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Resultados da Pesquisa Página 19 ordem jurídica: KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 228. 21 Em brevíssimo escorço, Carlos Henrique Abrão expõe a gênese histórica do instituto, cf. ABRÃO, Carlos Henrique. Do protesto. São Paulo: LEUD, 1999. p. 15-16. Pontes de Miranda também realiza análise histórica: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito cambiário. Campinas: Bookseller, 2001. vol. I. 22 COUTO E SILVA, Clóvis V. do. A obrigação como processo. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2006. p. 142-144. 23 Idem, p. 136. 24 Sobre as diversas competências dos Tabelionatos, vale conferir o seguinte texto: PELLEGRINI, Alexandre Rezende. Algumas linhas sobre a atividade notarial.RDI 54/155 (DTR\2003\62) e ss. São Paulo: Ed. RT, 2003. 25 O credor possui diversos meios para perseguir o seu crédito, não sendo obrigado a utilizar todos, tampouco escolher apenas um. Pode o credor optar pelos meios executórios que melhor lhe convierem, em virtude da regra da disponibilidade da execução, reproduzida no art. 775 do CPC (LGL\1973\5)/2015. Sobre a disponibilidade da execução: ZAVASCKI, Teori Albino. Comentários ao Código de Processo Civil (LGL\1973\5). 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2003. vol. 8. p. 75-86.

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ordem jurídica: KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 228. 21 Em brevíssimo escorço, Carlos Henrique Abrão expõe a gênese histórica do instituto, cf. ABRÃO, Carlos Henrique. Do protesto. São Paulo: LEUD, 1999. p. 15-16. Pontes de Miranda também realiza análise histórica: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito cambiário. Campinas: Bookseller, 2001. vol. I. 22 COUTO E SILVA, Clóvis V. do. A obrigação como processo. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2006. p. 142-144. 23 Idem, p. 136. 24 Sobre as diversas competências dos Tabelionatos, vale conferir o seguinte texto: PELLEGRINI, Alexandre Rezende. Algumas linhas sobre a atividade notarial.RDI 54/155 (DTR\2003\62) e ss. São Paulo: Ed. RT, 2003. 25 O credor possui diversos meios para perseguir o seu crédito, não sendo obrigado a utilizar todos, tampouco escolher apenas um. Pode o credor optar pelos meios executórios que melhor lhe convierem, em virtude da regra da disponibilidade da execução, reproduzida no art. 775 do CPC (LGL\1973\5)/2015. Sobre a disponibilidade da execução: ZAVASCKI, Teori Albino. Comentários ao Código de Processo Civil (LGL\1973\5). 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2003. vol. 8. p. 75-86.

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O REGIME JURÍDICO DOS PRECEDENTES JUDICIAIS NO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Revista de Processo | vol. 237/2014 | p. 369 - 401 | Nov / 2014

DTR\2014\17948 ___________________________________________________________________________ Lucas Buril De Macêdo Mestre em Direito pela Faculdade de Direito do Recife - UFPE. Membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo. Advogado. Área do Direito: Processual Resumo: Com o Projeto do novo Código de Processo Civil (NCPC) em vias de aprovação, há a expectativa de uma regulação específica dos precedentes judiciais, o que será realizado pela primeira vez na história do direito brasileiro. Para que o regime dos precedentes não gere confusão ou para que não seja mal aplicado, é essencial o estudo da teoria dos precedentes, responsável pela construção das bases para a compreensão e aplicação adequada dos precedentes. O presente trabalho analisa, sob essa perspectiva, o tratamento dado aos precedentes pelo NCPC, buscando determinar o seu conteúdo normativo e avaliar as modificações projetadas. Palavras-chave: Precedentes judiciais - Stare decisis - Projeto do novo Código de Processo Civil. Abstract: With the Project of new Civil Procedure Code (NCPC) about to be approved, there is the expectative of a specific regulation of judicial precedents, for the first time in the Brazilian law history. For the system of precedent does not create confusion or not be misapplied, is essential the study of the theory of precedents, responsible for building the foundation for understanding and proper application of the precedents. The present work analyses, under this perspective, the treatment given to the precedents by the NCPC, trying to determinate its normative content and evaluate the projected modifications. Keywords: Judicial precedents - Stare decisis - Project of new Brazilian Civil Procedure Code. Sumário: - 1.Introdução - 2.Sucintas noções acerca da teoria dos precedentes obrigatórios - 3.Aspectos gerais do Projeto do Novo Código de Processo Civil e a proteção da segurança jurídica nas decisões judiciais - 4.A regulação específica dos precedentes judiciais no NCPC - 5.Considerações finais e conclusões

Recebido em: 03.03.2014

Aprovado em: 12.08.2014

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1. Introdução

O Projeto do Novo Código de Processo Civil tem o mérito de constituir legislação atinada com o atual estágio constitucional, consagrando expressamente os ditames do Estado Constitucional, especialmente mediante o recurso aos princípios consagrados na Constituição Federal de 1988. Muito embora a força da Constituição se imponha independentemente da existência de previsão expressa, não deixa de possuir um valor simbólico louvável a encampação dos importantes valores constitucionais, notadamente no Livro I (“Das normas processuais civis”) da Parte Geral do Código, que, nessas disposições e ao longo de seu texto, preza pela concretização dos princípios da segurança jurídica, igualdade e dignidade da pessoa humana.1

Nesse quadrante, as técnicas previstas no NCPC voltam-se, a maioria delas, para a proteção desses princípios mediante a utilização de institutos ligados à padronização decisória, especialmente com o reforço do precedente judicial. Os precedentes passam a ser um volante que direciona a atividade processual, em uma perspectiva do todo, com o claro intuito de fornecer maior racionalidade à atividade jurisdicional.2

Em outras palavras: a procedimentalização da demanda liga-se diretamente à existência de precedente judicial prévio (perspectiva histórica) ou à necessidade de prolação de um novo precedente que regule a questão posta e outras afins (perspectiva prospectiva).3

O que se impõe notar, nesse contexto, é que o direito brasileiro, muito embora possua uma afinidade histórica com institutos do direito norte-americano, não possui qualquer teorização, muito menos algo sólido, acerca do stare decisis. Para o bom funcionamento dos precedentes obrigatórios, é essencial que se tenha com claridade os conceitos e técnicas deles imanentes, caso contrário, arrisca-se criar uma prática confusa e pouco útil, além de, em alguns sentidos, perigosa. Com efeito, não basta a institucionalização dos precedentes judiciais obrigatórios, é essencial uma teoria dos precedentes bem construída.4

Parece, portanto, que esse é o momento de construir a teoria do stare decisis brasileira. Cabe à doutrina e à jurisprudência modelar o substrato indispensável para o bom funcionamento dos precedentes obrigatórios.

Nesse contexto, o presente trabalho busca fornecer algumas ideias basilares, inicialmente, e, em seguida, parte para a análise das regras que cuidam especificamente dos precedentes judiciais no NCPC, fornecendo uma primeira proposta de interpretação adequada e demonstrando a magnitude que o tema assume para a sistemática processual projetada.

2. Sucintas noções acerca da teoria dos precedentes obrigatórios

Como é evidente, o presente trabalho, por seus limites, não pode fornecer uma teoria geral dos precedentes judiciais, tarefa de alta complexidade e de extensão incompatível. Todavia, é importante que algumas linhas gerais sejam traçadas, pois são imprescindíveis

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para a boa compreensão do tema, evitando-se erros dialogais, especialmente quanto aos pontos principais aqui abordados.

Primeiramente, deve-se ressaltar que se perspectiva o precedente judicial como fonte de direito:5 isto é, toma-se a decisão como ato jurídico que tem por eficácia (anexa)6 lançar-se como texto do qual se construirá uma norma.7 Essa norma, na teoria dos precedentes, é comumente designada de ratio decidendi.8 Esse é o sentido próprio em que se invoca a palavra precedente, embora seja possível falar em precedente como norma, em um sentido impróprio e por metonímia, assim como se fala em “aplicação da lei”, quando, na verdade, quer-se falar em “aplicação da norma da lei”.

Sobre o ponto, é costumeiro afirmar que a única “parte” do precedente que é formalmente vinculante é a ratio decidendi ou holding.9

O ponto deve ser analisado com a devida cautela.

É importante perceber que a ratio decidendi transcende ao precedente do qual é compreendida, ou seja, embora a ratio tenha o precedente como referencial ad eternum, seu significado não está adstrito ao que o juiz lhe deu ou quis dar.10 Não há como se defender que a interpretação do precedente judicial que dá vazão à sua norma deve ser feita de forma canônica ou literal, muito embora possa ser corretamente realizada dessa forma em alguns casos.11 Com efeito, deve-se perceber que a norma do precedente é diferente do texto do precedente, sendo equivocado reduzi-la à fundamentação ou qualquer combinação de elementos da decisão do qual advém – da mesma forma que não se deve reduzir a norma legal ao texto da lei.12

Diante dessa perspectiva, a compreensão dos demais conceitos, institutos e técnicas ligados aos precedentes judiciais toma uma coloração própria. Percebe-se que a maioria dos problemas ligados aos precedentes judiciais, como o da diferenciação (distinguishing) ou da superação (overruling), são problemas ligados à interpretação e à argumentação. Não se pode, portanto, querer estabelecer uma certeza absoluta a priori ligada à aplicação dos precedentes judiciais que, assim como a lei – mas com notáveis diferenças –, é texto que, interpretado, dá vazão a um significado (norma).

Frise-se: só a partir desse prisma é possível uma construção da teoria dos precedentes séria, capaz de fornecer boas respostas, em vez de frustração ou autoritarismo, ou mesmo de um retrocesso, com um retorno incabível à exegese ou ao metodologismo.13

Note-se, por outro lado, que os precedentes judiciais são importantíssimos para garantir racionalidade ao direito, especialmente na sua atual dimensão.14 Com acréscimos significativos na criatividade do aplicador, notadamente pelo desenvolvimento dos princípios como normas, é essencial que se desenvolva uma forma de contenção ou de fechamento desse processo criativo: os precedentes obrigatórios.15

Isso mesmo: os precedentes são uma forma de garantir limites à atividade criativa dos juízes, e não de reforçar a criatividade ou de dar mais poderes aos magistrados.16 Aliás, ao se negligenciar a própria criatividade, acaba-se por dar margem mais ampla de criação, o que acaba por ensejar uma produção irresponsável de direito jurisprudencial.17

Ao se estabelecer o respeito aos precedentes, de fato, assume-se como premissa o fato de

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que os juízes podem criar normas jurídicas;18 todavia, são estabelecidas normas que regulam essa criação, impondo limites e garantindo racionalidade a esse processo criativo. De fato, ninguém duvida, hoje, que o STF ou o STJ criam Direito19 – basta visitar alguns julgamentos notórios para perceber –, entretanto, não se pode permitir que essa criação seja feita de forma desordenada e ilimitada, possibilitando-se, por exemplo, a construção de normas jurídicas de forma diferenciada no espaço ou desordenada no tempo. O respeito aos precedentes judiciais é forma relevantíssima de garantir segurança jurídica, igualdade e eficiência jurisdicional.20

Mais uma noção básica deve ser fornecida: o descumprimento da norma do precedente (ratio decidendi) não é diferente do descumprimento da norma legal. Perceba-se que, muito embora o conjunto das fontes do direito seja integrado por elementos de qualidade diversa (Constituição, leis, precedentes, costumes etc.), o conjunto das normas é sistemático e precisa ser, tanto quanto possível, racional e coerente. Ora, se norma é significado, é notável que estes, independentemente das qualidades dos textos, não podem ser logicamente incompatíveis – enfim, afirmar que o direito é mais do que lógica não equivale a dizer que ele é ilógico.

Nessa toada, a previsão de instrumentos específicos para a aplicação de precedentes judiciais, por qualquer motivo, é algo que não se deve tolerar. Os precedentes judiciais precisam ser interpretados e aplicados normalmente, e a colaboração criativa, com a outorga de sentido, deve ser feita na forma comumente estabelecida pelo sistema jurídico, não se admitindo qualquer forma autoritária de dar a um único órgão o poder de dar sentido a qualquer texto, reestabelecendo-se os ditames da exegese.21

Os precedentes judiciais precisam ser compreendidos adequadamente como uma fonte do

direito, que dá espaço para uma ou mais normas (rationes decidendi), e não como instrumentos de outorga de poder criativo aos juízes – que o possuem independentemente do stare decisis –, mas de fixação de limites e técnicas para seu exercício, garantindo racionalidade. Nesse quadro, eles não podem ser aplicados mediante instrumentos específicos ou centralizadores, que busquem mortificar a interpretação por outros órgãos, o que seria medida vulneradora do Estado Democrático de Direito e do contraditório, seu corolário processual.

