Os Olhos Velados de Londres - Edgar Wallace

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    FRANCISCO ALVES EDITORA 1979

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    Sinopse

    Um milionrio encontrado morto s margens do Tmisa. Umhomem sobre o qual nada se sabe. Em seu bolso, a polcia encontra ummisterioso rolo de papel pardo com uma mensagem em Braille, e no avessode sua camisa um testamento em que deixa a imensa fortuna para sua filhaClarissa.

    As estranhas circunstncias da descoberta do corpo levam aScotland Yard a suspeitar de assassinato. Por que aquele homem teria sidomorto? E quem deixara a mensagem era Braille, se o morto no era cego?

    Onde encontrar Clarissa Stuart, a filha que ningum sabia quem era?Para solucionar o enigma, o Inspetor Larry Holt chamado de volta

    de suas frias e encarregado do caso. A contragosto, assume a direo dasinvestigaes e, no menos a contragosto, informado de que ter comoauxiliar Miss Diana Ward.

    Ao se envolver em toda essa trama, o Inspetor Holt nem de longepoderia suspeitar que iria encontrar muito mais do que apenas o responsvelpelo crime. Ele teria que se defrontar com uma das mais cruis e astuciosasquadrilhas que j atuaram em Londres, os misteriosos Olhos Velados. E,muito menos, que cairia nas garras de uma fora ainda mais poderosa, quenem sua mente brilhante nem seus anos de experincia o ajudariam avencer: o amor.

    Unindo todos esses elementos com grande habilidade e uma lgicairrefutvel, Edgar Wallace cria para o leitor um romance vibrante, com tantaao e suspense que, certamente, empolgar a todos os aficionados do

    gnero.

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    Introduo

    Um mestre policial que usava o amor

    Em 1898, aparecia na Inglaterra o livro The Mission That Failed,publicado na frica do Sul por T. Maskow Miler. Autor: um jovem jornalistachamado Edgar Wallace.

    Os tempos passaram e o jovem Wallace deixou de lado suasreportagens para se dedicar ao gnero policial, quando ento se tornou umde seus mais famosos escritores.

    De 1898 at 1932, ano de sua morte, foram publicadas quase duascentenas de livros, entre romances e contos, com a marca pessoal de umescritor que sempre unia intriga policial uma histria de amor, sem queesta, no entanto, interferisse no desenvolvimento do caso.

    Talvez os leitores se lembrem de uma das regras (as famosas vinteregras) de S. S. Van Dine, de como escrever uma histria policial:

    No deve haver interesse amoroso no entrecho. Trazer amor cena atravancar a obra puramente intelectual com sentimentos que no vm aocaso. A questo a ser deslindada a de levar o criminoso ao Tribunal, e no ade levar um casal enamorado ao altar.

    Para Edgard Wallace, autor bem anterior a S. S. Van Dine, essa regrajamais importaria. Em quase todas as suas estrias h sempre, paralelamenteao fato criminal, uma histria de amor.

    Estria de amor, sim, para casar, terminando sempre num final feliz,embora sem influir no entrecho do livro. Poderamos at chamar de

    intermezzo amoroso que nunca prejudicou a trama de crime nos livros deWallace. Ao contrrio, deu-lhe um ovo sabor.Curioso que todos que estudaram a obra de Wallace no

    focalizaram em profundidade esse ngulo. A ns parece que essa constantedo amor nas novelas de Wallace se prende ao fato de que ele iniciou suavida literria no tempo dos folhetins. E para os folhetins dos primeiros anosdo sculo, o amor era pea fundamental.

    Publicado originalmente na revista Aswers, n 1718-31, entre 30 de

    abril e 30 de julho de 1921, Os Olhos Velados de Londresapareceu em livro pela

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    primeira vez em 1924 pela Ward Lock & Co.No Brasil surgiu na Coleo Amarela da Editora Globo e, sem dvida,

    constitui um dos melhores trabalhos de Wallace. Com todos os ingredientesque o tornaram um dos mestres do gnero.

    Inclusive, uma boa dose de amor.

    PAULO DE MEDEIROS E ALBUQUERQUE

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    Larry Holt em Paris

    Larry Holt estava sentado na calada do Caf de la Paix, observandoa torrente de vida que flua em ambos os sentidos do Boulevard des Italiens.O hlito da primavera perfumava o ar; as rvores cheias de brotos verdes, ocu azul salpicado de nuvens, a luz dourada do sol realando as cores dosquiosques e valorizando at mesmo os berrantes cartazes de propaganda,nibus lotados passavam vagarosamente, pequenos txis costuravamafoitamente por entre o trfego, constituindo um perigo mortal para os

    pedestres desavisados.Um gendarme com a pelerine sobre os ombros postara-se em atitude

    convencional junto ao meio-fio, com as mos s costas, sem olhardiretamente para coisa alguma. Na calada, moas passavamapressadamente, homens idosos caminhavam devagar, jovens poilusavanavam em passo de marcha. Por entre as mesas do caf circulavamatendedores ambulantes, rabes morenos com tapetes dobrados sobre os

    braos, homens maltrapilhos que ofereciam pilhas de cartes postais e, aomenor sinal de encorajamento, apresentavam fotografias no destinadas aosolhos do pblico em geral. Tudo aquilo era um deleite para Larry Holt, queacabava de regressar de Berlim aps quatro anos de trabalho extenuante naFrana e Alemanha, e agora se deixava dominar por aquele esprito festivo,ao qual at mesmo a mente de um policial dedicado pode sucumbir.

    A posio ocupada por Larry Holt constitua uma espcie de mistriopara o pessoal da Scotland Yard. Tinha o posto de Inspetor e exercia as

    funes administrativas de Comissrio; no consenso geral, ocupava oprimeiro lugar na fila para a prxima vaga de Comissrio-Assistente.Naquele momento, Larry no se preocupava com o problema de seu cargoatual e de eventuais promoes. Ali sentado, absorvia a doura daprimavera a cada respirao. Seu rosto bonito irradiava o mais puro prazerde viver e o corao pulsava com um alvio, uma sensao de tranquilidadeque ele h muito no experimentava.

    Ao levantar-se, revelou ser bastante alto. Pagou a conta e dobrou a

    esquina em direo ao hotel onde se hospedava. Caminhava

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    vagarosamente, as mos nos bolsos, o chapu de feltro empurrado para trs,um leve sorriso nos lbios e uma comprida piteira negra presa entre osdentes.

    Chegou ao movimentado saguo do hotel, o nico local em Parisonde as pessoas parecem afobadas, os mensageiros correm de um lado para

    outro, e todo mundo at mesmo os fleumticos ingleses parecedominado por uma pressa frentica. Caminhava em direo ao elevadorquando, atravs da porta de vidro que dava para o ptio interno ajardinado,avistou um homem em atitude de elegante repouso, recostado numagrande poltrona preta, tirando baforadas de um charuto.

    Larry sorriu e hesitou. Conhecia aquele sujeito de rosto magro, toradiantemente trajado, cujos dedos e gravatas fulguravam de brilhantes.Dominado por um humor travesso, passou pelas portas basculantes e se

    aproximou do indivduo que descansava na poltrona. Ora, se no meu velho amigo Fred! exclamou em voz baixa.Fred Fulgurante, vigarista, trapaceiro e jogador profissional que agia

    no continente, ergueu-se de um salto, visivelmente alarmado por se depararcom o inesperado visitante.

    Como vai, Sr. Holt? gaguejou. a ltima pessoa nestemundo que eu esperava...

    Ou desejava encontrar completou Larry, sacudindo a cabeacom ar de reprovao. Quanta prosperidade! Fred, voc est toenfeitado que at parece uma rvore de Natal!

    Fred Fulgurante exibiu um sorriso amarelo, mas fez um corajosoesforo para demonstrar indiferena.

    Tomei jeito, agora, Sr. Holt declarou. Voc um mentiroso, Fred, e assim continuar at morrer

    replicou tranquilamente Larry.

    Juro pela Bblia que... comeou Fred, enftico, mas Larryinterrompeu com a maior calma: Eu no acreditaria em voc mesmo que jurasse sobre o Livro dos

    Mrtires, diante de seu tio moribundo e o cadver ainda fresco de sua tia.Admirou os mltiplos adornos, de Fred: o grande brilhante no

    alfinete da gravata, a tripla corrente de ouro que cruzava a frente do coletede corte esmerado, as polainas brancas e os sapatos de verniz preto. Emseguida, olhou para os cabelos impecavelmente escovados.

    Voc est lindo! comentou. Em que anda metido agora? e

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    antes que o outro pudesse responder, acrescentou: No acredito que meconte, mas, de qualquer forma, deve ser uma tramoia muito lucrativa, Fred.

    O outro lambeu os lbios secos. Sou homem de negcios afirmou. No negcio de quem voc est metido? indagou Larry,

    interessado. E como conseguiu entrar nele? Com um p-de-cabra, ouuma banana de dinamite? um ramo novo para voc, Fred. Via de regra,contenta-se em catar as migalhas de ouro deixadas pelos jovens incautosdeste pas... e acrescentou significativamente a bater carteiras dedefuntos frescos.

    O homem ficou muito vermelho. O senhor no acha que tive algo a ver com aquele homicdio em

    Montpellier, no ? protestou acaloradamente.

    No creio que tenha atirado no infeliz jovem admitiu Larry. Contudo, no h dvida de que foi visto debruado sobre o cadver,revistando-lhe os bolsos.

    procura de identificao declarou Fred, com ar virtuoso. Queria descobrir quem o matou.

    Voc tambm foi visto conversando com o homem que o matou disse Larry, era tom de desaprovao. Uma velha senhora, MadamePrideaux, olhando pela janela do quarto, viu voc agarrar o homem e,depois, solt-lo. Presumo que ele tenha morrido numa nota.

    A princpio, Fred ficou calado. Detestava supostos cavalheiros quedesciam ao nvel de vulgaridade de empregar a expresso morrer numanota em lugar de suborno.

    Isso foi h dois anos, Sr. Holt disse ele, afinal. No vejo por que o senhor iria desenterrar agora uma coisa dessas

    contra mim. O juiz de instruo me considerou inocente.

    Larry riu e pousou a mo ao ombro do outro. Bem, Fred, de qualquer maneira, estou de folga. Vou aproveitar asfrias.

    Suponho que no vai para Londres? perguntou Fred, lanandoum rpido olhar ao rosto de Larry.

    No , respondeu Larry, tendo a impresso de perceber sinais dealvio no rosto de Fred.

    Vou pra l hoje disse este, em tom coloquial. Esperava que

    pudssemos viajar juntos.

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    Sinto muito estragar suas esperanas disse Larry. Vou em outra direo. At a vista. Felicidades! disse Fred, observando o outro afastar-se, com uma

    expresso que no indicava qualquer desejo de felicidades para Larry Holt.Larry subiu ao quarto e encontrou seu camareiro escovando as

    roupas e estendendo-as na cama. Patrick Sunny, o camareiro que ele jaturava h dois anos, era um jovem srio, taciturno, de olhos arregalados cara redonda, que demonstrou uma sbita energia entrada do patro.Escovou com mais fora, expelindo o ar entre os dentes, como costumavafazer quando servira num regimento de cavalaria.

    Larry foi janela e contemplou o movimentado panorama da Placede lOpra.

