OBRA RESENHADA- O Desaparecimento Da Infancia

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OBRA RESENHADA: POSTMAN, Neil. O desaparecimento da infância. Rio de Janeiro: Graphia, 1999. Tradução: Suzana Menescal de Alencar Carvalho e José Laurenio de Melo. PALAVRAS CHAVE: Infância. História. Comunicação de massa. Adultos. Desaparecimento. BIOGRAFIA DO AUTOR Foto: Reprodução Neil Postman [1931/2003] nasceu em New York e estudou na Universidade da Colômbia, onde fez carreira acadêmica chegando ao Doutorado em letras. Foi Diretor do departamento da cultura e de comunicação e Professor dessa renomada Universidade. Foi também colaborador de alguns jornais de grande circulação, como Tempos novos, Borne e Le Monde. Com formação básica em Sociologia, era um severo analista e crítico dos meios de comunicação, em particular à televisão, cuja visão era de que esse canal de informação tinha homogeneizado a política, impactando nos elementos do discurso, em prol da valorização da imagem visual do candidato. Entende que esse meio de comunicação, ao destruir os mecanismos de socialização, em particular a família e a educação, esteriliza a cultura e a sociedade.

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OBRA RESENHADA: POSTMAN, Neil. O desaparecimento da infncia. Rio de Janeiro: Graphia, 1999. Traduo: Suzana Menescal de Alencar Carvalho e Jos Laurenio de Melo.

PALAVRAS CHAVE: Infncia. Histria. Comunicao de massa. Adultos. Desaparecimento.

BIOGRAFIA DO AUTOR

Foto: Reproduo

Neil Postman [1931/2003] nasceu em New York e estudou na Universidade da Colmbia, onde fez carreira acadmica chegando ao Doutorado em letras. Foi Diretor do departamento da cultura e de comunicao e Professor dessa renomada Universidade. Foi tambm colaborador de alguns jornais de grande circulao, como Tempos novos, Borne e Le Monde. Com formao bsica em Sociologia, era um severo analista e crtico dos meios de comunicao, em particular televiso, cuja viso era de que esse canal de informao tinha homogeneizado a poltica, impactando nos elementos do discurso, em prol da valorizao da imagem visual do candidato. Entende que esse meio de comunicao, ao destruir os mecanismos de socializao, em particular a famlia e a educao, esteriliza a cultura e a sociedade.Dentre suas grandes obras, destaca-se: Ensinando atividade subversiva (1969); Lngua em Amrica (1974); Ensinando atividade conservada (1982); A dissipao da infncia (1984); Divertindo-se com a morte (1985); Como prestar ateno mostra da noticia na televiso (1994); O fim da instruo (1996); A rendio da cultura tecnologia (1994); O alvo da instruo (1999); Difuso Cultural (1994); O desaparecimento da infncia (1999); O fim da Educao (2002); etc. Visto a grande notoriedade das suas obras, que so traduzidas e lidas em boa parte do mundo, em especial no Brasil, em 1986 obteve o prmio George Orwell.No Brasil, o livro Desaparecimento da Infncia foi publicado em 1999 pela Graphia Editorial. Depois, a editora brasileira lanou, em 2002, outro livro de autoria de Postman sob o titulo de O fim da educao: Redefinindo o valor da escola, cujo autor examina os efeitos da devoo norte americana tecnologia, ao utilitarismo e ao consumismo desenfreado na educao.

PERSPECTIVA TERICA DA OBRA

Para analisar o problema levantado de que a infncia est desaparecendo, o autor se apia na linha de pensamento de Alfred Marshall e de McLuhan, cujo vis terico de que: Quando um artefato social torna-se obsoleto se transforma num objeto de nostalgia e de contemplao (POSTMAN, 1999, p. 19). A posio assumida por esses dois clssicos autores se traduz numa critica aos crticos sociais e historiadores, que tomaram a infncia como objeto de estudo apenas de maneira recente, embora o marco de partida desse fenomeno tenha sido a obra de Philippe Aris, Centuries of chilhood, publicada nos Estados Unidos, em 1962. Postman no apenas era discpulo de Alfred Marshall e de McLuhan, como a sua obra foi fortemente influenciada pelo pensamento desses tericos, na medida em que Postman tambm critica os historiadores de que a apropriao da infncia, como objeto de estudo, apenas sustenta a sua tese de que a infncia est em decadncia. Portanto, pelo olhar terico de Marshall, McLuhan e de Postman, a perda da infncia, como a prpria infncia, um fenmeno Histrico.

