OS CARRASCOS ESTÃO MORTOS

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MARCAS PROFUNDAS DE UMA GUERRA MUNDIAL: ONDE ESTÃO OS CARRASCOS RESPONSÁVEIS POR TANTOS HORRORES? Apesar da grande quantidade de livros escritos sobre os nazistas e o povo Judeu, muitas pessoas ignoram que até mesmo no Brasil existiram atitudes racistas e preconceituosas, inclusive no pós-guerra. Após a derrota da Alemanha na guerra, muitos nazistas se refugiaram na Argentina, no Paraguai e no Brasil. No primeiro, eram protegidos por Peron e Stroessner, e, aqui, pelo ditador Getúlio Vargas, que nutria forte simpatia pelo Terceiro Reich, levando o país a praticamente apoiar Hitler durante o conflito. A história narrada em Os carrascos estão mortos fala de uma época em que os judeus resolveram que “as contas tinham que ser acertadas”. Esse acerto começou na América Latina, com a prisão e a extradição de Eichmann, o carrasco nazista, e continuou com a procura de Mengele, o “médico-monstro dos campos de concentração”.

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PREÂMBULO

Não sei se a qualificação de “normal” pode ser dada a ele. Não sei se podemos considerá-lo alguém à margem da sociedade, que sempre acredi-tou em suas ideias e por elas lutou, arriscando inúmeras vezes a própria vida. Posso, entretanto, afirmar que Alex “não passou pela vida, viveu-a intensa-mente, não foi um espectro de homem, foi um homem. Não ficou à mar-gem do caminho, construiu-o, e desfrutou dele”.

Talvez muitos de nós possamos, ao fim da jornada, analisando-a, como escreveu Jorge Luiz Borges, considerar que “deveria ter subido mais monta-nhas, tomado mais banhos em riachos, sido mais preguiçoso e menos sério”. Sem dúvida, isso não foi o que Alex, em idade avançada, pensou de seu caminho. Como devaneio pelos mais absurdos recantos da alma de cada um, nos quais guardamos a pretensão de sermos livres, a ambição de ser-mos justiceiros e, principalmente, a loucura de sermos amados, encontra-se o porquê de contar sua história. Os caminhos foram trilhados, os crimes cometidos, os amores sentidos, os ódios vivenciados.

Hoje, passados os anos, aplacadas as feridas, fica o relato para nos fazer cientes de que a violência só conduz à violência, o ódio só conduz ao ódio. A resposta pode tardar, mas não deixa de vir.

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ANTECEDENTES

Em 1945, no pós-guerra, Buenos Aires mais parecia uma cidade euro-peia. Muitos europeus, protegendo seu patrimônio, haviam empregado ali suas economias. Franceses, ingleses, italianos, alemães e mesmo espanhóis estavam tentando sobreviver no Novo Mundo. Perón há muito tempo mani-festara suas simpatias pelo nacional socialismo, tanto que, nos últimos anos da década de 1930, era admirador dos êxitos dos governos nazifascistas. Os dólares vinham chegando à medida que a guerra evidenciava a derrota do III Reich.

A Argentina vivia um momento de prosperidade. Novas indústrias, pes-soal técnico de primeira linha, nova tecnologia, o que a máquina da guerra havia produzido de mais novo e, acima de tudo, muito dinheiro.

Antes dos arianos alemães elegerem a Argentina como porto seguro para seus investimentos, os judeus já o haviam feito. Desde 1936, com a ascensão do nazismo, judeus mais precavidos imigravam. Protegidos por Perón, que em 1945 se tornara vice-presidente e ministro da guerra, muitos dos nazistas sobreviventes, dados convenientemente como mortos ou desaparecidos, lá estavam também.

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OS ISRAELENSES

Fundado em 1948, o Estado de Israel propunha ao povo judeu, espa-lhado pelo mundo desde a Diáspora, que voltasse para sua terra. As atroci-dades cometidas na guerra vinham à tona. Os sobreviventes contavam his-tórias dos campos de concentração. As feridas eram enormes. Mesmo assim, mesmo convivendo lado a lado com ex-oficiais nazistas, vendo muitas vezes que estes continuavam a ter na Argentina posições de autoridade junto ao governo, jamais houve um protesto, nunca a comunidade judaica argentina encaminhou uma reclamação em busca de justiça.

