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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X OS CUIDADOS COM A INFÂNCIA DESVIANTE: SOBRE HIGIENE MENTAL E GÊNERO NOS PRONTUÁRIOS DO SERVIÇO SOCIAL DE ASSISTÊNCIA E PROTEÇÃO AOS MENORES DE SÃO PAULO (1930-1940) Viviane Borges 1 Fernando Salla 2 Resumo: O trabalho apresenta alguns resultados de uma pesquisa ainda em curso realizada nos arquivos do Serviço Social de Assistência e Proteção aos Menores de São Paulo, entre 1930 e 1940. A preocupação do Estado com o gerenciamento da infância e juventude considerada abandonada, perigosa e pervertida teve início no Brasil no final do século XIX e inicio do XX, encabeçada por médicos e juristas que apontavam a necessidade da criação de um aparato jurídico e institucional voltado a este segmento da sociedade. Nossa intenção tem sido investigar de que forma a documentação institucional categorizava esses sujeitos através uma perspectiva marcada pelo ideário da higiene mental e da criminologia. As informações produzidas sobre as crianças e adolescentes recorriam a aspectos sociais, econômicos, educacionais e afetivos que se somavam às razões constitucionais e orgânicas para instituir quem eram os menores delinquentes e pervertidos. Tais categorias mesclavam o campo jurídico e psiquiátrico, e atuavam diretamente sobre o tratamento conferido a meninos e meninas em conflito com a lei ou abandonados. A descrição e a análise das práticas institucionais, a partir dos prontuários, permitem problematizar as questões de gênero, indicando similaridades e diferenças nas formas de intervenção e tratamento de meninos e meninas no período. Palavras-chave: higiene mental, infância, abandono, delinquência. A preocupação do Estado com o gerenciamento da infância e juventude considerada perigosa e pervertida teve início no Brasil no final do século XIX e inicio do XX, encabeçada por médicos e juristas que apontavam a necessidade da criação de um aparato jurídico e institucional voltado a este segmento da sociedade. 3 Antes mesmo da entrada em vigor do Código de Menores de 1927 houve a criação de Juizados de Menores em 2 cidades brasileiras: Rio de Janeiro, São Paulo, que de certa forma deram início ao processo de judicialização das questões relativas ao abandono e à delinquência de crianças e adolescentes. Com a promulgação do Código de Menores de 1927, foi instituído um marco na história da infância e da juventude no Brasil. Logo em seguida, com a criação de uma legislação específica e de uma rede de instituições com a finalidade de colocá-la em exercício, o Estado assumia a função de cuidar da infância desviante, estabelecendo uma série de práticas institucionais que visavam sua regeneração, sobretudo pelo trabalho. A preocupação maior era afastar os menores da desordem, da perversão, dos maus hábitos, para torná-los 1 Professora do Departamento de História e do Programa de Pós-graduação em História Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC. Coordenadora do Laboratório de Patrimônio Cultural da UDESC (LabPac/UDESC). 2 Pesquisador associado do Núcleo de Estudos da Violência (NEV-USP) e docente do Mestrado Profissional Adolescente em Conflito com a Lei da Universidade Anhanguera de São Paulo. 3 A respeito da história da infância e adolescência ver: (VIANNA, 1999), (AREND, 2011), (ALVAREZ, 1989).

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

OS CUIDADOS COM A INFÂNCIA DESVIANTE: SOBRE HIGIENE MENTAL E

GÊNERO NOS PRONTUÁRIOS DO SERVIÇO SOCIAL DE ASSISTÊNCIA E

PROTEÇÃO AOS MENORES DE SÃO PAULO (1930-1940)

Viviane Borges1

Fernando Salla2

Resumo: O trabalho apresenta alguns resultados de uma pesquisa ainda em curso realizada nos arquivos do Serviço

