Onde Buscar Consolação (em português)

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    ONDE BUSCAR CONSOLAO1

    Swami ParatparanandaAbril de 1978

    um fato bem conhecido que este mundo um mistura de bem e mal, deprazer e dor, de concordncia e discordncia, de carinho e medo, de unio eseparao, de criao e destruio. Onde est um desses pares de opostos, esttambm o outro. No se pode separar um do outro nem se pode achar em umapessoa comum um s deles isoladamente. At o ladro ou assaltante que roubae mata sem piedade tem em seu corao carinho por sua famlia ou por umapessoa em particular, roubando ou matando talvez para mant-los. Vemos emtodos, no somente entre os seres humanos, estes dois sentimentos. At os

    pssaros que se comportam como inimigos dos vermes, o fazem com opropsito de alimentar aos seus filhotes. Em outras palavras, podemos dizerque evidente que o mundo inteiro um conjunto desses pares de opostos. Oque est sob a influncia de um, tambm est sob o domnio do outro. Enenhum dos dois nos permite sair de suas garras e liberar-nos. Todo esforohumano precisamente ir alm destes pares de opostos e alcanar a bem-aventurana plena e eterna. O ser humano tenta lograr este estado de vriasmaneiras: alguns adquirindo riquezas, outros tendo filhos, estes mediantelogros intelectuais, aqueles adquirindo poderes, quer sejam terrenos ou ocultos,no entanto nenhum deles chega a alcan-lo. Em vez da paz e consolao quebuscam atravs destes meios, se encontram em meio de um labirinto deinquietude, provocada pela sede de possuir mais e mais dessas coisas ou naconservao do j adquirido.

    O mundo que criamos desta maneira absorve a mente em sua totalidadee quanto mais nos apegamos aos objetos, tanto mais nos identificamos com eles.O resultado que a angstia que se sente ao afastar-se deles se faz mais aguda.O homem sabe tudo isto, no entanto no pode desfazer-se do apego pelosobjetos e o triste do caso que a maioria da humanidade nem o tenta. SriRamakrishna costumava dizer: O camelo come arbustos espinhosos eenquanto o faz sua boca sangra abundantemente, no obstante, no cessar decom-los. assim tambm a vida do ser humano. Sabe que tem que passar porincontveis sofrimentos neste mundo uma vez que se enreda nele, no entantono pode evitar envolver-se. O que que o compele a faz-lo? Arjuna, o grandeheri do Mahabharata, faz uma pergunta idntica a Sri Krishna: Ento o que,por assim dizer, obriga ao homem a levar uma vida cheia de erro, ainda queno queira? Sri Krishna lhe responde: este desejo, esta ira, produto derajas, que o obriga. voraz e malvado. Conhece-o, com certeza, como teu piorinimigo aqui. Vemos aqui que se usou o verbo no singular, ainda que

    1 Traduzido do original em espanhol Donde Buscar Solaz.

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    aparentemente existam dois sujeitos, desejo e ira. Shankaracharia comentandoeste verso diz que a ira outro aspecto do desejo; quando se impede ocumprimento do desejo este se converte em ira, portanto no texto o verbo estno singular. Em realidade, a base de toda atadura deste mundo o desejo. Eenquanto se tenha ainda que seja um vestgio de desejo, no pode ir alm dospares de opostos.

    Por que acontece isto? Por que no possvel desfazer-se do desejo? No que todos no possam faz-lo. Pelo contrrio, sabe-se que alguns se liberaramrompendo a corrente do desejo. Mas muito poucas so as pessoas quepertencem a esta classe. A maioria da humanidade vem terra devido aoimpulso desse desejo, que eles haviam abrigado durante vidas anteriores.Geralmente buscamos felicidade e consolao no externo, fora de ns, porestarmos sujeitos s nossas paixes e desejos.

