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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
O TRABALHO INFANTIL NO CULTIVO DE FUMO E SUA INFLUÊNCIA NO DESEMPENHO ESCOLAR DOS ALUNOS DO
CAMPO
Eliana Bojanoski Ribeiro¹ Luiz Alexandre Gonçalves Cunha²
RESUMO
Este artigo apresenta um projeto do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), implementado no Colégio Estadual do Campo Professor Argemiro Luiz de Lima em São João do Triunfo-PR. O trabalho é resultado de uma reflexão sobre o trabalho infantil nas lavouras de fumo, uma das culturas mais significativas do município. Embora existam leis que proíbam o trabalho para menores, essa prática ainda é uma realidade no campo, onde, principalmente, os jovens dividem o seu tempo entre estudo e trabalho, trazendo prejuízos ao desempenho escolar e gerando evasão escolar. Diante dessa realidade, o objetivo é proporcionar uma reflexão que venha a contribuir para que ocorra uma ruptura na transmissão cultural entre as famílias, mesmo que em longo prazo, de que o trabalho educa e é necessário para a formação do caráter ou que pode ser realizado sem maiores consequências para a vida escolar. Conclui-se que é necessário que se realizem mais discussões voltadas ao trabalho infantil com toda a comunidade escolar, pois a consciência da família, muitas vezes, se sobrepõem as leis que combatem o trabalho infantil. Muitos dos pais ainda estão alheios aos malefícios do trabalho precoce, bem como há uma aceitação, mesmo que velada por parte dos jovens.
Palavras-chave: Trabalho infantil. Desempenho escolar. Plantio do fumo.
1- Licenciada em Geografia pela Universidade Estadual do Centro-Oeste com Especialização em Metodologias Inovadoras Aplicadas à Educação. E-mail: [email protected]
2- Professor Associado da UEPG e Doutor em Ciências Sociais pela UFRRJ. E-mail: [email protected]
1. Introdução
O propósito deste trabalho é analisar os resultados da implementação de uma
Produção Didático-pedagógica, no formato de Unidade Didática, elaborada no
Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE). O tema se refere a interferência
do trabalho infantil na vida escolar de alunos do campo que precisam se preparar
para o futuro e ao mesmo tempo se dedicam às atividades agrícolas como auxiliares
dos pais.
No Colégio Estadual do Campo Professor Argemiro Luiz de Lima em São
João do Triunfo - Paraná, os alunos são na maioria filhos de agricultores, onde a
maior parte deles cultiva o fumo. Submetidos às exigências das indústrias
fumageiras e com um ganho muitas vezes insuficiente para contratar mão de obra,
os agricultores contam com a ajuda de toda família, inclusive dos jovens que ainda
estudam, para garantir um maior lucro com a safra.
Mesmo com a existência de leis que protegem os menores, no campo, o
trabalho infantil ainda é bastante expressivo. Para entender esse fato, parte-se do
princípio de que o trabalho infantil é decorrente de inúmeros fatores que vão além da
precariedade econômica em que vivem algumas famílias. Através de observações
feitas na escola e das contribuições dos cursistas do Grupo de Trabalho em Rede
(GTR), em uma das etapas do PDE, levantaram-se algumas hipóteses que podem
explicar a continuidade desse problema: a fiscalização distante e ineficaz; a
crescente necessidade de consumo dos jovens, ocasionadas pelo sistema
capitalista e também o fato de ser justificado pela cultura familiar onde as
concepções sobre o trabalho das crianças e jovens são repassadas através das
gerações.
Como é um problema que afeta diretamente a frequência, o desempenho e a
permanência dos alunos na escola, fica claro que é preciso repensar como a escola
está abordando o tema do trabalho infantil e a sua interferência no desenvolvimento
escolar das crianças e adolescentes. É de fundamental importância formar gerações
mais esclarecidas sobre o tema, quebrando a reprodução familiar de que o trabalho
precoce educa e auxilia na formação do caráter de um indivíduo.
Nesse contexto, a implementação do projeto no colégio realizou-se através de
atividades reflexivas, debate, teatro, aplicação de questionários abertos e fechados
com pessoas que vivem ou que já vivenciaram o drama do trabalho infantil no
passado. Assim, os alunos tiveram a oportunidade de refletir e opinar sobre os
resultados advindos do trabalho infantil, com foco nos prejuízos escolares e
consequentemente para um futuro profissional.