Social de Assistência e Proteção aos Menores de São Paulo, entre 1930 e 1940. A preocupação do Estado com o

gerenciamento da infância e juventude considerada abandonada, perigosa e pervertida teve início no Brasil no final do

século XIX e inicio do XX, encabeçada por médicos e juristas que apontavam a necessidade da criação de um aparato

jurídico e institucional voltado a este segmento da sociedade. Nossa intenção tem sido investigar de que forma a

documentação institucional categorizava esses sujeitos através uma perspectiva marcada pelo ideário da higiene mental

e da criminologia. As informações produzidas sobre as crianças e adolescentes recorriam a aspectos sociais,

econômicos, educacionais e afetivos que se somavam às razões constitucionais e orgânicas para instituir quem eram os

menores delinquentes e pervertidos. Tais categorias mesclavam o campo jurídico e psiquiátrico, e atuavam diretamente

sobre o tratamento conferido a meninos e meninas em conflito com a lei ou abandonados. A descrição e a análise das

práticas institucionais, a partir dos prontuários, permitem problematizar as questões de gênero, indicando similaridades

e diferenças nas formas de intervenção e tratamento de meninos e meninas no período.

Palavras-chave: higiene mental, infância, abandono, delinquência.

A preocupação do Estado com o gerenciamento da infância e juventude considerada perigosa e

pervertida teve início no Brasil no final do século XIX e inicio do XX, encabeçada por médicos e juristas que

apontavam a necessidade da criação de um aparato jurídico e institucional voltado a este segmento da

sociedade.3 Antes mesmo da entrada em vigor do Código de Menores de 1927 houve a criação de Juizados

de Menores em 2 cidades brasileiras: Rio de Janeiro, São Paulo, que de certa forma deram início ao processo

de judicialização das questões relativas ao abandono e à delinquência de crianças e adolescentes. Com a

promulgação do Código de Menores de 1927, foi instituído um marco na história da infância e da juventude

no Brasil. Logo em seguida, com a criação de uma legislação específica e de uma rede de instituições com a

finalidade de colocá-la em exercício, o Estado assumia a função de cuidar da infância desviante,

estabelecendo uma série de práticas institucionais que visavam sua regeneração, sobretudo pelo trabalho. A

preocupação maior era afastar os menores da desordem, da perversão, dos maus hábitos, para torná-los

1 Professora do Departamento de História e do Programa de Pós-graduação em História Universidade do Estado de

Santa Catarina – UDESC. Coordenadora do Laboratório de Patrimônio Cultural da UDESC (LabPac/UDESC).

2 Pesquisador associado do Núcleo de Estudos da Violência (NEV-USP) e docente do Mestrado Profissional

Adolescente em Conflito com a Lei da Universidade Anhanguera de São Paulo. 3 A respeito da história da infância e adolescência ver: (VIANNA, 1999), (AREND, 2011), (ALVAREZ, 1989).

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cidadãos úteis, pois se passou a reconhecer na figura desses sujeitos a potência do criminoso futuro, do mau

cidadão, do mau trabalhador.

Os cuidados com a infância aparecem também nas preocupações da Liga Brasileira de Higiene

Mental, criada em 1923. Entre os membros da Liga podemos citar médicos e juristas preocupados com a

questão da infância, ligados ao governo ou a instituições públicas, como Lemos Britto (advogado, jornalista

e diretor da Escola 15 de Novembro entre 1926-1930), Mello Mattos (Juiz de Menores, autor do projeto que

deu origem ao Código de Menores), Moncorvo Filho (vice-presidente da LBHM, diretor do Instituto de

Proteção e Assistência à Infância e do Departamento da Criança, criador do Departamento da Criança no

Brasil, em 1919, além de ser o organizador do primeiro Congresso Brasileiro de Proteção à Infância no ano

de 1922). Propostas como o "consultório gratuito de psicanálise”, que funcionou com regularidade até os

primeiros meses de 1927, foi uma tentativa da LBHM de atuar junto às escolas e ao Juizado de Menores,

visando a correção da infância em conflito com a lei.

