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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
ADÉLIA MARIA WOELLNER: poesia, jogo e linguagem
Autora: Ione Aparecida Peruzzo1
Orientador: Antonio Donizeti da Cruz2
Resumo: O presente artigo apresenta os resultados de uma pesquisa que teve como propósito repensar o trabalho de leitura do gênero poético através da poesia de Adélia Maria Woellner, aprimorando o olhar para o jogo da linguagem. A poesia é uma das formas de despertar a imaginação, levando os leitores a sonhar, o que hoje está tão afastado da sociedade capitalista, na qual a ciência imperou um valor imensurável. O estudo apresenta a poeta paranaense, a finalidade do texto poético, o ludismo como elemento instigador do poder imaginativo, a escrita como forma de revelar sentimentos e o jogo das palavras bem planejadas. A poesia auxilia tanto na aprendizagem como na imaginação e fruição da boa leitura, além de instigar o gosto por tratar-se de um texto pequeno, com linguagem simples e provocar no leitor uma reflexão. Enfatiza-se o trabalho com o gênero tendo em vista que as atividades instigaram os alunos a produzirem seus próprios poemas.
Palavras chave: Poesia. Leitura. Jogo da linguagem. Produção.
Introdução
Hoje é indispensável estudos sobre a leitura dentro e fora dos espaços
escolares. Temos consciência que muitas discussões sobre como e o que ensinar
tem se tornado realidade na área educacional. Na intenção de formar um cidadão
que usufrua de seus direitos e deveres as Diretrizes Educacionais do Estado do
Paraná (DCEs), assumem a concepção de língua como discurso que se efetiva nas
diferentes práticas sociais (DCEs, 2008), em texto “propõe-se que o currículo da
Educação Básica ofereça, ao estudante, a formação necessária para o
1Professora do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE 2013/2014, IES vinculada a Universidade Estadual do Oeste do Paraná, com atuação no Colégio Estadual Dr. Paranhos, NRE de Dois Vizinhos. Especialização em Ensino Aprendizagem da Língua Portuguesa. Graduação em Letras Português-Inglês pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras - Palmas, Paraná. 2Orientador e Professor Associado da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Doutorado em Letras pela UFRGS e pós-doutor pela PUC-RIO. Ministra aulas de literatura universal na graduação e Lírica e sociedade no Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Letras, da Unioeste, campus de Cascavel.
enfrentamento com vista à transformação da realidade social, econômica e política
de seu tempo” (PARANÁ, 2008, p. 20).
Para que esta efetivação aconteça aliou-se leitura, jogo e linguagem enquanto
interação entre sujeitos e construção de sentido na poesia de Adélia Maria Woellner.
A leitura e a produção de poemas são processos dos quais lança-se mão na escola
com o objetivo de despertar o gosto, provocar a imaginação e formar sujeitos
perceptivos, tão esquecida nesta sociedade cientificista, em que a ciência possui
mais valor que a criação. Paixão (1982) assevera que a poesia toca mais profundo,
pelo fato de as palavras adquirem uma força incomum, coisas banais adquirem
valores antes mesmo nem considerados pelo pensamento.
Trazer para a sala de aula um estudo voltado à literatura poética, mais
precisamente à paranaense, como forma de aproximar os alunos da produção e
aguçar neles o desejo de conhecer, além dos poemas estudados, outros escritos
pela poeta Adélia Maria Woellner juntamente com mais alguns nomes reconhecidos
na literatura brasileira.
Em acordo com as Diretrizes Curriculares da Educação Básica “É tarefa da
escola possibilitar que os alunos participem de diferentes práticas sociais que
utilizem a leitura, a escrita e a oralidade, com a finalidade de inseri-los nas diversas
esferas de interação” (2008, p. 48).
A base norteadora das diretrizes é a concepção bakhtiniana que estuda a
língua como fenômeno social, que nasce da necessidade de interação (política,
social, econômica) entre os homens. Segundo Bakhtin; Volochinov:
Ensinar a língua materna, a partir desta concepção, requer que se considerem os aspectos sociais e históricos em que o sujeito está inserido, bem como o contexto de produção do enunciado, uma vez que os seus significados são sociais e historicamente constituídos (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 1999, In: PARANÁ, 2008, p. 49).
É evidente que nós professores buscamos suportes para implementar a
proposta. O problema parece estar no planejamento que fica centrado no livro
didático e este contemplando poucos gêneros não dá conta de formar um indivíduo
de caráter crítico e participativo frente aos desafios propostos pelo sistema
capitalista que vivemos. Segundo Buzen (2006), a escola deve legitimar o trabalho
com os diversos gêneros textuais, pois o mesmo colabora para a não fragmentação
entre a língua e a vida do aluno. (in: PARANÁ, 2008, p. 53). Confirmando outra vez
nas palavras de Bakhtin (1992), o domínio dos gêneros, oferece o livre emprego e a
descoberta da própria individualidade no texto (in: PARANÁ, 2008, p. 49).
A prática da leitura para instigar o interesse há muito vem sendo discutida no
CEPA (Colégio Estadual Dr. Paranhos - Ensino Fundamental e Médio do Município
de São Jorge d’ Oeste - PR), nesse sentido, é preciso busca uma leitura que
propicie um crescimento intelectual, que possa formar o cidadão ativo e crítico.
A democratização oportunizou as diferentes classes sociais o ingresso à
escola, e nela nenhum meio de discriminação deve ser aceito. Para tanto a Língua
Portuguesa tem por objetivo ensinar a ler e a escrever com a proficiência necessária
e de direito àqueles que nasceram no universo da Língua Portuguesa, falada no
Brasil e necessitam dela como um instrumento legítimo de luta e posicionamento,
para que de posse desse instrumento, possam assumir uma postura de cidadãos
ativos na sociedade brasileira (PARANÁ, 2008, p. 39).
O ato de interpretar uma poesia não pode ficar restrito a sua forma de
apresentação sobre a página, ou seja, como ocorre à disposição das palavras, dos
versos, das rimas, e das estrofes; nem somente nas atividades propostas pelo livro
didático.
1 Adélia Maria Woellner
A figura feminina vem há anos, aos poucos, conquistado seu espaço.