2. O trabalho infantil no campo
No campo, os pais repassam os conhecimentos relativos à agricultura a seus
filhos, ensinando-os a trabalhar na terra que tomarão posse no futuro. Esse é o
conceito de socialização do trabalho agrícola, onde os filhos participam de pequenos
afazeres supervisionados pelos pais, como forma de aprendizado e com tempo
disponível para os estudos e lazer, sem danos para a sua saúde. Nessa perspectiva,
o trabalho das crianças e adolescentes é aceitável e não pode ser confundido com o
trabalho infantil, prejudicial ao desenvolvimento físico, social e que atrapalha o
desempenho, a frequência escolar e a continuidade dos estudos dos jovens.
Para Bonato (2007), apesar das campanhas para erradicação do trabalho
infantil, a maioria dos fumicultores não tem condições de contratar mão de obra,
tornando-se impossível manter o sustento da família sem a contribuição dos filhos
no trabalho. Segundo o autor, esse fato comprova a necessidade de melhorar a
remuneração pelo trabalho dos fumicultores.
Também para Almeida (2005), a renda do produtor de fumo não lhe dá
autonomia para contratar mão de obra necessária em épocas de safra, então ele
conta com a força de trabalho disponível, que é a família. Segundo o autor, grande
parte dos produtores de fumo entende a participação de crianças e adolescentes na
produção do fumo como uma forma de educação. O trabalho aparece como um
ensino de práticas agrícolas, passado de pais para filhos.
Inevitavelmente esses fatores acabam refletindo no desempenho escolar,
além dos problemas físicos e sociais oriundos do trabalho precoce. Estudantes que
trabalham não dispõem do tempo necessário para se dedicar aos estudos e chegam
na escola fatigados pelo dia de trabalho, o que pode comprometer a sua capacidade
de aprendizagem.
Sabe-se que o presente projeto não solucionará o problema do trabalho
infantil, o qual tem origem histórico-geográfica, mas certamente levantará uma
reflexão para tentar interromper a transmissão familiar de que o trabalho educa,
quando os próprios jovens acreditam que o trabalho precoce é benéfico, pois assim
os pais lhes ensinaram e estes aprenderam do mesmo modo. A partir do
esclarecimento das ideias errôneas sobre o trabalho infantil, cortando esse círculo
vicioso, é possível que se consiga amenizar o problema nas futuras gerações.
Com referência à afirmação acima, Kassouf (2002) observa os estudos da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) que apontam para o efeito imediato
que a educação pode ter na redução do trabalho infantil, formando pessoas mais
conscientes de seus direitos e capazes de criar filhos mais educados e saudáveis,
reduzindo assim o trabalho infantil a longo prazo.
No entanto, o tema ainda é pouco debatido nas escolas, talvez pelo complexo
confronto entre o que é correto e a realidade vivida pelas crianças e jovens de
muitas famílias carentes ou até mesmo pela divergência de opiniões, afinal muitos
adultos já passaram por isso na infância e defendem que foi fundamental para sua
formação. Todas essas situações, além de tornar o trabalho infantil aceito perante a
sociedade, dificultam a sua erradicação.
Assim, entende-se que a partir do momento que os profissionais da educação
tem ciência do problema, a escola deve possibilitar a reflexão e discussão sobre o
trabalho infantil com alunos, pais e professores, visto que é um grave problema
social que repercute no desempenho escolar dos educandos bem como no seu
desenvolvimento físico e social.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) a participação dos
professores nas escolas contra o trabalho infantil é fundamental para mobilizar e
sensibilizar a comunidade, contribuindo assim para a sua erradicação:
Quem está em contato próximo com crianças, jovens e seus pais, tem a oportunidade de fazê-los refletir sobre a realidade e a responsabilidade de cada um de nós no conhecimento e na transformação social, especialmente da realidade à nossa volta. É o educador que pode estimular os alunos a formar conceitos e valores sobre direitos, justiça, equidade e solidariedade. (OIT, 2001, p. 4).
Dentre as inúmeras consequências do trabalho infantil, pode-se citar a falta
de tempo para se dedicar aos estudos e até mesmo a pouca disposição para assistir
as aulas depois de um dia de trabalho, aumentando os índices da evasão escolar
por não conseguirem conciliar trabalho e estudo. Segundo o Fundo das Nações
Unidas para a Infância (UNICEF), o mundo de hoje exige cada vez mais qualificação
em todos os campos profissionais. Assim, o trabalho precoce aliado a baixa
escolaridade, vão restringir a oportunidade dos jovens de se capacitar para o
mercado de trabalho.
