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Órgão de Expressão Oficial da APED Volume 11, Número 2, 2003 ISSN - 0872 - 4814

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DOR ®

Órgão de expressão oficial daASSOCIAÇÃO PORTUGUESA PARA O ESTUDO DA DOR (APED)

Volume 11, Número 2, 2003 ISSN: 0872-4814

2º volume monotemático sobre

INVESTIGAÇÃO EM DOREditor convidado: Profª Deolinda Lima

DirectorJosé Manuel Castro Lopes

Director ExecutivoJosé Manuel Caseiro

Acessora de DirecçãoAna Regalado

Conselho CientíficoAntónio CoimbraAntónio PalhaAquiles GonçaloArmando Brito e SáCardoso da SilvaDaniel Serrão(Pe) Feytor PintoGonçalves FerreiraHelder CameloJoão DuarteJorge TavaresJosé Luis PortelaJosé Manuel Castro LopesMaia MiguelMartins da CunhaNestor RodriguesRobert MartinsWalter OswaldZeferino Bastos

SumárioEditorial IAs vitórias da APED 3José Manuel Caseiro

Editorial IIO desafio da DOR 4Deolinda Lima

Mensagem do Presidente da APED 5José Manuel Castro-Lopes

Estudo de expressão do Drg11 nas regiões cranianasdurante o desenvolvimento das vias nociceptivas 6Osório LA, Rebelo S, Reguenga C, Lima D

Expressão de receptores NK1 e GABAB em neuróniosnociceptivos da medula espinhal do rato 10Castro AR, Pinto M, Lima D, Tavares I

A anandamida, um agonista endógeno do receptorvanilóide, aumenta durante a inflamação da bexiga econtribui para a hiperreflexia e alodínia 15Avelino A, Dinis P, Charrua A, Nagy I, Yacoob M, Cruz F

A actividade das cínases ERK 1 e 2 na medula espinhalcausada pela distensão da bexiga é aumentada emcondições inflamatórias crónicas 20Cruz C, Avelino A, McMahon SB, Cruz F

Correlação entre o efeito dos opióides e as propriedadesfuncionais dos neurónios da substantia gelatinosa damedula espinhal de rato 25Santos S, Safronov BV

Potencialidades da terapia genética no controlo da dor 28Martins I, Pinto M, Wilson SP , Lima D, Tavares I

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1. A Revista “DOR” considerará, para publicação,trabalhos científicos relacionados com a dor emqualquer das suas vertentes, aguda ou crónica e,de uma forma geral, com todos os assuntos queinteressem à dor ou que com ela se relacionem,como o seu estudo, o seu tratamento ou a simplesreflexão sobre a sua problemática. A Revista“DOR” deseja ser o órgão de expressão de todosos profissionais interessados no tema da dor.

2. Os trabalhos deverão ser enviados em diskete3.5“ 2HD (1.4 Mb) ou zip 100 Mb, para a seguintemorada:

Permanyer PortugalAv. Duque d’Ávila, 92, 7º Esq.1050-084 Lisboa

ou, em alternativa, por e-mail: [email protected]

3. A Revista “DOR” incluirá, para além de artigosde autores convidados e sempre que o seu espaçoo permitir, as seguientes secções: ORIGINAIS -Trabalhos potencialmente de investigação básicaou clínica, bem como outros aportes originaissobre etiologia, fisiopatologia, epidemiologia,diagnóstico e tratamento da dor; NOTAS CLÍNICAS -Descrição de casos clínicos importantes; ARTIGOSDE OPINIÃO - assuntos que interessem à dor e suaorganização, ensino, difusão ou estratégias de pla-neamento; CARTAS AO DIRECTOR - inserção de

NORMAS DE PUBLICAÇÃO

objecções ou comentários referentes a artigos pu-blicados na Revista “DOR”, bem como observa-ções ou experiências que possam facilmente serresumidas; a Revista “DOR” incluirá outras sec-ções, como: editorial, boletim informativo aos só-cios (sempre que se justificar) e ainda a reprodu-ção de conferências, protocolos e novidadesterapêuticas que o Conselho Editorial entenda me-recedores de publicação.

4. Os textos deverão ser escritos configurandoas páginas para A4, numerando-as no topo su-perior direito, utilizando letra Times tamanho 12com espaços de 1.5 e incluindo as respectivasfiguras e gráficos, devidamente legendadas, notexto ou em separado, mencionando o local dasua inclusão.

5. Os trabalhos deverão mencionar o título, nomee apelido dos autores e um endereço. Deverãoainda incluir um resumo em português e inglês emencionar as palavras-chaves.

6. Todos os artigos deverão incluir a bibliografiarelacionada como os trabalhos citados e a respec-tiva chamada no local correspondente do texto.

7. A decisão de publicação é da exclusiva respon-sabilidade do Conselho Editorial, sendo levada emconsideração a qualidade do trabalho e a oportu-nidade da sua publicação.

© 2003 Permanyer PortugalAv. Duque d’Ávila, 92 - 7º E1050-084 LisboaTel.: 21 315 60 81 Fax: 21 330 42 96

Impresso em papel totalmente livre de cloro

Este papel cumpre os requisitos de ANSI/NISOZ39-48-1992 (R 1997) (Papel Estável)

Impressão: Comgrafic, S.A.ISSN: 0872-4814Dep. Legal: B-17.364-00Ref.: 254AP032

Reservados todos os direitos.Sem prévio consentimento da editora, não poderá reproduzir-se, nem armazenar-se num suporterecuperável ou transmissível, nenhuma parte desta publicação, seja de forma electrónica, mecâ-nica, fotocopiada, gravada ou por qualquer outro método. Todos os comentários e opiniõespublicados nesta revista são da responsabilidade exclusiva dos seus autores.

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Editorial IAs vitórias da APED

José Manuel Caseiro

Dor (2003) 11

Comemorou-se mais um Dia Nacional de Luta Contra a Dor, este ano sob a égide do nº 5. De facto,foi a 5ª vez que se celebrou o evento, tendo ficado

fortemente assinalado pela decisão governamental de decre-tar a Dor como o 5º Sinal Vital, algo que todos os que lutamno terreno por melhorar as condições assistenciais dos doen-tes com dor há muito reclamavam. Curiosamente, foi também,no meu entender, a 5ª grande vitória da APED (as outrasquatro foram o decreto ministerial que instituíu o Dia Nacionalde Luta Contra a Dor, a publicação do Plano Nacional de LutaContra a Dor, o anúncio do objectivo estratégico da DGS de,até 2007, virem a existir Unidades de Dor Aguda e de DorCrónica em 75% do hospitais portugueses e a realização pelaFMUP do 1º Curso Pós Graduado de Medicina da Dor, compatrocínio da Fundação Gulbenkian), sem prejuízo de outrasacções igualmente vitoriosas mas de menor impacto no meio.

A comemoração deste ano, para além de muito participa-da na sua acção dirigida ao grande público, com uma meiamaratona e uma caminhada na cidade do Porto, envolveuainda uma pequena mas simbolicamente importante campa-nha publicitária televisiva e uma cerimónia na Aula Magna daFaculdade de Medicina da Universidade do Porto, menosconcorrida do que devería ter sido, pela importância determos tido entre nós H. Breivick, presidente da EFIC e pelofacto de terem sido publicamente distribuídos os diplomas aosalunos do 1º Curso de Pós-Graduação em Medicina da Dor.

A importância do reconhecimento da Dor como 5ºSinal Vital, não se esgota no facto de passar aconstituír um registo obrigatório, em paralelo com

os outros quatro que sempre existiram (frequência cardíaca,pressão arterial, temperatura e frequência respiratória). Apartir do momento em que um doente tiver um registoquantificado de existência de dor, deu-se visibilidade a algoque, eticamente, não poderá deixar de ser tratado, nem queseja pela administração rotineira de um simples analgésico,mas que se deseja seja desencadeador de medidas adicio-nais de apoio que permitam lidar com esse facto com amesma seriedade com que se lida com as alterações dosoutros quatro sinais vitais. E se a qualidade de tratamento dador não fica assegurada apenas pelo facto de reconhecer-mos a necessidade de a tornar visível, também não é menosverdade que, a partir do momento em que se estabelece aobrigatoriedade de a incluír nos sinais vitais, se está aaceitar como negligente a sua omissão. É também umexcelente contributo para as mudanças de índole culturalque o nosso País necessita, o que se sauda e se aplaude.

C oncluíu-se, com enorme êxito, o 1º Curso de Pós-Graduação em Medicina da Dor. Numa altura emque se batalha pela possibilidade de obtenção,

no âmbito da Ordem dos Médicos, de uma Competência emMedicina da Dor, temos já 20 clínicos que, humildemente, se

submeteram a um longo e trabalhoso curso de pós-gradua-ção, com um exigente e vasto programa inspirado no CoreCurriculum da IASP e avaliação em todas as áreas ensina-das. Construíu-se assim, desde já, um esqueleto do quepoderão vir a ser, no futuro, as exigências curriculares paraa obtenção da tal Competência e sería bom que ninguém(repito, ninguém) a pudesse vir a obter sem se submeterigualmente a uma avaliação tão criteriosa como aquela a quese submeteram os primeiros e corajosos alunos do Curso dePós-Graduação. O que se deseja, penso eu, com a futuraCompetência, é termos pessoas devidamente qualificadas eque, tal como nas Especialidades Médicas, tiveram quefazer prova da sua competência, sem se escudarem emargumentos oportunistas como o seu passado, o reconheci-mento público ou outros.

A APED vai ganhando assim importância e suman-do triunfos, sem prejuízo do desepero que conti-nuo a sentir em não perceber, nas Administrações

Hospitalares, sinais claros do mesmo empenho pela causada Dor que a própria tutela faz questão de, episodicamente,exibir. Talvez mesmo, inexplicavelmente, também nem todosos que são seus associados respondam com a mesmaassiduidade ou energia ao dinamismo dos que a represen-tam. Ainda assim, Dia Nacional, Plano Nacional, metas para2007, 5º sinal vital e Curso de Pós-Graduação, são prova demuito trabalho e de enorme entrega à causa. Tem sidoinexcedível o poder de argumentação, de firmeza e depersistência que tem caracterizado a acção da APED, bemexpressos na forma como se têm obtido respostas instituci-onais absolutamente pioneiras em todo o mundo e, por issomesmo, também já em fase de serem imitadas. Até o Cursode Pós-Graduação, sem eu ter conhecimento de quantospaíses já optaram por fazê-lo, é algo absolutamente inovadorentre nós, que muitos dirão não ter nada a haver com aAssociação, o que discordo. O prestígio, o dinamismo, oespírito de luta e a capacidade de organização do seuprincipal mentor, o Prof. Dr. José M. Castro Lopes, estãopatentes nos sucessos obtidos, com a sua personalidade aatravessar incontornavelmente todos eles, mas pergunto setería tido a mesma facilidade em congregar toda a espéciede colaborações que conseguiu para a organização teórico-prática do Curso, se não fosse o brilhantismo com que temdesempenhado o seu papel de Presidente da APED e tam-bém, através dele, de Tesoureiro da EFIC.

P ercebe-se que continuo muito optimista. Gostaría,no entanto, de ver as coisas andarem mais de-pressa no que diz respeito ao crescimento assis-

tencial hospitalar. Até porque a qualidade só poderá chegardepois. Mas, mesmo confiante, a vida já me ensinou a nãoser demasiadamente ingénuo e a manter-me atento. Afinal,pouco falta para 2007!

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Editorial IIO desafio da DOR

Deolinda Lima

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Ao contrário do que poderia parecer inquestio nável, ofacto de a dor se impor sempre como um problema de saúdea quantos lidam com o deslindar dos mecanismos que lheestão subjacentes (sejam eles os investigadores ditos “bási-cos” ou as entidades financiadoras) tem contribuído maispara retardar o progresso nesse domínio do que para adescoberta das tão almejadas soluções terapêuticas. Esta aconclusão a que facilmente se chega quando se comparamos conhecimentos alcançados sobre o sistema visual, audi-tivo ou mesmo táctil, para não sair do domínio sensorial, e oponto em que nos encontramos no referente ao sistemanociceptivo. É um sistema complexo, dirão alguns, altamenteimiscuído noutros sistemas neuronais com os quais se rela-ciona de forma permanente e dinâmica, ou, opinarão outros,falho de estruturação anatómica clara, de perfeita segrega-ção, em termos de estrutura e localização, dos vários com-ponentes neuronais. Embora ambas as afirmações sejamcorrectas, não bastam como explicação para o atraso senti-do nesta matéria no momento presente, em particular seatentarmos no não menos complexo, e no entanto, bemmelhor conhecido, processamento auditivo ou visual, e noque de proveito prático se tem retirado desse conhecimento.

Sucede com frequência em áreas como a Biologia (omesmo já não se aplica à Engenharia), e parece ser isso oque neste campo testemunhamos, que a definição clara deobjectivos num processo de investigação limita a capacida-de para avaliar dados e elaborar hipóteses fora do contextopré-definido, aquele em que todo o processo se deve desen-rolar de modo a atingir os fins delineados. Facilmente, por-tanto, são ignorados factos, como tal relevantes para acompreensão do objecto em estudo, tanto por não serempercebidos ou valorizados, apesar de revelados pela expe-rimentação, como por a pesquisa não admitir desvios aotraçado estabelecido sob pena de nos afastarmos da metaa atingir a ponto de a perdermos de vista.

Embora uma das principais razões para este estado decoisas seja o carácter peculiar da investigação em dor, quefacilmente ultrapassa o de investigação pura em Neurociên-cias para se constituir em investigação de um problema desaúde, não lhe são alheias circunstâncias de todos conheci-das, tais como a definição de prioridades pelas Instituiçõesque detêm a capacidade de financiamento e a valorizaçãoda investigação aplicada ou das relações com a Indústria.

Julgo ser a altura de deixarmos de falar em “investigaçãoaplicada” e passarmos a incluir no nosso léxico “aplicações/aplicadores da investigação”. Quem investiga deve perse-guir o gosto pelo saber, seja ele qual for, e estar atento atodas as questões que se lhe levantam, pertinentes ou não,com a perseverança indispensável para encontrar as respos-tas mesmo quando é necessário esperar pelas ferramentasadequadas ou promover a sua construção. A investigaçãoenquanto procura do saber é sempre “fundamental”, e éfundamental que assim seja para que o saber ocupe aposição de relevo que merece no processo científico. Aplica-ção da investigação acontece quando, movido ou não pelascircunstâncias, alguém, o próprio investigador (porque não)ou quem melhor conhece o campo de aplicabilidade, desco-bre que o conhecimento adquirido, aquele preciso saber,pode ser utilizado para um determinado fim.

É este o desafio que a investigação em dor nos coloca:tentarmos ignorar, nem que por períodos curtos, que aquiloque procuramos saber pode vir a ter alguma utilidade, paranos dedicarmos à pesquisa desinteressada; conseguirmos,mesmo assim mantermo-nos tão próximo dos “aplicadores”que nada do que de útil nos saia porventura das mãos possaser desperdiçado. Dos “aplicadores” exige-se paciência ecompreensão para nos manterem no seu círculo coloquialapesar das tão grandes diferenças de linguagem. Talvez daínasça um Esperanto que nos aproxime definitivamente etorne cada vez mais profícua esta relação.

