Octavio Marcondes Ferraz, Um Pioneiro da Engenharia Nacional

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OCTAvro___

MARCONDES FERRAZ

UM PIONEIRO DA ENGENHARIA NACIONAL

E.irRItA De 'IA O PAULO AFOOO

MI'l\IRIA DA ELETRICIDADEPROORA\IA Ilf. IIISrOlu \ OK"l DO cpt)()(" FG\

OCTAVIO___

UM PIONEIRO DA

MARCONDES FERRAZ

ENGENHARIA NACIONAL

Centro da Memria da Eletricidade no Brasil Octavio Marcondes Ferraz. um pioneiro da engenharia nacional- Depoimen Dias. - Rio de Janeiro: Memria is. grupo Amforp iniciou efetivamente suas operaes no Brasil em setembro de 1 927, com a criao das Empresas Eltricas Brasileiras - futura Companhia Auxiliar de Empresas Eltricas Brasileiras (CAEEB) -, concentrando sua atuao no interior de So Paulo e em diversas capitais, do Nordeste ao Sul do pas, e incorporando um grande nmero de concessionrias ;:lt o lil1al da dcada de 1 920. Ver PatlOramQ, op. cit., p. 62-63. Em 1 923 a Bond and Share criou a American and Foreign Power Co. (Amf orp) para agilizar de ao para diversos pases da Amrica Latina,

13. Trata-se da usina de Manllelos-O, idealizada pelo industrial mineiro Bemardo Mascart!llhaspara f omecer energia indstria de tecidos que instalaria em Juiz de Fora c dot..'u a cidade de iluminao eltrica. A usina entrou em operao p. 32.

110 ano de

1889. Ver Pa"orama, op. cit.,

14. Decreto-Lei n0 3. 1 28, de 1 9 de marode 194 1 , Ihou o m\ll0 de I ( )%paraa rcmunemo do capital das empresas concessionrias ele energia eltrica, estabeleocndo ainda que se detcnninassc o investimento das empresas, atravs do hlmoomcnlo de seus ocnsc instalaes, e encampao. Ver A e"ergia eltrica p. 65 e 235, e nola 3 1 do caplulo 3 .110

conceitualldo-sc o custo histrico para f de ouse tarililriu e indenizao nos caSO!) de rl!vcr!)o msBrasil

(da primeira lmpada a Hlelrobras), op. cit.,

Um engenheiro eletricista nos anos

20

59

15.

H dois Mackenzie, ambos canadenses, na histria da Light: William Mackenzie, presidente da CanadianNorthern Railway e um dos fundadores, em Toronto, da So Paulo Light; e Alexander Mackenzie, advogado responsvel pelos problemas jurdicos"relativos aos decretos das concesses de interesse da companhia no Brasil e Wl1 dos idealizadores da Rio de Janeiro Light. Ale;\:ander Mackenzie substituiu Frederick Pearson na direo do grupo Panorama, op. cit.. p. "35-42, e nota em

1914, quando este. falece4. Ver Hisfria e Energia - A chegada da Light, op. cit., 1 1 deste captulo.

16. Conhecido como o "metr da LighC , o Plano Integrado de Transportes, elaborado peloengenheiro de trfego e urbanista Nonnan D. Wilson, da finna canadense Wilson, BllJUlel and Borgstrom, f apresentado pela Light Prefeitura de So Paulo em oi do prieto decorreu do interesse da empresa na alterao das tarifas, fixadas em

1927. A elaborao 1 909, por

ocasio da renovao de seu contrato com a municipalidade. Dessa f orma, uma questo especfica de poltica tarifria gerou lUTIa proposta geral de planejamento para o sistema de transportes coletivos de So Paulo. Envolvendo a utilizao de alguns trechos de linllas subterrneas, a proposta tinlla como caracterstica mais importante a combinao do uso dos bondes com um servio de alta velocidade, atravs da viao subterrnea e de uma rede de autO-nibus. Apesar de todo o seu empenho e influncia, a Light no conseguiu aprovar o Plano Integrado de Transportes. Ver Histriae

Energia

-O

metro da

Light.

So Paulo, Eletropaulo/Departamento de

Patrimnio Histrico, novo

1986, n 3.os enlpresrios brasileiros, interessados na concesso para o

re 1 7. O primeiro conflito entre a Light e o grupo nacional liderado por Cndido GatT e Eduardo Guinle ocorreu quando f ornecimento de energia na capital federal, tentaram impedir a instalao da companhia canadense 'no Rio de Janeiro. O grupo Light saiu vitorioso na disputa, valendo-se da influncia de Percival Farquhar, membro de sua direo, junto ao Departamento de Estado norte-americano, e da conseqente interveno de diplomatas dos Estados Unidos jW1to aos ministros brasileiros das Relaes Exteriores, o baro do Rio Branco, e da Indstria, Viao e Obras Pblicas, Lauro Mller. Em

1 905, foi criada a Rio Light. 1 909, quando Gaffre e Guinle

Novo conflito se desencadearia a partir de f evereiro de

solicitaram autorizao da Pref eitura de So Paulo para vender o excedente de energia da usina de Itatinga, de sua propriedade, na capital paulista. Tendo em vista o baixo preo da tarifa apresentado pelos proponentes, o prefeito Antnio Prado deferiu o pedido, entrada dos empresrios brasileiros no mercado. Ver Panorama, op. cit., p.mas

a

Cmara Municipal defendeu a manuteno do monoplio da So Paulo Light, barrando a

41.

18. O advogado e politico Carlos de Campos ( 1 866-1 92 7), filho de Bernardino de Campos, umdos f mldadores do Partido Republicano Paulista (PRP), f onuou-se pela Faculdade de Direito de So Paulo em Amparo, elegendo-se em

1 887. hliciou sua vida pblica como vereador e intendente em 1896 para o Legislativo paulista. Inlportante articulador do

processo que resultou na concesso, pela Cmara Mmlicipal, do servio de viao eltrica em favor de Francesco Gualco e Antnio Augusto de Sousa - de quem f genro -. ocupou oi a Secretaria de Justia do estado no govemoCampos Sales Light instalava-se em So Paulo. Em

( 1 898-1902), quando o grupo 1900 tomou-se advogado da So Paulo Light, mas pennaneceu ligado poltica, retomando Cmara Municipal de 1 902 a 1907, e elegendo-

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Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro da engenharia nacional se senador em 1 9 1 5 e deputado federal em 1 9 1 8 . Em 1 924 assumiu a presidncia de So Paulo, em cujo exerccio atuou decisivamente para a implantao da Light no estado. Seu inno, Slvio de Campos, tambm advogado da Light, foi promotor pblico e deputado federal por So Paulo, tendo participado da Revoluo Constitucionalista de 1 932. Ver Hist,.ia e Ellergia-

O metr da Ligllt, op.

cit., e nota 1 1 deste captulo.

1 9 . Catulo Branco nasceu em So Paulo em 1 900. Aos dez anos de idade transferiu-se com a famlia para a Blgica, onde estudou at retomar ao Brasil em 1 9 1 4 . Em 1 9 1 8 ingressou na Escola Politcnica de So Paulo, fonnando-sc engenheiro em 1924. Tcnico da Secretaria de Obras Pblicas do Estado de So Paulo de 1928 a 1958, quando se aposentou, destacou se como especialista no campo da energia hidreltrica, tendo participado da elaborao de importantes projetos, como o da usina de Caraguatatllbn , em 1 938.eo da usina de Barra Bonita, em 1942.

Foi membro da Aliall-n Nacional Libertadora em 1 935 e deputado Constituinte de So Paulo em 1 946 na legenda do Partido Comul1ita Brasileiro (PCB), tendo desenvolvido um combate intransigente aos intcrcsse:s dos trutcs ctrangeiros que exerciam os servios de utilidade pblica na produo e distribuio de encrgia, representados pela Light e a Amforp. Sistematizou suas experincias e opinies no livro pref aciado por Barbosa Lima Sobrinho, Energia el,rica e capiral eS'ITlIlgeiro Omega em 1 975, e no f olheto El1chemes em So Paulo, escrito com a colaborao da110 Br sil, editado em a

So Paulo pela Alf a

sociloga Paula Beiguelman e publicado em 1985. Ver Bofe,im Histrico, So Paulo, Eletropaulo, jnl1. 1 986, 11' 6, p. 16.

EM BUSCA DE AUTONOMIA

Vendendo massa cinzentao senhor deixou a Light para montar um escritrio prprio. Como f essa oi experincia?

Ainda em 1 928 montei o Escritrio Tcnico O.M.F., que f o primeiro que se oi constituiu no Brasil para consultoria tcnica ligada energia eltrica, e sobretudo o primeiro aparelhado com todo o instrumental necessrio para f azer medies e verificaes de funcionamento de mquinas. Com o entusiasmo de engenheiro e de moo, gastei todo o dinheiro economizado nos anos de trabalho mascateando engenharia pelo interior na compra de todo esse equipamento. Naquela poca, era comum abrir-se um escritrio comercial onde ou vendiam se mquinas, ou f aziam-se trabalhos prticos de engenharia. Ns s vendamos massa cinzenta. Dvamos consultas como mdicos: a pessoa nos procurava com um oramento, examinvamos se estava correto, elaborvamos um parecer e recebamos pela muito consulta. Paralelamente, de fazamos projetos de instalaes instalaes existentes, ou se ja, eltricas de prdios, f azendas, indstrias, e desenvolvamos ainda um trabalho comum na Europa, de inspeo vistorivamos uma fbrica e vamos se os equipamentos estavam corretos e em condies adequadas de funcionamento.

Havia demanda para esse tipo de prestao de servio ?Os trs primeiros anos f oram de muita luta. mal cobramos as despesas, porque no existia uma mentalidade que pedisse engenharia. s vezes eu conversava com

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Oclavio Marcondes Fcrrai'.

11m

pioneiro da engenharia I1ncional

um industrial amigo e propunha: "Voc no quer que tomcmos conta de sua instalao'''' Ele respondia: "No. a fbrica existe h quarenta anos. nunca teve ningum e sempre funcionou direito. No vale a pena. no do nosso interesse." De repente. arrebentava alguma coisa e ramos chamados a opinar. amos l e mostrvamos que a situao no cra bem como eles estavam pensando. Havia fbrica com trs mil motores e que nunca tinha sido submetida a uma vistoria. Depois de contratados nossos si'vios. cada motor passou a ter uma ficha de controle e a ser inspecionado continuamente por um engenheiro. de modo que as instalaes comearam a funcionar melhor. Mas ainda assim havia uma crena de que o engenheiro era um terico que ia atrapalhar as coisas, e que havia tcnicos f onnidvcis para fazer O trabalho. Lembro-me de um industrial que se gabava: . 'Nosso tcnico isso, aquilo! " Era um homem pouco mais que alfabetizado. um sujcito que tinha engenho e dava solues para probleminhas, mas eles o achavam um grande tcnico e se entusiasmavam com isso. Mesmo hoje h muitas indstrias que trabalham na base do empirismo, na base da improvisao.

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Instrumental utilizado pelo Escritrio Tcnico O.M.F.

Em busca de autonomia

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Diante dessas dificuldades, como o escritrio conseguiu os primeiros clientes?Com os conhecimentos que eu tinha nas indstrias, fiz contatos, mandei circulares, e s vezes, quando apareciam dificuldades, ramos procurados para resolv-las. As instalaes eltricas em So Paulo, muito mais do que no Rio embora no Rio tambm -, eranl de uma tecnologia a mais atrasada e errada do mundo! Faziam-se instalaes contra todos os princpios da tcnica. Ento, quando aparecemos e fomos desenvolvendo nosso trabalho, passamos a ter uma grande influncia na praa. Se iam construir um prdio e nos apresentavam um projeto de instalao e o respectivo oramento feito por alguma outra firma, dizamos: "Isso no est direito, deve-se f azer assim, assim. " E apresentvanlOs um oramento com custos geralmente bem mais altos, mas explicvanlOs: agora tem ..

