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Organizadora Orly Zucatto Mantovani de Assis ANAIS DO I SEMINÁRIO INTERNACIONAL EDUCAÇÃO PARA O SÉCULO XXI 2018

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  • Organizadora

    Orly Zucatto Mantovani de Assis

    ANAIS DO I SEMINRIO INTERNACIONAL

    EDUCAO PARA O SCULO XXI

    2018

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

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    Copyright by autores, 2018

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    Organizadora

    Orly Zucatto Mantovani de Assis

    EDUCAO PARA O SCULO XXI

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    DEDICATRIA

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    APRESENTAO

    O I Seminrio Internacional organizado e promovido pelo Laboratrio

    de Psicologia Gentica da Faculdade de Educao da UNICAMP e realizado de

    05 a 07 de maro do corrente ano, teve por finalidade oferecer um espao de

    aprofundamento e ampliao de conhecimentos, que possibilitasse discusso e

    reflexo sobre a Educao do Sculo XXI a partir dos quatro pilares propostos por

    Jacques Delors: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a

    viver juntos, os quais foram adotados pela UNESCO e declarados em seu relatrio

    Educao: um tesouro a descobrir. Buscando assim, interrogar o sentido dos

    referidos pilares e do discurso da educao que neles se fundamentam, os

    profissionais da educao podem escolher com mais segurana dentre as prticas

    educativas que utilizam, quais so as mais eficazes a fim de que os seus alunos

    possam aprender a conhecer, pois consideram prazeroso o ato de compreender ou

    construir o conhecimento. Para isso, necessrio que o aluno construa as estruturas

    de pensamento especficas para conhecer, por meio das quais desenvolvem o

    raciocnio dedutivo, indutivo e a memria que possibilitam a aquisio do

    conhecimento fsico, do conhecimento lgico matemtico e o do conhecimento

    social, que correspondem a todo contedo das disciplinas que compem os

    currculos da educao infantil ao ensino mdio. Sabemos que sem ter construdo

    essas estruturas que so os instrumentos para aquisio do conhecimento, segundo

    Piaget, a crianas, os pr-adolescentes, jovens e adultos no podem compreender

    nada do que a escola lhes ensina. Alm disso, a tarefa da educao estar quase

    completa quando os estudantes aprendem a fazer, isto , quando eles se tornam

    capazes de ir alm do conhecimento terico adquirido e saberem utiliz-lo na vida

    prtica ao exercer a profisso que escolheram como meio de subsistncia e

    realizao pessoal e profissional. O saber fazer ou dominar competncias implica

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    necessariamente o aprender a conhecer, pois ambos transformam o aluno num

    tcnico ou profissional capaz de aplicar esses saberes tericos e prticos no

    trabalho que realiza. Segundo Jean Piaget, a interao social um dos fatores do

    desenvolvimento e da aprendizagem. Entretanto, para que esse fator desempenhe

    seu papel, preciso que nossos alunos em toda a sua trajetria escolar tenham tido

    a oportunidade de aprender a viver com os outros compreend-los, realizar

    trabalhos em equipes, cooperar, trocar pontos de vista, tanto com os colegas que

    apresentam dificuldades de aprendizagem quanto com aqueles que no tm

    dificuldades, assim tambm com relao aos que tm crenas e valores semelhantes

    aos seus ou no. Para aprender a ser, imprescindvel que o aluno desenvolva a

    autonomia intelectual e moral, a criatividade, a sensibilidade, a espiritualidade, a

    responsabilidade, o respeito pelo outro e, ademais esteja comprometido em

    contribuir para o progresso tecnolgico, material e cultural de sua comunidade.

    Nesse sentido, para que a qualidade de nossa educao melhore, imperativo que

    esses quatro pilares sejam considerados igualmente.

    Com certeza as palestras, conferncias, oficinas, relatos de pesquisas, relatos de

    experincias apresentados nesse I Seminrio Internacional, bem como as reflexes

    e o debate de ideias propiciadas por esse evento podero contribuir para a melhoria

    de nossa da Educao. A participao de todos que estiveram conosco fez aumentar

    nossa esperana de que isso acontea.

    Este livro contm relatos de pesquisas, relatos de experincias, propostas de

    minicursos e oficinas que apresentam as ideias e preocupaes dos participantes

    deste evento, que reuniu profissionais dos diferentes nveis de ensino e renomadas

    universidades brasileiras e de outros pases. Seus trabalhos elaborados a partir de

    diferentes perspectivas tm em comum os quatro pilares da educao que esto

    fundamentam a educao deste sculo e tambm a procura de meios eficazes para

    aprimorar a formao dos professores que fundamentam sua prtica docente nos

    princpios construtivistas. Sejam de natureza terica ou representem experincias

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    concretas desenvolvidas em instituies ou salas de aulas, esses trabalhos refletem

    uma viso sobre a prtica da educao inspirada na teoria piagetiana, a qual implica

    que o trabalho pedaggico seja organizado de modo quer na escola um ambiente

    escolar de tal ordem que torne possvel ao aluno elaborar, at a concluso, os

    instrumentos indispensveis de adaptao que so as operaes da lgica e

    construir valores e princpios morais que o torne capaz de exercer com autonomia

    seus deveres de cidado. Isso s ser possvel se a escola tiver por finalidade

    promover o desenvolvimento intelectual, moral, social e afetivo de seus alunos.

    Os trabalhos contidos nesta publicao, cujos temas esto intimamente

    relacionados com os saberes e fazeres dos profissionais da educao deixam claro

    tambm um posicionamento que encerra a convico de que a educao pode se

    converter em um importante instrumento para ajudar seus alunos a conquistar a

    autonomia, tornarem-se pessoas criativas, crticas, alegres e felizes. Mais do que

    nunca se tem conscincia de que nossa educao s se transformar na medida em

    que os professores se apropriarem cada vez mais do conhecimento para isso

    necessrio.

    Resultado dos esforos de uma equipe que integra o Laboratrio de

    Psicologia Gentica, que h mais trinta anos vem desenvolvendo atividades de

    docncia e prestao de servios para a coletividade a partir de estudos e pesquisas

    realizados em nossa Universidade, a realizao do I Seminrio Internacional a

    Educao de Sculo XXI se tornou possvel graas aos esforos e a cooperao da

    comisso organizadora. Esta publicao foi possvel graas aos esforos

    incansveis da comisso cientfica e da Profa. Dra. Andra Patapoff Dal Coleto que

    se encarregou da editorao final. A todos queremos expressar nossos sinceros

    agradecimentos.

    Somos gratos tambm equipe do Centro de Convenes da Unicamp, por

    todo apoio, orientao e esforos envidados junto comisso organizadora para

    que fosse possvel alcanar nossos objetivos.

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    Agradecemos a equipe administrativa do Laboratrio de Psicologia

    Gentica da Faculdade de Educao da Unicamp que com entusiasmo e

    competncia tem se encarregado da logstica para a promoo de nossos cursos de

    extenso universitria e de nossos eventos. Somos gratos tambm Rafaela Braga

    Miranda que atende prontamente com alegria e de nossos s nossas necessidades

    burocrticas.

    Nossa gratido se estende tambm a Saberes Consultoria e Assessoria

    Educacional cujo apoio foi inestimvel para que esse I Seminrio Internacional

    tivesse xito.

    Dedicamos esta publicao a todos aqueles profissionais que decidiram

    contribuir para que as crianas com as quais convivem, sejam autoconfiantes,

    autnomas e mais felizes.

    Campinas, 01 maro de 2018.

    Orly Zucatto Mantovani de Assis

    Coordenadora do LPG/FE/Unicamp

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    SUMRIO

    RELATO DE PESQUISA - APRENDER A CONHECER ................................ 18

    CONHECE-TE A TI MESMO E AOS TEUS DIREITOS: UM ESTUDO SOBRE A

    CONSTRUO DO CONHECIMENTO SOCIAL NA ESCOLA ........................ 19

    RELATO DE PESQUISA - APRENDER A SER .............................................. 31

    A PSICOGNESE DA GENERALIZAO: UM ESTUDO EVOLUTIVO

    PIAGETIANO ........................................................................................................ 32

    PROFESSORES, SEUS SABERES E SUA IDENTIDADE PROFISSIONAL ..... 44

    RELATO DE PESQUISA - APRENDER A FAZER ......................................... 57

    O PROEPRE EM GUAXUP/MG: O QUE DIZEM PROFESSORES? ................ 58

    OS TEMPOS E ESPAOS NA PR-ESCOLA: O BRINCAR SRIO? ............. 71

    A IMPORTNCIA DO PROGRAMA DE MONITORIA NO ENS. SUPERIOR . 84

    UMA PRTICA DE RESOLUO DE CONFLITOS DE PROFESSORES........ 94

    CONCEPES DE PROFESSORES EM RELAO AO DESENVOLVIMENTO

    MORAL E SUAS INTERAES COM CRIANAS DE 0 A 3 ANOS .............. 107

    RELATO DE PESQUISA - APRENDER A VIVER JUNTOS - .................... 120

    CONCEPO DE ALUNOS E PROF. SOBRE A PRTICA DE RESOLUO

    DE CONFLITOS NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL ........ 121

    ESCOLA COM GNERO, ESCOLA COM SEXUALIDADES .......................... 134

    O CLIMA ESCOLAR POSITIVO E O DESEMPENHO DO ESTUDANTE

    MEDIANTE DADOS CONTEXTUAIS .............................................................. 147

    RELATOS DE EXPERINCIA - APRENDER A CONHECER ................... 161

    INTRODUO AO ENSINO DA PROGRAMAO JAVASCRIPT POR MEIO

    DA PLATAFORMA KHAN ACADEMY ............................................................ 162

    METODOLOGIAS ATIVAS E O ENSINO DA ARITMTICA:

    MULTIPLICAO .............................................................................................. 172

    ARITMTICA: PROPOSTA DE INTERVENO COM METODOLOGIAS

    ATIVAS ................................................................................................................ 186

    A BASE CURRICULAR DIVERSIFICADA DO PROGRAMA DE ENSINO200

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    INTEGRAL NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM: PRATICA PRATICA