RESUMO DA OBRA

O contedo da obra de Postman est alocado em duas partes. Na primeira, sob o titulo de A inveno da infncia, o autor discute o surgimento e o desenvolvimento da ideia de infncia, com base nas condies e no desenvolvimento dos meios de comunicao que, no decorrer da histria, tornou a infncia desnecessria. Na segunda parte, intitulado de O desaparecimento da infncia, Postman discute o seu objeto de estudo nos tempos modernos, cujo enredo mostra que a evoluo dos meios de comunicao (prensa tipogrfica, telgrafo, grfica e as mdias eletrnicas) depreciou e transformou estrutura social, resultando na extino da infncia.No contexto pormenor, o livro est estruturado num total de 9 (nove) captulos, sendo quatro itens distribudos na primeira parte e os restantes cinco captulos constituem a segunda parte da obra. A isto se adiciona as partes pr textuais (prefcio e introduo) e a ps textuais (notas, referncias e ndice remissivo).Como um nato pesquisador, Postman inicia a sua obra com uma indagao instigante: O que podemos fazer a respeito do desaparecimento da infncia? Embora essa pertinente indagao esteja inclusa na introduo, Postman tira das suas responsabilidades a possibilidade de apresentar algum tipo de soluo para essa questo.Postman desenvolve seu estudo a partir de dois pressupostos, que busca (in)valid-los com o resultado da sua investigao: A infncia est desaparecendo e numa velocidade espantosa e, a outra, que os Norte americanos tem averso a ideia de infncia. Para corrobora esses pontos de vista, o autor descreve a histria da criana desde o Mundo antigo, perpassando pela Idade Mdia e Moderna at o perodo Contemporneo. Toma como objeto de estudo a linha divisria entre a infncia e a idade adulta, que tende a se apagar ao longo dos tempos. Nesse vis investigativo, Postman se preocupa com dois questionamentos bsicos: De onde vem a infncia? E porque estaria desaparecendo?

Primeira parte do livro

Postman inicia o Capitulo 1, intitulado de Quando no havia criana, afirmando que garotas de doze a treze anos so as modelos mais bem pagas dos Estados Unidos. So apresentadas ao pblico como se fossem mulhres adultas, espertas e, sexualmente, atraentes. So expostas num ambiente de erotismo, cujo simbolo valoriza a personifica a idade adulta.Antes de enveredar pelo surgimento da idia de infncia a partir da inveno da prensa tipogrfica no sculo XVI, Postman faz um retorno civilizao antiga, descrevendo como as crianas eram educadas e tinham acesso ao conhecimento. Para tanto, recorre alguns clssicos, como Xenofonte, Plato, Aristoteles, Socrates, entre outros, cuja abordagem sobre a criana era unnime em relacion-la a ideia de segredo, ou seja, as crianas no tinham acesso h muitas informaes e conhecimentos, que eram de exclusividade dos adultos.Fora os segredos, o autor nos relata que as crianas aprendiam mediante leitura, pois na poca havia dois tipos de alfabetizao: A socializada, onde uma parte do povo tinha acesso a leitura; e a Alfabetizao corporativa, que estava restrita a uma minoria, o que resultou na formao de uma classe privilegiada os Escribas. Alm dessa ciso, outro elemento que contribuiu para restringir a leitura, foi que naquele momento ainda no havia manufatura de papel e, portanto, inexistia livro.Postman discute a educao da criana no mundo antigo, fazendo uma comparao entre as cidades gregas de Atenas e de Esparta. Considera o autor que em Atenas a criana era educada e melhor preparada nos centros de ensino para ingressar no mundo dos adultos; enquanto em Esparta, a educao das crianas era voltada para a guerra, aprendendo apenas o necessrio. O modelo de educao grego, com referncia a Atenas, se difundiu para o mundo romano, cuja civilizao avanou no seguinte aspecto: Estabeleceu uma conexo - aceita pelo mundo moderno, entre a criana em crescimento e a noo de vergonha, tornando-se um crucial passo na evoluo do conceito de criana (POSTMAN, 1999, p. 22-23).Depois, Postman destaca as invases barbaras no Imprio romano que, alm de findar o perodo antigo, suplantou a cultura clssica, afetando diretamente a leitura, a escrita, a aprendizagem e a educao. Enfim, com o declnio da educao, na idade Mdia (idade das trevas) a criana passa absorver os conhecimentos no mais pela leitura, mas de modo oral, face a face. Esse novo ambiente informacional permitiu que as crianas passassem conhecer o mundo dos adultos, isto , a perda da capacidade de escrever e de ler no mundo medieval aproximou a criana do adulto na medida em que a fronteira do desconhecido deixou de existir.Ao colocar que, na idade mdia, o processo de aprendizagem se realizava mediante as interaes sociais, Postman acredita que a Europa teria voltado a condio natural, concepo essa sustentada por Rousseau que - em sua obra o bom selvagem, defendia a ideia de que: Os homens devem se abster dos livros e das leituras. [...] Ler o flagelo da infncia, porque os livros ensinam a falar de coisas das quais nada sabemos. Tambm porque a leitura cria a idade adulta (POSTMAN, 1999, p. 27).Para o autor os efeitos das invases barbaros no apenas foi sentido na cultura clssica, mas, sobretudo, fez desaparecer a vergonha e a prpria criana. Para se ter uma noo desse impacto no campo da educao, Postman enftico, ao afirmar que osindivduos- mesmos letrados, tinham grande dificuldade de dominar um texto, cujo leitor tipico medieval:

Procedia como um aluno iniciante no aletramento, pronunciando palavra por palavra, murmurando para si mesmo e em voz alta, sendo o dedo apontado em cada palavra, como estivesse esperando que algumas delas fizessem algum sentido (POSTMAN, 1999, p. 26).

A desvalorizao da alfabetizao, da leitura e da criana pode ser percebido num pequeno trecho da obra de Postman: No mundo medieval no havia nenhuma concepo de desenvolvimento do termoinfncia [...] Ao contrrio da civilizao antiga, o mundo medieval no tinha ideia alguma de educao (POSTMAN, 1999, p. 29). Prova do descaso para com a criana que a palavra Child expressava lao de parentesco, e no criana como significa nos dias atuais. Ao contrrio da civilizao antiga, na idade mdia a criana no sentido nato da palavra praticamente inexistia, diferenciando-se do adulto apenas em duas coisas: Na capacidade de fazer sexo e de participar das guerras. Fora essas duas situaes, a criana reproduzia os mesmos atos de um adulto, o que explica o modelo de criana retratado nas pinturas da poca: Crianas como adultos em miniaturas (POSTMAN, 1999, p. 32).No capitulo 2, intitulado de A prensa Tipogrfica e o novo adulto, o autor inicia essa parte colocando que necessrio redefinir a concepo da vida adulta. Busca mostrar como a advento da tipografia, no sculo XVI, criou um novo mundo simblico [o da infncia], o que exigiu mudanas no conceito do ser adulto,extinguindoa criana desse mundo. Coloca ainda o autor que a tipografia foi o primeiro invento que se traduziu em disputaantagnicas haja em vista que a possibilidade de ter asprpriaspalavras impressas, como sua difuso, gerou a individualidade, gerando a corrida na busca por conhecimento (POSTMAN, 1999, p. 35).O autor considera o sculo XVI como um divisor de guas na historia da criana, cuja retomada da alfabetizao socializada e a capacidade de ler passaram a determinar a idade adulta e, por outro lado, a concepo de infncia passou a ser definida pela incapacidade da leitura, sendo que esse iderio valorizou a familia e a escola. A intima relao entre o surgimento da prensa tipogrfica e o desenvolvimento da concepo de infncia sustentada por Innis:

As mudanas na tecnologia da informao tm trs tipos de efeitos Alteram as estruturas de interesses (pensamento); alteram ocarterdos simbolos (objetos de que pensamos); e alteram a natureza da comunidade, isto , como os pensamentos se desenvolvem (POSTMAN, 1999, p. 35).

Na medida em que os materiais impressos foram se aperfeioando, foi se criando condies para se organizar os contedos (livro) que, por sua vez, promoveu nova maneira de organizar o pensamento, cuja mudana possibilitou a tipografia florescer a infncia (individualismo), em detrimento das interaes sociais (POSTMAN, 1999, p. 43). Mais que isso: Postman considera que a difuso do conhecimento fez surgir o homem letrado, que ps fim o ser criana, cuja fase medieval nem os jovens e nem os velhos sabiam ler, visto que ambos estavam em um mesmo contexto. Desde ento, um individuo para entrar no mundo dos adultos, tinha que saber ler, o que exigia para isso de educao, isto , a civilizao europia reinventou as escolas e, ao faz-las, transformou a infncia em uma necessidade (POSTMAN, 1999, p. 50).No Capitulo 3, intitulado de Os incunbulos da infncia, o autor descreve operododo bero da prensa tipogrfica, cujo produto foi a valorizao do iderio do surgimento da infncia. Nesse contexto, o termo infncia se firmou e passou ser um objeto de: Respeito, como sendo uma criatura especial, de outra natureza e com necessidades distintas dos adultos e, por isso, deveria ficar protegido. Essa nova concepo fez ampliar a alfabetizao socializada e o uso de livros como instrumento de educao, embora, a partir de meados do sculo XVII, o segmento da igreja Catlica se demonstrasse contrria a essa politica, cuja divergncia o autor retrata numa seguinte passagem de sua obra:

A igreja catlica passou a considerar a proliferao do uso da leitura como um elemento desintegrador, coimbindo a alfabetizao socializada, como tambm a leitura da Biblia verncula. Essa oposio catlica fez surgir as heresias. Por outro lado, os protestantes se apropriaram da literatura para disseminar o cristianismo (POSTMAN, 1999, p. 52).

