Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode...

8
289 Ordem Blattodea (blatta = inseto lucífugo, barata) Jorge Luiz Nessimian 1 Diagnose. Insetos neópteros de tamanho moderado a grande (3-100 mm), com o corpo ovalado e deprimido (às vezes convexo), de coloração parda, castanha ou preta, podendo apresentar manchas coloridas. Algumas espécies podem apresentar tons de laranja, amarelo ou verde. O pronoto tem a forma de um disco e é expandido, cobrindo a cabeça em muitas espécies. A cabeça é bastante móvel e normalmente pode estar com a fronte voltada para baixo. As antenas são, em geral, filiformes. Aparelho bucal do tipo mastigador. Há espécies aladas, braquípteras e ápteras. As asas anteriores são pergamináceas (tégminas) e as posteriores, membranosas. As pernas são marchadoras (às vezes, cavadoras) com tarsos pentâmeros. Os cercos têm de um a vários artículos. Machos com genitália assimétrica. Fêmeas com ovipositor, geralmente, escondido. Os ovos são depositados em ootecas. Anatomia externa Adultos. Cabeça. hipognata, de movimento livre, gula presente, olhos compostos bem desenvolvidos, reniformes; dois ocelos; antenas filiformes (setiformes ou moniliformes), longas, multiarticuladas; aparelho bucal mastigador, palpos maxilares com cinco artículos, palpos labiais com três artículos (Figura 1). Tórax. protórax com pronoto expandido, em forma de disco, cobrindo a cabeça; meso e metanoto mais ou menos retangulares e subiguais; pleura e esterno pouco esclerosados; pernas cursoriais, coxas aproximadas, tarsos pentâmeros com pulvilos nos tarsômeros 1-4, um par de garras tarsais com ou sem empódio ou arólio entre elas (Figura 2). Asas, quando presentes, as anteriores pergaminhosas (tégminas), Costa (C) da tégmina, marginal, Sc curta e R com muitos ramos; M e CuA ocupando grande parte da tegmina e CuP curva e curta delimitando um distinto clavo; asa posterior com dobra entre CuP e 1A, separando remígio (anterior, contendo as veias C, Sc, R, M e Cu) e área anal (posterior, contendo as veias Anais), geralmente bem desenvolvida, dobrada ou plissada, quando em repouso (Figura 3). Abdômen. achatado, com 10 tergitos visíveis, o 11 o representado pela placa supra-anal; cercos com um a vários artículos; 1 o esternito pequeno ou ausente, o 11 o representado pelos paraproctos, cobertos pela placa subgenital ventralmente; a placa subgenital do macho (9 o esternito) portando usualmente um par de estilos (Figura 4); a genitália do macho consiste em um grupo de falômeros esclerosados e é coberta pela placa subgenital; na fêmea, a placa subgenital é formada pelo 7 o esternito e pode ser única ou estar dividida (Figura 5); o ovipositor é curto e consiste de três pares de valvas dentro da câmara genital. 1 Laboratório de Entomologia, Departamento de Zoologia, Instituto de Biologia, UFRJ. Caixa Postal 68044, Rio de Janeiro, RJ, 21941-971, Brasil. 16

Transcript of Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode...

Page 1: Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou

289

Ordem Blattodea(blatta = inseto lucífugo, barata)

Jorge Luiz Nessimian1

Diagnose. Insetos neópteros de tamanho moderado a grande (3-100 mm), com o corpo ovalado e deprimido (às vezes convexo), de coloração parda, castanha ou preta, podendo apresentar manchas coloridas. Algumas espécies podem apresentar tons de laranja, amarelo ou verde. O pronoto tem a forma de um disco e é expandido, cobrindo a cabeça em muitas espécies. A cabeça é bastante móvel e normalmente pode estar com a fronte voltada para baixo. As antenas são, em geral, filiformes. Aparelho bucal do tipo mastigador. Há espécies aladas, braquípteras e ápteras. As asas anteriores são pergamináceas (tégminas) e as posteriores, membranosas. As pernas são marchadoras (às vezes, cavadoras) com tarsos pentâmeros. Os cercos têm de um a vários artículos. Machos com genitália assimétrica. Fêmeas com ovipositor, geralmente, escondido. Os ovos são depositados em ootecas.

Anatomia externaAdultos. Cabeça. hipognata, de movimento livre, gula presente, olhos compostos bem

desenvolvidos, reniformes; dois ocelos; antenas filiformes (setiformes ou moniliformes), longas, multiarticuladas; aparelho bucal mastigador, palpos maxilares com cinco artículos, palpos labiais com três artículos (Figura 1).