    Sunny, no precisa escovar minhas roupas a rigor. Arrume-as na

    mala. Sim, senhor disse Sunny. Vou para Monte Carlo no trem noturno. Certamente, senhor disse Sunny, que diria exatamente a

    mesma coisa se Larry anunciasse a inteno de ir ao Saara ou ao Polo Norte. Monte Carlo, Sunny! exclamou Larry, rindo. Seis semanas

    alegres, divertidas e dispendiosas. Faa as malas imediatamente.Pegou o telefone e ligou para a agncia de viagens. Quero reservar uma cabine com leito e uma poltrona de primeira

    classe no trem noturno de hoje, para Monte Cario declarou. MonteCarlo repetiu mais alto. No, no para Calais. Para Monte Cario. Muitoobrigado, mas no tenho a menor inteno de ir para Calais.

    Desligou e olhou para o camareiro. Detesto falar com voc, Sunny, mas preciso conversar com algum

    comentou. Alm disso, odeio seu nome. Quem lhe deu um nome to

    horrvel? Meus antepassados respondeu Sunny formalmente,continuando a escovar as roupas sem erguer a cabea.

    Pois erraram totalmente o alvo, no mesmo? perguntou Larry. Se existe algo mais diferente que voc de um dia ensolarado deprimavera, fao questo de no ver nem de longe*. De todo modo, Sunny,estamos de partida para o sul, para a Cte dAzur, terra de flores e dedivertimento, terra dos laranjais... Gosta de laranjas, Sunny?

    [*] N.T.: Sunny=ensolarado

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    Prefiro castanhas, senhor respondeu Sunny. No ligo parafrutas.

    Larry soltou uma risadinha e sentou-se na beira da cama, Para variar, seremos os criminosos e tiraremos dinheiro dos

    incautos, em vez de andarmos metendo o nariz nos crimes cometidos pelos

    outros declarou. Chega de roubos, falcatruas e assassinatos, Sunny.Teremos seis semanas de dolce far niente. No conheo esse jogo, senhor disse Sunny. Prefiro bisca.Larry pegou o jornal e correu os olhos pelas notcias. Havia uma boa

    quantidade delas que lhe lembravam os deveres profissionais. Um granderoubo de banco em Lyons; bandidos armados tinham assaltado um vagopostal na Blgica. Ento, deparou-se com um pargrafo:

    O cadver encontrado nos degraus do cais do Tmisa foiidentificado como o Sr. Gordon Stuart, milionrio canadense. Acredita-se que tenha sido suicdio. O Sr. Stuart estava com um grupo de amigosno teatro e desapareceu no intervalo entre dois atos do espetculo, nomais sendo visto at encontrarem seu cadver. O laudo pericial revelara verdade sobre o caso.

    Larry releu a notcia e franziu a testa. No comum sair do teatro entre dois atos de uma pea para

    cometer suicdio a menos que a pea seja mesmo muito ruim... comentou.

    No, senhor concordou o obediente Sunny.Larry largou o jornal. Sunny, estou adquirindo pssimos hbitos. Comeo a interessar-

    me por lunticos e justamente por isso estou notando que voc dobrou

    minha cala com o vinco fora do lugar. Dobre-a direito, seu malandropreguioso.Passou a tarde ocupado com os preparativos para a viagem e, s seis

    e meia, com as malas carregadas por empregados do hotel e o sobretudolevado por Sunny, pagou a conta na portaria, dobrou o recibo e o estavaguardando no bolso quando foi abordado por um mensageiro.

    Monsieur Holt? Sou eu disse Larry, olhando desconfiado para a envelope na

    mo do rapaz. Telegrama para mim? Nem quero v-lo.

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    No obstante, pegou o envelope e desdobrou o papel azul. Com umacareta de aborrecimento, leu:

    MUITO URGENTE SERVIO ESPECIAL DE POLICIA

    MANTENHA A LINHA DIRETA DESOCUPADA.

    LARRY HOLT, GRAND HOTEL, PARIS:MUITO PREOCUPADO AFOGAMENTO STUART.FICARIA PESSOALMENTE GRATO VOC VIESSE

    IMEDIATAMENTE CHEFIAR INVESTIGAES.Estava assinado pelo Comissrio-Chefe da Scotland Yard, que no s

    era seu superior como amigo pessoal. Com um gemido, Larry guardou otelegrama no bolso.

    A que horas chegaremos a Monte Cario, senhor? indagouSunny quando Larry tomou a juntar-se a ele.

    Aproximadamente nesta mesma data, daqui a um ano respondeu Larry.

    Certamente, senhor concordou Sunny, discretamenteinteressado. Vai ser mesmo um dia muito comprido.

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    Sir John HasonFred Fulgurante, cujo sobrenome era Grogan, estava genuinamente

    aborrecido, pois, aps lhe ter sido assegurado por um respeitvel agente dalei que pretendia ir para Monte Cario, Fred o avistara a bordo do trem quepartiu de Paris para fazer a travessia da Mancha. E, muito embora tivesse ocuidado de evitar o policial, Fred sabia que Larry tinha pleno conhecimentode que estavam viajando juntos.

    Na estao Victoria, em Londres, Fred tratou de sair o mais depressapossvel, sem ter certeza de que os negcios de Larry na Inglaterra noestavam relacionados com suas prprias atividades. Larry viu o trapaceirosumir na multido e sorriu pela primeira vez desde que partira de Paris.

    Leve minhas coisas para o apartamento ordenou ele a Sunny. Vou Scotland Yard. Talvez volte para casa esta noite, talvez s amanh noite.

    Devo preparar seu traje a rigor? indagou Sunny.A ele, s lhe interessava a elegncia do patro. Para Sunny, o dia se

    dividia em trs partes: terno de tweed, traje a rigor e pijamas.

    No... ou melhor, sim... como voc preferir respondeu o patro. Sim, senhor disse o obsequioso Sunny.Larry foi direto Scotland Yard e encontrou alguma dificuldade para

    entrar, pois era desconhecido para os funcionrios locais; afinal, foiconduzido grande sala onde Sir John Hason se ergueu da mesa de trabalhoe veio ao seu encontro com a mo estendida.

    Meu caro Larry disse ele. muita bondade sua abrir mo dasfrias. Voc mesmo formidvel! Eu tinha certeza de que viria, tanto que

    lhe reservei a sala 47 e o secretrio mais esperto que j tivemos na ScotlandYard at hoje.

    John Hason e Larry Holt eram velhos amigos e ex-colegas de escola;existia entre eles uma afeio e confiana raramente encontradas entre doiscolegas de profisso.

    No conheo a sala 47 disse Larry com um sorriso, tirando osobretudo. Mas gostaria de conhecer o secretrio mais esperto daScotland Yard. Como se chama ele?

    No ele, ela sorriu Hason. Srta. Diana Ward, que trabalha

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    comigo h cerca de seis meses e, na verdade, a garota mais esperta e dignade confiana que j trabalhou para mim.

    Oh! Uma secretria... disse Larry, sombrio. Em seguida, animou-se: Sua palavra lei, John; nem mesmo esse tal modelo de virtude mepreocupa. Presumo que tenha a voz spera como uma lixa e rumine goma

    de mascar. Admito que no seja muito atraente, mas a aparncia no tudo replicou secamente Sir John. Agora, sente- se, meu velho; queroconversar com voc. a respeito desse caso Stuart comeou ele,oferecendo a Larry uma caixa de cigarros. S ontem descobrimos queStuart era muito rico. Estava morando na Inglaterra h nove meses, numapenso da Nottingham Place, em Marylebone. Era um indivduo misterioso,no saa, tinha poucos amigos, extremamente reticente. Naturalmente,

    sabia-se que tinha dinheiro e seus banqueiros de Londres, que revelaram suaidentidade ao saberem que tinha morrido, estavam a par do segredo. Isto ,o segredo referente identidade dele.

    Quando voc diz que ele no saa, o que quer dizer com isso? Elepassava o tempo todo na penso?

    J chegarei l disse Sir John. Ele ia a um lugar, emboraningum saiba por qu. Todas as tardes, costumava sair de carro, indoinvariavelmente ao mesmo lugar: uma pequena aldeia em Kent, a cerca de40 quilmetros da cidade. Deixava o carro numa extremidade da aldeia,atravessava o vilarejo a p e sumia durante cerca de duas horas.Investigamos e descobrimos o seguinte: ele passava a maior parte do tempona igreja, uma velha construo saxnica cujos alicerces datam de mil anosatrs. Com a regularidade de um cronmetro, voltava aps duas horas deausncia, entrava no carro alugado e voltava a Nottingham Place.

    Como o nome da aldeia?

    Beverley Manor disse o Comissrio-Chefe. Bem, em resumo:na noite de quarta-feira, abandonando a rotina de sempre, aceitou o convitede um tal Dr. Stephen Judd para assistir estreia de um novo espetculo noTeatro Macready. O Dr. Stephen Judd diretor-gerente da Companhia deSeguros Greenwich, uma firma pequena, pertencente essencialmente famlia Judd, mas que goza de tima reputao no mundo dos negcios. OSr. Judd um sujeito agradvel, apreciador de arte, e possui uma linda casaem Chelsea. Judd tinha um camarote para a estreia do espetculo, que, a

    julgar pelas crticas dos jornais, uma boa porcaria. Reservou o Camarote A.

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    Stuart compareceu e, segundo as declaraes de Judd, mostrou-se muitoinquieto. No intervalo entre o segundo e o terceiro atos, esgueirou-se parafora do teatro, sem ser observado, e no voltou. Ningum mais o viu atencontrarmos o cadver na margem do Tmisa.

    Que tipo de noite foi aquela? indagou Larry.

    Limpa no incio, mas depois um tanto nublada, com tendnciapara nevoeiro informou Sir John. Na verdade, o guarda quepatrulhava a zona em que o cadver foi encontrado revelou que a nvoaesteve bastante densa entre trs e meia e quatro e meia.

    Larry meneou a cabea. Existe alguma possibilidade de Stuart ter-se perdido no nevoeiro e

    cado no rio? perguntou. Absolutamente nenhuma replicou enfaticamente Sir John.

    Entre a hora em que desapareceu e as duas e meia da manh, a margem dorio estava completamente limpa de qualquer nvoa e ele no foi visto por l.At essa hora, foi uma noite muito clara.

    O Comissrio fez uma breve pausa e acrescentou: H outra circunstncia curiosa: quando foi encontrado, o cadver

    estava cado nos degraus, com as pernas dentro dgua. O corpo foradgua... concluiu pausadamente

    .. .e a mar ainda estava subindo.Larry encarou-o, perplexo. Quer dizer que o cadver no foi depositado nos degraus pela

    mar vazante? indagou, incrdulo. Como poderia ter ido parar ali,com as pernas na gua, quando a mar ainda estava baixa, como certamenteestava, no momento em que o corpo foi depositado nos degraus?

    exatamente esta a questo assentiu Sir John. A menos quese tenha afogado imediatamente aps sair do teatro quando a mar ainda

    estava cheia e comeava a vazar, parece-me quase impossvel que pudesseser depositado pela gua nos degraus ao amanhecer, quando a mar estavasubindo,

    Larry esfregou o queixo. esquisito comentou. No h dvidas quanto morte por

    afogamento? Absolutamente nenhuma replicou o Comissrio, abrindo uma

    gaveta e dela retirando uma pequena bandeja, na qual estavam vrios

    objetos. Isto foi tudo que encontramos nos bolsos do cadver informou.