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) relaciona o exploração do trabalho adolescente como um fator que interfere na educação, pois os adolescentes que trabalham e estudam ficam mais suscetíveis tanto ao mau desempenho escolar como à evasão. Para a UNICEF jovens trabalhando precocemente e com baixa escolaridade irão restringir a capacidade de aperfeiçoamento, limitando a sua atuação profissional no mercado de trabalho. (UNICEF, 2011, p. 33)
Existem ainda os danos causados pelo contato com o agrotóxico utilizado no
plantio do fumo. De acordo com Londres (2011), o contato com o agrotóxico pode
causar intoxicações, desde a aguda até a crônica, conforme o tempo da exposição e
ao grau de toxidade dos produtos. Alguns sintomas da intoxicação relatados pela
autora, como dores de cabeça, estômago e enjoos são constantemente
presenciados nas escolas rurais.
Sobre os riscos a que crianças e jovens são expostos dentro da divisão do
trabalho em uma pequena propriedade rural, Almeida (2005), explica que
normalmente não se permite que crianças executem tarefas forçadas e que tragam
riscos ou perigos à sua saúde. No entanto, esse cuidado pode ser alterado conforme
a situação econômica em que se encontra a família:
Quando a pobreza prevalece e a qualidade de vida dentro da pequena unidade rural decai, ocorrem desvios de conduta que induzem a sobre- exploração do trabalho dos membros da família, crianças inclusive. (ALMEIDA, 2005, p. 118)
Almeida (2005), ainda aponta que diante da produção do fumo integrada à
indústria, o sentido do trabalho da criança e do adolescente na agricultura
camponesa, em regime familiar e como educação para o trabalho no campo, é
alterada para atender as exigências contratuais feitas pela indústria.
Para Marin (2006), as famílias através de suas especificidades econômicas e
culturais, contribuem para a existência das atuais circunstâncias em que se
encontram muitas crianças e adolescentes.
Seguindo o pensamento do autor citado acima, é imprescindível identificar
como alunos e familiares vivenciam as situações do trabalho infantil. A família tem
uma grande influência sobre o pensar e agir das crianças e adolescentes, portanto
se os pais entendem o trabalho precoce como natural, porque assim o aprenderam,
irão reproduzir esse aprendizado para com seus filhos e esse problema social terá
continuidade por várias gerações. É comum ouvir dos próprios jovens uma opinião
negativa às questões de trabalho contidas no Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), com a justificativa de que se começar a trabalhar desde cedo, se tornarão
adultos que sabem e gostam de trabalhar.
É notório que há muitos autores escrevendo sobre as causas e
consequências do trabalho infantil no campo, sejam elas físicas, psicológicas ou
sociais. A escola é um lugar onde se pode observar a realidade desse problema,
alunos com frequência irregular devido a necessidade de trabalhar para ajudar no
sustento da família e também os que abandonam seus estudos porque não
conseguem conciliar os horários de estudo e trabalho. Entre diálogos e observações,
percebe-se que em um misto da cultura e da necessidade, a família tem uma forte
influência na inserção das crianças e adolescentes no trabalho precoce,
prejudicando as tentativas de erradicação do trabalho infantil.
3. Implementação da Produção Didático-pedagógica
Deu-se inicio no 1º semestre de 2014, a Implementação da Produção
Didático-pedagógica, reunindo vinte e três alunos do 1º Ano do Ensino Médio em
contra turno para que realizassem as atividades propostas. Eis o primeiro desafio
encontrado, pois se tratando de uma região do interior, os alunos residem em
distâncias bastante consideráveis do colégio e dependem de transporte escolar para
o deslocamento. Muitos deles eram obrigados a permanecer no colégio para poder
assistir as aulas no período noturno, já que não teriam tempo hábil de retorno as
suas casas. Esse fato ocasionou certa desmotivação na participação dos alunos.
Nas atividades iniciais, os alunos puderam refletir e discutir sobre o que é o
trabalho infantil, suas causas, consequências e também elaboraram possíveis
soluções para o problema. As atividades desenvolvidas foram baseadas em leituras
seguidas de produção de texto onde expressaram suas opiniões sobre o tema, as
suas expectativas de futuro e como organizam o seu tempo entre o trabalho, estudo
e lazer. Também assistiram a documentário sobre o trabalho infantil no plantio de
fumo e vídeo sobre o ECA, logo após fazendo analises escritas e conversando com
o grande grupo sobre as impressões obtidas.
