PACTA 11ª Edição

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Coordenadores da PACTA:Sofia Ramos, nº 212430Tiago Nobre, nº 216492

Colaboradores:Filipe Gomes, nº 216427

Gabriel Machado, nº 216387João Pinto, nº 214903

Nuno Gonçalves, nº 216399

Responsáveis pelas Redes Sociais:Filipe Gomes

Gabriel MachadoJoão Pinto

Nuno GonçalvesTiago Nobre

Design Editorial:Maria João Martins

EQUIPA

ÍNDICE DE CONTEÚDOSCadernos do TiaguistãoPAG.| 4

O Papel dos Media na Política InternacionalPAG.| 6

A Europa de BentoPAG.| 7

Os BRICS e a Responsabilidade de Proteger (R2P)PAG.| 12

A Enciclopédia das Relações Internacional

PAG.| 15

ENTREVISTA: Madam Keitumetse Matthews

PAG.| 17

ENTREVISTA: Senhor Conselheiro António Augusto Martins César

PAG.| 22

O ‘R’ nos BRICS: Revisionismo, Resistência e Reafirmação

PAG.| 25

CRONOLOGIAPAG.| 27

Carolina Brito CecílioPAG.| 29

DA CASA

ENTREVISTA

DE FORA

EXPERIÊNCIA ERASMUS

Para a primeira edição do presente ano lectivo, a Equipa PACTA esolheu construir uma revista grande-mente dedicada ao grupo de países que desde os anos 1990 é conhecido como BRICS: Brasil, Rússia, Índia, China e, o mais recente membro integrado no grupo, África do Sul. O acrónimo foi criado em virtude da crescente importância destes cinco países na política internacional, que, apesar das diferenças que inega-velmente os separam, passaram a desempenhar um papel cada vez mais relevante no debate de questões mundiais devido às potencialidades que os unem. Ora, nesta que é a 11ª edição da PACTA apresen-tamos, relativamente à temática dos BRICS e a out-ras questões actualmente prementes e importantes, as habituais colunas da Professora Maria Ferrei-ra e do Professor Tiago Ferreira Lopes, um con-tributo de natural excelência do Professor Adriano Moreira, uma entrevista ao Professor Nuno Canas Mendes sobre a recentemente editada “Enciclopédia das Relações Internacionais” e ainda um interes-sante artigo da Professora Maria Raquel Freire.. Por serem os BRICS o principal foco da edição, temos duas entrevistas à Embaixatriz da África do Sul e ao Chefe do Sector Político da Embaixada do Brasil, a fim de tentar proporcionar ao leitor a pos-sibilidade de encontrar um denominador comum naquela que pode ser uma percepção colectiva e unificada relativamente à pertença a um grupo in-formal como os BRICS ou se, apesar de tudo, prev-alecem as diferenças entre os cinco países emer-gentes na dinâmica das relações internacionais. Em nome da equipa, compete-me mais uma vez agradecer o apoio de quem contribui de forma in-cansável e disponível para este projecto e de quem o segue, porque são todas essas pessoas que per-mitem que ele cresça, evolua e continue a existir.

EDITORIAL

Sofia RamosCoordenadora da Revista Pacta

A História tem mudado pouco o seu guião, no que toca à aurora e ao ocaso de novos impérios e dos seus contendentes. Não houve Império que não fosse desafiado e, curioso, quase todos os Império colapsaram por não saberem olhar para dentro, quando estão demasiado ocupados com os rivais de fora… Foi assim com os khans Mon-góis, com os Turcos Seljucidas, com os Roman-ov da Rússia e com os Qing na China Imperial. Viajemos no tempo! No começo do século XVI, o Cáucaso, porta de passagem entre o Ocidente e o Oriente, foi alvo da cobiça de vários “campeões regionais”. Mehemmed Giray I (khan da Cri-meia), Möxämmät Ämin (khan de Kazan), Qasim II (khan de Astrakhan), Ivan IV (czar da Rússia), Ismail I (xá da Pérsia) e Bayezid II (sultão Otoma-no) foram alguns dos contendores que aguçaram as garras na tentativa de conquistar o Cáucaso. A certa altura, curiosidade histórica, todos eles clamaram, ao mesmo tempo, suserania absoluta sobre o Cáucaso usando títulos como Defensor do Cáucaso, Mestre do Cáucaso, Senhor do Cáucaso. Esta faixa de terrena, pouco maior do que a Fin-lândia e onde vivem centenas de pequenas comu-nidades étnicas dissemelhantes, passava a ter não um, mas vários mestres, após a implosão da Horda Dourada, na época nas mãos do khan Shayk Ahmad. O Império Russo acabaria por vencer a “corrida”. O mesmo Império que em 1555 é deixado de fora da importante assinatura da Paz de Amasya, que divide a zona em duas esferas de influência: o Este passava a dever vassalagem a Istanbul e o Oeste voltava-se para Qazvin/Isfahan. O mesmo Império que nascera em Moscovo, que no século XII mais não era do que um pequeno entreposto comercial

ONTEM COMO HOJE, MESTRES DO NADA!

CADERNOS D0 TIAGUISTÃO

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dependente do principado de Vladimir-Suzdal. Na segunda metade do século XIII, o principa-do de Vladimir-Suzdal herdava a glória perdida dos Ruríquidas de Kiev. Ironia sublime, na segunda dé-cada do século XXI, Kiev tenta não ser engolida pelo tal entreposto comercial que, em outras eras, foi dependente de Vladimir-Suzdal. As verdadei-ras ameaças são como as evidências, difíceis de serem vistas mesmo quando estão há nossa frente. Mas voltemos aos Impérios e aos seus contendores. Nos anos 1990 o Império Ocidental (lato senso) en-trou em júbilo completo. Com a queda do Muro de Berlim julgou-se que a ameaça vermelha tinha sido vencida, apesar de vários outros países ainda hoje se pintarem de vermelho; mesmo que com tonalidades diferentes o vermelho subsiste... A primeira reacção foi aceitar a unipolaridade e clamar pela visão hegeli-ana de um Fim da História, com os povos a rumarem todos no mesmo sentido, com o mesmo timoneiro. A realidade dos anos 1990, contudo, revelou-se menos onírica e os pressupostos foram revistos. O mundo, aos poucos, deixava de ser unipolar, para ser apolar e depois multipolar. É talvez por pular-mos tanto que, de vez em quando, parecemos fi-car baralhados com o estado das coisas. É talvez por se trocar tanto de pólo que, por vezes, não per-cebemos que para cada acção haverá sempre uma reacção… Mas voltemos às polaridades do mundo. Na multipolaridade surgiram então “campeões re-gionais” que contestariam o poder supremo de Washington. Foram-se erguendo teorias que tentam mostrar que o mundo seria mais polarizado, menos monocromático, e que a “torta” teria que alimen-tar mais barrigas que não apenas a do Tio Sam. Na verdade estes campeões regionais parecem mais interessados em clamar por mais e mais recur-sos, do que em contestar a polaridade do mundo. É certo que, de vez em quando, com pompas de estado e tudo o mais, lá se assistem a discur-sos de grandiosos “renascimentos” e de chegadas ao mundo que tem que perceber que não é só em