Finalmente, cabem algumas palavras sobre uma das mais importantes características do

stare decisis: a autorreferência.22

Autorreferência é um dever de fundamentação específico, pelo qual o magistrado precisa, necessariamente, referir-se ao que foi realizado anteriormente pelos seus pares para decidir adequadamente uma questão similar. Isto é, o Judiciário, ao julgar um caso que já foi por ele mesmo decidido, precisa referir-se à sua atuação, independentemente de sua decisão confluir ou se desviar da linha assumida anteriormente. Essa é uma característica essencial para o bom funcionamento do stare decisis e é capaz de garantir racionalidade e segurança.

Note-se que a autorreferência não impõe o dever de seguir precedentes – isso cabe ao próprio princípio do stare decisis –, mas se trata de regra jurídica que determina a adequação da fundamentação aos precedentes pertinentes ao caso. Precisamente, a partir da autorreferência, o julgador subsequente precisa voltar-se para o que foi decidido

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anteriormente, seja essa decisão favorável ao seu entendimento, possibilitando uma fundamentação que se limite a demonstrar a identidade dos casos, ou contrária, caso no qual será indispensável evidenciar diferenças relevantes ou trazer fundamentos importantes para não se aplicar o precedente judicial.23

Realmente, o magistrado, ao solucionar um caso, precisa necessariamente fundamentar

fazendo referência aos precedentes que tratem de questões análogas às analisadas. O fato de os precedentes serem enunciados na fundamentação das decisões e servirem como vetores argumentativos para a tomada de decisão é uma das principais razões para sua força vinculante.24 Isso não quer dizer que os precedentes judiciais precisarão ser mantidos em todas as hipóteses, mas que “não é aceitável que o juiz decida desconsiderando as normas dos precedentes e, se decidir contrariamente a elas, deve, ao menos, justificar adequadamente porque o fez”.25

3. Aspectos gerais do Projeto do Novo Código de Processo Civil e a proteção da segurança jurídica nas decisões judiciais

O Projeto do Novo Código de Processo Civil tem o mérito de constituir legislação atinada com o atual estágio constitucional, consagrando expressamente os ditames, especialmente mediante o recurso aos princípios, do Estado Constitucional. Muito embora a força da Constituição se imponha independentemente da existência de previsão expressa, não deixa de possuir um valor simbólico louvável a encampação dos importantes valores constitucionais, notadamente no Livro I (“Das normas processuais civis”) da Parte Geral do Código, que nessas disposições, e ao longo de seu texto, preza pela concretização dos princípios da segurança jurídica, igualdade e dignidade da pessoa humana.26

No quadro em que se insere o NCPC, o Senado Federal publicou, por meio da comissão de juristas formada para confeccionar o Projeto do Código, a exposição de motivos. Nesse espaço, consagrou-se expressamente:27

“Com evidente redução da complexidade inerente ao processo de criação de um novo Código de Processo Civil, poder-se-ia dizer que os trabalhos da Comissão se orientaram precipuamente por cinco objetivos: 1) estabelecer expressa e implicitamente verdadeira sintonia fina com a Constituição Federal; 2) criar condições para que o juiz possa proferir decisão de forma mais rente à realidade fática subjacente à causa; 3) simplificar, resolvendo problemas e reduzindo a complexidade de subsistemas, como, por exemplo, o recursal; 4) dar todo o rendimento possível a cada processo em si mesmo considerado; e, 5) finalmente, sendo talvez este último objetivo parcialmente alcançado pela realização daqueles mencionados antes, imprimir maior grau de organicidade ao sistema, dando-lhe, assim, mais coesão”.

Muito embora não se tenha alçado a segurança jurídica nos atos jurisdicionais a um dos principais objetivos do Projeto do novo Código de Processo Civil, a exposição de motivos acabou por dedicar muitas linhas a enfatizar a preocupação dos juristas idealizadores da nova lei com a tutela da segurança jurídica e com a uniformidade da jurisprudência. De fato, a preocupação enunciada com os precedentes judiciais permeia e fundamenta o NCPC.

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Consoante se consigna na exposição de motivos, não se pode tolerar diversos posicionamentos jurisdicionais acerca de uma mesma situação jurídica substancial, em detrimento dos jurisdicionados, seja em relação aos que estão em situações idênticas e recebem um tratamento menos favorável ou àqueles que planejaram suas atuações com fundamento na orientação dada pelos tribunais. Conforme se observou, a insegurança nas decisões judiciais “gera intranquilidade e, por vezes, verdadeira perplexidade na sociedade”.28

Nessa linha, na versão confeccionada pelo Senado, já no texto do Anteprojeto do novo Código de Processo Civil, estabelecia-se que “A jurisprudência do STF e dos Tribunais Superiores deve nortear as decisões de todos os Tribunais e Juízos singulares do país, de modo a concretizar plenamente os princípios da legalidade e da isonomia”. A disposição foi elaborada em claro prestígio da função nomofilácica e paradigmática desses tribunais e servia para fornecer, ainda que inadequadamente, a base legal para a construção de uma teoria brasileira dos precedentes.

Diversos outros dispositivos do Anteprojeto enaltecem o valor dos precedentes judiciais, preocupando-se, por exemplo, com a mudança de orientação dos tribunais e estabelecendo expressamente a possibilidade de modulação. De uma análise dos motivos expostos e dos dispositivos do NCPC, fica patente a aposta nos precedentes judiciais como forma de racionalizar o direito e tutelar a contento o princípio da segurança jurídica.29

4. A regulação específica dos precedentes judiciais no NCPC

De forma extremamente significativa, o Projeto do novo Código de Processo Civil inaugura regulação específica destinada ao precedente judicial, que não é realizada no CPC vigente, de 1973, e nem o fora no Código de Processo de 1939. Trata-se de previsão que demonstra a atualidade do tema e o atino da comunidade jurídica para a necessidade de disciplinar adequadamente o resultado da prestação jurisdicional, outorgando-lhe a devida eficácia como ato relevante para a construção do direito.

Na forma como aprovado na Câmara, o NCPC prevê um capítulo específico, o XV, nomeado “Do precedente judicial”, no Título I, “Do procedimento comum”, do Livro I, “Do processo de conhecimento e do cumprimento de sentença”, da Parte Especial.

Primeiramente, cumpre notar que o locus que se designou para a regulação do precedente não foi o mais adequado.

Com efeito, importantes precedentes podem muito bem ser fixados por decisões tomadas no cumprimento de sentença ou nos procedimentos especiais. Isso torna a previsão de sua tratativa no título destinado ao procedimento comum equivocada, por ser redutora. Precedentes judiciais podem surgir em decisões relativas a qualquer procedimento. Na verdade, a procedimentalização do direito material é pouco importante para a existência

de precedente judicial, que é efeito anexo da decisão judicial: portanto, ocorrendo decisão, há precedente.30 Sua destinação correta seria, sem dúvidas, a Parte Geral.

Nada obstante, a parcela do Código em que colocada a regulação dos precedentes não significa uma barreira instransponível, pelo contrário: trata de um pequeno problema

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facilmente contornável. Assim como no CPC vigente aplicou-se comumente disposições sobre o procedimento comum aos demais, o mesmo há de ser feito quanto aos precedentes no NCPC. De fato, nada obstante os precedentes judiciais tenham sido tratados em título destinado ao procedimento comum, as normas relativas a esses dispositivos possuem aplicação para as decisões tomadas em qualquer que seja o procedimento.31

O tratamento do precedente judicial no Projeto do novo Código de Processo Civil é realizado em três dispositivos, nos arts. 520, 521 e 522.

O art. 520 determina que “Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”. Estabelece-se, assim, um dever geral de tutelar a segurança

jurídica nas decisões judiciais, marcadamente nos posicionamentos dos tribunais.

O dispositivo aponta, primordialmente, para a inadmissibilidade de qualquer tribunal sustentar mais de uma orientação simultaneamente. Obviamente, não se afasta a possibilidade de diferença temporal entre as rationes decidendi assumidas, desde que com o devido cuidado, mas não é possível tolerar que o mesmo tribunal, ou mesmo que tribunais distintos, venham a sustentar, ao mesmo tempo, posições distintas. O tribunal, ainda que dividido em vários órgãos, é um só, e precisa atuar em conformidade com sua unidade, assumindo uma única posição acerca da mesma questão jurídica. Além disso, o tribunal precisa estar atento para uma eventual manifestação de dissidência interna, tomando a responsabilidade de uniformizar a sua orientação, mediante um precedente adequado para isso. Nesse sentido, estabelece-se o dever de uniformizar.32

Da mesma forma, os tribunais precisam justificar adequadamente a mudança. É igualmente afrontoso à segurança jurídica a excessiva variação de orientações assumidas pelos precedentes, ainda que em espaço temporal diferido. A fixação da ratio decidendi

precisa ser respeitada pelo próprio tribunal, evitando a superação do precedente de forma leviana ou incauta. De fato, é preciso perspectivar que, mesmo ao julgar uma demanda individual, o tribunal está orientando a sociedade, e tanto os particulares que participam do processo como a comunidade de forma geral possuem o direito fundamental à segurança. Dessa forma, o dever de estabilidade, consagrado no dispositivo em comento, exige que se pese a força da segurança quando o tribunal cogite desviar de posicionamento assumido em um precedente.33

A enunciação de precedentes pelos juízes segue uma mesma linha, que, ainda que não se possa compreender como retilínea, deve ser, efetivamente, uma só linha. Com isso se quer dizer que os órgãos judicantes não podem assumir posicionamentos inconsistentes e conflitivos, devendo manter sua jurisprudência racional, mediante precedentes que, em um primeiro aspecto, dialoguem com o que foi construído anteriormente, respeitando o dever de autorreferência, e, em um segundo sentido, é exigido que as decisões, na continuidade ou na alteração, sejam proferidas sem inconsistências injustificadas entre elas. Impõe-se a integridade das decisões e dos precedentes.34 Em outras palavras, o Judiciário precisa estar alinhado em sua atuação sob duas perspectivas: geograficamente, não se autorizando que a mesma situação jurídica seja tratada de forma injustificadamente diferente por órgãos de locais díspares; e historicamente, precisando respeitar sua atuação anterior ou justificar a modificação da posição que foi adotada com referência e cuidado com o passado e suas consequências.35 Pode-se falar, portanto, em um dever de

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integridade.

Outrossim, o Judiciário, em comando direcionado especialmente aos tribunais, deve ser

compreendido como um só, e, consequentemente, as orientações que são oferecidas aos jurisdicionados, especialmente pelos precedentes judiciais, não podem ser observadas de forma particularizada ou destacada dessa realidade.36 Por isso mesmo, os tribunais precisam considerar o que foi por eles dito anteriormente, e justificar qualquer dissenso, tanto interno, em relação ao órgão prolator do precedente contrário, como também

externo, quando o precedente advir de outro órgão judicante. Requer-se, também por esse prisma, o dever de autorreferência como dever de fundamentação específico. Em síntese: o que é enunciado nos precedentes precisa ser compreendido como um discurso do Judiciário para a sociedade, que precisa ser coerente, ainda que não siga uma só linha, é essencial que os desvios particulares ou mudanças sejam substancialmente justificadas, evitando uma verdadeira esquizofrenia do Judiciário. O precedente judicial insere-se em um contexto mais amplo em que visa garantir coerência e consistência da atuação dos juízes.37

Consagra-se o dever de coerência.

O art. 520 do NCPC é, certamente, o dispositivo mais importante sobre a teoria dos precedentes judiciais, fornecendo material suficiente para a construção do stare decisis

brasileiro. Com efeito, a partir da institucionalização dos deveres de uniformização,

estabilidade, integridade e coerência, torna-se pouco crível o funcionamento do sistema

jurídico sem o stare decisis. Os deveres consagrados no Projeto do novo Código de Processo Civil possuem conteúdo normativo suficiente para a criação institucional dos precedentes obrigatórios.