A questo no encarecer, que voc no tinha uma instalao, em ns e fizeram instalaes perf eitas, ou foram

Muitos acreditaram

aperf eioando as j existentes, at chegarmos a um ponto de termos a grande satisf ao moral de ver contratos de arquitetos ou de construtoras com fi rmas de instalaes eltricas, dizendo: " A instalao deve ser feita de acordo com as regras do Escritrio O.M.F." Outro prazer que tivemos foi o de ouvir de um colega que nos chamou para f azermos o pro jeto das instalaes de um grande edificio que ele estava construindo: "Resolvemos cham-los porque os outros f azem instalaes malf eitas e depois chamam vocs. Ento chamamos agora." E assim o escritrio foi-se expandindo.

Quais eram seus principais clientes?Eram construtoras, industriais, donos de usinas eltricas ou de fbricas, que nos encarregavam de estudar e f azer as instalaes eltricas. Um de nossos clientes foi o Roberto Simonsen, que era um grande homem da indstria e das finanas, associado com seu cunhado Murray, na finna Murray-Simonsen - eles f aziam de tudo, desde tomar caf em uma xicrinha, at negociar caf na Bolsa de Nova York. Simonsen f cliente do meu escritrio em uma associao com Ccero oi Prado e Guilherme Guinle para fazer papel e celulose em Pindamonhangaba, o que mais tarde, todavia, no se verificou . Ele era engenheiro, mas era sobretudo um lider da indstria, tanto que presidiu a Federao das Indstrias do Estado de So Paulo. Tentou muitos empreendimentos, continuou em alguns por muito tempo, e outros passou adiante, como uma pequena indstria que comprou, desenvolveu e depois vendeu Pirelli. Mas era um homem que atuava muito e, como todos os que chegam a essa altura, teve tambm uma atuao poltica -

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Octavio Marcondes FerrazUm pioneiro da engenharia nacional

criticam, mas no pode ser de outro modo. Quando houve a e1eio na qual foram escolhidos pela primeira vez no Brasil os deputados profissionais pelos sindicatos, ele foi eleito .'"O govemo tambm solicitava nossos servios, mas, como scmpre, havia muita

burocracia e dificuldades para receber o pagamento, o que era o pior. At hoje no compreendo por que se quer tanto fazer servios para o governo. Conosco era diferente, porque era um dos grandes clientes possveis. Ento fazamos trabalhos, mas procurvamos ter sempre uma clusula contratual que nos garantisse os recebimentos, porque no tnhamos dinheiro para financiar. Assim, fizcmos um grande projeto para a usina dc Ubatuba e prestamos vrios servios para o governo do estado e a Prefeitura de So Paulo. Chegamos a ter um certo cartaz junto ao Ministrio da Agricultura, que na poca era o rgo encarregado das questes de energia. Eles consideravam nossos projetos bem-feitos.

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Festa no clube operrio em Paulo Afonso,

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Aspecto do hospftal em Paulo Afonso,

A construo de Paulo Afonso

1 15

A entrada em operaoQuanto tempo duraram as obras at ser ligado o primeiro circuito ? M onso foi inaugurada em 1 955 ,,, I Mas desses sete anos, as obras mesmo demoraram quase cinco, porque houve um perodo de tnais ou menos um ano e meio para a organizao e instalao da companhia. Nodia 10 dedezembro de 1 954 fui a Recif e liguei o primeiro circuito, quer e dizer, um ms antes da inaugurao a usina j estava funcionando.A Chesff instalada em 1 948 e a usina de Paulo oi

A hidreltrica de Paulo Af onso f constndda para suprir o Nordeste de energia. oi atingindo portanto um mercado que j era atendido pela An?f orp. No significa que a idia do projeto era vender essa energia Amjolp? Perf eito. A idia era a produo e a transmisso de energia serem feitas pela Chesf, enquanto a distribuio ficaria a cargo dos govemos estaduais e das empresas existentes. A Anlf seria nossa cliente, compraria a energia produzida por Paulo orp M ol1So e furia a distribuio. Isto foi feito e foi bem-aceito, porque havia uma reclamao danada, como no tenlpo em que trabaUlei em empresa eltrica, e todo mundo tinha a Tramways - era como ehamavanl a Anlforp no Nordeste atravessada, porque prestava muitomau servio e no atendia den13nda;tinha umas usininhas trmicas muito precrias e no podia se expandir porque, como a tarfu estava congelada, a empresa no estava sendo bem remunerada e no fuzia investinlentos. Os governos estaduais no a judavam na constnto de linhas de transmisso ? No. As transmisses eram e devem ser feitas pela empresa quegera; a distribuio era que podia, pode e tem sido feita, contra o meu voto, pelos govemos estaduais. A meu ver, todo o processo devia ficar sob a responsabilidade da empresa geradora Mas, . no. Os estados compram a energia da empresa geradora, distribuem e tm mais uma estatal sua disposio para tzerem muitas coisas ecrtas, e sobretudo, como tzenl, muitas coisas erradas. Todos querem ter a sua empresinha eltrica para garantir a possibilidade de dar empregos e desenvolver uma poltica muito imoral, quando com esse dinheiro poderianl levar muitos outros beneficios s suas cidades. Sempre fui contra a distribuio pelos estados. mcsmo porque. a no ser So Paulo, Minas, talvez o Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul. os demais no tm capacidade financeira para fazer empresa eltrica. E j que o Estado chamou a si

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engenharia nacional

a questo das empresas eltricas, estas deveriam ento ficar exclusivamente nas mos da empresa f ederal. H, neste caso, evidentemcnte um aspecto muito srio a considerar: se o estado no tiver boas relaes com o govemo f ederal, este o abandona, deixa-o sem energia. Ento todos tm medo. Porque no h patriotismo, no h bom senso, no h decncia na atuao do govemo federal, de cuja ajuda os estados e municpios dependem, j quc ficam com muito pouco dos impostos. No h dvida de que muitos estados tm suas empresas eltricas s pela glria de terem mais uma empresa e dizerem que esto realizando alguma coisa. Mas outros tm de faz-lo porque, se o govemo federal os largar sem energia... ser um desastre absoluto. So Paulo um caso tpico.

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Unha de transmisso sobre a estrutura de concreto construida pela Chesf .

A construo de Paulo Af onso

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Como se resolveu o problema da dif erena defreqncia ?A Diviso de guas tinha fixado a freqncia no padro cinqenta, com o que eu jamais havia concordado muito; So Paulo, Paran e l para o Norte era sessenta, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, cinqenta. Ento decidimos f azer Paulo Af onso a sessenta ciclos, e avisamos a Tramways, que transf ormou e preparou por setores: liguei o primeiro circuito, depois f omos fazendo os outros, de modo que no houve nenhuma dificuldade. A partir de ento, esquecemos aquela fixao do Ministrio da Agricultura e, uma vez que as reas supridas na ciclagem de sessenta eram ma joritrias, o Brasil passou a ter freqncia oficial em sessenta ciclos. Como o pessoal no entendia muito da questo, fui f azendo o que queria e ningum se imiscuiu. Quando estive modifiquei na Eletrobrs, a freqncia do Rio para sessenta, ao lado do f ora ao almirante, que

almirante que estava encarregado de tratar desses assuntos. O Lacerda eramuito contra a Light, ento dificultava; mas dei toda a

eito sincronizou com a Light, e fizeram a mudana.''''' Era o que deverianl ter f ciclos e metade a sessenta.,2" ,

tanlbm no Paraguai, ao invs dea energiade Itaipu ser gerada metade a cinqenta Hoje. graas padronizao de freqncia. o Brasil inteiro est interligado. Quando houve a seca de Paulo Af onso h dois, trs anos, recebeu-se energia de Tucuru, e isto se f ez por transferncia de carga - atualmente Tucuru est nenhum inconveniente; a nica restrio a distncia possvel de transporte, ou alimentando o Nordeste dentro de certos limites.'''' Quanto a esse aspecto, no h se o problema todo est na capacidade das linhas de transmisso eltrica. Hoje ja, se transmite a dois mil quilmetros de distncia - a tcnica j o pennite -, e estou certo de que em alguns anos o Brasil todo estar dentro de um mesmo esquema, comandado por um centro que ter autoridade para organizar todo o funcionamen to. Por esses dois blecautes que tivemos. que atingiram Minas, So Paulo e Rio, viu-se que esta zona est realmente interligada " 9' No futuro, esta interligao vai se aperf eioar, no s para servir bem, como tambm para porporconar maior segurana no funcionamento.

Paulo Af onso inaugurou no Brasil ajse de construes de grandes hidreltri cas. O senhor sempre f f oi avorvel opo por grandes usinas ?quilowatt instalado em uma grande usina deve ficar mais barato do que em duas A grande usina pref ervel at por uma questo de escala. A princpio, o

usinas menores - no uma regra absoluta, mas a probabilidade essa. De modo que f interessante fazerem-se no Brasil grandes usinas, como fizeranl vrias oi

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Ocwvio Marcondes FerrazUm pioneiro da

engenharia nacional

em So Paulo - Ilha Solteira um exemplo - e todas as do rio Grande construdas pela Cemig, que so de tamanho bastante grande c de boas condies de execuo econmica.

Com esta opo, o Brasil j tem garantida energia eltrica at o final do sculo. Mas o pas ainda tem possibilidades hidrulicas para se continuar investindo, ou apartir de ento haver necessidade de se optar por outro tipo de energia ?Segundo relatrio da Eletrobrs, o Brasil tem um potencial de cerca de trezentos milhes de quilowatts, com apenas quarenta ou cinqenta instalados, o que significa que ainda tem grandes possibilidades por muitos anos. Precsamos de usinas trmicas porque so indispensveis nos anos de pouca hidraulicidade. Temos umagrande usina trmica em So Paulo, a usina de Piratininga, localizada em Santo Amaro, e temos tambm a tenncltrica de Santa Cruz, perto do Rio, . alm de outras menores. Concordo que h necessidade de se f azer usinas trmicas. Agora" no estou de acordo que elas sejam nccessarianlente atmicas, nuclcares. Acho que o risco da usina nuclcar to grande que no deve se corrido, a menos que no tenhanlos mais nenhuma possibilidade. A, pacincia, tem dc sc correr qualquer risco. Mas enquanto tivermos ainda mais de duzentos milhes de quilowatts possveis de eletricidade, acho que loucura se pensar em nuclear.

