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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

PORTFÓLIOS SOBRE CIDADE: UMA DISCUSSÃO SOBRE O

ENSINO DE ARTE1

Ana Inez Kienen Schreiner 1

RESUMO

Este artigo, intitulado Portfólios sobre cidade: uma discussão sobre o Ensino de Arte, construiu-se a partir da elaboração e aplicação de projeto de intervenção pedagógica, subsidiado pela Unidade Didática, bem como de uma respectiva análise. A temática proposta foi cidade, por seu caráter múltiplo. Sendo assim a problemática estabelecida foi ‘em que medida um roteiro de produção e procedimentos artísticos, da fotografia ao desenho e à gravura, pode contribuir para a percepção de alunos do Ensino Fundamental, do 9º ano, sobre a cidade com ênfase em sua dimensão plástica, e presente na configuração formal do desenho das arquiteturas? ’ Com o objetivo de construir portfólios com imagens, textos e fotografias, desenhos e gravuras, com narrativas acerca das percepções e das memórias sobre a cidade. O trabalho compreende, projeto de intervenção pedagógica, unidade didática, tutoria em grupo de trabalho em rede, implementação do projeto pedagógico em sala de aula e elaboração de artigo, realizados nos anos de 2013 e 2014, de acordo com o Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, turma 2013, subordinado a Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), desenvolvido na área de Arte. No desenvolvimento deste texto optou-se por relacionar o projeto de intervenção pedagógica com a sua implementação e a Unidade didática com o GTR, as considerações são apresentadas a seguir com as devidas reflexões e ao final elencados as referências bibliográficas e obras consultadas.

Palavras-chave: Cidade, Arte, Portfólio.

INTRODUÇÃO

Este artigo, intitulado Portfólios sobre cidade: uma discussão sobre o Ensino de

Arte, construiu-se a partir da elaboração e aplicação de projeto de intervenção

pedagógica, subsidiado pela Unidade Didática, bem como de uma respectiva

análise. O trabalho compreende o projeto de intervenção pedagógica, a unidade

didática, a tutoria em grupo de trabalho em rede, a implementação do projeto

pedagógico em sala de aula e a elaboração de artigo, todos realizados nos anos de

2013 e 2014, de acordo com o Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE,

turma 2013, subordinado a Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED),

1 Professora da disciplina de Arte da Rede Estadual de Educação do Paraná (SEED-PR). O presente artigo foi desenvolvido sob orientação da Professora Mestre Desirée Paschoal de Melo (DEART-UNICENTRO)

desenvolvido na área de Arte, linha de estudo ‘Arte, cultura e sociedade e as

diversas teorias da Arte que estabelecem referências sobre a sua função social’, sob

orientação da Profª. Ma. Desirée Melo do Departamento de Artes (DEART) da

UNICENTRO (Campus Santa Cruz).

A implementação do projeto pedagógico aconteceu de acordo com o previsto

em cinco turmas de 9º ano do Ensino Fundamental do Colégio Estadual José de

Anchieta, no município de União da Vitória, Paraná, contabilizando 64 horas. A

escola localiza-se na Praça Cel. Amazonas, na região central do município, possui

ambientes específicos para direção, secretaria, sala dos professores, reprografia,

para acompanhamento pedagógico, para atividade docente, cozinha, cantina, sala

de recursos e de altas habilidades, para atividades de arte, uma biblioteca, uma sala

com computadores e internet com softwares livres. O corpo docente é titulado nas

diferentes áreas do conhecimento de nível Fundamental e Médio, com docentes

especializados, três mestres e um doutor, todo trabalho conta com apoio dos

agentes educacionais.

Nesse contexto escolar, foi observado em sala de aula que há entre os alunos

pouco conhecimento sobre gravura, dificuldades na evolução da representação

gráfica, o gosto pela tecnologia e pela fotografia em especial. A temática proposta foi

cidade, por seu caráter múltiplo. Desse modo foi estabelecida a problemática ‘em

que medida um roteiro de produção e procedimentos artísticos, da fotografia ao

desenho e à gravura, pode contribuir para a percepção de alunos do Ensino

Fundamental do 9º ano sobre a cidade com ênfase em sua dimensão plástica, e

presente na configuração formal do desenho das arquiteturas?’ Com o objetivo de

construir portfólios com imagens, textos e fotografias, desenhos e gravuras, com

narrativas acerca das percepções e das memórias sobre a cidade. Para isso foi

previsto um percurso no espaço urbano para fotografar a cidade com a observação

da arquitetura4, relacionando a história da cidade, estabelecendo interligações entre

desenho e fotografia, com a obtenção de gravuras por meio de um processo

alternativo: a papelogravura5, e por fim a estruturação do caderno com as produções

e percepções.