Woellner (2007), salienta que, já no século XlX, Victor Hugo, escritor francês,
poeticamente estabelece um diferencial caracterizador do homem e da mulher. Ao
homem é legado o poder da decisão, da autoridade, a capacidade de pensar; a
mulher é considerada frágil, delicada, uma imagem divinal, algo como o sonho.
Porém, segundo Woellner, todavia poucos assimilaram esta definição e a mulher
durante muitos anos serviu-se de trabalhos domésticos, sendo impedida de atuar na
sociedade, portando papeis de administração da casa, ou outra profissão que não
lhe desse título valorativo.
Hoje na sociedade capitalista que vivemos é mais do que necessário mostrar
que muitas mulheres mesmo sendo delas negado direitos, conquistaram seu espaço
na história do Estado do Paraná.
A poeta e escritora Adélia Maria Woellner, poeta reconhecida até no exterior,
nos seus escritos é capaz de provocar no leitor uma reflexão, além de comtemplar o
ser humano de forma realista.
Adélia Maria Woellner nasceu no dia 20 de Junho de 1940, em Curitiba, PR.
Formou-se em Direito pela Universidade Federal do Paraná, em 1972, recebendo
4 medalhas, inclusive de ouro por ter obtido o primeiro lugar no curso jurídico
noturno. Professora de Direito Penal de 1973 – 1985, na Pontifícia Universidade
Católica do Paraná. Adélia Maria Woellner participa de inúmeras Academias de
Letras, Centros Culturais Nacionais e Associações, além de vários outras
entidades lítero-culturais dentro e fora do país. Seu nome já foi incluído em obras
de diversos autores, inclusive em Dicionário Biobibliográfico de Mulheres Ilustres,
Notáveis e Intelectuais do Brasil em 1969. Além de ter a obra “Poesia Trilógica”
analisada em cadeia nacional de rádio, participou da elaboração dos livros Uma
Viagem de Cem Anos e Pelos Trilhos da Memória ambos editados em 1985, pela
Superintendência Regional Curitiba da RFFSA, da qual entre muitos prêmios e
homenagens, recebeu a comenda “Medalha do Mérito Ferroviário” em 1990, no
Rio de Janeiro.
Alguns dos livros publicados por Adélia Maria Woellner: Encontro Maior
(1982), Poesia Trialógica (1972), Avesso Meu (1990), Infinito em Mim (1998),
Luzes no Espelho: memórias do corpo e da emoção (2004), Sons do Silêncio
(2004).
A obra Luzes no Espelho: memórias do corpo e da emoção (2004), apresenta
a descrição da vida, a dificuldade na infância, a dureza com que a vida vai exigindo
do ser humano. Na obra Adélia é capaz de deixar transparecer a fortaleza do eu
poético, na pessoa que sonha, imagina e vive cada momento como se fosse o único.
Esses momentos são definidos como um jogo que precisamos jogar.
Os poemas de Woellner traduzem com fidelidade a busca interior do ser,
busca pela identidade, pela história, pela vida e também a relação com o universo.
Trabalhar o início de nós enquanto sujeitos ativos para entender a sociedade a qual
pertencemos e transformá-la à medida que oferece melhores condições aos seres
humanos. Tanto é tarefa do cidadão quanto da escola, auxiliar seu público nos
esclarecimentos. Constituindo uma prática educativa envolvente é possível formar
alunos leitores aptos a interpretar e compreender o texto poético, além de suscitar o
interesse pela pesquisa e produção literária.
2 A Poesia, o Lúdico e a Leitura
A poesia é conhecimento, salvação poder abandono. Operação capaz de mudar o mundo, a atitude poética é revolucionária por natureza, exercício espiritual é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo e cria outro (PAZ, 2012, p. 21).
Helena Kolody ao definir a poesia tece a seguinte afirmação:
A poesia, para mim, é como um jogo. Mas um jogo difícil, ainda que tenha elementos lúdicos de prazer. É como um jogo que você não consegue armar, não consegue vencer. Às vezes não era aquela a palavra que você queria. Então, você muda, tira um verso, corta. O meu normal é cortar muito. Poesia é um jogo no qual a gente perde sempre (KOLODY, 1985, In: CRUZ, 2012, p. 67).
Mediante as afirmações de Kolody, percebe-se a ação transformadora de que
o gênero é capaz. Além de construir um presente diferente, dá nova forma ao futuro.
Octavio Paz (2012), considera que a construção poética é parecida com o
exorcismo, e o poema age como um mago. Ao mago é relegado o conhecimento, e
ao exorcismo o poder de afastar os espíritos maus. Paz deixa explícito que existe
um poder de transformação que vem da poesia, e também assim como o mago dá
de si para ensinar, a poesia é escrita por quem ama, e revela uma necessidade
intelectual e vital, apresenta para a sociedade a sua função.
Muitos estudiosos ao longo da história já tentaram definir poema e poesia.
Porém nenhuma afirmação apresentou-se com rigor necessário quanto à estética
filosófica e científica.
Segundo Paz, “O poema não é uma forma literária, mas um ponto de
encontro entre a poesia e o homem. Poema é um organismo verbal, que contém,
suscita ou emite poesia” (2012, p.22).
Segundo a Sequência Didática: Uma proposta para o ensino da Língua
Portuguesa nas séries iniciais, define-se:
Poema é a arte de escrever em verso. Trata-se de uma estrutura textual formada por versos, estrofes e rimas (quando há), geralmente de pequena extensão. A poesia é o próprio entusiasmo do seu criador (autor/poeta) que, inspirado pelos seus sentimentos, revela, no texto (poema), o belo, a fantasia, o sonho. Portanto, a poesia é o que há de elevado ou comovente nas pessoas ou nas coisas. Transmite encanto, graça e atração. Ela está sempre presente no poeta e pode estar presente no leitor (2007, p.90).
Os termos estão tão ligados que é difícil definir isoladamente. Tanto a poesia
faz parte do poema, quanto o poema da poesia. A poesia existe e torna-se concreta
a partir da ação do ser humano, quando capta algo ou escreve, a escrita produz
sentimento no outro. O poema é o resultado da escrita, produto apresentável aos
leitores.