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Editorial IIO desafio da DOR

Deolinda Lima

Dor (2003) 11

Ao contrário do que poderia parecer inquestio nável, ofacto de a dor se impor sempre como um problema de saúdea quantos lidam com o deslindar dos mecanismos que lheestão subjacentes (sejam eles os investigadores ditos “bási-cos” ou as entidades financiadoras) tem contribuído maispara retardar o progresso nesse domínio do que para adescoberta das tão almejadas soluções terapêuticas. Esta aconclusão a que facilmente se chega quando se comparamos conhecimentos alcançados sobre o sistema visual, audi-tivo ou mesmo táctil, para não sair do domínio sensorial, e oponto em que nos encontramos no referente ao sistemanociceptivo. É um sistema complexo, dirão alguns, altamenteimiscuído noutros sistemas neuronais com os quais se rela-ciona de forma permanente e dinâmica, ou, opinarão outros,falho de estruturação anatómica clara, de perfeita segrega-ção, em termos de estrutura e localização, dos vários com-ponentes neuronais. Embora ambas as afirmações sejamcorrectas, não bastam como explicação para o atraso senti-do nesta matéria no momento presente, em particular seatentarmos no não menos complexo, e no entanto, bemmelhor conhecido, processamento auditivo ou visual, e noque de proveito prático se tem retirado desse conhecimento.

Sucede com frequência em áreas como a Biologia (omesmo já não se aplica à Engenharia), e parece ser isso oque neste campo testemunhamos, que a definição clara deobjectivos num processo de investigação limita a capacida-de para avaliar dados e elaborar hipóteses fora do contextopré-definido, aquele em que todo o processo se deve desen-rolar de modo a atingir os fins delineados. Facilmente, por-tanto, são ignorados factos, como tal relevantes para acompreensão do objecto em estudo, tanto por não serempercebidos ou valorizados, apesar de revelados pela expe-rimentação, como por a pesquisa não admitir desvios aotraçado estabelecido sob pena de nos afastarmos da metaa atingir a ponto de a perdermos de vista.

Embora uma das principais razões para este estado decoisas seja o carácter peculiar da investigação em dor, quefacilmente ultrapassa o de investigação pura em Neurociên-cias para se constituir em investigação de um problema desaúde, não lhe são alheias circunstâncias de todos conheci-das, tais como a definição de prioridades pelas Instituiçõesque detêm a capacidade de financiamento e a valorizaçãoda investigação aplicada ou das relações com a Indústria.

Julgo ser a altura de deixarmos de falar em “investigaçãoaplicada” e passarmos a incluir no nosso léxico “aplicações/aplicadores da investigação”. Quem investiga deve perse-guir o gosto pelo saber, seja ele qual for, e estar atento atodas as questões que se lhe levantam, pertinentes ou não,com a perseverança indispensável para encontrar as respos-tas mesmo quando é necessário esperar pelas ferramentasadequadas ou promover a sua construção. A investigaçãoenquanto procura do saber é sempre “fundamental”, e éfundamental que assim seja para que o saber ocupe aposição de relevo que merece no processo científico. Aplica-ção da investigação acontece quando, movido ou não pelascircunstâncias, alguém, o próprio investigador (porque não)ou quem melhor conhece o campo de aplicabilidade, desco-bre que o conhecimento adquirido, aquele preciso saber,pode ser utilizado para um determinado fim.

É este o desafio que a investigação em dor nos coloca:tentarmos ignorar, nem que por períodos curtos, que aquiloque procuramos saber pode vir a ter alguma utilidade, paranos dedicarmos à pesquisa desinteressada; conseguirmos,mesmo assim mantermo-nos tão próximo dos “aplicadores”que nada do que de útil nos saia porventura das mãos possaser desperdiçado. Dos “aplicadores” exige-se paciência ecompreensão para nos manterem no seu círculo coloquialapesar das tão grandes diferenças de linguagem. Talvez daínasça um Esperanto que nos aproxime definitivamente etorne cada vez mais profícua esta relação.

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Mensagem do Presidente da APED

José Manuel Castro-Lopes

Dor (2003) 11

Dando cumprimento a mais um dos objectivos a que nostínhamos proposto, foi criado e encontra-se já activo o siteda APED na internet, no endereço http://www.aped-dor.org.Trata-se de uma versão inicial, que irá agora ser desenvolvi-da no sentido de acrescentar funcionalidades úteis nãoapenas para os associados da APED, mas também paraqualquer prestador de cuidados de saúde e para a popula-ção em geral. Numa sociedade cada vez mais informatizada,onde a busca de informação tem vindo a aumentar exponen-cialmente, o primeiro contacto com uma instituição faz-sefrequentemente através da utilização da internet. Deste modo,a “imagem de marca” dessa instituição está, muitas vezes,associada à forma e conteúdo da informação que essainstituição disponibiliza na internet. Solicito pois a todos osassociados com acesso à internet, que visitem desde já osite, e me façam chegar as sugestões, críticas ou comentáriosque entenderem possam contribuir para o seu melhoramento.

A convite do presidente da Sociedad Española del Dolor(SED), Dr. Manuel Rodriguez, e tirando partido de um simpó-sio para apresentação de um trabalho científico patrocinadopela filial espanhola de uma empresa multinacional da indús-tria farmacêutica, realizou-se no final de Maio, uma reuniãoentre os presidentes de alguns capítulos ibero-americanosda International Association for the Study of Pain (IASP). Paraalém dos presidentes da SED e da APED, estiveram presen-tes os presidentes dos capítulos Brasileiro, Chileno, Peruanoe Uruguaio.

O primeiro objectivo desta reunião era dar a conhecer asdiferentes realidades no que respeita às respectivas socie-dades e ao combate à dor, em países que têm algunsaspectos culturais em comum, mas também grandes diferen-ças socio-económicas e organizacionais. Com esta finalida-de, cada elemento fez uma pequena apresentação da suaAssociação, trabalho desenvolvido e principais objectivos.Foi um grato prazer constatar a apreciação extremamentepositiva e mesmo elogiosa, que os nossos colegas ibero-americanos manifestaram em relação à APED. Os pontosmais apreciados foram a existência de um Plano Nacional deLuta Contra a Dor, a criação de um Dia Nacional de LutaContra a Dor, a organização da Corrida Contra a Dor noano transacto, a proposta da implementação da dor como5º sinal vital e o consenso obtido com outras 7 sociedadescientíficas em torno da proposta da criação da competênciaem Medicina da Dor. Podemos afirmar sem falsas modéstias,que em todos estes pontos estamos mais avançados do quequalquer dos outros países representados na reunião.

A promoção de intercâmbios e possíveis actividades con-juntas era o segundo objectivo desta reunião. Neste âmbito,a SED disponibilizou-se para subsidiar estágios de curtaduração em Unidades de Dor espanholas, segundo critériosa definir, desde que os estagiários obtivessem da respectivaassociação nacional ou de outras fontes, financiamento paraa viagem. Dado que se pretende que uma hipotética asso-ciação ibero-americana estabeleça pontes multilaterais e nãoapenas unívocas, cada associação irá estudar este assuntoe apresentar propostas concretas num futuro próximo. No

que diz respeito à APED, o intercâmbio com os nossoscolegas da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor(SBED) poderá assumir um papel preferencial. Foi aliásnesse sentido que o presidente da SBED, Dr. Jaime OlavoMarquez, propôs a realização do 1º Congresso Luso-Brasilei-ro de Dor, a realizar em simultâneo com o congresso daSBED que terá lugar em Setembro de 2004 em Florianópolis.Ciente de que um número apreciável de colegas portugue-ses já participaram no anterior congresso da SBED, esta éuma proposta que iremos estudar com algum cuidado poisa sua concretização não depende apenas da (boa) vontadedos dirigentes da APED e da SBED, mas dos apoios queambas as associações conseguirem reunir.

Um outro campo de cooperação ibero-americana poderiaser a realização de estudos conjuntos, potenciando assim oseu interesse e impacto científico pelo recrutamento depopulações distintas. A troca de informação é condiçãoindispensável à concretização deste objectivo, pelo que paraalém de comunicações regulares entre os presidentes dasassociações, foi proposta a criação de uma página nainternet, onde possa ser disponibilizada toda a informaçãorelevante para a comunidade ibero-americana.

Desta reunião resultou pois, o embrião de uma novaassociação, cujos contornos terão que ser estudados com ocuidado necessário, pelas direcções das associações queestiveram na sua génese. Pessoalmente, creio ter deixadobem expresso aos meus colegas ibero-americanos, que asobrigações profissionais de todos nós, bem como o rigorético e deontológico que deve pautar a nossa actividade,são cada vez mais incompatíveis com iniciativas de turismopseudo-científico. Uma hipotética associação ibero-america-na contra a dor só terá razão de existir se, na sequência doempenhamento de todos os intervenientes, trouxer vanta-gens acrescidas ao combate à dor nos países participantes.O futuro demonstrará se as boas vontades agora expressasresultam em sinergias com expressão prática relevante. Seassim for poderão contar com o meu apoio.

PS. Escrevo este texto a escassos 10 dias da comemoraçãodo 5º Dia Nacional de Luta Contra a Dor. Dando seguimento auma deliberação da direcção da APED, esforçámo-nos porrealizar este ano uma cerimónia comemorativa que pudesseatrair as entidades governamentais, com o intuito de as sensi-bilizar para a necessidade de incrementar o ritmo de aplicaçãodo Plano Nacional de Luta Contra a Dor. Nesse sentido,tentámos concentrar na mesma cerimónia a celebração do5º Dia Nacional de Luta Contra a Dor, o encerramento do 1ºCurso de Pós-graduação em Medicina da Dor, e o eventualanúncio público da aprovação de uma proposta apresentadaao Senhor Alto Comissário para a Saúde pela Comissão deAcompanhamento do Plano Nacional de Luta Contra a Dor.Não sei ainda se os objectivos serão atingidos, mas segura-mente que continuaremos a lutar pelas nossas convicções,sempre com o objectivo último de melhorar as condiçõesassistenciais a quem sofre de dor no nosso país, utilizandotodas as “armas” que estiverem ao nosso alcance, qualquerque seja o “campo de batalha” em que nos encontremos.

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Estudo de expressão do Drg11nas regiões cranianas durante odesenvolvimento das vias nociceptivas

Osório LA, Rebelo S, Reguenga C, Lima D

Dor (2003) 11

ResumoOs mecanismos moleculares que estão na origem da especificação dos neurónios sensoriais nociceptivossó agora começam a ser entendidos, principalmente através da identificação e caracterização de váriosfactores de transcrição implicados neste processo. Um destes factores, o Drg11, tem um papel determinan-te no desenvolvimento do sistema nociceptivo. Com o intuito de melhor conhecer a sua função, procedeu-se neste trabalho à identificação dos locais de expressão do Drg11 na região craniana de embriões deratinho, para o que se utilizou a técnica de hibridação in situ. Para além dos neurónios aferentes primáriosdos gânglios raquidianos e dos respectivos alvos, o Drg11 expressa-se em locais funcionalmente equiva-lentes na região craniana: o gânglio e o núcleo trigeminal.

Palavras chave: Drg11. Dor. Nociceptores. Complexo trigeminal. Aferentes primários. Medula espinal.

SummaryThe molecular mechanisms involved in the specification of sensitive neurons are just being revealedthrough the identification and characterization of several transcription factors that participate actively inthis process. One of these, Drg11, seems to have an essential function in the development of nociceptivepathway. In order to better understand its function, the authors performed in situ hybridization experimentsto identify the expression of Drg11 in the encephalic region of mouse embryo. Beyond the knownexpression in neurons of the dorsal root ganglion in the spinal cord, Drg11 is expressed in functionallyequivalent sites of the encephalon: the trigeminal ganglion and nucleus.

Key words:

Instituto de Histologia e EmbriologiaFaculdade de Medicina e IBMCUniversidade do Porto, PortoPortugal

IntroduçãoTodos os organismos dependem de uma sé-

rie de comportamentos que garantem a sobre-vivência. Após a exposição a um estímulo nóxi-co (mecânico, químico ou térmico) os animaisexecutam um programa de protecção para evi-tar danos tecidulares. Células especializadasdentro de sistema nervoso periférico detectamestes estímulos nóxicos e levam a informaçãoao sistema nervoso central. Estes neuróniosnociceptivos são anatómica e funcionalmentedistintos dos neurónios sensíveis à estímulosinócuos, tal como o tacto (mecanorreceptores)e a informação posicional (proprioceptores)(Scott, 1992).

O processamento da informação sensitivaproveniente dos tecidos periféricos tem lugarna medula espinal e tronco cerebral. Na medulaespinal, os aferentes sensitivos nociceptivosprojectam para as lâminas superficiais da partedorsal (Lima D, 1998), enquanto na região cra-niana, as funções sensoriais somáticas se pro-cessam através do sistema trigeminal (Sewar-ds, et al., 2002). Os mecanismos molecularesque estão na origem da especificação destesneurónios sensoriais ao longo do desenvolvi-mento só agora começam a ser entendidos,principalmente através da identificação e ca-racterização de vários factores de transcriçãoimplicados neste processo (Ma, et al., 1999;Bertrand, et al., 2002; Caspary, et al., 2003).

Na medula espinal, o Drg11, um factor detranscrição da família dos homeobox, foi recen-temente descrito como tendo um papel deter-minante para o correcto estabelecimento das

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Osório LA, et al.: Estudo de expressão do Drg11 nas regiões cranianas durante o desenvolvimento das vias nociceptivas

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conexões entre os neurónios nociceptivos aferen-tes primários e os seus alvos nas lâminas super-ficiais do corno dorsal (Chen, et al., 2001). Oestudo dos genes que actuam a montante doDrg11 sugere que esta proteína seja regulada deforma distinta nos gânglios raquidianos e na me-dula espinal, apontando assim para a possibilida-de de existirem diferentes modos de acção doDrg11, conforme a especificidade do local deexpressão (Chen, et al., 2001; Quian, et al., 2002).

Neste trabalho procedeu-se identificar, porrecurso à técnica de hibridação in situ, osvários locais de expressão do Drg11, com par-ticularmente realce para a região craniana.

Materiais e métodosExtracção de RNA total

Quatro ratinhos, com uma semana de idade,foram sacrificados de acordo com os padrõeséticos vigentes (Zimmermann, 1983). Os res-pectivos gânglios raquidianos foram recolhidose utilizados para a extracção de RNA totalatravés do método do tiocianeto de guanidinautilizando-se para este fim o produto RNA-gents®‚ Total RNA Isolation System (Promega),de acordo com as instruções do fabricante.