4 Para a realização do percurso solicitou-se aos pais autorização prévia. 5 Papelogravura é um método alternativo para obtenção de gravuras, onde o papel é utilizado como suporte para a matriz.

Este artigo se constituiu de análises elencadas em três momentos: o projeto e

sua implementação, a unidade didática, o grupo de trabalho em rede, e as

considerações finais.

1 O PROJETO DE INTERVENÇÃO DIDÁTICA E A IMPLEMENTAÇÃO

O projeto de intervenção pedagógica foi elaborado com vistas ao seu

contexto imediato de aplicação, com alunos do 9º ano, do Ensino Fundamental do

Colégio José de Anchieta em União da Vitória, moradores de diferentes localidades

de União da Vitória e do município vizinho Porto União, local de trabalho da

professora-pesquisadora. Antes da aplicação e durante o desenvolvimento da

intervenção pedagógica, ainda na fase de elaboração o projeto, um grupo de alunos

com sua professora foram convidados a percorrer as ruas do centro. Quando

questionados sobre o que afinal é cidade, a resposta veio simples e direta foi ‘a

cidade é o centro’. E o que significa isso? O centro geralmente é a área com mais

opções de atendimento ao cidadão (posto de saúde, setores da prefeitura,

policiamento, bancos...), casas de comércio, fluxo de sujeitos, conceitos estes

anotados a partir da reflexão com o grupo. Embora em grandes centros, como São

Paulo, não aconteça desse modo, pois são locais de fluxo intenso de sujeitos que

em certa ora são comercialmente movimentados, em outro momento exibe a

marginalidade. (Palestra com Dr. Paulo C. Garcez Marins6)

Então, como recorte nesse universo de formas e cores optou-se pelo caminho

das ‘Percepções sobre cidade e arte em portfólios’. Aproximar o antigo e o novo,

ambos na presentes na paisagem como saberes do cotidiano, entre as memórias e

a historicidade. Afinal, é na cidade que os sujeitos se elaboram, se reconhecem,

negam e afirmam suas realidades. A apropriação do espaço e o estabelecimento de

vínculos no tempo e no espaço estão ligados à materialidade e são condicionantes

dos sujeitos7.

De certo modo, as arquiteturas em suas configurações são refratárias dos

tempos, pois exibem valores estéticos e concepções de espaço, bem como o gosto 6 A palestra com o Professor Doutor Paulo César Garcez Marins (USP) sobre a revitalização do Centro Histórico de São Paulo aconteceu no dia 26 de maio de 2012 nas dependências do Museu Ipiranga. 7 Bergson, Henri (1999), a percepção evoca a memória no instante do gesto, há dialogismo nisso, o sujeito dimensiona seu universo a partir dessa vivência.

e as possibilidades e tecnologias da época. A materialidade é um condicionante dos

sujeitos, regulam suas percepções ao possibilitarem sensações corpóreas e

experiências visuais, tornadas vivências8.

O tangível da cidade de União da Vitória, Paraná, apresenta sua evolução na

edificatória. As ruas são largas e seculares desenhadas por bandeirantes e tropeiros

no século XVIII. Navegou pelo Rio Iguaçu e aportou nesta localidade o Visconde de

Taunay em uma das suas viagens desbravadoras pelos rios brasileiros. O lugar era

de índios guerreiros que resistiram em deixar as terras. No fim do século XIX, os

imigrantes se estabeleceram definitivamente. O local foi estratégico para a extração,

o armazenamento e a comercialização de madeira transportados primeiro por

vapores pelo rio e depois pelos trilhos da estrada de ferro9.

