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O TRATAMENTO DADO À HETEROGENEIDADE DAS APRENDIZAGENS NO CICLO DE ALFABETIZAÇÃO: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS As pesquisas que integram esse painel têm como eixo norteador o aspecto da heterogeneidade e recorreram à análise de conteúdo temática para a discussão dos dados, Bardin (1977). O primeiro estudo investigou, a partir de trabalhos aceitos e publicados no II Congresso Brasileiro de Alfabetização, pesquisas que estiveram determinadas a investigar práticas e processos de ensino pautados na perspectiva do atendimento à heterogeneidade nas aulas e materiais didáticos de alfabetização, voltados aos anos iniciais do ensino fundamental. Os resultados evidenciaram a presença de comunicações específicas do tratamento, por docentes, da heterogeneidade de conhecimentos da escrita alfabética pelos aprendizes. Por outro lado, pôde ser identificada a escassez de estudos sobre o tratamento da heterogeneidade em contextos de salas de aula multisseriadas, próprias da educação do campo. A segunda pesquisa analisou as práticas de duas professoras do 1º ano do Ensino Fundamental da rede municipal de ensino da cidade de Caruaru-PE que realizavam atividades diferenciadas com vistas a atender à heterogeneidade de conhecimentos sobre a leitura e a escrita. Embora a pesquisa tenha evidenciado a proposição de atividades diversificadas; apontou, ainda, a explícita dificuldade em atender, de forma minuciosa, àqueles alunos com dificuldades. O último estudo se propôs a analisar o tratamento diversificado do erro no 1º ciclo do ensino fundamental. Os resultados apontaram para uma predominância de correções nos grupos e/ou no coletivo da sala de aula, ao se comparar com as intervenções individuais. Essa alternativa adotada pelas professoras ora se relacionava à otimização do tempo da aula, de modo a dar conta de todos os alunos ao mesmo tempo; ora se vinculava ao objetivo de refletir acerca de uma dúvida que poderia ser a mesma de outros alunos. Palavras-Chave: Ensino, Aprendizagem, Heterogeneidade XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 3158 ISSN 2177-336X

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O TRATAMENTO DADO À HETEROGENEIDADE DAS

APRENDIZAGENS NO CICLO DE ALFABETIZAÇÃO: CONCEPÇÕES E

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

As pesquisas que integram esse painel têm como eixo norteador o aspecto da

heterogeneidade e recorreram à análise de conteúdo temática para a discussão dos

dados, Bardin (1977). O primeiro estudo investigou, a partir de trabalhos aceitos e

publicados no II Congresso Brasileiro de Alfabetização, pesquisas que estiveram

determinadas a investigar práticas e processos de ensino pautados na perspectiva do

atendimento à heterogeneidade nas aulas e materiais didáticos de alfabetização, voltados

aos anos iniciais do ensino fundamental. Os resultados evidenciaram a presença de

comunicações específicas do tratamento, por docentes, da heterogeneidade de

conhecimentos da escrita alfabética pelos aprendizes. Por outro lado, pôde ser

identificada a escassez de estudos sobre o tratamento da heterogeneidade em contextos

de salas de aula multisseriadas, próprias da educação do campo. A segunda pesquisa

analisou as práticas de duas professoras do 1º ano do Ensino Fundamental da rede

municipal de ensino da cidade de Caruaru-PE que realizavam atividades diferenciadas

com vistas a atender à heterogeneidade de conhecimentos sobre a leitura e a escrita.

Embora a pesquisa tenha evidenciado a proposição de atividades diversificadas;

apontou, ainda, a explícita dificuldade em atender, de forma minuciosa, àqueles alunos

com dificuldades. O último estudo se propôs a analisar o tratamento diversificado do

erro no 1º ciclo do ensino fundamental. Os resultados apontaram para uma

predominância de correções nos grupos e/ou no coletivo da sala de aula, ao se comparar

com as intervenções individuais. Essa alternativa adotada pelas professoras ora se

relacionava à otimização do tempo da aula, de modo a dar conta de todos os alunos ao

mesmo tempo; ora se vinculava ao objetivo de refletir acerca de uma dúvida que poderia

ser a mesma de outros alunos.

Palavras-Chave: Ensino, Aprendizagem, Heterogeneidade

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3158ISSN 2177-336X

O USO DE ATIVIDADES DIVERSIFICADAS COMO UMA PRÁTICA DE

ATENDIMENTO À HETEROGENEIDADE DE CONHECIMENTOS

Ms. Nayanne Nayara Torres da Silva – UFPE

Dr. Alexsandro da Silva – UFPE/CAA

RESUMO

O presente trabalho analisa as práticas de duas professoras do 1º ano do Ensino

Fundamental da rede municipal de ensino da cidade de Caruaru-PE que realizavam

atividades diferenciadas com vistas a atender a heterogeneidade de conhecimentos sobre

a leitura e a escrita do seu grupo-classe. Trata-se de parte dos resultados de um estudo

maior que teve como objetivo compreender como professores do 1º ano do Ensino

Fundamental concebiam e praticavam o ensino de alfabetização em relação ao

atendimento à heterogeneidade de conhecimentos dos alunos sobre a escrita e a leitura.

Para isso, trazemos uma discussão teórica que versa sobre as concepções e práticas de

alfabetização, tanto em uma perspectiva “tradicional”, quanto em perspectivas “mais

recentes”, e suas implicações na maneira de tratar a heterogeneidade de conhecimentos

dos aprendizes. Apresentamos, também, algumas reflexões sobre saberes e práticas

docentes, enfocando a maneira de fazer dos professores no cotidiano da sala de aula.

Como caminho teórico-metodológico, adotamos a abordagem qualitativa de pesquisa e

recorremos ao uso de entrevistas semiestruturadas e observações em sala de aula. Os

dados resultantes do uso desses procedimentos foram analisados por meio da análise

temática de conteúdo, com base em Bardin (1977). Como resultados desta investigação,

percebemos que as atividades diversificadas eram utilizadas como um recurso para

atender a heterogeneidade do grupo classe. Para isso, as docentes iam (re)construindo

cotidianamente suas ações com vistas a contemplar as diferentes dificuldades

apresentadas por alguns dos seus aprendizes. Contudo, a presente pesquisa também

evidenciou a dificuldade dessas professoras em desenvolverem, por meio das atividades

diversificadas, um trabalho mais minucioso com as crianças que apresentavam

dificuldades de aprendizagens.

PALAVRAS-CHAVES: Alfabetização; Heterogeneidade; Atividades diversificadas.

1. INTRODUÇÃO

A presente pesquisa inscreve-se no âmbito das discussões sobre saberes e

práticas de professores alfabetizadores, enfocando o atendimento à heterogeneidade de

conhecimentos dos alunos sobre a leitura e a escrita. Nesse sentido, direcionamos a

análise para uma das estratégias que foi utilizada pelas docentes investigadas com vistas

a atender à heterogeneidade de conhecimentos sobre a leitura e a escrita do seu grupo-

classe: as atividades diferenciadas. Desse modo, também procuramos analisar a maneira

como esse trabalho com as atividades diversificadas era desenvolvido em sala de aula

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pelas professoras, tendo em vista que se tratava de um ensino voltado, em certa medida,

para as singularidades dos sujeitos.

No período Colonial e até mesmo no Império, quando a educação no Brasil não

era um direito de todos e não havia a obrigatoriedade de frequência à escola, havia uma

intensa presença do ensino individual (FARIA FILHO; VIDAL, 2000), muitas vezes

realizado em casa ou em espaços inadequados de sala de aula. Nesse modo de ensino, o

preceptor ou professor ensinava cada aluno individualmente, mesmo quando sua classe

era constituída por vários alunos.

Entretanto, essa atenção individual não significava, necessariamente,

atendimento à heterogeneidade, pois constituía, apenas, uma modalidade de ensino, uma

vez que as atividades continuavam padronizadas, e o que se esperava desse aluno,

individualmente, era o mesmo esperado para toda a turma. A modalidade de ensino

voltada para o coletivo, com atividades padronizadas e alunos organizados em séries,

surge, no Brasil, na época da República, com vistas a dar conta da escolarização de

massa e perdura até hoje, de modo geral, nas escolas brasileiras (BATISTA; GALVÃO;

KINKLE, 2002).

É preciso não esquecer, no entanto, que os alunos não aprendem ao mesmo

tempo e da mesma maneira. Os estudos desenvolvidos por Emília Ferreiro e seus

colaboradores, acerca da teoria da psicogênese da língua escrita, evidenciaram que a

apropriação do sistema de escrita alfabética (doravante SEA) acontece de forma

gradativa e evolutiva, sinalizando a existência de diferentes conhecimentos sobre a

escrita em uma mesma turma de alfabetização.

São, portanto, múltiplos os conhecimentos, percursos e níveis de aprendizagem

que se fazem presentes tanto nas turmas de alfabetização, como também em qualquer

outro nível de ensino, tendo o professor o desafio de lidar com esse fenômeno,

elaborando procedimentos de ensino que contemplem tal heterogeneidade. Além disso,

a recente implementação da proposta de ciclos, que, no caso da alfabetização, amplia

para três anos o tempo destinado à apropriação e à consolidação do sistema de escrita

alfabética, tem como um de seus princípios o atendimento à heterogeneidade.

Por acreditarmos que contemplar esses aspectos nas práticas de ensino não

constitui tarefa fácil, desenvolvemos uma pesquisa que visou investigar o uso das

atividades diversificadas por duas professoras do 1º ano do Ensino Fundamental no

atendimento à heterogeneidade de conhecimentos dos alunos sobre a leitura e a escrita.

2. DISCUSSÃO TEÓRICA

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2.1 Concepções e práticas de alfabetização e suas implicações no tratamento da

heterogeneidade de conhecimentos dos aprendizes

Por entendemos que a alfabetização não se processa, via de regra, de forma

espontânea, consideramos necessário o desenvolvimento de um ensino contínuo e

progressivo dos princípios do sistema de escrita alfabética. Para isso, o professor poderá

escolher e (re)construir, dentre os muitos “modelos” de alfabetização, aqueles que

considera mais pertinentes à sua turma e ao contexto no qual atua.

No decorrer da história da alfabetização, dois grandes grupos de métodos

apresentaram-se de maneira hegemônica: os sintéticos (soletração, silabação e método

fônico), que partiam das unidades menores da língua (letra, sílaba ou fonema), e os

analíticos (palavração, sentenciação e método de contos), que iniciavam o processo de

alfabetização a partir da análise das unidades maiores (palavra, frase ou texto)

(CARVALHO, 2008). Embora tivessem pontos de partida diferentes, esses grupos não

se diferenciavam quanto à maneira de perceber a alfabetização, que era vista como um

código a ser memorizado pelos alunos.

