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PABLO RIBEIRO CONEXÃO REPÓRTER: UMA PRÁTICA DE JORNALISMO INVESTIGATIVO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito obrigatório para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social Habilitação em Jornalismo, da Universidade de Caxias do Sul. Orientador: Prof. Me. Jacob Raul Hoffmann Caxias do Sul 2017

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PABLO RIBEIRO

CONEXÃO REPÓRTER: UMA PRÁTICA DE JORNALISMO INVESTIGATIVO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito obrigatório para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo, da Universidade de Caxias do Sul.

Orientador: Prof. Me. Jacob Raul Hoffmann

Caxias do Sul 2017

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PABLO RIBEIRO

CONEXÃO REPÓRTER: UMA PRÁTICA DE JORNALISMO INVESTIGATIVO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito obrigatório para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo, da Universidade de Caxias do Sul.

Aprovado (a) em: ___/___/2017. Banca Examinadora: ______________________________________________ Prof. Me. Jacob Raul Hoffmann Universidade de Caxias do Sul ______________________________________________ Prof. Ma. Marliva Vanti Gonçalves Universidade de Caxias do Sul ______________________________________________ Prof. Me. Marcell Bocchese Universidade de Caxias do Sul

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Dedico este trabalho aos meus pais, Carlos e Mara, por terem me acompanhado durante esta jornada e por sempre apoiarem minhas escolhas.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, em primeiro lugar, a Deus, por ter me dado o dom da vida e por

sempre guiar meus caminhos, abençoando cada passo que dou rumo ao alcance de

meus objetivos. Por isso, continuo mantendo a fé no Senhor e acreditando que todos

os nossos sonhos podem ser alcançados quando se acredita Nele.

Aos meus pais, Carlos Augusto Ribeiro e Mara Rúbia Pasqualotto Ribeiro, que

nunca mediram esforços para que eu pudesse chegar até aqui. São eles que estão

sempre ao meu lado, me apoiando em minhas escolhas. Agradeço a eles por terem

me criado e educado com todo o amor, e por terem me ensinado, principalmente, os

valores do caráter e da ética. Verdadeiramente, são meus exemplos de força, vontade

e perseverança.

Aos grandes amigos que constitui ao longo dos anos de graduação,

principalmente, Denise Costa e Gabriela Fiorio. Foram muitos os trabalhos realizados

com empenho, dedicação e companheirismo. Muitas risadas e muita cumplicidade.

Conversas que ficarão eternizadas na minha memória. Amizades que quero levar para

o resto da vida.

Um dos grandes amigos que fiz na UCS, se dúvida, foi o grande Dirceu Borba.

Costumo dizer que sou um grande fã desse ser-humano. Um cinegrafista único, que

capta cada imagem com uma essência magnífica. Uma pessoa e um profissional de

caráter ímpar, parceiro para todas as horas. Os melhores trabalhos que realizei

durante a graduação, tiveram a “mão” do Dirceu.

Ao meu orientador, professor Jacob Raul Hoffmann, por todo o incentivo na

realização desta monografia. Por apontar os erros e acertos, contribuindo

significativamente pela busca de um caminho melhor. Além disso, agradeço por todos

os ensinamentos nas diversas disciplinas que cursei sob a sua orientação, e pelas

muitas conversas sobre o rádio.

Ao longo da minha vida acadêmica, agradeço pelas experiências fantásticas

que tive em todos os locais de trabalho no qual passei – Randon Implementos, Rádio

Caxias e Rádio São Francisco. Além disso, não poderia deixar de citar a passagem

pela Rádio Gaúcha Serra, por meio do projeto “ Jornalismo na Prática”, do Grupo RBS.

Experiências que contribuíram para minha formação como jornalista.

Ao gerente do SBT-RS, Danilo Teixeira, que, atenciosamente, atendeu meus

e-mails e contribuiu imensamente para que eu pudesse realizar e entrevista com o

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jornalista Roberto Cabrini, em outubro de 2017. Sua ajuda foi fundamental para o

complemento deste trabalho.

Ao Frei João Carlos Romannini que, “em cima da hora”, conseguiu uma

credencial para que eu pudesse assistir à palestra de Cabrini no 24º Congresso

Gaúcho de Emissoras de Rádio e Televisão da Associação Gaúcha das Emissoras

de Rádio e Televisão (AGERT), que ocorreu em outubro de 2017, no Hotel

Continental, na cidade de Canela, no Rio Grande do Sul.

Ao jornalista Roberto Cabrini pela disponibilidade em me conceder a

entrevista no dia do congresso. Agradeço a ele pela atenção e carisma. Suas

respostas contribuíram imensamente para o enriquecimento desta monografia. Além

disso, realizei o sonho de conhecer o meu ídolo no jornalismo. Um momento único e

especial, que jamais será esquecido.

Por fim, agradeço a todos os professores que tive a oportunidade de conviver

ao longo do curso de Jornalismo, demais familiares, e a todos que contribuíram para

que eu pudesse chegar até aqui. A todos, o meu muito obrigado!

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“Que todos os nossos esforços estejam sempre focados no

desafio à impossibilidade. Todas as grandes conquistas humanas vieram daquilo que

parecia impossível”.

Charles Chaplin

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RESUMO

Esta monografia tem por objetivo investigar quais elementos do Jornalismo Investigativo estão presentes e como são evidenciados nos episódios do programa Conexão Repórter, do SBT. A pesquisa aborda o histórico da televisão, seus gêneros e formatos na categoria informação, e também do hibridismo. Além disso, traz os conceitos de jornalismo e jornalismo investigativo, evidenciando suas diferenças. O método utilizado foi a análise de conteúdo, juntamente com as técnicas de revisão bibliográfica, entrevista e observação. Com a realização da pesquisa foi possível perceber as principais características do jornalismo investigativo. Além disso, notou-se que os episódios do programa analisado possuem diferentes níveis de investigação. Palavras-chave: Televisão. Jornalismo Investigativo. Documentário. Conexão Repórter.

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ABSTRACT

This monograph aims to investigate which elements of invetigative journalism are present and as evidenced in episodes of program Conexão Repórter, of SBT. The research covers the history of television, its genre and formats in the information category and as well the hybridism. Besides, it brings the concepts of journalism and investigative journalism, highlighting their differences. The method was used the "content analysis", along with the bibliographical review techniques, interview and observation. With the realisation of research it was possible to perceive the main chacarteristics of investigative journalism. Furthermore, it was noted that the episodes of analyzed program have different levels of investigation. Keywords: Television; Investigative journalism; Documentary; Conexão Repórter.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Categorias, gêneros e formatos..................................................................33

Figura 2: Esquema de diferenciação entre o jornalismo convencional e investigativo,

desenvolvido por Mark Lee Hunter............................................................................74

Figura 3: Esquema de compreensão do conceito de metodologia..............................77

Figura 4: Esquema de Bardin.....................................................................................83

Figura 5: Logotipo do programa Conexão Repórter e o apresentador Roberto

Cabrini........................................................................................................................91

Figura 6: Padre Eugênio em um de seus cultos........................................................94

Figura 7: Roberto Cabrini mostra uma das fossas onde corpos de presos foram

encontrados..............................................................................................................126

Figura 8: Câmera escondida revela a venda ilegal de remédios controlados............169

Figura 9: Soldado com a orelha cortada....................................................................190

Figura 10: Foto com Roberto Cabrini........................................................................203

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO........................................................................................................12

2 A TELEVISÃO.........................................................................................................16

2.1 HISTÓRIA DA TELEVISÃO..................................................................................16

2.2 A TELEVISÃO NO BRASIL...................................................................................18

2.3 A ERA DA TELEVISÃO NO SÉCULO XXI............................................................25

3 GÊNEROS E FORMATOS DE PROGRAMAS TELEVISIVOS................................31

3.1 CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS...................................................................31

3.2 CATEGORIA INFORMAÇÃO...............................................................................34

3.2.1 Gênero documentário....................................................................................34

3.2.2 Gênero entrevista...........................................................................................35

3.2.3 Gênero telejornal............................................................................................36

3.3 HIBRIDISMO........................................................................................................37

4 O JORNALISMO....................................................................................................39

4.1 O CONCEITO DE JORNALISMO........................................................................39

4.2 UM BREVE HISTÓRICO DO JORNALISMO.......................................................41

4.3 JORNALISMO NO BRASIL.................................................................................43

4.4 CLASSIFICAÇÕES NO JORNALISMO...............................................................44

4.5 A NOTÍCIA NA TV...............................................................................................47

4.6 A PAUTA NA TV..................................................................................................49

4.7 AS FONTES NA TV.............................................................................................53

4.8 PROCESSO DE EXECUÇÃO DA REPORTAGEM NA TV.................................54

4.8.1 Entrevista na TV.............................................................................................56

4.8.2 Edição do material na TV...............................................................................60

5 JORNALISMO INVESTIGATIVO...........................................................................63

5.1 HISTÓRICO, CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS............................................63

5.2 FASES DA INVESTIGAÇÃO...............................................................................69

5.3 JORNALISMO CONVENCIONAL VERSUS JORNALISMO INVESTIGATIVO...72

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6 METODOLOGIA....................................................................................................76

6.1 O MÉTODO: ANÁLISE DE CONTEÚDO............................................................77

6.1.1 Pré-análise......................................................................................................78

6.1.2 Exploração do material..................................................................................79

6.1.3 Codificação.....................................................................................................80

6.1.4 Categorização.................................................................................................80

6.1.5 Tratamento dos resultados obtidos e interpretação...................................82

6.2 TÉCNICAS...........................................................................................................83

6.2.1 Revisão Bibliográfica.....................................................................................84

6.2.2 Observação.....................................................................................................86

6.2.2.1 Corpus da pesquisa: Programa Conexão Repórter..................................87

6.2.2.2 O apresentador: Roberto Cabrini...............................................................89

6.2.2.3 Episódios analisados..................................................................................91

6.2.2.3.1 Investigando Milagres.................................................................................92

6.2.2.3.1.1 Análise do episódio “Investigando Milagres”..........................................112

6.2.2.3.2 A Longa Noite no Inferno de Alcaçuz........................................................120

6.2.2.3.2.1 Análise do episódio “A Longa Noite no Inferno de Alcaçuz”..................151

6.2.2.3.3 O Mercado Negro dos Remédios Controlados.........................................159

6.2.2.3.3.1 Análise do episódio “O Mercado Negro dos Remédios Controlados”...180

6.2.2.3.4 Os Filhos da Meia-Noite...........................................................................185

6.2.2.3.4.1 Análise do episódio “Os Filhos da Meia-Noite”......................................195

6.2.3 Entrevista......................................................................................................197

6.2.3.1 Processo da entrevista................................................................................199

6.2.3.2 Entrevista com Roberto Cabrini...................................................................203

6.2.3.2.1 Análise da entrevista com Roberto Cabrini...............................................207

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................210

REFERÊNCIAS........................................................................................................216

ANEXOS..................................................................................................................222

APÊNDICES.............................................................................................................224

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1 INTRODUÇÃO

O jornalismo investigativo se diferencia em alguns aspectos relacionados ao

jornalismo convencional. Alguns autores, porém, defendem a ideia de que todo

jornalismo é, por essência, investigativo. Leandro Fortes, em seu livro Jornalismo

Investigativo (2005), sintetiza tal afirmação e a reforça afirmando que o termo

“jornalismo investigativo” pode soar redundante, tendo em vista que toda apuração

deve tomar ares de investigação.

Ricardo Noblat, jornalista e autor, em seu artigo Sem investigação não há

jornalismo (2005) compartilha da ideia de Fortes (2005) e evidencia que todo

jornalismo pressupõe e exige investigação, desde uma simples denúncia, um acidente

de carro, até uma eleição fraudada. Segundo Noblat (2005), o bom jornalismo é

resultante de uma investigação, que, muitas vezes, pode ser até exaustiva.

Ainda que Fortes (2005) e Noblat (2005) defendam que todo jornalismo exige

investigação, outros autores trazem conceitos que diferenciam o jornalismo

investigativo do convencional. Dirceu Fernandes Lopes, em seu artigo Caminhos do

jornalismo investigativo em busca da verdade oculta (2003), destaca que o jornalismo

investigativo se objetiva em reconstruir importantes acontecimentos, desmascarar

aquilo que os poderes querem ocultar, principalmente as injustiças e, com isso,

promover reformas na sociedade.

Mark Lee Hunter, em seu livro A investigação a partir de histórias: um manual

para jornalistas investigativos (2009), sintetiza que um dos principais fatores que

distinguem estas duas maneiras de prática jornalística pressupõe à iniciativa do

repórter, pois é a partir dele que uma cobertura investigativa é realizada. Em

contrapartida, uma cobertura jornalística convencional depende apenas de materiais

fornecidos por terceiros, como a polícia, governos, etc.

O Conexão Repórter, exibido pelo SBT (Sistema Brasileiro de Televisão), é

um dos programas televisivos que carregam como essência o jornalismo investigativo

na maioria de seus episódios. No ar desde o dia 04 de março de 2010, tem como

característica principal a exclusividade. Transmitido aos domingos, na faixa da meia-

noite, logo após o Programa Silvio Santos, o Conexão Repórter é produzido e

apresentado pelo jornalista Roberto Cabrini. No currículo de Cabrini, destacam-se a

cobertura da morte do piloto brasileiro de Fórmula 1, Ayrton Senna, em 1994; o

documentário Em Nome de Alá, em 1996, vencedor do Prêmio Vladimir Herzog de

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direitos humanos e que mostrou a ascensão do grupo radical Taliban no Afeganistão,

apoiado pela Al Qaeda, de Osama Bin Laden; além de realizar a cobertura jornalística

de seis guerras internacionais: Afeganistação, Iraque, Palestina, Camboja, Caxemira

e Haiti. Estes trabalhos fizeram com que Cabrini ganhasse os principais prêmios

nacionais como repórter investigativo (Esso, APCA, Líbero Badaró, Imprensa, Tim

Lopes e Vladimir Herzog).

A partir do apreço pelo jornalismo investigativo, aliado ao programa Conexão

Repórter e ao jornalista Roberto Cabrini, estabeleceu-se o tema para a presente

pesquisa: perceber e analisar os elementos do Jornalismo Investigativo que

caracterizam as reportagens do programa Conexão Repórter, do SBT.

Neste sentido, desenvolveu-se a questão norteadora desta pesquisa: Quais

elementos do Jornalismo Investigativo estão presentes e como são evidenciados nos

episódios do Programa Conexão Repórter, do SBT? Foram elencadas as seguintes

hipóteses para nortear o estudo: o apresentador Roberto Cabrini evidencia em suas

reportagens o trabalho de meses de investigação sobre assuntos de interesse público

e repercussão social, o que denota ao telespectador um longo trabalho de pesquisa;

a maioria dos episódios é produzido com o auxílio de câmeras escondidas, além de

apresentar documentos por vezes obtidos com exclusividade pelo programa e em

muitas reportagens, Roberto Cabrini é ousado e por vezes sofre risco de vida, pois

muitos personagens e fontes das reportagens não gostariam que o assunto em

questão fosse divulgado.

Como objetivo geral, a pesquisa tem a proposta de analisar quais elementos

do jornalismo investigativo são evidenciados nos episódios do programa Conexão

Repórter, do SBT. Quanto aos objetivos específicos: conhecer melhor e caracterizar

o jornalismo investigativo; proporcionar aos acadêmicos um melhor entendimento

sobre os elementos do jornalismo investigativo; analisar o processo de construção e

produção dos conteúdos do programa Conexão Repórter e caracterizar e conceituar

os gêneros de programas televisivos.

Os elementos do jornalismo investigativo abordados no decorrer da análise

basearam-se nos conceitos dos autores Dirceu Fernandes Lopes, em sua obra

Caminhos do Jornalismo Investigativo em busca da verdade oculta (2003); Leandro

Fortes, que explana sobre as fases da investigação em seu livro Jornalismo

Investigativo (2005) e Mark Lee Hunter, que expõe as principais diferenças entre o

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jornalismo investigativo e o jornalismo convencional no livro A investigação a partir de

histórias: uma manual para jornalistas investigativos (2009).

O resultado do estudo foi a elaboração de sete capítulos. No capítulo 2 desta

monografia, A Televisão, é apresentado um panorama geral dos fatores históricos que

constituíram este veículo de comunicação no âmbito mundial e nacional. Além disso,

também são evidenciadas as evoluções da televisão no século XXI, dentre elas, o

desligamento do sistema analógico para a exclusividade do sistema digital.

O capítulo 3, Gêneros e formatos de programas de televisivos, são

conceituados categoria, gêneros e formatos direcionados para o tema da pesquisa,

classificando o programa Conexão Repórter no gênero documentário. Além disso, a

mistura dos gêneros televisuais, o chamado hibridismo, também é abordado neste

capítulo.

O quarto capítulo desta monografia, O Jornalismo, aborda o conceito, os

fatores históricos mundiais e nacionais, além das classificações no jornalismo. O

capítulo também evidencia os conceitos de notícia, pauta, fontes, e o processo de

execução da reportagem, que envolve a entrevista e a edição do material.

O capítulo 5, Jornalismo Investigativo, busca, além de conceituar o gênero,

trazer as características e fatores históricos na visão de diversos autores, detalhando

as fases de uma investigação e as diferenças do jornalismo investigativo em relação

ao jornalismo convencional.

No capítulo 6, Metodologia, é apresentado o método da Análise de Conteúdo,

utilizado para a realização desta pesquisa, apresentando seus procedimentos e

corpus para análise. O trabalho utilizará as técnicas de revisão bibliográfica,

observação e entrevista. Neste capítulo também são apresentadas as decupagens

das cenas selecionadas para análise dos elementos do jornalismo investigativo de

quatro episódios do programa Conexão Repórter: Investigando Milagres, A Longa

Noite no Inferno de Alcaçuz, O Mercado negro dos Remédios Controlados e Os Filhos

da Meia-Noite. A análise de cada episódio é realizada após a decupagem dos

mesmos. A entrevista com o jornalista Roberto Cabrini também é apresentada no

capítulo em questão.

O sétimo e último capítulo desta monografia é dedicado às considerações

finais, onde novamente são evidenciados os objetivos desta pesquisa e se, de fato,

foram alcançados. Também é respondida a questão norteadora e confirmadas ou não

as hipóteses da pesquisa. Nesse capítulo o pesquisador também tratou de apresentar

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o relato sobre os aprendizados e inferências durante o processo de produção deste

trabalho.

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2 A TELEVISÃO

Para a realização do presente trabalho, torna-se necessário evidenciar a

história deste que é um dos veículos de comunicação mais presentes nos lares

brasileiros: a televisão. Neste capítulo, apresentaremos alguns aspectos históricos da

televisão, no que diz respeito ao Brasil e ao mundo, e assim, direcionar ao objeto de

estudo desta pesquisa: o programa Conexão Repórter, do SBT.

2.1 HISTÓRIA DA TELEVISÃO

O autor Sérgio Mattos, em seu livro História da Televisão Brasileira – Uma

visão econômica, social e política (2010), apresenta um panorama geral dos fatores

históricos que ajudaram a moldar e constituir este veículo de comunicação chamado

televisão.

Conforme Mattos (2010), tudo começa em 1873. Foi neste ano que o

engenheiro elétrico norte-americano Willoughby Smith (1828-1891) descobriu, através

de seus estudos, que o elemento químico selênio continha propriedades

fotocondutoras, ou seja, ele constatou que, dependendo da quantidade de luz, existia

variação da condutividade elétrica. Já em 1875, o inventor norte-americano George

Carey criou um aparelho de transmissão de imagens, através de circuitos elétricos.

“Estes dois americanos, portanto, deram os primeiros passos no sentido de viabilizar

a criação da televisão tal qual a conhecemos hoje”. (MATTOS, 2010, p. 190).

Em 1880, dois cientistas idealizaram o “sistema de varredura”. O norte-

americano Sawyer e o francês Maurice Le Blanc criaram esse sistema que transforma

as imagens em linhas e transmite uma a uma, em alta velocidade, numa sucessão de

quadros. O olho humano as percebe como movimento devido à persistência visual.

Segundo Mattos (2010), foi na Alemanha, em 1884, que o primeiro sistema

de televisão eletromecânica, utilizando o princípio da varredura, foi patenteado pelo

inventor Paul Nipkow. O conhecido Disco de Nipkow foi utilizado pela televisão até

1940.

Ainda em 1884, o físico alemão Heinrich Hertz demonstrou a existência de

ondas eletromagnéticas, na qual passaram a ser conhecidas como ondas hertzianas,

que são as transportadoras dos sinais de televisão.

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O invento que viabilizou a televisão eletrônica, o chamado “tubo de vidro a

vácuo” foi desenvolvido pelo alemão K.F. Braun.

A primeira demonstração da televisão, utilizando sistema de varredura

mecânica, ocorreu apenas em 1923. Foi na Inglaterra, onde o engenheiro escocês

John Logie Baird conseguiu reproduzir imagens em uma pequena tela. Logicamente,

imagens precárias. Baird testou, em 1928, a televisão a cores, fabricada com base no

sistema eletromecânico.

As primeiras transmissões de imagens coloridas foram realizadas em 1929,

nos Estados Unidos e foi entre as cidades de Novo York e Washington, utilizando o

sistema de varredura mecânica e com definição de cinquenta linhas.

A primeira emissora de televisão pública do mundo foi a BBC (British

Broadcast Corporation), que nasceu na Inglaterra, em 1936. Já a NBC (National

Broadcasting Company) se destacou como a primeira emissora de televisão

comercial.

Um fato histórico importante sobre a televisão, que Mattos (2010) evidencia,

é que no período da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), as transmissões foram

cessadas em grande parte dos países. Apenas após a guerra é que as pesquisas e o

desenvolvimento da televisão são retomados.

As primeiras transmissões públicas a cores nos Estados Unidos aconteceram

em 1951.

Mattos (2010) destaca que a grande revolução tecnológica que deu um

sentido ainda maior para a televisão foi a descoberta do videoteipe, que foi lançado

no mercado em 1956, pela empresa norte-americana Ampex. Até essa descoberta,

os programas de TV eram transmitidos todos ao vivo. A partir do videoteipe, a

linguagem visual dos filmes começou a ser melhorada. Os japoneses aperfeiçoaram

o equipamento e criaram o videocassete.

A partir dos anos 90 até os dias atuais, iniciou em todo o mundo, inclusive no

Brasil, o processo de substituição do sistema de televisão analógico pelo sistema

digital, que permitem a imagem em alta definição.

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2.2 A TELEVISÃO NO BRASIL

A televisão chegou ao Brasil em 18 de setembro de 1950, quando foi

inaugurada em São Paulo a PRF-3 Tupi Difusora, canal 3. A TV Tupi foi a primeira

emissora da América Latina.

O autor, ator, redator, diretor e produtor Jorge Lorêdo, um dos pioneiros da

TV brasileira, relata em seu livro Era uma vez...a televisão (2000) que, no início da TV

Tupi, tudo era feito na base do improviso. Segundo Lorêdo (2000, p. 03) “A emissora

entrou no ar sem que soubesse qual seria a programação do dia seguinte”.

A Tupi foi criada por um dos maiores nomes da comunicação brasileira: Assis

Chateubriad, dono dos Diários Associados1. Lorêdo (2000) traz à tona a história de

que Chateubriand inaugurou a primeira câmera quebrando uma garrafa de

champanhe na lente da câmera. “[...] a programação preparada para três câmeras

teve que ir para o ar com duas, aumentando ainda mais o tumulto da estreia [...]”.

(LORÊDO, 2000, p. 03).

Mattos (2010) evidencia que a televisão brasileira começou a ser implantada,

de fato, em fevereiro do ano anterior à estreia, em 1949. Chateaubrind adquiriu

aproximadamente trinta toneladas de equipamentos necessários para montar uma

emissora de televisão, isso como resultado de uma parceria junto à empresa

americana RCA Victor. Grandes nomes da comunicação ajudaram Chatô na

implantação da televisão no país. Dermival Costa Lima foi nomeado coordenador do

projeto. Os outros integrantes do pioneirismo foram Mário Alderigui, Cassiano Gabus

Mendes e Georges Henry, maestro francês.

De acordo com Melo (1975, p. 37 apud MATTOS, 2010, p. 55), “o crescimento

inicial da televisão, a partir de 1950, pode ser atribuído ao favoritismo político, o qual

concedia licenças para exploração de canais sem um plano preestabelecido”.

Ainda de acordo com o autor:

1 Os Diários Associados se consolidaram como um dos mais importantes conglomerados de

comunicação de massa do Brasil e da América Latina – são dezenas de jornais, emissoras de rádio e TV, revista, sites e portais de internet, a Fundação Assis Chateaubriand e também outras empresas. Chateubriand deu origem ao grupo em 1924, lançando veículos de comunicação Brasil afora, que são, até hoje, referência de qualidade e de compromisso com a boa informação. A história do grupo está, ao mesmo tempo, interligada à da modernização da comunicação no Brasil, bem como a própria história do País, disponível no link: <http://www.diariosassociados.com.br/home/conteudo.php?co_pagina=44>. Acesso em: 31 jul. 2017.

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[...] a proliferação de estações de televisão começou antes do Golpe Militar de 1964, mais precisamente durante a administração do Presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961). Depois do estabelecimento do Ministério das Comunicações, em 1967, o processo de concessão de licenças passou a levar em conta não apenas as necessidades nacionais, mas também os objetivos do Conselho de Segurança Nacional, de promover o desenvolvimento e a integração nacional. Entretanto o favoritismo político nas concessões de canais de TV prolongou-se até o governo da Nova República, de José Sarney”. (MATTOS, 2010, p. 55).

O desenvolvimento da televisão no Brasil passou por algumas fases desde a

inauguração da TV Tupi, a primeira emissora. Mattos (2010) destaca as fases elitista

(1950-1964); populista (1964-1975); a fase do desenvolvimento tecnológico (1975-

1985); a fase de transição e da expansão internacional (1985-1990); a fase da

globalização e da TV paga (1990-2000); a fase da convergência e da qualidade digital

(2000-2010) e, por fim, a fase da portabilidade, mobilidade e interatividade digital

(2010 até os dias de hoje).

Mattos (2010) classifica o período de 1950 a 1964, como a “Fase Elitista”,

quando apenas as pessoas de poder econômico poderiam ter um aparelho televisor,

considerado um luxo para a época. A televisão brasileira foi iniciada com apenas

duzentos aparelhos televisores. Conforme Júnior (1998 apud Mattos, 2010) estes

duzentos aparelhos foram importados através de contrabando, a mando do próprio

Assis Chateaubriand. Já ao final de 1951, já haviam mais de sete mil aparelhos de

televisão entre Rio de Janeiro e São Paulo.

Sobre a chamada “Fase Elitista”, a autora Vera Íris Paternostro, no livro O

texto na TV (2006), cita que, realmente, a programação das emissoras seguia a linha

de “elite”, pois a maioria dos artistas e técnicos eram vindos do rádio e do teatro.

Dentre as principais atrações das programações estavam as entrevistas, debates,

teleteatros, shows e música clássica. Em 1954, já existiam 12 mil televisores no Rio e

em São Paulo. Quatro anos depois, o número se elevou para 78 mil aparelhos em

todo o país. (PATERNOSTRO, 2006).

Conforme Mattos (2010), foi em 1952, mais precisamente no dia 1º de abril,

foi ao ar pela primeira vez o mais famoso telejornal da televisão brasileira: O Repórter

Esso2, que levava o nome de seu patrocinador, e era transmitido pela TV Tupi. O

programa permaneceu no ar até o dia 31 de dezembro de 1970.

2 O Repórter Esso foi adaptado pela Tupi Rio de um rádio jornal de grande sucesso transmitido pela United Press International (UPI).

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Mattos (2010) ainda destaca que no final da década de 1950, o Brasil já

contava com dez emissoras de televisão em funcionamento. Segundo o autor, um

grande avanço para o setor de comunicações surgiu em 1962. Foi o Código Brasileiro

de Telecomunicações, promulgado pela Lei 4.117. Este código dava maiores

garantias às concessionárias e amenizava as sanções.

A segunda emissora de São Paulo foi inaugurada em 1952. Na TV Paulista

nasceram programas históricos como A Praça da Alegria, com Manoel de Nóbrega

que, posteriormente se transferiu para a TV Record e se consolidou como um dos

maiores sucessos humorísticos da TV brasileira, cuja fórmula permanece até hoje,

com A Praça é Nossa, que vai ao ar pelo SBT e é apresentado por Carlos Alberto de

Nóbrega, filho de Manoel. Outro grande sucesso da TV Paulista foi O Sítio do Pica-

Pau Amerelo, baseado na obra de Monteiro Lobato. Também na TV Paulista, o

apresentador Silvio Santos era um dos destaques e apresentava seus shows

populares. (PATERNOSTRO, 2006).

Em 1953, no dia 27 de setembro, surgiu a terceira emissora de televisão de

São Paulo: a TV Record, canal 7. A emissora foi fundada pelo empresário Paulo

Machado de Carvalho.

Segundo Mattos (2010), no início da década de 1960, a TV Record viveu um

dos seus melhores períodos, com programas musicais e festivais de música de

sucesso, na qual revelaram grandes cantores da música popular brasileira como

Roberto Carlos, Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Elis Regina, entre

muitos outros. Paternostro (2006) destaca que os programas de maior repercussão e

também audiência foram O Fino da Bossa, apresentado por Elis Regina e Jair

Rodrigues, e Jovem Guarda, com Roberto Carlos. Mattos (2010) ressalta que a TV

Record entrou em decadência devido a uma série de incêndios ocorridos entre 1968

e 1969. A emissora começou a se recuperar financeiramente apenas em meados dos

anos 1970 e, atualmente, é uma das maiores emissoras de TV do Brasil. Hoje, a

emissora chama-se Record TV e pertence ao Bispo Edir Macedo, proprietário da

Igreja Universal do Reino de Deus.

De acordo com Paternostro (2006), a briga pela audiência começa a partir dos

anos 60, quando a TV se consolida no Brasil e passa a assumir o caráter comercial.

Com essa consolidação, em 1960, chega ao Brasil a maior revolução tecnológica e

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que mudaria de vez a forma de se produzir conteúdo: o equipamento de videotape3.

“Estava instaurada a revolução do VT: operações atualizadas, racionalização da

produção, economia de custo e de tempo, melhor qualidade nos programas”.

(PATERNOSTRO, 2006, p. 31).

Sobre a chegada do videotape, Mattos (2010) afirma ter sido um dos grandes

impulsos para a televisão.

O uso do VT possibilitou não somente as novelas diárias como também a implantação de uma estratégia de programação horizontal. A veiculação de um mesmo programa em vários dias da semana criou o hábito de assistir televisão rotineiramente, prendendo a atenção do telespectador e substituindo o tipo de programação em voga até então, de caráter vertical, com programas diferentes todos os dias. (MATTOS, 2010, p. 93).

Paternostro (2006) destaca que uma das emissoras que mais aproveitou o

potencial dos recursos que o videotape oferecia foi a TV Excelsior, emissora que

nasceu no dia 9 de julho de 1960, em São Paulo. Um dos destaques de inovação foi

o programa Chico Anísio Show, dirigido por Carlos Manga, passou a ter cenas com

montagens e cortes até então nunca vistos. Se Mattos (2010) destacou o grande

impulso que o VT deu à televisão em si, Paternostro (2006) evidencia o impulso às

telenovelas, evidenciando que a primeira novela da TV brasileira foi transmitida ainda

ao vivo, e se chamava Sua Vida me Pertence, que foi ao ar pela Tupi, em 1951, duas

vezes por semana, em capítulos de 15 minutos.

Ou seja, para Paternostro (2006, p. 32), “A chegada do videotape permitiu às

emissoras investirem mais nas telenovelas. A TV Excelsior lançou a primeira novela

diária, 2-5499 Ocupado, com Glória Menezes e Tarcísio Meira, e partiu em seguida

para uma sucessão de títulos [...]”.

Conforme Mattos (2010), a “Fase Populista” compreende os anos de 1964 até

1975. De acordo com o autor, em 1964 foi o momento de maior influência política

sobre o desenvolvimento da televisão brasileira. Neste ano que o Presidente João

Goulart foi deposto por um golpe de estado. “O Golpe de 1964 afetou diretamente os

meios de comunicação de massa porque o sistema político e a situação

socioeconômica do país foram totalmente modificados pela definição e adoção de um

3 Videotape ou VT: equipamento eletrônico que grava [em fita magnética] os sinais de áudio e vídeo gerados por uma câmera. Acoplados, um ou mais videotapes, são usados para edição de matérias nas ilhas de edição. O videotape revolucionou o telejornalismo brasileiro. (PATERNOSTRO, 2006, p. 226).

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modelo econômico para o desenvolvimento nacional”. (MATTOS, 2010, p. 95).

Paternostro (2010, p. 33) classifica tal fase como “[...] a fase da censura prévia ao

conteúdo de programas de todos os gêneros”.

Conforme Almeida (1971, p. 58 apud MATTOS, 2010, p. 99), “Também foram

factíveis neste período as represálias, tais como, a exercida contra a TV Excelsior,

que foi uma rede poderosa durante o governo de Goulart (1961-1964)”. A TV Excelsior

perdeu a licença em 1970, supostamente por problemas financeiros. A falência da

Excelsior coincidiu com o auge da TV Globo, que ocupou o lugar dos Diários

Associados, constituindo-se como um novo oligopólio das comunicações.

Esta etapa do desenvolvimento da televisão, segundo Mattos (2010, p. 99),

também se caracterizou “como sendo a fase em que esta, deixando de lado o clima

de improvisação dos anos de 1950, adota os padrões de administração norte-

americanos e torna-se cada vez mais profissional”.

No dia 26 de abril de 1965 o jornalista e empresário Roberto Marinho inaugura

a TV Globo, no Rio de Janeiro. Em São Paulo, aquela que viria a ser a maior emissora

de televisão do país chegou em 24 de março de 1966. (MATTOS, 2010).

Segundo Paternostro (2006), o início da TV Globo foi marcado com uma

programação voltada para a linha popular, com grandes nomes em seu elenco como

Chacrinha, Dercy Gonçalves, e até mesmo, Silvio Santos, que compra a TV Paulista

em 1966. Logo, a emissora se associa ao grupo norte-americano Time-Life, e começa

a comprar e contratar emissoras pelo país, constituindo suas afiliadas e expandindo

seu sinal. Era o chamado esquema network. “O envolvimento americano da TV Globo

foi, subsequentemente, eliminado, embora isso só viesse a acontecer depois que ela

usufruiu das vantagens dos dólares e da experiência gerencial estrangeira”.

(MATTOS, 2010, p. 101).

Paternostro (2006) destaca que a estruturas para as redes nacionais de

televisão surge nesta época, quando se constituiu a Embratel (Empresa Brasileira de

Telecomunicações), que adere ao consórcio internacional para utilizar satélites de

telecomunicações, principalmente o Intelsat, que marcou o início da implantação de

um sistema global de satélites de comunicação.

O primeiro programa da TV Globo lançado em rede nacional foi o Jornal

Nacional, que entrou no ar no dia 1º de setembro de 1969. O telejornal era feito no

Rio e retransmitido ao vivo, via Embratel, para todo o Brasil, através das emissoras

da rede. (PATERNOSTRO, 2006).

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Como o momento era favorável para a TV Globo, outras emissoras

começavam a enfrentar situações difíceis, principalmente a TV Record e a TV

Bandeirantes, emissora idealizada pelo empresário João Jorge Saad, que havia

iniciado suas transmissões no dia 13 de maio de 1967. Ambas emissoras foram

consumidas por constantes incêndios e tiveram suas produções prejudicadas. A

Record então seguiu para uma programação com filmes americanos. Já a

Bandeirantes investiu em programação musical, o que não se reverteu em audiência.

(PATERNOSTRO, 2006).

Um dos grandes avanços tecnológicos da história da televisão brasileira se

deu em março de 1972: a era da televisão a cores. A primeira transmissão com cores

foi realizada pela TV Difusora de Porto Alegre. A Festa da Uva, em Caxias do Sul, no

Rio Grande do Sul, foi palco dessa inovação. O então presidente Emílio Garrastazu

Médici realizou a inauguração do evento. E, em janeiro do ano seguinte, vai ao ar pela

TV Globo a primeira novela a cores: O Bem Amado, obra de Dias Gomes.

A fase seguinte do desenvolvimento televisivo é a chamada “Fase do

Desenvolvimento Tecnológico” que, segundo Mattos (2010), compreende os anos de

1975 a 1985. Nesta fase, “[...] as redes de TV se aperfeiçoaram e começaram a

produzir, com maior intensidade e profissionalismo, os seus próprios programas com

estímulo de órgãos oficiais, visando, inclusive, a exportação”. (MATTOS, 2010, p. 85).

De acordo com Mattos (2010), em 1976, a TV Globo já produzia grande parte

de seus programas, o equivalente a 75%. A emissora começou a abrir caminho junto

ao mercado internacional e, em 1979, já exportava seus programas para mais de

noventa países.

Já no final dos anos 70, o empresário e apresentador Sílvio Santos ganha a

concessão de uma emissora de TV no Rio de Janeiro. Em 1976, Sílvio sai da TV Globo

e começa a produzir seu programa aos domingos na TV Tupi de São Paulo e,

posteriormente, retransmitindo pela sua emissora, a TVS do Rio de janeiro.

(PATERNOSTRO, 2006).

Em 1979, a Rede Globo de Televisão anuncia publicamente que a maioria de

seus programas atingia os mais altos índices de audiência em todo o Brasil,

principalmente os de horário nobre. (MATTOS, 2010).

Paternostro (2006) destaca que em julho de 1980, chegava ao fim a história

da televisão pioneira no país: A Rede Tupi de Televisão é cassada pelo governo

devido aos crescentes problemas financeiros. O que restou das emissoras da Tupi foi

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dividida pelos grupos empresarias de Silvio Santos e Adolfo Bloch. Sob o comando

de Silvio Santos, surgia em 1981, o SBT (Sistema Brasileiro de Televisão) que, com

uma programação popular, a emissora atingiu rapidamente altos índices de audiência.

No final dos anos 80, o SBT se consolida como vice-líder de audiência em

todo o Brasil, com sua programação essencialmente popular. Uma das inovações do

SBT, que marcou não somente a emissora, como também o telejornalismo brasileiro,

foi a criação do Telejornal Brasil, o chamado TJ Brasil, um projeto audacioso de Silvio

Santos, que tinha o intuito de mudar a imagem da emissora. O programa era o

contraposto do Jornal Nacional, da Rede Globo, pois o apresentador, o jornalista Bóris

Casoy comenta e opina sobre algumas reportagens. (PATERNOSTRO, 2006).

A outra parte da falida TV Tupi ficou com o Grupo Bloch, que inaugurou, em

1983, a Rede Manchete de Televisão, que também alcançou altos índices de

audiência, principalmente com suas telenovelas. A emissora deu espaço as

produções independes e conquistou o público. Um dos maiores sucessos foi a novela

Pantanal (1990). (PATERNOSTRO, 2006).

A quarta fase do desenvolvimento da televisão, segundo Mattos (2010), é a

chamada “Fase da Transição e da Expansão internacional”, que compreende os anos

de 1985 até 1990. Esta foi uma fase que ocorreu durante a Nova República, quando

se intensificou as exportações de programas.

Outro fator que caracteriza esta fase foi a transição do regime militar para o

regime civil. De acordo com Mattos (2010), as principais mudanças no setor das

comunicações decorreram a partir da promulgação da nova Constituição, em 5 de

outubro de 1988, na qual apresenta um texto específico sobre o tema, e também fixa

normas para a programação das emissoras de rádio e televisão.

Segundo Mattos (2010, p. 127), “Nesta fase [...], o que se observa é a maior

competitividade em as grandes redes, um contínuo avanço em direção ao mercado

internacional, com a Rede Globo implementando, desde 1985, sua expansão

sistemática no exterior”.

A “Fase da Globalização e da TV Paga”, que compreende os anos de 1990

até 2000, acontece num contexto onde, segundo Mattos (2010), o Brasil buscava a

modernidade e, com a redemocratização, a televisão se adaptava conforme os novos

tempos. “[...] Na década de 1990 começou-se a estabelecer as bases para o

surgimento estruturado da televisão por assinatura, via cabo ou via satélite,

estruturada nos moldes americanos, e a se debater a televisão de alta definição”.

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(MATTOS, 2010, p. 131). Também nessa década a interatividade do telespectador

com os programas de TV começa a tomar forma. Mattos (2010) cita como exemplo

dessa inovação o programa Você Decide, da Rede Globo, vendido para onze países.

A TV por assinatura surge nesta década. Com isso, segundo Paternostro

(2006, p. 35 e 36), “[...] o público tem a oferta de canais variados, nacionais e

estrangeiros, programação segmentada e globalizada [...]”, porém, o valor da TV por

assinatura não atrai muitos clientes no início de sua implantação. Sobre esse fator,

Mattos (2010) destaca que, em 1998, seis operadoras de TV por assinatura já estavam

em funcionamento no Brasil, porém, o autor sintetiza que em alguns países,

principalmente nos Estados Unidos, o sistema de televisão por assinatura tem mais

adeptos do que a televisão aberta. Em 1999, o número de assinantes no Brasil girava

em torno dos 2,9 milhões.

Em relação aos dados sobre o número de aparelhos televisores no Brasil

nesta época de desenvolvimento da TV, Mattos (2010) destaca que o pico foi atingido

em 1996, quando havia cerca de 8,5 milhões de aparelhos no país, devido ao

aquecimento do consumo. No ano seguinte, o número caiu para 6,5 milhões. Nova

queda foi percebida em 1998, quando eram comercializados aproximadamente seis

milhões de aparelhos televisores. Já o ano de 1999 foi marcado por uma queda de

25% nas vendas, o que correspondeu a 4,5 milhões de aparelhos. Essa queda se deu

ao alto índice de inadimplência dos consumidores.

Ao final desta década, devido a problemas financeiros, a Rede Manchete é

vendida em 1999 para o empresário Amílcare Dallevo Júnior. Meses depois, a

emissora passa a se chamar Rede TV!

2.3 A ERA DA TELEVISÃO NO SÉCULO XXI

Após avanços importantes no desenvolvimento da televisão no Brasil, ela

chega ao século XXI trazendo grandes inovações tecnológicas. Segundo Mattos

(2010), o período que compreende os anos de 2000 até 2010 evidencia a “Fase da

Convergência e da Qualidade Digital”. Além disso, é a fase de crescimento do uso da

internet. “A indústria especializada na produção de televisores começou o século

anunciando a criação da Web TV, dotando-o de razoável inteligência”. (MATTOS,

2010, p. 159).

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Nesta fase, começa a se tornar realidade a convergência entre internet e

televisão. O aparelho televisor em si torna-se cada vez mais portável e a ter um

formato diferente. A televisão inicia o processo de segmentação e a programação

voltada para diferentes grupos da sociedade. (MATTOS, 2010).

Ainda conforme Mattos (2010), em 1999 o Brasil dava início ao processo de

modernização da infraestrutura televisiva, no governo do então presidente Fernando

Henrique Cardoso. Neste ano, foram iniciados com maior profundidade os estudos e

testes para a mudança do sistema analógico para o digital. Estimava-se, à época, que

o processo de migração levaria de dez a quinze anos e movimentaria valores na faixa

de R$ 80 a 100 bilhões. Tais valores comportavam os investimentos das emissoras

para adequarem sua infraestrutura para a reformulação dos sistemas de transmissão

e a renovação dos televisores nos lares brasileiros.

Em 26 de novembro de 2003, o então Presidente da República Luiz Inácio

Lula da Silva assinou o decreto que definiu e estabeleceu as bases do Sistema

Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD). Três anos depois, em 9 de junho de 2006, foi

definido que o padrão de televisão japonês seria o adotado no Brasil. Um novo decreto

estabeleceu as diretrizes do processo de transição da TV analógica para digital.

Apenas um ano depois, o padrão de TV digital foi implantado inicialmente em São

Paulo. (MATTOS, 2010).

Sobre a televisão no século XXI, Paternostro (2006) desta que:

A televisão brasileira entra no século XXI na expectativa de uma grande mudança tecnológica que faz rever conceitos, paradigmas, parâmetros. A tecnologia digital reverte padrões e aprimora as transmissões. A TV brasileira, que em conteúdo chega se destacar em todo o mundo, vive lentamente o caminho da qualidade digital de sons e imagens. (PATERNOSTRO, 2006, p. 36).

Ainda de acordo com Mattos (2010), a implantação da TV digital teve como

consequência o movimento de reestruturação do mercado. As relações entre

radiodifusores, operadoras de telecomunicações e consumidores se modificaram,

influenciando até mesmo o modelo de negócios. E, como os setores de radiodifusão

e telecomunicações são regidos por legislações, o avanço da convergência entre TV,

internet e telefonia começa a determinar ajustes em setores como da legislação.

A última fase do desenvolvimento da televisão, classificada por Mattos (2010)

é a “Fase da Portabilidade, Mobilidade e Interatividade”, que inicia em 2010 e segue

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até os dias atuais. A convergência entre as mídias, nesta fase, torna-se cada vez mais

intensa, devido aos grandes avanços tecnológicos e, principalmente ao

desenvolvimento da internet e da digitalização de conteúdos de áudio, vídeo e texto.

Mattos (2010) ainda destaca que esse período é marcado, principalmente,

pela convergência entre celular e televisão, afirmando que “A convergência da TV

digital com o mundo do celular passa pela evolução deste último”. (MATTOS, 2010, p.

175).

Conforme o autor, a escolha definitiva sobre o padrão digital implantado no

Brasil passou por diversas disputas entre empresas de radiodifusão e de

telecomunicações. Sobre esta disputa, o modelo europeu era defendido pelas

operadoras, tendo em vista os lucros com tarifação, publicidade e serviços. Já a

tecnologia japonesa, que permite a segmentação de transmissões, era a defendida

pelos radiodifusores. (MATTOS, 2010).

Mattos (2010) salienta que os interesses econômicos são os principais fatores

que levam em conta a disputa pela ocupação de espaço no mercado, que se estrutura

com a tecnologia digital e traz uma perspectiva de altos lucros que as empresas

podem ter a partir de investimentos feitos no setor.

Uma nova portaria que estabeleceu novo cronograma para o desligamento da

TV analógica no Brasil foi publicada no dia 25 de janeiro de 2016, conforme informou

a Anatel4 (Agência Nacional de Telecomunicações) em sua página web.

A primeira cidade no Brasil a ter o sinal de TV analógico desligado e contar

somente com o sinal de TV digital foi Rio Verde (GO). Inicialmente, a data de

desligamento do sistema analógico estava prevista para 29 de fevereiro de 2014, mas

o desligamento não ocorreu porque não foi atingida a condição necessária: a

conversão de 93% dos domicílios analógicos para digitais. A data foi remarcada para

15 de fevereiro de 2017 e o desligamento completo do sistema analógico ocorreu

apenas em 1º de março de 2017, com 85% das residências habilitadas à nova

tecnologia5.

4 Informações publicadas pela página web da Anatel, disponível no link <http://www.anatel.gov.br/institucional/ultimas-noticiass/929-ministerio-das-comunicacoes-publica-portaria-sobre-tv-digital>. Acesso em: 14 ago. 2017. 5 Informação divulgada em reportagem on-line do portal G1, disponível no link <http://g1.globo.com/goias/noticia/2016/03/rio-verde-e-primeira-cidade-do-pais-ter-somente-o-sinal-de-tv-digital.html>. Acesso em: 14 ago. 2017.

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Em São Paulo e em mais de 38 cidades da região metropolitana do Estado

paulista, o sinal analógico de televisão foi desligado às 23h59 do dia 29 de março de

20176.

Nesta fase, surgiu um dos maiores embates entre a TV aberta e a TV por

assinatura. A empresa Simba Content, joint venture que reúne as emissoras de TV

aberta SBT, Record TV e RedeTV! não autorizou a exibição do sinal digital dos três

canais nos pacotes das operadoras de TV por assinatura Net, ClaroTV, Oi TV e Sky.

A empresa reivindicava o pagamento pelo fornecimento do conteúdo de seus canais7,

assim como acontece com alguns canais internacionais e outros nacionais, como a

Globosat.

A Vivo foi a única operadora que aceitou negociar com a Simba Content. As

empresas fecharam acordo em definitivo no dia 1º de agosto de 2017 para a

transmissão dos três canais na operadora8. Logo após, a Sky também cedeu às

reclamações dos consumidores e voltou a transmitir os canais.

O embate entre as três emissoras e as operadoras de TV por assinatura se

resolveu apenas em setembro. No dia 08, a Telecon Américas, dona da NET e da

Claro TV, assinou um novo contrato com a Simba Content.

Com o novo acerto, as operadoras aceitaram pagar às emissoras um valor

específico por assinante. Apesar de o valor exato não ter sido revelado, anteriormente,

a Simba Content havia pedido R$ 15 por assinante. Apenas a Oi TV, entre as grandes

operadoras a atuarem no Brasil, ainda não realizou um novo contrato para

disponibilizar SBT, Record e Rede TV! para os seus assinantes9.

O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC)

publicou no Diário Oficial da União, do dia 29 de maio de 2017, o novo calendário de

6 Informação divulgada em reportagem on-line do portal G1, disponível no link <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/sinal-analogico-de-tv-e-desligado-em-sp-e-em-38-cidades-da-regiao-metropolitana.ghtml>. Acesso em: 14 ago. 2017. 7 Informação divulgada pelo site Meio&Mensagem, disponível no link <http://www.meioemensagem.com.br/home/midia/2017/03/30/sem-acordo-simba-tira-record-sbt-e-redetv-das-operadoras.html>. Acesso em 14 ago. 2017. 8 Informação divulgada pelo site R7.com, disponível no link < http://noticias.r7.com/economia/simba-e-vivo-selam-acordo-para-transmitir-sinal-digital-da-record-tv-sbt-e-redetv-07082017>. Acesso em 14 ago. 2017. 9 Informação divulgada pelo site Tecmundo, disponível no link https://www.tecmundo.com.br/mercado/121939-sbt-record-rede-tv-voltam-grade-net-claro-tv.htm. Acesso em 03 out. 2017.

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desligamento do sinal analógico de televisão no país até 201810. A Portaria 2.992/17

atende a um acordo dos radiodifusores, que solicitaram mais tempo no processo. A

Seja Digital11 também se manifestou a favor do adiamento, já que a distribuição de

conversores com o cronograma antigo superava o limite da capacidade.

De acordo com o novo cronograma, em 2017, a implantação do sistema de

televisão digital e consequente desligamento do sistema analógico abrange os

estados de Goiás, Pernambuco, Bahia, Ceará, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas

Gerais, e alguns municípios do interior de São Paulo.

No Rio Grande do Sul, o primeiro desligamento ocorrerá no dia 31 de janeiro

de 2018, em 89 municípios. Essa etapa inclui Porto Alegre, toda a Região

Metropolitana, uma parte do Litoral, uma parte da Serra, incluindo Caxias do Sul, e

uma parte do Vale do Taquari.

A segunda etapa do desligamento do sistema analógico acontecerá no dia 28

de novembro de 2018, para 11 municípios da região de Rio Grande e Pelotas, no Sul

do estado.

Na terceira etapa, no dia 5 de dezembro de 2018, o sinal analógico vai ser

desligado em mais oito municípios, dessa vez na região de Santa Maria12.

Além do Rio Grande do Sul, o desligamento do sinal analógico e a expansão

do sistema digital em 2018 também acontecerá nos estados de Santa Catarina,

Paraná, Maranhão, Rio Grande do Norte, Pará, Paraíba, Alagoas, Sergipe, Piauí,

Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e mais algumas cidades do estado São Paulo.

Segundo estimativa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e

Comunicação, até 2018, 1,3 mil municípios já estarão com o sinal analógico desligado

10 Informação divulgada pelo site da ABERT (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), disponível no link < http://www.abert.org.br/web/index.php/notmenu/item/25672-goias-tem-nova-data-para-desligamento-da-tv-analogica>. Acesso em 20 ago. 2017. 11 A Seja Digital (EAD - Entidade Administradora da Digitalização de Canais TV e RTV) é uma instituição não-governamental e sem fins lucrativos, responsável por operacionalizar a migração do sinal analógico para o sinal digital da televisão no Brasil. Criada por determinação da Anatel, tem como missão garantir que a população tenha acesso à TV Digital, oferecendo suporte didático, desenvolvendo campanhas de comunicação e mobilização social e distribuindo kits para TV digital para as famílias cadastradas em programas sociais do Governo Federal. Também tem como objetivos aferir a adoção do sinal de TV digital, remanejar os canais nas frequências e garantir a convivência sem interferência dos sinais da TV e 4G após o desligamento do sinal analógico. Esse processo teve início em abril de 2015 e, de acordo com cronograma definido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, mais de 1300 municípios terão o sinal analógico desligado até 2018. Disponível no link <http://www.sejadigital.com.br/sobre>. Acesso em 20 ago. 2017. 12 Informação divulgada em reportagem on-line do site da Rede Globo, disponível no link < http://redeglobo.globo.com/rs/rbstvrs/tvdigitalrbs/noticia/tv-analogica-comeca-a-receber-aviso-de-mudanca-de-sinal-saiba-mais.ghtml>. Acesso em: 20 ago. 2017.

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A expectativa é de que, em 2023, a TV digital esteja disponível em todos os

domicílios do Brasil. Ao todo, cerca de R$ 3,6 bilhões serão disponibilizados para a

total habilitação – quantia custeada quase que integralmente por empresas de

telecomunicações13.

13 Informação divulgada em reportagem on-line do portal G1, disponível no link <http://g1.globo.com/goias/noticia/2016/03/rio-verde-e-primeira-cidade-do-pais-ter-somente-o-sinal-de-tv-digital.html>. Acesso em: 14 ago. 2017.

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3 GÊNEROS E FORMATOS DE PROGRAMAS TELEVISIVOS

Além do caráter histórico acerca da televisão, desde sua criação até os dias

atuas, já abordados na presente pesquisa, também torna-se necessário formar uma

base de conhecimento sobre as categorias, gêneros e formatos de programas

televisivos, para poder direcionar o objeto de pesquisa, neste caso, o programa

Conexão Repórter, do SBT.

3.1 CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS

O autor José Carlos Aronchi de Souza, em seu livro Gêneros e formatos na

televisão brasileira (2004), aborda que, ao separar os programas de televisão em

categorias, cria-se a necessidade de classificar os gêneros pelo qual correspondem.

Por esse motivo, uma categoria pode apresentar um número diversificado de gêneros.

Segundo Souza (2004, p. 37), “A divisão dos programas em categorias inicia o

processo de identificação do produto, seguindo o conceito industrial assumido pelo

mercado de produção”.

Souza (2004) afirma que, em síntese, todo programa de TV deve trazer

características importantes. Seja qual for sua categoria, ele deve sempre entreter,

podendo também informar e, ao mesmo tempo que pode ser informativo, também

pode ser de entretenimento.