    INTERDISCIPLINAR ENTRE SOCIOLOGIA E ORIENTAO DE ESTUDOS

    200

    ENSINO DE MATEMTICA EM ESCOLAS DEMOCRTICAS: UMA

    EXPERINCIA .................................................................................................... 211

    CONHECIMENTO FSICO: EXPERINCIAS MARAVILHOSAS ............... 220

    RELATO DE EXPERINCIA - APRENDER A SER ..................................... 232

    O PAPEL DO ALUNO NAS INSTITUIES QUE SE AUTODENOMINAM

    INOVADORAS .................................................................................................... 233

    VOC PREFERE BRINCAR OU COMPRAR? ................................................... 246

    EDUCAO DE 0 A 3 ANOS A INTENCIONALIDADE DA ROTINA DIRIA

    DA E.M.E.I. CRECHE CENTENRIO ............................................................. 259

    FORMAO CONTINUADA DOS GESTORES ESCOLARES: DESAFIOS E

    POTENCIALIDADES .......................................................................................... 270

    RELATOS DE EXPERINCIAS - APRENDER A FAZER ........................... 279

    DA COMPREENSO DO MTODO AO REALISMO NOMINAL: ................. 280

    O MUNDO PELA CRIANA .............................................................................. 280

    REFLEXO SOBRE O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO NA FORMAO

    DO CIDADO DO SC. XXI A PARTIR DE PROVAS OPERATRIAS DE

    PIAGET ................................................................................................................ 293

    PROEPRE: PRTICAS PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL ............. 307

    PRTICAS PEDAGGICAS DO PROEPRE - PROMOVENDO UM

    TRABALHO PAUTADO NA ESCUTA DAS CRIANAS ................................ 319

    RELATOS DE EXPERINCIAS - APRENDER A VIVER JUNTOS .......... 331

    DORMIR NA ESCOLA PODE? ........................................................................... 332

    COMO CONVIVER COM PESSOAS QUE PENSAM DIFERENTE DE NS?

    SER QUE CONVERSANDO A GENTE SE ENTENDE? RELATO DE UMA

    EXPERINCIA SOBRE POSSVEIS CONEXES ENTRE OS CONFLITOS DA

    ORALIDADE E A QUESTO FILOSFICA DO PACTO SOCIAL ................. 341

    PROJETO VALORES PARA CONVIVNCIA .................................................. 356

    DA TERRA MEMRIA: A CONSTRUO DA IDENTIDADE ................... 365

    PAZ SE FAZ COM ARTE .................................................................................... 376

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    EDUCAO PARA A PAZ E TOLERNCIA - FORMAO REALIZADA NO

    ANO DE 2016 PARA PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL NA

    SECRETARIA DA EDUCAO DA REDE MUNICIPAL DE ITATIBA SP. .. 390

    A PAZ SE APRENDE EM QUALQUER LNGUA ............................................. 400

    PSTER - APRENDER A CONHECER .......................................................... 410

    O USO DOS BLOCOS LGICOS E A CONSTRUO DA ESTRUTURA DE

    CLASSIFICAO ............................................................................................... 411

    HORTA E SADE: UMA EXPERINCIA INTERDISCIPLINAR .................... 423

    NO ENSINO INTEGRAL DESENVOLVIDA NA DISCIPLINA ELETIVA DA

    GRADE CURRICULAR DIVERSIFICADA ....................................................... 423

    AVALIANDO O MODO PRETENDIDO DAS ESTRATGIAS DE

    APRENDIZAGEM NO ENSINO TCNICO EM ESTUDANTES BRASILEIROS

    434

    PSTER - APRENDER A FAZER .................................................................... 446

    UM NOVO OLHAR PARA A SALA DE AULA: EXPERINCIAS DE ALUNAS

    DO CURSO DE EXTENSO DO PROEPRE ENSINO FUNDAMENTAL .... 447

    O PROGRAMA DE MONITORIA DE UMA INSTITUIO DE ENSINO

    SUPERIOR ........................................................................................................... 458

    O DESENHO NO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA PROPOSTA DE

    INTERVENO .................................................................................................. 468

    MEU QUERIDO DIRIO: A ESCRITA DE TEXTOS DE AUTORIA POR

    CRIANAS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL ................. 480

    PSTER - APRENDER A SER ......................................................................... 491

    O PROJETO DE VIDA NA ESCOLA DO PROGRAMA ENSINO INTEGRAL 492

    (RE)APRENDER A SER PROFESSOR? O PIBID COMO LCUS DE

    APRENDIZAGEM DOCENTE ............................................................................ 502

    DESENVOLVIMENTO MORAL: MUITO SE FALA, MAS O QUE SE TEM

    FEITO?.................................................................................................................. 513

    PSTER - APRENDER A VIVER JUNTOS.................................................... 524

    O PROTAGONISMO JUVENIL NA ESCOLA DO PROGRAMA ENSINO

    INTEGRAL: ESPAOS E VIVNCIAS .............................................................. 525

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    15

    COMUNICAO ORAL - APRENDER A FAZER ....................................... 536

    A TEORIA PSICOGENTICA DE JEAN PIAGET E A METODOLOGIA ATIVA

    DE EDUCAO MUSICAL DE JACQUES-DALCROZE ................................ 537

    COMUNICAO ORAL - APRENDER A CONHECER .............................. 549

    A PESQUISA CIENTFICA NO CONTEXTO DA FORMAO PARA O

    TRABALHO: SISTEMA DE COMPLEXOS ....................................................... 550

    MATEMTICA NA PR-ESCOLA, IMPLICAES DA TEORIA DE JEAN

    PIAGET ................................................................................................................ 562

    AS PRTICAS DE LEITURA E A FORMAO DO INDIVDUO LEITOR NAS

    CLASSES DO PROEPRE ..................................................................................... 575

    OS ESTMULOS E A AQUISIO DA LINGUAGEM: DESENVOLVIMENTO

    INFANTIL EM PERSPECTIVA .......................................................................... 587

    BLACKOUT DOCENTE: COMO SUPERAR A CRISE DA TRANSIO

    PARADIGMTICA E INSPIRAR PARA APRENDER A CONHECER? .......... 601

    CURRCULO DA EDUCAO INFANTIL COMO REFLEXO DE UMA

    ESCOLA DE EDUCAO INFANTIL DE QUALIDADE ................................ 618

    O USO DE APARELHOS ELETRNICOS DE TELA E A CONSTRUO DAS

    ESTRUTURAS LGICAS ELEMENTARES E INFRALGICAS DE ESPAO

    634

    CONSIDERAES SOBRE A IMPORTNCIA DAS IDEIAS PIAGETIANAS

    PRESENTES NO PROCESSO DE FORMAO CONTINUADA DE

    PROFESSORES.................................................................................................... 656

    COMUNICAO ORAL - APRENDER A SER ............................................. 671

    ELEANOR RIGBY: OS BEATLES E O VCUO EXISTENCIAL ................... 672

    ALGUMAS CONSIDERAES SOBRE A AUSNCIA DE SENSIBILIDADE

    MORAL E O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DOS ALUNOS QUE

    PRATICAM O BULLYING ................................................................................. 686

    APRENDER PARA SER: ESCOLA E FORMAO HUMANA ....................... 708

    PROPOSTA DE DISCUSSO SOBRE A EVOLUO DO APARATO

    COGNITIVO EM FUNO DAS TROCAS COM O MEIO PSICO-SOCIAL

    COMO CONSTRUO EPIGENTICA NA PERSPECTIVA DA

    EPISTEMOLOGIA GENTICA DE JEAN PIAGET .......................................... 723

    A FORMAO TICO-MORAL E O ENSINO DE CINCIAS ........................ 738

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    16

    ALGUMAS CONSIDERAE SOBRE A AUSNCIA DE SENSIBILIDADE

    MORAL E O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DOS ALUNOS QUE

    PRATICAM O BULLYING ................................................................................. 753

    COMUNICAO ORAL - APRENDER A VIVER JUNTOS ....................... 775

    PENSAMENTO E LINGUAGEM NA TEORIA DE PIAGET: ITINERRIO,

    CONTRAPONTOS E IMPLICAES AO COMUNICATIVA ................ 776

    APRENDIZAGEM COOPERATIVA: REFLEXES FRENTE S DEMANDAS

    DA ATUALIDADE .............................................................................................. 792

    VOC QUER BRINCAR COMIGO? A IMPORTNCIA DO BRINCAR NA

    PRIMEIRA INFNCIA ........................................................................................ 807

    RESUMOS: CONFERNCIAS, MESAS E MINICURSO ............................. 820

    A ESCOLA E A CONSTRUO DE COMPETNCIAS PARA A EDUCAO

    DESSE SCULO .................................................................................................. 821

    AO E PRAZER ................................................................................................ 822

    O TRABALHO COM O JOGO NA CONSTRUO DO CONHECIMENTO: AS

    ABSTRAES E O CONHECIMENTO LGICO-MATEMTICO ................. 828

    A CONSTRUO DA NOO DE ESPAO NA CRIANA ........................... 829

    JOGOS TA-TE-TI E KALAH: ESTRATGIA, DESENVOLVIMENTO E

    APRENDIZAGEM ............................................................................................... 831

    FUNES EXECUTIVAS E SUAS RELAES COM O DESENVOLVIMENTO

    MORAL DE JEAN PIAGET................................................................................. 832

    O CURRCULO CONSTRUTIVISTA E AS ATIVIDADES NA EDUCAO

    INFANTIL ............................................................................................................ 834

    ATIVIDADES DIVERSIFICADAS NO PROEPRE DO

    ENSINOFUNDAMENTAL I ............................................................................... 835

    PILAR DA EDUCAO PARA PAZ .................................................................. 837

    PROTAGONISMO INFANTO-JUVENIL: QUANDO ....................................... 839

    A AJUDA PARTE DOS IGUAIS PARA A SOLUO DO BULLYING ........... 839

    A PRTICA DOCENTE NA FORMAO DE PROFESSORES NUMA

    PERSPECTIVA PIAGETIANA ........................................................................... 840

    METODOLOGIAS ATIVAS NA EDUCAO BSICA: A POSSIBILIDADE DE

    INTEGRAO DO CURRCULO E AS TECNOLOGIAS DIGITAIS .............. 841

    EDUCAO FINANCEIRA E PARA O CONSUMO ACESSO QUALIDADE

    DE VIDA............................................................................................................... 842

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    17

    OS DESAFIOS DA EDUCAO INFANTIL E A BASE NACIONAL COMUM

    CURRICULAR (BNCC)....................................................................................... 848

    SOBRE OS PILARES DA EDUCAO NO ENSINO SUPERIOR ................... 851

    POS GRADUAO EM EDUCAO NO BRASIL EM DEBATE

    MODERNIZAR E FORMAR PESQUISADORES .............................................. 853

    A CONVIVNCIA TICA NA ESCOLA E OS PROCESSOS FORMATIVOS 856

    ESCOLA BOA ESCOLA PARA TODOS ......................................................... 858

    A INCLUSO ESCOLAR UM DESAFIO AO MODO TRADICIONAL DE

    ENSINAR. ............................................................................................................ 858

    A CONSTRUO DO RELACIONAMENTO DE PERSPECTIVAS ESPACIAIS

    E A COMPREENSO DE CONTEDOS DA ASTRONOMIA NA ESCOLA .. 860

    UMA ESCOLA ABERTA PARA TODOS: CONSTRUINDO UM CAMINHO...