No século XX, dois momentos são marcantes na evolução das arquiteturas

locais, o primeiro com o fim da Guerra do Contestado (1911-1916) quando União da

Vitória foi oficialmente dividida ao meio, ficando uma parte para o Paraná (mantendo

o mesmo nome), e outra parte para Santa Catarina, que passou a ser chamada de

Porto União. Nessa época, a ferrovia já estava concluída e são perceptíveis

influências dos imigrantes europeus no feitio das construções; o segundo momento

trata-se da construção da Estação União10 (concluída em 1942), uma edificação

ferroviária simétrica, e é singular o modo como a linha de eixo está fincada na divisa

entre as duas cidades (e os respectivos estados). No primeiro momento é nítida a

presença do ecletismo ligado ao gosto dos imigrantes (FIGURA 1), e no segundo é

perceptível influência elegante do déco11 marcante nas linhas arquitetônicas da

estação ferroviária (FIGURA 2).

8 Rossi, Aldo (2001). Discute em ‘Arquitetura da cidade’ o caráter diverso e o modo como é dialético o agir dos sujeitos na materialidade do edificado. 9 A estrada de Ferro entre Itararé e Uruguaiana foi concluída em 1910, a Ponte sobre o rio Iguaçu em 1906. 10 A Estação União é tombada pelos municípios de Porto União, Santa Catarina, e União da Vitória, Paraná e por seus respectivos Estados, o IPHAN listou em levantamento (inventário de varredura disponível em http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=2063 acessado dia 23/11/2014) sobre o Patrimônio Ferroviário a edificação. 11 Schreiner, Ana Inez Kienen. A plasticidade e as permanências nas arquiteturas históricas de Porto União/SC e de União da Vitória/PR. Orientadora Dra. Nadja de Carvalho Lamas. Dissertação de Mestrado. Joinville, UNIVILLE: 2013.

Figura 1. Escola Professor Serapeão (1917), Fotografia: 2012. Acervo da Autora. Edificação com características ecléticas situada na Praça Coronel Amazonas em frente ao Colégio José de Anchieta. Edificação tombada pelo Estado do Paraná.

Figura 2 Prefeitura Antiga (1942), Fotografia: 2012. Acervo da Autora. Edificação construída após a Estação União com características déco situada na Praça Coronel Amazonas em frente ao Colégio José de Anchieta.

É possível perceber o legado da cultura material, e também como se

interligam os percursos urbanos e o desenhos dos mesmos sobre mapas. Juntos

contribuem com a compreensão do espaço e seus modos de representação. Ao

desenhar, linhas são trajetos que se interligam, convergem e se sobrepõe. Um

imbricado de traços que geram análises, sobre proximidade, reconhecimento e

entendimento. Que na voz dos alunos torna-se: ‘Onde você mora é por aqui?’ ‘Por

aonde vou?’. ‘Não sabia que este caminho é o mais curto para ir à escola’. Ou

‘Moramos na mesma rua.’ ‘Onde moro não aparece no mapa da cidade. Como faço

para desenhar? ’ Não se trata, apenas, de responder a todas as questões, o

exercício leva a alteridade e a historicidade, e em Arte conduz à compreensão do

conceito formal de linha, das possibilidades da abstração e da sua leitura em

imagem.

Figura 3 Aula sobre o desenho da linha e suas representações. Fotografia: 2014. Acervo da pesquisadora.

A produção do portfólio cumpriu o objetivo geral: construir portfólios com

imagens, textos e fotografias, desenhos e gravuras, desenvolver a narrativa acerca

das percepções e das memórias sobre a cidade. Sendo que os objetivos específicos

buscaram fotografar a cidade com a observação da arquitetura em um percurso

previsto, relacionar os lugares fotografados com a(s) história(s) da cidade e com

músicas, conhecer processos de criação em desenho a partir de fotografias,

elaborar gravuras com materiais não convencionais a partir dos desenhos, organizar

o portfólio de arte a partir das fotografias, desenhos e gravuras com inserção de

relatos ou outras memórias que o aluno autor considere relevantes e socializar os

trabalhos em exposição.

Porém, a quê leva a ação pedagógica, ou seja, a problemática discute: em

que medida um roteiro de produção e procedimentos artísticos, da fotografia ao

desenho e à gravura, pode contribuir para a percepção de alunos do Ensino

Fundamental do 9º ano sobre a cidade com ênfase em sua dimensão plástica,

presente na configuração formal e o desenho das arquiteturas?

A revisão bibliográfica e o aprofundamento teórico possibilitou discutir: o

conceito do termo cidade e as implicações da arquitetura; as origens da cidade de

União da Vitória; a teorização sobre desenho, fotografia e gravura; e a implicação

didático-pedagógica quanto ao uso de portfólios.