Tórax. protórax com pronoto expandido, em forma de disco, cobrindo a cabeça; meso e metanoto mais ou menos retangulares e subiguais; pleura e esterno pouco esclerosados; pernas cursoriais, coxas aproximadas, tarsos pentâmeros com pulvilos nos tarsômeros 1-4, um par de garras tarsais com ou sem empódio ou arólio entre elas (Figura 2).

Asas, quando presentes, as anteriores pergaminhosas (tégminas), Costa (C) da tégmina, marginal, Sc curta e R com muitos ramos; M e CuA ocupando grande parte da tegmina e CuP curva e curta delimitando um distinto clavo; asa posterior com dobra entre CuP e 1A, separando remígio (anterior, contendo as veias C, Sc, R, M e Cu) e área anal (posterior, contendo as veias Anais), geralmente bem desenvolvida, dobrada ou plissada, quando em repouso (Figura 3).

Abdômen. achatado, com 10 tergitos visíveis, o 11o representado pela placa supra-anal; cercos com um a vários artículos; 1o esternito pequeno ou ausente, o 11o representado pelos paraproctos, cobertos pela placa subgenital ventralmente; a placa subgenital do macho (9o esternito) portando usualmente um par de estilos (Figura 4); a genitália do macho consiste em um grupo de falômeros esclerosados e é coberta pela placa subgenital; na fêmea, a placa subgenital é formada pelo 7o esternito e pode ser única ou estar dividida (Figura 5); o ovipositor é curto e consiste de três pares de valvas dentro da câmara genital.

1 Laboratório de Entomologia, Departamento de Zoologia, Instituto de Biologia, UFRJ. Caixa Postal 68044, Rio de Janeiro, RJ, 21941-971, Brasil.

16

Page 2: Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou

Insetos Aquáticos na Amazônia brasileira: taxonomia, biologia e ecologia 290

Figura 1. Blattodea. Aspecto da cabeça de Periplaneta americana (Blattidae). Ant. antena; Cp. clípeo; Fr. fronte; Lb. labro; Md. mandíbula; Pl. palpo labial; Pm. palpo maxilar; Oc. ocelo.

Figura 2. Blattodea (Blaberidae). Hábito. A. Vista dorsal. B. Vista ventral. Ant. antena; Ca. cabeça; Ce. cerco; Cx II. mesocoxa; Cx III. metacoxa; Fe. metafêmur; Pn. pronoto; Ta. metatarso; Tc. metatrocanter; Tg. tégmina; Ti. metatíbia. Foto de Brunno H.L. Sampaio.

Figura 3. Blattodea (Blaberidae). A. Tégmina. B. Asa posterior. An. área anal; C. Costa; Sc. Subcosta; CuA. Cubital anterior; CuP. Cubital posterior; M. Mediana; R. Radio.

Imaturos: Ninfas semelhantes aos adultos, mas com asas e genitália não desenvolvidas (Figuras 6 e 7).

Mais aspectos da morfologia geral de Blattodea, assim como referências, podem ser encontrados em Costa Lima (1938), Roth (1991) e Grandcolas e Pellens (2013).

As baratas são mais conhecidas popularmente através de seus representantes domésticos e cosmopolitas como Periplaneta autralasiae (Fabricius, 1775), P. americana (Linnaeus, 1758) (Blattidae) e Blattella germanica (Linnaeus, 1758) (Blattellidae) e algumas outras espécies que podem aparecer nas moradias (Rafael et al. 2008). Porém, a grande maioria não tem hábitos sinantrópicos,

ocorrendo em grande variedade de ambientes. A ordem é predominantemente terrestre podendo encontrar-se baratas no solo, sob pedras, entre folhas secas, sobre plantas, em madeira, em ninhos de formigas (mirmecófilas) e em cavernas, mas há algumas espécies relacionadas a ambientes aquáticos, sendo consideradas semiaquáticas.

A maioria das espécies de Blattodea apresenta atividade noturna e possui hábitos onívoros. Os ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou depositados em campo, enterrados ou fixados a algum substrato. A posição da ooteca antes da deposição é usada taxonomicamente. Blatóideos e alguns Blaberóideos carregam a ooteca com a quilha em posição dorsal. No entanto, nos Blaberidae e nos Blattellidae, a fêmea gira a ooteca em 90 graus, ficando a quilha em posição lateral no momento da deposição (espécies ovíparas) ou recolhimento em uma bolsa incubadora (espécies ovovivíparas) (Bell et al. 2007; Grandcolas 1999).