Washington que brilha o sol. E no entanto estes no-vos Mestres de tudo correm o sério risco de acabar como os contendores do Cáucaso do século XVI… Correm o risco de acabar como Mestres do Nada! Quem olha demasiado para fora, deixa de olhar para dentro e é dentro de “casa” que nascem os verdadeiros perigos. Os contendores do Cáucaso do século XVI eram tidos como superpotências regionais que per-durariam ad eternum. E hoje nenhum deles existe… Existem os seus herdeiros e estados sucessórios, mas os contendores de per si desapareceram nas are-ias da História, por não saberem olhar para dentro. Kazan cindiu-se em guerras internas, antes de ser engolida por Moscovo; Astrakhan foi palco de uma série de sublevações fratricidas, que apenas facili-taram a vida de Moscovo. A Crimeia perdeu a inde-pendência e é hoje pertença de Kiev e de Moscovo… A escolha dependerá da mundivisão do caro leitor. Os Impérios Safávida e Otomano implodiram por não saberem lidar com as dinâmicas internas, ocu-pados que estavam com as dinâmicas externas. Ocu-pados que estavam em ser “campeões regionais”. Não nega este colunista que o poder de Washington está, de facto, em fase de contestação; que a unipolari-dade não existe mais, se é que alguma vez existiu. Mas a História ensina que talvez não sejam os “campeões regionais” os verdadeiros contendores do poder. Talvez seja mais útil olhar para os aliados e saber ler na deri-va do Cairo, na fuga de Cabul, no caos de Bagdad e na rebeldia de Ancara os sinais do que poderá acontecer. E os “campeões regionais”? A esses resta saberem olhar por si, antes de quererem olhar para e pelos out-ros. Porque quem ignora as dinâmicas internas, por fixação nas dinâmicas externas, parece estar condena-do a desaparecer das dinâmicas políticas e a ficar en-cerrado nas dinâmicas históricas. Ontem como hoje, estes novos campeões regionais, que querem ser Sen-hores de Tudo, arriscam-se a ser Mestres do Nada…

Tiago Ferreira LopesProfessor Universitário na Universidade de Kirrikale

Investigador Integrado no Instituto do Oriente

COLUNACADERNOS D0 TIAGUISTÃO

Tiago Ferreira Lopes

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A última década do século XX e a primeira déca-da do século XXI ficam definitivamente marcadas pela agência internacional dos media (dos Santos, 2010). Conceitos como o “efeito CNN”, o “efeito digital” e o “efeito Al Jazeera” emergem da neces-sidade de explicar o papel crescente dos media nas relações internacionais (dos Santos, 2010; Gilboa, 2002). O “efeito Al Jazeera”, em particular, assume uma importância fundamental dada a relevância que o Médio Oriente tem no contexto da política inter-nacional (Seib, 2008; dos Santos, 2010). O conceito de “efeito Al Jazeera” foi introduzido por Philip Seib (2008) na sua obra The Al Jazeera Effect: How the New Global Media are Reshaping World Politics. O argumento subjacente ao “efeito Al Jazeera” é o de que as novas tecnologias da informação e da comunicação vieram alterar a relação das audiên-cias com os meios de comunicação à escala global (Seib, 2008). Tal transformação empodera o papel dos cidadãos agora considerados como “netizens”, ou seja, como indivíduos tecnologicamente empod-erados no que toca ao acesso, produção e mobili-zação de informação (Seib, 2008). Os “netizens” são agentes ativos do processo de comunicação e o seu papel nos fluxos de comunicação globais deriva da bidireccionalidade e multidireccionalidade inerentes à utilização dos media digitais (Seib, 2008). Note-se que os media tradicionais não permitem a interação entre os meios de comunicação e as audiências, reduz-indo-as a uma condição de passividade (Seib, 2008). A transformação do ambiente mediático global, e segundo Seib, foi potenciada pela emergência de ca-nais de comunicação de cosmologia não ocidental, designadamente a Al Jazeera e a Al Arabiya (Seib, 2008). Tal emergência veio enriquecer, do pon-to de vista ontológico e cosmológico, os fluxos de

comunicação globais dado que retirou aos media oci-dentais o monopólio da determinação da agenda inter-nacional (dos Santos, 2010). Todavia, e no entender de Seib, as consequências mais relevantes do “efeito Al Ja-zeera” e da crescente importância da existência de uma“arena virtual” à escala global respeitam a uma nova função performativa dos media no plano da política in-ternacional (Seib, 2008). Como Seib refere a “batalha pelas mentes e corações” dos indivíduos depende dos fluxos de comunicação globais e do seu contudo on-tológico (Seib, 2008: Preface). Os media assumem no-vas funções no contexto internacional, nomeadamente ao nível da capacitação de novas vozes no contextointernacional, ou seja, concedendo agenda inter-nacional a sujeitos outrora excluídos da comuni-cação e agência globais (Seib, 2008). Os processos de transição para a democracia mas, e igualmente, o fenómeno do terrorismo global, são influenciados pela multiplicação dos instrumentos e processos da comu-nicação digital global (Seib, 2008). Note-se a im-portância que as novas tecnologias da informação e da comunicação e, em particular os media digitais e so-ciais, assumiram no contexto da chamada “Primavera Árabe” (O’Donnell, 2011). Neste sentido, torna-se ur-gente discutir de que forma a transformação do am-biente mediático e da comunicação global tem reper-cussões ao nível da política internacional (Seib, 2008; Gilboa, 2002; dos Santos, 2010; der Derian, 2001).

Maria João Militão Ferreira (PhD, Professora Auxiliar, ISCSP/UL)

Referências bibliográficas* Derian, James der (2001), Virtuous War, Nova York, Basic Books.

* dos Santos, John Philip (2010), ‘The Evolution of Media’, Global Media Project, Brown University, 17 February, 2010. Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=TZl2tqilxEg

* Gilboa, Eytan (2002), “Global communication and foreign policy”, in Journal of Communication, 52 (4):731-748.

* ’Donnell, Catherine (2011), “New study quantifies use of social media in Arab Spring”, University of Washington Today, 12 September 2011. Disponível em http://www.washington.edu/news/2011/09/12/new-study-quantifies-use-of-so-cial-media-in-arab-spring/.

* Seib, Philip (2008), “The Al Jazeera Effect: How the New Global Media are Reshaping World Politics”, Virginia, Potomac Books.