Uma das consequencias da ciso entre catlicos e protestantes em relao a prensa tipogrfica, o autor destaca que foi uma inverso geogrfica intelectual: Se por um lado, a populao prostentante passou a ter acesso ao conhecimento, em funo da leitura; por outro, os os catlicos permaneceram sob o manto da ignorncia. Essa questo religiosa explica o porque o catolicismo se firmou como uma religio da imagem (culto aos santos) e oprotestantismose desenvolveu como religio do livro - uso dabblia (POSTMAN, 1999, p. 53).No Capitulo 4, intitulado de A jornada da infncia, Postman inicia enfatizando o processo de depreciao e de perda da ideia de infncia, reportando-se especificamente para aInglaterrano periodo da expanso industrial nas grandes cidades. Relata o autor que as crianas tornaram-se objeto de mo de obra para o setor fabril, cuja descrio de uma menina de oito anos sobre um dia de labuta, em meados do sculo XIX, a seguinte: Entro s quatro e saio s cinco e meia. Nunca durmo. s vezes canto quanto tenho luz, mas no escuro no ouso a cantar (POSTMAN, 1999, p. 67).Da Inglaterra, o autor se reporta para a Frana, cujo empeclio a alfabetizao e a educao no se deram a partir do capitalismo industrial, mas dos jesuitas [catlicos] que temiam o avano do protestantismo na Europa (POSTMAN, 1999, p. 69). Embora da oposio das mquinas (Inglaterra) e dos Catlicos (Frana), o autor frisa que a educao e, por conseguinte, a ideia de infncia, vinha se fortalecendo desde o sculo XVIII, por ocasio do surgimento do movimento Iluminismo que, tendo John Loocke e Roseau como expoentes, sustentou oclimaintelectual da poca (POSTMAN, 1999, p. 70).Tanto que com o seu livro Pensamento sobre educao, Locke exerce forte influncia na disseminao da ideia de infncia e, acima de tudo, promoveu a teoria da infncia, ao expr a seguinte ideia: Ao nascer a mente uma folha em branca, uma tbula rasa. Por esse entendimento, a responsabilidade do que ser inscrito na mente recai sobre os mestres, professores, pais, governos, enfim e delegado a terceiros (POSTMAN, 1999, p. 71).Rousseau, por seu turno, contribuiu com o iderio de infncia, ao acreditar que: A criana importante em si mesma, e no meramente como um meio para um determinado fim; pensamento esse que se diferenciava da posio de Locke, que via na criana umpotenciala ser desenvolvido (POSTMAN, 1999, p. 72).Quando a infncia ingressou no sculo XIX e, ao mesmo tempo, quando penetrou no novo mundo, o autor mostra que havia claramente duas linhas de pensamentos sobre a infncia: A corrente lockiana ou protestante e a corrente rousseuaniana ou romantica, sendo que:

Na viso protestante, a criana era uma pessoa amorfa que, por meio da educao e do auto controle da vergonha, podia se tornar um individuo adulto civilizado. Na viso romntico, por outro lado, no a criana amorfa, mas o adulto deformado que constitui o problema, ou seja, a criana possui, como direito inato, aptides para a sinceridade, compreenso, curiosidade eespontaneidade aos quais so amortecidos pela educao e pelo auto controle da vergonha (POSTMAN, 1999, p. 74).

A partir dessas duas concepes predominantes, Postman aponta que outros tericos passaram a contestar ou legitimar tais linhas de pensamento. Por exemplo, enquanto Freud refutava as ideias de Lock e Rosseau; Dewey entendia ser os pais que deveriam indagar s crianas: Do que elas precisavam? Embora das contestaes, o autor acredita que Freud e Dewey cristalisaram o paradigma da infncia, que vinha se formando desde o surgimento da prensa tipogrfica: A criana como aluno, cujo ego e individualidade deveriam ser preservados por cuidados especiais, onde o auto controle, a satisfao adiada e o pensamento lgico deveriam ser ampliados, sob o controle dos adultos (POSTMAN, 1999, p. 77).Segunda parte do livro