    862

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    18

    RELATO DE PESQUISA APRENDER A CONHECER

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    19

    CONHECE-TE A TI MESMO E AOS TEUS DIREITOS: UM ESTUDO

    SOBRE A CONSTRUO DO CONHECIMENTO SOCIAL NA ESCOLA

    Camila Fernanda da Silva - [email protected]

    Faculdade de Filosofia e Cincias UNESP, Campus de Marlia

    Resumo

    Este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa-ao, com anlise de

    natureza qualitativa e quantitativa, realizada luz da Epistemologia Gentica e dos

    estudos sobre o conhecimento social. Foram participantes desta pesquisa 19

    crianas, entre sete e nove anos de idade, alunos de uma turma de 3 ano do Ensino

    Fundamental de uma escola pblica municipal do interior do estado de So Paulo.

    Os participantes foram escolhidos por se tratar da turma atribuda pesquisadora

    como professora regular no ano de 2016. Os procedimentos para o

    desenvolvimento desta investigao foram delimitados segundo as orientaes para

    a pesquisa-ao. Na fase exploratria, tendo como objetivo avaliar as ideias que as

    crianas tinham sobre os seus direitos, foi aplicada uma entrevista baseada no

    mtodo clnico-crtico piagetiano, contendo histrias envolvendo diferentes direitos

    infantis e suas respectivas violaes. Na fase de ao, os participantes vivenciaram

    uma interveno pedaggica sob o enfoque construtivista, por meio de atividades

    com msicas, vdeos, histrias, desenhos, entre outras, tendo como objetivo

    favorecer a construo do conhecimento social e o avano na compreenso da

    noo social especfica. Finalmente, na terceira e ltima fase, de avaliao, foram

    reaplicadas as entrevistas clnicas, com a finalidade de verificar a evoluo da

    noo social pesquisada aps a implementao da interveno pedaggica. Os

    dados foram analisados segundo os nveis de compreenso da realidade social. Os

    resultados da fase exploratria demonstraram que as crianas possuam noes

    bastante simplistas sobre seus direitos e, muitas vezes, nem os reconheciam nas

    histrias. Durante e realizao das atividades propostas, foi possvel observar o

    envolvimento da turma, bem como os conflitos e necessidades que surgiam sobre

    SEMINRIO INTERNACIONAL

    EDUCAO PARA O SCULO XXI 1.

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    20

    os diferentes temas abordados. Ao final da interveno pedaggica, na fase de

    avaliao, percebemos modificaes na maneira de pensar dos sujeitos ao

    analisarem as situaes descritas nas histrias. Houve um avano significativo na

    maneira como os sujeitos compreendem seus direitos, assim como reconhecem

    suas diferentes formas de respeito, garantia e violao.

    Palavras-Chave: Epistemologia Gentica; Conhecimento Social; Direitos das

    Crianas. Interveno Pedaggica Construtivista.

    Introduo

    Neste trabalho, apresentamos os dados referentes pesquisa de mestrado

    intitulada A construo da noo de direito em alunos do 3 ano do Ensino

    Fundamental: uma pesquisa-ao na perspectiva piagetiana (SILVA, 2017) que

    buscou ouvir e compreender o que as crianas pensam/sabem sobre seus direitos. A

    pesquisa aqui descrita faz parte de uma srie de investigaes que vem sendo

    levadas a efeito nas linhas de pesquisa Construo do Conhecimento Social e

    Construo de ambientes pedaggicos pautados no construtivismo do Grupo de

    Estudos e Pesquisas em Aprendizagem e Desenvolvimento na Perspectiva

    Construtivista (GEADEC) da FFC/UNESP, campus de Marlia-SP.

    A justificativa da temtica dos direitos das crianas no trabalho de Silva

    (2017) se deu pela realidade do contexto escolar da professora/pesquisadora. Ao

    iniciarmos nossa trajetria como docente na Educao Bsica, nos deparamos com

    questes bastante problemticas que apesar da necessidade de serem discutidas por

    seu grande teor educativo e poltico, raras vezes aparecem como foco de nossas

    discusses junto a nossos alunos. Aspectos como as diferenas sociais, tnicas,

    raciais, culturais, de gnero, de religio e, ao mesmo tempo, dos direitos, apesar de

    parecerem compor o cotidiano escolar, tm pouqussimo espao de reflexo para

    serem debatidos ou, simplesmente, reconhecidos como importantes. Assim sendo, a

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    21

    temtica dos direitos das crianas emergiu das/nas interaes cotidianas da

    professora/pesquisadora com seus alunos enquanto sujeitos de pesquisa.

    Desde sua promulgao, em 1990, o ECA, como legislao vigente,

    consagra em seu texto a participao da criana na sociedade e, por consequncia,

    refora a ideia de que a criana no pode ser ignorada em sua opinio sobre os

    aspectos que lhe dizem respeito.

    A Lei n. 11.525 (BRASIL, 2007), em vigor desde sua data de sua

    publicao, em 25 de setembro de 2007, alterou a Lei de Diretrizes e Bases da

    Educao (LDB) (BRASIL, 1996) determinando a incluso obrigatria, no

    currculo do Ensino Fundamental, de contedos que tratem dos direitos das

    crianas e adolescentes, tendo o ECA como diretriz. O objetivo no foi o de criar

    uma nova disciplina, mas sim trabalhar a questo nas disciplinas que j existem,

    tornando o Estatuto presente no dia-a-dia da escola.

    Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educao Bsica

    (BRASIL, 2013), os componentes curriculares e as reas de conhecimento devem

    articular a seus contedos, a partir das possibilidades abertas pelos seus

    referenciais, a abordagem de temas abrangentes e contemporneos, que afetam a

    vida humana em escala global, regional e local, bem como na esfera individual.

    Nesse contexto, tambm aparecem os direitos das crianas e adolescentes, de

    acordo com o ECA, como tema que deve permear o desenvolvimento dos

    contedos da base nacional comum e da parte diversificada do currculo, assim

    como as temticas: sade, sexualidade e gnero, vida familiar e social.

    Entendemos que nossas crianas, independentemente de seu contexto,

    devem ser escutadas e enxergadas em suas singularidades para no permanecerem

    assistindo passivas s inmeras violaes de seus direitos ou pior, como vtimas.

    Assim, com base no referencial piagetiano sobre a construo do conhecimento e,

    corroborando os trabalhos de Delval e Padilla (1997 apud SARAVALI, 1999),

    Chakur et al. (1998), Saravali (1999), Barroso (2000) e Trevisol (2002),

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    22

    defendemos que para se compreender os direitos e poder reivindic-los, exerc-los

    e proteger-se no basta apenas ter contato com eles, reproduzindo-os sem, ao

    menos, lhes atribuir significados, afinal, o conhecimento adquirido por meio de

    uma construo e reelaborao individual do sujeito.

    O objetivo primordial de Piaget, nas pesquisas em que realizou, foi o de

    compreender como surge o conhecimento e de demonstrar, por meio de estudos

    criteriosos, que o sujeito tem papel fundamental e singular na construo de novos

    conhecimentos. Assim, passou sua vida estudando e buscando compreender a

    elaborao de novos conhecimentos, por meio da construo que o sujeito realiza

    em interao com o meio fsico e social. Os trs tipos de conhecimento estudados

    por Piaget, isto , o conhecimento fsico, o conhecimento lgico-matemtico e o

    conhecimento social so diferenciados na obra piagetiana de acordo com suas

    fontes (gnese) e modos finais de estruturao (KAMII; HOUSMAN, 2002).

    Apesar de menos explorado, o embrio do conhecimento social se encontra

    na obra piagetiana, de modo que seus seguidores deram continuidade aos seus

    estudos (PIAGET; WEIL, 1951). O conhecimento social nasce nas interaes entre

    os indivduos e das transmisses sociais e culturais que acontecem ao decorrer da

    vida. Desse ponto de vista, as crianas e os adolescentes elaboram, durante o longo

    perodo de seu desenvolvimento, noes e ideias especficas referentes aos diversos

    aspectos da realidade social, por meio de um processo de construo que ocorre

    desde o nascimento.

    No que diz respeito natureza do conhecimento social, Chakur (2011, p.

    169) afirma que [...] pessoas, fenmenos sociais e instituies podem ser,

    igualmente, objetos de conhecimento e que a interao sujeito-objeto pode, ela

    prpria, revelar-se de natureza mais propriamente social. Por sua vez, Delval

    (2007, p. 21), acerca das especificidades das representaes sobre o mundo social,

    diz que [...] tienen algunas caractersticas peculiares que las diferencian de otras

    representaciones, debido al carcter propio del conocimiento social.

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    23

    O conhecimento social, como objeto de conhecimento, segundo Enesco et

    al. (1995), produzido em um contexto social que adquire o seu significado no seio

    das relaes com os outros. Esse objeto de conhecimento pode se caracterizar por

    diferentes dimenses, tais como: o conhecimento do eu e dos outros (conhecimento

    psicolgico ou pessoal), as relaes interpessoais, os papis sociais, as normas que

    regulam as condutas dentro do grupo social, o funcionamento e a organizao da

    sociedade (economia, poltica, etc).

