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EXISTE LIRISMO EM AUGUSTO DOS ANJOS – O POETA DO “MAU GOSTO”?

Nilséia Charal Lopes

Prof. Dra. Marcele Aires (Orientadora/UEM)

RESUMO Com intuito de encontrar formas mais dinâmicas para trabalhar a literatura no Ensino Médio do Colégio Estadual Vercindes Gerotto dos Reis, em Paiçandu, PR, foi elaborado um projeto de intervenção pedagógica priorizando a poesia, em especial devido ao “tabu” que os alunos trazem em relação a esse gênero. O projeto envolveu duas turmas de 3º anos do Ensino Médio, período matutino, envolvendo ações numa metodologia diversificada e dinâmica, com o objetivo de despertar nos alunos o gosto pela poesia. Como corpus do trabalho foram selecionados poemas de Augusto dos Anjos, substancialmente aqueles que abordam o tema “morte”. O propósito era levar os alunos a pensar na própria existência. Trabalhando-se concomitantemente com outras áreas artísticas, a exemplo da pintura, da música e do cinema, foram selecionadas 16 poesias de Augusto dos Anjos, intertextualizadas com os poetas: Álvares de Azevedo, Junqueira Freire, Fagundes Varela e Castro Alves – do Romantismo; e Manuel Bandeira e Mario de Andrade – do Modernismo, que retratam o tema morte, em outra vertente. Este artigo tem como objetivo relatar as etapas e resultados alcançados por meio do projeto de intervenção, pautado não apenas nas leituras, mas na dramatização das ideias. Palavras-chave: poesia, Augusto dos Anjos, dramatização, morte.

INTRODUÇÃO

Como professora de Língua Portuguesa, com anos de prática em sala

de aula do Ensino Médio, sempre soube o quanto é necessária a Literatura ao

desenvolvimento dos alunos, tanto no que tange à aprendizagem, e acima de

tudo, no aprimoramento cultural, criativo, crítico, bem como na possibilidade de

despertar do espírito imaginativo e emocional diante do mundo e da vida.

Contudo, percebi o tabu existente em relação ao gênero “poesia”, pois

quando se faz a proposta de trabalhar com poesias, geralmente ela é

associada a rimas, métricas, versificação; enfim, prioriza-se o conceito da

estrutura e com isso os próprios alunos afirmam não entender nada, inclusive

muitos a veem como amontoados de palavras incompreensíveis, sem sentido.

É comum vários a relacionarem ao “lirismo amoroso”. Dizem, na maioria das

vezes, que poesia “é de amor”, dificilmente a correlacionando às diferentes

manifestações de lirismo poético.

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É rotina nos deparamos com alunos que leem muito pouco, e que

comumente não se interessam pela Literatura, tampouco pela poesia por

considerá-la chata, incompreensível, desinteressante.

Existe por parte de muitos alunos certa dificuldade de compreensão em

relação à real função da poesia – além da estrutura, que é importante,

imprescindível, tem-se o conteúdo, a finalidade da poesia de transmitir

subjetividade, expressividade, imaginação, sensibilidade; mexer com as

emoções; humanizar; seduzir. Para Novalis, escritor e filósofo representante do

Romantismo alemão, “poesia é a arte de excitar a alma” (1987, p. 13). Não

sendo apenas uma “diversão”, a Poesia, na concepção novalisiana é a mais

completa das atividades do espírito, o saber mais profundo e a ação mais

eficaz. O poeta é ainda aquele que descobre o eterno, escondido e oculto nas

realidades passageiras e efêmeras (CAMUS, 1942, p. 32 apud OLIVEIRA,

1996, p. 57).

De fato, a poesia é criada para ser sentida, valorizando os sentimentos,

e são conceitos como estes que pretendemos passar aos alunos, de forma a

desmistificar a noção “errônea” que eles têm sobre o estudo. O próprio Ezra

Pound, em ABC da Literatura, afirma: “Creio que o professor ideal seria o que

examinasse qualquer obra-prima que estivesse apresentando a seus

alunos quase como se nunca a tivesse visto antes” (2006, p. 81).

As Diretrizes Curriculares da Educação Básica de Língua Portuguesa da

Secretaria de Estado da Educação do Paraná (2008) nos orientam a trabalhar

desta forma com os textos poéticos:

No caso da leitura de textos poéticos, o professor deve estimular, nos alunos, a sensibilidade estética fazendo uso, para isso de um instrumento imprescindível e, sem dúvida, eficaz: a leitura expressiva. O modo como o docente proceder a leitura do texto poético poderá tanto despertar o gosto pelo poema como a falta de interesse pelo mesmo. Assim, antes de apresentá-lo para os educandos o professor deve estudar, apreciar, interpretar, enfim, fruir o poema (p. 300).

Diante desse grande desafio de despertar o prazer para o gênero

poesia, buscamos um projeto audacioso, apostando na proposta de um

trabalho mais dinâmico ao escolher a poesia como meio para despertar os

alunos, oportunizando o desenvolvimento do lado criativo, imaginário.

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Pretendíamos que vivenciassem o mundo dos sonhos, “acordando” o artista

escondido dentro de cada um.

