Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma...

25
RSP 223 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013 Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente Introdução No âmbito corporativo de uma instituição como a Escola de Governo e Administração Pública (Egap), da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), que se preocupa com a formação de servidores da administração pública, as questões de fundo que se colocam são: Como capacitar grande número de servidores e proporcionar-lhes uma aprendizagem continuada mediante cursos on-line usando métodos e técnicas de ensino que estejam de acordo com a especificidade da tarefa a ser realizada? Como incorporar, nos cursos baseados no paradigma da produção em massa, suportes que contribuam para que o servidor seja capaz de construir, no seu local de trabalho, as condições necessárias e propícias às mudanças profissionais e de aprendizagem?

Transcript of Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma...

RSP

223Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

Os suportes de uma comunidadevirtual de aprendizagem: uma

experiência do Governo doEstado de São Paulo, Brasil

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

Introdução

No âmbito corporativo de uma instituição como a Escola de Governo e

Administração Pública (Egap), da Fundação do Desenvolvimento Administrativo

(Fundap), que se preocupa com a formação de servidores da administração pública,

as questões de fundo que se colocam são:

• Como capacitar grande número de servidores e proporcionar-lhes uma

aprendizagem continuada mediante cursos on-line usando métodos e técnicas de

ensino que estejam de acordo com a especificidade da tarefa a ser realizada?

• Como incorporar, nos cursos baseados no paradigma da produção em

massa, suportes que contribuam para que o servidor seja capaz de construir, no

seu local de trabalho, as condições necessárias e propícias às mudanças profissionais

e de aprendizagem?

RSP

224 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

Nas instituições governamentaisbrasileiras, a implantação da Internet, alémde ter ajudado a obter respostas para essasindagações, vem facilitando a aprendizagemcontinuada dos servidores por intermédiode capacitações on-line. Isso tem permitidoimplantar uma nova abordagem de edu-cação, realizada no local de trabalho e comvárias vantagens, tanto para os servidoresquanto para o professor que ministra o curso(VALENTE e TAVARES-SILVA, 2003).

Certamente, a evolução tecnológicatem alcançado papel relevante no processode maturação da Educação a Distância(EaD) como uma alternativa no processode ensino e aprendizagem de grandenúmero de alunos, como é o caso dosservidores do Estado de São Paulo.

E é nesse contexto que as comunidadesvirtuais de aprendizagem (CVA) são hojeuma das ferramentas mais poderosas paradiscutir ideias e construir conhecimentoatualizado, em que se somam as expe-riências de muitas pessoas. Todavia,conforme destaca Dias (2007), o objetivode uma CVA

está para além do acesso à rede deinformação, a qual, só por si, repre-senta a entrada num ambiente enri-quecido de materiais e conteúdos, enão propriamente um fator de mu-dança e inovação para a aprendiza-gem. O desenvolvimento da inovaçãono interior da comunidade realiza-seatravés da capacidade de atribuirsentido a estes materiais no âmbitodo projeto da comunidade, contri-buindo para esta finalidade osprocessos de mediação colaborativana experiência das figurações enarrativas do conhecimento e doscontextos e práticas da sua aplicaçãoe utilização (DIAS, 2007, p.36).

Logo, não basta somente o acesso à redede informação, mas, sim, como essa redepoderá contribuir para desenvolver habili-dades que interessam ao bom desempenhodo servidor em seu trabalho, além de de-senvolver habilidades que têm a ver com apossibilidade de continuar a aprender.

Assim, nossa proposta neste artigo seráapresentar e discutir quais foram ossuportes que ampararam as CVA daFundap/Egap no período de 2000 a 2012e proporcionaram, com isso, a criação deum espaço de trocas de informação, deconstrução do conhecimento e de apren-dizagem significativa.

O que é a Fundap

A Fundap foi criada pela Lei no 435,de 24 de junho de1974, e teve seus esta-tutos aprovados em 1976, data de suaefetiva instalação e do início de seustrabalhos. Atualmente vinculada à Secre-taria de Gestão Pública do Estado de SãoPaulo, Brasil, a fundação tem personali-dade jurídica de direito privado e dispõede autonomia técnica para executar suasatividades; sua “missão institucional é ga-rantir um permanente movimento de atu-alização das estruturas, procedimentos epráticas administrativas” (FARIA, 1997,p. 192).

Para tanto, a Fundap/Egap repousasobre o seguinte tripé: ensino, desenvolvi-mento organizacional e pesquisa.

A Fundap possui, em sua estrutura, aEgap, que é um centro de capacitação deexecutivos do setor público para o exercícioda gestão pública, com vistas ao aperfei-çoamento de profissionais capazes deformular diretrizes e políticas governa-mentais, de implementar e gerenciarpolíticas, e de gerar e prestar bons serviçospúblicos à sociedade.

RSP

225Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

“... existem nasCVA uma fortemoral social e umconjunto deregulamentos nãoescritos entre os seusenvolvidos e nasinformações quecirculam nessesespaços.”

A metodologia educacional adotada nacapacitação enfatiza a prática profissional,à luz de conceitos e ferramentas queajudem a definir e superar os problemasque afetam o desempenho do serviçopúblico. Nesse sentido, a Fundap procuramanter estreita articulação com instituiçõese profissionais especializados que estejamproduzindo conhecimento e tecnologia deinteresse ao setor público. A própria estru-tura da Fundap favorece essa concepção,já que a instituição opera como uma“ponte” entre a administração pública e asinstituições universitárias. Seu Conselho deCuradores – instância máxima de direção– é composto de representantes daFundação Getúlio Vargas (FGV), daUniversidade de São Paulo (USP), daUniversidade Estadual de Campinas(Unicamp) e da Universidade EstadualPaulista (Unesp).

Até o ano de 2000, a Fundap/Egapvinha realizando cursos de capacitaçãobasicamente mediante ações presenciais,atendendo a uma pequena demanda de parti-cipantes por curso. A partir dessa data,pensando nos aspectos extremamenteimportantes para o desenvolvimento de pro-cessos educacionais com qualidade e consi-derando que a tecnologia computacional estácada vez mais presente nos postos de traba-lho dos servidores públicos, a Fundap/Egapiniciou estudos e ações voltados à aplicaçãodos recursos das tecnologias de informaçãoe comunicação (TIC) na educação.

O objetivo tem sido incorporar deforma sistemática e permanente as TIC nasatividades educacionais, principalmente naEaD via Internet, com a finalidade de tornaro participante um sujeito mais ativo noprocesso de aprendizagem e de recolocar acomunicação interpessoal no centro dosmétodos da educação, utilizando, para isso,diferentes abordagens de EaD.

O que é uma comunidade virtualde aprendizagem

Para Dias (2007), o surgimento de umaCVA acontece a partir da definição nego-ciada dos objetivos da aprendizagem, damediação colaborativa e do suporte dogrupo para as reestruturações das figu-rações do conhecimento.

Ainda conforme esse autor, o desafioproposto pelas comunidades de aprendi-

zagem “consiste na criação de uma peda-gogia baseada na partilha, na exposição dasperspectivas individuais entre os pares ena iniciativa conjunta orientada para ainovação e a criação” (DIAS, 2007, p. 35).

Para Lévy (2000), Palloff e Pratt (2002),a gênese de uma CVA baseia-se na afini-dade de interesses, de conhecimentos, deprojetos mútuos e de valores estabelecidos

RSP

226 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

por meio de um processo de colaboração.Assim, as CVA são hoje uma das ferra-mentas mais poderosas para discutir ideiase construir conhecimento, uma vez que sesomam as experiências de muitas pessoas.Conforme destaca Palloff e Pratt (2002,p. 47), uma comunidade de aprendizagemestabelece-se quando “unem-se pessoas quepossuem interesses e objetivos similares, ouseja, pessoas que não estão conectadas poracaso, como se verifica em outras áreas dociberespaço”.

