O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

9
O TRABALHO INFANTIL NUM AMBIENTE DE MODELAGEM MATEMÁTICA Paulo Henrique Gomes Santana UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA-UEFS [email protected] Lísian Caroline Lima Alves UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA-UEFS [email protected] Resumo: O presente trabalho, o qual aborda uma experiência com Modelagem Matemática, embasado nas concepções de Barbosa (2001), realizado junto a um colégio da rede estadual, na cidade de Feira de Santana – Bahia. Esta atividade aconteceu no dia 15 de junho de 2010, em uma turma de 1° ano do ensino médio. O objetivo deste trabalho foi evidenciar a importância da aplicação da Modelagem Matemática, através de uma atividade contextualizada sobre funções ao qual estimulamos aos alunos a indagarem e questionarem conteúdos matemáticos em situações oriundas de outras áreas da realidade. Palavras-chave: Modelagem Matemática; Ensino-aprendizagem; Trabalho Infantil; Função. INTRODUÇÃO Este relato discorre sobre a realização de uma experiência com Modelagem Matemática em um colégio da rede estadual de ensino de Feira de Santana – BA. A iniciativa decorreu de uma professora que ministrava a disciplina Instrumentalização para o Ensino da Matemática 02, que tinha como objeto de estudo o ensino de funções. A referida professora nos propôs a aplicação de uma atividade contextualizada sobre o ensino de funções. Optamos por usar a Modelagem Matemática, pois esta é uma alternativa metodológica que aproxima os conteúdos matemáticos às atividades cotidianas dos alunos, buscando assim, harmonizá-los com as diretrizes que norteiam a educação básica hodierna apresentadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM, 2000). Conforme BASSANEZI, (2002, p.38):

Transcript of O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

Page 1: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

O TRABALHO INFANTIL NUM AMBIENTE DE MODELAGEM

MATEMÁTICA

Paulo Henrique Gomes Santana UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA-UEFS

[email protected]

Lísian Caroline Lima Alves UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA-UEFS

[email protected]

Resumo: O presente trabalho, o qual aborda uma experiência com Modelagem

Matemática, embasado nas concepções de Barbosa (2001), realizado junto a um colégio da

rede estadual, na cidade de Feira de Santana – Bahia. Esta atividade aconteceu no dia 15 de

junho de 2010, em uma turma de 1° ano do ensino médio. O objetivo deste trabalho foi

evidenciar a importância da aplicação da Modelagem Matemática, através de uma

atividade contextualizada sobre funções ao qual estimulamos aos alunos a indagarem e

questionarem conteúdos matemáticos em situações oriundas de outras áreas da realidade.

Palavras-chave: Modelagem Matemática; Ensino-aprendizagem; Trabalho Infantil;

Função.

INTRODUÇÃO

Este relato discorre sobre a realização de uma experiência com Modelagem

Matemática em um colégio da rede estadual de ensino de Feira de Santana – BA. A

iniciativa decorreu de uma professora que ministrava a disciplina Instrumentalização para

o Ensino da Matemática 02, que tinha como objeto de estudo o ensino de funções. A

referida professora nos propôs a aplicação de uma atividade contextualizada sobre o ensino

de funções. Optamos por usar a Modelagem Matemática, pois esta é uma alternativa

metodológica que aproxima os conteúdos matemáticos às atividades cotidianas dos alunos,

buscando assim, harmonizá-los com as diretrizes que norteiam a educação básica hodierna

apresentadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM,

2000). Conforme BASSANEZI, (2002, p.38):

Page 2: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

A modelagem no Ensino é apenas uma estratégia de aprendizagem,

onde o mais importante não é chegar imediatamente a um modelo

bem sucedido, mas caminhar seguindo etapas onde o conteúdo

matemático vai sendo sistematizado e aplicado. Com a modelagem

o processo de ensino- aprendizagem não mais se dá no sentido

único do professor para o aluno, mas como resultado da interação

do aluno com seu ambiente natural.

Existem inúmeras definições para Modelagem matemática. Para Barbosa (2004,

p.4), “a Modelagem é um ambiente de aprendizagem no qual os alunos são convidados a

problematizar e investigar por meio da matemática, com referências na realidade”.

Segundo Burak (2004), “Modelagem Matemática é uma alternativa metodológica para o

ensino da matemática”. Bassanezi (2002, p.16), afirma que “a Modelagem Matemática

consiste na arte de transformar problemas da realidade em problemas matemáticos e

resolvê-los, interpretando suas soluções na linguagem do mundo real”.

Compactuamos com as idéias apresentadas por Barbosa, à proporção que o

ambiente de modelagem está associado à problematização e investigação, onde ambas são

essenciais, no processo envolvimento dos alunos para abordar a atividade proposta. A

primeira é o ato de questionar e perguntar e a segunda é uma reflexão e manipulação da

informação dada. Estas investigações nos levam a atingir o conhecimento reflexivo.