Diante disso, Souza (2004) explica que os programas televisivos são

classificados em cinco categorias – entretenimento, informação, educação,

publicidade e outros. O autor apresenta ainda os gêneros e a identificação de seus

formatos:

a) Entretenimento: programas de auditório, colunismo social, culinário,

desenho, docudrama, esportivo, filme, game show (competição),

humorístico, infantil, interativo, musical, novela, quiz show (perguntas e

respostas), reality show (TV realidade), revista, série, série brasileira

(minisséries), sitcom (comédia de situações), talk show (programa de

entrevistas com plateia), teledramaturgia (ficção), variedades, western

(faroeste);

b) Informação: debate, documentário, entrevista, telejornal;

c) Educação: educativo, instrutivo;

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d) Publicidade: chamada de patrocínio, filme comercial, político, sorteio,

telecompra;

e) Outros: especial, eventos, religioso.

Diante da apresentação destas categorias, Souza (2004) explica que dentro

da referida categoria está o gênero. O autor evidencia a definição de “gênero”

conceituada no dicionário Aurélio, que diz que os programas formam um “conjunto de

espécies que apresentam certo número de caracteres comuns”. (SOUZA, 2004, p.

41).

Arlindo Machado, em seu livro A televisão levada a sério (2000) evidencia o

conceito etimológico da palavra gênero, dizendo que “[...] deriva do latim

genus/generis (família, espécie) e não se vincula etimologicamente, malgrado a

aparente homofonia, com as palavras gene e genética (do grego génesis: geração,

criação).

Das categorias apresentadas por Souza (2004), três delas abrangem o maior

número de gêneros: entretenimento, informativo e educativo.

Souza (2004) observa que os estudos dos gêneros televisivos estão

relacionados com aspectos históricos e culturais, podendo ou não ser influenciados

pelas considerações do observador.

Somos capazes de reconhecer este ou aquele gênero, falar de suas especificidades, mesmo ignorando as regras de sua produção, escritura e funcionamento. A familiaridade se torna possível porque os gêneros acionam mecanismos de recomposição da memória e do imaginário coletivos de diferentes grupos sociais. (SOUZA, 2004, p. 44).

Machado (2000) explica que, de certo modo, é o gênero que orienta o uso da

linguagem na esfera de um determinado meio. Segundo o autor “Os gêneros existem

numa diversidade tão grande que muitas vezes se torna complicado estudá-los

enquanto categorias”. (MACHADO, 2000, p. 68). O autor evidencia o fato de que não

há como colocar em igualdade programas tão distintos entre si, como seriados de

ficção, transmissão de uma partida de futebol, o pronunciamento do presidente, um

videoclipe, um debate, vinheta ou documentário. Conforme Machado (2000, p. 71),

“Os gêneros são categorias fundamentalmente mutáveis e heterogêneas”. Diante

desta afirmação, o autor explica que cada enunciado pode evidenciar muitos gêneros

ao mesmo tempo.

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Na mesma linha de raciocínio, o autor francês François Jost, em seu artigo

Para além da imagem, o gênero televisual: proposições metodológicas para uma

análise das emissões de televisão (2007) afirma não ser possível estabelecer uma

única classificação aos gêneros. Segundo ele, “[...] os gêneros são antes categorias,

variando consideravelmente em função do uso que deles fazemos”. (JOST, 2007, pgs.

101 e 102).

Dentro do gênero, há o formato. De acordo com Souza (2004), o termo

formato é um conceito com poucas referências científicas. Para ele, no campo da

biologia, no que se refere ao estudo de gênero, existem muitas semelhanças entre

gêneros e formatos na televisão. “Assim como na biologia existem gêneros e

espécies, em televisão coexistem os gêneros e os formatos”. (SOUZA, 2004, p. 45).

O autor complementa dizendo que, em televisão, um gênero de programa é

constituído por muitos formatos, e os gêneros, a partir do momento que se agrupam

entre si, formam uma categoria, como o autor exemplifica na figura a seguir:

Figura 1: Categorias, gêneros e formatos

Fonte: Souza (2004, p. 47).

Diante destas características e subdivisões, Souza (2004, p. 46) conclui que

“[...] o termo formato é a nomenclatura própria do meio [...] para identificar a forma e

o tipo da produção de um gênero de programa de televisão. Formato está sempre

associado a um gênero, assim como gênero está diretamente ligado a uma categoria”.

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3.2 CATEGORIA INFORMAÇÃO

De acordo com a autora Olga Curado, em seu livro A Notícia na TV, o dia-a-

dia de quem faz telejornalismo (2002, p. 16) “Fundamentalmente, a notícia é a

informação a serviço do público”.

Ainda segundo Curado (2002, p. 21), “A informação primária é a matéria-prima

do jornalismo [...]”.

Sobre as categorias na televisão, Souza (2004) explica que “A separação dos

programas de televisão em categorias atende à necessidade de classificar os gêneros

correspondentes. Por isso, a categoria abrange vários gêneros [...]”.

Ainda de acordo com Souza (2004), o processo de identificação do produto

inicia a partir da divisão dos programas em categorias. Isso segue o conceito industrial

assumido pelo mercado de produção.

Dentro da categoria informação, destacamos os gêneros documentário,

entrevista e telejornal, na qual serão abordados a seguir.

3.2.1 Gênero documentário

Souza (2004) destaca que os documentários demonstram a qualidade dos

programas do departamento de telejornalismo de uma emissora. Por esse motivo,

carregam consigo o prestígio dentro das emissoras. Segundo o autor, “Os temas

abordados pelos documentários apresentam certa importância histórica, social,

política, científica ou econômica e também aprofundam assuntos do cotidiano, vistos

de uma perspectiva crítica”. (SOUZA, 2004, p. 145).

Além disso, o autor destaca que nem todas as emissoras produzem

documentários, devido ao alto de custo de produção, pois o gênero necessita de certo

aprofundamento do tema abordado, processo que envolve entrevistas e produção de

imagens em diversos locais.

Sobre o formato, Souza (2004, p.146) explana que “A proposta de todo

documentário é buscar o máximo de informações sobre um tema. Por isso, sua

duração é maior do que as reportagens apresentadas pelos telejornais”. O autor

destaca que, no Brasil, inicialmente, os programas do gênero, como o Globo Repórter

(Globo) e o SBT Repórter (extinto programa do SBT) tinham em média apenas trinta

minutos de duração. Porém, os programas também sofreram significativa redução da

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duração, o que faz com que o programa mereça o título de apenas grande reportagem.

A principal alegação das emissoras era de que o programa se torna cansativo para a

audiência que não está habituada a assistir o mesmo assunto por muito tempo. A

única emissora que sempre destacou o documentário em sua programação é a TV

Cultura, que é fiel ao conceito do gênero e busca sempre mostrar todos os ângulos

do tema abordado (SOUZA, 2004).

Ainda segundo Souza (2004, p. 147), “O documentário pode apresentar

muitos formatos dentro do próprio gênero, como videoclipes, entrevistas, debates,

narração em off, com o objetivo de não torná-lo cansativo e apresentar de forma

variada as informações colhidas de várias fontes”.

3.2.2 Gênero entrevista

O gênero entrevista, segundo Souza (2004), está diretamente ligado aos

programas jornalísticos da emissora. Pessoas das mais variadas áreas ficam frente a

frente com o apresentador. O autor cita como exemplo os extintos programas Cara a

Cara e De frente com Gabi, apresentado pela jornalista Marília Gabriela durante

muitos anos na Bandeirantes e no SBT. Tal exemplo evidencia a diferença do gênero

entrevista com o talk show. “No gênero entrevista, o entrevistado é o foco e não há

show comandado pelo jornalista apresentador”. (SOUZA, 2004, p. 147).

Ainda de acordo com Souza (2004), o apresentador de entrevista pode

questionar o entrevistado sobre fatos e questões polêmicas, podendo até, por vezes,

chegar a discórdia entre apresentador e entrevistado. Tal característica evidencia a

seriedade e comprometimento do programa com a verdade dos fatos, atribuição dos

programas jornalísticos, como por exemplo o programa objeto de estudo da referente

pesquisa: Conexão Repórter, do SBT.

Dentre os formatos de programas do gênero entrevista concentram-se na

escolha do local de realização, podendo ser em estúdio ou local externo, e na forma

de transmissão, podendo ser ao vivo ou gravado.

Souza (2004) sintetiza ainda que, para não haver contradições com o talk

show, diferenças relativas ao cenário e ao posicionamento do apresentador podem

ajudar a distinguir o gênero de entrevista do talk show. O talk show tem como

característica a possibilidade do apresentador se movimentar pelo estúdio em busca

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das atrações do programa. Nos cenários do gênero entrevista, o apresentador e o

entrevistado ficam sentados durante todo o tempo.

Além disso, os programas podem ser ilustrados por reportagens pela qual irão

auxiliar na abordagem do assunto em questão.

3.2.3 Gênero telejornal

Segundo Souza (2004), o gênero telejornal é classificado como um programa

que apresenta características próprias, na qual são claramente evidenciadas, com o

apresentador em estúdio chamando reportagens sobre os fatos mais recentes.

Conforme o autor, cada vez mais o telejornalismo ocupa espaço e visibilidade

nas emissoras de televisão.

Sobre o formato do gênero telejornal, Souza (2004) explana que o primeiro

formato existente foi o noticiário, onde o apresentador lê os textos de frente para a

câmera. Este formato mantém, até hoje, esta fórmula básica de produção e

apresentação.

De acordo com Souza (2004):

O telejornalismo buscou outros formatos, além do telejornal. Por isso mantém-se em evidência em todas as grades de programação. São programas de debate e entrevista, mediados pelos jornalistas da rede, e também os documentários e reportagens especiais que ocupam os departamentos de jornalismo das emissoras. Todos esses formatos tornam o gênero importante numa estratégia para modificar a imagem da emissora [...]”. (SOUZA, 2004, p. 152).

Segundo a autora Fabiana Piccinini, em seu artigo O processo editorial na TV:

as notícias que os telejornais contam (2006), “[...] como produto audiovisual, o

telejornal oferece sedutor recurso da imagem ancorada num texto em áudio. Essa

estrutura bidimensional reforça a proposição de emissão “objetiva” e “imparcial” do

jornalismo”. (PICCINI, 2006, p. 139). Ainda de acordo com a autora, a notícia na

televisão adquire um grau elevado de credibilidade.

Souza (2004) conclui que dentro do gênero telejornalismo, há outros formatos

que se firmam como gêneros pela importância. Devido ao status que alcançam com a

audiência, programas de debate, entrevista e documentários são alguns dos formatos

que pertencem ao telejornalismo.

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3.3 HIBRIDISMO

O chamado hibridismo se caracteriza como a mistura de gêneros televisuais.

De acordo com Machado (2000, p. 67), “[..] quanto mais avançamos na direção do

futuro, mais o hibridismo se mostra como a própria condição estrutural dos produtos

culturais”.

A autora Elizabeth Bastos Duarte, em seu artigo Reflexões sobre gêneros e

formatos televisivos (2006), conceitua a hibridação no processo televisivo:

Os processos comunicativos televisivos se materializam em textos – os produtos televisuais, cuja característica principal é a complexidade e a hibridação: não só no conteúdo expressa-se simultaneamente através da articulação de diferentes linguagens sonoras e visuais, como a gramática das formas televisuais está em processo de permanente apropriação em relação a outras mídias. (DUARTE, 2006, p. 20, grifo do autor).

Ainda conforme a autora, um gênero é uma estratégia de comunicabilidade e,

por este motivo, também é uma categoria discursiva e cultural, na qual aparece como

forma de subgênero e formato. (DUARTE, 2006).

Sobre as funções de gênero e subgênero na televisão, Duarte (2006) afirma

que o debate se intensifica a partir do momento que os produtos televisuais se tornam

mais híbridos e complexos.

Ao hibridismo, pode-se também relacionar o avanço da tecnologia e a

convergência digital, como já citado nas fases de desenvolvimento da televisão. A

autora Miriam de Souza Rossini, em seu artigo Convergência tecnológica e os novos

formatos híbridos de produtos audiovisuais (2007), afirma que a criação de uma

linguagem própria para a TV foi favorecida através do desenvolvimento do videoteipe,

que propiciou maiores experimentos com movimentos de câmeras, enquadramento e

edição de imagens.

Rossini (2007) salienta que foi através da convergência tecnológica que o

cinema e a TV aproximaram suas bases produtivas. A mesma infraestrutura utilizada

para produzir produtos audiovisuais para a televisão também é utilizada para o

cinema. Através disso, os elementos artístico-estéticos também são compartilhados

entre a TV e o cinema. É a chamada hibridização entre esses meios, que passam a

compartilhar tecnologias e gestão de produção, porém possuindo formas diferentes

de recepção.

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Conforme a autora, “Desse hibridismo tecnológico ocasionado pela

convergência tecnológica estão surgindo os produtos híbridos [...]. No fundo, a

aproximação entre eles sempre esteve no horizonte”. (ROSSINI, 2007, p. 180).

Sob a mesma ótica de Rossini (2007), o autor Néstor García Canclini, em sua

obra Culturas Hibridas (2000) evidencia que todas as artes se relacionam entre si,

ganhando assim novos conhecimentos, adquiridos por meios dos diversos campos

pelos quais percorreram.

As hibridações descritas ao longo deste livro nos levam a concluir que hoje todas as culturas são de fronteira. Todas as artes se desenvolvem em relação com outras artes: o artesanato migra do campo para a cidade; os filmes, os vídeos e canções que narram acontecimentos de um povo são intercambiados com outros. Assim as culturas perdem a relação exclusiva com seu território, mas ganham em comunicação e conhecimento. (GARCÍA CANCLINI, 2000, p. 348).

Para a autora Nísia Martins do Rosário, em seu artigo Formatos e gêneros em

corpos eletrônicos (2007), a televisão, diferente do cinema, apresenta produtos

diferenciados e as classes de programas partem de estruturas que se hibridizam e se

multiplicam, atingindo maiores efeitos do que o cinema.

Ainda conforme a autora, os gêneros no domínio televisivo assumem uma

conformação dinâmica e seu estudo busca “[...] entender a constituição dos sentidos

na sua relação com as mutações, as hibridizações e as tendências dos produtos dessa

mídia, bem como as modificações e entrelaçamentos dos seus discursos”.

(ROSÁRIO, 2007, p. 185).

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4 O JORNALISMO

A presente pesquisa se objetiva em analisar quais elementos do jornalismo

investigativo e como são evidenciados nos episódios do programa Conexão Repórter,

do SBT. Para tanto, é preciso sintetizar os conceitos dos termos Jornalismo e

Jornalismo Investigativo, para de fato entender suas características. Assim, poderá se

construir uma análise mais aprofundada, tendo como base a pesquisa bibliográfica

acerca do tema pesquisado.

4.1 O CONCEITO DE JORNALISMO

De acordo com o autor Michael Kunczik, em seu livro Conceitos de Jornalismo

(1999), o jornalismo é considerado como uma profissão da área da comunicação. O

autor, porém, alerta que o termo comunicador é constantemente utilizado na definição

de toda a organização dos meios de comunicação. “Quem quer que passe informação,

opinião ou entretenimento aos receptores ou participe de alguma maneira em tal

processo está compreendido nessa categoria, [...]”. (KUNCZIK, 1997, p.15). O autor

recomenda ainda que se separe o aspecto de produção da distribuição de conteúdo

e definir como comunicador apenas quem de fato produz conteúdo para os meios de

comunicação.

Segundo Koszyk e Pruys (1976, apud KUNCZIK, 1997):

Em geral, o jornalismo tem uma definição mais estreita do que a de comunicador, ainda que na literatura existam grandes divergências. Por isso o jornalismo é considerado a profissão principal ou suplementar das pessoas que reúnem, detectam, avaliam e difundem as notícias; ou que comentam os fatos do momento. (KOSZYK; PRUYS, 1976, apud KUNCZIK, 1997, p. 16).

De acordo com o autor João Elias da Cruz Neto, em seu livro Reportagem de

Televisão (2009), ”Em outras palavras, podemos dizer que o jornalismo pretende

descrever a realidade atual e, através dos meios de comunicação, causar impacto

sobre várias pessoas”. (CRUZ NETO, 2009, p. 11).

Cruz Neto (2009), ainda explica que os principais meios de comunicação da

atualidade são o rádio, jornais impressos, televisão e internet, tendo como objetivo a

divulgação de notícias, porém, cada meio possui características próprias, o que

diferenciam um do outro.

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O autor Juarez Bahia, em seu livro Jornalismo, informação, comunicação

(1971) conceitua a palavra jornalismo:

A palavra jornalismo é geralmente interpretada como sendo o registro e a apreciação dos acontecimentos de interesse geral. Jornalismo quer dizer a transmissão de informações, fatos ou notícias, com exatidão, clareza e rapidez, conjugando atualidade, pensamento e ação. É o meio pelo qual as notícias e comentários chegam ao público. É uma arte, uma técnica e uma ciência. (BAHIA, 1971, p. 37).

Para Bahia (1971), o jornalismo é considerado uma arte, pois apresenta os

elementos básicos da criação nos planos da realização intelectual e de trabalhos

plásticos e gráficos. Além de arte, o jornalismo também é visto como técnica, porque

concilia faculdades científicas e artísticas, garantindo assim rendimento prático no

processo de comunicação.

O autor ainda destaca que o jornalismo, além de arte e técnica, também é

classificado como ciência, pois tem como indiscutível a necessidade de

conhecimentos especiais, de métodos e princípios, que somente são adquiridos

através do processo de estudo e pesquisa.

Ainda segundo o autor Juarez Bahia, a definição de jornalismo varia de acordo

com o ponto de vista de cada pessoa. Para Bahia (1971), alguns o entendem como

comércio, tendo apenas o lucro como finalidade. Porém, ele destaca que para a

maioria das pessoas, o jornalismo é algo mais sério, que está ligado às concepções

de justiça, desenvolvimento e liberdade do homem.

Bahia (1971) destaca que:

Não há dúvida de que o jornalismo tem de ser compreendido no contexto da cultura de massa. E esta, na idade tecnológica, já não tem fronteiras. Os padrões, estilos de vida, hábitos e organização política, diferentes no capitalismo e no socialismo, ditam o exercício da informação, sua natureza e sua estrutura. E, em cada campo, o jornalismo torna-se, cada vez mais, um reflexo da sociedade. (BAHIA, 1971, p. 39).

Bahia (1971) sinaliza ainda que o jornalismo possui certas leis, nas quais

também são aplicadas a todos os seus meios. São elas o fato, a novidade, a surpresa

e a atualidade. De acordo com Bahia (1971, p. 40) “Não é possível o exercício da

informação sem liberdade, do mesmo modo como não é possível democracia sem

livre manifestação do pensamento”.

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De acordo com o autor Nelson Traquina, em seu livro Teorias do Jornalismo:

porque as notícias são como são (2005), conceituar o jornalismo em apenas uma frase

ou um livro é uma tarefa quase que impossível.

Poder-se-ia dizer que o jornalismo é um conjunto de ‘estórias’, ‘estórias’ da vida, ‘estórias’ das estrelas, ‘estórias’ de triunfo e tragédia. Será apenas coincidência que os membros da comunidade jornalística se refiram às notícias, a sua principal preocupação, como ‘estórias’? Os jornalistas veem os acontecimentos como ‘estórias’ e as notícias são construídas como ‘estórias’, como narrativas passadas. (TRAQUINA, 2005, p. 21).

O autor Luiz Beltrão também traz um conceito ao jornalismo no seu livro

Jornalismo Interpretativo: filosofia e técnica (1980). Beltrão (1980) o conceitua como

a informação de ideias e fatos atuais, na qual são interpretados levando-se em conta

o interesse coletivo. Tais informações são transmitidas periodicamente à sociedade.

Para o autor, o jornalismo tem o objetivo de disseminar conhecimentos, contribuindo

e orientando a opinião pública e promovendo o bem da sociedade.

4.2 UM BREVE HISTÓRICO DO JORNALISMO

Kunczik (1997) traz um breve histórico do jornalismo. De acordo com o autor,

na Europa Central, os antecessores dos jornalistas eram os poetas, que reportavam

e comentavam o que acontecia durante o dia nas feiras e nos mercados. Os

correspondentes dos príncipes governantes foram os primeiros jornalistas-escritores.

Dentre as primeiras distribuições profissionais e comerciais de notícias para o público,

destaca-se o Notícias de Nuremberg, escrito a mão, datado do século XVI.

De acordo com Kunczik (1997), no século XVI a publicidade começou a ter

maior importância para a imprensa. “Só no século XIX o jornalismo chegou a ser uma

profissão de tempo integral, onde se podia sobreviver economicamente na Europa e

nos EUA”. (KUNCZIK, 1997, p. 23). Ainda segundo o autor, Karl Marx foi um dos

jornalistas mais destacadas desta época.

Kunczik (1999) classifica a história da imprensa como uma história da luta

pela liberdade na Europa do Ocidente e também nos EUA. “Logo depois que

Gutemberg inventou a máquina de imprimir com tipos móveis, institucionalizaram-se

as medidas de censura, especialmente devido à publicação de folhetos anticlericais

ou de outros materiais críticos”. (KUNCZIK, 1999, p. 24).

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De acordo com Bahia (1971), o surgimento da imprensa de Gutemberg, no

século XV é o marco do início da aplicação especial, particular e própria da escritura

manuscrita, cujo caráter de instrumento de trabalho pessoal transformou-se um

caráter também coletivo.

Dentro de alguns aspectos históricos, Bahia (1971) destaca que a escritura

manuscrita teve a função delimitada uma vez que as aplicações das técnicas de

escritura impressa se ampliaram, e na medida em que os meios mecânicos se

tornaram cada vez mais ágeis e economicamente mais em conta registrar, conservar

e transmitir as informações.

Bahia (1971) ainda destaca que:

As origens do jornalismo se encontram nas primeiras manifestações conscientes ou organizadas da comunicação, com as quais surge o costume da transmissão de informações. O jornal não só é anterior à tipografia, como também é anterior à própria escrita. Suas formas rudimentares surgem com a transmissão oral mais fugaz e se estendem com a transmissão simbólica destinada a fixar os acontecimentos. (BAHIA, 1971, p. 30).

Os mais antigos manuscritos, que se assemelham a um jornal, segundo Bahia

(1971) são as Acta Diurna Populi Romani, que eram os atos do Senado e do povo,

determinados por Júlio César, que assumiu o consulado no ano de 69 antes de Cristo.

Os acontecimentos eram registrados em uma tábua branca, chamada de álbum, na

qual era exposta no muro da residência do político romano.

Conforme Bahia (1971), posteriormente, os Annales Maximi, substituíram o

álbum. De acordo com autor, o aparecimento da escrita modificou o quadro da

comunicação oral de maneira profunda. “As Atas possuíam pelo menos três

características do jornal: a periodicidade, a atualidade e a variedade”. (BAHIA, 1971,

p. 30). No Annales Maximi, eram publicadas nomeações de funcionários,

nascimentos, casamentos, óbitos e demais eventos sociais.

Bahia (1971) chega ao jornalismo oral na Idade Média. Segundo o autor, a

sistematização da vida feudal representou um retrocesso. O pergaminho tornou-se

escasso e o alfabeto inacessível e as notícias se espalhavam de boca em boca.

Com o período do Renascimento, segundo Bahia (1971, p. 31) “[...] a

informação escrita acentua a sua importância. Há imensa sede de conhecimento a

atender e uma patente necessidade de registrar as ocorrências da época”.

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O jornal epistolar, entre os séculos XVI e XVII, prepara o nascimento da

empresa jornalística. Segundo Bahia (1971, p. 32), era “Um jornal de comunicados,

também primariamente entendido, que operava de modo eficiente na ausência de

meios mais acabados de transmissão da notícia”. Bahia (1971, p. 32) ainda destaca

que “O papel e o jornalismo dão contribuições recriadoras às novas fronteiras do

jornalismo”.

A etapa mais avançada da informação é a gazeta-a-mão, que circulou em

Veneza antes do ano de 1550.

No processo histórico do jornalismo, destaca-se a invenção da tipografia, na

qual marca uma revolução da imprensa. (BAHIA, 1971). “Abre-se com ela uma nova

era que se liga a partir da gravura sobre madeira (1400-1460) à disseminação dos

correios públicos, desembocando na multiplicação das cópias”. (BAHIA, 1971, p. 32)

O jornal Nieuwe Tijdinghen, de Antuérpia, foi o primeiro impresso, datado de

1605. Para o autor, “Com a periodicidade, o jornalismo ganha categoria. A ideia de

propiciar, em prazos fixos, a cobertura de acontecimentos que vão desde a informação

mais grave às novidades mais caricatas, logo transforma-se em hábito. (BAHIA, 1971,

p. 33).

Os impressos relatando fatos se disseminam na mesma época do primeiro

jornal impresso, e a produção torna-se cada vez mais voltada à coletividade.

4.3 JORNALISMO NO BRASIL

Um dos autores mais reconhecidos acerca do tema Jornalismo no Brasil é

José Marques de Melo e seu Livro Jornalismo Brasileiro (2003).

De acordo com Melo (2003), a pesquisa sobre o jornalismo no Brasil se

constitui a partir de meados do século XIX. Segundo o autor, a preocupação inicial se

dá nos meios de difusão da notícia, especificamente na tecnologia de impressão dos

periódicos da época e não estava centrada nos processos noticiosos em si.

Conforme Melo (2003), a imprensa se desenvolve no Brasil mais de três

séculos depois de ser criada por Gutemberg:

Embora estabelecida tardiamente em território brasileiro [...], a imprensa aqui se desenvolve a partir da chegada da Corte de D. João VI, em 1808. Na verdade, os seus primeiros momentos são tímidos, porque controlados pela censura real, destinando-se a reproduzir informações e documentos de governo. (MELO, 2003, p. 21).

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O fundador do Jornalismo Brasileiro, segundo Melo (2003), é Hipólito José da

Costa Pereira, que lançou o jornal mensário Correio Brasiliense (1808-1822). “Trata-

se de publicação essencialmente política, que abriu espaço para a informação de

natureza científica, quase sempre divulgando fatos e ideias gerados na Europa e

considerados relevantes pelo jornalista para aplicação no Brasil”. (MELO, 2003, p. 29).

Entretanto, o jornal não era impresso no Brasil, e sim em Londres. As autoras Ana

Luiza Martins e Tania Regina de Luca, no livro História da Imprensa no Brasil (2011),

sintetizam que a impressão de papel no Brasil surgiu mais tarde em relação à Europa

e a algumas partes das Américas. No continente europeu a tipografia já existia desde

a metade do século XV. Apenas no século seguinte a atividade impressa surge nas

Américas. (MARTINS; DE LUCA, 2011). Ainda segundo Martins e De Luca (2011,

p.23), “Eram, ainda assim, iniciativas com defasagens em relação à Europa, sob

vigilância e repressão das autoridades e aparecendo de forma esparsa.”.

Sobre a atuação do exercício jornalístico de Hipólito da Costa, Melo (2003)

destaca que ele se utilizava de um jornalismo mais interpretativo, onde relatava aquilo

que observava, ou seja, não se limitava ao terreno noticioso. “Ele procura desvendar

e compreender a conjuntura que se esboçava, e, sempre que indispensável, tece

juízos de valor, ou seja, opina judiciosamente”. (MELO, 2003, p. 36).

Melo (2003) destaca ainda a influência de outros nomes para o jornalismo no

Brasil, dentre eles, Rui Barbosa. Segundo o autor, a maioria dos biógrafos de Rui

Barbosa reconhecem que sua atuação na imprensa de sua época foi marcante.

O autor sintetiza que o jornalismo tem suas raízes europeias, mais

especificamente nos modelos franceses e norte-americanos, e que o nosso jornalismo

é o resultado desse conjunto de motivações produzidas pelos padrões estrangeiros.

“Na verdade, o jornalismo brasileiro estruturou-se criativamente, observando com

seletividade os modelos que se insinuaram ou impuseram, adquirindo feição

diferenciada”. (MELO, 2003, p. 17).

4.4 CLASSIFICAÇÕES NO JORNALISMO

O autor Felipe Pena, em seu livro Teorias do Jornalismo (2005) evidencia a

importância do autor e professor José Marques de Melo, cujo a obra já foi destacada

nesta monografia, no histórico do jornalismo no Brasil. Para Pena, Melo é o principal

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representante na área de classificações jornalísticas. A obra de José Marques de

Melo, na qual ele explana sobre as classificações no jornalismo é o livro A opinião no

jornalismo brasileiro (1994).

De acordo com Pena (2005), as definições de gêneros vêm desde a

antiguidade:

A definição de gêneros vem desde a Grécia Antiga, há quase três mil anos, com a classificação proposta por Platão, baseadas nas relações entre literatura e realidade, dividindo o discurso em mimético, expositivo ou misto. E foi nessa área que a teoria dos gêneros adquiriu coerência, seja como agrupamento de obras por convenções estéticas ou como normatizadora das relações entre autor, obra e autor. (PENA, 2005, p. 66).

Ainda segundo Pena (2005), o inglês Samuel Buckeley foi a primeira pessoa

a tentar classificar o jornalismo, no século XVIII. Ele resolveu separar o conteúdo do

jornal Daily Courant em notícias e comentários. Pena (2005) afirma que, até hoje, essa

divisão causa divergências entre jornalistas.

De acordo com Pena (2005), as propostas de classificação jornalística

expostas por José Marques de Melo são baseadas em alguns critérios:

a) a finalidade do texto ou disposição psicológica do autor ou ainda a

intenção;

b) estilo;

c) modos de escrita;

d) natureza do tema;

e) articulações interculturais.

Conforme Pena (2005, p. 67), “As sistematizações de Marques de Melo

também levam em conta a geografia, o contexto sociopolítico, a cultura, os modos de

produção, os modos de produção e as correntes de pensamento”.

Melo (1994) classificou as categorias jornalísticas primeiramente em

jornalismo informativo e jornalismo opinativo, baseado na distinção entre news e

comennents. Segundo Melo (1994, p. 24), “Cada processo jornalístico tem sua

dimensão ideológica própria, independentemente do artifício narrativo utilizado”.

Segundo Melo (1994), o jornalismo informativo se apresenta como uma

categoria hegemônica, no século XIX, quando a imprensa norte-americana aumenta

o ritmo de produção, transformando a informação em mercadoria. Essa categoria

“assegura a informação ao povo”. (MELO, 1994, p. 27).

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Já o jornalismo opinativo tem um espaço reduzido segundo o autor. Ele se

baseia propriamente nas páginas intituladas “editoriais”. Essa categoria jornalística

“tem procurado influenciar o homem”. (MELO, 1994, p. 27).

Conforme Melo (1994), essas duas categorias predominam, historicamente,

no jornalismo, e convivem com novas categorias. Ele classifica isso como uma

tendência de países capitalistas, onde, cada vez mais, o jornalismo busca se adequar

aos desejos dos consumidores.

De acordo com o autor Cleofe Monteiro de Siqueira, em seu livro Jornalismo

Investigativo: o fato por trás da notícia (2005), José Marques de Melo não explana

sobre o jornalismo investigativo devido à sua obra mais importante sobre

classificações jornalísticas ser datada em 1985, ou seja, antes do Caso Watergate.

Ainda segundo o autor, Melo ignora o jornalismo investigativo mesmo esta

classificação ter tido destaque no Brasil ainda nos anos 1970.

Melo (1994) traz à tona as classificações de Luiz Beltrão na obra Iniciação à

Filosofia do Jornalismo (1960). Segundo Beltrão (1960 apud Melo, 1994, p. 59), os

gêneros jornalísticos se subdividem em três categorias:

a) Jornalismo informativo: nesta divisão está incluída a notícia, a reportagem,

histórias de interesse humano e informação pela imagem;

b) Jornalismo interpretativo: aqui destaca-se a reportagem em profundidade;

c) Jornalismo opinativo: editorial, artigo, crônica, opinião ilustrada e opinião

do leitor.

Apesar de Luiz Beltrão trazer estes gêneros e classificações, não é

especificado onde o jornalismo investigativo de fato se classifica. Podemos concluir

que ele poderia se encaixar no jornalismo interpretativo, pois as reportagens do

programa Conexão Repórter que serão objetos desta análise se caracterizam como

reportagens em profundidade.

Um dos únicos autores que classifica o jornalismo investigativo como um

gênero e traz semelhanças e diferenças em relação ao jornalismo interpretativo é

Alberto Dines, em sua obra O papel do Jornal (1996).

De acordo com Dines (1996), o leitor, telespectador, consumidor de mídia

quer, hoje em dia, assegurar-se da sua situação dentro dos acontecimentos na

sociedade e não mais apenas saber o que acontece à sua volta. O autor sintetiza

ainda que a informação precisa passar por um processo de engrandecimento, e

precisa conter alguns elementos, como “[...] a dimensão comparada, a remissão do

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passado, a interligação com outros fatos, a incorporação do fato a uma tendência e

sua projeção para o futuro”. (DINES, 1996, p. 90).

Sendo assim, segundo Dines (1996), chega-se perto do jornalismo

interpretativo e do jornalismo investigativo.

O jornalismo investigativo não é apenas jornalismo de sensações ou de escândalos. Relaciona-se com o jornalismo interpretativo ou analítico, pois, ao inquirir sobre as causas e origens dos fatos, busca também a ligação entre eles e oferece a explicação da sua ocorrência. (DINES, 1996, p. 92).

Conforme o autor, ao praticar este tipo de jornalismo, não é necessário atribuir

a postura de denúncia. É necessário que o jornalista adote o princípio filosófico de que

toda questão oferece perspectivas de prós e contras, e uma reportagem deve

apresentar os dois lados, caracterizando assim um bom padrão ético.

Nos próximos tópicos, vamos trazer os conceitos de notícia, pauta, fontes e,

também, abordaremos o processo de execução de uma reportagem.

4.5 A NOTÍCIA NA TV

Cruz Neto (2009) afirma que o jornalismo tem como objetivo principal a

apresentação de notícias. De acordo com Cruz Neto (2009, p. 17) “[...] são os

jornalistas que escolhem o que noticiar, definem como fazer isso ou, simplesmente,

decidem que não vale a pena divulgar uma informação”.

Alfredo Eurico Vizeu Pereira Jr. em seu livro Decidindo o que é notícia: os

bastidores do telejornalismo (2000) afirma que “A notícia é uma forma de ver, perceber

e conceber a realidade. É um autêntico sintoma social e a análise de sua produção

lança muitas pistas sobre o mundo que nos cerca”. (FONTCUBERTA, 1993 apud

PEREIRA JÚNIOR, 2000, p. 62).

Conforme Olga Curado, em seu livro A Notícia na TV: o dia-a-dia de quem faz

telejornalismo (2002), “A notícia é a informação que tem relevância para o público. A

importância de um acontecimento é avaliada pelo jornalista, que julga se o fato é

notícia e deve ser divulgado”. (CURADO, 2002, p. 15).

Ainda de acordo com Curado (2002):

A importância da notícia é geralmente julgada de acordo com a sua abrangência, isto é, segundo o universo de pessoas às quais pode interessar. Esse é o critério mais utilizado em jornalismo de televisão que, dando ênfase ao aspecto de amplitude, pode tender a transformar a notícia em

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entretenimento ou em espetáculo, tratando apenas de questões amenas ou desprovidas de polêmica. (CURADO, 2002, p. 16).

Ainda segundo Curado (2002), a informação deve contribuir em quem a

consome um sentimento de inclusão social e política, e que sirva para aumentar a

consciência crítica acerca dos fatos.

O autor Nilson Lage, em seu livro Estrutura da Notícia (2006), traz alguns

dados históricos sobre a notícia em si. De acordo com Lage (2006), na Idade Média,

as informações que eram repassadas à população vinham em decretos e sermões

das igrejas. Tais informações levavam décadas para cruzar a Europa. Ainda segundo

o autor, isso começou a mudar a partir do século XIII com a ampliação da atividade

comercial.

Conforme Lage (2006), o valor investido para imprimir um jornal era pequeno

e as redações comportavam duas ou três pessoas. Qualquer um podia lançar o seu

próprio jornal, desde que tivesse amigos com motivos para temer ataques impressos

caso não contribuíssem, isso de um ponto de vista econômico.

De acordo com autor Ricardo Noblat, em seu livro A arte de fazer um jornal

diário (2010), “Fora dos manuais, notícia na verdade é tudo o que os jornalistas

escolhem para oferecer ao público”. (NOBLAT, 2010, p. 31).

Segundo o autor Mário L. Erbolato, em seu livro Técnicas de Codificação em

Jornalismo: redação, captação e edição no jornal diário (2008), a notícia é a matéria-

prima do jornalismo, pois os assuntos, para serem comentados e interpretados,

necessitam anteriormente em divulgados e conhecidos pelo público. Para Erbolato

(2008, p. 51), “As notícias são comunicações sobre fatos novos que surgem na luta

pela existência do indivíduo e da própria sociedade”.

Ainda de acordo com Erbolato (2008), a notícia deve ser atual, inédita, além

de, logicamente ser verdadeira, objetiva, e que prime pelo interesse público. O autor

destaca que:

Outra característica da notícia é a objetividade. Deve ser publicada de forma sintética, sem rodeios e de maneira a dar a noção correta do assunto focalizado. Quem colhe dados, observando o local ou entrevistando pessoas capacitadas a proporcionar informações para a matéria, deve agir com isenção de ânimo. Honestidade e imparcialidade são atributos exigidos do repórter. Porém, o poder de síntese não impedirá a clareza. (ERBOLATO, 2008, p. 55).

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Para que uma notícia seja de fato considerada completa, segundo Erbolato

(2008), a mesma deve possibilitar ao leitor a ideia exata e precisa sobre um

acontecimento. “A importância e a repercussão determinam o tamanho da notícia”.

(ERBOLATO, 2008, p. 57).

O autor Juarez Bahia, em seu livro Jornalismo, informação, comunicação

(1971), também traz a sua definição do que é a notícia. Ele destaca que:

Na raiz da disciplina do jornalismo está a notícia – isto é, a informação elaborada, o acontecimento mecanicamente trabalhado, o fato em seu significado de comunicação para consumo. Assim, a notícia se distingue do eco, que não tem conteúdo transcendente, mais se identificando como um sinal de repetição cujo alcance é limitado. (BAHIA, 1971, p. 65).

Para Bahia (1971), a notícia como aconteceu, segura e largamente

transmitida, de forma responsável, exata e verídica, deve ser também impessoal.

Segundo o autor, a impessoalidade da notícia é uma característica que favorece uma

maior receptividade da audiência. Com isso, a formação da opinião torna-se mais

adequada.

4.6 A PAUTA NA TV

A produção de uma reportagem, processo que antecede a saída do repórter

ao trabalho de campo, é caracterizada, anteriormente, pela escolha da pauta. De

acordo com Curado (2002, p. 40), “A pauta é um conjunto de dados que dão partida a

uma reportagem”.

Os autores Heródoto Barbeiro e Paulo Rodolfo de Lima, no livro Manual de

Telejornalismo: os segredos da notícia na TV (2002) destacam que o pauteiro é aquele

que observa e analisa o que de fato pode ser transformado em reportagem. É ele que

pensa o assunto em sua totalidade e indica os possíveis caminhos que o repórter pode

percorrer para a execução da mesma.

De acordo com Barbeiro e Lima (2002, p. 89), “A busca e planejamento de

reportagens não deve se limitar aos assuntos do dia, ao que é imediato. É preciso

criar, contextualizar e avançar. O aprofundamento aguça a reflexão crítica”.

O autor Luiz Costa Pereira Júnior, em seu livro A Apuração da Notícia:

métodos de investigação na imprensa (2006), destaca que a elaboração da pauta é a

sondagem inicial, a investigação preliminar, a exploração das fontes, documentos,

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publicações e todos os materiais necessários à execução da reportagem. Para o

autor, tal base de informações serve para sustentar uma investigação. “Ajuda a

estabelecer a viabilidade da pauta – se não estaria propondo o impossível de ser

apurado – e se justifica”. (PEREIRA JÚNIOR, 2006, p. 78).

Pereira Júnior (2006) explica mais precisamente sobre a pauta propriamente

dita e ainda destaca que:

Toda reportagem tenta dar resposta a uma curiosidade ou lançar uma hipótese sobre a realidade. Pauta não é tema. Não é camisa-de-força. Não busca confirmar o que já se sabe. É uma dúvida sobre algum aspecto da realidade a ser respondida pelos fatos. (PEREIRA JÚNIOR, 2006, p. 78 e 79).

Após esta etapa, Pereira Júnior (2006) ressalta ainda que é necessário um

plano de ação para servir como um apoio para a formulação da pauta. Este plano de

ação é constituído pela relação de informações que já adquirimos; a relação de

informações que faltam ser obtidas e pela lista de fontes, na qual servirá para localizar

a informação que nos falta. É importante ainda definir, conforme o autor, quais as

fontes mais importantes e consistentes.

Conforme Pereira Júnior (2006):

O plano de ação ajuda a organizar o que a reportagem quer demonstrar. Pauta que é pauta define o rumo do trabalho, o ângulo, a escolha de uma ou várias nuances do que será apurado, qual o recorte da realidade que a reportagem fará, sob que modo novo será abordada a questão. (PEREIRA JÚNIOR, 2006, p. 79).

Uma mesma linha de pensamento é seguida pelo autor João Elias da Cruz

Neto, em seu livro Reportagem de Televisão: como produzir, executar e editar (2009).

Segundo ele, a pauta é o que orienta o trabalho do repórter, e prepará-la é a principal

função do produtor. Como os repórteres não participam diretamente da reunião de

pauta, esta deve ser clara e precisa para sua melhor execução. Geralmente, a reunião

é realizada com produtores, chefe de reportagem e diretor de jornalismo e todas as

sugestões são discutidas. Cruz Neto (2008) ressalta que algumas sugestões são

reprovadas, pois, por algum motivo, por vezes pessoal, pode não valer para um dia, e

sim para outro. “Se o repórter no momento em que estiver realizando a matéria

perceber que a realidade não é bem aquela descrita na pauta, ele pode, sim, mudar o

gancho e fazer a matéria de acordo com o que ele está percebendo na rua. (CRUZ

NETO, 2006, p. 25). Logicamente que o autor ressalta que tal atitude deve ser

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previamente comunicada à chefia de redação, para que todos fiquem cientes de como

a matéria está sendo executada.

De acordo com Cruz Neto (2009), a pauta é formada em duas partes

principais. O autor ressalta que a primeira parte é o cabeçalho, onde se coloca a

retranca, que é nome que se dá a pauta; o nome dos entrevistados; as formas de

contato, além do endereço completo. Sugere-se ainda que seja incluído o nome da

pessoa que fez os contatos e digitou as informações.

A segunda parte da pauta, segundo Cruz Neto (2009), é o desenvolvimento,

na qual é constituído pelo gancho, informações e encaminhamento. O gancho é onde

se diz quais os objetivos da matéria. Ele deve ser escrito de maneira objetiva, em, no

máximo, três linhas. Já no campo das informações, o produtor que escreveu a pauta

coloca tudo o que sabe sobre o tema. Após, ele mostra o caminho que o repórter deve

seguir para realizar a reportagem. Esta etapa chama-se encaminhamento.

Cruz Neto (2009) ressalta a importância de as informações estarem sempre

claras e objetivas, para que o repórter tenha o pleno entendimento sobre os objetivos

de se produzir tal matéria.

Mesmo que uma pauta não esteja muito boa, não tenha as informações adequadas, o repórter pode ir além, fazer uma apuração mais detalhada, coletar entrevistas interessantes e apresentar um texto correto. Uma pauta bem feita não implica uma boa matéria, assim como de uma pauta malfeita pode surgir uma excelente matéria. (CRUZ NETO, 2009, p. 26).

Ainda conforme Cruz Neto (2009, p.27), “Uma pauta para TV tem que prever,

também, com que imagens as informações vão ser cobertas”. De acordo com o autor,

alguns assuntos abordados são difíceis de serem divulgados por causa da dificuldade

em se obter imagens.

Barbeiro e Lima (2002, p. 89) também ressaltam tal cuidado dizendo que “A

preocupação com a imagem está presente em todas as etapas da produção de uma

reportagem para TV, desde a pauta”. Segundo os autores, necessário avaliar o

assunto que será abordado, mas também se será possível obter imagens sobre o

tema.

Compartilhando das ideias de Cruz Neto (2009), Curado (2002, p. 40) também

ressalta que, “A pauta de televisão só existe se ela puder ser proposta em três linhas.

Se não for assim é um simples enunciado ou fragmento de uma informação”.

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De com Curado (2002), quando a pauta é precisa nas informações, ela mostra

uma notícia completa, na qual deverá ser desdobrada pelo repórter. O autor salienta

que pauta deve sempre trazer uma notícia, já que é o alicerce da reportagem.

Para Curado (2002), o pauteiro é um dos profissionais mais importantes, raros

e menos valorizados no mercado de comunicação. “A pauta enxerga de longe a

notícia, antes que ela se torne visível para a maioria”. (CURADO, 2002, p. 41).

Curado (2002) relaciona alguns recursos importantes na hora de pautar:

a) Contato com a apuração: a pauta analisa todos os detalhes e a apuração

dá boas indicações à pauta;

b) Leitura dos jornais e revistas diários: O pauteiro lê tudo, de forma

cuidadosa e vê além do que está nas manchetes;

c) Agenda: É um calendário de eventos com as datas marcadas. Segundo

Curado (2002, p.42), “A construção de uma agenda é um trabalho

meticuloso e diário”.

d) Internet: É um recurso que, além de ser um excelente meio de pesquisa,

auxilia na pauta. Nesse ponto, segundo Curado (2002), é importante que

o pauteiro se concentre no foco central, pois a internet é um ambiente

onde, devido ao alto número de informações, pode distrair;

e) Contatos pessoais: É importante ampliar o universo de relações, além do

meio jornalístico;

Ainda conforme Curado (2002), existem dois tipos de pauta: a factual e a

produzida.

A pauta factual é a cobertura, onde, de fato, a equipe acompanha e registra

um fato que está acontecendo. De acordo com a autora, este é o tipo mais simples de

pauta. “Funciona como um lembrete para a produção. Oferece em poucas palavras

sugestões para enfoques de cobertura”. (CURADO, 2002, p. 43).

O segundo tipo de pauta é a produzida. Curado (2002) explica que esta pauta

é caracterizada pela investigação e apresenta denúncias. “O essencial que não se

pode perder de vista é que o ponto de partida de uma pauta será sempre a notícia”.

(CURADO, 2002, p. 43).

4.7 AS FONTES NA TV

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Após analisar os conceitos de notícia e pauta, torna-se necessário explorar

sobre as fontes, que são as possíveis pessoas que podem passar informações, na

qual se transformam em reportagens.

De acordo com Cruz Neto (2009), qualquer pessoa pode ser uma fonte de

informação. Segundo o autor, as fontes podem ser classificadas em oficiais e não-

oficiais ou primárias e secundária.

a) Fontes oficiais: São representantes do poder público, mas nem sempre

podem ser confiáveis. Nesse ponto, o autor ressalta ser sempre importante

checar as informações;

b) Fontes não-oficiais: Estas não possuem nenhuma relação com o poder.

São pessoas comuns;

c) Fontes primárias: São as pessoas que serão entrevistadas na matéria. De

acordo com Cruz Neto (2009, p. 32), “Uma pessoa só será uma boa

entrevistada para TV se souber se comunicar bem no veículo”. Ainda sobre

tal aspecto, o autor ressalta que muitas pessoas têm restrição em aparecer

na televisão, pois não se sentem à vontade, por isso é importante escolher

bem as pessoas que aparecerão no vídeo;

d) Fontes secundárias: São as fontes que apenas passam as informações,

mas que não serão entrevistadas.

Compartilhando do mesmo conceito estabelecido por Cruz Neto (2009),

Erbolato (2008, p. 181) afirma que “Fonte é qualquer pessoa que presta informações

ao repórter”.

Um dos problemas mais comuns no jornalismo é quando o repórter possui

relacionamento com a fonte. Sobre este aspecto, Cruz Neto (2009) destaca que:

Uma fonte pode passar informações para você, mas necessariamente você não precisa se tornar amigo. Fazer amizade com a fonte é complicado porque se um dia você precisar fazer uma matéria de denúncia que envolva aquela fonte, com certeza, ela não vai te perdoar. A fonte sempre vai achar que, por ser sua amiga, você nunca poderá falar sobre algo que ela fez de errado. (CRUZ NETO, 2009, p. 34).

De acordo com Pereira Júnior (2006), é preciso realizar uma análise

estratégica das fontes. O autor destaca que:

As fontes devem ser tão confiáveis que a informação fornecida por elas exige o mínimo possível de controle. Entrevistados que em outras ocasiões

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forneceram fatos confiáveis têm maior chance de continuarem a ser acessadas pelo jornalista, até virarem fontes regulares. (PEREIRA JÚNIOR, 2006, p. 82).

Ainda segundo Pereira Júnior (2006), uma estratégia geral de abordagem do

assunto em questão só será possível após a análise das fontes implicadas na notícia

e das fontes secundárias.

Cruz Neto (2009) ressalta ainda que todo bom jornalista deve ter as suas

próprias fontes. “Com certeza, o repórter, o editor que tiver suas fontes vai se destacar

dos demais”. (CRUZ NETO, 2009, p. 35).

4.8 PROCESSO DE EXECUÇÃO DA REPORTAGEM

A partir da definição da pauta e das possíveis fontes a serem contatadas, o

processo seguinte é a execução da reportagem em si, ou seja, é necessário apurar

as informações para constituir uma matéria.

De acordo com Barbeiro e Lima (2002, p. 69), “A reportagem é a principal

fonte de matérias exclusivas do telejornalismo”.

Segundo Cruz Neto (2009), o repórter que atua em televisão é um especialista

em generalidades, ou seja, sabe um pouco de cada coisa. O autor ressalta que o

repórter quando sai da redação, sai para realizar mais de uma reportagem e, por

vezes, tratam de assuntos totalmente diferentes.

A equipe de reportagem, segundo Cruz Neto (2009, p. 39), “[...] é formada,

geralmente, por três pessoas: o repórter, o cinegrafista ou repórter cinematográfico e

o auxiliar que exerce, também, a função de motorista”. O autor saliente que o repórter

é tido como o chefe da equipe, ou seja, qualquer problema que possa acontecer na

rua, é ele que deve entrar em contato com a redação.

Sobre a reportagem, Curado (2002, p. 95) afirma que “Toda história possui

começo, meio e fim, mas sua apresentação não é feita necessariamente nessa ordem.

O estilo do repórter e do programa ajuda na concepção do formato da reportagem.

No processo de execução da reportagem, Cruz Neto (2009, p. 41) ressalta

que “O repórter deve estar sempre ao lado do cinegrafista acompanhando a captura

de imagens. [...] E, sempre que necessitar de uma imagem, ele deve pedir ao

cinegrafista”.

Para Barbeiro e Lima (2002):

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O repórter deve desenvolver a compreensão da imagem. A regra é: imagem e palavras andam juntas. O conflito entre elas deve ser evitado, uma vez que distrai o público; mas se ainda assim ocorrer, prevalece o poder da imagem. (BARBEIRO; LIMA, 2002, p. 70).

Ainda sobre a questão das imagens, as autoras Luciana Bistane e Luciane

Bacellar, no livro Jornalismo de TV (2005), destacam que:

Em reportagens externas, repórteres e cinegrafistas fazem um recorte da realidade ao formular uma pergunta, ao escolher um enquadramento. Uma imagem é capaz de garantir a veiculação de um assunto que talvez nem fosse ao ar se o cinegrafista não tivesse a sorte de captar o flagrante. (BISTANE; BACELLAR, 2005, p. 41).

Os jornalistas e autores Alexandre Carvalho, Fábio Diamante, Thiago Bruniera

e Sérgio Utsch, no livro Reportagem de TV: como fazer, como produzir, como editar

(2010), enfatizam que a imagem é uma das características mais intrínsecas do

telejornalismo. Assim como os outros autores já citados, estes também reiteram que

existe certa dificuldade em garantir informação visual em determinados assuntos, e

destacam ainda que:

Ao produzir uma reportagem, devemos nos colocar nas situações que o repórter vai encontrar na rua e construir a informação visual como se não fosse existir o texto. Cada um tem sua maneira de fazer isso. O importante é pensar na matéria como um todo. (CARVALHO et al., 2010, p. 37).

Curado (2002, p.96) alerta que “Em nome da clareza, é fundamental que a

reportagem não se transforme num vídeo exibicionista de tecnologias e de recursos

visuais”.

As reportagens podem ser gravadas ou ao vivo. De acordo com Curado

(2002), a forma mais utilizada atualmente no jornalismo é o recurso da gravação,

chamada normalmente de “tape”. Ou seja, são registradas cenas e falas que serão

editadas em seguida.

Ainda segundo Curado (2002, p. 97), “A gravação permite uma avaliação mais

detalhada do material coletado, a revisão de entrevistas e a seleção dos pontos

considerados mais pertinentes ao assunto e que farão parte da reportagem”.

Sobre as reportagens realizadas ao vivo, Curado (2002) destaca que:

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A história contada ao vivo, isto é, simultaneamente ao momento em que ocorre, é possível diante das facilidades tecnológicas disponíveis – micro-ondas, satélite. As imagens e as informações são transmitidas pelo repórter direto do cenário dos acontecimentos, ao telespectador. (CURADO, 2002, p. 97).

Curado (2002, p. 69), “O vivo também enfatiza o compromisso do jornalismo

com a atualidade”.

Segundo Barbeiro e Lima (2002), “Por uma característica própria do veículo

eletrônico, as reportagens ao vivo reproduzem sempre o som ambiente. Isso dá o

clima do acontecimento”.

Por vezes, segundo Curado (2002), a execução de uma reportagem requer

algumas necessidades especiais, principalmente em relação ao tempo e aos meios.

O autor destaca que é preciso fazer uma avaliação criteriosa acerca do ambiente, da

natureza e dos personagens que ilustrarão a reportagem para que ela não se torne

algo frustrante.

Carvalho et. al. (2010) destaca ainda que:

O olhar do repórter dá o tom da matéria. É ele quem vivencia o fato, que percebe as sutilezas das situações, que estabelece um contato direto com os personagens envolvidos, olho no olho. É ele quem mais sofre o impacto da emoção ou da revolta provocadas pelo assunto tratado. É para ele a maior parte dos louros pelo sucesso da reportagem especial, assim como é em cima dele que recai maior parte da cobrança. (CARVALHO et. al., 2010, p. 44).

4.8.1 Entrevista na TV

A entrevista é uma das formas de apuração da notícia, na qual constitui uma

pauta. Segundo Erbolato (2008, p. 157), “A entrevista é um gênero jornalístico que

requer técnica e capacidade profissional, pois se não for bem conduzida redundará

em fracasso”.

Antes de conceituarmos a entrevista, torna-se necessário remontar às origens

deste gênero jornalístico tão importante para a concepção de uma reportagem.

Sobre as origens históricas da entrevista, Chanrley (1976, apud Erbolato,

2008) destaca brevemente que tal gênero nasceu em Nova York, no ano de 1836,

quando James Gordon Bennet, fundador do jornal New York Herald, fez perguntas a

uma mulher chamada Rosina Townsend, na qual era proprietária de um prostíbulo

situado em Nova York. Nesse local ocorreu um assassinato e durante vários dias o

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jornal publicou matérias sobre o ocorrido com o objetivo de comprovar a inocência da

pessoa apontada como autora do crime.