Síntese das sondas ribonucleicasO cDNA correspondente aos nucleótidos

327-807 da sequência de Drg11 de ratinho(GenBank AK039633) foi amplificado por RT-PCR a partir de RNA total de gânglios raquidi-anos, utilizando-se para este efeito os primers5´-aaggaacccatggcagag-3´ e 5´-tcatacactcttc-tctccctcgc-3´. O fragmento obtido foi purificadoe clonado, por TA cloning, no plasmídio pCR2.1(Invitrogen). Os plasmídios contendo a inserçãoforam purificados e utilizados para a síntese desondas ribonucleicas antisense (complementar aomRNA de Drg11) e sense (controlo negativo),marcadas com digoxigenina, utilizando-se paraeste fim o produto DIG DNA Labeling Kit (Roche).

Hibridação in situPara a hibridação in situ, os tecidos embri-

onários de ratinhos de várias idades foramfixados em 4% paraformaldeído durante 12 ha 4 ºC e crioprotegidos numa solução de 30%(p/v) de sacarose em tampão fosfato até seremprocessados. O material foi então criosecciona-do, em cortes com espessura de 10 µm. Apósmontagem em lâminas, os cortes foram fixadosem 4% paraformaldeído durante 20 min, lavadosem PBS e tratados com proteinase K (0,4 µg/ml)durante 7 min. Após lavagem com PBS, oscortes foram novamente fixados em 4% parafor-maldeído durante 15 min, lavados com PBS eincubados com o tampão de hibridação (50%formamida, 5X SSC, 0,3 mg/ml tRNA, 100 µg/mlde heparina, 1X solução de Denhardt, 0,1% (p/v) Tween 20, 0,1% (p/v) CHAPS e 5 mM EDTA)

durante 4 h a 56 ºC. De seguida, os cortesforam incubados com as sondas RNA em tam-pão de hibridação numa diluição de 1µg/mldurante 16 h a 56 ºC. Após a ligação, as prepa-rações foram lavadas, pré-incubadas durante 1 hcom 20% de soro em PBT, e incubadas 16 h, a4 ºC, com um anticorpo antidigoxigenina conju-gado com a fosfatase alcalina. A revelação foiefectuada com os cromogénicos NBT e BCIP.

Coloração pelo formol-tioninaOs cortes foram corados por formol-tionina

de acordo com procedimentos padrão (Donovi-ck, 1974). Brevemente, as preparações foramincubadas 5 min com a solução de acetonaácida (80% de acetona em ácido acético), lava-das com água e coradas com 0,1% de tioninadurante 7 min. A descoloração foi efectuadacom uma solução contendo 66% de propanol e3% de ácido acético.

ResultadosPara proceder à hibridação in situ, foi sinteti-

zada uma sonda ribonucleica conforme descri-to nos materiais e métodos. A especificidadedesta sonda foi testada por controlo negativocom uma sonda RNA sense produzida para oefeito. As experiências de hibridação in situforam efectuadas em secções de tecido embri-onário. De acordo com dados recentes (Chen,et al., 2001; Quian, et al., 2002), o Drg11 ex-pressa-se inicialmente nos gânglios raquidia-nos de embriões de 11,5 dias de idade (E11.5),seguindo-se, um dia mais tarde, expressão nocorno dorsal da medula espinal. Este padrãode expressão mantem-se em idades embrioná-rias mais tardias (Fig. 1a), e durante algumassemanas pós-natais (dados não apresentados).A expressão detectada é específica uma vezque não se observa nenhuma marcação com asonda ribonucleica controlo (Fig. 1b). Em colo-rações citoarquitectónicas pelo formol-tionina(Fig. 1c), confirma-se a expressão do Drg11nas lâminas superficiais do corno dorsal damedula espinal, região que recebe os aferentesprimários nociceptivos vindos do gânglio raqui-diano.

Em secções coronais da porção craniana deembriões de ratinho, detectou-se marcação nosgânglios trigeminais (Fig. 2a), conforme é reve-lado por coloração de cortes adjacentes comformol-tionina (Fig. 2b), e nas lâminas superfici-ais dos núcleos trigeminais (Fig. 3a, b). O com-plexo trigeminal sensitivo divide-se em doiscomponentes, as porções espinal e principal(Sewards, et al., 2002). De modo a possibilitaruma visualização mais clara das diversas por-ções do complexo trigeminal, foram utilizadoscortes transversais. Foi detectada expressão doDrg11 nas porções espinal e principal do nú-cleo trigeminal (Fig. 3c), estruturas identificadasatravés da coloração por formol-tionina (Fig. 3d).

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DiscussãoO Drg11 é um dos factores de transcrição

essenciais ao desenvolvimento das vias noci-ceptivas (Chen, et al., 2001; Quian, et al., 2002).Actualmente, é o único em que o silenciamentodo respectivo gene provoca alterações exclusi-vamente no sistema nociceptivo, nomeadamen-te deficiências na penetração das projecçõesdos neurónios nociceptivos dos gânglios raqui-dianos nas lâminas superficiais do corno dorsalda medula espinal (Chen, et al., 2001). Contu-do, muito pouco se sabe sobre o modo deacção do Drg11. Neste estudo demonstra-seque o Drg11 se expressa não apenas nosgânglios raquidianos e nas lâminas superficiaisdo corno dorsal da medula espinal, mas tam-bém nas regiões cranianas funcionalmente equi-valentes, nomeadamente os gânglios trigemi-nais e as porções espinal e principal.

O complexo trigeminal sensitivo recebe afe-rentes primários de estruturas orofaciais e podeser comparado ao corno dorsal da medulaespinal. De facto, os aferentes nociceptivos

com origem nos gânglios trigeminais projectampara as lâminas superficiais do complexo trige-minal (Sewards, et al., 2002). Assim, os dadosdisponíveis sublinham o papel do Drg11 naconexão entre o primeiro e o segundo neurónioda via nociceptiva ao longo de todo o eixorostrocaudal. Resta esclarescer, por meio detécnicas mais sensíveis, se o Drg11 se expres-sa também em zonas ditas de terceira ordempara o processamento nociceptivo, tal como otálamo. A verificar-se, estes resultados apoiam ahipótese do Drg11 estar implicado no estabeleci-mento das vias nociceptivas na sua globalidade.

Agradecimentos

Este trabalho foi financiado através- do pro-jecto FCTSapiens 32257/99.

BibliografiaBertrand N, Castro DS, Guillemot F. Proneural genes and the specification

of neural cell types. Nat Rev Neurosci 2002;3(7):517-30.Caspary T, Anderson KV. Patterning cell types in the dorsal spinal cord:

what the mouse mutants says. Nat Rev Neurosci 2003;4:289-97.

Figura 2. Expressão do Drg11 nos gânglios trigeminais. A) Hibridação in situ com uma sonda ribonucleica de Drg11em secções coronais da região craniana de embriões de ratinho no dia E14.5. B) Coloração por formol-tionina deuma secção adjacente (B). As setas indicam a localização dos gânglios trigeminais.

Figura 1. Expressão do Drg11 na medula espinal e nos gânglios raquidianos. Hibridação in situ com uma sondaribonucleica de Drg11 antisense (A) e sense (B) a partir de cortes transversais da medula lombar de embriões deratinho no dia E14.5. Em (C) um corte adjacente corado por formol-tionina. As setas indicam expressão de Drg11nos gânglios raquidianos (DRG) e nas lâminas superficiais do corno dorsal da medula espinal.

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DiscussãoO Drg11 é um dos factores de transcrição

essenciais ao desenvolvimento das vias noci-ceptivas (Chen, et al., 2001; Quian, et al., 2002).Actualmente, é o único em que o silenciamentodo respectivo gene provoca alterações exclusi-vamente no sistema nociceptivo, nomeadamen-te deficiências na penetração das projecçõesdos neurónios nociceptivos dos gânglios raqui-dianos nas lâminas superficiais do corno dorsalda medula espinal (Chen, et al., 2001). Contu-do, muito pouco se sabe sobre o modo deacção do Drg11. Neste estudo demonstra-seque o Drg11 se expressa não apenas nosgânglios raquidianos e nas lâminas superficiaisdo corno dorsal da medula espinal, mas tam-bém nas regiões cranianas funcionalmente equi-valentes, nomeadamente os gânglios trigemi-nais e as porções espinal e principal.

O complexo trigeminal sensitivo recebe afe-rentes primários de estruturas orofaciais e podeser comparado ao corno dorsal da medulaespinal. De facto, os aferentes nociceptivos

com origem nos gânglios trigeminais projectampara as lâminas superficiais do complexo trige-minal (Sewards, et al., 2002). Assim, os dadosdisponíveis sublinham o papel do Drg11 naconexão entre o primeiro e o segundo neurónioda via nociceptiva ao longo de todo o eixorostrocaudal. Resta esclarescer, por meio detécnicas mais sensíveis, se o Drg11 se expres-sa também em zonas ditas de terceira ordempara o processamento nociceptivo, tal como otálamo. A verificar-se, estes resultados apoiam ahipótese do Drg11 estar implicado no estabeleci-mento das vias nociceptivas na sua globalidade.

Agradecimentos

Este trabalho foi financiado através- do pro-jecto FCTSapiens 32257/99.

BibliografiaBertrand N, Castro DS, Guillemot F. Proneural genes and the specification

of neural cell types. Nat Rev Neurosci 2002;3(7):517-30.Caspary T, Anderson KV. Patterning cell types in the dorsal spinal cord:

what the mouse mutants says. Nat Rev Neurosci 2003;4:289-97.

Figura 2. Expressão do Drg11 nos gânglios trigeminais. A) Hibridação in situ com uma sonda ribonucleica de Drg11em secções coronais da região craniana de embriões de ratinho no dia E14.5. B) Coloração por formol-tionina deuma secção adjacente (B). As setas indicam a localização dos gânglios trigeminais.

Figura 1. Expressão do Drg11 na medula espinal e nos gânglios raquidianos. Hibridação in situ com uma sondaribonucleica de Drg11 antisense (A) e sense (B) a partir de cortes transversais da medula lombar de embriões deratinho no dia E14.5. Em (C) um corte adjacente corado por formol-tionina. As setas indicam expressão de Drg11nos gânglios raquidianos (DRG) e nas lâminas superficiais do corno dorsal da medula espinal.

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Osório LA, et al.: Estudo de expressão do Drg11 nas regiões cranianas durante o desenvolvimento das vias nociceptivas

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Figura 3. Expressão do Drg11 nos núcleos trigeminais. A) Hibridação in situ com uma sonda ribonucleica de Drg11em secções coronais da porção craniana de embriões de ratinho no dia E14.5. B) Ampliação da região delineadapor uma caixa em A. As setas indicam a expressão do Drg11 no sistema trigeminal. C) Hibridação in situ com umasonda RNA de Drg11 em secções transversais da porção craniana de embriões de ratinho no dia E18.5.D) Coloração por formol-tionina de uma secção adjacente. As setas tracejadas indicam a localização do núcleotrigeminal principal enquanto que as cabeças de setas indicam o núcleo trigeminal espinal.

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Expressão de receptores NK1 eGABAB em neurónios nociceptivos damedula espinhal do rato

Castro AR, Pinto M, Lima D, Tavares I

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ResumoNeste trabalho estudou-se a participação dos receptores NK1 e GABAB da medula espinhal no processa-mento de estímulos dolorosos mecânicos aplicados de forma sustentada na pele do rato. Para o efeitocombinámos a reacção imunocitoquímica para cada um dos receptores com a detecção da proteína Fos,cuja síntese foi induzida em neurónios do corno dorsal da medula espinhal pelo estímulo doloroso atrásmencionado. Para além disso, efectuámos reacções imunocitoquímicas triplas em que se detectava, emsimultâneo, os receptores NK1, os receptores GABAB e a proteína Fos. Os resultados mostraram que, paraambos os receptores, eram preferencialmente recrutados os neurónios da lâmina I e que era, também aí,que os dois receptores co-localizavam no mesmo neurónio. O balanço das influências excitatórias einibitórias exercidas pelos neurónios da lâmina I que exprimem aqueles receptores deve ser crucial nadeterminação do impulso nociceptivo transmitido para as áreas supraspinhais.

Palavras chave: Dor mecânica. Corno dorsal. Proto-oncogene c-fos.

AbstractIn this study we analysed the involvement of NK1 and GABAB receptors at the spinal dorsal horn in thetransmission of nociceptive mechanical input sustainely applied to the skin of the rat. For this purpose wecombined an immunocytochemical reaction for each receptor with the detection of the Fos protein, whichwas induced in dorsal horn neurons by the noxious stimulus refered above. We also carried out a tripleimmunoreaction for both receptors and for the Fos protein. The results show that each receptor waspreferentially activated in nociceptive lamina I neurons and that this lay was also where co-localization ofthe two receptors occurred in the same neuron. The balance between excitatory and inhibitory influencesexerted by the NK1 and GABAB receptors on lamina I neurons is likely to be critical in the nature ofnociceptive input transmitted to supraspinal regions.

Key words: Mechanic pain. Dorsal horn. C-fos proto-oncogene.

Instituto de Histologia e EmbriologiaFaculdade de Medicina e IBMCUniversidade do Porto, Portugal

IntroduçãoA transmissão da informação nociceptiva

na medula espinhal envolve a participação dediversos neurotransmissores. De entre os neu-roagentes de maior importância destacam-se asubstância P (SP) e o ácido gamaaminobutírico(GABA). Relativamente à SP, encontra-se per-feitamente estabelecido que este peptídeo seliberta no corno dorsal da medula espinhalapós estimulação nóxica de tecidos periféricos

(para revisão ver Snijdelaar, et al., 2000). Sabe-se, também, que a acção da SP no processa-mento doloroso na medula resulta duma acçãodirecta sobre receptores NK1. No corno dorsalda medula espinhal, a área envolvida no proces-samento de informação dolorosa, os receptoresNK1 predominam nas lâminas I e II (Littlewood,et al., 1995; Mantyh, et al., 1985) e, dado quea rizotomia dorsal não reduz a expressão da-queles receptores, pensa-se que os receptoresNK1 tenham uma localização pós-sináptica(Yashpal, et al., 1991). Os estudos do papel dosreceptores NK1 na transmissão dolorosa namedula espinhal centralizaram-se em estímulosnóxicos agudos. Verificou-se que a injecção de

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Castro AR, et al.: Expressão de receptores NK1 e GABAB em neurónios nociceptivos da medula espinhal do rato

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apoiar estes dados, surgem outros estudos quemostram que a actividade de neurónios nocicep-tivos espinhais, avaliada pela expressão da pro-teína Fos cuja síntese é induzida por activaçãodo proto-oncogene c-fos, diminui em animaiscom uma inflamação articular crónica após aadministração de baclofeno (Castro, et al., 1999).

O balanço entre as influências excitatórias einibitórias exercidas sobre os neurónios espi-nhais determinam as características dos impul-sos dolorosos transmitidos supraespinhalmente.Porém, desconhece-se o modo como estasduas influências actuam individualmente sobreos neurónios nociceptivos da medula espinhal.Com o propósito de esclarecer a participaçãorelativa dos receptores NK1 e GABAB na trans-missão da informação nociceptiva na medulaespinhal realizámos um estudo em duas eta-pas. Na primeira, a detecção imunocitoquímicade cada um dos receptores foi combinada coma imunorreacção para a proteína Fos, induzidapor estímulo doloroso cutâneo mecânico aplica-do à pele durante 2 h. Posteriormente, procede-mos à realização de uma tripla imunorreacçãodestinada a avaliar a co-localização dos doisreceptores, pelo que combinámos, nos mesmoscortes, a detecção imunocitoquímica da prote-ína Fos com a daqueles receptores.

