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Curso de Ciências Contábeis Artigo Original ORÇAMENTO PARTICIPATIVO: DO CONCEITO DE ORÇAMENTO PÚBLICO ATÉ A MEDOTOLOGIA DE PARTICIPAÇÃO POPULAR PARTICIPATORY BUDGETING: FROM PUBLIC BUDGET CONCEPT TO POPULAR PARTICIPATION MEDOTHOLOGY Corinto Meffe(1), Artur José Simão Pedreira (2), Cristiano Ricardo Vaz de Melo (3) 1 Aluno do Curso de Ciências Contábeis 2 Professor Especialista do Curso de Ciências Contábeis 3 Professor Mestre e Coordenador do Curso de Ciências Contábeis Resumo Introdução: o surgimento do orçamento público tem uma relação com as demandas da sociedade por maior controle do uso dos recursos públicos, que recebe influência direta da forma de como o poder é exercido e executado. O Orçamento Participativo nasce com essa mesma perspectiva, mas coloca o cidadão como um ator essencial na formulação da peça orçamentária, demonstrando as nuances de uma metodologia de participação capaz de melhorar o nível de cidadania e das relações sociais, sustentadas pelo acesso mínimo ao conhecimento das técnicas que envolvem a elaboração e a destinação do Orçamento Público. Objetivo: apresentar a evolução histórica e os conceitos básicos de Orçamento Público, o surgimento da metodologia de Orçamento Participativo, o caso prático da experiência de Porto Alegre e as percepções sobre o processo de participação popular que qualificam a cidadania. Materiais e Métodos: a realização deste trabalho será fundamentada em revisão teórica de acordo com a bibliografia básica de referência. Outras fontes bibliográficas serão utilizadas com a intenção de aprofundar os conceitos abordados sobre cidadania e ampliar o horizonte temático no que tange à participação popular. Desta forma, será abordado o conceito de Orçamento e o seu histórico, destacando sua evolução e sua estrutura. Em seguida, será analisado o modelo de construção do Orçamento Participativo, a sua correlação com os princípios abordados, de acordo com o referencial teórico, e o caso prático na cidade de Porto Alegre. Resultado: com base nas experiências observadas na sociedade e no governo, sustentadas por ampla bibliografia teórica, descritiva e de estudos de casos, serão demonstrados os detalhes da metodologia do Orçamento Participativo e alguns indícios da melhoria da qualidade da cidadania. Para tanto, será abordada a experiência de Porto Alegre, onde a prática esteve vigente por maior tempo e serviu de referência para outras cidades brasileiras. Conclusão: a partir da análise conceitual de Orçamento Público e Participativo, será demonstrado como a aplicação prática da metodologia do Orçamento Participativo estabelece os mecanismos de participação popular na gestão da cidade, a melhoria qualitativa e educativa do cidadão e a democratização do uso dos recursos públicos. Palavras-Chave: Orçamento Público; Orçamento Participativo; Participação Popular; Metodologia de Participação; e Democracia. Abstract Introduction: the emergence of public budget is related to the social demand for more control of the public funds spending, which is strongly influenced by the way the power is exerted and executed. The participatory budgeting sets upon the same perspective, but put the citizen as an essencial actor in the budget drafting, showing the nuances of a participation methodology that is able of improve the level of citizenship and social relations, supported by minimum access of technical knowledge related to the formulation and commitment of public budget. Goal: review the historical evolution and the basic concepts of Public Budget, the appearance of Participatory Budgeting methodology, the practical case of the city of Porto Alegre and perceptions about the popular participation process that qualifies citizenship. Resources and Methodology: the implementaion of this work will be based on literature review according to the basic bibliography.Other literature sources will be used in an attempt to deepen the concepts covered on citizenship and broaden the thematic boundary regarding to popular participation. Thus, we will address the Budget concept and its history, highlighting its evolution and structure. Then, the construction model of Participatory Budgeting will be analyzed, its correlation with the addressed principles, in accordance with the proposed theoretical framework, and the practical case of the city of Porto Alegre . Results: based on the experiences observed in society and government, supported by extensive theoretical, descriptive and case studies bibliography, details of the Participatory Budgeting methodology will be shown as well as some evidence of improving the quality of citizenship. For that end, the Porto Alegre case will be addressed, where the practice was effective for a longer time and has been used as an example for other cities. Conclusion: from the conceptual analysis of Public Budget and Participatory Budgeting, the way in which the application of Participatory Budgeting methodology establishes mechanisms for popular participation in city management and the qualitative and educational improvement of the citizen and the democratization of the public resources use will be shown. Keywords: Public Budget; Participatory Budgeting; Popular Participation; Participation Methodology; and Democracy. contato: [email protected] , [email protected] Introdução A dicotomia clássica entre o conhecimento científico e popular no passado, fez com que o primeiro estabelecesse especificidades teóricas, cujo domínio o reduzia ao universo dos “estudiosos”, sendo estes, de forma provocativa, batizados de “iluminados”. Percebe-se que durante muito tempo tal reducionismo tornou-se aliado da manutenção de poderes e privilégios, de separatismos sociais e da sustentação de modelos de exploração e alienação. 1/30

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Curso de Ciências Contábeis Artigo Original

ORÇAMENTO PARTICIPATIVO: DO CONCEITO DE ORÇAMENTO PÚBLICO ATÉ A MEDOTOLOGIA DE PARTICIPAÇÃO POPULARPARTICIPATORY BUDGETING: FROM PUBLIC BUDGET CONCEPT TO POPULAR PARTICIPATION MEDOTHOLOGY

Corinto Meffe(1), Artur José Simão Pedreira (2), Cristiano Ricardo Vaz de Melo (3)

1 Aluno do Curso de Ciências Contábeis2 Professor Especialista do Curso de Ciências Contábeis3 Professor Mestre e Coordenador do Curso de Ciências Contábeis

Resumo

Introdução: o surgimento do orçamento público tem uma relação com as demandas da sociedade por maior controle do uso dos recursos públicos, que recebe influência direta da forma de como o poder é exercido e executado. O Orçamento Participativo nasce com essa mesma perspectiva, mas coloca o cidadão como um ator essencial na formulação da peça orçamentária, demonstrando as nuances de uma metodologia de participação capaz de melhorar o nível de cidadania e das relações sociais, sustentadas pelo acesso mínimo ao conhecimento das técnicas que envolvem a elaboração e a destinação do Orçamento Público. Objetivo: apresentar a evolução histórica e os conceitos básicos de Orçamento Público, o surgimento da metodologia de Orçamento Participativo, o caso prático da experiência de Porto Alegre e as percepções sobre o processo de participação popular que qualificam a cidadania. Materiais e Métodos: a realização deste trabalho será fundamentada em revisão teórica de acordo com a bibliografia básica de referência. Outras fontes bibliográficas serão utilizadas com a intenção de aprofundar os conceitos abordados sobre cidadania e ampliar o horizonte temático no que tange à participação popular. Desta forma, será abordado o conceito de Orçamento e o seu histórico, destacando sua evolução e sua estrutura. Em seguida, será analisado o modelo de construção do Orçamento Participativo, a sua correlação com os princípios abordados, de acordo com o referencial teórico, e o caso prático na cidade de Porto Alegre. Resultado: com base nas experiências observadas na sociedade e no governo, sustentadas por ampla bibliografia teórica, descritiva e de estudos de casos, serão demonstrados os detalhes da metodologia do Orçamento Participativo e alguns indícios da melhoria da qualidade da cidadania. Para tanto, será abordada a experiência de Porto Alegre, onde a prática esteve vigente por maior tempo e serviu de referência para outras cidades brasileiras. Conclusão: a partir da análise conceitual de Orçamento Público e Participativo, será demonstrado como a aplicação prática da metodologia do Orçamento Participativo estabelece os mecanismos de participação popular na gestão da cidade, a melhoria qualitativa e educativa do cidadão e a democratização do uso dos recursos públicos.

Palavras-Chave: Orçamento Público; Orçamento Participativo; Participação Popular; Metodologia de Participação; e Democracia.

Abstract

Introduction: the emergence of public budget is related to the social demand for more control of the public funds spending, which is strongly influenced by the way the power is exerted and executed. The participatory budgeting sets upon the same perspective, but put the citizen as an essencial actor in the budget drafting, showing the nuances of a participation methodology that is able of improve the level of citizenship and social relations, supported by minimum access of technical knowledge related to the formulation and commitment of public budget. Goal: review the historical evolution and the basic concepts of Public Budget, the appearance of Participatory Budgeting methodology, the practical case of the city of Porto Alegre and perceptions about the popular participation process that qualifies citizenship. Resources and Methodology: the implementaion of this work will be based on literature review according to the basic bibliography.Other literature sources will be used in an attempt to deepen the concepts covered on citizenship and broaden the thematic boundary regarding to popular participation. Thus, we will address the Budget concept and its history, highlighting its evolution and structure. Then, the construction model of Participatory Budgeting will be analyzed, its correlation with the addressed principles, in accordance with the proposed theoretical framework, and the practical case of the city of Porto Alegre . Results: based on the experiences observed in society and government, supported by extensive theoretical, descriptive and case studies bibliography, details of the Participatory Budgeting methodology will be shown as well as some evidence of improving the quality of citizenship. For that end, the Porto Alegre case will be addressed, where the practice was effective for a longer time and has been used as an example for other cities. Conclusion: from the conceptual analysis of Public Budget and Participatory Budgeting, the way in which the application of Participatory Budgeting methodology establishes mechanisms for popular participation in city management and the qualitative and educational improvement of the citizen and the democratization of the public resources use will be shown.

Keywords: Public Budget; Participatory Budgeting; Popular Participation; Participation Methodology; and Democracy.

contato: [email protected], [email protected]

Introdução

A dicotomia clássica entre o conhecimento científico e popular no passado, fez com que o primeiro estabelecesse especificidades teóricas, cujo domínio o reduzia ao universo dos “estudiosos”, sendo estes, de forma provocativa, batizados de

“iluminados”. Percebe-se que durante muito tempo tal reducionismo tornou-se aliado da manutenção de poderes e privilégios, de separatismos sociais e da sustentação de modelos de exploração e alienação.

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Nas políticas públicas, o domínio de conhecimentos técnicos específicos serviram, na maioria das vezes, também para manter privilégios e para afastar o cidadão do centro das decisões e sustentar, consequentemente, as estruturas de poder inabaladas. Verifica-se, entretanto, que nos últimos anos existe uma aproximação profunda e contínua entre o estudo científico e o saber popular, bem como das interações sociais geradas entre ambos, com o propósito de atender de forma mais acelerada e efetiva as demandas da sociedade.

O foco do presente estudo não pretende aprofundar o impasse (que vem se reduzindo com o tempo) entre o saber científico e o conhecimento popular, mas sim demonstrar que o domínio de saberes que levem à compreensão de informações técnico-científicas, por parte de qualquer cidadão, auxilia sobremaneira a cidadania e que tal "desmistificação" da ciência, amplia o espectro democrático na gestão pública, em especial no que tange às relações sociais provenientes da vida no seio das cidades.

Desta forma, pretende-se demonstrar as possibilidades de operar a desmistificação do Orçamento Público para o cidadão “comum”, com a aplicação de uma metodologia denominada Orçamento Participativo e como, a partir da implementação desta metodologia, que completa 25 anos, amplia-se o conhecimento da lógica do Orçamento Público, da participação popular e da qualidade da cidadania.

Como a Administração Pública não assume o caráter de competitividade inerente ao setor privado, as vantagens da gestão democrática, anteriormente citadas, relacionam-se de forma direta e objetiva com a promoção da qualidade dos serviços prestados ao cidadão e com o fortalecimento da cidadania.

O Brasil, a partir de junho de 2013, passou a conviver com uma série de manifestações populares, em boa parte com a população tomando as ruas de forma pacífica (com exceções de alguns atos violentos), para exigir inicialmente a redução de preço das passagens e a melhoria dos transportes públicos. Aos poucos, as reivindicações se alastraram para outros segmentos: educação, saúde, segurança e justiça. Esse leque de demandas da sociedade demonstra a atualidade de se discutir o aperfeiçoamento da nossa democracia e os mecanismos de participação social, dentre eles o Orçamento Participativo.

Objetivos

O interesse pelos problemas sociais que assolam nosso país e as nossas cidades são capazes de comover parte expressiva da sociedade. Na maioria das vezes, a dedicação pessoal a um determinado tema é acompanhada por uma dose forte

de emoção: uma combinação que nos aproximou, com certa naturalidade, dos temas relacionados à democracia e cidadania. Não se pode sair impune de apaixonante relação.

Ao tomarmos contato com os estudos sobre o Orçamento Participativo e a correlação imediata com a participação cidadã, que alcançou seu auge na década de 90, foi inevitável o anseio de recolocar o assunto em pauta e, porque não dizer, provocar o retorno do assunto de forma mais contudente em nosso país.

Ao reconhecer que o conhecimento técnico quando disponibilizado para sociedade, pode fortalecer a capacidade de intervenção social, foi quase por impulso que surgiu a intenção de preparar o artigo, para explorar a necessidade de se alcançar a conjunção do saber científico, cunhado na academia, com o saber popular, construído em meio às realidades inerentes às relações sociais e culturais.

Nesse contexto, surge em dois tempos, a pergunta que norteia a questão central, motivadora do presente artigo: Como foi desenvolvida a metodologia do Orçamento Participativo e como tal prática melhora a participação social do cidadão? Concentrado nestas interrogações, o presente trabalho demonstra que o cidadão quando chamado à participação, depreende um nível de conhecimento que engrandece a política pública e, ao mesmo tempo, alimenta a inserção cidadã individual e coletiva.

Propositalmente, ocorreu o resgate da experiência da cidade de Porto Alegre, que é detentora de resultados contundentes, para gerar um alinhamento com o momento atual, em que a sociedade brasileira tem clamado nas ruas por melhor qualidade dos serviços públicos, por maior participação política e pela ampliação do combate à corrupção. O Orçamento Participativo pode ser novamente um desses instrumentos que consiga atender aos anseios dos brasileiros. Para tanto, a iniciativa precisa ser resgatada, estimulada, aperfeiçoada e acima de tudo vivenciada nas cidades.

Por fim, como se trata de uma prática que precisa ser compreendida, assimilada e difundida, buscamos desvendar os intrincamentos metodológicos para que qualquer cidadão, tomando como base o presente artigo, possa ter os instrumentos necessários para a proposição, a implantação ou a análise de uma experiência de Orçamento Participativo.

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Materiais e Métodos

Para a realização do artigo será aplicada a teoria orçamentária clássica para tratar do tema Orçamento Público e, em específico, para a dimensão do Orçamento Participativo, com os estudos de duas pesquisadoras brasileiras: Ana Clara Torres RIBEIRO e Grazia de GRAZIA [2003], na intenção de respaldar cientificamente as conclusões apresentadas. Tal sequência parte da evolução do conceito de orçamento e de Orçamento Público, com o propósito de demonstrar os detalhes da prática do Orçamento Participativo, de descrever uma experiência concreta e, ao final, apresentar uma análise do impacto dessa metodologia.

Para alcançar tal objetivo, a fonte de consulta primária do estudo tem relação com os pesquisadores relacionados com o Orçamento Participativo, com teóricos da contabilidade pública e com experiências concretas realizadas nos municípios brasileiros.

Quanto aos fins, o presente artigo atenderá às seguintes características: Exploratória e Descritiva. A primeira por se tratar de um tema recente, cujas implicações ainda não são plenamente conhecidas e com potenciais ainda a serem explorados pela sociedade. A segunda característica, pelo conteúdo bibliográfico que detalha conceitualmente a essência do objeto central pesquisado e descreve os resultados nas cidades onde a experiência foi implantada.

No que concerne aos meios serão adotados métodos de pesquisa documental, de estudos de casos e de referências bibliográficas, respectivamente, o primeiro tem relação com os materiais produzidos por ONGs-Organizações Não Governamentais; o segundo com as pesquisas acadêmicas dedicadas ao tema; e o último destinado aos teóricos (ou criadores) do Orçamento Participativo.

Procedimentos de estudo: trata-se de um trabalho de natureza exploratória, com a realização de levantamento e pesquisa de bibliografia básica sobre Orçamento Público e Orçamento Participativo, com o uso de bibliografia complementar sobre gestão democrática, participação popular e políticas públicas, com o apoio de pesquisa junto à artigos científicos, que exploram as experiências práticas nas cidades brasileiras e o estudo de caso da prefeitura de Porto Alegre.

Caracterização do estudo: O trabalho foi desenvolvido com base em uma pesquisa exploratória e descritiva por meio de bibliografia de referência, pesquisa eletrônica e documentos técnicos. A metodologia de desenvolvimento deste trabalho é dividida em três etapas:

1ª – Análise da literatura bibliográfica dedicada às seguintes áreas: Orçamento Público, Orçamento Participativo e o caso da cidade de Porto Alegre;

2ª – Busca eletrônica, para tratar dos temas mais atuais de legislação, cidadania e qualidade de vida, bem como as práticas de Orçamento Participativo pela internet; e

3ª – Documentos técnicos que relatam as práticas de Orçamento Participativo, em especial os documentos relacionados à implantação e análise da metodologia.

Orçamento Público: histórico, princípios, processo e as funções do orçamento.

