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IBSN: 978-85-7282-778-2 Página 1 OCORRÊNCIA E DISTRIBUIÇÃO DE MICROPLÁSTICOS NO LITORAL DA ILHA GRANDE (ANGRA DOS REIS, RJ) Andrea Viana Macedo (a) , André Luiz Carvalho da Silva (b) , Emanuelle Assunção Loureiro Madureira (c) (a) Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia, Departamento de Geografia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, [email protected] (b) Professor adjunto do Departamento de Geografia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, [email protected] (c) Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia, Departamento de Geografia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, [email protected] Eixo: Zonas costeiras: processos, vulnerabilidades e gestão Resumo Este trabalho objetiva caracterizar a ocorrência, distribuição e as fontes de resíduos sólidos no litoral da Ilha Grande (Angra dos Reis, RJ) e o papel dos processos costeiros na distribuição destes materiais. A área de estudo possui cerca de 100 praias, sendo parte delas voltadas para o norte e outra para o sul. A biodiversidade local e os sistemas costeiros têm seu equilíbrio constantemente ameaçado pela expansão do turismo e das atividades petrolíferas na região. A metodologia deste estudo consiste na coleta de materias em 10 praias localizadas ao redor da ilha e análises laboratoriais para a extração e classificação de microplásticos. Os resultados mostram uma ocorrência maior de microplásticos nas praias localizadas na borda sul da ilha, com destaque para Dois Rios; na face norte, a maior quantidade de microplásticos foi verificada na praia de Abraãozinho. Fragmentos de microplásticos são predominantes, seguidos por fibras, isopor e pellets. Palavras chave: poluição marinha; dinâmica costeira, Ilha Grande-RJ. 1. Introdução A Ilha Grande está localizada no município de Angra dos Reis no litoral sul do estado Rio de Janeiro (Figura 1) e possui cerca de 100 praias distribuídas ao longo de 155 km de litoral. Essa região recebe uma grande quantidade de turistas durante o ano todo, sendo maior nos meses mais quentes, o que tem contribuído para o acúmulo de resíduos sólidos na

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OCORRÊNCIA E DISTRIBUIÇÃO DE MICROPLÁSTICOS NO

LITORAL DA ILHA GRANDE (ANGRA DOS REIS, RJ)

Andrea Viana Macedo (a), André Luiz Carvalho da Silva (b), Emanuelle Assunção Loureiro

Madureira (c)

(a) Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia, Departamento de Geografia,

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, [email protected] (b) Professor adjunto do Departamento de Geografia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro,

[email protected] (c) Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia, Departamento de Geografia,

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, [email protected]

Eixo: Zonas costeiras: processos, vulnerabilidades e gestão

Resumo

Este trabalho objetiva caracterizar a ocorrência, distribuição e as fontes de resíduos sólidos no

litoral da Ilha Grande (Angra dos Reis, RJ) e o papel dos processos costeiros na distribuição

destes materiais. A área de estudo possui cerca de 100 praias, sendo parte delas voltadas para o

norte e outra para o sul. A biodiversidade local e os sistemas costeiros têm seu equilíbrio

constantemente ameaçado pela expansão do turismo e das atividades petrolíferas na região. A

metodologia deste estudo consiste na coleta de materias em 10 praias localizadas ao redor da ilha

e análises laboratoriais para a extração e classificação de microplásticos. Os resultados mostram

uma ocorrência maior de microplásticos nas praias localizadas na borda sul da ilha, com destaque

para Dois Rios; na face norte, a maior quantidade de microplásticos foi verificada na praia de

Abraãozinho. Fragmentos de microplásticos são predominantes, seguidos por fibras, isopor e

pellets.

Palavras chave: poluição marinha; dinâmica costeira, Ilha Grande-RJ.

1. Introdução

A Ilha Grande está localizada no município de Angra dos Reis no litoral sul do

estado Rio de Janeiro (Figura 1) e possui cerca de 100 praias distribuídas ao longo de 155 km

de litoral. Essa região recebe uma grande quantidade de turistas durante o ano todo, sendo

maior nos meses mais quentes, o que tem contribuído para o acúmulo de resíduos sólidos na

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ilha. Este cenário demanda ações voltadas para a preservação dos diversos ecossistemas

presentes na Ilha Grande e a manutenção das atividades de subsistência da população local.

Figura 1 – Localização da área de estudo. Fonte: Baptista (2017) adaptada por Ana Beatriz Pinheiro.