Materiais e métodos

Neste trabalho foram usados 12 ratos machos,da estirpe Wistar, provenientes dos laboratóriosCharles River (Espanha), mantidos de acordocom a legislação em vigor (Directiva 86/609 daUnião Europeia). Os animais foram anestesia-dos com pentobarbital i.p. (50 mg/kg) e subme-tidos à estimulação nóxica mecânica de umaárea restrita da pele que recobre a parte internado membro posterior esquerdo. Usámos um pro-tocolo de estimulação mecânica já publicado(Lima, et al., 1993; Tavares, et al., 1993, 1995),que consiste em beliscar a pele com uma pinçade dentes de rato, a intervalos de 2 min e comintensidade controlada. Duas horas após o iní-cio da experiência, os animais foram perfundi-dos com uma mistura de paraformaldeído a 4%e ácido pícrico a 14%. Após a perfusão, ossegmentos T13-L3 da medula espinhal foram re-movidos, pós-fixados na mesma solução de fixa-ção e cortados com uma espessura de 60 µm.Os animais foram, então, divididos em doisgrupos de seis ratos consoante se destinavamàs reacções imunocitoquímicas duplas ou tri-plas. Nas reacções imunocitoquímicas duplas,os cortes foram incubados num anticorpo con-tra a proteína Fos e usou-se um fluorocromoque, observado em microscopia de fluorescên-cia, emite radiações cujo comprimento de ondaé de 519 nm, pelo que os núcleos imunorreac-tivos para a proteína Fos eram observados coma cor verde. Após várias lavagens, uma dasséries de cortes foi incubada em anticorpo que

antagonistas daqueles receptores bloqueia asrespostas de neurónios nociceptivos (McCar-son e Krause, 1996; Radhakrishnan, et al.,1998). Por outro lado, a aplicação intratecal deSP induz um aumento das respostas comporta-mentais a estímulos dolorosos agudos (Björk-man, et al., 1994; Malmberg e Yaksh, 1992).Mais recentemente, os estudos foram alargadosa situações de dor prolongada. A destruiçãoselectiva de neurónios espinhais que exprimemo receptor NK1 resulta na diminuição da hipe-ralgesia induzida pela administração intraplan-tar de substâncias irritantes como a capsaicina(Manthy, et al., 1997). Para além disso, a admi-nistração intratecal de antagonistas dos recep-tores NK1 diminui as respostas na segundafase do teste do formol quando há uma sensi-tização dos neurónios do corno dorsal, mas nãoaltera a primeira fase do teste e atenua, demodo dependente da dosagem, a hiperalgesiatérmica e mecânica após injecção de carrage-nina (Traub, 1996). Em conjunto, os dados apre-sentados sugerem que os receptores NK1 têmum papel importante na produção de hiperalge-sia e alodínia.

Relativamente ao GABA, sabe-se que é umdos principais neurotransmissores inibitórios nosistema nervoso central. O envolvimento da-quele aminoácido na transmissão sensitiva namedula espinhal encontra-se profundamentedemonstrado, tendo-se verificado que participana despolarização dos aferentes primários (Ec-cles, 1964). A acção do GABA na modulaçãoda transmissão dolorosa na medula espinhalparece fazer-se sobretudo através de recepto-res GABAB, não sendo consensual a participa-ção dos receptores GABAA (Castro, et al., 1999;Hammond e Drower, 1984). No corno dorsal damedula espinhal, os receptores GABAB concen-tram-se nas lâminas I-IV (Bowery, et al., 1984,1987), onde se admite que exerçam os seusefeitos através de mecanismos pré- e pós-si-nápticos. O baclofeno, agonista dos receptoresGABAB, diminui a transmissão sináptica excita-tória por mecanismos que envolvem a diminui-ção da libertação de aminoácidos excitatórios eneuropéptidos de aferentes primários (Kangrga,et al., 1991; Malcangio e Bowery, 1993). Pós-sinapticamente, verificou-se que o baclofenoprovoca a hiperpolarização da membrana deneurónios do corno dorsal da medula espinhal(Kangrga, et al., 1991). Os receptores GABABparticipam na transmissão de estímulos doloro-sos agudos dado que a administração intrate-cal de baclofeno induz analgesia em diversostestes comportamentais (Hammond and Wa-shinghton, 1993; Malcangio, et al., 1991). Oenvolvimento dos receptores GABAB em situa-ções de dor sustentada encontra-se tambémdemonstrado. As respostas comportamentaisna segunda fase do teste do formol são aumen-tadas na presença de antagonistas dos recep-tores GABAB (Green e Dickenson, 1997). A

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reconhece os receptores NK1 enquanto na ou-tra série se usava um anticorpo contra os re-ceptores GABAB. A revelação dos receptoresNK1 e GABAB foi feita de modo semelhante, istoé, usando um anticorpo secundário biotinilado,seguido de um fluorocromo que, quando exci-tado em microscópio de fluorescência, emiteradiação com 617 nm por neurónios imunoreac-tivos para os receptores NK1 ou GABAB peloque estes apareciam com a cor vermelha. Emcada imunorreacção dupla, ou seja Fos + NK1ou Fos + GABAB foram examinados 15 cortes,aleatoriamente seleccionados, usando um mi-croscópio de fluorescência que fazia secciona-mento óptico (microscópio confocal). No cornodorsal da medula espinhal (lâminas I a V),contaram-se todos os neurónios imunorreactivospara a proteína Fos, para cada um dos recepto-res e duplamente marcados para a proteína Fose para cada um dos receptores. Usou-se oteste de X2 corrigido para comparações múlti-plas para comparar as percentagens de neuró-nios que exibiam imunorreacção simultâneapara a proteína Fos e para o receptor NK1 comos que possuíam reacção para a proteína Fos epara os receptores GABAB.

Na reacção imunocitoquímica tripla usámosum protocolo similar ao anteriormente descritomas utilizámos 3 fluorocromos que conferiamuma cor distinta à proteína Fos, aos receptoresNK1 e aos receptores GABAB. Para o efeito, aproteína Fos foi revelada por um anticorpo de-tectado por fluorocromo que emite a 688 nm,sendo observada com a cor azul. Os cortesforam de seguida, incubados em anticorpo con-tra os receptores NK1 e revelados com o fluo-rocromo que emite na gama do verde. Para osreceptores GABAB usou-se o fluorocromo queemite na radiação vermelha. Foram contados,em 15 cortes da medula escolhidos ao acaso,os neurónios imunorreagidos para cada um dosreceptores, para a proteína Fos ou triplamentemarcados. As percentagens de neurónios queco-localizavam os receptores NK1 e os recepto-res GABAB foi comparada consoante as célulascontinham ou não a reacção para a proteína Fos.

Resultados

Os receptores NK1 e GABAB ocorriam empericários e fibras dispersos na substância cin-zenta da medula espinhal (Fig. 1A e 1B) mas aquantificação restringiu-se aos pericários queocorriam no corno dorsal (Fig. 2). A maioria dospericários com reacção imunocitoquímica paraos receptores NK1 ocorria na lâmina I (75%)enquanto os valores nas lâminas II, III e IV-Veram semelhantes (cerca de 8% em cada). Ospericários imunorreactivos para os receptoresGABAB predominavam nas lâminas IV-V (70%),seguidos da lâmina I (21%). Foram observadospoucos neurónios nas lâminas II e III (6 e 3%,respectivamente).

A expressão da proteína Fos era detectadapela presença de núcleos de contornos bemdefinidos onde ocasionalmente sobressaíam osnucléolos (Fig. 1C). Estes distribuíam-se diferen-cialmente nas várias lâminas do corno dorsal damedula espinhal, predominando na lâmina I(45%), seguindo-se a lâmina II (33%), a lâminaIV-V (15%) e por último a lâmina III (7%). Estadistribuição diferencial da proteína Fos está deacordo com os dados de estudos previamentepublicados usando o mesmo protocolo de es-timulação dolorosa (Lima, et al., 1993; Tavares,et al., 1993, 1995).

Os neurónios duplamente marcados para umdos receptores e para a proteína Fos encontra-vam-se predominantemente na lâmina I quernos receptores NK1 (81%) quer nos GABAB(73%). A proporção de neurónios com recepto-res NK1 que também era imunorreactiva para aproteína Fos era superior na lâmina I atingindo-se diferenças estatisticamente significativas quan-do se comparavam com a lâmina III (Fig. 3).Relativamente aos receptores GABAB, ocorriaum predomínio mais acentuado da dupla mar-

Figura 1. Microfotografias de fluorescência mostrandoo mesmo neurónio (setas) triplamente marcado para osreceptores NK1 (A), GABAB (B) e proteína Fos.

• I

I I

III

IV-V

••

••

•• ••

Figura 2. Distribuição dos receptores NK1 (círculos) eGABAB (triângulos) no corno dorsal da medulaespinhal. Cada símbolo representa 10 neurónios queexprimem o respectivo receptor.

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cação na lâmina I (Fig. 3). Quando se compa-ravam entre si as proporções de neuróniosduplamente marcados para cada receptor, veri-ficou-se que os receptores NK1 predominavamsobre os GABAB nas lâminas II e IV-V enquantoo oposto acontecia na lâmina III (Fig. 3). Aspercentagens de neurónios marcados para aproteína Fos e que também eram imunorreacti-vos para um dos receptores era largamentesuperior na lâmina I (Fig. 4). Quando os doisreceptores eram comparados entre si, detectá-mos um predomínio acentuado da dupla mar-cação para os receptores GABAB em todas aslâminas do corno dorsal (Fig. 4).

No estudo da tripla marcação, verificámosque os pericários que co-localizavam os doisreceptores ocorriam quase exclusivamente nalâmina I. Destes, a grande maioria (63%) tam-bém apresentava imunorreacção para a proteí-na Fos.

Discussão

Os resultados deste estudo em que analisá-mos a participação dos receptores NK1 e GA-BAB no processamento de informação dolorosamecânica, revelaram novas perspectivas daparticipação daqueles receptores nos neuróni-os individuais do corno dorsal da medulaespinhal. No que respeita à análise dos da-dos relativos aos receptores NK1, é pertinen-te salientar que as proporções de neuróniosnociceptivos que exprimem receptores NK1 éabsolutamente idêntica às obtidas noutros estu-dos em que a síntese da proteína Fos erainduzida por diversos tipos de estímulos noci-ceptivos (Doyle e Hunt, 1999). Deste modo, osnossos resultados reforçam a proposta feita poraqueles autores de que os neurónios da lâmina Ique exprimem os receptores NK1 estão envolvi-dos na discriminação da intensidade dolorosa,

Figura 3. Percentagens (± erro da média) dos neurónios marcados para os receptores NK1 (barras brancas) ou paraos receptores GABAB (barras tracejadas) que também estavam marcados para a proteína Fos (*p<0.05; ***p<0.005).

Figura 4. Percentagens (± erro da média) dos neurónios marcados para a proteína Fos e que também exprimiam osreceptores NK1 (barras brancas) ou os receptores GABAB (barras tracejadas; *p<0.05, ***p<0.005).

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enquanto os neurónios das lâminas profundasestarão sobretudo relacionados com a identifi-cação do tipo de estímulo nociceptivo (Hunt,2000; Hunt e Manthy, 2001).

A análise quantitativa da distribuição de peri-cários imunorreactivos para os receptores GA-BAB no corno dorsal da medula espinhal foiefectuada pela primeira vez no nosso estudotendo-se sido verificado que predominavam naslâminas IV-V. Para além disso, o nosso estudofoi o primeiro a abordar a activação nociceptivade neurónios espinhais que exprimem os re-ceptores GABAB, sendo evidente um predomí-nio da activação na lâmina I. É possível que anatureza do estímulo doloroso aplicado possadeterminar o local de recrutamento dos neuró-nios com receptores GABAB. A apoiar esta su-gestão, existem dados que mostram que, nador inflamatória, o baclofeno inibe preferencial-mente as respostas nociceptivas de neuróniosdas lâminas profundas do corno dorsal (Burito-va, et al., 1996).

Da análise global dos resultados deste trabalhosobressai a expressão preferencial dos recepto-res NK1 e GABAB em neurónios nociceptivos dalâmina I. De facto, tanto os neurónios dupla-mente marcados para cada um dos receptorese para a proteína Fos como os triplamentemarcados ocorriam na lâmina I. Dado que alâmina I está envolvida na transmissão supras-pinal de informação nociceptiva (Lima, 1997), obalanço de influências excitatórias e inibitóriasexercidas sobre estes neurónios deve ser deter-minante na transmissão supraspinal de informa-ção nociceptiva. Torna-se crucial analisar se oreferido balanço se altera quando o sistemaprocessa outro tipo de informação dolorosa,nomeadamente na dor crónica. Para o efeito,temos em curso um estudo em que a metodo-logia aqui descrita é aplicada a um modelo deinflamação articular crónica.

AgradecimentosA investigação incluída neste trabalho foi sub-

sidiada pelo projecto POCTI/NSE/38952/2001da Fundação para a Ciência e Tecnologia epelo “Programa Dor” da Fundação CalousteGulbenkian. A Mestre Ana Rita Castro é docen-te da Universidade Fernando Pessoa a prepa-rar o doutoramento no nosso laboratório.

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Avelino A, et. al.: A anandamida, um agonista endógeno do receptor vanilóide

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A anandamida, um agonista endógenodo receptor vanilóide, aumenta durantea inflamação da bexiga e contribuipara a hiperreflexia e alodínia

Avelino A1, Dinis P2, Charrua A1, Nagy I3, Yacoob M4, Cruz F1,2

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ResumoA anandamida (ANA), um lipídeo endógeno, mostrou capacidade de activar o receptor vanilóide (VR1) invitro. Dado que a ANA é um agonista endógeno quer do VR1, quer do receptor canabinóide 1 (CB1),estudou-se (i) a variação da concentração da ANA na cistite crónica; (ii) o efeito da aplicação de ANA e deANA em conjunto com SR141716A, um antagonista do CB1, e com a capsazepina (CPZ), um antagonista doVR1, em bexigas normais de ratos, e (iii) a possibilidade da ANA induzir dor na bexiga e desta ser mediadapor nociceptores sensíveis à capsaicina. Verificou-se que: (i) a ANA aumenta na inflamação; (ii) a suaaplicação aumenta as contracções vesicais, e (iii) que induz dor através de nociceptores sensíveis àcapsaicina. Estes resultados podem ser relevantes para a compreensão da dor e da hiperactividade dabexiga durante a inflamação.

Palavras chave: Inflamação vesical. Anandamida. Receptor vanilóide tipo 1. Receptor canabinóide 1.SR141716A. Capsazepina.