Ademais, verificamos, mediante nossaprática, que a palavra comunidade apresentauma diversidade de sentidos e conotaçõesemotivas. Percebemos que o que une osparticipantes em uma comunidade não ésua estrutura, mas o estado de espírito e osentimento de pertencimento dos indivíduosdessas comunidades.

No diálogo com Lévy (2000), observa-se que as comunidades de aprendizagemconstituem-se nas relações interpessoaisimpregnadas de emoções, não distantes efrias. Em concordância com Lévy (2000),Tavares-Silva (2003) enfatiza que, nessascomunidades, o importante é resgatar afuncionalidade da emoção1 como condi-ção capaz de proporcionar circunstânciasadequadas aos anseios e desejos dos parti-cipantes, tornando esses ambientes adap-táveis aos seus integrantes e possibilitan-do uma boa interface de comunicação einteração.

Silva (1998, p. 95), por sua vez, com-plementa esse argumento, ao afirmar quea CVA é um “espaço de construção (umterritório simbólico) marcado pela exten-são e pela profundidade da interação entreos indivíduos de construir esse todo”.

Com isso, existem nas CVA uma fortemoral social e um conjunto de regulamentosnão escritos entre os seus envolvidos e nasinformações que circulam nesses espaços.

De acordo com Palloff e Pratt (2002),as relações e os limites individuais e cole-tivos estão ancorados em algumas regraspreestabelecidas e amplamente divulgadas,dentre as quais se destacam: honestidade,correspondência, pertinência, respeito,franqueza e autonomia.

Nessas comunidades, há um sistemade valores e um código de moral queproporcionam aos seus membros um sensode identidade e de pertencimento.

Percebemos também, com o olhar emnossa prática, que uma CVA só sobrevivese houver um foco – afinidades de interes-ses –, se houver participantes responsáveis,unidos espontaneamente, compromissados, quequeiram aprender, envolvidos com a colabo-ração (participação) e que objetivam umempreendimento coletivo. Nesse espaço, nãoexistem hierarquias, e a gestão do conheci-mento deve ser uma preocupação cons-tante. Os participantes dessa comunidadepossuem identidade na prática (reciprocidadena colaboração e no trabalho contínuo).

Todavia, os participantes, quando adultos,aprendem quando o assunto, o foco, possuium valor imediato, uma utilidade paraenfrentar problemas reais de sua vidapessoal e profissional. Esse foco cria cir-cunstâncias para o envolvimento, a presença,dos participantes e a visibilidade, pois elessabem que as informações estão disponí-veis no ambiente a qualquer momento.

Verificamos também, pela nossa prática,que os participantes passam a ser “donos”zelosos desses espaços e fazem de tudo paraque a chama das interações não arrefeça e,com isso, possam utilizar esse ambiente aolongo dos anos (continuidade), ou seja, osmembros dessas comunidades têm compro-misso de longo prazo com o seu desenvol-vimento (criação de valores).

Os participantes entendem que umacomunidade de aprendizagem é uma

RSP

227Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

poderosa ferramenta de trabalho, poispodem resolver os problemas do seu diaa dia de trabalho por meio da contribuição,de experiências dos colegas (diversidadede talentos dos seus membros). Tambémo interagir com os pares cria uma relaçãode confiança, amizade e bem-estar (pertenci-mento).

Todavia, enfatizamos, com base emnossa prática, que a espontaneidade podenão ser o meio eficiente para gerar conhecimento.Nesse caso, é imprescindível a presença dosmediadores técnicos e dos mediadores pedagógicos.O mediador deve ser um facilitador daaprendizagem; deve estabelecer relaçõesdialógicas e de parceria com os aprendizes;deve procurar valorizar a bagagem deconhecimento trazida por seus aprendizes.Os mediadores criam circunstâncias paratrabalhar melhor a informação e isso geramelhor qualidade de conhecimento. Nãoconseguimos vislumbrar uma comunidadesem esses intervenientes, pois, casocontrário, o “barco” pode afundar!

Além disso, as CVA da Fundap/Egappossuem diferentes níveis de participação.Também verificamos que há, como Wenger(1998) acena, três tipos grupais:

• um grupo nuclear (pequeno grupo quetem como tônica a paixão pelo que faz e,consequentemente, possui grande envol-vimento);

• um grupo com adesão completa (grupo queé reconhecido pela comunidade, em virtudede suas contribuições e envolvimentos, eque define o andar da comunidade);

• um grupo com participação periférica(grupo que pertence à comunidade, masque tem menor envolvimento; em algumasvezes, seus membros são novatos ou, então,não têm envolvimento com a prática).

Dessa forma, a sociedade do conheci-mento e a emergência de uma novaeconomia “informacional” e globalizada

demandam capital intelectual (CASTELLS,1996), pessoas com competência paraparticipar ativamente, saber trabalhar emgrupo, pensar e criar soluções para proble-mas complexos, e aprender continuamente.Essa nova mentalidade deve permear todosos cidadãos, produtores ou consumidoresde todos os segmentos sociais, incluindo osetor público.

Assim, é importante analisar as possi-bilidades de aplicar o conceito de comu-nidades de prática no contexto dos setorespúblico, privado e terceiro setor, uma vezque elas se constituem em uma ferramentaaglutinadora de ações individuais e organi-zacionais.

O desafio: como capacitar trêsmil servidores em um curso naabordagem broadcast e criarcircunstâncias para a construção doconhecimento via CVA

Como já afirmado, até o ano de 2000a Fundap/Egap vinha realizando cursosde capacitação basicamente mediante açõespresenciais, atendendo a uma pequenademanda de participantes por curso.

A partir dessa data, pensando nosaspectos extremamente importantes parao desenvolvimento de processos educacio-nais com qualidade, na educação conti-nuada, e considerando que a tecnologiacomputacional está cada vez mais presentenos postos de trabalho dos servidorespúblicos, a Fundap/Egap iniciou estudose ações voltados à aplicação dos recursosdas TIC na educação. O objetivo tem sidoincorporar sistemática e permanentementeas TIC nas atividades educacionais,principalmente na EaD via Internet, a fimde tornar o participante um sujeito maisativo no processo de aprendizagem e derecolocar a comunicação interpessoal no

RSP

228 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

centro dos métodos da educação, usando,para isso, diferentes abordagens de EaD.

Os primeiros cursos de EaD ofertadospela Fundap/Egap foram baseados naabordagem do estar junto virtual e no uso daplataforma TelEduc (ROCHA, 2002). O estarjunto virtual (VALENTE, 2009) prevê alto graude interação entre professor e aprendizes, eentre os próprios aprendizes. A Internetproporciona os meios para que essasinterações sejam intensas, permitindo o acom-panhamento do aluno e a criação de condi-ções para o professor “estar junto”, ao ladodo aluno, vivenciando e auxiliando-o aresolver seus problemas, porém virtualmente.

O TelEduc é um ambiente de suportea atividades de ensino e aprendizagem viaInternet, desenvolvido no Núcleo deInformática Aplicada à Educação (Nied) eno Instituto de Computação da Universi-dade Estadual de Campinas (Unicamp),São Paulo.

Cada curso ofertado pela Fundap/Egap, que utilizava o ambiente TelEducna abordagem estar junto virtual, envolviacerca de trinta participantes. Em 2002, aFundap/Egap foi consultada pela Secre-taria de Gestão Pública do Estado de SãoPaulo para realizar o Curso de Licitação eGestão de Contratos, mediado por com-putador, via Internet, para cerca de três milservidores do Estado.

Dada essa demanda, surgiu o grandedesafio: como sair de cursos para trinta alu-nos e partir para cursos com mais de trêsmil participantes, mas sem desperdiçar opotencial do aprendiz de interagir, pensare criar?

Esse desafio levou a uma série dequestões tendo em vista a experiência comas atividades de EaD da Fundap/Egap, queprimavam pela intensidade e qualidade dainteração e, consequentemente, peloprocesso de construção de conhecimento.

Uma das questões, por exemplo, eracomo incorporar, nos cursos a distânciadestinados a um grande número de partici-pantes, aspectos pedagógicos que contri-buíssem para que o servidor fosse capazde construir, no seu local de trabalho, ascondições necessárias e propícias àsmudanças profissionais e de aprendizagem?