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    Sir John olhou para o relgio sobre o aparador da lareira. A esta hora, deve estar no escritrio, uma dessas pessoas

    infatigveis, que trabalham at tarde. Fica no nmero 17 da BloomsburyPavement. No h possibilidade de engano.

    Larry pegou a bandeja e se encaminhou para a porta.

    Agora, tratemos da secretria pouco atraente disse ele.Sir John sorriu.

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    A Secretria

    A sala 47 ficava no andar acima do gabinete do Comissrio. Situava-se na extremidade de .ura comprido corredor. Larry Holt, segurando abandeja com uma das mos, abriu a porta com a outra e entrou numpequeno mas confortvel escritrio.

    Ol! exclamou, surpreso. Ser que me enganei de sala?A moa que se erguera de uma mesa de trabalho era jovem e

    extremamente bonita. A massa de cabelos dourados, penteados sobre a testa,dava maior realce aos lmpidos olhos cinzentos que fitavam Larry com

    expresso de surpresa. O corpo era esbelto e elegante; quando ela sorriu,Larry disse com seus botes que dificilmente j vira uma senhorita tograciosa e agradvel.

    Este o gabinete do Inspetor Holt informou ela. Santo Deus! exclamou Larry, entrando vagarosamente e

    fechando a porta atrs de si.Foi at a outra mesa e colocou a bandeja sobre ela. A moa parecia

    intrigada.

    Este o gabinete do Inspetor Holt repetiu. Essas coisas sopara ele?

    Larry assentiu com a cabea, fitando-a, maravilhado. O que isso? indagou repentinamente, apontando para um

    copo e uma jarra que estavam sobre uma mesinha de canto forrada com umguardanapo branco.

    Oh, isso para o Inspetor Holt disse ela.

    Larry espiou o contedo da jarra. Leite? perguntou, abismado. Sim disse a moa. O Inspetor Holt j idoso, sabe? Quando

    perguntei ao Comissrio o que o Inspetor gostaria de tomar ao chegar deviagem, ele sugeriu comida de doente e leite. Como no posso prepararcomida aqui...

    A gargalhada de Larry interrompeu a jovem, que o fitou muitoespantada.

    Eu sou o Inspetor Holt, anunciou Larry, enxugando as lgrimas

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    provocadas pelo riso. Voc? disse ela, boquiaberta. O prprio confirmou ele, complacente. John, isto , o

    Comissrio, fez uma brincadeira com voc, Srta... no sei o seu nome. Agora,quer fazer-me o favor de pedir idosa Srta. Ward que venha at aqui?

    Um leve sorriso surgiu nos lbios da jovem, que replicou: Eu sou a Srta. Ward.Foi a vez de Larry ficar boquiaberto. Depois, sorriu e estendeu a mo. Somos companheiros de infortnio, Srta. Ward, Cada um de ns

    foi vtima de um prfido comissrio de polcia. Tenho um enorme prazer emconhec-la... e alvio, tambm.

    Sinto-me um pouco aliviada disse a jovem, rindo, ao se dirigir sua mesa de trabalho; Larry, observando-lhe os mnimos movimentos, teve a

    impresso de que ela flutuava em vez de andar. Sir John disse que o senhor tinha sessenta anos e sofria de asma.

    Recomendou-me no permitir correntes de ar nesta sala. Mandei instalaruma vedao especial esta tarde.

    Larry ficou pensativo por um instante. Depois, comentou: Talvez tenha sido melhor eu no ir a Monte Cario.Sentando-se sua mesa, acrescentou: Bem, vamos comear o trabalho, no ?A moa abriu o bloco e pegou um lpis, enquanto Larry examinava os

    objetos na bandeja. Anote o seguinte, por favor disse ele. Relgio fabricado por

    Gildman, de Toronto; de bolso, com tampa traseira, 15 rubis; nmero A778432. Sem arranhes na parte interna da tampa.

    Abriu a tampa, tomou a fech-la, depois experimentou a corda. Deram-lhe corda menos de seis horas antes da morte.

    A moa ergueu os olhos. o caso Stuart? indagou. Sim respondeu Larry. Sabe algo a respeito? S o que o Comissrio me contou disse ela. Pobre homem!

    Mas eu estou ficando to acostumada com esses horrores que quase j metornei insensvel. Suponho que isso acontece com quem estuda medicina.Fui enfermeira, durante dois anos, num asilo para cegos acrescentou. Isso ajuda a endurecer a gente, no acha?

    Sorriu.

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    Suponho que sim respondeu Larry, pensativo, tentandoadivinhar que idade teria ela quando comeara a trabalhar para ganhar avida. Calculou que ela tivesse vinte e um anos de idade e considerou aestimativa bastante aproximada. Gosta deste trabalho? perguntou.

    Ela assentiu com a cabea.

    Adoro declarou. Sir John afirma que um dia desses far demim um... ela hesitou em empregar o termo. Um tira? No me diga que vai ser detetive! implorou Larry.

    Pensei que ns, homens, tivssemos exclusividade na profisso. Atualmente,a concorrncia feminina...

    Ela sacudiu a cabea, interrompendo com ar de censura: Est negligenciando o trabalho, Sr. Holt. S fomos at o relgio.Ele riu baixinho e voltou ao exame dos objetos.

    Corrente de ouro e platina, trinta centmetros de comprimento,tendo na extremidade uma argola com a tampa de uma lapiseira de ouro...ou, pelo menos, presumo que fosse de ouro ditou. Depois, perguntou

    jovem: A lapiseira no foi encontrada? No , respondeu ela. Fiz questo de perguntar ao sargento

    que trouxe os objetos se a lapiseira fora encontrada.Larry ergueu a cabea, surpreso. Reparou nisso? Oh, sim. Reparei tambm nisso replicou ela, com a maior calma.

    O canivete tambm desapareceu.Desta vez, Larry a fitou totalmente perplexo. Que canivete? Calculo que fosse um canivete disse ela. A argola grande

    demais para prender apenas uma lapiseira. Se olhar bem, ver que existeuma argola menor; provavelmente, est presa argola da tampa da

    lapiseira. Quando chegou, estava aberta, mas tornei a fech-la. Dava aimpresso de haver sido puxada por algum. Presumi que se tratasse de umcanivete, pois muitos homens costumam carregar um pequeno canivete deouro na ponta da corrente do relgio de bolso.

    Ou seria um cortador de charutos? sugeriu Larry. Pensei nisso disse ela, meneando a cabea. Mas eles no se

    dariam ao trabalho de levar um cortador de charutos. Eles?

    Quem matou Stuart continuou ela tranquilamente

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    certamente removeria todas as armas que estivessem de posse dele.Larry olhou ainda uma vez para a corrente e viu a outra argola, no

    compreendendo por que motivo no a notara antes. Creio que tem razo declarou. A argola muito maior. Alis,

    chegou a escorregar pela corrente. E tem marcas ntidas de arranhes onde

    o canivete foi arrancado.Colocando a corrente em cima da mesa, consultou seu prpriorelgio.

    J viu o resto das coisas? indagou.Ela sacudiu a cabea: S examinei o relgio.Larry procurou um lugar onde guardar as coisas e avistou um

    armrio embutido na parede. Est vazio? perguntou. A moa assentiu. Ento, deixaremos

    o exame das outras peas para quando eu voltar. Preciso falar com umapessoa.

    Guardou a bandeja no armrio, trancando a porta, e entregando achave jovem. Estava a meio caminho da porta, quando se lembrou dealguma coisa,

    No estar aqui quando eu voltar? Bem, suponho que deva teruma espcie de horrio de trabalho, no ?

    No costumo ficar depois das duas da manh replicou ela,muito sria.

    Enfrentou sem o menor embarao a franca admirao expressa noolhar de Larry.

    Acho que nunca conheci uma moa como voc declarou elepausadamente, como se estivesse exprimindo os pensamentos em voz alta.

    Ela corou e baixou os olhos. Depois, riu e tomou a encar-lo. Larryachou que os olhos dela pareciam duas estrelas.

    possvel que jamais tenhamos conhecido algum como o outro comentou ela.E Larry Holt saiu da Scotland Yard consciente de que um novo e

    poderoso interesse acabava de surgir em sua vida.

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    Fred Fulgurante Visita um Cliente

    Fred Fulgurante observara Larry Holt deixar o terminal ferrovirio,pois, embora tivesse sado antes do prdio, esperara at ver o txi de Larryafastar-se.

    Tinha uma preocupao toda especial em no ser seguido naquelanoite; somado a essa preocupao, estava o grande respeito que Fred nutriapelo gnio e perspiccia de Larry Holt. Na Europa continental, sempre quetrapaceiros ou criminosos se reuniam, havia o consenso geral e unnime deque a primeira pessoa que desejavam ver no outro lado do Estige era Larry

    Holt. claro que no diziam no outro lado do Estige, mas, simples ecruamente, no inferno. A implacabilidade do policial quando farejavauma pista j se tornara tradicional e legendria. E Fred, mais que qualqueroutra pessoa, tinha, motivos para tem-lo.

    Deu a Larry Holt uma vantagem de dez minutos, e depois voltou aointerior da estao, onde deixou a mala no depsito de bagagens. Emseguida, utilizando-se de uma das sadas laterais, pegou o primeiro txi dafila e deu um endereo ao motorista. Dez minutos mais tarde, saltou numa

    tranquila praa de Bloomsbury, ocupada essencialmente por escritrios deadvocacia. Havia, contudo, uma exceo. O prdio diante do qual Freddesceu do txi era alto e estreito, de tijolos vermelhos. Embora no houvesseluzes no trreo, uma luminosidade difusa aparecia nas janelas do andar decima. Um zelador, de servio no hall, deteve Fred.

    O escritrio est fechado h vrias horas, senhor anunciou,sacudindo negativamente a cabea. Abrimos s nove da manh.

    O Dr. Judd no est no prdio? indagou Fred Fulgurante,trocando o charuto de um canto para outro da boca,O zelador hesitou. O Dr. Judd ainda est ocupado, senhor. No creio que deseje

    receber algum. Oh, voc no cr, hem? zombou Fred. Pois suba at l e diga

    a ele que o Sr. Walter Smith deseja v-lo. E no se esquea do nome: bastante raro acrescentou com um toque humorstico.

    O zelador olhou com ar duvidoso para o visitante.

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    S vou arranjar encrenca resmungou, entrando num dos doispequenos elevadores. Apertou um boto e a porta automtica logo oescondeu de vista.

    Aparentemente, o escritrio do Dr. Judd ficava no ltimo andar, poisse passou algum tempo antes que o gemido do motor do elevador cessasse

    bruscamente. Aps um intervalo, o barulho do motor recomeou e, afinal, ozelador reapareceu no hall. Ele vai receber o senhor anunciou. Quer vir por aqui, por

    favor? J devia me conhecer a esta altura, chefe disse Fred, entrando

    no elevador. Tenho vindo aqui com bastante regularidade nestes ltimosanos.