Introdução: o orçamento é uma prática de política pública empregada desde o século XII, no período do Absolutismo. O responsável pelo registro embrionário é o rei John Lackland, popularmente conhecido como João Sem Terra. Durante o seu reinado foi instituída a Magna Charta Libertatum que estabeleceu em seu artigo 12 que “Nenhum Tributo ou auxílio será instituído no Reino, senão pelo seu conselho comum”(1). Tal decisão, promulgada no ano de 1217, tem relação com a pressão inicial do Conselho Comum(órgão de representação da sociedade) em controlar a origem das receitas que sustentavam o regime monárquico.

A contabilidade tem no orçamento uma de suas peças mais importantes. Trata-se de algo tão essencial que outras ciências aplicadas dependem dessa peça para realizar a tomada de decisões: o gestor público, o administrador de empresas, o economista, o publicitário, o auditor, entre outros, precisam desse instrumento para empregarem melhor os recursos financeiros, no decorrer de um determinado exercício. No orçamento temos o coração das decisões de qualquer organização, seja ela pública, privada e sem fins lucrativos.

O surgimento do Orçamento Público se confunde com o nascimento do Estado de Direito. Como afirmam PIRES e MOTTA [2006], “a questão de ordem financeira do poder público foi a primeira área a ser atingida na passagem do Estado Absoluto para o Estado de Direito”.

Ressalta-se que o Orçamento Público é o mais antigo instrumento de gestão e é também o de maior relevância(2). Ele se desenvolve com a necessidade de fortalecer os vínculos de controle do gasto público, em uma fase da civilização de expanção das relações e transações comerciais - momento histórico denominado Mercantilismo.

No Orçamento Público se traduzem as políticas e as ações governamentais. É nele que se percebe para onde caminha a Administração Pública, se verifica a origem das receitas, a projeção do aumento dessa receita, de onde surge essa projeção, e de como serão gastos os

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recursos públicos. Quando o Executivo decide aumentar os gastos com educação, ampliando as dotações orçamentárias previstas em lei, é justamente no orçamento onde esse aumento se traduz. Se existem inversões que retiram gastos da saúde para publicidade é no orçamento que se reflete essa movimentação (tecnicamente denominada remanejamento). É justamente na prática orçamentária que se percebe a intenção política do ente governamental.

Histórico: a origem etimológica da palavra orçamento, de acordo com Pedro A. PINTO [1956], “está em geral, vinculada ao termo italiano orzare ou então ao latino ordiro, orsus, sum, ordiri, que tem o significado de planejar, calcular”. Fica evidente que a intenção de planejar as ações encontrava-se há tempos, intimamente associada às práticas orçamentárias.

O registro histórico do Orçamento Público pode ser observado sob aspectos peculiares. Os estudiosos ao abordarem o tema, fazem diversas correlações, dentre elas: (i) com as experiências desenvolvidas nos principais países para a formulação conceitual: Inglaterra, França e Estados Unidos; (ii) com as principais transformações históricas da sociedade: Revolução Burguesa, Revolução Francesa, Revolução Americana; e (iii) com a própria evolução da técnica orçamentária, que influenciou a concepção de três modelos: o tradicional (ou clássico); o de desempenho (ou de realizações) e por programas (ou orçamento-programa).

As contribuições dos países pioneiros foram responsáveis por sustentar a construção da política pública do orçamento. Tal construção tem uma relação direta com o amadurecimento do Estado. Na época do Feudalismo e do Mercantilismo, os gastos do imperador ou rei se confundiam com as finanças públicas, não havia distinção entre as despesas pessoais e as do Governo. A figura crescente do Estado tornou necessária uma melhor organização de suas receitas e despesas. Entretanto, a história do Orçamento Público é acompanhada de árduas e longínquoas lutas políticas, tornando-o um instrumento essencial para o equilíbrio dos interesses que rondam o poder e a sociedade.

A Inglaterra foi o primeiro país a se preocupar de fato com a forma em que a receita se originava. No princípio o rei estabelecia a tributação e a população obrigatoriamente atendia ao monarca. No ano de 1706, através da Resolução n. 66, da Câmara dos Comuns, se estabeleu que qualquer tributo a ser criado deveria passar pela aprovação do Parlamento e que caberia ao executivo a responsabilidade pela condução das finanças do governo(3). Desde essa época, o país se tornou referência para implementação da sistemática orçamentária nas instituições governamentais de todo mundo. Mas, somente a partir de 1822, que foi formalmente

redigido o primeiro Orçamento Público da Inglaterra, data que pode ser entendida como a que registra o início da política orçamentária desenvolvida em sua plenitude.

Na França, a partir de 1831, se amplia o controle da despesa (assim como na Inglaterra tal preocupação chega em segundo momento) e fica estabelecido que nenhum ministro poderia gastar mais que os recursos destinados à sua pasta. De acordo com GIACOMONI [1992], a partir dessa data “o controle parlamentar sobre o orçamento passou a ser completo”. PIRES e MOTTA [2006] se debruçam em BURKHEAD [1971], para apresentar os fundamentos franceses, que se tornaram basilares para os princípios orçamentários adotados até hoje, sendo eles:

"o orçamento deverá ser votado anualmente (anuidade); deverá ser votado antes do início do ano financeiro a que se refere (anterioridade); deverá conter todas as previsões de receitas e despesas necessárias para o ano seguinte (universalidade); e as receitas não devem ser vinculadas a objetivos específicos, mas todas fazem parte de um fundo consolidado (não-afetação da receita);

Os Estados Unidos, por meio de um dispositivo constitucional regulamentado por volta de 1800, instituiu que ao Secretário do Tesouro Nacional caberia "elaborar e apresentar ao Congresso [...] um relatório financeiro sistemático que contenha a estimativa da receita pública, bem como da despesa". Tal regulamentação tem base na primeira Constituição americana que definia "que nenhuma soma será retirada do Tesouro, senão em consequência de apropriações estabelecidas em lei". O país, naquela época, reforçou ainda a questão da transparência ao incluir em seu dispositivo que "um balanço das entradas e saídas de dinheiros públicos deve ser divulgado periodicamente"(4).

Obviamente, que as questões históricas têm uma relação direta com os países onde o conceito de orçamento surgiu originalmente. Entretanto, elas estão entranhadas pela ideologia que as suportava, em especial com o emergir do Estado Liberal. Suas contribuições estão presentes até os dias de hoje. Verifica-se no caso da Revolução Burguesa, iniciada na Inglaterra entre os anos de 1688 e 1689, a preocupação com a dissolução do poder abasoluto do rei, atitude que transformou o método de arrecadação e de uso dos tributos. Primeiro com a figura da Câmara dos Comuns para reger a aprovação da criação de algum tributo e, em segundo momento, pela função do Parlamento em aprovar, reduzir ou rejeitar alguma despesa.

Já a Revolução Francesa, dominada pela corrente de pensamento Iluminista, definiu as bases da democracia moderna ao criar a partilha do poder do Estado entre o executivo, o

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legislativo e o judiciário. E de Acordo com FREITAS [2003], “foi a partir de 1789 que a Constituição francesa consagrou o princípio de que nenhum imposto pode ser cobrado sem o consentimento da nação”, decisão reforçada em 1817 pela Assembleia Nacional, quando definiu que o orçamento deveria ser aprovado pelo representantes do poder legislativo.

A Revolução Americana, foi irradiada pelas experiências inglesas e francesas. Entretanto, em decorrência da expansão do liberalismo nos Estados Unidos, a lógica empresarial influenciou o desenvolver do orçamento-programa. De acordo com FREITAS [2003]:

“No final da década de 1940, a Comissão Hoover, em face de estudos, recomendou ao Governo Federal um orçamento com indicação dos objetivos, dos custos e da relação receita/despesa, tudo estruturado na forma de funções, projetos e atividades. Para esse tipo de orçamento cunhou a expressão performance-budget, vale dizer, orçamento de desempenho.”

No aspecto histórico destaca-se também que a evolução orçamentária tem um enlace permanente entre os aspectos políticos, econômicos, técnicos e financeiros. O conceito moderno de finanças públicas tem sua origem na Idade Moderna e existem fundamentos oriundos de três escolas do pensamento: a Escola Cameralística, presente na Administração Pública da Alemanha e Aústria – século XVI ao XVII, a Escola Fisiocrática de teóricos franceses – século XVIII, e a principal delas, a Escola Clássica originada na Inglaterra – século XVII(5).

No que tange à evolução técnica, existem três modelos resultantes do aprimoramento da prática orçamentária, sendo eles: o modelo Clássico ou Tradicional, que tem uma preocupação marcada pelo controle do gasto. Já o modelo de Desempenho ou de Realizações evidencia, como o próprio nome diz, que as coisas que o governo compra são menos importantes que as coisas que o governo faz(6). Por fim, o modelo orçamento-programa que busca associar os gastos públicos com as ações e com o planejamento de cada atividade a ser executada.

Embora os aspectos históricos evidenciem a evolução técnica, sabe-se que o surgimento do )Orçamento Público tem uma ligação forte com o propósito do controle. No decorrer da sua evolução foram incoporadas de forma cumulativa as preocupações com a destinação dos recursos (as despesas), com a realização das ações (orçamento-programa) e a publicização do uso desses recursos (transparência). Entretanto, jamais tal política perdeu o seu caráter de relação com o poder. O economista FREITAS [2003], caracteriza que

“a compreensão do processo orçamentário e das suas instrumentalidades – planejamento e programação, gerência e administração, contabilidade e administração financeira, controle e avaliação – decorre da evolução à sua condição de instrumento político”.

Fica latente na afimação do economista que existe uma relação intrínseca entre o processo orçamentário e a política, pois o referido instrumento é tratado também como componente de gestão e de controle dos recursos financeiros para sustentar as políticas e ações do governo. Isto significa que a tradução das definições políticas vigentes em determinada sociedade têm o seu reflexo na lógica orçamentária.

Os Princípios Orçamentários: os princípios orçamentários são as regras fundamentais que servem como o norte da prática orçamentária e que estabelecem o conjunto de premissas, que devem ser observadas durante cada etapa da elaboração orçamentária. SANCHES [1997], expressa um sentido mais rigoroso para o conceito, definindo que se trata de

“um conjunto de preposições orientadoras que balizam os processos e as práticas orçamentárias, com vistas a dar-lhe estabilidade e consistência, sobretudo ao que se refere a sua transparência e ao seu controle pelo Poder Legislativo e demais instituições da sociedade...”

Os princípios orçamentários, de acordo com alguns autores, podem ser divididos entre os clássicos (com fundamento político-legalista) e modernos (com base no planejamento e gestão), sendo os clássicos: Anualidade, Clareza, Equilíbrio, Exclusividade, Legalidade, Não-afetação, Publicidade, Unidade Orçamentária, Uniformidade, Universalidade, do Orçamento Bruto; e os modernos: Simplificação, Descentralização, Responsabilização.

Importante mencionar que de acordo com SILVA [1962] “não há aprovação absoluta e unânime dessa classificação”, contudo, existem aqueles que são geralmente aceitos e SILVA [1962] reforça que

“esses princípios não tem caráter absoluto ou dogmático, antes constituem categorias históricas e, como tais, estão sujeitos a transformações e modificações em seu conceito e significação”.

A intenção não é de exaurir os princípios acima apresentados. Entretanto, alguns deles precisam ser evidenciados em decorrência de sua importância teórica ou da sua correlação com o tema proposto:

Anualidade: o orçamento tem vigência limitada a um exercício financeiro, que no caso da legislação brasileira, precisa coincidir com o ano civil.

Exclusividade: a legislação orçamentária não pode conter matéria estranha à previsão das receitas e à fixação das despesas.

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Não-afetação: uma determinada parcela da receita não pode ser reservada para atender a um gasto específico.

Unidade Orçamentária: o orçamento é uno, isto é, todas as receitas e despesas devem fazer parte de uma única lei orçamentária.

Uniformidade: a classificação e demais aspectos envolvidos na metodologia de elaboração do orçamento devem ser homogêneos para garantir as comparações ao longo do tempo.

Do Orçamento Bruto: as receitas e despesas devem constar na peça orçamentária em valores brutos e não em sua forma líquida.

Simplificação: o planejamento e o orçamento precisam estruturar-se a partir de elementos de fácil compreensão.

Descentralização: a execução das ações, preferencialmente, devem ocorrer próximo aos seus beneficiários.

Publicidade: a transparência e o amplo acesso às informações são garantidos plenamente a qualquer cidadão.

De imediato, verifica-se que três princípios são essenciais para fortalecer a participação da sociedade, em decorrência de sua relação direta entre governo e sociedade, sendo eles: da Descentralização, da Publicidade e da Simplificação.

Já outros princípios influenciam de forma cristalina a questão da aplicação técnica do Orçamento Participativo, tais como: da Anualidade, do Orçamento Bruto e da Unidade Orçamentária.

Desta forma, evidencia-se que todos os princípios orçamentários, em algum nível, estão presentes na metodologia do Orçamento Participativo e que o enlace verificado acima reforça a qualidade técnica que envolve a metodologia e demonstra que o Orçamento Participativo não é uma prática dissociada da boa técnica orçamentária e muito menos um instrumento político-partidário.

O Processo Orçamentário: o alinhamento entre o Orçamento Público e a legislação se acentuou com o passar do tempo. Uma das características marcantes do processo (ou ciclo) orçamentário é o seu respaldo legal. De acordo com o Senado Federal, o processo orçamentário “compreende as fases de elaboração e execução das leis orçamentárias – PPA, LDO e LOA(7). Cada uma dessas leis tem ritos próprios de elaboração, aprovação e implementação pelos Poderes Legislativo e Executivo”. Entender esses ritos do ciclo orçamentário é o primeiro passo para a participação da sociedade no processo decisório, fortalecendo, assim, o exercício do controle social na aplicação dos recursos públicos e os mecanismos de participação popular.

O processo orçamentário também evolui com a própria sociedade, representa o sistema político, os

interesses sociais e as disputas de poder de uma determinada época e reflete a cultura política e social registradas na história. De acordo com FREITAS [2003],

“a forma com que tais instrumentalidades vêm sendo praticadas, ao longo do tempo, depende da natureza do Estado, da estrutura institucional do setor público e da própria cultura administrativa local, que são decorrentes da dinâmica da história”.

Para demonstrar tal enlace político-legal e a evolução do instrumento orçamentário sob a égide da inflluência política de uma determinada localidade, serão apresentadas as principais etapas do processo orçamentário brasileiro, sendo elas:

Constituição Federal, Constituição Estadual, Lei Orgânica Municipal: o orçamento faz parte das leis máximas de cada Unidade da Federação, obedecendo a estrutura federalista de nosso país. No caso da Constituição Federal existe uma seção dedicada com exclusividade ao tema, sendo ela assim dividida: Título VI – Da Tributação e do Orçamento, Capítulo II - das Finanças Públicas, Seção II - dos Orçamentos (do Artigo 165 até 169).

Lei Federal 4.320/64: é a lei que cria o modelo orçamentário padrão para os três níveis de governo, disciplinando-o nas Unidades da Federação, por meio de dispositivos da receita e da despesa. Essa lei sofreu inúmeras inovações com destaque para a Portaria n.9 de 1974, que atualizou a discriminação da despesa por funções e estabeleceu um conjunto de normas para sua aplicação, inovando com a classificação funcional-programática das despesas orçamentárias.

Plano Plurianual – PPA: o Plano deve ser realizado a cada quatro anos e revisado anualmente, e como estabelece a lei constitucional. O PPA deve ser instituído “de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para despesas de capital e outras delas decorrentes e para as despesas relativas a programas de duração continuada”(8).

Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO: é a lei que estabelece o elo entre o PPA e a LOA. Uma das funções principais da LDO é de selecionar dentre os programas incluídos no PPA aqueles que terão prioridade na execução do orçamento do exercício subsequente. A LDO “compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subseqüente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento”(9).

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Lei Orçamentária Anual – LOA: é a lei que define o Orçamento Anual (anteriormente proposto pela LDO), divididos entre os orçamentos: fiscal, de investimento e da seguridade social, e visa concretizar de forma compatibilizada os objetivos e metas propostas no PPA, segundo as diretrizes de curto prazo estabelecidas pela LDO.

Elaboração do Orçamento Anual: após a definição do PPA, o Executivo desenvolve o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) que deverá, posteriormente, ser submetido à apreciação e aprovação do Poder Legislativo. Com sua aprovação o PLDO se torna oficialmente a Lei de Diretrizes Orçamentárias-LDO, que passará em sequência pelo crivo do legislativo, quanto ao uso e priorização dos recursos, alcançando então o seu desdobramento na fase de execução, logo após a aprovação da LOA.

Lei de Responsabilidade Fiscal-LRF: surge como desdobramento da própria Constituição de 1988, no ano 2000, e é considerada uma formulação importante, pois traz o objetivo de impedir que os governantes gastem mais do que as administrações têm capacidade de pagar, evitando o acúmulo de dívidas para as gestões posteriores. A Lei configura um propósito que atinge inclusive alguns princípios do orçamento, tais como o da não-afetação, pois destina recursos de forma exclusiva para algumas áreas, tais como: educação e saúde. A LRF, como é conhecida, deve ser considerada no momento de discussão do PLDO, para buscar maior equilibrio entre receita e despesa, e para verificar se as destinações dos recursos financeiros, que estão garantidos e definidos por lei, foram devidamente alocados.

Muitos autores deixam transparente que o orçamento é a tradução da aplicação política. A intenção de um governo se verifica no orçamento. No processo orçamentário tal característica fica evidenciada. Em primeiro lugar, por se tratar da composição de um instrumento jurídico, que como tal é construído pela sociedade e seus representantes. Em segundo lugar, por definir e respaldar as ações e os programas de governo. Em terceiro lugar, por garantir o processo de tomada de decisão, aprovação e definição das prioridades, bem como a alocação dos recursos. E por último, e mais importante, para refletir a política e o programa de um determinado governo, bem como a sua linha ideológica e as influências da sociedade.