A solução2 foi a criação de uma CVAamparada pelos seguintes suportes:

• criação de um curso na abordagembroadcast3;

• mediação pedagógica e técnica, à luzdo estar junto virtual;

• efetiva contribuição dos participantes;• aprendizagem continuada e

colaborativa.Para atender a esse primeiro desafio, a

equipe de EaD da Fundap/Egap, comoainda não dispunha, em 2002, de umaferramenta de EaD para atender a umgrande número de participantes, recorreuà criatividade e passou a utilizar uma ferra-menta estática4, desenvolvida em páginasHTML para abrigar o conteúdo programáticode seus cursos.

Ao iniciarmos a construção da ferra-menta estática (tutorial5), tínhamos aseguinte preocupação: o modelo educa-cional homogêneo não é vivenciado portodos os aprendizes da mesma maneira (osaprendizes diferem quando aprendem!).

Assim, a construção dessa ferramentaestática procurou contemplar as diversaspreferências de aprendizagem dos partici-pantes, uma vez que alguns participantesaprendem com textos e gráficos; outros,com imagens, filmes, análises de casos;outros ainda, interagindo com os seus paresem um ambiente de diálogo (comunidade)etc. (CAVELLUCCI, s.d.). Percebemos que umaúnica forma de apresentar o conteúdo docurso (por exemplo, somente uma apos-tila) não atingiria a todos os participantes

RSP

229Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

de igual maneira. A ferramenta possibilitou,pois, contemplar diferentes dinâmicas deapresentação do conteúdo dos módulos e,assim, atingir cada um dos estilos de apren-dizagem.

As Figuras 1 e 2 mostram o cuidadoem contemplar diferentes formas de apre-sentar o conteúdo do curso (texto, figura,pop-up6, sites etc.).

O tutorial compõe-se de sete módulos7.Cada módulo organiza-se nos seguintessubcampos: conteúdo, tema, exercícios,apontamentos, pesquisa e saiba mais. Alémdisso, o curso conta com recursos extras:ajuda, midiateca, glossário, créditos equestões interessantes8.

Embora sequencial, o participantepode seguir essa ordem ou qualquer outraque lhe parece mais conveniente (não hábloqueio de módulos que obrigue o partici-pante a obedecer a sequência linear deapresentação dos módulos do curso).Entretanto, em todos os módulos, osassuntos estão relacionados e indicados pormeio de links, permitindo que o participanteretorne, quando necessário, aos conceitosapresentados nos demais módulos. Todosos módulos possuem a mesma estrutura,o que facilita a navegação do participantenos demais módulos depois de ter nave-gado em um módulo, conforme indicadona Figura 3.

Como não existe bloqueio de módulos,o participante é o responsável por seuaprendizado e pode escolher por ondecomeçar, quando, o que e como estudar.

Conforme mostra a Figura 3, cadamódulo contém doze exercícios (exceçãopara o Módulo 4, que conta com quatorzeexercícios). Esse curso disponibiliza 74 exer-cícios em formatos diferentes (animações,completar o texto, palavras cruzadas, arras-tar palavras, ouvir uma música ou assistir aum filme etc.). Todas as alternativas dos

exercícios são comentadas, possibilitandoque o participante aprenda com o seu erro.A Figura 4 mostra esse recurso.

Todavia, o objetivo da Fundap/Egapera transformar a metodologia bem-suce-dida do ambiente estático em um ambienteLMS dinâmico, com um design mais limpo,porém mantendo toda a facilidade denavegação até então adotada e aprovadapelos alunos (o segundo desafioencontrado).

Além da criação do tutorial (conteúdodo curso), a Fundap/Egap customizou umsoftware livre – Snitz (http://forum.snitz.com) –, que compreendeu a traduçãodo ambiente para o português, uma novaconfiguração de cores e a seleção e adap-tação de alguns dos recursos oferecidospelo software; com isso, criou o espaço deinteração (a CVA).

“... uma CVAsó sobrevive sehouver um foco;no caso, a criação deum curso, na aborda-gem broadcast,contextualizadoe significativo.”

RSP

230 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

Figura 1: Diferentes formas de apresentar o conteúdo: texto e figuras

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

Figura 2: Diferentes formas de apresentar o conteúdo: pop-up

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

RSP

231Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

Figura 4: Diferentes formas de apresentar o conteúdo: exercícios

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

Figura 3: Estrutura dos módulos do curso

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

RSP

232 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

A seguir, veremos em detalhes ossuportes da CVA – do Curso de LicitaçãoSustentável Brasil –, ofertados pelaFundap/Egap em 2012.

O primeiro suporte da CVA:curso na abordagem broadcast(foco)

Verificamos, com o olhar em nossaprática, que uma CVA só sobrevive sehouver um foco; no caso, a criação de umcurso, na abordagem broadcast, contextua-lizado e significativo, uma vez que os par-ticipantes (alunos), quando adultos,aprendem se o assunto, o foco, possui umvalor imediato, uma utilidade para enfrentarproblemas reais de sua vida pessoal eprofissional.

Esse foco cria circunstâncias para oenvolvimento, a presença, dos participantese a visibilidade, pois eles sabem que asinformações estão disponíveis no ambientea qualquer momento.

A abordagem broadcast não permitenenhum tipo de interação com o aluno, maspode atingir grande número de aprendizes.O modelo preocupa-se em como a infor-mação é armazenada, representada e, prin-cipalmente, transmitida. O computadortorna-se, assim, poderosa ferramenta paraarmazenar, representar e transmitir ainformação. Essa abordagem baseia-se nomodelo tutorial, em que a informação éorganizada de acordo com uma sequênciapedagógica particular9, sendo apresentadaao participante segundo essa sequência.

Assim, o conteúdo é preparado e or-ganizado previamente, para só depois depronto ser oferecido ao aprendiz, que nãopode fazer nenhuma alteração. A interaçãodo participante com o computador ocorrepor meio da leitura da tela ou medianteuma teleconferência.

Esse modelo não nos fornece nenhumapista sobre o processamento da infor-mação, isto é, ele não permite certificar-nos de que o aluno está processando ainformação transmitida, nem diagnosticarcomo a aprendizagem está sendoprocessada.

O grande desafio na concepção decursos ou programas de capacitação, nessaabordagem, é o tratamento dado ao con-teúdo programático. Deve existir a preo-cupação com a linguagem extremamentedidática e sedutora para o participante. Aênfase é mesclar teoria e prática em totalsinergia com o fazer diário do participante.

Para Valente (2009), a limitação daabordagem broadcast é a ausência deinteração entre mediador e aprendiz. Comoo mediador não interage com o aluno, elenão recebe nenhum retorno do aprendiz e,portanto, não tem ideia de como essainformação está sendo compreendida ouassimilada. Nesse caso, o aluno pode estarou atribuindo significado e processando ainformação, ou simplesmente memori-zando-a. O professor não dispõe de meiospara verificar o que o aprendiz faz.

A Figura 5, a seguir, ilustra a aborda-gem broadcast utilizando a Internet.

A abordagem broadcast é bastanteeficiente para disseminar informação a umagama muito grande de alunos. No entanto,essa proposta não garante que o alunoesteja construindo conhecimento.

A interação do participante10 com oconteúdo consiste em ler a tela do cursono computador, responder a perguntas,buscar informação em diferentesmateriais de apoio, ou mesmo fazer odownload de um documento que contenhatodo o conteúdo tratado em um módulo.Essa abordagem não fornece pistas sobreo processamento da informação, isto é,ela não permite certificar-nos de que o

RSP

233Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

aluno está processando a informaçãorecebida, nem diagnosticar como a apren-dizagem está ocorrendo.