A presença crescente de profissionais (médicos, psiquiatras, psicólogos, assistentes sociais e

educadores) nas instituições criadas (denominadas, então, de escolas de reforma, institutos disciplinares) e

uma progressiva produção de informações sobre os antecedentes legais dos menores, seu passado familiar,

suas características psicológicas, sua sociabilidade, suas potencialidades para o trabalho – passaram não só a

contribuir para a conformação das instituições como também para organizar a própria dinâmica interna

desses espaços e ainda a circulação dos menores por elas.

Os prontuários aqui analisados constituem conjuntos documentais referentes aos menores que

passaram pelo Serviço Social de Assistência e Proteção a Menores (SSAPM), criado em 19354, o qual

pertencia ao Departamento de Assistência Social do Estado de São Paulo5. O Serviço articulava-se a rede

institucional que envolvia o Juízo de Menores e os locais para onde eram encaminhados os menores por

abandono ou por infração. Dentre esses locais estavam o Instituto Disciplinar da Capital, o Instituto

Disciplinar de Mogi-Mirim, o Reformatório Profissional de Taubaté e um vasto conjunto de instituições

religiosas de abrigamento de crianças órfãs e abandonadas que era mediado pela Liga das Senhoras Católicas

(ALVAREZ et at, 2016)6. Essas instituições tinham um caráter disciplinar, focando no trabalho e na

educação como elementos que proporcionariam sua regeneração.

4 Lei n. 2.497, de 24 de dezembro de 1935 5 Os nomes usados são fictícios, respeitando os cuidados éticos que envolvem a pesquisa com este tipo de fonte. 6 A Liga das Senhoras Católicas (LSC), criada em 1923, “servia de intermediária entre o Juízo de Menores, o Serviço

Social de Menores e as instituições religiosas que mantinham abrigos e orfanatos na capital e no interior. A Liga das

Senhoras Católica mantinha a Casa da Infância e o Educandário Dom Duarte (EDD), mas fazia a colocação de menores

abandonados a pedido do juiz ou do diretor do SSM em diversas instituições: Abrigo Santa Maria; Abrigo ou Casa

Santa Marta; Asilo da Divina Providência; Asilo do Bom Pastor; Asilo São José do Belém; Assistência Vicentina aos

Mendigos – Sanatório de Tuberculosos Pobres; Casa Pia de S. Vicente de Paula; Asilo dos Expostos; Lar São Paulo;

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Tobias Barreto, em sua obra Menores e Loucos, contestava os limites da generalização do limite

etário de 14 anos estabelecido pelo Código Penal para julgar a responsabilidade penal, pois isso acabaria por

apagar uma série de diferenças como as regionais, ou de gênero.

O campo da história da infância vem se consolidando no Brasil desde a década de 90, com trabalhos

preocupados em entender os mecanismos criados pelo Estado para assegurar a “regeneração” dos menores.

Estes estudos permitem vislumbrar as práticas institucionais e suas interpelações em relação à legislação.

Dos 67 casos aqui analisados, 26 são meninas7.

Ainda observamos uma carência de estudos ligados a presença das meninas nos espaços de

aprisionamento. Somente a partir dos anos 90 podemos observar estudos, de influência feminista, focados

nas meninas em conflito com a lei e a dificuldade de acessar questões como o tratamento e a intervenção

quando o assunto são as menores (WORRAL, 1990); (STEFFENSMEIER & ALLAN 1996); (CHESNEY-

LIND, 1997), (CHESNEY-LIND & SHELDEN, 1992); (MILLER, 2001), (BURMAN, BATCHELOR &

BROWN, 2001).

Observa-se que alguns desses estudos acabaram reforçando estereótipos que conferem a mulher uma

“inabilidade” delituosa, colocando mulheres e meninas apenas como vítimas de seu meio social, de seu

passado e de sua condição feminina, repetindo o pensamento defendido por médicos e juristas da época. Esse

olhar não parece levar em conta a complexidade do sistema de justiça e das trajetórias individuais e sua

relação com o social, elas também perpassadas por questões de gênero8. Inserir essas meninas na história

permite ressignificações dentro do que tradicionalmente é estudado quando o assunto são as instituições de

aprisionamento, espaço predominantemente masculino, possibilitando tangenciar a complexidade que

envolve fenômenos sociais e históricos.