    Talvez eu no estivesse de servio disse o zelador, enquanto o

    elevador subia lentamente. Somos dois, sabe? O senhor era amigo do Sr.David?

    Fred no riu. Nem mesmo esboou um sorriso. No, no. declarou, displicente. No conheo o Sr. David. Ah, uma pena! Uma grande pena! exclamou o zelador. Ele

    morreu de repente, h quatro anos. O senhor no sabia?Fred sabia, mas no admitiu conhecer o fato. A repentina morte do

    Sr. David privara-o de uma possvel fonte de renda a que tinha direito;agora, recebia a referida renda apenas por favor e poderia perd-la aqualquer momento, alm de ir para a cadeia, se o jovial Dr. Judd se cansassede lhe pagar a chantagem.

    O elevador parou. Fred saltou e acompanhou o zelador at umaporta qual o homem uniformizado bateu. Uma voz alta mandou queentrassem. Fred Fulgurante entrou com ar solene no elegante apartamento eendereou um frio meneio de cabea ao ocupante.

    O Dr. Judd se erguera para receb-lo. Muito bem, chefe disse ele ao zelador, atirando uma moeda,que o homem pegou no ar com agilidade. V comprar cigarros para mim.

    Quando a porta se fechou dirigiu-se a Fred, bem-humorado: Sente-se, velhaco. Suponho que tenha vindo me extorquir mais

    dinheiro.Era um homem alto, vigoroso, de rosto vermelho e constituio

    corpulenta. A testa era calva e os olhos profundos, afastados um do outro;

    tinha um ar de conforto e de expansivo bom humor. Fred, sem o menor

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    embarao, sentou-se na beira de uma poltrona. Bem, Doutor, estou de volta disse ele.

    Judd sacudiu a cabea e tateou os bolsos procura de um cigarro. O que deseja? Um cigarro? indagou Fred, pegando a cigarreira.

    Mas o mdico sacudiu a cabea, exibindo um sorriso largo, bem-humorado,

    mas significativo. No, muito obrigado, Sr. Grogan disse ele, com uma risadinha. No fumo cigarros que me sejam oferecidos por cavalheiros da suaprofisso.

    E qual a minha profisso? grunhiu Fred Fulgurante. Noacha que eu pretendo drog-lo, no ?

    Eu estava sua espera disse o doutor, sem responder apergunta, tornando a sentar-se. Se no estou enganado, o senhor tem

    fortes objees quanto a aceitar cheques.Fred Fulgurante sorriu. Exato, patro disse ele. Essa ainda minha fraqueza.O doutor tirou do bolso um molho de chaves, foi at o cofre, acionou

    o fecho e, olhando por cima do ombro, declarou: No precisa prestar muita ateno, meu amigo; a no ser quando

    tenho que fazer pagamentos a chantagistas, jamais guardo dinheiro nestecofre.

    Fred fez uma pequena careta. Insultos no matam ningum comentou sentenciosamente.O doutor tirou do cofre um pacote, bateu a porta, girou a chave e

    voltou vagarosamente mesa, sobre a qual atirou o gordo envelope. Emseguida, abriu uma gaveta e consultou uma caderneta de anotaes.

    Est adiantado trs dias declarou.Fred assentiu, admirado.

    Que cabea o senhor tem para nmeros, Doutor! exclamou. Tem razo: estou adiantado trs dias, mas porque preciso deixar aInglaterra bem depressa, a fim de encontrar-me com um amigo em Nice.

    O doutor jogou o pacote e Fred segurou-o desajeitadamente. H mil e duzentas libras nesse envelope. No precisa conferir,

    porque o dinheiro est todo a declarou o Dr. Judd, recostando-se napoltrona, pegando um palito de ouro e encarando o outro com ar pensativo. Naturalmente, sou o maior tolo do mundo, ou jamais me submeteria a

    esta inqua chantagem. S fao isso para evitar que a memria de meu

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    falecido irmo seja caluniada. Se seu irmo atira nas pessoas em Montpellier e eu, por acaso,

    estou no local e o ajudo a escapar replicou Fred, untuoso comorealmente aconteceu e eu posso provar, creio que tenho direito a umapequena compensao.

    Voc um miservel patife disse o outro, naquele seu tomagradvel, com um sorriso. E me diverte. Suponhamos que eu, em vez deser o que sou, fosse um homem mal-intencionado? Suponhamos queestivesse desesperado e no conseguisse arranjar o dinheiro? Ora, eupoderia... fazer qualquer coisa!

    Deu uma gargalhada ante a perspectiva de cometer algo muitoterrvel.

    No faria a menor diferena para mim disse Fred.

    Por outro lado, tambm no faria a menor diferena para voc.Escrevi todos os fatos relativos quele crime como ajudei o homem a fugire, mais tarde, ao voltar para Londres, reconheci-o como sendo o Sr. David

    Judd e o documento est com meu advogado. Seu advogado? Claro, meu advogado confirmou Fred, balanando a cabea.

    Debruou-se na direo de Judd. Sabe, no acreditei que seu irmotivesse morrido. Pensei que fosse uma farsa para me tirar do caminho e noteria acreditado se no tivesse lido nos jornais e ido pessoalmente ao enterro.

    O Dr. Judd se ergueu, guardando o palito de ouro. E um homem como voc pode macular um nome como o dele!

    exclamou. Todo o bom humor se desvanecera e ele tremia de indignao epaixo.

    Passou para a frente da mesa e ficou de p, encarando furiosamenteFred Fulgurante. Este, j acostumado a cenas como aquela pois no era

    seu primeiro caso de extorso limitou-se a sorrir. Ele foi o melhor homem que j viveu nesta terra: o maisinteligente, o mais maravilhoso declarou o Dr. Judd, muito plido. Talvez tenha sido o maior homem que este mundo j conheceu!. sua voztremia com a intensidade da emoo. E voc!...

    Estendeu os braos e, antes que Fred percebesse o que acontecera, amo enorme o agarrou pela gola, obrigando-o a levantar-se.

    Ei, pare com isso! gritou Fred, tentando libertar-se.

    No me importo pelo dinheiro prosseguiu Judd.

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    No isso que me enraivece. O pior saber que voc est emcondies de sujar o nome de um homem que...

    Neste ponto, no conseguiu continuar. Ergueu a outra mo.Com um grito de animal selvagem, Fred se atirou para trs com todas

    as suas foras e livrou-se das mos do adversrio. De repente, num passe de

    mgica, um revlver apareceu em sua mo. Mos ao alto e no se mova, maldito!Ento, uma voz a voz mais suave do mundo indagou: Posso ser til?Fred virou-se, assustado. Larry Holt estava de p no umbral da

    porta, exibindo um sorriso encantador.

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    O Testamento

    Fred Fulgurante olhou para o intruso e seu rosto constitua umacaricatura de cmico espanto. No perde tempo, no ? protestou.Larry riu baixinho. Est preso por porte ilegal de armas, Fred. No crime neste pas replicou o outro, guardando o revlver.A essa altura, o Dr. Judd j se recobrara. Vejo que conhece nosso amigo Grogan disse calmamente.

    Faz parte de nossa companhia de teatro amador e estvamos ensaiandouma cena dos Irmos Corsos. Suponho que tenha sido um poucoalarmante para o senhor.

    Pensei que fosse Jlio Csar replicou secamente Larry, Acena entre Cssio e Brutus, embora no consiga lembrar-me de usaremarmas de fogo.

    O doutor olhou para Fred Fulgurante e depois para Larry. Creio que no o conheo comentou, ainda um pouco plido,

    mas recuperando o tom bem-humorado. Sou o Inspetor Larry Holt, da Scotland Yard informou Larry.

    Agora, falando srio, Dr. Judd, vai apresentar alguma queixa contra essehomem?

    No, no, no, respondeu Judd, rindo. Falando srio, eraapenas uma brincadeira inofensiva.

    Larry olhou de um para outro. O diretor-gerente de uma companhia

    de seguros, por menor que esta seja, no brinca com um criminosoconhecido. Suponho que conhece esse homem? Encontrei-me com ele vrias vezes disse Judd, pouco

    vontade. Sabe, tambm, que ele membro da classe criminosa? Que, na

    verdade, o Fred Fulgurante, que cumpriu pena de priso neste pas etambm foi condenado deteno na Frana?

    O doutor permaneceu calado por algum tempo. Depois, disse em voz

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    baixa: Acho que tambm adivinhei isso e, consequentemente, minha

    associao com tal indivduo pode lhe parecer um tanto curiosa. Todavia,no posso explic-la.

    Larry assentiu com um movimento de cabea. A nica pessoa

    perturbada naquela sala era Fred Fulgurante, que se debatia numa agonia demedo de que o Dr. Judd revelasse seu segredo e o motivo daquela visita.Todavia, o Dr. Judd no tinha tal inteno.

    Pode ir, agora disse laconicamente.Fred, tentando recobrar um pouco da atitude atrevida que exibira ao

    chegar, acendeu um charuto com mo trmula. Larry observou a operao. Est precisando de um remdio para os nervos, Fred comentou

    ele. Vi uma farmcia aberta na esquina, quando vim para, c.

    Fred saiu com um intil esforo para mostrar indiferena. Larry,olhou-o sair e, em seguida, voltou-se para o Dr. Judd.

    Sinto muito haver chegado num instante to inconvenienteembora no creia que o senhor corresse perigo. Fred consegue seus efeitosdramticos sacando armas, mas no as dispara.

    Concordo com o senhor disse o doutor, com uma risada. Sente-se, Sr. Holt. Eu certamente no o esperava. Costumo trabalhar aquiat tarde da noite.

    No havia ningum l embaixo quando cheguei disse Larry. Essa minha desculpa por ter subido sem me fazer anunciar.

    O doutor meneou a cabea. Mandei o zelador sair para comprar cigarros. Oh, a est ele.Houve uma batida porta e o zelador entrou, colocando um mao

    de cigarros sobre a mesa, em confirmao s palavras do doutor- Agora, em que posso servi-lo? indagou Judd, tirando um

    cigarro do mao e acendendo-o. Suponho que se trate do caso Stuart,no? Fui entrevistado hoje por um de seus homens.Larry assentiu. Trata-se do caso Stuart disse ele. Eu desejava alguns

    detalhes adicionais. Acabo de ser encarregado do caso e interrompi o examedos... dos despojos a fim de chegar aqui antes que o senhor fosse embora.

    Sei muito pouco disse o doutor, fumando confortavelmente. Ele foi comigo ao teatro na noite de anteontem. Era um homem estranho,

    calado, reticente, que conheci por acaso. Na verdade, eu me encontrava

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    num carro que se chocou contra o txi ocupado por ele e fiquei ligeiramenteferido. Ele me fez uma visita e assim se iniciou nossa amizade se que sepode chamar de amizade...

    Conte-me o que aconteceu na noite de anteontem pediu Larry.O doutor olhou para o teto.

    Bem, deixe-me ver... Posso fornecer-lhe a hora quase exata, poissou muito metdico. Encontrei-o na entrada do teatro s sete e quarenta ecinco e fomos juntos para o Camarote A. o ltimo camarote esquerda.Fica no nvel da rua; a plateia e o palco ficam num nvel inferior.Permanecemos no camarote durante os dois primeiros atos. Ento, quando acortina baixou no final do segundo ato, ele deu uma desculpa, saiu docamarote e nunca mais foi visto.