De início, como aponta Erbolato (2008, p. 158), “O gênero entrevista não foi

bem aceito pelos profissionais da imprensa”. Jornais da Inglaterra chegaram a afirmar

que, para o jornalista, era uma tarefa degradante, e para o entrevistado, desagradável.

Os periódicos ainda destacavam que a entrevista era algo cansativo para o público.

(ERBOLATO, 2008).

Ao longo dos anos, entretanto, a entrevista foi se tornando a principal fonte de

construção de uma reportagem. É o contado direto do repórter com a fonte. Segundo

Curado (2002, p. 98), “Uma entrevista é o mecanismo por meio do qual se obtêm

respostas a perguntas feitas a alguém em benefício de um público”.

Ainda de acordo com Curado (2002):

A entrevista é a maior fonte de informação jornalística. Outros mananciais são a pesquisa de documentos, discursos ou pronunciamentos e o testemunho pessoal do jornalista. Mesmo diante desses recursos a entrevista é o elemento mais forte e refrescante, porque propicia uma relação dinâmica com a autoridade informativa, aquela que pode esclarecer sobre a natureza e a mecânica dos acontecimentos. (CURADO, 2002, p. 98).

Segundo Barbeiro e Lima (2002), existem algumas distinções sobre a

entrevista realizada em televisão e no impresso. Para os autores, em televisão a

entrevista consegue transmitir o que o impresso nem sempre consegue, que é, de

fato, a exposição da intimidade daquele que está sendo entrevistado. O telespectador,

conforme Barbeiro e Lima (2002), é influenciado pelos gestos, olhar, tom de voz e

outras características do entrevistado, que nesse ponto, também é influenciado a dizer

mais do que gostaria.

Nesse mesmo sentido, Noblat (2010) destaca que:

Notícia em uma entrevista está no que diz o entrevistado. Mas pode estar também no silêncio dele, na irritação que demonstra diante de uma pergunta, no sorriso que esboça quando escuta outra, na recusa em responder uma determinada questão. Tudo deve ser observado. E o relevante, publicado. (NOBLAT, 2010, p. 70).

Além disso, Barbeiro e Lima (2002, p. 85) destacam que “Boas entrevistas são

as que revelam conhecimentos, esclarecem fatos e marcam opiniões. Quando isso

acontece a notícia avança e abre espaços para novas entrevistas e reportagens”.

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A autora Cremilda Medina, em seu livro Entrevista: o diálogo possível (2008),

ressalta que:

A entrevista, nas suas diferentes aplicações, é uma técnica de interação social, de interpenetração informativa, quebrando assim isolamentos grupais, individuais, sociais; pode também servir à pluralização de vozes à distribuição democrática da informação. [...] constitui sempre um meio cujo fim é o inter-relacionamento humano. (MEDINA, 2008, p. 08).

Cruz Neto (2009) explica que a entrevista é a maneira que o repórter vai

apurar a informação, na qual será utilizada na matéria. Em relação à entrevista na

televisão, o autor ressalta que algumas informações levantadas servirão para que o

repórter faça o texto, e outras deverão ser gravadas na própria voz do entrevistado,

para que o mesmo se constitua como parte da matéria.

Ainda segundo Cruz Neto (2009), recomenda-se em uma entrevista para

televisão que, antes de gravar, repórter e entrevistado conversem entre si a fim de

esclarecer e sanar todas as dúvidas em relação a pauta.

Nesse sentido, Bistane e Bacellar (2005) ressaltam que o microfone e a

câmera podem intimidar quem não é acostumado a falar em televisão. Por isso, a

conversa entre repórter e entrevistado serve como forma de descontração e, assim,

deixar o entrevistado mais à vontade.

Curado (2002) ainda destaca que:

Saber perguntar é quase uma arte. A pergunta denota que há necessidade de esclarecimentos sobre determinada situação ou tema e revela a atenção e a acuidade do entrevistador. A natureza das dúvidas explicita o nível de preparo do jornalista. (CURADO, 2002, p. 98).

Cruz Neto (2009, p. 44) esclarece que “O repórter deve tratar o entrevistado

de forma educada, mas não é necessário ter excesso de bons modos [...]”. O autor

ressalta que quando o objetivo da matéria é trazer fatos importantes para a sociedade,

o repórter deve perguntar tudo.

“Para saber o que perguntar, uma dica é o repórter se colocar sempre na

posição do telespectador, pensar como telespectador e fazer as perguntas que as

pessoas que estão passando por aquele problema fariam”. (CRUZ NETO, 2009, p 45).

As entrevistas podem ter diferentes classificações. De acordo com Cruz Neto

(2009), elas diferem, levando em consideração às circunstâncias. Assim, são

classificadas como: coletiva, ocasional e diagonal:

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a) Entrevista coletiva: ocorre quando o entrevistado responde à diversos

jornalistas de diferentes veículos de comunicação ao mesmo tempo;

b) Entrevista ocasional: é realizada sem marcação prévia. Um exemplo desse

tipo de entrevista é quando o repórter sai para a rua a fim de saber a

opinião da população a respeito de determinado assunto;

c) Entrevista diagonal: esta entrevista é normalmente marcada previamente

entre repórter e entrevistado. Tal classificação permite um maior

aprofundamento das questões.

Assim como as entrevistas são classificadas de acordo com a circunstância,

Cruz Neto (2009) explica que elas também podem ser classificadas levando-se em

conta objetos, na qual elas podem ser: ritual, em profundidade, temática e

testemunhal:

a) Entrevista ritual: é rápida e se objetiva em fazer com que o entrevistado

fale na matéria, e isso é mais importante do que o conteúdo da fala. Muitas

vezes serve para, também, marcar a presença da equipe de reportagem;

b) Entrevista em profundidade: tem como objetivo a figura do entrevistado,

onde relaciona-se os aspectos de sua vida propriamente dita. São,

geralmente, as entrevistas especiais exibidas em telejornais;

c) Entrevista temática: aborda um tema na qual o entrevistado é apto a falar;

d) Entrevista testemunhal: é o relato de um entrevistado sobre alguma

situação pela qual vivenciou.

Sobre a execução da entrevista, Barbeiro e Lima (2002) ressaltam que é

importante que a mesma tenha começo, meio e fim. Por isso, é necessário planejar o

tempo disponível. “A falta de preparo pode dar ao entrevistado a chance de

transformar a entrevista em palanque, púlpito ou algo semelhante”. (BARBEIRO;

LIMA, 2002, p. 85).

Pereira Júnior (2006, p. 86) destaca que esse contato direto com as fontes “É

a chance de o repórter detectar erros de avaliação da pauta, que podem ser corrigidos,

colocados à luz de novos fatos. Cada apuração abre novos vazios de informação, a

serem preenchidos por mais investigação”.

Além disso, o autor destaca que o repórter não pode se contentar com apenas

um aspecto da história, frente a diversos aspectos possíveis.

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É preciso validar a informação com pelo menos duas outras fontes. O repórter não pode bancar uma afirmação sem confirma-la. A pressa não é desculpa para má apuração. É da natureza do jornalismo ser feito em tempo curto. Na linha de produção da notícia, o levantamento e o rigor na checagem estabelecem a qualidade da informação. (PEREIRA JÚNIOR, 2006, p. 87).

De acordo com Medina (2008), a entrevista pode transmitir muito para um

leitor, ouvinte ou telespectador, pois ele “Sente quando determinada entrevista passa

emoção, autenticidade, no discurso enunciado tanto pelo entrevistado quanto no

encaminhamento das perguntas pelo entrevistador”. (MEDINA, 2008, p. 05).

Medina (2008) ainda destaca que:

A entrevista pode ser apenas uma eficaz técnica para obter respostas pré-pautadas por um questionário. Mas certamente não será um braço da comunicação humana, se encarada como simples técnica. Esta – fria nas relações entrevistado-entrevistador – não atinge os limites possíveis da inter-relação, ou, em outras palavras, do diálogo. Se quisermos aplacar a consciência profissional do jornalista, discuta-se a técnica da entrevista; se quisermos trabalhar pela comunicação humana, proponha-se o diálogo. (MEDINA, 2008, p. 05).

O processo de edição do material será abordado no próximo tópico desta

monografia.

4.8.2 Edição do material na TV

Após ser produzida e gravada, a matéria necessita passar pelo processo de

edição para, posteriormente, ser exibida em determinado programa. Por isso, Curado

(2002, p. 112) explica que “O trabalho de captar imagem e áudio deve considerar o

resultado final que vai ao ar. Não pode ser feito de maneira aleatória e fragmentada,

sem levar em consideração o conjunto da matéria a ser editada”.

Sobre o processo de edição, Barbeiro e Lima (2002, p. 102) destacam que “É

nessa etapa da elaboração da matéria que fica mais clara a ação do jornalista em

excluir e suprimir parte do material colhido, sob ação da subjetividade. É preciso

reduzir a complexidade do real para torna-lo inteligível em uma reportagem de TV”.

Portanto, nesse processo, é sempre importante buscar a objetividade.

De acordo com Barbeiro e Lima (2002), editar uma reportagem para TV

precisa de uma sequência lógica, pois é um processo na qual se conta uma história.

Por isso, é imprescindível combinar imagens e sons.

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Cruz Neto (2009) destaca que, na maioria das vezes, o repórter conclui a

pauta e envia uma fita para a redação, onde nelas contém as entrevistas que ele

realizou, assim como as imagens e o off gravado. Ele também envia o texto escrito

para a redação.

Barbeiro e Lima (2002, p. 102) destacam que “Nas matérias mais elaboradas,

geralmente de um dia para o outro, é possível uma conversa entre repórter e editor, e

mesmo o acompanhamento da edição pelo repórter”.

Sobre o processo de edição de reportagens especiais, Carvalho et. al. (2010)

destaca que a decupagem, ou seja, a avaliação da fita bruta contendo o material

gravado pelo repórter, dever ser analisado nos mínimos detalhes. Por isso, repórter e

editor participam do projeto de construção e edição juntamente.

“A ilha de edição não é uma caixinha mágica, nem faz milagres. Há uma

relação direta entre o material bruto e o produto final. A criatividade deve perpassar

todas as etapas do processo”. (CARVALHO et. al., 2010, p. 66).

Segundo Curado (2002), o processo de edição da reportagem requer algumas

etapas:

a) Avaliação do conjunto de informações colhidas pelo repórter: é o processo

de reunir todos os dados e considerar a hierarquia das informações como

o lead e o encaminhamento do vt;

b) Decupagem: é a avaliação da fita onde contém as imagens e entrevistas

colhidas pelo repórter;

c) Roteirização: nesse processo a reportagem é estruturada a partir das

imagens e falas. O “esqueleto” da reportagem é construído;

d) Redação: é o processo de escrever o texto que servirá como base da

reportagem, levando em conta todos os aspectos que a constituem;

e) Outros recursos: o editor identifica quais elementos podem ilustrar a

reportagem, como gráficos, mapas, animações e reconstituições;

f) Gravação do texto: o texto na qual será reunido com as imagens e as falas

devem ser gravados pelo repórter ou locutor;

g) Montagem: é o processo de juntar texto e imagem em uma única narrativa.

Tal processo exige um rigor técnico e criatividade.

Barbeiro e Lima (2002, p. 107) ressaltam ainda que “Ao lado da clareza e da

concisão, a simplicidade completa a eficiência na comunicação dos fatos”. De acordo

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com os autores, é preciso que o repórter e o editor tenham em mente que o público

telespectador é heterogêneo.

5 JORNALISMO INVESTIGATIVO

Para a realização desta pesquisa, e, de fato compreender quais os elementos

do Jornalismo Investigativo que caracterizam os episódios do programa Conexão

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Repórter, do SBT, e como são evidenciados, é necessário, além de entender os

conceitos do Jornalismo, uma fundamental compreensão dos conceitos de Jornalismo

Investigativo.

5.1 HISTÓRICO, CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS

O autor Dirceu Fernandes Lopes, em seu artigo Caminhos do Jornalismo

Investigativo em busca da verdade oculta (2003), expõe algumas premissas

consideradas como pilares do Jornalismo Investigativo. De acordo com Lopes (2003.

P.10), “A liberdade se fundamenta não apenas no direito de saber o que acontece,

mas também no direito de expor ideias que possibilitem formar espíritos críticos que

contribuam para mudanças nas sociedades injustas”.

Ainda conforme Lopes (2003), O Jornalismo Investigativo possui alguns

objetivos e destaca que:

[...] se propõe a reconstruir acontecimentos importantes, promover reformas, expor injustiças, desmascarar fraudes, divulgar o que os poderes públicos querem ocultar, mostrar como funcionam esses organismos, informar os eleitores sobre os políticos, especialmente sobre suas intensões e atuação. (LOPES, 2003, p.10).

Lopes (2003) afirma que existem dois pontos essenciais que contribuem para

o estabelecimento dos conceitos do Jornalismo Investigativo. De acordo com o autor,

o primeiro destes pontos é a busca pela verdade oculta; o segundo é juntar os cacos

da realidade e estabelecer relações entre eles.

Conforme Lopes (2003), o Jornalismo Investigativo é considerado um dos

gêneros nobres do jornalismo e começou a aparecer, de fato, após à Segunda Guerra

Mundial (1935-1945). Seu fortalecimento se deu entre os anos de 1955 e 1974,

especificamente nos Estados Unidos.

De acordo com o autor, entre esse período, os jornalistas americanos se

posicionaram contra o governo do país, que participava da Guerra do Vietnã (1964-

1973). Por tal posição, os jornalistas começaram a analisar a atuação dos políticos de

forma crítica. “Em 18 de junho de 1972 a publicação de um fato político começou a

instituir na esfera pública as palavras “Jornalismo Investigativo”. (LOPES, 2003, p. 13).

Era o início do Caso Watergate, que culminou com a queda do presidente Richard

Nixon, em agosto de 1974.

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A história dos Caso Watergate é contada por Lopes (2003). O caso trata-se

da prisão de cinco homens na noite de 16 de junho de 1972. Eles estavam tentando

instalar aparelhos de espionagem no comitê do Partido Democrata, no Edifício

Watergate, em Washington. A investigação realizada pelos jornalistas Carl Bernstein

e Bob Woodward chegou à Casa Branca.

No dia 21 de março de 1973, um dos cinco detidos, James McCord enviou ao

juiz John Sirica, uma carta com acusações. Os jornalistas do The Washington Post

sabiam que James McCord era um consultor de segurança da CIA (Agência Central

de Inteligência), oficial da reserva, e coordenador de segurança do comitê para a

reeleição do presidente Richard Nixon, que, com a imagem abalada, pediu demissão.

O Caso Wategate criou um precedente ao mostrar, como fundamentais, alguns princípios que afetavam diretamente o papel que devia caber à imprensa: não se limitar a ser meramente intermediária entre os canais oficiais e a opinião pública, reproduzindo releases ou comunicados. Mais do que isso: a imprensa tinha que começar a questionar as versões oficiais dos acontecimentos. Era preciso instalar a dúvida na informação oficial e, sobretudo, indagar em todas as ocasiões os fatos que ficavam ocultos. (LOPES, 2003, p. 10).

Lopes (2003) destaca que a partir deste caso, a lição aprendida pelos

jornalistas foi a de que era fundamental ver as informações com diferentes ângulos.

Ainda segundo Lopes (2003, p. 11), “É fundamental que o jornalista

investigativo tenha senso de busca da verdade, da justiça e do equilíbrio. É importante

também que tenha o desejo de ver as coisas se realizarem, terminarem”. O autor,

porém, destaca que, para tanto, para atingir tais características, é necessário trabalhar

durante um bom tempo, sem esquecer dos aspectos legais e éticos, que devem guiar

uma reportagem investigativa.

O repórter Caco Barcelos, um dos pioneiros no Jornalismo Investigativo no

Brasil, no artigo Jornalismo Ativo (2003), ressalta que o conceito de Jornalismo

Investigativo sempre foi alvo de controvérsias. Para Caco, por vezes, o Jornalismo

Investigativo pode ser confundido com o que ele chama de “jornalismo de dossiê”,

onde o repórter recebe documentos sobre algum assunto, checa e logo publica.

Segundo ele, isso não é jornalismo Investigativo, pois o repórter não investigou.

Diferentemente de Caco, Siqueira (2005) afirma que o jornalismo

investigativo tornou-se conhecido pela sociedade por realizar a reconstrução de

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acontecimentos importantes, mostrar injustiças e também a corrupção. Para o autor,

o jornalismo investigativo é um prestador de serviços à sociedade.

De acordo com o autor Leandro Fortes, em seu livro Jornalismo Investigativo

(2005), o termo “jornalismo investigativo” pode soar redundante, tendo em vista que

todo jornalismo deve ser investigativo. “De fato, até o surgimento das facilidades das

ferramentas eletrônicas de busca, toda apuração, por mais simples que fosse, tomava

ares de investigação”. (FORTES, 2005, p. 09).

Compartilhando da ideia de Fortes (2005), o jornalista e autor Ricardo Noblat,

em seu artigo Sem investigação não há jornalismo (2005), sintetiza que todo

jornalismo pressupõe investigação. “[...] denunciar um escândalo ou um erro, contar a

história de um acidente de carro ou de uma eleição fraudada, exige investigação. E

exaustiva, muitas vezes. Claro, se quisermos fazer um bom jornalismo”. (NOBLAT,

2005, p. 81).

Sobre essa ideia de redundância do termo Jornalismo Investigativo, Carvalho

et. al. (2010, p. 78) defendem “[...] que o termo diz respeito ao tipo de reportagem que

vai além do relato dos fatos e revela algo até então escondido”.

Os autores ainda destacam que a reportagem investigativa, principalmente na

TV, é considerada um trabalho arriscado, pois se compara a um trabalho de

investigador, pois é necessário levantar dados e informações para se apurar e

produzir a reportagem. Além disso, outra parte arriscada da investigação é a

constatação, onde, muitas vezes, o repórter é incumbido de se infiltrar em lugares

perigosos e também a se relacionar com pessoas que vivem em situações à margem

da lei.

Segundo Fortes (2005), a disposição pessoal do jornalista em investigar deve

ser pautada pelo bom senso. “A busca enlouquecida pela verdade, por mais digna e

respeitável que seja, não pode tomar o lugar da responsabilidade profissional, muito

menos expor um repórter à sandice de criminosos”. (FORTES, 2005, p. 73).

Sobre esse trabalho arriscado e essa exposição na qual o repórter se submete

em uma investigação, é importante sempre evidenciar o chamado Caso Tim Lopes,

que culminou com a morte do repórter, um dos mais expoentes do jornalismo

investigativo. De acordo com Fortes (2005), o caso, além de envolver a morte do

jornalista, também serviu como a abertura de uma discussão acerca dos limites de

uma investigação.

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Tim Lopes era um renomado jornalista investigativo da TV Globo, tendo

conquistado até mesmo o primeiro Prêmio Esso de Telejornalismo, após uma série de

reportagens intitulada “Feira de Drogas”.

Conforme Fortes (2005), o assassinato de Tim Lopes, aos 51 anos, por

traficantes do Rio de Janeiro, sensibilizou a classe de jornalistas brasileiros a

pensarem sobre os riscos da ousadia e ambição dos repórteres na execução de uma

reportagem investigativa.

Além do emblemático Caso Tim Lopes, ao falarmos de jornalismo

investigativo, também se faz necessário voltar ao passado e relembrar um caso na

qual expôs erros irrelevantes da imprensa brasileira na apuração e condução da

investigação: o Caso Escola Base.

Fortes (2005, p. 40) classifica o caso como a “[...] mais emblemática tragédia

da imprensa brasileira.

[...] a mídia paulistana denunciou, em março de 1994, seis pessoas por envolvimento no abuso sexual de crianças da Escola Base, no bairro Aclimação, em São Paulo. Baseou-se em fontes oficiais (polícia e laudos médicos) e em pessoas próximas às crianças (pais de alunos). O fato simplesmente não existiu, mas a mídia, em vários momentos e veículos, exagerou e liquidou projetos profissionais e pessoais dos acusados, todos mais tarde inocentados. (FORTES, 2005, p. 40 e 41).

Ainda segundo Fortes (2005), o caso tomou grandes proporções por meio de

uma apuração imprecisa, o que revelou uma sucessão de erros tanto da polícia,

quanto da imprensa.

Segundo Carvalho et. al. (2010, p. 78), “[...] o jornalismo investigativo é a

“menina dos olhos” dos veículos de comunicação, em especial nas emissoras de TV”.

Conforme os autores, matérias desse gênero sempre registram índices elevados de

audiência.

Entretanto, Carvalho et. al. (2010) alertam que uma matéria investigativa

necessita de tempo para produção. Se não houver tempo disponível, pode haver o

risco de ser impreciso nas informações.

Nesse ponto, o autor Sérigio Buarque de Gusmão, em seu livro Jornalismo de

Investigação: o Caso Quércia (1993), destaca que, por vezes, a imprensa do Brasil é

incompetente no jornalismo de investigação. Gusmão (1993) é categórico ao dizer que

a imprensa comete erros amadores no procedimento de filtrar quem vai absolver sem

provas ou condenar sem o devido julgamento.

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O autor Diego Escosteguy, em seu artigo intitulado Encruzilhada (2005),

compartilha da opinião de Gusmão (1993) ao dizer que o jornalismo em si vive uma

crise devido aos problemas econômicos e também ao que ele classifica como

incompetência das empresas de comunicação. Por esse motivo, Escosteguy (2005)

afirma haver uma escassez de reportagens investigativas no Brasil.

Conforme Fortes (2005), nem todas as grandes reportagens são, de fato,

investigativas, mas, mesmo assim, alguns veículos e, principalmente, os jornalistas

imprimem a estas matérias o selo do jornalismo investigativo.

Não é por outra razão que o conceito de investigação jornalística no Brasil está atrelado a escândalos e denúncias, quando se sabe que a maioria dessas matérias nasce do repasse puro e simples de informação, muito mais um mérito das fontes do que, propriamente, do repórter. O que antes era a busca pelo furo passou a ser uma corrida, às vezes desenfreada pelo rótulo. (FORTES, 2005, p. 17).

Fortes (2005) destaca ainda que a investigação jornalística possui também

algumas dificuldades. Uma das maiores, segundo o autor, encontra-se nas bases

éticas da profissão, pois tende a se aproximar de um trabalho mais policial do que do

jornalismo. “Muito se discute sobre o comportamento do jornalista diante das

circunstâncias de uma matéria que exige infiltração, dissimulação e, não raras vezes,

doses exageradas de perigo”. (FORTES, 2005, p. 19). O autor sintetiza que a

utilização de câmeras e gravadores escondidos gera um debate que, muitas vezes,

avalia o resultado, e não os meios de se chegar a ele. Segundo Fortes (2005, p. 19),

“A tentação de se descobrir a verdade, ou dela se apropriar como trunfo, pode levar

as redações a optarem por todo tipo de meio investigativo, legal ou não, graças à

velha máxima de que os fins justificam o meio”.

Lopes (2003, p. 12) ressalta que o jornalismo de investigação pode ser

definido em três caminhos básicos. São eles:

a) o jornalismo é produto da iniciativa pessoal;

b) reportagens especiais;

c) assuntos de interesse público que os investigados querem manter em

segredo.

Ainda segundo Lopes (2003), uma reportagem pode ser considerada de

investigação quando cumpre três requisitos básicos:

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a) a investigação deve ser resultado do trabalho exclusivo do jornalista, sem

a interferência ou com informações de outras áreas, como a polícia, por

exemplo;

b) o objetivo da investigação deve ser, mesmo que razoável, importante para

grande parcela da população, e não para interesses de determinados

grupos;

c) quando os investigados tentam esconder as informações do público.

“Quando há ocultação, a consciência não está tranquila”. (LOPES, 2003,

p. 12).

Partindo destas premissas, Lopes (2003) chega a um conceito de jornalismo

investigativo:

O jornalismo de investigação consiste em juntar todos os dados pertinentes, ainda mais os ocultos, para que o leitor se intere da verdade. Em vista disso, Jornalismo Investigativo pode ser definido como a busca da verdade oculta ou mesmo como uma reportagem em profundidade. (LOPES, 2003, p. 12).

Sobre os objetivos do gênero, Lopes (2003) destaca que o primeiro deles é ir

à essência das coisas, tentar responder os porquês que provocam situações na qual

prejudicam as pessoas.

Além disso, Lopes (2003) sintetiza que o Jornalismo Investigativo também se

objetiva em “[...] promover reformas; expor injustiças; desmascarar fraudes; dar a

conhecer o que os poderes públicos querem ocultar; detectar quais instituições não

cumprem seus deveres; [...] e reconstruir acontecimentos importantes”. (LOPES,

2003, p. 15).

Lopes (2003) também traz à tona as principais diferenças entre o jornalista

tradicional e o jornalista investigador. Segundo o autor, o tradicional é o transmissor

da notícia, na qual informa os fatos da atualidade a partir de uma linguagem e estrutura

pré-estabelecidas. Ao contrário, o investigador é o criador da informação.

O jornalista investigador é quem provoca a informação, é quem dá os passos necessários para a obtenção dos dados que necessita para completa-la, aquele que busca, compara e não é um mero receptor da informação. É aquele que adianta os acontecimentos. Não espera que os fatos se produzam; ele os desencadeia ou os para com sua investigação, dependendo dos fatos e do que tratam. (LOPES, 2003, p. 15).

Lopes (2003) ainda destaca que o jornalista deve sempre primar pela ética no

desenvolvimento de seu trabalho. É somente a ética que vai assegurar de que a sua

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informação é exata. Um fator fundamental é que se assegure de que não está

trazendo informações superficiais ou tendenciosas, que possam arruinar injustamente

a reputação de alguém.

De acordo com Siqueira (2005), após as empresas jornalísticas se

transformarem em indústrias da comunicação, o jornalismo investigativo, assim como

o interpretativo, começou a ter destaque. Para o autor, o jornalismo investigativo é um

novo sentido para a reportagem. Tal reportagem passa a apresentar alguns

elementos, como “[...] uma dimensão comparada, a remissão ao passado, a

interligação entre os fatos (contexto) e a incorporação do fato a uma tendência e sua

projeção para o futuro”. (SIQUEIRA, 2005, p. 62).

A partir dos conceitos levantados acerca do termo Jornalismo Investigativo,

torna-se necessário compreender o processo de produção de uma reportagem

investigativa, o que será abordado no próximo tópico.

5.2 FASES DA INVESTIGAÇÃO

De acordo com Lopes (2003), uma investigação se origina a partir do encontro

de um tema amplo. A partir daí, é necessário reunir dados que forem surgindo ao

longo do processo de apuração da informação. Além disso, é preciso pesquisar e

estudar exaustivamente os arquivos públicos, conhecendo assim os mecanismos

burocráticos onde se encontram.

Lopes (2003) destaca ainda que as investigações jornalísticas também podem

ter início a partir de avisos anônimos, contato frequente com as fontes e um fato da

atualidade.

Fortes (2005) divide o processo de investigação em algumas fases:

a) Pesquisa minuciosa sobre os fatos com olhar crítico. É importante fugir das

fontes óbvias;

b) Paciência e concentração, pois uma boa investigação requer tempo. Em

muitos casos, a informação é obtida apenas no cruzamento de alguns

documentos;

c) Insistência e perseverança, pois quem está sendo investigado jamais irá

colaborar;

d) Atenção especial a todos os documentos disponíveis, inclusive os

públicos;

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e) Entrevistas para obter o maior número possível de informações e

contradições dentro da investigação. O autor destaca a importância de se

usar um gravador para não haver contestação dos entrevistados logo

adiante;

f) Conhecimento policial básico para entender sobre investigação, seleção

de pistas, análise de provas e indícios. A partir daí tudo passa a ser uma

questão. É necessário ter boa convivência com fontes policiais;

g) Curiosidade e desconfiança devem sempre andar juntas em uma

investigação jornalística. Segundo o autor, o repórter deve sempre ser

curioso e desconfiado;

h) Discrição, pois o bom repórter deve manter-se no anonimato para garantir

uma reportagem de sucesso;

i) Checar muitas vezes as informações, principalmente aquelas que lhe

parecerem estranhas, imprecisas ou óbvias demais;

j) Liberte-se de preconceitos, pois, em uma investigação, é importante nunca

partir de princípios pessoas, religiosos ou ideológicos;

k) Possuir arquivos organizados com informações pertinentes ao tema da

reportagem;

l) Frieza, objetividade e precisão. É preciso, apesar das circunstâncias, tratar

os investigados, na medida do possível, com respeito;

m) Lealdade ao consumidor da informação, pois toda investigação deve ser

fundamentada no interesse público;

n) Coragem e responsabilidade, pois o Jornalismo Investigativo é uma

atividade de risco;

o) Respeito às fontes. É preciso preservá-las e não abrir quem são em

hipótese nenhuma;

p) Clareza e simplicidade na construção do texto e edição.

Além disso, Fortes (2005) destaca ainda que, no caso de uma investigação

jornalística, o trabalho sempre é intenso. Por isso, segundo o autor, é fundamental ter

disposição para fazer um boa reportagem, onde, por vezes, é até mesmo necessário

uma mudança na rotina.

Lopes (2003) destaca ainda que o Jornalismo Investigativo deve se preocupar

sempre em ser preciso nas informações durante todo o processo de investigação,

para que não seja transformado em mero denuncismo.

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O autor Raimundo Pereira, em seu artigo Investigar faz parte do Jornalismo

(2003), ressalta que o bom jornalista deve sempre cobrar as condições necessárias

para poder realizar a reportagem e ir a campo. Entre elas, tempo para conhecer e se

aprofundar no tema, tempo para investigar e recursos para poder realizar um bom

trabalho.

Ainda segundo Pereira (2003), dentro do processo de apuração e

levantamento de informações, o jornalista deve sempre ter a preocupação em mostrar

uma nova perspectiva ao acontecimento investigado.

O autor Antônio Carlos Fon, em seu artigo Investigação comprometida com o

interesse público (2003) enfatiza que o jornalista deve apurar certas informações

sozinho, ou seja, sem a participação do veículo de comunicação na qual trabalha,

pois, os envolvimentos políticos e econômicos podem atrapalhar e, por vezes, impedir

que a investigação seja concluída.

Fon (2003) destaca ainda existe uma confusão entre Jornalismo Investigativo

e reportagem policial. Segundo o autor, isso acontece porque, até a metade dos anos

1960, esse gênero jornalístico no Brasil estava confinado à reportagem policial.

“Somente após 1978, com a absorção das técnicas dos serviços de informação, é que

o Jornalismo Investigativo se expandiu para outras editorias”. (FON, 2003, p. 88).

Como esta monografia se objetiva em analisar os elementos do Jornalismo

Investigativo que estão presentes nos episódios do programa “Conexão Repórter”, do

SBT, apresentado pelo jornalista Roberto Cabrini, é importante evidenciar o que o

próprio Cabrini pensa sobre esse gênero jornalístico. No artigo Exercício de psicologia

e dedicação (2003), Cabrini destaca ser importante fugir das primeiras aparências da

notícia, dedicar-se, pesquisar e tratar os assuntos investigados com seriedade para

que o jornalista se torne de fato investigativo.

Cabrini (2003) ressalta que a investigação é um trabalho solitário e que, antes

de tudo, é preciso constituí-la através da conversa e saber como extrair as

informações.

Em uma reportagem investigativa, alguns recursos são utilizados. Segundo

Cabrini (2003), a câmera escondida é um recurso insubstituível na busca de provas,

principalmente na televisão, mas pondera que não pode ser utilizada para tirar a

privacidade de alguém.

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De acordo com Pena (2005, p. 201), “Investigar significa pesquisar,

confrontar, verificar, analisar, insistir. Todos esses verbos no mesmo processo de

produção jornalística”.

5.3 JORNALISMO CONVENCIONAL VERSUS JORNALISMO INVESTIGATIVO

Após conceituar o jornalismo investigativo e trazer alguns fatos históricos,

torna-se necessário diferenciá-lo do jornalismo convencional, para evidenciar as

características próprias do jornalismo investigativo. Assim, será possível analisar mais

profundamente quais os principais elementos do jornalismo investigativo estão

presentes e evidenciados nos quatro episódios do programa Conexão Repórter,

selecionados como objeto de análise da referida pesquisa.

Para a realização deste tópico da pesquisa, utilizaremos os conceitos

apresentados pelo autor Mark Lee Hunter, em seu livro A investigação a partir de

histórias: um manual para jornalistas investigativos (2009).

Mark Hunter expõe a conceituação do jornalismo investigativo e no que ele se

caracteriza frente ao jornalismo convencional:

O jornalismo investigativo envolve expor ao público questões que estão ocultas – seja deliberadamente por alguém em posição de poder, ou acidentalmente, por trás de uma massa desconexa de fatos e circunstâncias que obscurecem a entendimento. Ele requer o uso tanto de fontes e documentos secretos quanto divulgados. (HUNTER, 2009, p. 08).

Ainda sobre essa diferenciação entre o jornalismo convencional e o jornalismo

investigativo, Hunter (2009) afirma que a própria iniciativa do repórter é um dos

principais fatores que distinguem estas duas maneiras da prática jornalística, pois é a

partir da iniciativa do repórter que uma cobertura investigativa é realizada. Em

contraste, a cobertura jornalística convencional depende, quase que exclusivamente,

de materiais fornecidos pelos outros, seja pela polícia, governos, empresas, etc.

Alguns elementos e detalhes, segundo Hunter (2009), dão ao jornalismo

investigativo uma certa qualidade estética e enfatiza o impacto emocional ao

consumidor da informação.

De fato, ambas as formas de jornalismo focalizam os elementos de quem, o que, onde e quando. Mas o quinto elemento da cobertura convencional, o “por que”, torna-se o “como” na investigação. Os outros elementos são

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desenvolvidos não apenas em termos de quantidade, mas também em termos de qualidade. O “quem” não é apenas um nome ou um título, e sim uma personalidade, com traços de caráter e um estilo. O “quando” não está presente nas notícias, e é um continuum histórico – uma narrativa. O “que” não é meramente um evento, e sim um fenômeno com causas e consequências. O “onde” não é apenas um endereço, e sim uma ambientação, na qual certas coisas se tornam mais ou menos possíveis. (HUNTER, 2009, p. 08).

As principais diferenças entre o jornalismo convencional e investigativo são

evidenciadas na imagem a seguir. Cabe ressaltar que Hunter (2009) ainda sintetiza

que os dois papéis, tanto o convencional como o investigativo envolvem habilidades,

hábitos de trabalho, processos e metas diferentes.

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Figura 2: Esquema de diferenciação entre o jornalismo convencional e investigativo, desenvolvido por Mark Lee Hunter.

Fonte: HUNTER, 2009, p. 09

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O autor finaliza dizendo que as histórias que adicionam valor à sociedade

fazem a diferença. A partir do assunto investigado, a vida das pessoas pode mudar.

“[...] o jornalismo investigativo não é somente ou principalmente um produto, e sim um

serviço; e esse serviço está tornando a vida das pessoas mais fortes e melhores”.

(HUNTER, 2009, p. 10).

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6 METODOLOGIA

Para analisar quais elementos do Jornalismo Investigativo estão presentes e

como são evidenciados nas reportagens exibidas no programa Conexão Repórter, do

SBT, esta pesquisa terá como base metodológica a Análise de Conteúdo, e como

técnicas a entrevista, a revisão bibliográfica e a observação.

Através da análise minuciosa, tendo como base esse processo metodológico,

será possível perceber e compreender quais e como os elementos que caracterizam

o Jornalismo Investigativo são evidenciados no programa em questão.

De acordo com Antônio Carlos Gil, em seu livro Métodos e técnicas de

pesquisa social (1999, p. 26), “Pode-se definir método como caminho para chegar a

determinado fim. E método científico como o conjunto de procedimentos intelectuais

e técnicos adotados para atingir o conhecimento”.

Os autores Aidil Barros e Neide Lehfeld, no livro Fundamentos de Metodologia

Científica (2007, p. 01) explanam sobre a definição etimológica do termo

‘metodologia’. Segundo as autoras, a palavra “vem do grego: meta, que significa ‘ao

largo’; odos ‘caminho’; logos ‘discurso’, ‘estudo’”.

“Assim, a metodologia corresponde a um conjunto de procedimentos a ser

utilizado na obtenção do conhecimento. É a aplicação do método, por meio de

processos e técnicas, que garante a legitimidade científica do saber obtido.”.

(BARROS; LEHFELD, 2007, p. 02).

As autoras acima citadas desenvolvem um esquema, na qual explicam melhor

o conceito de metodologia:

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Figura 3: Esquema de compreensão do conceito de metodologia

Fonte: Barros e Lehfeld (2007, p. 03).

Ou seja, de acordo com Barros e Lehfeld (2007), é através do método que

podemos chegar à uma finalidade, pois é o trajeto mais organizado e sistemático.

6.1 O MÉTODO: ANÁLISE DE CONTEÚDO

Como dito anteriormente, a presenta pesquisa de utilizará da metodologia de

Análise de Conteúdo.

Para Krippendorff (1990 apud FONSECA JUNIOR, 2005, p. 280), “A Análise

de Conteúdo (AC), em concepção ampla, se refere a um método das ciências

humanas e sociais destinado à investigação de fenômenos simbólicos por meio de

várias técnicas de pesquisa”.

De acordo com Bardin (2011, p. 37), “A análise de conteúdo é um conjunto de

técnicas de análise das comunicações”. A autora, em seu livro Análise de Conteúdo,

explica que, para a organização de análise de conteúdo concisa e organizada, é

necessário passar por três diferentes fases cronológicas: a primeira fase se constitui

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na pré-análise, a outra na exploração do material, e a subsequente no tratamento dos

resultados, a inferência e a interpretação. Tais etapas serão explicadas a seguir.

6.1.1 Pré-análise

O primeiro polo cronológico da metodologia de Análise de Conteúdo se

constitui na pré-análise.

Segundo Bardin (2011, p. 125), essa é a fase de organização e “corresponde

a um período de intuições, mas tem por objetivo tornar operacionais e sistematizar as

ideias iniciais, de maneira a conduzir a um esquema preciso do desenvolvimento das

operações sucessivas, num plano de análise”.

Para Fonseca Júnior (2005), a pré-análise é a fase mais determinante e de

extrema importância na análise de conteúdo, pois vai configurar toda a organização

da análise propriamente dita.

Na etapa de pré-análise existem três tarefas que devem ser cumpridas:

primeiramente deve-se escolher os documentos que serão analisados, após deve-se

formular as hipóteses juntamente com os objetivos propostos para a análise a ser

desenvolvida e, por último, a elaboração de indicadores que irão de fato fundamentar

a interpretação final da análise. Bardin (2011) indica que tais fatores dependem uns

dos outros. Ainda segundo Bardin (2011), a etapa da pré-análise é dividida em outras

cinco atividades não estruturadas.

A primeira atividade a ser executada é a leitura “flutuante”. Bardin (2011, p.

126) diz que “consiste em estabelecer contato com os documentos e analisar e

conhecer o texto deixando-se invadir por impressões e orientações”.

A atividade seguinte é a escolha dos documentos, onde, com o objetivo

determinado, é necessário buscar os documentos que irão de fato trazer informações

sobre o problema que será analisado. A partir disso, é preciso constituir um corpus.

Segundo Bardin (2011, p. 126), “o corpus é o conjunto de documentos tidos em conta

para serem submetidos aos procedimentos analíticos”. A constituição desse corpus

origina algumas regras importantes.

A regra da exaustividade é a primeira desse grupo. Nesta regra, para Bardin

(2011), deve-se ter em mãos todos os elementos que vão constituir o corpus da

pesquisa, ou seja, nada pode ficar de fora. É uma regra rigorosa, pois não admite-se

nenhuma justificativa para que algum documento fique de fora.

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A segunda regra é a da representatividade. De acordo com Gil (1999, apud

FONSECA JÚNIOR, 2005, p. 292), “as pesquisas sociais, de forma geral, abrangem

um universo de elementos tão grande que se torna impossível considerá-los em sua

totalidade, sendo necessário trabalhar com uma amostra”. Além disso, Bardin (2011,

p. 127) afirma que “para se proceder à amostragem é necessário ser possível

descobrir a distribuição dos caracteres dos elementos da amostra”.

A regra seguinte é a da homogeneidade. Nesta regra, segundo Bardin (2011),

os documentos que foram selecionados devem ser praticamente iguais e dentro dos

critérios estabelecidos, com poucas diferenças entre si.

A última regra que compõe a atividade de escolha dos documentos é a de

pertinência Para Fonseca Júnior (2005, p. 293), “os documentos devem ser

adequados aos objetivos da pesquisa em todos os aspectos: objetivo de estudo,

período de análise e procedimentos”.

Após a fase de escolha dos documentos, a pré-análise constitui a atividade

de formulação das hipóteses e dos objetivos.

Nesta atividade, Bardin (2011), separa os conceitos referentes:

Uma hipótese é uma afirmação provisória que nos propomos verificar (confirmar ou infirmar), recorrendo aos procedimentos de análise. Trata-se de uma suposição cuja origem é a intuição e que permanece em suspenso enquanto não for submetida à prova de dados seguros. O objetivo é a finalidade geral a que nos propomos (ou a que é fornecida por uma instância exterior), o quadro teórico e/ou pragmático, no qual os resultados obtidos serão utilizados. (BARDIN, 2011, p. 128).

A quarta atividade é a chamada referenciação dos índices e a elaboração de

indicadores. Bardin (2011) classifica tal atividade como a consideração dos textos em

uma manifestação que dispõe de índices que a análise vai mostrar. O trabalho de

escolha de tais índices será basicamente em função das hipóteses, se estas forem

estabelecidas e indicadas. Para Bardin (2011, p. 130), “geralmente, certificamo-nos

da eficácia e da pertinência dos indicadores testando-os em algumas passagens ou

em alguns elementos dos documentos (pré-teste de análise)”.

A quinta e última atividade da pré-análise é a preparação do material. Bardin

(2011) explica que, como o próprio nome denota, antecedendo a análise, é necessário

preparar todo o material reunido. Junto a isso, também ocorre a edição do material.

6.1.2 Exploração do material

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De acordo com Fonseca Júnior (2005), a exploração do material:

[...] refere-se à análise propriamente dita, envolvendo operações de codificação em função de regras previamente formuladas. Se a pré-análise for bem-sucedida, esta fase não é nada mais do que a administração sistemática das decisões tomadas anteriormente. (FONSECA JÚNIOR, 2005, p. 290).

Para Bardin (2011, p. 131), “Esta fase, longa e fastidiosa, consiste

essencialmente em operações de codificação, decomposição ou enumeração, em

função de regras previamente formuladas”.

É na exploração do material que ocorre a codificação e também a

categorização.

6.1.3 Codificação

O material a ser pesquisado precisa de fato ser codificado. Essa é a fase em

que o pesquisador necessita saber a razão e o por que se analisa, além de explicar

como deve-se analisar (BARDIN, 2011). Para Fonseca Júnior (2005, p. 294), “a

codificação é o processo de transformação dos dados brutos de forma sistemática,

segundo regras de enumeração, agregação e classificação, visando esclarecer o

analista sobre as características do material selecionado”.

O processo de codificação é onde vamos definir se a análise em questão será

qualitativa ou quantitativa. De acordo com Bardin (1977, p. 114) “A abordagem

quantitativa funde-se na frequência de aparição de certos elementos da mensagem”.

Contudo, segundo Bardin (1977), a análise qualitativa é válida na elaboração de

deduções específicas sobre algum acontecimento ou inferências precisas.

Esta pesquisa será qualitativa.

6.1.4 Categorização

Para Bardin (2011), a maioria dos procedimentos da análise se organizam ao

redor de um processo de categorização.

A categorização é uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto por diferenciação e, em seguida, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com os critérios previamente definidos. As categorias são rubricas ou classes, as quais reúnem um grupo de elementos (unidades

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de registro, no caso da análise de conteúdo) sob um título genérico, agrupamento esse efetuado em razão das características comuns destes elementos. (BARDIN, 2011, p. 147).

Segundo Bardin (1988, apud FONSECA JÚNIOR, 2005):

[...] a categorização envolve duas etapas: o inventário e a classificação. A primeira consiste em isolar os elementos enquanto a segunda consiste em repartir os elementos, reunindo-os em grupos similares de forma a impor certa organização à mensagem. (BARDIN, 1988, apud FONSECA JÚNIOR, 2005, p. 298).

Bardin (1977) explica que as categorias podem ser positivas ou negativas. A

autora cita algumas qualidades que as categorias boas devem possuir:

a) Exclusão mútua: não deve haver indeterminação no momento dos

cálculos. Tal condição estipula que cada elemento não pode existir em

mais de uma divisão;

b) Homogeneidade: o princípio acima citado depende da homogeneidade das

categorias. Apenas um princípio de classificação deve comandar a

organização;

c) Pertinência: a categoria é pertinente quando está adaptada ao material de

análise que foi escolhido. Esse sistema deve contemplar as questões do

analista;

d) Objetividade e fidelidade: são princípios importantes da análise de

conteúdo. As partes de um material devem ser codificadas da mesma

maneira, mesmo sendo realizada várias análises;

e) Produtividade: quando o conjunto de categorias fornece resultados férteis

em índices de inferências, em dados exatos e novas hipóteses, ele é

considerado produtivo.

O momento mais fértil da análise de conteúdo, segundo Bardin (1988, apud

FONSECA JÚNIOR, 2005), é a inferência. Este procedimento está centrado nos

aspectos implícitos da mensagem analisada pelo aluno.

Para Bardin (1988, apud FONSECA JÚNIOR, 2005), existem muitos

processos das variáveis, que são agrupados em dois gêneros:

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a) Inferências específicas: quando é vinculada a uma situação característica

do problema investigado pelo aluno.

b) Inferências gerais: quando excede a situação específica do problema

analisado.

6.1.5 Tratamento dos resultados obtidos e interpretação

O tratamento dos resultados e a interpretação é a última fase cronológica da

análise de conteúdo. Segundo Bardin (2011) “os resultados brutos são tratados de

maneira a serem significativos e válidos”. Ainda de acordo com a autora, as

informações fornecidas pela análise se dão após os resultados serem evidenciados

das mais diversas formas. Conforme Bardin (2011), o pesquisador, tendo em mãos os

resultados significativos, pode agora propor inferências e antecipar interpretações

sobre os objetivos que ele previu no início da pesquisa ou até mesmo que digam a

propósito de novas descobertas, das quais não estavam previstas anteriormente.

Bardin (2011) porém analisa que:

Por outro lado, os resultados obtidos, a confrontação sistemática com o material e o tipo de inferências alcançadas podem servir de base a outra análise disposta em torno de novas dimensões teóricas, ou praticada graças a técnicas diferentes. (BARDIN, 2011, p. 132).

Bardin (2011) explica o esquema do desenvolvimento de uma análise a

seguir:

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Figura 4: Esquema de Bardin

Fonte: Bardin (2011, p. 132)

6.2 TÉCNICAS

Determinando como método a Análise de Conteúdo, passa-se ao processo

seguinte, que é determinar as diferentes técnicas que serão empregadas na análise

para se chegar aos objetivos. Na referente pesquisa, utilizaremos as técnicas de

revisão bibliográfica, observação e entrevista.

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6.2.1 Revisão Bibliográfica

A técnica de pesquisa bibliográfica, ou revisão bibliográfica equivale ao

planejamento inicial do trabalho de pesquisa e análise. Para a autora Ida Regina C.

Stumpf, no artigo Pesquisa bibliográfica (2005), tal processo inicia na identificação,

localização e na obtenção da bibliografia que de fato vai tratar sobre o assunto que

será analisado pelo aluno. Por fim, o aluno apresenta toda a bibliografia pesquisada

em um texto, na qual se evidenciará o pensamento dos autores estudados.

Logicamente que as ideias e opiniões do aluno são acrescidas ao trabalho,

fundamentado nas teorias pesquisadas.

Num sentido restrito, é um conjunto de procedimentos que visa identificar informações bibliográficas, selecionar os documentos pertinentes ao tema estudado e proceder à respectiva anotação ou fichamento das referências e dos dados dos documentos para que sejam posteriormente utilizados na redação de um trabalho acadêmico. (STUMPF, 2005, p. 51).

De acordo com o autor Antônio Carlos Gil, em seu livro Métodos e Técnicas

de Pesquisa Social (1999), a pesquisa bibliográfica possui uma vantagem muito

importante, que é a de permitir ao aluno pesquisador a cobertura de uma série de

fenômenos muito mais ampla e vasta do que aquela que poderia pesquisar

diretamente. O autor explica que tal importância se dá quando o problema pesquisado

requer de muitos dados, por vezes dispersos pelo espaço. Entretanto, Gil (1999, p.

66) alerta que “Estas vantagens da pesquisa bibliográfica têm, contudo, uma

contrapartida que pode comprometer em muito a qualidade da pesquisa”. O autor

afirma que certas fontes consultadas apresentam dados coletados de forma

equivocada, então, cabe ao investigador assegurar-se das condições em que os

dados foram obtidos e analisar com profundidade, utilizando também diversas fontes

para um mesmo tema pesquisado.

Segundo Stumpf (2005), o investigador precisa conhecer previamente e

revisar a literatura existente sobre o tema pesquisado e essa atividade de consulta

bibliográfica vai acompanhar o aluno e o professor durante todo o processo de

pesquisa.

Stumpf (2005) afirma ainda que para ter êxito na realização do trabalho, é

necessário fazer um planejamento minucioso de uma pesquisa bibliográfica acerca do

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assunto em questão. A autora divide essa fase em quatro partes que serão explicadas

a seguir:

A primeira parte se constitui na identificação do tema e assuntos. É nesta

etapa que o pesquisador precisa definir o tema na qual será estudado com precisão.

De acordo com a autora, torna-se necessário elaborar um rol de palavras-chaves

relacionados ao assunto em questão, na qual servirá de guia na busca por fontes

bibliográficas. Isso servirá para que o aluno direcione sua pesquisa a alguns aspectos

do tema estudado, visto que, é impossível abordar todos os ângulos em apenas um

trabalho. Para Stumpf (2005), o aluno deve trabalhar dentro do limite de espaço e

tempo.

A seleção das fontes é a segunda etapa deste processo. O estudante realizará

o levantamento bibliográfico, identificando as obras e autores que lhes servirão de

suporte à pesquisa. Segundo Stumpf (2005, p. 56), “A primeira fonte para indicar a

bibliografia pertinente ao tema escolhido é o orientador”. A autora explica que é o

professor orientador quem indicará, com mais propriedade, as fontes bibliográficas

necessárias à investigação, entretanto, o aluno não deve limitar-se apenas à essas

fontes, e sim, investigar novas atualizações para a pesquisa.

De acordo com Stumpf (2005), as fontes bibliográficas secundárias

relacionadas ao assunto abordado na pesquisa devem ser conhecidas pelo aluno

pesquisador. Tais fontes incluem somente a referência do material relacionado e/ou o

resumo do documento. A autora explica quais as principais fontes de informação

bibliográficas secundárias:

a) Bibliografias especializadas: são publicações que tem a relação de obras

publicadas sobre algum assunto, em um determinado período específico;

b) Índices com resumo: são chamados também de Abstracts, em inglês. De

acordo com Stumpf (2005, p. 57) “são um índice da literatura corrente de

artigos de periódicos, contendo a referência e o resumo de cada item”;

c) Portais: são a porta de entrada a muitos serviços e informações, até mesmo

bibliográficos. Está disponível nos sites das instituições.

d) Resumo de teses e dissertações: segundo Stumpf (2005, p. 57) “são

publicações que possuem a indicação do autor, título, orientador, ano e

universidade das dissertações e teses defendidas nos programas de pós-

graduação de uma instituição ou país”;

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e) Catálogos de bibliotecas: é a relação das obras de uma determinada

biblioteca, com entradas separadas por autor, título e também assuntos;

f) Catálogos de editoras: o pesquisador poderá consultar os catálogos de

editoras para completar sua busca. Normalmente, tais catálogos estão

disponíveis nas bibliotecas.

A etapa seguinte é a de localização e obtenção do material e se dá após a

seleção de fontes. De acordo com Stumpf (2005) o primeiro passo é realizar uma

consulta na biblioteca na qual temos acesso e ali começar a pesquisa pelo catálogo.

A leitura e transcrição dos dados é a quarta e última etapa do processo de

revisão bibliográfica. Stumpf (2005) explica que, após o aluno ter em mãos todos os

documentos, procede à leitura, determinado as prioridades e o interesse para cada

parte do trabalho. Depois de realizada a leitura, o pesquisador poderá anotar o

resultado em fichas (fichamento do material), onde deverá conter os principais dados

da obra consultada, como título, edição, local de publicação, editora, ano etc.

Stumpf (2005, p. 61) finaliza a explicação das fases do processo de revisão

bibliográfica dizendo que “a primeira vez que o aluno produz um trabalho acadêmico

seguindo todas essas etapas talvez considere o trabalho árduo e desnecessário. Mas

aos poucos, ao se familiarizar com o método e com as fontes, verá que o produto é

satisfatório”.

6.2.2 Observação

De acordo com Gil (1999), a observação é a técnica que constitui elemento

fundamental para a pesquisa. Passando pelos processos de formulação do problema,

construção das hipóteses, análise e interpretação dos dados coletados, a observação

tem um papel de extrema importância na pesquisa. Seu papel se torna mais evidente

na fase de coleta de dados.

Segundo Gil (1999):

A observação é sempre utilizada nessa etapa, conjugada a outras técnicas ou utilizada de forma exclusiva. Por ser utilizada, exclusivamente, para a obtenção de dados em muitas pesquisas, e por estar presente também em outros momentos da pesquisa, a observação chega mesmo a ser considerada como método de investigação. (GIL, 1999, p. 110).

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Conforme o autor, a técnica de observação é dividida em três diferentes

módulos: observação simples; observação participante; e observação sistemática.

De acordo com Gil (1999), a observação simples é aquela em que o

pesquisador permanece isento em relação à situação que pretende analisar,

observando tudo de maneira espontânea. O pesquisador atua como um espectador.

Ainda segundo o autor, a observação simples é executada de forma pouco

sistemática, por isso não é recomendável utilizá-la para testar hipóteses, e sim, para

estudos qualitativos, de caráter exploratório.

Sobre o segundo módulo, a observação participante, Gil (1999, p. 113) afirma

que é também chamada de observação ativa e “consiste na participação real do

conhecimento na vida da comunidade, do grupo ou de uma situação determinada”.

De acordo com o autor, neste caso, o observador passa a ter o papel de membro do

grupo, pelo menos até um determinado ponto.

O terceiro e último módulo da técnica de observação é a chamada observação

sistemática. De acordo com Gil (1999):

[...] é frequentemente utilizada em pesquisas que têm como objetivo a descrição precisa dos fenômenos ou o teste de hipóteses. Nas pesquisas deste tipo, o pesquisador sabe quais os aspectos da comunidade ou grupo que são significativos para alcançar os objetivos pretendidos. Por essa razão, elabora previamente um plano de observação. (GIL, 1999, p. 114).