Assim, embora sejam ainda escassos os trabalhos historiográficos voltados para as meninas nas

instituições de confinamento, como abandonadas ou infratoras, parece que é relevante o conjunto documental

constituído pelos prontuários do SSAPM para uma melhor compreensão desse capítulo da história da

infância e juventude no Brasil.

Colégio Patrocínio de São José (de Lorena); Asilo de Vila Mascote (que era mantido pela Assistência Vicentina aos

Mendigos da Sociedade de S. Vicente de Paulo)” (ALVAREZ et at, 2016).

7 O atual estágio da pesquisa com os prontuários é de cunho exploratório, portanto ainda não foram adotados critérios

mais rigorosos, do ponto de vista quantitativo e qualitativo, para a seleção desses documentos que se encontram no

Arquivo do Estado de São Paulo e são dali retirados a pedido dos pesquisadores pelo Centro de Pesquisa e

Documentação (CPDoc), da Escola de Formação e Capacitação Profissional (EFCP) da Fundação CASA (Centro de

Atendimento Socioeducativo ao Adolescente). 8 Citamos alguns estudos realizados em Portugal nesse sentido: Cunha, 2002; Matos, 2008; Duarte, 2012; Duarte e

Cunha, 2014.

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O relatório do Projeto Fundação CASA prontuários 1925-1934 (ALVAREZ et al, 2016) apresentou

uma pesquisa realizada em 2015, a qual consultou 299 prontuários dentre os listados no ‘Inventário de

Prontuários de ex-internos 1925-1934 vol.1’, produzido pelo Centro de Pesquisa e Documentação (CPDoc),

da Escola de Formação e Capacitação Profissional (EFCP) da Fundação CASA. Naquela pesquisa apurou-se

que os prontuários de meninos eram 259 (86,6%) e de meninas 40 (13,4%).

O Juízo de Menores de São Paulo integrava o Serviço Social de Menores que possuía um laboratório

de investigação voltado aos menores, o Instituto de Pesquisas Juvenis, criado também em 1935, com a

finalidade de realizar “Pesquisas e investigações referentes a problemas pedagógicos e de reeducação da

criança, que é estudada sob o aspecto biológico e social, tendo ainda medidas e instituição de psicotécnica e

de orientação profissional” (LIMA, 1939, p. 535). O IPJ teria as seguintes atribuições:

a) - o exame médico-pedagógico do menor (estado físico e mental), no momento da

admissão, psicobiograma, história clínica complementar, anexos ao psicobiograma,

investigação social (levada a efeito por intermédio do Comissariado de Menores) e estudo

psiquiátrico complementar eventual;

(...)

c) - orientar e auxiliar as atividades do Serviço, referentes à reeducação dos menores,

acompanhando o desenvolvimento das medidas corretivas, em prática nos estabelecimentos

do Serviço e, eventualmente, nos particulares que isso solicitem;

(...)

f) - lavrar pareceres sobre assuntos médico-pedagógicos.

O IPJ funcionava junto ao Abrigo Provisório de Menores, para onde todos os menores eram enviados

e que ficavam à disposição do juiz. Era o posto de observação que fornecia as principais informações e

diagnósticos para os juízes e mesmo para os administradores dos institutos. Inicialmente, era composto por

um gabinete de exame clínico, um gabinete de psicologia, um serviço de investigação social e um “serviço

de biogenética” (artigo 76). Mas em 1938, quando o Serviço Social foi remodelado, sua estrutura se

diversificou ainda mais. Embora as atribuições do IPJ não tivessem se alargado tanto com a reorganização,

passou a ter, pelo parágrafo único do artigo 6º, os seguintes serviços: “a) - Serviço de Psicopatologia; b) -

Serviço de Neuropediatria; c) - Serviço de Biotipologia e Patologia constitucional; d) - Serviço de

Psicopedagogia; e) - Serviço de Psicologia experimental; f) - Serviço de Pesquisas; g) - Serviço de Arquivo e

Estatística; h) - Serviço de Tradução e Biblioteconomia; i) – Serviço de Desenho; j) - Serviço de

Identificação”.