É prudente admitir que ao iniciarmos os trabalhos com alunos do 3° A e

do 3° B (Ensino Médio) do Colégio Estadual Vercindes Gerotto dos Reis, em

Paiçandu, foi constatado que a relação aluno-poesia era, de fato, como a

descrita: poucos alunos afirmavam gostar de poesia e a justificativa era

exatamente essa: “Não gosto porque é chato, não entendo”.

Sem muito temer e apostando num resultado positivo, lancei o desafio e

relatarei as etapas desse projeto de intervenção. Primeiramente abordando o

porquê da escolha do poeta Augusto dos Anjos, em especial sua única obra,

Eu, publicada em 1912 com recursos próprios e do irmão Odilon (dois anos

depois, aos trinta, o poeta paraibano morreria ao sofrer de uma grave gripe). É,

pois, exatamente num período de mudanças estéticas, políticas e geográficas

que surge Eu, destacando-se Augusto dos Anjos não somente pela perfeição

formal na composição dos versos decassílabos, mas principalmente pelo

registro de imagens que remetem ao pânico, ao noturno, à morte, ao mistério.

Diante desse quadro, é plausível notar que seu livro provocou um certo

“escândalo”, visto que o público leitor da época, sempre tão seguidor do

modismo europeu, estava habituado à elegância parnasiana. Ou como Wilson

Martins em História da inteligência Brasileira, “na ‘Belle époque’ a literatura

deveria ser o ‘sorriso da sociedade’. Porém Eu era um livro malcriado, de ‘mau

gosto’, de ‘poeta de soldado de polícia’, teria dito Manuel Bandeira” (1981, v.5,

p. 512). Assim que o poeta, polêmico, só encontraria compreensão e aceitação

a partir de 1928, quatorze anos depois da sua morte (REIS, 1982, p.6).

Diante do quadro de um poeta tão controverso e ao mesmo tempo tão

admirado, vale escolhê-lo como autor a ser trabalhado por inúmeros pontos.

Em primeiro lugar, suas poesias chocam pela intensidade dramática com que a

voz lírica trata de sua aflição pessoal. Dentre os temas abordados, escolhemos

a temática da morte, tratada pelo autor como decomposição da matéria,

apresentada nos poemas com os sinônimos “cemitérios”, “vermes”, “caixão”,

“putrefação”. Mas é por tratar de termos incomuns na poesia que acreditamos

que despertariam o interesse dos alunos.

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1. Metodologia

1.1 A opção por Augusto dos Anjos

Escolhemos o poeta Augusto dos Anjos por considerá-lo “diferente” dos

modelos de poetas e poesias que os alunos estão acostumados a estudar; mas

principalmente porque mexe com diversas emoções. De início, numa primeira

leitura, há estranheza, porém com certa compreensão muitos se identificam,

acabam gostando porque sai do que é convencional. É um poeta que choca

pelo vocabulário científico, dono de um lirismo grotesco, ao mesmo tempo em

que explora o subjetivismo, como em “Psicologia de um vencido”, publicado na

obra Eu (1912).

A opção pelo poeta Augusto dos Anjos deve-se ao fato de ser um poeta

único, de estilo próprio, que se destaca pelo lirismo grotesco. Um poeta tido

pela crítica e por historiadores como como Ferreira Gullar (1976), Eudes Barros

(1996) e Anatol Rosenfeld (1996) como extravagante, filosófico, estranho,

chocante, grotesco, pessimista. Eis um poeta de inegável valor, original pela

temática materialista e pelo vocabulário científico típico do final do século XIX.

Em sua época, inovou ao empregar poeticamente, e com frequência, palavras

científicas, manifestando suas ideias materialistas.

As poesias de Augusto dos Anjos chocam pela carga dramática com que

o poeta trata de sua aflição pessoal. Dentre os temas abordados, optamos pela

temática da morte, tratada pelo autor como decomposição da matéria,

apresentada nos poemas com os sinônimos “cemitérios”, “vermes”, “caixão”,

“putrefação”. Mas é por tratar de termos incomuns na poesia que acreditamos

que despertaria o interesse dos alunos.

Percebemos a profundidade de Augusto dos Anjos para exprimir seu

fazer poético. Contudo, ao apreciar os versos desse poeta ímpar na literatura,

devemos convir que para os estudantes, objeto primordial desse trabalho, ele é

classificado como um “estranho”, “esquisito”; poeta “de difícil compreensão”, de

“mau gosto”.

Desse modo, quis buscar na crítica de autores e estudiosos que

escreveram com propriedade sobre a vida do poeta, visivelmente com intuito

de melhor conhecê-lo, para melhor compreendê-lo e aceitá-lo como um escritor

de inegável valor poético, tal como nos comprova Ivan Cavalcanti Proença:

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Curioso, no mínimo, o que se passa com o poeta Augusto dos Anjos. Reconhecidamente, poeta de difícil, muito complexo, vocabulário, a exigir conhecimentos ora puramente de seus escritos, poeta cujos versos acabam resultando, por vezes, herméticos e de sofrida 'tradução', este mesmo poeta acaba se transformando em escritor dos mais conhecidos, muito lido, e ,aqui o mais surpreendente, 'decorado, declamado pelo público leitor'. Do intelectual ao superficialmente interessado em poesia, do professor e estudante, ao pacato funcionário público, da poetisa à dona de casa, encontram-se apaixonados

e conhecedores da obra de Augusto (1973, p.23).