Além desses métodos, outro modelo também esteve presente no processo

histórico da alfabetização. Não se tratava, porém, de algo totalmente diferente, mas,

sim, de uma combinação entre os métodos já existentes, a qual ficou conhecida como

método misto ou eclético (analítico-sintéticos ou vice-versa).

Entretanto, é notório que a sucessão de métodos não deixou de tratar a

alfabetização enquanto um código e que as mudanças se davam essencialmente em

relação à unidade linguística a ser priorizada. Com isso, podemos inferir que a maneira

de compreender o processo de alfabetização continuava a mesma.

Isso nos leva a perceber que os métodos tradicionais de alfabetização, ao

considerarem a escrita enquanto um código, acreditavam que a memorização seria

suficiente para o aprendiz se alfabetizar, desconsiderando a necessidade de levá-lo a

compreender o funcionamento da escrita alfabética. Além disso, também não se

considerava, de modo geral, a necessidade de propor atividades diferenciadas que

considerassem os diferentes conhecimentos dos aprendizes. Diante disso, a proposição

de atividades padronizadas, coletivas e com muita repetição bastariam para levar os

alunos, tratados enquanto sujeitos homogêneos, à memorização do código.

Se essa concepção tradicional de ensino não está preocupada com a

heterogeneidade de conhecimentos dos aprendizes, podemos dizer que as concepções

“mais recentes” de alfabetização começaram a abrir espaço para percepção desse

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fenômeno. Foi, sobretudo, a partir da difusão dos estudos da psicogênese da escrita, de

Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999), que o alfabetizando passou a ser percebido em

sua singularidade.

É no início da década de 1980 que a tradição metodológica típica dos métodos

tradicionais começa a ser questionada, pois é a época em que começam a se disseminar

no cenário brasileiro os estudos acima citados. A partir de então, pensar meramente em

métodos de alfabetização passa ser considerado algo tradicional, e, por esse motivo,

inicia-se uma revolução conceitual acerca da alfabetização, sendo o foco da

investigação transferida, conforme esclarece Ferreiro (2001), do “como se ensina” para

o “como se aprende”.

Com essa transferência de foco, o aprendiz vai sendo colocado numa posição de

destaque e as maneiras pelas quais aprende, que são as mais diversas possíveis,

assumem um papel central no processo de alfabetização, uma vez que a aprendizagem

do SEA acontece, conforme evidencia a teoria da Psicogênese, de forma gradativa e

evolutiva. Nessa perspectiva, o professor teria como uma de suas atribuições a atenção

às diferenças entre os alunos, que apresentam diferentes conhecimentos e percursos de

aprendizagem.

Assim, a diferenciação do ensino entra em cena e as práticas voltadas a atender

às necessidades dos aprendizes ganham uma atenção especial. Conforme expõe

Perrenoud (2001), embora o professor enfrente diferentes obstáculos nesse processo de

diferenciação, como a limitação do horário escolar, o número de alunos em cada classe,

as dificuldades para desenvolver atividades de níveis e conteúdos diferentes na sala de

aula, a diferenciação é possível, até porque “nenhum professor, por menos que se

preocupe com a diferenciação, pode oferecer um ensino totalmente uniforme: ele não

tem o mesmo relacionamento com todos os alunos, não intervém com cada um pelos

mesmos motivos, de uma maneira idêntica [...]” (PERRENOUD, 2001, p. 49)i.

2.2 Os saberes e as práticas docentes: as maneiras de fazer no cotidiano da sala de

aula

Em todas as práticas desenvolvidas pelo professor no espaço da sala de aula, são

mobilizados saberes construídos no decorrer do tempo e da carreira profissional

docente, entre os quais se sobressaem aqueles oriundos da experiência. Conforme

esclarece Tardif (2008), tais saberes podem ser oriundos do processo formativo, por

meio das contínuas trocas e interações ocorridas no processo de socialização

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profissional e do trabalho diário, como também da trajetória pré-profissional do

professores.

Os saberes experienciais são, segundo Tardif (2008), provenientes das

experiências dos professores, que são adquiridas por meio de suas práticas cotidianas, e

não se encontram, portanto, definidos nem nos currículos, nem nas instituições de

formação, muito menos sistematizados como teoria e doutrina. É no exercício diário de

sua função, em meio às ações impostas pelos condicionantes do contexto escolar, que

esse saber experiencial vai-se constituindo.

São nas ações cotidianas que os professores traçam as suas estratégias e decidem

as suas práticas de acordo, principalmente, com uma pertinência e coerência que são de

ordem pragmática, buscando contemplar aspectos presentes no dia a dia da sala de aula

(CHARTIER, 2007). Como em tais práticas podem coexistir ações que se relacionem a

perspectivas teóricas diferentes e até mesmo antagônicas, elas (as práticas) podem ser

vistas como incoerentes por aqueles que, a partir de uma visão teórica, se encontram

fora desse ambiente e não compartilham as diferentes tramas nele vivenciadas.

Diante disso, a partir dos saberes da ação o professor estabelecerá a sua maneira

de ensinar ao reinventar e reformular as teorias acadêmicas, as prescrições legais, as

regras - ou seja, “as estratégias” - e utilizá-las conforme suas necessidades, o que

podemos chamar de “táticas”, conforme esclarece Certeau (1994). Tais modificações

fazem parte dos movimentos de inovação didática e pedagógica da prática docente, pois

são os “tateamentos incessantes, as adaptações locais, as modificações provisórias”

(CHARTIER, 2000, p. 164), ou seja, os fazeres ordinários da classe, que podem

conduzir ou não a mudanças nas práticas.

3. METODOLOGIA

Para atender ao objetivo desta pesquisa, que consistiu em analisar as práticas de

professoras do 1º ano do Ensino Fundamental no que se refere ao uso de atividades

diferenciadas com vistas a atender à heterogeneidade de conhecimentos sobre a leitura e

a escrita do seu grupo-classe, pautamo-nos em uma abordagem qualitativa,

considerando algumas características elencadas por André (1995): a ênfase maior no

processo que no produto; o pesquisador como instrumento principal na produção e

análise dos dados; a preocupação maior com os significados; a utilização de dados

descritivos, como também da indução.

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Para isso, selecionamos duas professorasii que atuavam em turmas do 1° ano do

Ensino Fundamental de escolas públicas municipais de Caruaru – PE. Os alunos e as

docentes serão tratadas em nossas análises por nomes fictícios (no caso das professoras,

usaremos os nomes Beatriz e Irene), com vistas a preservarmos as suas identidades.

Quanto à formação e ao tempo de experiência das professoras pesquisadas,

podemos observar similaridades. Ambas tinham formação em Magistério e Pedagogia,

mas Irene estava cursando, à época da pesquisa, o 4º período da graduação. Nenhuma

das duas havia cursado pós-graduação e apresentavam uma experiência considerável

como docentes – Beatriz, 10 (dez) anos e Irene, 15 (quinze) –, como também na área da

alfabetização – 06 (seis) e 10 (dez) anos, respectivamente. As duas docentes

trabalhavam como contratadas na rede de ensino – Beatriz há 07 (sete) anos e Irene há

05 (cinco) – e não lecionavam em outra escola. Beatriz não exercia outra atividade

profissional, mas Irene atuava como artesã, segundo ela, mais como um hobby.

Como procedimentos metodológicos, realizamos observações das práticas de

ensino da professora (dez dias em cada turma), como também entrevistas

semiestruturadas com vistas a analisar e compreender a maneira como esse trabalho

com as atividades diversificadas era desenvolvido em sala de aula pelas professoras.

O tratamento dos dados foi desenvolvido por meio da análise de conteúdo do

tipo temática categorial, envolvendo as etapas sugeridas por Bardin (1977): pré-análise,

análise do material (codificação e categorização da informação) e tratamento dos

resultados, inferência e interpretação.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

A análise das práticas de ambas as professoras evidenciou que a realização de

atividades diversificadas foi um dispositivo utilizado para atender a heterogeneidade do

grupo classe. Contudo, a mobilização desse procedimento restringiu-se a um grupo

pequeno de estudantes. Do total de vinte e quatro (24) alunos da professora Beatriz, o

recurso à atividade diferenciada foi mobilizado com quatro (04) alunos, dos quais dois

(02) apresentavam necessidades educativas especiais. Na turma da professora Irene, que

contava com um quantitativo de trinta e um (31) alunos, as atividades foram

desenvolvidas, apenas, com três (03) aprendizes, tendo um deles necessidades

educativas especiais, segundo diagnóstico da professora. A seguir, discutiremos como

esse trabalho era realizado em sala pelas docentes.

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4.1 O tratamento da heterogeneidade de conhecimentos dos aprendizes sobre a leitura

e a escrita: a realização de atividades diversificadas

O uso das atividades diferenciadas como uma prática de atendimento à

heterogeneidade de conhecimentos dos alunos acontecia, na prática de ambas as

professoras, no interior das situações coletivas de ensino. Entretanto, a professora

Beatriz buscava desenvolver outras estratégias para esse trabalho e, além de realizar

atividades diferenciadas, também adaptava algumas das atividades que estavam sendo

propostas ao coletivo para que alguns aprendizes, com dificuldades de aprendizagem,

pudessem realizá-las. O quadro abaixo evidencia os tipos de atividades desenvolvidas

por essa professora:

Quadro 1 - Atividades desenvolvidas pela professora Beatriz que foram realizadas coletivamente e

atividades diferenciadas ou adaptadas para alguns alunos.

Diante do quadro, podemos perceber que, em algumas ocasiões, as atividades

propostas para alguns alunos foram adaptadas ou suprimidas, em relação à proposta ao

coletivo da sala. Como exemplos desse aspecto, podemos indicar os seguintes: na aula

Aulas Atividades Atividades diferenciadas ou

adaptadas

Alunos

02 Ordenação de palavras em

ordem alfabética (no

caderno).

Leitura e identificação de vogais.

Escrita do nome no caderno.

Dimas.

03 Ordenação de palavras em

ordem alfabética

(mimeografada).

Coordenação motora. Bia.

04 Ordenação de palavras em

ordem alfabética

(mimeografada).

Leitura e identificação de vogais. Dimas, Ciel e Bia.

05 Leitura de palavras;

separação silábica e atividade

do livro.

Identificação de vogais e consoantes;

Complementação de sequência de

números; Escrita do nome.

Dimas, Ciel e Bia.

06 Identificação de palavras que

rimam.

Identificação de imagens que rimam.

Ordenação do alfabeto seguindo a

sequência numérica.

Dimas, Ciel e Bia.

Dimas, Ciel, Bia, e Raul.

07 Ditado; complementação de

palavras.

Formação de palavras com alfabeto

móvel.

Dimas, Ciel e Bia.

08 Contagem de letras e sílabas

em palavras; Reescrita de

palavras; Escrita de palavras

com base na indicação da

quantidade de sílabas.