As funções do Orçamento: o orçamento atualmente cumpre múltiplas funções. De início, quando de sua origem, tinha uma relação direta com a função de controle. Nesse período, já ficava evidente o caráter político da atividade orçamentária, visto que o ato de controlar tinha uma relação direta em reduzir o poder imediato do governante, impondo a obrigatoriedade em prever a criação e o aumento de tributos.

Ao longo do tempo outras funções foram incorporadas. De acordo com Pedro NOBLAT [2003],

“Além da clássica função controle, o orçamento apresenta outras funções mais contemporâneas, do ponto de vista administrativo, gerencial, contábil e financeiro. No Brasil, a função incorporada mais recentemente foi a função de planejamento, que está ligada à técnica de orçamento por objetivos”.

Fica latente que a evolução dos conceitos, das práticas e das técnicas do orçamento deram origem a algumas abordagens diferenciadas sobre sua abrangência, sua tecnicidade, seus princípios e processos, capazes de gerar experiências como a do Orçamento Participativo. Este internaliza uma parcela do processo decisório de elaboração orçamentária junto à população em geral, ouvindo de forma devidamente estruturada e institucionalizada as comunidades, para a definição das ações de Governo. Algo que pode ser traduzido como um aprofundamento da recente incorporação da função de planejamento, com o diferencial de que uma parte dos objetivos podem ser traçados também pela sociedade.

O Orçamento Público tem características que o relacionam aos aspectos macroeconômicos, aos microeconômicos, à própria sustentação da prática orçamentária e, como mencionado anteriormente, a evolução técnica e histórica do orçamento. O foco do presente artigo tem relação ao alinhamento dos aspectos das práticas orçamentárias aplicadas ao Orçamento Participativo. Isto significa dizer que a questão das Funções do Estado em sua dimensão alocativa, redistributiva e estabilizadora, bem como das práticas orçamentárias de orçamento de desempenho, base-zero, programa, tradicional incremental e teto fixo não serão abordadas.

No que tange às práticas orçamentárias, o enfoque programático é fundamental para elucidar as nuances de evolução do orçamento e sua relação com as práticas participativas, pois é dele que deriva a preocupação com a programação das despesas, tornado-o expressão das políticas públicas setoriais, sendo elas, por exemplo: saúde, educação, segurança e transportes. É Justamente nesse enfoque que a função de planejamento expressa, financeira e fisicamente, os programas de governo, distribuídos pelas políticas setoriais, possibilitando a integração entre o orçamento e o planejamento. Tal prática foi introduzida no Brasil na década de 60, por volta de 20 anos antes do nascimento do Orçamento Participativo.

A centralidade do Programa está na identificação de um problema e na programação das despesas. A partir de tal compreensão, o objetivo de uma ação do governo deve ser pactuada para atuar sobre a causa ou as causas do problema. Não basta apenas identificar os problemas, mas também verificar a viabilidade de

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que eles sejam resolvidos, sob todos os aspectos, inclusive o financeiro.

Tal prática programática obriga que um objetivo seja claro, concreto, alcançável, voltado para a resolução de um problema e mensurável por um ou mais indicadores, ou seja, as ações devem colaborar para a consecução dos objetivos previstos no programa, dando-lhe capacidade de resolver os problemas da sociedade e de alcançar a efetividade da ação de governo.

Para o governo passar do campo das intenções programadas para a efetiva execução, as ações orçamentárias devem ser desdobradas e detalhadas em projetos, atividades e operações especiais, sendo que os dois primeiros precisam ser vinculados a um ou mais resultados - algum bem e/ou serviço ofertados pelo setor público, que possam ser de alguma forma quantificados pela associação direta a uma meta a ser alcançada.

Ao se observar os elementos que compõem o enfoque programático e de planejamento do orçamento, a sua correlação com as políticas setoriais que afetam diretamente o cidadão e a preocupação com os resultados quantificáveis, fica nítida a sua relação com a metodologia do Orçamento Participativo. Esta prática participativa surgiu justamente para inserir de forma organizada o cidadão na identificação dos problemas do bairro e da cidade, na apresentação de propostas, na definição das prioridades e no acompanhamento da excução das ações de governo.

Constituição, Cidadania e Orçamento Público no Brasil

A Evolução Orçamentária no Brasil: torna-se essencial mencionar no presente estudo a evolução do modelo orçamentário brasileiro, visto que o Orçamento Participativo é uma experiência desenvolvida originalmente no Brasil.

A chegada até o modelo orçamentário em vigor passou por diversos episódios, que estão relacionados com os períodos históricos de nosso país: Brasil Colônia, Império, República, Estado Novo, Governo Militar e Nova República.

Sendo assim, destaca-se que o Orçamento Público brasileiro, no decorrer de sua evolução atual, remete, segundo NOBLAT [2002], “a uma lei autorizativa que estabelece uma estimativa do conjunto de receitas públicas e, em termos financeiros, fixa os gastos governamentais para um exercício determinado”. O tema manteve uma trajetória de relevância para o País e, historicamente, as legislações nas três Unidades da Federação sempre contaram com dispositivos dedicados ao Orçamento Público.

No Brasil, com a vinda do rei D. João VI iniciou-se o processo de organização das finanças públicas, culminando no ano de 1808 com a criação do Erário Público e do Regime de Contabilidade(10). Durante o período monárquico, destaca-se a promulgação da primeira Constituição, no ano de 1824, dois anos após a Independência. Nesse perípodo do Império, somente para os anos de 1831 e 1832 existem registros marcantes sobre a questão do orçamento. Segundo BALEEIRO [1968] "o primeiro orçamento nacional elaborado com o dispositivo que abrigava as principais regras da matéria foi votado para o exercicío de 1831-1832 e não há registros maiores posteriormente”.

A segunda Constituição vem com a Proclamação da República e se torna referencial para a fase de distribuição de competências e responsabilidades e para elaboração e tramitação do orçamento. Sua implementação com relação ao tema foi tão rígida, que chegou a se definir que a não apresentação de proposta orçamentária se constituía em crime. Nesse período, destaca-se que em 1922 foi aprovado pelo Congresso Nacional, o Código Nacional de Contabilidade (Decreto n.4536/1922, Imprensa Nacional, 1938).

Na terceira Constituição, em 1934, volta a reinar o Executivo, que passa a exercer a elaboração e promulgação do orçamento e, merece destaque, que a matéria orçamentária recebeu uma seção exclusiva. Na quarta, influenciada pelo Estado Novo, manteve-se o poder centralizador do Executivo, mas foi criado o Departamento de Administração do Serviço Público-DASP, que iniciou pela primeira fez uma etapa de planejamento orçamentário e instituiu a anualidade de forma efetiva. A quinta Carta, promulgada no ano de 1946, é denominada a “planejamentista”, que reforça a fase de redemocratização do país e mantém a elaboração do projeto de Lei Orçamentária com o Executivo, contudo, de forma positiva passa a envolver o Congresso para a discussão e aprovação da Lei. A sexta Constituição, chega em 1967, carregada de nuances autoritárias, advindas do Golpe de 64, onde assume o Governo Militar, que reduz o poder do parlamento, mas que em contraparte cria os principais instrumentos de planejamento, sob a bandeira de alinhar o recursos financeiros às ações e atividades programadas pelo governo(11).

A sétima Carta Magna, foi assinada historicamente no dia 05 de outubro de 1988, simboliza a redemocratização brasileira na Nova República e amplia os mecanismos de participação na Administração, de direitos do cidadão e concebe uma seção especial ao tema orçamentário.

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A Constituição Cidadã de 1988 é considerada um marco da democracia brasileira, não somente por representar o processo de abertura política do país, mas pelos avanços considerados expressivos para valorização da cidadania, participação popular e controle social.

Atualmente, a constante reflexão sobre a necessidade de ampliar os meios e as formas de participação da sociedade nas decisões políticas, surge em bom momento, pois a experiência de ampliação da participação cidadã sofre refluxos na sociedade, são os chamados ciclos sociais(12). Aparentemente, com as manifestações de 2013 e a aproximação do momento eleitoral em 2014, o tema da gestão democrática das cidades poderá ser recolocado na pauta dos debates eleitorais e na agenda de reinvindicações da população.

O fenômeno dos ciclos, não tratado aqui por completo, tem a intenção de demonstrar que as descontinuidades administrativas, conhecidas pelo jargão político das "mudanças de rumo" são fenômenos naturais em nossa sociedade, bem como o auge e decadência de algum movimento social ou pauta política da sociedade. O desafio da continuidade de uma política de participação, deve ter o amparo da sociedade, ser incorporada na legislação e inserida na agenda institucional dos municípios, dos estados e da União.

A Constituição Cidadã e a sua relação com a democracia participativa: com o processo de redemocratização do país na década de 80, a abordagem sobre a importância da qualidade dos serviços prestados pelo Estado, os princípios basilares que norteiam a Administração Pública e a legislação que trata da ampliação da participação popular na gestão pública, começaram a fazer parte da pauta de reivindicações dos movimentos sociais.

A dimensão da esfera pública não-estatal tem impulsos diferentes no Brasil, mas é a partir da década de 70, que a noção de sociedade civil muda consideravelmente. Inúmeras expressões, dentre elas a da própria cidadania, passou a ser associada, como diz Liszt VIEIRA [2004], "ao conceito de sociedade civil". Esta, na época, passou por um forte momento de reorganização, fase de fortalecimento do dito terceiro setor, que foi, inclusive, um dos responsáveis por influenciar o forte eixo de democratização presente na Constituição de 1988.

O impulso da década de 70 para a recomposição de forças na sociedade civil organizada brasileira é um dos marcos para a redemocratização do país e do aperfeiçoamento da cidadania. De acordo com Ana Clara T. RIBEIRO e GRAZIA [2003],

“desde a década de 70, os movimentos sociais demandam por melhoria da qualidade de vida nos bairros e nas cidades. Essas demandas sempre significaram combate à concentração de riqueza e de poder e um

questionamento às políticas de distribuição dos investimentos públicos”.

Raul Pont, ex-prefeito de Porto Alegre pondera que “as conquistas da Constituição Cidadã de 1988, no resguardo aos direitos individuais e sociais, continuaram tímidas na sua aplicação prática”. Sabe-se que o amadurecimento de certas decisões institucionais, em determinados momentos, necessitam de algum nível de ajuste para inserção na sociedade. Significa que algumas leis não tem o retorno imediato, ao qual busca(m) o(s) proponente(s). O interesse dos agentes sociais, e neste caso não somente do poder instituído, pode acelerar o processo de implantação de uma política pública.

Entretanto, o que se busca ao elucidar a questão do resultado prático é a vinculação que ele tem com a vontade política. Esta, vem dos governantes e da sociedade. Obviamente, a parcela mais visível é aquela que cabe ao governante, mas a democracia moderna não deve conviver mais com a visão exclusivamente representativa. Não se pode pensar tal vontade como resultado de uma mera resolução eleitoral, obedecendo o dito popular: “se eu coloquei os políticos lá, são eles que devem fazer”.

Liszt VIEIRA [2004], em seu livro, Cidadania e Globalização, reforça que “a República Moderna não inventou o conceito de cidadania, que na verdade, se origina na República Antiga.” Vieira faz tal consideração no intuito de indicar que o processo de cidadania é cumulativo, afirmando que “ser cidadão é também ter acesso à decisão política, ser um possível governante, um homem político”. A intenção é demonstrar que o berço originário do conceito na República Antiga, não atingia em sua totalidade o que Vieira considera como cidadania plena.

O Orçamento Participativo é a principal inovação democrática no Brasil contemporâneo, tem enlaces diretos com a formulação e promulgação da Constituição Cidadã. O tema atrai atenção das ciências sociais e humanas, chega tangenciando as ciências econômicas, mas se afasta abruptamente das ciências contábeis. Os registros realizados por contabilistas das experiências brasileiras são tímidos. Um processo que busca pela cidadania plena deve envolver de forma ativa todos os atores sociais, inclusive os setores da academia distanciados da temática.

Orçamento Público e Orçamento Participativo

Faz parte da essência da evolução do Orçamento Público originar desdobramentos que ocasionam um aprofundamento da sua técnica e das suas alternativas de aplicação. O Orçamento

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Participativo pode ser considerado uma dessas evoluções.

As práticas eminentemente técnicas de gestão sempre afastaram parte significativa da sociedade de sua criação, construção e aplicação. A prática orçamentária não foge desse quadro, por ser algo de domínio de administradores, contadores e economistas. O orçamento tem um vocabulário, que lembra muito a máxima popular do “economês”, ou seja, adota uma linguagem em que somente as pessoas que detém o conhecimento técnico da área conseguem argumentar e debater.

Certamente, o estudante de ciências contábeis não tem a correta dimensão de que uma das matérias centrais da contabilidade: a do Orçamento Público, no decorrer de sua evolução, se tornou uma das experiências de maior mobilização social na década de 90. E mais, que tais práticas foram capazes de mudar a realidade de algumas cidades, como o caso de Porto Alegre, que tornou-se referência mundial em participação popular.

Mas afinal, o que tem de Orçamento Público dentro das experiências de participação?

Ao contrário do que se imagina, questões de ordem contábeis e econômicas não ficam afastadas do processo de participação. Pode aparentar para o leigo, que existem muitas evasivas políticas e pouca técnica por trás do processo e ao catedrático que não existe rigor na execução das práticas orçamentárias. Pelo contrário, as garantias legais e os princípios orçamentários são seguidos à risca e, em certa forma, aprimorados com o tempo, pois algumas amarrações jurídicas podem ser adaptadas ou até mesmo modernizadas com o aumento da participação e com a aplicação da metodologia. Afinal, mais eficaz do que a lei para se exercer a execução e a fiscalização é a presença do olhar atento do cidadão.

Um caso de correlação explícita pode ser visto no Ciclo Orçamentário, que se organiza em quatro fases: 1a Fase: elaboração e apresentação; 2a Fase: autorização legislativa; 3a Fase: Programação e Execução; e 4a Fase: Avaliação e Controle. Como será visto mais adiante todas essas fases estão presentes no Ciclo do Orçamento Participativo.

Embora a argumentação da eterna dicotomia entre o científico e o popular se façam presentes, a defesa da professora Danielle Martins D. COSTA [2009] desmonstra com clareza o que significa a inserção da população no debate técnico do orçamento. Em suas ponderações, no artigo “20 anos sobre o Orçamento Participativo”, fica evidente que a prática mais relevante nesses 20 anos, que foram acompanhados pela professora, tem relação com o conhecimento adquirido pela população, no que se refere às técnicas orçamentárias. Como conclui Danielle COSTA,

“De um modo geral, as experiências analisadas neste trabalho mostraram que o Orçamento Participativo é bem mais do que uma mera abertura do orçamento público, ou parte dele. É um processo amplo, que envolve a construção de um espaço de democracia participativa, no qual os cidadãos desenvolvem a capacidade de participar politicamente e de tomar decisões relativas à comunidade onde vivem”,

O Orçamento Público é uma política pública madura, robusta e permanente e se transformou de um instrumento de controle e de escopo meramente técnico para a gestão econômica, em um mecanismo de planejamento com imenso conteúdo político e social. Como diz Danielle COSTA [2009], com a função de “cuidar dos recursos públicos e investi-los de forma a atender as necessidades do município e prioridades demandadas pela população”.

Três questões são essenciais de serem consideradas na relação entre o Orçamento Público e Participativo. Primeiro que nem toda a parcela do Orçamento Público é dedicada para o Orçamento Participativo. O orçamento, com relação a classificação da destinação dos recursos, se divide de forma macro em custeio e investimento. O primeiro trata dos gastos que já estão comprometidos pelo(s) ente(s) público(s). Isto significa que, na maioria das experiências, até por uma questão de responsabilidade fiscal, são parte ou a totalidade dos investimentos, que são destinados para as definições da população.

Segundo, que a destinação dos recursos pode variar de um município para outro. Como se trata de uma ação política, cada dirigente pode destinar uma parcela ou um percentual diferente para ser alocado ao Orçamento Participativo, como por exemplo, num caso hipotético, usar verbas de ações setoriais definidas para as secretarias de obras, educação e saúde, mas não para as de transportes e segurança.

Terceiro, que, no caso dos municípios, o prazo de encaminhamento e aprovação da LDO deve constar na Lei Orgânica do Município-LOM. Se por acaso não existir a previsão de nenhum prazo na LOM, o Executivo poderá encaminhá-la a qualquer tempo, desde que seja garantido um prazo razoável para sua apreciação e aprovação e não seja comprometida a elaboração orçamentária(13). Isto significa dizer que na esfera muncipal, justamente aquela que é mais próxima ao cidadão, existe, dentre outras questões, um alcance menor da legislação quanto à definição de prazos para o orçamento. Desta forma, tudo depende de uma regulamentação própria, o que implica que o Orçamento Participativo faça parte da legislação municipal.

Ainda não existem registros de experiências efetivas na União e nos Estados

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brasileiros. Neste caso, são percebidos alguns ensaios, tais como o estado do Rio Grande do Sul, influenciado pela capital, que atualmente revigorou a experiência de 1999-2002 e organizou o Orçamento Participativo presencial e virtual para o exercício de 2015, que contou com a participação de mais de um milhão de pessoas, representando 15,67% do eleitorado gaúcho(14). Entretanto, os resultados efetivos ainda não foram estudados em função de serem muito recentes. Por isto, a grande maioria dos casos aqui apresentados tem relação com os municípios e os desafios ficam para as esferas estadual e federal.