    Os sankhias, psiclogos hindus de pocas anteriores, dizem que a criaoou o universo o produto do desequilibro dos trs elementos constituintes daPrakriti ou Natureza. Eles os chamam gunas. Estes trs gunas existem em toda acriao, tanto no ser humano como em qualquer outra coisa vivente; mas soperceptveis, pelas qualidades que eles engendram, de uma maneira mais clarano homem. Cada um destes gunas tem suas peculiaridades; cada um produz noser vivo certas inclinaes. O Bhagavad Gita em seu dcimo-quarto captulodescreve detalhadamente a influncia de cada um deles: Sattva, rajas e tamasso os trs gunas que se originam da Prakriti. Atam ao ser imutvel que morano corpo. Sattva, sendo sem mcula, brilhante e tranqilo, no entanto ata aoser por seu apego felicidade e ao conhecimento. A felicidade e oconhecimento que se refere aqui no so os mais elevados, mas os relativos aeste mundo objetivo, por exemplo, a felicidade que se sente contemplando umpanorama natural de paisagens ouvindo musica, etc, e o conhecimento do

    mltiplo. Esta felicidade e esse conhecimento no levam algum a Deus, aindaque estejam em um nvel mais alto que os das pessoas comuns. O apego a estaclasse de felicidade e conhecimento, a pesar de ser mais fino, prende o homemao mundo.

    O Bhagavad Gita continua: Sabe que rajas da natureza da paixo, afonte da sede e do apego, prende fortemente ao ser encarnado pelo apego ao. Aqui sede se refere ao desejo por coisas no adquiridas. Sabemos queno h saciedade para esta sede. Pensamos que logrando tal ou qual objetoestaramos satisfeitos. Com este motivo trabalhamos duramente, mas to logo ologramos a mente sugere outro objeto mais brilhante, mais atrativo como meta.Por acaso obtendo-o o homem fica satisfeito? No. Sua busca segue sem parar.

    assim como rajas impele ao ser humano a meter-se em um turbilho deatividade.Tamas, - diz Sri Krishna, - produto da ignorncia, que ilude todos os

    seres e submetendo-os ao erro, preguia e sono os prendem fortemente. O queest sob a influncia deste guna, v tudo ao contrrio: toma o transitrio peloeterno, o mal pelo bem e assim por diante.

    Sri Ramakrishna compara a esses gunas com ladres, por que todos elesprivam ao homem de sua faculdade de discernir e lhe ocultam a Verdade. Para

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    explicar isto, o Mestre relata uma estria: Certa vez um homem passava porum bosque quando trs ladres lhe assaltaram e lhe roubaram tudo o que tinha.Um deles dizendo: De que serve deix-lo com vida? estava por mat-lo comsua espada quando o segundo ladro lhe deteve dizendo: Oh no! De que servemat-lo? Ata-lhe os ps e as mos e deixe-o aqui. Em seguida os ladresfizeram isto e se foram. Depois de um tempo, o terceiro ladro voltou e disse aohomem: Ah, sinto muito.Voc est ferido? Vou te soltar as cordas. Depois delibert-lo o ladro lhe disse: Venha comigo. Vou lev-lo at a estrada. Depoisde um longo tempo chegaram ao cominho principal. Ento o ladro disse aohomem: Siga por este caminho. L est sua casa. A isto o homem respondeu:Senhor, Tu foste muito bom comigo. Venha minha casa. Oh no! disse oladro. No posso ir l, a policia saber.

    Sri Ramakrishna explicou: Este mundo mesmo o bosque. Os trsladres que andam aqui so sattva, rajas e tamas. So eles os que roubam aohomem o Conhecimento da Verdade. Tamas quer destru-lo. Rajas o ata aomundo. Mas o sattva lhe salva das garras de rajas e tamas. Sob a proteo desattva o homem se salva da ira, luxria e outros maus efeitos de tamas. Almdisso sattva solta as amarras do mundo. Mas sattva tambm um ladro. Nopode dar ao homem o Conhecimento final da Verdade, ainda que lhe mostre ocaminho que conduz Suprema morada de Deus. Ao mostrar-lhe o caminho,sattva diz: Olhe l, sua casa est daquele lado. Mesmo sattva est muito longedo Conhecimento de Brahman.

    J dissemos que estes trs gunas existem em todo ser vivo; em algunspredomina um dos gunas e em outros outro deles, e segundo qual delespredomina em um ser humano, este manifesta tranqilidade, atividade oupreguia. Rajas inquieta ao homem, o faz correr atrs de todo tipo de atividadese prazeres. Impulsionado pelos desejos, o ser humano comete erros e como

    conseqncia colhe seus frutos amargos. Ento se sente miservel. Tamas,devido letargia que engendra no homem e pelas idias equivocadas queplanta nele, muito mais perigoso. Estando preso na rede da ignorncia, sob odomnio de tamas, o pobre ser humano cr que um sbio. Este tipo de crenano o libera do sofrimento que vem como resultado de suas aes errneas. ento quando trata de jogar a culpa de seu sofrimento em algum, ignorandoque est colhendo o fruto de suas prprias aes. S ento o homem buscaconsolao. A questo saber onde deve busc-lo.

