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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

A INFLUÊNCIA DA IGREJA CATÓLICA UCRANIANA NA FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DOS JOVENS

Autor: Marcos Vinicio dos Santos

1

Orientador: Dr. Mario Souza Martins2

RESUMO

Prudentópolis é a maior colônia de imigrantes ucranianos do Brasil e a cultura ucraniana tem forte influência na vida das pessoas e da cidade. A religiosidade é marcante tanto na cidade como nos bairros do interior mantendo as tradições e influenciando na vida das pessoas. Nos últimos anos vive-se uma crise de identidade dos povos descendentes de ucranianos, considerando que os jovens estão cada vez participando menos das atividades culturais, muitos não aprendem nem mesmo a língua de seus pais, a missa que antes era somente no rito ucraniano, precisa ser intercalada em português. Desse modo é importante entender essa crise de identidade e pesquisar se realmente ela esta acontecendo com os descendentes de ucranianos de Prudentópolis e qual seria a alternativa para que a cultura e a tradição se mantenham entre os povos, sendo que entender o papel da religião na construção ou não da identidade deste povo é um grande desafio. Portanto, o objetivo da pesquisa foi analisar a influência da igreja católica ucraniana de Prudentópolis na formação da identidade dos alunos do Colégio Estadual Barão de Capanema e identificar as possibilidades de trabalhar essa influência em sala de aula, utilizando como estratégias de ação oficinas, visitas técnicas e pesquisas sobre a cultura e religiosidade dos descendentes de ucranianos de Prudentópolis. Enquanto educador e como professor de História deve-se trabalhar em sala de aula como a cultura e a religiosidade ucraniana interferem na construção da identidade dos jovens.

Palavras-Chave: Religião. Cultura. Ucranianos. Identidade. Jovens.

ABSTRACT:

Keywords:

1 Especialista em Ensino de Geografia e História, graduado em Licenciatura em História, professor da rede

estadual de ensino do Colégio Estadual Barão de Capanema – Prudentópolis-PR. 2 Docente de Sociologia do Departamento de História da Universidade Estadual do Centro Oeste/ Campus de

Irati – UNICENTRO.

1 INTRODUÇÃO

Vive-se uma profunda crise de identidade no mundo contemporâneo, o que

antes era uma certeza, hoje é uma dúvida, o que era imutável, tornou-se mutável,

conceitos mudam e hábitos também. No entanto, o ser humano continua precisando

do ser humano para viver, a depressão parece ser o mal do século, pessoas sentem-

se solitárias no meio da multidão, culturas são esquecidas e culturas são

apropriadas por outras culturas no mundo globalizado e a grande pergunta que não

quer calar é: quem eu sou? Como eu me identifico? E essa pergunta tem respostas

de acordo com o ambiente em que estou. Na escola sou aluno, professor; no culto

sou fiel, no trânsito sou motorista ou pedestre, sou pai, filho, empregado e patrão,

mas como me identifico como ser humano? Quem eu sou afinal? A que grupo

pertenço de fato? São questionamentos muito atuais, e num povo que deixou para

trás seu país, sua pátria e tomou o Brasil como seu país esses questionamentos são

ainda maiores.

Prudentópolis é a maior colônia de imigrantes ucranianos do Brasil e a cultura

ucraniana tem forte influência na vida das pessoas e da cidade. A religiosidade é

marcante tanto na cidade como nos bairros do interior onde as celebrações

acontecem na própria língua e envolvem muitas pessoas, também se mantêm a

tradição e a alimentação típica é ainda presente nas famílias, principalmente em

datas festivas, onde preparam-se pratos típicos ucranianos, tais como borsthe,

holopeti, perovê, cutia, etc. Com isso esse povo imigrante que mora aqui consegue

se identificar e manter-se unidos.

A cultura ucraniana é muita rica por toda sua história e trajetória cultural de

um povo que passou por inúmeras provações e tinha na arte e na cultura um meio

de manter suas tradições e fugir da opressão em que viviam. Porém a valorização

da cultura ucraniana nos dias de hoje é uma forma de valorizar a identidade de um

povo, que preserva suas tradições e manter uma identidade cultural e religiosa que

influencia muito na vida em sociedade.