Orçamento Participativo-OP.

Histórico: O Orçamento Participativo, ou OP, completa 25 anos e teve uma grande repercussão na Administração Pública no decorrer da década de 90, em especial nos municípios. Naquela época, diversas premiações e reconhecimentos nacionais e internacionais foram entregues às prefeituras que adotavam tal prática em sua gestão.

O OP é uma metodologia genuinamente brasileira, construída com o acúmulo de experiências em diversas cidades. Quando falamos de Orçamento Participativo, como nos ensina Evanildo Barbosa DA SILVA [2001], “queremos dizer que se trata de uma modalidade de gestão participativa do poder público, tendo como pressuposto a elaboração e execução do orçamento e de suas prioridades, para que se tome decisões sobre o quanto, o quê, quando e aonde serão realizados os investimentos”.

Existem referenciais no meio acadêmico, técnico e no campo da gestão pública. Cada abordagem e cada olhar auxiliam na compreensão da riqueza que esconde a metodologia.

No meio acadêmico, o pesquisador Luciano FEDOZZI [2001], detentor de uma tese dedicada ao Orçamento Participativo, reflete sobre as desvantagens que os menos escolarizados têm com relação ao que ele chama de conhecimento das “regras do jogo”. Para FEDOZZI,

“as metodologias também não podem ser neutras frente à realidade da estrutura social que constitui o tecido público participante, sob pena de reproduzir – e essa é uma forte tendência – as assimetrias de poder e de influência”.

As referências técnicas, em sua maioria extraídas de documentos que descrevem os resultados práticos (relatórios, planos, programas, etc.), refletem as experiências implementadas em cada cidade brasileira, como pode ser visto no Caderno do Observatório dos Direitos do Cidadão do Instituto Pólis [2004], ao analisar a experiência de São Paulo, nos anos de 2001-2002. Para o Instituto Pólis,

“a experiência do orçamento participativo tem permitido aprofundar a prática da democracia ao introduzir um novo

modelo de gestão pública que se apóia em duas ideias centrais: de um lado, a combinação da participação popular direta e mecanismos tradicionais de representação e, de outro, a introdução de um método objetivo de redistribuição de recursos públicos”.

No campo da gestão pública, destaca-se o ex-prefeito de Belo Horizonte, Patrus ANANIAS [2005], que decidiu implantar a iniciativa na cidade por ser uma das práticas mais inovadoras de gestão democrática. Patrus disse que

“o processo tradicional de elaboração dos orçamentos públicos é inacessível à cidadania, sendo portanto uma prática abominada nos governos éticos, democráticos e populares. Ele estabelece uma distância intransponível entre governantes e governados, não respeitando a vontade cidadã. O orçamento neste caso é orientado por critérios unicamente técnicos, sem o envolvimento da comunidade na discussão das prioridades”.

Para enriquecer de maneira empírica e simplificada, a questão política do tratamento dos recursos financeiros, observa-se a administração de um condomínio: as contas são simples e repetitivas, os lançamentos com pouca dificuldade de entendimento pelo morador e poucas variações das contas. Caso um condômino acompanhe minimamente as finanças, em pouco tempo conseguirá fazer uma análise das decisões do síndico e da destinação dos recursos. A ponderação pretende reforçar que o fato de ter o contato com o balanço mensal condominial e tendo condições de analisá-lo, se consegue facilmente detectar o estilo de gestão do condomínio. O mesmo ocorre por exemplo com a administração municipal, se existe um conhecimento mínimo por parte do cidadão de como funciona o orçamento municipal, é possível compreender sobre o sistema e o modelo político adotados pelo governante.

No início desta década, ao contrário do auge das décadas anteriores, o Orçamento Participativo aparentemente convive com um momento de congelamento, de reflexão e, principalmente, de apatia social. Qual a motivação? Seria o esgotamento das metodologias de participação, a tomada do método pela burocracia municipal ou a ausência de instrumentos para garantir a evolução metodológica?

Para reforçar a situação de dificuldade que as experiências atravessam, as pesquisadoras Ana Clara T. RIBEIRO e GRAZIA [2003], constataram que o Orçamento Participativo,

“além de uma experiência inovadora e em rápida difusão é, também, uma experiência difícil e instável. A interrupção de experiências, nos últimos dois anos da gestão analisada, envolve 23 municípios, um número muito superior ao daqueles municípios que

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deram início a experiências de participação no orçamento municipal no mesmo período (9 ocorrências)”.

Ao completar 25 anos e verificando que o cenário sofreu poucas alterações, para responder as indagações acima, é possível reproduzir as palavras da professora Danielle COSTA [2009], que ao fazer uma reflexão sobre os 20 anos da experiência, afirmou que “as práticas participativas são ainda marginais na cultura política nacional”.

A estrutura e organização do Orçamento Participativo: existem diferentes formas de organização do Orçamento Participativo, de estruturação na administração pública e de sua dimensão legal. Tal diferenciação ocorre principalmente por se tratar de uma política pública que ao ser implementada sofre influência das relações sociais vigentes, dos programas de governo e da linha política do governante.

O Orçamento Participativo também tem as suas bases fundadas na questão do controle e do poder, mas com interveniências diferentes, já que existe a incorporação de novos atores, métodos e ferramentas. A função controle recebe reforços de novos “fiscalizadores” com a proximidade geográfica da aplicação do recurso; com a densidade da prioridade escolhida; e com a necessidade de transparência de todo processo. A questão do poder estabelece novas relações em decorrência do deslocamento do centro de decisões da destinação dos recursos do executivo e legislativo para a sociedade; pela distribuição desses recursos para prioridades mais coletivizadas; pela ampliação do universo de tomadores de decisão; e pela autonomia individual e coletiva ofertada aos participantes.

O primeiro passo envolve a própria lógica de entender o Orçamento Público, pois já seria louvável para qualquer cidadão compreender a política orçamentária. Mas o OP, vai além dessa prática, já que ele insere o cidadão diretamente na formulação da peça orçamentária. Como não se trata de algo trivial, o Executivo precisa elaborar uma série de conteúdos, ferramentas e publicações, para atingir todos os cidadãos. Isto significa que a prefeitura deve preparar um Plano de Implementação do OP para o município, que contemple como foco principal a mobilização e a capacitação da sociedade.

O segundo passo trata de preparar a máquina administrativa, justamente para incorporar as mudanças acima mencionadas. E para que as transformações em determinada sociedade ocorram de fato no decorrer da implementação da metodologia, algumas mudanças precisam ser estruturadas na Administração municipal, sendo elas:

Admin istrativas: adotar novos instrumentos de gestão e planejamento; melhorar a articulação entre as políticas setoriais; revisar os processos e as rotinas administrativas; aumentar o nível de informatização da

administração; preparar a capacitação dos recursos humanos; e criar ou designar algum órgão para coordenar as ações de participação popular.

Polí ticas e instrumentos articulados: alterar a política tributária; executar e implementar o Plano Diretor; respeitar as decisões dos Conselhos Setoriais; realizar o Planejamento Estratégico da prefeitura; articular com o legislativo a implementação da metodologia; desenvolver os mecanismos de participação; e criar a comissão mista que vai tratar da criação do processo.

Processo de capacita çã o: criar um plano de formação e capacitação para os técnicos da prefeitura, as lideranças estratégicas, os conselheiros e delegados e membros da sociedade civil organizada.

Enfrentar as principais dificuldades para a Administra çã o: o acúmulo de obras aprovadas e não realizadas; o predomínio de demandas localizadas; a falta de participação da população; as divergências na equipe do governo; a burocratização da máquina administrativa; as pressões das políticas clientelistas, as disputas partidárias acirradas, as dificuldades na relação com a Câmara de Vereadores.

Embora uma parte dos aplicadores e pesquisadores do Orçamento Participativo não o encarem como metodologia, algumas questões metodológicas estão presentes na prática. Existem características que são comuns e serão consideradas em qualquer implantação, tomando como ponto de partida a composição administrativa da cidade e da lógica jurídica do modelo orçamentário, sendo elas:

Divisão geográfica da cidade: cada estruturação local do OP cria ou obedece a divisão de bairros, distritos ou de regiões já pré-definidas na cidade, tais como: sub-prefeituras, regiões administrativas, administração regional, bairros.

Plano e cronograma de trabalho: em função do exercício do orçamento se encontrar limitado pelo período anual, todo o processo segue um calendário que atende ao princípio da anualidade. Sendo assim, o Plano deve compreender dentro do período de um ano todas as atividades que compõem o Ciclo do OP: i) as assembleias, plenárias, rodadas, encontros e reuniões, ii) a escolha de representantes: delegados e conselheiros.; e iii) a montagem do Programa do OP, da Matriz Orçamentária e do Plano de Investimentos.

Escolha de representantes: a maioria das experiências por uma questão de organização e de mobilização fazem a escolha de delegados, de

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conselheiros, de técnicos especializados, que vão representar a sociedade nos passos subsequentes, dentre eles: nas Assembleias, nas Rodadas Orçamentárias, na grande Plenária, no Conselho do Orçamento Participativo, nas Comissões Paritárias ou em momentos de articulação e diálogo com o governo, a região ou a própria base que os elegeram.

Capacita çã o dos agentes sociais: montar programa de formação sobre Orçamento Público e das funções da administração municipal para ONGs, empresas, movimentos sociais e o cidadão; desenvolver atividades de capacitação, tais como: cursos, seminários e troca de experiências com outras cidades; e preparar multiplicadores para atingir o mais rápido possível o conjunto da sociedade.

Definição dos princípios, regras e critérios: de início o governo e os representantes da sociedade, normalmente a Comissão Paritária, prepararam os primeiros documentos orientadores para a aplicação da metodologia, alguns deles são o Regimento Interno, o Regulamento, as regras do Ciclo do OP, os critérios de participação, as notas e pesos aplicados para as demandas. As boas práticas recomendam que todo material produzido para os participantes do OP, seja produzido em conjunto com a população. Em decorrência dos inúmeros casos de sucesso, esses materiais também podem ser coletados junto a outros municípios.

Participação da sociedade: principal foco da implantação da metodologia, os mecanismos e procedimentos de participação devem considerar a presença de toda sociedade (independente da escolha dos representantes). A presença do cidadão deve considerar de forma objetiva, universal e transparente o início e fim do processo, o papel de cada participante, os diferentes perfis e sua inserção em cada etapa da metodologia, com o objetivo de garantir que as deliberações, os debates e as prioridades sejam definidas individual e coletivamente.

Orçamento participativo nas cidades e o caso de Porto Alegre

As características da aplicação do Orçamento Participativo nas cidades: em 1986, a cidade de Vila Velha (ES) foi a primeira a adotar o termo Orçamento Participativo. No final dos anos 80, as cidades de Fortaleza (CE), Recife (PE) e Belém (PA), iniciaram as primeiras experiências concretas de discussão do orçamento municipal com a população. Mas foi em 1989, que a experiência do Orçamento Participativo se espalhou de forma mais contundente, tornando-se política pública e instrumento de estudo no Brasil e no mundo.

O estágio atual de algumas experiências pode ser resumido no caso de três grandes capitais, que foram selecionadas pela sua importância nacional e

pelas diferenças dos seus resultados. Apresenta-se um resumo da visão sobre o projeto adotado em cada município, uma breve ponderação da situação atual em cada cidade e, por meio dessa reflexão situacional, ter a possibilidade de identificar que se tratam de três destinações bem diferentes.

O ex-prefeito de Belo Horizonte, Fernando PIMENTEL [2005], disse: “mais do que uma simples escolha de obras e definição de políticas públicas, o Orçamento Participativo é, em sua essência, a forma democrática de planejamento da cidade que desejamos”. A percepção da possibilidade de participação pela internet foi pensada de forma estruturada pela primeira vez na cidade de Belo Horizonte, com o Orçamento Participativo Digital(15).

A prefeitura da cidade de Recife, de acordo com DA SILVA [2001], “adotou uma organização da estrutura do orçamento participativo vinculada ao secretariado e não ao gabinete do prefeito o que tornou pouco efetiva a sua implantação”. A cidade de Recife reduziu sobremaneira o apoio a iniciativa e tem hoje o que se chama de implementação de “fachada”, com baixa instituicionalização, algo somente para cumprir a legislação vigente.

Já na experiência de São Paulo, da gestão 1989-1992, ficou latente a necessidade da continuidade administrativa e de um alinhamento político, pois a mudança de partido enfraqueceu a prática na cidade. E por outro lado, como a população não se apropriou do ferramental, ocorreu, paulatinamente, um esvaziamento das ações e atividades. Nesse caso, por influência do governo estadual, a iniciativa foi inclusive rebatizada para Orçamento Cidadão, no ano de 2002(16).

O artigo não tem interesse em refletir sobre a continuidade ou não destas experiências, mas de conhecer um pouco cada realidade, demonstrar as suas diferenças e verificar o que significa a tradução da lógica orçamentária para sociedade, na visão de que o incentivo da participação cidadã tem relação direta com a estrutura que permeia o Orçamento Participativo e pela vontade política do governante e da população.

A experiência da cidade de Porto Alegre: embora a cidade de Porto Alegre não tenha sido a pioneira, o desenvolvimento da iniciativa no decorrer dos anos tornou-a a mais significativa, gerando inclusive um modelo de replicação para outras cidades.

Na década de 90, a cidade conquistou o reconhecimento em diversas conferências internacionais, em especial a Habitat II,

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organizada pela ONU-Organização das Nações Unidas. Os resultados alcançaram um reflexo motivacional direto na população, que resgatou inclusive o histórico de mobilização da política gaúcha.

O ex-prefeito de Porto Alegre Tarso GENRO [1997], relata que a experiência realizada na cidade com o Orçamento Participativo é incomum. Tarso diz que

“não se tratou simplesmente de incentivar a participação popular de uma forma espontânea, fazer obras ou simplesmente azeitar os mecanismos da democracia formal. Na verdade, foi criado um novo centro decisório que, juntamente com o poder executivo e o legislativo, democratizaram efetivamente a ação política e integraram os cidadãos comuns num novo espaço público”.

Foi no decorrer da campanha para a prefeitura, em 1988, que o programa de governo do Partido dos Trabalhadores, desenhou a proposta de democratização das decisões da gestão da cidade, a partir do que era denominado Conselhos Populares (termo já utilizado desde 1986 pelo prefeito Alceu Collares, do PDT). Uma proposição, segundo Tarso GENRO [1997], “muito mais em princípios gerais, originários da Comuna de Paris e dos sovietes, do que propriamente em experiências colhidas com a realidade local”.

O que deu projeção à iniciativa da capital gaúcha foi uma conjugação de fatores, que podem ser divididos em dois momentos diferentes da década de 80. O primeiro, na primeira metade dos anos 80, como resultante do acúmulo de demandas apresentadas pelos movimentos sociais e o segundo, no final da década de 80, provocado pela sequência de gestões que valorizavam o modelo de democracia participativa.

A fase dos movimentos sociais, como menciona Leonardo AVRITZER [2005], “envolve elementos institucionais com elementos extra-institucionais, na medida em que a origem da proposta situa-se no campo das associações comunitárias de Porto Alegre nos anos 80”. Neste período, especificamente no ano de 1986, a União das Associações de Moradores de Porto Alegre-UAMPA, respondeu ao então prefeito Alceu Collares em carta sobre a proposta dos Conselhos Populares: “O mais importante na Prefeitura é a arrecadação e a definição de para onde vai o dinheiro público”, e a UAMPA completou dizendo “...queremos decidir sobre as proridades de investimento em cada vila, bairro e da cidade em geral”(17). Já se notava um clamor por participação presente na sociedade porto-alegrense e, de acordo com Avritzer, a Carta da UAMPA foi o primeiro documento que mencionou o termo “Orçamento Participativo”.

A segunda fase, que se relaciona diretamente com o governo estabelecido, começa com a eleição

do prefeito Olívio Dutra, em 1988. ABERS diz que no “programa do Partido dos Trabalhadores havia a ideia de conselhos operários que gerariam conselhos da cidade que, por sua vez, constituiriam uma forma paralela de administração”(18). Embora com essas bases genéricas, de alguma forma a prefeitura começou a buscar formas de fortalecer os mecanismos de participação e uma decisão de importância crucial foi a centralização das ações de democracia participativa na Coordenação de Relações com a Comunidade-CRC. De acordo com Avritzer, a CRC era “uma entidade que já existia, mas não desempenhava nenhum papel relevante”. Aos poucos, por decisão do prefeito, a CRC se tornou a organização central para a criação do Orçamento Participativo.

De acordo com Avritzer [2005], quatro passos coincidiram no início da Administração do prefeito Olívio Dutra para à constituição do Orçamento Participativo, sendo eles:

“a preocupação do movimento comunitário com o controle do orçamento e sua decisão em nível local; a ênfase dada pelo Partido dos Trabalhadores na participação em Conselhos; a iniciativa descentralizada de diversas secretarias, inclusive a secretaria de Planejamento de encorajar a participação popular; e, pouco depois, a iniciativa de centralizar todas as formas de participação na CRC”.