A dinâmica dos ambientes costeiros é o resultado da influência de uma variedade de

processos de natureza física, tais como, a ação das ondas, das correntes, dos ventos, das marés

que promovem oscilações diárias do nível do mar. As áreas litorâneas são constantemente

ameaçadas e impactadas por atividades antrópicas, colocando em risco os ambientes costeiros

e as populações que vivem deste ambiente. A ocorrência e a dispersão de resíduos sólidos em

ambientes litorâneos são complexas, pois envolvem uma grande variedade de fontes que

podem estar relacionadas com fatores locais (uso e ocupação) e externos (oriundos do mar). O

incremento do turismo na Ilha Grande no decorrer das últimas décadas, e os impactos

diretamente associados às atividades decorrentes desse aumento, tem preocupado moradores e

frequentadores, e aumentam a necessidade de desenvolvimento de pesquisas voltadas para a

preservação deste conjunto de ecossistemas singular no litoral fluminense. Diante do exposto,

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esta pesquisa tem como objetivo caracterizar a poluição por microplásticos no litoral da Ilha

Grande (Angra dos Reis, RJ) para compreender o papel das áreas fontes e dos processos

costeiros no transporte e deposição de materiais. As praias escolhidas para a elaboração do

presente estudo (Figura 2) foram selecionadas de modo que permita a compreensão do papel

da dinâmica costeira que, na Ilha Grande ocorre de maneira distinta entre a face sul (mais

exposta às ondas oceânicas) e norte (mais abrigada), conforme Gralato (2016). Neste sentido,

foram selecionadas as praias de Grande Araçatiba, Japariz, Abraão, Abraãozinho e Pouso,

voltadas para o continente; Lopes Mendes, Dois Rios, Parnaioca, Aventureiro e Meros,

voltadas para o Oceano Atlântico (Figuras1 e 2).

Figura 2 – Praias estudadas. Praias no litoral da Ilha Grande voltadas para o continente (face norte):

Grande Araçatiba (A); Japariz (B); Abraão (C); Abraãozinho (D) e Pouso (E). Praias voltadas para o oceano

(face sul): Lopes Mendes (F); Dois Rios (G); Parnaioca (H);Aventureiro (I) e Meros (J).

Os impactos causados por resíduos sólidos nos litorais, em especial, nas praias, tem

despertado o interesse de diversos autores, preocupados com os danos causados por lixo nos

ecossistemas costeiros e à saúde humana (COE e ROGERS, 1997, SANTOS et al., 2008;

RYAN et al., 2009; MACHADO & FILLMANN, 2010; BAPTISTA NETO e FONSECA,

2011; FARIAS, 2012; CARVALHO e BAPTISTA NETO, 2016; SANTANA NETO et al.,

2016). Tais impactos tendem a comprometer o equilíbrio dos ecossistemas marinhos e

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costeiros, além de oferecer risco para a saúde dos banhistas e prejudicar diretamente as

atividades essenciais à economia local (SANTOS et al., 2008; FARIAS, 2012). Essa questão

passou a ser tratada com maior relevância após a publicação da lei n° 12.305 de 02 de agosto

de 2010, quando o tema poluição por resíduos sólidos tornou-se mais evidente na mídia, nas

pesquisas científicas e em programas de educação ambiental. Coe e Rogers (1997) definem

lixo como sendo qualquer resíduo sólido de origem humana que foi inserido no ambiente

marinho pela ação antrópica. De acordo com Somerville, et al. (2003) os resíduos sólidos

podem ser provenientes de quatro fontes principais: (1) turismo e atividades recreativas, (2)

atividades pesqueiras, (3) esgotos e (4) navegação. De acordo com Cheshire et al. (2009) a

duração do resíduos sólidos no ambiente pode ser longa, considerando a sua composição, o

que passa a ser muito preocupante devido ao seu comportamento no meio ambiente, onde os

materiais são expostos à dinâmica de ondas e correntes, a exposição solar e a temperatura.

Entre os resíduos sólidos, os plásticos estão entre os materiais que mais predominam nos

ambientes costeiros e marinhos (COE e ROGERS 1997; UNEP 2005; BAPTISTA NETO e

FONSECA, 2011). A proporção de lixo composto por plástico aumenta com a distância em

relação às áreas de origem, pois são mais facilmente transportados que os materiais mais

densos (como os vidros e metais); também, possuem um tempo maior de decomposição se

comparado a outros materiais como papel e tecidos (RYAN et al., 2009). Os detritos plásticos

flutuantes têm se tornado um problema global crescente, pois são transportados por longas

distâncias através das bacias oceânicas, alcançando até mesmo as ilhas mais remotas

(BARNES, 2002). Muitos detritos plásticos estão presentes nos oceanos na forma de

pequenas partículas, o que representa uma ameaça potencial devido ao pequeno tamanho

(microplásticos) e o longo tempo de degradação destes materiais. Segundo Browne (2007), os

microplástico, podem ser encontados na forma de poliestireno, fibras, fragmentos e pellets.