Os ucranianos, um povo detentor de um milênio de história, cultura, língua, personalidade e tradições, habitam o sul da Europa Oriental – o território situado ao norte do Mar Negro, com uma área de 740.000 Km2. A população desta área é calculada em mais de 50 milhões. (…) Oprimidos por todos os meios pelos ocupantes da sua terra, muitos ucranianos procuraram transferir-se para outros países, onde

existisse liberdade, para aí construírem seus novos lares. O ponto de partida da referida imigração é o ano de 1895, porque foi neste ano que chegou ao Brasil a primeira leva de ucranianos vindos da Galícia (Ucrânia Ocidental) em busca das terras do sul do Brasil (MACHULA, 1988, p.02).

A cultura ucraniana ainda se mantém valorizada principalmente pelas

manifestações da religião, que tem forte influência na vida e no cotidiano das

pessoas que geram duas práticas: por um lado, acaba tornando a pessoa alienada

politicamente e mesmo impõe conceitos ideológicos, embora a riqueza das

manifestações rituais tenham papel importante na manutenção da língua e dos

várias costumes, e tradição em algumas comunidades, que fazem questão de

manter tudo como era, pelo simples fato de manter, muitas vezes, ou na maioria sem

questionar o porquê de ser assim, mas pelo fato simples fato de querer manter e

conservar a sua identidade étnica e cultural ucraniana.

…os descendentes de ucraniano tendo consciência de que para

manter a religião e cultura é preciso manter a língua, trabalham incansavelmente para que todos tenham acesso a sua língua, inclusive aqueles que não têm a mesma origem étnica, mas por ser simpatizante da comunidade também é convidado a aprender a língua de origem. O desejo desta comunidade é manter a sua cultura e, sobretudo, a sua religiosidade nos moldes em que foram criados os seus pais. Para tanto, é preciso ensinar o pouco que sabem e como eles mesmo dizem não abandonar a “terra-mãe.”, ou seja, a língua (MEZAVILA, 2006, p.84).

Paralelamente a essa valorização cultural e religiosa da Ucrânia existe um

histórico de domínio e alienação que interferem na formação da identidade histórica

e cultural da comunidade prudentopolitana. Se compararmos Prudentópolis, por

exemplo, com a Colônia Alemã localizada em Guarapuava, município próximo, a

cidade permaneceu atrasada tanto econômica quanto politicamente. Esse atraso

pode ser identificado quando pensamos na classe política que domina a região,

onde poucos descendentes de ucranianos governaram ou governam o município,

embora, sejam maioria numericamente, e deve-se considerar ainda o baixo índice de

IDH da cidade.

Uma vez que a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é

interpelado ou representado, a identificação não é automática, mas pode ser ganha

ou perdida (HALL, 1990, p. 21).

Acontece que nos últimos anos vive-se uma crise de identidade dos povos

descentes de ucranianos, os jovens estão cada vez participando menos das

atividades culturais, muitos não aprendem nem mesmo a língua de seus pais, a

missa que antes era somente no rito ucraniano, precisa ser intercalada em

português, e todo o esforço e força principalmente da Igreja vem sendo perdida,

principalmente entre os jovens que saem das comunidades do interior, que se

tornam citadinos e vão para a cidade ou até mesmo aqueles, que migram para

outras cidades, estes praticamente abandonam, em sua grande maioria, a cultura

ucraniana e são absorvidos pela cultura brasileira dominante. A igreja resiste em

promover uma mudança em sua estrutura, principalmente por saberem seus

membros que é pela tradição que ainda mantém a população a ela submetida.

Também, a escolinha de ucraniano não consegue ter muitos alunos, o grupo

folclórico Vesselka que é muito forte com apresentações até mesmo fora do país

acaba recebendo integrantes que muitas vezes não são de descendência ucraniana

e isso parece ser o principio de uma crise de identidade, pois as velhas identidades

que estabilizaram o mundo social estão em declínio. Novas identidades estão

surgindo, deixando o individuo fragmentado e dividido entre continuar mantendo a

tradição ou se render a cultura local, da televisão, da internet e dos meios de

comunicação de massa.