Justamente a partir da comunhão do momento histórico de abertura política na década de 80, dos princípios de participação democrática expostos na Constituição Cidadã e dos elementos institucionais e extra-institucionais favoráveis à participação popular na gestão, a experiência de Porto Alegre tornou-se a mais relevante do Brasil. E algumas características que foram trabalhadas de forma conjunta e perene, emolduram a base desse sucesso, sendo elas: i) o de permitir que cada cidadão pudesse interferir na criação de políticas públicas e nas demais decisões de governo; ii) o de buscar os meios de ampliar a participação da sociedade na gestão da cidade, mesmo com baixos indíces iniciais de presença; iii) o de aprofundar o nível de institucionalização da experiência para criar os elos de continuidade; iv) a confiança da população no processo deliberativo e no método de tomada de decisão; v) pela vontade política dos governantes; e vi) pela premiação conquistada junto à ONU na Conferência Habitat II.

A construção do Orçamento Participativo na cidade de Porto Alegre demonstrou que os resultados obtidos transcendiam a própria gestão pública e a metodologia de participação. Tarso GENRO[1997] pondera que se desenvolveu um processo político de geração de consciência e cidadania. O ex-prefeito, ao falar sobre os oito anos de execução da iniciativa disse que

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“a população aprendeu que existem problemas que ultrapassam a esfera do município. Que as questões da saúde, educação, habitação, assistência social, geração de renda, entre outras, para a sua resolução estrutural dependem de políticas macroeconômicas, fiscais, definições dos governos estaduais e da União, na Assembleia Legislativa e no Congresso Nacional”.

Algumas intervenções urbanas são facilmente percebidas na cidade de Porto Alegre, como o caso da favela da Vila Cai-Cai às margens do Guaíba, uma das comunidades mais miseráveis do município. Por decisão da sociedade em Plenária, os moradores foram transferidos para o bairro Cavalhada, região urbanizada próxima ao centro(19). Certamente, o poder público decidiria algo sobre a favela no futuro, mas o respaldo da metodologia cria condições favoráveis para acelerar a tomada de decisão e a execução da ação. E mais, que as definições orquestradas pela população conseguiram atingir uma perspectiva além do espectro orçamentário. Algo que demonstra como a participação ocorrida pela lógica financeira, destinada para alocar uma verba para habitações populares, pode influenciar na própria gestão, como a mudança territorial de uma favela para um bairro. Esse exemplo demonstra claramente a evolução da qualidade da cidadania e a melhoria das condições de vida da população local.

O Orçamento Participativo, Participação Popular e Democracia Participativa.

Um dos responsáveis pela organização da experiência de Porto Alegre, o professor Ubiratan de SOUZA [1997], registra que “a principal riqueza do orçamento participativo é a democratização da relação do Estado com a sociedade”. Percebe-se, neste contexto, o significado da abertura política do país, que alcançando naquela época um pouco mais de cinco anos de amadurecimento, rapidamente deixou fluir uma experiência de participação na gestão das cidades, cuja preocupação com mecanismos de democratização eram visíveis. O professor Ubiratan afirma que essa experiência “rompe com a visão tradicional da política, em que o cidadão encerra sua participação apenas no ato de votar”.

Renato Raul BOSCHI [2005], professor titular do IUPERJ-Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro, menciona que "entre as formas de participação popular nas últimas décadas sobressai a proposta de Orçamento Participativo, que constituí o experimento mais avançado de democratização dos governos locais no país."

A maioria dos estudos e relatos sobre Orçamento Participativo não conseguem dar a correta dimensão das relações sociais que ocorrem a todo momento. Desde a articulação para participação nas plenárias até a fase final de definição das prioridades existem inúmeros “movimentos silenciosos” na sociedade. Tais movimentos são permeados por uma grande quantidade de relações que acontecem entre

os cidadãos, que articulam os projetos de interesse coletivo e individual, gerando encontros e reuniões adicionais e não-programadas nas associações de moradores, nas igrejas, nos sindicatos, nas ONGs e até na casa das pessoas.

Não é simples mensurar quais são os impactos sociais de um processo de participação popular, pois os elementos em grande parte são subjetivos e abstratos, resultantes do que aqui se convenciona como “movimentos silenciosos”. Inegável, contudo, é verificar que em todos os estudos realizados sobre a adoção de mecanismos que ampliam a participação popular é que eles apontam para a melhoria da qualidade de vida da população e da localidade(20).

Assim, percebe-se duas vertentes que extrapolam o escopo da metodologia e podem ser melhor observadas à luz das implicações que envolvem a experiência do OP: primeiro pela gestão democrática das cidades, e segundo pela vertente da possível superação da democracia representantiva pela participativa

O orçamento participativo como política de democratização da gestão das cidades: na visão do Fórum Nacional de Participação Popular-FNPP, “a Gestão Democrática da Cidade é uma forma de planejar e governar as cidades com participação popular e controle da sociedade sobre o Estado”(21).

Desde a chegada da Nova República, visivelmente o Orçamento Participativo é a iniciativa que mais tem aderência ao conceito exposto pelo FNPP e a que gerou mais resultados expressivos na sociedade. As implicações de tal prática nas estruturas públicas resultou em mudanças de comportamento na relação governo-sociedade, que se desdobraram no aperfeiçoamento das práticas de gestão, no empoderamento da sociedade civil, e, em especial, nas relações de poder com o executivo e o legislativo.

Existem defesas inequívocas de diversos estudiosos no assunto ao mencionarem que a democracia é fortalecida quando a participação da sociedade se amplia na gestão pública e os mecanismos de controle social se aprimoram. Paulo ROMEIRO [2003], coloca que

"a participação da sociedade civil no planejamento, gestão e controle do orçamento público é um dos elementos centrais para garantir uma efetiva democratização da sociedade brasileira. Para que isso ocorra é importante conhecer como é feito o orçamento nos três níveis de governo - municipal, estadual e federal"

Romeiro defende a politização da elaboração da peça orçamentária ao afirmar que "muito mais que uma peça financeira burocrática,

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o orçamento - seja no município, do estado ou da União - é o resultado de uma articulação essencialmente política”.

Existem inúmeras metodologias que possibilitam e buscam a melhoria da gestão nas cidades, mas o OP demonstrou ser a de maior alcance e profundidade, por vários motivos: pela quantidade de pessoas envolvidas; pelo montante dos recursos financeiros alocados; pela articulação entre os entes sociais; pela influência na modernização da máquina pública; pela distribuição de poder e de riqueza; e pelos “movimentos silenciosos”, que jamais serão contabilizados.

No que cabe à gestão das cidades, o Orçamento Participativo pode ser analisado pelos seus resultados, sendo estes quantitativos e qualitativos. Grande parte da literatura fixa-se nos resultados quantitativos, que por sua objetividade são facilmente apropriados pelos atores envolvidos, pois demonstram por exemplo: a quantidade de participantes de uma Plenária em determinado ano; o percentual de verba dedicada para a decisão coletiva; a quantidade de obras deliberadas e executadas; o número de casas construídas; a ampliação da malha asfáltica e da rede de iluminação pública. São os resultados que interferem na camada visível da urbe.

Mas a gestão de uma cidade não convive somente com a quantidade e a qualidade dos resultados visíveis. Existem conquistas, que em certo grau podem ser consideradas mais importantes, pois melhoram a própria gestão em si, tais como: a organização do planejamento urbano e do Plano Diretor da cidade; a distribuição de recursos para as comunidades de baixa renda; a reforma do modelo de ensino nas escolas; a alocação de recursos de forma democrática; entre outros.

Ainda existe o resultado, que embora traga problemas para a política clientelista, deve ser pensado como o principal motor para as políticas participativas, pois trata da elevação da consiciência política e social dos cidadãos.

Para que tais resultados sejam alcançados, deve-se reforçar que o Orçamento Participativo é uma experiência do campo institucional, que para ser implantada na cidade depende de uma decisão política do Poder Executivo. Para tanto, a partir dessa decisão do Executivo, como reforça Denise VITALE [2004], “a prerrogativa de elaboração do projeto de lei orçamentária, constitucionalmente atribuída ao Poder Executivo, passa a ser compartilhada com a população”.

Isto significa que o processo de gestão democrática é uma conquista da população, construída a partir de mecanismos sólidos e institucionalizados. Vitale completa dizendo que se trata de “um processo de co-gestão e de compartilhamento de poder, onde governo e

população tornam-se co-autores da elaboração do Orçamento Público, principal instrumento de planejamento e definição de políticas públicas prioritárias para a cidade”.

As cidades se converteram em espaços paradigmáticos, enquanto a maioria da população mundial se concentra em territórios de diferentes dimensões e complexidades, as políticas que poderiam definir o acesso do cidadão aos serviços públicos, a melhoria da qualidade de vida, seus benefícios e a sua sustentabilidade, estão sendo definidas pelo mercado. Não é casual que o lugar elegido para representar o fenômeno da globalização seja o locus da cidade.

Por conta deste domínio da noção de cidade como mercadoria, a desregulamentação da gestão, a expansão de atividades ilegais, o uso inadequado do solo, a agressão ambiental e a exclusão social, obedecem a lógica da rentabilidade e da lucratividade. Este cenário demonstra como os mecanismos de gestão democrática são essenciais para garantir o acesso universal ao planejamento, à gestão e ao uso dos recursos públicos.

As metodologias de participação popular e a Democracia Participativa: a Sociedade Civil Organizada, encarnada nos movimentos sociais, demandam por melhorias de qualidade de vida no bairro e nas cidades desde 1970. Tais demandas tem seu espelho nas lutas de combate à concentração de poder e riqueza e nas pressões por maior participação na definição da distribuição dos investimentos públicos.

No período pós-constituinte, dentre as práticas e canais de participação popular implantados, principalmente no nível local, a experiência do Orçamento Participativo adquire relevância, na medida em que oferece condições básicas para a população debater acerca das prioridades para alocação dos recursos públicos.

Duas características de forma interrelacionada demonstram a existência de mecanismos de democratização: primeiro a participação da sociedade civil tanto na elaboração, como na implementação de leis, planos, programas e ações inovadoras de governo; segundo pelos espaços ofertados pela Administração Pública para a tomada de decisão conjunta. Tal quadro, aponta para duas análises diferentes sobre o sistema democrático: uma reformista, da democracia representativa e outra mais revolucionária, da democracia participativa.

Alguns analistas das políticas de democratização, como o caso de Neimar DUARTE [2005], observam a divisão de opiniões sobre a capacidade que o orçamento participativo tem de ser uma alternativa à democracia

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representativa. A centralidade da discussão está no papel que o Executivo municipal tem na aplicação da metodologia e, se em decorrência de tal presença, o resultado alcançado com a metodologia expressa elementos da democracia representantiva ou da participativa. De acordo com Duarte,

“Os estudos mencionados ainda não demonstraram suficientemente qual o potencial de renovação democrática das experiências de democracia participativa e se tais experiências podem, realmente oferecer uma alternativa à concepção hegemônica de democracia. Esta visão de literatura, ainda que breve, indica que o OP é uma experiência induzida e coordenada pelo Executivo municipal, a questão da autonomia dos participantes deve ser questionada, e, além disso, as pesquisas sobre o tema devem reconhecer que a democracia participativa não pode prescindir de regras para organizar o processo decisório”.

Os reformistas entendem que tratar de recursos financeiros na ótica do capitalismo tradicional ou como sustentação desse sistema não é o suficiente para se criar um modelo democrático mais amplo: participativo e popular. Uma outra questão é que se trata da construção de uma metodologia cujo o controle parmanece nas mãos do executivo, que de alguma forma controla a execução da metodologia. Celina Souza, reconhece que existe um acesso do cidadão ao processo decisório local, mas que tal acesso é “induzido e coordenado pelos governos”(22).

Os que percebem o Orçamento Participativo como um método revolucionário entendem que o nível de abstração que é trabalhado com o cidadão e sua aplicação prática pautada por premissas como da simplificação, da transparência e da desmitificação técnica, proporcionam um exercício mental ao cidadão que revoluciona os princípios de cidadania. Existe também a percepção dos mecanimos de auto-regulamentação e de construção do planejamento das atividades de forma autônoma, que independem da presença do Executivo. Neste caso, SANTOS [2002], associa o Orçamento Participativo a uma iniciativa de co-gestão ao dizer que trata-se de “um modelo de partilha do poder político mediante uma rede de instituições democráticas orientadas para obter decisões por deliberação, por consenso e por compromisso”.

Existem alguns elementos que podem nos ajudar na análise do grau de radicalização democrática existente nas experiências participativas. No caso do OP, AVRITZER [2005], aponta quatro elementos que balanceam a articulação entre o sistema representativo e participativo, sendo eles:

(…) a cessão de soberania por aqueles que a detêm como resultado de um processo representativo local; (…) a reintrodução de elementos de participação local, tais como as assembleias regionais, e de elementos de delegação; (…) o princípio da auto-regulação soberana, ou seja, a participação envolve um conjunto de regras que são definidas pelos próprios participantes; (…) em quarto lugar, o OP se caracteriza por uma tentativa de reversão de prioridades de distribuição de recursos públicos...”

O propósito de apresentar a existência de um embate teórico entre democracia representativa e participativa, entre reforma e revolução, entre controle ou não do Executivo, é para ratificar o impacto que tal iniciativa tem na sociedade. E mais importante, a riqueza que a envolve, visto que existem diversas análises de conjuntura, modelos de implementação e até falsas experiências que adotam o nome OP, como forma de ganhar um “selo de qualidade”, mas não o praticam de fato. Neimar DUARTE [2005], cita AVRITZER [2003], ao identificar as polêmicas em torno da democracia representativa e representativa, mencionando que o aprofundamento em tais conceitos “permite nos posicionarmos sobre diferentes tipos de OP e até mesmo postularmos o caráter meramente ilusórios de algumas experiências que reinvidicam o termo”.

A Prática do Orçamento Participativo

A intenção de apresentar como pode ser construída uma prática de Orçamento Participativo é justamente para que as organizações da sociedade civil, as universidades ou a população em geral, que convivem ou não com uma experiência em sua cidade, tenham capacidade de avaliar uma implementação de OP, e de também criarem as condições de acompanhamento e controle orçamentário ou, quiçá, retomarem articulações similares às da década de 80, que resultem em pressão política junto aos governantes, aos postulantes ou até capazes de gerar uma ação política autômoma.

A Metodologia do Orçamento Participativo: com o acúmulo de experiências existentes é possível que qualquer cidadão conheça como funciona uma prática de Orçamento Participativo ou tenha capacidade de avaliar a qualidade do nível de participação nesta ou em outras metodologias. A intenção aqui é demonstrar a melhoria da qualidade de vida nas cidades com o uso de tal ferramental e que o principal caminho para obter êxito, passa por elucidar os elementos e conteúdos que estão presentes na metodologia.

Vale destacar que os estudos recentes apontam para a existência de diversos níveis de aplicação da metodologia, que obviamente causam impactos diferenciados na população e refletem o nível de apropriação ou não da Administração Pública, bem como a capacidade que o cidadão tem para interferir no processo.

As experiências da prática orçamentária participativa têm seu aprofundamendo em estudo realizado pelas professoras Ana Clara T. RIBEIRO e GRAZIA [2003], que relatam pesquisa realizada com 80% dos casos conhecidos no Brasil entre os anos de 1997 e 2000, e

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demonstram, em síntese, que as experiências de Orçamento Participativo dependem das seguintes características para existir:

“(i) dos projetos partidários que orientam os governos locais; (ii) do nível de organização, mobilização e politização da sociedade civil; (iii) do contexto sócio-econômico e do volume da população das localidades envolvidas; (iv) do nível técnico e da complexidade da máquina administrativa; (v) do grau de envolvimento do conjunto do governo; (vi) dos recursos arrecadados pelo município; (vii) da metodologia aplicada; e (viii) da relação da administração com a Câmara de Vereadores”.

Essas premissas podem servir como uma “receita de bolo” para aqueles que pretendem criar ou monitorar a implantação do Orçamento Participativo. Entretanto, como alertam as pesquisadoras “os municípios brasileiros apresentam diferentes memórias de planejamento e diferentes acúmulos técnicos no conhecimento e controle do uso dos territórios”. Ou seja, a maturidade e capacidade do Executivo devem ser considerados, visto que o próprio Ciclo do OP tem suas complexidades e desafios sustentados na relação governo-sociedade.

Embora no momento de aplicação da metodologia exista um grau de simplificação é importante verificarmos os componentes orçamentários e metodológicos presentes. O Orçamento Participativo tem seus ciclos bem definidos, mas antes do detalhamento desse Ciclo, existem instâncias e artefatos que são essencias para o pleno funcionamento e entendimento da metodologia.

Programa do OP: principal documento para a gestão e instituição do OP. Nele se traduz a convicção do governante e o comprometimento da Administração Pública. Na condição de Programa deve conter objetivos, ações, metas, resultados e indicadores, se tornando assim o primeiro passo para institucionalização da iniciativa. Pode ter a dimensão da totalidade da política de participação ou apenas da segmentação de todas as etapas de implantação da metodologia, contendo todo Ciclo do OP. Não é possível falar de um formato específico de Programa para o OP, pois ele vai variar de modelo em cada lugar onde for implantado.

Comissão Paritária: instância responsável pela fase inicial do OP. Alguns governos começam a prática por conta própria e outros adotam a construção já considerando os representantes da sociedade por meio da criação da Comissão Paritária, que cumpre a função de tomada de decisão compartilhada para a construção do Programa e do Ciclo do OP e que pode permanecer em funcionamento para outras colaborações e arbitragens. A cada representante do governo é indicado um representante da sociedade, que pode ser designado pelos movimentos sociais.