Ainda segundo o autor, tal observação pode acontecer em situações de

campo ou de laboratórios e antes de coletar os dados, o aluno pesquisador elabora

um plano para organização e registro das informações obtidas no processo de

pesquisa. Antecipadamente, segundo Gil (1999), deve-se estabelecer as categorias

necessárias à análise em questão. Para isso, é necessário a realização de estudos

exploratórios, ou especialmente direcionados ao levantamento de instrumentos para

registro de dados.

6.2.2.1 Corpus da pesquisa: Programa Conexão Repórter

De acordo com os autores Martin W. Bauer e George Gaskell, no livro

Pesquisa Qualitativa com Texto, Imagem e Som: Um manual prático (2011), a palavra

corpus vem do latim, que significa corpora, ou, simplesmente, corpo.

Ainda segundo Bauer e Gaskell (2011):

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Uma boa análise permanece dentro do corpus e procura dar conta de toda diferença que está contida nele. Em resumo, embora significados mais antigos de “corpo de texto” impliquem a coleção completa de textos, de acordo com algum tema comum, mais recentemente o sentido acentua a natureza proposital da seleção, e não apenas de textos, mas também de qualquer material com funções simbólicas. Esta seleção é, até certo ponto, inevitavelmente arbitrária: a análise compreensiva tem prioridade sobre o exame minucioso da seleção. (BAUER; GASKELL, 2011, p. 45).

Para esta pesquisa, será feita a observação simples e a decupagem de quatro

episódios do programa Conexão Repórter, do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT),

selecionados pelo pesquisador, que será o corpus desta pesquisa.

O Conexão Repórter teve sua primeira edição levada ao ar no dia 04 de março

de 2010. Caracteriza-se no gênero de Jornalismo Investigativo. O programa vai ao ar

semanalmente. Inicialmente era vinculado às quintas-feiras, após o humorístico A

Praça é Nossa. Atualmente vai ao ar aos domingos, após o Programa Silvio Santos,

na faixa de 00h à 01h.

Com 60 minutos de duração cada episódio, o Conexão Repórter é produzido

e apresentado pelo premiado jornalista Roberto Cabrini, que também atua como

editor-chefe. Segundo o site da emissora, o programa tem a proposta de buscar a

verdade por meio de grandes reportagens. O nome do programa “surgiu pela

modernidade que sugere, a informação nos tempos de hoje viaja por conexões cada

vez mais velozes e sofisticadas”. (SBT, 2017)14. Para destacar o formato do programa

e a disposição de Cabrini, também é utilizado a palavra “repórter”.

O Conexão Repórter possui um diferencial em relação a outros programas do

gênero. Ele tem a capacidade de abordar vários temas diferentes. O programa busca

ser o menos engessado possível e é mais amplo. O cenário é futurista, com um pacote

gráfico que muda conforme o tema do programa.

A equipe do programa é formada essencialmente por produtores-repórteres

que não mostram o rosto devido ao caráter investigativo das reportagens. Eles

participam ativamente das reportagens.

A principal característica do programa é a exclusividade.

14 SBT. Conexão Repórter. Disponível em: <http://www.sbt.com.br/jornalismo/conexaoreporter/programa/>. Acesso em: 10 de junho de 2017.

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6.2.2.2 O apresentador: Roberto Cabrini

Francisco Roberto Cabrini15 nasceu em 3 de outubro de 1960, na cidade de

Piracicaba, interior de São Paulo. Cabrini iniciou sua carreira aos 16 anos de idade

em uma emissora de rádio e um jornal do interior. Aos 17, foi contratado pela Rede

Globo, como o repórter mais jovem do telejornalismo de uma emissora do país. Ele

começou atuando no jornalismo esportivo.

Em toda a sua carreira, Roberto Cabrini realizou a cobertura jornalística de

seis guerras internacionais: Afeganistão, Iraque, Palestina, Camboja, Caxemira e

Haiti; participou de cinco Olimpíadas e cinco Copas do Mundo; foi correspondente

internacional por oito anos – quatro deles em Londres e quatro em Nova York - além

de realizar coberturas em mais de 60 países.

Dentre as grandes investigações realizadas por Cabrini, destaca-se a

descoberta do paradeiro de Paulo César Farias, em Londres, em outubro de 1993,

após sete meses de investigação. PC Farias era o tesoureiro de campanha de

Fernando Collor de Mello nas eleições presidenciais brasileiras de 1989 e foi a peça

chave que causou o primeiro processo de impeachment da América Latina, em 1992.

Cabrini conseguiu superar até mesmo as buscas da polícia brasileira.

Ainda no currículo do repórter Roberto Cabrini, podemos destacar a mais

célebre entrevista com o presidente Fernando Collor de Mello depois do impeachment,

em 1995. O documentário se intitulou "Enigma das Alagoas". A técnica utilizada para

a entrevista gerou reconhecimento de todos veículos de comunicação. O Estado de

São Paulo o escolheu como o melhor do jornalismo da TV neste ano, a revista Veja

considerou esta como a melhor reportagem do ano.

Cabrini concluiu, ainda em 1995, o documentário "Enigma das Mil e Uma

Noites". Após vários meses no Iraque, ele conseguiu provar a existência de soldados

iraquianos que, por se recusarem a servir seu exército, tiveram suas orelhas cortadas

pelo regime de Saddan Hussein. Cabrini revelou as sequelas dos ataques com armas

químicas na cidade curda de Halabja pelas forças de Saddan Hussein. A entrada na

cidade tinha sido bloqueada aos jornalistas desde o ataque de 1988. Roberto Cabrini

realizou uma grande entrevista com o líder palestino Yasser Arafat e ainda com os

guerrilheiros preparados para o martírio, os homens-bomba recrutados para se

15 SBT. Conexão Repórter. Disponível em: <http://www.sbt.com.br/jornalismo/conexaoreporter/apresentador/>. Acesso em: 10 de junho de 2017.

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explodirem contra alvos israelenses. Ainda em 1995, Cabrini foi considerado pelo

Jornal do Brasil como o melhor repórter em atividade da TV brasileira.

Em 1996, foi o único jornalista da América Latina a cobrir a ascensão do grupo

radical Taliban no Afeganistão, fortemente apoiado pela Al Qaeda, de Osama Bin

Laden que se armou com a ajuda americana. Nessa cobertura, produziu o

documentário "Em nome de Alá", vencedor do Prêmio Vladimir Herzog de direitos

humanos no ano de 1996.

Em setembro de 1997, após uma investigação de 5 meses, localizou na Costa

Rica, na América Central, a fugitiva Jorgina de Freitas Fernandes, a maior fraudadora

da história do INSS no Brasil. Ganhou, com a reportagem, o Prêmio Previdência Social

de Jornalismo.

Ainda em 1997, produziu a reportagem "A Verdadeira História do Voo 254",

contando em detalhes o que de fato aconteceu em um dos piores desastres da

aviação brasileira, que aconteceu no dia 03 de setembro de 1989. Segundo o autor

Ivan Sant’anna, no livro Caixa-Preta: o relato de três desastres aéreos brasileiros

(2001), a reportagem de Cabrini foi ao ar no programa Fantástico, da Rede Globo. A

matéria apresentou trechos de áudios captados pela caixa-preta do avião. Eram

diálogos entre os pilotos, minutos antes da queda. Cabrini ouviu alguns passageiros

e tripulantes, inclusive Cézar Garcez, um dos pilotos e comandante do voo.

Cabrini também entrevistou o co-piloto Nilson Zille, que acusou Garcez de ter

provocado a tragédia que culminou com a morte de 12 pessoas. Garcez admitiu o

erro, mas culpou o plano de voo mal elaborado pela empresa Varig. (SANT’ANNA,

2001).

A reportagem garantiu a ele o VI Prêmio Líbero Badaró de jornalismo.

Também foi Roberto Cabrini quem noticiou, ao vivo, pela Rede Globo, a morte do

piloto Ayrton Senna em maio de 1994. Cabrini cobria o GP de Fórmula 1 de Ímola, na

Itália, e foi a Bologna acompanhar a sequência dos fatos onde entrou em plantão ao

vivo para noticiar o fato.

Em 1998, denunciou um grande esquema de venda de crianças para países

europeus no Sri Lanka, na extremidade sul do subcontinente indiano, reportagem

considerada pela Anistia Internacional uma das melhores já realizadas sobre o

assunto em toda história. Desde 2001 passou a atuar também como âncora e editor-

chefe de programas jornalísticos nas emissoras Bandeirantes, Record e SBT, onde

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retornou em 2009, onde é o editor-chefe e apresentador do programa Conexão

Repórter.

Figura 5: Logotipo do programa Conexão Repórter e o apresentador Roberto Cabrini

Fonte: Conexão Repórter, SBT

6.2.2.3 Episódios analisados

Para realizar a referente pesquisa e analisar os elementos do jornalismo

investigativo no programa, foram selecionados quatro episódios. A escolha dos

mesmos se deve a relevância do conteúdo jornalístico de cada um. São eles:

1º) Investigando Milagres: exibido em 03 de abril de 2016. Cabrini comanda

uma investigação especial sobre a história de um padre que vem sendo chamado de

"milagreiro". Padre Eugênio Maria La Barbera é apontado como alguém capaz de

fazer curas sobrenaturais, não explicadas pela medicina convencional.

2º) A Longa Noite do Inferno de Alcaçuz: exibido em 26 de março de 2017. O

episódio mostra as consequências do horror e crimes na chamada guerra no presídio

de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte. Além de ter passado a noite no pavilhão 4, local

onde ocorreram os confrontos, o repórter mostrou os diversos lados do massacre: De

um lado famílias indignadas, de outro a rigorosa postura do Estado.

3º) O Mercado Negro dos Remédios Controlados: exibido em 02 de abril de

2017. O episódio mostra o drama de pessoas que fazem uso de medicamentos

controlados e seus possíveis danos para a vida delas, além de mostrar como funciona

o mercado negro que fornece receitas e medicamentos falsos e prejudiciais à saúde.

4º) Os Filhos da Meia-Noite: exibido em 09 de abril de 2017. O episódio lembra

e mostra em detalhes e imagens as experiências de Roberto Cabrini em Halabja,

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cidade curda arrasada por armas químicas em 1988, no regime do ditador Saddam

Hussein. Cabrini foi o único jornalista da América Latina a entrar na cidade.

Para a realização do processo de decupagem dos quatro episódios

selecionados para a análise, levou-se em consideração as peculiaridades e

características do conteúdo de cada produção. Portanto, algumas cenas específicas

foram selecionadas para de fato serem decupadas, na qual os critérios de escolha

das mesmas serão explicadas previamente. As cenas selecionadas, e o tempo exato

em que ocorreram serão sinalizadas com os minutos, utilizando-se do símbolo (‘), e

com os segundos, através do símbolo (“), além de, claro, ser apresentada a

contextualização das referidas cenas. Os planos de filmagem serão descritos

conforme sua relevância para a pesquisa.

Após a decupagem de cada episódio, serão analisadas as cenas detalhadas

anteriormente. Como já foi explanado, cada documentário teve um critério específico

de escolha de cenas a serem decupadas, portanto, a análise também se dará de forma

específica para cada episódio. Essa é uma das principais fases do método de Análise

de Conteúdo de Bardin (2011), descrito especificamente na página 78 desta

monografia. Em cada cena, será analisado quais elementos do jornalismo

investigativo são evidenciados nos episódios. A base teórica desses elementos terá

como base os conceitos dos autores Lopes (2003), Fortes (2005) e Hunter (2009)

onde são precisamente descritos no capítulo Jornalismo Investigativo desta

monografia.

Todo o material pode ser visto no DVD anexado a esta monografia.

6.2.2.3.1 Investigando Milagres

O primeiro programa a ser observado é intitulado “Investigando Milagres”,

exibido no dia 03 de abril de 2016, com duração de 54’11”. Nele, Roberto Cabrini

investiga a história de padre Eugênio Maria La Barbera, considerado por muitos como

milagreiro. As cenas decupadas deste episódio abrangem a entrevista com o

personagem central, uma entrevista em apoio ao personagem (favorável) e outra

entrevista que mostre o contraponto da história (contra), além do texto de

encerramento da reportagem (conclusão).

CENA (7’12”– 7’30”)

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Contexto da cena: Plano geral de Roberto Cabrini, que está no estúdio do programa

Conexão Repórter, em pé. A câmara começa com um leve plongée, seguindo com

zoom até chegar ao plano médio do apresentador.

Roberto Cabrini (RC): Boa noite. No Conexão Repórter de hoje, a história de um

homem a quem se atribui uma série de curas não explicadas pela medicina. Entre a

ciência e a fé, onde está a verdade? Aqui Roberto Cabrini, e este é o Conexão

Repórter de hoje.

RODA VINHETA DE ABERTURA DO PROGRAMA

CENA (13’09 – 15’11”)

Contexto da cena: Imagem de uma idosa chorando, na qual assiste a um culto do

Padre Eugênio Maria La Barbera, se intercalando com a imagem do padre com a mão

sobre a cabeça de uma menina. Após, aparece a imagem de um terço, que está em

plano detalhe na mão de outra mulher. As imagens estão em câmera lenta. Na

sequência, aparecem imagens aceleradas da movimentação de pessoas no saguão

de um aeroporto, intercalando com imagens acelerados do trânsito em São Paulo.

RC: Em São Paulo, uma entrevista reveladora.

Contexto da cena: Plano geral de Padre Eugenio, que chega em uma sala para

conceder a entrevista a Roberto Cabrini. A câmera está em travelling de frente para o

padre, até que encontra e cumprimenta Cabrini. Os dois se apertam as mãos, ainda

em pé.

Padre Eugênio (PE): Boa tarde.

RC: Como vai?

PE: Tudo bom.

RC: Prazer.

PE: Prazer é meu.

RC: Pronto para responder todas as perguntas?

PE: Pronto.

RC: Pode perguntar tudo?

PE: Tudo o que o senhor quiser.

RC: Pode contestar o seu poder de cura?

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PE: Pode. Não pode contestar o Evangelho.

RC: Vamos começar então?

PE: Vamos começar.

Contexto da cena: Antes do início da entrevista de fato, aparece a imagem de uma

missa do Padre Eugênio. Ele está de frente para um homem, com os seus braços

envolvendo o corpo deste homem. Ao redor, as pessoas prestam atenção no que

acontece. Padre Eugênio fala algumas palavras para este homem. Após, mais

imagens de fiéis com fotos de parentes, na qual acompanham o culto do Padre

Eugênio.

PE: Então, agradeça a Deus e reze para a sua cura que já iniciou agora. Então, volte

trazendo certidão médica.

Figura 6: Padre Eugênio em um de seus cultos

Fonte: Conexão Repórter, SBT

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o início da entrevista.

RC: Padre Eugênio, o senhor tem o dom da cura?

PE: (antes de responder, Padre Eugênio fica alguns segundos em silêncio). Bom, eu

é...penso de ter o dom da cura no sentido que o bispo diocesano me colocou por

escrito que eu tenho este carisma de dom de cura que posso celebrar esta missa e

conduzir enfermos, como eu costumo chamar.

Contexto da cena: Enquanto Padre Eugênio responde à primeira pergunta, aparece

a imagem de um documento, na qual autoriza o padre a celebrar missas de cura na

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Diocese de Santo Amaro, datado de 1º de fevereiro de 2001 e assinado pelo Bispo

Diocesano Fernando Antônio Figueiredo. As imagens subsequentes aparecem como

plano detalhes no termo “Autorização” e na assinatura de Dom Fernando. Após,

aparecem novamente imagens de uma missa celebrada por Padre Eugênio. Ele

caminha jogando água benta nos fiéis que ali estão, que cantam louvores de igreja.

Depois, a cena retorna para a entrevista.

RC: O senhor descobriu que tinha o dom da cura aos 32 anos?

PE: Descobri como...era o dia de Páscoa e eu celebrava a missa. Duas meninas

adolescente me levaram a própria mãe para eu dar uma benção. Mas, uma coisa

simples. Eu levantei as pernas da mulher e dei uma benção, tranquilo. E, naquele

mesmo instante, essa mulher tinha chagas abertas à causa do diabetes. Estas

chagas, na minha frente, se fecharam, uma a uma. Assim começou o meu ministério

de cura.

CENA (15’24” – 18’03”)

Contexto da cena: Imagens das missas de Padre Eugênio e algumas freiras rezando.

Enquanto Cabrini explica sobre a vida do padre, aparecem imagens do mosteiro onde

ele reside.

RC: Padre Eugênio é o fundador da comunidade religiosa que lidera até hoje. Tudo

foi construído com dinheiro de uma herança de família. Ele nos mostra seu escritório.

Contexto da cena: Padre Eugênio abre a porta do seu escritório e olha para a

câmera.

PE: Olá, bem-vindo!

Contexto da cena: Cenas de alguns itens do escritório de Padre Eugênio, dentre eles,

um quadro com uma foto em que aparece o padre Eugênio junto com o Papa João

Paulo II. Na mesa, a câmera mostra alguns objetos como uma cruz e livro utilizados

em sessões de exorcismo. O padre Eugênio carrega um livro na mão, intitulado

“Celebração dos Exorcismos”.

RC: Registros de sua história. Objetos e livros usados em sessões de exorcismo, uma

de suas práticas

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Quantas pessoas o senhor já exorcizou?

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PE: Umas centenas. Nesses trinta anos, centenas de pessoas.

RC: As enfermidades estão relacionadas ao diabo? Ao demônio?

PE: Bom, isto é o que eu acredito. Que o pecado não faz mal somente à alma. Aos

poucos, mata o homem.

RC: Qual a sua definição de doença? (Trilha sonora de impacto).

PE: Doença é qualquer coisa que tenha um distúrbio no ser humano.

Contexto da cena: Neste momento, aparecem imagens de uma missa do padre

Eugênio e ele fala algumas palavras para os fiéis.

PE: Senhor Jesus está curando pessoas de sinusite, pessoas que sempre respiram

pela boca.

Contexto da cena: Padre Eugênio fala diretamente para uma fiel que está assistindo

a missa.

PE: Com o nariz, né, está respirando com o nariz, né? Amém.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Eu gostaria que o senhor falasse exatamente o que o senhor diz nessa missa

especial de cura. Como que o senhor fala? Só uma pequena parte do que o senhor

fala.

PE: Não sei. Pessoas que o Senhor Jesus está tocando o joelho, pessoas que não

podem se ajoelhar, pessoas que tem problema no joelho, agora, esta dor que está no

joelho, passou por completo.

RC: E o senhor viu isto acontecer muitas vezes?

PE: Eu vi isto acontecer sempre, não muitas vezes, sempre.

Contexto da cena: Padre Eugênio está celebrando uma missa.

PE: O Senhor Jesus está curando joelhos.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: O senhor já viu cegos voltando a enxergar pelo seu dom?

PE: Sim.

RC: Surdos voltando a ouvir pelo seu dom?

PE: Sim.

RC: Pessoas com câncer que se curaram?

PE: Não sei.

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RC: O senhor já viu pessoas condenadas pela ciência, pela medicina, que o senhor

curou? Isso já aconteceu?

PE: Sim, aconteceu, e sem eu proclamar a cura.

RC: Segundo o que o senhor diz, quem cura é o poder de Jesus Cristo?

PE: Sem dúvida.

RC: E qual é a sua função nessa cura? (Trilha sonora de impacto).

PE: É de rezar por estas pessoas.

Contexto da cena: Novamente aparece a imagem de padre Eugênio Celebrando uma

missa.

PE: Senhor Jesus Cristo, nosso filho, nosso irmão, na unidade do Espírito Santo.

Contexto da cena: Na sequência, aparece a imagem de Cristo morto na cruz, de

dentro da igreja. Após, aparecem imagens das pessoas com as mãos levantadas,

cantando músicas sacras em uma missa celebrada pelo padre Eugênio, que no palco,

levanta a imagem de Nossa Senhora. Os rostos de algumas pessoas aparecem em

close, muitos com os olhos fechados e cantando.

RC: Durante meses acompanhamos as tais missas de cura, ouvimos histórias,

conhecemos os dramas de frequentadores.

CENA (22’47” – 23’50”)

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Padre Eugênio, o senhor tem consciência de que toda pessoa que afirme ter o

dom da cura por meios que não sejam os da medicina, pode ser questionada? O

senhor tem consciência disso?

PE: Sem dúvida, porque a fé pode ser questionada.

RC: Até que ponto o senhor é um charlatão? Até que ponto o senhor tem mesmo o

poder da cura?

PE: Então, é aquilo que eu disse. Até que o Senhor me mostra que as pessoas são

curadas quando eu falo. Este dom pode ser temporário ou pode ser para toda a vida,

este carisma. São Paulo fala que pode ser ou temporário ou por toda a vida.

RC: Padre Eugênio, muitas pessoas o procuram buscando a cura. O senhor ganha

dinheiro com isso?

PE: Não. E nunca ganhei dinheiro.

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RC: A pessoa tem que pagar?

PE: Não.

RC: Não?

PE: Não.

RC: O senhor não ganha dinheiro com esse dom?

PE: Não. Seria um pecado mortal se fizesse uma coisa dessas. Não se vende a graça

de Deus, pelo amor de Deus.

CENA (26’33”– 40’56”)

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Por que o senhor foi o escolhido para ter esse dom da cura?

PE: Porque o Senhor escolhe os mais imbecis para proclamar o reino de Deus (risos).

RC: E o senhor já parou para pensar da razão de ter sido escolhido para essa missão?

PE: Eu acho porque eu sou meio bobinho (risos). O Senhor escolhe como escolheu

doze pescadores, assim, o Senhor continua escolhendo pessoas comuns, normais,

com todos os seus pecados, seus defeitos, mas que tem essa vontade de viver com

o Senhor.

Contexto da cena: Uma idosa chora. Ela está enquadrada em primeiro plano, em

câmera lenta, mostrando claramente suas lágrimas. Após, um plano conjunto de

pessoas assistindo a missa de padre Eugênio. A maioria está com os braços

levantados. A imagem em seguida é da mão direita do padre Eugênio, em plano

detalhe, enquanto celebra a missa. As imagens são acompanhadas de uma trilha

sonora triste. Após, a cena volta para Roberto Cabrini e Padre Eugênio, que estão

sentados, frente a frente, para o prosseguimento da entrevista.

RC: Se eu tivesse uma doença incurável por exemplo, como é que o senhor me

curaria? Como é que seria mais ou menos?

PE: Eu não curaria nada. Eu venho e dou a unção dos enfermos, que é um

sacramento da igreja, e rezo para que o Senhor possa curá-lo. Depois, se o senhor

curado, amém, agradecemos a Deus. Se não é curado, amém igualmente. Se cumpre

a vontade de Deus. Eu não sou um Deus.

RC: Qualquer doença pode ser curada pelo seu dom? (trilha de impacto)

PE: Qualquer doença pode ser curada por Deus, porque Deus pode tudo.

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Contexto da cena: Cenas da cidade de São Paulo, com imagens aceleradas. Um

carro chega em uma empresa. Um senhor sai dele e sobe uma escada.

RC: São Paulo.

Contexto da cena: O empresário Alfredo Teixeira sobe todos os degraus da escada

e chega ao topo. A câmera corta para a chegada dele, mostrando-o de frente. Após,

ele explica como era fazer aqueles movimentos antes de, supostamente, ter recebido

a cura do padre Eugênio.

Alfredo Teixeira (AT): Essa parte era a parte mais difícil, esse movimento aqui de

forçar a coluna, então eu sentia muita dificuldade, né. Não conseguiria fazer. Hoje,

isso aqui faz parte do meu dia a dia, onde eu armazeno os vinhos aqui nesse

armazém.

Contexto da cena: As imagens anteriores são mescladas com outras dele

caminhando dentro da empresa, pegando e abrindo caixas com litros de vinhos.

RC: Ele agora sobe escadas, carrega caixas de vinho. Antes, mal podia andar.

AT: Essa cura é Deus. É Deus que, através das mãos ungidas do padre Eugênio, que

me fez eu estar aqui, bem, para poder trabalhar, que é minha paixão. Minha família,

meu trabalho, e faço com muito amor e com muita dedicação.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Alfredo Teixeira estão sentados, frente a frente,

para a entrevista.

RC: Seu Alfredo, o senhor acredita em milagres?

AT: Sim.

RC: O senhor considera que foi curado pelo padre Eugênio?

AT: Totalmente.

RC: O senhor não tem nenhuma dúvida disso?

AT: Absolutamente, nenhuma. (com sinal de negativa com a cabeça).

RC: O senhor apresentava um quadro sério, grave de hérnia de disco?

AT: Sim, eu tive uma infelicidade que eu até peço que não façam isso. Foi uma

brincadeira de piscina. Eu mergulhei para derrubar o meu sobrinho, de 120 quilos, e,

no momento em que ele se movimentou, fugindo da brincadeira que eu queria

derrubá-lo, aí da piscina eu já saí carregado.

RC: Que limitações o senhor tinha?

AT: Ah, eu não conseguia urinar em pé, só pra ter uma ideia Cabrini. Eu urinava que

nem uma mulher, sentava no vaso porque não aguentava cinco segundos em pé.

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Contexto da cena: Imagens em movimento de dentro do carro mostrando uma rua,

até chegar à porta da garagem da casa de seu Alfredo.

RC: Vamos até a casa para acompanhar Seu Alfredo em visita ao médico.

Contexto da cena: Seu Alfredo abre a porta de sua casa e olha para a câmera,

convidando para entrar.

AT: Boa tarde! Sejam bem-vindos! Vamos entrando.

Contexto da cena: A esposa de Seu Alfredo, Maria de Fátima Teixeira, está na

cozinha fazendo um café.

Maria de Fátima Teixeira (MT): Nessa época, eu trabalhava, tinha uma empresa

também, paralelo ao trabalho dele. E, o que que acontecia é que eu tinha que conciliar

as duas coisas porque ele não conseguia dirigir.

Contexto da cena: Seu Alfredo e sua esposa olham um exame de raio-X.

MT: E com esse exame, nós passamos por três médicos, todos indicavam cirurgia.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Alfredo Teixeira estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Que dia o senhor decidiu buscar o padre Eugênio?

AT: Ah, foi num dia em que eu estava muito...com uma crise muito forte, inclusive a

Fátima, minha esposa, me ajudou a conduzir até o local.

RC: Pela gravidade do seu caso?

AT: Pela gravidade do meu caso.

RC: O senhor estava há poucos dias da cirurgia?

AT: Praticamente, eu teria que partir dali há duas semanas.

Contexto da cena: Close na imagem de Cristo na cruz. Em seguida, aparece o padre

Eugênio passando a mão sobre o rosto de uma criança que está no colo de sua mãe.

A imagem é intercalada com o plano detalhe das mãos do padre Eugênio fazendo o

sinal da cruz de frente para o rosto de um homem que assiste a sua missa e, após,

no rosto da criança. Roberto Cabrini e Alfredo Teixeira estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: O que que o senhor sentiu exatamente?

AT: A única coisa que eu lembro, assim, na minha memória, que eu consegui, depois

que ele fez a unção, depois que eu consegui caminhar com ele, ele me abraçou e foi

andando. Eu sentei. A minha primeira atitude foi ajoelhar, eu fiquei ajoelhado, nunca

me esqueço, no pedrisco, por um bom tempo. Eu não senti nada de dor ou de alguma

coisa que me desconfortasse.

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RC: O senhor sentiu que estava sendo curado?

AT: Senti.

RC: De que forma?

AT: Senti da forma fisicamente. Aquelas dores mais intensas, elas foram diminuindo,

foram amenizando.

RC: Isso num período de quanto tempo?

AT: No período imediatamente quando o padre Eugênio se dirigiu a mim.

RC: O que que o senhor recorda do padre Eugênio naquele dia? Da expressão dele,

do que ele falava.

AT: Foi um sorriso. Isso (Alfredo começa a chorar). Eu tenho a imagem dele sorrindo

na minha frente. Foram alguns flashes de algumas coisas, e caminhando na...

RC: O que que veio à mente agora?

AT: É complicado, desculpa (Alfredo continua emocionado). É que a gente volta a

situação de momento.

RC: Compartilhe isso com a gente.

AT: Então é, é assim, (Alfredo enxuga as lágrimas) as lágrimas são de alegria, não

são de tristeza, são de gratidão a Deus e através do padre Eugênio.

RC: O senhor tá resgatando a emoção que o senhor sentiu naquele dia?

AT: Sim.

RC: Como é que é?

AT: Ah, é maravilhosa. É maravilhosa.

RC: Como é que o senhor compara isso?

AT: Não tem comparação, não dá pra comparar, não dá pra explicar com exatidão,

com coisas físicas, né. Então, são coisas muito grandiosas, que não tem dimensão.

Eu diria que não tem dimensão.

Contexto da cena: Imagens do padre Eugênio conduzindo uma missa, levantando

uma cruz. Em câmera lenta e planos em detalhe, pessoas mostram fotos de parentes

na missa. Uma mulher chora. Roberto Cabrini e Alfredo Teixeira estão sentados,

frente a frente, para o prosseguimento da entrevista. Cabrini pede para seu Alfredo se

levantar e mostrar que está curado.

RC: Neste instante, o senhor está sentindo dor?

AT: Nada.

RC: O senhor consegue se levantar normalmente? Pode ficar de pé?

AT: Olha, eu levanto sem o apoio das mãos.

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RC: Posso ver?

AT: Que é o processo mais complicado pra forçar a coluna ‘éle’ (L) quatro.

Contexto da cena: Seu Alfredo levanta do sofá sem o apoio das mãos.

AT: Levanto.

RC: O senhor não fazia isso antes?

AT: Cabrini, eu estou um pouquinho pesado. (risos)

RC: Sim, mas o senhor não fazia isso antes?

AT: Não fazia. Não conseguia fazer o movimento de fazer xixi em pé. Eu tinha que

sentar porque...

RC: O senhor não tem limitações mais?

Contexto da cena: Seu Alfredo gira o corpo de um lado para outro.

AT: Não, não tenho mais limitações de, de...

RC: O senhor fica com uma perna só se precisar?

AT: Sim, totalmente.

Contexto da cena: Seu Alfredo levanta a perna para comprovar que fica em pé com

apenas uma perna.

RC: O senhor está curado? O senhor se sente assim?

Contexto da cena: Seu Alfredo abaixa o corpo e tenta juntar as mãos com os pés.

AT: Esse movimento aqui ó...Isso aqui.

RC: Não fazia antes?

AT: Isso aqui era o movimento mais, mais terrível de dobrar a vértebra.

Contexto da cena: Seu Alfredo força a coluna para trás.

AT: Ou fazer esse aqui, jogar aqui pra trás. Então aí era morfina (risos).

RC: Então perguntando assim, olho no olho, padre Eugênio tem o dom da cura?

AT: Sim.

RC: Sem qualquer dúvida?

AT: Mas nenhuma dúvida. Nenhuma dúvida. Isso, eu me coloco como testemunha

viva de um fato. Isso é um fato.

Contexto da cena: Imagem de um exame do seu Alfredo. Após, ele parece estar

lendo o exame ao lado de sua esposa, Maria de Fátima. O rosto de seu Alfredo

aparece em close, à direita do vídeo em ¾. A imagem é desfocada e, ao fundo,

aparece uma imagem de Cristo na cruz, que está pendurada na parede.

RC: Chega o momento de ciência e fé serem então confrontadas

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Contexto da cena: Seu Alfredo está ao lado de sua mulher em pé e, na mão, segura

um CD na qual está gravada a sua ressonância magnética.

AT: E esta semana, depois de quatro anos, eu fiz a segunda ressonância. Como eu

estava bem, não achava necessidade pra ver, porque eu não tinha dúvida quanto à

benção que eu recebi. Aí o doutor Paulo não, pra tirar a dúvida então vamos fazer

uma nova ressonância. A parte religiosa eu não tenho dúvida nenhuma, agora a parte

física, os fatos, eu vou ver com o doutor Paulo.

Contexto da cena: Com o exame em mãos, Seu Alfredo dá um beijo na esposa e sai

de casa, rumo ao médico. Quando a porta se fecha, novamente a câmera direciona

ao crucifixo que está preso na parede, em cima da porta. O carro sai da garagem. A

cena, até então externa, se intercala com a imagem dentro do carro, onde Seu Alfredo

dirige normalmente. A câmera também mostra ele pisando na embreagem, em plano

detalhe.

RC: Durante o trajeto, Seu Alfredo dirige sem nenhuma dificuldade, uma atividade que

antes era impensável.

AT: A minha dificuldade maior era dirigir, porque a utilização da embreagem, meu

carro não é automático e não era também na época, primeira e segunda (marchas).

A minha esposa, Fátima, me ajudou muito nesse período.

Contexto da cena: Imagem externa do veículo chegando ao consultório. O carro para

e Seu Alfredo sai do veículo. Ele caminha até o consultório, até chegar na porta. O

doutor Paulo Miyagi a abre e o cumprimenta. Seu Alfredo entra no consultório.

Doutor Paulo (DP): Seu Alfredo. Bom dia!

AT: Ôh doutor Paulo, tudo bem?

DP: Vamos entrando, por favor.

AT: Dá licença.

Contexto da cena: Doutor Paulo retira do envelope os exames de raio-X da coluna

de Seu Alfredo e os analisa, colocando-os no negatoscópio.

RC: O doutor Paulo discute sobre o quadro clínico de Seu Alfredo.

Contexto da cena: No consultório, Seu Alfredo está sentado no sofá e ouve o doutor

Paulo, que está sentado em uma cadeira bem à sua frente.

DP: Provavelmente, Seu Alfredo já...passando em dez médicos, provavelmente nove

ortopedistas indicariam o tratamento cirúrgico em decorrência do exame clínico e do

exame radiológico que ele apresentava no início dos sintomas.

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Contexto da cena: Com uma caneta na mão, doutor Paulo aponto para alguns pontos

do exame de raio-X de Seu Alfredo, na qual está no negatoscópio. Após, aparece Seu

Alfredo prestando atenção, atentamente.

RC: O ortopedista e acupunturista une as terapias à fé de Seu Alfredo.

Contexto da cena: Aparece o rosto de Seu Alfredo. Ele está emocionado, com os

olhos com lágrimas. Ele se levanta e mostra como chegou à primeira vez ao

consultório e depois se senta novamente.

AT: Fico emocionado porque eu entrei aqui é, assim, curvado, praticamente todo torto,

e aí quando o doutor Paulo começou o tratamento da acupuntura, eu já sai daqui com

uma melhora e sempre tendo fé no trabalho, e confiando no trabalho do doutor Paulo,

muito, com muita confiança.

Contexto da cena: Em câmera lenta, Seu Alfredo enxuga as lágrimas. Após, ele

entrega o CD ao doutor Paulo. Nele está gravado a nova ressonância magnética.

Doutor Paulo o coloca na bandeja do computador.

AT: Estou trazendo o resultado depois de quatro anos. Essa é a ressonância atual.

Contexto da cena: Close no rosto de Seu Alfredo.

RC: O antes.

Contexto da cena: Doutor Paulo e Seu Alfredo estão sentados, frente a frente. O

doutor Paulo solicita os exames antigos de Seu Alfredo. O Doutor levanta e Seu

Alfredo os entrega. Eles estão em um envelope.

DP: Vamos ver os seus exames Seu Alfredo? Iniciais.

Contexto da cena: O doutor Paulo retira os exames de raio-X do envelope e os coloca

no negatoscópio. A imagem seguinte mostra um plano detalhe do ponto da coluna de

Seu Alfredo, onde o doutor Paulo aponta com a caneta os pontos que até então tinham

problema.

DP: Visualizamos o disco com problema, com a desidratação, com a perda da altura

e obstruindo para fora, comprimindo a medula, gerando sintomas no paciente.

Contexto da cena: Seu Alfredo olha para o negatoscópio e depois senta e fica

novamente frente a frente com o doutor Paulo.

RC: E o depois.

Contexto da cena: A imagem seguinte mostra um plano detalhe do ponto da coluna

de Seu Alfredo, onde o doutor Paulo aponta com a caneta os pontos que foram

resolvidos.

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DP: Sua medula totalmente livre, compatível com o quadro clínico que o senhor tem

hoje, que é assim, nenhum sintoma de dor, nenhum déficit neurológico, estando muito

bem clinicamente.

Contexto da cena: Doutor Paulo está à direita do vídeo. À esquerda está a tela do

computador com a imagem do raio-X.

DP: Dificilmente eu encontro uma regressão tão benigna e tão favorável quanto a do

Seu Alfredo. Digamos assim, de uns dez casos do Seu Alfredo, se eu encontrei mais

um ou dois com uma regressão, assim tão impressionante, seria muito.

Contexto da cena: Close na imagem do novo exame de raio-X do Seu Alfredo. A

imagem retorna para o doutor Paulo.

DP: Tudo aquilo que, do ponto de vista espiritual, energético ou na crença do paciente,

que for algo que seja favorável ao tratamento, eu acho que deve se somar aquilo que

possa favorecer o paciente.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Seu Alfredo estão no estúdio, com fundo preto.

Os dois estão de pé, frente a frente.

RC: O senhor acha que foi curado por uma ação sobrenatural?

AT: Sobrenatural, através da unção das mãos do padre Eugênio. Então é Deus, as

mãos do padre Eugênio, ok? E, lógico, a parte científica não podemos descartar.

Fisioterapia, esse tratamento.

RC: Padre Eugênio não é um charlatão?

AT: Padre Eugênio? Se alguém chamá-lo de charlatão, eu vou ficar muito irritado. Não

me queira ver irritado.

Contexto da cena: Cenas do padre Eugênio celebrando uma missa e proclamando

algumas palavras para os fiéis que ali estão. As imagens são intercalas com outras

imagens da missa, com o padre Eugênio passando as mãos nas costas de um

homem, e ajoelhado de frente para duas pessoas que estão sentadas.

RC: Um padre reverenciado, reconhecido por quem acredita em suas curas,

questionado por quem apenas enxerga as mesmas curas como obra da mente

humana.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Alfredo Teixeira estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: No seu dicionário padre Eugênio, não existe doença incurável?

PE: Sim, eu vi, porque meu pai morreu de câncer nos ossos e a minha mãe morreu

de leucemia, então...

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RC: O senhor não conseguiu curá-los?

PE: Não, eu rezei, mas morreram.

RC: O senhor tentou?

PE: É?

RC: O senhor tentou?

PE: Não, quando morreu minha mãe, eu tinha 18 anos, não tentei nada. Quando

morreu meu pai, eu rezei para que...

RC: O senhor tentou curá-lo?

PE: Que Deus o curasse, mas Deus não o curou.

RC: O que ele tinha?

PE: É... câncer nos ossos.

RC: O senhor ficou decepcionado pelo fato de o senhor não conseguir curar o seu

próprio pai?

PE: Não, não fiquei decepcionado.

RC: O senhor chegou a questionar Deus? Por que seu pai não pôde ser curado?

PE: Sem dúvida, eu dizia: Senhor, eu vi tantas curas, e por que não pode ser curado

também meu pai?

RC: Deus deu respostas ao senhor?

PE: Sim.

RC: Qual foi a resposta?

PE: Que não curou. Então, foi o melhor para o meu pai, porque Deus quer o melhor

para os seus filhos, isto aí eu tenho certeza absoluta, que Deus quer o melhor para os

seus filhos.

RC: O seu poder pode vencer a morte?

PE: O meu poder não, eu não tenho este poder.

CENA (42’00”– 46’03”)

Contexto da cena: Nesta parte, Cabrini mostra uma história na qual a cura realizada

pelo padre Eugênio não deu certo. Uma fotografia do rosto de Seu Emílio Pintor

Pegoraro aparece na tela. Após, aparece o rosto da viúva, Eunice de Jesus Pintor

com semblante emocionado. Na sequência, aparecem imagens do padre Eugênio

fazendo o sinal da cruz de frente para o Seu Emílio e também colocando a mão sobre

a barriga dele.

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RC: Maio de 2015. Um câncer devastador e Seu Emílio não resiste. Ele participou três

vezes dos cultos de padre Eugênio.

Contexto da cena: Dona Eunice de Jesus Pintor está sentada no sofá da sala de sua

casa, ao lado de sua filha, Estela Pintor Pouseiro, que está abraçada à sua mãe.

Eunice de Jesus Pinto (EJ): É que nem eu sempre falo, ele não recebeu a cura física

né, do corpo, mas recebeu da alma né, do espírito.

Contexto da cena: As imagens do padre Eugênio juntamente com Seu Emílio são

mostradas novamente.

Estela Pintor Pouseiro (EP): Ele teve uma cura espiritual, ele mudou muito, não tem

como. Se você perguntar para qualquer pessoa, vai descrever o meu pai como

nervoso, bruto, e quando ele se se foi, ele se foi uma outra pessoa.

Contexto da cena: Imagens de um vídeo que Seu Eugênio gravou enquanto estava

internado no hospital. A cena se intercala com fotografias do casal Emílio e Eunice e

depois da família, com os dois filhos do casal.

Emílio Pintor Pegoraro (EM): Beijinho e um beijão.

RC: Seu Emílio deixa a esposa, Eunice, e dois filhos, Estela e Serafin, que se ordenou

padre no mesmo mosteiro frequentado pelo pai.

Contexto da cena: Dona Eunice e a filha, Estela, estão em um estúdio escuro, frente

a frente com Roberto Cabrini, para o início da entrevista.

RC: Vocês acreditavam piamente que o padre Eugênio poderia trazer a cura ao Seu

Emílio?

EJ: Acreditava sim, porque eu mesmo já vi muitas curas acontecendo lá na missa do

padre Eugênio, porque também, além do meu filho ser padre lá, eu também ajudo na

missa de cura, né.

EP: Sim, sim.

RC: Por que vocês acreditavam que o padre Eugênio poderia curar o que a medicina

não conseguia?

EJ: Porque eu acredito muito em Deus, né. Pra Deus nada é impossível, então a gente

achava que Deus ia fazer a cura nele.

EP: Pela fé.

RC: Vocês acreditavam mais na ação do padre Eugênio do que na própria medicina?

EJ: É, não é bem assim né.

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EP: É que a medicina, no caso do meu pai, não podia fazer muita coisa. Meu pai, ele

ia fazer uma quimioterapia paliativa. Ele não tinha perspectiva de nada. Somente Deus

podia fazer alguma coisa por ele.

RC: A cura não aconteceu. O Seu Emílio faleceu.

EJ: Sim.

RC: Diante disso, como é que vocês veem a ação do padre Eugênio?

EP: Da mesma maneira.

RC: Vocês ficaram decepcionadas?

EP: Não.

EJ: Não.

EP: Eu acredito que Deus olhou para a doença dele e ajudou meu pai a enxergar a

doença dele e, por mais que ele não falasse, mas dentro dele ele sabia que ele não

ia sobreviver, porque quando eu fiquei grávida eu falei pra ele e ele falou – Espero

que eu consiga conhecer sua filha, seu filho.

RC: O fato do Seu Emílio não ter sido curado não significa necessariamente que a

ação do padre Eugênio tenha sido um fracasso?

EP: Não.

EJ: Não, não.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Por que algumas pessoas alcançam a cura e outras não?

PE: Isso aqui é uma pergunta que eu farei a Jesus o dia que eu me encontrar com ele

no paraíso, porque eu também não sei.

RC: Como é que o senhor vai perguntar à Ele?

PE: Eu vou dizer por que alguns foram curados e outros não?

Contexto da cena: Imagens do padre Eugênio celebrando uma missa. Ele proclama

a cura para algumas pessoas que o assistem e carrega um objeto sacro (Santíssimo

Sacramento) com as duas mãos. Ele está com os olhos fechados.

PE: Pessoas que tinham problemas nos olhos, que não enxergavam, agora estas

pessoas podem olhar e ver perfeitamente o Santíssimo Sacramento aqui nas minhas

mãos. Ela está enxergando, antes enxergava embaçado, agora está enxergando bem.

É o Senhor que está tocando teus olhos.

Contexto da cena: Dona Eunice e a filha, Estela, estão em um estúdio escuro, frente

a frente com Roberto Cabrini, para o prosseguimento da entrevista.

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RC: Você ainda acredita no poder de cura do padre Eugênio:

EP: Sim, acredito.

RC: Mesmo com a morte do seu pai?

EP: Mesmo com a morte dele, acredito.

RC: Por que?

EP: Porque Deus é maior. Se Deus levou meu pai, foi porque foi o melhor pra ele.

RC: Para alguns a morte do seu pai seria uma prova de que o padre Eugênio não teria

um dom de cura?

EP: Não.

RC: Pra você não?

EP: Não, pra mim não porque o padre Eugênio é um instrumento, quem toca é Deus.

Contexto da cena: Imagem de uma missa celebrada pelo padre Eugênio. Ele está de

frente para um homem, que está sentado. A câmera vai para o plano detalhe na mão

de padre Eugênio, que toca o braço do homem. As pessoas que ali estão cantam

músicas de igreja. Após, novamente Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados,

frente a frente, para o prosseguimento da entrevista.

RC: As pessoas que não alcançam a cura, significa que faltou fé a elas?

PE: Não, absolutamente. Absolutamente, pode ter até mais fé daqueles que

receberam a cura.

RC: Qual o perfil das pessoas que costumam alcançar a cura?

PE: De todo gênero, não existe um perfil.

RC: Independe de a pessoa ter fé ou não?

PE: Sem dúvida, a fé acho que contribui a alcançar algo, mas, repito, eu vi pessoas

que me falaram que não tinham essa fé e alcançaram a cura.

CENA (49’06”- 54’11”)

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Catolicismo não tem o monopólio da cura?

PE: Não, qualquer cristão...

RC: Um ateu pode ter o dom da cura?

PE: Um ateu se não acredita em nada, como pode e a quem que vai pedir a cura?

RC: Um protestante pode ter o dom da cura?

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PE: Sem dúvida.

RC: Um espírita?

PE: Espírita, não sei.

RC: Um umbandista pode ter o dom da cura?

PE: Eu não sei. Eu estou falando que quem acredita no Senhor Jesus, São Paulo é

muito claro – Se com a tua boca proclama que Jesus é o Senhor, e no teu coração

acredita que ele ressuscitou dos mortos, você é salvo. Esta é a fé católica, que São

Paulo proclamou e que a igreja hoje ainda proclama, que Papa Francisco ainda

proclamou. Esta é a fé.

RC: Não existe doença incurável para a fé?

PE: Pela fé não existe porque para Deus tudo é possível. Então, é possível que Deus

cure algo.

Contexto da cena: Imagens de um culto celebrado pelo padre Eugênio. Ele está

abaixado, segurando as pernas de um senhor e colocando a mão sobre seus joelhos,

enquanto outras pessoas cantam músicas.

Para trazer a palavra da medicina, o presidente da Associação Médica Brasileira

(AMB) concede entrevista, em uma sala, falando sobre a sua opinião a respeito do

tema abordado.

Florentino Cardoso (FC): Pessoalmente, eu acredito em milagres. Pessoalmente, eu

tenho fé. Pessoalmente, eu imagino que é fundamental que tenhamos esperança pra

vivermos.

Contexto da cena: Imagens de um culto celebrado pelo padre Eugênio. Ele está

abaixado, passando as mãos nas pernas de uma senhora. A imagem se intercala com

o plano detalhe de um terço, que alguém o segura. A imagem é apresentada em

câmera lenta. Após, aparecesse novamente o padre Eugênio abaixado, colocando as

mãos no joelho de um homem. A cena retorna para Florentino Cardoso. Enquanto ele

fala, algumas imagens dos cultos do padre Eugênio são repetidas.

FC: Reiteramos aqui: nós médicos somos treinados, habituados a trabalhar com

evidência científica. Nós não recomendamos, por exemplo, por mais fé e esperança

que se tenha, é que abandone o tratamento que tenha evidência científica e vá fazer

algo que nós não sabemos ao certo. Então, tem fé e esperança, se apegue a

determinada coisa espiritual, por exemplo, muito bom, é ótimo, mas não abandone o

tratamento que está estabelecido.

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Contexto da cena: Roberto Cabrini e Padre Eugênio estão sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Padre Eugênio, quais são as suas virtudes e quais são os seus pecados?

PE: Virtude eu acho que não tenho, pecados tenho muitos.

RC: Que pecado o senhor pretende curar?

PE: Pecado não se cura.

RC: O senhor disse que tem pecados, que pecados são esses?

PE: Bem, se eu contar ao senhor, eu vou contar ao meu confessor os meus pecados.

(risos). Você não pode me absolver e não é bom também que se saiba, por isso que

a confissão é...

RC: O senhor teme que esse dom da cura que o senhor possui acarrete em vaidade?

PE: Poderia, se...

RC: O senhor teme isso?

PE: Não. Não, absolutamente, não.

RC: Isso aconteceu?

PE: Não.

RC: Não?

PE: Nunca.

Contexto da cena: Imagens de diversos cultos celebrados pelo padre Eugênio. Ele

pede para uma mulher abrir os braços. Padre Eugênio coloca a mão sobre a cabeça

de um jovem que está sentado. A imagem seguinte mostra um plano conjunto dos

fiéis que assistem ao culto e cantam. Ela está em câmera lenta. Uma mulher está de

olhos fechados e com as mãos juntas, rezando. A câmera segue em travelling no meio

da igreja em direção ao altar. Na imagem seguinte, padre Eugênio coloca a mão sobre

o rosto de uma criança. Após, uma mulher, no meio da multidão, também reza. A

câmera faz uma panorâmica desde o altar, onde está padre Eugênio, até terminar em

um plano conjunto das pessoas que assistem ao culto.

RC: Muitas das respostas procuradas jamais serão encontradas, ou dependerão

sempre do que cada um acredita. Conceitos que não são necessariamente

antagônicos, mas podem ser. O ato de curar nem sempre implica em verdades

absolutas.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está no estúdio do programa Conexão Repórter.

RC: Ao jornalismo, é claro, não cabe discutir os poderes da fé, apenas apresentar

fatos.

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Aqui, Roberto Cabrini, e este foi o Conexão Repórter de hoje. Boa noite.

Contexto da cena: Sobem créditos finais.

6.2.2.3.1.1 Análise do episódio “Investigando Milagres”

Iniciamos a análise pelo programa intitulado “Investigando Milagres”. Como já

sintetizado, as cenas decupadas deste episódio abrangem a entrevista com o

personagem central, uma entrevista em apoio ao personagem (favorável) e outra

entrevista que mostre o contraponto da história (contra), além do texto de

encerramento da reportagem (conclusão).

Logo no início da primeira cena apresentada, onde Cabrini está no estúdio e

faz uma breve apresentação sobre o tema do programa em questão, podemos

comparar a fala do apresentador com um dos conceitos apresentados por Lopes

(2003). Após dizer que, ao padre Eugênio se atribui uma série de curas não explicadas

pela medicina, Cabrini questiona: “Entre a ciência e a fé, onde está a verdade?”. Na

página 63 desta monografia, Lopes (2003) explana sobre os dois pontos importantes

e essenciais que contribuem para o estabelecimento dos conceitos do jornalismo

investigativo, que são a busca pela verdade oculta e a junção dos cacos da realidade

para se estabelecer relações entre eles. Mais adiante, ainda na página 63, Lopes

(2003) afirma novamente que o senso de busca pela verdade é fundamental para o

jornalista investigativo. Desta forma, Cabrini dá o primeiro indício de que se trata de

uma investigação.

Ainda sobre a questão de “verdade”, na cena seguinte, descrita na página 93,

Cabrini antecede a entrevista com o padre Eugênio chamando-a de “reveladora”, ou

seja, podemos ter uma dimensão de que, de fato, antes mesmo da entrevista ser

exibida, grandes revelações exclusivas serão explanadas pelo personagem central do

episódio em questão. Mas isso só aconteceu pela insistência e perseverança de

Cabrini, que é uma das fases de uma investigação, descrita por Fortes (2005) na

página 70. Porém, no papel de investigado, padre Eugênio colabora com a

investigação em questão, e isso se pode prever muito antes da entrevista ser iniciada,

pois Cabrini o questiona: “Pronto para responder todas as perguntas?”, e padre

Eugênio responde: “Pronto”. Ainda assim, para deixar claro que trata-se de uma

investigação e que nenhuma questão pode ficar de fora, Cabrini reforça: “Pode

perguntar tudo?”, e padre Eugênio concorda: “Tudo o que o senhor quiser”. Nesse

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ponto, recordamos um dos requisitos básicos de uma reportagem investigativa,

proposta por Lopes (2003) na página 68 desta monografia, que é quando os

investigados tentam esconder as informações do público. Ou seja, Cabrini deixa claro

muito antes da entrevista começar de que nenhuma informação deve ser ocultada.

Após afirmar que Cabrini pode perguntar tudo o que quiser, padre Eugênio é

desafiado pelo repórter: “Pode contestar o seu poder de cura?”, e o padre responde,

com ressalvas: “Pode. Não pode contestar o Evangelho”. Aqui podemos analisar que

Cabrini exerce um dos pontos explanados por Hunter (2009) no que diz respeito à

relação com as fontes, descrito na tabela da página 74, que compara o jornalismo

convencional e o jornalismo investigativo, onde diz que o repórter pode desafiar ou

negar explicitamente a versão oficial de uma história, com base nas informações de

fontes independentes. Isso se confirma também logo adiante, quando Cabrini traz à

tona outras fontes que confirmam e contrastam a versão do padre Eugênio. Portanto,

Cabrini não aceita apenas uma versão oficial da história, indo além do jornalismo

convencional, como propõem Hunter (2009).

Ainda antes mesmo do início da entrevista, cabe aqui a ressalva de que, tanto

o texto como os questionamentos de Cabrini, são curtos e objetivos. Cruzamos essa

constatação com outra fase proposta por Fortes (2005) na página 70 desta

monografia, onde ele explana sobre a clareza e simplicidade na construção do texto

e edição.

Frente à essa objetividade, Cabrini pergunta: “Padre Eugênio, o senhor tem o

dom da cura?”, e, para responder, padre Eugênio se apoia no que lhe foi assinado

pelo bispo diocesano, que lhe conferiu a liberação para celebrar missas com intuito

da cura. Essa afirmação é confirmada através da divulgação do documento que, de

fato, autoriza o padre a celebrar missas de cura na Diocese de Santo Amaro, datado

de 1º de fevereiro de 2001 e assinado pelo Bispo Diocesano Fernando Antônio

Figueiredo. Para reforçar a veracidade da informação, as imagens subsequentes

aparecem em planos detalhes no termo “Autorização” e na assinatura de Dom

Fernando. Nesta cena podemos analisar algumas fases da investigação proposta por

Fortes (2005) na página 69. A primeira destas fases é a pesquisa minuciosa sobre os

fatos e a importância de se fugir das fontes óbvias. Neste caso, o padre Eugênio seria

a fonte óbvia, porém, apoiado às suas declarações, a divulgação do documento

comprova aquilo que ele diz. Outra fase proposta por Fortes (2005) é, de fato, a

atenção especial a todos os documentos disponíveis. Essa atenção é comprovada

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quando a câmera realiza planos detalhes na assinatura do bispo diocesano e no termo

“Autorização”. Sobre essa pesquisa, Hunter (2009) explana na tabela da página 74

que a reportagem investigativa requer uma documentação capaz de apoiar ou negar

as informações das fontes. Neste caso, o documento apoiou a afirmação do padre

Eugênio.