O Código de Menores de 1927 ao mesmo tempo em que procurava amparar os menores também

contribuía para fomentar estereótipos em relação a eles: vadios, mendigos, libertinos, capoeiras, pervertidos,

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delinquentes são categorias presentes na legislação e que perpassam os registros institucionais. Nesse

sentido, um documento fundamental é a Síntese Médico Psicopedagógica, um exame realizado pelo médico-

chefe do Instituto de Pesquisas Juvenis por solicitação do diretor do Serviço Social de Menores, presente em

boa parte dos prontuários analisados, tanto de meninos quanto de meninas. Nessa avaliação é possível

observar os mecanismos utilizados pela instituição para a produção de informações sobre os menores.

O documento possui os seguintes campos:

1. Antecedentes hereditários

2. Condições sociais (subdividido em “Família” e Ambiente”)

3. Antecedentes pessoais (com um subcampo denominado “instintos”, “Atitude social”, “Temperamento e

Caráter”)

4. Estado Atual – Constituição. “Índices antropométricos sintéticos, sensibilidade sensorial, “Dados

Clínicos”, “Dados Psicológicos” – (inteligência, “velocidade dos processos mentais”; “Temperamento e

caráter”;

5) Atitude social

6) Aptidão e vocação

7) Escolaridade

8) Dados psiquiátricos

9) Diagnóstico

10) Imputabilidade

11) Periculosidade

12) Indicações

O exame do IPJ atuava de forma relacional com todos os demais documentos presentes nos

prontuários. Os pareceres dos juízes eram fundamentados com base nos exames realizados pelo IPJ e

determinavam o destino dos menores na rede institucional. A ideia de degeneração ganhou destaque nesses

registros. As discussões a respeito da loucura têm papel fundamental no desenvolvimento da noção de

degeneração e das teorias a ela ligadas, contudo é importante ressaltar que tal noção adentrou em outros

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campos. Conforma Viana (1999), “mais que uma doutrina circunscrita, a degeneração pode ser tomada como

uma justificativa capaz de adaptar-se a diversas situações específicas e de legitimar formas de controle sobre

comportamentos”.

Os menores eram entendidos nesse período como crianças e adolescentes pobres ou abandonados

que perambulavam pelas cidades, cabendo às instituições retirá-los ou livrá-los da delinquência, do conflito

com a lei, evitando que viesse a “infancia abandonada a se contaminar pelo ambiente das ruas ou pelo

convivio com pessoas de indole criminosa” (MOTTA, 1897, p. 23 apud FONSECA, 2008).

O perigo do meio no qual o sujeito se desenvolve, que perpassa as ideias de médicos e juristas do

final do XIX e inicio do século XX, passa a ser um elemento fundamental para a avaliação da presença ou da

ausência de doenças (ENGEL, 1998). Conforme Engel, de um modo geral, “a partir de meados do século

XIX, as degenerescências e os desvios passaram a ser vistos não apenas como produto da hereditariedade,

mas também como resultado da desordem social”. Esses dois aspectos, hereditariedade e desordem social,

aparecem como preocupação central nos registros analisados.

Angelina9, de 17 anos, foi recolhida ao Reformatório Modelo por 4 anos por ter assassinado o marido

com a ajuda da mãe, envenenando-o com “bolinhos de farinha de trigo em mistura com uma substancia

arsenical”. A sentença do Juiz, totalmente fundamentada nos exames realizados pelo IPJ, reforça que sua

regeneração só se daria quando esta fosse afastada do meio em que vivia:

A punição de Angelina não interessa a coletividade; o que consulta os interesses da

sociedade é sua regeneração, a sua formação moral, fora do ambiente mesquinho e

confinado onde cresceu e criou-se, sem instrução alguma, sem nunca ter frequentado

uma escola, entregue aos seus instintos e sem força para dominá-los. Angelina

necessita de reeducação, para que, livre da ignorância e do meio em que viveu, possa

um dia, conscientemente, distinguir entre o licito e o ilícito e ser útil à si e aos seus”.