Por outro lado, para os alemães agora refugiados, muitos deles até natu-ralizados argentinos, era o paraíso.

A ODESSA (Organizazion Der Ehmaligen SS Angehöringen), ou Organização dos Ex-Componentes da SS, funcionava colocando seus filia-dos em postos importantes, na indústria, no comércio e no governo.

Até quando? Até quando seria possível que um povo espoliado, massa-crado, escravizado, não reagisse diante dessa nova ameaça nascente? Será que se veria crescer agora, do outro lado do oceano, a intolerância racista e se teria de novo, apenas poucos anos depois, uma repetição do que acontecera na Alemanha?

As coisas caminhariam assim até 1960, quando, no bairro judaico El Onze, uma nova visão se formou. Era o tempo necessário.

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ALEX

Quando seu pai morreu, Alex, com pouco mais de oito anos, foi man-dado para o Brasil para morar com seu padrinho Ludwig Landman. Só muito mais tarde ele entenderia por que sua madrinha, ao chegar, alojou-o no subsolo do casarão que moravam na rua Vergueiro, em São Paulo, onde ficavam as dependências dos empregados. Ela nunca deu a ele o menor cari-nho, e nem sequer foi simpática. Na verdade, ela nunca se convenceu de que Alex não era filho de uma aventura de Ludwig com a mãe dele. O menino, além de ir à escola, foi crescendo e se tornando um adolescente apaixonado por automóveis. Quando era possível, ia para a Willis-Overland do Brasil, da qual seu padrinho era presidente, e, assim que conseguiu alcançar os pedais, começou a guiar todo tipo de veículos de quatro rodas no pátio de provas da fábrica. Incentivado pelos funcionários, logo se tornou um exímio motorista.

Convidado pela Willis, ele foi fazer em Córdoba, na Argentina, um curso sobre out of roads. Lá conheceu Benites, aliás, Benites Antonio Gomes, espe-cializado em fios sintéticos especiais. Benites havia trabalhado na Dupont e conhecia o assunto muito bem. Casado há 3 anos com Sandra, 20 anos mais nova que ele, era feliz, apesar de sua grande aspiração, ter filhos, não ter se realizado. Talvez por isso, com 45 anos, tenha estabelecido com Alex uma relação muito próxima à de um pai com o filho.

Após se conhecerem e constatarem uma afinidade muito grande, Alex e Benites resolveram, por sugestão deste, abrir uma fábrica de fios em Buenos Aires. Foram então para lá e começaram a trabalhar.

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O serviço na fábrica era interessante, e Alex gozava de toda liberdade. Era realmente uma posição muito alta para um rapaz de tão pouca idade.

Alex, com quase vinte anos, era um rapagão forte de 1,80 metro de altura, oitenta quilos de peso e olhos muito azuis. O cabelo loiro e fino começava a prenunciar uma típica careca judaica, que acabou chegando só muitos anos mais tarde. Pela manhã, os dois iam à fábrica e só voltavam ao anoitecer. Após o jantar, estendiam-se por longas conversas até tarde da noite. Alex morou com Benites e Sandra durante um ano. Um dia, quando estava no clube que frequentava, recebeu um chamado urgente ao telefone:

– Alex! Sou eu, Sandra. Eu e Benites estávamos na sala ouvindo o rádio e de repente ele sentiu dor no braço. Começou a vomitar, a dizer que estava mal, e que era para eu chamar um médico! Quando a ambulância chegou, ele já estava desmaiado. Faz vinte minutos que chegamos aqui no hospital da Universidade e o levaram para dentro. Alex, será que é grave? Estou com muito medo!

– Não sei, Sandra. Ninguém falou nada enquanto vocês estavam na ambulância? – perguntou, tentando concluir alguma coisa para confortá-la.

– Não, o médico ficou o tempo todo com uma máscara no rosto dele e ouvindo o coração – respondeu ela.

Alex pegou seu carro e rapidamente foi ao hospital. Encontrou Sandra sentada na sala de espera, angustiada pela ausência de qualquer explicação sobre o estado do marido.