Para contornar essas limitações, asolução encontrada pela Fundap/Egap foidesenvolver uma ferramenta na aborda-gem broadcast, porém com diferenciais napreparação do material didático (abor-dagem broadcast) e com a introdução daCVA à luz do construcionismocontextualizado11 e do estar junto virtual12

(VALENTE, 2009).Assim, vale ressaltar que a abordagem

broadcast adotada pela Fundap/Egap nãopressupõe um conteúdo fechado, já queo curso tem as informações atualizadassistematicamente, pois a comunidaderealimenta o tutorial, num processo con-tínuo, que retorna para a comunidade,favorecendo, também, a gestão doconhecimento em governo.

Os únicos pré-requisitos mínimosindispensáveis, para o servidor, são: sabernavegar na Internet; usar regularmente ocorreio eletrônico; ter prática com editor detextos; e saber baixar arquivos (fazer download).Além disso, quanto à infraestrutura compu-tacional, o participante deve ter acesso regulardiário à Internet, com conexão estável, e oequipamento a ser utilizado deve dispor deum navegador e um programa de correioeletrônico instalados.

A Figura 6 ilustra a segunda página deabertura do Curso de Licitação Sustentá-vel Brasil, mediado por computador e viaInternet, ofertado pela Fundap/Egap em201213.

O grande desafio na montagem docurso – na abordagem broadcast – foi otratamento dado ao conteúdo programático,com uma linguagem extremamente didáticae sedutora para o participante; o curso

Figura 5: Abordagem broadcast de EaD, utilizando a Internet

Fonte: Fundap/Egap (São Paulo, Brasil)

RSP

234 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

mescla teoria e prática em total sinergia como fazer diário do servidor, a fim de promo-ver o processo de ensino e aprendizagem, emanter a motivação dos participantes.

Para isso, houve o cuidado em con-templar as várias preferências de aprendi-zagem no conteúdo programático do curso(imagens, textos, desenhos, gráficos, casospráticos, exercícios, pesquisa, filmes,interação etc.).

Conforme mostra a Figura 7, a seguir,o curso contém uma estrutura modular(sequência pedagógica particular), com afinalidade de poder atender a uma clientelabastante heterogênea, desde os servidoresque começam a trabalhar em determinadaárea (conforme o foco de cada curso), atéos que precisam ou queiram atualizar-se.

O curso não oferece, portanto, comofaz a maioria dos cursos tradicionais,“primeiramente” a apostila14, com cerca devinte a trinta páginas por módulo, uma vez

que sabemos que cada participante traz umreferencial teórico e prático. Assim, enten-demos que o participante traz algo para ocurso e, com isso, ele poderá desejarexplorar os módulos conforme a suanecessidade.

Não existe bloqueio dos módulos docurso. Dessa forma, o participante podeoptar ou pela sequência pedagógicasugerida pelo curso, ou qualquer outra quelhe pareça mais interessante.

O participante é responsável por seuaprendizado e pode escolher por onde equando começar, o que estudar e a maneiraem que prefere fazê-lo.

O material de apoio do curso é organi-zado em uma sequência de módulos,planejada por critérios pedagógicos; cadamódulo está organizado nos seguintessubcampos:

• Conteúdo, que apresenta os assun-tos do módulo, o número de exercícios

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

Figura 6: Segunda página de abertura do curso

RSP

235Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

propostos, o número de casos práticos e onúmero de páginas da apostila (saiba mais).Informa também a autoria do módulo.

• Tema, o qual traz uma síntese dosassuntos trabalhados no módulo.

• Exercícios, propostos para que oparticipante do curso aplique e retenhanovos conteúdos/informações.

• Apontamentos, subcampo quefornece, em tópicos curtos, os principaisconceitos tratados em cada módulo docurso. Os apontamentos são os assuntosrelevantes do módulo. Esse item possui,no máximo, duas rolagens de página.Representa aquilo que o participante nãopode esquecer, ou seja, o participante nãopode sair do módulo sem saber osconteúdos abordados nos apontamentos.

• Atividades Complementares, asquais apresentam exemplos teóricos oupráticos sobre o conteúdo programático docurso.

• Pesquisa, subcampo que indicareferência bibliográfica sobre determinadomódulo e apresenta sugestões de ende-reços interessantes a visitar, na Internet.A pesquisa ajuda o participante a fazerum aprofundamento do conteúdo domódulo, caso ele tenha interesse duranteou após o curso.

• Saiba Mais, que traz uma apostilaem formato PDF, contemplando todas asinformações do módulo.

O curso oferece também espaços deapoio, como comunidade, fale conosco,glossário, midiateca, questões interessantes,ajuda e créditos, conforme ilustrado naFigura 7.

O Fale Conosco permite ao participanteobter informação sobre a parte adminis-trativa do curso (informa quando o parti-cipante poderá acessar o curso, resolveproblemas de navegação e dúvidas sobre acertificação). No Fale Conosco, o participante

Figura 7: Estrutura dos módulos do curso

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

RSP

236 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

não pode tirar dúvidas sobre o conteúdoprogramático do curso.

O Glossário contém os principaistermos empregados em todos os módulosdo curso, com definições compiladas ouelaboradas por especialistas.

A Midiateca é uma biblioteca virtual.Contém material de leitura complementarindicado por mediadores e participantes.

Questões Interessantes são questõescolhidas pelo mediador técnico respon-sável pela comunidade, com base nainteração dos participantes nos fóruns daCVA. Essas questões são colhidas após ofechamento de cada fórum (gestão dainformação).

O subcampo Créditos, por sua vez, apre-senta a equipe multidisciplinar do ambientede capacitação (autores e mediadores).

No início de cada mês, uma nova turmaacessava o ambiente de aprendizagem(curso e comunidade). Cada turma, comno máximo trezentos participantes, podiarealizar o curso durante, no máximo, trêsmeses. Entretanto, após o encerramento docurso, os participantes manifestavam inte-resse de continuar a ter acesso à CVA, comoem outras comunidades ofertadas pelaFundap/Egap.

Comprovamos, pois, que o suporte da“aprendizagem continuada” é fundamentalem uma CVA. A ideia é tornar esse espaçodisponível aos servidores em seu dia a diade trabalho, como um meio de aprimorarseus conhecimentos técnicos e seu desem-penho profissional.

O segundo suporte da CVA:mediação técnica e pedagógica, àluz do estar junto virtual

Existe significativa diferença entremediação técnica e mediação pedagógica,conforme postula Tavares-Silva (2006).

Os mediadores técnicos15 são conhecedoresdo conteúdo programático do curso,contudo, para além disso enfatizam osurgimento de novas relações em detrimentoda clássica relação mediador-aluno. A inter-venção do mediador técnico deve ir aoencontro da proposta que procura rompere superar o paradigma da contradiçãomediador-aluno (modelo conducionista).

Nesse espaço, todos – aprendizes emediadores técnicos – detêm conheci-mentos específicos, diferenciados e rele-vantes. Todos são coautores e coprodutoresdo seu próprio conhecimento e, também,ambos são coautores e coprodutores doque está sendo produzido e incorporadoao ambiente, em um movimento contínuoe recursivo. Assim, o mediador técnico é oorganizador da troca de ideias, em vez dedetentor do conhecimento ou de instrutor,e os aprendizes passam a ter um papel maisativo ao explicitar seus conhecimentos eao revelar seus talentos. O mediadortécnico é diferenciado por ser a pessoaportadora de uma intencionalidade peda-gógica, a qual deve preservar os objetivosoriginais do curso (o barco tem umtimoneiro!).

Os mediadores pedagógicos não são“conhecedores” do conteúdo progra-mático, mas têm a função de facilitar aambientação dos alunos no curso (apresen-tam os fóruns de discussão, incentivam ainteração nesses fóruns, auxiliam os alunospara que postem contribuições conformeo conteúdo proposto em cada fórum etc.),ou seja, os mediadores pedagógicos auxi-liam o mediador técnico a conduzir os espa-ços de discussão.

