O sistema Westfaliano e as relações internacionais na Europa

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O sistema Westfaliano e as relaes internacionais na Europa.Para entender a histria... ISSN 2179-4111. Ano 1, Volume ago., Srie 27/08, 2010, p.01-09.

A anlise das relaes internacionais nos sculos XVII e XVIII possui como centro dois pontos principais:

1. Primeiro, a formao do chamado sistema Westfaliano, criado a partir de uma srie de tratados resultantes de guerras envolvendo Espanha, Holanda, Frana, Inglaterra, Alemanha e Sucia, tendo a dinastia dos Habsburgo como centro; o qual serviu de referncia para guiar as relaes internacionais europias, sobretudo, durante o perodo compreendido entre 1648 e 1789. 2. Depois, o Congresso de Viena, em 1815, uma reao conservadora que tentou restabelecer o Antigo Regime, aps os efeitos provocados pela Revoluo Francesa, redefinindo as fronteiras da Europa e as suas zonas de influencia, terminando por estimular as revolues liberais e as independncias na Amrica Latina, mola impulsora do liberalismo e da hegemonia Britnica.

Mas, antes de abordar estes dois pontos conveniente levantar um debate feroz existente em torno da historiografia envolvendo a histria das relaes internacionais: o marco que, segundo os tericos especializados, delimitaria o inicio das modernas relaes internacionais, justamente girando em torno do debate da importncia da paz de Westflia contraposta as conseqncias advindas a partir do Congresso de Viena.

O debate historiogrfico.

O Congresso de Viena considerado o ponto de partida que marca as modernas relaes internacionais, opinio partilhada por especialistas de peso; como Paul Kennedy, autor de Ascenso e Queda das Grandes Potncias, obra que reinaugurou os estudos na rea; assim como por Antnio Carlos Lessa, um dos maiores especialistas em RI do Brasil; e Amado Luiz Cervo, para quem um verdadeiro sistema internacional s passou a existir depois da transio marcada pelo Imprio Napolenico. Na viso dos defensores do Congresso de Viena como marco das modernas relaes internacionais, a partir do chamado concerto entre as naes, em uma tentativa de restaurar o Antigo Regime e deter o avano do modelo liberal, que se configura justamente o oposto, uma sociedade industrial que consolidou o liberalismo, derrotando definitivamente o absolutismo e os resqucios medievais que permaneceram durante a Idade Moderna, como, por exemplo, os direitos e privilgios da nobreza. Cabe ressaltar que a palavra concerto, derivada do verbo concertar, ao invs de conserto, no denota reparo ou emenda, significando ordem ou harmonia, passa a idia de concrdia entre as naes participantes do Congresso de Viena, no sentido de uma reao conservadora que redefiniu as fronteiras da Europa e as zonas de influencia, terminando por estimular as revolues liberais e as independncias na Amrica Latina, mola impulsora do liberalismo.

O liberalismo, mecanismo utilizado pela Gr-Bretanha para consolidar sua hegemonia, possibilitou o surgimento das democracias republicanas, tpicas da Idade Contempornea, herdeiras da Revoluo Francesa, criando uma sociedade de consumo, marcada por intenso intercambio que, para os especialistas, formou um sistema internacional interestatal; visto que, dentro desta concepo, no existiam se quer Estados Nacionais consolidados antes da Paz de Westflia. Aqueles que no concordam com esta viso, defendem a tese de que um sistema internacional interestatal formou-se muito antes do Congresso de Viena.

O portugus Antnio Pedro Barbas Homem, a exemplo de outros, delimita o inicio das modernas relaes internacionais a partir da Paz de Westflia, a finalizao da guerra dos oitenta anos; disputada entre Espanha e Holanda, na qual estiveram envolvidas Frana e Inglaterra; e da guerra dos trinta anos, luta motivada pelo antagonismo religioso entre catlicos e protestantes, envolvendo, alm das naes j citadas, a Alemanha, principal palco dos conflitos, na Bomia, atual Repblica Checa, a Sucia e a Polnia. Dentro desta concepo, o chamado sistema Westfaliano, passou a servir de referncia para guiar as relaes internacionais europias, sobretudo, durante o perodo compreendido entre 1648 e 1789, consolidando o conceito de Estado Nacional, em desenvolvimento, em estgios diferenciados, em Portugal, Espanha, Inglaterra e Frana, vinculado as Monarquias Absolutistas, desde o sculo XV; inaugurando o principio da soberania estatal. J o norte-americano Giovanni Arrighi, autor do celebre O longo sculo XX, recua mais no tempo para demonstrar que as origens das modernas relaes internacionais esto fixadas no sculo XIII; quando teria se iniciado a formao dos sistemas interestatais, a partir da hegemonia genovesa, pautada pela intermediao das trocas comerciais entre Ocidente e Oriente e pelo financiamento das expedies martimas portuguesas; depois substituda pela hegemonia holandesa, garantida pelo controle de feitorias, pontos estratgicos que garantiriam o fluxo comercial.