1Instituto de Histologia e Embriologia, Faculdade deMedicina do Porto e IBMC, 4200-319 Porto, Portugal2Departamento de Urologia, Hospital S. Jão,4200-319 Porto, Portugal3Departamento de Anestesia, Imperial College, Chelseaand Westminster Hospital, Londres, Reino Unido4Novartis Institute for Medical Research, Londres,Reino Unido

IntroduçãoO receptor vanilóide tipo 1 (VR1) é um canal

catiónico não selectivo (McCleskey e Gold,1999). Este receptor parece desempenhar umpapel importante no desenvolvimento da alodí-nia (Vizzard, 2000) e da hiperactividade vesi-cais (Cruz, et al., 2002) subsequentes à infla-mação da bexiga. De facto, a regulaçãonegativa do VR1 através da acção da resinife-ratoxina (RTX) diminui a alodínia e a hiperactivi-dade vesical em ratos cujas bexigas foramcronicamente inflamadas por um agente quími-co (Dinis, et al., submetido para publicação).Por outro lado, a aplicação de um ligandoexógeno específico do VR1, a capsaicina, des-perta dor no homem, comportamento doloroso

nos animais e hiperactividade vesical em am-bos (Maggi, et al., 1989; Cruz, et al., 1996).

Os mecanismos de activação do VR1, duran-te a inflamação crónica da bexiga, não sãoainda bem conhecidos. Isto deve-se, em parte,ao desconhecimento de uma substância endó-gena que possa activar o VR1, tal como acapsaicina o faz. Os mecanismos de activaçãoendógena do VR1 que têm sido propostos in-cluem a baixa do pH no tecido inflamado e aacumulação de mediadores inflamatórios, taiscomo o NGF e a bradicinina (Cesare e McNau-ghton, 1996; Miller, et al., 2002). Contudo, aexistência de um agonista endógeno, com ca-racterísticas semelhantes às da capsaicina éainda desconhecido.

Recentemente, a anandamida (ANA), um lipí-deo com uma cadeia alifática, semelhante à dacapsaicina, sintetizado por macrófagos, peloendotélio vascular (Di Marzo, et al., 1996) e poraferentes primários (Ahluwalia, et al., 2003),mostrou activar o VR1, em experiências condu-zidas in vitro (Zygmunt, et al., 1999). De facto,a ANA induz vasodilatação e libertação deCGRP em vasos sanguíneos de rato, que sãobloqueadas pela capsazepina (CPZ), um anta-

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Avaliação do efeito nociceptivo da ANAOs animais foram anestesiados com hidrato

de cloral 35% (0,1 ml/100 g) e a bexiga foicateterizada pela uretra, instilando-se durante30 min, 0,5 ml de soro fisiológico, de ANA 50µM, ou de ANA + CPZ, ambos a 50 µM. Umahora e meia após o fim da aplicação, os animaisforam fixados por perfusão transaórtica, comparaformaldeído a 4% e ácido pícrico a 10%. Nofinal colheu-se a medula espinal, a qual foi pós-fixada durante duas horas no mesmo fixador, ecrioprotegida, durante 24 h, em sacarose a30%. O segmento espinal L6 foi cortado trans-versalmente a 40 micrómetros num micrótomode congelação, sendo cada um em cada qua-tro cortes imunorreagido contra a proteína Fos,usando o método ABC-HRP. As células imuno-positivas foram contadas em 10 cortes por seg-mento.

Tratamento estatísticoTodo os resultados obtidos nesta experiência

foram analisados com o test t, de distribuiçãounicaudal. Valores de p < 0,05 foram conside-rados significativos.

ResultadosQuantificação da anandamida

O resultado da análise por espectrometria demassa mostrou que as bexigas dos ratos injecta-dos com soro fisiológico continham 32,15 ± 3,35pmol ANA/g de peso seco da bexiga. Ao fim das4 h após a indução da inflamação os valores deANA subiram para 45,01 ± 6,72 (p < 0,05) (Fig. 1).

Efeito da anandamida no reflexo miccionalA ANA, nas concentrações de 1, 5 e 10 µM,

não influenciou a actividade do reflexo miccio-nal. Contudo, para valores de concentraçãosuperiores, ou seja, 50 e 100 µM, o número dascontracções da bexiga por minuto aumentaram

gonista específico do VR1. Embora estas expe-riências levem a pensar que a ANA seja umagonista endógeno do VR1, não se pode igno-rar que a ANA é também agonista de um outroreceptor abundante no sistema nervoso, o CB1(Devane, et al., 1992). Apesar do CB1 serexpresso em aferentes primários que exprimemo VR1 (Ahluwalia, et al., 2000), a sua estimula-ção por agonistas específicos administradossistemicamente causa na bexiga um efeitooposto ao da estimulação do VR1, isto é, induzanalgesia e hiporreflexia (Farquhar-Smith, et al.,2002).

Perante estes dados decidimos verificar se aconcentração da ANA varia em bexigas infla-madas, se a ANA induz dor e hiperactividadevesical quando aplicada em bexigas normais,e, no caso de acontecerem, se são alteradaspela administração simultânea de antagonistasespecíficos do VR1 e do CB1, respectivamentea CPZ e o SR141716A.

Materiais e métodos

Utilizaram-se ratos fêmeas Wistar adultas.A ciclofosfamida foi adquirida à Baxter, Portu-

gal. O uretano foi adquirido à Sigma, Portugal.A anandamida e a capsazepina foram adquiri-das à Tocris, EUA, e o SR141716A à SRI Inter-national, EUA.

Quantificação da anandamida

Com o intuito de se avaliar qual a concentra-ção de ANA presente em bexigas inflamadas,induziu-se cistite química, injectando intraperi-tonealmente (i.p.) ciclofosfamida, numa dosede 200 mg ciclofosfamida/kg de peso corporal.Quatro horas depois, os animais foram decapi-tados e as bexigas colhidas e imediatamentecongeladas a –80 ºC. Utilizou-se, como contro-lo, bexigas de ratos injectados i.p. com sorofisiológico. A concentração de ANA foi determi-nada por espectrometria de massa.

Efeito da anandamida no reflexo miccional

Em animais anestesiados com uretano (1,2 mg/kg, s.c.), a bexiga foi exposta através de umaincisão abdominal. Uma agulha de calibre 21 foiinserida na cúpula e soro fisiológico foi infundi-do a 6 ml/h, deixando a uretra aberta. A tempe-ratura corporal foi mantida a 36-37 ºC, atravésde um dispositivo termorregulável. Após o perí-odo de estabilização de 30 min, aplicaram-sesequencialmente na superfície serosa da bexi-ga soluções de ANA a 1, 5, 10, 50 e 100 µM emsoro fisiológico, durante 10 min cada. Esteprocedimento foi repetido usando-se uma so-lução de a 50 µM de SR141716A, em simultâ-neo com cada uma das soluções de ANA.Aplicou-se ainda, sobre bexigas normais, umasolução de ANA a 50 µM, seguida da aplica-ção de ANA + CPZ, ambas a 50 µM.

Figura 1. Valores de anandamida, em pmol/g de pesoseco da bexiga, presentes nas bexigas de ratoscolhidas 4 h após a injecção i.p. com soro fisiológico(SF) e com ciclofosfamida (inflamados).

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de 0,51 ± 0,09 para 0,73 ± 0,1 (p < 0,05) e 0,79± 0,09 (p < 0,05), respectivamente (Fig. 2). Aaplicação de CPZ a 50 µM bloqueava a hipe-ractividade induzida pela ANA 50 µM (Fig. 3).

A aplicação da solução de 50 µM deSR141716 fez com que o número de contrac-ções por minuto induzidas pelas doses de 5 ou10 µM de ANA aumentasse de 0,58 ± 0,10 para0,77 ± 0,15 (p < 0,05) e 0,76 ± 0,10 (p < 0,001),respectivamente. Quando comparadas entre si,verificamos que as aplicações de 1, 5 e 10 µMde ANA com e sem SR são estatisticamentediferentes. No entanto, o SR141716A não tevequalquer efeito potenciador sobre as soluçõesde ANA a 50 ou a 100 µM (Fig. 2).

Avaliação do efeito nociceptivo da ANAA instilação das bexigas com soro fisiológico

induziu a produção de proteína Fos em 51 ± 17

células por cortes da medula espinal. A instila-ção de ANA a 50 µM aumentou este númeropara 80 ± 9. A CPZ diminuiu este número paravalores semelhantes aos encontrados nos ani-mais tratados com soro –51±13 (p < 0,05)células por secção da espinal medula (Fig. 4).

DiscussãoDesde a sua descoberta, a ANA tem sido

vista como um endocanabinóide que interage emodula diferentes partes do sistema nervoso(Di Marzo, et al., 1998). Este composto é produ-zido de novo como resposta a um estímulo, nãose encontrando por isso armazenado. Existemdois mecanismos sugeridos para a produçãoda ANA. O mais provável ocorre a partir dahidrólise da N-araquidonilfosfatidil etanolamina(NAPE) e é dependente da entrada de cálciopara a célula (Hillard, 2000; Sugiura, et al.,2002). No sistema nervoso central, uma vezprocessada, a ANA é libertada para o meioextracelular, indo actuar nos receptores CB1pré-sinápticos, inibindo canais de cálcio e, emconsequência, a libertação de neurotransmis-sores. À medida que vai sendo readquirida pelamembrana pós-sináptica, a ANA é degradada,a valores fisiológicos de pH, por uma hidrolaseespecífica, a FAAH, produzindo ácido araquidó-nico ou outros eicosanóides (Deutsch, et al.,2001; Kreitzer e Regerhr, 2002). A valores depH ácidos, a enzima responsável pela degrada-ção da ANA é a amidohidrolase da ANA (Ueda,et al., 2001).

Para além de actuar sobre o CB1, a ANAactua sobre outros receptores (Hampson, et al.,1998; Kimura, et al., 1998; Christopoulos A,Wilson K, 2001). A sua acção sobre o VR1 foiprimeiro observada por Zygmunt, et al. (1999),que, in vitro, verificaram que a ANA provocouuma libertação do neuropeptídeo relacionadocom o gene da calcitonina (CGRP). Esta acçãonão ocorreu quando foi coadministrada comCPZ, levando a concluir que a ANA actuousobre o VR1.

Figura 4. Células reactivas com Fos no segmentoespinal L6, em animais instilados com soro, 50 µM deANA e CPZ + ANA, ambos a 50 µM.

Figura 3. Efeito da aplicação de ANA a 50 µM e ANA+ CPZ, ambas a 50 µM, sob a actividade do reflexomiccional (contracções da bexiga/min).

Figura 2. Efeito das várias doses de ANA (_), em µM,e da aplicação dessas com SR141716 a 50 µM (_),sob a actividade do reflexo miccional (contracções dabexiga/minuto); * representa diferenças significativasentre as aplicações de ANA com e sem SR141716A.

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O resultados das nossas experiências mos-traram que a ANA aumenta aquando da ocor-rência de inflamação vesical, mantendo-se ele-vada se o estado inflamatório não se alterar(dados não mostrados). Este aumento poderárelacionar-se com (i) um aumento da sua produ-ção tanto por parte das células do sistemaimunitário envolvidas na inflamação (Pestonja-masp e Burstein, 1998), como por parte dascélulas da glia (Walter, et al., 2002) e dosneurónios sensíveis à capsaicina (Di Marzo, etal., 1994; Ahluwalia, et al., 2003), e com (ii) umadiminuição da sua degradação intracelular (DePetrocellis, et al., 2001; Di Marzo, et al., 2001;Ueda, et al., 2001).

Os nossos resultados mostraram que a ANAaplicada na bexiga normal aumenta a frequên-cia das contracções vesicais. Curiosamenteeste efeito só se tornou significativo a partir dadose de 50 µM e atingiu a saturação a 100 µM.Tendo-se verificado que este efeito foi inibidopela aplicação de CPZ ficou mostrado que oaumento da quantidade de ANA na bexigainflamada pode estimular o reflexo miccionalpor activação do VR1.

Curiosamente, a aplicação de SR141716Aem conjunto com ANA provocou um desviopara a esquerda da curva dose-efeito do endo-canabinóide. De facto, as contracções vesicaisinduzidas pela ANA aumentaram de forma sig-nificativa logo a partir da dose de 1 µM napresença do antagonista do CB1. Sabendo-seque o VR1 e o CB1 se encontram coexpressosnos neurónios aferentes primários (Ahluwalia, etal., 2003) os nossos resultados levam a crerque, em condições normais, a ANA actue pre-ferencialmente sobre o CB1. À medida que aconcentração de ANA aumenta, a sua acçãoparece exercer-se preferencialmente sobre oVR1. A acção preferencial da ANA em altasdoses sobre o VR1, explica porque é que aacção do SR141716A não trouxe qualquer ac-ção adicional à hiperactividade vesical provoca-da pela ANA em concentrações de 50 e 100 µM.

Os nossos resultados estão de acordo comoutros estudos recentes. Quando testada emconcentrações nanomolares, o efeito da ANAno CB1 foi antinociceptivo (Richardson, et al.,1998) e antiinflamatório (Burstein, et al., 2000).Estes resultados estão de acordo com osdescritos por Lever e Malcangio (2002), queobservaram que a inactivação do CB1 au-menta a libertação de neurotransmissores nosterminais dos neurónios sensitivos primárioscausada pela activação do VR1. A acçãopreferencial da ANA em baixas concentra-ções sobre o CB1 poderia também explicar asua acção analgésica e relaxante observadana bexiga (Farquhar-Smith, et al., 2002). Con-tudo, neste caso, a ANA foi administrada sis-temicamente, pelo que não é possível excluiruma acção central concomitante (Farquhar-Smith, et al., 2002).

Para além da hiperactividade, a ANA 50 µMaumentou a expressão de c-fos a nível damedula espinal, reproduzindo o efeito que acapsaicina causa (Cruz, et al., 1996). Este geneé expresso rapidamente como resposta a umestímulo nóxico, havendo uma acumulação má-xima de RNA mensageiro ao fim de 30 a 40 min,com valores máximos de expressão proteica 2 hapós a indução da transcrição do gene (Harris,1998). Sabendo-se que estímulos inócuos cau-sam uma baixa expressão de c-fos, os nossosresultados sugerem que a ANA em concentra-ções elevadas tem uma acção algogénica.

Recentemente, McVey, et al. (2003) verifica-ram, no intestino, que a ANA medeia efeitosinflamatórios, no caso, através de aferentes pri-mários sensíveis à capsaicina, resultados quecorroboram os obtidos na nossa experiência.Em conclusão, numa situação de inflamaçãocrónica da bexiga, a quantidade de ANA pro-duzida aumenta, passando a actuar sobre oVR1, potenciando a micção reflexa e levando àsensação de dor. Estes resultados mostram-serelevantes para a compreensão da hiperactivi-dade vesical causada pela inflamação e para odesenvolvimento de terapias baseadas na des-sensibilização do VR1.