Instâncias Participativas: essa denominação tem a intenção de abarcar o conjunto de atividades que são

realizadas com a presença da sociedade e que podem ser batizadas de Assembleia, Plenária, Rodada, Congresso, Seminário, Encontro, entre outros. São muitas as denominações para definir o momento em que os participantes da metodologia se agregam. Nesses “pontos de encontro” são escolhidos os representantes da população (delegados, conselheiros, etc.), são apresentadas as propostas, definidas e votadas as prioridades, se organizam os momentos de troca de propostas e de experiências entre governo e sociedade e, dependendo do momento, os encontros são consultivos e/ou deliberativos.

Regimento Interno do OP: costuma ser a única “legislação” do OP, deve ser revisada a cada ano, e trata dos mecanismos de participação; da formulação dos critérios gerais de distribuição dos recursos entre as regiões; da descrição dos critérios técnicos, legais e regionais da metodologia; bem como para compor o calendário das atividades.

Delegados do OP: são eleitos, em geral, em proporcionalidade ao número de habitantes de uma região ou de presentes nas atividades. Os representantes são escolhidos durante as Rodadas do OP (na maioria dos casos na Primeira Rodada), passam a compor o Fórum dos Delegados e são responsáveis por realizar toda estruturação do ciclo do OP, por definir algumas deliberações do exercício em vigor e por participar da construção do processo do ano seguinte. Os delegados repassam informações aos moradores e deliberam, num primeiro momento, a respeito das prioridades regionais e municipais.

Conselho do Orçamento Participativo - COP : praticamente todas as experiências criam um Conselho do OP-COP, considerado a estrutura central da metodologia. A formação do COP pode aproveitar os próprios delegados eleitos; algumas escolhem a partir dos delegados um conjunto de conselheiros; e outras escolhem pessoas somente para tal função. Os conselheiros discutem, propõem e decidem as prioridades do município. Trata-se da instância que participa das atividades compartilhadas com o governo e é essencial para garantir a representatividade da população. O COP, no processo de ajuste anual, pode propor mudanças no Ciclo do OP, como por exemplo ampliar ou reduzir temas setoriais. A eleição, o mandato ou revogação dos conselheiros são definidos no Regimento Interno e normalmente o mandato atinge um ano de duração, podendo ter apenas uma reeleição consecutiva.

O Ciclo do Orçamento Participativo: o presente artigo pretende apresentar as condições mínimas

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para garantir a implementação do Orçamento Participativo. Como as atividades são contínuas no universo do Orçamento Público, não acontece diferente com as atividades relacionadas ao Orçamento Participativo. Em linhas gerais oito ações devem ser considerados para o pleno funcionamento do OP, sendo elas:

1) Descentralizar a administração em territórios devidamente identificados;

2) Organizar a dinâmica de mobilização da sociedade e do governo;

3) Planejar as ações para a implantação da metodologia;

4) Garantir a alocação de recursos para a execução das prioridades deliberadas pela população;

5) Definir o método de participação da sociedade na formulação de propostas, definição de prioridades e das deliberações;

6) Gerar o Programa do Orçamento Participativo;

7) Estruturar a elaboração do Orçamento;8) Organizar os mecanismos de

acompanhamento e controle.

As ações acima configuram as garantias de que a Administração está preparada para começar o processo. Em seguida, serão destacadas as principais etapas e procedimentos do ciclo de construção da metodologia do OP e, como dito anteriormente, tendo como foco uma implementação municipal que, considerando as devidas proporções, pode ser adaptada para as demais Unidades da Federação.

Após o governante e a Administração assumirem que a máquina administrativa está preparada para arcar com as mudanças que vão ocorrer e que a estrutura de governo encontra-se organizada para cuidar das ações e dos elementos que integram a metodologia, tais como o Ciclo do OP, inicia-se a fase da realização prática, que deve compreender os três eixos estratégicos abaixo(23):

01) Garantir as premissas para implantação do Orçamento Participativo: a vontade política do governo para efetivar a participação cidadã; os meios de integração e funcionamento da máquina administrativa; a aproximação do conhecimento técnico dos profisisonais da prefeitura com o conhecimento político e social da comunidade; a organização dos mecanismos de produção das informações para os participantes, para a tomada de decisão e para os sistemas de informação; a garantia de ampla divulgação e comunicação; a mobilização universal da sociedade.

02) Buscar os meios de financiamento para implantação e sustentação das ações: a definição dos mecanismos de arrecadação e de distribuição dos recursos; a realização da reforma fiscal para aumentar a capacidade de investimento próprio; a combinação de critérios técnicos com as carências da sociedade; o

mapeamento conjugado entre as políticas municipais, estaduais e federais; a articulação com outros mecanimos de planejamento(Plano Diretor) para otimizar as decisões e o uso dos recursos.

03) Realizar o planejamento de cada fase de implantação a organização detalhada de cada fase da metodologia; a elaboração do primeiro plano e do cronograma das atividades de implantação, a criação do Programa do Orçamento Participativo (em geral este planejamento pode integrar o Programa do OP); disseminar o início dos trabalhos para o governo e para sociedade, com foco na mobilização. Nessa ação estratégia são tratadas as quatro fases do Ciclo do Orçamento Público.

A construção e execução do Programa do OP, compreendido dentro da estratégia de planejamento, pode ser dividido em cinco fases contínuas e que podem ocorrer em paralelo:

A fase de articulação política cuida do momento inicial da mobilização e do envolvimento da sociedade civil organizada, dos profissionais da máquina administrativa, dos sindicatos e da própria sociedade para dar início às demais fases, em especial de autoregulamentação, preparação, execução, monitoração e acompanhamento. Um segundo momento será da articulação entre o governo e a sociedade para identificar atores proeminentes para integrarem a Comissão Paritária. Numa terceira etapa, a de coordenar as ações de ordem mais técnica, para buscar consensos na definição da Matriz Orçamentária e do Plano de Investimentos. Por fim, a necessidade de articulação com a Câmara de Vereadores para tramitação da Lei Orçamentária.

A fase de preparação e autoregulamentação ocorre em geral com maior densidade no primeiro ano e essa fase merece um cuidado especial para que ela seja permanente. Aqui a preocupação da divisão da cidade em regiões deve ter sido resolvida. A parcela da sociedade já organizada, em conjunto com o governo, preparam as primeiras versões dos conteúdos, dos artefatos, do Ciclo do OP, da mobilização geral e do Regimento Interno. A Comissão Paritária, já formada, cumpre uma função importante para criar uma regulamentação mais aderente às expectativas dos envolvidos e dar legitimidade à fase de execução. É na autoregulamentação que o Executivo escolhe a sua postura com relação ao grau de participação da sociedade, que pode ser da autonomia total até a “liberdade vigiada”.

A fase de execução concentra a realização do que foi planejado no Programa do OP e as

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principais etapas do Ciclo do OP, e que mais adiante serão vistas detalhadamente (no exemplo de Porto Alegre). São quatro etapas essenciais para a execução da metodologia: i) a mobilização e participação da população, ii) a formulação das propostas, iii) a realização dos debates e deliberações, e iv) a elaboração e execução do Orçamento. Aqui é o momento em que o cidadão tem o contato mais visível com a metodologia e torna-se vital que o processo deliberativo e de execução das obras e serviços mantenham o nível de confiança do cidadão.

A fase de institucionalização embora esteja presente desde a autoregulamentação, tem duas prerrogativas essenciais: primeiro de realizar a tramitação das leis orçamentárias entre o Executivo e a Câmara de vereadores, o acompanhamento da execução orçamentária e o processo do OP, segundo para que o governo e sociedade estabeleçam os mecanismos de continuidade do OP, tornando-o uma política pública, buscando inclusive a sua inserção na LOM-Lei Orgânica do Município.

Na fase de acompanhamento e monitoração são estabelecidas as regras de monitoramento que podem ser realizadas por órgãos designados pelo executivo ou em conjunto com os representantes da sociedade, como o Conselho do OP. Independente da estrutura, esses entes vão realizar o acompanhamento e a fiscalização da execução orçamentária e do calendário de obras, dentre outras atividades.

A metodologia compreende que podem ser incoporadas formas de propostas autônomas no decorrer do processo, que façam interferência em alguma fase de construção e execução do Programa do OP, tais como de controle das obras e das operações do próprio aparato administrativo. Essas contribuições podem ser apresentadas nas assembleias ou em outros encontros propositivos e assim serem incorporadas em sua respectiva fase, com a devida deliberação dos presentes.

Por fim, existem as ações que são encadeadas e fazem parte do Programa e do Ciclo do Orçamento Participativo. Embora estejam interligadas, algumas podem ocorrer em paralelo ou antecipadas para garantir a execução dentro do prazo pré-determinado. Tomando como exemplo a cidade de Porto Alegre (24), registram-se as seguintes etapas previstas no Regimento Interno, compreendidas no espaço de um ano, para a organização do OP.

Definição da Base Geográfica: constitui a fase de divisão regional da cidade (no caso de Porto Alegre são 16), são definidos, em comum acordo entre governo e movimentos sociais, são os territórios onde o mapeamento das necessidades ocorre com a coleta da opinião de cada cidadão.

Escolha de Prioridades: com base na divisão geográfica definida, a população escolhe uma

quantidade de prioridades (no caso são 4), dentre um rol de políticas setoriais estabelecidas (no caso são 8) e faz uma hierarquização com as escolhas numerando-as de 1 a 4, da primeira para a última prioridade.

Elaboração da base temática: as plenárias temáticas (no caso 5) não obedecem a lógica da divisão regional. A proposta é de atingir segmentos da sociedade que se articulam independente do local onde as pessoas habitam, refletindo tais segmentos sociais: sindicatos, comerciantes, empresários, estudantes e movimentos sociais, além do próprio cidadão. A base temática também atinge os problemas estruturais da cidade, as políticas macro, como por exemplo de saúde e educação, e a própria gestão da máquina pública.

Programa de Governo e o Governo: nas reuniões regionais e temáticas existe uma troca de informações e propostas entre os entes governamentais e a população. Nesta etapa existe uma troca de conhecimentos: os representantes do executivo prestam informações para instruir a discussão da população e os participantes apresentam propostas que podem melhorar o funcionamento da máquina pública ou de algum projeto específico. O governo também pode apresentar as suas demandas para cidade, mas deverão passar pelo crivo dos participantes.

Primeira Rodada do OP: momento em que são realizadas as reuniões regionais e temáticas, e devem ser organizadas entre o primeiro e segundo trimestre do ano. Os encontros são convocados com antecedência, dentro do plano de comunicação e divulgação, e são abertos a qualquer cidadão. A Rodada tem uma pauta específica, que compreende a seguinte dinâmica(no caso de Porto Alegre): o governo presta contas, por escrito, do Plano de Investimento do ano anterior, detalha o método de distribuição de recursos, bem como apresenta o regulamento do OP. Em seguida, a população avalia o que foi apresentado, apresenta suas considerações e elege os delegados, obedecendo o critério de representação de acordo com a população que está presente no encontro (cada experiência municipal tem o seu critério), e por fim os novos delegados passam a compor o Fórum de Delegados, que em conjunto com os Conselheiros, coordenam o processo de discussão e deliberação com a população.

Rodadas Intermediárias: são organizadas também obedecendo a ótica regional e temática e acontecem entre a Primeira e a Segunda Rodadas do OP. São encontros em que a população se organiza de maneira autônoma para escolher as suas prioridades temáticas, hierarquizar as obras e os serviços e debater as propostas. A atividade conta com a presença de

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profissionais do governo para prestar o auxílio técnico necessário.

Segunda Rodada do OP: momento em que são realizadas as reuniões regionais e temáticas, de acordo com critérios semelhantes da Primeira Rodada, bem como seguem o mesmo rito de convocação com antecedência. Os encontros devem ser organizados bem no meio do ano. A pauta também é específica, mas se divide de forma diferente entre as regionais e as temáticas, compreendendo a seguinte dinâmica: o governo (no caso representado pelo Gabinete de Planejamento-Gaplan), em ambos encontros, apresenta os agregados de despesa mais importantes (gastos de pessoal, consumo, serviços de terceiros, entre outros) e a estimativa de receita do ano seguinte.

No caso das plenárias regionais, a comunidade entrega as prioridades por meio de um documento onde estão as quatro prioridades temáticas para aquela região. As prioridades são escolhidas por temas setoriais (no caso 8). Elas devem estar detalhadas em um formulário contendo a descrição, o endereço, o tema setorial e a sua hieraquização. Ao final a comunidade entrega o documento sistematizado para o representante do governo (no caso a Gaplan) com as diretrizes e prioridades das políticas setoriais e obras estruturais.

No caso das plenárias temáticas, como estão enquadradas em algum tema setorial, a população entrega ao representante do governo (Gaplan) um documento com a sistematização das diretrizes e prioridades das políticas setoriais de serviços e obras estruturais.

Durante os dois encontros: regional e temático, a população elege, de maneira direta, os conselheiros titulares (no caso 2) e os suplentes (idem) que vão representá-la no Conselho do OP. Trata-se de uma representação direta com regras estabelecidas no Regimento.

Nesta Rodada a população por meio da participação direta escolhe as suas prioridades e delega a representação aos conselheiros (ou o Fórum dos delegados) para que eles elaborem, em conjunto com o governo, o Orçamento Público e o Plano de Obras do ano seguinte.

Elaboração da Primeira Matriz Orçamentária: todas as demandas são encaminhadas pelo representante do governo (no caso a Gaplan) que insere as informações em sistema informatizado (no caso o Sistema de Gerenciamento de Projetos-GPR). Após a entrada no GPR os entes municipais analisam as demandas sob os aspectos: técnicos, financeiros e legais, com vistas à elaboração do orçamento e o plano de investimentos. O governo (no caso a Gaplan) recebe as prioridades temáticas de cada região e procede o cálculo com a ponderação de notas que

são atribuídas por critérios pré-definidos (cada experiência tem o seu critério).

Com a soma de todas as prioridades, alcança-se um ranking, que segue a classificação da demanda mais pontuada para a menos pontuada, então alcança-se como resultado as prioridades temáticas (no caso 3) e as prioridades regionais (no caso 3) de cada região da cidade (no caso 16). Desta forma, no caso da prefeitura de Porto Alegre (pode variar em cada município), “tem-se um indicador de planejamento para alocação dos recursos financeiros para obras e/ou serviços na base regional da cidade”(25), respectivamente, as prioridades para o ano de 1997 foram: política habitacional, pavimentação e saneamento básico.

O segundo indicador de planejamento surge dos documentos sistematizados nas plenárias temáticas, que são conjugados e cruzados com os projetos e obras em andamento na prefeitura. O terceiro indicador aparece das necessidades do próprio governo, essenciais para manter os serviços para população, e que são tratadas como as despesas rígidas. Estas devem ser programadas a médio e longo prazo, conjugadas com uma política contínua de arrecadação e de aumento de produtividade. Por último, são inseridas as obras e serviços de cárater emergencial, que são alheios ao planejamento.

A partir desses insumos, mapeados por indicadores, o governo (no caso a Gaplan), tomando como base as deliberações de todas as propostas e prioridades e a receita prevista, monta a primeira matriz orçamentária. A matriz é então examinada pelos especialistas do governo (no caso uma Junta Financeira de Governo) e enviada aos demais órgãos para manifestação técnica e elaboração das suas respectivas propostas orçamentárias, que depois devolvem a Gaplan com suas análises. A etapa da elaboração da primeira matriz deve ocorrer no início do segundo semestre.

Conselho do OP-COP: No decorrer da elaboração da matriz, no início do segundo semestre, os conselheiros devem tomar posse (no caso são 32 das regiões, 10 das temáticas e 2 de entidades do terceiro setor, totalizando 44 conselheiros). Dois representantes de governo participam, mas sem direito a voto. Até meados do segundo semestre o novo COP define seu plano e agenda de trabalho e o governo aproveita para realizar a formação do conselheiros, delegados e cidadãos interessados na temática do orçamento público.

Governo Discute e Delibera: o representante do governo (no caso a Gaplan), em meados do terceiro trimestre, realiza a compatibilização das prioridades regionais e temáticas, com as

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propostas orçamentárias da matriz e com as análises técnicas realizadas pela estrutura. Em seguida, no final do terceiro trimestre, o Governo prepara a minuta da proposta que será encaminhada para votação na Câmara de Vereadores, mas antes discute com o COP a proposta Orçamentária.

Proposta Orçamentária: Após a fase de discussão entre o governo e a COP, ainda no final do terceiro trimestre, o representante do governo (no caso a Gaplan) elabora a proposta orçamentária, que será encaminhada à Câmara e prepara a entrega institucional (no caso participam o(a) prefeito(a), Gaplan, CRC, COP e delegados), com a proposta orçamentária final do Executivo.

Plano de Investimentos do OP: para definir os critérios de alocação e execução das obras e serviços, no quarto trimestre é elaborado o Plano de Investimentos, que é priorizado com base em critérios de progressividade (cada município tem o seu critério). A boa prática sugere que os critérios sejam aprovados por alguma instância de participação (no caso o COP, Rodada ou delegados). A progressividade pode obedecer também pesos de acordo com a origem da proposta: região, temática, governo, especialistas, etc. O caso de Porto Alegre definiu três critérios gerais, ponderados por pesos e notas, sendo eles: i) população total da região; ii) carência de serviço ou infraestrutura; e iii) prioridade temática eleita pela região. Isto significa na visão de Ubirantan de SOUZA [1997] “que a região com maior carência, maior população, combinada com a vontade política estabelecida na prioridade temática, será contemplada com mais obras e serviços”.

