Os Lusíadas_ reflexao sobre a fama e a gloria
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Os Lusíadas, de Luís de Camões Plano das Reflexões do Poeta
Canto VI
Estrutura ExternaEstrutura Externa
As estrofes 95-99 pertencem à parte final do Canto VI (constituído por 99 estrofes no
total). Todas as estrofes são constituídas por oito versos (oitavas), de versos
decassilábicos, e esquema rimático abababcc.
Estrutura InternaEstrutura Interna
No canto VI, Luís de Camões narra a viagem de Melinde a Calecut. As estrofes 95-99
pertencem, portanto, à Narração (em que Camões narra toda a viagem de Vasco da
Gama até à Índia), especificamente, ao Plano do Poeta, que interrompe a Narração
para reflectir sobre o verdadeiro valor da Fama e da Glória.
Contextualização do excertoContextualização do excerto
Depois das festas de despedida, a armada lusitana parte de Melinde, para continuar a
sua Viagem até à Índia, levando consigo um piloto melindano. Enquanto isso, Baco vai
ao palácio de Neptuno para tentar colocar os deuses marinhos contra os portugueses,
pois estes estão quase a atingir o seu império na Índia. Depois de recebido por
Neptuno, Baco explica-lhe os motivos da sua presença. Ordenado por Neptuno, Tritão
convoca todos os Deuses marinhos para o consílio.
Quando reunidos, Baco discursa, apresentando de forma honesta e clara os motivos
que o levaram a lá ir. A certa altura é interrompido pelas suas lágrimas, o que leva a
que todos os outros deuses fiquem do seu lado. Eolo, a pedido de Neptuno, solta os
ventos originando uma tempestade com o intuito de destruir os portugueses (Episódio
da Tempestade).
Os portugueses estavam entretidos a contar histórias uns aos outros para não
adormecerem. Quando dão conta da chegada da tempestade, a força dos ventos é tal,
que não têm tempo de subir as velas, acabando estas por se romper, ficando os
mastros quebrados igualmente. As areias do fundo do mar são revolvidas, as árvores
arrancadas, e os montes caem. Na armada, a situação estava bastante caótica, as
pessoas gritavam e, conseguiam avistar de perto a desgraça. Vasco da Gama sente-se
perdido e pede ajuda à Divina Guarda Estrofes 81 e 82).
81
"Divina Guarda, angélica, celeste,
Que os céus, o mar e terra senhoreias;
Tu, que a todo Israel refúgio deste
Por metade das águas Eritreias;
Tu, que livraste Paulo e o defendeste
Das Sirtes arenosas e ondas feias,
E guardaste com os filhos o segundo
Povoador do alagado e vácuo mundo;
82
"Se tenho novos modos perigosos
Doutra Cila e Caríbdis já passados,
Outras Sirtes e baixos arenosos,
Outros Acroceráunios infamados,
No fim de tantos casos trabalhosos,
Por que somos de ti desamparados,
Se este nosso trabalho não te ofende,
Mas antes teu serviço só pretende?
Apercebendo-se do perigo, Vénus manda as Ninfas amorosas acalmarem a fúria dos
ventos. Quando a tempestade se acalmou, era já de manhã e o piloto avistava a costa
de Calecute.
O Canto VI termina com a oração de agradecimento de Vasco da Gama, e com uma
reflexão do poeta sobre o verdadeiro valor da Glória e da Fama.
Reflexão sobre a Fama e a Glória (Canto VI –Reflexão sobre a Fama e a Glória (Canto VI –
estrofes 95-99)estrofes 95-99)
PEDIDO DE AJUDA DE VASCO DA GAMA À
DIVINA GUARDA
Nesta reflexão, o poeta valoriza a honra e a glória alcançadas por mérito próprio,
considerando que a nobreza não é um título que se herda. Camões introduz, desta
forma, um novo conceito de nobreza, em que a virtude e a honra são os únicos meios
de aquisição da experiência e do conhecimento. Este novo conceito constitui um dos
ideais do saber renascentista.
95
Por meio destes hórridos perigos,
Destes trabalhos graves e temores,
Alcançam os que são de fama amigos
As honras imortais e graus maiores:
Não encostados sempre nos antigos
Troncos nobres de seus antecessores;
Não nos leitos dourados, entre os finos
Animais de Moscóvia zebellinos;
Ao longo da sua reflexão, Luís de Camões enumera um conjunto de pontos que
considera serem obstáculos à Fama e à Glóriaobstáculos à Fama e à Glória. São eles:
Viver à sombra da glória dos antepassadosViver à sombra da glória dos antepassados, isto é, julgar-se nobre só porque os
seus antepassados o eram. Segundo o poeta são necessários feitos dignos do
título nobre.