1.2. Sobre a obra Eu

Há inúmeros estudos sobre o livro emblemático de Augusto dos Anjos,

obra que traduz com sensibilidade seu estilo poético. Zenir Campos Reis diz:

O livro Eu, único livro publicado em vida por Augusto dos Anjo. É um conjunto de 58 poemas. São sonetos e poemas mais longos, escritos quase todos em versos rimados e decassílabos - com uma única exceção, a poesia “Barcarola”. Tradicional do ponto de vista técnico, Eu chama a atenção pela temática – a podridão, a decomposição, a morte, o sofrimento, os terrores noturnos e pelo vocabulário científico muito marcado (1982, p.12).

Augusto dos Anjos foi um dos pioneiros a incorporar, conscientemente o

trivial à sua poesia. Em Eu, seu universo, o universo “augusto-cêntrico”,

segundo Proença (1973), é apresentado dentro de uma avassaladora maioria

de versos decassílabos. O autor continua:

[...] de tal modo que poderíamos dizer que toda poesia de Augusto dos Anjos é feita em decassílabos, tão raros e tão pouco numerosos os que não têm dez sílabas. Ora devemos notar que a leitura desses versos nos traz a todo momento a repetição das mesmas ideias.Só o gênio do poeta- dando roupagem a esse pequeno número de ideias- é que faz do livro um dos de maior aceitação entre todos os poetas brasileiros, além de isolá-lo entre os demais de nossa literatura (idem ibidem, p.25).

Além da forma, em relação ao seu conteúdo, Eu se apresenta como um

livro polêmico e inaugural em seu tempo. Eis a gênese da obra:

O livro de estreia do escritor provinciano provocou escândalo [...]. A crítica, embora reconhecendo talento no estreante, fazia-lhe sérias restrições. A faculdade de Medicina incluiu a obra em sua biblioteca, por tratar de assuntos científicos (REIS, 1982, p.6).

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Somando-se a essas informações, Fonseca (2009) observa que foi por

obra e arte de seu melhor amigo, Orris Soares, que no ano de 1920 temos a 2ª

edição da obra, intitulada então: Eu e Outras Poesias. Contudo foi somente a

partir de 1928, na 3ª edição, que o poeta ganhou vasto prestígio e apreço

literário:

Ao falar de Augusto dos Anjos, devemos ressaltar a sua ampla aceitação popular, o que paradoxalmente, muitas vezes o diminui aos olhos da crítica... De minha parte, afirmo que a musicalidade empregada por Augusto em seus poemas, fez com que se tornassem fascinantes aos ouvidos do povo (FONSECA, 2009, p. 75).

Ainda segundo Fonseca (2009), “o vento, a sombra, à noite e os

mistérios que ela traz também fascinam e inspiram. [...] São fronteiras que se

abrem através do inexplicável de labirintos, catacumbas e masmorras. É o

império do buscar, do querer, e mais do que do saber, do experimentar” (id.

ibid.).

Nesse contexto, ao propormos trabalhar com os poemas de Eu,

pensamos em como eles instigam os alunos ao aprendizado e à experiência.

Daí surgiu, de forma natural, o título desse projeto: “E existe lirismo em

Augusto dos Anjos, o poeta do mau gosto?”. Levando-se em conta à

definição do termo: “Lirismo – relativo a lírico: diz-se do gênero poético

subjetivo, emotivo, sentimental. Lirismo: subjetivismo, sentimentalismo.

Expressão de sentimentos individuais” (LUFT, 20ª ed., 2003, p. 426). Muito

embora o que realmente tenha nos motivado a trabalhar com esse

questionamento “lírico” em Augusto dos Anjos seja a aproximação de Hegel

sobre o tema: “O que conduz à lírica [...] satisfaz a necessidade de se

expressar a si e de perceber o ânimo na exteriorização de si mesmo” (HEGEL,

2004, v. 4, p. 157).

Sendo, pois, lirismo a expressão de sentimentos individuais, pode-se

afirmar, sem medo, que existe lirismo nas poesias de Augusto dos Anjos. Eis

versos carregados de sentimentalismo, emoção do poeta que aflora nas

incontáveis estrofes rimadas, de versos decassílabos. Comprovamos este

lirismo nos próprios versos:

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Sou uma Sombra! Venho de outras eras, Do cosmopolitismo das moneras... Pólipo de recônditas reentrâncias, Larva de caos telúrico, procedo Da escuridão do cósmico segredo, Da substância de todas as substâncias!

(“Monólogo de uma sombra”, Eu e Outras Poesias, 1996, p. 9)

De fato, certos poemas como “Psicologia de um vencido” e “Budismo

moderno”, respectivamente, apresentaram-se nítidos para que os alunos

entendessem que Augusto dos Anjos se considerava um “desgraçado”, alguém

de má sorte, de mau agouro:

Eu, filho do carbono e do amoníaco, Monstro de escuridão e rutilância, Sofro, desde a epigênese da infância, A influência má dos signos do zodíaco. Profundissimamente hipocondríaco, Este ambiente me causa repugnância… Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia Que se escapa da boca de um cardíaco.

(“Psicologia de um vencido”, id., p.16).