Peca, entretanto, o dispositivo, em seu § 1.º. O § 1.º do art. 520 do NCPC estabelece que os tribunais, consoante seus regimentos internos, “devem editar enunciados correspondentes à súmula da jurisprudência dominante”.

É necessário que as súmulas sejam vistas com a devida atenção.

Precisamente, súmulas não são precedentes judiciais.38–39 Para a criação de um enunciado sumular é estabelecido um procedimento específico e distinto do processo judicial, que enseja o precedente judicial.40 Bem vistas as coisas, o precedente é elemento da hipótese

fática da norma que permite a edição da súmula. E só isso. Não é possível confundir os dois institutos, inclusive porque a necessidade de instituir súmulas ou súmulas vinculantes parte do pressuposto da ausência de força do precedente, isoladamente e em sua unidade. Há de se perceber: caso o stare decisis brasileiro estivesse institucionalizado, a importância das súmulas seria reduzida a nada.41

No ponto, é relevante destacar que o enunciado sumular, autorizado pela existência de precedentes, passa a deter vinculatividade própria. Inclusive, em interessante pesquisa, Leonardo Greco demonstrou que os enunciados 622, 625 e 626 da súmula da jurisprudência dominante do STF não guardam correspondência, como era de se esperar, com os acórdãos paradigmas.42 Seguindo essa linha, Patrícia Perrone Mello analisou as Súmulas Vinculantes 1, 2 e 3, e, embora as duas primeiras guardem congruência com as decisões de base, na terceira, três dos quatro precedentes invocados para a autorização da

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edição do enunciado tratavam da matéria objeto apenas como obiter dictum. A jurista carioca, nesse contexto, aponta uma autonomia excessiva entre os enunciados sumulares e a ratio decidendi dos julgados e a inexistência de preocupação com a distinção entre ratio

decidendi e obiter dictum, concluindo pela necessidade de melhorar a operacionalização com as súmulas.43

Desse modo, muito embora o caput do art. 520 forneça todas as ferramentas necessárias para a construção do stare decisis brasileiro, estabelecendo importantes deveres para o Judiciário, o seu § 1.º consegue fincar uma barreira de difícil transposição para que se alcance um sistema de precedentes obrigatórios. Ao se investir nas súmulas como método de estabilização da jurisprudência, reduz-se a importância que, a princípio, viria a ser atribuída ao precedente judicial.

Noutra mão, o § 2.º do art. 520 fixa que “É vedado ao tribunal editar enunciado de súmula que não se atenha às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua preocupação”.

Muito embora o § 2.º acabe por reduzir os problemas causados pelo primeiro parágrafo do dispositivo, ele não é suficiente. O seu propósito é evitar que os enunciados sumulares se distanciem da ratio decidendi dos precedentes que lhe fundamentam, mas, ao contrário de negar a diferença entre precedente e súmula, serve para afirmá-la: os textos mantêm sua autonomia e os precedentes perdem a dignidade de referencial normativo.

A súmula vinculante, observada em sua regulação e funcionalização, possui uma faceta claramente autoritária. O instituto é realizado para impedir a atuação do direito pelos demais órgãos jurisdicionais, idealizando-os como meros porta-vozes do STF, o que não acontece no stare decisis.44

De fato, a súmula vinculante enrijece o direito exacerbadamente. Perceba-se que se busca impedir atividade interpretativa e criativa pelos demais órgãos jurisdicionais.45 Inclusive, o cabimento de reclamação constitucional, diretamente para o STF, conota essa pretensão. A ideia é que a súmula vinculante é o ponto final do direito e que não cabe a ninguém – sejam os jurisdicionados, outros profissionais da área jurídica ou os demais órgãos jurisdicionais – construir a questão, pois é competência do Supremo estabelecê-la e definir o seu significado definitivo. Exclui-se a participação mais aberta mediante um procedimento centralizador da interpretação do texto da súmula.46 Entabular toda a riqueza do precedente, diferenciado da lei justamente por sua conexão mais forte com os fatos da causa, em um enunciado abstrato é impossível, e acaba, além disso, por dificultar diferenciações ou uma construção ou reconstrução que efetive um real diálogo com a experiência.47

Com as súmulas busca-se excluir discordâncias e, assim, exclui-se a própria possibilidade de construção dialógica, envolvendo o máximo número de processos – e, consequentemente, de jurisdicionados, advogados e demais atores jurídicos e sociais –, e paulatina, o que permite que a decisão absorva o maior número possível de argumentos. Opta-se por eliminar a natural formação dinâmica do precedente e a flexibilidade ínsita à sua aplicação.48 Com efeito, as súmulas, especialmente as vinculantes, são muito similares à legislação, o que se torna notável com a existência de um procedimento próprio para sua enunciação, modificação e alteração.49

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A súmula vinculante, embora tenha sido importante para apontar para a criatividade judicial, reforçando a sua percepção como uma realidade inolvidável, está longe de representar um instituto característico de um sistema de precedentes.50 Realmente, as súmulas vinculantes não são condizentes com o stare decisis. Com a fortificação deste, é natural que elas percam sua força e sejam pouco utilizadas, abrindo caminho para uma prática pautada na importância de uma única decisão e mais aberta à interpretação e à construção colaborativa e paulatina.

Assim, é natural que a caminhada em direção à fortificação dos precedentes obrigatórios no Brasil passe pelo esquecimento e supressão das súmulas, vinculantes ou não, instituto que só tem razão de ser em um sistema que desconsidera o precedente judicial.

Passa-se à análise paulatina do art. 521, caput e seus incisos, do Projeto do novo Código de Processo Civil, para analisar seus parágrafos depois. O dispositivo, in verbis, determina que:

“Art. 521. Para dar efetividade ao disposto no art. 520 e aos princípios da legalidade, da segurança jurídica, da duração razoável do processo, da proteção da confiança e da isonomia, as disposições seguintes devem ser observadas:

I – os juízes e tribunais seguirão as decisões e os precedentes do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

II – os juízes e os tribunais seguirão os enunciados de súmula vinculante, os acórdãos e os precedentes em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

III – os juízes e tribunais seguirão os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional, do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional e dos tribunais aos quais estiverem vinculados, nesta ordem;

IV – não sendo a hipótese de aplicação dos incisos I a III, os juízes e tribunais seguirão os precedentes:

a) do plenário do Supremo Tribunal Federal, em controle difuso de constitucionalidade;

b) da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em matéria infraconstitucional”.

Primeiramente, é imperioso que se compreenda a relação do dispositivo com o anterior corretamente. O art. 520 estabelece os deveres gerais de uniformização, estabilidade, integridade e coerência, que são expressões da segurança jurídica, particularmente a segurança nos atos jurisdicionais. O art. 521 regula a forma de cumprimento específico do

dispositivo. Assim, são estabelecidos os meios pelos quais os deveres decorrentes da segurança jurídica na atuação judicial são cumpridos no processo brasileiro.

Todavia, não se pode enxergar essas formas como exaurientes. Sem dúvida, caso elas sejam suficientes, não é preciso recorrer a outras formas de cumprimento dos deveres estabelecidos. Por outro lado, caso se tenha alguma situação em que os deveres de uniformização, estabilidade, integridade e coerência sejam vulnerados, ou parte ou mesmo apenas um deles, é indispensável que se recorra ao art. 520 para a solução. Em síntese: os deveres gerais de segurança, que são concretizações do princípio constitucional da

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segurança jurídica, não podem ser desatendidos, mesmo que alguma situação não encontre guarida na sua regulação específica, realizada no art. 521 do NCPC. Caso ocorra vulneração à segurança jurídica, o princípio deve ser concretizado e protegido, exista ou não previsão específica.

Esclarecido esse ponto inicial, deve-se reconhecer que o avanço realizado no NCPC acerca dos precedentes judiciais foi substancial.

É notável que o Projeto do novo Código cria uma hierarquia entre institutos e precedentes. É dizer, ao se decidir uma questão, deve-se inicialmente procurar por precedente do STF em controle concentrado de constitucionalidade, em seguida, para enunciados da súmula vinculante, e, depois, os precedentes gerados por incidente de assunção de competência ou resolução de demandas repetitivas ou recursos extraordinário ou especial repetitivos. Não existindo nenhum destes, segue-se os enunciados da súmula do STF em matéria constitucional e do STJ em matéria infraconstitucional, e do respectivo tribunal intermediário, respeitando-se essa sequência. Finalmente, não existindo regulação em qualquer destes, o dispositivo determina o respeito aos precedentes do plenário do STF em controle difuso de constitucionalidade e da Corte Especial do STJ em matéria infraconstitucional.

Tirante a crítica às súmulas, fez bem o NCPC em expressamente eleger a hierarquia dos tribunais como critério para a seleção do precedente aplicável.

Ademais, importa notar que se procurou estabelecer, tanto quanto possível, a fixação da importância dos precedentes em conformidade com a substância, isto é, com a matéria de que tratem. Dessa forma, o inciso cuidou de outorgar aos tribunais de justiça a incumbência de determinar o direito local, mediante seus precedentes do plenário ou do órgão especial. Todavia, a orientação se mantém: cabendo recurso da decisão que fixa o direito local, e permitindo-se ao tribunal superior imiscuir-se na análise do direito local, a definição do circuito recursal sobrepõe-se ao tanto estabelecido no dispositivo.

Finalmente, conquanto inexista previsão do dever de seguir os precedentes das turmas do STJ ou do STF, caso inexista precedente dos órgãos mencionados no dispositivo, nada justifica que o juiz ou tribunal intermediário ignore o precedente de alguma das turmas desses tribunais. Com efeito, os deveres de integridade, de coerência e de estabilidade impõem que os órgãos judicantes que se encontrem em posição inferior no circuito processual recursal respeitem os precedentes daqueles que estão acima.

Assim, em respeito à segurança jurídica e à igualdade, é imprescindível que se estabeleça também o respeito aos órgãos fracionários do STJ e do STF não mencionados no dispositivo, quando inexista algum precedente dos órgãos mencionados. Em respeito ao tanto estabelecido no art. 520, portanto, os precedentes dos órgãos do STF e do STJ não mencionados devem ser compreendidos como seguintes na lista de precedentes a serem seguidos. Dessa forma, depois de verificada a existência de precedente do plenário do STF, em matéria constitucional, deve-se analisar se alguma das turmas já resolveu a questão. Igualmente, em matéria infraconstitucional, caso inexista precedente da Corte Especial do STJ, deve-se perquirir acerca do tratamento da matéria, Seção competente ou por alguma das turmas.

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Seguindo na análise, os primeiros parágrafos do art. 521 cuidam da modificação ou superação dos precedentes ou de atos de criação de normas jurídicas jurisprudenciais. Estabelecem os §§ 1.º a 6.º:

“§ 1.º A modificação de entendimento sedimentado poderá realizar-se:

I – por meio do procedimento previsto na Lei 11.417, de 19 de dezembro de 2006, quando tratar-se de enunciado de súmula vinculante;

II – por meio do procedimento previsto no regimento interno do tribunal respectivo, quando tratar-se de enunciado de súmula da jurisprudência dominante;

III – incidentalmente, no julgamento de recurso, na remessa necessária ou na causa de competência originária do tribunal, nas demais hipóteses dos incisos II a VI do caput.

§ 2.º A modificação de entendimento sedimentado poderá fundar-se, entre outras alegações, na revogação ou modificação da norma em que se fundou a tese ou em alteração econômica, política ou social referente à matéria decidida.

§ 3.º A decisão sobre a modificação de entendimento sedimentado poderá ser precedida de audiência pública e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.

§ 4.º O órgão jurisdicional que tiver firmado a tese a ser rediscutida será preferencialmente competente para a revisão do precedente formado em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas, ou em julgamento de recursos extraordinários e especiais repetitivos.

§ 5.º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante, sumulada ou não, ou de precedente, o tribunal poderá modular os efeitos da decisão que supera o entendimento anterior, limitando sua retroatividade ou lhe atribuindo efeitos prospectivos.

§ 6.º A modificação de entendimento sedimentado, sumulado ou não, observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia”.