1.1 A CIDADE E AS LINGUAGENS PLÁSTICAS

Para Argan (2005, p. 73) “a cidade favorece a arte, é a própria arte”. É espaço

de manifestação da arte. A dinâmica da construção é uma ação humana sobre a

matéria, portanto uma exteriorização das concepções artísticas. E nesse ambiente

são perceptíveis os elementos plásticos que caracterizam a imagem da cidade,

linha, forma, volume, cor. A cidade é a materialidade, o volumétrico, preenchido,

caótico, fixo, geográfico, localizado, científico, mas também é o imaterial, o denso,

vazio, orgânico, fluído, volúvel, cartográfico, impreciso, artístico, antropológico.

Existe uma cidade real percebida em sua materialidade e outra ideal buscada

pela subjetividade, de algum modo, ambas se entrelaçam e são distintas como o

mundo do pensamento e dos acontecimentos. A cidade é intensa e fluída. E em

letras de músicas contemporâneas é possível perceber concepções que costuram o

imaginário e realismo da cidade, como a música ‘Depois da meia noite’, da Banda

Capital Inicial:

Dias de verão e noites de inverno A cidade às vezes é um inferno Criei então um universo onde tudo era perfeito [...]14

14 Composição Dinho Ouro Preto e Pit Passarel.

A “substância histórica é a cidade em seu conjunto, antiga e moderna”

(ARGAN, 2005, p.79) e são os sujeitos que a elaboram (ROSSI, 2001). A arquitetura

possui uma intencionalidade estética, produz e evoca memórias, narra por meio de

do desenho urbano, das formas, dos contornos volumétricos e das fachadas a

própria historicidade. O olhar dos alunos sobre a cidade evidenciou o

reconhecimento do antigo presente nas fachadas históricas. Ainda que a publicidade

identificadora do ponto comercial elimine a imagem histórica, o que geralmente é

visível no andar térreo. Então, a imagem possui dois níveis, o térreo atualizado e o

2º piso de outra época15. Rossi (2001) concorda com Argan (2005) ao apontar a

cidade como arte, e sugerem o caráter social como ponto comum entre elas. A

cidade configura concepções culturais, e estes são legados presentes nas formas

representativas das épocas em diálogo com os sujeitos.

A fotografia elimina o desconforto da falta de habilidade gráfica, mas não

exclui a importância do apuro no olhar. Quando surgiu, ela estabeleceu uma nova

linguagem16, e aí nasceu também um modo particular de perceber e interpretar o

mundo. A fotografia torna-se uma linguagem, um novo código visual (BARTHES,

1984) que implica diretamente nos modos de ver. Um fragmento do tempo

capturado, retido, enquanto imagem (pós-histórica17) permite reinterpretações.

(SONTAG, 2004, p.13).

“Fotografar é apropriar-se da coisa fotografada”, afirma Sontag (2004, p.14).

Há na imagem fotografada força, agressividade e um poder de apropriação que

cerca a ação de obter uma fotografia no instante da captura. E isso é uma fatia do

universo no tempo e no espaço (KOSSOY, 2001). Flusser (1985) afirma que a

fotografia não é um fragmento no tempo e no espaço, mas uma superfície com uma

imagem plana capturada. E que uma fotografia seria, no mínimo, um registro

espectral do mundo, e o filósofo alerta, ainda há muito o que se discutir sobre a

imagem. Olhar uma fotografia implica perceber o que lentes capturam, e entender

que nas interpretações são aplicados filtros culturais.

15 Não se aplica a todas as edificações, mas àquelas que no decorrer do tempo foram se modificando apenas no térreo e se adaptando às épocas. 16 Por volta de 1839 nasce a fotografia, Sontag (16/01/1933 – 28/12/2004) estadunidense, ensaísta, personagem da literatura americana e ativista politica. Discute fotografia e suas implicações no livro ‘On Photography’ (Sobre Fotografia), 1977. 17 Flusser (2009), filósofo tcheco radicado no Brasil (1920-1991) considera a fotografia um legado e marco histórico, pois divide a história em pré e pós-histórica, ou seja, antes e depois do registro fotográfico da cena vivida.