Ainda conforme Tavares-Silva (2006),os mediadores pedagógicos, além de auxi-liarem o mediador técnico a conduzir osespaços de discussão, têm o papel deresgatar a funcionalidade da emoção como

RSP

237Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

condição capaz de proporcionar circuns-tâncias adequadas aos anseios dos partici-pantes, tornando esse ambiente adaptávelao aluno e possibilitando uma boa interfacede comunicação e interação; porém, semnunca perder o foco do curso, o controle,o gerenciamento e a animação geral doambiente de aprendizagem.

Vale enfatizar que as atuações dosmediadores – pedagógicos e técnicos –estão amparadas na abordagem do estarjunto virtual16, na qual o aprendiz é estimu-lado a desenvolver uma atuação respon-sável e autônoma, sendo pedagogicamenteapoiado e orientado pelos mediadoresdentro dos propósitos estabelecidos, poisnão se objetiva ter um aluno autodidata,que não conta com uma proposta peda-gógica e didática para o estudo, como alertaLitwin (2001).

Destaca-se, na abordagem estar juntovirtual, a atuação dos mediadores; noentanto, acima de tudo, deve-se dar atençãoespecial ao fundamental papel dos apren-dizes, para os quais:

A mediação pedagógica enfrenta odesafio de criar situações que propi-ciem a presença virtual por meio deacompanhamentos, interações e orien-tações que aproximam professores ealunos, fazendo com que os alunosassumam o papel de mediadores dospróprios colegas e desenvolvendo aautoaprendizagem e a aprendizagemdos seus pares. (BEREHENS, apudMORAN, 2000, p. 82)

Para Dias (2007, p. 35), o desafio nessaabordagem é a “criação de uma pedagogiabaseada na partilha, na exposição das pers-pectivas individuais entre os pares e nainiciativa conjunta orientada para a ino-vação e criação”.

Nesse sentido, o estar junto virtual é a abor-dagem que oferece maiores condições paraimplantar situações de construção de conhe-cimento, mas ela exige o envolvimento, oacompanhamento e o assessoramentoconstantes do participante por parte damediação técnica e da mediação pedagógica.

A Figura 8, a seguir, ilustra a abor-dagem do estar junto virtual a partir daabordagem do construcionismo contextua-lizado17 utilizando a Internet.

Essa é, sem dúvida, a abordagem demaior custo, pois pressupõe acompanha-mento permanente dos aprendizes pormeio da mediação, pedagógica e técnica.

Portanto, a abordagem estar junto virtualnão representa o paradigma conducionista,tutorial, mas enfatiza as interações domediador com os aprendizes, priorizandosempre as condições para a construção deconhecimento.

O terceiro suporte da CVA:participantes (alunos) responsáveise envolvidos

Os participantes (alunos) são responsá-veis pelo surgimento de um novo tipo derelação, muito diferente da clássica relaçãoprofessor-aluno. Essa nova relação repre-senta uma outra forma de comunicação eenfatiza a interação participante-participan-te. Os participantes devem entender que osmediadores serão facilitadores do processode ensino e aprendizagem e não“entregadores” da informação. Eles devemestar cientes de que o mote da comunidadeé a interação participante-participante.

Na comunidade, há uma divisão deresponsabilidade, bem como posição deigualdade entre mediadores e participantes.O participante deve modificar sua atitudepara vir a ser um agente de busca e cons-trução do conhecimento, tornando-se

RSP

238 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

coautor de seu aprendizado pessoal eprofissional, uma vez que dá a sua opiniãoa cada questão apresentada. Cada partici-pante é responsável pela construção doconhecimento de forma autônoma e deacordo com sua disponibilidade e ritmopessoal. O importante é despertar em todos– participantes e mediadores – a correspon-sabilidade pelo processo de construção doconhecimento.

O quarto suporte da CVA:aprendizagem continuada

Conforme já afirmado, mesmo após oencerramento do curso, os participantesmanifestavam interesse em ter acesso àcomunidade de aprendizagem do curso.

A ideia é tornar esse espaço disponível aosservidores em seu dia a dia de trabalho,como um meio de aprimorar seus conhe-cimentos técnicos e seu desempenho pro-fissional.

É nesse cenário e com base nos recur-sos descritos que a Fundap/Egap propor-ciona, por meio desse suporte, umacapacitação continuada e permanente, quevaloriza o servidor e elimina a cultura daescolarização formal clássica, comopassaporte único, para a sua capacitação.Esse suporte possibilita a valorização desua autoestima, melhoria do serviço emelhores oportunidades no mercado detrabalho.

A aprendizagem contínua e permanentefornece aos participantes os instrumentos

Figura 8: Abordagem de EaD que implementa o modelo do construcionismocontextualizado

Fonte: Fundap/Egap (São Paulo, Brasil)

RSP

239Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

essenciais de que necessitam para participarativamente da sociedade globalizada, umavez que sabemos que a capacitação doindivíduo não pode ser pensada como algoque acontece entre os muros de uma escola.

Todavia, os ambientes que oferecemuma aprendizagem continuada de quali-dade devem atentar para vários aspectosdeterminantes, entre eles:

• que o participante tenha predispo-sição para aprender;

• que o ambiente de aprendizagem sejaadequadamente organizado e exista inter-veniente, agente de aprendizagem, quepossa ajudar os participantes no processode aprender;

• que o indivíduo, ao aprender, utilizea sua experiência de vida e os seus conheci-mentos adquiridos e, com isso, dê novossignificados à atribuição da informaçãoadquirida e, consequentemente, convertaessa informação em conhecimento18;

• que a ênfase seja “não” na trans-missão da informação, mas na discussãoem grupo, no compartilhamento da infor-mação, no cultivo da heterogeneidade deideias e experiências; especificamente,nesse curso, testes e provas são abolidose a certificação é opcional19 e de participa-ção20; ou seja, nesse curso não é feita aavaliação da aprendizagem, pois sabemos queos métodos tradicionais de avaliação(testes e provas, por exemplo) não são,muitas vezes, métodos eficientes paraavaliar a aprendizagem (entretanto, casoo cliente – demandante do curso – solicitecritérios de certificação tradicionais, comoprovas, a Fundap/Egap atenderá a essademanda);

• que os mediadores, agentes de apren-dizagem, sejam desafiadores, e não sótransmissores da informação, e contribuampara o desenvolvimento cognitivo, afetivoe social dos participantes;

• que o ato de aprender seja contro-lado pelo participante que quer conhecermais e é motivado pelo prazer de satisfazersuas necessidades e interesses;

• que o incentivo à colaboração leve àsatisfação de ser útil, de poder ajudar oscolegas, de poder resolver problemas e,muitas vezes, de realizar tarefas sofisticadas;isso gera o sentimento de empowerment (sen-sação de que podem desenvolver algo con-siderado quase impossível e, o mais impor-tante, de compreenderem como foirealizado). Esse tipo de sensação não é en-contrado nos ambientes educativos tradici-onais.

Considerando, como explicitadoacima, que os métodos tradicionais deavaliação não são, muitas vezes, métodoseficientes para avaliar a aprendizagem,entendemos que a avaliação da apren-dizagem é:

1) Ter um olhar na dimensão interacio-nista e social21.

2) Respeitar os diversos estilos deaprendizagens e as diferenças individuais(CAVELLUCCI, s.d.).

3) Entender que não consiste emreproduções da realidade e, sim, umainterpretação do mundo própria de cadaindivíduo, da estrutura do organismo, dasua constituição física, das percepçõessensoriais, da forma como experimenta edelineia os objetos (MORAES, 2004).

4) Refletir e aprender a respeitar o“silêncio virtual” no contexto do grupode discussão via rede. Para Gonçalves(2003), é necessário que se tenha abertura,mais receptividade nesses momentos.Ignorar o silêncio diante do que não estásendo comunicado pode ser uma posturasábia, produtiva, diante do silêncio, ouuma postura esterilizante, que exigeresposta rápida e que pode ser reflexo daansiedade do professor/tutor/moderador.

RSP

240 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

5) Perceber a importância do erro nosprocessos de ensino-aprendizagem. Deacordo com Moraes (2004), o erro é umestágio do processo de construção doconhecimento, uma vez que repensar o erroé investigar sua correção; o indivíduoretroage e realimenta o seu processo deconstrução e corrige os desvios.