No poema os termos voam, tomam liberdade, transcendem a matéria.
Tomemos então o poeta não como alguém que se serve de palavras, mas aquele
que consegue mostrar o valor das palavras. Paixão (1982), assevera que poeta é
aquele que assume a condição social de produtor de imagens, de poemas, de
indivíduos que funciona coletivamente como aquele que constrói paisagens
pessoais, intimidades, sejam elas utópicas ou não.
A poesia tem a força de exercitar nossa imaginação e fazer com que
reconheçamos as diferenças e analogias (semelhanças) presentes nos textos
poéticos e nas figuras e imagens da linguagem.
Paz(2012) salienta que o poema nasce das coisas que podem ser possíveis
no mundo. Ocorre que a cada leitura o sujeito tenha um posicionamento diferente,
uma experiência de abandono ou de reencontro, seriedade ou imaginação,
reconhecimento dos sentimentos, uma forma diferente de ver, de sentir; e não é
estranho que o mesmo texto possa causar no leitor uma visão diferente, ou
descobrir o que parecia já estar dentro dele.
A leitura é um processo formador, desde que o indivíduo tenha-a como uma
forma de buscar aperfeiçoar seus conhecimentos, partindo dos quais já possui. Para
Soares (2005) a leitura não acontece de forma isolada, é um envolvimento verbal de
indivíduos socialmente determinados. O ato de ler exige do leitor uma
contextualização. Esse processo é definido por Bakhtin de enunciação, um processo
que ocorre dentro de um enunciado e vinculado às estruturas sociais
Qualquer enunciação, por mais significativa e completa que seja, constitui apenas uma fração de uma corrente de comunicação, verbal ininterrupta [...] Mas essa comunicação verbal ininterrupta constitui, por sua vez apenas um momento na evolução contínua, em todas as direções, de um grupo social determinado (BAKHTIN,1979 apud SOARES, 2005, p. 18-19).
A interpretação do texto faz-se a partir de uma série de detalhes, assim como
aponta Antunes 0(2007), a interação ocorre a partir da definição do gênero, da
função, da informatividade presente no texto, das remissões intertextuais, da
coerência e coesão.
O texto precisa ser analisado no seu gênero, na sua função, nas suas estratégias de composição, na sua distribuição de informações no seu grau de informatividade, nas suas remissões intertextuais, nos seus recursos de coesão, no estabelecimento de sua coerência (ANTUNES, 2007, p.138).
É necessário muita atenção na seleção dos textos literários, uma escolha
seletiva é capaz de provocar o desejo, fascinar e impulsionar o ato criador do leitor.
Segundo Brodsky,
O caminho para desenvolver bom gosto em literatura é ler poesia. [...] A questão é que, sendo a poesia a suprema forma de locução humana, a poesia não é apenas a mais concisa, a mais condensada forma de transmitir a experiência humana; ela também oferece os mais altos padrões possíveis para qualquer operação linguística- especialmente escrita (BRODSKY, 1995apud TEZZA, 2003, p. 67).
3 A linguagem poética
A primeira atitude do homem diante da linguagem foi de confiança e
perseverança, daí a necessidade de não perdê-la, e para isso constituiu a gramática
como forma fixa. Mas a definição não era única a cada palavra e até hoje não cessa
a batalha entre a ciência e a linguagem. Segundo Paz, “O homem é inseparável das
palavras. Sem elas é inatingível. O homem é um ser de palavras” (2012, p. 38).
Os especialistas concordam com a polissemia e a natureza primariamente
mítica de todas as palavras e formas de linguagens. Clarice Braatz Schmidt
Neukirchen considera que “É indiscutível que, para além do mundo concreto, existe
um abstrato, povoado de imagens e símbolos preexistentes à vida humana”
(NEUKIRCHEN, 2011, p. 87). Essa abstração é o que promove a polissemia através
do poder imaginativo inato em cada ser humano.
Por muito tempo, a ciência não se preocupou com a imaginação, porém, nos
séculos XlX e XX, filósofos retomam os estudos e defendem a ideia de que, ao
nascer o sujeito entra em contato com muitas coisas que existiam antes mesmo dele
nascer. O que já existia, passa fazer parte deste novo ser.
O conhecimento na sociedade é passado de geração em geração e junto com
o ensinamento são repassados imagens e símbolos. Para explicar o surgimento de
determinadas coisas recorrem ao mito, aplicando-o na linguagem, assim como, as
metáforas criadas a partir da realidade, que segundo a ciência, essa linguagem “é
poesia em estado natural”.
Segundo Paz, ao exemplificar metáfora, afirma que quando o poeta toma a
palavra pão no sentido de sol, transforma o astro efetivamente em alimento. Esse
jogo da linguagem exige tempo, analise e treinamento para interagir com a língua. O
treino de partir para fora de si, imaginar, fantasiar, deve ser contínuo, quando
criança, adolescente e torna-se prática quando adulto. Para Paz (2012) só consegue
criar aquele que, sentado olhando para aponta do próprio nariz de forma impassível,
é tão dono de si que se esquece de si, consegue transcender e criar.
Ao falar sobre o jogo, Paz tece a seguinte afirmação: “A linguagem poética
tem início como violência sobre a linguagem, o poeta arranca de suas conecções e
misteres habituais: separados do vocabulário habitual, ele torna-se único como se
tivesse acabado de nascer” (2012, p. 46).
Em razão desta forma de expor os termos, o trabalho exige uma leitura para
além da leitura do verso, da rima, da estrofe. Irandé Antunes afirma que “A leitura é
parte da interação verbal escrita, enquanto implica a participação cooperativado
leitor na interpretação e na reconstrução do sentido e das intenções pretendidas
pelo autor do texto.” (ANTUNES, 2003, p. 66. Grifos da autora).
A prática da leitura e a aquisição de novo vocabulário, tende a elevar tanto a
compreensão como a posterior produção. Garcia (1977) lembra que,
Dispondo de palavras suficientes e adequadas a expressão do pensamento de maneira clara, fiel e precisa, estamos em melhor condição de analisar conceitos, de refletir, de escolher, de julgar, do que o outro cujo acervo léxico seja insuficiente ou medíocre para a tarefa vital da comunicação (GARCIA, 1977, in: ANTUNES, 2007, p.44).