Superar um precedente significa retirá-lo do ordenamento jurídico como direito vigente, colocando algo novo em seu lugar. Falar em superação do precedente abrange tanto a exclusão do precedente em si, como a eliminação de sua ratio decidendi – visto que é possível eliminar uma das normas do precedente e preservar outra.51 A revogação de um precedente pode se dar de duas formas. É possível que seja realizada pelo próprio Judiciário, mediante outra decisão, que afirme uma norma diferente da contida no precedente, superando-a. É também possível que se dê por meio de ato do legislador, ao dispor em sentido contrário ou mesmo promulgando lei que repita a norma enunciada em um precedente, quando passa a ser o novo referencial normativo. Os parágrafos colacionados tratam da superação de precedente judicial pelo Judiciário (overruling).

É importante notar que, nos ordenamentos jurídicos em que não há disposições regulando a superação dos precedentes judiciais e, mais importante, remediando-a, os precedentes tendem a ser descartados despercebidamente, e, assim, simplesmente não há como se falar em precedente obrigatório. Como resultado, os juízes se inclinam, em variada

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medida, a decidir acerca dos mesmos fatos jurídicos de forma diferente, tornando, em muitas áreas, o direito jurisprudencial bastante caótico e confuso. Com efeito, percebe-se que a preocupação do sistema jurídico com a superação dos precedentes é a maior demonstração da sua importância.52

A regulação da superação (overruling), primeiramente, estabelece o paralelismo entre a formação e a modificação ou extinção do ato normativo. Assim, súmulas, vinculantes ou não, precisam ser modificadas mediante seu procedimento específico. Além disso, despontar que súmulas não são precedentes demonstra a inconveniência da medida: deve-se aplicar o texto como se ele tivesse um significado unívoco e certo, qualquer compreensão diferenciada deve ser aditada ou editada pelo tribunal competente.

Com acerto, o NCPC estabelece as modificações contextuais como a principal causa para a superação de um precedente judicial. Todavia, ainda que isso em nada prejudique a superação, deixou de se prever expressamente a hipótese de erro. Parece que isso foi proposital: busca-se a contenção das modificações constantes da jurisprudência. O dispositivo, entretanto, é meramente exemplificativo, como não poderia deixar de ser, e não obstaculiza a possibilidade de invocar outros motivos relevantes para a superação.

É essencial notar que a própria extinção ou modificação do precedente deve, além de respeitar os requisitos procedimentais-argumentativos, ser congruente com os princípios jurídicos e com as proposições sociais que determinam o sistema jurídico e a própria superação dos precedentes.53 Isso significa que a norma que substitui a contida no precedente superado não é criada livremente. Sua criação está ligada, além de às restrições processuais, aos argumentos permissivos da mudança e ao próprio ordenamento jurídico, compreendido em sua totalidade, e às proposições sociais que fundamentam o sistema jurídico. O novo precedente deve ser uma exigência de

determinadas normas materiais, que fazem necessária a sua construção e a sustenta.54 Dessa forma, é imprescindível compreender, ainda que grosseiramente, que a superação

do precedente só é legítima quando o tribunal nega o precedente para que, assim, sustente

o direito.55

Além disso, fixa-se a possibilidade de intervenção nos processos em que se debata a modificação ou superação de orientação jurisprudencial. A previsão fortalece o amicus

curiae, cada vez mais importante nos tempos atuais, em que cada processo detém certo interesse coletivo.

Ainda sobre a previsão do § 3.º, é de se notar que ela acaba por encartar a possibilidade de se estabelecer um verdadeiro procedimento para a audição de terceiros. Realmente, é possível que, em recursos, o STJ ou o STF suscite a possibilidade de superação de um importante precedente, e, buscando ampliar a participação e fortificar a legitimidade democrática da tese adotada, resolva instaurar um incidente para ouvir pessoas, entidades ou órgãos contributivos para a solução da questão.

No que toca à competência para a superação do precedente, nada obstante o dispositivo utilizar a ideia de preferência do órgão que fixou a ratio decidendi, deve-se entender que só é possível que outro órgão realize a superação caso se encontre em posição superior na pirâmide judiciária. Caso contrário, quando a decisão em sentido contrário ao estabelecido é de órgão inferior, não se trata de superação, mas apenas de decisão em error in

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judicando ou in procedendo.

Perceba-se que a superação é uma prerrogativa dos tribunais superiores.56 Como o stare

decisis está diretamente ligado à estrutura judiciária e à ordem jurídica processual, nomeadamente à previsão recursal, a superação dos precedentes judiciais obrigatórios só é permitida para o próprio tribunal que prolatou a decisão ou para outro que esteja em posição hierárquica superior. Assim, no stare decisis brasileiro, os precedentes dos tribunais superiores e do STF são obrigatórios, sendo certo que este pode superar os precedentes daqueles com base em sua competência recursal.

O § 5.º possibilita a superação prospectiva do precedente, em qualquer de suas variações. A superação dos precedentes precisa necessariamente considerar a segurança jurídica, que incide para proteger a confiança legítima.57–58 Perceba-se: a norma exarada por precedente cria a expectativa legítima de sua continuidade pelos jurisdicionados, que programam suas relações jurídicas em conformidade à juris dictio, merecendo proteção, especialmente nos casos em que há longa linha de decisões que confirmam um precedente originário, tornando bastante improvável a existência de uma superação.59 Seria um verdadeiro venire contra factum proprium o Judiciário afirmar que as pessoas devem se comportar de determinada forma e, em seguida, puni-las por terem agido exatamente da forma por ele determinada. Trata-se de ofensa tão forte à segurança que agride o próprio Estado de Direito.60

O § 6.º impõe fundamentação adequada e específica para a realização da superação, que deve seguir as considerações realizadas anteriormente: (i) é preciso que se demonstre a nova norma estabelecida ou nova orientação como melhor do que a anterior, diante do equívoco desta ou de uma mudança contextual; (ii) o órgão judicante precisa demonstrar que as razões para a mudança são mais fortes do que as razões de segurança, que

pressionam para a manutenção do precedente; (iii) caso a mudança seja estabelecida como o caminho correto, o tribunal precisa considerar a existência de confiança legítima e, sendo o caso, fixar a técnica adequada para sua tutela.61

Problema de menor monta, mas que precisa ser ressaltado, é que o NCPC considera a

confiança legítima como um princípio, o que o faz de forma equivocada. Confiança legítima é um conceito que representa determinado estado fático no qual incide o princípio da segurança jurídica, determinando sua tutela.62 Assim, o que se quis dizer, na verdade, foi que o tribunal deve considerar a existência de confiança legítima como situação fática, para que, por força do princípio da segurança jurídica, tutele-a, determinando a incidência ou aplicação da nova ratio decidendi apenas a partir de determinado tempo ou evento.63

Segue-se na análise dos parágrafos do dispositivo, notadamente dedicados a esclarecer a importante distinção entre ratio decidendi e obiter dictum, agora consagradas legalmente. São eles os §§ 7.º e 8.º:

“§ 7.º O efeito previsto nos incisos do caput deste artigo decorre dos fundamentos determinantes adotados pela maioria dos membros do colegiado, cujo entendimento tenha ou não sido sumulado.

§ 8.º Não possuem o efeito previsto nos incisos do caput deste artigo os fundamentos:

I – prescindíveis para o alcance do resultado fixado em seu dispositivo, ainda que

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precedentes no acórdão;

II – não adotados ou referendados pela maioria dos membros do órgão julgador, ainda que relevantes e contidos no acórdão”.

Nos sistemas jurídicos de civil law, justamente por tradicionalmente não se atribuir eficácia obrigatória aos precedentes, não houve preocupação doutrinária de definir ratio decidendi

ou obiter dictum.64 Isso ocorre no direito brasileiro.65 Todavia, a partir do momento em que se opera com precedentes, a problematização do que é efetivamente vinculante no precedente passa a fazer sentido e, assim, a discussão sobre ratio decidendi torna-se uma das mais relevantes. Realmente, não é possível o funcionamento do stare decisis sem a identificação de qual elemento possui autoridade no precedente judicial.66

Andou bem o legislador ao não estabelecer qualquer método de definição da ratio

decidendi como correto a priori. Caso o fizesse, tratar-se-ia de dispositivo fadado à ineficácia. A diferenciação entre ratio decidendi e obiter dictum foi realizada apenas em termos gerais, deixando corretamente à doutrina o papel de precisar os conceitos.

Uma questão terminológica: perceba-se que o dispositivo menciona, de forma correta, a vinculação como efeito decorrente da fundamentação no § 7.º, mas os atribui à própria fundamentação no § 8.º. Trata-se de uma metonímia: o que vincula, na verdade, é a norma decorrente do precedente ou o elemento determinativo que contém. O precedente é a fonte, é a sua norma que vincula. Nada obstante, a linguagem justifica-se na tradição, em que comumente fala-se, da mesma forma, em vinculação à lei, quando o que vincula é a norma dela decorrente, sem quaisquer problemas.

Finalmente, o ponto mais relevante está na percepção do tratamento das súmulas. Há uma sofisticação no ponto. O dispositivo menciona que a vinculação decorre dos fundamentos

determinantes adotados, tenham eles ou não sido determinados. Ora, o dispositivo busca

retirar a vinculação do texto da súmula e a colocar na fundamentação da decisão que o

gerou.

Apesar de o dispositivo ser ineficaz no que toca à súmula vinculante, por sua definição constitucional, ele é realmente muito importante para a súmula da jurisprudência dos tribunais. Com efeito, ao se operar mediante o recurso à fundamentação das decisões para determinar o conteúdo da súmula, fortalece-se a teoria do precedente judicial, em detrimento das súmulas e de seus enunciados totalizantes.

O dispositivo, portanto, possui um poderoso potencial de modificação na prática das súmulas no direito brasileiro. Fornecido o material necessário, resta aos aplicadores fazerem um bom uso dele.

O § 9.º trata das distinções. Trata-se de um texto longo que precisa ser compreendido com cuidado. Consta nele:

“§ 9.º O precedente ou jurisprudência dotado do efeito previsto nos incisos do caput deste artigo poderá não ser seguido, quando o órgão jurisdicional distinguir o caso sob julgamento, demonstrando fundamentadamente se tratar de situação particularizada por hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada, a impor solução jurídica diversa”.

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As distinções (distinguishing) são a principal forma de operar com precedentes judiciais, assim como na legislação os juristas utilizam-se da argumentação a contrario sensu ou da analogia, a fim de afastar ou atrair o reconhecimento da incidência no caso concreto, a distinção é a forma de evitar ou trazer a aplicação de um precedente no caso subsequente.67 As distinções consistem na atividade dos juristas de fazer diferenciações entre um caso e outro.68

A sua previsão legal é supérflua como disposição para a aplicação dos precedentes, porém tem um importante valor simbólico e didático, levando a que a comunidade jurídica, por força da consagração na lei, centre suas atenções nos conceitos e técnicas próprios da teoria dos precedentes judiciais.

Importa perceber que, enquanto a superação dos precedentes suscita uma questão de competência, não podendo ser realizada por todo e qualquer órgão julgador, a distinção pode ser realizada tanto pelo tribunal do qual emanou o precedente como pelos juízes e tribunais inferiores, vinculados à norma do precedente. As distinções são o método aplicativo dos precedentes, não se justificando sua limitação a órgãos específicos – do mesmo modo que é impossível limitar a interpretação da lei a determinados tribunais ou juízes.

É correto afirmar, portanto, que o método de aplicação dos precedentes é marcado pelas distinções (distinguishing); conceito de suma importância, pois se trata do mecanismo mais relevante na concretização do direito jurisprudencial, justamente por ser o que é utilizado com maior frequência. Nas distinções (distinguishing), o jurista deve operar por meio do raciocínio analógico entre os fatos do precedente e os do caso presente, identificando quais as diferenças e similitudes, demonstrando que são substanciais, ou seja, que são juridicamente relevantes. Essa característica da operação com precedentes faz o processo de sua aplicação essencial e especialmente fundado em analogias, que moldam e remoldam as normas a partir de cada decisão.69

É relevante perceber, ademais, que é realizada a utilização do termo distinção (distinguishing) em dois sentidos, um amplo e outro estrito. Distinção em sentido amplo é o processo argumentativo ou decisional segundo o qual se demonstram diferenças e similitudes entre dois casos, o do precedente e o subsequente, sob análise. Trata-se do método próprio dos precedentes judiciais.70 Já distinção em sentido estrito refere-se ao resultado do processo argumentativo, especificamente quando se chega a efetivamente diferenciar os fatos substanciais do precedente dos do caso seguinte, para concluir pela não aplicação da ratio decidendi que, a princípio, parecia incidir. Assim, é por meio da distinção em sentido amplo (processo argumentativo típico dos precedentes judiciais) que se alcança ou não a distinção em sentido estrito (resultado da argumentação por precedentes no sentido de que o precedente realmente não é aplicável ao caso concreto, pois há fatos substanciais distintos).