    Os estudos referentes ao conhecimento social nos mostram que no se pode

    chegar diretamente por uma transmisso ou do nada por simples maturao, s

    explicaes a respeito das questes da realidade social, como por exemplo,

    econmicas, polticas ou das relaes sociais, sendo preciso que as ideias sejam

    construdas por meio de um processo individual e lento.

    Durante o desenvolvimento, a criana vai formando representaes sobre os

    diferentes aspectos da sociedade [...] resultado de uma atividade construtiva a

    partir de elementos fragmentados que recebe e seleciona (DELVAL, 1989, p.

    245). Sobre esse paulatino processo de construo [...] lo importante es ver cmo

    un individuo se hace adulto dentro de una sociedad determinada y va adquiriendo

    la ideologa de esa sociedad; y tambin cmo va entendendo las instituciones

    sociales, las reglas de funcionamiento social, etc. (DELVAL, 2007, p. 8-9).

    Destacamos que na perspectiva do conhecimento social, a interao social

    reconhecida nesse processo de construo, afinal, sabemos que os sujeitos

    aprendem uns com os outros, todavia, cada indivduo tem que realizar um trabalho

    bastante pessoal e, portanto, singular na construo de suas noes sociais. Assim,

    faz-se preciso compreender como acontece o processo de desenvolvimento das

    concepes e ideias sobre o mundo pelas crianas, pois suas representaes so

    construdas e no automticas (DELVAL, 1991).

    Tais explicaes e interpretaes acerca do mundo social no so

    semelhantes s dos adultos e nem foram ensinadas, todavia, [...] so comuns a

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    24

    crianas de uma mesma faixa etria, mesmo provenientes de meios sociais e

    culturais distintos. (CHAKUR, 2011, p. 176). Delval (2002) nos explica que a

    evoluo das concepes sobre o mundo social ocorre em trs nveis, ao longo do

    desenvolvimento, considerando que essas ideias podem se transformar,

    caracterizando a existncia de uma evoluo. O autor abordou essa evoluo

    propondo a existncia de nveis de compreenso da realidade social. Em linhas

    gerais, esses nveis tm por objetivo demonstrar os progressos do conhecimento da

    sociedade, bem como mostrar as semelhanas existentes na construo de

    diferentes noes sociais (DELVAL, 2002).

    As pesquisas referentes construo do conhecimento social corroboram

    aquilo que a teoria piagetiana acreditava ser o papel ativo do sujeito que conhece.

    A criana realiza uma tarefa individual que nada tem a ver com uma assimilao

    passiva; isso significa que as representaes que elabora no so simples cpias das

    dos adultos (DELVAL, 2007).

    A partir disso, temos uma de nossas mais importantes tarefas na escola:

    possibilitar que as crianas tenham voz e vez para exprimirem sua opinio e viso

    de mundo. Assim, sem a pretenso de questionar a efetividade da legislao

    destinada proteo das crianas e dos adolescentes, investigamos as ideias que

    alunos do Ensino Fundamental tm sobre os direitos das crianas.

    Desenvolvimento

    A pesquisa aqui descrita realizou-se em uma Escola Municipal de Ensino

    Fundamental (EMEF), localizada numa cidade do interior do estado de So Paulo.

    A turma escolhida foi um 3 ano do Ensino Fundamental com 19 alunos

    regularmente matriculados, com idade entre sete e nove anos de idade, por se tratar

    da sala atribuda pesquisadora, como professora regular da turma em 2016.

    Objetivou-se avaliar as ideias que as crianas tm sobre os seus direitos,

    realizamos a aplicao de uma entrevista baseada no mtodo clnico-crtico

    piagetiano (CHAKUR et al., 1998) e no trabalho de Delval (1997) envolvendo

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    25

    diferentes direitos infantis e suas respectivas violaes. As histrias referiam-se ao

    direito educao, alimentao, proteo contra maus-tratos, seguidas de perguntas

    gerais sobre os direitos.

    Os procedimentos para o desenvolvimento desta investigao foram

    delimitados de acordo com as orientaes para a pesquisa-ao, dividindo-se em

    trs principais momentos, sendo uma fase exploratria, uma fase de ao e, por

    ltimo, uma fase de avaliao, conforme o descrito por Thiollent (2011). Os dados

    foram analisados segundo os nveis de compreenso da realidade social (DELVAL,

    2002).

    Na fase exploratria, as respostas da maioria dos sujeitos de nossa amostra

    foram enquadradas no nvel I de compreenso da realidade social. Nesse nvel, as

    crianas embasam suas explicaes nos aspectos mais visveis da situao, naquilo

    que aparente e possvel de ser observado. Por assim dizer, os conflitos so pouco

    perceptveis e, quando questionados a respeito da veracidade das histrias, os

    sujeitos demonstravam no acreditar que as situaes-problema descritas fossem

    possveis de acontecer na vida real.

    Para tais sujeitos, a situao da criana que no vai escola, por exemplo,

    parecia algo impossvel de se concretizar, porque nenhum pai gostaria ou admitiria

    que um filho no frequentasse a escola. Alm disso, os direitos so, quase sempre,

    confundidos com deveres e obrigaes. Na sequncia, exemplos de respostas desse

    nvel considerado mais elementar:

    ALE (7;10): O que voc acha dessa histria? Eu acho que um mito.

    Como assim um mito? Porque todos os filhos tm que ir pra escola. Por

    que todos os filhos tm que ir pra escola? Porque ningum nasce

    sabendo. Ento todos tm que ir escola.

    KAI (8;3): Voc acha que as crianas tm direitos? Tem. Quais so

    eles? tipo assim, no xingar a professora? Para voc isso um

    direito? Sim. Quais mais? No xingar a professora, no bater nos

    amigos.

    Durante a fase de ao foram feitas alteraes no ambiente da sala de aula,

    pautadas em princpios construtivistas, segundo as orientaes da metodologia

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    26

    ativa do PROEPRE Programa de Educao Infantil e Ensino Fundamental

    (ASSIS; ASSIS, 2002). Nosso objetivo era o de propiciar um espao privilegiado

    para a discusso da temtica por meio de diferentes atividades e, da mesma forma,

    favorecer as interaes dos sujeitos com o meio, com seus pares e, por assim dizer,

    com a professora/pesquisadora.

    A interveno pedaggica, foi composta de 35 atividades diferenciadas,

    sendo coletivas, diversificadas e individuais enfocando a temtica dos direitos das

    crianas, bem como formas de violaes. As atividades foram propostas utilizando

    como recurso: vdeos, histrias, msicas, interpretao de imagens, confeco de

    cartazes, produes de desenhos e textos, criao de roteiros teatrais, apresentao

    teatral e de seminrios, entre outros. Tais atividades visaram a construo de

    noes/explicaes sociais e no somente de informaes referentes ao assunto

    tratado. Para tanto, o espao da sala de aula foi modificado para se aproximar ao

    mximo de um ambiente sociomoral construtivista.

    Finalmente, na terceira e ltima fase, de avaliao, foram reaplicadas as

    entrevistas clnicas, com a finalidade de verificar a evoluo da noo social

    pesquisada aps a implementao da interveno pedaggica com enfoque na

    construo do conhecimento social das noes de direito.

    Na fase de avaliao, encontramos sujeitos com respostas caractersticas do

    nvel II de compreenso da realidade social. As crianas desse nvel, comeam a

    fazer consideraes para alm dos aspectos mais superficiais ou evidentes das

    situaes-problema relatadas nas histrias. As relaes passam a ser sociais ou

    institucionalizadas e no mais pessoais. Os conflitos passam a ser mais percebidos

    e os sujeitos at ponderaram que certos profissionais ou instituies poderiam

    contribuir na resoluo dos conflitos envolvidos nas histrias, por meio da

    reivindicao dos direitos ou pela punio do responsvel pela violao, por meio

    da ao policial ou do Conselho Tutelar, como mostra o trecho, a seguir:

    GIS (9;5) Voc j ouviu algum falar em ter direitos? O direito da

    criana. Quais so? Brincar, tomar banho, dormir e ela ficar se

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    27

    divertindo com a famlia. Tem um direito que o mais importante? Sim.

    Qual ? Vim pra escola, estudar e aprender. [...] Toda criana tem esse

    direito? Sim, porque seno ela vai pro Conselho Tutelar. Como assim?

    O Conselho conversa com ela e chama os pais dela e fala que se eles

    no colocarem ela na escola, no vai aprender nada. Ser que os

    direitos dependem da idade? Sim. Os adultos tm direitos? Tem, eles

    tm que cuidar das crianas, como alimentar elas. Se no cuidar um

    crime e se o pai for preso, l na cadeia [...]

    Na fase de avaliao tambm encontramos um nmero, mesmo que

    pequeno, de respostas caractersticas do nvel III de compreenso da realidade

    social. Nesse nvel, os sujeitos passam a levar em conta, em suas respostas, os

    aspectos e processos ocultos para as explicaes dos fenmenos sociais. Do mesmo

    modo, buscam encontrar uma coerncia entre os diferentes aspectos abordados nas

    histrias, abordando diretamente os conflitos. De maneira mais efetiva, identificam

    os problemas relatados nas histrias como formas de violao dos direitos

    fundamentais das crianas. A seguir, um excerto da resposta de um sujeito desse

    nvel:

    ANA (9;4) O que voc acha dessa histria? Ruim, porque o filho tem

    que ir pra escola, porque um direito dele. Como assim? Toda criana

    tem esse direito, n? Ento, ele tem todo direito de ir pra escola e

    servio da me e do pai [...] Voc acha certo os pais fazerem isso?

    No, porque os pais que deviam estar fazendo isso e no o filho. Por

    que no, o filho? Porque ele pequeno, tem direito de brincar, estudar,

    tomar banho, ser alimentado. [...] Mas essa criana da histria, tm

    direito? Tem, s que os pais no pensam. Eles no querem fazer

    servio, mas criana tem que ficar brincando, ir na escola, esse o

    direito dela. Voc acha que a criana podia fazer alguma coisa? Podia

    contar pra professora. O que a professora poderia fazer? Ligar pro

    Conselho, porque isso importante. Falar que a criana est dentro de

    casa, fazendo servio, o pai sai de casa e deixa a criana l. Isso um

    problema, deixar a criana sozinha, fazendo servio [...]