O PAPEL DOS MEDIA NA POLÍTICA

INTERNACIONAL

COLUNAMaria João Militão Ferreira

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Realmente o que fez a Europa foram os europeus, nascida mestiça de uma variedade de povos, que se encontraram frequentemente em conflitos quedestruíram homens e patrimónios em dimensões tremendas, mas que, com diferença de línguas, de et-nias, de história, foram criando uma comunidade sem Estado, sempre em busca de uma convivência pacífi-ca articulada por afetos, mas dividida por ambições, que não tornaram fácil até hoje o respeito e observân-cia dos valores que dão mais sentido ao seu patrimó-nio imaterial, e que são os valores cristãos. Embora seja da Europa de hoje que nos ocupamos, convém lembrar que o passado está sempre presente, embo-ra, como Vieira ensinou na História do Futuro, não tenha sempre a mesma leitura através dos tempos: a aristocracia de Esparta, a democracia de Atenas, o sé-culo de Péricles e a guerra do Peloponeso, Roma e o Império, os celtas, a Europa romana e a pax romana, o desenvolvimento do cristianismo, as invasões dos bárbaros, a reestruturação do Império, Constantino imperador cristão, que liberta a fé depois da batalha de Mílvios em 312, a unidade do Concilio de Niceia, a partilha do Império depois da morte de Teodó-sio em 395 – Constantinopla e Milão ou Ravena. Como conclui o grupo dirigido por Carpentier e Leb-run, “a uma Europa romana unificada, face a um mun-do germânico em plena mutação, defronta-se uma or-ganização do espaço europeu bastante mais complexa. O contraste entre as regiões mediterrânicas e a Europa central subsiste, mas é contrabalançado pela oposição entre uma Europa oriental onde as estruturas romanas se mantêm e se prolongam no quadro do Império Bi-zantino, e uma Europa ocidental cuja evolução depende da repartição de forças entre reinos bárbaros, e dos contactos entre as duas formas de culturas, romana e germânica: a história da Europa entra numa nova fase.2

1 Carpentier, J. e Zebrum, F., (Dir) Histoire de L’Europe, Editions du Seuil, Paris, 1990.

2 As grandes invasões, no começo do século V, ap. J. C., entre 406 – 407 na Gália, são descritos por S. Jerónimo nestes termos: “Que crónica poderia exprimir em linguagem conveniente que Roma, no seu próprio seio, não luta pela glória, mas pela salvação, que direi? Não luta sequer, mas por preço do seu oiro e baixela, compra a própria vida”. A. Chastagnot, Le fin du monde antique, Nouvelles Editions Latines, Paris, 1976, pag. 142.

DA CASA

A EUROPA DE BENTO

Era difícil imaginar que, sem acidentes naturais que definam uma fronteira traçada pela natureza – mon-tanhas, rios – a identidade não tivesse origem divi-na, e daqui a luta da princesa Europa que sonhou ser disputada por duas terras com formas femininas, uma terra de Ásia que a quisera guardar para si, e outra, fazendo-lhe fronteira, e obedecendo a Zeus, querendo raptá-la. Descuidada, foi divertir-se à borda do mar, e de lá foi raptada por um toiro magnífico e amoroso, Zeus disfarçado, que a levou para Creta, sendo Hes-íodo o primeiro autor que usou famoso nome – Eu-ropa – que Roma espalharia por todo o Ocidente, que Ovídio relançou nas Metamorfoses, que a arte inscre-veu nos muros de Pompeia, de que a Idade Média e os nossos tempos multiplicaram as imagens. Existem outras muitas efabulações, antes que se tornasse a mais importante parte do Ocidente – onde o Sol morre – por oposição ao Oriente – onde o Sol Nasce. Mas, de qualquer modo, como que a confirmar, pela visão cristã, que a palavra de batismo ganharia sentido pe-los valores cristãos, quando, no século 4.º, S. Jeróni-mo e S. Ambrósio reportam nos capítulos 9 e 10 do Génese, a história de que Noé deu a seu filho Cham a África, ao filho Sem a Ásia, e a Japhet a Europa. De facto seria a história, nas suas dimensões políticas e religiosas, que viria a dar identidade à Europa, sub-missa no seu destino, configuração geográfica, e atitude perante o mundo e a vida, por duas linhas marcadas pelo sangue de gerações: uma, a linha maquiavélica que preside à história do poder, outra a linha de valores, que define uma conceção do mundo e da vida, duas es-padas nem sempre em mãos aliadas e concordantes. 1

Antes de atingirmos um estado de espirito que do exterior viu a Europa como uma unidade, e do interi-or viu crescer uma visão de consciência comunitária, que nos fez sentir uma realidade politicamente iden-tificada, está o mistério, nunca resolvido, de a desig-nação existir sem haver conhecimento da divisão do

mundo que Heródoto não conseguiu perceber porque era composto de parcelas todas de nome feminino:

Europa, Ásia, África.

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DA CASA

A Península Ibérica, que mais de perto nos in-teressa, sofreu, com a invasão dos bárbaros, Al-anos, Vândalos e Suevos, na era de 409 ap. J.C., segundo o testemunho de Haydace, nest-es termos: “pilham e massacram sem piedade”.

A Igreja, que assumiu a divisão entre o Império Roma-no do Oriente e o abandonado Império Ocidental que guardava Roma como o sinal para sempre da grandeza passada, procurou organizar este espaço usando de reg-ra o poder da palavra (a espada espiritual) e abençoan-do frequentemente a espada do poder (poder político), com alternância da tentação de superioridade recípro-ca entre ambos. O texto chamado Doação de Constan-tino (274-337), ainda hoje é origem de controvérsias: mas verdadeiro ou contrafeito, serviu o aparecimento do Sacro Império, aponta consolidar a unidade interior dessa Europa, e estabelece uma colaboração construti-va, com incidentes, entre o poder temporal e o poderespiritual. Para tratar da Europa em que nos encon-tramos, lembrarei apenas alguns documentos funda-mentais quanto às raízes do presente: o Dictatus Pa-pae, decretado pelo Papa Gregório VII em 1075, e que exprime as aspirações da Santa Sé a respeito da organização da Europa Ocidental (Teocracia Pontifí-cia), as Siete Partidas de Afonso X, redigidas talvez entre 1256 e 1625, as quais materializam a ideia do rei, imperator in regno suo, o Concílio de Trento, convocado no pontificado de Carlos III para abrir, por iniciativa de Paulo III, em 13 de Dezembro de 1545, tendo Lutero como referência desafiante, acabando com o espaço cristão dividido entre católicos, protes-tantes, e ortodoxos, mas com a maioria fiel a Roma. Espero não ser inteiramente abusivo reconhecer que, entre 1463-1494, um jovem Giovanni Pico Della Mirandola, com o seu Heptaplus (1489), lançava uma profissão de fé humanista em favor da liberdade dada ao homem por Deus, afirmando: “…O Arquiteto Supremo escolheu o homem, cri-atura de uma natureza imprecisa, e, colocando-o no centro do mundo, dirigiu-se-lhe nestes termos:

não te damos nem lugar preciso, nem forma que te seja própria, Adão, para que, segundo os teus desejos e o bom discernimento, possa assumir e possuir o lu-gar, a forma e as funções que desejares” (In Les Mem-oires de l’Europe, Paris, Laffont, 1971, t. II, pg. 161). Admitindo que estas lembranças sejam suficientes para ao menos clarificar o quadro de correntes que convergiram para o globalismo critico em que nos en-contramos, sugiro que pelo menos emergiram em con-corrência, raras vezes em convergência, estas premis-sas: 1) uma unidade cristã quanto às fontes matriciais, divergentes quanto às interpretações da palavra de Cristo, e muitas vezes produzindo violência ofensiva da doutrina; 2) uma corrente maquiavélica que fez da aquisição, conservação, e exercício do poder políti-co, um critério estratégico de organização, admitindo conseguir a coexistência do pluralismo político com a eventual prominência diretória de um desses poderes, por vezes colocando em confronto o poder político e o poder religioso, pondo de lado a doutrina das duas espadas; 3) nascimento de um sentimento de superi-oridade cultural, científica e técnica frente às várias e diferentes áreas culturais do globo, que foram sen-do submetidas ao poder ocidental, secundarizando a memória das invasões e destruições que antes os euro-peus sofreram; 4) à medida que os conflitos internos, ou de expansão, cresceram em preço de vidas, bens, e valores, desenrolou-se uma corrente favorável à uni-dade política, com várias versões que não visam sem-pre o modelo da herança romana, mas sem esquecer a superioridade cultural, que centenas de conventos preservaram, com o exemplo cimeiro de S. Bento, pa-droeiro da Europa, em regra com lento mas crescente predomínio da corrente que nega a transcendência e parece querer colocar Lucrécio no patronato dos es-combros que estamos a viver, com o credo do mercado a substituir o credo dos valores, à medida que o Império Euromundista cresceu e decaiu pelas guerras civis da cristandade ocidental, chamadas guerras mundiais.

3 A. Tranoy, Chorique d´Hydace, Paris, Ceff, 1979, pg. 115.

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O desenvolvimento destas últimas tendências é que nos parecem dominantes, mas certamente não exclusi-vas, e que conduziram ao desastre a Europa de hoje, par-te de um Ocidente que sofre uma crise outonal. Quan-to à unidade religiosa, que teve um marco de aceitação da fragmentação quando no Natal de 800 foi coroado em Roma Carlos Magno, rei dos francos, iniciando-se um processo que autonomizou uma Europa ocidental, cada vez mais alheia ao Império de Constantinopla. Mas ela própria não conseguiu manter a unidade reli-giosa, em vista das consequências do reformismo, em que se destaca a intervenção de Lutero, movimento que tem o seu confronto definido no Concilio de Tren-to (1563): com as sedes das grandes ordens religiosas, abrangentes de toda a cristandade submissa a Roma, o Cristianismo ficava dividido em Católicos, Protes-tantes, e Ortodoxos, apontando para uma Europa Oci-dental identificada, mas para a qual o poder político seria uma unidade de conceito, mas não de governo. Essa pluralidade de governos não lembrava Ben-to, mas faz recordar Las Siete Partidas de Afonso X com o seu princípio – sex, imperator in regno suo. Trata-se de uma Europa dos Reis, em que se desta-cam homens como Richelieu e Mazarin, a França contra os Habsburgos, com Olivares e Filipe IV de Espanha a pretenderem as Províncias-Unidas, e a França a apoiar Holandeses, Portugueses (1640), Suecos, Catalães, Napolitanos, os suecos vencendo o imperador na Baviera, até que a paz é assinada em Westphalie, que consagra a soberania, a jurisdição interna, as diferenças religiosas, o enfraquecimento do Imperador pelo reforço de 360 Estados alemães. As guerras continuaram, mas quando Luís XIV es-creve o seu testamento e descreve a Europa de 1661, afirma: “Com efeito, tudo estava calmo em toda a parte; nem movimento, num receio ou aparência de movimento que pudesse interromper ou opor-se aos seus projetos; a paz estava estabelecida com os meus vizinhos, seguramente por tanto tempo quanto eu quisesse, visto a disposição em que se mantinham”. Este período dos Reis seria substituído pelo

período dos povos, cujo nascimento seria anota-do por Goethe quando na Batalha de Valmy veri-ficou, depois da Revolução Francesa, que os sol-dados gritavam viva a França e não viva o Rei. Temos a intervenção de grandes políticos, diplo-matas, generais, em que se destaca Napoleão, o qual, já exilado na Ilha de Elba, ditava para as suas memórias que era necessário um governo para a Eu-ropa, ressuscitando sim o pensamento que fora do Rei da Boémia no século XIII, que seria assumido pela linha dos pacifistas europeus, vindo a destacar-se Victor Hugo ao reclamar “uma cidadania europeia”, e Kant com o seu projeto de Paz Perpétua. Em vez disso, esta Europa Ocidental, transformada, na visão do resto do mundo, na grande agressora dos tem-pos modernos, lançou-se no que seria a construção do Império Euromundista, começando com as de-scobertas portuguesas (D. Henrique), e espanholas, mas sobretudo com o que Anatole France chamou “la folie colonial” (1905), a cargo dos Estados da frente marítima atlântica, Inglaterra, Holanda, Bélgi-ca, França, Portugal e, com fraco papel, a Alemanha. Todos concorrentes, os povos peninsulares con-tinuaram a proclamar a evangelização, a França a di-vulgar as luzes, a Inglaterra o peso de civilizar esses povos, que todos viram a Europa ocidental como uma unidade, em busca de matérias primas, mercados de produtos acabados, e mão de obra barata, este com a variante da escravatura, do trabalho forçado, da ser-vidão, do racismo, da discriminação. Quando Pio IX, pela encíclica Quanta Cura e o Syllabus (1864), re-cusando o mundo moderno, estava a enfrentar o con-sequêncialismo do que Stephen Greenblatt chamou A Grande Mudança (Clube de Leitores, Lisboa, 2011), que radica no lembrado Poema de Lucrécio – Da na-tureza das coisas, descoberto, depois de mil anos, em 1417, por Poggio Bracciolino, que talvez Ernest Re-nan tivesse como antepassado ao escrever em L’ave-nir de la science (1848) ser necessário organizar ci-entificamente a humanidade, com estas palavras: “é sobretudo sob a forma religiosa que o Estado vela até

CONTINUAÇÃO ...