(PT 5035, 1938)

A preocupação com os antecedentes hereditários e com as condições sociais é uma constante nas

avaliações do IPJ, apontando aspectos como: “influência maléfica devido a uma tendência moral duvidosa,

abandono moral e desarmonia entre pais e filhos. Presença do álcool à mesa é comum” (PT 5035, 1938). No

documento Síntese Médico Psicopedagógica, um dos itens elencados é “instintos”, o qual traz

caracterizações pejorativas como: mentirosa, dissimuladora, indisciplinada, rebelde, impulsiva, “Aprender a

controlar os impulsos” era parte do processo de regeneração.

9 Prontuário 5035.

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Identificar a degeneração era um exercício de observação e registro de traços nem sempre claros e

evidentes. Tratava-se de buscar não apenas os abandonados e pervertidos, mas também os “passíveis de o

ser”, conforme estabelecia o Código de Menores, sujeitos que possuíam “vocação para o crime” (PT 0132).

Conforme Candido Motta Filho, diretor do Instituto Disciplinar de SP, nem mesmo o crime cometido poderia

ser entendido como critério suficiente para a classificação dos menores – esta deveria se basear numa

observação individual, constante e cuidadosa. E indicava que todos os menores deveriam ser enviados as

mesmas instituições, sem distinção de delito ou condenação, e que então internados poderiam ser

classificados a partir de um diagnóstico preciso (VIANA, 1999).

Causas morais como “maus-costumes”, “enfraquecimento da autoridade familiar”, somam-se a

“distúrbios físicos e psíquicos e hereditariedade. Documentos assinados por assistentes sociais, pedagogos,

psicólogos corroboravam teorias médicas da época. Nesse sentido, é possível encontrar classificações e

diagnósticos que apontam as menores como “débil mental”, “histérica”, “tarada”, “pervertida sexual” etc.

Conforme observou Viana: “mais do que atuar no sentido de um diagnóstico preciso de alguma situação [...]

essas noções transformavam-se em princípios explicativos exportáveis para diversos campos de

conhecimento” (Viana, 1999, p. 142).

Em consonância com o pensamento médico jurídico da época, o alcoolismo e a sífilis eram tidos

como fatores predominantes na hereditariedade da degeneração. Conforme a cópia da sentença do menor

Rodolfo, 17 anos, condenado por furto: “apesar do exame de sanidade o dar como fisicamente normal, pode

ser um tarado, descendente de pai alcóolatra que suicidou-se ingerindo creolina”. Nesse caso, o que não era

muito comum, o Juiz contesta o exame de sanidade mental realizado pelo IPJ com base nos antecedentes

hereditários do menino.

Ao lado do alcoolismo, havia a preocupação com a sífilis. O pedido de exame de Heredo-lues é uma

constante nos prontuários. Ainda que não tenhamos encontrado os exames anexados aos prontuários, havia

sempre a recomendação do IPJ para que ele fosse realizado. Os heredo-sifilíticos teriam um aspecto físico

que mesclaria involução e degradação alcançando características físicas e morais. Assim, os “doentes da

vontade, os preguiçosos, os perversos sexuais começam a ser considerados frutos da sífilis” (CARRARA,

1996, p. 65).

A ideia de “regenerar pelo trabalho”, conforme o Código de Menores, aparece como uma

preocupação constante na documentação. No item “atitude social” do exame realizado pelo IPJ, são

apresentadas informações sobre o fato do menor gostar ou não de trabalhar, sobre seu comportamento nas

ruas a preferência ao ócio e ao divertimento em detrimento ao trabalho, a indisciplina. Na citada Síntese

Médico Psicopedagógica, constava o campo: “Aptidão e vocação”.