Em uma das atividades propostas, os alunos responderam a um questionário
fechado onde aparecem alguns detalhes da produção do fumo. Tais detalhes
encontram-se nas tabelas abaixo:
Tabela 1: Produtos cultivados nas propriedades
Somente o fumo Fumo e outros produtos Outros produtos
9 10 4
Fonte: Alunos do 1º Ano do Ensino Médio, 2014
Tabela 2: Mão de obra utilizada no plantio do fumo
Pai Mãe Filhos Mão de obra contratada
20 15 12 9
Fonte: Alunos do 1º Ano do Ensino Médio, 2014
Tabela 3: *Etapa em que os filhos colaboram na produção do fumo
Plantio Aplicação de agrotóxicos
Colheita Secagem Classificação
10
2 7 7 16
Fonte: Alunos do 1º Ano do Ensino Médio, 2014 * Essa amostra não se refere necessariamente aos entrevistados, mas também aos irmãos já maiores
de idade.
Pode-se observar que os dados acima revelam que poucos agricultores se
utilizam de mão de obra contratada, além disso, em todos os questionários em que
aparece, a família também trabalha, deixando claro que o número de contratados é
insuficiente para todo o trabalho a ser realizado. Consequentemente, no mês em
que se inicia o plantio do fumo, a frequência dos alunos que trabalham decai
consideravelmente e ssa situação se repete durante a colheita do fumo.
As pesquisas realizadas pelos alunos estão de acordo com Departamento do
Pesquisas e Estudos Econômicos (DEPEC, 2013) que mostram que nos meses de
plantio, colheita e secagem, o fumo exige a utilização de grande mão de obra, o que
acarreta em custo adicional ao produtor, sendo então a mão de obra familiar uma
alternativa.
Dentro do custo da produção do fumo, os agricultores destinam 54% para a
mão de obra (DEPEC, 2013). É nesse contexto de mão de obra familiar que se
insere o trabalho infantil, pois se os agricultores vivem uma realidade de muito
trabalho e pouco lucro, geralmente irão se valer da ajuda dos filhos em quase todas
as etapas da produção. Crianças e jovens terão que dividir o seu tempo entre
trabalho e estudo para colaborar com a renda familiar ou até mesmo como
provedores do sustento da família.
Durante os encontros, ficou claro que, entre os alunos, as ideias favoráveis ao
trabalho infantil estavam bastante enraizadas e que talvez pelo temor às leis que
proíbem o trabalho infantil, as discussões se desenvolviam com certa timidez e com
pouca espontaneidade. Foi necessário observar nas entrelinhas das conversas que
os alunos não associavam o trabalho infantil ao desempenho escolar, para eles não
havia vínculo entre estes fatores e nem interferência do trabalho sobre a escola.
Através das diversas atividades, os alunos tiveram oportunidade de rever
seus conceitos e ter uma orientação sobre a importância de poder viver plenamente
as diferentes etapas da vida, com observações de que o trabalho precoce não é
inerente a faixa etária em que se encontram.
Ao solicitar que escrevessem sobre o trabalho infantil e o desempenho
escolar, vinte e um alunos concordaram que o trabalho prejudica os estudos, seja
pela falta de tempo ou pelo cansaço físico, citando-o também como a principal causa
do abandono escolar. Somente dois deles se posicionaram a favor, dizendo que o
trabalho não atrapalhava os estudos. Entretanto, em alguns relatos, observa-se a
uma contradição entre as opiniões e a realidade.
“Pra mim o trabalho não afeta o desempenho escolar. Tenho que trabalhar, mas sempre tiro um tempo para fazer as tarefas e estudar. Não perco aula por causa do trabalho. Trabalho o dia inteiro, as vezes fico cansada as vezes não. No trabalho que estou me movimentando muito ou andando muito, eu canso mais e aí dá até preguiça de vir para escola por causa da canseira.” (Aluna A)
Esse trecho de um texto mostra uma rotina de trabalho nos horários em que
não estão na escola, apesar da aluna ter o horário de estudos em casa, fica evidente
que o cansaço ocasionado pelo trabalho prejudica o seu desempenho escolar.
