribuiu para a correcção monetária da dívida

fiscal, permitiu uma maior eficácia das cobranças e elevou as receitas dos orçamentos provinciais.

Em jeito de conclusão, extrai-se que a lei 3/87 contribuiu para o aumento das receitas fiscais e

para a reposição de alguns princípios que orientam as leis do mercado. Dado que as posições

divergem em função da preferência de um ou outro sistema, não nos cabe aqui tomar posições

sobre a perfeição ou não de um sistema.

Este sistema vigorou até 31 de Dezembro de 2002, altura em que começou a funcionar o novo

sistema aprovado pela Lei 15/2002 de 26 de Junho, conhecida pela sigla LBST5.

5 Pelo facto de a LBST ter entrado em vigor a 1 de Janeiro de 2003, o Dr. Waty prefere dizer Reforma de 2003 e não de 2002, ano da publicação da LBST. Vide T. Waty, Introdução ao Direito Fiscal. P.219

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IV. A TERCEIRA REFORMA DE 2002

A terceira Reforma teve como prenúncio a introdução do IVA como substituição do imposto de

circulação que apesar de ter constituído grande fonte de receita para os cofres do Estado

fomentava o mercado informal e aumento dos preços dos produtos produzidos internamente; e

introdução do Imposto de Consumo de Produtos Específicos (ICE) que substituía o Imposto de

Consumo, que pelas características dava azo ao contrabando e evasão fiscal6.

Estes novos impostos visavam alargar da base tributária, reduzir a carga fiscal no conjunto da

tributação directa, aumentar o nível das receitas fiscais, modernizar o sistema de impostos e

racionalizar o sistema de benefícios fiscais.

Como ficou dito, nem toda a legislação fiscal colonial foi revogada, restando para tal tudo o

que não fosse contrário à Constituição de 1975. Por assim dizer, assistiu-se a uma reformulação

da tributação, substituindo também a matéria do Código dos Impostos sobre o Rendimento de

1987.

Nesta reforma de 2002, estabeleceram-se as bases para a implementação do novo sistema

de tributação do rendimento (Imposto sobre Rendimento de Pessoas Singulares - IRPS e Imposto

sobre Rendimento de Pessoas Colectivas - IRPC) com carácter progressivo. Ainda, foram

constituídos os princípios de organização tributaria no país, as garantias e as obrigações

tributárias dos contribuintes e da Administração fiscal, os procedimentos básicos de liquidação e

cobrança de impostos, o regime geral de infracções tributárias, introduz-se a tributação das

empresas pelo seu rendimento real.

1. O SISTEMA TRIBUTÁRIO DE 2002

A última Reforma introduz alterações profundas na estrutura dos impostos e coloca princípios

que foram deixados à parte pelas duas anteriores Reformas designadamente de 1978 e 1987 de

forma a alcançar melhor eficiência de execução face à realidade da época quer quanto `a

capacidade técnica do pessoal administrativo quer dos contribuintes.

A lei 15/2002 introduz técnicas modernas de tributação e consagra os princípios de

generalidade, da justiça material, da eficiência e simplicidade do sistema, requisitos necessários

6 Desde logo, o Dr. Waty considera a esta situação uma Reforma Fiscal. Vide Waty, op. Cit. p. 217

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para um sistema fiscal ideal7. Ainda, revoga a Lei 3/87 de 19 de Janeiro e a Lei 8/88 de 21 de

Dezembro.

Uma outra inovação consistiu na materialização dos princípios e na fixação de regras de

interpretação e integração de lacunas da mesma, no tratamento dos elementos da relação jurídico

tributária, conceituação de substituição fiscal e de retenção na fonte, garantias dos contribuintes,

apresentação das formas de extinção da responsabilidade tributária, das modalidades de

cobrança dos impostos e do conceito de infracção tributária (arts. 5, 6, 11 e 12, 17, 32, 37 e 41

todos da LBST).

Ainda mais, introduz uma alteração na tributação directa, passando do clássico modelo

cedular para um modelo de tributação de Rendimentos.

A) TIPOS DE IMPOSTOS DA ÚLTIMA REFORMA

O sistema tributário integra impostos nacionais e autárquicos8. De todo resulta que os

impostos do sistema fiscal nacional classificam-se em directos e indirectos e actuam da seguinte

maneira:

1. TRIBUTAÇÃO DIRECTA (art. 57 LBST)

Actuam com base em:

- IRPS; e

- IRPC.