– Vou perguntar – disse Alex, indo até um balcão onde uma imperti-nente recepcionista lhe respondeu:

– Senhor, assim que houver qualquer novidade o médico virá informá-lo.O tempo de espera não foi muito longo. Pareceu, entretanto, uma eter-

nidade. Enquanto esperavam, Alex levou seu pensamento às coisas mais culpógenas que o atingiam.

Lembrou-se de que sua mãe e irmã estavam morando na mesma cidade, e de que ele, depois que chegara do Brasil, tinha estado com elas poucas vezes, a última há dois meses. Será que elas estavam bem? E sua irmã, com a ideia de morar em Paris? Será que iria embora sem se comunicar com ele?

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Afinal, tinham seu telefone e podiam encontrá-lo todos os dias na fábrica. Pelo menos um telefonema poderiam ter dado, se algo errado tivesse aconte-cido. Com o firme propósito de procurá-las no dia seguinte, ouviu o médico perguntar:

– Parentes do Sr. Benites, por favor! Podem me acompanhar? – De um pulo, chegaram até ele, que os conduziu para uma sala contígua, quando, então, falou:

– Infelizmente, não pudemos fazer nada. Foi um enfarte fulminante.Nenhum dos dois teve uma reação exaltada. Sandra olhou para Alex,

abraçou-o e começou a chorar baixinho. Um choro profundo, sentido. Nada de histeria de viúva. Era mais um choro de filha... Já era saudade.

Voltaram para casa. Não havia ninguém à avisar aquela hora. Benites não tinha parentes próximos. No dia seguinte, fizeram o enterro, que não foi muito concorrido. Só compareceram os funcionários da fábrica e alguns poucos amigos.

Assim que terminaram os cumprimentos, Alex foi direto à casa da mãe, lugar que para ele nunca fora sinônimo de calor e aconchego. A distância colocada pelos pais entre eles e os filhos, há muitos anos, acabou afastando-o definitivamente. Quando o pai morreu, a ida para o Brasil para morar com o padrinho, apesar da pouca idade, foi para ele uma libertação. Estava agora morando em Buenos Aires, perto delas, por mero acidente de trabalho. Nunca um pensamento de proteção para com as duas havia passado por sua cabeça! Sua irmã não era uma lembrança agradável. Quando pequena, era uma chata que sempre chorava muito e reivindicava mais ainda.

Ao chegar, ficou aliviado. As duas estavam vivas e bem de saúde. A irmã ainda pensava em ir para a França, a mãe continuava com o mesmo olhar distante e alheio à realidade que sempre teve. Nada de novo.

Ele tinha a certeza de que a família em sua vida não passava de uma referência genética. Sabia que nada maior o unia a elas. Assim, pensando se foi, quase como chegou, sem grandes emoções, mas com menos culpa.

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O ESTOPIM

Em Buenos Aires, existe um bairro que desde há muito tempo é conhe-cido como o bairro dos judeus. É El Onze, ou Villa Crespo. É lá que a colônia trabalha, e muitos moram. Há lojas de tecidos e armarinho, pequenos escri-tórios comerciais e de confecções. Também lá estão os entrepostos de algo-dão, os grandes escritórios que movimentam milhões de dólares diariamente. Enfim, todo o comércio feito pelos judeus. Em 1960, o efeito da imigração judaica já se fazia sentir no comércio. Judeus ocupavam postos importantes e manobravam a economia com a habilidade que lhes conferiram milhares de antepassados em um sem-número de gerações. Costuma-se dizer que um judeu, em qualquer negócio, nunca perde, no mínimo empata. Na verdade, a habilidade desse povo para comerciar e, a partir daí, amealhar grandes for-tunas gera uma reação contra eles. O mesmo fenômeno que acontecera na Alemanha antes da guerra repetia-se agora na Argentina. O mercado de gado era monopolizado por ingleses que começaram a declarar todo o seu antisse-mitismo quando tiveram que ceder espaço. O mercado de algodão, ocupado por alemães, reagiu da mesma forma. Aos poucos, começou a se perceber que forças antissemitas encontravam terreno fértil para crescer e agir. Num país com tantos nazistas, era fácil prever o que acabou acontecendo.