Em outro texto escrito sobre a rotina de estudos, trabalho e lazer, uma aluna
se referiu ao trabalho como se fosse brincar com a criança que cuida durante um
período do dia. O pequeno trecho retirado do texto ilustra como o trabalho infantil é
tido como algo natural, que ocupa o tempo das crianças e adolescentes sem lhe
causarem maiores prejuízos e é aceito tanto por eles como pelos seus pais.
“Eu acordo por volta de 8 horas tomo café e vou arrumar a sala e a cama. Logo após vou trabalhar na casa da minha vizinha e brincar com o filho dela enquanto ela faz o serviço da casa. Só ao meio dia eu volto almoço assisto tv e descanso. Têm vezes que ela me pede para voltar à tarde aí eu vou brincar um pouco mais... (Aluna B).
Com o intuito de verificar como é percebido o trabalho infantil pelos pais, os
alunos realizaram entrevistas com os mesmos, no entanto apenas dezessete foram
respondidas. Nas tabelas a seguir pode-se observar o perfil dos pais entrevistados.
Tabela 4: Faixa etária dos pais
30 anos ou mais 40 anos ou mais 50 anos ou mais
7 7 3
Fonte: Alunos do 1º Ano do Ensino Médio, 2014
Tabela 5: Escolaridade dos pais
2ª série 3ª série 4ª série 5ª série 7ª série 8ª série
1 2 7 1 3 3
Fonte: Alunos do 1º Ano do Ensino Médio, 2014
Nos questionários respondidos, constata-se que todos os dezessete
entrevistados tem uma baixa escolaridade e que trabalhavam desde crianças. Em
primeiro lugar aparece o trabalho na roça, citados por onze entrevistados, enquanto
seis declararam que “ajudavam” nos afazeres domésticos. Quando indagados sobre
os benefícios e prejuízos decorrentes do trabalho realizado desde a infância, as
respostas foram variadas: sete dos pais têm a opinião de que foi benéfico, pois
aprenderam a trabalhar e hoje são adultos responsáveis; em seis das entrevistas, os
pais relataram que não podiam estudar por causa do trabalho e sentem que foram
prejudicados pela falta dos estudos. Em outra questão abordada, os pais
responderam se acham importante que crianças e jovens trabalhem e o porquê.
Somente três dos pais não acham que os filhos devam trabalhar e que a escola é
prioridade; três dos pais responderam que o trabalho é importante, desde que os
filhos possam estudar e não realizem atividades que prejudiquem sua saúde ou
onde corram riscos físicos; em oito das entrevistas o trabalho é citado como
elemento formador do caráter e ocupação para que se tornem responsáveis; três
dos pais consideram o trabalho das crianças e jovens como aprendizado do trabalho
agrícola.
Um ponto interessante da entrevista com os pais foi sobre a opinião deles em
relação ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Nos questionários cinco dos pais
se posicionam a favor do ECA; dois deles deram respostas evasivas, sem relação a
pergunta, o que demonstrou a falta de conhecimento sobre o tema; três dos pais são
contra o ECA; dois pais não responderam, aparentemente por falta de conhecimento
e cinco deles responderam que não conhecem ou não sabem o que é o ECA. Com
tais informações percebe-se a necessidade de esclarecimento e uma maior
divulgação do ECA para a compreensão e conhecimento por parte dos mesmos.
Para que os alunos percebessem claramente as consequências da evasão
escolar, realizaram-se também entrevistas com dezessete pessoas com idades
diferenciadas e que não concluíram seus estudos. Dentre os motivos da evasão
escolar, quatro pessoas colocaram a distância de suas casas à escola como
determinante; quatro deixaram de estudar porque tinham que trabalhar; três pessoas
não achavam importante estudar e outros seis citaram motivos variados, como
doença, que não gostavam de estudar, casamento precoce e também por influência
dos pais. Nessa entrevista, as pessoas relataram sobre a reação dos pais diante da
decisão de abandonarem os estudos. O resultado foi de que cinco dos pais se
mostraram favoráveis; nove deles não queriam que os filhos parassem de estudar e
três se mantiveram neutros diante da atitude dos filhos.
Essas situações evidenciam como a inserção no trabalho das crianças e
jovens tem uma relação bastante importante de como a família encara as questões
do trabalho infantil.
Ainda com esta entrevista, verificou-se que quatorze dos entrevistados se
arrependeram por abandonar a escola, principalmente pela dificuldade que
enfrentam para conseguir empregos em lugares diferentes das atividades agrícolas.