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A actividade das cínases ERK1 e 2 na medula espinhal causadapela distensão da bexiga é aumentadaem condições inflamatórias crónicas

Cruz C1,2, Avelino A1, McMahon SB2, Cruz F1

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ResumoOs mecanismos moleculares envolvidos na recepção e processamento do estímulo pelas células nervosassão complexos, sendo conhecido o envolvimento de cascatas intracelulares de transdução de sinal,nomeadamente a família MAPK (mitogen activated protein kinase ou cínases proteicas activadas pormitogénios). As MAPK estão presentes no sistema nervoso onde são responsáveis pela modulação daexpressão génica levando a alterações moleculares que permitem o processamento de estímulos de ummodo mais eficiente. A cascata das ERK 1 e 2 (extracellular signal-regulated kinases 1 and 2 ou cínases1 e 2 reguladas por sinais extracelulares) faz parte da família MAPK. Em neurónios da medula espinhal, asERK 1/2 são activadas por estimulação nóxica de aferentes primários. Neste trabalho, efectuámos o estudoimunohistoquímico da expressão da forma fosforilada das ERK 1/2 na medula espinhal de ratos sujeitos aestimulação mecânica de bexigas normais ou cronicamente inflamadas por injecções de ciclofosfamida(CYP). Analisámos ainda o padrão temporal de activação das ERK 1/2 na medula espinhal. Verificámos queem animais intactos a cascata só era activada a níveis apreciáveis em consequência de estimulação nóxicaenquanto que em animais inflamados estímulos inócuos induziam já a activação das ERK 1/2 num númeroconsiderável de células. Observámos também que em animais intactos a actividade destas cínases obedecea um padrão intermitente e não é aumentada por estimulações repetidas. Desta forma, podemos depreenderque as ERK 1/2 poderão estar envolvidas em fenómenos de hiperalgesia e alodínia. A manipulação da suaactividade pode permitir uma intervenção mais eficiente em estados dolorosos.

Palavas chave: ERK. Inflamação vesical. Medula espinhal. Ciclofosfamida.

1Instituto de Histologia e EmbriologiaFaculdade de Medicina do PortoPorto, Portugal2Sensory Function GroupCentre for Neuroscience ResearchLondres, UK

Introdução

A família das cascatas intracelulares detransdução de sinal das proteínas cínase activa-das por mitogénios (MAPK, mitogen activatedprotein kinase) é tradicionalmente conhecidapelo papel que desempenha na regulação daproliferação e diferenciação celular. Estas cas-catas são constituídas por três cínases que seactivam sequencialmente (Sweatt, 2001) porfosforilações em resíduos de serina e treoninaresultando na regulação da expressão génicaatravés da activação de factores de transcri-

ção. Sabe-se, também, que podem interagircom domínios intracelulares de receptoresmembranares (Adams, et al., 2000) e modificaro seu funcionamento. A família MAPK é com-posta por 4 cascatas de transdução de sinalactivadas por diferentes estímulos: a cascatada cínase p38, a cascata das cínases Junaminoterminal (JNK, Jun amino-terminal kina-ses), a cascata das cínases 1 e 2 reguladaspor sinais extracelulares (ERK 1 e 2, extracellu-lar signal-regulated kinases) e a cascata daERK 5 (Chang e Karin, 2001), sendo as casca-tas p38 e JNK activadas em situações de stress

Autor para correspondência:Prof. Francisco Cruz

Institute of Histology and EmbryologyFaculty of MedicineUniversity of Porto

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ambiente até à pressão de 15 (distensão fisioló-gica inócua, grupo B) ou 60 cm H2O (distensãonóxica, grupo C) durante dois minutos seguindode perfusão imediata. Como controlo, utilizaram-se animais intactos não estimulados, grupo A. Ogrupo D foi perfundido duas horas após o estí-mulo nóxico enquanto que o grupo E foi subme-tido a um segundo estímulo nóxico após umintervalo de 2 h seguido de perfusão imediata.

Os ratos dos grupos F-G foram injectadoscom ciclofosfamida 75 mg/kg i.p. de três emtrês dias durante dez dias. Ao décimo primeirodia, os animais foram anestesiados e estimula-dos da mesma forma. O grupo F constitui ogrupo controlo (animais inflamados não estimu-lados). Os animais do grupo G foram estimula-dos com pressões inócuas enquanto que os dogrupo H foram estimulados com pressões nóxi-cas. Aas perfusões realizaram-se tabém logoapós a conclusaõ sa estimulação.

A perfusão foi feita pela injecção transaórti-ca de uma solução de paraformaldeído a 4%com ácido pícrico a 14% a pH 7,4. Os seg-mentos espinhais L6 foram recolhidos, pós-fixados com a mesma solução durante quatrohoras e crioprotegidos durante a noite numasolução de sacarose a 30%. No dia seguinte,os segmentos espinhais foram seccionados a40 +m e cada terceiro corte foi imunorreagidocontra a forma fosforilada das cínases ERK 1 e2 (pERK 1 e 2) segundo o método ABC-HRP.As células positivas foram contadas em dezcortes não adjacentes nos cornos dorsais (lâ-minas I a IV), na comissura dorsal (DCM -dorsal commissure) e na substância cinzentaintermediolateral (ILG - intermediolateral greymatter). Os resultados foram analisados esta-tisticamente com o teste ANOVA, seguido peloteste Student-Newman-Keuls e são apresenta-dos como média das contagens por corte ±desvio padrão.

ResultadosEm cortes de animais não estimulados, intac-

tos ou inflamados, não se observou qualquercélula imunorreactiva para pERK 1 e 2 (Fig. 1a).

e as cascatas ERK 1/2 e ERK5 activadas porfactores de crescimento vários e neurotrofinas.

Os elementos da cascata ERK1/2 são expres-sos constitutivamente no sistema nervoso central(Zanassi, et al., 2001) e são vários os estudosque demonstram a sua participação em fenó-menos de plasticidade neuronial tais como apotenciação e a facilitação a longo prazo (Mar-tin, et al., 1997; Rosenblum, et al., 2002). Estãotambém envolvidos em fenómenos de aprendi-zagem e memorização (Berman, et al., 2000;Hebert e Dash, 2002). Recentemente, foi de-monstrado que estímulos somáticos nóxicostambém activam a cascata das ERK 1/2 nossegmentos da medula espinhal que recebem oafluxo sensitivo proveniente da estrutura perifé-rica estimulada (Ji, et al., 1999). Estudos subse-quentes utilizando diferentes estímulos nóxicosvieram corroborar estes resultados (Karim, et al.,2001; Galán, et al., 2002).

Até ao momento, nenhum estudo foi feito nosentido de esclarecer se a estimulação nóxicade órgãos viscerais activa de uma forma iden-tica a cascata ERK 1/2 na medula espinhal,nem tão pouco são conhecidos os efeitos dainflamação crónica na actividade da mesma.Deste modo, este trabalho foi desenvolvido como objectivo de verificar o padrão de activaçãoda cascata das ERK 1/2 na medula espinhalapós estimulação da bexiga com pressões inó-cuas e nóxicas e bem como averiguar se aactividade desta cascata é modificada pelainflamação crónica da bexiga, condição associ-ada ao aumento da excitabilidade dos aferentessensitivos vesicais (Sengupta e Gebhart, 1995).

Material e métodosNeste trabalho foram utilizados 8 grupos ex-

perimentais de ratos fêmea adultos, descritosna tabela 1.

Os ratos dos grupos A-E foram anestesia-dos com uma injecção subcutânea de uretano(1,2 mg/kg) e a sua bexiga exposta através deuma incisão abdominal. Através de uma agulhacalibre 21 inserida na cúpula, as bexigas foramdistendidas com soro fisiológico à temperatura

Tabela 1. Grupos experimentais

Designação N Injecção de Tipo de estimulaçãociclofosfamida

A 4 Não Sem estimulaçãoB 4 Não Estimulação inócua (2 min) - 2’ inoc.C 4 Não Estimulação nóxica (2 min) - 2’ nóx.D 4 Não 2 min de estimulação nóxica seguido de um

intervalo de 2 h - 2’nóx. - 2 hE 4 Não 2 min de estimulação nóxica, seguido de um

intervalo de 2 h e um segundo estímulo nóxico -2’ nóx. - 2 h - 2’ nóx.

F 4 Sim Sem estimulação.G 4 Sim Estimulação inócua (2 min) - 2’ inoc.H 4 Sim Estimulação nóxica (2 min) - 2’ nóx.

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Em cortes de animais intactos sujeitos a estimu-lação inócua (Fig. 1b) foram contadas 10,75 ±0,85 células enquanto que em cortes animaisestimulados com pressões nóxicas (Fig. 1c)foram observadas 30,95 ± 1,73 (p < 0,001)(Fig. 2). As células estavam distribuídas aolongo das lâminas I, II-IV, DCM e nos ILG,sendo bem visíveis os corpos celulares bemcomo os seus prolongamentos celulares.

Em cortes de animais inflamados submeti-dos a distensão da bexiga a pressões inócuas(Fig. 1d) foram observadas 21,13 ± 6,61 célulaspositivas para as pERK 1 e 2. Em cortes deanimais inflamados cujas bexigas foram disten-didas com uma pressão de 60 cm H2O (Fig. 1e)

observaram-se 41,13 ± 2,63 células. Estes va-lores são significativamente diferentes dos ob-servados em cortes de animais intactos sujeitosao mesmo tipo de estimulação (p < 0,001)(Fig. 2). Nestes cortes, as células apresenta-vam distribuição e imunorreacção semelhanteàs observadas em cortes de animais intactos.

Em cortes de animais intactos que foramperfundidos duas horas após um primeiro estí-mulo nóxico foram contadas 7,58 ± 1,97 célulaspositivas. Em cortes de animais que foram su-jeitos a um segundo estímulo nóxico após umperíodo de duas horas de repouso foram ob-servadas 31,30 ± 5,12 células imunorreactivas(p < 0,05) (Fig. 3).

Figura 1. Células imunorreactivas para a forma fosforilada das ERKs 1 e 2 no segmento da medula espinhal L6. Nosanimais não estimulados não são visíveis células imunoreactivas (a). As células imunorreactivas localizam-se naslâminas I, II-IV, DCM e ILGs dos segmentos espinhais L6 de animais intactos estimulados com pressões de 15 cmH2O (b), intactos estimulados com pressões de 60 cm H2O (c), inflamados estimulados com pressões de 15 cm H2O(d) e inflamados estimulados com pressões de 60 cm H2O (e).

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DiscussãoA cascata de sinalização intracelular de sinal

que inclui as cínases ERK 1 e 2 está activa nosistema nervoso central em condições váriastais como o desempenho de tarefas de apren-dizagem, exposição a neurotrofinas (Grewal, etal., 1999; Pizzorusso, et al., 2000) e estimulaçãonóxica somática (Ji, et al., 1999). Os resultadosapresentados neste trabalho indicam que aestimulação nóxica da bexiga também induzactivação por fosforilação das cínases ERK 1 e2 ao nível do segmento espinhal L6. De acordocom o que tinha sido observado após a estimu-lação somática, a activação da cascata só ocor-

reu em condições em que os animais foramestimulados, dado que não se observou qual-quer célula imunorreactiva em cortes da medulaespinhal de animais não estimulados, inflama-dos ou não. Por outro lado, verificámos que aactivação dependia da intensidade do estímulouma vez que o número de células positivas foidirectamente proporcional à intensidade do es-tímulo.

Os nossos resultados sugerem também que aactividade é transitória. Era, no entanto, já sabi-do que o número de células imunorreactivaspara a forma fosforilada das ERK 1 e 2 atingeum máximo dois a três minutos após um estí-mulo nóxico somático e que este número dimi-nui gradualmente ao longo de duas horas. Nonosso trabalho, verificámos que duas horasapós um estímulo nóxico inicial o número decélulas positivas era semelhante ao induzidopor um estímulo inócuo. No entanto, nuncaforam analisados os níveis de actividade destasmoléculas após um segundo estímulo. Um se-gundo estímulo nóxico induz um número decélulas imunorreactivas semelhante ao observa-do no caso de um único estímulo nóxico. Destemodo, estes dados demonstram que em ani-mais intactos a activação destas cínases não épotenciada por estimulação repetida. Nesteaspecto, os nossos resultados parecem divergirdos de outros investigadores que verificaramque até 60 min após uma injecção de formalinana pata ainda é possível observar na medulaespinhal numerosas células imunorreactivas con-tra a forma fosforilada destas cínases (Ji, et al.,1999). É sabido que as ERK 1/2 podem intera-gir com domínios intracelulares de receptoresmembranares (Adams, et al., 2000), facilitandoe potenciando a transmissão do impulso nervo-so. Deste modo, após uma activação inicial dasERK 1/2 devido a um estímulo inicial nóxico, osníveis da cascata poderão manter-se elevadosjá que o limiar de activação neuronial foi dimi-nuído e estímulos de menos intensidade pode-rão activar estas cínases. No entanto, durante ointervalo de tempo aqui estudado entre doisestímulos (2 h) pode ocorrer desfosforilação poracção de fosfatases específicas (Sun, et al.,1993; para revisão ver Keyse, 2000) e conse-quente inactivação das ERK 1 e 2.

Os nossos resultados demonstram que a ac-tivação das ERK 1 e 2 na medula espinhal erapotenciada pela inflamação crónica da bexigainduzida por injecções repetidas do agenteantitumoral ciclofosfamida. Este composto émetabolizado em acroleína, a qual, por acumu-lação na bexiga, causa cistite química (Vizzarde Boyle, 1999). Em animais injectados com estefármaco, a estimulação da bexiga induziu acti-vação das ERK 1 e 2 em mais células do queem animais normais. Aparentemente, a activa-ção desta cascata de sinal num maior númerode células da medula espinhal poderá depen-der da facilitação do afluxo nervoso sensitivo

Figura 2. Número de células imunorreactivas para aspERKs 1/2 em cortes transversais do segmento L6 damedula espinhal . Os animais foram estimulados pordistensão da bexiga urinária com uma pressão de 15(distensão inócua) ou 60 cm H2O (distensão nóxica)durante dois minutos. Na medula espinhal, o númerode células imunorreactivas foi proporcional àintensidade do estímulo e aumentou em condiçõesinflamatórias crónicas. Os resultados estão denotadoscomo o valor médio do número de célulasimunorreactivas e respectivo desvio-padrão. **p<0,01;***p<0,001.

Figura 3. Histograma representando o padrão temporalda expressão da forma activa das ERKs 1/2 em cortestransversais do segmento L6 da medula espinhal deratos não inflamados cujas bexigas foram distendidascom uma pressão de 60 cm H2O durante 2 minutos.Duas horas após um estímulo nóxico o número decélulas observado era semelhante ao induzido porestimulação inócua. Uma segunda estimulação induzum número de células imunorreactivas semelhante aoobservado no caso de uma única estimulação nóxica.Os resultados estão denotados como o valor médio donúmero de células imunorreactivas e respectivo desvio-padrão. *p<0,05.

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que se sabe ocorrer ao nível dos aferentesprimários que enervam as estruturas inflamadas(para revisão ver Hunt e Mantyh, 2001), e pode-rá concorrer para a hiperalgesia e alodínia ve-rificadas nestas situações.