Ao que teria se seguido hegemonia Britnica, caracterizada pelo controle dos mares, atravs de sua imensa frota naval, exercendo, portanto, domnio sobre os caminhos por onde transitavam as mercadorias. O que foi superado pela hegemonia dos Estados Unidos da Amrica e seu controle sobre o transito de capital, apoiado, sobretudo, no poder de persuaso de seu arsenal blico; a despeito de, j na dcada de 1970, data original da publicao, Arrigui defender a idia de que a China estaria iniciando sua ascenso como nova potencia hegemnica a partir do sinal denotado pela derrota norte-americana na Guerra do Vietn, marcando uma nova fase de reajuste do sistema capitalista. Destarte, seja qual for o marco escolhido como referencial, para compreender a configurao das relaes internacionais contemporneas, fundamental estudar o significado do Congresso de Viena e suas implicaes; sendo, antes, necessrio, recuar at seus antecedentes.

A Paz de Westflia. A paz de Westflia consolidou o conceito de Estado Nacional, em desenvolvimento, em estgios diferenciados, em Portugal, Espanha, Inglaterra e Frana, vinculado as Monarquias Absolutistas, desde o sculo XV, inaugurando o principio da soberania estatal.

Tamanha a importncia deste fato que, muitos autores, preferem, erroneamente, delimitar o surgimento do moderno sistema internacional a partir de Westflia. Esquecendo-se que a complexidade que passaria a envolver as relaes internacionais, aps 1648, encontra suas razes na formao dos Estados Nacionais Absolutistas e na abertura de novos mercados consumidores, representada, sobretudo, pelos descobrimentos e colonizaes quinhentistas. Outra conseqncia marcante foi redefinio das fronteiras polticas da Europa, alterando o equilbrio do poder e criando uma disputa pela hegemonia mundial, envolvendo, primeiro, as guerras Anglo-Holandesas, e, depois, estendendo-se at o perodo napolenico, com a disputa entre Inglaterra e Frana pela liderana europia. Alm claro, do acirramento do antagonismo religioso entre catlicos e protestantes, depois do reconhecimento legal do calvinismo, cuja prerrogativa de liberdade de adoo como religio oficial passou a ser permitida aos governantes dos Estados germnicos. Na realidade, observado pelo prisma da longussima durao braudeliana, o sistema Westfaliano representou o surgimento de novas potncias, constituindo a base para rivalidades que desintegrariam qualquer possibilidade de unio entre os Estados Europeus, culminando, posteriormente, com as guerras napolenicas e a primeira e segunda guerra mundial.

O estabelecimento da Paz de Westflia. Em 1648, a vasta regio da Alemanha de Westfalen, entre os rios Reno e Weser, compreendendo 22.000 km e com uma populao entre 4 e 8 milhes de habitantes, volta das cidades de Dortmund, Mnster, Bielefeld, e Osnabrck; terminou emprestando seu nome a uma srie de tratados que puseram fim a Guerra dos Oitenta Anos e a Guerra dos Trinta Anos, assinalando a chamada Paz de Westflia.