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No que se refere às meninas, o campo quase sempre não era preenchido, ou se registrava que a

mesma não possuía “vocação profissional”, mas ao mesmo tempo indicava que era adaptável aos “serviços

domésticos”. Em apenas um prontuário dentre os pesquisados, foi apontada a aptidão de “arrumadeira”.

Essas características legitimavam o trabalho das meninas como domésticas em casas de famílias residentes

em áreas nobres da cidade, a chamada “soldada”.

Conforme o Código de Menores: “Art. 202. Às menores serão ensinados os seguintes ofícios:

Costura e trabalhos de agulha; Lavagem de roupa; Engomagem; Cozinha; Manufatura de chapéus;

datilografia; Jardinagem, horticultura, pomicultura e criação de aves”. A colocação de uma menina sob

soldada em casas de família significava que ela ficava sob a responsabilidade de uma pessoa dessa família,

faria trabalhos domésticos e receberia uma quantia em dinheiro pelos serviços e outra parte do dinheiro era

depositada numa conta que era administrada pelo Serviço Social de Menores. A colocação da menina numa

casa de família era sempre amparada pela assinatura de um termo de responsabilidade. O juiz de menores,

em princípio deveria ser sempre informado sobre esses procedimentos, pois implicava a colocação da menina

fora de uma instituição (pública) que havia sido o destino dado pelo juiz. Vários registros indicam atritos

entre a meninas e as famílias, que muitas vezes as “devolviam”. No prontuário de Dolores, consta que ela e

mais seis moças foram devolvidas ao Abrigo Provisório de Menores, em maio de 1940, por “não se

adaptarem ao regime” de soldada.

Também as instituições a que os menores haviam sido encaminhados (como hospitais ou mesmo

orfanatos), os devolviam, a razão apontada frequentemente se refere a rebeldia, por medo de “contagiar” os

demais com um comportamento moral que não era considerado adequado. No caso de Dolores, a rebeldia

também se fez no interior do Hospital-Sanatório Leonor Mendes de Barros, local para onde foi enviada. Um

ofício de agosto de 1940 do diretor do Hospital para o diretor do Comissariado do Juízo de Menores

informava que a sua permanência ali estava se “tornando inconveniente pela absoluta falta de respeito à

ordem do Hospital-Sanatório Leonor Mendes de Barros. Não desejando aqui ficar, a mesma se convenceu de

que, pelo desrespeito e inobservância dos regulamentos conseguiria seu intento”. O diretor informou ainda

que muitas providências haviam sido tomadas sem sucesso. O problema é levado ao conhecimento do juiz e

o diretor do Serviço Social de Menores se dirige ao diretor do Hospital-Sanatório informando que não

dispunha de “estabelecimento adequado” para a menor e que ele poderia “agir com a maior severidade para

com as menores aí recolhidas, quando não sigam a disciplina desse estabelecimento.

O caso de Dolores aponta ainda para o tratamento conferido aos casos de prostituição. Não são

apresentados na guia de internação de Dolores os motivos da internação (se abandono ou cometimento de

alguma infração). Segundo esse documento, ela declarou ter 18 anos, mas ao longo de sua permanência sob

custódia do Serviço Social de Menores a idade dela seria motivo de investigação. Ao que tudo indica sua

internação está associada à questão da prostituição. Seguem trechos da sentença, prolatada pelo juiz da

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Capital, que são ilustrativos da condição da menor bem como do imaginário que a cercava:

...hei por bem declará-la em estado de abandono no conceito legal. A referida menor

como consta do processo não tem pessoa alguma que cuide de si e ignora o

paradeiro de seus pais conforme declarou. Trata-se, no caso, de uma menor que

devido ao seu estado e passado constante dos autos não pode permanecer no

convívio de outras internadas [estava então no Abrigo Provisório de Menores]. A

menor fichada como prostituta em Barretos, exerceu o meretrício em vários lugares

conforme declara. Pelo seu proceder e pelo contato que a miséria naturalmente teve

pode-se avaliar o seu moral. Oferece o caso perigo para as companheiras de casa.