6) Entender que o ato de aprender nãoocorre em função dos estímulos externospor uma cadeia linear – causa-efeito. Con-forme ressalta Moraes (2004), a aprendi-zagem é um processo circular interativo erecorrente, que ocorre dentro de uma redeneuronal estruturalmente aberta, masorganizacionalmente fechada e queprovoca mudanças de condutas, de acordocom a história de interações recorrentesentre o sistema vivo e o meio.

7) Compreender que não existe umacorrespondência direta entre uma boadiscência e um bom resultado docente(MORAES, 2004).

8) Respeitar a diversidade que favorecea flexibilidade. A diversidade de um sistemade avaliação está mais de acordo com ocontexto, métodos e tratamentos curricu-lares variados e flexíveis (MORAES, 2004).

9) Adotar um processo de auto-orga-nização22, que implica mudança deconduta, é processual, contínuo no tempoe que valoriza a etapa intermediária.Segundo Moraes (2004), o aluno, ao seautoavaliar, estará automaticamente em umprocesso de autoformação, de desenvolvi-mento e de aprendizagem. Nesse caso, aavaliação é um instrumento importantepara o desenvolvimento da autoestima econquista da autonomia. Ressalta aindaMoraes (2004) que as situações imprevistase os objetivos não planejados são elementosimportantes para o conjunto de uma boaavaliação e para futuros ajustes desseprocesso.

10) Priorizar um processo de incentivoe motivação, e de acompanhamento doaprendiz em todo o seu processo de apren-dizagem. Segundo Masetto (2003),vivenciamos práticas de avaliação da apren-dizagem como identificadoras de resul-tados obtidos e não como incentivo àaprendizagem. Além disso, essa avaliaçãonão poderá vir ao final de determinadaetapa e apenas representada por uma nota.Representa um feedback contínuo erecursivo entre formador e aluno(MASETTO, 2003).

Conclusões

Com a criação de uma CVA, é ofere-cida a possibilidade de se organizar umespaço de colaboração, para discutir osconteúdos do curso e resolver problemasdo dia a dia de trabalho dos servidores.Com isso, tal facilidade explora os poten-ciais da Internet com vistas a poder criarespaço e condições para que se estabele-çam redes de aprendizagem colaborativa,nas quais é possível trocar informações eexperiências, e partilhar ideias ou tarefasentre servidores que trabalham em ativi-dades assemelhadas. A intenção é permitirque os servidores adotem novas posturasou práticas que promovam a tomada deconsciência e, então, mudem o modo decompreender o que fazem e, até mesmo,como aprendem.

Embora os cursos possam, na abor-dagem broadcast, atingir grande número departicipantes, eles não têm mecanismos quegarantam o máximo rendimento daformação obtida, isto é, indivíduos comautonomia intelectual, pensamento crítico,capacidade de equacionar e resolverproblemas, disposição para oferecersugestões e opiniões, iniciativa e capacidadede organizar-se para cumprir as tarefas no

RSP

241Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

tempo e nas condições necessárias para omelhor aprendizado.

Para que essas habilidades e compe-tências sejam adquiridas, é necessárioincrementar as atividades previstas na abor-dagem broadcast com outras atividades,como a CVA. A comunidade passa a ser oespaço para a interação do grupo, localonde são trocadas informações e encami-nhadas dúvidas do dia a dia de trabalho.

A comunidade, porém, não se formaou se mantém de modo espontâneo. Elanecessita ser cultivada e incentivada, porintermédio de mediadores que atuam e sededicam fundamentalmente a solidificar aparticipação de todos os envolvidos nocurso. Em geral, as estratégias adotadaspelos mediadores, para desencadear aintegração e estabelecer a familiaridadecom os recursos técnicos, têm resultadossatisfatórios nas primeiras semanas e aolongo do curso, com tendência de forta-lecimento das relações interpessoais numclima solidário, cordial, de aceitação e, porfim, de segurança.

Contudo, para que esse espaço possasobreviver, é indispensável a figura doformador, não como único responsávelpelo processo de ensino e aprendizagem,mas como indivíduo que assume umaposição de igualdade ao lado dos demaisparticipantes do ambiente e entende quetodos – participantes e formadores – detêmconhecimentos específicos, diferenciadose relevantes. Ele é diferenciado por ser apessoa que tem uma intencionalidadepedagógica e que deve preservar os obje-tivos originais do curso – o barco tem umtimoneiro!

A partir do momento em que se esta-belece a confiança e a comunidade começaa ser fortalecida, é possível identificaralunos (participantes) que são verdadeirosespecialistas (talentos) e que passam a

assumir a responsabilidade de interagir eajudar os colegas. Com efeito, participantese formadores passam a ser coautores ecoprodutores do seu próprio conhecimentoe, também, ambos são coautores e copro-dutores do que está sendo produzido eincorporado ao ambiente, em um movi-mento contínuo e recursivo.

As intervenções dos mediadores têma função de facilitar o processo de ensinoe aprendizagem, incentivar a interação nosfóruns de discussão e auxiliar o participantea descobrir seu potencial intelectual. Esta-belecem relações entre as várias áreas deconhecimento, conexões relevantes entreos participantes e os mediadores. Alémdisso, as intervenções dos mediadores têmo papel de resgatar a funcionalidade daemoção como condição capaz de propor-cionar circunstâncias adequadas aosanseios e desejos dos participantes, tornan-do esse ambiente adaptável ao aluno epossibilitando uma boa interface de comu-nicação e interação; porém, sem nuncaperder o foco do curso, o controle, ogerenciamento e a animação geral dacomunidade.

Na comunidade, o participante (aluno)tem que modificar a sua atitude para vir aser um agente de busca e construção doconhecimento, tornando-se corresponsável,coautor do seu aprendizado pessoal eprofissional. Cada participante é respon-sável pela construção do conhecimento, deforma autônoma e de acordo com suadisponibilidade e ritmo pessoal. Nessecontexto, o participante pode colocar tantosuas dúvidas quanto os conhecimentos deque dispõe e, portanto, pode ser ao mesmotempo aprendiz e auxiliar do processo deaprendizagem do colega.

A criação da CVA, associada a umcurso que utilize a abordagem broadcast,propicia um ambiente de aprendizagem

RSP

242 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

rico e permite que se entendam osdiferentes papéis que mediadores e parti-cipantes passam a desempenhar. Ademais,faz com que se possam identificar, entreos participantes, talentos que passam a terpapel fundamental na manutenção dacomunidade virtual, e não só nela, mas naprópria estrutura do governo, que, porintermédio dessa ação de formação, conse-guiu identificar diversos servidores comalto grau de especialidade (expertise).

Essa experiência mostra que o conhe-cimento que o governo quer incrementarencontra-se, de algum modo, imerso emsua própria estrutura. Os especialistas exis-tem, porém estão incógnitos e, possivel-mente, ignorados. A criação da CVA podeser a grande oportunidade de o governoresgatar o potencial intelectual e humano

de seus servidores, valorizando a capaci-dade de pensar, de criar e de se relacionarque eles detêm.

Por fim, percebemos que a economiaglobalizada expõe a sociedade e asempresas a uma competição acirrada e,nesse contexto, um dos elementos estraté-gicos dos setores público e privado estaráno domínio de saber trabalhar em comu-nidades virtuais, como uma alternativa deaproveitar e aglutinar o aprendizado dosenvolvidos. As interações sociais virtuais(CVA) têm o poder de construir, por meiodo compartilhamento das informações edas experiências de seus membros,soluções inovadoras para a sociedadecomo um todo.

(Artigo recebido em: maio de 2013. Versão finalem: junho de 2013.)