Aps o inicio das conversaes entre as diversas naes envolvidas nos conflitos, conduzidas ao longo de trs anos, diante da recusa de catlicos e protestantes de reunirem-se na mesma cidade, por sugesto da Sucia, foram escolhidas as cidades de Mnster e Osnabrck para sediar as negociaes de paz, opondo-se a sugesto francesa de utilizar as cidades de Hamburgo e Colnia. Todo o processo de negociao manteve os lideres catlicos e protestantes separados, enquanto os primeiros ficaram sediados em Mnster, os protestantes estabeleceram sua sede em Osnabrck. O Tratado Hispano-Holands, pondo fim Guerra dos Oitenta Anos, foi assinado no dia 30 de janeiro de 1648, em Mnster, por meio do qual a independncia da Holanda foi reconhecida; j a Guerra dos Trinta Anos, foi oficialmente encerrada atravs do tratado de Osnabrck, assinado em 24 de outubro do mesmo ano, entre Fernando III, Sacro Imperador Romano-Germnico, os prncipes alemes, a Frana e a Sucia. Os tratados estabelecidos foram reunidos no Ato Geral de Westflia, em Mnster, tambm em 24 de outubro de 1648, ratificando as clusulas do Tratado de Augsburgo de 25 de setembro de 1555, reconhecendo o calvinismo, garantindo aos protestantes e catlicos a liberdade de culto e redesenhando as fronteiras polticas da Europa, alterando o equilbrio do poder. A despeito do sistema Westfaliano s passar a vigorar depois do acordo de paz entre Frana e Espanha, por meio do Tratado dos Pirineus, assinado em 1659.

As conseqncias do surgimento do sistema Westfaliano. A paz de Westflia condenou a Espanha a perder seu papel como potncia hegemnica a rivalizar com a Inglaterra, dissolvendo o poder dos Habsburgo, representado pelo Sacro Imprio Romano-Germnico.

Por outro lado, fortaleceu a hegemonia inglesa na Europa, fazendo a Frana e a Holanda surgirem como novas rivais dos ingleses, a primeira como potencia terrestre e a ltima como poder naval, ambas disputando a supremacia no cenrio colonial; criando uma potncia menor, a Sucia. Alm disto, reduziu a relevncia dos Estados alemes perante o equilbrio do poder na Europa, uma vez que, saindo derrotada, ao lado da Espanha, a Alemanha foi arruinada e devastada pela Guerra dos Trinta Anos, fragmentada em mais de 350 Estados independentes, atrasando a criao de um genuno Estado Nacional alemo at o sculo XIX, visto que seus principados sofreram graves danos causados pelas pilhagens realizadas pelos soldados mercenrios suecos e pelas tropas francesas. Deve-se ressaltar que era uma prtica comum, poca, a manuteno das tropas invasoras, com suprimentos e demais recursos necessrios, atravs de uma estratgia predatria que conduzia destruio completa de comunidades.

Estima-se que, durante a Guerra dos Trinta Anos, a populao da Alemanha tenha cado, em linhas gerais, mais de 20%; chegando a declinar em 50% em algumas regies; culminando com a dissoluo de vilas inteiras em certos locais. Os tratados de paz, aps 1648, terminaram possibilitando a incorporao de Metz, Toul, Verdun e da Alscia pela Frana, esta ltima, posteriormente, palco de disputas entre franceses e alemes na primeira e segunda guerras mundiais. A Sucia recebeu a Pomernia Ocidental, alm de Bremen e Stettin, ganhando o controle da desembocadura dos rios Oder, Elba e Weser. A despeito de no ter sido signatria da Paz de Westflia, a independncia da Sua foi reconhecida, emergindo como Estado neutro em uma Europa dividida pela disputa entre

Frana, Holanda e Inglaterra. Na realidade, a Europa havia tomado a forma de malha fina de interesses, com a transferncia de direitos soberanos de Estados Nacionais para instituies supranacionais europias.

A falncia do sistema Westfaliano. Diante da redefinio das fronteiras europias, a Frana, em pleno processo de consolidao tardia de seu Estado Nacional; tardia, devido, sobretudo, a questes internas, envolvendo disputas pelo trono; iniciou uma poltica voltada a galgar uma posio de destaque entre as Naes da Europa, pelas mos do cardeal Richelieu.

Ministro do rei da Frana, Lus XIII, o cardeal Richelieu organizou um forte aparelho burocrtico, responsvel pelo arrecadamento de impostos, possibilitando a manuteno de um poderoso exrcito e de um absolutismo cercado de luxo e ostentao; culminado com o pice do Antigo Regime, representado pela fabricao da imagem pblica de Lus XIV (1661-1715), transformando o rei em uma criatura dotada de poderes divinos. A despeito da ostentao, a continuidade da poltica de Richelieu pelo cardeal Mazzarino, manteve a Frana caracteristicamente agrria, opondo-se ao processo de industrializao ingls; arrecadando impostos insuficientes para manter o imenso aparelho burocrtico, o luxo da corte sediada no Palcio de Versalhes e o numeroso exrcito francs; criando uma situao insustentvel de dficit publico, agravada aps a morte de Lus XIV. O novo rei, Lus XVI, enfrentou a formao de um cenrio nada favorvel ao Antigo Regime que se espalhou pela Europa, ameaando a existncia das monarquias absolutistas. A Revoluo Francesa inaugurou uma nova ordem social, abolindo os direitos feudais, suprimindo as antigas ordens e privilgios, proclamando a igualdade civil, embora tenha mantido a escravido nas colnias, influenciando levantes e revolues na Europa e na Amrica, criando relaes conflituosas entre a Frana e os paises monarquistas.