A construo de Paulo Afonso

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A emoo contidaA constmo dePauloAf onso reanimou as esperanas dopovo nordestino. Isto era perceptvel no seu contato com as pessoas ?Apenas com as pessoas que acreditavam que a usina vingasse. Porque as coisas l pelo Nordeste no andavam. S para dar um exemplo, quando comecei a obra fu i buscar um guindaste em um lugar chamado Poo dos Paus, onde havia sido projetada uma barragem para desenvolver um plano de irrigao na regio, ainda ado, no tempo do Epitcio! Estava tudo preparado, cabe way, depsito, almoxarif e no foi adiante. Se f osse aqui no Sul, O material teria enferrujado, apodrecido; mas l o clima quente, de modo que conservou. Havia, portanto, muita descrena. Mesmo depois de terem sido iniciadas as obras da usina, uma f brica importante em Recif ainda encomendou uma grande usina e trmica a diesel. Eu lhes disse: "No f aam isso, tenham um pouco de pacincia." E me responderam: "H muitos anos que se fala em trazer energia para a regio, e nada acontece. No queremos nem saber. " Um deputado federal de Pemambuco - chamava-se qualquer coisa Lins, no me lembro exatamente -, que era dono do hotel Boa Viagem e era tambm industrial e proprietrio de uma empresinha eltrica em Escada,'''" disse-me certa vez em Recif "No acredito e: em Paulo Afonso. No dia que fizesse isso. Mas havia uma parte da populao, o corpo poltico de modo geral e mesmo o govemo federal que achavam que Paulo Af onso seria a redeno do Nordeste. O termo meio forte, porque o Nordeste prceisa de uma poro de coisas, no s de energia: precisa tambm, uma condio necessria, mas no uma condio suficiente. A indispensabilidade da energia um fato indiscutvel, principalmente naquela regio, em que havia uma demanda reprimida muito grande. Mas o que a energia pennitia sobretudo era a execuo de uma srie de medidas necessrias, e nem todas foram implementadas - esse foi o grande mal. Por isso, o povo foi ficando meio desiludido. Todo mundo falava na energia de Paulo Af onso, mas com o tempo, sc um raio cortasse uma linha, saiam pelas ruas gritando eontra Paulo Af onso. So eoisas da vida, que os homens que esto envolvidos na questo j esperam e por isso no se emocionam muito. em que voc trouxer energia para c, eu me comprometo a pegar no fio." Quando inauguramos a usina, quase fui l cobrar

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Octavio Marcondes FerrazUm pioneiro da engenharia nacional

Mas o senhor deve ter sentido lima grande emoo por ler chegado em um lugar onde havia um acampamento mnimo. um rio com lodaaquelafiJra e violncia, ler iniciado o pro jeto do zera e hoje em dia ver essa grande obra que. com todos oi os altos e baixos e toda a dificuldade. f comll'1ldo por suas mos.Quem ama a profisso. engenheiro de corpo inteiro. quando tennina um servio desse porte, sente realmente grande satisf ao, grande emoo. O meu ilustre e saudoso mestre Barbillion fala em um de seus livros desta emoo, de depois de muitos anos de lutas, de mortes, ver-se, num movimento, a muitas centenas de quilmetros, uma lmpada se acender. Mas como isso leva tempo para se fazer, a emoo muito contida, O entusiasmo discreto. sobretudo quando se procura constituir times - eu sempre trabalhei assim -. porque so obras muito grandes para um homem s. Eu atribuo a vitria que tivemos em Paulo Afonso ao time muito bom que consegui f ormar l e manter unido.

o senhor se sentiu

reconheCido por esse trabalho? a histria do Foch: quem ganhoua batalha do

Nunca se muito reconhecido.

Mame, ele no sabe: sabe que, se se perdesse, seria ele '3l ' De modo quea situao

sempre a mesma. Mas no se faz um trabalho para ser reconhecido; faz-se por uma questo de satisf ao pessoal de realizar alguma coisa de til.

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Vista area da hidreltrica de Paulo Af onso, com o lago artificialj formado.

A construo de Paulo Afonso

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NOTASI. Entre 1 920 e 1 922, por designao do ento ministro da Agricultura do governo Epitcio Pessoa, lIdefonso Simes Lopes, um grupo de engenlleiros do Setor de Estudos e Captao de Foras Hidrulicas do Servio Geolgico e Mineralgico do Brasil - embrio da futura Diviso de guas -, integrado, entre outros, por Antnio Jos Alves de Sousa e Valdemar Jose de CarvaJho, realizou diversos estudos para o aproveitamento energtico do rio So Francisco, na regio entre Juazeiro e Paulo Af onso. Um desses estudos resultou no primeiro levantamento topogrfico da cachoeira de Palo Af onso, f eito em 1 9 2 1 pelos engenheiros Alves de Sousa, Jorge de Meneses Werneck, Jaime Martins de Sousa, Mrio Barbosa de Moura e Menglvio da Silva Rodrigues. Ver Afrnio de Carvalho,

Paulo Af onso e a

integrao nacional, Rio de Janeiro, 1989, p. 35 e histOrio, Recife, Chesf, 1 982, p. 37.

199, e Joselice Juc, Ches 35 anos de f

2. Grande entusiasta do aproveitamento do rio So Francisco para o desenvolvimento do Nordeste, A)X)lnio Sales, ministro da Agricultura do govemo Vargas de 1 942 a 1 945, idealizara o pro jeto inicial da Chesf a partir do Ncleo Agro Industrial do So Francisco, em Petrolndia, que constituiria o centro de expanso da regio, com o seu programa de povoamento, iniciado por volta de 1 945 em tomo da explorao da cachoeira de Itaparica, ef etuando-se o aproveitamento integral do rio em etapas sucessivas. Apesar disso, ao ser definida a soluo de Paulo Af onso, tomou-se wn incansvel batalhador pelo xito do pro jeto e a concepo da Chesf. Ver Apolnio Sales, Companhia Hidrelflica doSo Francisco, Rio de Janeiro, Ministrio da Agricldtura/Servio de Documentao, 1945, p. 40-43, e Joselice Juc, op. cil., p. 37. 3. Em4 de abril de 1944, Apolnio Sales submeteu a Getlio Vargas a Exposio de Motivos nl' 456, apresentando o anteprojeto de criao de uma sociedade por aes com vistas ao aproveitamento do potencial hidreltrico do rio So Francisco, cujo capital social incial de quatrocentos milhes de cruzeiros teria a maioria das aes subscrita pelo governo f ederal. Desse anteprojeto resultou a promulgao, em 3 de outubro de 1 945, de dois decretos-Ieis: o de n" 8.03 1 , autorizando a constituio da Companhia Hidro Eltrica do So Francisco (Chest), e o deno8.032, abrindo ao Ministrio da Agricultura o crdito especial de duzentos milhes de cruzeiros para a subscrio de aes da companhia. A Chesf obteve concesso pelo prazo de cinqenta anos para efetuar o aproveitamento progressivo da energia hidrulica do rio So Francisco no trecho compreendido entre Juazeiro e Piranhas, fomecer energia em alta-tenso aos concessionrios de servios pblicos de uma ampla rea do Nordeste e, respeitando os direitos de terceiros, f azer a distribuio direta de eletricidade na mesma regio. A rea de concesso foi oficialmente designada por lml crculo de 450 quilmetros compreendendo 347 municpios situados em oito estados da f ederao . Piau, Cear, Rio Grande do Norte, Paraba, Pemambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. A instalao ef etiva da companhia ocorreu em 1 5 de maro de 1 948, j no governo de Eurico Gaspar Dutra. Ver Joselice Jut, op. cit., p. 38, e Panorama do

de raio em tomo de Paulo Afonso,

selor de ellergia ell,ica 110 Brasil,

Renato

Feliciano Dias (coord.), Rio de Janeiro, Centro de Memria da Eletricidade no Brasil MEMRIA DA ELETRICIDADE, 1 988, p. 95-96 e 1 5 1 .

122

Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro da engenharia nacional

4.

Delmiro Gouveia ( 1 863- 1 9 1 7 ) nasceu em Ipu, no Cear, e transferiu-se ainda jovem para Pemambuco, onde exerceu diversas profisses at tomar-se mll prspero comerciante de Dedicou-se a vrios empreendimentos de vulto, destacando-se entre eles a no serto peles.

construoda maiorrefinaria de acar da Amrica do Sul. Por volta de 1903, quando suas reiniciando o negcio de peles e conseguindo se estabilizar financeiramente. Atravs atividades encontravam-se em crise, estabeleceu-se em Pedra, alagoano.

do Decreto n 520, de 1 2 de agosto de 1 9 1 1 , obteve concesso do estado de Alagoas para

o aproveitamento de Paulo Af onso, instalando em 1 9 1 3 mna pequena usina de 1 .500 HP

Fabril Mercantil, localizada em Pedra, distante 24 quilmetros da cachoeira.

para servir f brica de linhas e fios que inauguraria no ano seguinte, a Companhia Agro

o fato de ter-se tornado concorrente da Machine Cottons, que ate ento dominara o mercado

rente da assassinato, ocorrido em 1 0 de outubro de 1 9 1 7. Seus herdeiros pt...:rmaneceram f companhiaat7 demaiode 1 927, quando, diante das dificuldades na obteno dos recursos necessrios ao financiamento dos diversos setores dasem com

de linhas e fios, deu origem notcia de que o grupo ingls teria sido o responsvel por seu

empresa pemambucana Meneses Innos & Cia. Finalmente, em 9 de dezembro de 1 929,

indstria, venderam suas aes

condies de enfrentar a concorrente inglesa, os inuos Meneses fizeram mn acordo

o pimieiro de P(m/o Af onso, Recife,5. Vale do So Francisco para expor o

Suldopais e o restante destntdo a golpes de marreta. VerTadcnRocha,

linhas em manufatura de tecidos, sendo algumas .de suas mquinas transf eridas para o UniverSidade Federal de Pemambuco, 1 970.

a Machine CoUons,.que resultou na venda da Agro Fabril, transfonnada de f brica de

De/miro Gouveia

Em fins de 1 947, Antnio .Tos Alves de Sousa remliu-sc com a Comisso Parlamentar do constituio da Chesf. No debate que se seguiu, algmnas objees f oram levantadas ao teor do docwnento, a mais significativa da parte do deputado baiano Lus Viana,

Afallif eslo

em que eram apresentados os ob jetivos de

contestando a no-incluso da Bahia na relao dos estados a serem energizados por Paulo Afonso e.IU sua primeira etapa. Foi criado um impasse, solucionado afinal com a proposta de que a Bahia ficaria para \Una segunda etapa.

Alves de Sousa de que se omitisse na redao tinal do l\laliifislo a declarao expressa de

ocasio da abertura da subscrio pblica de aes preferenciais da companhia, o

A pretenso da Bahia teve um desfecho f avorvel em

1 ("I

de dezembro de 1 947, quando, por

presidente Dutra, representando o maior acionista - o govemo f ederal , anwlciou ter autorizado o aumento de capital ou a realizao de emprstimos Chesf destinados ao f omecimento de recursos financeiros capazes de possibilitar a ampliao,j na primeira f ase,

das linhas de transmisso Bahia e Paraba. Ver .losdice .fuc; op. cit., p. 4 1 -42. 6.

A transferncia da sede da Chesf para o Nordeste, pleiteada pelos estados da regio desde o junho de 1 974, no governo de Emesto Geisel. Em agosto a Chesf apresentou inicio da dcada de 1960, foi recomendada pela diretoria executiva da Eletrobrs em 7 dewn

erncia, constituindo um ms depois um gmpo de trabalho para este preliminar de transf fim. Aps intensa disputa entre os estados que;: c..k:scjavam ser contemplados com a escolha,

plano

particulannellte Bahia, Alagoas e Pemambuco, a Chesf cllcamin}Jou afinal em dezembro comunicada oficialmente ao presidente da companhia, Andr Falco, atravs de telex do o

P/ano de fiuilil'o de lransf en}neia da sede fKlra Reeif. A

aprovao da medida

f oi

A construo de Paulo Afonso

123

secretriD-geral do ministro das Minas e Energia Shigeaki Ueki, Arnaldo Barbalho, em encerrados os trabalhos de transf erncia. Ver Joselice Juc, op. cil., p. 1 90 e 280-283.

22 de janeiro de 1975. Em 30 de setembro do mesmo ano a diretoria da Chesf deu por

7. Domingos Marchetti integrou a assessoria de apoio da diretoria tcnica de Octavio MarcondesFerraz, que contava ainda com os engenheiros Gentil Norberto, Jos Vilela e Jlio Miguel de Freitas. Grande especialista em tneis, Marchetti em pouco tempo concluiu que

sua quase impenlleabilidade, tendo supervisionado os trabalhos de escavao, que relatou

a usina de Paulo Afonso podia ser subterrnea devido satisfatria opacidade da rocha e em Noticias sobre as escavaes subterrneas da usina hidreltrica de Paulo Afonso" . monografia nO 21 dos Anais do Congresso Alundial de Energia do Rio de Jalleiro, 1 950,

rnio de Carvalho, op. cil., p. 50, 62, 66 e 95. p. 386. Ver Af

8. A represa Boulder Dam est localizada no cmlyoll do rio Colorado, prxima regio de

Las Vegas, na fronteira entre os estados de Nevada e Colorado. Concluda em 1936, durante

o govemo do presidente Franklin Roosevelt, teve seu nome mudado posterionnente para Hoover Dam.