Este último, é comumente usados como matéria-prima para a fabricação de utensílios

plásticos e são definidos como esférulas plásticas com diâmetro inferior a 5 mm. A produção,

o consumo crescente e o prolongado tempo de degradação faz do plástico o resíduo mais

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comum nos oceanos e litorais de todo o planeta (MOORE, 2008). Os animais marinhos são os

mais impactados com os microplásticos e morrem em grande parte por inanição, ao

confundirem microplásticos com alimentos, entre outras causas (LAIST, 1997). Apesar dos

avanços alcançados nas últimas décadas, a poluição por resíduos sólidos, especialmente

aquela associada à contaminação por plástico, ainda é bastante preocupante.

2. Materiais e métodos

O presente estudo foi desenvolvido com base nas seguintes etapas: pesquisa

bibliográfica, voltada para a literatura especializada; trabalho de campo para a coleta de

amostras de sedimentos na zona de supramaré das praias; análise laboratorial para a

separação, identificação e classificação dos microplásticos encontrados nas areias das dez

praias selecionadas na Ilha Grande (Figuras 1 e 2; Tabela 1). A amostragem de sedimentos,

feita no inverno de 2018, ocorreu na linha de deixa correspondente a maré alta de sizígia,

delimitando uma área de 1m² e com profundidade de 5cm, conforme Carvalho e Baptista Neto

(2016). Para averiguar a presença de microplásticos nos sedimentos das praias foi adotada a

metodologia proposta por Thompson et al., (2004). As 10 amostras de materiais coletadas

foram analisadas no laboratório para a extração, identificação e classificação dos

microplásticos, com base nas seguintes etapas: pesagem inicial e identificação das mesmas;

secagem na estufa à 60°C, por um período de cerca de 12 horas; pesagem da amostra seca;

peneiramento para a remoção de materiais com diâmetro superior à 5mm; preparação da

solução hipersalina, contendo 358,9g de NaCl para cada litro de água; agitação da solução por

2 minutos, com posterior adição da amostra e agitação da mesma por 5 minutos; decantação

dos sedimentos por 5 horas; remoção do material sobrenadante com o auxílio de um becker;

filtragem em bomba à vácuo no filtro de papel com porosidade de 14 µm; secagem dos filtros

na estufa por 72 horas, conforme o metodologia adaptada de Besley, (2017). A contagem e

classificação foi realizada na lupa binocular, com o auxílio do software ToupView para a

análise digital dos mesmos.

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Tabela 1 - Praias selecionadas para o monitoramento no litoral da Ilha Grande.

Praias Setor Localização Orientação Extensão-m

1. Grande Araçatiba Setentrional-ocidental 23° 9'10.47"S 44°19'26.52"O SO/NE 630

2. Japariz Setentrional-oriental 23° 5'31.61"S 44°12'50.20"O NO/SE 250

3. Abraão Setentrional-oriental 23°08’18.4”S 44°10’ 10.4” O NO/SE 1250

4. Abraãozinho Setentrional-oriental 23°8' 6.96"S 44° 9'7.16"O NE/SO 300

5. Pouso Setentrional-oriental 23°09’34.4”S 44° 08’ 19.5”O NO/SE 600

6. Lopes Mendes Meridional-oriental 23°10’00.4” S 44° 08’16.0”O NO/SE 2500

7. Dois Rios Meridional-oriental 23°11’11.3”S 44°11’24.8”O NE/SO 1300

8. Parnaioca Meridional-ocidental 23°11'37.31"S 44°15'2.49"O NO/SE 1086

9. Aventureiro Meridional-ocidental 23°11'18.46"S 44°19'6.99''O NE/SO 45q0

10. Meros Meridional-ocidental 23°13'7.71"S44°20'22.99"O NO/SE 145

3. Resultado e discussão

As praias no litoral da Ilha Grande possuem aspectos geográficos e geomorfológicos

distintos; a maioria se encontra abrigada e encaixada entre costões (pocket beaches) e

possuem no máximo algumas poucas centenas de metros; as mais extensas estão em número

reduzido e medem cerca de 1 a 4km de extensão. Conforme Gralato (2016), essas praias

possuem níveis distintos de exposição à incidência de ondas e aos eventos de tempestade, o

que depende da localização e orientação das mesmas. Sendo assim, as praias estudadas foram

agrupadas em dois setores: (1) setentrional, com as praias voltadas para o continente; e (2)

meridional, para as praias voltadas para o Oceâno Atlântico (Figura 1).