“A arte com que a fotografia mais se parece é a arquitetura, cujas obras

estão sujeitas à mesma inexorável ascensão por efeito da passagem do tempo;

muitos prédios e não só o Parthenon provavelmente tem um aspecto melhor como

ruínas” (SONTAG, 2004, p.94). A fotografia pode estabelecer um diálogo intenso

entre presente e passado. Pode direcionar o olhar ao enquadrar o abandono. É

possível perceber a ética por meio da imagem, onde o digno e o solene são tão

perceptíveis quanto a ruína e a decadência.

A linha em sua expressividade plástica expõe a força do desenho que

extrapola tempo, espaço e cultura. Na espontaneidade ou não do traço está o

potencial perceptivo e cognitivo humano. É elemento básico do desenho que traduz

conhecimento, possui um caráter intelectualizado e universal, assim defendido por

Derdyk (1989) e Ostrower (1991).

A gravura é uma linguagem artística reconhecida na contemporaneidade, pois

seus usos não eram, na maioria das vezes, aplicados a finalizações plásticas18. O

procedimento técnico para obtenção da gravura consiste em estudar a linha e

elaborar um desenho prévio, um estudo acerca da imagem que se deseja obter;

depois transpor o desenho espelhado para a matriz; escavar a superfície em

xilogravura ou linoleogravura, gravar em metal ou produzir uma matriz com materiais

não convencionais, finalizar de acordo com a técnica utilizada; entintar a matriz;

escolher o tipo e o formato de papel ajustados ao tamanho do desenho; e então

imprimir, ou seja, obter a gravura.

Um artista ou aluno pode reunir suas produções em portfólios e desse modo

organizar suas experiências plásticas. Hernandez (2000) sugere o ajuntamento de

produções como um modo de visualizar percursos pedagógicos e avaliar essas

ações. O trabalho artístico é um exercício reflexivo, um agir onde a intuição é tão

significativa quanto a intelectualidade. Encerrar um trabalho permite apreciar e

entender a finitude e a beleza do fazer da arte na escola ou fora dela.

18 Na década de 1950 e 60, o público e a obra de arte estabelecem novas relações, como a interatividade, e nesse fluxo de ideias há ruptura nos limites entre o comercial e o artístico, entre a elitização e o consumo popular. Andy Warhol ao burlar as regras do mundo da arte na época alargou o entendimento utilizando gravuras, fotocópias, serigrafias, rótulos, retratos de personalidades emblemáticas, funcionaram compositivamente em arranjos plásticos hoje conhecidos como Pop Art (GOMBRICH, 2010).

2 UNIDADE DIDÁTICA E O GRUPO DE TRABALHO EM REDE

A Unidade Didática consiste em um texto de apoio pedagógico fundamentado

que subsidia a ação docente. A mesma foi elaborada tendo em vista sua utilização

por professores da Rede Estadual, e em especial para a formação proporcionada no

curso on line GTR.

GTR é, de acordo com as iniciais, um Grupo de Trabalho em Rede para

formação profissional continuada do educador da rede pública do Estado do Paraná.

O formato do curso é preestabelecido e divide-se em quatro momentos, sendo: a

apresentação sobre o tipo de curso seus objetivos e exigências; as discussões

acontecem nos fóruns número ‘1’ sobre o projeto de intervenção pedagógica,

número ‘2’ que é sobre a unidade didática e no último momento as proposições e

analises dos professores participantes são postadas.

Na temática 1, o objetivo foi Socializar o Projeto de Intervenção

Pedagógica possibilitando a troca de ideias e dos fundamentos teóricos

relacionados à proposta de intervenção pedagógica. Os cursistas foram

orientados a ler o artigo Fotografia e Cidade19, a fazer um estudo sobre as próprias

cidades e a interagir no fórum da unidade. No desenrolar do fórum 1, os

participantes apontaram as características sociais, econômicas, políticas, históricas,

religiosas, das arquiteturas e cada um ao compartilhar as observações, ilustradas

com fotos, sobre suas cidades proporcionaram aos participantes conhecer um pouco

sobre cada um dos lugares, como: Curitiba, Campo Largo, Araucária, Guarapuava,

Londrina, Mallet, Castro, Ponta Grossa, Mandaguari, Santa Izabel do Oeste e

Tapira. Além das discussões sobre o teor das fotos ficou evidente a evocação de

memórias quando as imagens suscitavam comentários a partir de experiências

pessoais que foram compartilhadas. Foi difícil estabelecer os limites entre a

discussão teórica e a subjetividade das observações, pois ambas são relevantes.