Existem vários exemplos de cuidado parental em baratas (Bell et al. 2007) e, dentre as espécies semiaquáticas, cita-se Phlebonotus pallens (Serville, 1831) (Epilamprinae), uma espécie associada a

Page 3: Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou

Ordem Blattodea 291

riachos em Borneo e no Sul da Índia, cujas fêmeas carregam suas ninfas sob as asas (Pruthi 1933). O desenvolvimento é do tipo paurometabólico e o número de estádios ninfais varia entre as espécies.

A ordem Blattodea tem grande importância no funcionamento do ecossistema, atuando na fragmentação e decomposição da matéria orgânica e na liberação de nutrientes (Bell et al. 2007). Em termos de biomassa, um estudo feito por Basset (2001) mostrou que baratas representam aproximadamente ¼ da biomassa de invertebrados habitantes no dossel de florestas. Com relação à fauna do solo, a participação das baratas é bastante variável (Bell et al. 2007). Contudo, um estudo realizado em floresta de igapó na Amazônia Central mostrou que a espécie mais abundante de Blattodea na serapilheira, Epilampra irmleri Rocha e Silva & Aguiar, 1978, consome 5,6% da produção anual de serapilheira (Irmler e Furch 1979). Algumas espécies são gregárias, das quais o exemplo mais notável é o de Cryptocercus punctulatus Scudder, 1862 (Cryptocercidae), de hábitos xilófagos. Estudos recentes acerca da filogenia de Isoptera e Blattodea, com base em caracteres morfológicos, comportamentais e moleculares incluem os cupins na ordem Blattodea como um grupo de baratas eussociais relacionado aos Cryptocercidae (Klass e Meyer 2006; Inward et al. 2007).

Existem pouco mais de 4600 espécies atuais de baratas (exceto térmitas) em todo o mundo (Beccaloni e Eggleton 2011), sendo quase um terço na região Neotropical. De acordo com a classificação adotada por Pellens e Grandcolas (2008) e Grandcolas e Pellens (2013), 647 espécies ocorrem no Brasil, distribuídas em seis famílias (Blattidae, Polyphagidae, Anaplectidae, Pseudophyllodromiidae, Blaberidae e Blattellidae. Embora as seis famílias citadas tenham algum representante associado a bromélias (Rocha e Silva-Albuquerque e Lopes 1976), somente a família Blaberidae apresenta espécies comprovadamente associadas ao meio aquático. Uma breve caracterização das famílias ocorrentes no Brasil, com base em Grandcolas (1999) e Roth (1991), é apresentada a seguir.

BlattidaeBaratas de tamanho médio, geralmente de

cores escuras (castanho, castanho-escuro). Pernas médias e posteriores com fêmures portando

Figura 4. Blattodea. Terminália maculina. A. Blattidae; B. Blaberidae. Ce. cerco; Es. estilo; Psg. placa sub-genital.

Figura 5. Blattodea. Terminália feminina. A. Blattidae; B. Blaberidae. Ce. cerco; Psg. placa sub-genital.

Figura 6. Blattodea (Blaberidae). A e B. Ninfas semiaquáticas, coletadas em igarapés da Amazônia Central. Foto de Brunno H.L. Sampaio.

Figura 7. Blattodea (Blaberidae). Ninfa semiaquática, coletada em igarapé na Amazônia Central. A. vista dorsal; B. vista ventral. Foto de Brunno H.L. Sampaio.

Page 4: Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou

Insetos Aquáticos na Amazônia brasileira: taxonomia, biologia e ecologia 292

espinhos semelhantes nas faces ântero-ventral e póstero-ventral. Placa subgenital do macho aproximadamente quadrangular, simétrica com estilos longos e finos; Placa subgenital da fêmea bivalvular (Figuras 4A e 5A). Nesta família há espécies bromelícolas dos gêneros Eurycotis Stal, 1874 e Pelmatosilpha Bohrn, 1887, ambos com representantes no Brasil (Rocha e Silva-Albuquerque e Lopes 1976; Pellens e Grancolas 2008).