Nessa parte da obra o autor incursiona no Capitulo 5 (o principio do fim), cujo limite temporal so os anos de 1850 a 1950, abordando o preamar da infncia. Para o autor, essa fase de 100 anos representou a tentativa de por todas as crianas fora das fbricas e dentro das escolas, das prprias roupas, do prprio imobilirio, da prpria literatura, do prprio jogo. Enfim, trata-se de uma fase que buscou colocar a criana dentro do seu prprio mundo, afastando-se das contendas da vida adulta, cujo recorte espacial passa ser os Estados Unidos.Todavia, antes de apontar os indcios do desaparecimento da infncia, o autor faz uma importante observao: Como veio sendo trabalhada como direito nato da pessoa no contexto da classe social, no inicio do sculo XX a infncia foi definida como uma categoria biolgica, em detrimento da cultura, como deveria ser (POSTMAN, 1999, p. 81). O contexto social daquele periodo (1850/1950) indicava que os simbolos que tinham sustentado a infncia comeavam a se desmoronar, reflexo da publicao da primeira mensagem eltrica, sob o invento de Samuel Morse no final do sculo XIX.Postman percebe que o invento de Morse surtiu os seguintes efeitos: Mudou o carater da informao, passando do pessoal/regional para o impessoal e global; criou um pblico e um mercado com noticias fragmentadas, descontinua e irrelevante, sendo at hoje a principal materia prima da indstria de noticia, ou seja, transformou a informao - antes um bem pessoal, em mercadoria. Com tais mudanas, o autor explica que: [...] Ningum foi mais responsvel pelas noticias: O telegrfo dirigia-se ao mundo, e no mais s pessoas (POSTMAN, 1999, p. 85).Na avaliao do autor, o novo contexto nos meios de comunicao, delimitado pelotelgrafo impactou diretamente na infncia, visto que desde a tipografia, a subsistncia da infncia dependia estritamente dos principios da informao controlada e da aprendizagem sequencial. Porm, o autor contundente, ao considerar que: A instituio dotelgrafocolocou tudo isso por terra, pois - ao invadir os lares e as escolas, colocou o controle da informao em cheque, cuja disseminao da informao possibilitou maior acesso das crianas (POSTMAN, 1999, p. 86).Alm dotelgrafo outros elementos (como a revoluo grfica, fotografia, cinema; etc.) foram determinantes para desburocratizar o conhecimento e as informaes, que at ento, estavam sob odomniodos adultos. Mais que a velocidade da transmisso da informao, o autor aponta que: O surgimento da imagem mudou a prpria forma da informao, passando de discursiva para no discursiva; de proposicional para a proposicional; de racionalista a emotiva (POSTMAN, 1999, p. 87). Trata-se do surgimento da televiso, cuja veiculao da imagem sacramentou a proliferao das informaes no meio pblico. Para se ter uma noo do seu poder, o autor afirma que a imagem de um candidato tornou-se mais patente do que a sua plataforma de governo (POSTMAN, 1999, p. 87).Essa mudana de percepo trazida pelo meio televisivo, conjugada com a competio da velocidade dos meios de comunicao, com mais intensidade em 1950, que criaram um ambiente para odeclnioda infncia, visto que:

A competio da velocidade da informao e da imagem produzida em massa tornou a infncia obsoleta, ao mesmo tempo que foi concebida como um acessrio permanente, periodo esse em que a televiso se instalara firmemente nos lares americanos (POSTMAN, 1999, p. 89).

No contexto da evoluo dos meios de comunicao, o autor faz um retrospecto, afirmando que assim como os escribas tiveram seu monoplio de conhecimento destroado pela prensa tipogrfica; tambm o monoplio do livro foi destronado pelo o advento da mensagem eltrica e amdiaeletrnica, o que permitiu maior acesso de informao por parte da populao infantil. E mais: Na televiso a imagem que domina a conscincia do telespectador e conforma os significados, isto , as pessoasvemteleviso, e no lem, sendo o quevemso imagens em constantedinmica (POSTMAN, 1999, p. 92). Afinal, assistir televiso requer apenas conhecimentos instantneos de padres, e no de decodificaoanaltica assim como tambm exige percepo, e no concepo, visto que assim como no exige habilidade, tambm no agrega nenhum atributo no individuo, como ocorre com a leitura de um livro.No Capitulo 6, intitulado de O meio que escancara tudo, o autor comea descrevendo um individuo que, num programa na TV, tenta vender um pouco de tudo e com pouca delimitao de fronteira entre os produtos. Em seguda, o autor retoma o fator vergonha, que separava a criana do adulto at o fim da idade mdia, apontando que seu fundamento residia na concepo de que:

A civilizao no podia viver sem o controle dos seus impulsos, como o da agresso e o da satisfao imediata, pois os indivduos esto expostos aos constantes perigos dabarbrie(violncia, promiscuidade e egoismo). A vergonha , assim, o mecanismo para conter abarbrie(POSTMAN, 1999, p. 99).