    Nenhum dos atendentes o viu?

    No, replicou o doutor. Mas creio que isso fcil de explicar.Era noite de estreia e, como o senhor sabe, os atendentes ficam muitointeressados no espetculo, postando-se nas portas e entradas das rampas,olhando para o palco em vez de cuidarem de suas obrigaes normais.

    O senhor sabia que ele era um Stuart um ricao? perguntouLarry.

    Eu no fazia a menor ideia disse o doutor, com franqueza. Nada sabia a respeito de seu passado, exceto que ele viera do Canad.

    Larry ficou desapontado. Eu esperava conseguir do senhor uma boa quantidade de

    informaes disse ele. Parece que ningum conhecia Stuart e,naturalmente, julguei que o senhor talvez fosse confidente dele.

    Nem eu nem o gerente do banco ramos confidentes dele afirmou o doutor. S esta manh o gerente do London & Chatham meinformou que Stuart era cliente deles. Nada sabemos a respeito dele

    absolutamente nada a no ser que possua muito dinheiro.Poucos minutos depois, Larry caminhava, muito pensativo, ao longode Bloomsbury Pavement. O que estaria Fred Fulgurante fazendo naqueleescritrio? O que significariam aquele revlver e a palidez do Dr. Judd? Eramais um pequeno mistrio que ele no tinha tempo de investigar e que,ademais, no lhe dizia respeito, de forma alguma. sua frente, um homemcaminhava, lenta e cautelosamente, batendo com a ponta de ferro da

    bengala na calada. Larry passou por ele. Fez sinal para um txi e, ao esperar

    a aproximao do veculo, tomou a ver o homem da bengala.

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    Cego, disse com seus botes, sem interromper seus pensamentos arespeito de Fred e do doutor.

    Mas no tinha tempo livre para desvios ou devaneios. Entrando notxi, mandou o motorista seguir para Westminster.

    No voltaria imediatamente para a Scotland Yard. Antes, precisavacumprir uma pequena mas revoltante tarefa. Saltando do txi em frente aonecrotrio de Westminster, encontrou dois detetives da Scotland Yard suaespera.

    O exame do cadver foi rpido. A nica marca era um arranho notornozelo esquerdo. Em seguida, Larry comeou a inspecionar as roupas, quetinham sido levadas para uma sala adjacente.

    Ali est a camisa, senhor o policial apontou para a pea mal

    dobrada. No consigo entender essas marcas azuis no peito.Larry levou a camisa para baixo da lmpada. Era uma camisa a rigor,

    amarrotada; as pequenas marcas roxas no peita eram nitidamente visveis. Marcas de lpis-tinta disse Larry, lembrando-se subitamente da

    lapiseira desaparecida. O que significavam, porm, aquelas marcas queformavam trs linhas de garranchos indecifrveis?

    Ento, Larry percebeu a soluo. Virando o peitilho da camisa a rigor

    pelo avesso soltou uma exclamao. Havia trs linhas escritas na parteinterna do peitilho e o lpis-tinta molhado atravessara o tecido, causando asmanchas na frente da camisa.

    A gua borrara um pouco o lpis-tinta, mas as palavras eram legveis:

    Temendo a morte, eu, Gordon Stuart, de Merryhill Ranch,Calgary, deixo tudo o que possuo para minha filha, Clarissa, e rogo aostribunais que aceitem estas linhas como minha ltima vontade e

    testamento. GORDON STUART.

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    Logo abaixo, estava escrito:

    evidente, agora, que fui trado por...Seguia-se uma letra que parecia um O, mas, naquele ponto, a

    escrita terminava abruptamente.Larry ergueu os olhos e encarou seu subordinado. Eis aqui o testamento mais estranho que j foi feito comentou

    em voz baixa.Largou a camisa e voltou cmara morturia, tornando a examinar o

    cadver. Uma das mos estava cerrada e, evidentemente, o fato escapara observao dos mdicos. Empregando toda a fora, Larry abriu os dedos ealgo caiu no cho com um rudo caracterstico. Curvou-se e apanhou o

    objeto: Era uma abotoadura quebrada, de desenho peculiar. O centro deesmalte preto e a orla de pequenos brilhantes. Larry fez mais uma inspeo,nada descobrindo de novo.

    Ento, olhou para o companheiro, franzindo a testa. O quesignificaria aquilo? De que modo se associavam entre si todas aquelascircunstncias? Tinha certeza de que seria possvel estabelecer uma ligaoentre elas: o estranho encontro entre Fred Fulgurante e o Dr. Judd; otestamento escrito na camisa; e aquela ltima pista. Uma atmosfera deimpenetrvel mistrio envolvia o caso, como um nevoeiro por detrs do qualse movessem formas estranhas e desumanas, mal avistadas de relance.

    Assassinato!Larry sabia, sentia cada vulto sombrio pelo qual ele passou no

    caminho de volta ao seu gabinete de trabalho parecia sussurrar a palavra:Assassinato!

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    O Texto em Braille

    A moa estava fazendo caf no fogareiro eltrico quando ele entrou. Ol! exclamou ele, espantado. Eu tinha me esquecido devoc.

    Ela sorriu. Diga-me uma coisa acrescentou ele, depressa. Suart tinha

    abotoaduras?Ela meneou afirmativamente a cabea e pegou um pequeno pacote

    na mesa.

    O Comissrio tinha esquecido de mandar isto aqui; chegou logodepois que o senhor saiu explicou.

    Larry abriu o pacote. Eram abotoaduras lisas, de ouro, semmonogramas ou brases. Ele retirou do bolso a abotoadura de esmalte e

    brilhantes, tomando a examin-la. O que isso? perguntou a jovem, O senhor a encontrou no...Interrompeu-se, hesitante.Ele assentiu.

    Encontrei-a na mo dele confirmou. Ento, acha que foi homicdio? Tenho certeza, replicou Larry. Ser extremamente difcil

    provar e, a menos que ocorra um milagre, o bandido que cometeu o crimepermanecer em liberdade.

    Abriu o armrio e retirou a bandeja com os objetos, adicionando coleo o par de abotoaduras de ouro e a abotoadura quebrada que

    encontrara na mo do cadver. Absolutamente nada comentou, sacudindo a cabea. Ento,lembrou-se de que no havia examinado o pequeno rolo de papel pardo. No sei o que isto. Foi encontrado no bolso dele.

    Desenrolou o papel, esticando-o sobre a mesa. A jovem se aproximoupelo lado oposto e debruou-se para ver melhor. O papel tinha cerca de dezcentmetros de comprimento por cinco de largura.

    Nada escrito aqui disse Larry. Virou o papel e olhou o verso.

    Aqui tambm no. Mandarei fotograf-lo amanh.

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    Um momento disse a jovem, depressa. Tirou o papel das mosde Larry e passou de leve sobre a superfcie as pontas de seus dedosdelicados.

    Larry percebeu que ela empalidecia. Foi o que pensei murmurou ela. Tive quase certeza quando

    vi o relevo. O que ? indagou Larry, ansioso. Neste papel existem algumas palavras escritas em Braille, a escrita

    dos cegos disse ela, passando novamente os dedos pela superfcie dopapel, parando aqui e ali, com. uma expresso intrigada no rosto.

    Braille? repetiu Larry, espantado.Ela assentiu. Eu costumava ler Braille quando trabalhei no Instituto

    explicou. Mas parte deste texto foi danificada, provavelmente pela gua.Algumas palavras, porm, esto bem ntidas. O senhor quer anotar enquantoeu soletro?

    Larry pegou a caneta e apanhou uma folha de papel na prateleira,aguardando as palavras da moa. Mesmo naquele momento de expectativa,refletiu que as posies se haviam invertido de modo bastante curioso:agora, ele era secretrio e a jovem era detetive...

    A primeira palavra legvel assassinado disse ela. Emseguida, um espao e, depois, a palavra caro; ento, outro intervalo e apalavra mar. Isso tudo.

    Com a esquisita mensagem entre eles, fitaram-se em silncio. Quecego, dentre os vultos sombrios que haviam sussurrado para ele em meio aonevoeiro, enviara aquela mensagem?

    O que havia por detrs daquele rolo de papel molhado? A quempertenceria a abotoadura encontrada na mo rgida do cadver? Por que

    fora assassinado? Havia dinheiro em seus bolsos; seus pertences estavamintatos. No se tratava de um latrocnio, Nem de vingana, pois ele eradesconhecido na cidade. .

    Um fato sobressaa: um ponto tangvel a partir do qual Larry sabiaque se irradiariam seus movimentos futuros.

    Assassinato! murmurou. E eu encontrarei o criminosomesmo que ele se esconda no inferno!

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    Um Telegrama de Calgary

    Diana Ward fitava seu chefe com um novo interesse nos belos olhos. Braille disse ele, em voz baixa. a linguagem escrita doscegos, no mesmo?

    Ela assentiu. Sim. usada na impresso de livros e jornais confirmou. So

    caracteres em relevo, constitudos de um conjunto de pequenos pontos,cuja relao entre si forma a letra.

    Ela tomou a pegar o papel acrescentando:

    Quando os cegos escrevem em Braille, utilizam um pequenoinstrumento perfurante e uma espcie de guia. Isto aqui, porm, foi escritos pressas, por algum que no usou uma guia. Posso sentir a irregularidade;a ilegibilidade de algumas palavras se deve quase tanto aos defeitos deescrita quanto ao da gua.

    Larry pegou a curiosa pista e examinou-a com ateno. Stuart poderia fazer isto com a lapiseira?Ela sacudiu negativamente a cabea e indagou:

    O senhor encontrou a lapiseira? No respondeu Larry, sombrio. Mas descobri para que ela foi

    utilizada.Desembrulhou o pacote que trouxera consigo, mostrando jovem a

    camisa e a trgica mensagem escrita no avesso do peitilho. Por que pelo lado de dentro? perguntou Larry, pensativo.

    Alm disso, est escrito no lado esquerdo.

    Diana compreendeu: Teria que ser escrito, necessariamente, no lado esquerdo, se eleescrevesse com a mo direita disse ela.

    Contudo, por que pelo lado de dentro?Ela sacudiu a cabea. No sei. Seria muito mais simples se ele... J entendi! exclamou Larry, triunfante. Ele escreveu o

    testamento onde no poderia ser visto por qualquer pessoa. Se fosse escrito

    pelo lado de fora da camisa, teria sido visto e, provavelmente, destrudo.

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    Diana estremeceu. Ainda no me tornei bastante insensvel comentou com um

    sorriso. H algo terrvel em tudo isto, no mesmo? Creio que o senhortem razo: e, baseando-nos na pressuposio de que ele escreveu otestamento dessa maneira a fim de evitar que fosse visto por uma terceira

    pessoa, devemos supor que essa terceira pessoa existia. Em outras palavras:existia algum que ele temia ou, se prefere, algum era cujas mos eletemia morrer e o crime foi premeditado, pois ele deve ter permanecidopor algum tempo sob a custdia dessa terceira pessoa antes de ter aquelehorrvel fim.

    Interrompeu-se bruscamente ao perceber que Larry a fitava. Baixouos olhos e enrubesceu.

    Voc mesmo uma maravilha, comentou ele suavemente.