Finalmente, uma questão importante relativa ao dispositivo do NCPC precisa ser analisada com cuidado.

O texto do dispositivo, buscando ser minudencioso, acabou criando certa confusão. Fala-se que o juiz ou tribunal, ao realizar a distinção, deverá fazê-lo “demonstrando fundamentadamente se tratar de situação particularizada por hipótese fática distinta ou

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questão jurídica não examinada, a impor solução jurídica diversa”.

Das duas, uma: ou a lei brasileira chamou de distinção a possibilidade de o juízo inferior, com base em novos argumentos jurídicos, deixar de aplicar o precedente, inovando na teoria dos precedentes; ou se trata de mera conjugação infeliz de palavras, simplesmente para significar o sentido clássico de distinção. Parece que a resposta é esta última.

Não é possível que se defenda uma distinção com base em novo argumento jurídico. A distinção é resultado de uma configuração diferente dos fatos substanciais do caso subsequente. Com efeito, a existência de um novo argumento pode ser alçada a razão permissiva da superação antecipada no direito brasileiro, isto é, a possibilidade de órgãos judicantes inferiores superarem um precedente, independentemente de manifestação da Corte prolatora.71 Muito embora se tenha tal possibilidade como imprópria e enfraquecedora da teoria dos precedentes, a vontade política tem autonomia e liberdade para optar por uma configuração desse tipo.

Todavia, não parece que foi isso que o NCPC fez.

O caso é de enunciado diferente que invoque novas questões jurídicas, não abrangidas pelo precedente judicial obrigatório. Realmente, “questão jurídica não examinada” é, apenas, a inexistência de precedente que regule a matéria. Sendo assim, invocado precedente que a parte aduz incidir nos fatos do caso, o magistrado pode demonstrar que se trata de uma questão jurídica diversa, não abrangida pela ratio decidendi do precedente invocado.

Perceba-se: não é possível que o juiz afaste o precedente por divisar a existência de novo

argumento jurídico, não analisado pelo STJ ou pelo STF, mas pertinente à mesma hipótese fática e à mesma questão jurídica. Não foi isso que se possibilitou, o que equivale a uma

superação antecipada.

Com efeito, o que se permite é que o juiz afaste o precedente por se tratar de uma questão jurídica distinta, o que, no mais das vezes, é resultado de alguma diferença fática. Nada obstante, deve-se notar que é efetivamente possível que, mesmo se tratando dos mesmos fatos substanciais, o precedente aborde a incidência de norma distinta da que é objeto de discussão no caso subsequente. Imagine-se, por exemplo, que se invoque precedente que define determinado fato como ilícito civil para que se alcance a solução de uma demanda subsequente, tratando determinada conduta como ilícito tributário ou das suas consequências tributárias. O juiz, por uma “questão jurídica”, estaria autorizado a fazer a distinção.

O dispositivo normativo, portanto, com a pretensão de ser analítico, acabou por ensejar certa confusão. Não se deve confundir os institutos: ele trata efetivamente de distinção, e não da possibilidade de superação antecipada de precedente. Ao magistrado é permitido afastar um precedente que não incide, por tratar de questão jurídica que não equivale à veiculada no precedente, e nunca afastar um precedente por considerar um argumento novo, não analisado quando da prolação do precedente, suficiente para esvaziar sua força. Neste último caso, cabe-lhe apenas ressalvar na decisão sua opinião pessoal – de muita importância para a reconstrução da norma jurídica –, todavia, não é permitido que deixe de aplicar o ordenamento jurídico.

Finalmente, colaciona-se para a análise os últimos dois parágrafos, que tratam,

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respectivamente, da publicidade e da fundamentação nos precedentes judiciais:

“§ 10. Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.

§ 11. O órgão jurisdicional observará o disposto no art. 10 e no art. 499, § 1.º, na formação e aplicação do precedente judicial”.

Conquanto o dispositivo não o diga expressamente, a publicidade é requisito de eficácia do precedente judicial. Aliás, ainda que dispusesse de forma contrária, o que não ocorre, tratar-se-ia de disposição inconstitucional, porquanto só é possível vincular os jurisdicionados a enunciados normativos que tenham a oportunidade de conhecer, corolário inafastável do direito fundamental à segurança jurídica e do Estado de Direito.

Só é possível a construção de um sistema de precedentes obrigatórios a partir de instrumentos eficazes de publicidade das decisões.72 A cognoscibilidade do direito é requisito essencial do princípio da segurança jurídica e para a concretização do ideal do Estado de Direito, sendo indispensável que seja possível aos cidadãos conhecer os textos dos quais serão coligidas normas jurídicas.73 A partir do momento em que se tem a decisão judicial como fonte do direito, é indispensável inseri-la nesse contexto: do ato judicial será extraída uma norma jurídica que terá aplicação a todos os jurisdicionados, sendo direito fundamental destes, portanto, tomar conhecimento apropriadamente do direito que rege suas ações.74

Já o § 11 faz remissão ao dispositivo que trata do contraditório e ao que enuncia os requisitos para que se considere uma decisão fundamentada. Com os requisitos estabelecidos analiticamente no art. 499, § 1.º, tem-se uma decisão com fundamentos suficientes para a reconstrução adequada da ratio decidendi. De fato, o NCPC trata com muito cuidado do tema, escamoteado pelos tribunais, que é um dos mais importantes do direito processual contemporâneo, porquanto é essencial para os precedentes judiciais, ao constituir o próprio desaguar do contraditório, e, além disso, é onde se dá a concretização dos princípios e, assim, constitui tema imprescindível para o controle racional da decisão.

Perceba-se que o dever de fundamentação em sua perspectiva forte, adotada como consequência do contraditório como influência, faz necessário que o juiz leve em conta os argumentos da parte ao decidir, sob pena de nulidade.75 Com efeito, a decisão precisa levar em conta todos os argumentos autônomos levantados pelo sujeito parcial: de nada adianta prever um contraditório forte e, ao final, possibilitar que o julgador simplesmente desconsidere tudo o que foi aduzido. Ao se inserir o contraditório como manifestação democrática de influência no ato de poder judicial, impõe-se a necessidade de observar a regularidade da fundamentação em correspondência direta aos argumentos utilizados pelos litigantes.76 Além disso, todos os fundamentos para a decisão devem ter sido oferecidos ao debate das partes.77

De fato, um dos pontos mais importantes para o funcionamento da teoria dos precedentes é a forma como a decisão judicial é apresentada, isto é, o que é considerado efetivamente cumpridor do requisito de fundamentação. Deve-se ter em mente que, sem que exista uma adequada fundamentação das decisões, sequer é possível defender-se uma teoria dos precedentes obrigatórios. Trata-se de requisito basilar para o funcionamento dos

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precedentes e do elemento da decisão mais importante para a compreensão das rationes

decidendi.

O art. 522 do NCPC, o último que trata detidamente dos precedentes judiciais, limita-se a decretar que o incidente de resolução de demandas repetitivas e o julgamento dos recursos especial e extraordinário repetitivos são considerados casos repetitivos pelo Código. Destaca-se, ademais, em seu parágrafo único, que o julgamento de casos repetitivos pode ter por objeto tanto questões de direito material como questões de direito processual.

5. Considerações finais e conclusões

A regulação dos precedentes judiciais, diante desse quadro, foi feita de forma introdutória, pois não se trata de forma exauriente ou profunda o tema – o que seria um despropósito inescusável e deletério –, e suficiente, visto que garante todo o arcabouço necessário para que os juristas construam o stare decisis brasileiro. Ademais, percebe-se que a tratativa foi cautelosa, pois em nenhum momento fala expressamente de vinculatividade dos precedentes, mas enuncia imperativamente que os precedentes serão seguidos, invocando um dever de respeitá-los.

Por consequência, pode-se falar que o Projeto do novo Código de Processo Civil inaugura o

stare decisis brasileiro, sendo certo que cabe aos juristas em geral e aos tribunais em especial o seu desenvolvimento. É certo, boas ferramentas não faltam.

Diversas outras previsões mereceriam destaque, como, e.g., os poderes do relator voltados para a afirmação dos precedentes, o incidente de resolução de demandas repetitivas, a previsão de exceção à remessa necessária quando houver entendimento sumulado ou fixado em resolução de demandas repetitivas e a correta modificação da hipótese de cabimento da ação rescisória, excluindo-se ofensa à lei e prevendo-se a ofensa à norma jurídica, que pode advir tanto da lei como do precedente, o novo julgamento liminar pela improcedência, a tutela de evidência, dentre muitos outros. Todas elas tratam da força dos precedentes em específicas aplicações dos precedentes judiciais. Caberá à doutrina e à jurisprudência paulatinamente construir e reconstruir o aparato fornecido pelo NCPC, substancioso para que se alcance o stare decisis brasileiro.

Finalmente, em um apanhado geral do Projeto do novo Código de Processo Civil, percebe-se que se estabeleceu uma regulação específica dos precedentes judiciais, como deveres gerais, servindo como forma de concretização da segurança jurídica nas decisões judiciais, e sua tratativa minudenciosa – que não exclui a possibilidade de complementação. Nesse ponto, o NCPC avançou bastante, inaugurando tratamento específico dos precedentes judiciais. Todavia, ao regular os institutos e técnicas específicos, o Projeto de novo Código fica aquém do esperado, outorgando dignidade especial às súmulas e aos procedimentos abstratos de definição de tese jurídica, o que afasta os precedentes em sentido estrito, mesmo os mais importantes, das técnicas e institutos de aceleração do procedimento.

Nada obstante se tratar de uma lastimável perda de oportunidade de afirmar com a devida força a vontade política de um Judiciário mais coerente, estável e racional, a doutrina e a

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jurisprudência podem avançar onde o legislador foi inerme, consagrando também nas técnicas e institutos analisados o stare decisis brasileiro.

1 CUNHA, Leonardo Carneiro da. O processo civil no Estado constitucional e os fundamentos do Projeto do novo Código de Processo Civil brasileiro. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, n. 209, ano 37, 2012, p. 350-354. 2 Já se concluiu, com base em estudos comparados, que o stare decisis é uma forma de garantir racionalidade aos sistemas jurídicos, pois garante um incremento de coerência, uniformidade e integridade na aplicação do direito (BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK, Neil; MORAWSKI, Lech; MIGUEL, Alfonso Ruiz. Rationales for precedent. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 486-487). 3 Geralmente, os precedentes são observados apenas em perspectiva histórica ou retrospectiva, isto é, ligados ao passado, o que se afigura incompleto, como bem se destacou. Sobre o ponto, cf. SCHAUER, Frederick. Precedent. Stanford Law Review, vol. 39, 1987, p. 571-605. O jurista norte-americano preocupa-se em sublinhar a perspectiva voltada para o futuro, isto é, o prisma pelo qual se olha a decisão do presente como o precedente do futuro, o que serve como guia para o magistrado. Ressalte-se que Neil Duxbury não concorda integralmente com Schauer. Sua discordância se dá quanto à existência de uma “obrigação” do magistrado de considerar o futuro, quando da prolação de sua decisão, justamente por pressupor uma sanção, inexistente no caso. Conferir, sobre a crítica: DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent. Cambridge: Cambridge University Press, 2008. p. 4-5. 4 MACCORMICK, Neil. Why cases have rationes and what these are. In: GOLDSTEIN, Laurence (ed.). Precedent in law. Oxford: Claredon Press, 1987. p. 157. Também destaca o problema, sobretudo no contexto da utilização cada vez maior dos precedentes no civil

law: TARUFFO, Michele. Processo civil comparado: ensaios. Trad. Daniel Mitidiero. São Paulo: Marcial Pons, 2013. p. 131. Ressaltando a necessidade de observar a diferença entre conceitos relativos aos precedentes dos provenientes da perspectiva do caso: MITIDIERO, Daniel. Fundamentação e precedente – dois discursos a partir da decisão judicial. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, ano 37, vol. 206, 2012, p. 75. 5 Nesse sentido: CROSS, Rupert; HARRIS, J. W. Precedent in english law. 4. ed. Oxford: Oxford University Press. p. 72; MUÑOZ, Martin Orozco. La creación judicial del derecho y el

precedente vinculante. Navarra: Arazandi-Thomson Reuters, 2011. p. 28; TARANTO, Caio Márcio Gutterres. Precedente judicial. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 7-8. Aproximadamente: MELLO, Patrícia Perrone Campos. Precedentes. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 63; SANTOS, Evaristo Aragão. Em torno do conceito e da formação do precedente judicial. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.). Direito jurisprudencial. São Paulo: Ed. RT, 2012. p. 143-145. 6 Sobre eficácia anexa das decisões, ver: SILVA, Ovídio A. Baptista da. Eficácias da sentença e coisa julgada. Sentença e coisa julgada – Ensaios e pareceres. 4. ed. Rio de

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Janeiro: Forense, 2006. p. 88-89; PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado das

ações. São Paulo: Ed. RT, 1970. t. I, p. 216-217. 7 “As fontes do Direito põem normas jurídicas. A norma jurídica é, pois, conteúdo da fonte de Direito por ela enunciada, a fim de determinar seja obrigatória, proibida ou permitida alguma conduta ou serem especificados certos âmbitos de competência, em dada conjuntura histórica” (COSTA, Adriano Soares da. Teoria da incidência da norma jurídica.

2. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 29). 8 “Ratio decidendi can mean either ‘reason for the decision’ or ‘reason for deciding’” (DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 67). 9 SUMMERS, Robert S. Precedent in the United States (New York State). In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 370. 10 Aproximadamente: MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2011. p. 222-223. 11 Ver, sobre a questão: DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 59-62. 12 Nesse sentido: MACCORMICK, Neil. Why cases have rationes and what these are… cit., p. 165. 13 Sobre o metodologismo como um formalismo redutivo e deformativo do direito, ver: SALDANHA, Nelson. Da teologia à metodologia: secularização e crise no pensamento jurídico. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. 14 “Applying lessons of the past to solve problems of the present and future is a basic part of human practical reason” (MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert. Interpreting

precedents… cit., p. 1. Igualmente, SCHAUER, Frederick. Precedent… cit., p. 572; BENDITT, Theodore M. The rule of precedent. In: GOLDSTEIN, Laurence (ed.). Precedent

in law. Oxford: Claredon Press, 1987. p. 89. A ideia aqui adotada segue a linha exposta em: BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: A justificação e a aplicação de regras jurisprudenciais. São Paulo: Noeses, 2012. p. 190-205. Assim também: ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005. p. 264). Chega-se a afirmar que a importância do precedente está atrelada à natureza humana, cf. GREY, John Chipman. Judicial precedents. Harvard Law Review, n. 9. 1895-1896, p. 27. 15 Mais precisamente, esse fechamento se dá pelas próprias regras, como bem constrói Marcelo Neves: “Pode-se dizer que, no processo de concretização normativa, enquanto os princípios jurídicos transformam a complexidade desestruturada do ambiente do sistema jurídico (valores, representações morais, ideologias, modelos de eficiência etc.) em complexidade estruturável do ponto de vista normativo-jurídico, as regras jurídicas reduzem seletivamente a complexidade já estruturável por força dos princípios,

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convertendo-a em complexidade juridicamente estruturada, apta a viabilizar a solução do caso. São dois polos normativos fundamentais no processo de concretização jurídica, cada um deles se realimentando circularmente na cadeia argumentativa orientada à decisão do caso. Não há hierarquia linear entre eles. Por um lado, as regras dependem do balizamento ou construção a partir de princípios. Por outro, estes só ganham significado prático se encontram correspondência em regras que lhes deem densidade e relevância para a solução do caso. Essa relação não é harmônica” (NEVES, Marcelo. Entre Hidra e Hércules:

princípios e regras constitucionais. São Paulo: Martins Fontes, 2013. p. XIX-XX). É notável, por outro lado, o importante papel dos precedentes como referentes normativos para as regras construídas mediante a aplicação jurisprudencial dos princípios, como reconhece o jurista pernambucano (p. 169). 16 Assim: “Ello se concreta en que cuando ante un órgano jurisdiccional se ofrecen distintas alternativas jurídicamente razonables para fundamentar la solución de un caso, ya en cuanto la selección de la fuente normativa, ya en cuanto a la derivación, de dicha fuente, de la norma jurídica aplicable, dicho órgano sólo podrá elegir aquella alternativa que, en un supuesto esencialmente iguales, ya fue elegía por una sentencia o sentencias anteriores, constitutivas del precedente o jurisprudencia vinculante” (MUÑOZ, Martin Orozco. La creación judicial del derecho y el precedente vinculante… cit., p. 185). 17 Carla Faralli percebeu bem o ponto: “Como una consecuencia de todo esto, los jueces en los sistemas de civil law tienen que vérselas ahora con problemas similares a los de un

judge-made law, pero sin las características culturales de los paises del common law. La producción legislativa cada vez más abundante, caótica, continuamente modificada, plagada de fórmulas oscuras de compromiso, deja abiertos márgenes muy amplios a la ‘creatividad’ del juez” (FARALLI, Carla. Certeza del derecho o “derecho a la certeza”?. cit., p. 74. Disponível em: [www3.cirsfid.unibo.it/murst40…/Faralli_new.doc]. Acesso em: 26.02.2014). 18 Como bem coloca Eisenberg, trata-se de uma realidade inevitável, assumam-na ou não os juristas, estruturem o sistema jurídica em conformidade, ou não. Nas palavras do jurista estadunidense: “Of course, the judicial establishment of legal rules would occur even if the sole function of the courts was to resolve disputes. If the courts are to explicate the application, meaning, and implication of the society’s existing standards in new situations, they cannot simultaneously be prohibited from formulating rules that have not been previously announced. To begin with, modern society is in a state of continual change, creating a continual need for new legal rules to resolve new issues. Indeed, because of the inevitability of the change, even the application of an old rule to a new case may constitute a new rule (…). Moreover, even when social conditions have not changed, previously adopted legal rules must often be discarded because they were wrongly established. Finally, whether a previously adopted rule covers a given dispute may often depend on the degree of generality with which the rule was formulated in earlier cases, and that degree is often somewhat adventitious” (EISENBERG, Melvin Aron. The nature of the common law. Cambridge: Harvard University Press, 1991. p. 5-6). 19 A questão da criatividade no direito é complexa e padece de um déficit de precisão conceitual em sua abordagem, dependendo da perspectiva que se adota (assim,

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MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios… cit., p. 97). Com “criação” pretende-se significar que se chega institucionalmente a determinada norma jurídica que pode ser racionalmente atribuída aos elementos normativos fornecidos anteriormente, mas ainda assim até então inexistente de forma expressa. É também claro que a constituição, a modificação e a extinção do direito realizadas pelo juiz possuem limites, que são impostos pelo próprio ordenamento jurídico e que a criação judicial do direito não significa uma inovação completa, a partir do nada. O direito é construído e reconstruído sempre em determinado contexto histórico-social, do qual o intérprete não pode se alienar: a norma é gota de tinta em um copo, e sua cor é assumida em conformidade ao todo. Em interessante passagem do Sistema, Pontes de Miranda, tendo isso em mente, acaba por dizer que não há atos criativos do direito: o direito é processo social de adaptação e é forjado pela e na própria sociedade, ao legislador ou ao juiz cabe reconhecê-lo. A interessante e misteriosa passagem conta com uma analogia surpreendente: para Pontes, o jurista não cria o direito assim como o arquiteto nada cria, simplesmente reordena e combina os elementos encontrados na natureza para lhes dar o aspecto de novo: constrói. Não há aí criação, pois toda substância era anterior ao ato, novidade só há na forma como se organizou e na função que se deu. O tema é extremamente complexo e sua tratativa adequada requereria uma pesquisa à parte, que não é o objeto deste trabalho. De toda forma, o sentido de criação em Pontes não é o mesmo que aqui é utilizado: quer-se dizer com o termo o reconhecimento de norma jurídica que até então não era reconhecida institucionalmente. Pode-se dizer que se utiliza, nessa tese, um sentido fraco ou superficial de criação, enquanto Pontes utiliza o termo em sentido forte ou profundo. Sobre isso, ver, dentre outras passagens, expressamente: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Sistema de ciência positiva do direito. 2. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972. t. I, p. 83-84. Ver sobre o tema, com base em estudo comparado, a análise em: TARUFFO, Michele. Institutional factors influencing precedents. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 458-460. 20 Sobre a segurança: BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK, Neil; MORAWSKI, Lech; MIGUEL, Alfonso Ruiz. Rationales for precedent… cit., p. 487. Quanto à igualdade: MACCORMICK, Neil. Rhetoric and the rule of law. Oxford: Oxford University Press, 2005. p. 143. Na teoria da argumentação destaca-se o precedente judicial como corolário da universalidade, representada juridicamente especialmente pela igualdade, cf. ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica… cit., p. 265. Acerca da eficiência: CARDOZO, Benjamin Nathan. Nature of judicial process. New Haven: Yale University Press, 1960. p. 149; FARBER, Daniel A. The rule of law and the law of precedents. Minnesota Law Review, vol. 90, 2006, p. 1.175. 21 É o que se dá, atualmente, com as súmulas vinculantes. No ponto: “O que há aí é um renascimento (se é que entre nós houve uma morte) dos postulados da escola da exegese, da crença oitocentista na clareza do texto e mais, no poder racionalizador do mesmo: crê-se que as Súmulas Vinculantes, por serem Súmulas, tornam ‘claro’ o sentido (verdadeiro) da norma e, acredita-se que, por serem Vinculantes, impediriam qualquer outra interpretação” (BAHIA, Alexandre Gustavo Melo Franco. As súmulas vinculantes e a nova escolada da exegese. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, ano 37, vol. 206, 2012, p. 364). No mesmo sentido: ABBOUD, Georges. Súmula vinculante versus precedentes:

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notas para evitar alguns enganos. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, ano 33, vol. 165, 2008, p. 224-226; SILVA, Ovídio A. Baptista da. A função dos Tribunais Superiores. Sentença e coisa julgada. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 299. 22 “Observe-se, por outro lado, que o estilo de julgamento, no âmbito do common law, é caracterizado pela ‘autorreferência’ jurisprudencial. Na verdade, pela própria técnica do precedente vinculante, impõe-se, na grande maioria das vezes, a exigência de que a corte invoque, para acolher ou rejeitar, julgado ou julgados anteriores. Em outras palavras, a fundamentação de uma decisão deve, necessariamente, conter expressa alusão à jurisprudência de tribunal superior ou da própria corte” (TUCCI, José Rogério Cruz e. Parâmetros de eficácia e critérios de interpretação do precedente judicial. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.). Direito jurisprudencial. São Paulo: Ed. RT, 2012. p. 105). 23 “Here, it seems, we discover the real meaning of ‘binding precedent’: courts might not be bound to follow the earlier decision of (usually) superior courts on the same facts but, when confronted with such decisions, they are obliged to deal with them somehow” (DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 109). 24 ALEXY, Robert; DREIER, Ralf. Precedent in the Federal Republic of Germany. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Dartmouth, 1997. p. 30-31. 25 BENDITT, Theodore M. The rule of precedent… cit., p. 97. 26 CUNHA, Leonardo Carneiro da. O processo civil no Estado constitucional e os fundamentos do Projeto do novo Código de Processo Civil brasileiro… cit., p. 350-354. 27 Brasil – Congresso Nacional. Senado Federal – Anteprojeto do Novo Código de Processo

Civil. Brasília: Senado Federal, 2010, p. 14. 28 Idem, p. 17. 29 Nesse sentido: CUNHA, Leonardo Carneiro da. O processo civil no Estado constitucional e os fundamentos do Projeto do novo Código de Processo Civil brasileiro… cit., p. 353. 30 Apontando que, quando há decisão, gera-se precedente: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert. Interpreting precedents… cit., p. 1. É importante notar que, nada obstante toda decisão gere um precedente, nem todo precedente gerado possui eficácia obrigatória ou eficácia persuasiva significante. Isso se dá, inclusive, porque, para que exista a obrigação de seguir um determinado precedente, é preciso que um caso análogo subsequente apresente-se, diante do aspecto relacional característico dos precedentes obrigatórios. Nesse sentido: BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK, Neil; MARSHALL, Geoffrey. Precedent in the United Kingdom. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 323; LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 5. ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2009. p. 611. Aproximadamente: TUCCI, José Rogério Cruz e. Precedente judicial como fonte do direito. São Paulo: Ed. RT, 2004. p. 11-12; TARUFFO, Michele; LA TORRE, Massimo. Precedent in