O autor discorda que a vergonha possa funcionar como mecanismo de controle social ou de diferenciao de papeis numa sociedade que no sabe guardar segredos, pois acredita que a vergonha (como por exemplo na violncia) acaba quando a fonte que a esconde acaba. Porm, com a predominncia da televiso e com o fim da vergonha, o autor faz a seguinte critica: Parece que estamos retomando s condies do sculo XIV, quando nenhuma palavra era considerada imprpria para os ouvidos de um jovem (POSTMAN, 1999, p. 103).A televiso, ao tornar pblica todos os tipos de informaes, tanto a autoridade do adulto, quanto a curiosidade da criana, perderam terreno, haja em vista que a vergonha estava enraizada na ideia de segredo. Esse o argumento central descrito por Postman para o desaparecimento da infncia que, de outra maneira, pode ser concebida por Mead como Crise da f, cujo pensamento de que no h pessoa mais velha que saiba mais que um jovem e sobre o que este est vivnciando (POSTMAN, 1999, p. 103).Postman acredita que, na atualidade, o grande problema a explorao da sua matria prima (violncia, estrupo, assassinatos, drogas, etc.), que difundida mundialmente, colocando tais realidade em contato com o mundo jovem que, muitas das vezes, induz esse a reproduzir cenas de barbarie. Neste ponto, Postman catedrtico, ao afirmar que isso nada mais do que a televiso revelando os segredos dos adultos (POSTMAN, 1999, p. 109). Nesse momento oportuno, o autor apresenta dois indicativos de que a televiso excepert em revelar segredos: A vulnerabilidade dos liderespolticos quando este assunto era objeto de revistas; e as fraquezas do corpo humano, pois por muito tempo as graves doenas ficaram ocultas s crianas (POSTMAN, 1999, p. 110). E completa: Ao ter acesso ao fruto antes proibido pelo mundo adulto, osindivduosforam expulsos do jardim da infncia (POSTMAN, 1999, p. 111).No Capitulo 7, intitulado de O adulto criana, a parte do trabalho em que o autor defende a sua tese de que a infncia est desaparecendo, comeando pela descrio de um comercial de televiso, onde me e filha pouco apresentam distino de idade, isto , a televiso tenta passar a imagem de que as diferenas entre adultos e crianas esto desaparecendo. Argumenta o autor que, assim como a midia eletrica deslocou a alfabetizao para a periferia da cultura, redefinindo a idade adulta; a televiso promoveu mudanas, visto que ela gerou trs etapas: Os recm nascidos, o adulto-criana e os senis (POSTMAN, 1999, p. 113).Um dos pontos altos desse capitulo, quando Postman - ao fazer um parmetro do adulto-criana da idade mdia, cuja concepo normal era a ausncia de alfabetizao e de disciplina/aprendizagem para ser tornar um adulto; faz a seguinte indagao: Porque o adulto-criana est surgindo como normal na cultura da sociedade contempornea? A resposta a seguinte: Como na arena simblica, o crescimento humano muda na forma e no contedo em especial no sentido de no exigir diferenciao de sensibilidade do adulto e da criana, as duas etapas de vida (adulto/criana) se fundem numa s (POSTMAN, 1999, p. 113). Essa a construo terica de Neil Postman como produto da obra o desaparecimento da infncia.Alm de apontar a televiso ser o fator crucial do desaparecimento da infncia, Postman questiona e rebate a ideia de que esse meio de comunicao tem como papel manter o pblico informado. O argumenta que, dado o poder dinmico das imagens, a televiso, gera dois efeitos: Torna dificil pensar sobre um acontecimento (sua Histria, significado, causas, etc.) e torna dificil sentir algo sobre um dado evento, ou seja, quais as reaes humanas aos homicidios estrupo, incendios, corrupo, entre outros. E mais: As noticias que esse canal de comunicao difunde representa: Um entretenimento, um mundo de artificios e de fantasias montado para produzir uma determinada srie de efeitos a fim de deixar a platia rindo, chorando e estupefada. [...] O efeito trivializar a ideia de homem poltico para destruir a compreenso do adulto e da criana (POSTMAN, 1999, p. 121).Outra concepo desenvolvida por Postman a respeito da televiso que ela aproxima a idade adulta do mundo da criana, na medida em que torna tudo concreto, em detrimento da abstrao. Tambm a televiso est estritamente ligada a dominncia das imagens e das figuras, recursos esses natos ao mundo infantil. Por outro lado, embora parea contraditrio, Postman diz no ser contra a televiso, visto que sua obra apenas: Descreve as limitaes desse meio de comunicao e os efeitos de tais limitaes, pois depende muito de como entendemos a natureza desse poderoso meio transformador de cultura (POSTMAN, 1999, p. 132).No Capitulo 8, intitulado de A criana em extino, o autor nos mostra alguns indicativos do desaparecimento da infncia, cujos elementos so de vrias naturezas, como bem lista o autor:- Vestimento, cuja consequncia no comportamento de uso de traje alterou a industria de roupas infantis, pois garotos de 12 anos passaram a usar ternos em festa de aniversrios,- Sexo, cujo tempo de puberdade feminina vem diminuindo. Se nos anos de 1900, a idade mdia da menstruao era de 14 anos; em 1979, esse indicativo passou para 12 anos,- Preferncia, cuja brincadeira (de criana) com recursos infantis diminuiu. Essa situao foi sentida na reduo da arrecadao da Walt Disney,- Jogo, que fez aumentar o ingresso dos jovens nas atividades profissionais do adultos, em detrimento dos jogos e das brincadeiras infantis, e- Entretenimento, que tem levado aos jovens a optar pelos programas de adultos, seja na TV, cinema, em videos, etc.O autor observa que, junto com essa mudana de comportamento, muitos valores, inerentes a categoria infantil, se perderam, principalmente queles referentes as formas de tratamento com os mais velhos, como obrigado. O Fim da infncia reforada por outras tendencias, como: Aumento da criminalidade infantil, elevado nivel de atividade sexual dos jovens e o aumento dos partos em adolescentes, aumentando as doenas venreas; aumento do alcoolismo dentre a populao jovial, etc. Corrobora tambm o fim da infncia o fato de que muitasinstituiespassaram a promover uma poltica no sentido de resgatar o Direito de ser (da) criana, a partir de dois argumentos: a) A criana desejvel, mesmo que frgil, necessitando de proteo dos maus tratos; b) O termo criana em si representa uma ideia opressiva e que tudo deve ser feito para liberar os jovens de tais restries.No Capitulo 9, intitulado de Seis perguntas, Postman conclui sua obra chamando ateno do leitor com meia duzia de indagaes, cujas reflexes se deu durante o processo de confeco desse livro. Coloca ainda o autor que, alm de servir para o leitor refletir sobre a temtica, tais perguntas so uma forma de compensar a ausncia de respostas para o problema do desaparecimento da infncia, dentre as quais se destaca: A infncia foi descoberta ou inventada? O declinio da criana significa um declinio geral da cultura americana? At que ponto a maioria moral e outros grupos fundamentalistas podem contribuir para a preservao da infncia? Haver tecnologias de comunicao que tenham potencial para sustentar a necessidade de infncia? Haver instituies sociais suficientes fortes esuficientementeempenhadas em resistir o declinio da infncia? Ser que o individuo se tornou impotente para resistir o que est acontecendo?Considerando que a televiso o meio de comunicao que mais contribui para degradar a infncia, Postman apresenta a seguinteprescrio A sada reduzir e no proibir, o uso desse recurso informativo, como tambm puxar uma discusso critica a respeito do contedo do que est sendo visto, sob pena de no reproduzir e banalizar atos de barbarie televisivos pela populao jovem.E, para encerrar a construo da sua obra, o autor nos apresenta a sintese do seu livro:

Assim como a alfabetizao fontica alterou as predisposies da mente em Atenas no sculo V a. C. ; assim como o desaparecimento da alfabetizao social ajudou a criar a mente medieval; assim como a tipografia aumentou a complexidade do pensamento, mudando o contedo da mente, no sculo XVI; a televiso tornou para ns desnecessrio distinguir a criana do adulto (POSTMAN, 1999, p. 132).

Mas que demonstrar a evoluo dos meios de comunicao, que coloca em risco a permanncia da infncia na contempornea sociedade, o autor manifesta ser favorvel infncia, Postman (1999, p. 167) enfatiza e conclui que: As pessoas no devem esquecer que as crianas precisam de infncia e, quem tomar isso como aprendizado, est prestando um nobre servio a humanidade (Grifo do resenhista).

POSIES DEFENDIDAS PELO AUTOR

Postman apresenta uma consistente argumentao histrica para sustentar a sua tese de que a infncia est desaparecendo, tornando vlida a sua posio de que esse fenmeno produto do desenvolvimento dos meios de comunicao, em particular a televiso, que torna pblica toda e qualquer tipo de informao, deixando de lado os segredos e a vergonha.Alm de associar o fim da infncia ao surgimento da televiso, o autor desenvolve a ideia de que os meios de comunicao afetam diretamente o processo de socializao, em especial a famlia e a escola, indicando que os condicionantes do desaparecimento da infncia residem no ambiente informacional.Outra ideia desenvolvida pelo autor que a mdia eletrnica de fcil compreenso, enquanto a mdia impressa exige concepo critica. Por outro lado, no fica claro no decorrer do livro a posio assumida por Postman frente as duas matriz tericas (Lockeana/Rosseuana) que deram embasamento para o desenvolvimento do termo infncia, porm o autor critica algumas correntes de pensamento, como a linha psicolgica da educao, incluindo o destacado Jean Piagt, visto que - em seus trabalhos, no contestam e nem abrem uma discusso de que as crianas sejam diferentes dos adultos ou que devem, paulatinamente, alcanar a idade adulta.