    Consideraes finais

    A nosso ver, as diferenas entre os resultados da fase exploratria e da fase

    de avaliao so decorrentes das alteraes na organizao da rotina de sala de

    aula, bem como da adoo de uma postura docente diferenciada, por meio de um

    trabalho pedaggico dinmico e provocativo de trocas entre os pares,

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    28

    reciprocidade, respeito mtuo, vivncia democrtica, valorizao de aspectos

    sociomorais e construo da autonomia.

    Em sntese, os resultados da fase exploratria demonstraram que as crianas

    possuam noes bastante simplistas sobre seus direitos e, muitas vezes, nem os

    reconheciam nas histrias. Durante e realizao das atividades propostas, foi

    possvel observar o envolvimento da turma, bem como os conflitos e necessidades

    que surgiam sobre os diferentes temas abordados.

    Ao final da interveno pedaggica, na fase de avaliao, percebemos

    modificaes na maneira de pensar dos sujeitos ao analisarem as situaes descritas

    nas histrias. Houve um avano significativo na maneira como os sujeitos

    compreendem seus direitos, assim como reconhecem suas diferentes formas de

    respeito, garantia e violao.

    Acreditamos e defendemos que como professores, no podemos subestimar

    a capacidade de nossas crianas de interpretarem as informaes recebidas do

    meio. Entendemos que, ainda que certas questes lhes paream difceis de serem

    compreendidas, imprescindvel que as crianas tenham contato com eles,

    reflitam, ouam as opinies de seus pares, entrando em desequilbrio com suas

    prprias ideias e que, enfim, paulatinamente, tomem conscincia sobre seus

    contedos.

    A atualidade desta pesquisa e a relevncia de sua realizao se revelam ao

    entendermos que as informaes aqui contidas podem contribuir significativamente

    com as discusses no campo dos direitos humanos e, em especfico, dos direitos

    das crianas. A medida que transformamos nossa prtica de ensino, embasados

    num processo verdadeiramente construtivista, oportunizamos que nossas crianas

    experieciem aes desafiadoras, organizem e reorganizem seus conhecimentos,

    estruturem e formulem explicaes prprias a partir do vivido.

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    29

    Referncias

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    Paulo, So Paulo, 2002.

    ************************************

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    31

    RELATO DE PESQUISA

    APRENDER A SER

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    32

    A PSICOGNESE DA GENERALIZAO: UM ESTUDO EVOLUTIVO

    PIAGETIANO

    Eliane Giachetto Saravali [email protected] UNESP/Marlia-SP

    Amanda M. P. Mano [email protected]

    UNESPAR/PR

    Taislene Guimares - [email protected] - UNESP/Marlia-SP

    Anglica Pall Oriani [email protected] UNESP/Marlia-SP

    Resumo

    O texto apresenta um estudo evolutivo transversal a respeito da construo da

    generalizao, baseado no trabalho original de Piaget (1896-1980) sobre a temtica.

    A pesquisa foi desenvolvida junto a 80 participantes com as seguintes faixas

    etrias: 20 sujeitos de 06 anos, 20 de 11 anos, 20 de 16 anos e 20 de 21 anos, sendo

    metade pertencente a instituies de ensino pblicas e metade a instituies de

    ensino particulares. Todos foram submetidos prova da generalizao o conjunto

    das partes e os dados obtidos foram analisados conforme nveis de construo da

    generalizao. Os resultados indicam um significativo atraso dos sujeitos

    brasileiros em relao aos protocolos piagetianos apontando que, mesmo entre

    indivduos mais velhos, a generalizao e, no caso especifico dessa prova, a

    interseco, no havia sido construda ou estava em nveis mais elementares.

    Reflexes sobre o papel da escola e dos docentes encerram o trabalho.

    Palavras Chave: generalizao; teoria piagetiana; estudo evolutivo.

    SEMINRIO INTERNACIONAL

    EDUCAO PARA O SCULO XXI 1.

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    33

    Introduo

    A atualidade da teoria piagetiana se apresenta, para ns educadores, em

    vrios aspectos; dentre um dos que nos cumpre destacar est a explicao do

    grande mestre sobre como ocorre o desenvolvimento humano. Para alm das

    discusses referentes teoria dos estdios, to enfatizadas, e at mesmo distorcidas

    no campo pedaggico, acreditamos ser importante uma ateno especial aos

    mecanismos que pem em funcionamento nosso sistema cognitivo e o processo de

    equilibrao, entre eles, a abstrao reflexionante, a formao de possveis e a

    generalizao. Esses processos so bem menos enfatizados nos estudos dos

    seguidores piagetianos e, a nosso ver, nos ajudam a explicar muitas das

    dificuldades que temos encontrado em nossos alunos, bem como aquelas que

    evidenciam uma incapacidade docente de realizar intervenes profcuas.

    A capacidade de realizar generalizaes deriva de aes sobre os objetos no

    sentido fsico, mas a capacidade de reconhecer elementos em termos de classes,

    atribuindo incluses, comparaes, quantificaes fruto de operaes, o que nos

    remete s coordenaes mentais que transcendem o papel fsico da experincia.

    Piaget et al (1995) distinguiram 2 tipos de abstraes, a saber: emprica e

    reflexionante; essa ltima subdividida pelo autor em pseudo-emprica e refletida. A

    abstrao emprica permite a retirada de caractersticas observveis dos/nos objetos

    e a abstrao reflexionante atua a partir das coordenaes das aes exercidas pelos

    sujeitos. A abstrao pseudo-emprica consiste numa variao da abstrao

    reflexionante, porm apoiada nos resultados constatveis da ao e a abstrao

    refletida uma abstrao reflexionante que se torna consciente ao sujeito (PIAGET

    et al, 1995).

    Da mesma forma, Piaget y col (1984) nos apresentaram dois tipos de

    generalizao que se apiam nos processos de abstrao: a generalizao indutiva e

    a generalizao construtiva.

    La que parte de lo observable contenido en los objetos, por tanto,

    abstracciones empricas, y que se remite a ellos para averiguar su

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    34

    validez de las relaciones observadas, con el fin de establecer su grado

    de generalidad y sacar de ello previsiones posteriores (pero sin tratar

    an de encontrar explicaciones o razones, lo que nos llevaria a

    superar lo observable). Esta forma es de naturaleza esencialmente

    extensiva y consiste en proceder del alguno a todos o del hasta

    aqui a siempre: la llamaremos generalizacin inductiva [...] En

    cambio, cuando la generalizacin se funda en o se refiere a las

    operaciones del sujeto a sus productos, su naturaleza es en ese caso

    simultneamente comprensiva y extensiva, y conduce entonces a la

    produccin de nuevas formas e incluso, a veces, de nuevos contenidos.

    [...] Las llamaremos generalizaciones constructivas (PIAGET y col,

    1984, p.8).

    Na obra destinada a investigar a construo da generalizao, os autores

    apresentam diferentes estudos nos campos da lgica, numrico, de coordenaes

    espaciais, entre outros. Para o presente relato, objetivamos apresentar uma

    pesquisa1 realizada com crianas, jovens e adultos a partir da prova do conjunto das

    partes, constante da referida obra, e analisada sob a tica da construo da

    generalizao.

    Aspectos Metodolgicos

    Trata-se de um estudo evolutivo, pautado no mtodo clnico-crtico

    piagetiano (PIAGET, 1967; 1979) do qual participaram 80 sujeitos com as

    seguintes faixas etrias: 20 sujeitos de 06 anos, 20 de 11 anos, 20 de 16 anos e 20

    de 21 anos. Os recortes etrios foram escolhidos objetivando-se abarcar a

    possibilidade de transio entre momentos diferentes do desenvolvimento; assim,

    por exemplo, poderamos ter um momento de transio do estdio pr-operatrio

    para o estdio concreto, um momento de equilbrio do estdio operatrio concreto e

    incio da construo de estruturas formais, e dois momentos de equilbrio do

    estdio operatrio formal.

    Cada grupo de sujeitos foi dividido conforme a instituio de ensino de

    origem: pblica ou particular. Assim, temos 10 sujeitos de 06 anos de escolas 1 Financiada pelo CNPq Edital Universal, 2014.

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    35

    pblicas e 10 sujeitos de 06 anos de escolas particulares, 10 sujeitos de 11 anos de

    escolas pblicas e 10 sujeitos de 11 anos de escolas particulares, 10 sujeitos de 16

    anos de escolas pblicas e 10 sujeitos de 16 anos de escolas particulares, 10

    sujeitos de 21 anos de Universidades pblicas e 10 sujeitos de 21 anos de

    Universidades particulares.

    As instituies escolares foram contatadas para a permisso de realizao

    da pesquisa, assim como todos os sujeitos autorizaram ou foram autorizados a

    participar da mesma. Os procedimentos ticos foram devidamente analisados e

    aprovados conforme o Comit de tica em Pesquisa da UNESP, campus de

    Marlia-SP, protocolo n 1.089.954/15.

    Todos os participantes foram submetidos Prova da Generalizao O

    conjunto das partes; os dados foram coletados nas respectivas instituies

    educativas, em salas reservadas aos pesquisadores. As entrevistas foram gravadas

    em vdeo e, posteriormente, analisadas conforme o proposto na obra piagetiana

    acerca do tema (PIAGET y col, 1984).

    Resumidamente, essa prova da generalizao possui o seguinte protocolo:

    Material: conjunto de figuras concretas (em EVA, papel ou acrlico)

    classificados da seguinte forma: quadrados e crculos, grandes ou pequenos,

    vermelhos ou amarelos, sendo 8 classes de n elementos cada uma.