Na temática 2, para Socializar a Produção Didático-pedagógica,

possibilitando a troca de ideias e dos fundamentos teóricos e metodológicos

relacionados à Produção, os participantes foram solicitados a refletir sobre as

questões a seguir: a) Você usaria atividades propostas em suas aulas, por quê, e

como desenvolveria o trabalho? b) Na sua concepção, qual atividade se destaca? c)

19 POSSAMAI, Zita Rosane. Disponível em http://www.artcultura.inhis.ufu.br/PDF16/Z_Possamai.pdf. O

artigo trata das relações dialéticas, históricas e plásticas entre a cidade e a fotografia.

A qual nível escolar indicaria a Unidade Didática? d) Caso já tenha realizado um dos

exercícios propostos, relate essa vivência, ou compare com propostas similares. No

fórum esse roteiro levou a uma variedade de proposições envolvendo fotografia,

desenho, cidade, memórias, patrimônio cultural. Percebeu-se nos textos, entre as

linguagens abordadas preferência pela fotografia e pelo patrimônio cultural material.

E ainda oportunizou integração entre docentes, como a que se apresenta a seguir:

... já que estamos na mesma cidade a gente podia desenvolver algumas das ideias com as nossas turmas [...] O que você acha? A mesma proposta com a mesma série e abordagens diferentes, você com a música e eu com a fotografia? Ou, algo semelhante a isso, depois a gente podia montar uma exposição desse material com as duas escolas trabalhadas [...]20

No depoimento acima é evidente que a atividade proporcionaria um

intercâmbio cultural e artístico entre escolas. São ações pedagógicas que promovem

o enriquecimento da vivência artística dos alunos.

Quanto ao nível de escolaridade ao qual se destina a Unidade Didática, as

respostas dos docentes foram simples, como, a indicação da faixa etária a partir do

9º, e análises onde houve um deslocamento e liberdade para interferir. O

participante apropriou-se e propôs desdobramentos com ideias ampliadas. Seguem

os depoimentos:

Professora 2:

Sobre a aplicabilidade da intervenção proposta, na minha percepção, todas as atividades podem ser aplicadas em sala de aula tanto para o ensino fundamental, quanto para o ensino médio, a adaptação acontecerá de acordo com aos conteúdos estruturantes de cada série/turma. Em relação sobre como aplicar em sala de aula, pode ser seguida como no roteiro da intervenção como pequenas modificações de metodologia quanto a materiais.21

E a professora 3 comentou que:

Em meu ponto de vista, considero a atividade que aborda a música como a mais relevante, pois em um momento em que os professores de arte precisam trabalhar com a música no contexto escolar (Lei 11.769 - 2008), muitos ainda se veem sem opção, uma vez que sua formação não é específica nessa linguagem; considero essa proposta como uma oportunidade de despertar o interesse do aluno através de uma linguagem

20 Relato de professora participante 1 do GTR. Texto adaptado ao artigo. Os nomes dos participantes (no total 18) não foram citados para preservar a privacidade. 21 Relato de professoras participantes 2 e 3 do GTR. Texto na íntegra.

tão explorada pelo mesmo, e também de atender o objetivo que a Lei nos impõe. Sem dizer que, o universo da música nos permite aproximarmos o aluno do conteúdo, pois se trata de uma estratégia que faz parte de seu universo diário.

Em sua percepção, a professora 3 discute a formação superior em Arte, pois

os professores têm diferentes habilitações, em Artes Plásticas, Artes Visuais,

Música, Teatro, Dança, Arte-Educação além das Licenciaturas com habilitações em

áreas específicas como Desenho ou Escultura. No Ensino Básico de Arte estão

compreendidas as modalidades de Artes Visuais, Música, Teatro e Dança. Sendo

que cada uma delas se desdobra em diferentes linguagens e gêneros. E é

importante considerar as hibridações em arte, ou seja, manifestações que costuram

os diferentes modos de arte.

Na temática 3, o objetivo foi socializar a aplicabilidade das ações de

Implementação do Projeto de Intervenção na Escola. E no respectivo espaço de

discussão, o Fórum 3, tratou-se do uso de tecnologias e do arquivamento de

informações, da utilização de fotos e músicas em celulares. Nesse momento

considerou-se pertinente orientar os alunos a utilizarem os equipamentos eletrônicos

que estão à disposição para aprimorar os estudos com pesquisas.