Em relação ao relacionamento com a fonte no jornalismo investigativo, Cabrini

também praticou um dos conceitos descritos por Hunter (2009), de que a boa-fé das

fontes não pode ser presumida e que, frente à possibilidade de que qualquer fonte

pode fornecer informações falsas, as informações não podem ser publicadas sem

verificação. Ou seja, as informações do padre Eugênio foram verificadas, confirmadas

e mostradas para o telespectador através do documento.

No questionamento subsequente, Cabrini pergunta afirmando que o padre

Eugênio descobriu o dom da cura aos 32 anos de idade e o padre Eugênio responde

contando como descobriu o dom. Isso mostra que Cabrini realizou uma pré-pesquisa

sobre o personagem principal dessa investigação. Esse também é um dos requisitos

básicos de uma reportagem de investigação propostos por Lopes (2003), quando

afirma que a investigação é o resultado exclusivo do jornalista, além, claro, do que

Fortes (2005) explana sobre as fases da investigação ao dizer que a curiosidade e a

desconfiança andam juntas em uma investigação. Ao iniciar a conversa dando um

panorama completo das informações, começando, de fato, desde o início da história

do padre Eugênio, o programa dá um indício de que a reportagem será completa e

longa, assim como propõe Hunter (2009) ao diferenciar o jornalismo convencional do

investigativo e dizer que, no jornalismo investigativo, a história se baseia no máximo

possível de informações, e pode ser bastante longa.

Ao visitar o escritório do padre Eugênio, outra atribuição é constatada, o

exorcismo. O “gancho” para essa constatação é o livro que o padre segura, intitulado

“Celebração dos Exorcismos”. Na sequência Cabrini lhe pergunta sobre quantos

exorcismos ele já praticou, e ele responde afirmando que foram centenas. O

exorcismo, por si só, não foi comprovado através de documentos ou imagens, apenas

ficou na afirmação do padre Eugênio. Aqui podemos analisar este questionamento

com uma das fases da investigação de Fortes (2005), onde ele diz que o repórter deve

libertar-se de preconceitos e não partir de princípios pessoais, religiosos ou

ideológicos. Ou seja, ainda que o exorcismo possa ser um tabu na sociedade, o

questionamento não deixou de ser feito por Cabrini. O que por vezes é mostrado são

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os cultos realizados pelo padre Eugênio, onde ele afirma que as pessoas que sofrem

determinada enfermidade são curadas naquele momento. A confirmação da cura ou

não são evidenciadas nas outras fontes do documentário, expostas mais adiante.

A insistência e perseverança, uma das fases da investigação proposta por

Fortes (2009) pode ser conferida em um dos questionamentos que Cabrini faz ao

padre Eugênio: “Eu gostaria que o senhor falasse exatamente o que o senhor diz

nessa missa especial de cura. Como que o senhor fala? Só uma pequena parte do

que o senhor fala”. Ao responder e afirmar que já viu as curas acontecerem muitas

vezes, a afirmação é comprovada quando, na sequência, aparece a imagem de um

culto de celebração da cura.

Na sequência da entrevista, novamente a clareza e a simplicidade, assim

como a objetividade é o que norteia os questionamentos de Cabrini ao padre Eugênio.

O exemplo é quando Cabrini questiona se o padre Eugênio já viu cegos voltarem a

enxergar e surdos voltarem a ouvir. Nas duas respostas, padre Eugênio afirmou que

sim, porém, no questionamento sobre a cura do câncer, ele disse que não sabia.

Uma investigação requer tempo. Ao final da cena, Cabrini afirma: “Durante

meses acompanhamos as tais missas de cura, ouvimos histórias, conhecemos os

dramas de frequentadores”. Com tal afirmação, podemos analisar alguns pontos das

fases da investigação de Fortes (2009), entre elas a paciência e concentração, pois a

investigação requer tempo e, em muitos casos, a informação é obtida apenas no

cruzamento de alguns documentos. Aqui podemos substituir os documentos pelas

fontes, pois ao ouvir o padre e outras fontes, nesse ponto acontece o cruzamento das

informações e a construção de uma conclusão sobre o tema central do documentário.

Esse é “gancho” para outra fase proposta por Fortes (2009), onde as entrevistas são

utilizadas para obter o maior número possível de informações e contradições dentro

da investigação. E ainda, outro ponto já descrito nesta análise, proposto por Hunter

(2009) e que concorda com Fortes (2005) é o de que a história se baseia no máximo

possível de informações, e pode ser bastante longa.

Na cena seguinte, mais uma vez a fase da investigação que corresponde à

insistência e perseverança, de Fortes (2009), pode ser conferida na sequência de

questionamentos que Cabrini faz ao padre Eugênio, começando pela pergunta sobre

se o padre tinha a consciência de que toda pessoa que afirme ter o dom da cura por

meios que não sejam os da medicina, pode ser questionada. Cabrini ainda insiste

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perguntando se o padre Eugênio era um charlatão e até que ponto ele possuía o dom

da cura.

O que mais chama a atenção na cena em questão é o próximo

questionamento, que é repetido quatro vezes seguidas. Cabrini pergunta ao padre

Eugênio se ele ganha dinheiro curando as pessoas, e o padre responde que não.

Cabrini novamente pergunta se as pessoas têm que pagar e, novamente, padre

Eugênio nega. Desconfiado, Cabrini questiona com um simples “Não?”, e o padre

responde “Não”. Na busca por uma resposta mais consistente, Cabrini novamente

questiona o padre Eugênio se ele não ganha dinheiro com esse dom, e ele, mais uma

vez, nega. Ou seja, os mesmos questionamentos seguidos trazem, além da

insistência e perseverança já citadas, outros elementos propostos por Fortes (2005)

como a curiosidade e a desconfiança, porém, aliado à frieza, objetividade e precisão,

pois Cabrini questionou o padre Eugênio diversas vezes apenas no intuito de obter

uma resposta mais completa possível e, tratando-o, na medida do possível, com

respeito, um dos outros elementos elencados por Fortes (2005).

Após Cabrini questionar o padre Eugênio como ele o curaria caso sofresse de

uma doença incurável, padre Eugênio deixa claro que não pratica a cura, e sim,

apenas a unção dos enfermos, que é um sacramento da igreja. Cabrini repete o

questionamento afirmando que padre Eugênio tem o dom da cura e o padre responde

que o dom é de Deus, e não dele. Neste ponto fica evidente outro elemento da

investigação proposto por Fortes (2005), que é a lealdade ao consumidor da

informação, pois toda investigação deve ser fundamentada no interesse público.

Ao negar que pratica a cura, e que é apenas um instrumento para se chegar

a ela, é desmistificada a ideia inicial de que o padre Eugênio é, de fato, um curandeiro.

Aos poucos, a realidade vai tomando forma e as dúvidas são esclarecidas acerca da

veracidade ou não do dom da cura do padre Eugênio.

Após estas revelações expostas no início da entrevista com o personagem

central da história, a próxima cena decupada é de outra entrevista em apoio ao

personagem, ou seja, que é favorável às afirmações do padre Eugênio.

Ao subir escadas e fazer movimentos com o corpo, o empresário Alfredo

Teixeira deixa claro que recebeu uma cura e, logo na primeira fala, ele confirma o que

disse o padre Eugênio anteriormente, de que a cura era de Deus, realizada através

das mãos ungidas do padre Eugênio.

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Seu Alfredo sofria de hérnia de disco e os exames de raio-X são mostrados

para o telespectador. Mais uma vez, o programa pratica uma das fases da

investigação, a atenção especial aos documentos disponíveis, proposto por Fortes

(2005). O raio-X comprova que Seu Alfredo de fato sofria da doença. Além disso, a

documentação apoia a informação da fonte, um dos elementos da investigação

conceituado por Hunter (2009) na tabela da página 74.

Mesmo com a constatação da cura de Seu Alfredo, Cabrini o instiga a

comprová-la. Ele pede para que Seu Alfredo se levante e fique em pé com o apoio de

apenas uma perna. Esse desafio imposto por Cabrini ao Seu Alfredo também é

explicado por Hunter (2009) quando o autor diz que o repórter pode desafiar ou negar

explicitamente a versão oficial da história. Seu Alfredo ficou em pé e confirmou a

afirmação.

Lopes (2003) afirma em um dos requisitos básicos de uma reportagem de

investigação que o objetivo da investigação deve ser importante para grande parcela

da população e não para interesses de determinados grupos. Diante disso, no

decorrer da reportagem, Cabrini confronta a ciência e a fé. Seu Alfredo leva os novos

exames para serem analisados pelo médico para que de fato se comprove a cura. Os

planos detalhes no antigo raio-X e na nova ressonância magnética do Seu Alfredo

mostram, mais uma vez, a atenção especial que o programa dá aos documentos, uma

das fases da investigação proposta por Fortes (2005).

Como já explanado por Fortes (2005) nesta pesquisa, a investigação deve ser

fundamentada no interesse público e, no decorrer da reportagem “investigando

Milagres”, a lealdade ao consumidor da informação é reforçada novamente quando

Seu Alfredo afirma que foi curado pelo padre Eugênio, porém através da força divina

de Deus, e quando o próprio padre Eugênio confirma que não conseguiu salvar seu

próprio pai devido a uma doença, deixando claro para o telespectador que ele não

possui o poder de vencer a morte.

A desmistificação da imagem de “curandeiro” do padre Eugênio é confirmada

na próxima entrevista que Cabrini realiza. É a família de seu Emílio, que não resistiu

a um câncer. Porém, a esposa Eunice e a filha Estela, em nenhum momento culpam

o padre Eugênio pela morte de seu Emílio. Elas veem de outra maneira a cura que ele

recebeu. Para mãe e filha, a cura foi espiritual. Apesar de não ter alcançado a cura

para seu Emílio, elas afirmam acreditar no poder de cura conferido ao padre Eugênio.

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O próprio padre Eugênio afirma que a cura vem para alguns, porém não soube explicar

o porquê.

De uma maneira geral frente ao episódio “Investigando Milagres” podemos

analisar que dois dos três requisitos básicos de uma investigação, propostos por

Lopes (2003) foram praticados. O primeiro deles diz respeito ao trabalho exclusivo do

jornalista, sem a interferência de outras áreas. Cabrini entrevistou todas as fontes

frente a frente.

Outro requisito básico leva em consideração o objetivo da investigação que,

segundo Lopes (2003), deve ser importante para grande parcela da população, e não

para interesses de determinados grupos. Esse ponto é percebido quando a imagem

do padre Eugênio é desmistificada do que se tem ideia no início, de que ele seja um

“milagreiro”. As entrevistas, tanto com o personagem central como com o Seu Alfredo,

que foi curado, e com a mãe e filha de seu Emílio, que não recebeu a cura, evidenciam

por diversas oportunidades que o padre Eugênio é apenas um instrumento que

transmite a cura através do poder de Deus, e somente a Ele cabe esse poder. Esse

item proposto por Lopes (2003) podemos relacionar com outro elemento evidenciado

por Fortes (2005) quando diz que é preciso ter lealdade ao consumidor da informação,

pois toda investigação deve ser fundamentada no interesse público. Confrontar a

ciência com a fé, mostrando os dois lados da história contribui para que o objetivo da

investigação não privilegie interesses de determinados grupos.

Sobre as fases de uma investigação, proposta por Fortes (2005), a paciência

e concentração são evidenciadas quando Cabrini afirma logo no início que

acompanhou a história durante meses, pois Fortes (2005) afirma que uma boa

investigação requer tempo.

A insistência e perseverança também foi um dos pontos muito utilizados por

Cabrini principalmente na condução das entrevistas, quando ele buscava sempre a

resposta mais completa possível, tanto do padre Eugênio como das outras fontes para

que, de fato, suas afirmações fossem confirmadas sem que houvessem dúvidas.

Aliado a isso, a curiosidade e desconfiança andaram juntas no decorrer de toda a

reportagem, assim como a frieza, objetividade e precisão.

Por se tratar de uma reportagem investigativa, a atenção aos documentos

disponíveis foi muito bem conduzida pela reportagem no intuito de comprovar as

afirmações das fontes. A permissão para conduzir missas de cura e os exames do

Seu Alfredo foram os principais documentos evidenciados.

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Fortes (2005) ainda destaca as entrevistas para obter o maior número

possível de informações e contradições dentro da investigação. No programa, além

do padre Eugênio, tivemos a entrevista com Seu Alfredo, que confirmou o poder de

cura, e com a mãe e filha de seu Emílio, que faleceu por não ter conseguido a cura.

Ele elemento do número de entrevistas também é evidenciado por Hunter (2009) que

afirma que, no jornalismo investigativo, a história se baseia no máximo possível de

informações, e pode ser bastante longa, fato que se confirmou na reportagem.

No que diz respeito à relação com as fontes, Hunter (2009) afirma que a boa-

fé das mesmas não pode ser presumida e que elas podem fornecer informações

falsas. Podemos analisar que, por esse motivo, Cabrini, por vezes insiste em

determinadas questões mais polêmicas em seus questionamentos, instigando cada

vez mais uma resposta completa.

Outro ponto abordado por Hunter (2009) sobre a relação com as fontes no

jornalismo investigativo e que frequentemente foi utilizado por Cabrini é o ato de

desafiar ou negar explicitamente a versão oficial de uma história. Isso pôde ser

percebido explicitamente quando Cabrini pediu para que Seu Alfredo levantasse e

mostrasse que realmente estava curado.

Uma das características do programa Conexão Repórter é a estrutura

dramática da história, até mesmo pelo fato de os episódios serem longos. Isso

colabora com o que Hunter (2009) diz sobre os resultados de uma investigação.

Segundo o autor, a estrutura dramática da história é essencial para seu impacto,

levando a uma conclusão do repórter ou da fonte. Isso é muito bem construído nos

planos de filmagem, onde detalham em diversas oportunidades objetos sacros e as

missas do padre Eugênio. Além disso, as pessoas que por vezes aparecem chorando

ou emocionadas, aliadas as trilhas sonoras de impacto, contribuem fortemente para o

conceito de Hunter (2009).

Por fim, podemos analisar que, no episódio em questão, tanto o programa

Conexão Repórter, quanto Roberto Cabrini, no papel de repórter, cumprem e denotam

a maioria dos conceitos apresentados por Lopes (2003), Fortes (2005) e Hunter (2009)

no que diz respeito ao jornalismo investigativo e, para finalizar, abordaremos outro

ponto abordado por Hunter (2009) sobre os resultados da investigação. Para o autor,

o repórter busca ser justo em relação aos fatos da história e também pode oferecer

um juízo de valor ou veredito sobre a história.

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De certa forma, Cabrini deu seu veredito ao dizer ao final do episódio: “Ao

jornalismo, é claro, não cabe discutir os poderes da fé, apenas apresentar fatos”.

Podemos analisar que não se trata de uma conclusão clara, mas que, de certa forma,

mesmo que tenha sido explanado tal ideia indiretamente, cabe a cada telespectador

tirar suas próprias conclusões sobre o poder de cura do padre Eugênio.

Apesar da relação com muitos elementos do jornalismo investigativo às cenas

apresentadas, o episódio, em si, não apresentou algo que possamos evidenciar como

puramente investigativo, nem ao menos a exclusividade, ou seja, apresentou pouca

investigação.

6.2.2.3.2 A Longa Noite no Inferno de Alcaçuz

O segundo programa a ser observado é intitulado “A Longa Noite do Inferno

de Alcaçuz”, exibido no dia 26 de março de 2017, com duração de 54’29”. Neste

documentário exclusivo, Roberto Cabrini passa uma noite em uma das celas do

pavilhão quatro do presídio de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte, palco de um

massacre que matou 26 pessoas. Ele desvenda os segredos e os bastidores da guerra

entre facções. As cenas decupadas deste episódio abrangem os diversos lados do

massacre: os líderes das facções rivais, a rigorosa postura do Estado (entrevista com

o polêmico secretário de Justiça do RN), as famílias indignadas e, claro, o próprio

relato de Cabrini e suas percepções diante do que viu.

CENA (10’40”- 22’23”)

Contexto da cena: É noite. Após a imagem da lua cheia, um plano geral do presídio

de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte. Na sequência, é mostrada uma das celas do

presídio. Roberto Cabrini está sentado em uma das camas de concreto, com uma

lanterna na mão, a única forma de iluminação além da luz da câmera. Ele se mostra

pensativo diante do que vê. A imagem retorna para um plano geral do presídio. A

câmera faz uma panorâmica da esquerda para a direita. Cabrini entra no vídeo da

direita para a esquerda e é enquadrado em plano médio.

Roberto Cabrini (RC): Boa Noite! A imagem ainda provoca tensão. Este é o presídio

de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte, que o Brasil ficou conhecendo como inferno em

forma de muros, grades e torres. No Conexão Repórter de hoje, os bastidores de uma

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guerra que, oficialmente, matou 26 pessoas numa série de execuções bárbaras. E

ainda existem muitas revelações. Os detalhes de um confronto como não se tinha

mostrado. Aqui, Roberto Cabrini, e este é o Conexão Repórter de hoje.

RODA VINHETA DE ABERTURA DO PROGRAMA

Contexto da cena: O nome do episódio aparece na tela. “A Longa Noite no Inferno

de Alcaçuz” sobre um fundo azul, onde aparecem duas mãos segurando uma grade.

Após, imagens do céu, com a câmera de dentro de um avião, intercalando com

imagens da estrada, passando por um rio. A câmera está dentro do carro, o que

denota a chegada da equipe do Conexão Repórter ao Estado do Rio Grande do Norte.

Começa a anoitecer. A imagem mostra a lua e desce até chegar aos portões do

presídio de Alcaçuz. Roberto Cabrini está de frente para a porta, acompanhado de um

policial, até que a porta se abre e os dois entram. Cabrini cumprimenta outro policial

que abriu a porta e segue atrás daquele na qual estava acompanhado. Um plano geral

do presídio se intercala com a imagem de um pavilhão onde mostra um buraco na

parede, feito pelos presos. Após, aparecem imagens com planos mais fechados do

presídio.

RC: É madrugada. Os portões velhos e enferrujados se abrem. Acesso autorizado. A

partir de agora, o que vem pela frente é uma longa noite no inferno de Alcaçuz.

Contexto da cena: Roberto Cabrini caminha ao lado do policial. A câmera está em

travelling e mostra os pés dos dois, de costas, caminhando no pátio do presídio. Após,

aparece a imagem da lua e retorna para os dois, agora de frente. Cabrini e o policial

estão com lanternas. Cabrini mostra o pavilhão número quatro do presídio. A câmera

mostra o enorme buraco na parede do pavilhão.

RC: A lua, o silêncio. Estamos caminhando em direção ao pavilhão número quatro, o

centro da guerra aqui no presídio.

Contexto da cena: Imagens de arquivo mostram como foram os dias de massacre e

guerra no presídio. São imagens de presos em cima do teto do presídio, com

bandeiras de suas respectivas facções, intercaladas com imagens de carros de polícia

e um helicóptero. Imagens amadoras mostram os presos dentro do pátio do presídio

em um dos dias de massacre, onde um deles, preso 1 (P1) fala no vídeo.

RC: O final da tarde de sábado, 14 de janeiro, salta aos meus olhos.

P1: Se for morrer, vai morrer aqui. Se for morrer, vai morrer aqui.

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Contexto da cena: Após estas imagens de arquivo, aparecem outras imagens que

contextualizam o presídio, enquanto Cabrini explica sobre os motivos da guerra entre

as facções. São mostradas imagens da entrada do complexo penitenciário e um plano

geral do local.

RC: Após o horário de visitas, os presos do pavilhão 5, que abriga ao menos de uma

facção criminosa que atua em presídios de todo país, ataca o pavilhão 4, da facção

que age no Rio Grande do Norte.

Contexto da cena: Outras imagens de arquivo mostram vários policiais prontos para

atacarem. Após, imagens exclusivas mostram a negociação entre os presos e a

polícia militar. A câmera detalha a negociação envolvendo um preso de uma facção e

alguns policiais.

RC: A rebelião é parcialmente controlada na tarde do domingo, dia 15. A negociação

da polícia militar com os presos é desmentida, mas essas imagens as quais temos

acesso, não mentem, e mostram que após o início da rebelião, existe, sim, uma

negociação.

Contexto da cena: Imagens em plongée mostram os policiais entrando nos pavilhões

para tentar controlar a situação no dia da rebelião. Tiros são disparados e alguns

presos correm para dentro do pavilhão. Após a situação controlada, os presos

aparecem, um atrás do outro, entrando no pavilhão, sob a escolta dos policiais.

RC: Os cem homens da Força Tarefa Penitenciária invadem os pavilhões 4 e 5 na

manhã de sexta-feira, dia 27 de janeiro. Quatorze dias se passam.

Contexto da cena: Imagem da lua cheia. Após, a imagem em plano geral do presídio.

Dois policiais armados, sendo um deles encapuzado, entram no buraco da parede do

pavilhão 4, que foi feito pelos próprios presos. A câmera, já dentro do pavilhão, mostra

Cabrini, de frente, também entrando pelo buraco. Ela fica em travelling por poucos

segundos, enquanto ele conhece o ambiente. Ele entra em uma das celas na qual

tinha sido incendiada no dia da guerra. Ele está acompanhado de um policial militar.

Os dois estão segurando lanternas. Apenas esta luz, e a da câmera, são as formas

de iluminação do local. A câmera segue em travelling para outra cela que está vazia.

RC: O próprio acesso é o buraco aberto pelos presos no concreto e usado por eles

para o ataque e a defesa na carnificina. A noite angustiante das celas onde ocorreram

massacres

Contexto da cena: Cabrini e o policial estão de frente para uma das celas que foi

uma das mais atingidas do pavilhão 4. Acima dela, há os dizeres “Igreja Evangélica” .

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Eles entram e Cabrini contextualiza o ambiente, mostrando os buracos na parede,

onde eram guardadas armas, drogas e celulares. Ele mostra no chão o início da

escavação de um túnel e, depois, outro buraco na parede.

RC: Esta é uma das celas mais atingidas do pavilhão número 4. Os presos atearam

fogo e a destruição é muito grande. Na parede a gente observa esses buracos, onde

eram guardadas armas, drogas e também eram guardados celulares. Aqui nós

podemos ver o início da escavação de um túnel, uma rota de fuga. E aqui, outro

buraco, que possibilitava a comunicação entre as celas, mais uma estratégia dessa

guerra.

Contexto da cena: A câmera mostra um plano detalhe do buraco que servia como

comunicação entre as celas. A imagem se intercala com outros pontos da cela. Cabrini

aponta a lanterna para alguns desenhos na parede. A câmera está em travelling,

mostrando Cabrini, de frente, caminhando no corredor do presídio. Planos detalhes

de frases nas paredes são mostrados. Na sequência, são mostradas mais imagens

do corredor e das celas, o que denota a degradação do pavilhão.

RC: Em cada canto, um segredo, que ajuda a desvendar uma crise vivida por todo um

país. A lanterna vai iluminando meus passos, e revelando pistas. Desativado

temporariamente, o pavilhão 4 guarda os sinais da história escrita por aqui.

Contexto da cena: Cabrini e o policial entram em outra cela. Cabrini aponta a lanterna

para a parede e lê a frase que ali está exrita.

RC: “Conheça a verdade, a verdade vos libertará”.

Contexto da cena: Imagens de arquivo mostram o dia da guerra no presídio. As

imagens se intercalam com policiais armados se preparando para invadir o presídio.

Presos estão no pátio carregando corpos de pessoas mortas. Após, imagens da

guerra, em que os presos brigam entre si.

RC: O início de uma longa investigação sobre os bastidores do confronto que matou

26 pessoas. Execuções bárbaras. Decapitações. Imagens vivas na memória do país.

Era para ter sido apenas mais uma tarde de visitas, mas acabou como a senha para

uma guerra que durou quase duas semanas, e que, na verdade, está longe de

terminar.

Contexto da cena: Câmera em travelling mostra Cabrini, de costas, juntamente com

o policial entrando em umas das celas do pavilhão 4. Ele ilumina com a lanterna outra

frase que está na parede, e a lê.

RC: “Deus te ama!”

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Contexto da cena: A câmera está em travelling percorrendo o corredor sombrio do

pavilhão. Cabrini está na cela que foi incendiada.

RC: Pelo que se sabe, os próprios presos atearam fogo aqui, e usaram o incêndio

contra os inimigos.

Contexto da cena: A câmera está em travelling e mostra apenas Cabrini entrando

em outra cela e a iluminando com a lanterna. A câmera mostra o banheiro da cela e,

após, planos detalhes dos buracos nas paredes e no chão. Na sequência, aparecem

imagens de arquivo de presos utilizando celulares.

RC: Cada detalhe me fornece respostas de como foi possível a explosão do conflito

armado de facções que não tiveram qualquer dificuldade em infiltrar armas e

smartphones de última geração presídio adentro.

Contexto da cena: A imagem mostra um plano geral externo do presídio de Alcaçuz.

Na sequência, um plano detalhe do buraco do pavilhão 4, intercalado com outras

imagens de fora do presídio. Após, a câmera em travelling mostra cinco policiais, da

cintura para baixo, caminhando sobre um corredor do presídio. Imagens externas de

outros pavilhões também aparecem. Os policiais estão com lanternas conferindo

algumas celas do pavilhão 4.

RC: Um olho dentro de Alcaçuz, e outro fora, onde se travam conflitos sangrentos pelo

controle do tráfico de drogas da região, combustível do enfrentamento. O silêncio da

noite é quebrado pelos sons da prisão. Passos de guardas, conversas de presos em

outros pavilhões. O voar de insetos, que são abundantes aqui.

Contexto da cena: Em uma delas, Cabrini se senta em uma das camas de concreto.

Ele se mostra pensativo, pois tem que passar a noite ali. Uma imagem em plano geral

do presídio, mostrando também as nuvens em movimento, se intercalam com a

imagem de Cabrini sentado na cama de concreto, em silêncio, tentando pegar no

sono.

RC: Ainda tenho tempo para tentar chegar ao sono, até chegar ao amanhecer, mas

Alacaçuz não me permite esse privilégio.

Contexto da cena: Cabrini está já praticamente deitado na cama de concreto

enquanto contextualiza como viviam os presos naquele ambiente.

RC: Assim viviam os presos aqui no pavilhão número 4. Eles dormiam nessas camas

de concreto. O calor é insuportável, e ainda havia a questão da superlotação. Nessas

circunstâncias, a guerra foi iniciada. Hoje, o dia está para amanhecer. Naquele dia, o

amanhecer foi sangrento.

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Contexto da cena: Cabrini permanece sentado na cama de concreto, segurando a

lanterna, pensativo. Ouve-se apenas os sons dos insetos.

RC: O pensamento corre. Inquietações.

Contexto da cena: Imagem em plano geral do exterior do presídio, mostrando as

nuvens em movimento. Após, novamente aparecem as imagens de Cabrini entrando

na cela que foi incendiada, juntamente com um policial militar. As imagens são

intercaladas com o plano geral do exterior do presídio, mostrando as nuvens em

movimento.

RC: O registro dos mais variados ângulos é mais convidativo do que tentar relaxar.

Contexto da cena: A câmera mostra um feixe de luz solar atravessando uma abertura

na parede. A imagem se intercala com algumas grades, até chegar ao buraco feito

pelos presos no dia do confronto entre as facções.

RC: Os primeiros raios de sol penetram entre as grades. O dia está para nascer.

Contexto da cena: Cabrini está em um lugar do presídio, juntamente com outro

policial da Força Penitenciária. Ele mostra uma porta de ferro. A câmera faz planos

detalhes da porta de ferro. Cabrini abre a porta e sai. Lá fora, a câmera lhe mostra

saindo do local. Ele mostra o local onde existia um contêiner. Imagens de arquivo

mostram o contêiner. Após, ele mostra um muro que divide os pavilhões. Cabrini

mostra a área do pátio onde aconteceu o confronto entre as facções. Na sequência,

aparecem imagens de arquivo que mostram os presos no teto do presídio, no dia do

massacre.

RC: Aqui, tudo chama muito a atenção. Essa porta de ferro, por exemplo, guarda

marcas importantes do conflito, as cabeças que foram prensadas aqui. Ferro, ferro

maciço. E, abrindo essa porta, presos conseguiram empurrar esta pesada porta de

ferro para ter acesso à essa zona intermediária, entre o pavilhão número 4, e número

3. Aqui havia um contêiner e, recentemente, foi construído esse muro, exatamente

para dividir os pavilhões, ou seja, esta área foi a zona principal do conflito, da

carnificina, da matança daquele dia.

Contexto da cena: Ao fundo, Cabrini e o policial militar caminham. A câmera os

mostra de costas. Após, Cabrini está em cima de uma fossa do presídio. Um policial

está à esquerda do vídeo, de costas, e outro policial à direita, de frente. A câmera

realiza um close sobre a abertura da fossa.

RC: Muitos corpos e seus pedaços foram encontrados em fossas como essa. Existe

a suspeita de que restos humanos ainda estejam por aqui.

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Figura 7: Roberto Cabrini mostra uma das fossas onde corpos de presos foram encontrados

Fonte: Conexão Repórter, SBT

Contexto da cena: Roberto Cabrini e o agente federal da Força Penitenciária,

Maycon Rottava (MP) caminham juntos no pátio do presídio. Eles conversam sobre o

dia da guerra entre as facções. A cena é intercalada com imagens de arquivo do dia

do confronto e também do contêiner que dividia os pavilhões.

RC: O que chama mais a sua atenção aqui?

Maycon Rottava (MP): O que chama atenção é o desespero das pessoas em tentar

fugir da guerra, cavando buracos por debaixo do muro, porque aqui era o confronto,

aqui foi exatamente onde que aconteceu o conflito. E, de uma maneira desesperada

do Estado, colocaram contêineres aqui para dividir duas facções rivais.

Contexto da cena: Vídeo amador gravado por um dos presos, na qual chamaremos

preso 2 (P2).

Preso 2 (P2): Olha, aqui tá tudo solto…(sequência inaudível).

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Contexto da cena: Plano geral do presídio e, no céu, as nuvens em movimento

realizam a transição da noite para o dia. Cabrini está dentro do presídio, acompanhado

por policiais da Força Tarefa. A cela se abre e ele entra.

RC: Esta longa noite que passo nos porões de Alcaçuz, é o fio condutor de uma

investigação que dura cinco dias.

Contexto da cena: Roberto Cabrini caminha pelo corredor do presídio, entre dois

policiais. A câmera os acompanha em travelling.

MP: Foi consertada a ligação de um pátio para o outro.

Contexto da cena: O policial Maycon Rottava está de frente para a porta de uma cela

e fala com os presos.

MP: Cela 12, procedimento de confere.

Contexto da cena: Presos varrendo e limpando o pátio do presídio, sob os olhares

dos policiais. Um visitante passa pelo procedimento do detector de metais. Após,

policiais acompanham um preso que está algemado.

RC: Acompanhamos a rotina do presídio, agora sob a intervenção dos agentes

especiais da Força Nacional Penitenciária.

Contexto da cena: A imagem corta para um plano detalhe de uma espingarda, que é

segurada por um policial militar. Na sequência, aparece a imagem de quatro presos,

de costas, com as mãos na cabeça para o procedimento de revista, na qual será

realizada por quatro policiais.

Policial A: Põe as duas mãos na cabeça. Os demais, uma na cabeça e a outra no

ombro.

Contexto da cena: Fundo preto, com os dizeres “Dia 2”. Após, imagem do policial

Maycon Rottava chegando à frente de uma porta, juntamente com outros policiais. Ele

olha para o seu relógio e explica sobre o procedimento do dia. Vários policiais

fortemente armados entram no presídio.

MP: São 7h15 da manhã. Vamos iniciar o procedimento de confere. Estamos com o

responsável, que ele vai chamar nominalmente todos os presos que estão dentro do

presídio, um a um, nominalmente.

Contexto da cena: Os policiais caminham nos corredores do presídio. As imagens se

intercalam com planos detalhes dos pés dos policiais, até chegarem à uma das celas.

RC: O procedimento de recontagem é sagrado.

MP: Atenção ala! Procedimento de confere. Procedimento de confere. Todo mundo

no procedimento.

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Contexto da cena: O policial responsável pelo procedimento está de frente para a

Cela 1. Ele avisa que iniciará o procedimento.

Policial Responsável (PR): Atenção cela 1! Vou começar o procedimento para

confere. Eu vou chamar o primeiro nome e vocês vão completar o restante, entendido?

Contexto da cena: Imagem de uma pequena abertura da cela. Dentro, vários presos

estão em pé, de cabeça baixa. Após, Cabrini e o policial Maycon Rottava estão

conversando na frente desta cela.

RC: O grande desafio pra vocês da Força Tarefa é restabelecer a disciplina?

MR: Restabelecer a disciplina e a ordem dentro de um pavilhão onde não existia nada

de disciplina.

Contexto da cena: O policial responsável sai de frente da cela 1, enquanto o policial

Maycon Rottava já começa o procedimento na cela 2.

MR: Cela 2, procedimento de confere.

Contexto da cena: Imagem de uma pequena abertura da cela. Dentro, vários presos

estão em pé, de cabeça baixa.

RC: O interior revela um cenário de corpos humanos espremidos em celas de ar

viciado e calor escaldante.

Contexto da cena: O policial Maycon Rottava abre esta pequena abertura da cela e

fala com um dos presos.

MR: Tá olhando pra fora por que? É de cabeça baixa. Sabe como é que funciona.

Abaixa a cabeça, preso! Eu tô te vendo. Sentado, de costas, com a mão na cabeça.

Senta!

Contexto da cena: Cabrini fala com os presos pela pequena abertura da cela. Dentro

da cela, todos os presos estão sentados com as mãos na cabeça. Após a pergunta

de Cabrini, dois deles (preso 3 - P3 e preso 4 - P4) lhe respondem. Na imagem, o

rosto de Cabrini aparece olhando por dentro da pequena abertura da cela.

RC: Bom dia, pessoal! Roberto Cabrini. Como é que vocês descrevem as condições

aí dentro? É a oportunidade que vocês têm de falar. Quais são as condições aí?

Preso 3: Lotação aí, senhor! É péssima, senhor, muita lotação! Não tem nem como

nós dormir direito, muita muriçoca! Calor, senhor! Calor!

Preso 4: Uma cela que só cabe oito, dorme dois por cada pedra. Mosquito, coceira,

suor!

Contexto da cena: A imagem mostra dois presos sentados, recebendo atendimento

médico, enquanto um policial está de pé. Após, aparece a imagem de vários presos

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recebendo atendimentos de vários médicos. Outras pessoas estão no local, utilizando

máscaras cirúrgicas no rosto. Vários policiais acompanham a ação

RC: A Força Tarefa traz rigor e melhores condições aos presos. Nessas imagens, um

mutirão para atendimento jurídico e médico.

Contexto da cena: Imagens de arquivo do dia da rebelião. Estas imagens são

intercaladas com imagens de visitantes chegando ao presídio e sendo revistados

pelos policiais da Força Tarefa

RC: Desde a rebelião de janeiro, a fiscalização de quem entra e quem sai em Alcaçuz,

passa a ser rigorosa, disciplinadora, inclusive. A Força Tarefa é composta por agentes

federais e estaduais do Rio de Janeiro, Ceará, Pernambuco e Brasília.

CENA (24’53”- 26’21”)

Contexto da cena: Fundo preto, com os dizeres “Dia 1”. Após, o secretário de Justiça

do Rio Grande do Norte, Walber Virgolino chega ao prédio onde está sua sala. Quando

ele chega, chuta a porta.

RC: Fã declarado do cangaceiro Lampião, ele entra em sua sala chutando a porta.

Contexto da cena: Cabrini começa a entrevista dentro da sala do secretário. Os dois

estão de pé. Na parede da sala há uma imagem de Lampião.

RC: Como é que é essa sua admiração pelo Lampião?

Walber Virgolino (WV): Na verdade, eu não admiro a figura do Lampião. Eu admiro

a figura do nordestino. Ele representa bem o nordestino, um homem corajoso, foi um

homem corajoso, foi um homem que lutou.

RC: O senhor se identifica com isso?

WV: Me identifico com o sangue nordestino.

Contexto da cena: O secretário chega em sua sala, retira o paletó, tira o revólver da

cintura e coloca sobre a mesa e senta na cadeira de seu escritório. A câmera dá um

close na arma.

RC: Não abre mão de sua pistola ponto quarenta (.40), sempre ao alcance, em sua

mesa.

Contexto da cena: Cabrini e o secretário Virgolino estão de pé, ao lado da mesa.

Eles conversam.

RC: Esse é o máximo de distância que a sua arma fica do senhor?

WV: Eu acho que ela tá muito longe ainda.

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RC: Tá há um metro. É muito?

WV: É, é muito

RC: Pro senhor é muito?

WV: É muito, e eu estou aqui porque eu confio em você, e sei que não vai me fazer

mal, e eu sei que essa câmera não atira.

Contexto da cena: Imagens do dia do confronto entre os presos, intercaladas com o

secretário sentado em seu escritório, de frente para Cabrini. O secretário manuseia

sua arma.

RC: O confronto revela ao país um homem carismático, e também polêmico.

WV: A munição já está aqui. Só destravar e mete-lhe fogo.

Contexto da cena: O secretário mostra para Cabrini alguns chapéus de cangaceiro

e depois lê uma frase que está na parede.

RC: Seu nome é Walber Virgolino. Um delegado paraibano, agora radicado no Rio

Grande do Norte. É o atual secretário da Justiça e da Cidadania.

Contexto da cena: o secretário está sentado em seu escritório, de frente para Cabrini.

RC: Até que ponto o senhor está disposto a se sentar para negociar com preso?

WV: Eu não negocio com preso, nunca negociei.

RC: De jeito nenhum?

WV: Eu não...eu não tenho…

RC: Em hipótese alguma?

WV: Em hipótese alguma. Eu não tenho vocação para negociar.

Contexto da cena: A câmera mostra o quadro do Lampião na parede do escritório do

secretário. Ela desce e mostra Walber Virgolino sentado na cadeira, mexendo em seu

celular. Após, a câmera dá um close no colete à prova de balas, que está sobre a

mesa, ao lado do revólver.

RC: Virgolino enfrenta pressões de todos os lados para tentar administrar a crise.

Contexto da cena: Cabrini e o secretário Virgolino estão de pé, ao lado da mesa.

Eles conversam.

RC: Tem muitas armas apontadas para o senhor?

WV: Dizem que tem. Eu nunca vi, e, se eu ver e tiver chance de também apontar uma

pra lá, eu vou apontar.

CENA (27’24”– 33’07”)

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Contexto da cena: Walber Virgolino e Roberto Cabrini estão de frente para um portão

que dá acesso ao pátio do presídio de Alcaçuz. Outros policiais estão ao redor, porém,

com os rostos embaçados para não serem identificados. O secretário de Justiça e

Cabrini entram no pátio conversando. A câmera os acompanha em travelling.

RC: Elogiado por seus homens por vestir a camisa com coragem, criticado por seus

métodos não ortodoxos, ostenta o orgulho de jamais fugir da raia. É o que sempre diz.

Contexto da cena: Enquanto o secretário e Cabrini continuam caminhando, a câmera

agora os acompanha de frente. Antes, ela mostra um produtor do programa e um

segurança do secretário, este armado. Ambos não mostram o rosto.

WV: Eu costumo dividir o mundo do crime em dois: o criminoso e o marginal. O

criminoso é aquele que cometeu o crime de forma esporádica, ele não tem o crime

como meio de vida. Já o marginal é aquele que tem o crime como meio de vida, é o

faccionado. Esse aí, na minha concepção, não tem recuperação.

Contexto da cena: Em travelling, a câmera acompanha o secretário e Cabrini, de

costas, que continuam caminhando pelo pátio do presídio. Vários outros membros da

equipe de reportagem também os acompanham, assim como seguranças de Walber

Virgolino. Nenhum rosto aparece.

RC: O senhor pode descrever exatamente onde nós estamos aqui e que risco estamos

correndo?

WV: Nós estamos a poucos metros do pavilhão 1. Aí são membros de uma facção

criminosa aqui local do Rio Grande do Norte. Aí tem cerca de duzentos presos, e que

estão apenas custodiados pela aquela porta preta. As celas estão danificadas. Lá

dentro eles estão soltos, não em função da rebelião de janeiro agora, 2017, mas de

uma rebelião de 2015.

RC: Essa estrutura é essencial?

WV: É o que o Estado pode fornecer. O Estado vem passando por uma crise

financeira, não só do Rio Grande do Norte, mas em todo o Estado do Brasil. Mas você

vê o silêncio do presídio.

Contexto da cena: Roberto Cabrini entra na caminhonete do secretário Walber

Virgolino. Homens armados sobem na carroceria do veículo. A câmera agora está no

banco traseiro. O secretário de Justiça dirige o veículo e Cabrini está de carona.

RC: Nesse momento estamos acompanhando o secretário em direção ao outro setor

de Alcaçuz, onde está exatamente a outra facção.

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Contexto da cena: Ambos saem do veículo Antes de sair, Walber Virgolino pega um

revólver. Já no pátio, um segurança, que não mostra o rosto, ajuda o secretário a

colocar a bandoleira de uma metralhadora no ombro.

RC: E para me acompanhar em Alcaçuz, recorre à artilharia mais pesada.

Contexto da cena: Antes de entrarem de fato no pátio do pavilhão, Cabrini e o

secretário Walber Virgolino estão de frente.

WV: Eu sempre tive contato com arma, meu pai sempre teve arma e eu tenho duas

paixões na vida, uma é cavalo e outra é arma.

RC: Tá pronto pra entrar aí?

WV: Eu acho que eu fui um general romano na outra encarnação.

RC: Ah, é? Por que?

WV: Porque eu gosto de cavalo e de arma.

Contexto da cena: Cabrini, Walber Virgolino, produtores e seguranças entram no

pátio do presídio por um enorme portão de ferro.

RC: Secretário, aqui a gente está entrando exatamente aonde aconteceram os

confrontos.

WV: É.

Contexto da cena: Cabrini e o secretário caminham no pátio do presídio. Após, os

dois estão frente a frente, onde conversam.

WV: Essa penitenciária há vinte anos vem se degradando. Vencer concurso público,

vencer construção de unidade, e, se comparar ao público federal, não tem nem

comparação. Se é público federal, tem presídio novos, tem efetivo, tem agente

treinados e todos os anos se reciclam.

Contexto da cena: Enquanto conversam, Cabrini, o secretário, e o restante da equipe

entram no pavilhão, acompanhados de policiais. Após, aparece um fundo preto, com

os dizeres “Dia 2”. A câmera faz um plano detalhe da parte de cima de uma cela se

abrindo. Cabrini e o policial militar Maycon Rottava estão de costas, caminhando no

corredor do pavilhão. Enquanto a câmera os acompanha em travelling, ela também

mostra algumas portas de celas e planos detalhes da parte de cima de celas se

abrindo. As imagens se intercalam com policiais encapuzados e fortemente armados,

na qual se preparam para a segurança de Cabrini, que entrevistará alguns líderes das

facções envolvidas nos conflitos. A câmera mostra um plano detalhe de um policial

retirando a algema de um dos presos. Após, dois presos são conduzidos por um

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policial até uma porta. Estes presos são da facção que atua em todo o país. Nenhum

rosto dos presos aparece.

RC: Minha missão agora é ouvir os presos das duas facções, alguns deles, líderes do

que aconteceu aqui. É um momento difícil. É uma operação que também envolve

riscos. Providências no pavilhão da organização de presos que está hoje em todo o

país. Providências também onde está a facção que opera no Rio Grande do Norte.

Tudo vai caminhando com o tempo.

Contexto da cena: Na parte de fora, um membro da facção que atua no Rio Grande

do Norte, sai de um carro da polícia e é conduzido pelos agentes para dentro do

pavilhão. Lá, Cabrini está o esperando para dar início à entrevista.

RC: Pronto para a nossa entrevista? (O preso apenas faz um gesto de positivo com a

cabeça).

Contexto da cena: Em imagens separadas, os presos que serão entrevistados são

conduzidos até Roberto Cabrini. Ele pergunta para cada um se concordam com a

entrevista. Após, cada um aparece sentado de frente para Cabrini. Em todas as

entrevistas, os agentes de segurança fazem a escolta.

RC: Três presos de um lado, três do outro são trazidos. São escoltados e cercados

por agentes o tempo todo.

Contexto da cena: Cabrini está sentado de frente para um preso que é membro da

facção que atua em todo o Brasil. Antes de iniciar a entrevista, ele explica como ela

se dará para garantir a segurança.

RC: Nesse momento, começa a nossa entrevista aqui no pavilhão cinco. Estamos

escoltados por oito agentes da Força Tarefa que estão fornecendo segurança para

que essa entrevista possa acontecer.

Contexto da cena: As imagens mostram o ambiental que Cabrini descreveu

anteriormente. A entrevista inicia.

RC: Há quanto tempo você sabia que essa carnificina, essa guerra iria acontecer

aqui?

Membro da facção que atua em todo o Brasil (FB1): Qualquer momento poderia

acontecer né, estourar a bomba né.

RC: Vocês sabiam?

FB1: A gente tinha um conhecimento de que eles estavam ameaçando nós direto.

Todo dia ameaçando, fazendo ameaça.

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Contexto da cena: Roberto Cabrini agora está sentado de frente para um preso que

é membro da facção que atua no Rio Grande do Norte.

RC: Quem é que começou essa guerra?

Membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR1): Quem começou essa

guerra, pra falar a verdade, foi o (censurado).

RC: Eles dizem que vocês começaram.

FR1: Nós não começou em momento algum essa guerra. Nós só fez só se defender.

Contexto da cena: Roberto Cabrini agora está sentado de frente para outro preso

que é membro da facção que atua em todo o Brasil.

Membro da facção que atua em todo o Brasil (FB2): Como eles vem matando aí

nossos filhos na rua, vem matando mãe da gente, expulsando as famílias de onde

moram, certo? E, até aí, nós nunca fez nada disso com parente nenhum deles, e eles

sempre ameaçando que, ou nós sai do Estado ou vai acabar com nós e com nossa

família do Estado.

Contexto da cena: Roberto Cabrini agora está sentado de frente para outro preso

que é membro da facção que atua no Rio Grande do Norte.

Membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR2): Porque tudo aí que

começaram com essas covardias aí, tudo eles tiveram a oportunidade de ficar aqui do

lado de nós, aqui dos (censurado). Mas, como não quiseram, quiseram dividir o

sistema, aconteceu isso tudo, mas começaram deles, tá entendendo?

Contexto da cena: Cabrini aparece entrevistando três presos. As imagens são

separadas.

RC: Cada lado contando a guerra ao seu modo.

Contexto da cena: Roberto Cabrini agora está sentado de frente para um preso que

é membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR1).

FR1: Acabou a visita, começou o corre-corre na cadeia, nós sabia que não tava

normal, a rotina normal. Visitas passando aqui e dizendo “Aí meu Deus!” e vieram pra

cima de nós dentro do quadro.

Contexto da cena: Roberto Cabrini agora está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB2).

FB2: E quando a maioria viu que eles estavam vindo, nós teve que fazer o que? Teve

que partir pra cima. Quem tava solto teve que ir pra cima, enquanto isso, outros ainda

tavam trancado, ainda tentando sair de dentro das celas pra não perder suas vidas.

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Contexto da cena: Roberto Cabrini e Walber Virgolino caminham no corredor no

pavilhão quatro. A câmera os acompanha, de costas, em travelling. Eles estão indo

em direção à porta onde, supostamente, cabeças de presos foram prensadas. Cabrini

mostra a porta para o secretário de Justiça.

RC: Naquela porta de ferro, a gente vai ter uma imagem que marca muito. A imagem

de cabeças prensadas contra a própria porta. O senhor, com certeza, conhece essa

imagem.

WV: As cabeças não foram prensadas contra a própria porta.

RC: O senhor dá uma olhada. O senhor pode fechar essa porta de ferro aqui pra gente

ver? Dá uma olhada.

WV: As cabeças não foram prensadas pela porta. As cabeças foram jogadas contra

os corpos aqui.

RC: Ó, olha essas marcas aqui.

WV: Isso aqui é murro e pé pra arrombar a porta, e pau também e ferro. Isso aqui,

uma mão não faz isso aqui. Isso aqui é ferro, é grade.

RC: Sei.

Contexto da cena: Em preto e branco, a imagem retorna para o momento que o

policial militar Maycon Rottava abre a porta e explica para Roberto Cabrini sobre como

as cabeças dos presos eram prensadas contra a porta.

MR: Cada marca dessa daqui é uma cabeça. O sofrimento e a dor era tanta aqui

nesse confinamento onde que estavam botando fogo, que eles vinham aqui e não

tinham como sair e batiam a cabeça na porta.

RC: As pessoas ficavam prensadas aqui?

MR: Prensadas batendo a cabeça pra tentar abrir esse suporte metálico aqui.

CENA (34’06”- 47’20”)

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR1).

RC: Bom, no fundo a razão de tudo isso é o controle do tráfico de drogas do lado de

fora?

FR1: Com certeza, duas facções né.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB2).

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FB2: Eles que querem controlar o Estado.

Contexto da cena: Imagens de arquivo do dia do confronto, onde presos brigam no

pátio do presídio. Após, Cabrini está caminhando ao lado do secretário de Justiça pelo

corredor do presídio. Eles caminham em direção à câmera. Os seguranças ao redor

não mostram o rosto.

RC: Secretário, nesses dias que nós passamos aqui em Alcaçuz, surgiram algumas

denúncias que o senhor pode responder?

WV: Posso responder.

RC: Posso fazer as perguntas?

WV: Pode.

RC: Por exemplo, o Estado já sabia que tudo isso ia acontecer e poderia ter evitado.

WV: Não poderia e não sabia.

RC: É uma acusação que a gente ouviu de várias pessoas, inclusive dos familiares

dos presos assassinados.

WV: Eu, enquanto gestor público, eu trabalho em cima de informações oficiais. Boato

pra mim não muda nada. Se, eu duvido e desafio a qualquer órgão de inteligência do

Brasil a provar que o governo do Estado do Rio Grande do Norte recebeu algum

comunicado oficial de que isso ocorreria.

Contexto da cena: Imagens de arquivo do dia do confronto, onde presos brigam no

pátio do presídio. Tiros são ouvidos. Na sequência, Roberto Cabrini está sentado de

frente para o preso que é membro da facção que atua em todo o Brasil (FB1).

RC: E como é que vocês se preparavam para esse confronto?

FB1: A gente estava preparado pra tudo né.

RC: De que forma vocês se preparavam?

FB1: Todo jeito nós tava. Preparado pra tudo, uma guerra.

RC: Muitas armas?

FB1: Aí eu não posso dizer se tinha muita arma.

RC: Sei, mas eram muitas? Todos nós sabemos que eram muitas armas.

FB1: Aí eu não posso falar nessa parte.

RC: Quem é que tinha mais arma?

FB1: Aí eu não posso passar essa informação que eu não sei.

RC: Era muito fácil entrar arma aqui dentro?

FB1: Aí eu também não posso passar essa informação que eu não sei.

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Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para outro preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR3).

RC: Quem é que tinha mais armas?

Membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR3): Rapaz, eram eles.

RC: Mas vocês tinham muitas armas de fogo também?

FR3: Rapaz, tinha mais negócio de faca, facão.

RC: Impressiona como é fácil entrar arma de fogo, droga, celular?

FR3: Rapaz, eu não sei dizer não isso.

RC: Você sabia que tinha tantas armas assim aqui no presídio?

FR3: Sabia não.

Contexto da cena: Roberto Cabrini agora está sentado de frente para outro preso

que é membro da facção que atua em todo o Brasil (FB2).

RC: E vocês tinham quantas armas?

FB2: Nós nada. As armas que a gente pegou aqui foi as pedras, as barras de ferro

pra não perder nossa vida.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR1).

FR1: Eles já vieram de lá fortemente armados pra cima de nós com bomba, gás e bala

de borracha e bala letal.

Contexto da cena: O agente da Força Nacional Penitenciária, Antônio Arino abre uma

das celas e mostra para Cabrini onde os presos guardavam as armas. Ele mostra as

camas de concreto e explica como era o esconderijo.

RC: Onde estavam essas armas?

Antônio Arino (AA): Essas camas elas tinham uma estrutura aqui na parte de baixo,

era uma espécie de parede que vedava toda a parte de baixo e servia de baú pros

internos guardar, guardarem armas artesanais, armas de fogo.

RC: Como se fosse um paiol?

AA: Como se fosse um paiol. Munição.

Contexto da cena: Imagens amadoras mostram o momento em que policiais

descobrem o esconderijo e retiram celulares e facas, que estavam dentro de sacos

plásticos. Após, retorna a imagem de Antônio Arino e Cabrini dentro da cela.

AA: Inclusive, dentro de um desses baús, nós encontramos cerca de oito armas de

fogo.

RC: Que tipo de arma?

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AA: Revólver calibre 38, pistola 380. Foram duas pistolas e quatro revólveres se não

me engano.

Contexto da cena: Roberto Cabrini agora está sentado de frente para outro preso

que é membro da facção que atua em todo o Brasil (FB2).

RC: Sempre teve muita arma aqui?

FB2: Sempre teve.

RC: Por que é tão fácil entrar arma aqui?

FB2: Aí eu não sei né, só sei que sempre teve arma senhor.

Contexto da cena: Cabrini está ao lado do secretário de Justiça no corredor do

presídio.

RC: O que o senhor tem a dizer sobre a acusação de que agentes estaduais e da

polícia militar facilitaram a entrada de arma aqui para uma das facções?

WV: Olha, eu não descarto nenhuma possibilidade, mas eu, particularmente, não

acredito em corrupção. Eu acredito em ausência de procedimento.

RC: Por facilitação? Para entrada de armas aqui? Para uma das facções?

WV: Eu, enquanto secretário de Justiça e Cidadania do Rio Grande do Norte, não

descarto nenhuma possibilidade. Está sendo apurado diante de interna através de

sindicância própria. Está sendo apurado também através de inquérito policial pela

Polícia Civil.

RC: O senhor está desconfiado disso então?

WV: Mas eu, particularmente, eu não acho que houve corrupção. Eu acho...

RC: O senhor tem algum indício de que houve facilitação para entrada de armas aqui?

WV: Não, não tenho indício. O que eu tenho, particularmente, é que houve o

procedimental.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para outro preso, que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR3).

RC: Quem é que tinha mais armas?

FR3: Eles lá né, que vieram apoiados da polícia.

RC: Da polícia?

FR3: Eles vieram apoiados com a polícia.

RC: Como é que você pode afirmar isso (censurado).

FR3: Porque nós via com os próprios olhos. Um galheteiro descendo nas coisas e,

bagulho doido.

RC: Você está falando de corrupção e vistas grossas?

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FR3: Corrupção e vistas grossas.

Contexto da cena: Cabrini está ao lado do secretário de Justiça Walber Virgolino no

corredor do presídio.

RC: Secretário, realisticamente, esse confronto teria acontecido sem a corrupção de

agentes.

WV: Eu não acredito em corrupção, agora, não descarto. Eu, enquanto gestor, não

descarto, porque existe investigações em curso e essas investigações vão dizer.