Tome, Dr., esta tesoura, e… corte Minha singularíssima pessoa. Que importa a mim que a bicharia roa Todo o meu coração, depois da morte?! Ah! Um urubu pousou na minha sorte! Ao contato de bronca destra forte! Dissolva-se, portanto, minha vida Igualmente a uma célula caída Na aberração de um óvulo infecundo

(“Budismo moderno”, id., p.17).

O poeta, cheio de “ânsias”, proporciona imagens para que os alunos

vejam a descrição de um ser desgostoso, negativo diante da vida, emergente

de certo pessimismo, que escolhe a morte como solução para sua “pobre

pessoa”. Nascido já como um “vencido”, tendo toda a má sorte como

companheira, chega a escrever: “Ah! Um urubu pousou na minha sorte!”.

Consideremos ainda que o poema “Budismo Moderno” retrata a dissecação da

alma do próprio poeta (“Tome, Dr., esta tesoura, e... corte/ Minha

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singularíssima pessoa”). Assim, ao retratar a própria “dissecação”, ao “eu” não

restam escolhas senão se entregar ao inevitável destino da morte. Leiamos

essa “sina” no poema “Mágoas”:

Quando nasci, num mês de tantas flores, Todas murcharam, tristes, langorsas, tristes fanaram redolentes rosas, Morreram todas, todas sem olores.

(id., p.153)

Sem dúvidas, a concepção de corpo é muito utilizada por Augusto dos

Anjos, sobretudo quando entendemos que o poeta faz uma análise

macroscópica, característica típica do pensamento naturalista de sua época,

permeado pelo Evolucionismo de Darwin. Mas, o que importa aqui é a clareza

do “sofrimento cósmico” do autor e sua busca pelo mistério, ou, busca por

respostas que permeiam a morte:

Com isso, há uma espécie de incompreensão da transformação que ocorre em cada verso de seus poemas – a passagem do divino para o evolutivo. Portanto [...], o caminho do sublime para o grotesco ocorre na mesma velocidade em que os olhos do leitor passam de um verso para o posterior. Um dos aspectos que caracteriza a sua obra é [...] a utilização de termos grotescos mesclados a um ideal decadentista ou talvez moderno [...] (ALMEIDA, 2007, p. 52).

Se tomarmos o vocábulo como: “o que suscita riso ou escárnio; ridículo”

(LUFT, op. cit, p.360), podemos considerar seu vocabulário poético também

grotesco: “O beijo amigo, é a véspera do escarro / Escarra nesta boca que te

beija” (“Versos Íntimos”, op. cit., p. 85); “Podre Meu Pai! A morte o olhar lhe

vidra / E a mão que enchi de beijos / Roída toda de bichos, como os queijos /

Sobre a mesa de orgíacos festins!” (“A Meu Pai Morte”, id., p. 78); “Quando a

faca rangeu no teu pescoço, / Ao monstro que espremeu teu sangue grosso”

(“A um carneiro morto”, id., p. 43).

De fato, por chocar ao sair do convencional, Augusto dos Anjos acaba

despertando a curiosidade em estudá-lo. Ao transitar entre os extremos – o

lirismo e o grotesco – o poeta entra num conflito permanente. Talvez aí esteja

uma forte característica que aproxime o aluno do poeta, pois “conflito” é a

palavra de ordem da maioria dos jovens, ainda em formação.

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2. Análise-síntese das ações de implementação do projeto de intervenção pedagógica e relatos dos alunos

A implementação do projeto se deu de forma tranquila, primeiramente

porque foi aceito com grande entusiasmo pelas duas turmas escolhidas. De

início, os alunos estranharam a proposta de irem ao “cemitério” declamar

poemas de um autor “esquisito”. De acordo com o relato dos próprios alunos,

muitos acharam que era “loucura” da professora:

Estranho falar em fazer um trabalho sobre morte em um cemitério, entrar num caixão. Foi diferente, uma experiência única (Noála Thalia, 3º B). Pra falar a verdade, no começo eu achei meio estranho, porque eu nunca tinha feito um trabalho assim, de ter que comparecer em um cemitério para recitar uma poesia e ainda de madrugada. Mas depois que eu e meus amigos começamos a recitar e a entrar no clima, eu vi que não era lá aquele bicho de sete cabeças, e foi muito bom, foi um trabalho diferente, gostei

muito (Hericles Henrique Leão Natal, 3° A).

Como este trabalho foi para mim? No começo achei estranho: por que fazer um trabalho no cemitério? Como assim? [...] Mas quando começamos a fazê-lo nos esforçarmos, com dedicação (Letícia Oliveira Gonçalves, 3° A).

Contudo, quando compreenderam a metodologia e sentiram a

empolgação da professora, aderiaram ao projeto com entusiasmo:

Com esse trabalho, ao recitar a poesia de Augusto dos Anjos. “Terra Fúnebre” no cemitério foi uma experiência espetacular, e vi que o cemitério é um lugar calmo, não aquele lugar

assombrado como muitos falam. Valeu muito a pena. (Hericles Henrique Leão Natal, 3° A). Além disso, foi divertido e ao mesmo tempo triste, porque você se põe no lugar do poeta. A poesia nos demonstrou o que uma mãe e pai sente quando perde seu filho, uma realidade muito triste (Letícia Oliveira Gonçalves, 3° A, que

recitou “A Meu Primeiro Filho Morto aos Sete Meses

Incompletos”). Foi interessante, pois recitei a poesia num lugar inusitado, um cemitério. Quando cheguei, fiquei com certo receio, por ser um cemitério... Mas no decorrer do tempo foi normal. Foi uma experiência legal (Douglas Felipe, 3° A).