9.

Authority (TVA) - autarquia criada em 1933 pelo presidente norte-americano Franklin

Em 1 942, o Ministrioda Agricultura solicitou a Oren Reed, engenheiro da Tennessee Val1ey RooseveIt para promover o desenvolvimento do vale do Tennessee -, que revisse o

anteprojeto de aproveitamento hidreltrico de Paulo Afonso, elaborado pelos engenheiros da Diviso de guas Jos Luis Correia Leal e Leopoldo Schimmelpfeng. Ver Af rnio de Carvalho, op. cil., p. 60.

10. Alm dos projetos citados, havia ainda o de autoria de Fonseca Rodrignes e Sebastio Penteado, publicado do boletim de outubro - novembro de 1939 do Instituto de Engenharia de So Paulo. Ver Apolnio de Carvalho, op. cil., p. 62-64 .

1 1 . O Banco Interameric8110 para a Reconstruo e o Desenvolvimento (Bird), tambm conllecido realizada em Bretton Woods (EUA) em julho de 1944, com o ob jetivo de financiar a como Banco Mundial, f criado por deliberao da Conf oi erncia Monetria Internacional,

pro jetos em desenvolvimento. integram o Bird mais de cem pases, entre eles o Brasil. Ver Delta, op. cil. 12. Em 30 de janeiro de 1 94 1 , pelo Decreto-Lei n" 3.002, Getlio Vargas aprovou o plano de construo e explorao de wna grande lsina siderrgica , autorizando ainda a Comisso Companhia Siderrgica Nacional, Executiva do Plano Sidenrgico Nacional a prolllO\'cr os atos necessrios constituio da e o Ministrio da Fazenda a subscrever, atravs do

reconstruo dos pases devastados pela Segunda Guerra MWldial e f omecer recursos a

Tesouro, a parte necessria implantao do capital da sociedade.da usina de Volta Redonda teve inicio apenasem

A companhia foi criada em assemblia geral realizada em 9 de abril seguinte, mas a construo norte-americanos ao governo bmsileiro da ordem de 45 miUles de dlares, n troca de cooperao militar e f ornecimento de minrios estrawgicos com exclusividade para os Estados ( 1 930 1 942)", HGCB, 3' ed., So Paulo, Difel, 1 986, vo1. 3 , e DHBB, op. cil. 1942, a partir da concesso de emprstimos

Unidos. Ver talo Tronca, " O Exrcito e a industrializao: entre as anuas e Volta Redonda

124

Octavio Marcondes Ferraz

U11I pioneiro da engenharia nacional1 3. No dia I " de dezembro de 1 947, em discurso prof erido no Palcio do Catete, o presidente Dutra lanou oficialmente a abertura da subscrio pblica das aes preferenciais da Chesf. Com o desenvolvimento de um intenso programa de divulgao nos estados do Nordestecem alguIls estados do Sul, f oram subscritas cerca de 120 mil aes preferenciais pelos govemos de Pemambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, ficando apenas oitenta mil a cargo dos institutos federais de assistncia social. Em 1 5 de janeiro de 1 948, ao encerrar -se o prazo para a subscrio, as duzentas mil aes prcfercllciaisj haviam sido adquiridas, bem como efetuado o pagamento do valor de 10% das mesmas. Ver Joselice Juc, op. cit., p. 42-43, e Afrnio de Carvalho, op. cit., p. 38-39. 14. Para consolidar o emprcstimo negociado pela Chesfjllnto ao Bird, em 1 5 de julho de 1 949 vieram inteirar-se do projeto de constmo de Paulo Afonso o conselheiro tcnico do Banco, general Ra)l1lOnd Wheeler, e o engenheiro H. Tracy Martin. A esta visita seguiu-se a de outros elementos encarregados do estudo e da estipulao do contrato. o contrato final de emprstimo, discutido e acordado no Rio de Janeiro, s veio a se formalizar em 20 de maio de 1950, em Washington, sob o 11" BR25 ,juntamente com o termo de garantia do govemo brasileiro. O Bird se fez representar na transao por seu presidente, Eugene R Black, e do lado brasileiro assinaram o primeiro contrato, diretamente vinculado Chesf, seu presidente, Antnio Jose Alves de Sousa, e o segundo, o representante do govemo federal, Mrio Cmara. O emprstimo estabeleceu um perodo de carncia e amortizao de 25 anos, comjuros de 3,25%, acrescidos de p. 76-77. 1 5. Ver nota 1 0 do captlllo I .

I % de comisso,

vencendo a primeira prestao em setembro de 1 954. Ver Apolnio de Carvalho, op. dt.,

1 6 . O prieto elaborado por Octavio Marcondes Ferraz para o fechamento do brao principaldo rio So Francisco, necessrio construo da barragem mvel da usina, previa a utili7ao de ensecadciras celulares. A ensecadeira consiste em .. urna srie de clulas, f onnadas por estac..'1S ou pranchas, aj ustadas umas s outras por meio de ranllllras, de modo a isolar uma poro do leito do rio, que se mantm dessa f onna seco, possibilitando que se realizem os trabalhos de escavao e fundao dos pilares da construo. Em Paulo Afonso esse processo desdobrou-se em duas etapas sucessivas: a primeira, destinada a vencer a corrente fi partir da margem esquerda do brao principal, e a segunda, a partir da margem direita. Com o desenvolvimento dos trabalhos, os problemas da velocidade e irregularidade do fundo do rio exigiram que se adotasse uma soluo capaz de garantir a proteo do trecho marcado para o levantamento das clulas, que foi o caho flutuante, logo batizado de " navio" . . Encomendado a uma finnn francesa e montado pelos operrios brasileiros. o " navio" , de dezoito metros de comprimento por doze de nltura, pesando 350 toneladas, foi imerso no rio na cpoca da cheia, preso por cabos a longa distncia. Atrs dessa estrutura, ergueu-se entofi

primeira srie de ensecadeira:;, cstreitmluo-se,assim, o rio. maior, a velocidade das guas decorrente desse110

medida que o estreitamento ia se tomando

estrangulamento dobrou, amea.ando romper os Ulbos de amarrao. F oi necessrio ento o emprego de novo artitlcio tecl1ico para acalmar as guas segundo trecho, e a soluo

A construo de Paulo Afonso

125

proposta

pela

equipe tcnica

foi a utilizao das chamadas estruturas enrocadas, ou

"gaiolas", a que o Banco Mundial se ops, conduzindo ao impasse do qual a Chesf saiu afinal vitoriosa. Seria utilizada uma estrutura semille:-':vel, ou trelia, atravessada ajusante das futuras clulas, pennitindo fonllar progressivmnentc um enrocatllcntodc pedras de mo. Estas, lanadas pouco acima na corrcnte, ticariam detidas pela estmtura de ao dotada de malhas que deixavam passar as guas, e cairiam no fundo do rio, amontoando-se progressivamente at o alto. O processo rcsultou em completo xito, sendo rea1ido o f echamento do rio em e

1 9 dejulho de 1 954. Ver Ati"l1io de Carvalho, op. cit. , p. 1 28-132

1 39.

1 7. O engenheiro norte-americano Asa Billings ( 1 876-1 948) chegou a o Brasil e m 1922, aservio da empresa canadense Brazilian Tractioll, Lighl andPowerCo. Ltd. Fonnado pela Universidade de Harvard em

tenneltrica em Pittsburg, trallsf erindose

1 896, supervisionou em seu pas a construo de uma em 1899 pam Cuba, onde desenvolveu pesquisa

de processos de combusto e de produo de vapor. De volta aos Estados Unidos,

especializou-se em instalaes hidrdtricas c de irrigao na cidade de Nova York em

1 909, e trabalhou na constmo de barrl1gclls no Texas a partir de 1 9 1 1 , introduzindoinovaes que pcnnitiram a reduo dos custos no emprecndiult".1lto. A seguir utilizou seus novos mtodos em obras na Espanha c no M\ico. No Brasil, integrou-se a um gmJX> de renomados tl:cnicos estrangeiros, como Hugh Coopt::r , Chamleye Hyde, ligando-se ainda a figuras c:xpressivasdo sctorde energia eltrica, como Edgar de Sousa e Eli Chaves. E m seu trabalho junto ;] So Paulo Light e Rio Light, f oi resJX>nsvel JX>r vrias obras de vulto, como as da usina de Rasgo, 110 rio Tiet, e da ilha dos Pombos, no rio Paraba do Sul, tendo concehido e l::-.:ecutado o chamado pro jeto da Serra, que compreendia, alm da construo da usina de Cubato, a instalao de um sofisticado Pedras, lananda..as, atravs de grandes tuoos aJutorcs, llumaqueda de mais de setecentos metros. Posterionnente foi vice-presidente da Brazilian Tractioll. VerPanorama, op. cit., p. Bibliott:ca do E:-.:rcito Editora, sistema de barragens e reservatrios, destinados a represar as guas do rio Grande e das

58-59,..1 ellergia eltn'ca 110 Brasil (da primeira lmpada Eletrobrs), Rio de Janciro, 1 977, p. 3637, c Delta, op. L.

18. Ackennan preferia que se utilizasse para o fcchamento do rio o processo de obdisco,a ser preparado na margem direita, tombanJo-o de uma s vez sobre o leito. Aps a deciso do Bird de aprovar a soluo proposta por Octavio Marcondes Ferraz e encampada pela Chesf. Ackennan Ver Af rnio de Carvalho, 01'. cit., p. foi substitudo na consultoria do Banco pt::lo engenheiro Neil Bass.

69 e I 3 J - L l8.

1 9. Em janeiro de 1953, Octavio Marcondes Ferraz suhmeteu seu projeto de fechamento dobrao principal do rio aprovao da lntcmational Engilleering Co. Inc., obtendo parecer pelo Bird , retificou sua avaliao. Ver Afrnio de Carvalho, 01'. cit . , p. f avorvd do presidente da finna, o engenheiro C. P. Dl11Ul - o mesmo que, ao ser consultado

1 32 e 1 35.

20. Antnio Jos Alvc. de Sousa mOITt.. d e infarto do mioclmlio e m 18 de ua.cmbro de 1 96 1 - aos 'i 'l1 65 an os , em Paulo Afonso, onde foi entcrrado. Vt.. Afrnio de Carvalho, op. cit. p . 1 94. 'r 2 1 . Octavio Marcondes Ferraz refere-se a Euclides QuallJl de Oliveira, que foi presidente do Conselho Nacional de Telecomunicaes (ConteI) de 1 965 a 1967 e ministro das Comunicaes do govemo Emesto Geisel, de 1 974 a 1 979. Ver DHBB, 01'. ciL.

126

Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro da engenharia nacional

22.

o laboratrio decampoem modelo reduzido constitui uma tcnica universal em engenharia,naqual a construo do modelo regida por detenninadas leis que mantm sua proporo em relao obra, tornando possvel a realizao prtica das experincias tcnicas idealizadas teoricamente. O engenheiro responsvel pela constmo do modelo reduzido e eitos nas duas etapas necessrias ao fechamento do brao principal os testes em laboratrio f do So Francisco em Paulo Afonso foi o f rancs Andr Balana. Ver Afrnio de Carvalho, op. cit., p. 1 30.