Contagem de letras em palavras. Ciel.

10 Escrita do alfabeto; Reescrita

de palavras; Escrita de

palavras sinônimas;

Separação silábica.

Reescrita e contagem das letras do

alfabeto.

Escrita do nome próprio.

Dimas e Ciel.

Bia.

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06, a docente adaptou a atividade, entregando imagens, ao invés de palavras; na aula 10,

modificou a tarefa de escrita do alfabeto, colocando as letras para que os alunos

copiassem, assim como suprimiu as demais atividades. Nessas duas aulas a professora

ainda acrescentou outra atividade diferente para esses alunos. Na aula 08, solicitou

apenas a resolução de uma questão da atividade proposta a toda classe.

Com isso, percebemos a tentativa da professora de realizar um trabalho

diferenciado que atendesse às dificuldades desses aprendizes, realizando-o ao mesmo

tempo em que lidava com o coletivo da sala de aula. Segundo Perrenoud (2001), “[...]

para diferenciar é preciso limitar o tempo passado no grande grupo, que em geral não é

muito útil para os alunos em dificuldade.” (p. 45).

No entanto, percebemos que, embora a docente tentasse imprimir essa

diferenciação em sua prática com a realização de atividades diferenciadas ou mesmo

adaptações das tarefas para os alunos mencionados, Beatriz não limitava o tempo de

trabalho com o grande grupo, conforme menciona Perrenoud (2001). Pelo contrário,

percebemos que, em algumas ocasiões, essa diferenciação acontecia em momentos de

“brecha”, ou seja, no interior da situação coletiva, a professora reservava um pequeno

momento para explicar ou atender a esses alunos.

Isso pode ser visualizado na aula 02 (13/08/2013), quando a professora realizou

uma atividade diferenciada com Dimasiii

de leitura e identificação de vogais. Nessa aula,

a docente chamou-o em sua mesa, mostrou as vogais e pediu para que ele as

identificasse; depois solicitou a escrita de seu nome no caderno, para ser feita por ele,

individualmente, em sua carteira, de modo a poder trabalhar com os outros aprendizes.

Com isso, percebemos que houve uma atenção individualizada ao aprendiz e que

a atividade diferenciada serviu de estratégia para mantê-lo ocupado, uma vez que a

educadora precisava trabalhar com os demais alunos. Nessa situação, a atenção maior

recaiu sobre o grande grupo e a atividade direcionada a Dimas intencionou atender as

dificuldades e necessidades desse aprendiz, como também, resolver um problema de

ordem pedagógica: atender esse aluno individualmente e, ao mesmo tempo, o restante

da classe.

Esse tipo de prática, em que a docente realizava o atendimento diferenciado, por

meio das atividades, no interior de situações coletivas, também era desenvolvido pela

professora Irene. Observamos que a docente se preocupava em atender as dificuldades

de dois alunos em especial e com eles sempre desenvolvia uma atividade diferente da

que o grande grupo estava realizando, conforme apresentado no quadro a seguir:

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Quadro 2 – Atividades desenvolvidas pela professora Irene que foram realizadas coletivamente e

atividades diferenciadas para alguns alunos.

As atividades diferenciadas que foram propostas a esses alunos não se

relacionavam com as atividades que o restante da turma realizava. Isso não garantia,

portanto, a participação desses alunos no que estava sendo proposto ao grande grupo.

Além disso, a professora inicialmente atendia ao coletivo para, posteriormente, propor a

atividade diferenciada. Sendo assim, o tempo destinado a atender esses educandos era

relativamente menor, em relação ao grande grupo, e ocorria em momentos pontuais,

quando a docente entregava a atividade ou quando esses alunos com dificuldades

solicitavam sua ajuda.

No entanto, a diferenciação acontecia e a atividade proposta parecia assentar-se

nas possibilidades que os educandos apresentavam para resolvê-la. As lógicas utilizadas

pela docente para propor atividades diferenciadas pareciam centrar-se em suas crenças e

maneiras de fazer, dada a sua vasta experiência enquanto professora alfabetizadora.

Contudo, essas lógicas podem, nem sempre, serem adequadas às necessidades dos

alunos. Percebemos que a proposição das atividades diferenciadas parecia acontecer

sem um planejamento prévio e que a decisão sobre o tipo de atividade a ser realizada

por esses alunos com dificuldades de aprendizagem acontecia no momento da aula.

Com isso, inferimos que a professora se respaldava em suas percepções, sem se apegar a

uma avaliação diagnóstica mais detida.

Além desse atendimento diferenciado no interior das situações coletivas, outras

estratégias foram utilizadas por Beatriz. Para trabalhar as atividades diversificadas com

alguns alunos, a docente fez o movimento inverso do que até então foi apresentado e

voltou sua atenção para o grupo de alunos que apresentavam dificuldades de

Aulas Atividades Atividades diferenciadas Alunos

01 Atividade de

linguagem/língua portuguesa

do livro didático.

Atividade de matemática: numeral

cinco.

Karla.

02 Cópia da atividade do “Para

Casa”.

Atividades envolvendo vogais: cópia;

completar palavras com vogais e

circular vogais em palavras.

Karla, Gabriel e Darlan.

08

Ditado de palavras.

Ligar o número ao conjunto de

imagens correspondente;

Identificação de vogais em palavras.

Karla e Gabriel.

10 Leitura e cópia da atividade

“Para Casa”.

Cópia das vogais;

Associação de vogais a imagens.

Karla e Gabriel.

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aprendizagem, em detrimento do coletivo da sala. Na aula 04, o procedimento adotado

pela docente foi contrário ao da aula 02, uma vez que foi a maioria da turma que a

professora manteve ocupada, enquanto realizava uma atividade diferenciada com um

pequeno grupo de alunos.

Nessa aula, a docente agrupou, em um canto da sala, três alunos (Dimas, Ciel e

Bia) que precisavam de uma ajuda mais sistemática e direcionada, e tentou dar uma

atenção especial a estes aprendizes, mostrando-os e pedindo para identificar as vogais,

enquanto o restante da turma respondia a atividade que ela havia entregue sobre ordem

alfabética. Com isso, a professora evidenciava a necessidade de se “[...] encontrar um

sistema de trabalho individualizado, que permita a alguns alunos longos momentos de

atividades autônoma e útil, enquanto o professor trabalha mais intensamente com um

subgrupo ou apenas um aluno.” (PERRENOUD, 2001, p. 46).

Contudo, destacamos a dificuldade da mestra em desenvolver um trabalho mais

minucioso com essas crianças, devido à interrupção constante dos demais alunos que a

questionavam sobre a realização da atividade que havia sido proposta a eles. Isso levou

Beatriz a utilizar, na aula seguinte, outra estratégia para o trabalho com atividades

diversificadas com o subgrupo de alunos mencionados acima.

Na aula 07, ao invés de atendê-los de forma mais direta enquanto a maioria da

turma realizava uma atividade de ditado, a professora deixou para trabalhar com esse

grupo de alunos, de maneira mais sistemática, ao final da aula, quando a maioria dos

alunos já havia terminado a tarefa, embora não tenha deixado de dar atenção a esses

aprendizes quando estava realizando a atividade individualizada. Inferimos que a

docente tenha optado por essa prática devido às constantes interrupções que

aconteceram quando o trabalho com esse subgrupo de alunos foi realizado

anteriormente. Entretanto, o atendimento aconteceu em meio à conversa e ao barulho

dos demais alunos que já haviam terminado a tarefa.

Isso evidencia os tateamentos da professora em busca da melhor maneira de

realizar as atividades diversificadas com vistas a atender as dificuldades de

aprendizagem dos alunos em relação à leitura e à escrita. Tateamentos esses que

também aconteciam nas práticas desenvolvidas por Irene, com o intuito de atender as

dificuldades dos aprendizes, embora esse atendimento não parecesse suprir totalmente

as necessidades apresentadas pelos alunos.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Ao analisar as maneiras de fazer das professoras no cotidiano da sala de aula,

percebemos que a heterogeneidade não era um fenômeno indiferente às suas práticas,

pois as atividades diferenciadas eram utilizadas como um procedimento que rompia, em

maior ou menor grau, com a homogeneização e padronização do ensino. Desse modo,

pudemos observar a dinâmica utilizada por elas para atender as dificuldades de

aprendizagem de alguns alunos no interior do coletivo da sala de aula.

Com isso, podemos concluir que as professoras parecem estar tentando encontrar

maneiras de lidar com o fenômeno da heterogeneidade, mobilizando procedimentos de

ação com vistas a dar conta desse fenômeno na sala de aula, embora apresentem

dificuldades nesse percurso. Segundo Duran (2007, p. 126), “As invenções cotidianas

que ocorrem na escola representam as diferentes formas de os professores se ajustarem

às políticas que lhes são impostas, às diferentes formas de „caça não-autorizada‟ que vai

reorganizando o cotidiano de suas práticas”.

Assim, os tateamentos são usados para se chegar a práticas de ensino mais

coerentes, não do ponto de vista teórico, mas, sim, do melhor gerenciamento desse

fenômeno no espaço da sua sala de aula.

Diante disso, finalizamos esse estudo com algumas inquietações e apontamos a

possibilidade de novas pesquisas que busquem investigar a relação entre o atendimento

à heterogeneidade e a adequação das atividades propostas. Ou seja, até que ponto a

atenção à heterogeneidade garante a ajuda necessária e adequada às necessidades dos

aprendizes.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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3170ISSN 2177-336X

A HETEROGENEIDADE NO CICLO DE ALFABETIZAÇÃO – ATIVIDADES,

PERSPECTIVAS DE ENSINO E ENFOQUES DIDÁTICOS NOS ARTIGOS DO

II CONBALF

Ana Gabriela de Souza Seal – UFERSA/CEEL

RESUMO

A pesquisa em questão está voltada para tecer análises acerca das temáticas abordadas

nos artigos aceitos e publicados na ocasião do II Congresso Brasileiro de Alfabetização

– II CONBALF e, mais especificamente se detém às pesquisas que estiveram

determinadas a investigar práticas e processos de ensino pautados na perspectiva do

atendimento à heterogeneidade nas aulas de alfabetização voltados aos anos iniciais do

ensino fundamental. Trata-se de um recorte menor de um estudo sobre o estado da arte

das pesquisas em alfabetização voltadas ao estudo do primeiro ciclo do ensino

fundamental, realizadas entre os anos de 2010 – 2016. Realizaremos uma discussão

teórica que revela as preocupações atuais da área de alfabetização na constituição do

ciclo alfabetizador, os enfoques dados pelos documentos curriculares como também as

preocupações reveladas pelas pesquisas acadêmicas mais recentes, das quais a temática

do atendimento à heterogeneidade de aprendizagens em relação ao sistema de escrita

ganha centralidade ao se tratar do ciclo alfabetizador. Nossa perspectiva metodológica

está pautada nas abordagens de Bardin (1977), acerca da análise do conteúdo. Partimos

para a compreensão do evento, os propósitos deste, das linhas temáticas nele definidas

e, por fim, avançamos para a leitura e aprofundamento de cada artigo, a fim de

identificar quais, dentre eles, apresentaram o enfoque do tratamento da heterogeneidade

em relação à aprendizagem da leitura e da escrita no ciclo de alfabetização. Os

resultados apontaram que o evento promoveu comunicações específicas com a temática

do tratamento por docentes da heterogeneidade de conhecimentos acerca da escrita

alfabética dos discentes pertencentes ao ciclo de alfabetização do ensino fundamental.