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O Projeto de intervenção foi aplicado aos alunos do 3º anos A e B, no

período matutino. A proposta: ofertar os poemas de Augusto dos Anjos,

intertextualizando o tema “morte” com poetas que abordam a mesma temática,

a exemplo de Álvares de Azevedo, Junqueira Freire, Fagundes Varela (do

Romantismo); e Manuel Bandeira e Mario de Andrade (do Modernismo).

A primeira ação por parte da professora foi de apresentar o Projeto de

intervenção à equipe de ensino do Colégio, tendo sido aceito com grande

entusiasmo por parte de todos.

Ao iniciar o trabalho com os alunos, apresentamos a imagem da tela “O

Grito”, de Münch, ao som da cantora Enya, propondo aos alunos que olhassem

fixadamente à tela ouvindo. Ao término do som, deveriam escrever a impressão

que lhes causou a junção imagem+música. A maioria dos alunos disseram que

se sentiram “tristes” e “emotivos”.

Logo após, apresentamos a música “Canto para minha morte”, de Raul

Seixas (1984), com o intuito de instigar ainda mais os alunos a pensar no tema

que seria trabalhado. A partir da letra da música, interrogamos sobre o que o

tema tinha a ver com nossas vidas. Todos os alunos compartilharam suas

opinões.

Em seguida, a professora declamou o poema “Psicologia de um

Vencido”, de forma expressiva, com efeito de seduzir o aluno para o trabalho

que seria desenvolvido. Esse foi o primeiro contato que os educandos tiveram

com Augusto dos Anjos. Fez-se a pergunta se já conheciam ou tinham ouvido

falar sobre o poeta. Poucos alunos afirmaram conhecê-lo, ou já tinham ouvido

falar sobre ele. Assim, a partir das indagações, apresentamos oralmente

aspectos biográficos da vida, características de sua obra, além de projetarmos

algumas imagens do poeta no data show.

Apresentações realizadas, chegou o momento de explicar aos alunos

que fariam parte de um projeto sobre as poesias de Augusto dos Anjos,

ressaltando a importância de estudar o poeta, sempre destacando os pontos

das etapas do trabalho. Interessante constatar a expressão de “espanto” de

muitos alunos quando souberam que a encenação dos poemas seria no

cemitério. Para esclarecer, nosso Colégio faz fundos com o cemitério

municipal, fato que facilitou o trânsito. Num primeiro momento houve recusa e

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espanto: vários alunos disseram que não iriam ao cemitério pois “não

gostavam”, tinham “medo”.

Contudo, explicamos como seriam desenvolvidas cada etapa do

projeto: a escolha do poema; a elaboração do painel (fixado no pátio do

colégio); a declamação na rádio comunitária, na hora do intervalo; bem como a

declamação do poema e eventual encenação no cemitério; além da montagem

de um vídeo, apresentação de uma coreografia; pintura de uma tela; e a

produção e participação no sarau. Por fim, os alunos aceitaram as propostas,

sobretudo porque era algo novo, jamais realizado antes:

Realizar este trabalho foi uma experiência incrível. Foram momentos de descontração, emoção e de entusiasmo em ver no que iria dar no final. Como tudo que é novo nos causa estranheza. No início havia uma descrença no trabalho, mas ao decorrer do processo minha opinião foi mudando. Após o término do trabalho, abriram-se as portas: recitar a poesia em lugares diferentes foi o máximo. Depois [...] pareceu-me que se não ao tivessem recitado a poesia no cemitério, não teria emoção [...] (Mauricio Junior Machado, 3° A). Foi uma experiência completamente diferente, a gente estava com muita falta de interesse no começo, mas depois começamos a nos interessar e nos dedicamos mais ao trabalho. Esta experiência foi algo que vai ficar sempre marcado na minha memória, Aprendi a ver a morte com outros olhos e a não ter medo dela (Pedro Cardinali, 3º A). Foi uma atividade diferente das atividades já feitas em sala de aula. Criatividade foi a característica predominante desse trabalho. Não só a criatividade, mas o desempenho dos alunos foi surpreendente [...]. O cenário para algumas pessoas é estranho; o cemitério, para mim, é repleto de paz, calma. Ali dei o melhor da minha encenação, porque são poesias que fazem nossa alma entrar no clima. Eu aprendi que todos temos um lado de Augusto dos Anjos. Essa experiência vou levar para o resto da minha vida, pois poesia nos move (Yonaisa Karina da Silva, 3° B).

Para se ter mais ordem e agilizar o nosso trabalho, elaboramos uma

apostila com atividades, as quais foram resolvidas em sala de aula. Após essa

fase, daí sim começamos propriamente o trabalho: os alunos, de cada turma,

separaram-se em equipes de 4 a 5 alunos. Levamos para a sala de aula 16

poemas. Cada equipe escolheu uma poesia para a realização do trabalho.