23. Na equipe tcnica comandada por Octavio Marcondes Ferraz destacaram-se os engenheiros brasileiros Domingos Marchetti, Gentil Norberto, Jos Vilela, Jlio Miguel de Freitas, Hermnio Kerr, Denneval Resende, Jason Marques da Costa, Roberto Montenegro. Mcio de Lacerda, Hlio Gadelha de Abreu, Mrio Re.m Cameiro, Jos Martins de Sousa, Regiualdo Sarcinelli, Geraldo de Sousa Coelho, Lenine de Melo Mota, Paavo Nunni De Vicenzi, Bret Iolas Cerqueira Lima, Renato Teodoro de Assnno, Jos Mrio Ramagem Franco, Luis Afonso Braga, Raimundo Nonato, Alfred David Nigri, Emni Gusmo, OU.on Soares, Hilton Fiza de Castro e Arton Fernando de Lima. Entre os tcnicos estrangeiros podem ser citados Andr Balana, Cyril Iwanow, Konstantin K. Krokows1:y, Valerii Vasilevich Sorekin, Roger Gaetan MaUielo, Artlmr George Albcrt BOImy, Robert Destre, Andr Bu jnik, Abdank Abzantovsky, Henri Bogaert, Lucas e Dietrich. Ver Afrnio de Carvalho, op. cit., p. 142, e Joselice Juc, op. cit., p. 9 1 e 105.24. Ao longo dos doze anos em que permaneceu em Paulo Afonso, Marieta Marcondes Ferraz

dedicou-se intensamente escola de artesanato que organizou para as mulheres e filhas jetivo, entre outros, de complementar a renda das f amlias dos dos operrios, com o ob trabalhadores. Contando de inicio com o auxilio do govemo f ederal e de donativos, o Artesanato Nossa Senhora de Ftima alcanou extraon.linrio succssoe teve seus produtos, entre bordados finos, rendas de Viena, bolsas e ob jetos em palha, vcndidos at no exterior. Ver Joselice Juc, op. cit., p. 82-83, e ctavio Marcondes ferraz,Depoimel/to, So Paulo, Videoteca do In!?tituto de Engenharia de So PaulolPrieto Mcmria da Engenharia, mar. 1989. 25. A hidreltrica de Paulo Afonso foi inaugurada en. 1 5 de janeiro de 1955, no governo do presidente Joo Caf Filho, dunmte a gestodoministroda Agricultnra Jos da Costa Porto. Ver Afrnio de Carvalho, op. cit., p. 1 7 1 . 26. Embora a f reqncia de cinqenta ciclos para os servios de eletricidade em todo o terntrio nacional tenha sido fixada pelo Decreto-Lei n'" 852, de 1 1 de novembro de 1938, corroborando os resultados do primeiro estudo de padronizao de f reqncia feito pela Diviso de guas, diversos f atores con junturais levaram a que esta detenninao no f osse cumprida. Preocupao constante das autoridades ligadas ao setor energtico, a ooificao de freqncia foi objeto de reexame at o inicio da dcada de 1960, quando passos mais concretos foram dados no sentido de sua resoluo. Em 3 de abril de 1961 f criada no oi CNAEE a Comisso de Unifom1izao de Freqncia (CUF), cujos estudos recomendaram a adoo da f reqncia padro de sessenta ciclos. Em julho seguinte, o Ministrio das Minas e Energia instituiu um grupo de trabalho encaI"T"egado de estudar problemas

A construo de Paulo Afonso

127

financeiros da w1ificao nopas, priorizando as reas dos antigos estados do Rio de Janeiro eda Guanabara, tendo em vista sua importncia relativa e as disponibilidades de recursos necessrios converso. A Light, por seu lumo, apresentou um programa de converso do basicamente criao de wn mercado de sessenta ciclos para as novas usinas. "sistema Rio" a ser ef etivado num prazo de dez anos, entre 1 963 e 1973, visando

A partir de 1 965, j sob a coordenao da Eletrobrs, foi adotado o plano nacional de

a responsabilidade pela elaborao e a execuo dos planos para a converso de seus respectivos sistemas.

W1ificao das f reqncias no padro sugerido pela CUF. atribuindo-se aos concessionrios

Em janeiro de 1 967, durante a gesto de Octavio Marcondes Ferraz na Eletrobrs) iniciou sessenta ciclos da ltima grande rea do pas, o estado do Rio Grande do Sul. VerA energia op. cit., p. 209. seo processo de unificao de freqncia, concludo apenas em 1977, coma converso para110

eltrica

Brasil (da primeira Idmpada

ti

Eletrobrs). op.

cit., p. 98-105. e

Panorama,

27. A questo da f reqncia a ser adotada por ltaipu foi decidida em 1 977, quando os governos que alimentariam o sistema eltrico brasileiro. e a de cinqenta para os nove restantes, brasileiro e paraguaio optaram pela f reqUncia de sessenta ciclos para nove geradores,

destinados a supri! o sistema paraguaio. A parcela de energia em cinqenta ciclos no utilizada pelo Paraguai seria 'adquirida pelo Brasil e transportada atravs de W11 sistema de transmisso em corrente contnua e em alta-tenso. Ver Panorama. op. cit., p. 255.

28. Localizada no rio Tocantins. no Par. Tucum f o segundo empreendimento levado a oi

tenuo pela Centrais Eltricas do Norte do Brasil SA (Eletrollorte) no campo da gerao de energia, constituilldo-se a maior usina hidreltrica inteiramente brasileira. A entrada em operao de TUClUll, aps nove anos de construo, de 1 975 a 1984,e a energizao do usinas tnnicasde pequeno porte. Atualmente a populao beneficiada com a energia gera

sistema de transmisso interligado Chesf loram responsveis pela desativao de diversas

em Tucumi superior a oito milhes de pessoas. Ver Pal/orama, op. cit., p. 247-248.

29. o maior blecaute deqlle se tem notcia, atingindo toda a regio Sudeste, ocorreu em 1 8 de

abril de 1984 devido a problemas localizados nos transf onnadores da subestao de

Jaguara , da Cemig. Em 18 de agosto de 1985 verificou-se novo blecaute na mesma regio, porm. .4e menores propores, causado por perturbaes na linha de transmisso da usina de Iyfrmlxmdo, em Araraquara. No dia 1 7 do ms seguinte. problemas no elo de corrente Ernesto Paixo, A continua que liga Itaipu ao sistema Sudeste provocaram o mesmo fenmeno.

operao na Cesp, So Paulo, Cesp,

1 985, p. 157-160.

Ver Lindolro

30. Lus Dias Lins, engenheiro pernambucano !"nnado pela Escola Politcnica do Rio de

Janeiro e especialista em energia eltrica, teve destacada atuao em seu estado como diretor da Companhia de Fora e Luz do Nordeste do Brasil em Pemambuco, Alagoas e Rio industrial e poltico. Foi engenheiro-chef da Comisso de Estrada de Ferro em 1 922 e e

Grande do Norte. Ocupou a direo de diversas empresas ligadas ao setor de seguros e indstria txtil, tendo presidido o Sindicato das Indstrias de Tecidos e a Associao Comercial de Pemambuco, e integrado a diretoria da Federao das Indstrias de seu

128

Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro ela engenharia nacional estado. Foi vereador em Escada (PE) e deputado f 'tieral por diversas legislaturas, de 1951 L a 1971. Alm de discursos parlamentares, publicou

Instalaes hidreltricas em

Pemambuco e O problema daf ora no

Brasil. Ver Df/BB, op. cit.

3 1 . Ferdinand Foch ( 1 85 1 - 1929), marechal da Frana, Gr-Bretanha e Polnia, teve parti cipao decisiva lla vitria das f oras aliadas na Primeira Guerra Mundial ( 1 914-1918). Comandante do 20" Corpo do Exrcito ao ec10dir o conflito, assumiu um ms depois o comando do IX Exrcito, f rente do qual contribuiu paro a vitria do Mame por sua ao nos pntanos de Saint-Gond. Comandou diversas batalhas ao longo da guerra, sendo nomeadoem

1 9 1 8 generalssimo

das

tropas

aliadas

na f rente ocidental

c,

a seguir,

comandante supremo dos exrcitos aliados na Frana. Nessa condio, deflagrou, em 1 8 de julho de 1 9 1 8 , a fase of ensiva que conduziria vitria final dos Aliados etn I I de novembro. Seus ensinamentos na Escola de Guerra esto condensados em duas obras:

Principios da

guerra ( 1 903)e COlld!loda guerra ( 1 904),

Em suasAfemria" , lanadas em 1 929, relata

a seqncia de episdios militares de que participou na Primeira Guerra, tendo ainda seu depoimento prestado ao jornalista Ra)1UOnd Rcoouly publicado sob o titulo Le

mmonal de Foch.

Ver Dictiomraire des Oeuvres

(de tou. les lemps e( de tOIlS les pays),

LafT ont e Bompiani (romp.), Bouquins, 1 986, v. 4.

CONFLITO POLTICO E DESENVOLVIMENTISMO

A nfase estatizante do segundo govemo VargasA construo de Paulo Af onso. iniciada no governo Dutra. prosseguiu ao longo do novo governo de Getlio Vargas. eleito em outubro de 1 950. Que candidato o senhor apoiou nessas eleies ?No final do govemo Dutra, as eleics iam se processar, e o candidato oficial era Cristiano Machado. Havia ainda Getlio Vargas com Caf Filho na vice- . presidncia e o brigadeiro Eduardo Gomes. Como eu era filiado UDN, naturalmente apoiei o Brigadeiro. Getlio venceu as eleies, mas sua vitria no era esperada pelos polticos, f uma surpresa. Eu no entendo oi de poltica, mas creio que Cristiano f oi " cristianizado" , como se dizia, porque ele se considcrava eleito, c o govemo, quc era seu grandc suporte, o abandonou ' " O f ato que Getlio fcz uma poltica populista, beneficiando-se do apoio dos dois partidos quc havia fundado, o PSD eo PTB - curiosoque um mesmo homcm tenha fundado um partido conservadorc

outro socialista -, e evidentemente ganhou as eleics.

o

novo governo promoveu alguma modificao na Ches( i

Getlio no fez nenhuma interveno na Chcsf. Porque houve o seguinte: ns vimos que no daria para tenninar a construo de Paulo Afonso no govcrno Dutra, que mudaria o presidentc, mudaria todo mundo, e podia ser que o sujcito que entrasse no estivesse de acordo com aquele prieto e desmanchasse tudo. Ento pensei cm mantcr uma boa imagem da obra e gastar bastante dinhei ro,

1 30

Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro da engenharia nacional

gastar bem, para o pessoal ficar com medo de mexer - naquele tempo havia um pouco mais de respeito. E isso foi feito. Compramos material, fizemos as obras, e as pessoas que iam nos visitar ficavam impressionadas com o andamento dos trabalhos; viam o servio, viam o material empregado, e f aziam uma idia do quanto j se havia gasto. De modo que quando Getlio substituiu Dutra, as coisas se passaram como eu esperava: o novo governo teve um pouco de escrpulo de desarrumar o que encontrou bem-arrumado e no fez mudanas na Chesf. Getlio conhecia o dr. Sousa, provavelmente tinha confiana nele e o manteve na presidncia. Uma vez que eu no havia apoiado Getlio, pedi demisso: "Pode ser que este f ato desagrade poltica e no quero atrapalhar vocs, portanto me retiro." Mas dr. Sousa no aceitou: "O senhor tem um cargo tcnico, no tomo conhecimento de seu pedido."' Diante disso, continuei como diretor tcnico, mas pedi que arquivassem minha carta de demisso para no parecer que eu estava aderindo ao governo.

Logo que tomou posse. Vargas criou a Assessoria Econmica do Presidncia da Repblica. encarregada de elaborar uma poltico energtica para o pas. Os estudos desenvolvidos para o setor de eletricidade resultaram em quatro pro jetos que f oram encaminhados ao Congresso: do Imposto nico sobre Energia Eltrica, do Fundo Federal de Eletrificao. do Plano Nacional de Eletrificao e da Eletrobrs. (O) Como o senhor viu esses pro jetos?Estvamos isolados em Paulo Af onso, trabalhando com muita intensidade as 24 horas do dia, e no tnhamos tempo de pensar em outra coisa. Quando estamos frente de uma grande obra, com responsabilidade total, e sentimos que ningum est mexendo conosco, esquecemos todo o resto. De modo que continuamos tocando nosso trabalho, como mestre-de-obras. como manager, muito felizes de ver que tudo estava andando bem.

possivel que o dr. Sousa, como presidente

da companhia, seguisse os acontecimentos; mas eu, como diretor tcnico, no me imiscua. A parte poltica no estava nas minhas mos, no ?