Essa atividade de pesquisa local foi essencial para comprovar os efeitos do
trabalho infantil na vida adulta, desde perder a oportunidade de ser criança e estudar
no tempo certo até a limitação de um futuro profissional que poderia lhes
proporcionar uma vida melhor.
Em realização de um debate com e entre os alunos, os quais anteriormente
haviam recebido textos para leitura e feito pesquisas sobre as causas do trabalho
infantil, percebeu-se que no final do debate, os alunos entraram num consenso de
que o trabalho infantil só traz prejuízos às crianças e jovens.
Como atividade final, sugeriu-se a elaboração de um teatro sobre o trabalho
infantil que seria apresentado a todas as outras turmas do colégio. Livremente, os
alunos escolheram representar a pobreza como uma das causas do trabalho infantil,
fazendo um comparativo entre a situação dos filhos de uma família pobre e outra
rica. Na família pobre, os filhos aceitavam as ordens do pai e tinham que faltar às
aulas para trabalhar e quando iam à escola dormiam nas carteiras vencidos pelo
cansaço e tinham muitas dificuldades de aprendizado. Na espontaneidade de uma
peça de teatro, os alunos acabaram demonstrando uma situação real de muitas
crianças e jovens que são vítimas de um sistema injusto e que são prejudicadas em
seu desempenho escolar, pois muitos pais não conseguem perceber o quanto
prejudicam seus filhos inserindo-os no trabalho precoce.
4. Considerações finais
O trabalho infantil ainda é um dos problemas sociais a ser erradicado no
Brasil e em muitos países do mundo. Apesar da visível diminuição dos índices nos
últimos anos e do esforço de muitas instituições no seu combate, ainda afeta a vida
de muitas crianças e jovens. O presente trabalho é apenas um pequeno recorte da
realidade sobre o trabalho infantil no campo. As consequências sociais, físicas e
psicológicas muitas vezes passam desapercebidas pelas famílias e pelas próprias
crianças e jovens que aceitam com naturalidade a execução de atividades que
roubam-lhes o tempo de estudos e lazer, essenciais a um desenvolvimento
saudável.
Observou-se durante a implementação do projeto, que a abordagem sobre o
tema do trabalho infantil é encarado ainda com certa resistência e também com uma
falta de consciência sobre os malefícios decorrentes dessa prática. Em relação a
interferência negativa que o trabalho infantil provoca no desempenho escolar,
verificamos que não são percebidas por alguns alunos e que, para muitos, o trabalho
é mais importante do que os estudos.
No contexto social em que estão inseridos, a participação no trabalho é vista
com normalidade, já que muitas famílias não possuem disponibilidade financeira
para contratar a mão de obra necessária para atender as exigências feitas pelas
indústrias fumageiras.
As pesquisas realizadas pelos alunos apontam que a naturalidade com que é
encarado o trabalho infantil, além da situação econômica, é também consequência
dos ensinamentos repassados pela família, onde o trabalho é tido como uma forma
de educação dos jovens. Pensa-se que de nada adianta a existência das leis que
proíbem o trabalho infantil se os chefes de família persistirem na ideia de que o
trabalho educa. Ainda verificou-se que alguns jovens, vítimas do sistema capitalista,
mesmo que não precisem trabalhar para ajudar no sustento da família, trabalham
para atender ao seu desejo de consumo.
Através de muitas campanhas contra o trabalho infantil tem-se conseguido
diminuir os números desse grave problema social, no entanto estamos longe de
presenciar a sua erradicação. Nesse contexto, as escolas deveriam incluir o tema
em seu Projeto Político Pedagógico e discuti-lo constantemente com os estudantes
e também com os pais, objetivando uma maior consciência sobre os atrasos e danos
causados pelo trabalho infantil.
Sendo assim, conclui-se que é necessário rever as práticas pedagógicas que
se desenvolvem nas escolas sobre o trabalho infantil e verificar o quanto são
capazes de colaborar para que de alguma maneira, as mudanças realizadas no
presente possam proporcionar um futuro em que as crianças e adolescentes tenham
suas fases respeitadas, o que vai lhes garantir uma melhor formação e preparo para
sua vida pessoal e para o futuro profissional.
Uma última percepção sobre o presente trabalho é de que a escola é o
espaço ideal para que as crianças e adolescentes envolvidos no trabalho infantil
possam refletir e dialogar sobre valores já bem enraizados em sua cultura, que vêm
sendo transmitidos através das gerações e agravados pela lógica do sistema
capitalista.
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