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Essa ação foi bastante tranquila, pois cada equipe se identificou com

determinado poema, sem haver divergência entre uma ou outra turma.

Porém, não bastava escolher. A orientação era para que os alunos

lessem com cuidado, atenção e verdade os poemas, para que entendessem e

escrevessem suas impressões. Essa foi, necessariamente, uma atividade

individual. Como era de se esperer, principlamente devido aos vocábulos

estranhos, muitos não entenderam os poemas. A professora teve de intervir,

explicando-a para que não houvesse contradições ou dúvidas.

Como atividade extra-classe, cada equipe elaborou um painel com o

poema escolhido, que ficou fixado no pátio do colégio. Obviamente, essa

atitude “simples” chamou a atenção de vários alunos de outras turmas, que

vieram até nós perguntar sobre o poeta.

Além disso, como já observado, o Colégio Estadual Vercindes Gerotto

dos Reis possui uma rádio comunitária. Decidimos que dois membros de cada

equipe declamariam poemas na rádio na hora do intervalo. Muito interessante

notar que os alunos souberam entoar bem a voz, embora alguns deles se

sentissem envergonhados. Todos foram foram eleogiados por vários

professores e colegas de outras turmas.

Enquanto as turmas preparavam a encenação de seu poema,

paralelanebte estudavam poesias de outros poetas, contextualizando-os, a

exemplo de “Quando eu morrer”, de Castro Alves; “Lembrança de Morrer”, de

Álvares de Azevedo; “ Morte, hora do delírio”, de Junqueira Freire; “Cântico no

Calvário”, de Fagundes Farela; ”Consoada”, de Manuel Bandeira; e “Quando

eu morrer”, de Mario de Andrade”. Os grupos não só leram, como analisaram e

reponderam questões interpretativas.

Na sequência, levamos para a sala de aula alguns relatos do livro Por

um Fio (2004), de Dráuzio Varela, em que o médico atua como escritor

sensível, narrando as histórias reais e o impacto da perspetiva da morte no

comportamento de pacientes doentes e seus familiares. Comentamos

comentando sobre a elaboração do livro, cada aluno pegou um relato e realizou

a leitura durante a aula. Demos prosseguimento à atividade com cada aluno

apresentando para os colegas o resumo do relato lido. Essa etapa mexeu

muito com os alunos, pois se tratavam de experiências vividas por vítimas de

câncer, que vieram a falecer. Esse foi o momento de refletirmos sobre a morte

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e o sentido da vida. Muitos alunos relataram a emoção que lhes causou o

relato lido e afirmaram que isso fez com que pensassem mais na própria

existência.

Outra proposta apresentada e concluída foi assistirmos ao filme “As

Invasões Bárabaras” (2003), que também retrata a temátioca da morte: um

professor egocêntrico se depara com um câncer em estado terminal.

Relacionamos o filme com o relatos do livro. Os alunos não demonstraram

dificuldades em executar essa atividade.

Chegado o dia da encenação no cemitério municipal, a turma toda veio

vestida a caráter: todos de preto. Na produção foram usados caixão e velas.

Músicas fúnebres davam o tom de melancolia ao local. De fato, cenário

perfeito para a declamação dos poemas (VIDE IMAGENS EM ANEXO).

Mandamos uma mensagem para a RPC/TV (regional Maringá) comunicando

sobre o trabalho e houve interesse. A equipe de reportagem acompanhou

nossa atividade, fato que despertou ainda mais motivação da turma.

Vale esclarecer que todas as atividades desenvolvidas foram

apresentadas num sarau, ao público, com os alunos e a professora

caracterizados, bem como o espaço da apresentação (VIDE IMAGENS EM

ANEXO). Neste espaço decorado foram expostas poemas em painéis, bem

como telas, painel de fotos, além da mostragem dos vídeos produzidos no

cemitério, apresentação de danças coreografadas previamente e a declamação

de um poema de Augusto dos Anjos realizada por toda a turma.

Como é plausível observar, a interdisciplinaridade foi o motor que

conduziu os trabalhos. Desde a Lei de Diretrizes e Bases n. 5.692/71 (MEC,

1997) incentiva-se a interação como uma maneira complementar que

possibilita o saber crítico-reflexivo, saber esse que deve ser valorizado cada

vez no processo de ensino-aprendizado.

Devemos dizer que essa noite foi emocionante: o local escolhido estava

repleto de convidados, a decoração ficou muito bem-feita, mas quem brllhou

foram os alunos. Todos estavam visivelmente emocionados, empenhando-se

nas apresentações. Segundo os relatos, foi a primeira vez que participaram de

um trabalho dessa intensidade, por isso o engajamento:

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Para mim, fazer esse trabalho foi uma experiência diferente. No começo parecia uma coisa “doida” da professora, mas depois, ao encenar a poesia, foi bem legal. O grupo todo se empenhou para fazer este trabalho e apesar de ser uma experiência nova, o fim foi muito bom. Aprendi também que a única certeza da vida é a morte. As cenas gravadas no cemitério foram incríveis, assustadoras. Apesar de em alguns momentos sentir medo, faria tudo novamente (Patrícia Regolin, 3°A).