O Bosque de Palermo é um imenso parque no centro de Buenos Aires, contendo em seu interior recantos perfeitamente identificados como pon-tos de encontro para diferentes grupos. O Rosedal é um desses lugares. Ali se reúnem os antissemitas da cidade. É lá também que os rapazes fazem os “rachas”: corridas de automóveis absolutamente loucas, que vez por outra causam danos enormes aos corredores e assistentes; terreno fértil para

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fomentar discórdias e consequentes disputas. Num lugar assim, frequentado por uma burguesia jovem de duvidosas origens, num belo dia, alguém lan-çou uma ideia:

– Vamos dar uma lição aos porcos judeus lá do El Onze? Como um rastilho de pólvora, a ideia avançou, e em poucos minutos

estava resolvido: iriam ao El Onze.Doze pessoas saíram em quatro carros. O comércio estava fechado. Era

domingo, dia 15 de fevereiro de 1960.Nesse mesmo dia, Alex saíra de casa cedo e fora ao clube de golfe. Na ver-

dade, o seu amor pelo esporte era diretamente proporcional à necessidade de vender os fios sintéticos que produzia. Sempre havia procurado chegar-se aos homens de negócio, para colocar sua mercadoria entre uma conversa e outra, entre um uísque e outro. O clube era um excelente lugar para fazer essas liga-ções. Era preciso aprender a jogar rapidamente. Começava no sábado já às sete horas da manhã. Cem, duzentas, quinhentas tacadas no drive range. Madeira, ferro, ele experimentava todos os tipos e tamanhos de tacos. Às vezes, parava para almoçar e continuava até a noite cair. Saía exausto. Em pouco tempo, conseguiu jogar muito bem com um handicap 18, sendo aceito numa seleta roda de frequentadores. Era o que queria. No sábado, treinava. No domingo, conseguia ser convidado a jogar pelas pessoas que o interessavam, e com isso expandir sua roda de amigos tendo como meta incrementar seus negócios. Alex sempre foi determinado. Buscava o que queria com uma persistência ímpar. Sabia ser assim. Não se metia em empreitadas para perder. Talvez por isso a fábrica caminhava tão bem.

Nesse domingo, ele saíra mais cedo do clube para ir ao escritório de Erich Brandt, amigo que fizera jogando golfe, que ficava no El Onze. O convite tinha sido feito de maneira informal, o que fez Alex entrever um possível negócio, já que Erich era presidente da maior fábrica de tecidos de Buenos Aires.

Seu amigo era askenazi (judeu de origem polonesa), e sua família já mexia com tecidos muitos anos antes de irem para a Argentina. Como o pai de Alex, Erich tinha chegado antes da guerra, quando ainda pudera imigrar, conseguindo trazer não só a fortuna da família, mas também muitos de

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seus funcionários alemães de origem judaica que ainda trabalhavam para ele. Empregando seu capital no ramo há tantos anos e com uma mão de obra diferenciada, havia montado uma indústria de primeiro mundo. Era a principal fábrica de tecidos da Argentina, exportando grande parte de sua produção. A qualidade do seu produto era reconhecida, e parecia a Alex que ele exercia uma liderança dentro da colônia, pela sua credibilidade não só como profissional, mas também como homem.

O convite para ir até a empresa incluía, também, outros três judeus conhecidos do clube que nada tinham que ver com o comércio de fios ou tecidos. Acabado o jogo, reuniram-se na saída do clube e foram para o escri-tório. Estacionaram seus carros e juntos caminharam tranquilamente pela rua vazia. Todas as lojas estavam fechadas. Não se via ninguém além deles.

Subitamente, carros em velocidade vieram de uma travessa à esquerda, cantando os pneus. Aceleraram mais, até em frente da sinagoga que ficava logo à frente, onde brecaram violentamente, ficando todos atravessados interrompendo a rua. Os cinco homens, entre eles, Alex, pararam a uns cem metros. Aturdidos, ficaram paralisados. Rapidamente, desceram dos carros doze jovens. Armados de paus e pedras, oito deles começaram a quebrar os vidros do prédio, enquanto quatro outros escreviam nas paredes.

Ninguém apareceu. Tão rápido como chegaram, partiram. Saíram em desabalada carreira, quase atropelando Alex e seus amigos, que continuavam estáticos. Sumiram de vista rapidamente. De relance, entretanto, Alex per-cebeu que um dos motoristas era loiro e tinha uma mancha vinhosa no lado direito do rosto, indo até a orelha do mesmo lado.