Mas as propostas da Assessoria tratavam de questes de interesse para o desenvolvimento de sua atividade. O senhor no os aprovou?Fui contra todas essas medidas. Acho o Imposto nico uma barbaridade, porque ele vem encarecer uma coisa de uso obrigatrio e absolutamente indispensvel como a energia, e isso pode dificultar o desenvolvimento do pas. Fui igualmente contra o Fundo Federal de Eletrificao, mesmo porque, em deternlinado momento, os recursos encaixavanl-se no Tesouro c no eram aplicados no setor.

Conflito poltico e desenvolvimentismo

13l

o rgo encarregado de gerir os recursos do Fundo at a criao da Eletrobrs era o Banco Nacional do Desenvolvimento Econmico, institudo em 1952. (3) Sua atuao como agente financeiro no f avoreceu as empresas eltricas? o BNDE foi criado justamente para tratar das questes de financiamento s empresas nacionais. E financiou algumas, no particulannente uma ou outra empresa, mas funcionou sempre sob um clima poltico. Ainda hoje vem financiando todas essas empresas do governo que esto em dificuldades, que esto quebrando. Se eu estivesse no governo na poca, jamais aprovaria a criao do BNDE. Seria muito mais fcil criar uma seo no Banco do Brasil que se encarregasse dessas questes.

A Ches chegou a receber algum financiamento do BNDE enquanto o senhor f esteve na empresa?No tcnho lembrana, mas creio que no. Quando estive na Chesf, primeiro o governo completou seu capital, e tivemos ainda o emprstimo em dlar do Banco Mundial, que nos permitiu comprar no exterior todo o equipamento de que necessitvamos, porque no se fazia no Brasil.'"

Embora voltadopara oproblema energtico, o governo V argas no conseguiu impedira ocorrncia dos racionamentos de energia observados no Rio e em So Paulo a partir de 1 952 '" Quais as causas dessa crise?o governo, contra a lei, contrariando os compromissos diretos assumidos em emprstimos com instituies estrangeiras de dar tarifas, no deu. Ento as empresas estavam indo falncia e no podiam atender demanda. Hoje acontece a mesma coisa: as empresas eltricas tm apenas os 10% da lei e necessitam de investimentos contnuos, porque exigem expanso contnua. S se justifica no se dar tarif se o pas estiver em recesso dranltica. as

D2

Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro da cngl!nharia nacional

A Cemig e a " equipe mineira"No mesmo perodo do segundo governo Vargas. Juscelino Kubitschek era governador de Minas e promovia a criao da Cemig. 'GlComo o senhor viu essa iniciativa?

No gostei muito, porque sou sempre contrrio a intervenes estatais; acho que o servio de energia estava indo bem nas mos de particulares, era s uma questo de dar tarifa e fixar uma poltica. Mas no discordo de que a Cemig seja um exemplo de boa administrao. Juscelino queria realizar grandes obras e sabia que entregando qualquer projeto direo de Lucas Lopes, a quem era particularmente ligado, teria xito. Lucas Lopes um grande engenheiro e economista mineiro, altamente inteligente, competentc, honesto e de ao; e muito ligado a ns. Uma figura interessante do nosso mundo oficial. Foi o organizador da Cemig, ao lado de Jolm Cotrim, de Mrio Bhering e de um grande nmero de engenheiros de primeira categoria que l se agruparanl, e a empresa sempre funcionou bem, porque esses homens tinham os ps na terra e imprimiranl uma caracterstica e uma organizao muito interessantcs. De modo que apio a Cemig do ponto de vista de organizao bem-feita por um grupo de gente muito competente. A nica restrio quc fao ao fato de o Estado estar envolvido no empreendimento. Nos Estados Unidos, 90%das empresas so particulares e funcionam muito bem, o pas se desenvolveu e ningum faz objecs. De vez em quando so atacadas, como todas as empresas que prestam servios de utilidade pblica - os correios, as companhias de eletricidade, de transporte colctivo -, porque a populao nunca est suficientemente satisfeita, acha quc deveriam fazer mais e melhor. s vezes realmente no fazem por deficincia tcnica, dc administrao, mas s vezes no fazem porque no mesmo possvel. Tambm a exigncia do pblico nem sempre razovel, e muito exagerada e animada pela imprensa, que freqentemente combate as empresas prestadoras de servio. De modo que acho que a Cemig foi e uma grande empresa; apenas gostaria mais que ela pertencesse a um grupo de capitalistas mineiros ao invs de ao governo, para no sofrer em seus negcios, como todas as empresas eltricas no Brasil, a grande interveno poltica indbita que hoje vm sofrendo. E poltica no mau sentido, que consiste em s dar lugar a privilegiados, a parentes e amigos.

Conflito poltico e desen\'ol\'imentismo

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Esse gnlpo com o qual Lucas Lopes organizou a Cemig permaneceu sempre voltqdo para os interesses da energia eletrica no Brasil. e muitos de seus integrantes oCl/pam hoje altos cargos: John Cotrim est na ltaipll Binacional. Mrio Bhering presidente da Eletrobrs. . O senhor acha que a Cemig f ormou esses engenheiros ou. ao contrrio. f oram eles que levaram muito para a empresa?.

Eram todos engenheiros j com expenencia e, evidentemente, como todo homem que ama a sua profisso, aperf eioaram-se na Cemig. Porque quando trabalha numa empresa, vai-se tendo experincia no s nas questes tcnicas, mas tambm na rea humana. De modo que esses engenheirosse

prestaram um grande servio, e em contrapartida aproveitaram para melhorar as suas condies tcnicas, alguns mais, outros menos. Mas todos se beneficiaram.

Pode-se dizer. ento. que tanto a Light quanto a Amf orp. a Chesf e a Cemig serviram na realidade como uma grande escola para os tcnicos brasileiros?Realmente todas essas empresas so grandes fontes de ensino e prestaram esse servio de fonnao do nosso pessoal tcnico. Mas a que tevemaior influncia foi a Light, que era a nica grande empresa que havia no setor e da qual todo engenheiro eletricista era oriundo - mais tarde comearam a vir de outros lugarcs e mesmo da Escola Politcnica do Rio de Janeiro. O grande mestre no Brasil no campo da eletricidade foi mesmo a Light, que, alm de prestar um grande servio ao pas na rea tcnica, formando engenheiros como o Jlio Miguel de Freitas, o Marinho Lutz e outros - conheo mais os de So Paulo -, prestou tambm na rea econmica. John Cotrim, que um dos grandes engenheiros brasileiros, pode ser tomado como exemplo desse processo de fonnao tcnica. Ele comeou na Amforp, de l foi trabalhar na Cemig com o Lucas Lopes. e se desprendeu para fazer Fumas. Fumas foi idia do Cotrim, foi um prieto idealizado e elaborado por ele, que era um homem de coragem para enfrentar qualquer -problema e contava com pleno apoio do Lucas Lopes, que por sua vez tinha o apoio do Juscelino. Quando da criao de Fumas, ficou evidente como essas iniciativas de govemo so azer uma usina no rio perigosas, porque houve uma disputa acirrada para se f Grande: a Cemigqueria, So Paulo queria, todo mundo queria. ' " Quando fui para a Eletrobrs acabei afinal com essa briga, e f oram construidas diversas usinas l - creio que hoje h umas oito ou dez usinas no rio Grande.'" Quando a situao mudou, em 1964, todos esses engenheiros eram ligados ao govemo de Minas e continuaranl ocupando seus cargos, porque reconhecamos

1 34 Um

Octavio Marcondes Ferraz pioneiro da engenharia nacional

o seu valor e no amos fazer diligncias para que sassem. Hoje, pode-se dizer que esse grupo o dono da eletricidade no Brasil.

Inaugurao de uma das unidades geradoras de Furnas. Maio de 1 965.

,. Uncoln Gordon (embaixador dos Estados Unidos no Brasil )

2. Mauro Thibau (ministro dasMinas e Energia)

3. Otvio Gouveia de Bulhes(ministro da Fazenda)

4. Vitor da Silva (diretor doBrasil no

8/0)

5. Octavio Marcondes Ferraz(presidente da Eletrobrs)

6. John Cotrim (presidente deFumas)

7. Ronaldo Moreira da Rocha

Conflito poltico e desenvolvimentismo

\35

o senhor elogiou a Cemigdoponto de vista de uma " organizao bem-j eita " e " exemplo de boa administrao ' '. Em que pontos se basearia, ento, sua crtica atuao do Estado na economia ? Sou e sempre fui muito privatista, porque a empresa particular tem sempre melhor funcionamento do que a empresa pblica. O governo mau administrador no s no Brasil, como em toda parte do mundo, e isso vem sendo demonstrado na vida cotidiana. Minha posio est bastante clara nas conf erncias que fiz sobre a usina de Sete Quedas, depois crismada de Itaipu, que era uma obra de grande vulto. em que freqentemente me perguntavam: "O senhor aeha que particulares podem faz-Ia?" Eu respondia'. "Acho." Sc insistiam: " Por que o governo no deve ser o responsvel pelo empreendimento?" Eu dizia: " Porque embora haja a iluso de que o governo tem dinheiro. ele no tem. O que o governo tem na realidade o poder de imprio de vir buscar no nosso bolso de modo mais ou menos arbitrrio o tanto de dinheiro que quer. quando quer e como quer. E geralmente para administr-lo mal. por causa do seu anonimato. " Os funcionrios pblicos, sobretudo os titulados - engenheiros, advogados, mdicos -, acham sempre que os estamos atacando como profissionais. No verdade: eles so oriundos das mesmas escoias que ns, podem ter os mesmos conheciinentos e at os mesmos principios. Mas o anonimato de que desfrutam e a f alta de independncia que tm para agir acarretanl uma diminuio de sua capacidade gerencial e administrativa, oque no ocorre com as pessoas na empresa privada. Por diversas vezes conversei sobre esse assunto com o general Geisel, que chefiava a Casa Militar do governo Castelo Branco e era grandemente estatizante. E ele me dizia: "Conheo inmeras empresas particulares mal-administradas. " Aoque eu respondia: "Mas jamais neguei que houvesse empresas particulares mal-administradas. O que re jeito que m administrao da empresa pblica corresponda o aumento dos impostos no nosso bolso. Porque se os bancos e empresrios da iniciativa privada f azem maus negcios, vo falncia, ao passo que as empresas oficiais suprem seus enonnes dficits utilizando-se do sistema de que dispcm de imprimir dinheiro vontade. muitas vezes contrariando a lei, sem pedir permisso ao Parlamento." Todos os govemos abusaram dessa f acilidade de emitir dinheiro. mostrando-se incapazes dc administrar. Se, ao contrrio, cuidassem bem dos servios que so da sua competncia, como a educao, a sade pblica. as forasannadas. a diplomacia. sobraria dinheiro nas mos de particularcs para resolver os outros problemas. Mas isso no acontece, primeiro porque h muita gente que socialista. que acha quc tudo deve ficar sob a tutela do Estado. Hoje temos uma grande prova de que

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Octavio Marcondes FerrazUm pioneiro da engenharia nacional

o socialismo no d certo com a Rssia, que fez o socialismo integral, como eles pregavam, E de grande produtor, de celeir do mundo, tomou-se um pas importador de gros, onde as indstrias no funcionam, nada funciona, e onde grande parte dos recursos destinada ao terreno blico, ao terreno militar, porque eles acham que pela fora, tendo um grande exrcito, uma grande organizao '. militar, que podem se impor.

inegvel que o governo no tem dinheiro, Quando um pas se toma independente,como Bangladesh, por exemplo, a primeira coisa que faz um emprstimo para comprar mesa para o funcionrio poder trabalhar, Onde est o dinheiro do governose

ele precisa ir buscar no bolso dos outros? Os homens pblicos no

compreendem que o Brasil no suficientemente capitalizado porque o governo vem buscar o dinheiro no nosso bolso, emprega-o mal e impede que ns, particulares, possamos investir diretamente. sem precisar de sua intermediao, Sempre sustentei e sustentarei essa tese, at que me provcm o contrrio,