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agora pelos interesses supranacionais da humani-dade. Mas a partir do momento em que a religi-osidade do homem se venha a exercer sob a for-ma científica e racional, tudo o que o Estado dedicava antes ao exercício religioso pertencerá de direito à ciência, única religião definitiva”. O princípio maquiavélico que acompanhou a ex-pansão imperial, acabou por destruir o Império Euro-mundista com duas guerras chamadas mundiais pelos efeitos, mas guerras civis ocidentais que envolveram a pequena Europa ocidental e os EUA: a primeira cus-tou 20 milhões de mortos, a segunda 50 milhões de vítimas, mais o uso das armas de destruição maciça. Na sede europeia desse Império, a época dos po-vos, sempre lembrando as Declarações de Filadélfia e da Revolução Francesa, foi submetida a regimes total-itários que levaram à formulação jurídica dos crimes contra a Humanidade, envolvendo o Nazismo e o Sovietismo, e executando uma política de metades: duas Europas, duas Alemanhas, duas cidades de Ber-lim, e no sul colonial dois Vietnames e duas Coreias. Homens tocados pela santidade, como Ade-nauer, Schuman, e De Gasperi, transformando o sofrimento em sabedoria, procuraram dar fi-nalmente realidade à herança dos projetistas da paz, iniciando a hoje existente União Europeia. Acontece porém que meio século de guerra fria nos anos de metades (NATO e VARSÓVIA), levaram a fazer da queda do Muro de Berlim o monumento de uma nova época, e o novo riquismo substituiu as diferenças ideológicas do afrontamento, a criativ-idade financeira conseguiu colocar o credo do mer-cado no lugar do credo dos valores, com estas con-sequências visíveis: a cidade planetária do Norte do mundo, como lhe chamou Mao, entrou numa crise económica, financeira e social, sem precedentes; a po-breza, que a ONU no século passado considerou tão perigosa como a bomba atómica, atravessou o Med-iterrâneo, como que reconstituindo o limes romano, abrangendo Portugal; a declaração de impostos to-mou o lugar das Declarações de Direitos da ONU e da

DA CASA

Declaração de Deveres, que suplica aprovação; condu-ziu a Europa a esta situação: perda total das vantagens adquiridas com os impérios coloniais, muitas ao preço da lenta igualdade dos homens; adormecimento das organizações internacionais, como a ONU, e a União Europeia, estando a renascer tendências de regresso ao passado autoritário; enfrentando um neoliberalis-mo repressor que não atenta na fadiga fiscal e provoca uma crise económica assustadora, com o próprio Oci-dente a enfraquecer a solidariedade Atlântica, e os Es-tados Unidos a recuperarem a convicção de que o seu caminho é o oeste e o Pacifico, que o Atlântico é uma retaguarda frequentemente incómoda; o poder interna-cional nas mãos de entidades ignoradas ou não cober-tas pela lei – como acontece com o G20. Por outro lado, se as Constituições continuam a afirmar as grandes declarações de direitos, com preceitos cuja raiz está por vezes nos estatutos das Ordens Religiosas, os fac-tos notam a decrescente adesão às Igrejas institucio-nalizadas, embora cresça o apelo à transcendência. A Igreja de Roma escuta ataques que parecem traduções agravadas das queixas de Lutero, e o Papa Francisco enfrenta o neoriquismo e a ganância com o risco, a coragem, e a virtude, de acreditar que o poder da palavra, que inclui o exemplo, é capaz de corrigir a pa-lavra dos poderes que procuram, legal ou ilegalmente, a governança. Não é Maquiavel o seu adversário: ad-versárias são as práticas que identificou, e estão em exer-cício. Regressemos à origem: no princípio era o verbo.

Adriano Moreira(Presidente do Instituto de Altos Estudos

da Academia das Ciências de LisboaProfessor Jubilado da Universidade Técnica de Lisboa)

CONTINUAÇÃO ...

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Regime Político: Democrática Parlamentarista

INFORMAÇÕES RÁPIDAS

REPÚBLICA DA ÍNDIA

Região Geográfica: Ásia Meridional

Capital: Nova Deli

Línguas Oficiais: Hindi, Inglês e outras 21 línguas nacionais

População: 1233.00 milhões de habitantes(trading economics; 2014)

Moeda Nacional: Rupia Indiana

PIB per capita: 1165 USD (trading economics; DEC/2013)

Regime Político: Estado Unipartidário (Comunismo - Partido Comunista Chinês)

REPÚBLICA DA CHINA

Região Geográfica: Ásia – Leste da Ásia - Extremo Oriente

Capital: Pequim (Beijing)

Línguas Oficiais: Mandarim

População: 1360.72 milhões de pessoas (trading economics; JAN/2014)

Moeda Nacional: Remimbi (RMB)

PIB per capita: 3583.38 USD (trading economics; 2014)

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A cooperação entre os BRICS há muito não abarca apenas o domínio económico. Ainda que este persista em ser o vetor mais visível da cooperação encetada entre estes Estados, a sua vontade de projeção de pod-er no sistema internacional tem-nos levado a alargar a sua esfera de cooperação a áreas de ação tradicio-nal de poderes tão díspares como a Organização das Nações Unidas (ONU) ou a União Europeia (EU). Uma das áreas que vêm sendo brindadas com a atenção dos BRICS tem sido a do uso da força para fins humanitários. O conceito da Responsabilidade de Proteger (R2P), inicialmente proposto e defen-dido pelo Canadá, veio a ser aprovado por consen-so pela Assembleia Geral da ONU em 2005 e, as-sim, transformado em norma internacional, com base na ideia de que quando um Estado não é ca-paz de proteger a sua própria população de atrocid-ades em massa, ou não deseja fazê-lo, essa respons-abilidade recai sobre a comunidade internacional. Em Janeiro de 2009, o Secretário-Geral das Nações Unidas lançou o primeiro documento da Organi-zação dedicado especificamente à questão, suger-indo uma abordagem ao tema em três pilares: a) a responsabilidade primária do Estado de proteger a sua população de genocídios, crimes de guerra, lim-peza étnica e crimes contra a humanidade; (b) a re-sponsabilidade da comunidade internacional em assistir os Estados no cumprimento da sua respons-abilidade; (c) e a responsabilidade da comunidade internacional em agir a tempo e de forma decisiva a fim de proteger e prevenir as populações de atrocid-ades humanitárias, caso o próprio Estado não o faça, em conformidade com a Carta das Nações Unidas. A crise na Líbia atraiu a atenção do mundo e tem sido rotulada como um caso típico da rápi-da e decisiva resposta em face à ameaça iminen-te de atrocidades em massa sob os auspícios da R2P. Foi a primeira vez que o Conselho de Segu-rança das Nações Unidas (CSNU), através da Res-olução S/RES/1973/2001, autorizou o uso da força sob os auspícios da norma da R2P. Contudo, a ação