PolyphagidaeBaratas de tamanho pequeno a médio, com

coloração geralmente castanha ou castanho-amarelada. Clípeo normalmente inchado e dividido em anteclípeo e pós-clípeo. Tégminas com venação reduzida ou formando uma rede. Área anal da asa posterior reduzida e não pregueada quando em repouso. Margens ântero-ventral e póstero-ventral dos fêmures médios e posteriores com ou sem espinhos. Placa subgenital da fêmea, às vezes, bivalvular. Há registro de ocorrência do gênero Buboblatta Hebard, 1920 em bromélias (Rocha e Silva-Albuquerque e Lopes 1976). Há duas espécies nas Américas Central e do Sul.

AnaplectidaeBaratas de tamanho pequeno com contorno do

corpo e das asas geralmente em forma de gota, conferindo um aspecto de besouro. Pronoto com cerdas longas e retas. Asas posteriores dobradas transversalmente. Placa subgenital da fêmea bivalvular. O gênero Anaplecta Burmeister, 1838, de distribuição pantropical, apresenta algumas espécies bromelícolas (Rocha e Silva-Albuquerque e Lopes 1976; Winder 1977).

BlattellidaeBaratas de tamanho pequeno a grande,

(geralmente pequeno), com corpo esguio, cabeça pequena e triangular, pernas e antenas longas. Superfície ventral dos tarsos com espinhos. Asas bem desenvolvidas ou reduzidas; R usualmente bem desenvolvida com ramos anteriores simples e regularmente espaçados; CuA simples ou ramificada; placa subgenital do macho simétrica ou assimétrica e usualmente com dois estilos; placa subgenital da fêmea larga e arredondada. Os blatelídeos são indistinguíveis

dos pseudofilodromiídeos, exceto pelo fato das fêmeas girarem as ootecas (Grandcolas 1999). Nesta família há espécies bromelícolas dos gêneros Ischnoptera Burmeister, 1838, Pseudomops Serville, 1839 e Nesomylacris Rehn & Hebard, 1927 (Rocha e Silva-Albuquerque e Lopes 1976), os dois primeiros com representantes no Brasil (Pellens e Grancolas 2008).

PseudophyllodromiidaeBaratas de tamanho pequeno a médio, sendo

praticamente indistintas dos representantes de Blattellinae, com corpo esguio, pernas e antenas longas, cabeça pequena e triangular. Ao contrário dos Blatteliidae, as fêmeas não giram as ootecas durante sua extrusão. Nesta família há espécies bromelícolas dos gêneros Amazonina Hebard, 1929, Cariblatta Hebard, 1916, Euthlastoblatta Hebard, 1917, Helgaia Rocha e Silva-Albuquerque & Gurney, 1963, Isoldaia Gurney & Roth, 1963, Lophoblatta Hebard, 1929, Neoblattella Shelford, 1911 e Latiblattella Hebard, 1917 (Rocha e Silva-Albuquerque e Lopes 1976), com exceção deste último, todos com representantes no Brasil (Pellens e Grandcolas 2008).

BlaberidaeBaratas de tamanho pequeno a grande, com

grande variedade de formas e cores. Pernas frequentemente curtas, com fêmures e tarsos às vezes sem espinhos. Asas posteriores com cinco ou menos ramos de R e CuA com muitos ramos. Placa subgenital do macho simétrica ou assimétrica, geralmente portando um par de estilos curtos (Figura 4B). Placa subgenital da fêmea larga e arredondada, escavada ou truncada, nunca bivalvular (Figura 5B). Cercos usualmente curtos. Nesta família estão várias espécies associadas a ambientes aquáticos, algumas adaptadas à vida em fitotelmata, na maioria, bromelícolas (Rocha e Silva-Albuquerque e Lopes 1976; Rocha e Silva-Albuquerque et al. 1976) e outras associadas a poças, riachos e rios (Bristowe e Scott 1925; Rocha e Silva-Albuquerque et al. 1976; Nesemann et al. 2010), especialmente ninfas, sendo a maioria pertencente à subfamília Epilamprinae (Figuras 6-9). Porém, dentre as espécies de fitotelmata há poucas informações sobre hábitos aquáticos.

Há registros de espécies bromelícolas dos gêneros neotropicais Hormetica Burmeister, 1838;

Page 5: Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou

Ordem Blattodea 293

Audreia Shelford, 1910; Epilampra Burmeister, 1838; Litopeltis Hebard, 1920; Pinaconota Saussure, 1895; Poeciloderrhis Stål, 1874; Nyctibora Burmeister, 1838 e Dryadoblatta Rehn, 1930. Exceto o último, todos têm representantes no Brasil (Rocha e Silva-Albuquerque e Lopes 1976; Pellens e Grancolas 2008). Também há registros nos gêneros asiáticos Rhicnoda Brunner von Wattenwyl, 1865 e Pycnoscelus Scudder, 1862; cuja espécie P. surinamensis (Linnaeus, 1758) tem distribuição também na América do Sul, incluindo o Brasil (Beccaloni 2007).