Nunca tinha ouvido falar em um trabalho tão diferente e sinceramente me assustei quando a professora o solicitou. Mas desde o primeiro momento nosso grupo estava super animado e decidido a se empenhar ao máximo. E foi o que fizemos: a cada etapa fomos nos surpreendendo com nossa capacidade, e agora, ao final de tudo, ao vermos nosso trabalho pronto, o que predomina é o sentimento de orgulho e uma alegria imensa de termos conseguido. Alem disso, não podemos nos esquecer das experiências que o trabalho proporcionou, Aprender a trabalhar em grupo, respeitar as ideias de cada um, e principalmente, aprender a respeitar esse mundo desconhecido e tão temido que é o mundo da morte. Percebemos que talvez não seja tão assustador quanto parece, e sim interessante (Thamires Moreira, 3° A). O trabalho com a poesia de Augusto dos Anjos foi uma grande experiência, um modo bem diferente de aprendizado, e com certeza vou me lembrar por toda a minha vida. Com esse trabalho pude aprimorar meu modo de declamação e aprender sobre Augusto dos Anjos. Foi sensacional. E também com a encenação no cemitério consegui entender claramente o que o autor queria passar em seus poemas, mostrando a realidade da morte (Thais Ramos, 3° B).

Trabalhar com os poemas foi uma experiência incrível, pois aprendi muito sobre o autor, como viveu, o que passou, o que sentia. Este trabalho foi uma grande experiência: entrar no caixão foi uma sensação incrível, inexplicável! (Ana Carolina Leite, 3° B, que declamou “Solitário” dentro de um caixão). Esse projeto, além de muito produtivo, foi muito divertido, sem contar que as encenações ficaram nível “profissional”. Com esse trabalho, eu aprendi a trabalhar melhor em equipe e a confiar mais em mim mesmo; e claro, aprendi sobre o poeta e suas poesias (Loan Fuzari, 3º B).

Todas as etapas planejadas foram cumpridas a contento, principalmente

porque os alunos realizaram cada fase de forma agradável, dinâmica,

respondendo às expectativas previstas. As atividades, por seu caráter

interdisplinar e participativo, ofereceram uma nova postura diante do

conhecimento, garantindo a construção do saber global, rompendo com os

limites da “disciplina”.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sem dúvida alguma a proposta de intervenção pedagógica foi trabalhosa,

contudo, podemos afirmar, sem medo de errar, que a escolha foi certeira. A

finalidade da poesia em transmitir subjetividade, expressividade, imaginação,

sensibilidade; mexer com as emoções; humanizar; seduzir foi de fato testada e

comprovada, com resultados positivos.

Quando se trabalha com o gênero poesia de forma prazerosa há o

despertar do interesse do educando, que se deixa seduzir por inteiro, como

comprova o depoimento de uma aluna:

Desde o momento em que me foi apresentado o trabalho, senti receio da professora “nova”, e devo admitir que a julguei como “doida” e até mesmo “maluca”. Mas quando comecei a entender o que ela realmente queria nos passar, minhas definições sobre ela passaram para “brilhante” e “excelente”. Realizar a encenação no cemitério foi algo que jamais esquecerei; a sensação foi que Augusto dos Anjos estava realmente ali, presente com toda sua dor, com toda sua genialidade. Meus sinceros agradecimentos à professora Nil, por nos dar a oportunidade de uma experiência tão única. Conhecer o poeta além da teoria, mas interpretar o que ele escrevia na prática, foi incrível (Jéssica Bocon, 3°A).

Afirmo e comprovo com depoimentos dos próprios alunos que

participaram do trabalho que a poesia de Augusto dos Anjos mexeu com a

imaginação, sensibilizou, humanizou, seduziu a todos os alunos das turmas do

3º A e 3º B do Colégio Estadual Vercindes Gerotto dos Reis, como percebemos

nos depoimentos:

Foi algo muito diferente para mim, pois foi uma experiência única, vou levar para a minha vida toda. Augusto dos Anjos, o poeta que relatava sobre a morte. Ir ao cemitério gravar e vivenciar um pouco da história desse poeta foi algo inexplicável, pois a vida dele foi muito triste. No começo achei uma loucura ir ao cemitério para gravar, mas depois achei interessante, pois vivenciei um pouco da vida dele [,,,]. Também aprendi a declamar, a encenar e esta experiência foi ótima. Irei levá-la para sempre (Amanda 3°A). Foi bom porque aprendi a gostar de poesia, aprendi a declamar e encenar poesia (Daniel Vieira, 3º B).