A situao terminou se agravando com a subida de Napoleo ao poder, no chamado golpe Dezoito Brumrio, quando, temerosos com os rumos da revoluo, a alta burguesia colocou o jovem general frente da nao.

Napoleo percorreu um longo caminho, expandindo os ideais revolucionrios pela fora das armas, enfrentando a oposio de varias coalizes, tornando-se na prtica um monarca constitucional ao autoproclamar-se Imperador, at ser derrotado por sua prpria estratgia. O bloqueio continental imposto por Napoleo mostrou-se desastroso para a Europa, privou os paises submetidos ao domnio francs do escoamento da produo manufaturada para o Novo Mundo, bem como impediu o acesso a matria-prima das Amricas, cerceado pela poderosa frota naval inglesa, inaugurando a hegemonia britnica, garantida pelo controle do fluxo naval. A crise econmica, provocada pelo bloqueio, obrigou o Estado francs a aumentar abusivamente os impostos e obrigaes, inclusive seqestrando bens, para manter o exrcito e seu aparelho burocrtico, gerando inmeras revoltas contra os desmandos do governo imperial; culminando com o fim da aliana entre franceses e russos, em uma tentativa da Rssia de recuperar sua economia. Neste meio tempo, a Inglaterra, ao invs de ter sido prejudicada pelo bloqueio, s colhia benefcios.

Enfraquecida, em 1792, a Frana terminou vencida por uma coalizo da Rssia, Inglaterra e Prssia; a qual derrotou Napoleo em Leipzig, avanando at Paris, onde Napoleo foi deposto, sendo recolocada no trono a dinastia dos Bourbon, quando Lus XVIII, irmo de Lus XVI, foi empossado e obrigado a aceitar o tratado de Paris. Napoleo Bonaparte foi exilado na ilha de Elba, de onde fugiu em 1815, tentando retomar o poder em um governo de 100 dias, somente para ser novamente derrotado em Waterloo, na Blgica, sendo, posteriormente, aprisionado na ilha de Santa Helena, onde morreria em 1821. Lus XVIII restaurou os privilgios do clero e da nobreza, mas foi obrigado a aceitar alguns avanos implantados pela Revoluo Francesa. A Inglaterra emergiu como a grande potencia hegemnica mundial, passando a controlar o comercio colonial, compartilhando o equilbrio do poder na Europa com a Rssia, Prssia e ustria; consolidando seu papel no cenrio internacional atravs de sua participao no Congresso de Viena, em 1815. Este ltimo simboliza a restaurao do sistema absolutista, antagonicamente, marcando o inicio de um perodo que se estendeu at 1878, caracterizado por uma onda revolucionria na Amrica Latina que conduziu ao surgimento de novos Estados Nacionais independentes de suas antigas metrpoles.

Ao mesmo tempo, levantes revolucionrios comearam a surgir na Europa, modernizando diversas naes, conduzindo ao surgimento dos nacionalismos responsveis pela unificao da Itlia e Alemanha. A Inglaterra esteve por trs de boa parte destes movimentos, especialmente nas colnias, atendendo aos interesses do liberalismo econmico suscitado pela Revoluo Industrial. Os ingleses inauguraram uma nova fase nas relaes internacionais que levou o mundo ao imperialismo e a disputa pela posse de territrios na frica e sia. A ideologia do nacionalismo e as prerrogativas imperialistas, por sua vez, despertaram as lutas anticoloniais dos africanos e asiticos, alm das razes da primeira e segunda guerras mundiais, com a formao do moderno sistema de relaes internacionais.

O concerto europeu: os termos do Congresso de Viena. O fim do Imprio Napolenico iniciou um movimento contra-revolucionrio, em meio a pretenses hegemnicas, envolvendo, sobretudo, as naes que haviam participado da coalizo que havia derrotado os franceses, nomeadamente Inglaterra, Rssia, Prssia e ustria.