A ampliação lexical possibilita a compreensão da linguagem figurada,
presente na poesia. Recuperar a poesia e trazê-la de volta, na escola, é adentrar
nesta linguagem de tribos que está presente na sociedade, a qual teve no início nos
primórdios da idade moderna. O texto poético é um instrumento para o uso de uma
linguagem original, da fonte. Para Paz, “o gozo poético não se dá sem superar
certas dificuldades, análogas as da criação. A participação implica numa recriação, o
leitor reproduz gestos e experiências do poeta” (2012, p. 51).
Todo o texto pertence a um determinado tempo e espaço, e o leitor deve
buscar estas informações, tomado pelo desejo de compreendê-lo, o jogo poético o
envolve com certo entusiasmo e alegria, oferecendo recursos imaginativos
característicos do gênero. A falta do silêncio, concentração, devido agitação; trata o
gênero como difícil, e o tem apenas como meio para o ensino da gramática,
metrificação, verso, rima e estrofe.
É inegável que a poesia aflora da inquietação, termo que obteve diferentes
definições. Na Idade Média era considerado “estado de não repouso”; no século
XVII, “um mal a ser rejeitado”; e mais tarde um aspecto de “impulso”, enfim com
valor positivo. Especialistas definem o termo como: sentimento que o faz confrontar
ele e o mundo e a possibilidade de exercer sobre ele próprio.
Segundo Cruz (2012), a inquietação resulta numa angústia do próprio
homem, e ao mesmo tempo em que quer acabar com ela, vê na inquietude uma
forma de força, que o impulsiona a fim de realizar um sonho que parece inacessível.
A inquietação não é pela posse de bens materiais, é aquela de transformar o que lhe
parece inacessível. A inquietação é no dizer de Esteban (1991), uma espécie de
itinerância interior, um espírito com dificuldades para se fixar. A inquietação é capaz
de transformar o homem, ele precisa se abandonar para refletir. E tem a mesma com
estímulo para a criação (ESTEBAN 1991 apud CRUZ, 2012). Assim,
A inquietação origina-se de um duplo sentimento de ausência, pois a vida humana, realizando-se no tempo, gera sucessivamente um passado e um futuro: o passado, que é uma perda, e o futuro, uma privação. A infância não conhece a inquietação: o homem só a conhece quando sua vida já principiou, pois é no limiar da maturidade que a inquietação aparece (CRUZ, 2012, p. 57).
Para Hegel, a poesia é verdadeira quando há nela um espírito infinito. Ela é
capaz de revelar os sentimentos, porque escrever no papel é tornar possível e
reconhecida pelos leitores à inquietude do poeta. É ela que comporta a interioridade
do indivíduo, baseada na realidade concreta existente no mundo exterior (HEGEL,
1980, in: CRUZ, 2012, p. 57).
Roman Jakobson defende a ideia de que a poesia protege o homem contra a
“automatização” e a “ferrugem” colocando-nos mais próximos dos sentimentos
(JAKOBSON, 1978, in: CRUZ, 2012, p. 59).
No texto poético há um jogo de palavras, onde a combinação não é simples
combinação, ela envolve todos os elementos linguísticos em razão disso Jakobson
(1978), salienta que a gramática não está fora da poesia, ela está presente na figura
do som, que constitui o verso, a rima, o ritmo e o metro, a aliteração auxiliam as
palavras e as ideias. O que não deve acontecer é um trabalho fragmentado, ou
seja, quando o sujeito entrar em contato com a poesia, apenas identificar as
características.
Para Eliot,
A poesia não deve, é claro ser definida pelos seus usos. [...] Ela pode operar revoluções na sensibilidade tais como são periodicamente necessárias; pode ajudar a quebrar os modos convencionais de percepção e avaliação que estão perpetuamente se formando, e fazer as pessoas
verem o mundo renovado, ou alguma parte nova dele. Ela pode nos tornar, de tempos em tempos, um pouco mais conscientes dos sentimentos mais profundos e inefáveis que formam o substrato do nosso ser, no qual raramente penetramos, porque nossas vidas são na maior parte do tempo uma constante evasão de nós mesmos, e uma evasão do mundo visível e sensível (ELIOT, 1967 apud TEZZA, 2003, p. 58).
Envolvido pela linguagem poética o leitor torna-se menos passivo, será ele
capaz de perceber o até então despercebido /desconhecido e a partir da nova
percepção transformar o sentimento. Um fator negativo que inibe essa visão ampla é
o sentimento de ansiedade existente na sociedade hoje. Uma das justificativas é que
exalta-se o ter, então as pessoas tornam-se escravos do trabalho não tendo tempo
para interiorizar-se.
Além deste sistema tirar dos indivíduos a oportunidade do autoconhecimento,
figuram a eles que a linguagem poética é inacessível pela dificuldade de conferir a
poesia um sentido, incutindo neles, o poder das leituras de autoajuda, que hoje são
recordes de vendas no país.
Ainda Jakobson (1973) considera que nenhum homem pode se considerar
linguista sem conhecer a língua em todas as funções e a poética é a primordial (in:
CRUZ, 2012, p. 59-60).
Ao compor a obra poética o cuidado deve estar no componente verbal que a
constitui: a seleção e a combinação. Ao empreender a linguagem selecionada e
combinada, os termos adquirem a polissemia e o simbolismo, rico em recurso
poético.
Segundo Paul Valéry salienta que “a arte poética reside na capacidade de o
poeta comunicar uma impressão um estado iniciante de emoção criadora, isto é,
mediante a perturbação inicial e sempre imprevista é que o poeta constrói o objeto
poético”. Ainda afirma que “o fazer poético e a atividade reflexiva estão interligados,
isto é, a poesia é uma escolha precisa de palavras buscadas na harmonia e
sensibilidade.” (VALÉRY, 1991 apud CRUZ, 2012, p. 61).