As características que compõem a execução prática do OP podem ser verificados no Livro “Experiências de Orçamento Participativo no Brasil” [2003], onde as autoras se preocupam em fazer uma comparação quantitativa e qualitativa das experiências brasileiras em andamento. Neste caso, os elementos surgem das experiências concretas, onde as características partem das seguintes segmentações: da político-partidária, da gestão, dos participantes, da representação, da dinâmica das reuniões, da institucionalização, da divulgação, dos níveis e tipos de participação, do papel do Legislativo, do controle da execução e das mudanças na administração.

No contexto acima, temos novos elementos que compõem uma atividade em curso, ou seja real. Verifica-se assim nas características do Ciclo do OP, que existem segmentos que podem ser correlacionadas com a burocracia da máquina pública, com a melhoria da gestão pública e com os benefícios para sociedade. Eles coexistem, criando uma situação que reforça a tese de que o conhecimento técnico da estrutura governamental a serviço da melhoria da gestão pública e da sociedade, criam avanços inequívocos nos tecidos sociais.

Para cada item previsto acima será possível traçar uma linha de análise de uma determinada experiência (atribuir nota, peso, importância, etc.). RIBEIRO e GRAZIA[2003], chegam a criar arranjos mínimo, médio e máximo para sintetizar a prática do OP em determinada cidade. A intenção que cada pessoa ou instituição interessada no tema possam utilizar os elementos descritos no Ciclo do OP, somar aos segmentos das experiências práticas e criar uma metodologia de Orçamento Participativo para sua cidade ou realizar uma análise de uma iniciativa que esteja em andamento.

O Desafio da Evolução Metodológica

Por sua relação umbilical com a realidade local, inserida nas limitações financeiras e geográficas, o Orçamento Participativo tem seus maiores exemplos e êxitos nas implementações municipais. Existem três desafios que estão postos de imediato, com relação à metodologia: primeiro o fortalecimento do OP na esfera estadual e federal; segundo pensar em modelos alternativos que ampliem a participação e garantam a evolução metodológica; e por último, como reforçar as iniciativas existentes e alcançar um número maior de cidades no país.

Os processos de orçamento começam a ser organizados pela prefeitura e aos poucos são assimilados pela sociedade e entidades organizadas, e estes atores criam um modelo a partir da experiência implementada. A relação de dependência com o goveno existe, por isto a pressão de segmentos da sociedade organizada são fundamentais para que a iniciativa tenha continuidade. Aqui fica o desafio para a academia no sentido de envolver mais o corpo docente e discente com a temática da gestão e das práticas participativas.

Como qualquer método, ele se exaure, não pela sua inoperância, ou pela monotonia da repetição metodológica, mas sim porque as pessoas têm necessidades, têm percepções evolutivas e os métodos possuem dificuldade em acompanhar a evolução do mundo real. Markus BROSE [2001] demonstra sua preocupação com as metodologias e se manifesta contra “a ditadura dos métodos”. Existe um amplo rol de possibilidades e de escolhas do instrumental mais adequado. O desafio se divide em três momentos: i) o de não se tornar escravo de um determinado método; ii) o de manter o nível de mobilização da população; e iii) o de como construir uma experiência que esteja alinhada com a realidade encontrada na sociedade.

O professor Fedozzi [2001], durante o I Seminário de Gestão Democrática das Cidades,

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alerta sobre as preocupações com as assimetrias da sociedade. Na visão do professor existe um desafio de tratar da realidade do público participante, referindo-se “principalmente aos públicos heterogêneos, em especial, oriundos de camadas soiciais em que prepondera as assimetrias de capital escolar entre eles”.

Embora existam desafios explícitos para a própria prática do Orçamento Participativo, a partir do amadurecimento das iniciativas e dos casos de sucesso, um conjunto de outros métodos, modelos e ferramentas foram criados, aprimorados ou incorporados ao processo, sendo alguns deles:

Planejamento Estratégico Participativo: modelo de planejamento, que surgiu em 1996, onde se busca inserir práticas de gestão do meio empresarial para proporcionar a mesma eficiência ao setor público, incorporando a ótica da participação popular. A proposta gera um método que possibilita a criação de um Planejamento Estratégico Municipal.

Congresso da Cidade: a grande parte das dicussões do OP recaem sobre as questões dos bairros ou de regiões da cidade. Embora existam os grupos temáticos, surgem assuntos que a lógica de divisão por temas não consegue abranger. A experiência da cidade de Belém incorporou uma prática de discussão da cidade de forma global com a participação da população.

Orçamento Digital: a experiência de Belo Horizonte, que é uma das mais importantes práticas, iniciada em 1994, e a do governo do estado do Rio Grande do Sul, no ano de 2013, experimentam atualmente o orçamento digital. Uma identificação de problemas e apresentação de propostas e definição de prioridades realizadas pela internet(26).

Participação Virtual: como alternativa de renovação metodológica e na busca por adotar novos instrumentos frente aos modelos pré-existentes, os gestores municipais têm procurado o apoio da TI-Tecnologia da Informação para aperfeiçoar os procedimentos existentes e também promover novos estímulos para dar continuidade ao processo de participação popular. Nesse caso, o próprio governo federal tem o Portal Participa.br(27), que promove a participação nas políticas nacionais. Essas ferramentas, fortemente ancoradas na Internet, têm demonstrado um pequeno fôlego para criar alternativas de participação. Entretanto, embora sejam promissoras, percebe-se que as experiências virtuais são de menor vulto, quando comparadas às presenciais (28).

Nesses casos de renovação descritos acima, se encontra mais um desafio que é o de como incoporar as inovações de outras práticas de participação popular e de como deixar arejada a estrutura do OP para que ela possa receber tais inovações.

Orçamento Participativo, Cidadania e Qualidade de Vida

Não é trivial relacionar entre si os conceitos de Orçamento Participativo, Cidadania e Qualidade de Vida. Por isto, no decorrer do próprio artigo, foram desenvolvidas algumas aproximações entre os três conceitos.

O Orçamento Público pode ser um instrumento de apropriação da sociedade, e quando isto se realiza por meio da participação popular, a cidadania alcança uma melhoria significativa de qualidade. Como disse Genro [1997],

“a cada ano, o Oçamento Participativo aperfeiçoa-se pela acumulação de ricas e variadas experiências democráticas. E o que era puro requerimento, demanda, necessidade, muda de qualidade e mediante o processo participativo adquire natureza política, fazendo do indivíduo um cidadão.

A definição geral de Cidadania aponta que se trata do exercício dos direitos e deveres civis , políticos e sociais estabelecidos na constituição. Os direitos e deveres de um cidadão devem andar sempre juntos, uma vez que ao cumprirmos as obrigações permitimos que o outro exerça também os seus direitos(29). A partir de tal definição é possível perceber que tais direitos e deveres são exercitados no decorrer da construção da metodologia, inclusive de forma coletiva, como o caso da criação do Regimento Interno do OP.

A primeira conquista da cidadania se verifica no aprendizado que surge dos dois lados: governo e sociedade. A máquina pública dilui seu poder decisório e consegue prever demandas que muitas vezes não tinha capacidade de diagnosticar sozinha; já a sociedade conhece mais da estrutura pública e acaba entendendo que uma obra não acontece no dia seguinte, pois existem questões burocráticas e legais que precisam ser atendidas, e que essa burocracia, serve também para melhorar o controle, a transparência e o atendimento ao cidadão.

A relação de aprendizado entre governo e sociedade pode ser bem observada na Cartilha dos Critérios Técnicos do OP 2000 na cidade de Belém(30). Para tratar das demandas de saúde a prefeitura informa ao cidadão que “as demandas de construção de equipamentos, deverá levar em consideração a facilidade de acesso da população pelo sistema viário ao equipamento”. Assim, o cidadão percebe que a chegada de um equipamento novo para atender a população depende das condições de acesso ao Posto de Saúde ou então, que seja solicitada a melhoria das vias para acessar um Posto de Saúde mais próximo da demanda da região.

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A segunda conquista encontra-se próxima ao próprio conceito de cidadão, pois a discussão sobre a realidade do bairro, da cidade e da qualidade de vida, ganham uma agenda no cotidiano das pessoas. As rodadas intermediárias, as atividades autônomas e de autoregulamentação são momentos de construção política e social coletiva, em que o cidadão se programa para participar e, caso tenha interesse consiga até apresentar os seus argumentos para defender uma determinada proposta.

A professora Danielle COSTA [2003] considera que “o Orçamento Participativo é um processo amplo, que envolve a contrução de um espaço de democracia participativa, no qual os cidadãos desenvolvem a capacidade de participar politicamente e de tormar decisões relativas à comunidade onde vivem”.

A terceira surge de forma bem mais subjetiva, resultado dos “movimentos silenciosos”. Boa parte dessas relações aparecem em relatos dos representantes no decorrer dos encontros nas Instâncias de Participação, mas em sua maioria, são perdidas no tempo. É comum um delegado, ao pedir a palavra, mencionar que um cidadão analfabeto, de uma comunidade pobre, resolveu voltar a estudar para entender mais sobre o orçamento.

Os ganhos abstratos, aqueles que não são facilmente mensurados pelas métricas de aplicação de um método ou modelo, também compõem um resultado positivo per si. A questão é que o ganho intangível não tem métrica adequada para ser mensurado. É fácil perceber os resultados quando se realiza uma obra pública, se constrói um prédio ou uma escola, mas a qualidade do ensino, a preocupação com saúde pessoal, a melhoria do atendimento ao cidadão, são elementos de mensuração mais complexa. Na maioria das vezes a participação popular, tem muitos resultados relacionados a esses avanços.

Para Neimar DUARTE [2005] a metodologia “deve ser compreendida e reforçada como uma das formas mais objetivas de seguir adiante o desejo de empoderamento das organizações populares e dos movimentos sociais que buscam um novo sentido à participação e à democracia”.

A própria evolução da participação popular gera uma qualificação da cidadania individual que alcança reflexos na cidadania coletiva, como percebe Neimar, na “ampliação da qualidade da ação dos movimentos sociais, passando de um estágio meramente reinvindicatório para um estágio propositivo sobre suas demandas”. Nota-se que passar da posição de reinvidicação para a de proposição, engendra uma mudança de postura e de acúmulo de informações por parte do cidadão.

Neste sentido, a palavra-raiz, cidade, diz muito sobre o verbete cidadania. “O habitante da

cidade no cumprimento dos seus deveres é um sujeito da ação, em contraposição ao sujeito de contemplação, omisso e absorvido por si e para si mesmo, ou seja, não basta estar na cidade, mas agir na cidade. A cidadania, neste contexto, refere-se à qualidade de cidadão, indivíduo de ação estabelecido na cidade moderna”(31).

De acordo com Marta Elvira, articulista da Revista Exame, Qualidade de Vida “é um conceito subjetivo, multidimensional e que abrange características tanto positivas quanto negativas. Trata-se de um estado dinâmico que varia em razão dos acontecimentos vitais: a perda de um trabalho, uma doença ou outros incidentes”(32).

A ONU apresenta um conceito mais amplo de qualidade de vida. “Apesar de o crescimento econômico ser uma das condições necessárias para aumentar a qualidade de vida para todos, ele não é exclusivo. Outras políticas também são necessárias para aumentar diretamente a capacidade de todos para contribuir para a disseminação e o crescimento do bem-estar humano em todas as suas dimensões”(33).

A Frente Nacional de Participação Popular demonstra que o “Orçamento Participativo pode ser um instrumento eficaz para importantes conquistas políticas, econômicas e sociais” e conclui que “a democratização da gestão pública é uma condição necessária para a melhoria da qualidade de vida de todos(as) os(as) cidadãos(ãs)”(34).

Na cidade de Porto Alegre, a apresentação dos resultados das práticas de Orçamento Participativo, demonstram que as iniciativas aplicadas na cidade são uma demonstração inequívoca do fortalecimento da cidadania e de qualidade de vida. A obra na comunidade da Vila Cai-Cai é um pequeno exemplo do que pode ser alcançado com as práticas de democracia participativa.

Obviamente que não se trata de uma condição de melhoria da participação política de forma sistêmica, visto que as questões que envolvem a metodologia são mais pontuais e restritas ao universo do orçamento. Entretanto, com o surgimento do OP, emergiu uma alternartiva para trazer a reflexão da gestão democrática e da qualidade de vida nas cidades e conseguir, desta forma, debater também outras contradições de ordem mais gerais que atingem a cidade e a população.

A observação acima não impede que o Orçamento Participativo possa ser considerado um arranjo institucional que, independente dos parâmetros da democracia representiva ou participativa, apresente um conjunto de conceitos

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e práticas capazes de viabilizar o aperfeiçoamento da cidadania e a melhoria da qualidade de vida nas cidades.

Conclusão

O Orçamento Público, desde a sua origem na Inglaterra absolutista, continua sendo o principal instrumento de controle das políticas e finanças públicas. O seu aprimoramento é o resultado da própria evolução da civilização. Ao longo do tempo, os processos de democratização da sociedade influenciaram diretamente as práticas e técnicas orçamentárias, que o tornaram um poderoso instrumento de planejamento e de gestão.

O Orçamento Participativo é o resultado de múltiplos acontecimentos históricos: (i) a própria evolução do Orçamento Público; (ii) a pressão dos movimentos sociais, a partir da década de 70, por maior participação popular; (iii) a redemocratização do Brasil com a chegada da Nova República; (iv) os partidos progressistas com seus programas de participação popular e democratização da gestão; e (v) a Constituição Cidadã de 1988. Um ambiente de condições favoráveis para o avultar de uma metodologia como a do Orçamento Participativo.

Essa conjugação de fatores rendeu ao Brasil a chancela de pioneirismo nas práticas de participação popular associadas à gestão democrática das cidades. No decorrer da década de 90 e na virada de milênio, a iniciativa demonstrou capacidade de expansão, de amadurecimento e de inovação, chegando em algumas cidades a atingir mais de 20% da população(35).

A metodologia do OP, como diz Evanildo B. DA SILVA [2001], é capaz de gerar resultados expressivos para o governo e a sociedade. No caso do governo: traz maior articulação e racionalização dos instrumentos administrativos; torna a distribuição e o controle dos recursos públicos mais eficiente; melhora o sistema de arrecadação; gera maior legitimidade da Administração municipal; e reforça o reconhecimento político junto à população. No caso da sociedade: amplia a mobilização de setores organizados e não-organizados; cria um novo padrão de distribuição dos recursos; desenvolve novas lideranças comunitárias; melhora as condições de vida da população; e descentraliza o poder em função dos processos de tomada de decisão local, regional e temática. As considerações de Evanildo B. da Silva, que tomam como base o caso de Porto Alegre, demonstram como o Orçamento Participativo é capaz de fortalecer a democracia, estruturar melhor o planejamento e o investimento das cidades e fortalecer a participação social do cidadão.

Mas deve-se seguir o alerta de Markus Brose e fugir da “ditadura dos métodos” e do “milagre” das

metodologias. O OP é construído por pessoas, por relações sociais, por decisões políticas e por disputas de poder. O seu refluxo pode ser o resultado de retrocessos políticos, pressão das práticas clientelistas ou da falência do sistema político brasileiro. Por isto, o OP precisa ser sempre avaliado e repensado.

O período da história em que vivemos é comandado pelo capital financeiro e pelas grandes corporações transnacionais. São estes os atores que hoje dão sentido ao que Milton SANTOS [2000] identifica como a "vontade de evolução dos homens". Nunca, antes, o poder se concentrou em tão poucas e poderosas mãos. Esse poder transforma tudo em mercadoria, inclusive a cidade, e como diz Milton Santos, “impõe a lógica do mercado como a lógica da organização da sociedade e das relações sociais, enaltecendo a competição, o individualismo, a lei do mais forte”.

Em seu texto “Experiências Inovadoras Para Uma Nova Governança Democrática”, Silvio Caccia Bava, coloca que "para operar esta reconversão ideológica das propostas de inclusão social, as técnicas e metodologias inovadoras passam a ser tratadas como coisas, e não como novas relações sociais; passam a ter um valor em si, assegurando-se sua replicabilidade, e também a sua inoperância enquanto instrumentos de transformação social”(36).

Esse cenário traçado por Milton Santos e Silvio C. Bava, demonstra a atualidade do OP, indica que algo precisa ser feito para inverter a lógica de “coisificação” e serve como um sinal de alerta para as transformações que estão ocorrendo no sistema capitalista, no seio das cidades e nas relações sociais, e, como tais mudanças dirigidas por grupos poderosos sufocam, muitas vezes de forma orquestrada, as decisões políticas coletivizadas.

A maioria dos estudos sobre Orçamento Participativo estão centrados na técnica, na metodologia, no processo e nas experiências práticas, são poucos os estudos sobre os reflexos da relação com a Administração Pública e com os “movimentos silenciosos”. No primeiro caso, evidenciam-se duas reflexões: primeiro que o fato de um partido governar uma cidade não vai resultar no envolvimento do funcionalismo, o que pode tornar a prática uma obrigação(ou até um fardo) para os profissionais, segundo que o nível de institucionalização é frágil, pois obedece a lógica da temporalidade do mandato e não da prestação de um serviço público.

No segundo caso, dos “movimentos silenciosos”, ocultam-se muitos impactos e conquistas que ocorrem com a sociedade e o cidadão, dentre as quais: o aprimoramento das

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relações coletivas, a mobilização da população, as novas formas de organização dos movimentos sociais, a qualificação de saberes individuais e coletivos, a postura propositiva, o sentimento de cidadania, a valorização da identidade cultural, além daquelas relacionadas à própria gestão da cidade.