Entender essa crise de identidade e pesquisar se realmente ela está

acontecendo com os descendentes de ucranianos de Prudentópolis, destacando

qual seria a alternativa para que a cultura e a tradição se mantenham entre os povos

sem exercer um poder ideológico na construção da identidade deste povo é um

grande desafio.

Tentar mapear a história da noção de sujeito moderno é um exercício extremamente difícil. A idéia de que as identidades eram plenamente unificadas e coerentes e que agora se tornaram totalmente deslocadas é uma forma altamente simplista de contar a estória do sujeito moderno (HALL, 1990, p.24).

Hoje, manter a tradição para um povo que veio da Europa no contexto de

guerra mundial e que tinha lá um histórico complicado relacionado a identidade é a

forma de conseguir manter o sentimento de cidadania, de pertencimento a um grupo

e a uma nação e para os país conseguirem passar isso para os filhos é sentimento

de dever cumprido perante os avós que de lá vieram, perante a religião e perante a

própria sociedade, e esse sentimento está posto a prova, pois não existe uma

identidade que promova a união entre os descendentes, com o passar do tempo, os

costumes vão se modificando, e se unindo a outros valores e costumes, ainda mais

na atualidade em que a globalização submeteu a maioria das sociedades.

A religião tem uma tríplice função: para toda a humanidade, serve de consôlo às privações impostas pela vida: para a grande maioria dos homens, é um estímulo à aceitação emociaonal de sua situação de classe; e para a minoria dominante, é um alívio dos sentimentos de culpa provocados pelo sofrimento daqueles a quem oprime (FROMM, 1965, p. 24)

Pensando nessas questões expostas, desenvolvemos o trabalho de

intervenção “A influência da igreja católica ucraniana na formação da identidade dos

jovens” como parte das atividades do Programa de Desenvolvimento Educacional –

PDE3. O objetivo foi analisar a influência da igreja católica ucraniana de

Prudentópolis na formação da identidade dos alunos do Colégio Estadual Barão de

Capanema e identificar as possibilidades de trabalhar essa influência em sala de

aula.

A intervenção foi realizada tendo como público alvo da pesquisa os alunos do

Colégio Estadual Barão de Capanema, em duas turmas do segundo ano do Ensino

Médio, no período de janeiro a junho de 2014, no Colégio Estadual Barão de

Capanema - Ensino Fundamental e Médio, localizado na zona urbana do Município

de Prudentópolis - PR.

Para tanto, o trabalho foi desenvolvido dentro de uma ótica interacionista,

onde professor e aluno tem a oportunidade de interagir com a cultura, com a história,

o que lhes proporciona a inserção no meio cultural e histórico. Para o trabalho de

intervenção, além do levantamento bibliográfico com intuito de buscar subsídios

téorico-metodológicos, atividades desenvolvidas em sala de aula, também as

discussões decorrentes da nossa participação no Grupo de Trabalho em Rede -

GTR com tutoria para professores da rede estadual de ensino, como também

contamos com a unidade didática, preparada para a intervenção.

3 Trata-se de uma política pública que estabelece diálogos entre os professores da Educação Superior e os da

Educação Básica, por meio de atividades teórico-práticas orientadas, tendo como resultado a produção de

conhecimento e mudanças qualitativas na prática escolar da escola pública paranaense (Fonte:

http://www.diaadia.pr.gov.br ).

2 DESENVOLVIMENTO

2.1 A RELIGIOSIDADE E SOCIEDADE

Marx destaca que as relações sociais são fruto dos modos de produção, onde

a medida que o homem está envolvido na produção se relaciona com outras

pessoas. Desse modo, Silva [et al] (2012) para ele as mudanças sociais não são

fruto de idéias e valores humanos mas estimuladas pelas mudanças econômicas e

culturais, onde destacam-se os movimentos sociais resultado das lutas de classes,

ligadas a questão social e econômica.

Para Marx a historia se desenvolve na separação do homem e da natureza,

mas é preciso buscar a unidade entre natureza e história, ou entre natureza e

sociedade, pois a natureza não pode ser vista como algo exterior a sociedade. Esta

relação é um produto histórico e para ele a força motivadora dessa interação é o

processo de trabalho.

Analisando os pensamentos de Marx, a natureza e suas leis subsistem

independentemente de consciência e desejos humanos, mas como a natureza é

dialética na interação com o homem é importante para a transformação social e do

trabalho (SILVA [et al], 2012).