Baratas do gênero Epilampra; Poeciloderrhis; Opisthoplatia Brunner von Wattenwyl, 1865; Phlebonotus Saussure, 1832; Rhabdoblatta Kirby, 1903; Stictolampra Hanitsch, 1930 e Rhicnoda ocorrem associadas a riachos, poças e ambientes lacustres, sendo os dois primeiros com registros no Brasil (Roth e Willis 1960; Rocha e Silva-Albuquerque et al. 1976; Bell et al. 2007; Pellens e Grandcolas 2008).

Normalmente, tanto nas espécies de fitotelmata, quanto as ocorrentes em outras coleções de água, as baratas ficam sobre algum substrato na margem ou na superfície da água, submergindo para buscar alimento ou fugir de predadores. A capacidade de nado ou o modo de locomoção na água varia entre as espécies. Algumas podem nadar sob a superfície da água, como as ninfas do gênero Epilampra (Crowell 1946; Wolcott 1950; Roth e Willis 1960), enquanto representantes de outros gêneros, como Opisthoplatia maculata Shiraki, 1906, do Japão,

foram observados caminhando sobre as pedras submersas do leito de riachos (Takahashi 1926 apud Bell et al. 2007).

As espécies consideradas semiaquáticas, aparentemente não apresentam modificações especiais para o meio aquático. Roth e Willis (1960) resumiram observações feitas por vários autores sobre adaptações em algumas espécies, dentre elas a parte posterior do corpo facilmente molhada; longas cerdas na parte ventral do tórax facilitando a retenção de uma bolha de ar; espiráculos terminais no abdômen abrindo-se em tubos estendidos para trás, funcionando como um sifão; cerdas longas na superfície ventral dos cercos com possível "função protetora" para os espiráculos abdominais terminais. As pernas de baratas semiaquáticas são semelhantes às das espécies não aquáticas e não apresentam modificações para natação.

É muito comum encontrarmos ninfas Epilamprinae em bancos de folhas retidos em trechos de correnteza de igarapés. Assim como no ambiente terrestre, como evidenciado no estudo de Irmler e Furch (1979), provavelmente, elas estão entre os principais fragmentadores nas zonas de cabeceira dos igarapés e bancos de folhas marginais em rios e lagos amazônicos, especialmente em áreas de floresta. Há estudos mostrando a associação de baratas semiaquáticas a ambientes preservados, como as do gênero Rhicnoda, na Ásia (Nesemann et al. 2010) e Epilampra, na América Central (Fenoglio et al. 2002), o último apontando o seu potencial como bioindicadores.

Figura 9. Blattodea (Blaberidae). Forma adulta de Epilamprinae coletada às margens de igarapé na Amazônia Central. A. vista dorsal; B. vista ventral. Foto de Brunno H.L. Sampaio.

Figura 8. Blattodea (Blaberidae). A e B. Formas adultas, de duas espécies Epilamprinae, coletadas às margens de igarapés na Amazônia Central. Foto de Brunno H.L. Sampaio.

Page 6: Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou

Insetos Aquáticos na Amazônia brasileira: taxonomia, biologia e ecologia 294

Referências BibliográficasBasset, Y. 2001. Invertebrates in the canopy of

tropical forests. How much do we really know? Plant Ecology, 153: 87-107.

Beccaloni, G.W.; Eggleton, P. 2011. Order Blattodea Brunner von Wattenwyl, 1882. Pp. 199-200 In: Zhang, Z.-Q. (Ed.) Animal biodiversity: An outline of higher-level classification and survey of taxonomic richness. Zootaxa, 3148: 1-237.

Beccaloni, G.W. 2007. Blattodea Species File Online. Version 5.0/5.0. World Wide Web electronic publication. <http://Blattodea.SpeciesFile.org> (acessado em agosto de 2013).

Bell, W.J.; Roth, L.M.; Nalepa, C.A. 2007. Cockroaches. Ecology, Behavior and Natural History. The Johns Hopkins University Press, Baltimore, xvi + 230 p.

Bristowe, W.S.; Scott, H. 1925. XXI. Notes on the Habits of Insects and Spiders in Brazil. Transactions of the Royal Entomological Society of London, 72: 475-504.