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Italy. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert. Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 151. O fato de um precedente, entretanto, não possuir caso análogo não o exclui como fonte, apenas torna impossível sua aplicação. Nesse sentido: MUÑOZ, Martin Orozco. La creación judicial del derecho y el precedente vinculante… cit., p. 32. 31 Note-se que o mesmo problema ocorre no tocante à regulação do ônus da prova. 32 O stare decisis, ademais, impulsiona o aplicador a garantir uniformidade do direito e, assim, igualdade entre os jurisdicionados, o que comumente é expresso no adágio treat

like cases alike, sendo tais pontos valores perseguidos pelo Rule of Law. Assim: BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK, Neil; MORAWSKI, Lech; MIGUEL, Alfonso Ruiz. Rationales for precedent… cit., p. 488. 33 A perspectiva da segurança como estabilidade “estabelece exigências relativamente à transição do direito passado ao direito futuro. Não uma imutabilidade, portanto, mas uma estabilidade ou racionalidade da mudança, que evite alterações violentas”. Numa simplificação: em um ordenamento jurídico estável a mudança causa poucos danos aos jurisdicionados. Cf. ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica: entre permanência e realização no direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 124. 34 A Suprema Corte norte-americana já chegou a afirmar que o stare decisis contribui para a própria integridade do “sistema constitucional de governo”, uma vez que preserva e reforça a ideia de que os seus “princípios fundamentais são baseados no direito em vez de em propensões de indivíduos” (Vasquez v. Hillery, Supreme Court of United States, 1986, 474, p. 265-266). Nesse sentido, é muito proveitosa a lição de Waldron, que afirma que a previsibilidade também é possível a partir da Rule of Man, especialmente a partir do estudo de perfis dos homens que decidirão, mas que tal tipo de previsibilidade não é desejável, a segurança jurídica requerida pelo Estado de Direito é a que o stare decisis fornece: previsibilidade baseada em normas jurídicas, especialmente princípios, na compreensão e utilização das várias fontes do direito (WALDRON, Jeremy. Stare decisis and the rule of

Law: A layered approach, cit., p. 14-15). 35 A ideia é que os litigantes de hoje devem ser tratados da mesma forma que os do passado, exceto quando ocorrer algo que enseje uma modificação nas razões que levaram à decisão. Nesse sentido: ALEXANDER, Larry. Precedent. In: PATTERSON, Dennis (ed.). A

companion to philosophy of law and legal theory. 2. ed. Blackwell, 2010. p. 495. 36 Trata-se de uma aplicação do princípio da boa-fé ao discurso empreendido pelo Judiciário. Nem se invoque a inaplicação da boa-fé nessa seara, visto que se trata de princípio aplicável de forma generalizada, eis que “traduz um estádio juscultural, manifesta uma Ciência do Direito e exprime um modo próprio de certa ordem sociojurídica”, revelando regras de conduta fundadas na lealdade, honestidade, retidão, respeito e consideração com os interesses do alter, que devem ser observadas em certo contexto histórico-cultural (MENEZES CORDEIRO, Antonio Manuel da Rocha e. Da boa-fé no direito

civil. Coimbra: Almedina, 2001. p. 18 e 632). Ver também, diferenciando e conceituando a boa-fé objetiva e a subjetiva, MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado. 2. tir.

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São Paulo: Ed. RT, 2000. p. 410-413. No mesmo sentido: PÉREZ, Jesús Gonzáles. El

principio general de la buena fe en el derecho administrativo. 4. ed. Madrid: Civitas, 2004. p. 91). Defendendo a aplicação da boa-fé além do direito privado: WIEACKER, Franz. El

principio general de la buena fe. Madrid: Civitas, 1977. p. 95 (tradução de Zur rechtstheoretische Präzisierung des § 242 BGB, de 1955). Especialmente sobre a aplicação ao processo da boa-fé: “Pero tal lucha no significa que el proceso sea un campo de batalla en el cual todos los medios sean lícitos para obtener la victoria, sin importar que el resultado y los procedimientos estén o no de acuerdo con el derecho, la moral y la justicia, ni que se pueda recurrir al proceso para obtener, en connivencia con la parte aparentemente contraria, resultados ilegales o ilícitos, con o sin perjuicio de terceros” (ECHANDIA, Hernando Devis. Fraude procesal, sus características, configuración legal y represión. Revista de Derecho Procesal Iberoamericana, n. 4, 1970, p. 743-744). Assim, no direito brasileiro: “Fazendo eco às ideias plasmadas no campo do direito material, logo o direito processual civil tratou de amoldar-se aos ditames éticos. O processo, de instrumento de realização da vontade concreta da lei, passou a ser visto como instrumento destinado a proporcionar a ‘justa composição dos litígios’, tendo os Códigos de maneira geral reforçado os poderes do juiz e sancionado as condutas processuais abusivas” (THEODORO JR., Humberto. Boa-fé e processo: princípios éticos na repressão à litigância de má-fé – Papel do juiz. Estudos de direito processual civil: Homenagem ao Professor Egas Dirceu Moniz de Aragão. São Paulo: Ed. RT, 2005. p. 643). Igualmente: DIDIER JR., Fredie. Fundamentos do princípio da cooperação no direito processual civil português. Coimbra: Coimbra, 2010. p. 80. Sintetizando os posicionamentos, com um apanhado geral doutrinário: SILVA NETO, Francisco Antônio de Barros e. A improbidade processual da

administração pública e sua responsabilidade objetiva pelo dano processual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 7-13. 37 SCHAUER, Frederick. Thinking like a lawyer. Cambridge: Harvard University Press, 2012. p. 36. 38 Nesse sentido: SILVA, Ovídio A. Baptista da. A função dos Tribunais Superiores… cit., p. 300-301; ABBOUD, Georges. Súmula vinculante versus precedentes… cit., p. 218-220. 39 É interessante, no ponto, que Mancuso liga a Súmula ao enunciado legal: “É dizer, a Súmula obrigatória outra coisa não significa que a própria norma judicada, ou seja, a norma legal que teve a sua passagem judiciária, o seu day in Court, resultando, ao cabo de iterativas e harmônicas interpretações, num enunciado sintético, que, por opção política-jurídica do legislador (= lei federal) ou do poder constituinte derivado (= emenda à Constituição), passa a projetar efeitos pan processuais e até extraprocessuais, parametrizando a solução de situações análogas, pendentes ou futuras” (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência jurisprudencial e súmula vinculante. 5. ed. São Paulo: Ed. RT, 2013. p. 99). O jurista paulista equivoca-se, primeiramente por dar um aspecto, de certa forma, natural à enunciação de súmulas e também pela ligação das súmulas à lei: ora, se a súmula não é mais do que a lei, sua necessidade seria nenhuma. O autor, dessa forma, insere-se no paradigma da mera declaração da lei, sob o qual não é possível destacar a relevância do direito jurisprudencial sem cair em notável contradição. 40 A diferença fica clara a partir da lição de Taruffo: “Em especial, nem sempre se presta

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a devida atenção ao fato de que, em linha de princípio, o precedente se funda sobre a analogia que o segundo juiz vê entre os fatos do caso que ele deve decidir e os fatos do caso já decidido, porque somente com essa condição é que se pode aplicar a regra pela qual a mesma ratio decidendi deve ser aplicada a casos idênticos ou ao menos similares” (TARUFFO, Michele. Processo civil comparado… cit., p. 131). Inclusive, Eduardo Talamini entende que se trata de processo jurisdicional objetivo aquele que resulta no enunciado da Súmula Vinculante. Note-se que, sob esse prisma, fica claro que o enunciado sumular nada mais é do que uma decisão. Ver: TALAMINI, Eduardo. Novos aspectos da jurisdição

constitucional brasileira, cit., p. 118-120. 41 Em sentido contrário: SOUZA, Marcelo Alves Dias. Do precedente judicial à súmula

vinculante. Curitiba: Juruá, 2007. p. 176-178; ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues de. Precedentes vinculantes e irretroatividade do direito no sistema processual brasileiro. Curitiba: Juruá, 2012. p. 151; REIS, Maurício Martins. Precedentes obrigatórios e sua adequada compreensão: de como súmulas vinculantes não podem ser o “bode expiatório” de uma hermenêutica jurídica em crise. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, ano 38, vol. 220, 2013, p. 2.098-2.212; MELLO, Patrícia Perrone Campos. Precedentes… cit., p. 101-102 e 105; ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira: súmula vinculante e o incidente de resolução de demandas repetitivas. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, ano 37, vol. 208, 2012, p. 214-216. 42 GRECO, Leonardo. Novas súmulas do STF e alguns reflexos sobre o mandado de segurança. Revista Dialética de Direito Processual, São Paulo: Dialética, n. 10, 2004, p. 44-54. 43 MELLO, Patrícia Perrone Campos. Precedentes… cit., p. 166-173. 44 “O que há aí é um renascimento (se é que entre nós houve uma morte) dos postulados da escola da exegese, da crença oitocentista na clareza do texto e mais, no poder racionalizador do mesmo: crê-se que as Súmulas Vinculantes, por serem Súmulas, tornam ‘claro’ o sentido (verdadeiro) da norma e, acredita-se que, por serem Vinculantes, impediriam qualquer outra interpretação” (BAHIA, Alexandre Gustavo Melo Franco. As súmulas vinculantes e a nova escolada da exegese… cit., p. 364). No mesmo sentido: ABBOUD, Georges. Súmula vinculante versus precedentes… cit., p. 224-226; SILVA, Ovídio A. Baptista da. A função dos Tribunais Superiores… cit., p. 299. 45 “A instituição da súmula vinculante tenta amenizar os problemas interpretativos de ordem constitucional por meio de um rígido esquema vertical, que compele órgãos jurisdicionais e Administração Pública à estrita observância da interpretação fixada pelo Supremo Tribunal Federal. É certo que isso trará uma elevada dose de segurança ao sistema, mas o trade-off apresenta-se imediatamente: o cerceamento da tão propalada atividade criativa do juiz, não obstante a possibilidade de revisão e cancelamento de súmulas vinculantes” (DANTAS, Bruno. Súmula vinculante: o STF entre a função uniformizadora e o reclamo por legitimação democrática. Revista de Informação

Legislativa, vol. 48, 2008, p. 180-181). 46 Maurício Martins Reis, não sem razão, em crítica ao posicionamento de Lenio Streck,

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defende que a problemática não é relativa às súmulas em si, que devem ser ligadas ao processo judicial que lhes deu origem, mas sim à forma como elas são aplicadas. Todavia, há de se notar que, logicamente, caso conviesse a pesquisa no texto do precedente, o texto

da súmula não seria sequer necessário, não teria razão de ser. Por isso mesmo, parece que a crítica de Streck, contextualmente, mantém-se procedente: súmulas são textos que buscam a morte da hermenêutica. Ver: REIS, Maurício Martins. Precedentes obrigatórios e sua adequada compreensão… cit., p. 212-216. 47 Nesse sentido: ROSSI, Júlio César. O precedente à brasileira… cit., p. 205-206. 48 Similarmente: MELLO, Patrícia Perrone Campos. Precedentes… cit., p. 147-148. Sobre a ideia de formação estática e dinâmica: “Na formação estática interessa menos a fixação de entendimento que se legitime por si próprio e pela participação conjunta para o fim de se tornar paradigma a ser seguido em outras decisões, e mais o estabelecimento, então da maneira mais célere possível, de alguma decisão que, por vontade do Legislador, sirva de padrão formalmente obrigatório para solução de casos semelhantes. Em outras palavras, na prática a preocupação acaba sendo menos com a obtenção da melhor solução possível

nos padrões e com a participação propiciada pela formação dinâmica, e mais com a formação de alguma solução, qualquer que seja ela, mas desde que formalmente legítima, para servir de padrão para decisão de casos posteriores” (SANTOS, Evaristo Aragão. Em torno do conceito e da formação do precedente judicial… cit., p. 174). 49 ABBOUD, Georges. Súmula vinculante versus precedentes… cit., p. 227-229. Antes mesmo da instituição das súmulas, já apontava nesse sentido: SILVA, Ovídio A. Baptista da. A função dos Tribunais Superiores… cit., p. 298. 50 Destacando a importância das súmulas para o crescimento da preocupação com os precedentes judiciais: BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Súmula, jurisprudência, precedente: uma escalada e seus riscos. Temas de direito processual – nona série. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 310-313. 51 CROSS, Rupert; HARRIS, J. W. Precedent in english law… cit., p. 131-132. 52 SUMMERS, Robert S.; ENG, Svein. Departures from precedent. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 519. 53 “Any regime in which the law can change must then have a set of doctrines and institutional practices that govern the implementation of these changes. We can call this set of norms and arrangements the law of legal change” (BRUHL, Aron-Andrew P. Deciding

when to decide: how appellate procedure distributes the costs of legal change, cit., p. 209). 54 Nesse sentido, Eisenberg defende que a ideia de que o overruling representa uma grande ruptura é um engodo, pois a técnica é utilizada justamente para satisfazer princípios institucionais e em aplicação dos padrões de congruência social e consistência sistêmica. Sobre isso, ver: EISENBERG, Melvin Aron. The nature of the common law… cit., p. 104-105.