(...) O seu moral chegou ao ponto de noção (sic) seu próprio nome e interrogada vem

com evasivas ou ignorância. Hábito muito comum entre mulheres do quilate a que

pertence a menor. Não sabemos se ainda conserva o seu estado de espírito em parte,

pois que a modificação que deverá se operar será custosa e árdua. Sob a proteção do

Estado e nos termos do art. 26 n. I, V, VI, interne-se a menor referida em caráter

definitivo, por intermédio do DASPM [Departamento de Assistência Social e

Proteção aos Menores] que designará o lugar conveniente para sua pessoa.

Pode-se inferir que a penalidade imposta visava aos hábitos e costumes da menor. A miséria em que

vivia aparece como responsável por sua moral, apontada como perigosa para as outras detentas, pois sua má

conduta poderia influenciar as demais, visto seu envolvimento com a prostituição. O fato dela mentir o nome

(em seu prontuário constam dois nomes diferentes, informados pela própria menina), é apontado

pejorativamente como “hábito comum em mulheres do seu quilate”. Certamente essa avaliação referia-se aos

indícios da menor ter alegado nome falso e ainda ter informado ter "prontuário de prostituta na Polícia de

Barretos".

A ausência de um lugar considerado adequado para as meninas também aparece nos registros dos

prontuários. Angelina, citada anteriormente, foi condenada a 4 anos de internação no Reformatório Modelo,

contudo o Juiz atentava: “Reformatório Modelo é destinado aos menores abandonados e delinquentes de

mais de 10 até 14 anos completos e que não existe, no Estado, nenhum estabelecimento para delinquentes

menores do sexo feminino”.

No Código de Menores estava prevista a criação de “uma escola de preservação para menores do

sexo feminino, que ficarem sob a proteção da autoridade pública” (Art. 198), contudo, no caso de São Paulo,

os locais para internação de meninas eram improvisados, alas de outras instituições, como se pode observar

na ausência de referência a qualquer instituto exclusivamente destinado às meninas na reforma

administrativa do Serviço Social de Menores empreendida em 1938 com o decreto n. 9744.

Considerações finais

O presente texto trouxe apenas alguns resultados preliminares de pesquisa ainda em

andamento e que tem como uma de suas principais preocupações contribuir para uma compreensão

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mais alargada sobre os controles sociais voltados para os menores infratores ou abandonados desde

o advento do Código de Menores de 1927. Sustentamos que embora tenham havido avanços

consideráveis na literatura específica sobre a menoridade, nas últimas décadas, são escassos os

trabalhos destinados às práticas voltadas para a gestão das meninas. Nosso intento foi trazer alguma

reflexão sobre esses mecanismos de controle e gestão da menoridade e delinear algumas pistas, a

serem aprofundadas, sobre as representações sociais disponíveis no período sobre a condição das

meninas em abandono e as infratoras e como as tratavam as instituições públicas e privadas nas

quais eram inseridas.

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The care of deviant childhood: about mental hygiene and gender in the records of the Social Service of

Assistance and Protection for Minors of São Paulo (1930-1940)

Abstract: The work presents some results of an ongoing research carried out in the archives of the Social

Service of Assistance and Protection for Minors of São Paulo between 1930 and 1940. The State's concern

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with the management of childhood and youth considered abandoned, dangerous and perverted had Beginning

in Brazil in the late nineteenth and early twentieth centuries, headed by doctors and jurists who pointed to the

need to create a legal and institutional apparatus aimed at this segment of society. Our intention has been to

investigate how the institutional documentation categorized these subjects through a perspective marked by

the ideas of mental hygiene and criminology. The information produced on children and adolescents resorted

to social, economic, educational and affective aspects that added to the constitutional and organic reasons to

establish who were the juvenile delinquents and perverts. Such categories blended the legal and psychiatric

field, and acted directly on the treatment of boys and girls in conflict with the law or abandoned. The

description and analysis of the institutional practices, from the charts, allows to question the gender issues,

indicating similarities and differences in the forms of intervention and treatment of boys and girls in the

period.

Keywords: Mental hygiene, childhood, Penitentiary