Nessa perspectiva, Marx coloca que os componentes da ação ou da

identidade dos indivíduos que não resultem ou estejam vinculados com a sua

inserção no processo produtivo não tem sentido para o desenvolvimento do

indivíduo. Nesse contexto, a religião surge como um componente da identidade dos

indivíduos interferindo na construção ideológica das comunidades.

Em se tratando de ideologia, Karl Marx destaca que ela pode ser considerada

como um instrumento de dominação que age através do convencimento,

contribuindo para a alienação da consciência humana e mascarando a realidade.

Isso acaba aparecendo durante a implementação do Projeto no Colégio, onde

percebemos a grande influência da Igreja na comunidade, na vida pessoal

(casamentos, batizados, dias santos) e posteriormente até mesmo na questão

politica.

Haas (2014) explica que a devoção religiosa segundo Marx, na medida em

que não é um componente essencial das identidades individuais está inclusa no

status residual, sendo inconsistente com a identidade essencial dos indivíduos,

sendo uma forma ideológica de alienação.

Nesse contexto, para Marx a religião não é propriamente objeto de seu

estudo, mas de condenação, onde apresentava uma filosofia revolucionária que

procurava demonstrar as contradições internas da sociedade de classes e as

exigências de superação.

Segundo Gomes (2011), Karl Marx define a religião como uma projeção de

nossa realidade terrena para um plano superior metafísico. Desse modo, a religião é

um mundo fantástico que é criado pela mente humana que torna fenômenos naturais

com um ar sobrenatural. Para ele, significa que religião com o seu Deus não passa

de uma mera ilusão, mas que em Prudentópolis tem uma importância muito grande,

ou seja, tem influência direta na vida dos cidadãos.

Um fator que provavelmente influenciou o pensamento de Marx em sua crítica

a religião, além do papel da religião no período em que viveu, foi a sua história de

vida, considerando que ele viveu num ambiente em que os cidadãos não podiam

exercer as profissões se não fossem cristãos.

A família de Marx era de origem judaica, seu pai aceitou o batismo na igreja luterana, simplesmente para exercer sua profissão. A imposição externa de um credo religioso certamente contribuiu para orientar religiosamente o espírito de Marx, que, com toda a probabilidade, foi ateu desde a mocidade (ROVIGHI, 1990, p. 78).

Analisando a concepção de Marx sobre a religião, constata-se a influência do

pensamento filosófico de Feuerbach. Segundo Gomes (2011), Feuerbach destaca

que Deus é um reflexo do próprio homem, uma projeção, uma inversão dos desejos

humanos, um produto no qual o homem finito precário e dependente projeta seus

desejos e possibilidades de perfeição.

Dessa forma, Marx viu na ideologia de Feuerbach uma contribuição para

acabar com a farsa que é a religião, encontrando nas suas palavras o forte

instrumento que tanto precisava para a libertação do homem de uma ideologia

religiosa que ele considerava alucinante (NOGARE, 1990).

Gomes (2011) destaca que a religião para Feuerbach ensinava que o homem

deveria rejeitar o sensível tendo em vista o imaterial, abstrato, aceitar o sofrimento, a

exclusão, deveria negar a si próprio, ou seja, perder a sua identidade visando o

próximo, buscando uma atitude passiva diante de seus opressores tendo assim uma

atitude de pseudohumildade.

Por fim, coloca que Marx acreditava que a religião alienava o povo como se

faltasse algo nesta vida que teriam na eternidade. A religião transformava os

homens em marionetes fazendo-os cumprir sem reclamar ou blasfemar as leis que

lhes foram impostas por Deus, pela moral e por uma sociedade decadente (GOMES,

2011). A autoridade que o Padre tem, junto aos fiéis, é enorme, ele é reverenciado

como um enviado de Deus, infalível e por isso tem enorme poder nas decisões dos

homens comuns e enorme influência.

Considerando que o movimento da história é um processo de construção,

satisfação e reconstrução contínua das necessidades humanas, Haas (2014) explica

que a relação entre o indivíduo e o seu ambiente material. Quando pretende-se

estudar a evolução da sociedade humana deve-se partir do exame dos processos

concretos da vida social que constitui condition sine qua non da existência humana.