Costa Lima, A.M. 1938. Insetos do Brasil. 1o tomo. Escola Nacional de Agronomia. Série didática n. 2. Rio de Janeiro, x + 470 p.

Crowel, H.H. 1946. Notes on an amphibious cockroach from the Republic of Panama. Entomological News, 57: 171-172.

Fenoglio, S.; Badino, G.; Bona, F. 2002. Benthic macroinvertebrate communities as indicators of river environment quality: an experience in Nicaragua. Revista de Biologia Tropical; 50: 1-6.

Grandcolas, P. 1999. The origin of diversity in cockroaches: a phylogenetic perspective of sociality, reproduction, communication and ecology. Evolucion y Filogenia de Arthropoda. Boletim de la Sociedad Entomólogica Aragonesa, 26: 397-420.

Grandcolas, P.; Pellens, R. 2013. Blattaria. pp. 333-346 In: Rafael, J.A,; Melo, G.A.R.; Carvalho, C.J.B. de; Casari, S.A.; Constantino, R. (eds). Insetos do Brasil. Diversidade e Taxonomia. Holos Editora Ltda, Ribeirão Preto.

Inward, D.; Beccaloni, G.; Eggleton, P. 2007. Death of an order: a comprehensive molecular phylogenetic study confirms that térmites are eusocial cockroaches. Biology Letters, 3: 331-335.

Irmler, U.; Furch, K. 1979. Production, energy and nutrient turnover of the cockroach Epilampra irmleri Rocha e Silva & Aguiar in a Central Amazonian Inundation Forest. Amazoniana, 6: 497-520.

Klass, K-D.; Meyer, R. 2006. A phylogenetic analysis of Dictyoptera (Insecta) based on morphological characters. Entomologische Abhandlungen, 63:3-50.

Nesemann, H.; Shah, R.D.T.; Shah, D.N.; Sharma, S. 2010. First records of Rhicnoda natatrix and Rhicnoda rugosa (Blattodea: Blaberidae) from Nepal and India (Maharashtra) with notes on habitat quality. Journal of Threatened Taxa, 2: 648-652.

Pellens, R.; Grandcolas, P. 2008. Catalogue of Blattaria (Insecta) from Brazil. Zootaxa, 1709: 1-109.

Pruthi, H.S. 1933. An interesting case of maternal care in an aquatic cockroach, Phlebonotus pallens Serv. (Epilamprinae). Current Science, 1: 273.

Rafael, J.A.; Silva, N.M.; Dias, R.M.N.S. 2008. Baratas (Insecta, Blattaria) sinantrópicas na cidade de Manaus, Amazonas, Brasil. Acta Amazônica, 38: 173-178.

Rocha e Silva-Albuquerque, I.; Lopes, S.M.R. 1976. Blattaria de bromélia (Dictyoptera). Revista Brasileira de Biologia, 36: 837-901.

Rocha e Silva-Albuquerque, I.; Tibana, R.; Jurberg, J.; Rebordões, A. M. P., 1976: Contribution to the knowledge of the ecology of Poeciloderrhis cribrosa and Poeciloderrhis verticalis with a study of external genitalia (Dictyoptera: Blattariae). Revista Brasileira de Biologia, 36: 239-250

Rocha e SilvaAlbuquerque, I.; Aguiar, G. M. 1977. Blattariae da Amazônia. Família Blaberidae da localidade Sinop, estado de Mato Grosso, Brasil (Dyctioptera). Boletim do Museu Paraense Emilio Goeldi (Série Zoologia), 88: 1-30.

Roth, L.M. 1991. Blattodea. pp. 320-329 In: Naumann, I.D. et al. (eds.), The Insects of Australia, 2nd Ed., Victoria, Cornell University Press.

Roth, L.M.; Willis, E.R. 1960. The biotic associations of cockroaches. Smithsonian Miscellaneous Collections, 141: 1-470.

Page 7: Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou

Ordem Blattodea 295

Winder, J. A. 1977. Some organic substrates which serve as insect breeding sites in Bahian cocoa plantations. Revista Brasileira de Biologia, 37: 351-356.

Wolcott, G.N. 1950. The insects of Puerto Rico. Journal of Agricultural University of Puerto Rico (1948), 32: 1-224.

Page 8: Ordem Blattodea - bioforum.files.wordpress.com · ovos são acondicionados em uma ooteca, que pode ser carregada interna (espécies vivíparas ou ovovivíparas) ou externamente, ou