“Alcançam os que são de fama amigos / As honras imortais e graus maiores: /
Não encostados sempre nos antigos / Troncos nobres de seus antecessores”(estrofe
95)
Os luxos e os requintes supérfluosOs luxos e os requintes supérfluos
“Não nos leitos dourados, entre os finos / Animais de Moscóvia
zebellinos”(estrofe 95)
Os manjares, os passeios e os requintesOs manjares, os passeios e os requintes
“Não cos manjares novos e esquisitos, / Não cos passeios moles e ouciosos, /
Não cos vários deleites e infinitos, / Que afeminam os peitos generosos, / Não com os
nunca vencidos appetitos, / Que a Fortuna tem sempre tão mimosos” (estrofe 96)
Ao longo das estrofes 97 e 98, Luís de Camões enumera, ainda, os meiosmeios
necessários para atingir a glória e a fama por mérito próprionecessários para atingir a glória e a fama por mérito próprio, como por
exemplo:
Recusa da nobrezaRecusa da nobreza como título herdadocomo título herdado
O esforçoO esforço
“Mas com buscar, co seu forçoso braço, / As honras que ele chame próprias
suas” (versos 1 e 2, estrofe 97)
A disponibilidade para a guerraA disponibilidade para a guerra
“ Vigiando e vestindo o forjado aço” (v.3, estrofe 97)
Coragem para enfrentar os perigos, para sacrificar o próprio corpo, e para sofrerCoragem para enfrentar os perigos, para sacrificar o próprio corpo, e para sofrer
pela perda de um companheiropela perda de um companheiro
“Sofrendo tempestades e ondas cruas, / Vencendo os torpes frios no regaço”
(versos 4 e 5, estrofe 97)
“Pera o pelouro ardente que assovia / E leva a perna ou braço ao companheiro”
(v.4, estrofe 98)
Desprezo das honras e do dinheiroDesprezo das honras e do dinheiro
“Destarte, o peito um calo honroso cria, / Desprezador das honras e dinheiro, /
Das honras e dinheiro que a ventura / Forjou, e não virtude justa e dura. “
(versos 5-8, estrofe 98)
Posicionamento do poetaPosicionamento do poeta
Segundo o Poeta, só aquele que enfrenta os obstáculos e os ultrapassa com sucesso,
pode ser considerado nobre. Só desta forma, poderá superiorizar-se em relação aos
restantes homens, e ser considerado herói dignamente. O estatuto nobre será
adquirido ao ver os seus feitos reconhecidos pelos outros e, mesmo contra a sua
vontade, ver-se-á distinguido dos restantes.
“Este, onde tiver força o regimento / Direito, e não de affeitos ocupado, / Subirá (como
deve) a ilustre mando, / Contra vontade sua, e não rogando.” (versos 5 a 8, estrofe
99)
Marcas LinguísticasMarcas Linguísticas
95 Por meio destes hórridos perigos, Destes trabalhos graves e temores, Alcançam os que são de fama amigos As honras imortais e graus maiores: Não encostados sempre nos antigos Troncos nobres de seus antecessores; Não nos leitos dourados, entre os finos Animais de Moscóvia zebellinos; 96 Não cos manjares novos e esquisitos,
Não cos passeios moles e ouciosos, Não cos vários deleites e infinitos, Que afeminam os peitos generosos, Não com os nunca vencidos appetitos, Que a Fortuna tem sempre tão mimosos, Que não sofre a nenhum que o passo mude Pera algua obra heróica de virtude;
Construções negativas e repetição anafórica do advérbio de negação “Não” , como
forma de reprovação dos luxos, dos requintes supérfluos e da ideia de que a nobreza
se herda, ou seja, o poeta diz não aos manjares, não aos passeios, não aos apetites, e
não àqueles que julgam ser nobres só porque os seus antepassados o eram.
96 Não cos manjares novos e esquisitos, Não cos passeios moles e ouciosos , Não cos vários deleites e infinitos, Que afeminam os peitos generosos, Não com os nunca vencidos appetitos, Que a Fortuna tem sempre tão mimosos, Que não sofre a nenhum que o passo mude Pera algua obra heróica de virtude;
Utilização de duplas adjectivações ou paralelismo sintáctico para enumerar os luxos
que ele reprova, já que do seu ponto de vista, são obstáculos à fama e à glória.