    Procedimento: aps manipulao e reconhecimento inicial pelo sujeito das

    cores e formas procede-se aos seguintes questionamentos/instrues: 1) Convida-se

    o participante a escolher as figuras de tal forma que se obtenha um nmero igual de

    quadrados e grandes; 2) Solicita-se outras possibilidades; 3) Coloca-se 4 quadrados

    grandes vermelhos e um grande crculo amarelo e solicita-se ao participante que

    faa um grupo com um nmero igual de crculos e vermelhos; 4) Pergunta-se, se

    possvel acrescentar ao grupo teste outro crculo vermelho sem destruir a

    igualdade; 5) Pergunta-se: possvel trocar o grande crculo amarelo por outra

    pea, sem destruir a igualdade?; 6) Apresenta-se ao sujeito um grande quadrado

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    36

    amarelo e pede-se que seja encontrada uma figura que seja o contrrio; 7) Aps

    solicitar as possibilidades e explicaes, pergunta-se: Existe alguma que seja o

    mais contrrio? possvel organizar do menos contrrio para o mais contrrio?; 8)

    Solicita-se que aponte todas as peas que no so grandes quadrados amarelos.

    Trata-se de uma prova que requer muita preparao, pois o prprio modo de

    perguntar pode esconder interseces ou junes equivocadas que so ditas aos

    sujeitos sem que percebamos. Requer, portanto, bastante familiaridade por parte do

    experimentador.

    Resultados e Discusses

    A anlise das respostas seguiu os nveis de construo da generalizao

    apresentados na obra piagetiana (PIAGET y col., 1984).

    No nvel IA, observamos que os sujeitos raramente conseguem retomar a

    instruo dada pelo experimentador, sobretudo quando os elementos de interseco

    so explcitos. Assim, um atributo sempre visto separado dos demais.

    CAR (6;5): Para o grupo de quadrados e grandes: Tem que pegar quadrado

    grande. [...] Um grupo de nmero igual ao meu de crculos e vermelhos. [Pega

    somente os crculos vermelhos].

    ELV (11;2): Separa em igual quantidade dois grupos de quadrados amarelos e

    grandes. Explica para mim o que voc fez, como era o grupo que eu te pedi:

    Grupo de quadrado de tamanho grande.

    MAO (16;6): Para os quadrados e grandes pergunta-nos: um grupo de

    quadrados grandes?. Repetimos a instruo: um grupo de quadrados e

    grandes. [Faz um grupo com todos os quadrados vermelhos grandes e outro

    com todos os quadrados amarelos grandes.] Tem outro jeito? Posso intercalar

    as cores, vermelho e amarelo.

    AYS (21;2): Separa para mim um grupo de nmero igual de quadrados e

    grandes. Quadrados grandes? Quadrados e grandes. [Separa 3 grupos com 3

    elementos cada, todos quadrados grandes]. Voc acha que tem um outro jeito?

    [Comea a pegar os quadrados pequenos, mas os une formando, figuralmente

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    37

    sobre a mesa, um quadrado grande.] H um outro jeito? Olha para as

    fichas....acredito que tenha,mas eu no sei.

    Para a construo de um grupo igual, os sujeitos recorrem apenas aos

    aspectos aparentes, tais como o tamanho do monte de peas, a quantidade de peas,

    etc. Para Piaget, h uma dificuldade de raciocnio sobre divises heterogneas e os

    sujeitos recorrem a divises homogneas, ou seja, suprimem divises e unem

    qualidades que lhes permitiriam distinguir as duas classes. Adems, y como

    consecuencia, estos sujetos solo pueden razonar acerca de clases, o disyuntivas o

    fusionadas, ya que toda interseccin les es ajena. (PIAGET y col. 1984, p.16).

    Novamente, o protocolo de CAR nos ilustrativo:

    CAR (6;5): Quando solicitada a pensar sobre a possibilidade de

    manuteno/destruio da igualdade, consegue pensar em termos do tamanho

    da pilha ou da quantidade de peas Se voc colocar uma pea vermelha

    aqui vai ficar menos para esse grupo. De igual modo, uma substituio s

    possvel se a troca for por uma pea amarela.

    Qualquer indagao sobre uma outra maneira de responder ao que foi

    pedido respondida com um simples mexer nas fichas, sem a construo de novos

    conjuntos.

    Na solicitao final, novamente observa-se a ausncia de interseces.

    ANL (6;2): Separe os que no so grandes, quadrados, amarelos. Separa

    somente as peas pequenas e afirma: Separei porque so as pequenas.

    No nvel IB, so observadas diferenas sutis, mas nota-se um incio de

    variao quando se pede quadrados e grandes. Porm, tal variao significa atender

    ao pedido do experimentador considerando a caracterstica quadrado ou a

    caracterstica grande. Assim, por exemplo, podem selecionar quadrados vermelhos

    e quadrados amarelos todos grandes. No entanto, observa-se que os sujeitos so

    capazes de mais variaes.

    HEN (6;7): [Para um nmero igual de quadrados e grandes pega 2 quadrados

    vermelhos e 2 crculos amarelos.] H um outro jeito? Pega dois crculos

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    38

    amarelos. [Em seguida, aps lhe ser apresentado 3 quadrados vermelhos

    grandes e um crculo amarelo grande pedido para encontrar um grupo igual

    de crculos e vermelhos, faz trs grupos: 1) com 3 quadrados grandes

    vermelhos e 1 crculo amarelo grande; 2) com 4 crculos vermelhos grandes e

    um crculo amarelo grande; 3) com 3 crculos vermelhos pequenos e 1 crculo

    pequeno amarelo.]

    RIC (11;0) v duas possibilidades para o questionamento anterior: 1) 3 crculos

    vermelhos grandes e 1 crculo amarelo pequeno; 2) 4 crculos amarelos

    grandes e 1 quadrado grande vermelho.

    H uma viso ainda em elaborao, mais limitada, a respeito das

    possibilidades dos contrrios e poucos elementos so apresentados como

    contrrios; isso ocorre pelo fato de os participantes continuarem considerando uma

    caracterstica de cada vez, sendo a cor a predominante.

    Nas palavras de Piaget:

    [...] est claro que las reacciones frente a la pregunta sobre las

    diferencias tienen una gran relevancia para la construccion del conjunto

    de las partes: atestiguan acerca de la ausncia de una regulacin y de

    una jerarquizacin de las negaciones, que impide, en realidad, la

    construccin de divisones heterogneas extensivas con los subsistemas

    que esas suponen. Por esta razn, todo el primer estdio, incluyendo el

    nivel IB, pude caracterizarse por la ausencia de soluciones espontneas

    mediante disyunciones correctas, la ausncia de interseccin y por

    identidades todavia mal comprendidas. (PIAGET y col, 1984, p.18).

    Para o nvel IIA, observamos que a interseco ainda no est consolidada,

    embora o sujeito consiga visualizar mais possibilidades de formao dos conjuntos

    pedidos, mediante a considerao das diferentes caractersticas, ainda que

    permaneam somadas isoladamente. Embora errem, percebe-se a existncia de

    mais conflitos, mais testagens. Como diz Piaget: Se percibe una mejor

    comprensin de las soluciones de identidad, pero esa sigue siendo incompleta e

    insuficiente para desembocar en las intersecciones (1984, p. 21).

    GAB (16;8): Separa para mim os que no so grandes, quadrados,

    amarelos. [Ela separa inicialmente todos os pequenos.] Diz que no so

    grandes, e que h quadrados e amarelos.

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    39

    Os sujeitos passam a no visualizar somente o tamanho da pilha ou as

    caractersticas visveis do grupo teste. Por exemplo:

    MAR (11;5): Para a construo de um conjunto igual de crculos e vermelhos,

    pega um quadrado vermelho pequeno, um crculo vermelho pequeno e trs

    crculos amarelos pequenos. Outro jeito? Recorrendo somente aos pequenos e

    vermelhos, coloca 4 quadrados e 1 crculo. Outra forma? Quadrado grande

    vermelho, crculo grande amarelo e trs crculos pequenos vermelhos.

    Para a identificao dos contrrios, j conseguem considerar duas, at trs

    categorias, mas estabelecer uma hierarquia entre elas mais difcil. o caso de:

    EDI (21;4): Para os contrrios de um quadrado amarelo seleciona:o quadrado

    grande, o pequeno e o crculo grande (todos amarelos), alm do crculo

    pequeno, quadrado pequeno e quadrado grande (todos vermelhos). Voc acha

    que d para organizar do mais contrrio para o menos contrrio? Sim. Voc

    pode fazer ento? Faz uma sequncia de vermelhos: crculo pequeno, quadrado

    pequeno, quadrado grande, e uma sequncia de amarelos: crculo grande e

    quadrado pequeno. Ao ser questionado alega que fez separao entre amarelos

    e vermelhos.

    NIN (11;8): Para um grande quadrado amarelo indica um crculo grande

    vermelho. Por que o contrrio? Porque ela redonda e essa quadrada, ela

    no tem vrtices e essa tem. Ser que tem mais alguma possibilidade de uma

    pea contrria? Tem essa (um crculo amarelo). Por que? Porque ela

    redonda...e menor. Tem alguma outra? Pega um crculo pequeno vermelho e

    um crculo grande amarelo. Por que so contrrios? Essa porque vermelha, e

    essa porque redonda. Outra possibilidade? No. Dessas que voc separou,

    tem alguma que mais contrria da que eu te dei? No.

    ERI (16;11): Para o contrrio de grande quadrado amarelo: [Separa crculo

    pequeno de ambas as cores, crculos grandes de ambas as cores, quadrados

    grandes de ambas as cores e o quadrado pequeno vermelho.] Tem como

    organizarmos do mais contrrio para o menos contrrio? Aps muitas trocas e

    questionamentos do experimentador chega disposio final: crculo pequeno

    vermelho, crculo grande vermelho, quadrado pequeno vermelho, crculo

    amarelo pequeno, crculo grande amarelo e quadrado grande vermelho,

    demonstrando pouca convico alegando: para apenas estabelecer uma

    ordem.

    A dificuldade com a interseco tambm aparece na pergunta final da

    prova. Alguns exemplos.

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    40

    NIN (11;8): Para as peas que no so grandes, quadrados, amarelos, pega os

    crculos vermelhos e pequenos.Tem alguma outra possibilidade? No. Porque

    essa aqui amarela (apontando os crculos amarelos pequenos e no pode ser

    amarela); essas daqui so quadrados grandes e essa daqui grande (aponta

    para os crculos amarelos grandes).

    MIG (11;6): Para os que no so grandes quadrados amarelos, separa todos os

    quadrados amarelos. O que voc pensou? Que no grandes, so pequenas, so

    quadrados e so amarelos. Tem outra possibilidade? No.