Considerando que hoje, vive-se numa sociedade que busca pelo

transcendente e onde o número de religiões e correntes espirituais tem crescido de

modo exagerado, as pessoas fazem da religião um esconderijo, um abrigo, através

do qual elas podem negar ou esconder suas misérias. Outros a fazem como

instrumento de exploração, em que o dinheiro extorquido de uma classe necessitada

constitui o crescimento e enriquecimento de outros (GOMES, 2011). A força da Igreja

Ucraniana em Prudentópolis faz com que outras religiões não católicas não tenham

tanta força e poder de coesão, ela acaba absorvendo as necessidades de seu povo

no tocante ao transcendente e às respostas que eles tanto precisam para as dúvidas

e desalentos próprios da vida.

Em se tratando da religião, Durkheim (1996) destaca que se se a religião

fosse falsa, não conseguiria sobreviver ao longo da história humana sendo a

expressão de algo real e duradouro. Para ele, considerando a perspectiva

sociológica, não existe religião que seja falsa, tendo em vista que trazem respostas

às condições dadas da existência humana mas isso não isenta da busca pela

compreensão das necessidades humanas e a influência da religião na vida em

sociedade.

O cuidado que se deve ter, principalmente quando se trata essa temática em

sala de aula é fugir da alienação e dominação, discutindo com os alunos sua

importância e deixando claro até onde vai sua influência na vida das pessoas e foi

esse o objetivo de implementação do trabalho em sala de aula e mesmo do GTR.

2.2 A RELIGIOSIDADE NA CULTURA UCRANIANA E A CONSTRUÇÃO DE

IDENTIDADES

A vinda dos ucranianos para o Brasil deu-se em três grandes etapas: a

primeira situa-se no final do século XIX, quando camponeses da Galícia e da

Bukovina, devido a superpopulação, deixam o seu país na tentativa de encontrar

sorte melhor. Uma grande leva chegou ao Brasil em 1895; a segunda etapa ocorreu

após a Primeira Guerra Mundial e os motivos eram exclusivamente políticos; a

terceira etapa ocorre após a Segunda Guerra Mundial.

Com a chegada de mais de 250 famílias ucranianas no município de

Prudentópolis, entre os anos de 1901 e 1907, trouxeram a cultura e as tradições e a

esperança de viver dias melhores. Sua vinda foi difícil pela opressão vivida e

precisaram de muita força moral e espírito desafiador para iniciar sua vida numa

terra desconhecida (MACHULA, 1988).

O clima semelhante ao da Europa e a vontade de viver e ser feliz trouxe

ânimo aos imigrantes que iniciaram a colonização e serviu de estímulos para seus

filhos, netos e outros descendentes. A cultura foi preservada e as tradições também,

porém a identidade do povo ucraniano ficou limitada pela influencia religiosa.

Centro de colonização e abrigo de considerável falange de imigrantes ucranianos, era muito natural que em Prudentópolis se construísse um núcleo religioso e a cujo culto pertencessem seus colonizadores. Isto se operou com a vinda do primeiro missionário do rito oriental - ucraniano, Pe. Silvestre Kizema, que chegou a Prudentópolis em 6 dejulho de 1897, e demais sacerdotes do mesmo rito que sucessivamente vieram da Ucrânia (MACHULA, 1988, p. 01).

Dessa forma Prudentópolis recebeu os imigrantes ucranianos e toda a sua

cultura que foi repassada de geração em geração focando na valorização não só

pelo patrimônio histórico-cultural, mas pelo fortalecimento da identidade de um povo

muito oprimido no passado onde a igreja era o refúgio. Os imigrantes não tinham

representatividade política então os padres vindos da Europa traziam o modelo de

cidadão que deveria ser desenvolvido, o tipo ideal. O cidadão era moldado de

acordo com o que a igreja pregava e quem fosse diferente deveria ser reprimido

(MEZAVILA, 2006). Ai reside um problema que precisa ser discutido, o fato de que a

Igreja não deve moldar o cidadão e ainda a aceitação do outro, do diferente, no caso

de hoje, do homossexual, do gay, do negro que não fala e não entende o idioma

ucraniano, a Igreja que liberte e não que oprima.