A poesia é capaz de deixar o leitor inquieto quando lê, pois é perceptível a
realidade exposta, os problemas vividos, as situações presenciadas. O poema é o
meio instaurador de enigmas, que oportuniza a reflexão, através do jogo, onde a
linguagem dá as cartas.
4 Jogo e poesia: construções poéticas
A primeira postura do leitor no ato da leitura é identificar os termos que
compõem o texto. O momento da leitura é responsável para conferir sentido aos
termos, pois estes isoladamente não dão conta de transmitir mensagens. Após a
decodificação destes, o mesmo deve propor-se a descobrir o sentido expresso nos
vocábulos, iniciando aí uma espécie de jogo discursivo, instaurando nos signos um
sentido que proporcione ao leitor interpretar os sinais gráficos transformando-os a
ideia expressa pelo autor do texto.
Johan Huizinga (2012) identifica que
A poesia tem origem no jogo: o jogo sagrado do culto, o jogo festivo da corte amorosa, o jogo combativo da emulação da troca e da invectiva, o jogo marcial da competição, o jogo ligeiro do humor e da prontidão. A função do poeta continua situada na esfera lúdica em que nasceu. Na verdade, poiesis é uma função lúdica (HUIZINGA, 2012, p. 143).
O termo jogo é definido de várias formas em várias línguas, mas do ponto de
partida semântico a ideia é de movimento rápido, relação presente em muitas
línguas. O termo jogo nos remete a movimento rápido e este relacionado à
competição, combate entre o poeta e a obra, entre a obra e o leitor.
Ao se referir ao poema enquanto jogo, em Helena Kolody, Cruz salienta que
“a palavra é a pedra que ela joga no ‘xadrez do poema’: poesia feito jogo. As
‘palavras-imagens’ vão sendo ‘jogadas’ no ‘tabuleiro poema’ e, no final tem-se o
poema, composto de versos muito bem elaborados”. (2007, p. 19). Assim como no
jogo de xadrez o jogador planeja as jogadas, a poesia é um jogo de palavras
planejadas. Segundo Lotman (1978), o jogo possibilita o homem modelar situações,
uma situação real não convencional é substituída, por uma situação convencional
lúdica. (in: CRUZ, 2007, p. 14).
Huizinga (2012) afirma que a poesia é “uma maneira de exprimir, e talvez de
resolver, os intrincados problemas da vida, e que a arte poética, sem visar
diretamente o efeito estético, tenha encontrado neste jogo o mais fértil solo para seu
desenvolvimento”. (HUIZINGA, 2012, p. 140).
Huizinga (2012) em suas palavras confirma que poesia é transformação,
porque defende que precisamos abandonar a ideia que poesia possui apenas
função estética ou só pode ser explicada através da estética. Poesia é, portanto,
jogo que possibilita a tomada do controle, não só sobre o outro, mas sobre o próprio
eu, pois estamos, nós mesmo, dentro de nós em constante combate.
No momento da leitura é preciso que o ludismo do poeta seja percebido pelo
leitor em contato com o texto, há necessidade do abandono do mundo material, e
adentrar no mundo da emoção. No dizer de Huizinga, a poesia e o jogo podem ser
definidos como
Uma atividade que se processa dentro de certos limites temporais e espaciais, segundo uma determinada ordem e um dado número de regras livremente aceitas, e fora da esfera da necessidade ou da utilidade material (HUIZINGA, 2012, p. 147).
A dificuldade está em desmistificar o jogo, pois as palavras procuram
expressar o interior da mesma, tanto difícil para o poeta quanto ao leitor.
É sobre o que o poeta vive, vê, lê e algumas vezes fere o sentimento, que ele
procura escrever. Isto justifica uma obra, escrita por Adélia Maria Woellner, intitulado
“Sons do Silêncio”, na qual Neumar Carta Winter, salienta que “Adélia Maria
Woellner procura em seu ser mais íntimo, no seu silêncio interior, os ecos
produzidos pelos ruídos do mundo, da vida exterior, e deixa brotar, irromper toda a
poesia que possui.” (WOELLNER, 2004, p. 9).
Parar para ouvir o silêncio é ser capaz de refletir. Esta reflexão da linguagem
nos oferece um interesse maior pela poesia, é neste momento que começamos a
morrer para a vida. Cruz (2012) apresenta o jogo entre a vida e a morte na poesia de
Helena Kolody. Biologicamente a vida está para a morte e vice versa. Poeticamente
também há vida e morte, são as chamadas e as respostas, que causam
transformação num mundo de valores e comunicação.
O texto poético é capaz de revelar o homem, levá-lo à morte (vazio), para
retornar à vida (reencontro) consigo mesmo. Cruz evidencia:
A poesia é entre as formas literárias a que mais requer introspecção por parte dos operadores da linguagem e também dos leitores. A singularidade da poesia não surge somente das ideias ou atitudes do poeta, mas acima de tudo de sua voz, ou seja, ele faz do poema um ato. Este fazer é essencialmente um ‘fazer-se a si mesmo’ daí a poesia ser também autocriação, conhecimento e transmutação de sentidos (CRUZ, 2012, p. 130. Grifos do autor).
A linguagem poética é linguagem significativa, segundo Paz “é capaz de
revelar o intelecto” e o jogo de palavras requer um mergulhar.
Na poesia de Adélia Maria Woellner o jogo está presente nas rememorações de sua
infância. Conforme Clarice Braatz Schmidt Neukirchen,
A maioria dos adultos, por exemplo, nem notariam a beleza da imagem da fumaça subindo de uma chaminé. No entanto, as crianças e os poetas perceberiam o poder de ligação que a fumaça representa entre o mundo real e o universo simbólico, ou seja, a poeticidade de uma cena banal (2011, p. 138).
Há momentos de recordação e reflexão que induzem a produção. Adélia
Maria Woellner deixa transparecer no elaborado jogo da linguagem o seu interior e
autoconhecimento. Segundo Neukirchen, Adélia é capaz de transmitir através da
poesia lembranças boas e felizes; passagem para a vida adulta e o fato da
desestabilidade repentina.
Na linguagem poética há muito mais que um símbolo representativo quando
se menciona uma palavra. Os termos deixam transparecer os sentimentos do poeta.