O objetivo foi mostrar aos alunos outra perspectiva do ensino da matemática bem

como desenvolver um pensamento mais crítico e reflexivo, pois em geral, eles estão

acostumados a aulas mecânicas com simples reproduções de exercícios.

Retiramos a atividade do ambiente virtual “Colaboração Online em Modelagem

Matemática” (COMMA), que tem por tema “A erradicação do trabalho infantil” que foi

elaborada pelo professor Carlos Henrique Carneiro, já que o Trabalho infantil é um

assunto que envolve a realidade da sociedade em que vivemos, além de ser um tema pouco

discutido no meio escolar. Criamos um ambiente de modelagem no qual os alunos foram

convidados a questionar, por meio da matemática, situações oriundas de outras áreas do

conhecimento. Relata Freire (1997): “[...] o que o professor deveria ensinar [...] seria, antes

de tudo, ensinar a perguntar. Porque o início do conhecimento, repito, é perguntar. E

somente a partir de perguntas é que se deve sair em busca de respostas.”

RELATO

Page 3: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

O convite foi feito para a turma através da leitura interativa da cartilha do

Ministério do Trabalho do Governo do Estado, que esclarece os malefícios do trabalho

infantil tanto para as crianças como para toda sociedade, para complementar planejamos

passar um vídeo sobre o assunto, contudo houve um imprevisto com o equipamento e não

deu para utilizar esse recurso, nada que impedisse de realizar a atividade com sucesso, o

que seria apresentado pelo vídeo foi exposto pelo grupo.

A questão principal proposta para os alunos era constatar se o Brasil em 2015

atingirá a meta de erradicação do trabalho infantil, conforme proposto pela Organização

Internacional de Luta contra o Trabalho Infantil (OIT).

Após distribuirmos a atividade proposta (duas por equipe), fizemos uma leitura

detalhada, explicando o que cada questão queria, questionando aos alunos sobre os

conceitos presentes nela.

A atividade possui cinco questões e um quadro informativo que apresenta

informações sobre o número de crianças entre cinco e dezessete anos que estavam

vinculadas ao trabalho infantil. Os dados são da pesquisa de amostra de domicílios

realizada pelo IBGE.

Na primeira questão, solicitamos aos alunos, qual o ano zeraria o número de

crianças trabalhadoras, perguntando-os: “O que acontece com o número de crianças que

trabalham nos anos de 2006 e 2007? Qual o maior número de crianças, 2006 ou 2007?”

Eles responderam que houve uma diminuição entre esses anos, indagamos então, de quanto

seria essa diferença, orientando a utilizar esse resultado encontrado (0,3 milhões) para

responderem a questão. A partir do nosso direcionamento, foram calculando e chegaram ao

resultado que o número de criança que trabalham zeraria no ano de 2023.

Na segunda questão, que pedia para representar algebricamente a variação do

número de crianças que trabalham em função do tempo, perguntamos aos alunos o que

seria uma expressão algébrica, ouve no primeiro momento um silêncio, e depois de alguns

segundos alguns alunos disseram: “São expressões que possui uma parte numérica e outra

algébrica.”

Na terceira questão que solicitava para representar graficamente a variação de

crianças que trabalhavam em função do tempo, deixamos a critério dos alunos, para utilizar

gráficos de barra, de linha, dentre outros que eles conheciam.

Page 4: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

Na quarta questão solicitava, qual deveria ser a diminuição anual do número

quantitativo de crianças que trabalham, para que em 2015 se atinja a meta proposta pela

OIT, só que pela falta de tempo essa questão não foi feita pelos alunos.

Na quinta questão como solicitava uma opinião pessoal, quando perguntava se os

alunos concordavam se o número de crianças atingiria o valor zero em 2015, eles disseram

que considerando os dados da atividade, matematicamente o trabalho infantil não acabaria,

contudo afirmaram que se todos nós quisermos na vida real o trabalho infantil poderia

acabar em 2015.

Após todos os grupos terminarem a atividade, convidamos os alunos para

apresentarem os resultados encontrados, alguns grupos se recusaram a participar, assim

para não haver constrangimentos e para dar tempo de discutir todas as questões decidimos

que cada questão seria apresentada por grupos voluntários.

Na hora de socializar o mais difícil foi conseguir a atenção de todos os alunos,

porém mesmo com todas as conversas paralelas conseguimos discutir todas as questões,

apesar de nem todos os grupos irem ao quadro para responder a atividade, percebemos que

os resultados encontrados foram semelhantes.

Antes da aplicação estávamos muitos ansiosos e nervosos imaginando como seria o

desenvolvimento da mesma, esperando que desse tudo certo. Não sabíamos o que estava

nos esperando, era uma zona totalmente de risco.