Apesar de poucos trabalhos orientarem seus objetivos acerca da heterogeneidade, a

grande maioria cita, revela a necessidade, tangencia a discussão ou conclui que esta é

uma necessidade primordial quando se trabalha com a alfabetização. Ainda pôde ser

identificado a escassez de estudos apresentados no evento especificado sobre o

tratamento da heterogeneidade em contextos de salas de aula multisseriadas, próprias da

educação do campo.

PALAVRAS-CHAVES: Alfabetização; Heterogeneidade; Ensino da Leitura e Escrita.

Introdução

Com a ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos em prol da

inclusão das crianças de seis anos, passamos a observar o pulular de um discurso que

defende a implementação de práticas alfabetizadoras fundamentadas em uma

perspectiva de ludicidade e adequação ao novo público. Esse discurso, especificamente,

não se mostra novo, necessariamente, mas passa a enfatizar as características

fundamentais que exige o perfil do novo alunado e a relação deste com o objeto de

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3171ISSN 2177-336X

conhecimento “antecipado”: a escrita alfabética. O uso das aspas justifica-se por

estarmos tratando de um quadro próprio das escolas públicas, uma vez que mesmo na

educação infantil, nas escolas particulares, de um modo geral, a escrita alfabética é

apresentada às crianças menores em diferentes formatos.

Ao inserir as crianças de seis anos no ensino fundamental, as preocupações com

a rotulada e transgredida “sistematização” ganham enfoque central e junto a estas um

conjunto de pesquisas e formações docentes ganham corpo enfatizando a necessidade de

aprendizagem no que se refere à idade, como também no que tange às aprendizagens

específicas da escrita e de sua progressão. Metas de ensino, objetivos didáticos,

expectativas de aprendizagem passam a ser termos constantemente convocados quando

se pretende configurar um novo início para o ensino fundamental, à medida que se

delineia e se delimita o ciclo de alfabetização, composto pelos três primeiros anos deste.

Nesse contexto, a urgência da implantação de práticas que atendam à

heterogeneidade de aprendizagens em relação ao conteúdo específico “língua escrita”

aparece no discurso oficial e nas preocupações de muitos docentes e pesquisadores da

área da alfabetização.

As formações continuadas que foram implementadas a nível nacional nos

últimos anos, dentre elas o Pró-letramento e, mais recentemente, o Programa Nacional

de Alfabetização na Idade Certa, trazem em suas propostas essa necessidade de forma

latente. A diversidade de gêneros discursivos, as propostas de atividades e materiais

didáticos adequados aos níveis de ensino apresentados pelos discentes no que tange à

escrita alfabética, as formas de agrupamento e diversidade de proposições, sobretudo

nos anos iniciais do ensino fundamental são constantemente convocadas nos materiais

de formação docente do Pró-letramento e retomados com afinco no Programa Nacional

de Alfabetização na Idade Certa – PNAIC.

Os cursos de formação de professores, especificamente o de Pedagogia, a nível

de graduação também ganharam novos rumos, com diretrizes que visavam a inserção do

docente de forma gradual, possibilitando a pesquisa acadêmica no campo de trabalho

por meio das práticas pedagógicas e estágios supervisionados distribuídos ao longo dos

anos do curso acadêmico, não mais apenas em vias de finalização destes, desde o ano de

2006.

Nesse contexto, as abordagens acerca da especificidade da alfabetização ganha

corpo, espaço e legitimidade. Os grupos de trabalho sobre a alfabetização se instituem

em eventos nacionais e conquistam relevância nas discussões educacionais. Surge, então

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3172ISSN 2177-336X

como demanda, a Associação Brasileira de Alfabetização - ALBAF, instância essa que

passa a promover os Congressos Brasileiros de Alfabetização – CONBALF.

Neste artigo, pretendemos tecer análises acerca dos trabalhos que foram

apresentados no evento inaugurado nesse meio tempo, como culminância de diversas

discussões, o Congresso Brasileiro de Alfabetização - CONBALF, identificando no seu

II encontro – o mais recente – aqueles artigos que abordaram a necessidade de

atendimento à heterogeneidade de aprendizagens dos alunos no que tange à linguagem

escrita em materiais didáticos e aulas do/para o ciclo de alfabetização.

Objetivos

- Identificar os artigos apresentados no II CONBALF que tratam explicitamente

do atendimento/ adequação à heterogeneidade de aprendizagens em relação à linguagem

escrita no ciclo de alfabetização.

- Mapear as propostas pesquisadas/ suscitadas nos trabalhos apresentados para o

atendimento/ adequação do ensino da linguagem escrita ao primeiro ciclo do ensino

fundamental, o ciclo de alfabetização.

Atendimento às classes de alfabetização de crianças no Brasil – breve

contextualização

Temos vivenciado uma renovação do ensino no Brasil nos últimos trinta anos

impulsionada por uma busca pela “qualidade na educação”. Tal movimento foi

implantado e ampliado nos dois últimos governos federais, gerando uma série de

iniciativas e programas governamentais de distribuição de materiais didáticos, dos quais

os manuais escolares passaram a ocupar um lugar de destaque (COSTA VAL E

MARCUSCHI, 2005), como também de propostas de reestruturação da educação

básica, da formação inicial e de organização da formação continuada dos professores

(FREITAS, 2007).

Dentre as iniciativas de distribuição de materiais didáticos, atualmente temos:

1. O Programa Nacional da Biblioteca na Escola, que inclui análise de livros literários –

em formato tradicional e/ ou adaptados às pessoas com necessidades especiais, como

também fora acrescentada obras acadêmicas voltadas aos docentes; 2. Programa

Nacional do Livro Didático, voltado à análise de obras destinadas ao ensino das

diferentes áreas curriculares do Ensino Fundamental; 3. Programa Nacional de Livros

Didáticos do Ensino Médio, também voltada à análise de livros didáticos do Ensino

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3173ISSN 2177-336X

Médio. Mais recentemente fora criado o Programa Nacional do Livro de Alfabetização,

destinado à análise dos livros de alfabetização de jovens e adultos e, este ano,

incorporado como uma modalidade no PNLD, apresentando-se no formato de Programa

Nacional dos Livros Didáticos da Educação de Jovens e Adultos (PNLD-EJA).

Outro enfoque de renovação do ensino em prol da conquista da qualidade na

educação fora a ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos e a

organização das redes de ensino, passando essas a assumir um formato de ciclos

(OLIVEIRA, 2005). A proposta de ciclos acompanhou reformas e organizações já

realizadas em países como a França e que foram incorporadas a redes de ensino no

Brasil como, por exemplo, tem-se a experiência de Minas Gerais. Por meio dessa, cada

“ciclo” de ensino possui objetivos em comum. No caso do primeiro ciclo o objetivo em

comum das três primeiras séries é, em nosso país, a Alfabetização e o Letramento. O

documento voltado à inserção do público de seis anos no ensino fundamental (BRASIL,

2006), indica a revisão de algumas características para adequar-se ao novo público que

agora o adentrava como, por exemplo, a organização do tempo pedagógico e da rotina

em sala de aula, a importância do brincar, e a necessidade de pensar a prática

pedagógica baseada na Alfabetização e no Letramento. A incorporação de mais um ano

no ensino fundamental permitiu a inserção das turmas de alfabetização como marco

inicial do ensino fundamental e garantiu a essas o acesso aos recursos e programas do

Ministério da Educação para o Ensino Fundamental. Dentre eles o acesso aos materiais

didáticos e programas de formação docente.

No que tange à Formação Docente, sobretudo frente aos cursos de licenciatura

e, em especial, ao de Pedagogia, nos últimos vinte anos passamos a vivenciar reformas

curriculares nos cursos de graduação e estruturação de propostas de formação

continuada desde os documentos e regimentos que os orientam até a implantação

desses. Isto porque a formação de professores tem se constituído em um elemento

central da política nacional em busca de educação de qualidade (BATISTA NETO,

2006). Inicialmente, as reformas dos cursos de licenciatura a nível de graduação foram

impulsionadas pelas críticas às permanências do modelo 3+1 (VEIGA, 1991), através

do qual as disciplinas ditas “pedagógicas” eram apresentadas e refletidas geralmente no

último ano dos cursos. Ilma Veiga (1991), alertava nos anos 90 acerca da necessidade

de mudanças qualitativas no próprio modo de operacionalizar a formação dos

professores e apontava como um dos caminhos a alteração da estrutura dos cursos de

licenciatura existentes, nos quais a formação era exclusivamente centrada nos conteúdos

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3174ISSN 2177-336X

específicos de cada habilitação. Porém a autora já reconhecia que isso não era

suficiente, indicando como necessidade pertinente a articulação entre os processos de

formação inicial e continuada de professores, não encaradas como para “suprir”

necessidades da formação inicial ou “reciclar” conhecimentos dos professores

“defasados”, mas para promover momentos de reflexão. A perspectiva pautava-se na

idéia de formação de “professores profissionais”, apoiada na prática docente reflexiva

(FREITAS, 2007). A partir do final dos anos 90, as ementas e resoluções passaram a

exigir a reestruturação dos estágios e a acrescer novos componentes curriculares, como

as práticas de ensino. A adequação dos cursos a essas reformulações gerou a inserção

dos alunos dos cursos de licenciatura nas escolas já nos primeiros períodos da

graduação. Em particular, frente ao curso de Pedagogia, além da inserção das práticas

de ensino, outras exigências têm sido feitas. Na resolução CNE-CP Nº01/2006

identifica-se como foco de formação a docência na Educação Infantil, séries iniciais do

Ensino Fundamental e Ensino Médio na modalidade Normal, o que remete à

centralidade da discussão do ensino das diferentes disciplinas, embora a resolução não

restrinja o curso a essa perspectiva. Mais recentemente, em junho de 2010, o Ministério

da Educação lançou os critérios de avaliação através da Portaria nº 808 de 18/06/10 do

curso de Licenciatura em Pedagogia, das quais há enfoque na disponibilização de

laboratórios de ensino, de brinquedotecas, de laboratórios de tecnologias da informação

e da comunicação, bem como de experiências anteriores dos docentes do curso de

Pedagogia na educação infantil, ensino fundamental e médio. Quanto à formação

continuada, as iniciativas governamentais tem se voltado, de forma especial, às

propostas de alfabetização de crianças e adultos. O Programa de Formação do Professor

Alfabetizador (PROFA) e o Programa Alfabetização Solidária (PAS) foram duas das

primeiras iniciativas nesse sentido.