2. TRIBUTAÇÃO INDIRECTA (art. 66 LBST)

Actuam com base em:

- imposto sobre a despesa;

- IVA;

7 Ibraimo Obrarmos, Um Contributo para a Fiscalidade em Moçambique, p.105 e Teodoro Waty, Introdução ao Direito Fiscal, p.219.8 A Lei 11/97 de 31 de Maio fixa os seguintes impostos autárquicos: O Imposto Predial Autárquico, o Imposto Pessoal Autárquico, o Imposto Autárquico de Comércio e Indústria, o Imposto sobre o Rendimento de Trabalho secção B. A introdução desta Lei constitui uma outra Reforma para o sistema fiscal, cfr. T. Waty, op. Cit. P. 216

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- ICE; e

- Direitos Aduaneiros

Contudo, a LBST manteve os seguintes impostos das Reformas anteriores: Imposto do selo,

sobre sucessões, sisa, especial sobre o jogo, IRN, sobre veículos.

A terminar, de referir que esta Lei trouxe grandes inovações e modernizou o sistema fiscal

moçambicano porquanto adopta princípios universais do direito fiscal e está virado para a justiça

social.

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CONCLUSÃO

O sistema fiscal moçambicano é uma realidade que tem vindo a evoluir desde os tempos

antigos. Desde já, a evolução por mais que seja boa ou má aos olhos de uns e outros, ela tende a

melhorar qualquer situação social. Segundo, Hegel, o filósofo, a história é uma contradição ou

oposição de forças (tese, antítese e síntese).

Deste modo, a história do direito fiscal que partiu desde o período primitivo até à época

colonial servindo os interesses dos soberanos e depois dos exploradores, respectivamente, tem

hodiernamente o sentido verdadeiro do fisco, que visa a financiar a carência do Estado de forma a

satisfazer os fins a que ele se obriga a prosseguir.

Desde a Independência até hoje, vivemos três épocas “fiscais” distintas que pretendiam fins

de justiça social. Porém, bem ou mal, perfeito ou imperfeito era o sistema vigente.

Na primeira época, com a introdução do sistema socialista, houve por bem deixar o ideal

colonialista que satisfazia os interesses imperialistas burgueses9 para servir os interesses da

nação baseados no princípio de justiça social. Assistimos aqui a uma lapidação económica,

consequência da inexistência da paz e segurança social, descontrolo duma grande parte da

tributação, cerca de 70% e indiferença quanto ao fisco, incentivada pela guerra e outros males

sociais. Esta fase redundou num fracasso. Porque a história é feita de teses, antíteses e sínteses

desembocámos numa outra fase que pretendia recuperar o sucesso alcançado pela primeira fase.

Na segunda fase, as medidas usadas foram violentas e penosas para a população ao se

introduzir o PRE, exigindo de todos maior sacrifício fiscal. Procurava-se ajustar as receitas fiscais

ao OGE e acelerar o PIB. Das medidas tomadas, o mercado informal foi abrangido e o custo de

vida subiu.

Na terceira fase, pretendeu-se melhorar o sistema e introduziram-se grandes alterações que

resultaram na introdução de princípios de justiça social, simplicidade, eficiência e eficácia do

sistema fiscal. Uma grande informação e formação das pessoas nesta matéria e estabelecimento

de bases para garantias dos contribuintes entre outros. Foi, em suma, como prefere Dr. Waty a

introdução de um modelo fiscal comum, isto é, que obedece a regras universais.

Concluindo, diremos que este trabalho contribuiu bastante para enriquecer a nossa percepção

de todo um conjunto de arsenal que compõe a história da fiscalidade pós independência de

Moçambique.

9 Antigo Hino Nacional da República de Moçambique.

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Não se trata do cúmulo da matéria, mas um percurso pela história do direito tributário

moçambicano.

Desde já, com o conhecimento da história e dos seus princípios fundantes podemos ir mais

longe, progredindo e recuperando o que foi perdido, segundo as palavras dos latinos historia

magistra vita est.

O Autor

BIBLIOGRAFIA

1. WATY, T. A., Introdução ao Direito Fiscal, W&W Editora, Maputo, 2004

2. IBRAIMO, I., O Direito e a fiscalidade, Um Contributo para o Direito Fiscal Moçambicano,

Maputo, s.a.

3. CRPM de 1975

4. CRM de 2004

5. LBST

6. Lei das Finanças autárquicas.

Fontes orais

1. Inácio Petróleo, trabalhador, 36 anos de idade;

2. Mário Gobeia, trabalhador, 30 anos de idade.

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