Conflito poltico e desenvolvimentismo

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Ministro de Caf Filhoantecedeu o suicdio de Getlio f Vargas. em 24 de agosto de 1954. e seus desdobramentos aps a posse de Ca Filho na presidncia da Repblica?Estvamos em Paulo Af onso nessa poca, portanto longe do cenrio poltico. Mas no era necessrio encontrar-se no centro dos aconlecimentos para ver que a situ oandavamuitoruim. Havia grande agitao, com os militares revoltados, sobretudo O pessoal da aviao, e prevamos que alguma coisa ia acontecer. (9( Getlio tinha maioria na Cmara, mas era um homem que resolvia as coisas sozinho, independente de pareceres, e foi governando sua moda, fazendo o que queria, at que ficou numa posio insustentvel . No auge da crise, Caf Filho foi lhe propor que ambos renunciassem, para mostrar que no queriam a continuidade daquele estado de coisas, mas Get Iio no aceitou. Diante desse f ato, Caf desobrigou-se de qualquer compromisso e ficou liberado para assumir o governo com o suicdio do presidente. Ele f muito decente, teve um papel oi corretssimo, mas desde logo f muito hostilizado e teve de enfrentar toda sorte oi de dificuldades, porque no tinha fora poltica c apoio parlamentar. Qualquer lei que pedisse, demorava tranlitando no Congresso e no era aprovada. Caf foi um dos grandes homens do Brasil, a quem nunca se fez justia. o senhor acompanhou o perodo de crise que

Em abril de 1 955 o senhorf nomeado ministro da Viao e Obras Pblicas oi de Ca Filho em decorrncia do acordo/irmado entre o presidente e Jnio f Quadros com vistas s eleies que se realizariam em outubro. Como f oi esse processo ?Viao. Escolheram o dr. Whitaker para a Fazenda e a mim para a Viao "'" Eu oi o que aconteceu f que ofereceram dois min istrios a So Paulo: o da Fazenda e o da

nunca soube exatamente quem nos indicou. Qucm me f o convite oficial em nome ez do presidente foi Jnio Quadros, que na poca era governador de So Paulo. Mas Caf Fillioj me conhecia, porque ele era l do Norte e esteve vrias vezes em Paulo Af onso, inclusive quando da inaugurao da usina. Por outro lado, a briga com o Banco M\ill

(ministro da Agricultura)2.

Presidente Carlos Luz Justia)

3. Prado Kel/y (ministro da 4. Almirante Carfos Pena

Boto5. Octavio Marcondes

Ferraz (ministro da Viao)6. Jos Monteiro de

Castro (chefe da Casa Civil)

Conflito poltico e desenvolvimentismo

143

o Tamandar

tinha boas condies de comunicao ?

Sim. Logo que o navio desatracou, nos comunicamos com o capito dos portos de Santos, o Bulco Viana, que era nosso anligo, e ele nos tranqilizou: " Estamos preparando tudo para receber o governo e sua comitiva." Seguimos viagem e fizemos contato ainda com muitos outros que eram a nosso favor, entre eles o brigadeiro Eduardo Gomes, que, mesmo com aquele tempo horroroso, dirigiu-se para So Paulo levando todos os avies. Em um dado momento, no sei se o rdio no funcionou, perdemos contato com Santos. Mais tarde, quando conseguimos restabelecer as comunicaes, o capito nos informou: "A situao se reverteu. Of orte est contra vocs, todo mundo est contra." Diante disso, apesar de Jnio estar do nosso lado, no seria possvel seguirnlOs at Santos. Restavam-nos duas alternativas: irmos para Montevidu e nos entregarmos lou voltarmos para o Rio de Janeiro. Optou-se por esta ltima e voltanlOs. Ao chegarmos

capital, os

polticos subiram a bordo para parlamentar com o

presidente, e algum tempo depois pudemos desembarcar.( 1 2) Pensei que seramos da Frana para eventualmente me dar asilo. Mas a posio de Lott e seu grupo presos, tanto que o meu gabinete j havia entrado em contato com a embaixada

no era assim to f orte,de modo que resolveram no nos aborrecer. Descemos do

Tamandar

recebendo as

homenagens

da Marinha, com todos os militares

embarcados f azendo continncia enquanto passvamos, e ramos esperados pelo pessoal do meu gabinete e o brigadeiro Eduardo Gomes. Seguimos para casa, e no houve mais nada.

H uma verso de que Caf Filho. ao se internar. no estaria to gravemente enf ermo. De onde teria surgido essa histria ?Essa boataria surgiu porque os polticos vivem muito disso. Quem internou Caf Fiho f o Raimundo de Brito, que, alm de mdico, era seu amigo. A prova de oi que Caf estava doente que relativamente pouco tempo depois ele teve outras crises e morreu . Certa vez eu passei mal, pensaram que era o corao, e fui internado em uma clnica na rua CaJUling, onde ele se encontrava. Caf Filho no teria nenhum motivo para se af astar do governo se no estivesse realmente doente; era um homem de grande coragem e quis reassumir, mas isto lhe foi vedado. Foi um escndalo muito grande, uma coisa nef elibtica, esquisita, o Tribunal ter lhe negado uma sentena favorvel, maJltendo Ncreu Ramos na presidncia.' 1 31 Este f um perodo muito triste da nossa histria.(Ver Anexo oi

4)

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Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro da engenharia nacional

o govemo JKo senhor reassumiu seu cargo na Ches fimediatamente aps a crise do J J de Novembro?Sim. E continuei como diretor tcnico ainda por cerca de cinco anos, no mais morando em Paulo Af onso, porque no havia necessidade, mas indo muito l. Eu no havia sido favorvel candidatura de Juscelino, no o achava a melhor opo do eleitorado brasileiro, mas fui mantido no cargo durante quase todo o seu perodo presidencial, muito provavelmente por influncia do ministro Lucas Lopes, que era quem mandava no setor de eletricidade.'''' Alm de muito amigo do dr. Sousa, de grande brasileiro e homem de valor, Lucas Lopes conhecia bem as coisas e no mexeu na Chesf. Por outro lado, a companhia encontrava se no mesmo nvel de necessidades e merecimento que a Cemig, e no se podia proteger somente a empresa mineira, de modo que Juscelino no nos criou nenhuma dificuldade. Apenas, quando meu mandato na Chesfterminou, j quase no final do governo, ele no me reelegeu . E estava no seu direito.

Logo que assumiu a presidncia. Juscelino lanou o PlCmo de Metas, que deu grande nf aos investimentos na produo de energia eltrica. " ' , O senhor ase acompanhou sua aplicao?Um plano de metas um progranm de trabalho. Lucas Lopes foi o pai do Plano de Metas do governo Juscelino, e fez um programa muito interessante em sua origem, mas que foi defornlado pelo que eu chamaria de interveno incorreta da poltica partidria. Foi o clebre Plano de Metas que levou o Brasil situao em que se encontra hoje, porque comearam a f azer uma srie de coisas que no podiam ter sido feitas. O plano no previa, por exemplo, a construo de Braslia; e uma realizao de tal amplitude acrescida a um programa de trabalho acarreta um desastre em qualquer administrao. O ministro Lucas Lopes teve at um infarto, segundo dizem, ao ver o plano de estabilizao que idealizara ser grandemente prejudicado e deturpado pela ao nefasta da poltica que se faz no BrasiL"6'

O senhor discordou da construo de Braslia?A mudana da capital no surtiu o ef eito que eu esperava. Pensei que, quando Braslia estivesse pronta, irianl transferir para l todo o funcionalismo pblico federal, e quem no quisesse se mudar teria de pedir demisso. Desta forma,

Conflito poltico c dcscllvolviml. llismo

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o governo, que sabidamente tem gente demais cm seus quadros, ficaria livre do se transf eriu, e os que foram, desde o motorista at o funcionrio de alto escalo, passaram a ganhar "dobradinhas" . Uma coisa que afirmo sempre, embora sia contestado, que a

. pessoal suprfluo. Mas isso no aconteceu quem tinha proteo poltica no '

razo

fundamental de levarem o governo para Brasla naquela poca era a necessidade de se promover o desenvolvimento da regio Oeste do pas, e Braslia no trouxe eito, nenhum descnvolvimento. No se v - s se est muito escondido - o que foi f no se tcm conhecimento de nenhum grande empreendimento levado a tenno no Oeste por causa de Braslia. No h dvida de que construram estradas, que evidentemente melhoraram as condics da regio por perntirem o escoamento dos produtos, mas as mesmas estradas poderiam ter sido construisse Braslia. Em f eitas sem que se

1 89 1 , quando se elaborou a primeira Constituio,

os positivistas falaram

em levar a capital do pas para aquela regio, que mais ou menos o centro fisico do Brasil . Uma das razes alegadas para a transf erncia era de que, longe do mar, a capital ficaria mais def endida, menos sujeita a um ataque estrangeiro. Hoje ess motivo no sc justifica com odescnvolvicmto da aviao, no h lugar no mundo quc csteja a coberto de ataqucs castrenses.

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Octavio. Marcondes Ferraz recebe do presidente Juscelino Kubitschek a Medalha do Mrito pelos relevantes servios prestados engenhana e arquitetura. Rio de Janeiro (RJ). 1 1 de dezembro de 1 958.

!46

Octavio Marcondl.!s Fenal.

Um pioneiro da engenharia nacional

A meu ver, deveria ter sido construdo um centro cvico nas vizinhanas do Rio de Janeiro - um lugar como Jacarepagu, por exemplo -, onde os ministrios ficariam melhor instalados do que naqueles cdificios imprprios e precrios em que funcionavanL Se se fizesse esse centro cvico. o problema da tcnica administrativa estaria resolvido, e no se levaria a capital para um lugar to distante, to fora de mo, como Braslia, que isolou o mundo poltico brasileiro, no resultou em beneficios para a regio c custou cnonncs sacrificios ao pas.

oi o incentivo indstria alltomobilstica prol11ovido pelo governo JK f 111110 boa opo. OI/ leria sido pref ervel a ampliao da rede de estradas de ferro, com maior eletrificao das mesmas ?o automvel pode ser considerado um elemento indispensvel vida modema. O mundo inteiro privilegia o transporte rodovirio. que inegavelmente muitomais caro e oneroso do que os outros tipos de transporte. Certo ou errado. f oi-se crrovirio e maritimo. Esta no uma que tenham esquecido os transportes f dificuldade de sobreviver. Quando fui para o Ministrio da Viao. pensei muito nesse problema. e o meu prqjeto, seeu tivesse tido tempo de desenvolv-lo. seria procurar incutir na mentalidade do homem pblico. do poltico e do administrador brasileiros uma idia que talvez salvasse as f erro errovias. A idiaeraa seguinte: a infra-estrutura de uma estrada de f o maior investimento da empresa: esse im'estimento deve ser pago pelo frete. deve ter um retomo atravs do frete. Por que se d ao caminho uma infra-estrutura grtis. ou quase grtis, e a infra-estrutura da estrada de f erro tem de ser eustcada pela empresa? No pode haver concorrncia possvel! Do meu ponto de vista, a infra estrutura deve ser um encargo do govemo a ser dividido com O contribuinte em geraL e a estrada de f erro s teria de pr o trem em cima dos trilhos. c funcionaria como funcionam hoje os caminhcs. O transporte de carga em caminho. por sua vez. deveria tambm ser metodizado com o mesmo tipo de organizao existente para o transporte ferrovirio. promovendo-se a criao de centrais rodovirias. onde se depositaria a carga c onde os caminhcs pblicos ou particulares apanhariam o produto que se lhes of erecesse. que se lhes entregasse. e que deveriam receber obrigatoriamente para levar aos seus destinatrios. No seria possivel que ocaminho levasse apenas o creme do transporte. os produtos caros. e deixasse os produtos pesados que tm pequena devoluo de lucros. Seria nccessrio f azer uma coisa nesse sentido, para que os dois transportes pudessem concorrer de modo competitivo. de modo justo e eqitativo por esse caminho e no se pode mais volver. Agora. o que no me pareee correto

questo s do Brasil: em toda parte as f errovias se tornaram deficitrias e tm

Contlito poltico c desenvolvimcntismo

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E a navegaof/uvia/?A navegao fluvial no Brasil nunca foi levada muito a srio. O nico lugar em que realmente houve uma navcgao f no rio Amazonas, porque os navios oi ocenicos vo at bastante alto em seu curso. Hoje, em So Paulo, h uma o Paran. Ser possivel navegao ainda incipiente no rio Tiet, que poder passar para o rio Grande, para o Paranapanema e sobretudo para o Pamaba e desenvolver a navegao fluvial quando se completarem esses projetos e se fizerem eclusas. Uma das muitas criticas que fao a Itaipu de at ho je no terem executado as eclusas que perlnitiro ir de Gois a Buenos Aires por via fluvial. Essa navegao extremamente mais barata do que o transporte rodovirio c bastante mais barata tambm, embora no tanto, doque o ferrovirio.