Mais recentemente, em colaboração com Universidades Federais, o Ministério

da Educação promoveu a criação da Rede Nacional de Formação Continuada. Por meio

desta, vários centros de pesquisa e formação docentes foram instaurados. No tange à

promoção de formação voltada especificamente para o ensino da linguagem cabe

ressaltar o Pró-Letramento e o Programa Nacional de Alfabetização na Idade Certa -

PNAIC. O primeiro, Pró-letramento, centrava-se na formação de pessoal docente no

ensino da leitura/ escrita e matemática para os anos iniciais do ensino fundamental. O

Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa – PNAIC trata-se de um compromisso

firmado entre Governo Federal, estados, municípios e distrito federal que tem por meta

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3175ISSN 2177-336X

a alfabetização das crianças matriculadas nas redes públicas até os oito anos de idade.

Este último, o PNAIC, tem por eixos de ações a: 1. formação continuada, 2. a produção

e distribuição de materiais didáticos, 3. a promoção de avaliações, 4. Gestão,

mobilização e controle social.

Com a implantação do PNAIC passa a ser requerida/vislumbrada/divulgada a

necessidade de uma terminalidade para as aprendizagens referentes à escrita alfabética

no primeiro ciclo. Ou seja, torna-se imprescindível o estabelecimento de metas de

aprendizagens para os anos que compõem o primeiro ciclo do ensino fundamental.

Nesses termos, o reconhecimento das variedades de conhecimento dos alunos e o

trabalho com a heterogeneidade de aprendizagens ganha um enfoque central na

configuração das práticas alfabetizadoras desenvolvidas em sala de aula e

oferecidas/organizadas/sugeridas por meio das formações e dos materiais pedagógicos.

Partimos do pressuposto que a formação continuada propicia espaços de

reflexão acerca do fazer docente. Por um lado, permite ao professor acessar

conhecimentos e apropriar-se deles em sentido epistemológico e, por outro, pode gerar

reflexões acerca da práxis docente, chegando a modificar o próprio fazer, de forma a

adequá-lo às apropriações epistêmicas dantes realizadas.

A seguir, traremos alguns dos resultados desse levantamento dos artigos

apresentados via comunicação oral no último CONBALF com destaque para aqueles

que tiveram por preocupação central a discussão acerca do tratamento da

heterogeneidade nas turmas de alfabetização que compõem o primeiro ciclo do ensino

fundamental.

Perspectivas metodológicas

Nossa perspectiva metodológica está pautada nas abordagens de Bardin (1977),

acerca da análise do conteúdo. Partimos para a compreensão do evento, os propósitos

deste, das linhas temáticas nele definidas e, por fim, avançamos para a leitura e

aprofundamento de cada artigo, a fim de identificar quais, dentre eles, apresentaram o

enfoque do tratamento da heterogeneidade em relação à aprendizagem da leitura e da

escrita no ciclo de alfabetização. Não serão abordados, para este momento, os relatos de

experiência.

Dentre os eixos temáticos definidos no II CONBALF tivemos: alfabetização de

jovens e adultos; alfabetização e formação profissional; alfabetização e infância;

alfabetização e políticas públicas; alfabetização na história da educação; alfabetização,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3176ISSN 2177-336X

diversidade e inclusão. O primeiro movimento foi identificar quais desses tratavam

especificamente do ciclo de alfabetização do ensino fundamental, dessa forma, se

destacaram os eixos “alfabetização e infância” e “alfabetização, diversidade e inclusão”.

Não obstante, com exceção apenas do eixo “alfabetização de jovens e adultos”, os

demais eixos temáticos contiveram trabalhos que contemplaram a abordagem do

trabalho com a heterogeneidade de aprendizagens dos alunos acerca da linguagem

escrita no ciclo de alfabetização.

A seguir, passaremos a expor uma parcela dos resultados encontrados nesse

levantamento, o evento e seus objetivos, bem como aprofundaremos o que é dito como

necessário, nos trabalhos pesquisados, para o tratamento dessa heterogeneidade.

CONBALF- caracterização e objetivos do evento

O CONBALF - Congresso Brasileiro de Alfabetização, apresenta-se como um

espaço de debates acerca das temáticas e mudanças realizadas em cerca de 30 anos de

discussões e consolidações do campo da alfabetização no Brasil. Alega-se que já se

tinham conquistas tanto no que diz respeito ao amadurecimento da área como também à

implementação de políticas públicas em âmbito nacional. Contudo, apesar de garantido

os espaços de debates em eventos como o Seminário de Alfabetização no COLE e no

GT – Alfabetização e Letramento na ANPED, e recentemente no SIHELE, ainda não se

havia estabelecido um encontro específico da área. Dessa forma, surge o I CONBALF,

realizado em Minas Gerais em 2012 e, posteriormente, promove-se o II CONBALF no

ano de 2015 em Recife com o intuito de “contribuir para avaliação das perspectivas de

avanços teórico-conceituais e empíricos das pesquisas, políticas públicas e práticas

educacionais para a alfabetização no Brasil, reunindo pesquisadores, estudantes de

graduação e pós-graduação e profissionais da educação básica” (ASSOCIAÇÃO

BRASILEIRA DE ALFABETIZAÇÃO, 2016). Não há publicações disponíveis no site

da Associação Brasileira de Alfabetização dos artigos apresentados na primeira versão

do evento, portanto, optamos por, nesta ocasião, centrarmos esforços de leitura e

sistematização da segunda edição do evento, que encontra-se exposta em sua

completude na página da referida associação.

Os eixos temáticos definidos para essa segunda edição foram os seguintes:

alfabetização de jovens e adultos; alfabetização e formação profissional; alfabetização e

infância; alfabetização e políticas públicas; alfabetização na história da educação;

alfabetização, diversidade e inclusão. Como já anunciado, com a exceção dos eixos

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3177ISSN 2177-336X

“alfabetização de jovens e adultos” (com apenas 03 trabalhos no formato de

comunicação científica) e “alfabetização na história da educação” ( com 05

comunicações científicas) todos os demais contemplaram abordagens acerca da

heterogeneidade de aprendizagens em relação à linguagem escrita no ciclo de

alfabetização do ensino fundamental. Passemos a expor o mapeamento dos eixos, as

temáticas contempladas por esses e nosso enfoque: o trabalho com a heterogeneidade de

conhecimentos dos alunos no ensino da escrita alfabética.

Eixos temáticos do CONBALF e a presença do enfoque da heterogeneidade

O eixo com maior número de trabalhos apresentados foi “alfabetização e

infância”, contabilizando um número de 28 comunicações. Seguido deste tivemos

“alfabetização e formação profissional”, com 20 trabalhos apresentados na modalidade

de comunicação; “alfabetização e políticas públicas”, 07 apresentações nesse formato;

“alfabetização, diversidade e inclusão”, 06 trabalhos;.

“Alfabetização e infância” contemplou discussões que versaram acerca dos anos

iniciais do ensino fundamental e da aprendizagem da linguagem – sobretudo escrita – na

educação infantil. Sobre esta última abordagem, estiveram em pauta nas comunicações

a literatura infantil, a contação de histórias, o ensino da escrita alfabética, os processos

de compreensão da leitura e da escrita, brincadeiras para ensino da linguagem escrita, a

cultura visual. Contabilizaram ao total oito artigos. Como nosso foco não esteve

centrado na educação infantil, esses artigos não foram incluídos em nosso mapeamento

para este momento. Os demais trabalhos que orientavam suas análises para os anos

iniciais do ensino fundamental, ao todo vinte comunicações, trouxeram abordagens

bastante diversificadas, problematizaram o ensino da produção de textos via sequencias

didáticas, centraram-se no ensino por meio de gêneros discursivos, realizaram análises

de materiais didáticos – livros, jogos e recurso pedagógicos – e das falas das docentes,

da função do brincar no ensino da linguagem, das aprendizagens específicas referentes

à linguagem alfabética (conhecimento das letras, leitura), bem como das práticas das

alfabetizadoras.

Especialmente um trabalho se destaca em relação ao nosso objetivo de pesquisa.

Intitulado “Heterogeneidade no ciclo de alfabetização: possibilidades de trabalho com

as atividades diversificadas” de autoria de Viviane Dourado (DOURADO, 2015). O

artigo em questão tratou-se de um estudo de caso acerca da prática de uma professora

do 2º ano do primeiro ciclo, esteve voltado à análise sobre como a docente lidava com a

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3178ISSN 2177-336X

diversidade de aprendizagens reveladas pelos alunos no que concerne à aprendizagem

da escrita alfabética, leitura e produção de textos.

A autora revelou que havia diversidade nas propostas das atividades, nas

possibilidades de agrupamento dos alunos e na forma de atendimento desses. A

diversidade de propostas de atividades também contemplava atividades adequadas aos

níveis de aprendizagens que eram apresentados pelos discentes, de acordo com a tabela

presente no artigo. Sobre os agrupamentos, o tratamento dos dados indica que havia

privilégio de atividades individuais, porém com intenso atendimento aos discentes com

maior dificuldade, bem como com propostas de atividades adequadas aos níveis de

aprendizagem das crianças. Revela-se ainda que, quanto às intervenções, a professora

sempre realizava atendimento individualizado a alunos com maior dificuldade e com

certa frequência fazia intervenções junto às crianças mais adiantadas na apropriação do

sistema de escrita alfabético e atendimento individualizado a todas as crianças do grupo

classe. E, mesmo não de forma tão frequente, propôs divisão dos alunos em grupos de

acordo com o nível de aprendizagem revelados por esses quanto à escrita alfabética –

silábicos; silábicos alfabéticos e alfabéticos. Um ponto a destacar é que os alunos com

maior nível de apropriação também foram desafiados e motivados pelas atividades,

formas de organização da sala e intervenções promovidas pela docente.

Os trabalhos desse eixo revelaram a necessidade de variação de tipos de

atividades para a apropriação da escrita alfabética em prol do tratamento da diversidade

de aprendizagens dos alunos, da leitura e da produção de textos, da promoção do

trabalho com gêneros diversificados, da análise de propostas de materiais didáticos,

jogos e intervenções geralmente tendo em vista a importância do atendimento a essa

diversidade de aprendizagens, mas não necessariamente tratando a heterogeneidade

diretamente como objeto de pesquisa como esteve explicitado no artigo que acabamos

de detalhar. Há que se destacar que o artigo “A avaliação dos conhecimentos das

crianças sobre o sistema de escrita alfabética: instrumentos e registros utilizados por

uma professora alfabetizadora” de autoria de Maria de Fátima Moura de Lima e

Alexsandro da Silva (LIMA e SILVA, 2015). Apesar de não indicar como objetivo de

pesquisa, o artigo necessariamente convoca a abordagem acerca do reconhecimento e

tratamento da heterogeneidade nas turmas de alfabetização por docentes.