Os BRICS e a Responsabilidade de Proteger (R2P) internacional gerou controvérsia, tanto sobre as táticas utilizadas durante a operação militar, que buscava pro-teger a população, quanto sobre os efeitos produzidos na subsequente mudança de regime político no país. De todos os BRICS, a África do Sul foi o único a votar a favor dessa Resolução, sendo certo que, tal como os restantes BRICS, também a África do Sul assume uma postura crítica em relação à norma da R2P, integrada na mais abrangente postura de aversão ao uso da força para fins humanitários. Na verdade, à exceção da África do Sul, que votou em favor da Res-olução 1973 no CSNU, nenhum outro país dos BRICS desempenhou um papel ativo na aplicação do conceito da R2P. Em geral, todos eles mostram-se hesitantes em votar a favor de ações militares no CSNU, o que inclui questões relativas à Responsabilidade de Pro-teger. O grupo parece possuir a preocupação de que o CSNU não se transforme num instrumento das chama-das potências ocidentais para ingerir nos assuntos in-ternos dos Estados, daí que se encontram, nos seus discursos, seja no CSNU, seja na Assembleia Geraç das Nações Unidas (AGNU), defesas do princípio da soberania como pilar do sistema internacional. Os BRICS buscam soluções multilaterais para a resolução

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Os BRICS e a Responsabilidade de Proteger (R2P) de conflitos internacionais, e consideram as Nações Unidas a instituição legítima para adotar ações coleti-vas na manutenção da paz e segurança internacionais. Neste sentido, embora os BRICS concordem com os princípios básicos que sustentam a R2P e apoiem incondicionalmente os pilares I e II da doutrina, não raras vezes divergem das potências ocidentais quanto ao pilar III, isto é, relativamente ao quando e como aplicar a norma. Isto significa que os os de-bates em torno da R2P não são sobre quando ocorre ou não um genocídio, limpeza étnica, crimes de guerra ou crimes contra a humanidade, mas sim rel-ativamente a quando e à forma da comunidade in-ternacional intervir para resolver esses problemas, o que vem originando dois posicionamentos distintos, o Norte Global pró-intervencionista, e o Sul Glob-al apegado à tradicional conceção de soberania. Esta divisão começou a colocar-se com a norma 1973 relativa à polémica ação militar da NATO na Líbia sob os auspícios da R2P. De 2005 até então, o progresso da norma decorrera de forma tranqui-la; porém, as ações sobre a Líbia geraram profundas consequências para o avanço da norma no CSNU. Como referido já, a crise na Líbia atraiu a atenção

da comunidade internacional a ameaça iminente de atrocidades em massa levou o CSNU a autorizar, pela primeira vez, o uso de medidas coercitivas contra um Estado no âmbito da norma. Apesar de a norma ter sido usada, sua aplicação e os resultados decorrentes arriscam de tornar esta ocasião a primeira e última vez que o uso da força seria invocado em nome da RdP. A Resolução 1970 moldou a resposta do CSNU em termos da RdP e foi saudada como um momento diplomático inovador, porém a violência e a intran-sigência do regime de Kadafi tornaram-na insuficiente. A resolução seguinte (19731) propôs medidas mais robustas incluindo o uso da força e foi inicialmente vista como uma medida acionada em tempo oportuno e proporcional às necessidades de garantir a proteção de civis em grave risco de atrocidades em massa. Mas, nos meses que se seguiram, o debate a acerca do uso da força tornou-se cada vez mais acirrado. A China, membro permanente do CSNU argumen-tou que a responsabilidade de proteger civis é pri-mordialmente uma responsabilidade do governo soberano e que a comunidade internacional pode fornecer assistência construtiva, observando os princípios de objetividade e neutralidade, e respeit-ando plenamente a independência, soberania, uni-dade e integridade territorial do país em questão. Na mesma ocasião, o Brasil concordou com a posição chinesa, mas lembrou do dever que os Estados pos-suem em proteger a população. Assim, em evidente contraste com o que o próprio Brasil havia aceitado, representante permanente do Brasil junto à ONU, a Embaixadora Maria Luiza Ribeiro Viotti apontou que “devemos evitar interpretações excessivamente amplas da proteção de civis, que poderiam ligá-las à exacerbação dos conflitos, comprometer a impar-cialidade das Nações Unidas, ou criar a perceção de que ela está sendo usada como cortina de fumaça para uma mudança de regime ou uma intervenção”. 1 Dos dez membros do CSNU votaram a favor: Bósnia-Herzegovina, Colôm-bia, França, Gabão, Líbano, Nigéria, Portugal, África do Sul, Reino Uni-do e Estados Unidos; e abstiveram-se: Brasil, China, Alemanha, Índia e Rússia.

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Os BRICS, no fundo, criticaram a forma pela qual a intervenção foi levada a termo pela NATO, ao invés de seguir o princípio da responsabilidade de proteger. Neste contexto, o governo brasileiro relançou o debate sobre o novo conceito da RwP. A presi-dente Dilma Rousseff, em seu discurso de abertu-ra da 66ª Sessão da AGNU, reinseriu o Brasil nas discussões, levando a comunidade internacional a refletir sobre a necessidade de não somente dia-logar sobre a Responsabilidade de Proteger, mas também sobre a Responsabilidade ao Proteger. Até 2012, os dois membros permanentes do CSNU e membros do BRICS, Rússia e China, não se haviam pronunciado em relação ao novo conceito propos-to pelo Brasil, enquanto a Índia, embora declarasse não se opor ao conceito de Responsabilidade ao Proteger, não lhe conferia um apoio afirmativo. De todos os BRICS, a África do Sul foi o pri-meiro a apresentar um discurso amplamente fa-vorável ao conceito brasileiro de “responsabilidade ao proteger”, mas deixando claro ser contra uma nova discussão da norma já aprovada em 2005. Ocorre, contudo que o Brasil parece ter aban-donado o papel de liderança nos debates acerca da Responsabilidade de Proteger, o que se refle-tiu também na falta de uma maior articulação dos BRICS em relação à Responsabilidade ao Proteger. Após a abertura da AGNU em 2011, com o lançamen-to da proposta brasileira de RwP havia grande expec-tativa de que os BRICS não se opusessem a resoluções mais afirmativas sobre a crise na Líbia. Mas, em Out-ubro de 2011, a China e a Rússia vetaram um projeto de resolução patrocinado pela França, Alemanha, Por-tugal e Reino Unido, que condenava ações violen-tas do governo sírio contra manifestantes. O Brasil, a Índia e a África do Sul abstiveram-se. Mais tarde, de-pois de várias rondas negociais para alterar a proposta, tanto a China quanto a Rússia o vetaram, enquanto o Brasil, a Índia e a África do Sul voltaram a abster-se, o que levou à descrença internacional de que estas três democracias emergentes pudessem participar

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mais ativamente na gestão de conflitos internacionais. Para a maioria dos especialistas, no entanto, a pos-tura de bloqueio da China e da Rússia às resoluções do CSNU sobre a Síria não deve ser analisada como uma postura frequente dos BRICS contrária à Re-sponsabilidade de Proteger. Na verdade, o CSNU referiu-se mais vezes à RdP nos doze meses que se seguiram à intervenção na Líbia do que nos cinco anos que precederam essa intervenção. Tomando o histórico de votações dos BRICS no CSNU, não é possível afirmar, desta forma, que apenas pelo caso da Síria, a norma da RdP tenha sido engavetada junto a um rol de doutrinas fracassadas das Nações Unidas.