Hoje o número de descendes de ucranianos é próximo a quinhentos mil os

quais estão estabelecidos no Paraná, Santa Cataria e São Paulo principalmente, os

imigrantes quando vieram trouxeram consigo antecedentes históricos que foram

sobrepostos pela influencia da religião.

A religião, a cultura e a Igreja, imprimem limites, estabelecem fronteiras e

afetam a construção da identidade do povo ucraniano, mas não impermeabilizam o

grupo de influências externas.

Para os descentes de ucranianos, a religião, o rito, a Igreja (diferente do que

para os antigos que vieram da Ucrânia) são estruturas flexíveis, permeáveis,

ajustáveis conforme seus interesses, mas isso não exime da alienação religiosa

vivida por muitas pessoas, as quais continuam acreditando em vários absurdos e

vivendo de forma preconceituosa.

Hoje a maneira como os descendentes pensam a identidade, o rito e a Igreja

são diferentes daquela das instituições e das lideranças religiosas e culturais. Para

as pessoas das colônias ou dos núcleos urbanos, o rito abre concessões e se ajusta

de acordo com as necessidades religiosas de cada um. Ao passo que para as

autoridades religiosas ele é impermeável e codificado e nada pode ser adaptado em

nenhuma circunstância.

A religiosidade faz parte de um patrimônio cultural importante, porém o que se

vê é uma alienação e uma crise de identidade. Quando se fala na disciplina de

História e na necessidade de trabalhar com o cotidiano do aluno e a influência da

religião na vida das pessoas.

O conhecimento e o estudo da arte, da cultura e das raízes locais contribuem para a revitalização da identidade cultural dos alunos e a reflexão sobre suas possibilidades na sociedade. Portanto, a arte produzida localmente oportuniza a estudantes e educadores compreender melhor a dinâmica da vida a sua volta, examinando as dinâmicas econômicas, políticas e educacionais presentes em sua cultura (GEVAERD, 2011, p.35).

As igrejas ucranianas acabam sendo locais riquíssimos em material

histórico e cultural e estão disponíveis como fonte de pesquisa para toda a

comunidade, porém, lado a lado com essa riqueza cultural existe uma organização

social de dominação da igreja que interfere na identidade cultural dos ucranianos.

Trabalhar o ensino contextualizado é aproveitar o patrimônio cultural e histórico

acessível a toda a comunidade, levando para a sala de aula a discussão da

influência da religião na formação da identidade dos alunos.

Ao entrar num templo ucraniano, depara-se com a inexistência de esculturas ou estátuas de Cristo, dos Santos, ou de Maria, mas é possível perceber os ícones (pinturas religiosas), que são dotados de simbologias específicas dispostas nas posturas das mãos das imagens, objetos e cores selecionados para significação diferenciada. Na maioria das igrejas, tem-se o iconostás, uma grande divisória, rico em imagens de Cristo e Apóstolos, que delimita o espaço da igreja reservado ao sagrado, o Santuário, e os fiéis. Durante a cerimônia, há momentos em que o sacerdote incensa o ambiente, aromatizando passagens específicas da liturgia, esfumaçando o ambiente, possibilitando também a alteração no campo da percepção visual (BABBAR, 2008, p.35).

Dessa forma a riqueza particular das igrejas ucranianas e todo patrimônio

que elas encerram são fontes de pesquisa importantes, ,mas não se podem pensar

só em manter e preservar o capital religioso-cultural sem ter em vista a sua

renovação e sua reconstrução é correr o risco de perdê-lo definitivamente diante da

efemeridade das coisas, da celebridade e fugacidade do tempo.