CONTRIBUIO DA OBRA

A grandecontribuiode Postman foi a construo da seguinte teoria: Como na arena simblica, o crescimento humano muda na forma e no contedo em especial no sentido de no exigir diferenciao de sensibilidade tanto do adulto como da criana, essas duas etapas de vida se fundem numa s. Neste ponto, o autor d subsdios que explicam ser o meios de comunicao responsveis pelas mudanas de comportamento das crianas. Alm desse arcabouo terico, Postman responde as duas perguntas, que norteou a construo do seu livro:a) De onde vem a infncia? Foi uma necessidade inventada pelos meios de comunicao, tendo como marco tecnolgico a prensa tipogrfica;b) Porque estaria desaparecendo a infncia? A hiper concorrncia de informao e de imagens dos meios de comunicao por maior fatia de mercado audiovisual, ao invadirem os lares/escolas, destroem valores e corroem a estrutura social, cujo impacto na infncia.A grande contribuio social da obra de Postman que ele chama ateno dos pais no apenas para a reduo do tempo de permanncia da criana frente televiso, como tambm a favor de uma discusso a respeito do contedo veiculado pelo meio televisivo, o que certamente diminui os impactos das cenas de barbarie no comportamento das crianas. Agindo desse modo, os pais podem resgatar a sua autoridade no no sentido de saber mais que as crianas, mas lhes orientar quanto as debeis realidades disseminadas nos meios de comunicao de massa.

ANALISE CRTICA SOBRE OBRA

Na trajetria do desenvolvimento dos meios de comunicao, acredita-se que a indstria capitalista e a igreja catlica, ao se demonstrarem contrrias alfabetizao socializada, contriburam para retardar o desenvolvimento intelectual no final da idade mdia que, o que se refletiu no desenvolvimento da gerao presente, resultando numa classe pouca letrada.O estudo histrico de Postman explica muitos fenmenos que ocorrem na atualidade, com relevncia no campo da educao. O conhecimento deixou de ser algo exclusivo dos livros e/ou dos professores, visto que o alunado se antecipa s informaes, seja pela televiso, celular, internet, etc. Mais que isso: O respeito ao educador, como tambm aos mais velhos, deixou de ser uma referncia de disciplina na escola.Outra aprendizagem que se teve do estudo que, assim como o segredo e a vergonha representaram a linha de fronteira entre a fase da criana e adulta; nos dias atuais tambm requer um parmetro que venha excluir a criana de muitas informaes que venham degradar essa fase de vida, linha essa que teve pouco poder de explicao conceitual por parte do autor, indicando um vasto campo para se produzir estudo.Entendemos que a concepo de Postman tem maior notoriedade nesse inicio do sculo XXI, quando observamos jovens, ainda de idade pr matura, ocupados ao mesmo tempo, em vrias atividades, como estudo, trabalho/estgio, curso de lngua estrangeira e/ou atividades complementares. Enfim, so crianas que assumem responsabilidades, passando ter imagem de adulto, cuja autonomia resulta na perda da funo dos pais como conselheiros dos filhos.Como a infncia foi uma necessidade inventada pelos meios de comunicao, plausivel afirmar que a escola e a famlia, como instituies educadoras, so termos burgueses, na medida em que surgiram para atender interesses mercadolgicos, percepo essa que se reproduz no EUA na medida em que preferem a indstria televisiva, que fatura alguns zilhes de U$$, em detrimento da afirmao da criana no seio social, justificando averso americana infncia.Como aprendizagem dessa resenha, apresenta-se a seguinte sintese: O desenvolvimento dos meios de comunicao, iniciado pela prensa tipogrfica at o surgimento da televiso, assim como inventou a criana, tambm foi responsvel pela corroso e fim da infncia. O termo infncia, portanto, foi inventado e se desenvolveu a sombra do surgimento e da evoluo dos meios de comunicao, em particular a televiso, entre outras mdias eletrnicas afins.Como titular dessa resenha, acredita-se que os profissionais da educao no podem ficar refns dos meios de comunicao, como a televiso, e como tambm a internet, mas, sim devem tomar essas fontes de informao como recurso em prol do aprendizado e do crescimento dos alunos, isto , essas mdias devem sair do campo da xenofobia e se transformar em recursos pedaggicos. As cenas violentas devem ser trabalhadas em sala de aula, no sentido de educar o alunado quanto a sua nocividade, sob pena do papel do educador de difundir conhecimento e cincia desaparecer no atraente contexto das imagens televisivas e computacionais.

Graduado em Cincias econmicas pela Universidade Federal do Par. Atou como professor [leigo] na rede pblica de ensino no Municpio de Marituba, Estado do Par, por quatro anos [2004/2008].Registro no CNPq:http://lattes.cnpq.br/3841025922510505