Notas

1 Piaget (1980) defende que a inteligência possui dois aspectos: o cognitivo e o afetivo. Esseautor considera improvável encontrar o comportamento oriundo da afetividade sem nenhumaspecto cognitivo. Porém, os fatores afetivos e cognitivos são indissociáveis no comportamento.Para o aprendiz desenvolver o conhecimento, é necessário haver interesses intrínsecos. Quandoo indivíduo inicia o processo de construção de conhecimento, ele experimenta estados de pra-zer, ansiedade, fadiga, esforço, aborrecimentos, desapontamento etc. Assim, para Piaget (1980),os aspectos afetivos têm influência no desenvolvimento intelectual de uma pessoa.

2 Essa solução – comunidade virtual de aprendizagem como apoio a uma capacitação – foivencedora do Prêmio Mario Covas – 2008: “Comunidade Virtual de Aprendizagem Saúde: criandouma rede ‘viva’ de colaboradores na área da saúde”. Categoria: Inovação em Gestão Pública. Paradetalhes a respeito, consulte Prêmio Mario Covas em http://www.premiomariocovas.sp.gov.br/2012/index.html.

3 Na abordagem broadcast, os meios tecnológicos são utilizados para apenas transmitir infor-mação aos aprendizes. O conteúdo do curso foi preparado e organizado previamente, para só depoisde pronto ser oferecido ao participante, que não pode fazer nenhuma alteração. Entretanto, o Cursode Licitação Sustentável (oferecido em 2012), na abordagem broadcast, apresenta um diferencial que é acomunidade virtual de aprendizagem, um espaço que permite a interação entre participantes eformadores. Assim, caso o participante sinta necessidade de interferir no conteúdo do curso, ele devediscutir na comunidade (com os mediadores e colegas) e, se houver pertinência, o conteúdo seráalterado pela coordenação do curso, uma vez que o conteúdo do curso estará sempre em construção!

RSP

243Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

4 O conteúdo do curso é organizado em uma sequência de módulos, planejada por critériospedagógicos; cada módulo está organizado nos seguintes subcampos: conteúdo; tema; exercícios;apontamentos; atividades complementares; pesquisa; e saiba mais (campos estáticos). O cursooferece também espaços de apoio, como comunidade, fale conosco, glossário, midiateca, questõesinteressantes, ajuda e créditos.

5 No tutorial, o conteúdo do curso é apresentado por módulos sequenciais.6 A pop-up é uma janela extra que se abre no navegador ao visitar uma página web ou ao

acessar uma hiperligação específica.7 Módulo 1: Contratações ambientalmente sustentáveis; Módulo 2: Aspectos jurídicos;

Módulo 3: Prestação de serviços terceirizados; Módulo 4: Aquisição de materiais; Módulo 5:Obras e serviços de engenharia; Módulo 6: Responsabilidade social; e Módulo 7: Meio ambiente,sociedade e sustentabilidade.

8 Veja a descrição desses recursos na seção “O primeiro suporte da CVA” deste artigo.9 O conteúdo do curso é organizado em uma sequência de módulos, planejada por critérios

pedagógicos (bom exemplo é a comparação com uma “casca de cebola”); cada módulo compõe-se de subcampos: conteúdo; tema; exercícios; apontamentos; atividades complementares; pesquisa;e saiba mais. O curso oferece também espaços de apoio, como comunidade, fale conosco, glossário,midiateca, questões interessantes, ajuda e créditos.

10 O aluno é chamado de participante nos ambientes de aprendizagem a distância da Fundap/Egap.

11 O construcionismo contextualizado significa que a construção do conhecimento baseia-se narealização concreta de uma ação que produz um resultado palpável (um artigo, um projeto, umobjeto) de interesse pessoal de quem produz. É contextualizado porque o produto (a construção) estávinculado à realidade da pessoa ou do local onde vai ser produzido e utilizado (VALENTE, 1999).

12 Essa abordagem oferece condições para implantar situações muito favoráveis para a cons-trução do conhecimento e exige do participante envolvimento, acompanhamento e assessoramentoconstantes. Com base em situações práticas e concretas, mediadores e participantes podeminiciar, conjuntamente, a interaprendizagem e, por intermédio dessas relações intersubjetivas,produzir uma forma autêntica de reflexão e ação. Assim, nesse ciclo de pensar-agir e agir-pensar,toda a comunidade pode, afinal, começar a refletir sobre seu fazer diário.

13 Endereço do curso: http://www.governoemrede.sp.gov.br/ead/lictsustentavelbr/index.htm14 Note que, na estrutura de navegação dos módulos, a apostila (saiba mais) é o último item,

ao contrário, repita-se, da maioria dos cursos tradicionais.15 Os mediadores técnicos são geralmente os autores do conteúdo programático do curso e

também têm o encargo de mediar a comunidade durante três horas diárias. Nas CVA da Fundap/Egap, o aluno recebe um retorno (feedback) em até 24 horas.

16 Assim, o estar junto virtual é uma abordagem que favorece a aprendizagem, fundamentalpara a criação de comunidades virtuais de aprendizagem, e estimula a atuação do aprendiz comocoautor desse processo de construção.

17 O construcionismo contextualizado significa que a construção do conhecimento baseia-se narealização concreta de uma ação que produz um resultado palpável (um artigo, um projeto, umobjeto) de interesse pessoal de quem produz. É contextualizado porque o produto (a construção) estávinculado à realidade da pessoa ou do local onde vai ser produzido e utilizado (VALENTE, 1999).

18 Para Valente (2009, p. 1), “o conhecimento construído é o produto do processamento, dainterpretação, da compreensão da informação. É o significado que atribuímos e representamos

RSP

244 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

em nossa mente sobre a nossa realidade. É algo construído por cada um, muito próprio eimpossível de ser passado – passamos informação que advém desse conhecimento, porém nun-ca o conhecimento em si”.

19 Para o adulto, a vontade de aprender não pode ser explicada somente por mudança deconduta em decorrência de um estímulo externo. Para aprender, o adulto interpreta a realidadede acordo com a sua história e, a partir dessa interpretação, passa a internalizar algo (o produtoda significação); são os fatores de ordem interna que criam circunstâncias para ele se motivar aaprender (autorrealização, autoestima, qualidade de vida etc.).

20 A certificação do Curso de Licitação Sustentável Brasil é de participação e opcional. Oparticipante que desejar certificar-se deverá realizar todos os módulos do curso e participarativamente da comunidade virtual de aprendizagem, com o envio de mensagens significativasde conteúdo técnico (conteúdo do curso), no período de dois meses de vigência de sua turma.Mensagens postadas nos fóruns “Café” e “Bem-vindo! Apresente-se e Colabore” não são con-sideradas para essa avaliação.

21 No que se refere à dimensão interacionista, as relações que possibilitam trocas intelectuaissão, segundo Moraes (2004), inexoráveis ao desenvolvimento do pensamento do sujeito. Paraessa autora, o conhecimento em sua essência é dialético, uma vez que toda interação implicadialogicidade e produção compartilhada. No que concerne à dimensão social, ainda conformeMoraes (2004), o indivíduo, no ato de conhecer, realiza algo, experimenta e reconstrói a suaprópria realidade e muda interiormente, por meio dessa relação consigo mesmo e ante a relaçãocom os seus pares. Para essa autora, a aprendizagem é um “processo de auto-organização e dereorganização mental e emocional”.

22 Os processos auto-organizadores do indivíduo acentuam a dimensão auto-organizadorada avaliação. Isso nos acena que a avaliação deve proporcionar informações imprescindíveispara a formação do aprendiz e não apenas oferecer informações sobre certo aluno em momen-tos determinados pelo formador. A avaliação, a partir dessas teorias, passa a ser também umaparte importante do processo de auto-organização, tanto no nível do indivíduo quanto da orga-nização. E os processos auto-organizadores acentuam, com base nesses enfoques, a dimensãoautoformadora da avaliação. Isso indica que ele deve oferecer informações importantes para oprocesso de autoformação do aluno, colaborando para o seu próprio processo de desenvolvi-mento e aprendizagem. Desse ponto de vista, a avaliação é um instrumento importante para aautonomia do aluno (MORAES, 2004).