O segundo eixo, seguido do primeiro com maior quantidade de comunicações,

foi o “Alfabetização e formação profissional”. Dentre os vinte disponíveis na

modalidade comunicação oral, oito deles abordaram diretamente o Pacto Nacional de

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3179ISSN 2177-336X

Alfabetização na Idade Certa – apesar de apenas quatro deles revelarem em seu título,

convocando os saberes apropriados por docentes e as funções dos orientadores de

estudo. Dentre as diversas temáticas, as pesquisas se voltaram a analisar as práticas

docentes em prol do ensino da leitura e escrita, reflexões das crianças sobre os trabalhos

em grupo, a organização do trabalho pedagógico, a formação de alfabetizadores em um

curso de Pedagogia. Dois trabalhos apresentados salientaram a necessidade de

apresentação de uma variedade textual em prol da ampliação dos conhecimentos dos

alunos já nos anos iniciais e, em conclusões, atentaram para o atendimento à

heterogeneidade de conhecimentos dos alunos. Um outro artigo em especial traz à baila

a abordagem da heterogeneidade de conhecimentos dos alunos. Intitulado “O tratamento

da heterogeneidade e as estratégias de agrupamento no terceiro ano do ciclo de

alfabetização” (ALVARES, PESSOA e BARBOSA, 2015, p. 6) teve por objetivo:

refletir e demonstrar as práticas de alfabetização de uma professora do 3º ano

do ciclo de alfabetização, participante do Pacto Nacional pela Alfabetização

na idade Certa, visando perceber as estratégias e metodologias usadas por ela

para atender a heterogeneidade a partir das formas de agrupamento utilizadas

em sala de aula.(Ibidem)

As autoras estiveram voltadas a analisar não só as estratégias didáticas utilizadas

pela docente como também lhes interessava os agrupamentos, como ela organizava os

grupos de alunos em sala de aula, se essa heterogeneidade estava sendo contemplada

por essa ação pedagógica. Por meio entrevistas e das observações de aulas da

alfabetizadora, identificou-se que a professora investia em atividades diversificadas,

mesmo que nem sempre estas atendessem adequadamente à heterogeneidade de

aprendizagens dos alunos e que mesmo em meio a aspectos de dificuldade promoveu

por duas situações o agrupamento dos alunos. As autoras concluem que a professora

vinha se esforçando na tarefa de atender às diferentes aprendizagens de forma adequada,

realizando diagnósticos periódicos e planejamentos que atentavam para a diversidade de

aprendizagens, mas que demonstrava dificuldades em relação a isso.

O último eixo do Congresso Brasileiro de Alfabetização a contemplar artigos

voltados à abordagem da heterogeneidade tratou-se do eixo intitulado “Alfabetização,

Diversidade e Inclusão”. Com seis trabalhos na modalidade comunicação oral, abordou

temáticas referentes à aprendizagem da linguagem escrita de pessoas com necessidades

educacionais especiais (superdotação; paralisia), de comunidades ribeirinhas, bem como

reflexões sobre a aprendizagem conceitual da área em paralelo às reflexões acerca da

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3180ISSN 2177-336X

inclusão. Um dos artigos intitulado “Alfabetizar em turmas multisseriadas:

acompanhamento docente e heterogeneidade de aprendizagens das crianças” (SÁ e

PESSOA, 2015) tratou diretamente do nosso objeto investigativo. Neste, as autoras

revelam dados de um levantamento realizado por meio da observação da prática de uma

professora alfabetizadora em turma multisseriada.

O artigo centrou-se na análise acerca do acompanhamento da docente sobre os

conhecimentos dos alunos no que tange à apropriação da escrita alfabética. Como

procedimentos metodológicos fez-se uso de observações em sala de aula – 12 jornadas,

entrevistas semi-estruturadas e diagnoses com os alunos. Alguns resultados a que

chegaram as pesquisadoras revelam que a professora esteve preocupada em propor

muitas situações com atividades diversificadas. Essas atividades correspondiam às

necessidades de aprendizagem dos alunos. Foram predominantes as atividades

diversificadas e o atendimento individualizado. A pouca clareza das docentes acerca dos

conhecimentos necessários para a progressão frente às aprendizagens da área de

linguagem também foi outro aspecto problemático.

Considerações Finais

Diante das novas preocupações lançadas no campo da alfabetização, as

pesquisas presentes no CONBALF indicaram direta ou indiretamente que o tratamento

da heterogeneidade precisa ser encarado como primordial em prol da progressão das

aprendizagens e organização dos materiais, atividades e trabalho pedagógico de forma

adequada.

Em relação às práticas docentes, a presença das atividades diversificadas é

constante, no entanto a compatibilidade entre o que o alfabetizando necessita e o que é

proposta ainda é um desafio a ser superado. Em particular, um dado relevante foi que

em apenas um trabalho foi indicada a análise do tratamento da heterogeneidade em salas

multisseriadas, o que revela a necessidade de um descortinar para esta realidade.

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XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3182ISSN 2177-336X

“TIA, TÁ CERTO”? PERSPECTIVAS DIVERSIFICADAS DE TRATAMENTO

DO ERRO NA SALA DE AULA

Solange Alves de Oliveira-Mendes - UnB

RESUMO

Esse estudo analisou como professoras da Rede Municipal de Ensino de Recife vinham

tratando o erro na sala de aula, no 1º ciclo, nas aulas de língua portuguesa. Para isso,

recorremos a Astolfi (2006); Pinto (2002); entre outros autores. Contribuíram com a

pesquisa nove docentes, de três instituições, sendo três de cada escola, dos três anos do

ciclo I. Foram realizadas oito observações de aula em cada turma acompanhada, bem

como entrevistas semiestruturadas com as nove docentes. Para o tratamento dos dados,

recorremos à análise temática de conteúdo, de acordo com Bardin (1977). Os resultados

apontaram para uma predominância de correções nos grupos e/ou no coletivo da sala de

aula, ao compararmos com as intervenções individuais. Essa alternativa adotada pelas

professoras ora se relacionava à otimização do tempo da aula, de modo a dar conta de

todos os alunos ao mesmo tempo, em alguns casos, chamando a atenção e expondo o

aprendiz diante da turma; ora se vinculava ao objetivo de refletir acerca de uma dúvida

que poderia ser a mesma de outros alunos. No que se refere aos momentos de correção

individual do erro do educando, considerando os anos-ciclo, confirmamos maior

intervenção dessa natureza entre as turmas de primeiro e terceiro anos. Ao nos

reportamos às correções em grupo e/ou no coletivo das turmas, reafirmamos a alta

frequência verificada nos anos do 1º ciclo. Nesse item específico, não houve variações

significativas entre os anos-ciclo (16/19/18). É interessante destacar que os exemplos de

correção do erro recaíram, predominantemente, em situações de atividades que

envolviam a construção da escrita alfabética. Como as professoras monopolizavam os

momentos de leitura e algumas das situações de produção de textos, não ocorreram na

mesma proporção que as atividades focadas no sistema de notação alfabética.

PALAVRAS-CHAVE: ensino de língua portuguesa; ciclos; tratamento do erro.

Introdução

A partir da implantação dos ciclos de aprendizagem na rede municipal de

ensino de Recife, a partir de 2001, novas perspectivas didáticas passaram a ser adotadas

nas práticas de ensino. No rol dessas mudanças, cabe pontuar o tratamento do erro na

sala de aula.

Em estudo realizado por Oliveira (2004), a autora optou por analisar a

presença ou ausência de intervenções frente aos erros dos aprendizes no 1º ciclo. De que

modo as

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

3183ISSN 2177-336X

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professoras vinham lidando, a partir da implantação da proposta dos ciclos de

aprendizagem, na rede municipal de ensino de Recife, em 2001, com os erros dos

alunos? Que modalidades de intervenção ocorriam em suas práticas? Os resultados

apontaram para uma diversidade de encaminhamentos adotados pelas mestras, naquele

contexto. Entre eles, a partir dos grupos focais, a pesquisa constatou que as docentes

apostavam na cooperação dos colegas mais experientes da turma, em não fornecer a

resposta ao educando, mas, ao contrário, permitir, por meio da mediação, que, por si só,

descobrisse seu erro. As mestras mencionaram, também, a adoção da intervenção com

cautela, a fim de não traumatizar o aprendiz. Para isso, promoviam a reflexão coletiva

sobre o erro do aluno. Algumas delas acreditavam na eficácia de dar a resposta correta.

É oportuno destacar que a pesquisa foi realizada com nove professoras que atuavam no

1º ciclo, de três instituições daquela rede de ensino. Daquelas alternativas encontradas,

houve quem optasse por mais de uma delas, ao longo das observações feitas em sala de

aula.

Passados quatro anos, desde que analisamos os dados daquela pesquisa e seis

anos de implantação da proposta dos ciclos de aprendizagem na rede municipal de

ensino de Recife, voltamos a considerar, nas práticas acompanhadas, as alternativas que

estariam sendo adotadas pelas professoras, quanto ao tratamento do erro do aprendiz na

sala de aula.

Priorizamos, na presente sistematização, a seguinte questão: estariam as

professoras optando pela correção individual do erro do aprendiz ou, ao contrário,

realizando a correção nos grupos e/ou no coletivo da sala de aula?

Ciclos, ensino de língua portuguesa e tratamento do erro do aprendiz

Na década de 1980 diversos sistemas de ensino implantaram os ciclos básicos de

alfabetização. Entre eles, a rede municipal de ensino de Recife (1986-1988). Nesse

contexto, o objetivo era assegurar um ensino de qualidade numa etapa crítica marcada

pela evasão e reprovação escolares. No caso específico daquela rede, a proposta dos

ciclos de aprendizagem foi expandida para todo o ensino fundamental a partir de 2001

(RECIFE, 2001), estando em consonância com o que aponta a Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional (LDBEN, 9.394/1996).

Em se tratando daquela proposta, Lüdke (2001, p. 30) nos alerta para o fato de

que a ideia de ciclo de fato traz à tona a necessidade de se levar em conta a evolução

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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natural do aluno no concernente à aprendizagem, objetivando seu sucesso na escola e

que a divisão arbitrária em séries se constitui num esforço para “racionalizar a

organização escolar”.