    Se eu no me cuidar, acabarei perdendo o emprego.Percebeu a expresso de dvida nos olhos dela e riu. Ora, Srta. Ward disse em tom brincalho. Vamos comear em

    igualdade de condies e peo-lhe que me perdoe qualquer cimeprofissional.

    Cime profissional! zombou ela. Seria um absurdo! Nem tanto disse Larry. J vi homens com inveja de

    mulheres por motivos bem menos importantes. E agora disse,consultando o relgio acho melhor voc ir para casa. Vou chamar um txi.Mora longe daqui?

    No. Em Charing Cross Road respondeu ela. Ento, deix-la-ei em casa disse Larry. J quase uma hora.Diana Ward j comeara a vestir o casaco e colocar o chapu. Muito obrigada, mas irei sozinha declarou. No justo. Na

    verdade, Sr. Holt, no quero que se acostume a me levar at em casa toda

    vez que eu trabalhar at mais tarde. Estou bastante acostumada a andarsozinha e no preciso de txi para ir at em casa. Moro perto daqui. Veremos replicou Larry, escrevendo rapidamente num

    formulrio de telegrama. Se eu conseguir enviar este telegrama a tempo,o Chefe de Polcia de Calgary dever receb-lo ontem, hora do ch!

    Ontem? exclamou a moa, surpresa. Oh, sim. Naturalmente.H uma diferena de nove horas em relao ao horrio de Greenwich.

    Larry soltou um gemido.

    Oh! Terei que experimentar novos truques com voc

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    comentou.Voltaram para casa caminhando juntos. Na verdade, o pequeno

    apartamento da jovem ficava na direo que Larry teria que tomar.Chegando a seu prprio apartamento, situado em Regents Park, Larryencontrou o paciente Sunny estendendo seu pijama sobre a cama.

    Pouco depois, j de pijama e usando um roupo estampado,bebericando chocolate quente, Larry disse- Sunny, em algum lugar desta c idade existe um cavalheiro muito

    desagradvel, de nome ignorado. Creio que h muitos como ele, senhor disse Sunny. E existe, em algum lugar da Inglaterra, um homem conhecido

    pelo ttulo de Carrasco Oficial. Meu dever colocar os dois em contatopessoal!

    Chegou Scotland Yard s oito e meia da manh seguinte e, para suasurpresa, Diana Ward j se encontrava no gabinete. Os memorandosdepartamentais e os vrios documentos que chegam rotineiramente aosfuncionrios graduados da Scotland Yard encontravam-se meticulosamentearrumados sobre o mata-borro que forrava o tampo da mesa.

    Acaba de chegar um telegrama anunciou a moa. No abri. O senhor precisa dar-me instrues sobre o que fazer

    com cabogramas e telegramas. Abra-os todos replicou Larry. No tenho negcios

    particulares. E os bilhetes perfumados que recebo podem ser lidos sem fazercorar a mais pura donzela.

    Ela atravessou a sala com o cabograma na mo e Larry pegou o papel. Calgary comentou, lendo o endereo do remetente. Trabalho bem rpido.Ento, ficou boquiaberto, pois o telegrama dizia:

    STUART NO TINHA FILHOS. NO ERA CASADO.Larry olhou para a moa. Elimine o primeiro ponto disse ele.Ela tomou-lhe o telegrama e verificou a hora da remessa. um telegrama de conhecimento geral declarou. O que quer dizer com isso? indagou Larry, bem-humorado.

    Bem, deve ter sido respondido logo aps o recebimento do nosso.

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    A pessoa que o redigiu limitou-se a informar um fato que do conhecimentode todos. Era outras palavras: no fez investigaes, limitando-se aconsiderar o fato como consumado. Provavelmente, perguntou a algum doescritrio: Stuart casado ou solteiro? Quando responderam Solteiro, eledespachou a resposta.

    Larry dobrou o telegrama, guardando-o numa gaveta da mesa. Se do conhecimento geral que Stuart no era casado, istomeramente contribui para complicar uma situao que j bastanteconfusa. Temos o caso de um homem que morreu, evidentementeassassinado, e poucos momentos antes de morrer escreveu no lado internoda camisa um testamento secreto. A propsito, possvel que ele o tenhafeito na presena dos assassinos sem que estes percebessem; creio mesmoque isso muito provvel.

    Foi o que pensei concordou a moa. Ele foi assassinado, mas, antes de morrer, escreveu o testamento

    no interior do peitilho da camisa a rigor, deixando todas as suas posses para afilha. Ora, um homem mentalmente so e no existe motivo parasupormos que ele no fosse inteiramente so no inventa uma filha deum momento para outro. Consequentemente, bvio que o Chefe dePolcia de Calgary est enganado.

    A jovem interps: igualmente bvio que, se ele se casou realmente, no o fez em

    Calgary ou mesmo no Canad, onde o fato se tornaria conhecido.Casamentos secretos so possveis nas grandes cidades; em lugarespequenos, entre gente proeminente e, aparentemente, ele nem vivianuma cidade de interior, mas numa fazenda , o fato de ser casado nopoderia escapar ao domnio pblico.

    Ao voltarem para casa na noite anterior, Larry contara jovem quase

    tudo o que lhe fora revelado pelo Comissrio-Chefe. No era comum paraele fazer confidncias to facilmente, mas havia algo extremamenteatraente em Diana Ward; a confiana de Larry, que geralmente crescia comlentido, amadurecera de um momento para outro.

    A moa fitava pensativamente o tampo da mesa. Se ele se casou em segredo murmurou ela, afinal no teria

    sido em... em... Em Londres, naturalmente disse Larry, meneando a cabea.

    Mande outro telegrama ao Chefe de Polcia de Calgary, pedindo detalhes

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    dos movimentos conhecidos de Stuart. Pergunte quando ele esteve emLondres pela ltima vez, antes desta visita.

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    A Lpide

    Diana Ward assentiu, tirou da prateleira um formulrio de telegramae comeou a escrever. Larry correu mecanicamente os olhos pelosmemorandos e relatrios, rubricou um deles e deixou os outros de lado. Emseguida, abriu o armrio, retirou a bandeja com os objetos e levou-a mesa. luz do dia, tornou a inspecionar o relgio, a argola da corrente, a cigarreirae, afinal, o rolo de papel pardo. luz do sol, os caracteres em relevo eram

    bem visveis e Larry passou cuidadosamente as pontas dos dedos sobre as

    pequenas marcas. Todavia, no sabia ler Braille e compreendeu que sua moera pesada demais era comparao com o delicado toque da secretria. Estaacabara de escrever, tocara uma campainha e passara a Larry o rascunho dotelegrama.

    Est bem assim disse ele.Depois que o mensageiro uniformizado veio buscar o formulrio e

    tornou a sair, Larry apontou para o texto em Braille e perguntou a Diana: Notou algo peculiar nesse pedao de papel?

    Sim respondeu ela. Examinei-o antes que o senhor chegasse.No se importa? acrescentou rapidamente.

    Larry riu. Pode examinar tudo o que desejar, menos minha conscincia

    respondeu. Voltando mais uma vez a ateno para o papel, indagou: Percebeu que uma extremidade do papel est menos desbotada que aoutra?

    Notei, ontem noite, que uma extremidade estava mais seca quea outra disse a moa. Este, evidentemente, o motivo da diferena decolorao. Foi na parte seca que conseguimos melhor resultado. Por exemplo:a palavra assassinado estava quase seca; mida, mas no molhada.

    Larry assentiu. Diana abriu uma gaveta de sua mesa e pegou umafolha de papel pardo.

    Trouxe isto comigo disse ela. uma folha de um livro deBraille; andei fazendo experincias com tiras de papel que arranquei do livro

    e molhei na minha pia. Eis aqui o resultado.

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    Exibiu um pequeno rolo de papel molhado, que ameaava desfazer-se quando ela tentava desenrol-lo.

    Hum! grunhiu Larry.Ambos tinham chegado mesma concluso, embora por processos

    diferentes ela, por experimentao, ele, por deduo. A concluso era que

    o rolo de papel pardo fora colocado no bolso de Gordon Stuart depois que ocadver fora retirado da gua. Haveria bastante gua nas roupas para saturar o papel

    comentou Larry. Trata-se ,de um material muito absorvente, quase comomata-borro. Portanto, chegamos ao seguinte: Gordon Stuart foi afogado e,depois de morto, o cadver foi manipulado por uma ou mais pessoas. Umadelas lhe colocou essa mensagem no bolso. Esta pessoa cega, ou, ao menos,acredita-se que seja...

    Interrompeu-se, arregalando os olhos. Por Deus! exclamou, ante a sbita ideia. O que ia dizer? quis saber Diana Ward. Ser possvel que... comeou Larry, franzindo a testa. Era uma

    ideia absurda: a pessoa homem ou mulher que deixara a mensagem nobolso do cadver esperava que testa fosse lida por Diana Ward.

    Ora, Diana Ward no ocupava um cargo oficial na Scotland Yard, e ofato de ser secretria de Larry Holt era uma circunstncia puramentecasual, que no poderia ser prevista por uma pessoa estranha organizaopolicial. Todavia, um rpido telefonema ao Chefe de Informaes Internasrevelou que no havia um perito em Braille na Scotland Yard; o nicopolicial que conhecia o sistema de escrita dos cegos estava de licena por seismeses, para tratamento de sade.

    Creio que o senhor pode desistir da ideia de que a mensagem eradestinada a mim disse a jovem, com um sorriso. No; foi escrita por

    uma pessoa cega, ou estaria num formato mais regular. Algum que tivesse ouso da viso- certamente... Suponhamos que esse algum estivesse escrevendo no escuro?

    interps Larry, guardando a bandeja e trancando o armrio.A moa sacudiu a cabea. Se no fosse cego, no estaria de posse do instrumento destinado a

    produzir essas marcas, ponderou ela. Larry refletiu que elaprovavelmente tinha razo.

    Passou duas horas ditando cartas endereadas a diversas

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    autoridades. s onze horas, ergueu-se da mesa, vestiu o sobretudo e colocouo chapu.

    Vamos dar um passeio anunciou. Ns? perguntou a moa, espantada. Quero que venha comigo replicou Larry em tom autoritrio.

    Diana Ward obedeceu mansamente.Um carro os aguardava porta da Scotland Yard e, obviamente, omotorista j recebera instrues.

    Vamos a Beverley Manor, a aldeia que Stuart tanta gostava devisitar explicou Larry moa. Estou ansioso- por descobrir que tipo deatrao a velha igreja saxnica exercia sobre o infeliz. Parece-me que ele noera arquelogo, de modo que o fato de os alicerces terem mais de mil anosno lhe interessaria muito.

    Era um belo dia de primavera, com a dose exata de fria no ar paracolorir a face jovem e saudvel de Diana Ward. As sebes brotavam,verdejantes, e os gramados estavam cobertos de prmulas amarelas.Viajavam calados, um homem e uma mulher a quem o destino reunira emcircunstncias to estranhas, apreciando o dia dourado, e gratos por estaremvivos naquela estao de renovao. O mundo inteiro estava cheio de vida.Pssaros cortavam o ar em todas as direes, no af de construrem seusninhos. Vultos furtivos corriam atravs da estrada, passando de uma tocapara outra. Em alguns jardins floresciam lrios brancos.