Referências bibliográficas

CASTELLS, M. The rise of the network society. Oxford: Blackwell Publisher, 1996.CAVELLUCCI, L. C. B. Estilos de aprendizagens: um olhar nas diferenças de aprendizagens.São Paulo: Unicamp, s. d., mimeo.DIAS, Paulo. Mediação colaborativa das aprendizagens nas comunidades virtuais e deprática. In: COSTA, F. A.; PERALTA, H.; VISEU, S. (Orgs.) As TIC na educação em Portugal.Porto: Porto Editora, 2007.

RSP

245Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

FARIA, R. M. B. Formação de pessoal para o setor público: a experiência da Fundap. In:Cadernos Fundap, 21. São Paulo: Fundap, 1997, pp. 189-197.GONÇALVES, M. I. R. Reflexões sobre silêncio virtual no contexto do grupo de discussãona aprendizagem via rede. In: Revista Pateo: Multidisciplinaridade. [s. l.], ano 7, n. 26, maio/jul., 2003.LÉVY, Pierre. Cibercultura. Rio de Janeiro: Editora 34, 2000.LITWIN, Edith (Org.). Educação a distância: temas para o debate de uma nova agendaeducativa. Porto Alegre: Artmed, 2001.MASETTO, M. T. Competência pedagógica do professor universitário. São Paulo: Summus, 2003.MORAES, M. C. Pensamento eco-sistêmico: educação, aprendizagem e cidadania no séculoXXI. Petropólis/RJ: Vozes, 2004.MORAN, J. M. Ensino e aprendizagem inovadores com tecnologias audiovisuais etelemáticas. In: MORAN, J. M.; MASETTO, M. T.; BEHRENS, M. A. (Orgs.) Novas tecnologias emediação pedagógica. Campinas: Papirus, 2000.PALLOFF, R. M.; PRATT, K. Construindo comunidades de aprendizagens no ciberespaço. PortoAlegre: Artmed, 2002.PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1980.ROCHA, H. V. O ambiente TelEduc para educação a distância baseada na Web: princípios,funcionalidades e perspectivas de desenvolvimento. In: MORAES, C. M. (Org.) Educação adistância: fundamentos e práticas. Campinas: Unicamp/Nied, 2002, p. 197-212. [Online]Disponível em: http://www.nied.unicamp.br/oea/pub.html.SILVA, Bento. Educação e comunicação. Braga: CEEP/Universidade do Minho, 1998.TAVARES-SILVA, Tania. Mediação pedagógica, nos ambientes telemáticos, como recurso de expressãodas relações interpessoais e da construção do conhecimento. 2003. Dissertação (MestradoemEducação: Currículo) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.

. A educação baseada no paradigma da produção em massa, de servidores do Estadode São Paulo, via cursos on-line: a comunidade virtual de aprendizagem como recurso paravalorizar e resgastar a capacidade de pensar, interagir e construir do aprendiz. 2006.Tese (Doutorado em Educação: Currículo) – Pontifícia Universidade Católica de SãoPaulo, São Paulo.VALENTE, J. A. Formação de professores: diferentes abordagens pedagógicas. In: VALENTE,J. A. (Org.) O computador na sociedade do conhecimento. Campinas: Unicamp/Nied, 1999.

. Diferentes abordagens de educação a distância. In: Multiply. [Online]Acesso em: 10 agosto 2009. Disponível em: http://claudioalex.multiply.com/video/item/665.VALENTE, J. A.; TAVARES-SILVA, T. A capacitação de servidores do estado via cursoson-line: adequando soluções às diferentes demandas. In: SILVA, M. (Org.) Educação on-line: teorias, práticas, legislação e formação corporativa. São Paulo: Edições Loyola, 2003.p. 485-500.WENGER, E. Communities of practice: learning, meaning and identity. Nova York: CambridgeUniversity Press, 1998.

RSP

246 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

Resumo – Resumen – Abstract

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência doGoverno do Estado de São Paulo, BrasilTania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando ValenteEste artigo apresenta os quatro suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: a

criação de um curso, na abordagem broadcast, contextualizado e significativo; a mediação técnicae pedagógica; participantes responsáveis e envolvidos; e a aprendizagem continuada. Criada pelaFundação do Desenvolvimento Administrativo e Escola de Governo e Administração Pública,instituições vinculadas à Secretaria de Gestão Pública do Estado de São Paulo (Brasil), a comu-nidade virtual de aprendizagem foi utilizada como recurso para capacitação on-line de servidorespúblicos. Dessa experiência singular, verificou-se que um dos elementos estratégicos dos setorespúblico e privado está no domínio de saber trabalhar em comunidades, como uma alternativa deaproveitar e aglutinar o aprendizado dos envolvidos. As interações sociais virtuais têm o poderde construir, por meio do compartilhamento das informações e das experiências de seus membros,soluções inovadoras para a sociedade como um todo.

Palavras-chave: aprendizagem continuada; capacitação on-line; comunidade virtual deaprendizagem; interações sociais; suportes de aprendizagem

Los soportes de una Comunidad Virtual de Aprendizaje: una experiencia delGobierno del Estado de Sao Paulo, BrasilTania Tavares-Silva, Paulo Dias y José Armando ValenteEn este trabajo se presentan los cuatro soportes de una comunidad virtual de aprendizaje: la

creación de un curso, el enfoque de la difusión, contextualizado y significativo; mediación técnicay pedagógica; los participantes responsables e involucrados; y el aprendizaje permanente. Creadapor la Fundación de Desarrollo Administrativo y la Escuela de Gobierno y AdministraciónPública, instituciones vinculadas con el Departamento de Administración Pública del Estado deSao Paulo (Brasil), una comunidad virtual de aprendizaje fue utilizada como un recurso para laformación en línea de los servidores públicos. Esta experiencia única se constató que uno de loselementos estratégicos de los sectores público y privado está trabajando en el campo delconocimiento en las comunidades, como una alternativa para aprovechar y unir el aprendizajede los participantes. Las interacciones sociales tienen el poder de crear, a través del intercambiode información y experiencias de sus miembros, las soluciones innovadoras para la sociedad ensu conjunto.

Palabras clave: el aprendizaje permanente; la formación en linea; la comunidad virtual deaprendizaje; las interacciones sociales; soportes de aprendizaje

The principles of a virtual learning community: an experience of the Departmentof Public Administration of the State of São Paulo, BrazilTania Tavares-Silva, Paulo Dias and José Armando ValenteThis article presents four principles of a virtual learning community: the creation of a

contextualized and meaningful course, in a broadcast approach; the technical and pedagogicalmediation; responsible and involved participants; and the continuous learning. Created by theAdministrative Development Foundation and the Government and Public Administration School,institutions linked to the Department of Public Administration of the State of Sao Paulo,Brazil, the virtual learning community was used as a resource for on-line training of public

RSP

247Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

servants. From that singular experience, it was found out that one of the strategic elements ofpublic and private sectors is in the mastery of knowing how to work in communities, as a way toharness and unite the learning of those involved. Social interactions have the power to build,through the sharing of information and experiences of its members, innovative solutions tosociety as a whole.

Keywords: lifelong learning; on-line training; virtual learning community; social interactions;learning supports

Tania Tavares-SilvaÉ pós-doutora em Novas Tecnologias pela Universidade do Minho, Portugal. Técnica da Fundação do DesenvolvimentoAdministrativo (Fundap). Contato: [email protected]

Paulo DiasÉ doutor em Educação pela Universidade do Minho, Portugal. Reitor da Universidade Aberta, Portugal. Contato:[email protected]

José Armando ValenteÉ livre docente na área de Tecnologias Educacionais, pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Professor echefe do Departamento de Multimeios, Mídia e Comunicação do Instituto de Artes e pesquisador do Núcleo de InformáticaAplicada à Educação (Nied) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Contato: [email protected]

Edição e revisão técnica deste artigo

João VazÉ professor da Escola Diadema de Administração Pública (Edap) e da Uniesp/FaD. Mestre em Semiótica e LinguísticaGeral pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP); e especialistaem EaD pelo Senac/RJ.