Paz afirma, “Poesia e religião são revelação” (2012, p. 144). Ainda no dizer autor, “A
poesia é revelação da nossa condição e por isso mesmo criação do homem pela
imagem. A revelação é criação. A linguagem poética revela a condição paradoxal do
homem, sua ‘outricidade’ e o faz realizar o que é.” (PAZ, 2012, p. 163).
É através da poesia que o ser humano é capaz de revela-se, é na linguagem
poética que ele coloca o sentimento que é real, e muitas vezes contrário ao
momento que vive. São palavras profundas que precisam ser vistas com outros
olhos, assim como assevera Paz: “A voz do poeta é e não é a dele” (PAZ, 2012,
p.164).
5 Da teoria à prática: o lúdico e o poético
Reconhecendo os alunos sujeitos das ações pedagógicas, faz-se
necessário e imprescindível um levantamento para saber quem gosta, lê e
escreve poemas. Identificar o que leva a apreciar ou rejeitar o gênero observando
os motivos do afastamento. O Projeto Poesia, Linguagem e Jogo, na lírica de Adélia
Maria Woellner, desenvolvido com a turma do 6º ano, em sala de aula, despertou o
interesse pela leitura e produção do gênero.
Inicialmente a avaliação diagnóstica apontou um afastamento do gênero na
vida diária dos discentes, tanto da poesia quanto da leitura.
A biografia da escritora apresenta da trouxe mais confiança, pois tratava-se
de alguém do nosso estado, e a proximidade conferiu-lhes segurança. A trajetória
de vida e poesia de Adélia Maria Woellner parecia perpassar por cada um, porque
identificaram na poeta uma infância condizente com a realidade que vivem hoje,
período da vida que auxiliam os pais nos trabalhos diários.
Contando com alunos na faixa etária de 10 e 11 anos, fase em que há ainda
inúmeras brincadeiras dos anos anteriores, contribuiu para desenvolver atividades
com elementos imaginários, relativamente importantes no desenvolvimento
cognitivo e de aprendizagem.
A linguagem poética é um convite para sonhar, fantasiar e reinventar o que
parece não ter mais espaço hoje.
Segundo Kirinus salienta que:
O devaneio, anterior, posterior ou concomitante à contemplação, permite uma energia imaginal infinita que, na lógica particular do próprio imaginário, possibilita uma operacionalidade criativa. O exercício de devaneio não apenas é synthoma de poesia, mas também é terapêutica das inquietudes da alma (KIRINUS, 2011, p. 55).
O devaneio tratado por Kirinus é realmente esse capricho da imaginação que
quando dado continuidade não é algo impossível, mas divertido.
Cruz afirma que “o jogo é uma das vias de transformação de ideia abstrata
num comportamento, numa atividade. Representa ainda a aquisição de uma
habilidade, a preparação numa situação convencional.” (2007, p.14).
Firmando as palavras de Cruz, no que tange a abstração de ideias, o resultado
foi a edição do “Caderno dos Poetas” e l a b o r a d o c o m a p r o d u ç ã o dos
próprios alunos demonstrando suas habilidades de cada momento vivido durante o
projeto.
A intermediação do professor nas atividades é muito importante e
fundamental na execução da reescrita, tendo em vista que a prática da leitura,
ainda não faz parte da vida cotidiana do aluno. Os apontamentos do professor
baseados em leitura, serão provas para o aluno que quanto maior for seu
empenho na leitura, mais imaginativo e melhor vocabulário terá. Além da formação
pessoal e expressão oral nas declamações, transmite ao aluno uma autoconfiança
e alegria interior, pois percebem-se sujeito reconhecido e lembrado, tendo alçado
mais alguns degraus no domínio do conhecimento.
As ações pedagógicas presentes nesta proposta trabalhadas em
consonância com a Proposta Político Pedagógicas do Colégio Estadual Dr.
Paranhos – Ensino Fundamental e Médio, tiveram como base uma pesquisa
bibliográfica. Cumpre-se destacar que a biblioteca do colégio, com exemplares de
livros poéticos, é um lugar que propicia leituras das obras de Adélia Maria Woellner
e muitas outras, permitindo o conhecimento das culturas presentes no cotidiano.
6 O Literário na Sala de Aula
Inicialmente o trabalho foi à apresentação da poetisa através da biografia, e
complementado com vídeos. Organizados em pequenos grupos, efetivou-se a leitura
da obra Luzes no Espelho: memórias do corpo e da emoção, lançado em 2004,
escrito em prosa e versos. A exposição do livro foi uma forma de conhecer a poeta
desde a infância. Os alunos identificaram-se com a mesma, pois a maioria destes
provêm da área rural, e tem com atividades diárias auxiliar os pais nas tarefas do dia
a dia.
Os estudos relacionados à característica do gênero poético foram baseados
no poema “Convite” de José Paulo Paes, e outros dois poemas de Adélia intitulados
“Saudade”.
O momento exigiu bastante dos alunos quando tivemos que identificar poema
e poesia. Criar o conceito a partir dos apresentados, usando dicionário, ao mesmo
tempo analisamos os efeitos da pontuação no poema. Abordou-se também o
recurso da repetição, como forma de enfatizar um sentimento ou ação. A linguagem
conotativa de alguns termos, serviu de exercício para a imaginação e compreensão
do uso da polissemia nos poemas.
SAUDADE Passa, passa, passa o tempo passa a vida devagar; Passa, agora, este momento, passa a força e o chorar. Passa o sol e passa o vento, Passa alegria e o cantar. Passa a dor e o sofrimento, Passa o real e o sonhar. Passa o tormento e a bonança, Fica a emoção e o amar. Também não passa a esperança De a saudade ver passar... (WOELLNER, Infinito em Mim,1997, p. 62).