    Beverley Manor era uma aldeia isolada, situada na base do KentishRag. Excetuando a igreja antiga, poucas atraes tinha a apresentar aosvisitantes, pois estava afastada da estrada principal de Kent, um recantoescondido da Inglaterra rural, onde a vida seguia ura curso rotineiro etranquilo.

    Pararam o cano diante da estalagem, onde Larry encomendou o

    almoo, e depois foram a p at a igreja, situada a quatrocentos metros dedistncia, beira de uma estrada bonita e agradvel. No era uma igrejabonita; a torre quadrada era baixa e desproporcional. Geraes sucessivas,tentando melhorar as linhas originais simples da construo, haviamproduzido uma mistura arquitetnica onde se viam traos dos estilosromnico, gtico e normando.

    Parece estar praguejando, no mesmo? comentou Larry,irreverente, ao passarem pelo velho porto e entrarem no adro.

    A porta da igreja estava aberta e o interior vazio. Por mais

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    perturbador que fosse o aspecto externo, reinava serenidade, paz esimplicidade no calmo interior.

    Larry esperara encontrar nas paredes da igreja pedrascomemorativas que lhe fornecessem alguma pista dos movimentos deStuart. Contudo, a no ser por uma placa de metal louvando as virtudes de

    um antigo vigrio, e a tumba de um velho bispo de Rochester, no haviainscries lapidares. Ento, Larry saiu para o velho cemitrio anexo igreja edeu incio a uma sistemtica inspeo dos tmulos.

    Afinal, chegou extremidade oposta do cemitrio, onde meia dziade operrios carregava uma lpide nova, envolta em lona. Larry e DianaWard postaram-se lado a lado, observando em silncio os operrios pousarema carga junto a um tmulo bem cuidado.

    Acho que perdemos a viagem comentou Larry.

    Vamos fazer algumas perguntas na aldeia e, depois, voltar aLondres.

    Fez meno de se afastar, quando um dos operrios retirou a lonaque cobria a lpide.

    No custa nada sabermos quem disse Larry, avanando paraespiar.

    Os operrios se afastaram um pouco, a fim de deix-lo ver melhor.Larry leu a inscrio na lpide e prendeu a respirao.

    memria de Margaret Stuart,esposa de Gordon Stuart (Calgary, Canad),

    falec ida em 4 de maio de 1899.E tambm de sua nica filha, Jeane,

    nascida a 10 de junho de 1898,falecida a 1 de maio de 1899.

    A moa se juntara a Larry e, lado a lado, ambos fitaram a lpide. Sua nica filha! exclamou Larry, perplexo. Sua nica filha!

    Ento, quem Clarissa?

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    O Homem que Perdeu um Dedo

    Um exame dos registros locais no produziu resultados satisfatrios.Margaret Stuart falecera numa fazenda a cinco quilmetros de BeverleyManor, e a fazenda j mudara duas vezes de dono aps sua morte.

    Vinte anos atrs? perguntou o fazendeiro entrevistado porLarry. Ora, h vinte anos este lugar era uma espcie de asilo. Pertencia auma mulher que recebia invlidos.

    No sabia dizer onde se encontrava atualmente a mulher. Esta noera natural da regio. Ele tinha a impresso de que ouvira falar na morte

    dela. Tenho feito um esforo terrvel para me lembrar do nome dela

    disse o fazendeiro. Eu disse ontem ao cavalheiro que seria melhor ele ir aSomerset House...

    Um cavalheiro esteve aqui ontem? interrompeu rapidamenteLarry. Algum esteve aqui ontem fazendo indagaes a respeito?

    Sim, senhor: um homem de Londres respondeu o fazendeiro. Chegou num carro e me ofereceu cinquenta libras se eu soubesse dizer o

    nome da mulher que tomava conta deste lugar quando era um asilo. E maiscem libras se eu pudesse dar alguma informao a respeito de uma damaque morreu aqui, h vinte e dois anos. Uma senhora chamada Stuart.

    Oh, mesmo? comentou Larry, muito alerta, pois tinha certezade que as indagaes no haviam partido da Scotland Yard. Como era otal cavalheiro que esteve aqui ontem? indagou.

    Era bastante alto respondeu o fazendeiro. No vi direito o

    rosto, porque ele manteve o sobretudo abotoado at o queixo. Mas repareique no tinha o dedo mnimo da mo esquerda.No trajeto de volta a Londres, tanto Larry como Diana Ward

    permaneceram calados, imersos em seus prprios pensamentos. O carro jestava abrindo caminho por entre o trfego na Westminster Bridge Roadquando Larry fez a primeira meno ao passeio.

    Quem teria uma pressa to frentica para descobrir tudo arespeito dos Stuarts, dispondo-se a pagar cinquenta libras por qualquer

    informao? perguntou ele. E quem ser sua filha Clarissa? E como

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    poderia ele ter uma filha chamada Clarissa, quando sua nica filha jaz nocemitrio de Beverley Manor?

    O senhor fez perguntas ao pedreiro local, quando atravessamosBeverley Manor. Descobriu alguma coisa?

    Larry meneou afirmativamente a cabea.

    A lpide foi colocada por encomenda do Sr. Stuart, que costumavair ao cemitrio todos os dias e ficar sentado junto ao tmulo. A lousa foiencomendada h dois meses; foi vista e aprovada por Gordon Stuart nasemana passada.

    Mordeu o lbio, pensativo, antes de acrescentar: Entre a semana passada e a noite em que foi assassinado, Stuart

    deve ter descoberto que tinha outra filha.Ento, sacudiu a cabea.

    No. Esse tipo de coisa no acontece declarou decisivamente. Pelo menos, no na vida real.

    Larry passou dez minutos com o Comissrio-Chefe e, depois, foi aocentro da cidade. A moa no tomou a v-lo at as sete horas da noite.Recebera instrues no sentido de no esperar por ele, pois era sbado e seuexpediente de secretria se encerrava s treze horas. Todavia, estavasentada sua mesa, lendo, quando Larry entrou no gabinete. O inspetorestava to eufrico que nem reprovou a desobedincia da jovem.

    Consegui! exclamou, exultante. O assassino? perguntou ela, sobressaltada. No, no. A histria de Stuart. J chegou a resposta ao telegrama?Diana sacudiu a cabea em negativa. No faz muita diferena declarou Larry, caminhando de um

    lado para outro da sala. Descobri o registro do casamento. Ocorreu no anodo Jubileu de Brilhante; em agosto de 1897. Foi celebrado numa igreja em

    Highgate. No percebe o que aconteceu? No estou conseguindo disse Diana Ward, pausadamente. Bem, eu lhe conto. Gordon Stuart, ainda jovem naquela poca,

    estava de visita a este pas. Descobri que esteve hospedado no Cecil Hotelde junho a agosto de 1897. Casou- se com a moa, cujo nome era MargaretWilson, e voltou sozinho para l em maro de 1898. Existe um registro nohotel indicando que Stuart partiu para o Canad dois dias aps haverregressado ao hotel. Eles mantm um livro onde so anotados os endereos

    aos quais deve ser remetida a correspondncia que chegar aps a partida

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    dos hspedes. Portanto, no foi difcil acompanhar os movimentos de Stuartat aquela data. Em seguida, fui procurar o vigrio da igreja onde Stuart secasou, e fiz uma grande descoberta.

    Fez uma pausa, passou a mo pelos cabelos e franziu a testa. Na verdade, eu gostaria de saber quem o tal homem alto que

    perdeu o dedo mnimo da mo esquerda comentou, irritado. Por qu? indagou ela, surpresa. Ele esteve l um dia antes de mim disse Larry. Ento, afastando

    a irritao, prosseguiu: Eis a histria contada pelo prprio Stuart aovigrio, a quem encontrou no Strand na vspera de sua partida para oCanad, de onde s voltou h cerca de oito ou nove meses.

    O vigrio celebrou o casamento e se recorda perfeitamente dosfatos. Declarou que Stuart era um jovem muito nervoso e um tanto

    presunoso, que tinha um medo horrvel do pai, um rico latifundiriocanadense. Stuart confessou ao vigrio, ao tomarem ch no Cecil, que iadeixar a esposa na Inglaterra e voltar ao Canad, a fim de dar pessoalmenteao pai a notcia do casamento. Tinha considerveis dvidas sobre a eventualatitude do pai, ou, para ser mais exato, no tinha a menor dvida de que ovelho armaria um rebulio dos diabos. A impresso dada por Stuart aovigrio foi de que o pai o deserdaria. Para resumir tudo em poucas palavras,Stuart anunciou que partiria no dia seguinte, revelaria tudo ao pai naprimeira oportunidade e, depois, voltaria para a esposa.

    O vigrio no tem a menor dvida de que Stuart no revelou averdade ao pai continuou Larry. Ocultou cuidadosamente o segredodo casamento e, apavorado com a possibilidade de ser desmascarado, cortoutoda e qualquer comunicao com a esposa.

    Diana Ward sacudiu a cabea. No devemos julgar mal os mortos, mas no foi uma atitude muito

    correta por parte dele , comentou ela. Concordo plenamente disse Larry. No foi justo. Contudo,deve ter deixado para a esposa uma considervel soma em dinheiro. Detodo modo, quando o vigrio tornou: a v-la, ela parecia estar era situaomuito confortvel. Stuart partiu em maro. Em junho de 1898, trs mesesmais tarde,, nasceu sua filha: a filha que ele jamais viu e a respeito da qualnunca deve ter ouvido falar at que os anos de remorso surtiram efeito,obrigando-o a voltar Inglaterra, a fim de procurar a esposa e dar-lhe a

    posio a que ela tinha direito.

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    Provavelmente contratou um investigador particular. O pontofinal da investigao foi o cemitrio da velha igreja de Beverley Manor otmulo da esposa e da nica filha.

    E Clarissa? indagou a jovem. Larry deu de ombros. o Mistrio N 2, que precisa ser esclarecido.

    Diana Ward permaneceu calada, pensativa, com a bela testafranzida de perplexidade. Afinal, largou a caneta que estivera mordendo eergueu os olhos para fitar Larry com um sorriso vagaroso e triunfante, quelogo provocou uma reao no rosto dele.

    Conseguiu resolver? indagou Larry, ansioso. Quando elaassentiu com a cabea, ele insistiu: Solucionou O mistrio de Clarissa?

    Creio que um dos problemas mais fceis que temos a resolver declarou ela, Foi tolice minha no ter pensado nisso antes. O senhor

    encontrou o registro do nascimento? No. Vamos dar uma busca amanh replicou Larry. Vou poupar-lhe o trabalho declarou Diana Ward. Clarissa a outra filha gmea. Gmeas! exclamou Larry, quase engasgado.A jovem meneou afirmativamente a cabea, os olhos brilhando de

    divertimento ante a surpresa do inspetor. bvio disse ela. A pobre Sra. Stuart teve duas filhas; uma

    delas morreu e a outra Clarissa, da qual Stuart talvez s tenha tomadoconhecimento em suas ltimas horas de vida.

    Larry fitou-a, perplexo. Quando voc for Comissria-Chefe da Polcia Metropolitana,

    ficarei muito grato se for designado para seu secretrio comentou ele. Creio que tenho muito a aprender com voc.