Vive-se em um tempo em que a tradição, a permanência do passado

distante não é mais suficiente para orientar a conduta das pessoas. Urge a

necessidade de fazer uma nova leitura, uma nova reinterpretação, cuidadosa e séria,

evitando banalidades da tradição e de todo capital litúrgico, tendo em vista a

realidade, pois aqui é nossa casa definitiva. Quando o mundo se altera, a religião

tem que se transformar (SANTOS, 2011)

Analisar e pesquisar a identidade do povo ucraniano de Prudentópolis e o

papel da religião na preservação ou não dessa identidade envolve conhecer seus

ritos, liturgia, eventos culturais promovidos para fazer um elo de como os

descendentes de ucranianos agiam e como agem hoje, dentro de uma análise

histórica da influência da religião nos ucranianos de 2014, como eles se identificam

e analisando a importância do resgate da História da Imigração Ucraniana e a

religiosidade desse povo que colonizou, trouxe progresso e desenvolvimento para o

município.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

As atividades realizadas com a turma público alvo da pesquisa tiveram uma

participação representativa dos alunos, sendo iniciado com um levantamento prévio

do conhecimento dos alunos sobre a religião ucraniana o que contribuiu para

conhecer mais sobre a visão deles sobre religião e cultura ucraniana.

Os professores que analisaram a proposta durante o GTR destacaram que o

assunto é polêmico por ser desenvolvido numa comunidade onde a religião domina

e interfere nas relações sociais, porém, citaram que a forma a proposta com a

pesquisa dos rituais religiosos e a abordagem critica em sala de aula, foram os

pontos fortes da implementação, muitos destacaram que a riqueza do rito e da

própria religiosidade deve ser mantida e que a religião deve ser libertadora.

A proposta de trabalhar o estudo do meio, o conhecimento sobre a influência

cultural e religiosa na vida dos alunos e na construção da sociedade, ajudam a

construir disciplinas mais dinâmicas e vivas. Aproveitando as potencialidades e

possibilidades para construção do conhecimento, a visita ao Museu do Milênio

ajudou os alunos a compreenderem mais sobre a história dos imigrantes ucranianos

que chegaram a Prudentópolis, fazendo um resgate histórico e religioso.

Considerando a necessidade de trabalhar os conteúdos de forma

contextualizada, conforme destaca Pereira (2010) os alunos tiveram a oportunidade

e conhecer o monumento do poeta Taras Chevtchenko (1813) e a Igreja Matriz de

São Josafat, a pesquisa durante a Sexta Feira Santa com um ritual todo especial e

durante a Páscoa as fotos tiradas no sábado durante a benção dos alimentos,

complementando esse trabalho com pesquisas no laboratório de informática

montando um mural de noticias sobre a imigração ucraniana no Brasil, no Paraná e

em Prudentópolis.

O resgate das experiências dos alunos durante as atividades levou a

compreender o que Marx destaca sobre a religião e seu poder opressor. A

comunidade ucraniana é fortemente influenciada pela religião, em todas as suas

práticas sociais. Nas produções dos alunos foi possível identificar traços marcantes

da religião ucraniana na cultura, nas atividades cotidianas e até nas relações do

trabalho.

Para o trabalho de análise e pesquisa sobre a religiosidade e os ucranianos a

proposta foi trabalhar com a palestra de um religioso (padre) da Igreja Ucraniana

dentro da temática da religião e a descendência ucraniana. Nessa atividade os

alunos tiveram uma fala com o padre Efrem e uma fala com o Sr. Dirceu Belo. Foi

um momento interessante pela oportunidade de comparar a visão de um religioso

ucraniano e de um descendente de ucraniano que visitou várias vezes a Ucrânia e

trouxe aos alunos um enfoque da diferença da influência da religião no país de

origem dos ucranianos e na cidade de Prudentópolis e a visita foi bem no momento

em que Dirceu havia regressado da Ucrânia nos dias em que estava acontecendo

vários protestos que culminaram com a queda do Presidente.

As discussões em sala de aula demonstraram um novo panorama sobre

religião e sociedade, sendo enriquecidas pelos registros teóricos e fotográficos de

eventos religiosos que são frequentados pelos ucranianos, como Sexta feira Santa e

os Kossacos, soldados de cristo, a benção de alimentos, as hailcas (danças

ucranianas pós-páscoa) o Corpus Christi. Foi constatada através das pesquisas que

muitos jovens participam nesses eventos religiosos, muitos deles por influência e

cobrança da família, constatando a forte influência da religião na vida social das

pessoas.

Com a conclusão das pesquisas os alunos sistematizaram os dados

levantados e organizarão uma exposição fotográfica e documental voltada para toda

comunidade escolar. Por fim, após a exposição, foi organizada uma mesa redonda

com a turma para debater as atividades realizadas e analisar a visão dos alunos

(após a pesquisa) sobre a influência da cultura ucraniana e religiosidade na

identidade dos jovens.