Em resumo, os nossos resultados demons-tram que a estimulação inócua da bexiga deanimais não inflamados induz uma fraca activa-ção da cascata de sinalização intracelular quecompreende as cínases ERK 1/2. Nestes ani-mais, apenas ocorre activação a níveis eleva-dos quando a bexiga é distendida a pressõessuprafisiológicas nóxicas. Em animais inflama-dos cuja bexiga foi estimulada mecanicamente,o número de células da medula espinhal emque as ERK 1/2 foram activadas foi superior. Opadrão intermitente de activação desta cascatafaz-nos levantar a hipótese de estas proteínaspoderem constituir potenciais alvos para o de-senvolvimento de antagonistas específicos comacção analgésica.

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Santos S, et.al.: Correlação entre o efeito dos opióides e as propriedades funcionais dos neurónios da substantia gelatinosa da medula espinhal de rato

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Correlação entre o efeito dos opióidese as propriedades funcionais dosneurónios da substantia gelatinosa damedula espinhal de rato

Santos S, Safronov BV

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ResumoA substantia gelatinosa (SG) é a região do corno dorsal da medula espinhal envolvida na nocicepção e nomecanismo endógeno de antinocicepção dependente de encefalinas. A SG contém, pelo menos, três gruposfuncionais distintos de neurónios que diferem na sua resposta a despolarização sustentada: i) tonicallyfiring neurons (TFN), sem nenhuma adaptação de frequência; ii) adapting neurons (AN), e iii) delayed firingneurons (DFN). O estudo aqui apresentado mostra que o agonista dos receptores para µ-opióides (D-Ala2,N- Me- Phe4, Gly5- ol)- encefalina (DAMGO) afecta diferencialmente os neurónios da substantia gelatinosa.Todos os TFN foram fortemente hiperpolarizados, enquanto os AN e os DFN se mostraram insensíveis aofármaco. A aplicação de 1 µM de DAMGO nos TFN diminuíu a sua input resistance devido à activação decanais de K+ inward-rectifying regulados por proteína G e pertencentes à família GIRK. Desta forma, o efeitocelular específico do DAMGO pode ser explicado como uma coexpressão de receptores para µ-opióides ecanais GIRK, neste tipo de neurónios. Apesar dos AN e os DFN também possuírem os canais GIRK,especificamente bloqueados por baixas concentrações de bário e césio ou potenciados por baclofeno, taisneurónios falham em responder ao DAMGO, evidentemente devido à ausência dos receptores para os µ-opióides. Assim, sugerimos que a coexpressão dos receptores para µ-opióides e canais GIRK nos TFN ostorna especificamente sensíveis aos opióides. Os TFN, ao contrário dos AN e DFN, poderão estar envolvidosnos mecanismos endógenos de antinocicepção modulada por encefalinas ao nível da medula espinhal.

Palavras chave: µ-opióide DAMGO. Substantia gelatinosa. Canais GIRK. Antinocicepção.

Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC)Universidade do PortoRua do Campo Alegre, 823, 4150-180 Porto, Portugal

SummarySubstantia gelatinosa (SG) is a spinal dorsal

horn region involved in nociception and endoge-nous descending enkephalin-dependent anti-no-ciception. SG contains at least three functionallydistinct groups of neurons differing in their res-ponse to sustained depolarization: i) tonicallyfiring neurons (TFNs), with virtually no frequencyadaptation; ii) adapting neurons (ANs), and iii)delayed firing neurons (DFNs). Here we reportthat µ-opioid receptor agonist (D-Ala2, N- Me-Phe4, Gly5- ol)- enkephalin (DAMGO) differenti-ally affects SG neurons. All TFNs were stronglyhyperpolarized, while ANs and DFNs were in-sensitive to the drug. The application of 1 µMDAMGO decreased the input resistance due to

activation of G-protein-regulated inward-rectifierK+ channels from GIRK family in TFNs. Thus,cell-specific effect of DAMGO was explained bya co-expression of µ-opioid receptors and GIRKchannels in this type of neurons. Although theANs and DFNs also possessed GIRK channels,specifically blocked by low concentrations ofbarium and cesium or potentiated by baclofen,they failed to respond to DAMGO, probably dueto a lack of µ-opioid receptors. Therefore, wesuggest that a co-expression of µ-opioid recep-tors and GIRK channels in TFNs make themspecifically sensitive to opioids. The TFNs, butnot ANs and DFNs, could be involved in themechanisms of endogenous enkephalinergicantinociception at the level of spinal cord.

IntroduçãoO corno dorsal da medula espinhal é uma

região importante no processamento da infor-mação sensorial vinda dos terminais aferentes

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a coluna vertebral foi rapidamente extraída eimersa em ice-cold oxygenated artificial cere-brospinal fluid (ACSF). Na sequência de lami-nectomia o segmento lombar de 5-7 mm decomprimento foi dissecado e colado para corteno aparelho de corte (Leica VT 1000S). Asfatias assim preparadas foram incubadas du-rante 30-60 min em ACSF a 33 °C.

Soluções

O ACSF para a preparação e manutençãodas fatias contém (em mM): NaCl 115, KCl 5,6,CaCl2 2, MgCl2 1, glucose 11, NaH2PO4 1,NaHCO3 25 (pH 7,4 após borbulhamento com95-5% de mistura de O2-CO2). A solução dapipeta de registo usada nas experiências decurrent-clamp e registo dos canais de K+ con-tém (em mM): NaCl 6, KCl 128, MgCl2 2, EGTA10 e HEPES 10. O valor de pH foi ajustado para7,3 com KOH (a [K+] final foi de 160,5 mM).Todas as substâncias utilizadas são provenien-tes da Sigma.

Registo das correntes

As pipetas usadas na técnica patch-clampforam construídas em duas etapas a partir detubos de vidro de parede grossa de boro-silicato. A sua resistência após o polimento pelocalor foi de 3-5 MΩ. O amplificador de patch-clamp EPC-9 (HEKA, Lambrecht, Germany) foiusado em todas as experiências. Em neuróniossubmetidos a análise detalhada a resistência emsérie medida no modo whole-cell foi de 6-20 MΩe foi compensada em pelo menos 60%. Ospotenciais de acção foram registados usando omodo rápido de current-clamp do amplificadorEPC-9. As input resistances dos neurónios docorno dorsal da medula espinhal foram medi-das no modo voltage-clamp usando pulsosde 10-40 mV a partir de um nível sustentado de–80 mV. Apenas células com um potencial derepouso mais negativo do que –65 mV foramincluídas neste estudo.

Resultados e discussão

Os três tipos distintos de neurónios foramcaracterizados nas experiências mostradas nafigura 1. Os TFN responderam com um padrãode disparo tónico após injecção de pulsos decorrente despolarizante. O número de potenciaisde acção gerados aumentou proporcionalmentecom a força estimuladora. Os AN dispararamapenas vários picos de potenciais de acção(4-6) no início de uma despolarização. Os DFNprecisaram de correntes muito maiores para ageração dos primeiros picos de potenciais deacção, os quais usualmente apareceram comatraso ao fim de 500 ms de despolarização. Àmedida que a intensidade de estimulação au-mentou, o início do disparo dos potenciaisdeslocou-se em direcção ao início do pulso

primários. Diversas modalidades de informaçãosensorial a este nível são codificadas pelo tipode fibra aferente periférica, conexão sináptica epropriedades intrínsecas membranares dos neu-rónios daquela região (Brown, 1981; Cervero,1987). A última varia consideravelmente entreneurónios, permitindo uma separação em vári-os grupos fisiológicos (Yoshimura e Jessell,1989; Thomson, et al., 1989; López-García eKing, 1994). A estimulação intracelular dos neu-rónios do corno dorsal espinhal permitiu distin-guir três grupos de neurónios de acordo comas suas propriedades intrínsecas de padrãocelular: os tonically firing neurons (TFN) respon-dem com um padrão sustentado de potenciaisde acção à injecção de correntes despolarizan-tes, enquanto os neurónios dos outros doisgrupos apresentam quer vários picos no inícioda despolarização, adapting neurons (AN), querpicos tardios, delayed firing neurons (DFN). Arelevância funcional desta classificação foi ain-da reforçada pela ideia de que estes tiposneuroniais recebem diferentes tipos de enerva-ção cutânea aferente e que a resposta dosneurónios à estimulação cutânea periférica ésemelhante à sua resposta à estimulação intra-celular (López-García e King, 1994).

Sabe-se que os µ-opióides têm um efeitopós-sináptico num subgrupo de neurónios daSG resultando numa robusta hiperpolarização.Este efeito é associado a um aumento na con-ductância membranar devido à activação decorrentes de potássio inwardly rectifying regula-das por proteína G (GIRK) (Grudt e Williams,1994). Contudo, até agora não é claro quais ostipos de neurónios da SG que são sensíveis aosagonistas de opióides. Daí que, neste estudotenhamos tentado encontrar uma relação entrea sensibilidade neuronial aos opióides e aspropriedades intrínsecas inerentes aos padrõescelulares de disparo de potenciais de acção.

Os nossos dados mostram que o agonista dereceptores para µ-opióides (DAMGO) afectaespecificamente os TFN, sugerindo uma coex-pressão destes receptores e dos canais GIRKapenas neste tipo de neurónios. As nossasobservações poderão assim contribuir para aelucidação do processo de antinocicepção ine-rente ao mecanismo endógeno descendentemodulado por encefalinas.

Materiais e métodosPreparação

As experiências foram realizadas aplicandoa técnica patch-clamp (Hamill, et al., 1981) afatias transversais de 300 µm preparadas a par-tir da região lombar da medula espinhal deratos de 2-5 semanas de idade (Edwards, et al.,1989; Chery, et al., 2000). Os animais foramsacrificados de acordo com os protocolos le-gais vigentes. Após a anestesia, por injecçãointraperitoneal de Na+-pentobarbital (30 mg/kg)

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Santos S, et.al.: Correlação entre o efeito dos opióides e as propriedades funcionais dos neurónios da substantia gelatinosa da medula espinhal de rato

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despolarizante. Surpreendentemente, a aplica-ção de 1 µM do agonista de receptores paraµ-opióides DAMGO teve efeito apenas nosneurónios do tipo TFN. Isto resultou numa ro-busta hiperpolarização membranar em tornode 9,32 mV (n = 10) acompanhada por umaumento na conductância (Fig. 2). Este aumen-to surge com uma redução na amplitude daresposta passiva membranar em resposta àinjecção de corrente hiperpolarizante. O au-mento na conductância membranar correspon-deu a um decréscimo na input resistance de1,64 a 0,.293 ΩW.

Na presença de DAMGO o potencial mem-branar de repouso aproximou-se do potencialde equilíbrio dos iões K+ para as nossas condi-ções experimentais (–84 mV), indicando umaactivação da conductância selectiva para opotássio. A solução de bário numa concentra-ção de 0,5 mM bloqueou esta conductância, aopasso que 50 µM de baclofeno potenciaram-na.Desta forma, pode ser concluído que o DAMGOactiva uma corrente de potássio inwardly recti-

fying regulada por proteína G, conhecida comocorrente GIRK.

Em neurónios dos tipos AN e DFN o baclofe-no, ao contrário do DAMGO, induziu a geraçãode correntes associadas a um aumento na con-ductância membranar. O bário reduziu estascorrentes, o que significa que aqueles neuróni-os também expressam os canais GIRK, masprovavelmente não expressam os receptorespara opióides.

Em conclusão, o agonista para receptores deµ-opióides DAMGO afectou especificamente osTFN na SG. Parece que apenas este tipo neu-ronial possui receptores específicos para aque-le agonista. Apesar dos outros dois tipos deneurónios possuirem também conductância as-sociada aos canais GIRK, efectores standardpara a acção dos opióides, a falta da ligaçãoao receptor torna-os insensíveis à droga. Éinteressante notar que a maioria dos neuróniosda SG sensíveis ao DAMGO não contêm GABAnem glicina, neurotransmissores inibitórios, efuncionalmente são neurónios excitatórios(Kemp, et al., 1996). Assim, podemos assumirque os TFN aqui caracterizados, ao mostraremexclusividade na sensibilidade ao DAMGO,podem ser considerados interneurónios excita-tórios. As suas características únicas de input-output e capacidade de geração de maioresfrequências de disparo de potenciais de acçãoem resposta a uma estimulação crescente, po-dem ser propriedades importantes dos inter-neurónios excitatórios. Tal inibição específicados TFN pelo DAMGO, em oposição aos DN eAN, puderá levar a uma melhor compreensãode parte do mecanismo de antinocicepção as-sociado ao processamento da dor.

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Figura 1. Três tipos básicos de padrão de disparocelular em neurónios da SG.A, tonically firing neuron (TFN); B, adapting neuron(AN), e C, delayed firing neuron (DFN). Todas ascélulas foram mantidas a –70 mV e subsequentementedespolarizadas por injecção de pulsos de corrente.Para cada célula, a parte de baixo representa aresposta passiva à injecção de pulsos hiperpolarizantesde 10 pA.

Figura 2. Acção do DAMGO na resposta membranarpassiva dos três tipos de neurónios da SG. Asrespostas passivas foram evocadas pela injecção depulsos hiperpolarizantes de 10 pA, tal como na figura 1.A, TFN: o registo 1 foi feito em control, os registos de2-4 foram feitos na presença de DAMGO em que3 corresponde ao registo após despolarização para amedição de conductância a –70 mV, o registo5 representa a recuperação B, AN: 1 - control,2 - DAMGO, 3 - recuperação. C, DFN: 1 - controlo,2 - DAMGO, 3 - recuperação.

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Potencialidades da terapia genéticano controlo da dor

Martins I1, Pinto M1, Wilson SP 2, Lima D1, Tavares I 1

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ResumoEm edição desta revista publicada no ano passado, redigimos um artigo (Tavares, et al. Perspectivas demanipulação do sistema endógeno de controlo da DOR: o bolbo raquidiano ventrolateral. Dor 2002;10(2):11-5)onde reuníamos dados relativos ao funcionamento do sistema endógeno de controlo da dor e abordávamosnovas perspectivas para a sua manipulação. Neste trabalho, apresentamos alguns dos recentes avançosexperimentais no controlo da dor através das modernas técnicas de terapia genética. Discutimos, emespecial, os trabalhos em curso no nosso laboratório dedicados ao estudo da dinâmica de migração de umvector viral Herpes simplex do tipo 1, injectado em dois componentes do sistema endógeno de controlo dador: o bolbo raquidiano ventrolateral e o núcleo reticular dorsal.

Palavras chave: Controlo endógeno da dor. Modulação descendente. Opióides. Vectores virais.

SummaryIn an issue of this journal published last year (Tavares, et al. Perspectivas de manipulação do sistemaendógeno de controlo da DOR: o bolbo raquidiano ventrolateral. Dor 2002;10(2):11-5) we reviewed recentdata on the role of the endogenous pain modulatory system. The perspectives of manipulation of the systemwere presented and critically discussed. In this paper, we report some recent experimental findingsconcerning the use of gene therapy in pain control. We further discuss our recent data regarding thedynamics of the migration of a viral vector (Herpes simplex virus type 1) injected in two components of theendogenous pain modulatory system: the caudal ventrolateral medulla and the dorsal reticular nucleus.

Key words: Endogenous pain control. Descending modulation. Opioids. Viral vectors.