Na porção norte (setor setentrional) da Ilha Grande, mais abrigada, a maior quantidade

de microplásticos foi verificada na praia de Abraãozinho, com um total de 288 itens, sendo

272 na forma de fragmentos e 16 de poliestireno (Tabela 2; Figura 3). A praia de Abraãozinho

com apenas 20m de largura (BAPTISTA, 2017), possui poucas residências e restaurantes;

recebe uma grande quantidade de visitantes, devido a proximidade com Abraão (cerca de

2Km). Na praia de Pouso, que mede apenas 15m de largura, o total de microplásticos nos

sedimentos foi de 176 itens, com o predomínio de 128 poliestirenos, seguido de 32

fragmentos e 16 fibras (Tabela 2; Figura 3). Apesar de abrigada, essa área está sujeita a

incidência de ondas de tempestades, que alcançam toda a extensão da praia, quando associada

à maré alta de sizígia (GRALATO, 2016). A quantidade de turistas e embarcações nessa praia

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é intensa, devido a ligação dessa parte da ilha com a parte sul. A análise dos microplásticos na

praia de Abraão permitiu identificar um total de 128 itens, sendo 112 de fragmentos e 16 de

fibra (Tabela 2; Figura 3). Abraão, com largura em torno de 50m, concentra a maior parte da

infraestrutura voltada para o turismo (restaurantes, pousadas, hotéis, prédios públicos); além,

de duas áreas para atracação de embarcações de pequeno e médio porte. Por ocasião do

monitoramento, verificou-se a presença expressiva de lixo na praia. O mesmo foi constatado

por Macedo et al. (2017) em monitoramentos de resíduos sólidos no verão e inverno de 2016;

apesar da limpeza frequente realizada nessa área. A praia de Grande Araçatiba, um dos pontos

turísticos mais visitados na ilha, em especial, chamou atenção pela presença de 32

microplásticos na forma de pellets (Tabela 2; Figura 3). Essas esférulas plásticas são

geralmente encontradas em litorais próximos a portos e indústrias (ALVES et al., 2018), e

chegam no ambiente marinho pelos rios, drenagem de águas pluviais, ou quando são

derramados no mar (ANDRADY, 2011). Essa praia, com 35m de largura (BRUM, 2018),

encontra-se localizada a cerca de 16 km do Porto de Angra dos Reis, uma possível fonte de

pellets para este ambiente. Na praia de Japariz, com 26m de largura, apesar da grande

quantidade de lixo observado na faixa de areia e no mar, foram encontrados apenas 16 itens

de fibra (Tabela 2; Figura 3). No local existem alguns bares e restaurantes, e um píer para

pequenas embarcações.

Tabela 2 – Quantidade e tipo de materiais encontrados no inverno de 2018.

Praias Total de

Microplásticos Fragmentos

Poliestireno

(isopor) Fibras Pellets

Volt

ad

as

para o

con

tin

en

te

1-Grande Araçatiba 32 - - - 32

2- Japariz 16 - - 16 -

3-Abraão 128 112 - 16 -

4-Abraãozinho 288 272 16 - -

5-Pouso 176 32 128 16 -

Vo

lta

da

s p

ara o

Oce

an

o A

tlâ

nti

co

6-Lopes Mendes - - - - -

7-Dois Rios 480 464 16 - -

8-Parnaioca 48 16 - 32 -

9-Aventureiro 192 144 - 48 -

10-Meros 240 64 80 80 16

1600 1.104 240 208 48

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Figura 3 – Microplásticos encontrados nas praias estudadas, no inverno de 2018.

Os resultados mostram uma ocorrência maior de microplásticos nas praias localizadas

na borda sul da Ilha Grande, voltadas para o Oceano Atlântico, com destaque para Dois Rios

(Tabela 2; Figura 3). Essas praias se encontram expostas à incidência direta das ondas, que

podem chegar a 3m de altura na arrebentação durante as ressacas, conforme Godoi et al.