Nos textos dos participantes, avaliando o Projeto de Implementação

Pedagógico, notou-se a ênfase no aprofundamento na educação do olhar, pois, há

entre as atividades propostas na Unidade Didática momentos de apreciação

estética, semelhantes ao percurso pela rua a pé, enfatizando a observação das

formas e da plasticidade das edificações na cidade.

A cidade é um espaço múltiplo, caótico, denso, fluído e lúdico, não é objetivo

do presente trabalho iludir ou menosprezar os problemas urbanos, mas expor para

os jovens a estética urbana da cidade como legado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A experiência pedagógica no PDE, turma 2013, possibilitou um entendimento

ampliado da prática fundamentada na pesquisa docente e também das implicações

que uma prática pedagógica limitada acarreta, pois, a profundidade do conteúdo se

perde no vazio da ação. No ensino de arte as aulas são escassas e cada escola

pode fazer sua grade curricular, sendo que o conteúdo é proposto pela SEED e se

divide em modalidades (Teatro, Dança, Artes Visuais e Música), unidades

autônomas e interligadas, cada qual com suas questões teóricas, históricas e

práticas artísticas.

A concomitância entre a implementação do projeto (cinco turmas de 9º) e o

Grupo de Trabalho em Rede, não permite ao docente tutor, falar com propriedade da

implementação do trabalho durante o GTR, pois este ainda não foi concluído. E

considerando que há ainda carga horária em sala de aula (com apenas 25% de

afastamento para a pesquisa docente), o trabalho fica comprometido, pois cada qual

exigente tempo e atenção específica. A alternância das atividades acima descritas

permitiria ao docente (enquanto tutor GTR-PDE) reflexão sobre a prática. Isso

alimentaria a discussão sobre o que foi realizado, ao invés de discutir o porvir. Ainda

que o ensino a distância seja um requisito do PDE, para ser tutor em Ensino a

Distância é necessário ter perfil que vai além da formação técnica.

A elaboração de portfólios, incluindo fotografias, desenhos, músicas e

gravuras proporcionou a ampliação do repertório, frente ao desconhecimento do que

vem a ser um portfólio e a gravura25. O roteiro a pé pelas ruas da cidade motivou os

alunos e alargou o olhar: observou-se que notaram o segundo nível de algumas

edificações como um vestígio de outra época, e as características ecléticas

(atribuídas aos imigrantes) e déco (influência da arquitetura da Estação União -

1942)26. A fotografia incluiu o gosto dos adolescentes por autorretratos, fotos com

amigos e enquadramentos espontâneos, alguns, no entanto esteticamente

planejados com a cidade ao fundo. Ao elaborar os desenhos nem todos haviam

providenciado as impressões de fotografia, então foram compartilhadas imagens e

um álbum digital foi disponibilizado pela professora/pesquisadora, incluindo fotos

recentes e históricas.

Alguns optaram por elaborar o desenho que na foto parecia mais fácil, outros

por serem os autores fotografia e houve também a identificação pessoal com a

arquitetura, como lugares de memória27, como a antiga escola ou a ponte. As

gravuras surgiram a partir desses desenhos, o período de elaboração da matriz foi

demorado e a impressão com tinta off set, de gráfica, precisou que o procedimento

de entintar e imprimir fosse em circuito e colaborativo.

25 A gravura segundo o depoimento de discentes é a imagem impressa no livro, informação que está correta, mas limitada de acordo com o conceito de gravura. 26 Ver referência anterior nº 10. 27 Nora, Pierre. Em seu artigo evidencia a existência de lugares de memória.

A montagem do portfólio aconteceu reunindo o material como já havia sido

combinado com o grupo. O portfólio permitiu que o aluno visualizasse seu percurso

e avaliasse essa trajetória, em depoimento, os alunos evidenciaram que a prática

pedagógica desenvolveu suas habilidades artísticas e também o convívio social.

O relato aqui apresentado é uma proposição que permite reinterpretações,

uma metodologia e abordagem com seus percalços que traz em seu bojo o prazer

de ensinar, aprender e fazer arte.

REFERÊNCIAS

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