    O nvel IIB nos traz as interseces devidamente justificadas, os sujeitos

    compreendem, portanto, a diferena entre ou e e.

    JAQ (16;11): Um grupo com nmero igual de quadrados e grandes. Separa

    todas as formas grandes. Me conta o que voc pensou para fazer esse grupo. Se

    so quadrados e grandes eu peguei as formas que tinham maiores e que

    incluam os quadrados. Ah eu esqueci os quadrados pequenos. Eles tambm

    precisam estar includos. Por que? Porque uma diviso de quadrados e

    formas grandes, ento, apesar de serem pequenos, eles tambm se enquadram

    na parte de quadrados. S os crculos pequenos que no se enquadram no

    grupo.

    Piaget explica que as reaes desse nvel IIB preparam claramente conjunto

    das partes:

    Las divisiones heterogneas pedidas conducen rapidamente a

    disyunciones correctas [...] Por fin, el sujeto deduce, antes de

    averiguarlo, que dos soluciones justas distintas pueden ser reunidas

    conservando la igualdad n = n, y empieza a traducir de manera

    extensiva las relaciones diferente y contrario. (PIAGET y col,

    1984, p.23-24).

    Em toda a nossa amostra s encontramos 1 participante no nvel III, AND

    (16;6). Nesse nvel, observam-se as interseces de forma clara, h mais

    possibilidades quando se solicita a igualdade dos grupos e no h dificuldade para

    o estabelecimento e a hierarquizao dos contrrios.

    Os dados que apresentamos podem ser observados na Tabela 1 a seguir:

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    41

    TABELA 1 Resultados Prova da Generalizao

    Nveis de Construo da Generalizao

    IA IB IIA IIB III Total

    Idades f % f % f % f % f % f %

    06 anos 18 90 2 10 - - - - - - 20 100

    11 anos 1 5 4 20 14 70 1 5 - - 20 100

    16 anos - - 6 30 12 60 1 5 1 5 20 100

    21 anos - - 2 10 14 70 4 20 - - 20 100

    Fonte: Dados da pesquisa

    Legenda

    f frequncia

    % percentual

    A comparao dos dados obtidos entre escolas pblicas e particulares pode

    ser observada na tabela 2, a seguir.

    TABELA 2 Comparao dos resultados entre escolas pblicas e particulares

    IA IB IIA IIB III

    Idades Pa Pu Pa Pu Pa Pu Pa Pu Pa Pu

    06 anos 10 8 - 2 - - - - - -

    11 anos - 1 - 4 10 4 - 1 - -

    16 anos - - 2 4 7 5 - 1 1 -

    21 anos - - 1 1 7 7 1 3 - -

    Fonte: Dados da pesquisa

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    42

    Legenda

    Pa Escola pblica

    Pu Escola particular

    De uma maneira geral, observamos um atraso na construo da

    generalizao em nossos participantes, ainda que tenhamos includo em nossa

    amostra sujeitos mais velhos. Nos protocolos piagetianos, temos essa questo j

    resolvida para crianas com 10 anos e, quadros maiores de evoluo para crianas

    com 8 e 9 anos. Embora saibamos que a idade no deva ser a referncia maior,

    chama a ateno a ausncia de uma importante construo em jovens e adultos

    universitrios.

    As comparaes entre as escolas pblicas e particulares corroboram,

    igualmente, o atraso mencionado. No entanto, os dados sugerem que os alunos das

    escolas particulares atingem um pouco mais rapidamente o nvel IIA do que

    aqueles da escola pblica. Todavia, como j dito, h que se mencionar a

    permanncia do atraso, mesmo em participantes mais velhos. Tais dados

    corroboram os achados de Mantovani de Assis (1976) que indicavam que no o

    nvel scio-econmico que influencia o desenvolvimento, mas sim o tipo de trocas

    que ocorrem entre sujeito e meio fsico e social.

    Consideraes finais

    O que pesquisas e dados como esses que apresentamos podem nos

    proporcionar em termos de reflexo? O que o atraso na construo de um

    mecanismo importante para o desenvolvimento cognitivo pode significar?

    A generalizao construtiva possibilita ao indivduo transcender o

    observvel e o aparente, bem como a construo de variveis diferentes. Isso, a

    nosso ver, condio necessria para uma anlise crtica dos objetos de

    conhecimento com os quais nos deparamos, seja no mbito fsico, lgico-

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    43

    matemtico ou social. Processos que se excluem e se mesclam, assim como a

    observao das afirmaes e negaes, num contnuo processo de diferenciaes e

    integraes condio para uma mobilidade maior do sistema cognitivo.

    No contexto de nossa pesquisa, observamos que no somente a escola

    pblica falha, mas a escola particular tambm no tem conseguido promover o

    desenvolvimento dos seus alunos, que so reforados numa postura pacfica e de

    contnua reproduo. Cabe, portanto, aos professores a compreenso sobre o que

    podem fazer em relao a isso, ou seja, promover prticas que sejam de fato

    coerentes com o desenvolvimento e que auxiliem os alunos a pensarem,

    argumentarem, se contradizerem, hipotetizarem etc. S assim as construes

    podem avanar.

    Referncias

    MANTOVANI DE ASSIS, O. A solicitao do meio e a construo das estruturas

    lgicas-elementares pela criana. 1976. Tese (Doutorado em Psicologia Educacional) -

    Faculdade de Educao, Universidade Estadual de Campinas.

    PIAGET, J. O raciocnio na criana. Traduo de Valerie Rumjaneck Chaves. Rio de

    Janeiro: Record, 1967.

    PIAGET, J. A representao do mundo na criana. Traduo Rubens Fiza. Rio de

    Janeiro: Record, 1979. 318p.

    PIAGET, J. Investigaciones sobre la generalizacin. Mxico: Premia Editora, 1984.

    PIAGET, J. O possvel e o necessrio - evoluo dos possveis na criana. vol 1. Trad.:

    Bernardina Albuquerque. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1985.

    PIAGET, J. Abstrao reflexionante relaes lgico-aritmticas e ordem das relaes

    espaciais. Porto Alegre: Artmed, 1995.

    ************************************

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    44

    PROFESSORES, SEUS SABERES E SUA IDENTIDADE PROFISSIONAL

    Carla Fernanda Figueiredo Felix - [email protected] - UFSCar

    RESUMO

    Este artigo foi baseado em uma pesquisa de mestrado de Eveliyn Tiemi senvolvida

    entre 2013 a 2015, vinculada ao Programa de Ps-Graduao em Educao na

    Universidade Estadual de Campinas. O estudo objetivou compreender quais so os

    elementos que contribuem para formao da identidade profissional docente de

    professores iniciantes atuantes nos anos iniciais do ensino fundamental. Dentro

    disso, buscou-se compreender tambm como os professores constroem os saberes

    que compem suas prticas dirias. A pesquisa apoiou-se na abordagem qualitativa

    e utilizou dois instrumentos para coleta de dados, a entrevista semiestruturada e o

    questionrio. Alguns documentos oficiais tambm foram usados a fim de levantar

    mais evidncias para anlise. Oito professoras inseridas na rede de um municpio

    mineiro, atuantes do 1 ao 5 ano, se disponibilizaram a participar e colaborar com

    a pesquisa. Como base terica, os trabalhos Assuno (1996); Corsi (2002; 2005),

    Garcia (1998; 1999), Gonalves (2013), Goodson (2013), Huberman (2013); Lima

    (2006); Moitta (2013) Nvoa (2013), Tardif (2002), Tardif e Raymond (2000),

    entre outros, serviram para compreender os dados. Nesse texto, em especfico, ser

    evidenciado as impresses que as professoras participantes tiveram em relao

    formao inicial, da insero profissional, das condies de trabalho, os saberes

    que construram e como isso reflete na identidade profissional que construram a

    respeito de si e da profisso.

    Palavras Chave: Professores iniciantes; Saberes docentes; Formao inicial;

    Identidade profissional.

    SEMINRIO INTERNACIONAL

    EDUCAO PARA O SCULO XXI 1.

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    45

    Introduo

    A pesquisa teve o propsito de compreender como construda a identidade

    profissional de oito professoras iniciantes em Poos de Caldas (MG), atuantes do 1

    ao 5 ano do ensino fundamental da rede pblica de ensino. A partir disso surgiram

    outras indagaes, tais como: as relaes entre pares, dirigentes e alunado

    contribuem para a identidade profissional? Como a formao inicial e,

    posteriormente a formao continuada, atravessa a prtica docente e os constituem

    profissionalmente? A comunidade onde a escola est inserida exerce influncia

    sobre a prtica do professor? As trajetrias escolares e pessoais esto presentes nas

    posturas assumidas em sala e na prpria identidade docente? A atuao traz

    elementos que so incorporados pelos professores moldando uma imagem de si e

    de seu trabalho?

    A identidade profissional compreendida tambm como parte integrante dos

    saberes docentes, foi elencada para tecer reflexes sobre como, ao longo dos anos, os professores

    se apropriam e (re)significam discursos pedaggicos e sua prtica a partir de suas

    vivncias dirias no ambiente escolar.

    Para orientar esta pesquisa utilizou-se uma abordagem qualitativa na

    tentativa de compreender os processos pelos quais as professoras passam no incio

    da carreira na rede e, tambm, descobrir os elementos que as constituem

    profissionalmente. A opo por uma abordagem se deve ao entendimento de que as

    relaes so demasiadamente complexas e demandam uma interao maior entre os

    sujeitos. Para coletar os dados foram utilizados dois instrumentos, a entrevista

    semiestruturada e o questionrio.

    A partir disso, foram criados eixos temticos, uma vez que os elementos

    pontuados pelos sujeitos da pesquisa aparecem em mais de uma fala. Quatorze

    aspectos foram evidenciados: incio da carreira; viso que as professoras tm da sua

    formao inicial (magistrio, estgio e curso de pedagogia); formao continuada;

    saberes que embasam suas prticas; sentimento em relao atuao profissional;

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    46

    desafios da profisso; falas que desmotivam; relao com os agentes envolvidos no

    ambiente escolar (pares, dirigentes, alunos, pais e comunidade); expectativas em

    relao profisso; desvalorizao profissional; imagem que tem de si e do seu

    trabalho; escolha pela profisso; o trabalho que ultrapassa a sala de aula e, ltimo

    eixo, se gosta de ser professora.