Sabemos que a década de 1980 foi um marco em algumas definições no campo

da didática, com contribuições bastante inovadoras no âmbito do ensino de língua

portuguesa. Dentre as contribuições nessa área, especificamente no que concerne ao

processo de alfabetização, merece destaque o trabalho de Emília Ferreiro e seus

colaboradores quanto aos aspectos que fundamentam o processo de apropriação da

língua escrita pela criança; e, junto a esses, o papel da escola e do professor enquanto

mediadores dessa (re)construção.

A partir dos estudos de Ferreiro e Teberosky (1985, p. 17) e outros

pesquisadores, sabemos que “o processo de apropriação da escrita alfabética pela

criança não é aleatório; ao contrário, possui uma sequência que se compara à da

construção da notação da escrita pela humanidade”. Portanto, as dificuldades que o

aprendiz enfrenta estão centradas no nível conceitual.

O processo de alfabetização, concebido pela teoria da Psicogênese da Língua

Escrita, atribui uma significativa importância à natureza do objeto de conhecimento e

como esse intervém no processo de aprendizagem. Ferreiro propõe-se a analisar,

portanto, “a tríade existente, cujos elementos constitutivos se materializam em: o

sistema de notação alfabética com suas especificidades e as concepções que quem

aprende e quem ensina têm sobre esse objeto” (FERREIRO, 1985, p. 9).

A partir das décadas de 1980 e 1990, as discussões e concepções de

alfabetização se ampliaram, desencadeando uma reflexão sobre os usos e práticas da

leitura e da escrita. Segundo Soares (2003b, p. 7), migrou-se “do saber ler e escrever em

direção ao ser capaz de fazer uso da leitura e da escrita”. Com isso, gradativamente, o

conceito de alfabetização vem sendo articulado ao de letramento.

Diversos autores concordam que o conceito de alfabetização foi ampliado,

trazendo às práticas de ensino novos desafios, sendo necessário, com isso, garantir a

apropriação do sistema de notação alfabética, mas, também, ensinar diferentes formas

de utilização da linguagem. Logo, dominar a escrita alfabética não se constitui numa

condição que encerra as diferentes demandas de leitura e escrita impostas pela

complexificação das práticas sociais e, portanto, escolares. É nesse contexto que o

debate sobre o letramento ganha centralidade, conforme Soares (2003a, 2003b);

Kleiman (2002) e Morais; Albuquerque (2006).

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Compreendemos, ainda, que o trato dado à heterogeneidade, às formas de

cooperação na sala de aula estão estreitamente vinculados aos princípios defendidos

numa escolarização por ciclos e, no rol desses, ganha centralidade o modo como vem

sendo tratado o erro do aluno, de acordo com Pinto (2002). Diante desse pressuposto,

indagamos: que formas de intervenção são possíveis de serem adotadas ensejando a

superação dos erros pelos aprendizes? Quais as diferentes implicações que os modelos

de intervenção acarretam às aprendizagens construídas? É nesse aspecto que nos

deteremos a partir de então.

Remetendo-nos, brevemente, à análise da natureza do erro, sublinhamos que

Astolfi (2006) explicita três modelos distintos nas formas de conceber e de tratar esse

aspecto. O modelo transmissivo atribui, notoriamente, ao aprendiz, a origem do erro,

logo, o próprio sujeito seria responsável por seu fracasso na escola. Por outro lado, o

modelo behaviorista culpabiliza a planificação, não o aluno, pelo erro cometido. A

solução seria reelaborar todo o programa, a fim de preveni-lo. Por fim, o modelo

construtivista que, ao contrário dos demais, entende que a condição do erro é postulada

de sentido e, portanto, de avanço. Para o autor, a origem do erro decorre da apropriação

do conteúdo ensinado e a intervenção tem por objetivo criar alternativas didáticas que

promovam a construção do conhecimento.

Pinto (2002) realça que o erro dos alunos pode se constituir numa alavanca

para o professor enfrentar as diferenças entre eles na sala de aula e poder acompanhar,

de forma efetiva, a aprendizagem escolar (p. 48). A autora prossegue destacando que é

preciso superar essa concepção negativa rumo a uma perspectiva construtiva e

produtiva. O erro seria, na ótica da autora (2002), “um indicador privilegiado para dar

uma ajuda personalizada ao percurso escolar do aluno” (p.48). A adoção dessa postura

remete, essencialmente, a um ensino diferenciado, defendido nos sistemas organizados

por ciclos, conforme aponta Mainardes (2009a; 2009b; 2007a; 2007b).

A seguir, os instrumentos e procedimentos metodológicos adotados na

pesquisa.

Metodologia

Acompanhamos a prática de nove professoras, dos três anos do 1º ciclo, de três

instituições da rede municipal de ensino de Recife. Realizamos, em cada turma, oito

observações de jornadas de aula completas, totalizando 72 protocolos. Ao final do ano

letivo, entrevistamos cada uma das docentes.

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Enfocaremos, nesse artigo, o tratamento (anti)didático dado ao erro do aluno

na sala de aula.

Recorremos, para o tratamento de nossos dados, à análise de conteúdo

temática (BARDIN, 1977), a qual consiste numa metodologia de dados qualitativos. Tal

como Bardin, compreendemos que a análise de conteúdo acopla não só a categorização

e descrição, como a inferência e a interpretação dos dados.

Alguns Resultados

A seguir, explicitamos alguns dos resultados da pesquisa referentes ao

tratamento do erro na sala de aula. Consideramos os seguintes aspectos: correção

individual do erro nas três escolas, em cada ano do ciclo, assim como a alternativa de

corrigir no grupo e/ou no coletivo da turma. Segue quadro com números absolutos das

oito jornadas completas observadas em cada uma das nove turmas.

Quadro 01 – Alternativas adotadas no tratamento do erro no 1º ciclo, na área de língua

Escola A Escola B Escola C

Categorias 1º 2º 3º T 1º 2º 3º T 1º 2º 3º T

1- Corrige o erro

individualmente 3 0 4 7 2 0 0 2 2 2 1 5

2- Corrige o erro no

coletivo/grupo 6 7 6 19 7 6 5 18 3 6 7 16

1º = 1º ano; 2º = 2º ano; 3º = 3º ano; T = Total.

De acordo com dados do quadro 01, as intervenções ocorreram,

majoritariamente, no coletivo da sala de aula (14/53).iv

Pareceu-nos que essa alternativa

adotada pelas professoras ora se relacionava à otimização do tempo da aula, de modo a

dar conta de todos os alunos ao mesmo tempo, em alguns casos, chamando a atenção e

expondo o aprendiz diante da turma; ora se vinculava ao objetivo de refletir acerca de

uma dúvida que poderia ser a mesma de outros alunos. Esse último caso se assemelha às

proposições de Goigoux (2002) e de Cèbe e Goigoux (2003).

Ao nos reportarmos, especificamente, aos dados encontrados quanto à

correção individual do erro do educando, considerando os anos-ciclo, confirmamos

maior intervenção dessa natureza entre as turmas de primeiro e terceiro anos. Em se

tratando desses últimos, as escolas A e C (7/2/5)v optaram mais por essa modalidade de

intervenção. Por que enfatizamos isso? Novamente realçamos aquele pressuposto, visto

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que as turmas de primeiro ano, em nossa compreensão, careciam de um apoio mais

próximo, por parte das professoras, enquanto que as turmas de terceiro ano, em especial

daquelas escolas, tinham um perfil em comum, dado que os alunos, em sua maioria, não

tinham consolidado, ainda, o objeto: escrita alfabética.

Embora esses argumentos pareçam coerentes com nossas análises,

reconhecemos que essa não foi, definitivamente, a opção adotada pela maioria das

mestras, visto que, das 72 observações de aula, em 53 delas não recorreram à correção

do erro no âmbito individual, considerando essa prática no coletivo das turmas.

Para ilustrarmos com algumas das situações em que esse tipo de intervenção

ocorreu individualmente, nos remetemos ao que vimos no primeiro ano da escola A,

numa situação de ditado de palavras, em que a mestra, após correção das palavras no

quadro, mediante a escrita de alguns alunos por ela designados para essa tarefa, vi

solicitou que circulassem a sílaba „ca‟ das palavras ditadas, alertando-os de que não

seriam todas. Nessa ocasião, observou o caderno de um dos alunos, corrigindo-o e

declarou: “eu disse que era para circular o pedacinho „ca‟, não a palavra toda”.

Apoiando-se nesse mesmo modelo de intervenção, numa outra situação de ditado de

palavras, conduzido na quinta observação de aula, a professora, dessa vez, optou por

fazer a correção individual. Vejamos algumas de suas intervenções, num trecho da aula

que segue:

(Professora Aécia, 1º ano, Escola A, 5ª Observação)

(...)

P Agora eu vou corrigir. Só vou dar dez (10) pra quem realmente fizer

tudo certinho. Cadê? Faltou responder aqui. Eu mandei escrever

LINDA, LANÇA, você não colocou. „LAN‟ pra escrever „LAN‟.

A – „LÊ‟.

P – „LÊ‟? É „LAN‟ (professora no ato da correção). „LAN‟, pra ficar

„LAN‟, depois do „L‟ não, não. Antes do „N‟, entre o „L‟ e o „N‟ tem

uma letra (professora corrigindo a escrita de outro aluno). “É LANÇA,

não é LENÇA”.

A – É L A.

P – Ah, Wesley, sente no seu lugar. Falta separar as palavras, deixa eu

ver a outra que você errou: LINDA, „LIN‟. Até as palavras que tu

separasse (sic) ficou errado.

(...)

P – „MEN‟, „MEN‟, cadê o „E‟? Cadê gente, quem foi que fez?

P – Tu aqui errou o ditado todinho „AN‟, CANTA, CANTIGA,

„LAN‟, olhe o „LAN‟, „LIN‟, é „LIN‟, „MEN‟, „AINDA‟ (correção

das palavras). “Preste atenção” (referindo-se a Ana Karla. Na ocasião,

corrigiu o ditado de Peterson. Disse que ele tinha acertado, porém,

escreveu a letra „C‟ ao contrário). “Errou LANÇA Peterson, mas errou

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pouco” (acreditamos que essa última observação: “errou pouco”,

visou a motivar o aluno a participar das demais atividades, já que não

costumava se integrar e cumprir com as tarefas propostas). (...)

Entre as turmas de segundo ano, identificamos apenas duas aulas em que

houve algum tipo de intervenção frente ao erro do aluno, realizada individualmente.

Interessante que essa opção foi vista apenas na escola C. Na primeira observação, após

realizar a leitura de um texto intitulado “amigos para sempre”, realizou uma breve

compreensão oral e escrita, que incluía, exclusivamente, questões de fácil localização.