    Um agnstico ou ctico que no cr em um Ser Supremo ou Deus,depende da matria, das comodidades materiais para reconfortar-se. Mas poracaso o logra? No. Ento tenta esquecer seu sofrimento talvez com bebidas

    alcolicas ou drogas. Mas o efeito de todas estas coisas momentneo. Quandoo efeito passa, o sofrimento o ataca, como se com vigor redobrado. Alm disso,a mente que este pobre homem quer adormecer ingerindo estes txicos, toingrata que no somente no lhe deixa esquecer os danos causados pelosdemais ou os erros cometidos por ele mesmo, seno que lhe lembra toconstantemente que no o deixa em paz. Talvez se possa escapar da observaodas pessoas, mas de nenhum modo de sua prpria mente. Esta o acompanha

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    por todas as partes e em todos os momentos como uma sombra. Sua censura mais aguda, quando no se v uma sada para seu sofrimento.

    Vejamos, talvez exista o sofrimento no mundo como um corretivo para ahumanidade que erra. Se pode perguntar: Bem, por acaso no sofrem aquelesque crem em Deus ou levam uma vida espiritual? Vemos que eles sofrem maisdo que os que no crem em nada. Certamente eles tambm sofrem. O mundo,como dissemos ao incio desta conversa, uma mistura de prazer e dor.Nenhum deles permanente. Felicidade e sofrimento se alternam na vida dohomem. O corpo de matria e tudo que material mutvel e mutante.Portanto todos os seres encarnados esto sujeitos a estas mudanas da matria.Alm disso, como Swami Vivekananda disse: A vida est e deve estaracompanhada pelo mal. Um pouquinho de mal a fonte da vida. Que querdizer ele com esta ltima frase? Um ser perfeito no necessita encarnar-se, salvonos poucos casos dos que vm terra para ensinar a humanidade. Um ser nasceporque imperfeito, tem desejos e at que no consiga a perfeio ter que vir aeste mundo uma e outra vez. Isto o que afirmam os Upanishads quandodeclaram: Pelas aes meritrias se alcanam os mundos superiores e pelasms aes se alcanam os mundos inferiores e com um equilbrio entre estesdois tipos de aes se volta ao mundo do ser humano. Ou seja, nasce comohomem.

    Aquele que cr em Deus e segue o caminho da retido e do esprito sabe,ou melhor dito, deve saber que sua crena em Deus, sua inteno e seusesforos para seguir este caminho no o liberam de seus sofrimentos fsicos nemdas preocupaes. O verdadeiro amante de Deus no busca milagres, nem rezapela cura de suas enfermidades ou por seu bem-estar. Ama Deus por amor Ele. Tenta desenvolver o gosto por levar esta vida, sem ostentao. No esperanem sequer o reconhecimento das pessoas. Sabe que o amor por Deus que ele

    busca em si mesmo a recompensa de suas duras prticas e austeridades. Lutacom suas paixes e sentidos, os quais querem arrast-lo para o caminho daescurido. E ao final chega a ter uma paz que mesmo a duras penas s algunspoucos alcanam. Sente a proximidade do Senhor e no se sente abandonadoem nenhum momento ainda que o mundo inteiro esteja contra ele. Sri Krishnadisse sobre isto: A Suprema Bem-Aventurana com certeza vem a este yogui,cuja mente se tranqilizou, cuja paixo se aquietou e que se tornou Brahman,havendo-O realizado e que no tem mancha.

    Vejamos, a verdadeira habilidade consiste em poder ir alm do bem e domal, porque s ento se pode alcanar a paz e a consolao. Como podemosfaz-lo? Confiando em Deus e submetendo-nos Sua vontade. Como podemos

    saber qual Sua vontade? Tudo o que acontece, acontece por Sua vontade.Neste caso por que no deve pensar algum que o que est fazendo tambm por Sua vontade? Verdade, no h argumento contra isto. Mas est certo que Sua vontade que est trabalhando por meio dele? Sendo assim no se sentirexaltado com o xito e nem se sentir deprimido pelo fracasso. Caso contrrio,ainda que sinta s um pouquinho de exaltao ou orgulho por haver alcanadoalgo ou pensa que ele o agente da ao, ento esta pessoa no cr no que diz. hipocrisia o que a faz dizer que a vontade de Deus trabalha por meio dela.