RC: Armas entraram livremente aqui.

WV: Olha, armas entraram, armas foram apreendidas. As armas entraram...

RC: Isso não é vergonhoso?

WV: Olha, no dia do confronto, não tinha uma arma de fogo aqui dentro.

RC: Mas por que tanta arma assim?

WV: Não tinha arma de fogo. Eles fizeram armas caseiras. Foram apreendidas armas

caseiras.

RC: Não, foram apreendidas armas de fogo também.

WV: Armas caseiras.

RC: As imagens mostram.

WV: As armas de fogo foram a maioria apreendidas por fora do muro. Algumas armas

conseguiram ser lançadas para dentro no dia da rebelião, e, após a rebelião, a Força

Penitenciária conseguiu apreender três armas de fogo.

Contexto da cena: Cabrini conversa com o agente da Força Nacional Penitenciária,

Antônio Arino. Eles estão dentro de uma das celas onde os presos guardavam as

armas.

RC: Era muito fácil entrar arma aqui?

Antônio Arino (AA): Muito fácil.

RC: Celular?

AA: Celular, encontramos centenas de celulares.

RC: Lideranças tinham acesso à rede social?

AA: Com certeza.

RC: Se comunicavam pelas redes sociais aqui?

AA: Com certeza.

RC: Comunicação total?

AA: Comunicação total. Hoje...

RC: Sem qualquer tipo de problema?

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AA: Sem problema nenhum. Hoje...

RC: Drogas?

AA: Drogas.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e o secretário de Justiça do Rio Grande do Norte,

Walber Virgolino caminham em direção à cela do pavilhão 4 que foi incendiada pelos

presos no dia da rebelião. A câmera os acompanha em travelling, de frente. Eles

entram na cela e Cabrini mostra para o secretário os buracos na parede onde os

detentos guardavam as armas, além dos buracos no chão, onde os túneis eram

escavados.

WV: Você vai comprovar com os seus próprios olhos a estrutura.

RC: Ó, por exemplo, eu estive aqui. Essa cela totalmente queimada. E nós apuramos

que as armas, secretário, foram colocadas nesses buracos aqui, muitas vezes eram

escondidas aqui, guardadas aqui.

WV: Não foram.

RC: É a informação que eu obtive.

WV: Essa estoque são pra esconder telefone celular.

RC: Sei, tá certo, o que não torna mais aceitável, né?

WV: A estrutura do andar prisional, se você ver, ela é precária, ela colabora pra isso.

RC: Ó, o senhor vê, por exemplo, esses túneis escavados aqui. Eu fiquei

impressionado como eu encontrei túneis sendo escavados aqui. É túnel em todos os

lugares. Como é que o Estado não sabia disso?

WV: Você sabe onde você está?

RC: Numa cela.

WV: Você está em cima de uma duna.

RC: Sei.

WV: Então o terreno não é adequado pra construir um presídio.

RC: Mas como é que o Estado não sabia que tantos túneis estavam sendo

escavados?

WV: O Estado sabia desses túneis. É tanto que nenhuma fuga ocorreu por estes

túneis. Eles ocorreram por uma escavação no pé do muro.

Contexto da cena: Roberto Cabrini conversa com o agente da Força Nacional

Penitenciária, Antônio Arino. Eles estão dentro de uma das celas onde os presos

guardavam as armas.

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AA: Hoje, inclusive, nó conseguimos garantir com cem por cento de certeza que nós,

hoje, nesta unidade, está dominada pela nossa Força Tarefa. Não existe mais nenhum

aparelho celular e não existe drogas.

RC: Isso é uma certeza?

AA: Certeza absoluta.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e o secretário de Justiça do Rio Grande do Norte,

Walber Virgolino estão no pátio do presídio, de frente para o buraco na parede que foi

escavado pelos presos no dia da rebelião.

RC: Esta imagem é a demonstração da falência do Estado?

WV: É a demonstração da degradação do patrimônio do Estado. Não do Rio Grande

do Norte, mas do centro penitenciário brasileiro.

RC: De um confronto que o Estado não conseguiu evitar?

WV: De um confronto que o Brasil não conseguiu evitar.

Contexto da cena: Imagens de arquivo mostram presos com bandeiras em cima do

teto do pavilhão do presídio no dia da rebelião, além de imagens de facas sobre uma

mesa e detentos carregando corpos pós execuções.

RC: Com armas de fogo e outras improvisadas, estrategicamente armazenadas nas

celas, e uma infinidade de túneis cavados, a guerra evolui para execuções, onde

impera a barbárie máxima.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB1).

RC: Nós sabemos que você ordenou que cabeças fossem cortadas.

FB1: Eu? Sei não senhor.

RC: Tenho essa informação.

FB1: (Ele apenas faz gestos de negatividade com a cabeça).

RC: Você não fez isso?

FB1: Eu não. Informação tá errada. Eu cheguei aqui (inaudível), nós já tinha abrido o

pavilhão três já, onde já estava na metade nós cheguemo.

RC: Por que tantas cabeças foram decepadas?

FB1: Não sei informar o senhor.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR3).

RC: Os dois lados cometeram atrocidades?

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FR3: Os dois lados, que a gente não devia ficar só morrendo, morrendo. Tinha que

reagir, né. Se não, ia morrer todo mundo. Ia morrer tudinho. A gente teve que tomar

algumas atitudes.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB1).

RC: Como é que foi pra você decepar uma cabeça naquele momento?

FB1: Não, isso aí...

RC: O que que passava na sua mente?

FB1: Isso é coisa normal, né. Isso é coisa normal que a gente veve nessa vida.

RC: Você sentiu o que?

FB1: Nada.

RC: Era um ser-humano aí com a cabeça decepada.

FB1: É, mas se fosse a gente também eles tinha feito a mesma coisa pior, né.

RC: Mas por que tinha que decepar a cabeça?

FB1: Porque é a regra da cadeia.

RC: Que regra é essa?

FB1: Arrancar a cabeça.

RC: Por que?

FB1: Porque né, eles enforcam, e nós não enforca.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR3).

RC: Você teve que executar?

FR3: Não.

RC: Você executou alguém?

FR3: Não.

RC: Qual foi a cena que mais chamou a sua atenção no que você viu aqui?

FR3: Foi deles, né, pegando os corpos dos nossos irmão aí e jogando dentro das

fossas aí (Inaudível).

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para outro preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB3).

RC: As execuções dos presos foram decisões individuais ou partiu do grupo?

FB3: Até mesmo acho que cada um tomou sua decisão porque não teve ideia

nenhuma, até mesmo planejamento nenhum disso teve.

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Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR1).

FR1: Foi triste demais mano. É um cenário que, pode passar quantos anos for, nós

que passou por ele nunca vai esquecer.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB1).

RC: Como é que você vai explicar para os seus filhos que você decepou cabeças aqui

dentro?

FB1: Não tem explicação porque nem contato com ele eu posso ter.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR1).

RC: Como é que você vai explicar para sua filha o que aconteceu aqui dentro? Essa

carnificina. Essa matança.

FR1: Eu acho que eu não vou chegar nem a explicar.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB1).

RC: Você tem arrependimento pelos seus atos?

FB1: Eu não posso ter arrependimento do que fez, né. Já passou, né.

RC: Você tem arrependimento pelas cabeças decepadas? Pelos rivais mortos?

B1: Não tem não.

RC: Por que não?

FB1: (FB1 faz sinal de negativo com a cabeça).

RC: Você não se arrepende?

FB1: Arrependo não.

RC: Essas imagens fortes não ficam na sua mente?

FB1: Porque assim, hoje, o senhor podia estar aqui no pavilhão lá, com os

(censurado), fazendo as mesmas perguntas pra eles. Eu acho que eles responderiam

a mesma. Se nós tivesse morrido? Arrancado a cabeça de nós também? Como é que

ia ser?

Contexto da cena: Imagens de arquivo dos presos no pátio do presídio no dia da

rebelião. Após, Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é membro da

facção que atua em todo o Brasil (FB2).

RC: Você se arrepende do que você fez?

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FB2: Senhor, se eu disser que eu me arrependo, eu vou estar mentindo, né, porque

é como eu disse, esses caras já mataram mãe da gente.

RC: Você se arrepende de ter cortado cabeças?

FB2: Não, não. Não me arrependo, não.

RC: Você faria novamente?

FB2: Com certeza. Com certeza.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para outro preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR3).

RC: Foram 26 mortes, 26 execuções. Quem é que matou mais:

FR3: Foi eles lá, né.

RC: Como é que você sabe disso?

FR3: Porque, né, foi que pegaram todo mundo na covardia lá.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB1).

RC: Quem é que venceu essa guerra?

FB1: Ninguém venceu, que a guerra não para. Seu eu disser que a guerra parou, eu

vou estar mentindo.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para outro preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR3). Enquanto o detento

responde a pergunta, aparecem imagens em preto e branco dele sendo conduzido até

uma viatura de polícia.

RC: Que tipo de desabafo você gostaria de fazer? O que você gostaria de falar?

FR3: Só que, lamento muito só pelas famílias dos irmãos mesmo, que morreu mesmo,

família deles mesmo.

RC: Mais gente vai morrer?

FR3: Rapaz, você sabe que a guerra não acabou não. A guerra, ela apenas começou.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB1). Enquanto ele responde a última

pergunta, aparecem imagens em preto e branco dele sendo levado por um policial de

volta para sua cela.

RC: Você volta de que forma para a sua cela?

FB1: Normal. Tranquilo.

RC: Consciência tranquila?

FB1: Já passou.

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RC: Sem arrependimentos?

FB1: Não tenho arrependimento de nada. Não posso ter arrependimento. Pra minha

cela normal, tirar meia dia a dia. Meu respeito com as guarda. Pronto.

RC: Faria tudo novamente?

FB1: Se vim querer tirar a minha vida, com certeza. Que eu não vou querer morrer.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR3). Enquanto o detento

responde a pergunta, aparecem imagens em preto e branco dele sendo conduzido até

uma viatura de polícia.

RC: Você volta para sua cela com que tipo de cabeça nesse momento?

FB1: Só revolta mesmo.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB2). Enquanto o detendo responde a

pergunta, aparecem imagens em preto e branco dele sendo conduzido por um policial

de volta para sua cela.

RC: Você volta para a sua cela agora com que espírito?

FB2: Com receio, né, qualquer hora de ser atacado novamente, né.

RC: É isso que domina a sua mente nesse momento?

FB2: É, porque nós não dorme direito. Nós, às vezes, fica a noite acordado esperando

qualquer coisa, que nós sabe que qualquer hora vem qualquer coisa aí da parte

desses pessoal aí.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para o preso que é

membro da facção que atua no Rio Grande do Norte (FR1). Enquanto o detendo

responde a pergunta, aparecem imagens em preto e branco dele sendo conduzido

por um policial até uma viatura.

RC: Você volta pra sua cela de que forma? Como é que está sua cabeça?

FR1: Minha cabeça tá aperriada. Minha cabeça tá... Eu não acredito mais em nada

não.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado de frente para outro preso que é

membro da facção que atua em todo o Brasil (FB3). Enquanto o detendo responde a

pergunta, aparecem imagens em preto e branco dele sendo conduzido de volta para

sua cela.

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FB3: O que eu posso deixar, até mesmo claro pro senhor assim, é que, volto com

vida, ententendeu? Da mesma forma que eu enxergava ali que eu tava lutando por

ela.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e o secretário de Justiça do Rio Grande do Norte,

Walber Virgolino estão conversando, em pé, no pátio do presídio.

RC: Como é que vai ficar pra história o que aconteceu aqui dentro?

WB: Olha, a história ninguém apaga. A história são momentos bons e momentos ruins.

Eu vivi os bons e os ruins, mas vão lembrar de mim, e vão lembrar da forma mais

positiva possível. Vão lembrar de um servidor público que lutou contra o crime

organizado.

RC: Sim, mas é uma página negra da história do país.

WB: Uma página negra da história do país. Não me envergonho, mas deve

envergonhar todo o Brasil, porque isso também é culpa da sociedade. Há 20 anos o

sistema se degrada e ninguém fez nada. Agora, a gente está vendo a bomba estourar

com os reflexos na rua, e os especialistas agora, todo mundo tem uma solução pra

isso tudo. Por que a solução não foi dada antes?

Contexto da cena: Roberto Cabrini faz gesto de positivo com a cabeça, estende a

mão e agradece o secretário. Walber Virgolino o cumprimenta.

RC: Obrigado, secretário.

CENA (47’46” – 54’29”)

Contexto da cena: Viúvas dos presos que tiveram as cabeças decepadas relatam

como está sendo a vida. Elas não mostram os rostos. A câmera mostra apenas as

bocas em plano detalhe.

Viúva 1 (V1): Eu perdi meu marido. Ele teve a cabeça decepada e eu quero que o

Governo venha até nós e peça-nos desculpa, porque em nenhuma hora ele nos

apoiou.

Viúva 2 (V2): Perdi meu marido. Ele foi executado.

Contexto da cena: Para embasar o assunto tratado, a cena retorna para a entrevista

que Cabrini fez com o secretário de Justiça do Rio Grande do Norte, Walber Virglino.

Eles estão no corredor do presídio.

RC: O Estado deve um pedido de desculpas à essas famílias?

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WB: Quem promoveu essas mortes não foi o Estado não, Cabrini. Foi preso contra

preso. São presos faccionados.

RC: O Estado fez tudo o que poderia fazer pra evitar isso?

WB: O Estado fez tudo que poderia fazer.

RC: O senhor tem certeza disso?

WB: Tenho certeza, sem sombra de dúvida e sem medo de errar.

Contexto da cena: A câmera mostra planos detalhes dos braços e mãos das viúvas

dos presos que morreram nos confrontos. Após, aparecem imagens mostrando a

localização de alguns dos corpos humanos. Uma das imagens é distorcida, pois há

uma pessoa morta.

RC: Para as viúvas, continua a busca pelas cabeças de seus entes queridos. Esse

registro revela a localização de partes de corpos humanos de homens cujos enterros

já tinham sido até realizados.

Contexto da cena: A câmera mostra apenas a boca de uma outra viúva, em plano

detalhe, que acusa os policiais pela morte do seu marido.

Viúva 3 (V3): Perdi meu marido. Ele foi morto por um guariteiro né, que é agente

penitenciário. E só quero justiça com isso.

Contexto da cena: Sete mulheres, viúvas de presos mortos no dia do confronto estão

sentadas lado a lado, de costas para a câmera, em uma sala. Roberto Cabrini faz a

passagem pela frente delas. Enquanto ele fala, planos detalhes dos braços e bocas

das mulheres contextualizam a cena.

RC: São sete mulheres, a maioria jovens. Elas não querem ser identificadas porque

temem represálias. Todas perderam muito nessa guerra de Alcaçuz.

Contexto da cena: Cabrini está em pé, de frente para uma das viúvas. Ela responde

à pergunta e a câmera mostra um plano detalhe do seu braço.

RC: Que condições estava o corpo do seu marido?

Viúva 4 (V4): Ele teve a cabeça decepada.

Contexto da cena: Cabrini está em pé, de frente para outra viúva. Enquanto ela

responde à pergunta, imagens do dia do confronto são intercaladas.

RC: Como é que você dimensiona a sua perda?

Viúva 5 (V5): A perda do meu esposo é uma perda incalculável, não tem dimensão.

Deixando bem claro que ele não pertencia a nenhuma facção criminosa, diferente do

que vários veículos de comunicação vêm informando, que todos que morreram eram

integrantes de facção. Meu esposo não fazia parte.

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RC: Há quem você atribui a culpa?

V5: Ao Estado.

Contexto da cena: Cabrini está em pé, de frente para uma das viúvas (V4). Enquanto

ela fala, a cena é coberta por imagens das facas apreendidas no presídio e pelo

buraco feito pelos presos na parede.

V4: Eu quero dizer que existiu facilitação, não sei de quem, mas também não é difícil

descobrir.

RC: Que tipo de facilitação? A entrada de armas?

V4: A entrada de arma pra que eles conseguissem sair de lá pra chegar até lá. Não é

uma parede e entrar em outro buraco não.

RC: Para o deslocamento?

V4: Exatamente.

Contexto da cena: A única viúva que aceita mostrar o rosto, Carla Rejane Barbosa

(V6) caminha na calçada. Imagens do dia do confronto são intercaladas e, após, ela

aparece caminhando com Roberto Cabrini. Uma foto do casal aparece na tela e depois

ela aparece concedendo a entrevista.

RC: Esta mulher tem importantes revelações. O marido era preso em Alcaçuz, foi

executado e teve a cabeça decepada. A viúva é a única que aceita mostrar o rosto e

ser identificada.

Viúva 6 (V6): Quando eu vim ver, no sábado que eu vi um vídeo e conheci ele pelo

vídeo. Sem a cabeça, mas eu ainda conheci. E enterrei ele sem a cabeça.

Contexto da cena: Para contextualizar o assunto, Roberto Cabrini e o secretário de

Justiça do Rio Grande do Norte, Walber Virgolino estão no pátio do presídio. Cabrini

mostra para o secretário as fossas onde, supostamente, estariam pedaços de corpos

humanos. A câmera faz planos detalhes das fossas. Após, Cabrini e Walber Virgolino

conversam e divergem sobre as informações.

RC: Secretário, a gente está se aproximando aqui das fossas. Nós recebemos a

informação de que ainda existem pedaços de corpos, inclusive cabeças, dentro

dessas fossas.

WV: Não descarto.

RC: O senhor tem o conhecimento disso?

WV: Pedaços de corpos, não.

RC: Mas é um fato concreto que muitas cabeças não foram encontradas. Isso é um

fato.

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WV: Não.

RC: Conversei com os familiares.

WV: Não. Eu não posso afirmar porque...

RC: Presos foram enterrados sem suas cabeças.

WV: Aí, pode ser que tenha sido.

Contexto da cena: Cabrini está de frente para a viúva Carla Rejane Barbosa (V6).

V6: Vou estar em paz quando eu receber a notícia: tá aqui a cabeça dele.

RC: Você não vai desistir?

V6: Não vou desistir.

Contexto da cena: Cabrini está em pé, de frente para as sete viúvas que não são

identificadas. Após a pergunta, todas respondem ao mesmo tempo.

RC: Todas vocês acreditam que essa matança poderia ter sido evitada?

Todas: Com certeza.

Contexto da cena: Imagens de arquivo do dia do confronto entre os presos. Cabrini

faz um questionamento há uma das viúvas (V5). As imagens são intercalas com ela

respondendo e imagens dos confrontos.

RC: O que que as pessoas do lado de fora dos presídios precisam saber sobre o que

aconteceu ali dentro?

V5: São homens que tem esposa, que tem filho, que tem mãe, que tem avó, tem irmã,

tem irmão, tem família, assim como qualquer pessoa tem, e não é porque eles

estavam presos que eles tem que ser descartados como se fossem nada.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado frente a frente com a antropóloga

Juliana Melo (JM). Eles estão em uma sala. Enquanto Juliana responde o

questionamento de Cabrini, imagens do dia do confronto se intercalam à sua fala.

RC: Quais são os seus questionamentos, professora?

Juliana Melo (JM): O pavilhão cinco é como se fosse uma gaiola. O teto é uma grade

e os guardas andam em cima. Como é que aquela grade, que abre por fora

inicialmente, ela se abriu? Como é que 200 homens invadem um pavilhão? Como é

que antes tinha sido feita uma revista no pavilhão quatro e tinham retirado todas as

armas? Eu acho que indica o que, uma vontade de que eles mesmos se matem.

Contexto da cena: Roberto Cabrini novamente está com o secretário de Justiça da

Rio Grande do Norte, Walber Virgolino no corredor do presídio.

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WV: Cabrini, as facções criminosas, elas se degladiaram tentando demonstrar ao

Brasil força. E, os corpos dos presos eram troféus nessa empreitada criminosa. Então,

todos os corpos, eles foram expostos ao ar livre no pavilhão.

Contexto da cena: A diretora do Departamento Penitenciário Nacional, Cíntia Rangel

Assunção (CR) explica sobre a situação dos presídios. Ela está na sala onde trabalha,

sentada. Enquanto ela fala, aparecem imagens de dentro do presídio e presos sendo

conduzidos por policiais.

Cíntia Rangel Assunção (CR): Foi um ambiente de crise e, infelizmente, essas

situações de crise que soluções precisam ser dadas, projetos precisam ser

implementados, programas precisam ser efetivos.

RODA VINHETA INTERVALO

RODA VINHETA VOLTA DO INTERVALO

Contexto da cena: Imagens internas do presídio, com presos sendo conduzidos às

suas celas. Após, imagens de como está sendo a reconstrução do presídio.

RC: Esta semana, a Força Tarefa invade os pavilhões 1, 2 e 3. Presos são realocados.

Tentativa de enfraquecer as facções e continuar a reconstrução do presídio.

Contexto da cena: Imagens de celulares e facas que foram apreendidos pelos

agentes penitenciários.

RC: Um presídio que virou paiol de armas clandestinas. Os agentes recolhem

celulares, drogas, facas, além de outros objetos cortantes.

Contexto da cena: Imagens de arquivos de outros confrontos em outros presídios.

RC: 2017: a explosão em série nos presídios.

Contexto da cena: Cenas de parentes fora do presídio do Amazonas. Uma senhora

acompanha uma ambulância dizendo que amava o irmão.

RC: Amazonas.

Contexto da cena: Cenas do exterior do presídio de Roraima.

RC: Roraima.

Contexto da cena: Cenas de um confronto entre presos no presídio do Rio Grande

do Norte.

RC: Rio Grande do Norte.

Contexto da cena: Imagens externas e internas de presídios em situações

degradantes, com celas superlotadas.

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RC: Rebeliões e massacres que se repetem. Um sistema falido em todo país, sempre

à espera da tragédia.

Contexto da cena: Planos detalhes das mãos e bocas das viúvas dos presos mortos

no confronto de Alcaçuz.

RC: Vozes que vão e voltam.

Contexto da cena: Sucessivas imagens do dia do confronto entre as facções no

presídio de Alcaçuz, intercaladas com planos detalhes de presos sendo algemados e

conduzidos por agentes penitenciários. A cena termina com a imagem de uma cela

superlotada, onde presos estão sentados no chão, de cabeças baixas.

RC: Mortes que viram apenas estatísticas. A fábrica de criminosos e guerras. A

inversão da autoridade. A ausência frequente do Estado. A simplificação do nós contra

eles.

Contexto da cena: Com fundo preto e letras brancas, é explicado na tela que o

programa é em memória de Francisco Klemberg Batista, coordenador da Força

Nacional Penitenciária, que morreu em um acidente de carro antes de o programa ir

ao ar. Após, Cabrini aparece na tela. Ao fundo, o presídio de Alcaçuz.

RC: As feridas de Alcaçuz ainda continuam abertas. Quantos ainda precisam morrer

para que o país aprenda as lições? Aqui, Roberto Cabrini, e este foi o Conexão

Repórter de hoje. Boa noite.

Contexto da cena: Sobem créditos finais.

6.2.2.3.2.1 Análise do episódio “A Longa Noite no Inferno de Alcaçuz”

O segundo programa analisado é o episódio intitulado “A Longa Noite do

Inferno de Alcaçuz”. Como já sintetizado, as cenas decupadas deste episódio

abrangem os diversos lados do massacre ocorrido no presídio e que matou 26

pessoas em janeiro de 2017: os líderes das facções rivais, a rigorosa postura do

Estado (entrevista com o polêmico secretário de Justiça do RN), as famílias

indignadas e, claro, o próprio relato de Cabrini e suas percepções diante do que viu

na noite que passou no presídio.

Logo no início do episódio, onde Cabrini dá um panorama geral sobre o

conteúdo do programa, podemos analisar um caráter de exclusividade explícito na

fala do apresentador. Ao dizer que o programa abordará “os detalhes de um confronto

como não se tinha mostrado”, é denotada a exclusividade dos fatos que vem pela

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frente. Sobre isso, podemos relacionar com o conceito apresentado por Lopes (2003)

sobre um dos requisitos básicos de uma investigação, onde ele diz que ela deve ser

resultado do trabalho exclusivo do jornalista. Porém, neste ponto, Lopes (2003) diz

que a investigação não deve ter interferência ou informações de outras áreas, como

a polícia, por exemplo. Acontece que, no caso específico deste episódio, Cabrini

obteve a maioria das informações justamente com a polícia, porém sob o caráter de

exclusividade e total apoio para o restante da investigação, como veremos no decorrer

desta análise. Vale ressaltar que não estamos falando da Polícia Militar e sim da Força

Penitenciária, que, por segurança, interveio nos rumos da produção da reportagem de

Cabrini.

Ainda sob essa perspectiva, Fortes (2005) afirma nas fases da investigação

que é preciso ter um conhecimento policial básico para entender sobre investigação,

por isso a importância de se manter uma boa convivência com fontes policiais. O

caráter se investigação, porém, se dá quando Cabrini foge das fontes óbvias, como

veremos no decorrer desta análise.

Após chegar ao presídio, Cabrini, na narração, explica o que vem pela frente,

como relato pessoal. Após receber autorização, ele passará uma noite no presídio, o

que podemos analisar como uma atividade de risco, tendo em vista o grau de

periculosidade do local, porém, a coragem e a responsabilidade é uma das fases da

investigação proposta por Fortes (2005) que afirma, justamente, que o jornalismo

investigativo é uma atividade de risco.

No decorrer da cena, a exclusividade mais uma vez é explicitada por Cabrini

ao mostrar imagens de uma negociação entre presos e a polícia. Aqui, Cabrini afirma

que tal negociação foi negada pela Polícia Militar, porém, as imagens comprovaram.

Ao mostrar as imagens, aqui fica evidente a atenção especial aos documentos

disponíveis, outra fase da investigação de Fortes (2005). Sobre esta perspectiva,

Hunter (2009) também traz seus conceitos ao dizer que a reportagem investigativa

requer uma documentação capaz de apoiar ou negar as informações das fontes.

Nesta referida situação, podemos puxar um gancho para outros conceitos do autor.

Um deles é de que a boa-fé das fontes não pode ser presumida pois elas podem

fornecer informações falsas, ou seja, através da investigação, a versão dos policiais

militares sobre a história é contestada através do vídeo que o programa conseguiu

com exclusividade. Logicamente que, ao negar que houve uma negociação entre

presos e policiais, a polícia cumpre o papel de negar uma informação oficial sob a

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consequência de a instituição ser punida. E, sob essa ótica, Hunter (2009) afirma que

no jornalismo investigativo as informações oficiais são ocultadas do repórter pois a

revelação pode comprometer os interesses de autoridades e instituições.

Com base nas informações obtidas por Cabrini através da Polícia Militar, ele

nega explicitamente a versão tendo como apoio o vídeo que mostra de fato a

negociação envolvendo apenados e policiais. Pode-se relacionar essa observação

com outro conceito de Hunter (2009), onde o autor afirma que o repórter pode desafiar

ou negar explicitamente a versão oficial de uma história com base nas informações

obtidas com fontes independentes. Logicamente que, assim como explana Fortes

(2005) na página 70 desta monografia, é preciso ter respeito às fontes e preservá-las,

assim como não abrir quem são em hipótese nenhuma, e o próprio Hunter (2009), ao

conceituar o jornalismo investigativo também afirma que as fontes frequentemente

não podem ser identificadas, em nome de sua segurança, Cabrini não identifica o

responsável por repassar o vídeo da negociação entre presos e policiais. A fonte é

preservada.

Quando Cabrini entra em uma das celas mais atingidas no dia do massacre,

ele mostra buracos na parede e no chão. Ao afirmar que os buracos eram utilizados

para guardar armas e drogas e que outro buraco era o início da escavação de um

túnel, ele demonstra um conhecimento policial, ainda que básico. Porém, ao longo

dessa visita, muitos indícios são apresentados, além de pistas sobre o massacre,

assim como ele mesmo explana ao dizer que “Em cada canto, um segredo, que ajuda

a desvendar uma crise vivida por todo um país. A lanterna vai iluminando meus

passos, e revelando pistas...”. Pode-se relacionar essa fala e todo o contexto da cena

com o que diz Fortes (2009) sobre as fases da investigação na página 70, onde ele

afirma que o jornalista investigativo necessita ter um conhecimento policial básico,

justamente para entender sobre investigação, seleção de pistas, análise de provas e

indícios.

Fortes (2005) também afirma que nas fases da investigação é necessário ter

paciência e concentração, pois ela requer tempo. Cabrini deixa isso explicitado no

decorrer da cena do episódio em questão, ao dizer “O início de uma longa investigação

sobre os bastidores do confronto que matou 26 pessoas...”. Mais adiante, ele afirma

“Esta longa noite que passo nos porões de Alcaçuz é o fio condutor de uma

investigação que dura cinco dias”.

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Cabrini tenta dormir em uma das celas do presídio, porém, não consegue. Ele

afirma que o registro do local é mais convidativo. Essa afirmação do repórter podemos

relacionar com o que Fortes (2005) diz sobre uma das fases da investigação. O autor

afirma que a curiosidade e a desconfiança devem andar juntas em uma investigação

jornalística.

Na sequência, Cabrini entrevista o secretário de Justiça e Cidadania do Rio

Grande do Norte, Walber Virgolino. Diversos pontos sobre o secretário são abordados,

como seu fascínio pelo cangaceiro Lampião e por armas de fogo, o que o faz ter o

adjetivo de polêmico. Mostrando tais gostos peculiares, Cabrini evidencia uma das

fases da investigação de Fortes (2005), onde o autor afirma que é necessário libertar-

se de preconceitos, pois, em uma investigação, é importante nunca partir de princípios

pessoais, religiosos ou ideológicos.

Em determinado momento, Cabrini mostra para o secretário a porta onde

estão as marcas das cabeças dos presos que morreram no dia do massacre. Walber

Virgolino nega a versão de que as marcas foram feitas pelas cabeças dos presos,

afirmando serem marcas de murro. Porém, a fala é contestada com a afirmação do

policial da Força Tarefa Maycon Rottava, que disse que as marcas eram, sim, das

cabeças dos presos. Sobre esses contrapontos, Hunter (2009) afirma que a

reportagem investigativa requer uma documentação capaz de apoiar ou negar as

informações das fontes, descrito na tabela da página 74 desta monografia. Do mesmo,

o autor também explica que o repórter pode desafiar ou negar a versão oficial da

história com base nas informações de fontes independentes.

Em outro ponto da entrevista com o secretário Walber Virgolino, Cabrini o

questiona: “Secretário, nesses dias que nós passamos aqui em Alcaçuz, surgiram

algumas denúncias que o senhor pode responder?”. Diante da aprovação do

secretário em responder as perguntas, Cabrini questiona se o Estado já sabia que a

rebelião poderia acontecer e se poderia ser evitado. Walber Virgolinino afirma que não

sabia e Cabrini o contesta dizendo que tal acusação veio de várias pessoas, inclusive

dos familiares dos presos assassinados. Em resposta, o secretário diz que se baseia

em informações oficiais.

Nesse ponto, dois conceitos de Hunter (2009) podem ser evidenciados e

relacionados. Um deles, de que o repórter pode desafiar ou negar explicitamente a

versão oficial de uma história, com base nas informações de fontes independentes

que, neste caso específico, também foram preservados. Outro conceito de Hunter

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(2009) que podemos relacionar com a cena em questão é quando o autor afirma que

o repórter dispõe de mais informações do que qualquer uma de suas fontes. Sendo

assim, Cabrini pode contestar as afirmações do secretário.

Cabrini parte para as entrevistas com os presos das facções rivais que atuam

no Brasil e no Rio Grande do Norte. As entrevistas são cercadas por oito policiais da

Força Penitenciária que fazem a segurança e Cabrini deixa explícito o risco que corre:

“Minha missão agora é ouvir os presos das duas facções, alguns deles, líderes do que

aconteceu aqui. É um momento difícil. É uma operação que também envolve riscos”.

Nesse ponto recordamos uma das fases da investigação de Fortes (2005) já descrita

na análise do episódio em questão – a coragem e a responsabilidade, pois, segundo

o autor, o jornalismo investigativo é uma atividade de risco.

Três presos de cada facção são entrevistados por Cabrini. Nenhum rosto é

mostrado nas entrevistas. Fortes (2005) evidencia que o respeito às fontes deve ser

preservado e Hunter (2009) apoia o conceito afirmando que as fontes não podem ser

identificadas em nome de sua segurança. Baseado nestes conceitos, Cabrini

prossegue nas entrevistas com os apenados.

No decorrer das entrevistas com os presos que pertencem as duas facções,

em diversos momentos, eles não respondem aos questionamentos de Cabrini. Para

um deles, membro da facção que atua em todo o Brasil, Cabrini pergunta de que forma

eles se prepararam para esse confronto e se haviam muitas armas. O preso, porém,

responde que não poderia dizer se haviam armas. Cabrini insiste e pergunta

novamente se haviam muitas armas e quais das duas facções tinham mais armas. O

preso novamente se nega a responder dizendo que não poderia falar sobre o assunto.

Após, Cabrini também entrevista um dos membros da facção que atua no Rio Grande

do Norte que, assim como o outro preso, se nega a responder determinados

questionamentos. Dentre alguns destes questionamentos, Cabrini pergunta se a

facção sabia que haviam tantas armas de fogo no presídio e quais das duas facções

tinham mais armas. Diante destes questionamentos, o preso nega as afirmações que

já foram verificadas através de vídeos amadores e através de outras fontes. Pode-se

relacionar essa negativa dos presos em responder determinados questionamentos

com o que diz Lopes (2003) sobre um dos requisitos básicos de uma reportagem

investigativa – quando os investigados tentam esconder as informações do público.

Ainda sobre este ponto específico, Fortes (2005) diz que é preciso insistência

e perseverança por parte do repórter, pois quem está sendo investigado jamais irá

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colaborar. Cabrini realmente insiste nos questionamentos sobre a quantidade de

armas dentro do presídio no dia dos confrontos e, de fato, os investigados – os presos

das facções – não colaboraram com a investigação.

Para contestar a versão dos presos, Cabrini entrevista outro policial da Força

Penitenciária, dentro de uma cela, onde o mesmo mostra os locais onde eram

escondidas as armas, drogas e celulares. A afirmação do policial é confirmada com o

apoio de imagens amadoras onde os policiais descobrem o esconderijo dar armas e

facas. Isso mostra a importância das entrevistas para obter o maior número possível

de informações e contradições dentro da investigação, como afirma Fortes (2005) na

página 70 desta monografia. Também sobre o ponto de vista das entrevistas, Hunter

(2009) afirma que a história se baseia no máximo possível de informações. Outro

ponto descrito por Hunter (2009) também se adequa a cena descrita, mais

especificamente no apoio das imagens amadoras. Para o autor, a reportagem requer

uma documentação capaz de apoiar ou negar as informações das fontes. Fortes

(2005) também afirma que o repórter deve ter uma atenção especial a todos os

documentos disponíveis.

Em outro ponto, na retomada da entrevista com o secretário de justiça do Rio

Grande do Norte, Walber Virgolino, Cabrini lhe questiona sobre a corrupção de

agentes da Polícia Militar pela facilitação da entrada de armas de fogo no presídio. O

secretário, porém, afirmou não acreditar em corrupção e que as armas apreendidas

foram apenas caseiras. Cabrini então contesta o secretário ao dizer: “As imagens

mostram”. Na sequência, Cabrini entra com o secretário em uma das celas que foram

incendiadas e mostra para ele os buracos onde as armas eram escondidas e, mais

uma vez, o secretário nega. Nesse ponto, retornamos aos pontos explanados pelos

autores Fortes (2005) e Hunter (2009) descritos anteriormente e dizem respeito à

atenção aos documentos que podem negar ou apoiar as informações das fontes. Na

cena em questão, outro ponto de Hunter (2009) pode ser relacionado – quando o

repórter pode desafiar ou negar a versão de uma história – ou seja, apoiado às

imagens, Cabrini contesta o secretário em suas afirmações. Além das imagens

amadoras, as afirmações são contestadas posteriormente com o relato de Antônio

Arino, outro policial da Força Penitenciária, que confirmou a facilidade de acesso dos

presos a armas e drogas.

O massacre no presídio de Alcaçuz foi conhecido pelo grau de brutalidade,

marcado pela decapitação de presos. Em determinado momento da entrevista, Cabrini

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questiona um dos líderes da facção que atua em todo o Brasil se ele ordenou que

cabeças fossem cortadas, porém, o questionamento foi feito de forma afirmativa, pois

Cabrini já tinha obtido as informações com outras fontes, e foi assim que disse: “Tenho

essa informação”. O preso, assim como outros entrevistados, nega a afirmação e

ainda diz que ela está errada. Ele também não soube responder porque tantas

cabeças foram decepadas no dia dos confrontos.

Nesse ponto, novamente ficam evidentes os elementos já descritos nesta

análise. Podems relacionar essa negativa ao que diz Lopes (2003) sobre um dos

requisitos básicos de uma reportagem investigativa – quando os investigados tentam

esconder as informações do público. E, sobre este ponto específico, Fortes (2005) diz

que é preciso insistência e perseverança por parte do repórter, pois quem está sendo

investigado jamais irá colaborar. Hunter (2009) também apoia os dois autores ao dizer

que, no jornalismo investigativo, o repórter dispõe de mais informações do que

qualquer uma de suas fontes. Isso fica evidente quando ele afirma que tinha as

informações, porém, logicamente, a fonte foi preservada, outro ponto importante de

uma investigação abordado por Fortes (2005).

Levando-se em consideração ao que afirma Hunter (2009), que a história se

baseia no máximo possível de informações e no que diz Fortes (2005), ao afirmar que

uma investigação requer muitas entrevistas para obter o maior número possível de

informações e contradições, Cabrini também entrevista as esposas dos presos mortos

no confronto de Alcaçuz. Elas não são identificadas e Cabrini explica o porquê: “Elas

não querem ser identificadas porque temem represálias”. Esse é um dos pontos

importantes abordados por Hunter (2009) sobre a relação do repórter investigativo

com as fontes – frequentemente não podem ser identificadas em nome de sua

segurança.

Em outro ponto da entrevista com o secretário de justiça do Rio Grande do

Norte, Walber Virgolino, Cabrini, com base nas informações das esposas dos presos

mortos, afirma que nas fossas ainda podem haver corpos e cabeças dos presos. O

secretário, porém, nega. Pode-se relacionar esse ponto com o que diz Hunter (2009)

– as informações oficiais são ocultadas do repórter porque sua revelação pode

comprometer os interesses de autoridades ou instituições. Neste caso, o secretário

privou o Estado da culpa pelo massacre, pois o próprio Estado foi um dos mais

contestados frente a esse confronto, tanto por Cabrini, pelos agentes da Força

Penitenciária e também pelas viúvas dos presos mortos.

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Ao final do episódio, Cabrini entrevista uma das viúvas e faz o seguinte

questionamento: “O que que as pessoas do lado de fora dos presídios precisam saber

sobre o que aconteceu ali dentro?”. Essa pergunta podemos relacionar com outro

requisito básico de uma investigação, proposto por Lopes (2003) – o objetivo da

investigação deve ser importante para grande parcela da população. Neste ponto,

podemos também relacionar tal questionamento com o que diz Fortes (2005) – toda

investigação deve ser fundamentada no interesse público.

De uma maneira geral, podemos analisar que, diante dos requisitos básicos

de uma investigação, proposto por Lopes (2003), o episódio “A Longa Noite no Inferno

de Alcaçuz” foi um trabalho realizado com exclusividade pelo programa, como

explanado pelo próprio jornalista em diversos momentos do programa; se objetivou

em trazer à tona um importante tema para a discussão na sociedade – a degradação

do sistema penitenciário brasileiro - ; e muitas das fontes – secretário de justiça e

alguns presos – tentaram esconder certas informações do público.

Cabrini demonstrou ter realizado uma pesquisa minuciosa sobre os fatos, até

mesmo para poder contestar suas fontes, assim como explana Fortes (2005) nas

fases de uma investigação. Além disso, a investigação se mostrou longa, e sobre isso,

Fortes (2005) também diz que é necessário ter paciência e concentração, pois uma

investigação requer tempo e, compartilhando de suas ideias, Hunter (2009) também

diz que a história se baseia no máximo possível de informações e pode ser bastante

longa.

Em todos os momentos do episódio, intercalado com as entrevistas, o

programa mostrou vídeos amadores do dia do massacre, inclusive com imagens

censuradas de presos carregando corpos de mortos no confronto. Com esse apoio

das imagens, muitas das informações obtidas com os presos entrevistados e também

com o secretário de justiça, Walber Virgolino puderam ser contestadas com precisão

por Roberto Cabrini. Pode-se relacionar essa observação ao que diz Fortes (2005) –

é preciso atenção especial a todos os documentos disponíveis e possuir arquivos

organizados com informações pertinentes ao tema da reportagem. Além disso, Hunter

(2009) também apoia o conceito ao afirmar que a boa-fé das fontes não pode ser

presumida e que elas podem fornecer informações falsas, por isso a importância da

verificação.

Em relação aos resultados de uma investigação, Hunter (2009) afirma na

tabela da página 74 desta monografia que o repórter se recusa a aceitar o mundo

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como lhe é apresentado e a história visa a penetrar ou expor uma dada situação, para

que seja reformada ou denunciada, ou, para promover um exemplo de um caminho

melhor. Nesse ponto descrito pelo autor, podemos relacionar exatamente com as

dúvidas que surgiram e que foram questionadas em relação à história, pois, ao final

do episódio, a antropóloga Juliana Melo questiona que haveriam indícios de que o

confronto foi facilitado por agentes da Polícia Militar. Tais indícios também foram

expostos pelas viúvas dos presos mortos no massacre. Ou seja, a situação foi

denunciada e, ao se recusar a aceitar o mundo como é apresentado, Cabrini deixa

claro e evidente suas conclusões e isso pôde se perceber com as seguintes frases:

“Rebeliões e massacres que se repetem. Um sistema falido em todo país, sempre à

espera da tragédia”; “Mortes que viram apenas estatísticas. A fábrica de criminosos e

guerras. A inversão da autoridade. A ausência frequente do Estado. A simplificação

do nós contra eles”; e “As feridas de Alcaçuz ainda continuam abertas. Quantos ainda

precisam morrer para que o país aprenda as lições?”.

Diante disso, com Cabrini já sintetizando suas conclusões, também podemos

analisar outro ponto descrito por Hunter (2009) em uma investigação – a estrutura

dramática da história é essencial para seu impacto. De fato, por ser longa, a história

necessita de uma estrutura dramática. O episódio em questão, assim como o

“Investigando Milagres” também cumpriu este requisito ao intercalar frases fortes de

suas fontes com imagens do dia dos confrontos, mostrando também os diversos lados

deste massacre.

6.2.2.3.3 O Mercado Negro dos Remédios Controlados

O terceiro programa a ser observado é intitulado “O Mercado Negro de

Remédios Controlados”, exibido no dia 02 de abril de 2017, com duração de 53’26”.

Neste documentário exclusivo, Roberto Cabrini desvenda um esquema criminoso de

venda de receitas médicas e mostra como funciona o mercado negro dos remédios

controlados, os chamados “tarja preta”. As cenas decupadas deste episódio abrangem

a entrevista com uma dependente, a entrevista com um necropsicanalista e as cenas

em que foram utilizadas câmeras escondidas – um dos principais recursos do

jornalismo investigativo.

CENA (8’51”- 23’12”)

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Contexto da cena: Plano geral de Roberto Cabrini, que está no estúdio do programa

Conexão Repórter, em pé. A câmara segue em zoom até chegar ao plano médio do

apresentador.

Roberto Cabrini (RC): Boa noite. No Conexão Repórter de hoje, uma investigação

de vários meses revela uma ameaça invisível. O uso excessivo de remédios tarja preta

pode acabar em vício e levar à morte. Quem são, afinal, as vítimas? Como elas

acabam dominadas por esse mal? Aqui, Roberto Cabrini, e esse é o Conexão

Repórter de hoje.

RODA VINHETA DE ABERTURA DO PROGRAMA

Contexto da cena: Na tela aparece a frase “A Ameaça Invisível” sobre um fundo azul,

com e uma imagem de um pote de remédios. Após, aparece uma imagem em plano

geral da cidade de São Paulo vista do alto, intercalada com imagens aceleradas do

trânsito da cidade. A câmera está dentro do carro, mostrando uma rodovia. O carro

está em movimento. Após, aparecem duas personagens falando sobre os efeitos dos

remédios controlados (apenas a entrevista com uma delas será decupada para

análise). Na sequência, aparece a simulação de uma mulher tomando um remédio.

Ela está sentada sobre a cama e a imagem está distorcida.

RC: Vamos ao encontro de quem tem muito a dizer sobre drogas legais.

Michele Oliveira: Tenho vergonha do meu corpo. Eu tenho vergonha da condição

que eu estou hoje.

RC: Duas personagens que tem em comum o uso de pílulas restritas.

Lilian Ramos (LR): Aí eu passava em dois psiquiatras pra pegar duas receitas.

RC: Suas histórias são lições.

Contexto da cena: A imagem retorna para a câmera que está dentro do carro,

mostrando uma rodovia. O carro está em movimento, até que chega em uma chácara

em Santa Isabel, no interior de São Paulo. O local é um SPA para tratamento. A

câmera mostra imagens do ambiente e, após, aparece Lilian descendo as escadas,

acompanhada de um psicólogo. Os dois conversam no jardim.

RC: Atrás deste portão, um ambiente de paz. Vidas recuperadas. Aqui encontramos

Lilian, ainda em tratamento contra a dependência de calmantes.

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Contexto da cena: Lilian e o psicólogo Aléx Sandro estão sentados, frente a frente,

em uma sala. Ele explica a ela como será o tratamento.

Aléx Sandro (AS): Boa tarde, Lilian. Eu sou o Aléx, sou psicólogo do SPA Santa

Isabel, sou especializado em dependência química e serei o seu novo psicólogo nessa

nova etapa, né, dessa reabilitação do fármaco. Há quanto tempo você já está

conseguindo se manter sem a medicação?

LR: Eu terminei meu tratamento aqui há 60 dias, e agora vou começar o pós, as

minhas manutenções.

Contexto da cena: Aléx e Lilian caminham pelo pátio do SPA.

RC: Entre idas e vindas ao SPA, eu a encontro para uma longa conversa, sem

censura.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e Lilian aparecem sentados, frente a frente, em

uma sala, para o início da entrevista.

RC: Você viveu o glamour da comunicação?

LR: Vivi. Era uma delícia. Era muito bom.

RC: Uma pessoa desejada?

LR: Sim, fui. Fiz revista masculina.

Contexto da cena: Imagens antigas de Lilian Ramos como modelo e, após, ela

responde a um elogio de Cabrini.

RC: Ex-modelo. A mulher bonita.

LR: Obrigada

Contexto da cena: Lilian Ramos dançando no extinto programa Fantasia, do SBT.

RC: E seus dias de glória.

LR: Fiz inúmeras campanhas de fotografia, biquíni, cosméticos, muita coisa. Na TV,

eu comecei no extinto Fantasia.

Contexto da cena: Lilian Ramos dançando no extinto programa Fantasia, do SBT.

Após, retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente, para o

prosseguimento da entrevista.

RC: A sua vida parecia um paraíso aos olhos dos outros?

LR: Ah, sim, como referência, né. Ah, é o corpo dela, ah, a vida dela.

RC: Mas não era assim?

LR: Não.

RC: No seu interior?

LR: Não. Uma bagunça, um caos.

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Contexto da cena: A câmera faz planos detalhes dos olhos e do brinco de Lilian.

Após, aparece a simulação de uma mulher tomando um copo de água e depois

sentada em uma cama, com as mãos na cabeça. Na sequência, ela aparece

dormindo. A câmera foca na caixa de remédio tarja preta que está em cima do criado-

mudo, ao lado da cama.

RC: O olhar sereno e a fala convincente revelam um drama que jamais vai esquecer.

A tarja preta alerta perigos, muitas vezes ignorados.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Como é que você se comportava no auge da sua dependência?

LR: Eu já não prestava mais atenção na vida. Eu só ficava esperando o momento de

pedir a próxima remessa de remédio e quantas horas faltava para a próxima dose.

Contexto da cena: Aparece a simulação de uma mulher com as mãos trêmulas. Após,

retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente, para o prosseguimento

da entrevista.

RC: Remédios tarja preta, o que eles simbolizam para você?

LR: Passado e perigo.

RC: Uma prisão?

LR: Sim.

RC: Dependência?

LR: Sim.

RC: Estamos falando de que remédios?

LR: Ansiolíticos. Diversas marcas, diversos nomes, remédios que uma amiga

empresta para outra, remédios que a gente liga e alguém entrega em casa, remédios

controlados, que não são nem tão controlados assim.

RC: Você ficou totalmente dependente desses remédios?

LR: Fiquei.

RC: Descreva sua dependência.

LR: Acordar e pensar no próximo horário de tomar o próximo remédio.

RC: E o que que você fazia pra isso?

LR: Esperava as horas passar pra dar o horário de tomar o próximo remédio.

Contexto da cena: Simulação de uma mulher tentando dormir. Ela parece estar

inquieta na cama. Após, imagens em planos detalhes de um remédio em gotas caindo

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em um copo de água. Após, retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a

frente, para o prosseguimento da entrevista.

RC: Como é que você começou a usar esses medicamentos?

LR: Eu passei por uma fase no trabalho muito complicada, de muito estresse.

Trabalhei dezesseis horas por dia. Trabalhava num projeto muito grande e, no meio

de uma reunião, eu tive um surto. Parei de funcionar.

RC: Do que que se tratava?

LR: Eu cheguei no hospital descrevendo os meus sintomas físicos: formigamento na

mão, uma confusão mental, uma palpitação muito forte, uma arritmia, algumas

sensações ruins na cabeça. Então, aparentemente, era um surto psicótico.

Contexto da cena: Simulação de uma mulher com as mãos sobre o rosto, fazendo

sinal de negativo.

RC: Um diagnóstico errado.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: O remédio foi pior que a doença?

LR: Na hora, não. Na hora ele me deixou assim meio confusa. Eu acho que eu dormi,

eu me lembro de ter dormido algumas horas, mas quando o efeito passou, eu voltei

pra todos aqueles sintomas de novo.

RC: Você considera, hoje, que esse medicamento foi bem prescrito para você.

LR: Não.

RC: Por que?

LR: Porque eu fui procurar depois sobre esse remédio, e ele é um remédio para quem

tem algumas patologias, como esquizofrenia. São pessoas que escutam vozes, e eu

não tinha nada disso.

RC: Quanto tempo depois você escreveu para um especialista que você estava

usando esse medicamento?

LR: Cinco dias depois da primeira dose. Aí ele me deu meu primeiro diagnóstico, eu

estava tendo uma crise de estresse e não um surto psicótico.

RC: Ele te deu um outro medicamento?

LR: Aí ele me deu um calmante. Foi o primeiro tarja preta que eu tomei. Eu tive uma

sensação que eu nunca tinha tido antes, de leveza. Todos os sintomas que eu estava

sentindo, passaram. Meu coração começou a bater mais devagar. Minha respiração

voltou ao normal e, quinze, vinte minutos eu peguei no sono e dormi mais de um dia.

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RC: Pra você, ficou parecendo que os seus problemas estavam solucionados?

LR: Achei o meu remédio, agora tava tudo certo.

Contexto da cena: Simulação de uma mulher tomando uma quantidade de remédios,

seguido por um copo de água. Planos detalhes de várias caixas de remédios e da

mão juntando as cápsulas.

RC: Quando tudo parecia estar bem, um passo a mais. Outro. E o abuso começa sem

ela perceber.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: E quando é que os seus problemas voltaram?

LR: Quando eu perdi o controle da medicação. Eu comecei a me automedicar. Eu...

RC: Por que automedicar? Se os médicos te prescreviam esse medicamento?

LR: Então, depois de um certo tempo, eu achei que a medicação estava, é...já não

estava mais fazendo efeito pra mim, então eu comecei a aumentar as doses.

RC: Sem o conhecimento do médico?

LR: Sem o conhecimento do médico. Eu tinha medo que ele tirasse a medicação de

mim. Então, eu arrumei um segundo psiquiatra pra conseguir ter uma segunda receita

por mês.

Contexto da cena: Simulação de uma mulher conversando com psicólogo e, após,

com as mãos no rosto. As imagens estão distorcidas.

RC: E se torna incontrolável.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Você chegou a falar com quantos profissionais diferentes? Com quantos

psiquiatras?

LR: Eu já cheguei a ficar com três ao mesmo tempo.

RC: Três ao mesmo tempo? Um não sabendo do outro?

LR: Não.

RC: Pra conseguir mais receitas?

LR: Sim.

RC: Aumentar a dosagem?

LR: (Lilian apenas faz gesto de positivo com a cabeça).

RC: Ter medicamento sempre à disposição?

LR: (Lilian apenas faz gesto de positivo com a cabeça).

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RC: Aí gera uma prisão?

LR: Sim.

RC: Você estava dependente?

LR: Completamente.

RC: No auge da sua dependência, quantos medicamentos você usava?

LR: Eu estava com três diferentes, mas uma dosagem que não pode nem ser

administrada, considerada de risco por causa de uma parada cardíaca.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e o neuropsicanalista Nelson Luiz estão sentados,

frente a frente, em uma sala, para a entrevista. Eles abordam a enfermidade de Lilian.

RC: Qual era a enfermidade da Lilian Ramos?

Nelson Luiz (NL): Ela chegou completamente compulsiva e obsessiva por diversos

comportamentos e com uso abusivo de medicamentos.

RC: A Lilian chegou perto de perder a vida?

NL: Perto, bem perto. Com a dosagem que ela estava, foi por um milagre que ela não

teve realmente uma parada cardíaca, uma overdose.

Contexto da cena: Cenas de simulação. Um relógio está na parede e uma mulher

pega alguns remédios, como se estivesse ansiosa. Alguns planos detalhes de gotas

de remédios sendo colocadas em um copo de água aprecem. Na sequência, a mulher

da simulação aparece com as mãos trêmulas.

RC: Lilian contra um inimigo. Surgem caminhos ilegais para sustentar o vício. Uma

força maior do que a dela. Ela já não domina seu próprio destino.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Você passou quanto tempo conseguindo tarja preta debaixo do pano?

LR: Dois anos.

RC: Debaixo do pano?

LR: Sim.

RC: Como é que era isso?

LR: Você pode fazer uma procura no site de buscas e encontrar facilmente um

farmacêutico que entrega essa medicação pra você. Não só esse, como várias outras

medicações. Não é difícil. Não é difícil.

RC: Como é que você fazia pra burlar a fiscalização e conseguir os medicamentos

tarja preta?

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LR: Eu não tinha problema com receitas, porque eu recebia a medicação. Eu pagava

o dobro do valor de uma farmácia, mas eu recebia isso através de um motoboy na

portaria da minha casa.

Contexto da cena: Simulação. Imagens de uma cartela do conhecido remédio

chamado Rivotril, seguido por imagens de comprimidos caindo sobre uma mesa. Um

motoboy aparece do ombro para baixo, com o capacete em uma mão e, na outra, um

pacote. Ele chega em um lugar.