1Instituto de Histologia e EmbriologiaFaculdade de Medicina e IBMCUniversidade do Porto, Portugal2Department of PharmacologyPhysiology and NeuroscienceUniversity of South Carolina School of MedicineColumbia, EUA

A dor pode persistir como consequência deprocessos inflamatórios, oncológicos ou dege-nerativos conduzindo a uma situação de dorcrónica. Nestas circunstâncias, os analgésicosnormalmente utilizados são muitas vezes inefi-cazes ou produzem efeitos secundários indese-jáveis. De acordo com visões mais recentes, aterapia genética afigura-se como uma alternati-va potencial no tratamento da dor crónica (Pohle Braz, 2001). A terapia genética define-se, emgeral, como o conjunto de técnicas que permi-tem a introdução no organismo de genes, ouparte deles, cuja expressão resulta na sínteselocalizada de proteínas com propriedades tera-

pêuticas (Chiocca e Breakfield, 1998). No casoconcreto da dor, as substâncias produzidas portranscrição dos genes são geralmente neuro-transmissores com propriedades analgésicas,como por exemplo encefalinas, que se libertamdirectamente no tecido lesado ou em áreas dosistema nervoso que processam a informaçãodolorosa (Wilson e Yeomans, 2000). Pelas técni-cas de terapia genética consegue-se minimizaras acções indesejáveis de alguns tratamentosmais usuais como sejam o desenvolvimento detolerância e a produção de efeitos secundários.

Estratégias de terapia genética no sistemanervoso

Na terapia genética da dor aplicada directa-mente ao sistema nervoso podem distinguir-seduas abordagens distintas: a introdução decélulas ou tecidos geneticamente modificados(Cejas, et al., 2000; Eaton, et al., 1999) ou aadministração de vectores virais contendo ogene de interesse (Wilson e Yeomans, 2000).

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Os virologistas têm dado um importante contri-buto aos estudos de terapia genética de controloda dor nomeadamente ao produzirem vectoresvirais HSV sem capacidade replicativa, imuno-logicamente inertes e com capacidade de ex-pressão sustentada de genes potencialmenteterapêuticos. A este propósito, destacam-se osestudos que utilizaram o gene da pré-proence-falina humana dado terem mostrado eficácia nocontrolo da dor (Wilson, et al., 1999; Goss, et al.,2001; Braz, et al., 2001; Hao, et al., 2003).Nestes trabalhos tem-se utilizado essencialmen-te o HSV do tipo 1 (HSV-1) em que o gene viralque codifica a síntese da timidina cinase éinterrompido pela inserção do transgene. Esteprocedimento impede a expressão desta enzi-ma e, consequentemente, inibe a replicação nor-mal do vírus. Habitualmente a expressão do geneda pré-proencefalina está sob controlo do pro-motor citomegalovírus humano de expressãoimediata, que induz uma expressão potenciadadaquele opióide. As potencialidades terapêuti-cas destas estratégias são sugeridas pelo efeitoantinociceptivo detectado em modelos animaisde dor aguda e em situações de dor crónica.Relativamente ao local de administração doHSV-1, a administração à periferia tem sido amais utilizada. Neste caso, ocorre síntese denovo de pré-proencefalina nos neurónios dosgânglios raquidianos e aumento da expressãodo peptídeo nas lâminas superficiais da medulaespinhal (Antunes Bras, et al., 2001). O efeitoantihiperalgésico é detectado em diversos tes-tes comportamentais destinados a avaliar a doraguda e é mediado por opióides espinhais dadoque é bloqueado pela administração intratecalde naloxona (Wilson, et al., 1999). Apesar daantinocicepção ir diminuindo progressivamenteao longo do tempo, verificou-se que pode serrestabelecida por reinoculação do vector viralsem que ocorra desenvolvimento de tolerância(Goss, et al., 2001). Os potenciais efeitos tera-pêuticos da aplicação de vectores virais conten-do o gene da pré-proencefalina ficaram tambémdemonstrados em modelos experimentais dedor crónica. A aplicação do vírus com o geneda pré-proencefalina num membro cuja articula-ção foi inflamada cronicamente, induz aumentoda síntese de encefalina em neurónios sensitivose diminui a hiperalgesia. Outros parâmetrosdemonstraram a potencial utilidade da técnicadado que os animais revelaram uma melhoriasignificativa na locomoção e um decréscimo dadestruição do tecido ósseo (Braz, et al., 2001).Recentemente, este vector foi também aplicadoem modelos experimentais de dor neuropáticamostrando ter um efeito antialodínico (Hao, et al.,2003). A expressão do transgene potenciava oefeito analgésico da morfina e os animais nãodesenvolviam tolerância aquele fármaco (Hao,et al., 2003).

A eficácia da administração de vectores viraisa nível central não foi abordada detalhadamente

O sucesso de abordagens iniciais de introdu-ção de células ou tecidos foi limitado dado quea quantidade de substâncias analgésicas liber-tadas era muito baixa. Para contornar essesproblemas, têm vindo a desenvolver-se linha-gens celulares geneticamente alteradas capazesde sobreexprimirem a proteína de interesse. Asabordagens com melhores resultados dizemrespeito a implantações intratecais em que ascélulas funcionam como bombas infusoras deneurotransmissores diversos, como a serotoni-na, galanina ou ácido λ-aminobutírico (GABA)ou de factores de crescimento como o BDNF(brain-derived neurotrophic factor; Eaton, et al.,1997; 1999a; 1999b; Cejas, et al., 2000).

A terapia genética com recurso a vectoresvirais tem recebido maior atenção. A transfec-ção dos neurónios consiste na introdução devectores virais naquelas células e leva à altera-ção do fenótipo da célula-alvo. Os vectoresvirais contêm genes que podem produzir doisefeitos opostos na célula-alvo mas que, no final,se destinam a inibir a nocicepção. A transcri-ção dos genes inseridos nos vectores podeconduzir a um aumento da função do neurónionomeadamente na sobreexpressão de neuro-peptídeos inibitórios, como a encefalina, ou naredução da síntese de neurotransmissores quefacilitam a nocicepção, como a substância P(Wilson e Yeomans, 2000). Os vectores viraisdevem, portanto, ser construídos de acordocom objectivos específicos do estudo e com asituação experimental de dor que se pretendecontrolar.

O vírus Herpes simplex como um potencialvector terapêutico

Idealmente, os vectores virais devem ser defácil produção, imunologicamente inertes, ca-pazes de inserir um ou vários genes em locaisespecíficos do cromossoma da célula-alvo edestituídos de capacidade replicativa. Um outrorequisito específico do controlo da dor crónicadiz respeito à necessidade de conseguir umaexpressão sustentada do transgene (Somia eVerma, 2000). Existem vários tipos de vectoresvirais, nomeadamente, retrovírus, adenovírus evírus Herpes simplex (HSV). No que respeita àterapia genética da dor, a utilidade do HSV temsobressaído devido ao facto de possuir umgenoma de dimensões consideráveis e quepermite a inserção de uma grande quantidadede informação genética. Para além disso, acapacidade natural do HSV migrar retrograda-mente tem sido explorada em estudos em queo vírus era aplicado à periferia de modo a infectaros terminais nervosos sensitivos e a migrarretrogradamente para os gânglios das raízesdorsais. Aqui, o vírus permanece num estadode latência, isto é, o genoma viral permanecena célula hospedeira sem que interfira na fun-ção celular normal (Pohl e Braz, 2001).

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mas afigura-se como uma estratégia bastantepromissora, em particular no que respeita àpossibilidade de intervir sobre o sistema endó-geno de controlo da dor. Quando se injectava aamígdala, um dos componentes do sistemaendógeno de controlo da dor, com HSV-1 con-tendo o gene da pré-proencefalina, produzia-seum efeito antinociceptivo mediado por opióides(Kang, et al., 1998). Porém, a amígdala nãodeverá ser a área do sistema endógeno decontrolo da dor mais útil para a terapia genéticapelo seu envolvimento simultâneo no processa-mento afectivo. De entre os múltiplos compo-nentes do sistema endógeno de controlo dador, destaca-se o bolbo raquidiano ventrolateralcaudal (VLM), visto ser uma das áreas a partirda qual se produz analgesia particularmenteintensa e sustentada (Tavares e Lima, 2002).Com base em propostas mais recentes de queo sistema endógeno de controlo da dor podeestar envolvido na génese de hiperalgesiadurante processos dolorosos crónicos atravésdas acções facilitatórias que exerce (Urban eGebhart, 1999), é importante considerar simul-taneamente este aspecto quando se definemestratégias de intervenção na dor crónica. Deentre as potenciais áreas facilitadoras da trans-missão dolorosa destaca-se o núcleo reticulardorsal (DRt), localizado no bolbo raquidianocaudal, pois que, ao contrário dos restantescomponentes do sistema endógeno de controloda dor, está unicamente dedicado à facilitaçãodescendente da transmissão dolorosa (Lima eAlmeida, 2003).

Dinâmica de migração de uma formarecombinante de HSV-1 após injecção noVLM e DRt

Antes de utilizar vectores virais na terapiagenética a partir do VLM e DRt é fundamentalestudar a cinética de expressão do transgeneinserido no vírus e a dinâmica de migração dovírus a utilizar. Com este intuito, temos vindo autilizar uma forma recombinante não replicativade HSV-1 que contém o transgene Lac Z, sob ocontrolo do promotor citomegalovírus humanode expressão imediata. Mediante controlo este-

reotáxico e sob anestesia por halotano, injectá-mos HSV-1 no VLM ou no DRt de ratos machosadultos da estirpe Wistar, mantidos de acordocom a legislação em vigor (Directiva 86/609 daUnião Europeia). Dois, 7 e 14 dias após a injec-ção, a presença do produto do transgene eradetectada mediante reacção imunocitoquímicacom anticorpo dirigido contra a proteína betaga-lactosidase, produto de expressão do gene LacZ. Observaram-se cortes seriados do encéfalo,com uma espessura de 40 µm, para procurarneurónios imunorreactivos para a betagalactosi-dase. Os resultados encontram-se resumidos natabela 1. Dois dias após a injecção de HSV-1observaram-se neurónios marcados retrograda-mente na periferia do local de injecção, nonúcleo do tracto solitário, na área gigantocelu-lar, nos núcleos parabraquiais (PBN), no gruponoradrenérgico A5 e no locus coeruleus (LC)(Fig. 2A). Sete dias após a injecção, a migraçãodo vírus estendia-se mais rostralmente até aonúcleo dorsal do rafe e ao hipotálamo dorsome-dial e ventrolateral. Ao fim de catorze dias,observaram-se neurónios retrogradamente mar-cados, unicamente, no PBN. Relativamente aosratos injectados no DRt e processados 2 diasapós a injecção de HSV-1, observámos neuró-nios marcados retrogradamente na periferia dolocal de injecção, no núcleo reticular lateral, naárea gigantocelular, nos núcleos PBN (Fig. 2B),no grupo noradrenérgico A5 e na substânciacinzenta periaqueductal (PAG). Sete dias apósa injecção, o padrão de migração estendia-seàs áreas lateral, posterior, dorsomedial e ventro-lateral do hipotálamo. Ao fim de catorze dias,observaram-se neurónios marcados retrograda-mente unicamente no PBN.

Comparando os mapas de migração doHSV-1 injectado no VLM e DRt com os pa-drões de transporte retrógrado de traçadoresneuroanatómicos previamente publicados (Al-meida, et al., 2002; Cobos, et al., 2003), verifi-cámos que o vírus migra selectivamente emalguns dos aferentes ao VLM e ao DRt. Osmecanismos implicados na migração selectivade HSV-1 são ainda desconhecidos. Admite-se,no entanto, que possam estar relacionados coma afinidade dos receptores de superfície virais

Tabela 1. Distribuição dos neurónios retrogradamente marcados nas diferentes áreas encefálicas para onde o HSV-1migrou após injecção no VLM ou no DRt. O símbolo “+” representa 1 a 5 neurónios.

Injecção no VLM 2 dias 7 dias Injecção no DRt 2 dias 7 dias

Núcleo do tracto solitário ++ +++ Núcleo reticular lateral + ++++Área gigantocelular ++ + Área gigantocelular + +Núcleos PBN ++++ ++++ Núcleos PBN ++++ ++++Grupo noradrenérgico A5 +++ + Grupo noradrenérgico A5 + +Núcleo vestibular ++ ++++ PAG + +++Locus coeruleus ++ + Hipotálamo lateral - +Núcleo dorsal do rafe - + Hipotálamo posterior - +Hipotálamo dorsomedial - + Hipotálamo dorsomedial - +Hipotálamo ventrolateral - + Hipotálamo ventrolateral - +

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pelos receptores neuroniais e/ou com as pro-priedades neuroquímicas dos aferentes aoVLM e ao DRt. Analisando a cinética de ex-pressão da betagalactosidase em cada umadas áreas que projectam para o VLM ou DRtobservam-se padrões distintos de expressãodo vírus consoante a área, cujo significadoimporta avaliar. Na maioria das áreas, a ex-pressão da betagalactosidase diminui progres-sivamente enquanto noutras zonas se mantémforte e estável ao longo do tempo. A cinéticade expressão da betagalactosidase parece,portanto, variar com as áreas encefálicas para

onde o HSV-1 migrou, o que poderá estarrelacionado com a regulação/modulação daactividade do promotor em cada uma destasregiões.

Conclusões e perspectivas futuras

A possibilidade de manipular o sistema endó-geno de controlo da dor para controlar a dorcrónica é uma perigosa tentação. Apesar deser possível obter uma analgesia muito intensa,muitos dos componentes do sistema supraspi-nal endógeno de controlo da dor encontram-se

Figura 1. Microfotografias do VLM, dois (A) e sete (B) dias após a injecção local de HSV-1. A marcação no local deinjecção deve-se à presença da enzima betagalactosidase, revelada por reacção imunocitoquímica.

Figura 2. Microfotografias de neurónios marcados retrogradamente no locus coeruleus 2 após injecção do vírus noVLM (A) e de células do núcleo parabraquial (B) 7 dias após injecção no DRt.

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envolvidos na modulação de outras funções, oque impede uma manipulação generalizada. Aterapia genética surge como um utensílio poten-cialmente útil para contornar aqueles problemasao permitir efectuar uma manipulação neuroqui-micamente selectiva dos neurónios que partici-pam na modulação da dor. Importa estabelecerdetalhadamente as características dessas célu-las e os circuitos em que participam antes deutilizar os vectores virais para o controlo da dor.Ao continuarmos a focalizar os nossos esforçosem duas áreas do bolbo raquidiano profunda-mente caracterizadas pelo nosso grupo deinvestigação, acreditámos estar a dar tão so-mente um dos primeiros passos de uma longacaminhada a efectuar antes de perspectivar autilização da terapia genética para controlo dador crónica.

AgradecimentosA investigação incluída neste trabalho foi sub-

sidiada pelo projecto POCTI/NSE/38952/2001da Fundação para a Ciência e Tecnologia epelo “Programa Dor” da Fundação CalousteGulbenkian. O estágio de licenciatura de IsabelMartins no nosso laboratório foi patrocinadapelo INSERM (Institut National de la Santé et dela Recherche Médicale, França).

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