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    Surge outra pergunta: Devemos submeter-nos, sem fazer esforo algum, a todotipo de calamidades? Ningum aconselha isto. Enquanto uma pessoa sejaconsciente de que ela o agente de suas aes deve resistir a tudo que consideracomo maldade. O ensinamento no resista ao mal para as almas muitoevoludas. No significa somente a resistncia fsica seno tambm a mental. Napessoa que segue este ensinamento no deve surgir nem sequer uma idiacontrria, ou um sentimento de dio por quem lhe prejudica. S se pode falarde cumprir com este preceito na sua totalidade quando se alcana o estado emque a mente se mantm equnime sob todas as circunstncias. Mas para aspessoas comuns que so movidas ainda pelas menores mudanas nocomportamento dos demais em relao a elas, o caminho consiste em resistir aomal, no somente o que se origina de fora, seno tambm o que est dentrodelas mesmos.

    Pode chegar a consolao e a paz a algum que cr que a vontade deDeus a que atua no mundo? Vamos ser explcitos: se por consolao e paz seentende de que no vai sofrer mais, que no vai ter mais preocupaes, entoningum no mundo a ter. Mesmo para aquele que toma refgio em Deuschega o sofrimento fsico e no se suaviza o golpe que cai sobre ele; aconteceroas calamidades se tem que passar por elas, mas junto com as mesmas virtambm a fora para enfrentar o perigo e as tribulaes. No se desesperarquando se encontre em situaes difceis, sabendo que a vontade de Deus queage aqui e que Ele ir fazer o que bom para ele.

    Tem um crente comum esta confiana, essa fora? Isto depende daintensidade da f de cada um. Diz-se que a f pode mover montanhas, mas elatem que ser inamovvel como uma montanha. H uma estria que SriRamakrishna costumava contar seus discpulos que explica sobre osdiferentes tipos de f: Em certa aldeia vivia um brahmin, a quem uma pastora

    que vivia no outro lado do rio, dava leite todos os dias. As vezes ela demoravaem levar o leite. Um dia o brahmin se zangou e lhe perguntou porquedemorava. Ela lhe explicou que tinha que esperar o bote que s vezes seencontrava do outro lado e que o barqueiro tambm aguardava os passageiros etudo isto era a causa se sua demora. No mesmo instante o brahmin lhe disse:Mulher, as pessoas cruzam este oceano do mundo repetindo o nome de Deus,e tu no podes cruzar este pequeno rio fazendo o mesmo?A mulher, simplescomo era, aceitou esta reprimenda e acreditou nas palavras do brahmin. Apartir do dia seguinte ela levava o leite sem demoras. Observando isto, obrahmin lhe perguntou: Por que no demoras mais em vir aqui?A mulherrespondeu: Repetindo o nome de Deus, como o senhor me indicou, cruzo o rio

    e no preciso esperar mais o barco. Assombrado e no podendo acreditarnisto, o brahmin lhe pediu que lhe mostrasse como o fazia. Ambos desceram aorio e a mulher com toda a facilidade caminhava sobre as guas repetindo onome de Deus. Mas voltando-se notou que o brahmin, ainda que repetisse onome de Deus, levantava suas roupas para que no se molhassem. Ento apastora lhe disse: Senhor, repetes o nome de Deus e ao mesmo tempo levantassuas roupas. Tu no crs no que dizes. Aqui esto os dois tipos de f. E amaioria das pessoas como este brahmin, fala da f mas no a tem. Mas claro,

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    a f inquebrantvel vem com a viso de Deus ou sendo simples como estapastora ou como uma criana.

    Como se desenvolve esta f? Sendo simples e cndido como um menino.Quando algum cndido confia nas palavras das escrituras e dos grandesmestres espirituais. Em seguida pe em prtica seus ensinamentos semvacilao nem dvida. Esta prtica fortalece sua f em Deus, pois nela encontrauma fora que no deste mundo.