    Os dados foram trabalhados com os seguintes referencias: incio da carreira

    utilizando-se dos estudos de Corsi (2002; 2005) Lima (2006). J os estudos de

    Tardif (2002), Tardif e Raymond (2000), Assuno (1996), Pimenta (2008);

    Pimenta e Lima (2012) trazem contribuies no sentido de refletir sobre quais

    saberes os professores possuem para embasar suas prticas. Em relao insero

    na carreira docente, foram a base do trabalho, as obras de Garcia (1998; 1999) e

    Gonalves (2013). Ainda pensando no professor e o contexto escolar, sua relao

    com os pares, dirigentes, comunidade e aluno os estudos de Guarnieri (1996),

    Goodson (2013), Moitta (2013) e Nvoa (2013), Tancredi (2009). As contribuies

    de Fontana (2010), Moita (2013), Novaes (1991), Silva (2014) ajudaram a pensar

    sobre a identidade profissional das professoras que atuam nos anos inicias do

    ensino fundamental e, para aprofundar as discusses, o conceito de identidade em

    metamorfose de Ciampa (1987) fecha o referencial terico da pesquisa.

    Esse estudo trouxe importantes elementos para se pensar como os

    professores, ao longo da carreira, vo construindo uma identidade de si e de seu

    trabalho a partir dos vrios aspectos que compem e influenciam suas prticas.

    Nesse texto, em especfico, sero evidenciadas as impresses que as professoras

    participantes dessa pesquisa tiveram em relao formao inicial, insero

    profissional e condies de trabalho, no sentido de tecer reflexes sobre como esses

    elementos contriburam para construo da identidade profissional docente. Muitos

    excertos foram trabalhados nesses trs temas, contudo, nesse artigo foram

    selecionados apenas alguns2.

    2 Trabalho completo disponvel em:

  • I SEMINRIO INTERNACIONAL EDUCAO PARA O SCULO XXI

    47

    Antes de explorar o material escolhido necessrio compreender o conceito

    de identidade, utilizado como base terica para compreenso e anlise dos dados.

    Identidade Profissional Docente

    Falar sobre identidade, pessoal ou profissional, falar das vrias imagens

    construdas de si mesmo a partir do outro, ser identificado e identificar-se no outro

    (CIAMPA, 1987), entre a imagem interna e a imagem externa, ou seja, as vrias

    identidades que um sujeito pode assumir durante sua vida, nesse caso

    especificamente, na sua carreira docente. um processo dinmico que ocorre em

    momentos e lugares especficos, produzindo elementos que vo constituindo o

    indivduo, o professor, ao longo do ciclo de vida profissional (FONTANA, 2010).

    O ser humano se forma e se transforma a partir da relao com o outro, na

    interao social, por isso um processo dialtico que implica a atividade e a

    conscincia (CIAMPA, 1987). Passa a entender e interiorizar estilos de vida a partir

    do momento que encontra significado para suas aes, buscando sempre

    explicaes para os fatos, tornando desse modo suas atitudes intencionais.

    [...] a identidade humana no dada, de uma vez por todas, no ato do

    nascimento: constri-se na infncia e deve reconstruir-se sempre ao

    longo da vida. O indivduo nunca constri sozinho: ela depende tanto

    dos julgamentos dos outros como das suas prprias orientaes e

    autodefinies. A identidade um produto de sucessivas socializaes.

    (DUBAR, 1997, p. 10).

    Assim, a identidade se forma e se transforma com o outro, porque

    interiorizamos aquilo que os outros nos atribuem de tal forma que se torna nossa.

    A tendncia que ns nos predicarmos coisas que os outros nos atribuem

    (CIAMPA, 1987, p. 131). Por isso sempre usamos proposies substantivas para

    identificar algum e no proposies verbais.

    Ao adotar uma identidade em um determinado contexto, estou de alguma

    forma, excluindo vrias outras possibilidades, ou seja, toda identidade relacional

    http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000956454&fd=y

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    e, de certo modo, excludente. marcada pela diferena (SILVA, 2014). Implica,

    tambm, em vrios aspectos simblicos, culturais, econmicos e socais, pois,

    pertencer a uma nacionalidade carrega cultura especfica, lngua oficial, tendncia

    poltica e sistema econmico. Ao considerar esses aspectos, juntamente ao fato do

    ser humano estar em constante transio entre lugares e tempos, somado a sua

    adaptao e interiorizao de todos esses elementos, fica claro que sua identidade

    metamorfose, ser ser metamorfoseado. A metamorfose a expresso da vida.

    Como tal processo inexorvel, tenhamos ou no conscincia dele (CIAMPA,

    1987, p. 113).

    Importante esclarecer que o indivduo no pode ser visto como ser isolado,

    mas sim como relao (CIAMPA, 1987), como aquele que, presente e atuante no

    grupo, interioriza e transpem, por meio de alguns filtros e escolhas, o que

    vivencia. A individualidade uma incorporao progressiva da cultura da

    sociedade de pertena (DUBAR, 1997, p. 45).

    Bourdieu (2004) traz importantes contribuies para se analisar os

    ambientes de socializao, denominados por ele de campos sociais, que exercem

    um papel crucial na formao da identidade. A famlia, amigos, as instituies

    educacionais so exemplos de campos sociais que, com suas regras mais ou

    menos flexveis, induzem as pessoas, fazendo com que estas assumam

    determinadas posturas, ou seja, um estilo de vida familiar ser repassado s novas

    geraes reafirmando os modelos, padres daqueles sujeitos.

    Assim, pode-se dizer que os lugares sociais e histricos que ocupamos

    que nos tornam reais, determinando o contedo de nossa criao pessoal e cultural.

    Essa determinao tanto delineia quanto delimita as possibilidades entre as

    quais escolhemos (FONTANA, 2010, p. 103). Ainda nessa linha pode-se dizer

    que a cultura controla o sistema social que controla a personalidade que, por sua

    vez, controla o organismo (DUBAR, 1997, p. 51).

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    No caso dos professores geralmente nos referimos a sua identidade pelo

    vis de seu trabalho, ao longo da carreira pode mudar a maneira como o enxerga e

    modific-lo inmeras vezes. Isso se deve ao fato que sua identidade tanto pessoal

    quanto profissional est em constante transio (HALL, 2005).

    Sendo assim, a identidade profissional no um produto acabado, ela um

    lugar de lutas e conflitos, um espao de construo de maneira de ser e de estar na

    profisso (NOVOA, 2013, p. 16), por isso importante entender os elementos que

    vo, ao longo da carreira, influenciando na construo do eu professor, na

    maneira como esse profissional se v, se reconhece no trabalho e os saberes que

    constroem.

    Formao inicial e a construo dos saberes docentes

    De acordo com a bibliografia, os saberes so variados, abarcam saberes

    profissionais, compostos pelos conhecimentos sobre a educao e a ideologia

    pedaggica, transmitidos por meio das instituies de formao inicial e

    continuada. Saberes disciplinares que equivalem aos vrios campos do

    conhecimento presentes na sociedade, que provem da tradio cultural e dos grupos

    produtores desse conhecimento. Saberes curriculares, ou seja, a apropriao de

    discursos, contedos, objetivos elencados como primordiais educao escolar,

    denominados eruditos, que o professor deve aprender e ensinar no contexto escolar.

    Por fim, os saberes experienciais baseados em suas vivncias em sala de aula

    desenvolvidos, a partir do exerccio prtico do seu ofcio, levando em considerao

    a realidade e especificidades do lugar onde se est inserido (TARDIF, 2002).

    Segundo Tardif (2002) no h como delimitar quais saberes serviro de base para

    os professores. H uma srie de elementos dentre os quais podemos citar: relaes

    estabelecidas no cotidiano da escola, da formao inicial, da trajetria pessoal e

    escolar, por meio dos saberes prticos, etc. Cada professor passar por caminhos

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    distintos dos demais (GARCIA, 1999) e seu desenvolvimento profissional ser

    fruto de suas escolhas e experincias (MIZUKAMI, 2002).

    A formao inicial, por exemplo, deveria fornecer instrumentos e

    ferramentas necessrios prtica docente, para que a partir dela, os professores

    aprendessem a buscar, ir alm, despertar e instigar nos indivduos uma formao

    crtica, form-los em uma perspectiva de continuum durante sua carreira

    (GARCIA, 1999). um longo processo de aprendizagem, tanto ainda na graduao

    como dentro da prpria sala de aula. A respeito disso, duas professoras trazem

    elementos importantes para reflexo:

    A primeira coisa que a formao me ensinou foi aprender a buscar, se

    uma atividade no est dando certo, vai pesquisar, vai correr atrs. A

    segunda foi a prtica vinculada a teoria que eles [professores da

    universidade] passaram. (Entrevista 18/02/2014, Laura).

    Quando a gente est na faculdade aprende a teoria, temos poucos

    momentos de prtica dentro da faculdade. Os estgios que a gente tem

    so de observao, em nenhum momento voc pode assumir a sala,

    colocar em prtica o que voc pensa ou pensa em fazer. (Entrevista

    13/02/2014, Camila).

    De acordo com a professora Camila seu saber ficava condicionado s

    teorias e discursos na universidade. O estgio como componente curricular nos

    cursos de formao inicial um caminho para aproximar os estudantes da sala de

    aula e do ambiente escolar. Segundo Pimenta e Lima (2013), essa aproximao

    contribui para formao de uma identidade nos sujeitos envolvidos, pois esse

    exerccio de relacionar teoria e prtica proporciona aos professores momentos

    reflexivos, contribuindo para seu desenvolvimento profissional, logo, para

    construo da identidade profissional.

    Outro aspecto importante a ser evidenciado, segundo tema em destaque

    nesse texto, a insero dos professores no contexto escolar e as relaes que se

    tecem nesse espao.

    Insero Profissional e influncias na identidade docente

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    A insero do professor iniciante no seu ambiente profissional, na

    instituio escolar um processo importante na construo de sua identidade, onde

    o individual entra em contato com o grupo, isso provoca rupturas e (re)adaptaes.

    Para conviver necessrio aprender uma srie de atributos culturais, simblicos,

    eco