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    O Sr. Strauss Morre Numa Nota

    Fred Fulgurante no deixara Londres; para dizer a verdade, notinha mesmo a menor inteno de faz-lo. Havia em seu horizonte certasobscuridades que precisavam ser dissipadas, certas dvidas que precisavamser esclarecidas. Fred Fulgurante era esperto. Se no o fosse, certamente nopoderia viver no excelente estilo que escolhera para si, nem possuiria umapartamento na Jermyn Street ou um carro com motorista para lev-lo aoteatro noite. Suas despesas operacionais eram pesadas, mas os lucros eramenormes. Mantinha muitos ferros no fogo e no se queimava com nenhum

    deles que a arte do sucesso em todos os ramos de vida.Na noite do dia em que Larry Holt fizera sua descoberta, Fred

    Fulgurante, sozinho na tranquilidade e isolamento de sua elegante sala deestar, elaborara uma teoria que acompanhava de perto uma descoberta feitapor ele naquela manh. Homens com o seu temperamento e perspectivasincertas sofrem de insatisfao crnica. Tal insatisfao a causa parcial deseu desvio do estreito caminho reto e, tambm, totalmente responsvel porsua perdio final. Cem libras esterlinas mensais, pagveis anualmente,

    constituem uma bela renda; todavia, o submundo abomina tudo que lembreestabilidade, regularidade ou sistema trs qualidades to associadas com avida na priso, que trazem consigo uma espcie de mcula especialmentedesagradvel para os ex-reclusos penais.

    Mil e duzentas libras anuais durante cinco anos equivalem a seis millibras, ou vinte e quatro mil dlares taxa de cmbio vigente na ocasio uma soma respeitvel; todavia, cinco anos representariam uma enorme fatia

    da frentica vida de Fred Fulgurante. Na melhor das hipteses, mil eduzentas libras representam apenas dois golpes no trente et quarante,podendo ser perdidas em apenas trs minutos,

    O Dr. Judd era um colecionador. Fred fora informado de que aresidncia do Dr. Judd, em Chelsea, era um verdadeiro tesouro de quadros e

    joias antigas. Fred lera num jornal a notcia de que o Dr. Judd possua pedraspreciosas histricas no valor de cinquenta mil libras. Embora Fred no fosseapaixonado por Histria, interessava-se pelo valor das pedras preciosas. A

    teoria por ele desenvolvida naquela noite era essencialmente aritmtica. Se

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    conseguisse escapar com mercadorias avaliadas em dez mil libras numespao de vinte e quatro horas, no s anteciparia sua renda anual de oitoanos, como tambm evitaria o incmodo de vir a Londres a cada doze mesespara receb-la. Muita coisa podia acontecer em doze meses. Talvez nemsempre lhe fosse possvel fazer a viagem para efetuar o recebimento, pois as

    autoridades carcerrias so notoriamente difceis de persuadir. Ou elepoderia morrer.Conseguir aquela mercadoria removvel seria bastante difcil, pois o

    doutor no era o tipo de homem que deixa suas posses sem a devida guardae vigilncia. Na verdade, os mtodos comuns de penetrar na casa eramrepugnantes para os sentimentos profissionais de Fred, que ganhava oprprio sustento por meio da versatilidade de sua lngua e da rapidssimaadaptao de certas clulas cerebrais diante das emergncias; para ele, um

    p-de-cabra era um instrumento de terror, uma vez que implicava emtrabalho. Havia, porm, outro mtodo ... e, se ele conseguisse escapar, odoutor ousaria dar queixa polcia?

    Naquela tarde, passeando despreocupadamente por PiccadillyCircus ao meio-dia, Fred topara com um homem alto e corpulento, o qual,aps uma rpida troca de olhares, tentou evitar o encontro. Todavia, Fredpegou-o pelo brao, obrigando-o a virar-se.

    Ora, se no o velho n 278! exclamou. Como vai, Strauss?O rosto do Sr. Strauss contorceu-se nervosamente. Creio que est enganado, senhor disse ele. Deixe disso ordenou Fred, em tom vulgar, puxando-o pelo

    brao na direo de Lower Regent Street. Perdoe-me no t-lo reconhecido disse o Sr. Strauss, nervoso.

    Pensei que fosse um tira... Mas no sou interrompeu Fred Fulgurante. E como est indo

    no Velho Mundo, bem? Lembra-se da Galeria G do Bloco B, em Portland?O rosto do homem gordo se contorceu novamente. No gostava quelhe recordassem a experincia penitenciria, embora, na verdade, nadativesse contra o homem que ocupara a cela ao lado da sua.

    Como vai a vida? indagou ele.Por mero acaso, Fred Fulgurante no estava usando brilhantes

    vista, embora os trouxesse no bolso, pois no confiava em ningum. Mal mentiu Fred, pois nenhum bandido esperto admite estar

    em situao prspera. De repente, perguntou:

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    Por que pensou que eu era um tira, Strauss?Strauss parecia pouco vontade. Oh, s pensei por pensar respondeu canhestra- mente. Ainda est no velho jogo?Fred, fitando atentamente o rosto do gordo, percebeu que este

    desviou momentaneamente o olhar. No. Agora, estou na linha declarou o homem. Voc um mentiroso e vai continuar assim at morrer afirmou

    Fred, imitando Larry Holt. Aposto que est a caminho de algumreceptador.

    O homem tornou a olhar em volta, como se procurasse um caminhode fuga. Fred, que jamais desprezava uma oportunidade, por menor quefosse, exibiu a palma da mo, voltada para cima num gesto significativo,

    dizendo lacnico: Uma nota! Ou a muamba! So s umas coisinhas disse apressadamente o Sr. Strauss.

    Coisas que me deram, ou das quais ningum sentiria falta. Bugigangas. Duascolherinhas de prata... e enumerou os objetos roubados.

    Passe pra c! ordenou Fred, mais uma vez. Estou duro equero o dinheiro. Tirarei uma parte e voc receber o dinheiro de volta...qualquer dia desses.

    O Sr. Strauss obedeceu, praguejando. Vamos tomar um trago convidou Fred, quando a transao foi

    completada a seu gosto. Deixou-me apenas cerca de trs libras resmungou o homem.

    Na verdade, Sr. Grogan, no acho isso justo.Depois de olhar para Fred com ar desconfiado, acrescentou: E voc tambm no parece estar duro.

    As aparncias enganam replicou alegremente Fred, levando ooutro para um bar. O que agora: criado de quarto ou mordomo? Mordomo respondeu Strauss, tomando um trago. No um mau emprego, Sr. Grogan. Me chame de Fred retrucou Fred Fulgurante. Parece-me muita liberdade declarou Strauss, sinceramente.

    Tenho o emprego de mordomo de um timo cavalheiro acrescentou. Rico?

    O Sr. Strauss balanou afirmativamente a cabea.

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    Tem rios de dinheiro confirmou. No faz diferena, porm.Sabe que j estive preso e tem sido muito decente comigo.

    Fred o observava com ateno. Vejo que ainda usa drogas, hem? disse ele. O gordo ficou muito

    vermelho.

    Sim admitiu a contragosto. Tomo um pequeno estimulantede vez em quando. Muito bem disse Fred, Quem seu patro? Voc no o conheceria disse o Sr. Strauss, sacudindo a cabea

    Trabalha na City; dono de uma companhia de seguros. No seria o Dr. ... Judd? indagou Fred Fulgurante. . Ora, sim confirmou o outro, espantado. Como sabe?Despediram-se pouco depois e Fred Fulgurante ficou pensativo o

    resto do dia. Ao cair da tarde, seus planos comearam a tomar forma.Aps o escurecer, vestiu-se com esmero e caminhou em direo ao

    Strand, pois, entre outras realizaes suas, inclua o fato de ser umexperiente conquistador. Tinha um pronto sorriso para as garotas solitriasque voltavam apressadamente para casa e, embora as rejeies fossemnumerosas, as conquistas que tinha a seu crdito aumentavam o prazer dasrecordaes. Entre a igreja de St. Martin e a esquina do Strand, nadaconseguiu; as moas que avistou no eram atraentes ou estavamacompanhadas. Em frente ao Morleys Hotel, viu uma verdadeira boneca.

    Avistou-a de relance luz de um poste e ficou paralisado pela rarabeleza de seu rosto. Estava sozinha. Fred girou nos calcanhares e alcanou-aem poucos passos.

    J no nos vimos antes? perguntou ele, tirando o chapu.No teve tempo de perguntar mais nada. Algum o agarrou pela

    gola, puxando-o para trs.

    Fred, eu realmente serei obrigado a usar de severidade com voc declarou a odiada voz de Larry Holt. Fred sentiu-se imediatamenteofendido.

    No tem um lar para onde ir? lamuriou-se. Por que no vaipara l?

    E prosseguiu sua jornada ao longo do Strand, numa disposioamarga e sombria; a sacudidela que levara de Larry Holt dissipara seu desejode. aventuras. Ainda podia sentir na nuca os ns dos dedos do policial

    quando ele o agarrara pela gola.

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    Diana prosseguiu seu caminho, sem perceber que Larry estava s

    suas costas. No era novidade ser abordada na rua e ela se tomara insensvela tais coisas.

    Residia em cima de uma tabacaria na Charing Cross Road. Larry viu-

    a abrir a porta lateral e entrar no corredor escuro. Esperou alguns minutos edepois retomou o caminho de casa.A jovem lhe causara uma impresso extraordinria. Larry dizia com

    seus botes que no se tratava da sua delicada beleza, ou de qualquer outrode seus atributos femininos, mas da inteligncia e extraordinria faculdadede raciocnio que ela possua. E, justia lhe seja feita, ele acreditavapiamente que este fosse o motivo da atrao que exercia sobre ele. No eraum homem impressionvel. Conhecera mulheres bonitas, em ambos os lados

    da linha limtrofe entre o bem e o mal, que separa os honestos doscriminosos. Tivera alguns casos amorosos na juventude, mas conseguiraatravessar os sonhos ardentes sem guardar marcas ou cicatrizes de taisexperincias.

    Ou, pelo menos, era o que dizia a si mesmo. Era extraordinrio ternecessidade de tentar convencer-se de alguma coisa; contudo, havia o fatoindiscutvel de que ele passava uma grande parte de seu tempo livre

    tentando racionalizar sua atitude mental em relao a Diana Ward. Econhecia a jovem h pouco mais de vinte e quatro horas!Diana Ward no pensava em Larry Holt ao entrar no apartamento.

    Mantinha a mente totalmente ocupada com os problemas apresentadospelo caso Stuart. Tinha o pressentimento de que, se descobrissem adesaparecida Clarissa, estariam no caminho certo para desvendar a causada morte de Stuart e o motivo daquele crime hediondo.

    Bateu a porta de entrada e subiu vagarosamente a escada estreita e

    escura. A parte superior do prdio da tabacaria estava dividida em trsapartamentos alugados; ela morava no mais alto e mais barato. Sabia que

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    os inquilinos dos outros dois apartamentos estavam passando o fim desemana no campo. O primeiro andar era ocupado por um funcionriopblico solteiro, um homem animado, cujas festas mantinham-na acordadadurante a noite; o segundo andar, por um desenhista de jornal e a esposa,dos quais ela no tinha qualquer queixa como vizinhos.

    Diana chegou ao segundo patamar e colocou o p no primeirode