(2011) e Gralato (2016); provocando mudanças rápidas na hidrodinâmica, na morfologia e

largura das praias (GRALATO, 2016). Na praia de Dois Rios, com 27m até a linha d’água, os

fragmentos de microplásticos são predominantes, como na maior parte das praias estudadas,

totalizando 464 itens de um total de 480, seguido de 16 poliestirenos (Tabela 2; Figura 3). A

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abundância de fragmentos e fibras microplásticas vem sendo identificada em diversas baías,

como encontrado por Carvalho e Baptista Neto (2016) nas praias da Baía de Guanabara (RJ) e

por Baptista Neto et al. (2019) nos sedimentos de fundo da Baía de Vitória (ES). Na praia de

Dois Rios, localizada na Vila de Dois Rios, o turismo é discreto e controlado. O lixo

encontrado nessa praia, em pouca quantidade, é em geral de origem marinha, conforme

Madureira et al. (2017). A praia de Meros apresentou a terceira maior quantidade de

microplásticos, entre todas as praias estudadas, sendo a maior em diversidade de materiais;

com um total de 240 itens, sendo 80 poliestirenos, 80 fibras, 64 fragmentos e 16 pellets

(Tabela 2; Figura 3). Localizada no extremo sudoeste da Ilha Grande, com apenas 27m de

largura (BAPTISTA, 2017), essa praia é pouco frequentada devido à dificuldade de acesso e

ausência de estrutura para o turismo. A presença de lixo é expressiva na linha de deixa,

corroborando com o conteúdo elevado de microplásticos, o que sugere a ação das ondas no

retrabalhamento e fragmentação desses materiais.

A presença de pellets chama atenção e, tal como em Grande Araçatiba, coincide com o

local de maior proximidade com o Porto de Angra dos Reis (24 km de distância), o que sugere

a influência de correntes no transporte desses materiais. A Praia do Aventureiro apresentou

uma quantidade de 192 microplásticos, sendo 144 fragmentos e 48 fibras (Tabela 2; Figura 3).

Essa praia está localizada na Reserva Biológica Estadual da Praia do Sul e Parque Estadual

Marinho do Aventureiro, duas unidades de conservação com usos controlados e voltados para

atividades de pesquisa. O extremo oeste dessa praia é a unica área frequentada por turistas e

conta com uma infra instrutura local básica, com poucas residências e áreas de camping. A

praia mede cerca de 60m de largura e exibe um perfil íngreme, resultado da dinâmica

resultante da incidência direta de ondas (BAPTISTA, 2017). Na praia de Parnaioca foram

encontrados apenas 48 microplásticos, sendo: 16 fragmentos e 32 de fibras (Tabela 2; Figura

3). Trata-se de uma das praias mais desertas da Ilha Grande, com total ausência de

infraestrutura turística (apenas área de camping) e sem energia elétrica. Nessa praia, que mede

apenas 30m de largura e exibe um perfil íngreme (BAPTISTA, 2017), não foi observado lixo

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na faixa de areia, sendo, portanto, uma das mais limpas na área de estudo. Tal característica

aponta para o ambiente marinho como fonte potencial para os poucos microresíduos

encontrados. Por ocasião do monitoramento na praia de Lopes Mendes não foram encontrados

microplásticos (Tabela 1). No entanto, a presença de lixo ao longo do arco praial foi

constatada por Madureira et al. (2017) por meio de um estudo realizado no inverno de 2015 e

verão de 2016. Essa praia, com 1,2Km de extensão e 40-72m de largura é dinâmica

(GRALATO, 2016); trata-se de uma das mais visitadas e belas do litoral brasileiro.

4. Considerações finais

A quantidade total de microplásticos encontrados no litoral da Ilha Grande foi de 1600

partículas; desse total, 640 itens (40%) foram encontrados nas praias localizadas na face norte,

distribuídos entre fragmentos (416), poliestireno (144), fibras (48) e pellets (32); e 960 itens

(60%) na face sul, com fragmentos (788), poliestireno (96), fibras (160) e pellets (16). A

maior quantidade de microplásticos encontrados nas praias voltadas para o Oceano Atlântico,

com destaque para as praias de Dois Rios e Meros, aponta para o importante papel da

contribuição marinha no fornecimento de microplásticos para as praias estudadas, por meio da

deposição de materiais a partir da dinâmica de ondas (de maior energia), correntes e marés

nessas áreas. Nas praias voltadas para o continente, a quantidade elevada de microplásticos

identificados, principalmente nas praias de Abraãozinho, Pouso e Abraão, chama a atenção

para a necessidade de se investigar melhor o impacto das atividades relacionadas ao turismo e

como estas contribuem com a oferta de resíduos sólidos para esses ambientes.

5. Referências Bibliográficas

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