No poema “Saudade” identificou-se que a repetição do termo “passa” citado
doze vezes no poema, dá ideia da velocidade que as coisas acontecem, e provocam
este sentimento. Além do sentimento de saudade segundo os alunos outros
sentimentos podem ser poetizados, assim como amor, felicidade, alegria, tristeza,
consolo, entre outros. Trabalhou-se o ritmo, como forma de melhorar a declamação
dos poemas, pois eram lidos como textos em prosa. A rima mexeu com a
imaginação. A reescrita do poema substituindo o termo “passa” tantas vezes
repetida, é que gerou discussão, pois substituindo o termo por “Vive”, percebeu-se a
presença constante deste sentimento; trocando por “Deixa”, notou-se que o eu-lírico
está em constante espera; substituindo por “Cala” parece matar o sentimento,
empregando o termo “Recorda” é como reviver o sentimento. Além destes outros
termos foram possíveis, sempre empregados no tempo presente.
Adélia produziu muitos dos seus poemas a partir de figuras, para isso utilizou-
se da mitologia. Como forma de entender o processo dos mitos nos poemas,
buscou-se trabalhar primeiramente o mito “O príncipe infeliz e as abóboras
desprezas” de Reinaldo Pandi, também trazendo um contexto histórico do gênero e
porque há uma certa rejeição, ou afastamento do mesmo na sociedade de hoje.
Efetivou-se o trabalho com vários poemas.
Em relação ao poema “Deus”, a análise partiu da percepção da exaltação da
divindade Deus, que para os cristãos é uma criatura de infinita bondade, o todo
poderoso responsável pela criação do mundo:
DEUS Artesão-Poeta teceu o mundo com agulhas de luz e fez, do sol, um poema dourado. (WOELLNER, Infinito em mim, 2000, p.37)
Já o termo “artesão” usado pelo eu-lírico faz reconhecer em Deus o domínio
de todos os recursos existentes para a produção manual de objetos, e declara ser
ele o possuidor do dom de criar. Essa arte não identifica um trabalho coletivo, mas
sim a individualidade, ser único assim como assevera o catolicismo. O resultado do
trabalho, no caso o sol, é a interação no contexto entre o eu-lírico e Deus.
No poema “Constelação” identificando a criação do Cruzeiro do Sul, apontado
com obra de Deus, num ritual sempre lembrado pelos católicos no ato de fazer o
“Sinal da Cruz”.
CONSTELAÇÃO Na madrugada transparente e fria no céu sobressaía o Cruzeiro do Sul.
A emoção compreendeu ser cada estrela a marca do toque do dedo de Deus, no corpo do infinito, ao fazer O Sinal da Cruz... (WOELLNER, Infinito em Mim, 1998, p.16)
Segundo Neukirchen (2011), há na obra da poeta uma espécie de panteísmo.
A poeta percebe a natureza, o universo como criação divina, não atribuindo a ciência
o poder de originar o universo, a vida, porque no panteísmo Deus é todo o universo
e está em todo o lugar e sua ciência são as ciências naturais.
Outros poemas que tratam da mitologia cristã empregada na figura dos anjos
em união com a pagã, representada pela figura das fadas, reunirem-se para uma
comemoração festiva. O poema “Oferenda” recorre-se ao ritual católico da
consagração da hóstia, tendo como símbolo a “lua cheia”, além unir a crença
católica a politeísta, pois usou o termo “deuses”. No poema “Concessão” trabalhou-
se inicialmente o sentido expresso pelo título, que é de conceder a alguém o que já
está feito. O poema apresenta a criação do mundo, e segundo o eu-lírico o “Artista-
Maior” pede que se intensifiquem os olhares e sentidos para que cada um possa
continuar espalhando belezas e encantamentos, pois Ele concede “inspiração e
talento
No estudo dos poemas foi possível perceber que é necessário observar,
admirar as belezas que estão ao nosso redor. A produção mítica e a produção
poética contam com o princípio da imaginação e para motivá-los a proposta foi uma
produção partindo da observação e fotografias da natureza.
Utilizando o vídeo do poema “Solidão” e pesquisa no dicionário sobre o termo,
identificou-se que solidão na poesia não é sentimento de tristeza. A turma percebeu
que o termo traz um certo isolamento, mas que o mesmo é necessário à fertilidade
de ideias, apresentando-se assim, o grande mundo imaginário possível de existir no
ser humano.
Os poemas “Reencontro” e “Outra Vez” deram sustentação ao significado do
termo solidão na linguagem poética. Identificou-se que o grande vilão da solidão é o
tempo que atropela o ser humano, fruto de um sistema capitalista que exige ação e
produtividade das pessoas, deixando-as com um vazio, assim como o eu-lírico
revela no poema.
Outra vez O tempo se atropela e atropela. A cada novo tempo, a mesma sensação de vazio, de solidão. (WOELLNER, Avesso meu, 1990, p.56).
O jogo dos termos “se atropela” e “atropela” identifica que o ser humano é
atropelado pelo tempo, restando a ele o vazio. O eu-lírico oportuniza uma reflexão
sobre a civilização moderna que muitas vezes se vê sem tempo para produzir o que
julga necessário. O sentimento de solidão é o resultado do vazio, porém é abertura
para a interiorização para se autodescobrir, autoconhecer foi o que instigou os
alunos a parar e ouvir a natureza.
A interdisciplinaridade com Geografia oportuniza a análise mais criteriosa dos
elementos naturais que servem de base para possíveis produções poéticas. O livro
didático de Geografia apresenta o gênero poético nos textos propostos, o que
colaborou para instigar nos alunos a percepção da natureza a sua volta. Assim o
quarto momento desenvolvido com a turma resultou em poemas que retratam a
natureza do ambiente onde moram.
O tema infância foi introduzido pelo poema de Cassimiro de Abreu Meus oito
anos, juntamente com a biografia do autor. O poema deixou claro para os alunos
que a recordação e imaginação são processos de deslocamento do presente ao
passado, capaz de organizar esteticamente uma cena. O recurso é utilizado pelos
poetas que trazem na memória situações vividas e reconstroem-nas com palavras.
Tratando da infância praticou-se a leitura e entendimento dos poemas:
“Princípio”, “Renascimento”, “Interrogação” e “Felicidade Intangível” os quais trazem
como tema a infância. As atividades se concentraram mais no poema “Atavismo”
que descreve mais especificamente a infância.