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Octavio Marcondes FerrazUm pioneiro da engenharia nacional

Sudene e eletrificao ruralo senhor ainda estava na Chesfno final de 1959. quando a Sudene f criada oi para. entre outros objetivos. tentar viabilizar o Plano de Eletrificao do oram os contatos da Chefcom a Sudene nesse perodo? Nordeste. Como fOs contatos que tivemos com a Sudene foram feitos atravs do nosso servio

das tarif as. Ns, da rea tcnica, fazamos todas as linbas, sem interf erncia da Sudene, fornecamos energia, e as empresas funcionavam como nossas dar apoio s prefeituras, mas seu erro inicial foi ficar planejando durante umtempo demasiadamente longo, quando havia problemas imediatos a serem resol vidos e o pessoal morria de fome na seca ' 1 7 1 clientes. A Sudene tinba como objetivos a judar o desenvolvimento industrial,

comercial, que se encarregava dos estudos de viabilidade das ligaes, inclusive

A Ches recebia muitos pedidos de prf f eituras para puxar linhas e levar energia a pequenos municpios do interior? A eletr!ficao ntral era vivel naquele momento?A questo da eletrificao rural sempre muito interessante, porque no mundo reter o homem no canlpO a energia, que lhe d conf orto e o a juda muito em seus para as reas rurais mais distantes geralmente cara. Apesar disso, por motivos de ordem social, tem sido feita, e muitas vezes com a colaborao do prprio usurio, como em So Paulo, por exemplo, que tem energia praticamente em todo o estado, e energia de boa qualidade, sendo distribuda para a populao. A energia realmente est se ruralizando, por assim dizer. Naquela poca todos nos procuravanl, bispos, pref eitos, querendo que se fizessem linhas, com o argumento de que se a energia no chegasse, a cidade iria morrer. Ora, se no tinha morrido at aquele dia, no ia morrer mais, e acabaria tendo energia como todas as outras localidades. inteiro h um xodo do homem do campo para a cidade. E uma coisa que pode

trabalhos. Mas um processo dificil de se executar, porque a extenso das linhas

No caso das reas mais distantes. sairia mais barato montar pequenas termeltricas do que pl/xar linhas de transmisso ?Sim.

absolutanlente impossvel do ponto de vista econmico puxar uma linha

de grande porte para um pequeno consumo. Uma pequena usina resolveria o

Conflito poltico e desenvolvimentismo

149

problema. S que a pequena usina queima combustvel caro, queima divisas, e o Brasil, que j tem dificuldades para garantir suas divisas, ficaria em pior situao. Eu no tenho estudado muito a questo do lcool, mas, pelo que ouo por a, um combustvel antieconmico para ser empregado como est sendo, embora evite uma boa sada de divisas.

Como fico. ento. a situao do interior do Nordeste?o consumo de energia no Nordeste est bastante difundido; no tanto quanto seria desejvel, mas j de algum modo satisfatrio. Enquanto no tivermos dinheiro para tomar a energia acessvel a todos, ou a quase todos, a situao ter de ser essa mesmo. O grande mal no Brasil a distribuio de renda entre as diversas autoridades. cujas propores so mais ou menos as seguintes: o municpio fica com

1 0%

da arrecadao, o estado com

20% e a Unio com 70%.

Agora, na

Constituinte, esto querendo modificar essa correlao, mas

um processo

bastante delicado, que envolve muito trabalho para que se organize e funcione ") Por outro lado, h tambm muita incompetncia nas municipalidades; quandose decidiu

que parte do imposto de renda seria destinada aos municpios, vrios

deles fizeram fontes luminosas e coisas do gnero, quando deveriam aplicar os recursos em obras mais teis para a populao. Ento h ainda essa idia um pouco simplista em matria de administrao . Mas no h dvida de que casos como'o municpio de So Paulo constituem um vcrdadeiro desastre. No sei como h quem queira ser prefeito aqui. com o pouco dinheiro que temos e a quantidade e a diversidade de problemas que existem para resolver e administrar. Se esse quadro se alterar na atual Constituinte. a cidade e o estado podcro contar com um montante maior de recursos, mas tero em contrapartida mais deveres. Com essa politicagem que temos no pais, no sei como isso vai ficar. Quanto eletrificao rural, est-se fazendo com dificuldade e com o auxilio dos municpios. No tenho acompanhado muito de perto a questo, mas sei que est preocupando os responsveis pclacncrgia eltrica no pas. Para atender s necessidades da demanda, precisvamos ser um pas muito rico; mas as pessoas no se convencem de que o governo no tem dinheiro e o Brasil um pas pobre. Temos enornles riquezas potcnciais, mas enquanto no as explora mos, somos pobres. Esta a grande dificuldade com que se defrontam os paises novos: a f alta de dinheiro para explorar suas riquezas e investir em indstrias. A questo da eletrificao rural muito sria. muito difieiL mas est sendo estudada c com o tempo scguramentc ser resolvida dentro das nossas possibilidades.

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Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro da engenharia nacional

Ao longo do governo Jl/scelino slIcederam-se as denlncias cOl1lra a atl/ao da Light e da Amf orp. com a installrao de CP/. ,l9' Callsoll tamhm grande polmica a encampao da Companhia de I'.'nergia Fltrica Rio-Granden.>e. filial da Amf orp. em 1959. pelo governador do Rio Grande do Sul Leonel Brizola, A qlle se deveu esse quadro cOl1lllrhado ?Como j tive ocasio de dizer. as empresas sempre foram muito atacadas. porque eram servidoras pblicas e nunca atendiam na proporo de 1 00% aos desejos dos usurios. De modo que havia reclamaes de toda sorte, algumas talvez justas e outras injustas, sobretudo no caso da Light. que era uma grande empresa, Cometeu erros. no h dvida, mas prestou grandes servios ao pas. Esses ataques vinham principalmente de nacionalistas, de gente que s falava no "polvo canadense", e que prestava um grande desscrvio ao Brasil. dificultando o desenvolvimento dessas companhias. No caso do Rio Grande do Sul. Brizola dizia que as instalaes da companhia

.ia

estal'am pagas e queria fazer um

confisco, por assim dizer. H muita demagogia nessa filosofia: o que a empresa ganhou antes da regulamentao do Cdigo de guas era absolutamente legal. porque at ento podia ter a remunerao que quisesse, Por isso governo devia pagar ao f azer a cncampao . t:1l1

Conflito polilico e descnvolvimentismo

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Sada da ChesfEm maro de 1 960. quando da eleio para a diretoria do Ches(. seu mandato no joi renovado e o senhor deixou a companhia. Seu af astamento deveu-se a razes de ordem politica?Acredito que sim, e no quero crer que tenha sido outro o motivo. Porque fui muito combatido pela imprensa durante o governo Juscelino. Todo dia os jornais diziam queeu estava metido nisso e naquilo. que eu havia apoiado aqueles movimentos poltieos de Jacareacanga, da ilhado Cachimbo. As revistas Manchete

c Cmzeiro

publicavam: " 0 homem mais comprometido com Aragaras o engenheiro Marcondes Ferraz. ' '"' , Isso no era verdade' Em So Paulo eu f azia politica, votava. tinha alguns amigos, mas em Paulo Afonso sempre fui muito discreto, jamais falei em poltica. No tive nada a ver com esses movimentos. Apenas, como as f amilias dos rapazes que tomaram parte em Aragaras - o Veloso e outros ficaram em m situao financeira, resolvi promovcr uma coleta em seu favor: constitui um fundo em um banco. onde todos os amigos depositavam uma quantia. Foi a nica interveno que tive. Eu sabia que cra um movimcnto de ideal. mas que no tinha nenhuma probabilidade de xito. dc modo que aplaudimos o rapaz, mas no passou disso a nossa participao.

o senhor tomou conhecimento de U/11 suposto plano da ofiCialidade jovem da Aeronutica para bombardear Paulo Afonso. relatada por Cordeiro de Farias em seu depoimento .?''''Jamais ouvi falar nisso. Sei que a Aeronutica esteve muito agitada em

Pernambuco, at o Barbosa Lima Sobrinho

f l e oi

fez um discurso meio

contundente - eu no gosto dele, embora reconhea que um homem de cora gem -, mas nunca soube de nada a respeito de bombardearem Paulo Af onso. Sempre tive muito cuidado com a usina. porque ela era vital para o Nordeste. Primeiro cerquei toda a obra, e depois pedi ao governo que criasse l um posto militar. E isso f f oi eito. No sei se se criou como devia. com bastante artilharia onso. antiarea e coisas assim, mas ainda hoje existe uma tropazinha cm Paulo Af Finalmente, depois de me combaterem muito, todos puseram-se de acordo que eu cstava fazendo alguma coisa de til. Alm do mais. fui substitudo na Chesfpor um homcm que no conheo pessoalmente c de quem f alam muito bem. mas que no entcndia nada de energia eltrica. De modo que no h dvida de que sa cxclusivamente por motivos polticos.

1 52

Octavio Marcondes Ferraz Um pioneiro da engenharia nacional

Quem o substituiu na diretoria tcnica?No me lembro de seu nome. S ouvi dizer que era uma pessoa muito correta, um homem competente, masque no era especialista no setor. Tanto era verdade, que dois ou trs meses depois ele pediu demisso, convencido de que aquele cargo no era para ele e de que precisavam colocar em seu lugar uma pessoa que estivesse mais a par dos assuntos da Chesf. m)

Que repercusses teve na opinio pblica seu a astamento da companhia? fMinha sada causou uma onda muito grande, tanto na imprensa como no Parlamento, onde se destacou em minha def esa o senador Af onso Arinos, tambm da UON. Recebi diversas manifestaes de desagravo, e os amigos me of ereceram um almoo de quinhentos talheres, ao qual compareceram grandes personalidades brasileiras. Esse almoo foi mais uma homenagem ao engenheiro do que outra coisa, e estendi essa homenagem aos colegas que me a judaram a construir Paulo Af onso, porque ningum faz uma obra de grande vulto sozinho. O fim que Juscelino tinha em mente, que era me pre judicar, ele no atingiu. Ao contrrio, at me ajudou extraordinariamente, pois a obra de Paulo Af onso tinha me dado um certo relevo profissional, um certo cartaz, e fui convidado para ocupar diversos cargos, ganhando tanto quanto na Chesf e trabalhando dez vezes menos . A sada da companhia arrumou muito a minha vida econmica, porque eu ficava preso la, deixando meu escritrio mais ou menos abandonado. Confesso que fiquei triste, senti bastante, porque a gente se apega a uma obra como aquela, em que houve uma luta muito grande. Mas eu no poderia concordar em mudar o meu modo de ser: fiz um acordo com o governo, vendi meus servios profissionais, mas no vendi minha dignidade de pensar como penso e de a