Raquel de Caria PatrícioProf. Aux. ISCSP/ULisboa

CONTINUAÇÃO ...

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3. Qual o objectivo primordial da enciclopédia? A Enciclopédia procurou compulsar a informação mais relevante para cada uma das entradas definidas, as quais foram redigidas por especialistas na matéria em causa, fornecen-do ainda pistas para novos voos através das cinco referências bibliográficas. Trata-se, portanto, de uma súmula dos pontos essenciais sobre um dado tópico que procura ser um ponto de partida para posterior aprofundamen-to. Os seus principais destinatários são os estudantes, mas o público curioso e profissionais da área, incluindo jornalistas, passam a ter acesso a uma compilação de informações feita por académicos prestigiados, de norte a sul do país, com proveniências e perspectivas bastante diversas. A Enciclopédia é, deliberadamente, plural.

4. Qual a importância da enciclopédia no panorama das Relações Internacionais em Portugal? A mim não me compete julgar...sou mau juiz em causa própria. A nós interessava-nos a qualidade e a utilidade numa obra que colmata uma lacuna no panorama editorial português. Se esses objectivos forem alcançados já nos damos por satisfeitos. Como é evidente, e pela sua própria natureza, a Enciclopédia será objecto de revisões e de actualizações para não perder a oportunidade e continuar a ser consultada com proveito.

Entrevista Professor Nuno Canas Mendes

Professor Auxiliar no ISCSP-UL

A Enciclopédia das Relações Internacionais

1. Quanto tempo demorou a enciclopédia a ser compilada? O convite aos co-laboradores foi enviado em Maio-Junho de 2013 e as últimas entradas foram recebidas em Janeiro de 2014. Feitas as contas, foram cerca de 8 meses.

2. A tarefa de escolher os conceitos operacionais mais importantes para integrar a obra foi difícil? Na realidade, foi uma tarefa bastante estimulante. O que fize-mos foi ver obras similares publicadas no estrangeiro, que nos serviram como orientação, e depois trocamos impressões com alguns estudiosos da área que fiz-eram sugestões para entradas, num espectro alargado de temas que vão de autores, correntes teóricas, conceitos, instituições internacionais, factos históricos, etc.

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PACTA - What are the main political and social chal-lenges that South Africa faces nowadays?

Ambassadress Keitumetse Matthews - I would say, obviously, the most important is poverty – that’s one of our challenges. Inequality is the second and unem-ployment. Those are the three triple challenges that I would say we largely face as a country in the sec-ond phase of our transition from colonialism, apart-heid to a national democratic society. And what our government is now doing is they have embarked on what they call a radical-social economic transforma-tion to try to push back the triple challenges as much as possible and of course, one of the key tools, to try to make the change, specially in inequality is education, is absolutely a key priority for our government, from early childhood development right up to post doctoral education, that is something that our government is working very very hard, to implement and has actual-ly devoted a huge part of our national GDP to educa-tion. The second thing is we have got what we call a national development plan. This plan was developed from 2009, after our president took office - president Jacob Zuma - and one of the things he spoke about and indicated he would like is to have a thoroughly in-terrogated analysis of the sate of the country and that task was done by 22 commissioners , different sectors of the economy who were tasked with actually going around the country and doing a proper analysis of the strengths and weaknesses of the country in terms of what is required to make the necessary structural changes. And this whole analysis was lead by minis-ter Trevor Manuel who was the minister in the pres-idency tasked with carrying it out together with the commissioners and he presented his report to govern-ment and to parliament, it was debated, criticisms that would made what taken on board and the final docu-ment was then presented to parliament together with recommendations in respect of some of the things that the commissioners felt the country needed to do in order to take the country to the next ( in terms of

development. That is now encapsulated in the national development plan of the country which is a thirty year plan. The plan really literally takes the country apart and identifies what is needed in every single part of the country, whether is rural, mountain, vale, city, ur-ban and there is a pretty good understanding of what is needed and the weakest areas which need the greatest amount of development have been identified, for ex-ample, where the most sanitation is required is known, where the most water is required is known, where the most electricity is required is known, where the most housing is required is known. So, there is a really good idea of where implementation need to take place. And coupled with that is an infra-structural development plan which has been created across the country - is a nation wide development plan - to really upgrade the infrastructures of the country and South Africa has got pretty world class infrastructure as it is but there are pockets that need housing, proper humanitarian set-tlements, where it’s not just a house, but its got to have what people need to have a good quality of life, they need to have proper walls where people need to be to-gether, they need to have libraries, churches, mosques . Its not just about building a house, but its trying to make sure that people have a much more dignified quality of life, so that’s the purpose of the infrastruc-ture development plan which is also within the frame-work of the national development plan. Currently, we have set a growth target of about 5% by 2019, whether we achieve that target or not, we have to wait and see.

PACTA - What challenges do the BRICS face as a block, in your opinion?