Uma conseqncia direta das relaes internacionais desenvolvidas ao longo do sculo XVIII, as quais marcaram a falncia da paz de Westflia.. Precedida pelos Tratados de Paris, imposto a Luis XVIII e Tratados Coloniais entre Inglaterra e Holanda; sob pretexto de resolver as questes emergenciais do ps-guerra e decidir um novo arranjo de poder que nortearia as relaes internacionais a partir de ento; representantes das naes europias decidiram se reunir em Viena, em setembro de 1814, compondo o Congresso de Viena, o qual duraria at junho de 1815. As potencias envolvidas nos debates fizeram-se presentes representadas diretamente pelos seus mandatrios e principais ministros, haja vista a imensa importncia dos interesses envolvidos. Reunidos no Pacto da Santa Aliana, a Rssia, ustria, Prssia, Espanha e Portugal, unidos em torno do carter conservador do regime monrquico, pressionaram o

congresso a reimplantar o absolutismo, assumindo o compromisso de intervir em caso de avano dos ideais revolucionrios, o que na prtica representava uma tentativa de manuteno das colnias portuguesas e espanholas nas Amricas.

Enxergando uma limitao nas suas pretenses polticas e econmicas junto s zonas produtoras de matria-prima, potenciais consumidoras de produtos manufaturados, a Gr-Bretanha exerceu presso contrria restaurao do Antigo Regime, propondo o Pacto da Qudrupla Aliana, impondo, por sugesto francesa, o principio da legitimidade, por meio do qual cada potencia deveria voltar a possuir os mesmos limites que tivera antes de 1789. O mapa da Europa e da Amrica terminou sendo redesenhado, forjando um equilbrio entre as principais potencias europias, consagrando, pela primeira vez, um entendimento entre as naes em favor da manuteno da paz, traando diretrizes para criar um clima de estabilidade a partir de uma gesto compartilhada, negociada pelos diplomatas, visando evitar novas guerras. Neste sentido, na viso de muitos autores, o Congresso de Viena representou o amadurecimento das relaes internacionais praticadas pelas potencias europias, iniciadas com a criao do sistema Westfaliano, criando uma unidade orgnica, uma cultura comum com princpios especficos que passaram a caracterizar um sistema de relaes regidas pela racionalidade, da, inclusive, o emprego do termo concerto entre as naes.

O congresso terminou por constituir dois grandes grupos hegemnicos: de um lado as potencias liberais, agregando Gr-Bretanha e Frana; e de outro as potencias conservadoras, compondo Rssia, Prssia e ustria.

Consagrando uma harmonia nem sempre unitria, com histrico de divergncias e

decises ora pendendo a um ou outro lado, embora mantendo a ordem mundial precariamente entre 1815 e 1848, terminando por permitir a independncia dos paises da Amrica Latina e a sobrevivncia de monarquias constitucionais. No final, os interesses britnicos acabaram prevalecendo; mesmo durante o perodo de concerto entre as naes, movimentos de ordem liberal haviam sido registrados em paises conservadores, a despeito de reprimidos com sucesso; semeando o liberalismo, germinado pelo mercantilismo, fomentando o crescimento de uma economia globalizada a partir da dcada de 1840 e a substituio do poder compartilhado pela Pax Britannica.

Para saber sobre o assunto. ARRIGUI, Giovanni. O longo sculo XX. So Paulo: Unesp, 1996. JACKSON, Robert & SORENSEN, Georg. Introduo s relaes internacionais. Rio de Janeiro: Zahar, 2007. LESSA, Antnio Carlos. Histria das Relaes Internacionais. Petrpolis: Vozes, 2005. KENNEDY, Paul. Ascenso e queda das grandes potncias. Rio de Janeiro: Elsevier, 1989 RAMOS, Fbio Pestana. No tempo das especiarias: o imprio da pimenta e do acar. So Paulo: Contexto, 2004. SARAIVA, Jos Flvio Sombra (org.). Histria das Relaes Internacionais Contemporneas. So Paulo: Saraiva, 2007. WALTZ, Kenneth N. Teoria das Relaes Internacionais. Lisboa: Gradiva, 2002.

Texto: Prof. Dr. Fbio Pestana Ramos.