Talvez se fossemos professor regular dos alunos não estaríamos dessa maneira,

pois já conheceríamos os alunos, contudo no nosso caso era diferente, não sabíamos quem

era os alunos, assim surgirão várias dúvidas: “será que eles vão aceitar o convite? Será que

vai dá certo? Será que vamos conseguir fazer o que planejamos? Os alunos vão fazer

perguntas que a gente não sabe responder?” foram inúmeras dúvidas que nós tínhamos.

O que mais nos deixou inseguros no início da aplicação da atividade foi ficarmos

sozinho com os alunos, pois o professor apenas nos apresentou e saiu da sala deixando-nos

tomando conta da turma. Apesar de todas as dúvidas e incertezas os alunos nos receberam

muito bem e no decorre da aplicação nos tornamos cada vez mais próximos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Page 5: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

No decorrer dessa experiência, apesar de ser vivenciada em curto espaço de tempo,

observamos que a prática de estratégias pedagógicas como a Modelagem Matemática,

promove um entendimento melhor dos conteúdos por partes dos alunos, contribuindo para

o processo de ensino-aprendizagem e incentivam as interações entre os alunos-alunos e

alunos- professores.

Barbosa (2001) diz que “A maneira de organizar as atividades depende do contexto

escolar, da experiência do professor, dos interesses dos alunos e de outros fatores.” (p. 38).

Assim tentamos criar um ambiente de modelagem matemática, onde os alunos foram

instigados a investigar em uma situação do cotidiano os conteúdos matemáticos,

mostrando-lhes que estudar matemática pode ir além dos livros didáticos e dos exercícios

maçantes.

Proporcionando uma nova estratégia do conhecimento para os alunos, pudemos

verificar a aplicabilidade da teoria aprendida nas salas da Universidade na prática escolar e

verificar que como futuros docentes podemos mudar a realidade do ensino da matemática e

desmistificar a idéia dos discentes que a matemática é difícil e inacessível, basta apenas

ousar.

Page 6: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

REFERÊNCIAS

BARBOSA, J. C. Modelagem na Educação Matemática: Uma perspectiva. In: Encontro Paranaense de Modelagem em Educação Matemática, 1., 2004, Londrina. Anais.

Londrina: UEL, 2004. 1 CD-ROM

BARBOSA, J. C. Modelagem Matemática: O que é? Por quê? Como? Veritati, n. 4, p.

73-80, 2004.

BARBOSA, J. C. Modelagem na Educação Matemática: contribuições para o debate

teórico. In: Reunião Anual da ANPED, 24., 2001, Caxambu, Anais... Rio Janeiro:

ANDEP, 2001. 1 CD-ROM.

BASSANEZI, Rodney Carlos. Ensino – Aprendizagem com Modelagem Matemática.

São Paulo: Contexto, 2002.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais Ensino Médio. Disponível em:

< http://portal.mec.org.br/arquivo/pdf/blegais >. Acesso em 10 de março de 2011.

BURAK, Dionísio. Modelagem Matemática e a sala de aula. In: Encontro Paranaense de Modelagem em Educação Matemática, 1.,2004,Londrina.Anais. Londrina: UEL, 2004. 1

CD-ROM.

COMMA. Colaboração online em Modelagem Matemática. Acedido em: 09 de junho

de 2010, em: http://argo.uefs.br/comma/pask.do?op=view&id=8.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática Educativa. São

Paulo: Ed. Paz e Terra, 1997.

Page 7: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

ANEXOS

SITUAÇÃO-PROBLEMA

Tema: Trabalho Infantil

Page 8: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática

Situação-problema

A tabela abaixo apresenta informações sobre o número de crianças entre 5 e 17 anos que estavam

vinculadas ao trabalho infantil. Os dados são da pesquisa de amostra de domicílios realizada pelo

IBGE. Observe os dados da pesquisa:

TABELA I: Número de crianças que trabalhavam

Tempo ( anos) Quantitativo Percentual (%)

2003 5,1 milhões 11,5

2004 5,2 milhões 11,8

2005* - -

2006 5,1 milhões 11,5

2007 4,8 milhões 10,8

* Ano que não foi contabilizado

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

A Organização internacional de luta contra o trabalho infantil (OIT) propõe uma meta de até

2015 para que ocorra a erradicação do trabalho infantil em todo o mundo. Será que o Brasil atingirá

mesmo essa meta? Para responder a essa pergunta sugerimos algumas questões iniciais.

1. Considerando constante, a diminuição do número de crianças que trabalham entre os anos de

2006 para 2007, em que ano o número de crianças que trabalham atingirá o valor zero?

2. Como podemos representar algebricamente a variação do número de crianças de trabalham em

função do tempo?

3. E graficamente como podemos representar essa variação? O que podemos prever a partir do

gráfico sobre o número de crianças que trabalham?

4. Qual deverá ser a diminuição anual do número quantitativo de crianças que trabalham, para que

em 2015 se atinja a meta proposta pela OIT?

5. Você concorda que o número de crianças que trabalham atingirá o valor zero em 2015? Por

quê?

Page 9: O trabalho infantil num ambiente de modelagem matemática