Essa atividade foi bastante representativa, pois os alunos mencionaram nas

discussões que a religião ucraniana tem influência na cultura da cidade de

Prudentópolis e tem um caráter de dominação, uma vez que as práticas religiosas

se tornaram comuns sem refletir seu objetivo e sua contribuição na vida das

pessoas.

Além disso, foi identificado que para os descentes de ucranianos, a religião, o

rito, a Igreja (diferente do que para os antigos que vieram da Ucrânia) são estruturas

flexíveis, permeáveis, ajustáveis conforme seus interesses. Mas isso não torna as

pessoas totalmente flexíveis frente as práticas religiosas pois ainda existe uma

corrente dentro da igreja ucraniana que pensa a identidade, o rito e a Igreja

semelhante ao que se tinha no passado.

Ao finalizar a implementação do projeto junto aos alunos, foi possível construir

ao longo das discussões uma visão de que a religião, a cultura e a Igreja, imprimem

limites, estabelecem fronteiras dentro da sociedade. Podem não impermeabilizar o

grupo de influências externas, o que pode trazer fragilidade a dominação da igreja,

mas influencia na construção da identidade dos povos podendo ser alienante. Ainda

fica claro que a Igreja tem forte influência cultural, mantém o grupo unido e coeso,

atrai turistas a fim de conhecer o rito e as construções no estilo bizantino, a comida

típica, as danças e o traje. A Igreja do século XXI Francisco talvez seja a esperança

de que a Igreja passe a ser um instrumento de verdadeiro amor ao próximo.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A religião, a cultura e a Igreja, imprimem limites, estabelecem fronteiras nas

relações sociais. Para os descentes de ucranianos, a religião, o rito, a Igreja nem

sempre influenciaram na identidade das pessoas e nas questões sociais e culturais,

mas durante a pesquisa percebe-se que a religião teve e tem influência enorme na

identidade e nas questões sociais e culturais em Prudentópolis, principalmente para

os ucranianos.

A religiosidade faz parte de um patrimônio cultural muito importante quando se

fala na disciplina de História e na necessidade de trabalhar com o cotidiano do

aluno. As igrejas ucranianas e a religião representam o marco principal histórico-

cultural do povo eslavo no Brasil e abrigam um capital artístico muito grande. Os

templos não são apenas estruturas levantadas para celebrações religiosas, a igreja

ucraniana é um diferencial cultural existente no Brasil com as diversas etnias e suas

tradições que nos permite trabalhar o ensino contextualizado em História e

aproveitar o patrimônio cultural e histórico acessível a toda a comunidade, levando

para a sala de aula a discussão da influência da religião na formação da identidade

dos alunos.

Dessa forma a riqueza particular das igrejas ucranianas e todo patrimônio que

elas encerram são fontes de pesquisa importantes para o trabalho de resgate

histórico e para a formação da identidade dos alunos. Pensar só em manter e

preservar o capital religioso-cultural sem ter em vista a sua renovação e sua

reconstrução é correr o risco de perdê-lo definitivamente diante da efemeridade das

coisas, da celebridade e fugacidade do tempo.

Analisar e pesquisar a identidade do povo ucraniano de Prudentópolis e o

papel da religião na preservação ou não dessa identidade envolve conhecer seus

ritos, liturgia, eventos culturais promovidos para fazer um elo de como os

descendentes de ucranianos agiam e como agem hoje.

Dentro de uma análise histórica da influência da religião, deve-se conceber

como eles se identificam e analisam a importância do resgate da História da

Imigração Ucraniana e a religiosidade desse povo que colonizou, trouxe progresso e

desenvolvimento para o município, mas ao mesmo tempo manteve-se alienado a

práticas que não se renovavam e afetam as relações sociais.

Contudo, isso se deve analisar que manter a tradição, permanecer no

passado não é suficiente para orientar a conduta das pessoas, contribui para uma

crise de identidade. A partir disso surge a necessidade de fazer uma nova leitura da

religião e da história, buscando como trabalhar esses conceitos dentro da sociedade

atual.

REFERÊNCIAS

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