Atavismo Bebi da água límpida, pura, do poço cavado no barranco, paredes bordadas com verdes e macias avencas. O frescor da infância, enfeitada de arco-íris, dança em minh'alma e me ensina a viver melhor. (WOELLNER, Infinito em mim,2000, p.19)
Para estudo do poema debatemos as seguintes questões: Qual é o tema
deste poema? Qual é o número de versos e estrofes? Os termos “frescor” e “pura”
remetem a que figura do eu-lírico? As expressões “água límpida/pura” remetem a
que tipo de infância? O que você entende por “poço”, qual a referência feita pelo eu-
lírico e que definição o dicionário traz? Qual é o jogo de sentido expresso no termo
“da infância enfeitada de arco-íris”? Que revelação sobre a vida de hoje é possível
perceber no poema?
As questões levaram os alunos a perceber que a infância foi tratada como um
período cheio de inocências, sem maldade nem conflitos, mas de muito
conhecimento revelado no termo “poço”. O arco-íris remete a beleza da vida nesta
fase, e as rememorações hoje são ensinamentos para uma vida melhor.
A linguagem simples capaz de profunda revelação, descrever a infância da
própria poeta fazendo qualquer leitor buscar recordações de momentos da infância e
avaliá-la.
O momento provocou nos alunos uma rememoração e de forma poética
revelaram os sentimentos, alguns utilizando-se também de fotografias produziram
seus poemas, o autoconhecimento serviu de fonte inspiradora
No momento seguinte outra poeta especial da literatura paranaense, a poeta
Julia Maria da Costa que pertenceu à segunda metade do século XlX, e deixou
registrado na história literária grandes produções. A biografia auxiliou no
entendimento de seu poema “Rosa Murcha”, que também apresenta referências da
mitologia. A mulher é apresentada pelo eu-lírico na figura da rosa, que também
remete a figura do cálice, fazendo imagem ao ritual da consagração, várias vezes
citado na poética adeliana.
Analisando os poemas “Busca” e “Conflito” de Adélia, juntamente com o
poema de Julia Maria da Costa, percebe-se a luta da figura feminina para mostrar-
se, elas precisaram vencer alguns obstáculos. Os poemas deixam transparecer os
sentimentos de repreensão, vontade e a realização pessoal.
Neste momento os alunos produziram poemas referentes a figura feminina e
alguns utilizaram como referência a mãe. A personagem mãe é a referência para os
adolescentes que além de exaltá-las, são modelos de inspiração do mundo exterior,
para os pensamentos e planejamentos interiores.
Além de Julia, outra grande personalidade, a poeta Cora Carolina, com o
poema “Mascarados”, em diálogo com o poema “Semeador” de Adélia Maria, ambos
tratam do mesmo tema, e a linguagem traz um jogo de sentido que provoca o desejo
em buscar reconhecer esta polissemia da poesia.
SEMEADOR Em amoroso gesto, espargiu sementes no espaço. Nasceram luzes e floresceram estrelas... A nós, delegou o privilégio da colheita. (WOELLNER, Sons do Silêncio, 2004, p.41)
No sentido literal “semear” é lançar a semente na terra. O eu lírico amplia o
significado da ação de semear conferindo a semente o sentido de sentimentos. É
possível, assim, semear amor, felicidade, fraternidade, porque além da semeadura
delegou-se a nós o ato de colher. O poema excitou os alunos recordar alguns aos
provérbios “Quem semeia injustiça colherá desgraças” ou outro “Quem semeia
ventos colhe tempestades”.
A polissemia no emprego do termo semeador, oportuniza a imaginação, pois
é possível de forma verdadeira plantar sentimentos, a partir de ações praticadas no
dia a dia.
Segundo Cruz “a poesia tem o poder de exercitar a imaginação e nos ensinar
a reconhecer as diferenças de descobrir a analogias presentes nas formas poéticas”
(2012, p.61).
Com o intuito de mexer com a imaginação após a leitura do poema “Obrigada
Senhor”, os alunos em duplas parafrasearam, reescrevendo os termos que haviam
sido subtraídos conferindo sentido ao poema como atividade a substituição de
termos por outros que conferissem sentido poema. Além do poema intitulado
“Obrigada, Senhor, ”os poemas “Razão de Viver”, “Identificação”, “Viver” e “Retorno
ll”. Também serviram para a prática das atividades.
O projeto foi encerrado com a apresentação para todo o colégio. Os alunos
escolheram poemas de poeta Adélia Maria Woellner para declamar, além de relatar
como realizou-se os estudos durante o período. O muro do colégio também recebeu
poemas adelianos pintados, como forma de apresentar para a sociedade, mais que
um trabalho realizado na escola. Além destas atividades, contamos também com a
impressão dos poemas produzidos pelos alunos, reunidos no “Caderno dos Poetas
2014”.
CONCLUSÃO
Objetivou-se com este trabalho apresentar a eficiência da leitura, da
linguagem e da produção poética no desenvolvimento da inspiração e imaginação.
As atividades desenvolvidas no 6º ano do Ensino Fundamental, tendo como base,
obras da poeta paranaense Adélia Maria Woellner, um exemplo de poesia que
busca na mitologia, nas rememorações construir a poesia viva. A linguagem poética
é capaz despertar o olhar do ser humano, auxilia na aprendizagem, porque traz no
jogo da linguagem um mistério que convida o leitor a desvendar o sentido dos
signos, provocando assim a imaginação durante a leitura.
O trabalho com a poesia na sala de aula motiva os alunos a buscar um estado
de solidão, o qual resulta na apuração e observação do que há ao seu redor,
buscando a profundeza das palavras para produzir os próprios poemas. A linguagem
empregada nos primeiros poemas é simples, mas à medida que ocorrem as
reestruturações dos poemas é perceptível a mudança de termos por outros mais
significativos. Sobre o fazer poético, a aluna Júlia Grando teceu a seguinte
afirmação: “O olhar volta-se para dentro e as palavras parecem deslizar no papel
quando as produções começam a acontecer.”
A prática realizada por momentos com temas bem definidos contribuiu tanto
para o desenvolvimento das atividades, quanto para produção dos alunos, que ao
finalizar os momentos realizavam as produções. Além deste fato, outro também
importante é que não foi cansativo trabalhar com um único gênero.
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