RC: Substâncias de venda controlada, apenas nas farmácias, mas facilmente

encontradas no mercado paralelo, clandestino, seja pela internet, seja por meio da

venda de receitas.

Contexto da cena: Imagens aceleradas da cidade de São Paulo, intercalando prédios

e a igreja da conhecida Praça da Sé. Neste momento, começam a aparecer as

imagens de câmeras escondidas.

RC: Bem-vindos à selva da venda irrestrita. Praça da Sé, centro de São Paulo, um

dos cartões postais da maior cidade do país. Com uma câmera escondida, cenas de

um cotidiano fora da lei. E constatamos que não é difícil conseguir receitas médicas

aqui.

Contexto da cena: Imagens da câmera escondida, onde aparecem muitas pessoas

na Praça da Sé. O produtor é quem faz a entrevista com pessoas sabem sobre o

esquema criminoso, na qual chamaremos de Pedestre 1 e 2. Não é Roberto Cabrini

que faz a entrevista, pois é um jornalista conhecido. Ele apenas narra os fatos.

Pedestre 1: Eu não sei se tem mais alguém ali não, tem que perguntar para aqueles

prados, ali.

RC: Minutos depois, outra abordagem.

Pedestre 2: Eu vou ver aí. Tem uma mulher que ela arruma.

Contexto da cena: Por se tratar de câmera escondida, as imagens são desconexas

e aparecem distorcidas, aparecendo apenas algumas partes dos corpos das pessoas.

RC: Durante nossa espera, descobrimos que há mais envolvidos nesse comércio

paralelo de receitas médicas.

Produtor: Tá esperando quem?

Pedestre 2: Aquela mulher lá, o rapaz tá...o ‘veinho’ arruma, o ‘véio’ também sumiu.

Aquele lá vai direto lá, vai pegar...e leva no freguês.

Contexto da cena: O produtor continua a busca de alguém que venda as receitas

médicas. As imagens aparecem distorcidas, aparecendo apenas algumas partes dos

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corpos das pessoas. O produtor conhece Luiz, um intermediário para a venda de

receitas.

RC: Nossos primeiros contatos não voltaram, mas isso não é o problema. Ofertas não

faltam por aqui.

Produtor: Clonazepam. É uma receita de Clonazepam e de F...

Luiz: Esse aí vai ficar uns 150 ‘paus’ (reais).

RC: Acertamos os detalhes da entrega por telefone.

Luiz: Conversa aqui com ele (telefone), você explica qual é o remédio.

RC: Aqui marcamos com o negociante intermediário um novo encontro na manhã

seguinte.

Luiz: Eu chego nove e meia (horas). Quando você chegar, eu tô aqui, fico na frente

do metrô, não fico aqui não, fico ali.

Contexto da cena: Imagens aceleradas do nascer no sol e do amanhecer na cidade

de São Paulo, mostrando os carros nas rodovias. Após, novamente imagens de

câmeras escondidas, na Praça da Sé. Após o produtor encontrar novamente com o

negociante, o mesmo parece combinar com o possível vendedor da receita médica

por telefone.

RC: No local combinado e na hora marcada, lá está o homem com quem conversamos

no dia anterior.

Luiz: Eu tô indo aí, mais o rapaz aí.

RC: E vai nos levar até o vendedor de receitas médicas.

Contexto da cena: Imagens de câmeras escondidas. Elas aparecem distorcidas,

aparecendo apenas algumas partes dos corpos das pessoas.

Luiz: É o Luiz, rapaz, o rapaz de ontem, tô levando ele aí.

RC: Caminhamos alguns quarteirões. Nosso contato revela que o negócio principal

dele é vender ouro. O comércio clandestino de recitas médicas é parte apenas de uma

troca de favores.

Luiz: Rapaz, não dá nada não, às vezes fazem um serviço pra gente, alguma coisa,

não cobra nada.

Contexto da cena: Produtor e negociante chegam ao ponto marcado. É em frente a

um prédio.

RC: Minutos depois estamos no ponto marcado. Faltam apenas alguns minutos para

nos encontrarmos com “Cosme”, o negociante de prescrições médicas.

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Contexto da cena: Produtor e Luiz entram em um bar e sentam ao lado do outro

negociante, chamado “Cosme”.

RC: Ele está nesse bar. Vamos abordá-lo.

Produtor: E aí doutor, tudo bom, doutor? Como é que está?

Cosme: Qual é o problema?

Produtor: É aquele...aquele...Tô precisando desse aqui...esse...receita é segura, né?

Cosme: Você quer a receita ou quer...?

Produtor: A receita.

Cosme: Frontal, duas miligramas também, né?

Produtor: É.

Cosme: Quantas caixas aqui?

Produtor: Três caixas.

Cosme: Três caixas cada um?

Produtor: É.

RC: As receitas para três caixas de Frontal e três caixas de Rivotril já tem preço

definido.

Cosme: Vai ficar 220 ‘conto’ (reais).

RC: Antes de sairmos acertamos o pagamento de Luíz, o intermediário. São 220 reais

pelas receitas, mais 30 de comissão. E assim termina a participação de Luiz no caso.

Agora tudo vai ser resolvido com o autor das prescrições clandestinas. Toda

abordagem teve o conhecimento do Ministério Público.

Contexto da cena: Imagem das nuvens em movimento acelerado e, após, a câmera

escondida está de posse do produtor que está sentado em uma mesa de bar. Ele vai

acertar com o vendedor a compra das receitas ilegais. O vendedor aparece nas

imagens escrevendo a receita.

RC: Dez minutos depois, estamos na mesa de um bar, perto de onde mora o

negociador.

Cosme: Clonazepam?

Produtor: Clonazepam.

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Figura 8: Câmera escondida revela a venda ilegal de remédios controlados

Fonte: Conexão Repórter, SBT

Cosme: Quantas caixas?

Produtor: Três.

RC: Dados pessoais são passados para a receita.

Cosme: Mesmo nome aqui? Mesmo nome?

Produtor: É, mesmo nome.

RC: Agora, a dosagem é o tema central da conversa, ao limite, para não gerar

suspeitas no balcão da farmácia.

Cosme: O problema é o seguinte: quem manda é isso aqui, a posologia...se você

toma um remédio, eu ponho cinco caixas e você toma um comprimido por dia, o cara

fala, “tá errado”. Então, se eu colocar cinco caixas e você toma cinco comprimidos por

dia, aí os caras te vendem sem fazer nenhum caso lá também. A posologia que

manda.

RC: O pagamento é feito. Antes de nos despedirmos, o vendedor de receitas promete

facilitar ainda mais o esquema da próxima vez.

Cosme: Já vem aqui direto, eu tô aqui no barzinho, aí eu já sei, né?

Produtor: Certo.

Contexto da cena: O produtor chega em uma farmácia com a câmera escondida e

compra o remédio receitado ilegalmente.

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RC: Na farmácia, apresentamos a receita.

Produtor: Boa tarde. Você tem isso aí, amigo?

RC: Sem contestações, sem suspeitas.

Farmacêutico: R$ 12,90.

Produtor: R$ 12,90. Falou.

RC: Uma certeza: o remédio é bem mais barato do que a receita.

CENA (32’32”- 45’13”)

Contexto da cena: O doutor em psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP),

Adriano Segal está sentado em sua sala e explica sobre o remédio Sibultramina.

Enquanto ele fala, a cena é coberta por imagens de remédios sendo despejados sobre

uma mesa, em planos detalhes.

Adriano Segal (AS): A Sibultramina está no mercado brasileiro. Ela é aprovada pela

Anvisa e, de novo, sem nenhuma diferença em qualquer outra medicação que a gente

pode citar aqui, se ela é bem utilizada, ela é uma boa opção quando a pessoa tem o

efeito desejado, ou seja, perder uma boa quantidade de peso, cinco a dez por cento

do peso inicial, e quando ela tolera efeitos colaterais.

RC: Um remédio perigoso se usado indevidamente.

Contexto da cena: Imagens da tela de um computador que está em uma página da

internet onde mostra a Sibultramina à venda. Na sequência aparecem imagens em

planos detalhes das caixas dos remédios tarjas pretas.

RC: As redes sociais como balcões de negócios. Vitrines para o comércio clandestino

de tarjas pretas.

Contexto da cena: Simulação. Em um lugar escuro, um homem se sente em frente a

um computador e começa a digitar. A cena mostra planos detalhes da digitação e

também da tela do computador, com imagens desfocadas, pois ele está acessando

perfil de pessoas nas redes sociais. As imagens se intercalam com planos detalhes

de comprimidos.

RC: Mergulhamos neste universo. Criamos um perfil fictício. O próximo passo: entrar

em um dos vários grupos de compras e discussões sobre os medicamentos. Nosso

objetivo é comprar Sibultramina, o emagrecedor que já foi proibido e hoje está liberado

pela Anvisa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

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Contexto da cena: A tela do computador mostra a conversa da negociação da venda

da Sibultramina.

RC: Em um grupo iniciamos o bate-papo. O preço acertado: 150 reais. Hora, data e

local são marcados. Sexta-feira, quatro da tarde, na Estação República do Metrô de

São Paulo.

Contexto da cena: Imagens aceleradas do metrô em movimento. Agora, a câmera

está dentro do carro e mostra a rua. Ele está em movimento. A câmera foca em uma

placa onde diz “Praça da República”.

RC: E chega sexta-feira. Estamos a caminho do local combinado.

Contexto da cena: A partir daí as imagens são de câmera escondida, gravadas por

uma produtora do programa. Ela entra na estação do metrô. As imagens mostram

várias pessoas na estação. As imagens estão desfocadas para que as pessoas não

possam ser identificadas.

RC: O encontro é gravado por uma câmera escondida. Acompanhamos passo a

passo de nossa produtora. Minutos depois, uma mulher aparece. Ela está

acompanhada da filha pequena.

Contexto da cena: Imagens da câmera escondida mostram a vendedora mexendo

em sua bolsa. As imagens se intercalam com outra câmera escondida que está longe.

Vendedora: Fala ‘oi’ pra ela. Me atrasei um pouquinho...minha mãe saiu, aí ela não

tinha com quem ficar, aí eu tive que trazer ela.

RC: A embalagem já está em nossas mãos. Recomendações.

Vendedora: Ele te falo o horário pra você tomar?

Produtora: Não, como eu tomo?

Vendedora: Uma vez ao dia...pela manhã, de preferência.

Produtora: Certeza, assim, que faz efeito?

Vendedora: Ela faz porque inibe muito o apetite, você não vai ter muita vontade de

comer, porém você vai ter que se alimentar, ela vai tirar bastante a vontade de comer

doce, vai tirar bastante o apetite e você vai comer bem menos, mas não pode ficar

sem comer. Não pode beber.

Produtora: Não pode beber?

Vendedora: Não, de jeito nenhum! Não pode, então se você ver que tem uma festa

daqui uma semana, então espere pra tomar depois, porque não pode. Passa mal

mesmo.

Produtora: E quantas cápsulas vem?

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Vendedora: 60.

Produtora: Então dura dois meses?

Vendedora: Dois meses, você vai tomar uma por dia, dois meses. Em quinze dias

você já vai conseguir ver um resultado bem legal. Se você ver que em 30 dias você

conseguiu um resultado legal, aí você para de tomar.

Produtora: Pode parar?

Vendedora: Pode parar, se chegar onde você quer chegar, aí você para.

RC: A vendedora analisa, a seu modo, qual seria o peso ideal de nossa produtora.

Vendedora: Quanto de altura você tem?

Produtora: 1,70m.

Vendedora: Quanto você está de quilos?

Produtora: Acho que 78kg.

Vendedora: 78Kg? 1,70m? Creio que, mais ou menos, o seu peso deveria ser 70. 70

porque você é alta. Eu acho que uns oito quilos, você consegue, rapidinho.

RC: Oferece o que podemos chamar de atendimento pós-venda.

Vendedora: Você pode tomar direitinho, e qualquer coisa, você tem meu número,

você tem ele no ‘Face’, né? Pode chamar, qualquer dúvida que você tiver de

alimentação, alguma coisa, aí você me chama.

RC: E faz uma consulta improvisada na própria estação.

Vendedora: Precisa se adaptar ao arroz integral...pela manhã, como está seu café

da manhã?

Produtora: Como pão de queijo...

Vendedora: Então, tá errado...você tem que mudar isso aí também. Você começa a

mudar pro...sei lá, queijo branco, café com leite, desnatado, de preferência, se você

não gostar muito...

Produtora: Tem que segurar um pouco, né?

Vendedora: É, tem que segurar.

Contexto da cena: A câmera escondida acompanha a vendedora até ela chegar ao

trem. As imagens estão desfocadas pois muitas pessoas estão na estação.

RC: Fim de conversa. A vendedora deixa o local e pega o primeiro trem que chega à

estação.

Contexto da cena: A câmera está dentro do carro, que está em movimento em uma

estrada. O veículo chega à Campinas, no interior de São Paulo. Em travelling, a

câmera entra na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Em plano detalhe,

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aparece a mão de uma pessoa abrindo a porta e entrando na Unicamp. Após, ele

coloca o vidro de remédios sobre uma mesa, onde está uma pesquisadora.

RC: Pegamos a estrada. Estamos a caminho do interior de São Paulo. Nossa parada

é no laboratório de análises químicas da Unicamp, Universidade Estadual de

Campinas. O medicamento comprado na estação de metrô vai ser analisado.

Contexto da cena: O coordenador do laboratório, Marcos Eberlin está no laboratório.

Após colocar os comprimidos sobre a mesa e explica o que será feito.

Marcos Eberlin (ME): A gente consegue separar todos os seus componentes e

determinar que moléculas que estão presentes nessa mistura.

Contexto da cena: Uma pesquisadora do laboratório abre o pote de remédios e retira

uma cápsula. Após, a cena mostra plano detalhe das cápsulas e outro plano detalhe

do pó sendo colocado em um recipiente que calcula medidas. Na sequência, a

pesquisadora aparece olhando um recipiente onde a cápsula foi misturada com um

líquido.

RC: A pergunta não sai de nossa mente. O que há de fato nessas cápsulas? Um

remédio posto à prova. O resultado você acompanha ainda nesta edição, no Conexão

Repórter.

Contexto da cena: Simulação. Uma mulher toma um comprimido e após um copo de

água

RC: Esquemas criminosos e suas vítimas.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Você era apática em relação aos seus filhos?

LR: Também, fiquei um período assim.

RC: Apática em relação ao seu marido?

LR: Também.

RC: Em relação aos seus amigos?

LR: Tudo.

RC: Ao seu emprego.

LR: Tudo.

RC: O que era a vida pra você?

LR: A próxima dose.

RC: Só isso?

LR: (Lilian faz sinal de positivo com a cabeça).

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RC: E todo o resto?

LR: Ficava pra depois que passasse o efeito, se passasse, se eu aguentasse ficar

sem.

RC: Qual foi o fundo do poço?

LR: (Lilian suspira).

RC: O que você chegou a fazer:

LR: O fundo do poço foi ver os meus filhos é...segurando meu cabelo no banheiro me

ajudando a vomitar porque eu tinha tomado remédio demais.

RC: No que que você se transformou?

LR: Em nada. Eu virei em nada.

RC: O seu marido tinha consciência disso então?

LR: Tinha.

RC: Ele tentou te ajudar?

LR: Sim, tentou muito.

RC: Não deu certo porque?

LR: Porque eu não aceitei ajuda.

RC: Se recusava a receber ajuda?

LR: Eu não estava doente.

RC: Você não admitia que estava com problema?

LR: Não.

RC: Você não admitia sua dependência?

LR: Não. Enquanto eu estava com ele, não.

RC: Mas você estava totalmente dependente?

LR: Completamente.

Contexto da cena: Simulação de um homem tirando a aliança do dedo e colocando

sobre um sofá. A câmera dá um zoom na aliança.

RC: O fim do casamento é inevitável. A sequela, o estopim.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Você se divorciou?

LR: Sim.

RC: Por causa dessa dependência?

LR: Não por causa dessa dependência, mas por conta do que a relação se

transformou porque eu tomava remédio.

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RC: Você se sente culpada disso?

LR: Sim.

RC: Como é que você conseguiu ter forças pra procurar essa clínica sendo que você

estava totalmente dependente?

LR: A partir do momento em que eu olhei pros meus filhos e vi eles tomando conta de

mim.

Contexto da cena: Lilian caminha pelo pátio do SPA acompanhada de seu

neuropsicanalista, Nelson Luiz.

Nelson Luiz (NL): Bem-vindos. Meu nome é Nelson, sou neuropsicanalista e hoje eu

vou apresentar pra vocês o programa de tratamento oferecido pra Lilian aqui no SPA.

Contexto da cena: Lilian está no campo fazendo exercícios físicos. A imagem volta

para o neuropsicanalista, Nelson Luiz e se intercala com cenas de Lilian correndo e

fazendo exercícios no campo do SPA.

NL: Ao mesmo tempo que nós íamos trabalhando toda parte física, nós íamos focando

em terapias pra que pudesse ser reorganizado essa parte dela da dependência

psicológica e ela fosse aceitando essa nova realidade dela. Logo no início, quando ela

chegou aqui com cinquenta gotas de Rivotril e dez miligramas de Frontal, nós

começamos com supervisionamento médico e processo de desmame de

medicamentos. Nesse processo de desmame, nós fomos reduzindo de forma

gradativa toda essa dosagem dela pra que o próprio organismo não fosse sentindo.

Hoje a dependência dela é muito mais psicológica do que realmente física.

Contexto da cena: Lilian e o psicólogo Alex Sandro caminham pelo SPA até

chegarem em um banco. Eles sentam e Alex conversa com Lilian.

RC: Nas visitas ao SPA, a conversa com os terapeutas.

Alex Sandro (AS): E aí Lilian, como você está?

LR: Estou muito bem, obrigada!

AS: E depois do processo de reabilitação, como que você está hoje emocionalmente?

LR: Me sinto bem, é...hoje já sem a medicação consigo ter a visão muito mais clara

das coisas que estavam acontecendo antes, né. Estou reorganizando a minha vida

porque as coisas saem do trilho, né, quando a gente perde um pouco o controle de

alguma coisa e estou me readaptando, né.

Contexto da cena: Lilian desce as escadas do SPA e se dirige até um local onde fará

exercícios de alongamento. Ela faz as atividades de agaixamento sob a orientação de

um professor.

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RC: As atividades para a manutenção do equilíbrio.

Contexto da cena: Lilian entra em uma sala e cumprimenta a massagista (MS) que

a espera. Ela coloca uma touca na cabeça e se senta em uma cadeira.

LR: Oi.

MS: Oi. Boa tarde, tudo bem?

LR: Boa tarde, tudo. Vamos começar.

MS: Vamos.

Contexto da cena: Lilian está deitada em uma maca e a massagista explica sobre a

drenagem linfática.

MS: A drenagem linfática aplicada no dependente químico, ela ajuda da

desintoxicação do organismo e ajuda a eliminar todas as substâncias químicas.

Contexto da cena: Lilian está sentada em cima da maca.

LR: Fundamental, muito importante porque a gente tem que buscar coisas novas que

substituam o que a sensação de conforto que a medicação me trazia, né, a calma, a

suposta calma que um calmante me trazia, que um remédio me trazia. Eu precisei

reaprender como que eu buscava essa calma, como que eu conseguia esse equilíbrio

de novo.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Cabrini e Lilian sentados, frente a frente,

para o prosseguimento da entrevista.

RC: Olhando para os seus olhos agora eu vejo muita angústia.

LR: É lembrar disso.

RC: O que que você pensa quando você produz essa angústia ao me contar isso? O

que que vem à cabeça?

LR: que eu conheço muita gente que está nessa situação e não sabe que está doente.

RC: Você não sabia?

LR: Não, não sabia.

RC: O que que as pessoas precisam saber sobre isso?

LR: Que não dá pra tomar as gotinhas que estão na bolsa da amiga porque não tem

volta. Você pode, com uma ou duas doses, ficar dependente daquele remedinho. Que

não é engraçado tomar um tarja preta, não é motivo de piada, não dá pra fazer cena

de filme como fizeram é...porque não é legal, não termina bem.

RC: O seu sonho é se libertar totalmente?

LR: Sim, sim, o plano é. O psiquiatra hoje tem um plano pros próximos meses nós

zerarmos tudo isso.

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Contexto da cena: Lilian está dançando em uma sala e, após, Roberto Cabrini está

de pé onde conversa com o neuropsiquiatra Nelson Luiz, acompanhado de Lilian. As

imagens são intercaladas com a simulação de uma mulher sentada com as mãos

trêmulas, em cima do sofá e pressionando o peito.

RC: Qual a diferença entre a Lilian que nós temos agora e a Lilian que procurou o

senhor pela primeira vez?

NL: Completamente diferente. Hoje ela sorri. Quando ela chegou, ela chorava.

RC: É? Descreva a pessoa que procurou o senhor.

NL: Ela chegou magra, ela chegou com o olhar sofrido, fundo, chegou trêmula, com

falta de respiração, e isso poderia ter, inclusive, acarretado outros problemas de

saúde, e milagrosamente não aconteceu.

RC: Qual foi a cena que marcou mais esse dia?

NL: O olhar dela de desespero e saber que ela tinha uma família esperando por ela,

e que essa família, se ela não tivesse pedido socorro, ia enterrar a mãe, ia ter uma

mãe que ia enterrar uma filha, e hoje eles podem abraça-la de novo.

Contexto da cena: Cabrini direciona a pergunta para Lilian.

RC: Era assim?

LR: Era isso.

Contexto da cena: Cabrini volta a direcionar a pergunta para o médico.

RC: Por quanto ela estava perto da morte, doutor?

NL: Ela ultrapassou do limite da morte.

RC: Como assim?

NL: Ela foi salva porque tinha que ser salva, porque a dosagem que ela tomou era pra

ter levado ela a óbito.

RC: Poderia não estar mais aqui agora?

NL: Não.

RC: Era o mais provável?

NL: Era o mais provável.

Contexto da cena: Roberto Cabrini e o neuropsiquiatra Nelson Luiz estão sentados,

frente a frente, em uma sala para o prosseguimento da entrevista.

RC: Hoje, a Lilian Ramos está curada?

NL: Ela está liberta da dependência física do medicamento. A dependência

psicológica, os hábitos, ela vai ter ainda um longo passo pela frente. A estabilidade

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emocional dela é o que vai dizer que lá na frente, realmente, ela não precisa mais cair

em pegadinhas pra poder voltar no medicamento.

RC: O quanto a fármacodependência é comum na nossa sociedade?

NL: Hoje existem dados que oitenta por cento da população acaba fazendo uso de

medicamentos como uma forma de se auto ministrar, se automedicar.

CENA (45’42”– 48’35”)

Contexto da cena: A câmera está dentro do carro, que está em movimento. Ela

mostra a estrada rumo à Campinas. Após, a câmera mostra a faixada da Unicamp e,

na sequência, dois pesquisadores estão de frente para um computador, onde

analisam a substância da Sibultramina. Após, a dupla está em pé, conversando. A

câmera faz um plano detalhe da mão da pesquisadora, onde ela segura alguns

comprimidos que foram analisados.

RC: O resultado da Sibultramina comprada na internet está pronto. A resposta está

na Universidade Estadual de Campinas. Voltamos lá. A notícia não é das melhores.

Contexto da cena: O pesquisador da Unicamp, Marcel Nakahira está sentado no

laboratório e explica os resultados da análise na Sibultramina.

Marcel Nakahira (MN): Bem, o resultado que nós tivemos analisando este

medicamento comprado através da internet foi que existe realmente a presença de

Sibultramina, entretanto, comparando com medicamento vendido aqui no Brasil, nós

encontramos uma quantidade muito pequena.

Contexto da cena: Retorna a imagem de Roberto Cabrini e Lilian Ramos sentados,

frente a frente, para o prosseguimento da entrevista.

RC: O que você gostaria de dizer para as pessoas que estão acompanhando essa

entrevista?

LR: Não é normal ter um tarja preta na bolsa, por mais que todo mundo tenha hoje

em dia, como todo mundo diz, não é normal, e principalmente se esse tarja preta

chegou até você de uma forma ilegal, como acontece, de uma amiga emprestar para

outra, da “ah, minha vizinha não está conseguindo dormir...ah leva um comprimidinho

dessa aqui pra ela, só hoje”, não vai terminar bem.

RC: Você é a prova disso?

LR: Sim.

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Contexto da cena: Lilian Ramos está dançando em uma sala. Após, retorna a

imagem de Roberto Cabrini e Lilian Ramos sentados, frente a frente, para o

prosseguimento da entrevista.

RC: Até que ponto você vai recuperar o que você perdeu?

LR: Não vou recuperar, a minha filha não vai ter sete anos de novo, meu filho não vai

ter quatro anos de novo. Não vou recuperar.

RC: E o seu casamento?

LR: Não vai voltar.

RC: O que que você conseguiu salvar.

LR: A mim.

Contexto da cena: Simulação. Planos detalhes das mãos de uma mulher segurando

uma caixa de remédios e de um copo com água onde se está sendo despejado o pó

de um comprimido. Após, uma mulher bebe o líquido. Na sequência, diversos

comprimidos são despejados em uma mesa. Lilian reaparece dançando em uma sala.

RC: Os caminhos e as armadilhas da automedicação. Uma palavra pode ser a

diferença entre a cura e o risco de morrer.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está de pé onde conversa com o neuropsiquiatra

Nelson Luiz, acompanhado de Lilian.

RC: Hoje os medicamentos são importantes e são recomendados para casos

específicos?

NL: São importantes, são completamente aceitáveis nos níveis que são prescritos.

RC: O problema é quando a dosagem passa a ser maior? Fora de controle?

NL: Tudo que é usado sem prescrição, tudo que é usado de uma maneira obsessiva

e compulsiva torna-se prejudicial para a saúde, mas o medicamento, em si, tomado a

dosagem certa, correta, por orientação profissional, ele só tende a ajudar.

Contexto da cena: O doutor em psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP),

Adriano Segal está sentado em sua sala e explica sobre a dosagem de remédios.

AS: Se você usar para a indicação que elas estão aprovadas ou pra indicações que

também estudadas na literatura médica, de uma maneira controlada, de uma maneira

supervisionada, elas são drogas seguras.

CENA (52’28”- 53’26”)

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Contexto da cena: Imagem da tela preta com o texto em letras brancas “O Brasil tem

o maior índice de portadores de ansiedade em todo o planeta. São cerca de 20

milhões de pessoas”. Fonte: Organização Mundial da Saúde. Após, outro texto em

letras brancas: “Quanto à depressão, 11,5 milhões de brasileiros sofrem dessa

enfermidade”. Fonte: Organização Mundial da Saúde. Na sequência, Roberto Cabrini

está no estúdio e faz o encerramento do programa.

RC: Admitir a existência dessa verdadeira epidemia representada pela dependência

de medicamentos é o primeiro passo para se combater o mal que durante décadas foi

ignorado, mas que nunca deixou de fazer vítimas. Aqui, Roberto Cabrini, e este foi o

Conexão Repórter de hoje. Boa noite.

Contexto da cena: Sobem créditos finais.

6.2.2.3.3.1 Análise do episódio “O Mercado Negro dos Remédios Controlados”

O terceiro programa analisado é o episódio intitulado “O Mercado Negro de

Remédios Controlados”. Como já sintetizado, as cenas decupadas deste episódio

abrangem a entrevista com uma dependente de remédios “tarja preta”, a entrevista

com um necropsicanalista e as cenas em que foram utilizadas câmeras escondidas –

um dos principais artifícios do jornalismo investigativo – para denunciar o esquema

criminoso de venda de remédios.

Logo no início do programa, ainda no estúdio, quando Cabrini faz uma prévia

apresentação do tema que será abordado no episódio, ele sintetiza o termo

‘investigação’: “No Conexão Repórter de hoje, uma investigação de vários meses

revela uma ameaça invisível”. Pode-se relacionar essa observação ao que afirma

Hunter (2009) na tabela da página 74 desta monografia, onde o autor diferencia o

jornalismo convencional do jornalismo investigativo. No investigativo, o autor afirma

que a história se baseia no máximo possível de informações e pode ser bastante

longa. Nesse ponto, Fortes (2005) também sintetiza sobre as fases da investigação,

descritas nas páginas 69 e 70 desta monografia, que uma boa investigação requer

tempo, por isso exige paciência e concentração por parte do repórter.

Ainda na abertura do programa, após a frase descrita acima, que sintetiza o

caráter de uma longa investigação, Cabrini também evidencia os objetivos de tal

investigação com a seguinte frase: “O uso excessivo de remédios tarja preta pode

acabar em vício e levar à morte. Quem são, afinal, as vítimas? Como elas acabam

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dominadas por esse mal?”. Ou seja, a investigação se objetiva em responder os

questionamentos citados pelo jornalista.

O episódio mostra como é a dependência de remédios restritos na vida da

dançarina Lilian Ramos. Antes da entrevista com Cabrini, o jornalista deixa claro ao

telespectador: “Entre idas e vindas ao SPA, eu a encontro para uma longa conversa,

sem censura”. Quando Cabrini deixa explícito o termo “sem censura”, podemos

relacionar tal observação ao que diz Lopes (2003) sobre os requisitos básicos de uma

investigação, explanados na página 68 desta monografia, onde o autor explica que o

objetivo de uma investigação deve ser importante para grande parcela da população,

e não para interesses de determinados grupos. Ou seja, ao abordar o uso excessivo

de remédios restritos, grande parcela da população deve ser atingida, por isso a

importância de não haver censura na entrevista para que a mesma seja mais clara

possível na busca pelas respostas.

Com base nisso, Fortes (2005), ao explanar as fases da investigação, afirma

que é preciso ter lealdade ao consumidor da informação, pois toda investigação deve

ser fundamentada no interesse público, outro motivo importante para não haver

censura. E, de fato, não houve censura. Cabrini questionou Lilian sobre tudo, desde o

início da dependência, até os erros que cometeu.

Em determinado momento, Cabrini questiona Lilian sobre como estava sua

condição na época em que estava dependente dos remédios tarja preta. Ela confirma

que estava completamente dependente. Para confirmar o relato de Lilian, Cabrini

entrevista o neuropsicanalista Nelson Luiz, que também fala da condição de Lilian,

tendo em vista que ele a acompanhou em todo o processo de tratamento contra a

dependência. O médico confirma que Lilian estava compulsiva e obsessiva com uso

abusivo de medicamentos. Fortes (2005), nas fases da investigação, afirma que é

necessário ter muitas entrevistas para obter o maior número possível de informações

e contradições dentro da investigação. Neste caso específico, não houve contradição,

e sim, compatibilidade entre as informações de Lilian e do Dr. Nelson Luiz. Ainda sobre

a cena em questão, podemos relacionar com o que diz Hunter (2009) dentro dos

elementos do jornalismo investigativo – que a história se baseia no máximo possível

de informações e que a boa fé das fontes não pode ser presumida, pois podem

fornecer informações falsas e, por isso, necessita de verificação.

O próximo indício da investigação se dá em um dos questionamentos de

Cabrini para Lilian: “Você passou quanto tempo conseguindo tarja preta debaixo do

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pano?”. Após ela responder, Lilian então confirma a facilidade de conseguir a

medicação através da internet: “Você pode fazer uma procura no site de buscas e

encontrar facilmente um farmacêutico que entrega essa medicação pra você. Não só

esse, como várias outras medicações. Não é difícil. Não é difícil”. Lilian dá detalhes

de como conseguia a medicação. Esse é fio-condutor para o início da investigação

com o recurso de câmera escondida.

Para dar veracidade às informações denunciadas por Lilian, o programa

passa a fazer uso da câmera escondida. Cabrini diz o seguinte: “Bem-vindos à selva

da venda irrestrita. Praça da Sé, centro de São Paulo, um dos cartões postais da maior

cidade do país. Com uma câmera escondida, cenas de um cotidiano fora da lei. E

constatamos que não é difícil conseguir receitas médicas aqui”.

O uso da câmera escondida, aliado à constatação de Cabrini sobre a

facilidade de conseguir receitas médicas na Praça da Sé pode ser relacionado com

alguns elementos importantes do jornalismo investigativo. Um deles é a exclusividade

do trabalho do jornalista, assim como diz Lopes (2003) na página 68 desta monografia,

onde afirma que a investigação deve ser resultado exclusivo do jornalista e também

ao que diz Hunter (2009), quando afirma que sem o engajamento do repórter, a

história nunca será completada.

As imagens das câmeras escondidas mostram diversas abordagens

realizadas por um dos produtores do programa Conexão Repórter, que também é

jornalista. Logicamente que, como Cabrini é um jornalista reconhecido nacionalmente,

esse tipo de trabalho de investigação fica a cargo dos produtores, que não são

identificados para garantir a segurança dos mesmos. Duas das fases da investigação

de Fortes (2005) podem ser evidenciadas em relação à essa observação. O autor

sintetiza que é necessário discrição, pois o bom repórter deve manter-se no anonimato

para garantir uma reportagem de sucesso, e coragem e responsabilidade, neste caso

por parte dos produtores, tendo em vista que o jornalismo investigativo é uma

atividade de risco.

Nas diversas abordagens realizadas pelo produtor, procurando meios através

de muitas fontes para, de fato, consumar a compra dos remédios controlados,

podemos constatar outros elementos do jornalismo investigativo. Dentre eles, a

insistência e a perseverança, explanado por Fortes (2005), tendo em vista que os

investigados jamais irão colaborar, além, claro, de um conhecimento policial básico

para entender sobre investigação, seleção de pistas, análise de provas e indícios,

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como quando Cabrini afirma que, durante a espera do produtor, descobriu-se que

haviam mais envolvidos no comércio ilegal de medicamentos, pois, enquanto o

produtor aguardava, ele questionou o pedestre sobre quem ele estaria esperando. O

pedestre então revelou que o esquema envolvia mais duas pessoas – um idoso e uma

mulher.

A importância do uso de câmeras escondidas como no caso em questão pode

ser evidenciada quando analisamos as situações caso não fosse utilizado este

recurso. Logicamente que, quando os investigados sabem que estão sendo gravados,

possivelmente ocultarão as informações do público, pois este é um dos requisitos

básicos de uma investigação, segundo Lopes (2003), e, ainda conforme Hunter

(2009), as informações oficiais são ocultadas do repórter porque sua revelação pode

comprometer os interesses de autoridades ou instituições.

Após toda a primeira negociação para a venda ilegal das receitas, Cabrini

esclarece que toda abordagem teve o conhecimento do Ministério Público. Isso vai de

encontro ao que o próprio Cabrini (2003) afirma na página 71 desta monografia, onde

afirma que a câmera escondida é um recurso insubstituível na busca de provas,

principalmente na televisão, mas pondera que não pode ser utilizada para tirar a

privacidade de alguém.

Na cena subsequente, o programa aborda a venda do remédio Sibultramina,

na qual é realizada ilegalmente pela internet. Para efetivar a compra, os produtores

criaram um perfil falso em uma rede social e entraram em um dos vários grupos de

compras e discussões sobre os medicamentos. Pode-se relacionar isso com algumas

das fases propostas por Fortes (2005). Uma delas é quando o autor explana sobre a

discrição, onde é necessário que o repórter se mantenha no anonimato para garantir

uma reportagem de sucesso. Outro ponto na qual podemos comparar é sobre o

conhecimento básico para entender sobre investigação, seleção de pistas, análise de

provas e indícios.

Após toda a negociação para a venda do remédio Sibultramina, uma

produtora do programa parte para o local combinado com a vendedora. O encontro

novamente é gravado utilizando-se de câmeras escondidas. Todos os conceitos sobre

o uso deste artifício já foram explanados na referida análise.

O próximo ponto abordado no documentário, na cena seguinte, é a busca pela

constatação da eficiência do remédio Sibultramina, comprado na estação do metrô.

Cabrini leva o remédio até o laboratório de análises químicas da Unicamp

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(Universidade Estadual de Campinas). Podemos analisar esse ponto com os

conceitos de Fortes (2005) e Hunter (2009). Para Fortes (2005), é preciso ter lealdade

ao consumidor da informação, pois toda investigação deve ser fundamentada no

interesse público. Ou seja, o programa, inicialmente, abordou a facilidade de compra

do medicamento por meio da internet, porém, é necessário “quebrar” a primeira

impressão e mostrar que, de fato, a qualidade do remédio não é 100% comprovada.

Já Hunter (2009) afirma que, no jornalismo investigativo, o repórter se recusa a aceitar

o mundo como ele se apresenta e a história visa penetrar ou expor uma dada situação,

para que seja reformada ou denunciada. Em certos casos, inclusive, ela deve

promover um exemplo de caminho melhor. Pode-se analisar que este é um dos

principais objetivos do estudo que será realizado na Sibultramina.

Já ao final do programa, o resultado é divulgado. O remédio possuía

Sibultramina, porém em quantidade pequena do que seria vendido no Brasil.

Como já foi sintetizado na referida análise, o programa Conexão Repórter se

destaca por sempre apresentar edições de longa duração, evidenciando muitas

entrevistas para se ter, de fato, um maior número de informações. Essa é uma das

fases da investigação proposta por Fortes (2005) que, além disso, afirma que as

entrevistas podem trazer também contradições dentro da investigação. Sobre o

mesmo ponto, Hunter (2009) também evidencia que a história se baseia no máximo

possível de informações e pode ser bastante longa.

Visando tais conceitos, na cena seguinte, Cabrini entrevista o

neuropsicanalista Nelson Luiz, que mostra como é o tratamento de Lilian no SPA. Ele

explica minunciosamente como está sendo o processo de desintoxicação dela, desde

o início do tratamento. Pode-se relacionar as entrevistas com os médicos de Lilian

também com outro conceito de Fortes (2005) – Pesquisa minuciosa sobre os fatos

com olhar crítico, fugindo das fontes óbvias.

Em determinada cena, ainda na entrevista com Lilian Ramos, Cabrini não faz

um questionamento, e sim, uma constatação própria: “Olhando para os seus olhos

agora eu vejo muita angústia”. Pode-se relacionar essa observação à afirmação de

Hunter (2009) na tabela da página 74 desta monografia, onde o autor traz a

diferenciação entre o jornalismo convencional e o investigativo. Segundo ele, no

jornalismo investigativo o repórter busca ser justo e escrupuloso em relação aos fatos

da história e com base nisso pode designar as suas vítimas, heróis e malfeitores. Além

disso, o repórter também pode oferecer um juízo de valor ou veredito sobre a história.

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Ou seja, ao analisar como Cabrini vê Lilian, ele faz o seu juízo de valor e dá o seu

veredito sobre a situação dela.

Outro ponto importante e que mostra a importância da investigação em

questão é exposto através de dois questionamentos que Cabrini faz a Lilian: “O que

que as pessoas precisam saber sobre isso?”, e “O que você gostaria de dizer para as

pessoas que estão acompanhando essa entrevista?”, e de outro questionamento que

ele faz o neuropsiquiatra Nelson Luiz: “O quanto a fármacodependência é comum na

nossa sociedade?”.

Frente a esses questionamentos, relacionamos com o que diz Lopes (2003)

na página 68 desta monografia sobre os requisitos básicos de uma investigação – o

objetivo da investigação deve ser, mesmo que razoável, importante para grande

parcela da população. Sobre o mesmo ponto de vista, também relacionamos as

perguntas a uma das fases da investigação de Fortes (2005), onde o autor diz que é

preciso ter lealdade ao consumidor da informação, pois toda investigação deve ser

fundamentada no interesse público.

De uma maneira geral, o episódio “O Mercado Negro dos Remédios

Controlados” traz também outros pontos importantes que evidenciam os elementos

do jornalismo investigativo. A todo momento, a estrutura dramática do programa é

muito bem construída, trazendo imagens simuladas de pessoas tomando remédios e

demonstrando ansiedade, em imagens de um ambiente de escuridão, relacionado ao

tema do episódio. Sobre esse ponto, podemos relacionar com um dos conceitos de

Hunter (2009) sobre os resultados de uma investigação. O autor diz que a estrutura

dramática da história é essencial para o seu impacto, e leva a uma conclusão que é

oferecida pelo repórter ou por uma fonte.

Ao final do episódio, Cabrini, assim como em quase todas as edições do

Conexão Repórter, traz uma conclusão sobre o assunto abordado: “Admitir a

existência dessa verdadeira epidemia representada pela dependência de

medicamentos é o primeiro passo para se combater o mal que durante décadas foi

ignorado, mas que nunca deixou de fazer vítimas”.

6.2.2.3.4 Os Filhos da Meia-Noite

O quarto e último programa a ser observado é intitulado “Os Filhos da Meia-

Noite”, exibido no dia 09 de abril de 2017, com duração de 53’26”. Este documentário

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exclusivo mostra o registro de Roberto Cabrini, único jornalista da América Latina a

entrar em Halabja (cidade curda arrasada por armas químicas no final dos anos 80) e

lembra em detalhes e imagens suas experiências na comunidade destruída

por Saddam Hussein em 1988. Um documento raro no mundo, produzido in loco pelo

jornalista, que mostra as sequelas deixadas pelo pior ataque químico que se tem

notícia até hoje. As cenas decupadas deste episódio abrangem todo o resgate da

reportagem realizada por Cabrini em Halabja, nos anos 90.

CENA (4’20”- 19’26”)

Contexto da cena: Plano geral de Roberto Cabrini, que está no estúdio do programa

Conexão Repórter, em pé. A câmara segue em zoom até chegar ao plano médio do

apresentador.

Roberto Cabrini (RC): Boa noite. No Conexão Repórter de hoje, “Os Filhos da Meia-

Noite”, o ataque químico de Bashar al-Assad na Síria que desencadeou a ofensiva

americana traz de volta o terror representado pelas armas de destruição em massa.

Há mais de duas décadas, me tornei o único jornalista na América Latina a

testemunhar o pior ataque químico que se tem notícia até hoje. O ataque a cidade

curda de Halabja, no Iraque, ordenado por Saddam Hussein. Qual a ameaça para a

humanidade? Qual o preço pago pelos inocentes? Aqui, Roberto Cabrini, e este é o

Conexão Repórter de hoje.

RODA VINHETA DE ABERTURA DO PROGRAMA

Contexto da cena: Na tela aparece a frase “Os Filhos da Meia-Noite” sobre um fundo

azul. Após, imagens de pessoas correndo e carregando um ferido. Imagens de dentro

do hospital, pessoas ajudam um homem a se levantar da maca e outro está fazendo

nebulização. Na sequência, imagens dos ataques de bombas à cidade de Khan

Sheikhoun, província de Idlib. Imagens amadoras mostram os pacientes feridos pelas

armas químicas sendo atendidos no hospital, a maioria deles crianças. O exército da

Síria atira contra seus inimigos. Na sequência, imagens do ditador Bashar al-Assad.

A imagem retorna mostrando as crianças mortas no ataque de armas químicas.

Algumas crianças e adultos que conseguiram sobreviver são atendidos no hospital.

Um homem está deitado no chão e tem uma reação nervosa devido ao ataque das

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armas químicas. Outros são banhados com água. Em uma maca, um homem passa

mal. Um plano geral mostra a cidade sendo atacada pelas bombas. Uma criança faz

nebulização na maca do hospital. Um homem e um jovem se contorcem no chão após

sofrerem os efeitos das bombas químicas. Pessoas atingidas são atendidas no chão.

Imagens dos corpos de crianças mortas envoltos em plásticos aparecem na

sequência. Paramédicos chegam a um hospital da Turquia trazendo alguns pacientes

nas macas. Uma mulher e um rapaz fazem nebulização no hospital, enquanto outro

recebe atendimento de um médico, que ouve seus batimentos cardíacos.

RC: A cronologia de uma tragédia. Terça-feira, 04 de abril. O ataque aéreo com armas

químicas devasta a cidade Khan Sheikhoun, província de Idlib, uma região controlada

por rebeldes contrários ao regime de Bashar al-Assad. Entre os mortos, 26 crianças.

A inocência perdida. As imagens produzidas pelo massacre estarrecem o mundo.

Desespero. Pessoas atingidas tem reações nervosas. Civis são banhados com água

para tentar diminuir os efeitos do gás sarin. Substância tóxica e mísseis são

disparados pelos jatos que bombardeiam a cidade. Sintomas parecidos com o do

ataque de 2013. Na época, mais de 1400 pessoas morrem, entre elas, 426 crianças.

Sem estrutura hospitalar básica, muitos pacientes são transferidos para tratamento na

vizinha Turquia. A Organização Médicos sem Fronteiras confirma – pacientes são

contaminados com agentes químicos proibidos, que atacam o sistema nervoso.

Contexto da cena: Imagens amadoras mostram um míssil atingindo uma cidade

causando destruição. Imagens dos anos 90 mostram uma menina caminhando. Na

sequência, ela mostra as pernas com feridas, resultado dos efeitos das armas

químicas. Crianças doentes aparecem logo em seguida. Nas imagens de arquivo,

Roberto Cabrini aparece em um morro, de frente para uma bomba que não explodiu

e, após, dentro do carro conversando com um morador de Halabja. Ele caminha ao

lado de um menino que também sofreu os efeitos das armas químicas. A câmera

mostra as feridas na pele das costas e pescoço do garoto. Após, Cabrini caminha

pelas ruas ao lado de outros moradores da localidade. Uma criança caminha em

direção à câmera. Em outra imagem, um bebê está deitado na cama. Ele tem os pés

deformados devido aos efeitos das armas químicas. Outras crianças aparecem na rua

da cidade de Halabja.

RC: No momento em que o mundo discute a ameaça das armas químicas como

instrumento de guerra, eu fui o primeiro repórter da América Latina a entrar em

Halabja, cidade curda devastada por esta substância no final dos anos 80. Consegui

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finalmente chegar lá em 95. Registros que ficam para a história. O pior ataque químico

que se tem notícia, testemunhadas in loco por mim e por meu cinegrafista.

Contexto da cena: Roberto Cabrini está sentado em meio a um estúdio com cores

predominantes de azul e preto. Ele dá o seu relato sobre a época em que esteve em

Halabja.

RC: O cenário que a gente encontrou foi um cenário que eu jamais vou esquecer, nem

eu, nem o cinegrafista Fernando Pelégio. Tudo o que pode acontecer de destruição

em uma cidade arrasada por armas químicas em uma Campanha que se chamava Al-

Anfal. Era parte dessa Campanha Al-Anfal cujo objetivo era o de destruir ou de matar

insurgentes que apoiavam naquele momento os iranianos do conflito entre Irã e

Iraque.

Contexto da cena: Imagens de arquivo. Aviões sobrevoam o Iraque durante a noite.

Um míssil é lançado. A imagem a seguir mostra a mira digital de um possível míssil

sendo direcionado para um prédio.

RC: Iraque. A mãe de todas as batalhas apontou as luzes do mundo a uma nação

marcada pelas trevas. A guerra high-tech, o videogame de fogo e destruição.

Contexto da cena: Tropas de soldados americanos estão na estrada com seus

tanques de guerra. Após, o contraste mostra os soldados iraquianos de Sadam

Hussain.

RC: Americanos e seus aliados ocidentais contra um império que ajudaram a construir

– o império de Sadam.

Contexto da cena: A câmera está dentro do carro, que está em movimento e chega

até o Iraque. Uma idosa com feridas pelo rosto está deitada na rua. Pessoas gritam

em idolatria à Sadam Hussain, que acena para a multidão.

RC: Um império de riquezas e sofrimento, onde o fascínio e a opressão fazem uma

combinação tão enigmática quanto duradoura.

Contexto da cena: Imagens do exterior de uma mesquita no Iraque. Já no interior,

um homem faz seu culto à Alá.

RC: Para tentar revelar alguns dos mistérios desse império, passamos cinquenta dias

na terra das mil e uma noites.

Contexto da cena: A câmera está dentro do carro, que está em movimento e anda

pelo deserto sírio. Após, Cabrini está em uma montanha conversando com alguns

moradores. Um trator passa por um campo. Na sequência, imagens de comerciantes

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pelas ruas do Iraque. Após, aparece uma imagem de um monumento que homenageia

as vítimas de guerra.

RC: Andamos no deserto sírio às montanhas do Curdistão, passando pelas terras

férteis da Mesopotâmia. Vimos o Iraque que Sadam quer mostrar, o país que sofre

com o bloqueio econômico decretado pela ONU e que chora suas vítimas de guerra.

Contexto da cena: Nas montanhas do Iraque, um homem solta um míssil. Após, um

homem está com uma metralhadora e atira para o outro lado da montanha. Na

sequência, registros de um tiroteio entre civis nas montanhas iraquianas.

RC: Mas trabalhamos também para mostrar o Iraque que Sadam quer esconder.

Driblando os agentes iraquianos, encontramos um país em conflito.

Contexto da cena: Cabrini faz a passagem no pico da montanha onde acontecem os

conflitos. Ao mesmo tempo, civis iraquianos atiram em direção ao outro lado.

RC: E assim, forçados pelas tropas de Barzani, os guerrilheiros fogem para o Irã, logo

atrás daquelas montanhas.

Contexto da cena: Um tanque de guerra se desloca pelas ruas do Iraque. Durante a

noite, tiros são disparados. Cabrini está ao lado de um tanque de guerra e aponta para

o modelo do veículo, onde está gravado “Cascavel”, uma marca brasileira de tanques

de guerra.

RC: Combates diários e com a colaboração de armas bem conhecidas – armas

brasileiras.

Contexto da cena: Dois civis caminham ao lado de um rio. Um homem retira o pano

que está em sua cabeça e mostra a sua orelha decepada. A imagem mostra um plano

detalhe do pescoço de um menino cheio de feridas, resultantes do ataque químico.

RC: Imagens nunca mostradas. A face oculta de um regime de força capaz de cortar

as orelhas dos que ousam abandonar seu exército, que usa armas químicas para

arrasar suas minorias discordantes.

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Figura 9: Soldado com a orelha cortada

Fonte: Conexão Repórter, SBT

Contexto da cena: Em um hospital, médica e enfermeiras realizam um parto.

RC: Um país onde sobreviver pode se transformar em um ato de bravura.

Contexto da cena: Roberto Cabrini segue sentado em meio a um estúdio com cores

predominantes de azul e preto. Ele continua seu relato sobre os conflitos que

acompanhou.

RC: Uma cobertura particularmente desafiadora porque havia o receio, a todo

instante, de que os agentes do Sadam Hussein chegassem à Halabja e nos retirassem

dali.

Contexto da cena: A câmera está dentro do carro, que está em movimento e entra

na cidade de Halabja. Na sequência, as imagens mostram os prédios destruídos da

cidade.

RC: Estamos agora entrando na cidade curda que sofreu o mais cruel de todos os

ataques promovidos pelo regime de Bagdá. Esta é Halabja, nordeste do Iraque. É a

cidade que foi massacrada pelas armas químicas de Sadam.

Contexto da cena: Cabrini faz a passagem. Ele está em cima dos escombros de um

prédio destruído.

RC: Halabja já foi uma das cidades mais ricas do Curdistão, hoje lembra mais um

teatro dos horrores. As marcas da destruição e do sofrimento estão em todas as

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partes. Mas de sete anos já se passaram desde que o lugar foi atacado pelas armas

químicas de Sadam, mesmo assim, o pesadelo de Halabja parece longe de terminar.

Contexto da cena: Uma mulher carrega uma criança no colo e outra caminha ao seu

lado, chorando. Cabrini, emocionado, observa as ruinas da cidade. A imagem mostra

o cenário de destruição. Na sequência, Cabrini conversa com moradores do local. A

câmera segue pelas ruas da cidade. Um plano geral mostra mais destruição da cidade

de Halabja. Mulheres estão na porta de uma residência e olham atentamente para a

câmera.

RC: Ruínas e sofrimento. Andar pelas ruas de Halabja é uma experiência que marca.

É como testemunhar as atrocidades que o ser humano é capaz de cometer em nome

do poder. Depois de sofrer o ataque com armas químicas, Halabja ainda ficou sob o

controle de Sadam Hussein durante dois anos. Sadam mandou riscar Halabja do

mapa à exemplo de outras cidades curdas. Halabja foi então dinamitada, mas Sadam

não conseguiu terminar o serviço e muito menos conseguiu apagar Halabja da

memória. A cidade é hoje o retrato da indignação humana aos regimes de força.

Contexto da cena: Cabrini faz a passagem sobre as ruínas de uma casa que foi

destruída. Em seguida ele mostra duas mulheres que são irmãs.

RC: Essas são as ruínas de uma casa de Halabja onde viviam seis famílias. No dia

do bombardeio iraquiano, aqui estavam 62 pessoas, 32 delas morreram. Entre os 30

sobreviventes, as irmãs Seruin e Aluan.

Contexto da cena: As irmãs rezam sobre as ruínas da casa. Uma das mulheres

mostra uma foto de uma outra irmã que morreu no ataque de Halabja. Na sequência,

ela mostra fotos dos irmãos que também morreram. A imagem foca nos rostos das

duas mulheres.

RC: Uma vez por semana elas rezam pelas vítimas de Halabja. Uma das irmãs guarda

a foto de como ficou na época. Elas perderam os pais e três irmãos em consequência

daquele ataque. Elas lembram bem como tudo aconteceu. Eram onze horas da manhã

do dia 16 de março de 1988 quando o ataque começou.

Contexto da cena: Bomba caindo sobre a cidade de Halabja. Cabrini descreve o que

as irmãs falam.

RC: Era a época da guerra entre Irã e Iraque. Vimos quando os aviões de Sadam

Hussein se aproximaram, já conhecíamos aqueles aviões. Vinham de Kirkuk, mais ao

sul. Eram sete aviões ao todo. Elas dizem que já estavam acostumadas a esses

ataques, por isso se esconderam no porão da casa que servia como abrigo antiaéreo.

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Os ataques aconteciam em intervalos de quinze minutos, lembram as irmãs. Logo

percebemos que não era um bombardeio normal.

Contexto da cena: Bomba caindo sobre a cidade de Halabja. Uma densa fumaça se

levanta. Após, uma das irmãs mexe no pó.

RC: Ao explodir, as bombas espalharam uma nuvem densa de fumaça, de cor amarela

esbranquiçada, da cor desse pó.

Contexto da cena: As irmãs Seruin e Aluan relatam a história para Roberto Cabrini.

As imagens são intercaladas com outras imagens de bombas caindo sobre a cidade

de Halabja.

RC: Depois soubemos que era uma mistura de dois gases: o cianeto e o gás

mostarda. Era difícil respirar, os pulmões queimavam, os olhos ardiam, e quem bebia

água se sentia ainda pior.

Contexto da cena: Imagens dos mortos nas ruas de Halabja, muitos deles abraçados.

Um homem chora pelas crianças mortas.

RC: Muitos morreram depois das primeiras horas. As ruas de Halabja ficaram repletas

de corpos. Muitos morreram abraçados uns aos outros. Cinco mil mortos no total. Já

o número de traumas passa dos milhões.

Contexto da cena: Roberto Cabrini segue sentado em meio a um estúdio com cores

predominantes de azul e preto. Ele continua seu relato sobre os conflitos que

acompanhou.

RC: As consequências de um ataque químico não são apenas as imediatas. Muita

gente morre na mesma hora, mas a contaminação é muito grande também. Gerações

são atingidas durante muito tempo como no caso de Halabja, a água contaminada.