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55 DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 122. 56 CROSS, Rupert; HARRIS, J. W. Precedent in english law… cit., p. 127. 57 Nesse sentido, Alexy e Drier afirmam a existência de uma peculiar vinculatividade aos precedentes no direito alemão, fundamentada no requerimento de continuidade que advém da proteção da confiança legítima (ALEXY, Robert; DREIER, Ralf. Precedent in the Federal Republic of Germany… cit., p. 29-30). Os autores falam em uma vinculação prima

facie aos precedentes, diferente da vinculação padrão. Não concordamos com a ideia: toda vinculação a precedente é prima facie, podendo vir a ser superada pelo tribunal competente. Por outro lado, na Inglaterra, já chegou a se afirmar que o papel da confiança legítima tem sido pequeno na House of Lords, cf. CROSS, Rupert; HARRIS, J. W. Precedent

in english law… cit., p. 141. 58 Vale destacar que Eisenberg separa a confiança em duas acepções: a especial e a geral. A especial seria a depositada pelo litigante perante o tribunal que especificamente determinou sua conduta com base em uma norma legal. A geral seria a confiança por membros da sociedade outros que não os litigantes. A previsão dessas formas de confiança seria importante para a modulação de efeitos (EISENBERG, Melvin Aron. The nature of the

common law… cit., p. 48-49). 59 BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK, Neil; MARSHALL, Geoffrey. Precedent in the United Kingdom… cit., p. 340. A House of Lords, por meio do Lord Reid, já afirmou que: “It’s well recognized that we ought not to alter what is presently understood to be the law if that involves any real likelihood of injustice to people who have relied on the present position in arranging their affairs” (Inglaterra – House of Lords – Indyka v. Indyka – Decidido em 1969). Da mesma forma: “It would have been a compelling reason against overruling that decision if it could reasonably be supposed that anyone has regulated his affairs in reliance on its validity” (Inglaterra – House of Lords – Ross-Smith v. Ross-Smith

– Decidido em1963). 60 RAZ, Joseph. The Rule of Law and its virtue. The authority of law. Oxford: Oxford University Press, 2009. p. 222. 61 Assim: EISENBERG, Melvin Aron. The nature of common law… cit., p. 105-127. Igualmente: MELLO, Patrícia Perrone Campos. Precedentes… cit., p. 250-254. O jurista norte-americano e a brasileira, todavia, não vislumbram a questão sob a perspectiva

argumentativa, veem tais passos como princípios. Embora se admita tais pontos como relevantíssimos, deve-se perceber o equívoco em tratá-los como princípios. Ressaltando a necessidade de proteção das expectativas como uma consideração essencial à mudança: CABRAL, Antonio do Passo. A técnica do julgamento-alerta na mudança de jurisprudência consolidada. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, ano 38, vol. 221, 2013, p. 18-19. 62 A segurança é suficiente para lidar com essas situações, sem necessidade de remeter a um novo princípio com base normativa questionável e tirando-lhe um dos seus aspectos mais importantes na contemporaneidade. O chamado “princípio” da confiança legítima,

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inclusive, é atribuído pelos privatistas à boa-fé e pelos publicistas à segurança, o que demonstra a dificuldade de definir as suas bases normativas. Tratando a confiança legítima como princípio, o que não se admite neste trabalho: MARTINS-COSTA, Judith. A ressignificação do princípio da segurança jurídica na relação entre o Estado e os cidadãos: a segurança como crédito de confiança. Revista CEJ, Brasília, n. 27, 2004, p. 113-114; CABRAL, Antonio do Passo. Coisa julgada e preclusões dinâmicas: Entre continuidade, mudança e transição de posições processuais estáveis. Salvador: JusPodivm, 2013. p. 129; ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica… cit., p. 360; TORRES, Heleno Taveira. Direito

constitucional tributário e segurança jurídica: Metódica da segurança jurídica no sistema constitucional tributário. São Paulo: Ed. RT, 2011. p. 209-210; NOVAIS, Jorge Reis. Os

princípios constitucionais estruturantes da república portuguesa. Coimbra, 2011. p. 261-262. Os autores geralmente diferenciam a confiança da segurança pelo fato de aquela ser subjetiva enquanto esta é objetiva. A diferença não se justifica, tanto as hipóteses clássicas da segurança como as que envolvem a confiança legítima são subjetivas, no sentido de que são atribuídas a sujeitos quando há sua incidência; aliás, só uma concepção extremamente racionalista poderia visualizar um princípio exclusivamente objetivo: toda norma, necessariamente, subjetiva-se, no sentido de gerar situações jurídicas de vantagem. 63 Sobre a eficácia temporal da superação dos precedentes judiciais, especialmente a partir da tutela da confiança legítima: EISENBERG, Melvin Aron. The nature of the common

law… cit., p. 127-132. Ver, por todos, quanto ao direito brasileiro: ATAÍDE JR., Jaldemiro Rodrigues de. Precedentes vinculantes e irretroatividade do direito no sistema processual

brasileiro… cit., p. 177-183. 64 MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. Further general reflections and conclusions. Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 537. Destacando a existência de preocupação do Tribunal Supremo da Espanha em distinguir ratio decidendi

de obiter dictum, para “poder fundar el motivo de casación de la jurisprudência”, ver MUÑOZ, Martin Orozco. La creación judicial del derecho y el precedente vinculante… cit., p. 198. 65 Inclusive, não se deve confundir nenhum dos conceitos brasileiros com o de ratio

decidendi. Nesse sentido: MELLO, Patrícia Perrone Campos. Precedentes… cit., p. 122-123. 66 MACCORMICK, Neil. Why cases have rationes and what these are… cit., p. 156. Afirma o autor: “To be fully intelligible, any such doctrine must indicate in some way the element in precedents which is supposed to be binding (if any is) or persuasive in the strongest degree of persuasiveness admitted (…). Thus the identification of the binding or the specially persuasive element in decision is a matter of some importance”. No mesmo sentido: MARSHALL, Geoffrey. What is binding in a precedent. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Ashgate/Dartmouth, 1997. p. 507-509. 67 AARNIO, Aulis. Precedent in Finland. In: MACCORMICK, Neil; SUMMERS, Robert S. (ed.). Interpreting precedents. Aldershot: Dartmouth, 1997. p. 84-85.

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68 DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 113. 69 “Case law is peculiarly revisable in a way that enacted law is not: the judge who carefully articulates a principles is not determining its formulation in future disputes over materially identical facts – the likelihood, rather, is that it will be moulded and remoulded in the hands of successive courts. We might even question whether is correct to speak of precedents being interpreted. Although judges interpret statutes – and will sometimes consider the entire meaning of a statute to depend on the interpretation of a single word within it – they customarily purport to follow or distinguish or overrule precedents. Since the recorded case is not a strict verbal formulation of a principle, only exceptionally will judges conceive their task to be one of interpreting specific words or phrases within a case rather as they might focus on the precise wording of a statute. Instead, they will consider if the case is factually similar to or different from the case to be decided. Case-law, we might say, unlike statute law, tends to me analogized rather than interpreted” (DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 59). 70 “A complexa atividade lógica de interpretação do precedente judicial vale-se, assim, do método de confronto, denominado distinguishing, pelo qual o juiz verifica se o caso em julgamento pode ou não ser considerado análogo ao paradigma” (TUCCI, José Rogério Cruz e. Parâmetros de eficácia e critérios de interpretação do precedente judicial… cit., p. 125). 71 Sobre o conceito de superação antecipada (anticipatory overruling) e sua utilização no direito estadunidense, ver: KNIFFEN, Margaret N. Overruling Supreme Court Precedents: Anticipatory actions by United States Courts of Appeals. Fordham Law Review, vol. 51, 1981, p. 53. Importante notar que, embora a prática seja efetivamente utilizada, em vários casos, pelos tribunais de apelação, a Supreme Court não se manifestou especificamente acerca dela, o que a autora aponta como uma possível estratégia para evitar a disseminação indiscriminada da superação antecipada (p. 59-61). A autora ressalta, ainda, que a técnica também foi utilizada nas cortes distritais, embora tenha sido refutada, por elas mesmas, em outros precedentes (p. 54, nota 10). 72 No direito norte-americano, por exemplo, fala-se em uma série de decisões que não chegam à obrigatoriedade justamente por não serem publicadas, o que se dá nas Court of

Appeals. Sobre isso, ver: SHANNON, Bradley Scott. May stare decisis be abrogated by rule?

Ohio State Law Journal, vol. 67, 2006, p. 652-658. 73 Sobre a cognoscibilidade, ver: ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica… cit., p. 322-329. 74 Sobre a importância da publicidade dos precedentes no common law: DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent… cit., p. 5-7. Obviamente, a publicidade é princípio que independe dos precedentes judiciais: “A publicidade do processo constitui um imperativo de conotação política, introduzido nos textos constitucionais contemporâneos, pela ideologia liberal, como verdadeiro instrumento de controle de atividade dos órgãos jurisdicionais” (TUCCI, José Rogério Cruz e. Garantias constitucionais da publicidade dos atos processuais e da motivação das decisões no Projeto do CPC – Análise e proposta. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, ano 35, vol. 190, 2010, p. 258).

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75 Para uma análise crítica das consequências dos defeitos de fundamentação, ver: SILVA, Beclaute Oliveira. A garantia fundamental à motivação da decisão judicial. Salvador: JusPodivm, 2007. p. 183-196. 76 MITIDIERO, Daniel. Fundamentação e precedente… cit., p. 62-68. Ressaltando o nexo entre contraditório e fundamentação: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Omissão judicial e

embargos de declaração. São Paulo: Ed. RT, 2005. p. 389. A jurista paulista, em outra oportunidade, figura bem a relação: “Todavia, contemporaneamente é comum que se diga que o contraditório tem relação mais expressiva com a atividade do juiz. Este, no momento de decidir, como se fosse um último ato de uma peça teatral, deve demonstrar que as

alegações das partes, somadas às provas produzidas, efetivamente interferiram no seu

convencimento. A certeza de que terá havido esta influência decorre da análise da

motivação da sentença ou acórdão” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. A influência do contraditório na convicção do juiz: fundamentação de sentença e de acórdão. Revista de

Processo, São Paulo: Ed. RT, ano 34, vol. 168, 2009, p. 55). 77 Sobre o ponto, é muito proveitosa a seguinte síntese: “Na quadra teórica do formalismo-valorativo, pois, o direito ao contraditório leva à previsão de um dever de debate entre o juiz e as partes a respeito do material recolhido ao longo do processo. Esse dever de debate encontra a sua expressão mais saliente no quando da decisão da causa, haja vista a imprescindibilidade de constar, na fundamentação da sentença, acórdão ou decisão monocrática, o enfrentamento pelo órgão jurisdicional das razões deduzidas pelas partes em seus arrazoados, exigência de todo afeiçoada ao Estado Constitucional, que é necessariamente democrático. Mais: denota a necessidade de todo e qualquer elemento constante da decisão ter sido previamente debatido entre todos aqueles que participam do processo” (MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil cit., p. 150-151).