A baixa presença de discussão na academia sobre a gestão democrática das cidades, de experiências de participação popular, como as do OP, formam gerações de gestores e técnicos que dominam adequadamente a gestão e as finanças públicas, mas se distanciam de práticas cidadãs, que transformam a vida das pessoas. A relação com a Administração Pública e com os “movimentos silenciosos” poderiam ser objeto de estudo e formulação da academia. Os movimentos sociais que lutaram contra a ditadura e pela redemocratização do país na década de 80, tinham como aliados a academia. Esta precisa se envolver novamente em pautas que, como diz Boaventura de Sousa Santos, busquem “Democratizar a Democracia”.

Silvio C. Bava, reforça a tese de uma nova postura da academia ao afirmar que “a busca de novos paradigmas, a busca da passagem da experiência inovadora para a formulação de novas políticas públicas, requer um trabalho de pesquisa que permita sistematizar, analisar, debater e difundir o que nos ensinam estas experiências”(36).

Enxergar o tema do Orçamento Participativo de forma restrita, como apenas uma bandeira política-partidária, atende justamente ao interesse das pessoas que, como diz Max Weber, vivem “da Política” e não àquelas que vivem “Para a Política”.

Algo é certo, a expansão das ações de participação popular aumenta o número de possíveis postulantes aos cargos públicos, amplia a capacidade de controle e acompanhamento das políticas públicas e gera maior autonomia para o cidadão. Trata-se de um quadro que atinge os interesses daqueles que ganham com a mercantilização da cidade, tais como os sistemas financeiro, imobiliário e de transportes, entes que hoje são agentes políticos e financiadores de campanhas eleitorais.

O momento é propício para retomada das práticas de democracia participativa. As pressões da população em 2013 e 2014 e as manifestações pela Internet, em especial nas redes sociais, refletem o clamor por algo inovador na relação governo-sociedade. Como diz Silvio Caccia Bava com relação às novas formas de organização da sociedade. “Este movimento social que recentemente adquire uma escala global, denominado “altermundialista”, afirma que um outro mundo é possível, lança as bases para a construção de novos paradigmas, cria novas técnicas e metodologias para realizar seus objetivos”(36).

Este enfoque da disseminação das experiências inovadoras favorece a emergência na cena pública de novos atores(as redes sociais e a academia por exemplo), capazes de reelaborar as iniciativas de referência e, a partir delas, criar novas relações sociais, onde o OP continua como sendo uma excelente alternativa.

Por fim, verifica-se que os dois conceitos centrais que envolvem o presente estudo: a política e o poder, que são elementos intrínsecos à vida em sociedade, não sofrem mudanças somente pelas forças da natureza, advindas de uma evolução darwiniana, elas precisam da frequente organização das pessoas e dos grupos que são excluídos do centro das decisões e que não participam da acumulação e distribuição das riquezas. A urgência manifestada pela sociedade para o aprimoramento da democracia vai depender, como já dito anteriormente, da vontade política dos governantes e da sociedade.

Agradecimentos

A superação de barreiras encontra seu alimento primário nos incentivos que recebemos ao longo da vida, que podem ser materiais e imateriais. A conjugação dos dois oportuniza uma energia propulsora capaz de tornar a superação menos dolorosa e complexa. Tive a sorte de contar com os dois elementos. Os materiais agradeço ao meu amigo/irmão, Carlos Fernando Galvão, que durante anos estudou comigo meios de tornar mais democrática a gestão das cidades. Os mestres Hector Poggiese, Ana Clara T. Ribeiro e Grazia de Grazia pelas influências conceituais escavadas em seus livros e artigos e ao professor Fedozzi pelo estímulo teórico original, retratado publicamente nos estudos do I Seminário Gestão Democrática das Cidades, em 2002. Os imateriais nos remetem ao emocional, ao afetivo, ao motivacional. De imediato, dedico aos meus pais e ao meu irmão pelo exemplo e influência sempre presentes em minha vida, à minha namorada Jesa Lima, que colocou as palavras certas para me entregar com afinco ao presente estudo e a minha filha Tatiana Zanetti Meffe, que somente por existir me traz inspiração constante.

Finalmente, para alcançarmos um degrau na busca pelo conhecimento, interagimos com muitos saberes da humanidade. Ao subir um novo patamar na escada da vida, costumo agradecer debruçado em algum gigante, então, como nos ensinou Max Weber, "o homem não teria atingido o possível, se não houvesse sempre tentado atingir o impossível".

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DA SILVA, Evanildo Barbosa (2001), [apud BROSE], Markus [organizador]. Metodologia Participativa – uma introdução a 29 instrumentos. Porto Alegre. Tomo Editoral, 2001:p.211.

DUARTE, Neimar D. Azevedo (2005), [apud AZEVEDO e FERNANDES], Sérgio de e Rodrigo Barroso [organizadores]. Orçamento Participativo – construindo a democracia. Rio de Janeiro. Editora Revan, 2005:p.107.

FEDOZZI, Luciano (2002), [apud, livro Gestão Democrática das Cidades – Metodologias de Participação, Redes e Movimentos Sociais]. Prefeitura de Porto Alegre e Governo da Cidade de Buenos Aires, 2002:p.145.

NOBLAT, Pedro (2003), [apud NOBLAT e BARCELOS], Curso de Elaboração e Execução de Orçamento Público-Escola Nacional de Administração Pública-ENAP. Brasília, Editora ENAP, 2003:p.8.

PIMENTEL, Fernando (2005), [apud AZEVEDO e FERNANDES], Sérgio de e Rodrigo Barroso [organizadores]. Orçamento Participativo – construindo a democracia. Rio de Janeiro. Editora Revan, 2005:p.9.

PONT, Raul (2000), [apud FISCHER e MOLL]. Democracia Representativa e Democracia Participativa. In: FISCHER, Nilton Bueno e MOLL, Jaqueline (orgs.) Por uma nova esfera pública: a experiência do orçamento participativo. Petrópolis: Vozes, 2000:p.27.

ROMEIRO, Paulo (2003), [apud BALCÃO e TEIXEIRA], Nilde e Ana Cláudia [Organizadoras]. Controle Social do Orçamento Público, Publicações do Instituto PÓLIS/PUC-SP, 2003:p.11.

SANCHES, Osvaldo Maldonado (1997), apud [NOBLAT e BARCELOS], Curso de Elaboração e Execução de Orçamento Público-Escola Nacional de Administração Pública-ENAP. Brasília, Editora ENAP, 2003:p.16.

SILVA, (1962), [apud NOBLAT e BARCELOS], Curso de Elaboração e Execução de Orçamento Público-Escola Nacional de Administração Pública-ENAP. Brasília, Editora ENAP, 2003:p.17.

Notas:

(1) Magna Charta Libertatum, redigida em latim bárbaro e outorgada pelo Rei João sem Terra em 15 de Junho de 1215. Fonte: Comparato, Fábio Konder, “A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos”. São Paulo, Ed. Saraiva, 1999.

(2) a citação do Orçamento Público como instrumento de maior relevância pode ser obtida em NOBLAT, Pedro e BARCELOS Carlos L.K., Curso de Elaboração e Execução de Orçamento Público-Escola Nacional de Administração Pública-ENAP. Brasília, Editora ENAP, 2003:p.8.

(3) em 1706 a Câmara dos Comuns da Inglaterra determinou, através da Resolução n. 66, que caberia ao Executivo a responsabilidade pelas finanças do governo, coordenando a proposta de receitas e de despesas, ficando a cargo do Parlamento aprova-la, inclusive, exercendo o controle da execução orçamentária. Essa determinação foi um embrião para o orçamento público atual.

(4) a tradução do dispositivo constitucional dos Estados Unidos regulamentado por volta de 1800 foi encontrada no artigo dos professores PIRES, José Santo Dal Bem e MOTTA, Walmir Francelino, A Evolução Histórica do Orçamento Público e Sua Importância para a Sociedade. Maio-Agosto/2006, Maringá-PR. Revista Enfoque Reflexão Contábil da Universidade Estadual de Maringá, 2006:p.18-19

(5) o professor Edson Ronaldo Nascimento, no texto “Um Breve Histórico do Estudo das Finanças Públicas”, resume a origem do conceito de finanças públicas e como o tema se relaciona com a questão do Orçamento Público.

(6) “as coisas que o governo compra são menos importantes que as coisas que o governo faz” é uma citação de NOBLAT, Pedro e BARCELOS Carlos L.K., Curso de Elaboração e Execução de Orçamento Público-Escola Nacional de Administração Pública-ENAP. Brasília, Editora ENAP, 2003:p.11.

(7) menção feita ao Senado Federal na página do Instituto Federal do Paraná.Endereço: http://reitoria.ifpr.edu.br/?page_id=41130 (último acesso 16/07/2014)

(8) extraído da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 165, parágrafo 1º.Endereço:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm(último acesso 20/07/2014)

(9) extraído da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 165, parágrafo 2º.Endereço:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm(último acesso 20/07/2014)

(10) estudo histórico do Orçamento Público atribuído em diversos artigos a GIACOMONI, James, Orçamento Público. São Paulo. Editora Atlas. 4a edição, 1992.

(11) o histórico da evolução constitucional brasileira foi obtido junto ao artigo de PIRES, José Santo Dal Bem e MOTTA, Walmir Francelino, A Evolução Histórica do

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Orçamento Público e Sua Importância para a Sociedade. Maio-Agosto/2006, Maringá-PR. Revista Enfoque Reflexão Contábil da Universidade Estadual de Maringá, 2006:p20-22

(12) o conceito de ciclos sociais pode ser observado no artigo “O ecossistema humano parte I: O ecossistema humano como um conceito organizador no manejo de ecossistemas”, onde se define que os ciclos sociais “são os padrões temporais para alocar as atividades humanas”...”Os ciclos sociais influenciam consideravelmente a distribuição dos recursos críticos. Um exemplo é o conjunto de ritmos coletivos em uma comunidade ou em uma cultura que organiza seu calendário, festivais, colheitas, estações de pesca, dias de negócios e assim por diante”, 1997:p.3.

(13) o professor Marco Antônio Dias, demonstra que “caso não esteja previsto nenhum prazo na LOM, o Executivo poderá encaminhá-la a qualquer tempo, desde que se garanta um prazo razoável para sua apreciação e aprovação e não se comprometa a elaboração orçamentária”. Universidade Paulista-UNIP, 2012:p.21.

(14) dados do Portal do Sistema Estadual de Participação Popular e Cidadã, “Estado registra a maior votação da Participação Popular no Orçamento: 1.315.393 gaúchos apontaram onde o RS deve investir”, dentre 11,16 milhões de habitantes.Endereço:http://www.portaldaparticipacao.rs.gov.br/estado-registra-a-maior-votacao-da-participacao-popular-no-orcamento-1-315-393-gauchos-apontaram-onde-o-rs-deve-investir/(último acesso 20/07/2014)

(15) o Orçamento Participativo Digital da cidade de Belo Horizonte, “inaugurou uma metodologia administrativa que une participação popular, inclusão social e nova tecnologia. Pela primeira vez a Prefeitura submeteu a votação, pela internet, definindo as obras a serem executadas na cidade”.Endereço:http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade.do?evento=portlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMenuPortal&app=politicasurbanas&lang=pt_br&pg=5562&tax=16919(último acesso 20/07/2014)

(16) Cadernos sobre o Orçamento Cidadão, publicação da Fundação Prefeito Faria Lima. Cepam, elaborado por do AMARAL e CATANZARO, José Carlos Nobrega e Waldir, São Paulo, 2002.

(17) em março de 1986 a UAMPA-União das Associações de Moradores de Porto Alegre entregou carta ao prefeito Alceu Collares, contendo os princípios para a participação popular na gestão da cidade.

(18) citação a ABERS, Rebecca. (1996:p.38), em artigo de Leonardo AVRITZER, sobre o “Orçamento Participativo em Belo Horizonte e Porto Alegre: comparando instituições e práticas”, [apud AZEVEDO e FERNANDES], Sérgio de e Rodrigo Barroso [organizadores]. Orçamento Participativo – construindo a democracia. Rio de Janeiro. Editora Revan, 2005:p.199.

(19) o caso da Vila Cai-Cai é registrado com fotos nos anexos do livro de GENRO e SOUZA, Tarso e Ubiratan de. Orçamento Participativo – a experiência de Porto Alegre. São Paulo. Editora Fundação Perseu Abramo, 1997.

(20) o texto genérico afirma que “todos os estudos realizados sobre a adoção de mecanismos que ampliam a participação popular é que eles apontam para a melhoria de

qualidade de vida da população e da localidade”, isto ocorre em função de que todas as Referências Bibliográficas que tratam do Orçamento Participativo fazem sempre a mesma menção.

(21) mimeo com o título “Orçamento Participativo-Democratização da gestão Pública e Controle Social” de autoria de TEIXEIRA, GRAZIA, ALBUQUERQUE e PONTUAL, Ana Cláudia, Grazia de, Maria do Carmo e Pedro. Produzido pelo Fórum Nacional de Participação Popular.

(22) citação a SOUZA, Celina (2001), em artigo de Neimar DUARTE Azevedo, sobre “A Face Representativa do Orçamento Participativo”, [apud AZEVEDO e FERNANDES], Sérgio de e Rodrigo Barroso [organizadores]. Orçamento Participativo – construindo a democracia. Rio de Janeiro. Editora Revan, 2005:p108

(23) os três eixos de ações estratégicas é uma formulação realizada a partir do artigo de DA SILVA, Evanildo Barbosa, 2001, [apud BROSE], Markus [organizador]. Metodologia Participativa – uma introdução a 29 instrumentos. Porto Alegre. Tomo Editoral, 2001:p.211.

(24) todas as etapas do Ciclo do OP utilizam como base a experiência de Porto Alegre, com algumas influências da cidade de Belo Horizonte. Para Porto Alegre, GENRO e SOUZA, Tarso e Ubiratan de. Orçamento Participativo – a experiência de Porto Alegre. São Paulo. Editora Fundação Perseu Abramo, 1997:p52-68.

(25) os indicadores de planejamento são descritos por Ubiratan de Souza em, GENRO e SOUZA, Tarso e Ubiratan de. Orçamento Participativo – a experiência de Porto Alegre. São Paulo. Editora Fundação Perseu Abramo, 1997:p63.

(26) um dos objetivos do Portal de Participação Popular e Cidadã é possibilitar que “qualquer usuário, em qualquer parte do mundo, pela internet (em breve, utilizando equipamentos móveis – smartphones, tablets, etc.) poderá acompanhar a Agenda Estadual da Participação e também o estágio em que se encontra determinada Demanda e/ou Prioridade Regional”.Endereço:http://www.portaldaparticipacao.rs.gov.br/instancias-da-participacao/(último acesso 20/07/2014)

(27) o Portal do Participa.Br “é um ambiente interativo de rede social que permite a publicação de conteúdos pelos próprios usuários, sem moderação prévia. Em outras palavras, o Participa.Br vai muito além de um espaço de publicação de conteúdos pelos seus gestores, se constituindo como uma plataforma de interação”.Endereço: www.participa.br(último acesso 20/07/2014)

(28) o próprio caso do estado do Rio Grande do Sul explícita a relação do presencial e virtual, pois o OP para o exercício de 2015 contou com cerca de um milhão e trezentos mil votos, sendo assim distribuídos: votação digital: 255.751 e votação presencial: 1.059.842.(endereço na internet idem ao 14)

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(29) o conceito padrão de Cidadania foi extraído da internet no Portal da Wikipédia, a enciclopédia livre.Endereço: http://pt.wikipedia.org/wiki/Cidadania (último acesso 20/07/2014)

(30) a Cartilha do Orçamento Participativo de Belém, contendo os Critérios Técnicos do OP 2000, da Coordenação de Relações com a Comunidade da Prefeitura de Belém, 2000:p4.

(31) para este indivíduo de ação, cf. ARENDT, Hannah. A condição humana. 10. ed. Trad. Roberto Raposo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 17 et seq

(32) definição de Qualidade de Vida é subjetiva, mas e daí?, Revista Exame, Editora Abril.Endereço:http://exame.abril.com.br/revista-voce-rh/edicoes/28/noticias/a-subjetividade-do-estar-bem (último acesso 20/07/2014)

(33) o Portal da UNIC RJ-Centro de Informações da ONU - Rio de Janeiro. Endereço: http://www.unicrio.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-desenvolvimento/ (último acesso 20/07/2014)

(34) mimeo com o título “Orçamento Participativo-Democratização da gestão Pública e Controle Social” de autoria de TEIXEIRA, GRAZIA, ALBUQUERQUE e PONTUAL, Ana Cláudia, Grazia de, Maria do Carmo e Pedro. Produzido pelo Fórum Nacional de Participação Popular.

(35) as cidades de Ipatinga-MG e Icapuí-CE atingiram mais de 20% da população total e Recife-PE mais de 25% do eleitorado, de acordo com COSTA, Danielle Martins Duarte. Vinte anos de Orçamento Participativo: análise das experiências em municípios brasileiros. São Paulo. Cadernos Gestão Pública e Cidadania/v.15, n.56, da GVceapg, Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2010:p.21.

(36) mimeo do artigo “Experiências Inovadoras para uma nova governança democrática”, de CACCIA BAVA e PAULICS, Sílvio e Verônica, Instituto Pólis, 2005:p1.

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