Numa dessas, os alunos teriam que escrever o nome de um personagem da „história‟, no

caso, „Henrique‟. Um dos aprendizes expressou dúvida na escrita da palavra, momento

em que contou com a ajuda de alguns colegas, assim como da professora, a qual

destacou que aquela palavra não poderia ser escrita com dois „rr‟, já que era precedida

por „n‟, após pergunta realizada por ele.

Esse último evento, a nosso ver, possibilita uma compreensão e articulação

com o que Goigoux (2002) aponta quanto a três pólos que integrariam os processos de

ensino e aprendizagem na sala de aula: a elaboração que estaria centrada no pólo dos

saberes; a apropriação no pólo dos alunos e a intervenção no pólo do professor. Numa

relação de interdependência, cada um deles se constitui a partir do outro. Essa

intervenção do professor, por vezes, assume um caráter de correção sem reflexão por

parte do aprendiz.

Os terceiros anos das escolas A e C contaram com cinco aulas em que houve a

correção individual do erro do educando, por parte das professoras. Semelhantemente à

professora do segundo ano da escola C, a mestra do terceiro ano da escola A, em uma

das quatro aulas em que interveio individualmente, registrou um poema no quadro

intitulado: „O elefante Bamba‟, prosseguiu com uma atividade escrita, seguida de uma

leitura coletiva. Na ocasião, aproveitou o momento para tomar a leitura de alguns

alunos. Durante a tarefa, pôde prestar ajuda a um dos educandos em algumas palavras

compostas por sílabas complexas, tais como: „tromba‟, „espanta‟. Na leitura, o aprendiz

pronunciou „espata‟, mas, imediatamente ela o corrigiu, destacando o „n‟ e

pronunciando a palavra pausadamente, seguindo a marcação das sílabas („es pan ta‟).

A superação do modelo de intervenção ancorado numa perspectiva resolutiva

traria, entre outras implicações, a possibilidade de organizar o ensino coletivo, guiado

pelo professor, porém, com o objetivo de assegurar, gradativamente, a autonomia dos

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educandos frente aos desafios postos no processo de aprendizagem, conforme aponta

Goigoux (2002).

Ao nos reportamos às correções em grupo e/ou no coletivo das turmas,

reafirmamos o já dito quanto à alta frequência verificada nos anos do 1º ciclo. Nesse

item específico, não houve variações significativas entre eles (16/19/18).vii

No interior

dos primeiros anos, apenas a escola C não se destacou como as demais (6/7/3), ao

considerarmos o número absoluto de aulas em que aquele tipo de encaminhamento

esteve presente.

Assumindo uma postura diferenciada, no momento da correção coletiva, a

professora do primeiro ano da escola B realizou a leitura do conto Chapeuzinho

Vermelho e, em seguida, prosseguiu recontando-o oralmente. Durante essa última

atividade, lançou algumas questões, a fim de facilitar a retomada da história. Após

registrar o título do conto, a professora orientou-os a localizar as palavras. Naquele

contexto, a tarefa foi grafar o título e desenhar os personagens. A partir de então, a

professora deu início às intervenções. Vejamos como procedeu:

(Professora Bernadete, 1º ano, Escola B, 1ª Observação)

(...)

P – Primeira coisa, o nome „LOBO‟ tem quantas sílabas?

A – „LOBO MAU‟.

P – A palavra „LOBO‟ tem duas sílabas, é, João?

A – Três.

P – Por quê? Diga Tiago.

A – Porque eu contei.

P – Ele contou, tá vendo? A gente abre a boca quantas vezes?

A – É três tia (sic).

P – Diga por quê. Pra gente saber quantas sílabas têm na palavra, olhe

pra mim, a gente conta quantas vezes a gente abre a boca. Olhe e

preste atenção. Vamos? „LO – BO‟. Duas, não foi?

P – Qual é a primeira sílaba?

Alunos – LO.

P – Começa com que letra?

Alunos – „L‟.

A – LO.

P – Tudo bem, antes das férias estudamos palavras com „LA, LE, LI,

LO, LU‟... „LO‟ pode ter o som aberto „LÓ‟ e o som fechado „LÔ‟.

A – É um „S‟ tia.

P – Essa é a primeira sílaba. E a segunda?

Alunos – LO.

A – BO.

P – Muito bem. A gente estudou o „B‟? Através de que palavra?

A – BALÃO.

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P – Muito bem. A gente estudou o „B‟ e toda a família do „B‟, não foi?

Eu vou escrever „BA‟ ali? Se eu colocar o „BA‟, vai ficar como?

A – BALA.

P – Começa com „LO‟. Então fica?

A – LOBO.

A – „BO‟, tia! „BO‟.

P – Por que „BO‟? Porque o som... se eu for separar essa palavra fica

como? Larissa, venha aqui no quadro. Tente separar, „LO‟... muito

bem! É para separar com um tracinho, só pra gente ter ideia de que

são duas sílabas. O desenho vai ficar com vocês, vão apresentar.

Apresentar é mostrar o desenho. Quem não fez, faz agora. Depois vai

fazer a tarefa do caderno! (a aluna separou as sílabas, em seguida, a

professora apagou „LO – BO‟).

A – Tia, é pra fazer esse nome, é?

P – É, mas que nome é esse?

A – LOBÓ (pronúncia).

P – Não precisa dizer LÓBÓ, é LÔBO (pronúncia não artificializada).

(...)

Diante da realidade da maioria de nossas turmas, compostas, em geral, por um

quantitativo de alunos que excede o previsto em lei, a alternativa de tornar em objeto de

reflexão a dúvida de um aluno, sem que, para isso, o exponha, negativamente, diante da

turma, é extremamente plausível e se constitui, em nossa compreensão, numa das

possíveis alternativas de intervenção pelas mestras. Para que isso ocorra, é importante

“um conhecimento, por um lado, dos objetos linguísticos e das atividades de linguagem,

e, de outra parte, dos processos de aprendizagem da leitura e, enfim, das modalidades de

condução eficazes das atividades infantis”, conforme Goigoux (2002, p. 127)

Do mesmo modo que nos primeiros anos, verificamos uma visível opção das

professoras de segundo e terceiro anos quanto à correção no coletivo da turma, com as

seguintes proporções coletivo/individual: segundos anos (19/5) e terceiros (18/6).

É interessante destacar que, até o momento, os exemplos aos quais nos

reportamos, recaíram, somente, em situações de atividades que envolviam a construção

da escrita alfabética. Como as professoras monopolizavam os momentos de leitura e

algumas das situações de produção de textos, não ocorreram na mesma proporção que

as atividades focadas no sistema de notação alfabética. Com isso, mais uma vez

reiteramos que a natureza das atividades dizia (e muito), das intervenções que eram

adotadas pelas professoras.

A fim de examinarmos um pouco uma prática que fugia dessa lógica,

recorremos às correções coletivas realizadas pela professora do segundo ano da escola

B, a qual, no segundo semestre, investiu, essencialmente, na reescrita coletiva de contos.

Na primeira observação, após a leitura de um conto escrito pelos Irmãos Grimm,

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intitulado: „Os doze caçadores do rei‟, a mestra explorou a história oralmente com os

alunos, objetivando a posterior reescrita. Vejamos o que aconteceu em um trecho da

aula:

(Professora Bianca, 2º ano, Escola B, 1ª Observação)

(...)

P – Não. Vamos imaginar uma coisa. Quais são os personagens que

aparecem nessa história?

Alguns alunos – O príncipe, a princesa...

P – Quem mais?

A – O rei.

A – Tia, as doze caçadoras?

P – Doze?

A – Onze.

P – Isso. Se os irmãos Grim chegassem aqui e perguntassem como

você colocaria o nome do rei?

A – Jacó.

P – Jacó? E a princesa?

A – Isabel.

P – E o leão?

Alguns alunos – Simba.

P – O rei?

Alguns alunos – Lucas.

P – Desses personagens, quem vocês acham que é o mais importante?

Alguns alunos – O leão!!!!

P – O leão ajuda, mas é o mais importante?

A – A princesa.

P – Por quê?

A – Porque ela começa a história.

P – O que mais?

A – Porque ela teve o plano de doze caçadores.

P – Isso. Até porque como é o título da história?

Alguns alunos – „Os doze caçadores do rei‟.

(...)

Embora as correções tenham ocorrido, em sua maioria, no âmbito da reescrita

dos textos, chamamos a atenção para as intervenções mais específicas que estiveram

presentes naquela turma. Nessa mesma aula, a professora corrigiu a escrita do título

realizado por uma das alunas, afirmando a necessidade do „espaço entre as palavras‟,

assim como do uso da letra maiúscula.

A seguir, algumas ponderações finais.

Considerações Finais

Nosso objetivo, nesse texto, foi explorar as diferentes intervenções didáticas

realizadas pelas professoras, ocorridas tanto no âmbito individual quanto no coletivo da

sala de aula, referentes ao erro do aprendiz.

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Os dados revelaram uma predominância das correções na coletividade ao

compararmos com os erros cometidos individualmente. Atribuímos essa alternativa

didática a uma otimização do tempo na sala de aula e, de forma mais escassa, objetivava

explorar uma dúvida individual que poderia ser da coletividade.

De qualquer modo, as intervenções didáticas, sejam individuais e/ou coletivas,

majoritariamente, não contribuíram, conforme os dados dessa pesquisa, para uma

reflexão mais refinada do erro, a fim de superá-lo. Daí a relevância de superar a

proposta resolutiva, visto que não basta ao aluno acessar a resposta correta sem uma

reflexão cognitiva, conceitual; como em muitas ocasiões, ocorreu nas salas de aula por

nós acompanhadas.

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i Nesse sentido, analisamos que, mesmo na pedagogia tradicional, pode haver algum tipo de

diferenciação, ainda que ela não nos pareça adequada. Ou seja, não há necessariamente um ensino sempre

uniforme, mesmo no âmbito dos métodos. Todavia, a heterogeneidade não é vista com bons olhos e nem

como algo natural, mas, sim, como um desvio. ii A escolha dessas professoras ocorreu mediante a indicação da Secretaria de Educação do município de

Caruaru, que indicou professoras consideradas, pela rede municipal de ensino, como boas alfabetizadoras.

Em outras palavras, professoras que, ao final do ano letivo, conseguiam bons rendimentos, no que se

referia à alfabetização das crianças. Além disso, também buscamos encontrar essas boas alfabetizadoras

por meio da indicação de professoras e coordenadoras que atuavam na rede municipal de ensino. iii Nesse dia os demais alunos, com dificuldades de aprendizagem, mencionados no quadro, haviam

faltado. iv Ao considerarmos as modalidades de correção do erro individualmente e em grupo/coletivo,

respectivamente. v Respectivamente: escolas A, B e C.

vi Em geral, observamos que a mestra chamou ao quadro os alunos que conseguiam se sobressair nas

atividades por ela propostas. vii

Primeiros, segundos e terceiros anos.

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