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Este trabalho foi uma bela experiência para minha vida. Aprendi muitas coisas que não sabia sobre Augusto dos Anjos e sobre a encenação. Fazer este trabalho, na minha opinião, foi ótimo porque há muito tempo não expressava sentimentos fortes como na encenação. Essa experiência vou levar pra vida toda (Marcelo Ferrar, 3º A). Este trabalho foi algo inusitado, pois nunca tínhamos feito uma apresentação de tamanha responsabilidade e beleza (Nayra Andressa Paulino, 3º A). Como todas as experiências que vivemos em nossa vida, a experiência de ir ao cemitério e encenar um poema de Augusto dos Anjos foi inesquecível, pois é algo incomum de se fazer... (Júlio César Marcuz, 3º B). O trabalho sobre Augusto dos Anjos, realizado no cemitério, foi muito divertido e gratificante. Suas poesias emocionam a todos (João Paulo Dias, 3º B). Para mim, realizar este trabalho foi uma experiência incrível e muito legal. Tanto eu quanto o grupo nos divertimos muito. Passamos medo, mas foi bom. Com esta experiência aprendi um pouco sobre o poeta Augusto dos Anjos [...] e aprendi também a fazer algumas edições em vídeo (Cézar Augusto Catarin Alves, 3º A). Fazer esse trabalho, para mim, foi uma coisa incrível, porque além de eu gostar muito de poesias, eu consegui meditar em cada palavra e trazê-las para o meu dia-a-dia, além de me colocar no lugar do poeta, tentando imaginar o que Augusto dos Anjos pensava (Fernando Murilo Couto, 3º A). Foi uma experiência única, em que eu pude vivenciar a pessoa do poeta Augusto dos Anjos. A ida ao cemitério foi um tanto quanto tranquila; de fato foi algo inspirador. Todos se empenharam bastante para que pudéssemos realizar o trabalho. Sinto que a proposta era nos fazer sentir na pele e na alma como o poeta se sentia e de certa forma acredito que você [professora] atingiu seu objetivo. De modo geral, posso concluir que foi uma experiência incrível e instigante [...] (Ailson F.S. Lima, 3° B).

Encerro esse projeto com o sentimento de dever cumprido, pois atingi o

objetivo com uma proposta de trabalho que de início foi desafiadora, mas

que valeu pelo empenho e dedicação de todos os envolvidos. Acredito que

os relatos dos alunos sejam a prova cabal do sucesso do projeto, afinal é

para eles que nos esforçamos, é pensando no aprendizado e amor pela

Literatura que todos os dias planejamos nossas aulas.

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Referências Bibliografia ALMEIDA, Rogério Caetano de. O corpo grotesco como elemento de construção nas obras de Augusto dos Anjos, Mário de Sá Carneiro e Ramón Lopes Velarde. São Paulo: Mestrado/USP, 2007. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8156/tde-02102007-152309/pt-br.php, acessado em 17 out. 2014. ANJOS, Augusto dos. Obra Completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. BARROS, Eudes. A poesia de Augusto dos Anjos: uma análise de psicologia e estilo. Rio de Janeiro: Ouvidor, 1974. FACIN, Débora. Análise enunciativa de Canto para minha morte, de Raul Seixas. Ling. (dis)curso vol.12 no.2 Tubarão maio/ago. 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1518-76322012000200009&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt, acessado em 20 nov. 2013. FERNANDES, Flávio Sátiro. Augusto dos Anjos e a Escola do Recife. Jornal de Poesia, online, http://www.secrel.com.br/jpoesia/augusto18.html, consultado em 24 ago. 2013. GULLAR, Ferreira. "Augusto dos Anjos ou vida e morte nordestina". In: ANJOS, Augusto dos. Toda a poesia; com um estudo crítico de Ferreira Gullar. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. HEGEL, G. W. F. Cursos de estética. Tradução de Marco Aurélio Werle e Oliver Tolle. São Paulo: Edusp, 2004. v. 4. MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais: introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 1997. NÓBREGA, Humberto. Augusto dos Anjos e sua época. João Pessoa: Edição da Universidade da Paraíba, 1962. NOVALIS. Hinos à noite. Trad., seleção, introdução e notas de N. N. Okamnoto e P. Al!egrini. Ed. bilíngüe. Mairiporã: Esfinge, 1987. OLIVEIRA, Maria Elisa de. A figura do poeta em Friedrich von Hardenberg (Novalis) e Gaston Bachelard: algumas considerações. Trans/Form/Ação vol.19 Marília Dec. 1996. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0101-31731996000100003, acessado em 7 out. 2014. POUND, Ezra. ABC da Literatura. 11ª ed. Apresentação de Augusto de Campos. Tradução de Augusto de Campos e José Paulo Paes. Ed. Cultrix, São Paulo, 2006.

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PROENÇA, Manuel Cavalcanti de. Augusto dos Anjos e outros ensaios. Rio de Janeiro/Brasília: Grifo/INL, 1973. REIS, Zenir Campos. Augusto dos Anjos. São Paulo: Abril Educação, 1982. ROSENFELD, Anatol. A costela de prata de Augusto dos Anjos, em Texto e Contexto. São Paulo: Perspectiva, 1973. VARELA, Dráusio. Por um Fio. São Paulo: Cia das Letras, 2004. VILARINHO, Sabrina. Augusto dos Anjos. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-31731996000100004&script=sci_arttext, acessado em 24 nov. 2013. Videografia ARCAND, Denys. As invasões bárbaras (Les invasions barbares). Filme franco-canadense, 2003. Audiografia

SEIXAS, Raul. Canto pra minha morte. Emi-Odeon, 1984.

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ANEXOS

ICONOGRAFIA

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Fig. 1 e 2 – Apresentação dos poemas em Paiçandu-

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Fig. 3 e 4 – Engajamento dos alunos na apresentação

Fig. 5 – Representação do bem x mal nos poemas de Augusto dos Anjos

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Fig.6 e 7 – Pinturas dos alunos que decoraram o evento

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Fig. 8, 9 e 11 – Declamação no cemitério (com cobertura da rede RPC)

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Aluno representando o poeta Augusto dos Anjos