Contexto da cena: Cabrini está ao lado de um homem que tem fortes tosses.

RC: Esse agricultor ainda hoje tem problemas no pulmão.

Contexto da cena: Cabrini está ao lado de uma bomba que não explodiu e está presa

na montanha.

RC: Essa bomba iraquiana que não chegou a explodir no dia do ataque é hoje uma

espécie de monumento da resistência curda.

Contexto da cena: Cabrini está dentro de um carro, ao lado de um homem que é o

líder do partido curdo. Por fora, a câmera mostra o carro do homem sendo escoltado

por outro veículo com homens armados. Após, a imagem retorna para dentro do carro,

onde os dois conversam.

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RC: Esse é Mohied Abdula, líder regional do partido democrata curdo, que no

momento controla Halabja. Ele só sai de casa assim. A Mercedes está sempre

protegida por um forte aparato. Metralhadoras e os melhores atiradores. Enquanto a

Mercedes percorre as ruínas de Halabja, ele conta que teme a volta dos agentes de

Sadam. Segundo ele, Sadam ainda tem muitos agentes no Curdistão.

Contexto da cena: Mulheres estão na porta de uma residência. Abdula mostra uma

casa destruída para Roberto Cabrini. Crianças correm sobre os escombros. Após,

aparece um homem morto segurando um bebê, também morto.

RC: Quando o carro para, Abdula mostra o local onde estava o homem que acabou

virando símbolo do drama de Halabja. Aqui morrera o padeiro Omar Hauadt e seu

filho. Esse padeiro já tinha nove filhas, nove meninas, quando nasceu, finalmente, um

menino. Os corpos de Omar e de seu filho foram encontrados assim: Omar segurava

firmemente o menino numa última e desesperada tentativa de salvá-lo.

Contexto da cena: Uma menina caminha em direção à câmera e entra dentro de uma

casa. Na sequência, ela mostra as pernas repletas de feridas.

RC: A menina Rejan tinha apenas um ano quando os aviões iraquianos

bombardearam Halabja. Hoje, aos oito, ela guarda as marcas das armas químicas de

Sadam.

Contexto da cena: Roberto Cabrini segue sentado em meio a um estúdio com cores

predominantes de azul e preto. Ele continua seu relato sobre os conflitos que

acompanhou.

RC: E as sequelas, as consequências estava lá como se o ataque tivesse acontecido

no dia anterior, tamanho foi o nível de destruição.

Contexto da cena: Cabrini caminha pelas ruas do Curdistão ao lado de um menino

chamado Mohamed.

RC: O pequeno Mohamed tem treze anos, mas aparenta menos por causa da baixa

estatura. Ele tinha apenas cinco anos quando o ataque aconteceu, mas a ele não se

dá o direito de esquecer da tragédia. Até hoje, ele não entende exatamente o que

sejam armas químicas, sabe apenas que são a causa da doença que carrega e que o

impede de jogar futebol, exatamente como faz o seu ídolo.

Mohamed: Maradona.

Contexto da cena: Mohamed levanta a blusa e mostra as feridas que tem pelas

costas e também no pescoço. Após, em câmera lenta, ele cumprimenta Cabrini e os

dois se dão as mãos.

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RC: A pele de Mohamed está sempre ardendo. Sente muitas dores e não sabe se

conseguirá ser o que gostaria: professor. Se conseguir, ensinará aos outros a amar a

vida.

Contexto da cena: Roberto Cabrini segue sentado em meio a um estúdio com cores

predominantes de azul e preto. Ele continua seu relato sobre os conflitos que

acompanhou.

RC: A entrevista com esse menino me marcou muito. As marcas estavam em todo o

corpo dele e são marcas para toda uma vida. As consequências de um ataque com

armas químicas permanecem durante gerações, são sequelas quase que eternas

para essas pessoas vítimas, para os sobreviventes. Poucos sobrevivem e quem

sobrevive fica com consequências, com sequelas para toda uma existência.

Contexto da cena: Roberto Cabrini caminha pelas ruas de Halabja ao lado de um

médico que explica sobre a situação da cidade.

RC: O médico do hospital de Halabja afirma que o drama da cidade ainda está longe

de terminar. Neste momento o grande problema é a água. A maioria da população

toma água de poço, por desinformação ou por falta de opção. E esta água está

contaminada pelos componentes químicos, herança do ataque de Sadam.

Contexto da cena: Roberto Cabrini continua caminhando pelas ruas de Halabja ao

lado do médico que explica sobre a situação da cidade. Agora Cabrini traduz o que

diz o médico.

RC: Fiz um estudo a respeito. O mundo precisa saber disso, por favor, ajude! Vejo

todos os dias inúmeros casos de doença de pele, doenças cardiovasculares, doenças

nos olhos, diarreia, casos de infertilidade, tudo relacionado à agua contaminada.

Contexto da cena: Uma criança com os pés tortos está deitada sobre uma cama.

Cabrini conversa com a mãe dela.

RC: Aqui em Halabja, o índice de casos de crianças com má formação congênita é

muitas vezes maior do que em qualquer outro lugar

Contexto da cena: Cabrini conversa com uma enfermeira. As imagens são

intercaladas com a imagem do rosto de uma criança doente.

RC: Aqui envelhecemos muito cedo desabafa a enfermeira do único e superlotado

hospital de Halabja.

Contexto da cena: Cabrini está no meio de alguns moradores de Halabja, na rua.

RC: Mas essa população que voltou à cidade depois que as tropas de Sadam foram

expulsas não pensa em trocar de lugar.

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Contexto da cena: Uma mulher conta para Cabrini como é a vida na cidade. Ele

traduz. Após, algumas crianças brincam com uma bola nas ruínas de Halabja.

RC: Pertencemos à Halabja, aqui vivemos, aqui morreremos diz esta mulher. Antes

de deixarmos Halabja, vimos a última imagem: um bando de garotos correndo atrás

de uma bola velha e amassada entre as ruínas da cidade. Até mesmo em Halabja, a

vida insiste em continuar.

Contexto da cena: Roberto Cabrini segue sentado em meio a um estúdio com cores

predominantes de azul e preto. Ele continua seu relato sobre os conflitos que

acompanhou.

RC: Esse ataque foi comandado pelo primo de Sadam Hussein, Alimajid, que ficou

conhecido como Aliquímico. Durante muito tempo o Sadam se empenhou em impedir

que o mundo recebesse as informações, ele impedia que os jornalistas chegassem

até ali, por isso era muito difícil. Durante todo o tempo da realização dessa

reportagem, a gente tinha o medo, o receio de que os agentes do Sadam Hussein

chegassem à Halabja e as consequências seriam imprevisíveis do que poderia

acontecer com a gente.

6.2.2.3.4.1 Análise do episódio “Os Filhos da Meia-Noite”

O quarto e último programa analisado é o episódio intitulado “Os Filhos da

Meia-Noite”. Este episódio mostra o registro de Roberto Cabrini, único jornalista da

América Latina a entrar em Halabja (cidade curda arrasada por armas químicas no

final dos anos 80) e lembra em detalhes e imagens suas experiências na comunidade

destruída por Saddam Hussein em 1988. Um documento raro no mundo, produzido in

loco pelo jornalista, que mostra as sequelas deixadas pelo pior ataque químico que se

tem notícia até hoje. As cenas decupadas deste episódio abrangem todo o resgate da

reportagem realizada por Cabrini em Halabja, nos anos 90.

Logo no início do programa, quando Cabrini faz um panorama geral sobre o

conteúdo do programa em questão, ele fala a seguinte frase: “Há mais de duas

décadas, me tornei o único jornalista na América Latina a testemunhar o pior ataque

químico que se tem notícia até hoje”. Ou seja, aqui está evidenciado o caráter de

exclusividade da reportagem. Pode-se relacionar essa fala com o que diz Lopes

(2003) nos requisitos básicos de uma investigação, onde o autor afirma que a

investigação deve ser resultado do trabalho exclusivo do jornalista. Hunter (2009)

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também explana que sem um engajamento pessoal do repórter, a história nunca será

completada.

O episódio em questão possui uma peculiaridade nunca antes vista no

programa Conexão Repórter. Cabrini aparece como entrevistado e dá o seu próprio

relato sobre os momentos que viveu na condução da reportagem em Halabja e

evidencia que ela foi produzida in loco, ou seja, no local dos fatos.

Em determinado momento da reportagem, Cabrini diz: “Para tentar revelar

alguns dos mistérios desse império, passamos cinquenta dias na terra das mil e uma

noites”. Ou seja, aqui evidenciamos uma das fases da investigação, proposta por

Fortes (2005), onde ele afirma que é preciso paciência e concentração, pois uma boa

investigação requer tempo. Hunter (2009) também evidencia sobre a duração de uma

reportagem ao afirmar que a história se baseia no máximo possível de informações, e

pode ser bastante longa.

No decorrer da reportagem, outras frases de Cabrini também evidenciam o

caráter de investigação do documentário. “Mas trabalhamos também para mostrar o

Iraque que Sadam quer esconder. Driblando os agentes iraquianos, encontramos um

país em conflito” e “Imagens nunca mostradas. A face oculta de um regime de força

capaz de cortar as orelhas dos que ousam abandonar seu exército, que usa armas

químicas para arrasar suas minorias discordantes”.

Ao querer mostrar o outro lado da história, evidenciamos os três conceitos de

Lopes (2003) sobre os requisitos de uma investigação. Nesse ponto, mais uma vez a

investigação se mostrou como trabalho exclusivo do jornalista. Assim como explana

Lopes (2003), o objetivo também se mostra importante para grande parcela da

população, neste caso, para quem desconhecia até então o lado obscuro da guerra

de Sadam. O terceiro ponto abordado por Lopes (2003) na qual podemos evidenciar

a frase de Cabrini é quando o autor diz que os investigados tentam esconder as

informações do público, ou seja, “o Iraque que Sadam quer esconder”.

Também podemos relacionar essa frase com algumas fases da investigação,

pois, segundo Fortes (2005), é preciso que o jornalista seja insistente e perseverante,

pois quem está sendo investigado jamais irá colaborar, além de evidenciar a

curiosidade e desconfiança, que devem sempre andar juntas em uma investigação

jornalística.

Em determinado momento da reportagem, Cabrini faz a passagem no pico da

montanha onde acontecem os conflitos. Ao mesmo tempo, civis iraquianos atiram em

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direção ao outro lado. Ele se arrisca no meio do tiroteio. Esse é um ponto também

abordado por Fortes (2005) que diz que o jornalismo investigativo é uma atividade de

risco, por isso é preciso ter coragem e responsabilidade diante de uma investigação.

Sobre os riscos que correu durante a produção da reportagem, Cabrini dá seu

depoimento afirmando que ela foi desafiadora, pois havia o receio de que os agentes

do Sadam Hussein chegassem à Halabja e retirasse a equipe do local, outro ponto

que realça a insistência e perseverança por parte do repórter.

Cabrini entrevista duas irmãs, Suruín e Aluan, que perderam seus parentes

no ataque químico de 1988. Elas mostram fotografia destes parentes e detalham com

precisão como foi o dia do ataque. Pode-se relacionar a cena em questão com duas

importantes fases da investigação propostas por Fortes (2005). A primeira delas é

sobre a obtenção do maior número possível de informações através das entrevistas e

outra é sobre a atenção especial aos documentos disponíveis, no caso, as fotografias.

Num contexto geral, o resgate dessa reportagem de 1995 trouxe à tona alguns

dos elementos do jornalismo investigativo. Além dos já citados, podemos também

relacionar com alguns dos conceitos de Hunter (2009). Para o autor, a estrutura

dramática da história é essencial para seu impacto e leva a uma conclusão que é

oferecida pelo repórter ou por uma fonte. Toda a história do ataque químico à cidade

de Halabja foi carregada de uma estrutura dramática, evidenciada com cenas fortes

de pessoas atingidas, que sofrem até hoje com os efeitos das armas químicas.

Outro ponto importante evidenciado por Hunter (2009) no jornalismo

investigativo é de que o repórter busca ser justo e escrupuloso em relação aos fatos

da história, e com base nisso pode designar as suas vítimas, heróis e malfeitores. O

repórter também pode oferecer um juízo de valor ou veredito sobre a história. Nesse

quesito podemos analisar que Cabrini, a todo momento, evidenciou as vítimas, os

heróis e os malfeitores da história, ou seja, as vítimas do ataque químico, Sadam

Hussain como o malfeitor e, no papel de heróis, as pessoas que sobreviveram ao

massacre.

A reportagem, em sua totalidade, mostrou também a clareza e a simplicidade

na construção do texto e edição, trazendo uma costura perfeita entre texto e imagem.

6.2.3 Entrevista

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Outra técnica que será utilizada na referida pesquisa será a entrevista. O autor

Jorge Duarte, em seu artigo Entrevista em Profundidade (2005), diz que tal técnica é

considerada “qualitativa que explora um assunto a partir da busca de informações,

percepções e experiências de informantes para analisa-las e apresenta-las de forma

estruturada”. (DUARTE, 2005, p. 62). O autor ainda explica que uma das qualidades

dessa técnica é que o informante pode definir as respostas de forma flexível e que o

aluno, na condição de entrevistador, está livre para ajustar as perguntas.

Em outra perspectiva, de acordo com Gil (1999, p. 117) “Pode-se definir

entrevista como a técnica em que o investigador se apresenta frente ao investigado e

lhe formula perguntas, com o objetivo de obtenção dos dados que interessam à

investigação”. O autor complementa dizendo que a entrevista se apresenta com o uma

forma de interação social, na qual o aluno pesquisador busca coletar dado e o

entrevistado é a fonte de informações.

Segundo Gil (1999), a técnica de entrevista possui vantagens e limitações,

mas afirma que “[...] em função da flexibilidade própria da entrevista, muitas dessas

dificuldades podem ser contornadas”. (GIL, 1999, p. 119). O autor defende que para

atingir o sucesso nessa técnica, dependerá do nível de relação pessoal entre

entrevistador e entrevistado.

Gil (1999) explica que a entrevista pode ser classificada em diferentes tipos,

conforme segue estruturação a seguir:

a) Entrevista informal: é a menos estruturada possível e se distingue de uma

simples conversação pelo motivo de ter como objetivo a coleta de dados.

Esse tipo de entrevista tem o objetivo de ter uma visão geral do problema

pesquisado e também identificar determinados aspectos da personalidade

do entrevistado;

b) Entrevista focalizada: enfoca um tema bem específico. O entrevistador

deixa o entrevistado falar livremente sobre o assunto. Este tipo de

entrevista é muito utilizado em situações experimentais, que tem por

objetivo explorar a fundo alguma experiência vivida em determinadas

condições. Esta entrevista requer uma grande habilidade do pesquisador,

que deve respeitar o foco de interesse;

c) Entrevista por pautas: é guiada por uma relação de pontos de interesse na

qual o entrevistador explora durante o seu curso. As pautas são ordenadas

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e guardam certa relação entre si. O entrevistador formula poucas

perguntas e deixa o entrevistado falar livremente conforme o tema. Este

tipo de entrevista é recomendado quando o entrevistado não se sente à

vontade para responder a perguntas mais rígidas.

De acordo com Gil (1999):

À medida que o pesquisador conduza com habilidade a entrevista por pautas e seja dotado de boa memória, poderá, após seu término, reconstruí-la de forma mais estruturada, tornando possível a sua análise objetiva. (GIL, 1999, p. 121).

d) Entrevista estruturada: o desenvolvimento se dá a partir da relação fixa de

perguntas, sendo que a ordem e a redação permanecem as mesmas para

todos os entrevistados. Este tipo de entrevista é mais adequado para o

desenvolvimento de levantamentos sociais, pois possibilita um tratamento

quantitativo dos dados. As repostas são padronizadas, mas tais

entrevistas não possibilitam uma análise mais profunda dos fatos.

Ainda de acordo com Gil (1999), na maioria das vezes, as entrevistas têm sido

realizadas face a face, no entanto, nas últimas décadas uma outra modalidade de

entrevista vem sendo desenvolvida: a entrevista por telefone. Esta modalidade passou

a ser aceita como procedimento adequado para pesquisas em ciências sociais.

Segundo Gil (1999, p. 122), existem algumas vantagens ao realizar a

entrevista por telefone, como custos relativamente menores; seleção da amostra feita

com facilidade; rapidez; e a possibilidade de agendar o momento mais apropriado para

se realizar a entrevista. Em contrapartida, o autor também cita algumas desvantagens

nesse processo, como: o entrevistado interromper a entrevista; ter uma quantidade de

informações menores e a inviabilidade de descrever as características do entrevistado

e as circunstâncias de realização da entrevista.

De acordo com Gil (1999, p. 122), “a entrevista pode assumir diferentes

formas. Cada uma delas exige, naturalmente, do entrevistador habilidade e cuidados

diversos em sua condução”. Ainda segundo o autor, é difícil determinar a maneira

correta de se conduzir uma entrevista, pois dependerá dos objetivos e das

circunstâncias que a envolvem.

6.2.3.1 Processo da entrevista

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Com o objetivo de aprofundar a análise do jornalismo investigativo dos

episódios selecionados do programa Conexão Repórter, buscou-se a realização de

uma entrevista com o criador, apresentador e editor-chefe do programa, Roberto

Cabrini.

O primeiro contato foi realizado através de telefone com a emissora onde o

Conexão Repórter é veiculado semanalmente, o SBT (Sistema Brasileiro de

Televisão), com sede em São Paulo (SP). A ligação ocorreu no dia 13 de julho de

2017, pela manhã. O autor desta monografia entrou em contato com a assessora de

imprensa da emissora, que não se identificou, mas explicou que os horários de

trabalho de Roberto Cabrini eram diferenciados devido às suas investigações, por isso

repassou ao pesquisador o e-mail pessoal do jornalista.

O primeiro e-mail foi enviado no dia 13 de julho de 2017, às 20h23, da conta

universitária do pesquisador ([email protected]), para o endereço repassado pela

assessoria do SBT: [email protected].

Como não obteve retorno imediato, o pesquisador enviou mais dois e-mails,

sendo um no dia 18 de julho de 2017, às 21h03, e outro no dia 29 de julho, às 18h59.

Buscando uma outra forma de contado, o pesquisador acessou, em agosto, a

página web do programa Conexão Repórter:

http://www.sbt.com.br/jornalismo/conexaoreporter/, e enviou outra mensagem através

de um tópico que o site disponibiliza, chamado “Fale com Cabrini”, na qual também

não obteve resposta.

No decorrer do processo de produção desta monografia, o pesquisador

soube, através de seu professor orientador, Jacob Raul Hoffmann, que o jornalista e

apresentador do programa Conexão Repórter, Roberto Cabrini iria palestrar sobre

Jornalismo Investigativo no 24º Congresso Gaúcho de Emissoras de Rádio e

Televisão da Associação Gaúcha das Emissoras de Rádio e Televisão (AGERT), que

ocorreria nos dias 24, 25 e 26 de outubro de 2017, no Hotel Continental, na cidade de

Canela, no Rio Grande do Sul.

Em setembro, o pesquisador entrou em contato com a AGERT, na qual a

atendente afirmou que Roberto Cabrini participaria do evento no dia 25 de outubro,

porém ainda não sabia o horário.

Já em outubro, no dia 16, o pesquisador manteve contato com Frei Alceu

Ferronatto, um dos vice-presidentes da AGERT e solicitou apoio para a realização da

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entrevista. Frei Alceu disse que Roberto Cabrini estaria hospedado no Hotel

Continental, porém não poderia intermediar a entrevista.

No mesmo dia, o pesquisador voltou a entrar em contato com a AGERT. Foi

repassado outro número de telefone, desta vez do SBT de Porto Alegre, que estaria

intermediando a vinda de Roberto Cabrini ao Congresso. O pesquisador ligou pela

manhã, onde repassaram para a secretária de Luís Cruz, diretor regional do SBT. Em

contato com a secretária, a mesma repassou para a secretária do gerente do SBT-

RS, Danilo Teixeira, que mantinha contato direto com Roberto Cabrini. À tarde, o

pesquisador entrou em contato e falou diretamente com Danilo Teixeira, que, de

imediato, mostrou-se acessível a intermediar a entrevista com o jornalista Roberto

Cabrini. O gerente da emissora solicitou que o pesquisador enviasse um e-mail para

o endereço [email protected] explicando sobre a entrevista. O pesquisador,

através de outra conta de e-mail ([email protected]) enviou o e-mail às 15h11 do

dia 16 de outubro. Às 15h14, Teixeira respondeu confirmando que até a sexta-feira,

dia 20, a entrevista estaria marcada.

O pesquisador entrou em contato com Danilo Teixeira por e-mail na sexta-

feira, dia 20 de outubro, às 13h44, questionando se já havia alguma sinalização para

a realização da entrevista com Roberto Cabrini. Teixeira respondeu afirmando que na

segunda-feira, dia 23, repassaria o horário para que o pesquisador pudesse se

organizar.

No dia 22 de outubro, às 22h39, Roberto Cabrini respondeu o e-mail enviado

no dia 13 de julho. O e-mail enviado pelo pesquisador questionava sobre a

possibilidade de o mesmo acompanhar um dia na produção do programa Conexão

Repórter, em São Paulo, além da realização da entrevista. Cabrini respondeu dizendo

que estava terminando um livro sobre os bastidores de suas reportagens e que estaria

disponível apenas após três meses.

No dia 23 de outubro, às 18h02, mais um e-mail foi enviado pelo pesquisador

a Danilo Teixeira questionando sobre a logística para a entrevista com Roberto

Cabrini. Teixeira respondeu dizendo que estava esquematizando com Cabrini e que,

provavelmente, a entrevista ocorreria após a palestra do jornalista, que ocorreria às

16h40 do dia 25 de outubro.

Por volta de 17h30 do dia 24 de outubro, Danilo Teixeira ligou para o

pesquisador para combinar a entrevista, que poderia ser antes ou depois da palestra,

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tendo em vista que o pesquisador não possuía credencial para participar do evento,

ou seja, a entrevista deveria ocorrer no saguão do Hotel Continental.

O pesquisador chegou à cidade de Canela por volta de 10h30 do dia 25 de

outubro e se dirigiu para o Hotel Continental por volta de 13h30. O pesquisador

manteve contato constante via aplicativo Whatsapp com Danilo Teixeira.

O pesquisador, na condição de comunicador na emissora Tua Rádio São

Francisco, de Caxias do Sul, encontrou no evento seu supervisor, Frei João Carlos

Romannini, que conseguiu uma credencial para que o pesquisador pudesse assistir a

palestra de Roberto Cabrini.

Danilo Teixeira e Roberto Cabrini chegaram ao hotel por volta de 15h20. Em

contato via aplicativo Whatsapp, Teixeira afirmou que Cabrini atenderia o pesquisador

por volta de 16h, antes da palestra. Porém, logo depois, Teixeira disse que Cabrini

pediu para realizar a entrevista após a palestra, às 17h30.

A palestra de Roberto Cabrini se estendeu até as 18h e, logo após diversos

jornalistas entrevistaram o apresentador do programa Conexão Repórter. Como

estava com um questionário específico para a referida análise, o pesquisador optou

por ser o último a entrevistar Roberto Cabrini, de forma reservada dos outros

profissionais da imprensa que se faziam presentes no evento. A entrevista ocorreu

por volta de 19h. Ao final da entrevista, o pesquisador e Roberto Cabrini fizeram uma

fotografia.

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Figura 10: Foto com Roberto Cabrini

Fonte: Danilo Teixeira

A aplicação do questionário foi gravada em áudio, disponível no apêndice

desta pesquisa. As tentativas de contato estão em anexo. As respostas do

questionário aplicado presencialmente serão mostradas no subcapítulo seguinte.

6.2.3.2 Entrevista com Roberto Cabrini

1) Quais os principais fatores que diferenciam o jornalismo investigativo do

jornalismo convencional?

Eu não faço essa distinção. Todo jornalismo é, em tese, investigativo, e deve

ser investigativo. É que existe tantos exemplos de jornalismo tendencioso, jornalismo

oficial, jornalismo unilateral que se convencionou chamar de jornalismo investigativo

aquele que se aprofunda mais em uma questão, mas, em tese, todo jornalismo tem

que investigar, tem que apurar, e esses elementos são, assim, insubstituíveis e não

são negociáveis, eles tem que serem feitos em qualquer matéria, numa pequena nota

de três linhas, numa tese, num documentário, isso tem que ser exercido, então, o

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jornalismo é investigativo por essência, o que existem são distorções da nossa

atividade.

2) O Conexão Repórter é um programa premiado, inclusive com o prêmio

Esso de telejornalismo e o Troféu Imprensa. Além disso, é um dos líderes

de audiência. A que se deve esse sucesso?

Primeiro que há uma demanda do público por jornalismo investigativo. Eu

acho que nós refletimos muito dos anseios do público. Cada sociedade tem o

jornalismo que merece, cada sociedade tem o judiciário que merece, assim como o

Ministério Público que merece. A nossa atividade, ela não é separada do resto da

sociedade, ela reflete as nossas virtudes e os nossos defeitos, os nossos conflitos e

as nossas contradições, então tem havido uma evolução. Eu acho que hoje o nosso

jornalismo investigativo ele é melhor do que há dez anos, mas eu ainda acho que há

um longo caminho a ser percorrido. Pode se emitir o grau de democratização de uma

sociedade pelo grau de jornalismo investigativo que ela possui, pela diversidade de

opiniões que ela consegue representar no seu trabalho. Esse é um defeito clássico,

né, daquele jornalismo que se autodenomina jornalismo, mas ele não é jornalismo,

porque ele reflete apenas a opinião do setor dominante, geralmente o setor dominante

politicamente ou setor dominante economicamente, o resto é ignorado. Isso é

intercalado com formas de alienação, de manipulação, como a valorização do bizarro,

como, por exemplo, a propagação de manipulação da informação. Existem muitos

antídotos ao jornalismo como manda o figurino, muitos recursos são usados, de forma

planejada, porque isso é planejado. Não conscientizar a população, não promover um

sistema de educação condizente significa a perpetuação de diferenças sociais,

significa a perpetuação de diferenças que existem de oportunidades no Brasil, e o

jornalismo investigativo é um dos antídotos mais eficientes contra todas essas

distorções. A gente só vai crescer se tiver um jornalismo investigativo melhor, mas o

crescimento do jornalismo investigativo, ele vai caminhar junto com o crescimento dos

outros setores, junto com o crescimento do legislativo, com o crescimento do judiciário,

com o crescimento das outras classes profissionais, enfim, tudo caminha junto porque

são todos setores da sociedade. Conforme eu disse, cada sociedade tem o jornalismo

que merece.

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3) Uma frase sua recorrente é “denunciados não mandam flores”. O

jornalismo investigativo é uma profissão que envolve riscos e você já

passou por isso. Como aprendeu a lidar?

Fazendo desses riscos uma motivação. As pessoas, elas só tentam intimidar

e só tentam pressionar quando você está diante de um fato importante. Quando você

está diante de um fato irrelevante, não vai haver pressão. Então, você precisa

transformar isso em motivação, mostrar para o entrevistado que, por pior que seja a

matéria, por negócios que eventualmente ele tenha, pra posição social ou política que

ele tenha, você está fazendo algo de interesse da sociedade, que você não está

fazendo uma reportagem com finalidades pessoais. Você fazendo dessa forma, você,

de um modo geral, se protege melhor. Não é uma ciência exata, pode mudar, mas é

o que eu tenho percebido, e você fazendo dessa forma, você produz um jornalismo

melhor também. Você não pode produzir um jornalismo motivado por questões

individuais, tem que ser pelos interesses da coletividade.

4) “Investigando Milagres”, “A Longa Noite no Inferno de Alcaçuz”, “O

Mercado Negro dos Remédios Controlados” e “Os Filhos da Meia-Noite”.

Qual dessas reportagens foi a mais desafiadora no caráter de

investigação? Por quê?

Todas foram muito desafiadoras, mas eu diria que essa do Iraque, onde eu

consegui mostrar as armas químicas, consegui mostrar os soldados com as orelhas

cortadas, logisticamente, foi muito difícil porque a gente tinha os agentes do Sadam

Hussein atrás de nós o tempo todo, cerceando, dizendo o que pode, o que não pode,

e eu precisei elaborar toda uma estratégia. No caso, eu fui beneficiado por terem

chegado jornalistas americanos e franceses e eles não terem número suficiente para

ficar vigiando a gente. A gente usou também um recurso criativo. A gente disse que

ia jogar tênis e colocou o equipamento dentro de uma mochila onde deveriam estar,

supostamente, as raquetes e fomos para um hotel, pegamos um táxi e fomos para um

hotel onde tinha uma quadra de tênis. Quando eles se convenceram de que a gente

apenas ia jogar tênis, eles passaram a dar atenção apenas a jornalistas americanos

e franceses e a gente pôde ir até o local aonde havia, onde estavam os soldados que

tiveram as orelhas cortadas, que não queriam seguir o exército de Sadam Hussein,

um tremendo abuso de autoridade do Sadam Hussein e, da mesma forma, a gente

conseguiu ir para a cidade que foi arrasada pelas armas químicas usando um recurso

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de criatividade e também de atenção. No caso, em questão de vinte dias, haveria uma

eleição no Iraque, porque havia uma situação muito estranha naquela região. Pra você

chegar até a região da cidade arrasada pelas armas químicas, você tinha que entrar

pela Turquia. Você passava por uma região do Iraque chamada Curdistão, que não

era dominada naquele momento pelo Sadam Hussein, mas por outro lado, por um

acordo internacional, referendado pelas próprias Nações Unidas, você só poderia

entrar tendo o visto do Iraque, então os próprios turcos não permitiam que você

passasse pela fronteira se você não tivesse o visto. Então, embora, logisticamente, o

Iraque de Sadam Hussein tivesse pouco poder naquela região, naquele momento, por

um acordo internacional, você precisava ter um visto iraquiano. Pra conseguir um visto

iraquiano, você precisava ter uma argumentação convincente, então, naquele

momento, como haveria uma eleição de cartas marcadas, eleição no Iraque era de

cartas marcadas, não haveria eleição, era apenas um referendo, né, e a manipulação

era total, era apenas para dar uma satisfação à comunidade internacional, mas a

gente usou este visto dizendo que a gente iria cobrir a eleição quando, na verdade, a

nossa intenção foi ir até o norte do Iraque, entrando primeiro pela Jordânia e depois

pela Turquia, a gente conseguiu entrar pelo norte e, depois de uns dez dias a gente

conseguiu chegar à cidade que tinha sido arrasada pelas armas químicas, que é um

exemplo crasso, um exemplo extremo daquilo que pode acontecer pra se combater

opiniões divergentes, né. No caso, eles estavam combatendo a minoria curda que era

uma minoria que discordava, que combatia a maneira de governar o país do Sadam

Hussein. Então foi, logisticamente, muito desafiador conseguir isso, conseguir mostrar

tantos soldados com as orelhas cortadas. Ninguém tinha conseguido isso, nenhum

veículo americano tinha conseguido isso, como nenhum veículo tinha conseguido

entrar, nos últimos tempos, nas cidades arrasadas. Conseguimos provar, por

exemplo, que a água estava contaminada, já havia algum tempo do ataque de armas

químicas. A gente entrou lá em 95, o ataque tinha sido em 88, e durante sete anos, a

contaminação e a mortalidade tinha quadriplicado até um elemento desconhecido pela

dificuldade de ter acesso à região e a gente conseguiu mostrar tudo isso. Foi um

documentário muito importante que a gente ganhou até o prêmio Vladimir Herzog e

foi internacionalmente reconhecido. Os próprios americanos reconheceram a

importância dele. Enfim, foi um momento logisticamente muito desafiador e

emocionalmente também.

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5) Você recebe denúncias todos os dias? O que determina o início de uma

investigação?

O maior patrimônio de um profissional é esse, né, é...o público confiar no seu

trabalho e te mandar denúncias, e as denúncias chegam em grande quantidade, não

é fácil, você não consegue investigar tudo, você precisa fazer ali uma filtragem daquilo

que é mais importante e daquilo que não é, observar até que ponto aquilo que está

sendo apresentado não foi manipulado. Tem que ser uma apuração muito rigorosa,

mas esses documentos que são enviados pelo público originaram muitas matérias

importante como, por exemplo, essa pedofilia praticada por sacerdotes contra

coroinhas, crianças praticamente. Nunca tinha se denunciado isso em grande escala.

Essa matéria fez com que o Vaticano, pela primeira vez, reconhecesse esses abusos

no Brasil; ela foi muito desafiadora porque foram seis documentários, os primeiros

foram praticamente combatidos com muito rigor por setores da igreja que

influenciavam outros veículos de comunicação, mas a gente tinha noção total dos

elementos. Tentaram transformar os abusos que estavam acontecendo em apenas

um homossexualismo consentido, que não era, era um abuso cometido fazia muito

tempo, abuso de menores de idade exercido por pessoas que eram vistas como

pessoas altamente poderosas e de alta respeitabilidade, que conseguiam, com a sua

própria opinião, com seu status social, manipular toda uma população em nome de

abusos, abusos sexuais, e havia todo um jogo do silêncio para se encobrir isso,

praticado pelos mais diversos elementos. Então, vários setores da igreja combateram

a nossa matéria, até o momento que não conseguiram mais, então, a matéria, ela foi

reconhecida pela própria igreja católica, demorou um certo tempo, precisou de muita

convicção, e a gente ficou muito feliz porque ela produziu um benefício dentro da

própria igreja. O maior beneficiado dessa reportagem foi a própria igreja católica.

6.2.3.2.1 Análise da entrevista com Roberto Cabrini

Logo no primeiro questionamento, Roberto Cabrini afirma que não faz

distinção entre o jornalismo convencional e o jornalismo investigativo, pressupondo

que todo jornalismo é, por essência, investigativo, pois sempre é preciso ter uma

apuração dos fatos. Pode-se relacionar esta afirmação com o que diz Fortes (2005)

na página 65, no capítulo 05 desta monografia, onde o autor afirma que o termo

“jornalismo investigativo” é redundante, tendo em vista que todo jornalismo deve ser

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investigativo. Compartilhando da ideia de Fortes (2005), Noblat (2005) também

sintetiza, na página 65, que todo jornalismo pressupõe investigação. O autor ainda

frisa que o bom jornalismo é aquele feito através de uma investigação, desde um

grande escândalo até um acidente de carro.

No segundo questionamento, podemos destacar para a análise a seguinte

frase de Cabrini: “...Esse é um defeito clássico, né, daquele jornalismo que se

autodenomina jornalismo, mas ele não é jornalismo, porque ele reflete apenas a

opinião do setor dominante, geralmente o setor dominante politicamente ou setor

dominante economicamente, o resto é ignorado.”. Esta afirmação de Roberto Cabrini

pode ser relacionada com um dos requisitos básicos de uma investigação, proposto

por Lopes (2003) na página 68, no capítulo 05 desta monografia, onde o autor sintetiza

que o objetivo da investigação deve ser, mesmo que razoável, importante para grande

parcela da população, e não para interesses de determinados grupos.

Outra frase de Roberto Cabrini que podemos destacar é: “Não conscientizar

a população, não promover um sistema de educação condizente significa a

perpetuação de diferenças sociais, significa a perpetuação de diferenças que existem

de oportunidades no Brasil, e o jornalismo investigativo é um dos antídotos mais

eficientes contra todas essas distorções.”. Sobre tal afirmação podemos relacionar

com o que diz Hunter (2009) na tabela da página 74, no capítulo 05 desta monografia,

onde ele destaca que o repórter recusa a aceitar o mundo como ele se apresenta. A

história visa a penetrar ou expor uma dada situação para que seja reformada ou

denunciada, ou, em certos casos, para que se promova um exemplo de um caminho

melhor.

Sobre os riscos do jornalismo investigativo, Cabrini afirma no terceiro

questionamento que faz dos riscos uma motivação. A coragem e a responsabilidade

é, inclusive, uma das fases da investigação abordadas por Fortes (2005), na qual o

autor também sintetiza que o jornalismo investigativo é uma atividade de risco. Aliado

a isso está outra fase da investigação: a curiosidade e a desconfiança que, segundo

o autor, devem sempre andar juntas.

Umas das frases de Cabrini que podemos destacar é: “As pessoas, elas só

tentam intimidar e só tentam pressionar quando você está diante de um fato

importante.”. Pode-se relacionar essa observação à afirmação de Lopes (2003) sobre

os requisitos básicos de uma investigação, onde o autor sintetiza que os investigados

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sempre tentam esconder as informações do público e que quando há essa ocultação,

é porque a consciência não está tranquila.

Roberto Cabrini destacou “Os Filhos da Meia-Noite” como a reportagem mais

desafiadora que já realizou. Ele contou detalhes dos bastidores dessa investigação.

Nesse ponto, analisando todo o contexto de como Cabrini conseguiu produzir a

reportagem, podemos relacionar, primeiramente, com um dos requisitos básicos de

uma investigação, onde Lopes (2003) evidencia dizendo que a investigação deve ser

resultado do trabalho exclusivo do jornalista, sem a interferência de outras áreas. Ou

seja, as estratégias que Cabrini buscou para chegar até Halabja, cidade arrasada

pelas armas químicas do ditador Sadam Hussein, partiu de sua própria iniciativa. Aqui

também podemos relacionar com algumas das fases de uma investigação, segundo

Fortes (2005). Dentre elas, a insistência e a perseverança, pois quem está sendo

investigado jamais irá colaborar, e, de fato, o regime de Sadam, segundo Cabrini, de

maneira alguma estava disposto a colaborar, por isso, pela insistência e criatividade,

ele conseguiu com exclusividade mostrar as orelhas cortadas de alguns soldados, por

exemplo. Além disso, para o sucesso da reportagem podemos também relacionar com

outra fase da investigação, onde Fortes (2005) aborda que o repórter necessita ser

discreto e se manter no anonimato. Foi usando destes recursos que Cabrini conseguiu

enganar os agentes de Sadam Hussein e chegar até Halabja.

Cabrini, no último questionamento, afirma que recebe muitas denúncias dos

telespectadores e que necessita, de certa forma, filtrar essas informações que chegam

e que é preciso ter uma apuração muito rigorosa frente a esses documentos. Sobre a

afirmação de Cabrini, podemos analisar com o que Fortes (2005) afirma nas fases de

investigação. O autor diz que é preciso ter atenção especial a todos os documentos

disponíveis, no caso específico, nos documentos que Cabrini recebe contendo

denúncias. Além disso, Fortes (2005) também evidencia que é preciso haver uma

pesquisa minuciosa sobre os fatos e com olhar crítico, assim como checar muitas

vezes as informações, principalmente aqueles que lhe parecem estranhas, imprecisas

ou óbvias demais, assim evidenciado pelas ações de Cabrini diante da produção da

reportagem.

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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta monografia buscou analisar quais elementos do jornalismo investigativo

e como são evidenciados nos episódios do programa Conexão Repórter, do SBT

assim definido como a questão norteadora para a pesquisa.

Para embasar teoricamente a presente pesquisa, no início deste trabalho

foram apresentados os aspectos históricos do veículo televisão, desde o seu

nascimento, a evolução no Brasil e sua situação nos dias atuais. Isso também no

intuito de entender e conhecer profundamente o meio de comunicação no qual o

trabalho se baseia. Em seguida, abordamos os gêneros e formatos de programas

televisivos, seus conceitos e suas principais características, afim de classificar onde

de fato se encaixa o programa Conexão Repórter. Nesse ponto, podemos concluir

que, entre os quatro episódios escolhidos para análise: Investigando Milagres, A

Longa Noite no Inferno de Alcaçuz, O Mercado Negro dos Remédios Controlados e

Os Filhos da Meia-Noite, o programa se classifica no gênero documentário, porém,

apresentando muitos formatos dentro do próprio gênero, pois, assim como aponta

Souza (2004, p. 147), “O documentário pode apresentar muitos formatos dentro do

próprio gênero, como [...] entrevistas, debates, narração em off, com o objetivo de não

torna-lo cansativo e apresentar de forma variada as informações colhidas de várias

fontes”.

Após a conceituação dos gêneros e formatos de programas televisivos,

tratamos de apresentar os conceitos, classificações e histórico do jornalismo,

abordando a notícia, a pauta, as fontes e o processo de execução da reportagem em

televisão, com intuito de ter um entendimento amplo sobre a produção de reportagens

para o audiovisual. A conceituação de jornalismo investigativo vem logo em seguida,

retratando sua história, conceitos e características, mas, principalmente,

apresentando a diferenciação entre o jornalismo investigativo e o jornalismo

convencional, relatando ainda as fases de uma investigação. Esse capítulo foi

fundamental para o desenvolvimento da análise das cenas dos episódios

selecionados, tendo em vista que os elementos do jornalismo investigativo abordados

no decorrer da análise basearam-se nos conceitos dos autores Dirceu Fernandes

Lopes, com base em sua obra Caminhos do Jornalismo Investigativo em busca da

verdade oculta (2003); Leandro Fortes, que explana sobre as fases da investigação

em seu livro Jornalismo Investigativo (2005) e Mark Lee Hunter, que expõe as

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principais diferenças entre o jornalismo investigativo e o jornalismo convencional em

sua obra A investigação a partir de histórias: uma manual para jornalistas

investigativos (2009).

Para auxiliar na resposta da questão norteadora, foram levantadas três

hipóteses. A primeira delas afirma que o apresentador Roberto Cabrini evidencia em

suas reportagens o trabalho de meses de investigação sobre assuntos de interesse

público e repercussão social, o que denota ao telespectador um longo trabalho de

pesquisa. Essa hipótese foi confirmada. A partir do estudo sobre os elementos que

caracterizam uma reportagem investigativa, pudemos analisar, através dos conceitos

teóricos, que uma de suas principais características é o tempo de produção e

pesquisa. No episódio Investigando Milagres, Roberto Cabrini evidencia que as

missas de cura do padre Eugênio foram acompanhadas durante meses, assim como

o conhecimento das histórias dos frequentadores. Em relação ao episódio A Longa

Noite no Inferno de Alcaçuz, Cabrini destaca uma investigação de cinco dias. Já no

episódio O Mercado Negro dos Remédios Controlados, logo no início do programa,

Cabrini evidencia o trabalho de vários meses de investigação sobre a venda de

remédios tarja-preja. O longo trabalho de investigação do repórter também foi

sintetizado por Roberto Cabrini no episódio Os Filhos da Meia-Noite, onde Cabrini

passou cinquenta dias no Iraque. Além disso, na entrevista concedida ao pesquisador,

Cabrini também salientou esta como a mais desafiadora no caráter de investigação,

revelando, inclusive, os bastidores.

A segunda hipótese evidencia que a maioria dos episódios é produzido com

o auxílio de câmeras escondidas, além de apresentar documentos por vezes obtidos

com exclusividade pelo programa e em muitas reportagens. Nos episódios analisados,

o uso de câmeras escondidas foi constatado apenas no episódio O Mercado Negro

dos Remédios Controlados, que pôde revelar o esquema criminoso de vendas de

receitas médicas. Porém, no episódio A Longa Noite no Inferno de Alcaçuz, as

gravações amadoras, realizadas pelos próprios detentos do presídio, ainda que não

sejam realizadas pelo jornalista, foram transmitidas com exclusividade pelo programa

Conexão Repórter, e revelou a negociação entre os presos e a Polícia Militar em um

dos dias do massacre, além de imagens do conflito, o que caracterizamos, neste caso,

como os documentos obtidos com exclusividade. Nesse sentido, a hipótese se

confirma nestes dois episódios citados.

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Já a terceira hipótese apresentada diz que Roberto Cabrini é ousado e por

vezes sofre risco de vida, pois muitos personagens e fontes das reportagens não

gostariam que o assunto em questão fosse divulgado. No episódio Os Filhos da Meia-

Noite, a hipótese se confirma. Como foi descrito na decupagem das cenas e visto

através do vídeo, gravado em CD e anexado a esta monografia, em muitos momentos

Cabrini se arrisca, principalmente quando ele está nas montanhas onde acontecem

os conflitos. Enquanto ele faz a passagem, os soldados estão em confronto logo atrás

de Cabrini. Na entrevista concedida ao pesquisador, Cabrini também evidenciou que,

logicamente, as tropas do ditador Sadam Hussein não queriam que os assuntos

abordados no documentário fossem divulgados, principalmente sobre o corte das

orelhas dos soldados que se negassem a seguir o regime. A exclusividade se deu

através do empenho do jornalista, que também destacou os momentos de tensão que

viveu. No episódio A Longa Noite no Inferno de Alcaçuz, apesar de contar com todo o

esquema de segurança, Cabrini também se arrisca ao passar uma noite no presídio,

tendo em vista que os criminosos de duas facções estavam detidos ali. Durante as

entrevistas, percebeu-se que os líderes das facções se negavam a responder

determinados questionamentos, o que evidenciava que os presos sofreriam algum tipo

de represália de seus superiores na hierarquia do crime, caso suas revelações fossem

divulgadas. A mesma constatação se dá frente à posição do secretário de justiça do

Rio Grande do Norte, Walber Virgolino, que, a todo momento, contestava as

afirmações de Roberto Cabrini e procurava se abster da culpa do Estado perante os

conflitos. A hipótese também se confirma, em partes, no episódio O Mercado Negro

dos Remédios Controlados, pois o uso de câmeras escondidas evidencia que, caso

não as fossem utilizadas, dificilmente os investigados revelariam o esquema ilegal de

venda de remédios.

O objetivo geral desta pesquisa propôs a analisar quais elementos do

jornalismo investigativo são evidenciados nos episódios do programa Conexão

Repórter, do SBT. De forma específica, os objetivos eram conhecer melhor e

caracterizar o jornalismo investigativo; proporcionar aos acadêmicos um melhor

entendimento sobre os elementos do jornalismo investigativo; analisar o processo de

construção e produção dos conteúdos do programa Conexão Repórter e caracterizar

e conceituar os gêneros de programas televisivos. Pode-se afirmar que os objetivos,

tanto geral como específicos, foram atingidos.

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Durante o processo de decupagem e análise do material explorado nesta

pesquisa, percebeu-se outras inferências importantes. Em relação ao primeiro

episódio explorado, Investigando Milagres, que mostrou a história de padre Eugênio,

um padre considerado por muitos como milagreiro, podemos concluir que o programa

apresentou pouca investigação. Ainda que, no decorrer da análise, pudemos

relacionar muitos dos elementos do jornalismo investigativo às cenas apresentadas,

o episódio, em si, não apresentou algo que possamos evidenciar como puramente

investigativo, nem ao menos a exclusividade, uma das principais características do

programa, tendo em vista que o padre Eugênio já havia concedido outras entrevistas

a outros programas de televisão. Roberto Cabrini trouxe, sim, entrevistas reveladoras

de pessoas que afirmaram terem obtido a cura de suas doenças através das mãos do

padre Eugênio, porém as afirmações não foram de fato investigadas por parte do

repórter. Elas foram confirmadas apenas por meio das entrevistas.

O programa contou também com contestações ao poder de cura do padre

Eugênio, abordando a história de Seu Emílio Pintor Pegoraro, que, apesar de ter

participado das missas de cura, morreu sem ter tido a cura. Embora uma das

características da investigação seja a contestação, a família de Seu Emílio não tratou

de julgar e culpar o padre Eugênio pela morte dele, que foi, sim, tratada como algo

previsível, tendo em vista como era a vida de Seu Emílio.

Os quatro episódios do programa Conexão Repórter selecionados para a

análise nesta pesquisa foram assistidos mais de uma vez antes do início da

decupagem, justamente para elencar quais cenas deveriam ser objetos de estudo.

Durante o processo de decupagem, outra inferência pôde ser observada: algumas

palavras, sejam elas provenientes de uma entrevista ou até mesmo no texto de

Cabrini, tiveram que ser classificadas como inaudíveis, pois não foram entendidas

nem mesmo dentro do contexto pela qual se apresentavam. Percebeu-se tal

constatação apenas quando os episódios foram, de fato, explorados para a análise.

Um dos pontos mais importantes desta pesquisa refere-se a entrevista

realizada com Roberto Cabrini durante sua participação no 24º Congresso Gaúcho de

Emissoras de Rádio e Televisão da Associação Gaúcha das Emissoras de Rádio e

Televisão (AGERT), em outubro de 2017. Após a entrevista, constatou-se que as

respostas de Roberto Cabrini foram essenciais para o complemento deste trabalho,

principalmente em relação ao último questionamento, onde o jornalista revelou

detalhes dos bastidores do episódio “Os Filhos da Meia-Noite”, classificando-a como

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uma das reportagens mais desafiadoras que realizou durante sua carreira. Estes

relatos contribuíram e complementaram a análise do episódio, onde concluiu-se que

a investigação esteve completamente intrínseca à sua produção.

Além das constatações e aprendizados durante o processo de análise dos

episódios, esta pesquisa também contribuiu com muitos ensinamentos para a vida

profissional e pessoal do autor deste trabalho. O episódio Investigando Milagres

trouxe a reflexão sobre o embate entre a ciência e fé, que há anos perpetua em nossa

sociedade.

Já o episódio O Mercado Negro dos Remédios Controlados evidencia muito

além da venda ilegal de receitas médicas. Ele sintetiza também sobre as psicopatias

que o ser-humano vem passando na atualidade, muitas vezes, decorrentes das

pressões do dia a dia, sejam elas referentes ao trabalho, estudos, família, etc, o que

acaba por vezes ocasionando o consumo desenfreado de remédios controlados.

O terceiro episódio, A Longa Noite no Inferno de Alcaçuz, trouxe uma reflexão

sobre a situação do sistema penitenciário do Brasil, mas, além disso, mostrou o quanto

esse sistema é falido, resultado de diversos governos ineficientes que até hoje não

investem o mínimo em questões de segurança pública. Porém, coube refletir também

que tal situação degradante provém também dos maus investimentos não apenas nas

questões de segurança, mas também no que diz respeito à educação no Brasil, um

dos alicerces para o combate à corrupção e ao crime.

Estes três episódios trouxeram suas contribuições e ensinamentos para o

pesquisador, entretanto, o último programa analisado, Os Filhos da Meia-Noite, trouxe

um impacto muito maior. As cenas deste episódio, na qual foram gravadas em 1995,

após o ataque químico na cidade curda de Halabja no Iraque, que ocorreu em 1988,

mostram o terror que o país viveu durante o regime de Sadam Hussein e trás muitas

reflexões sobre a humanidade. O mais triste foi perceber que a guerra jamais

terminou, pois, em 2013, o regime de Bashar al-Assad, na Síria, também foi acusado

de utilizar armas químicas. Após a análise deste episódio, pôde-se chegar a um único

questionamento: até que ponto chega a crueldade humana?

A partir desta pesquisa foi possível perceber as muitas diferenciações entre o

jornalismo investigativo e o jornalismo convencional. Como foi abordado por alguns

autores e pelo próprio jornalista Roberto Cabrini, durante entrevista concedida ao

pesquisador, todo jornalismo, por essência, deve ser investigativo, porém, durante a

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análise dos episódios do programa Conexão Repórter, pudemos refletir e caracterizar

sobre tais diferenças.

Há de se evidenciar também os aprendizados no campo de estudo do

jornalismo investigativo. Ao sintetizar os conceitos dessa classificação jornalística

nesta monografia, podemos analisar que, hoje em dia, poucas são as redações pelo

País que abrem espaço para essa prática, que, quando bem realizada, denota o

trabalho de excelência do jornalista, pois, muitas vezes, uma investigação parte de

sua própria iniciativa.

Diversos são os motivos para explicar o pouco espaço destinado ao

jornalismo investigativo em algumas redações, dentre elas, o custo elevado para se

garantir o processo de uma investigação, e os riscos à vida do repórter frente à uma

investigação, pois apenas as grandes empresas de comunicação possuem condições

para garantir a integridade física de um repórter que se envolve com uma investigação.

A capacidade de o jornalismo investigativo promover reformas significativas

em uma sociedade é outra característica muito importante e vimos isso nos quatro

episódios analisados nesta monografia. Os quatro temas abordados, seja direta ou

indiretamente, possuem alguma relação com o nosso cotidiano: o embate entre fé e

ciência; a situação falida do sistema penitenciário no Brasil, o que impacta questões

de segurança pública; as crescentes patologias do ser-humano, que o levam ao

consumo desenfreado de medicamentos; e a questão da guerra no mundo, tema tão

antigo e tão atual ao mesmo tempo. Além disso, essa prática de promover mudanças

na sociedade através do jornalismo investigativo também é destacada pelo próprio

jornalista Roberto Cabrini, na entrevista concedida para este trabalho, quando ele

evidencia a reportagem que denunciou a pedofilia na igreja católica, uma série de seis

documentários fortemente combatidos com rigor por setores da igreja. Os padres

envolvidos acabaram presos e o Vaticano reconheceu os abusos praticados pelos

sacerdotes.

Esta pesquisa teve o foco de análise em apenas quatro episódios do

programa, porém, ao acompanhar muitas edições do Conexão Repórter, entende-se

que o programa é, de fato, uma prática de jornalismo investigativo. Por esse motivo,

os estudos acerca do tema devem ser ampliados, relacionando o gênero em questão

com outros episódios, e assim, investigar como as reportagens do programa

contribuem para mudanças significativas na sociedade.

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ANEXOS

DVD-ROM

O DVD-ROM (disco de vídeo digital) anexo a esta monografia inclui:

• Gravação dos quatro episódios do programa Conexão Repórter, selecionados

para a análise;

• Projeto de Pesquisa – Monografia I (elaborado em 2017/2), em formato PDF;

• Entrevista com o jornalista Roberto Cabrini, em formato de áudio mp3.

(Tempo total: 11’07”);

• Monografia II, em formato PDF.

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ANEXO A – GLOSSÁRIO

C

CLOSE – “a câmera está bem próxima do objeto, de modo que ele ocupa quase

todo o cenário, sem deixar grandes espaços à sua volta. É um plano de

INTIMIDADE e EXPRESSÃO.” (PRIMEIRO FILME, 2017). (100)

P

PLANO CONJUNTO – “Com um ângulo visual aberto, a câmera revela uma parte

significativa do cenário à sua frente. A figura humana ocupa um espaço

relativamente maior na tela [...].” (PRIMEIRO FILME, 2017). (98)

PLANO DETALHE – “A câmera enquadra uma parte do rosto ou do corpo [...]”

(PRIMEIRO FILME, 2017). (103)

T

TRAVELLING – “a câmera “viaja”, isto é, desloca-se, na mão do operador, sobre um

carrinho, sobre uma grua, em qualquer direção.” (PRIMEIRO FILME, 2017). (93)

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ANEXO B – GRAVAÇÃO DOS QUATRO EPISÓDIOS DO PROGRAMA CONEXÃO

REPÓRTER, SELECIONADOS PARA A ANÁLISE

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APÊNDICES

APÊNDICE A – PROJETO DE PESQUISA – MONOGRAFIA I

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APÊNDICE B – ENTREVISTA COM O JORNALISTA ROBERTO CABRINI

GRAVADA EM DVD-ROM

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APÊNDICE C – CONTATO COM ROBERTO CABRINI VIA E-MAIL

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APÊNDICE D – CONTATO COM O GERENTE DO SBT-RS, DANILO TEIXEIRA

VIA E-MAIL E WHATSAPP

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