    Vejamos agora, o que acontece com os que no so francos e simples? Seeles querem ter consolao e paz tambm tm que lutar duramente para vencerseus defeitos. Tm que rezar ao Senhor com todo o corao para que oscoloquem no bom caminho e possam corrigir-se. Pode surgir a dvida: E se asoraes no forem respondidas? A prpria dvida demonstra que no tomamoso caminho a srio, que no temos o verdadeiro anelo. Porque esta dvida notem base. Por acaso no nos asseguram os grandes mestres da humanidade, querealizaram a meta da vida, que viram Deus, que Ele nosso guia interno eescuta nossas oraes quando so sinceras? Por exemplo, o Senhor Jesus Cristoafirma: Peam e lhe daro; busquem e acharo; chamem e lhe abriro. Porquequalquer um que pea, recebe e o que busca, acha e ao que chama, lhe seraberta [a porta]. Que homem entre vs, a quem se o filho pedir po, lhe daruma pedra? E se lhe pedisse um peixe, lhe dar uma serpente? Pois se vs,sendo maus, sabeis dar boas ddivas a vossos filhos, quanto mais vosso Pai queest nos cus, dar boas coisas aos que lhe pedem. Portanto, se rezando umavez no conseguimos resposta, no devemos pensar que Deus no escuta nossaorao. Swami Vivekananda disse: Quantas tempestades e ondas precisoenfrentar antes de chegar ao porto de Paz! Quanto maior foi o homem, maisterrveis foram as provas pelas quais teve que passar. Assim, se queremos umacoisa valiosa, devemos estar preparados para pagar seu preo. E a pacincia e a

    perseverana so o preo da paz eterna. No devemos fraquejar nem afrouxarnossos esforos, mas continuar com a luta, no importa o que acontea. Porqueno h consolao em nenhum outro lugar seno em Deus. Se O deixamos, aque outro lugar podemos recorrer em busca de paz? Em que podemos confiar?Em riquezas, em filhos, em parentes ou amigos? At quando podem elesajudar-nos e como podem dissipar nossos sofrimentos que esto alm da ajudahumana? Sabendo que no temos a ningum seno ao Senhor neste mundo aquem podemos chamar propriamente nosso, devemos tomar refgio nEle.Swami Vivekananda aconselha: Renuncie a todo eu e meu, pois o Senhorchega quele que no tem nada neste mundo. Estas palavras surgiram de suaprpria experincia, no mero palavreado. por isso que ainda enchem ao

    leitor com estremecimento e lhe infundem confiana em si mesmo. As palavrasdaquelas pessoas que tocaram e apalparam o infinito levam uma fora prpria.Estas palavras consomem, por assim dizer, como o fogo, toda dvida, todotemor e vacilao dos que as ouvem ou lem.

    Por que ento se queixam e gemem at os crentes quando esto emcircunstncias difceis? Porque ainda no aceitaram ao Senhor como seu nosentido mais pleno. Alm disso, entregar-se Deus no to fcil como pareceenquanto exista to sequer um pequenssimo vestgio do desejo de gozar,

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    enquanto haja imperfeio no homem. Porque aquele que se entrega totalmente Deus no tem nada que temer, pois Sri Krishna nos assegura: Eu (o Senhor)Me encarrego daqueles que sempre pensam em Mim unicamente, Me servem eMe adoram, e lhes provejo do que lhes faz falta e cuido do que j tm.

    Ouvindo isto se pode atribuir parcialidade a Deus e dizer que em tal casoEle tambm, como qualquer ser humano, est sujeito a todas as debilidades,como dio, parcialidade e coisas assim. Esta acusao no tem fundamentocomo veremos do que disse Sri Krishna: Eu me manifesto igualmente em todosos seres. Ningum odioso nem mui querido para Mim. No entanto, Eu estounaqueles devotos que Me adoram com devoo e eles esto em Mim. O Senhorest em todos os seres como seu guia interno, como seu Ser mais recndito.Como podemos ento odiar algum? O significado que o devoto por suaintimidade com Deus perde a noo de diferenciao e distncia que umhomem comum sente entre ele mesmo e Deus. Para o devoto, o Senhor muitoseu, muito ntimo e as coisas do mundo no tem muito valor para ele. Sua vidase centra em Deus. Pelo contrrio, para o homem mundano Deus uma palavrae os objetos sensrios so como se fossem sua prpria vida. Sri Ramakrishnacostumava dizer: Deus est em todas as partes, mas se manifesta de umamaneira especial no corao do devoto. Eis aqui um canto que expressa aatitude do devoto por Deus:

    Senhor, Tu s meu Tudo em tudo, a Vida de minha vida, aEssncia da essncia;Nos trs mundos no tenho a ningum seno a Ti a quem possachamar meu.