A primeira palavra veio de Erich:– Não, isso não pode acontecer! – falou, profundamente abalado.Correram para a frente da sinagoga, onde já se encontrava o rabino.

Com o medo estampado em seus rostos, dois velhos saíram do prédio e começaram a se lamentar.

Uma mulher atravessou a rua e, chorando, entrou para rezar. Os velhos a acompanharam. Na rua, permaneceram Alex, seus amigos e o rabino. Nas paredes, várias suásticas e algumas frases em alemão e espanhol.

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“RAUS JUDEN: JÜDISCHE SCHWEINE”1

Todos leram e se entreolharam. Em seus olhares não havia medo.O rabino olhou para Erich como que esperando uma reação. Alex teve

a impressão de que um enredo preestabelecido se desenrolara à sua frente. Mais tarde, viria saber que o ataque era esperado.

– Senhores, gostaria de conversar com todos em meu escritório aqui em frente. Vamos até lá? – disse Erich, sério.

Silenciosamente atravessaram a rua, entraram na tecelagem e foram até a sala de reuniões do escritório. Sentaram-se, e Erich falou:

– Faz quinze anos que a guerra terminou. Eu pensei que não estaria vivo para assistir novamente a uma cena dessas. Vários amigos me preveniram para o que poderia acontecer, e eu achei que não aconteceria. Talvez como meu pai, que na Alemanha achava Hitler um louco que, como tal, jamais teria chance de chegar ao poder. Não quero esperar para ver o que pode acontecer amanhã. Quero começar a reagir hoje. Quem está comigo?

Todos estavam.O que se passou nessa reunião de duas horas daquele domingo, 15 de

fevereiro de 1960, jamais foi comentado por seus participantes. Alex teve certeza de que tinha vindo ao escritório, não para um negócio, mas para assistir ao acontecido. Quando encerrou a reunião, Erich dirigiu-se aos par-ticipantes dizendo:

– Esse encontro nunca existiu. Não existe nenhuma organização judaica. Todo e qualquer contato com vocês será feito por pessoas que vocês identifi-carão com o tempo. Todos os acertos devem ter cobertura estrita de negócios. Cada um de vocês – dirigia-se aos quatro que vieram do campo de golfe – poderá eventualmente ser convocado para um serviço através de um agente de contato. Não esperem proteção por parte da colônia. A reunião, hoje, não visava uma convocação. Os acontecimentos precipitaram essa conversa. Hoje faríamos simplesmente um contato para posteriormente averiguar a disposi-ção dos quatro para trabalhar conosco. Vocês já foram totalmente investiga-

1 Fora Judeus: Porcos Judeus (Tradução nossa).

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dos para termos a certeza de que são úteis à causa. Poderão trabalhar até que formem família, quando, então, serão automaticamente desligados.

Alex sabia que dos três que vieram do golfe com ele, um era médico, outro advogado, o terceiro fazendeiro. Todos solteiros.

– Lembrem-se, essa reunião nunca existiu. Boa tarde, amigos, Shalom!Saíram do prédio, e Alex percebeu que entrara no movimento judaico

através de uma porta que poderia conduzi-lo a caminhos difíceis, pelos quais nunca havia pensado passar. Não tinha nenhuma formação militar, nunca havia dado um tiro. Por que ele? Detestava maltratar qualquer animal e muito menos caçá-los. Pelo jeito, agora iria caçar... seres humanos. Não tinha a menor dúvida de que a colônia se armava para defender-se.

Naquela noite, teve um sono agitado. Via-se lutando contra animais imensos e com uma arma de brinquedo que só atirava água; ou, então, era atacado por índios que o amarravam e o levavam dependurado pelos pés. Deu graças a Deus quando acordou.

Pela manhã, finalmente, enquanto trabalhava em seu escritório, recebeu o telefonema de uma moça que se identificou como Rita. Dizia ela perten-cer ao movimento jovem da sinagoga X, e fez a ele um convite para ir até lá no sábado seguinte. A recomendação foi seguida de um “Por favor, não falte!” dito de maneira enfática.