    Tu s minha paz, minha alegria, minha esperana;Tu, meu apoio, minha riqueza, minha glria,Tu, minha sabedoria e minha fora.Tu s meu lar, meu lugar de descanso, meu amigo ntimo, meuparente mais querido.

    Meu presente e meu futuro Tu s; meu cu e minha salvao;Tu s minhas escrituras, meus mandamentos, Tu, meu semprebondoso Gur.Tu s a fonte de minha bem-aventurana sem limite.

    Tu s o caminho; Tu, a meta; Tu, Adorvel, Senhor.Tu s a me de corao terno; Tu, o pai que castiga.Tu s o Criador e o Protetor. Tu, o Timoneiro que guia minha barcaatravs do mar da vida.

    Aqui vemos como desaparece da vista do devoto a barreira doresplendor e glria que interferem na relao de um ser individual com o SerSupremo. Para o devoto, Deus no um estranho, por conseguinte, sente Sua

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    proximidade. Em troca, o homem comum, devido a sua ignorncia, constribarreira sobre barreira entre ele e Deus; barreiras do ego, riqueza, renome,fama, orgulho e assim por diante. So estas que nos impedem de ver a Deus,que mora em nosso corao.

    O que acontecer com aqueles que levam uma vida imoral e m, aquelesque cometem erros? No h sada para eles? O Bhagavad Gita promete asalvao para eles tambm: Ainda que um homem seja o pior dos malvados, seMe adora com a devoo de todo corao, deve ser considerado como umaalma nobre, pois tomou uma boa determinao. O significado este: O serhumano comete erros, por vrios motivos, mas por esta razo no deve sercondenado por toda vida. Se ele se arrepende e toma refgio em Deus existe apossibilidade de que suas tendncias viciosas desapaream e caiam dele, comoas folhas secas de uma rvore no outono. Sri Krishna agrega: Em pouco tempoeste homem se converte em um santo e alcana a paz imortal. filho de Kunti,proclama ao mundo que Meu devoto jamais perece. Temos aqui a promessainequvoca do Senhor.

    Qual a atitude que melhor convm ao devoto, est explicado por SriRamakrishna. Cita o exemplo do gatinho: O gatinho s sabe chamar a sua me,dizendo miau, miau. Fica contente aonde quer que a me o ponha. A gata ope s vezes na cozinha, s vezes no solo e outras vezes sobre a cama. Quandoo gatinho sofre, grita, miau, miau, no sabe fazer outra coisa. Mas to logo ame gata ouve este grito, aonde quer que esteja, vem at ele. Clama por Deus, conclui Sri Ramakrishna desta maneira, com um corao anelante, entocom toda certeza poders v-Lo.

    Surge outra vez a velha dvida, que j foi respondida, de outra forma:Por que Deus no outorga a todos f nEle? Por que s d alguns e no outros? E por que, mesmo estes poucos, d a f de diferentes graus? O

    Bhagavad Gita o aclara: O Senhor no obriga ningum atuar, no cria para aspessoas nem os objetos nem a unio com os frutos das aes. a natureza queatua. O Senhor no recebe nem o mal nem o bem de ningum. O conhecimentoest coberto pela ignorncia, por conseguinte, os seres ficam iludidos.Anatureza ou Prakriti, por seus poderes de ocultar a realidade e projetar airrealidade, rouba do ser individual sua faculdade de discernimento e eleidentificando-se com a natureza toma o irreal pelo Real, o transitrio peloEterno e permanece apegado ao mundo. O dia em que cessar de faz-lo se darconta de sua verdadeira natureza e se liberar para sempre.

    Vejamos agora, como podem aqueles que j esto presos no mundo,chegar Deus, a morada da consolao? No podem de repente romper sua

    relao com aqueles com quem convive, nem desfazer-se de seus deveres. Aeles Sri Ramakrishna aconselha: Cumpra com todos os deveres, mas mantenhavossa mente em Deus. Viva com todos, com esposa e filhos, pai e me, e sirva-os. Trate-os como se fossem seus mui queridos, mas saiba no mais ntimo devosso corao que eles no lhe pertencem; que Deus vosso amigo, parente emorada.

    Que possamos alcanar Deus, a morada da consolao, nesta mesmavida, por Sua misericrdia!