Ambassadress Keitumetse Matthews - The BRICS is an interesting grouping, because you have got a mixture of countries at different states of develop-ment and with different expertise across a wide va-riety of areas and I don’t think they face as many challenges collectively because the idea is that they take the challenge of each county and support

ENTREVISTA

Interview to the Ambassadress of the South African Republic in Portugal - Madam Keitumetse Matthews

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ENTREVISTA

that challenge as much as possible and, of course, if you tike a country like Russia, they would have a lot of developmental knowledge and expertise which they derived from their revolution and scientifically they’re very advanced, they have done certain things on their own which are quite important so that expe-rience would be useful for the group. But then you have China which is a growing economy, probably in a short time would be the leading economy in the world, and I think they have the human capital be-cause they have a large population but, at the same time, they also need to grown the quality of life of their own people and so in that respect I’d say their probably the same of a lot of African countries which have the same challenge and Brazil to a certain extent similarly has got developmental challenges but I think collectively its probably a plus because they can feed of each other in various sectors and get a proper bal-ance so that not one is over the other in terms of issues they need to resolve . I think that the BRICS meetings over the years have actually allowed them to encom-pass a huge variety of issues globally, for example, in the middle east they are able to have views on some of the things that are happening, they are able to take positions, they have interests in Afghanistan and what is happening there, I think they have a view and large-ly, from the way I see it, they are pushing peace that seems to be much more the framework that they sup-port, is the framework of reconciliation, dialogue and attempting to encourage this countries to built insti-tutions which support peace and democracy. I think that’s their position. I also think that the BRICS are quite smart in the way that they have created their own institutions which are more relevant to their needs, for example, the BRICS bank. The BRICS bank was not created so that they go around giving loans all over the world and messing up people’s economies but more to actually assist themselves to develop according to the needs that they have as developing countries and I think that’s the bit different from the current insti-tutions like the World Bank and the IMF, the agen

da is a little bit different and I think that’s important.

PACTA – Which is the importance to South Africa of the cooperation with BRICS in terms of imports and exports?

Ambassadress Keitumetse Matthews - As far as South Africa is concerned, South Africa currently has invested around 3 hundred billion Rand which is about 35.6 billion U$D into improving and expanding its railways, ports, fuel pipelines. Africa will contin-ue to be bought by this whole exploding demand for oil, for minerals, for metals, food. It’s probably the continent with a huge land mass of land that can be used to provide food for the world. And could argu-ably be one of the worlds largest unexplored resource basins. So when we talk about South Africa, its im-portant to remember that South Africa’s agenda al-ways include the rest of Africa, we try, in our foreign policy, to ensure that we are inclusive, we never do something only for our own benefit and the reason for that is because during Apartheid South Africa got a lot of assistance and support from other African countries and had concrete supports in terms of camps in coun-tries like Tanzania, Zambia, Angola, Mozambique and really we feel that we cannot be an island of success and ignore the support that we got from our brothers and sisters in different parts of the continent and so, we always remember when we do anything that we must include other African countries which is why at the BRICS that was held in Durban we made a point of ensuring that the BRICS members have meetings with other heads of states who were invited to have a breakaway session with the BRICS as the group of head of states of some of the African countries. And now is a very important initiative that was institut-ed by president Zuma to ensure that African leaders know that they are included in this dialogue between South Africa and BRICS countries. The other import-ant point to take on board is that 10% of the worlds oil reserves are on the African continent and 40%

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of its gold and 95% of platinum is on our continent, that is a very important point. And South Africa itself has got a very highly sophisticated financial market, our banking system is rated one of the best in the world and in many are number one for financial regulation we didn’t suffered the tackle of banking crisis that the rest of the world suffered after the crash of Lemmon Brothers, we were largely unscathed in our banking system are obviously the blow-back for us was the fact that when the economy of the world started to de-teriorate we were impacted because we were a huge export country and our 70% of our trade is with the EU and so that has impacted us quite gravely. We are a very competitive country and we were rated 4th in the global competitive index, there is a high level of confi-dence in South Africa’s financial market development, ranking us as 4th in the world on this measure. We also have an export structure to BRICS member coun-tries and it shows a lot of diversification and our nega-tive trade balance has also narrowed over the last four years from 57 billion in 2008 to roughly about 22.8 in 2011. Currently, our GDP deck ratio is about 40% but in 2008 it was 27% which is really good and I think South Africans are very conscious of that in terms of GDP debt ratio. We want our debt to go down, in fact, we don’t want any debt at all. And so our treasury is extremely strict about how indebted the country is and they monitor quite constantly how far the country goes into that and they try to reduce it, to keep it down, its something that our minister of finance takes very very seriously. We try to manage our debt very very strictly. Our export trade with BRICS is about 16.8% which is a growth from 6% around 2008. And I think the imports from BRICS countries rep-resented about 13.6% of total imports and 20% in 2011, 6% in 2005 and 20% in 2011. And our min-ister of treasury and industry indicated that in 2011 alone the trades between South Africa and BRICS countries grew by 29% which is not insignificant.

PACTA - Can the BRICS be seen as a pillar of the world economy?

Ambassadress Keitumetse Matthews - I wouldn’t say that we’re a pillar of the world economy. I think we are watching what is happening in the World econ-omy really closely and I think that BRICS leaders are very cautious. They’re not given to making wild statements about where they see growth. They’re very cautious about what they say around the economy of the world. And I think that one of the things they have spoken about quite regularly is trying to change the current international framework, in terms of financial regulation, in terms of the role of the IMF, the World Bank and the so called Breton Woods institutions. I think that is something that they talk about quite strongly, but I think that they noted for example re-cently that a strong and long lasting recovery is yet to materialize, so that’s the extent of the caution that they exhibit, despite having this tremendous potential, as the BRICS countries economically. They still are very cautious in the way they define what is really happening across the world economy. I would say that emerging market economies have been contributing to global economic activity by sustaining high growth rates despite adverse circumstances and spillovers from the policies of the major advanced economies, especially the monetary policies. But I know that at the recent G20, there was sort of an offline meeting, between the BRICS leaders and they underscored the fact that more needs to be done to support global de-mand in the short run, especially by advanced econ-omies to promote an increase in investment and long run growth. So I think that they really underscored the point that there needs to be more investment and eco-nomic reforms in order to boost demand and lift long term growth. If you take a line from 2008 to the pres-ent and you look at some of the chocks which have taken place and you compare how the BRICS have absorbed the chocks, I think that they absorbed them pretty well and they’re more prepare to manage exter-nal chocks, which is quite an interesting phenomenon.

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PACTA - What are the main advantages and disad-vantages of further consolidation and formalization of the block?

Ambassadress Keitumetse Matthews - BRICS is still new, but I think it’s been impossible to ignore the BRICS countries, they seem to be the linger of the day; it’s probably becoming one of most the well-known groupings, and I think that they’ve been fortu-nate because they’ve had seriously well-known lead-ers, quite charismatic. Dilma Rousseff has got a really special charisma, and she’s just won a second therm. President Zuma is a larger than life personality, has been a struggle hero for more than thirty years, he’s a former Robben Islander, he’s got very strong roots amongst the Zulu people and the South African peo-ple, he’s also got very strong connection with Mozam-bique and Angola with a very good relationship with those heads of state, especially in the SADC region, so he’s very well known in Africa. And you’ve got president Putin who’s also extremely strong, very well know. These are people that have brought a face to the organization that has enabled the grouping to become well known in a relatively short time. I do not think that there are disadvantages to further consolidation, because it’s such a small group and they’ve developed a very tightened way of working, a structured way of working and they meet so regularly that I think by now they know each other pretty well and know each other’s policies pretty well. Like any organization that starts with the same people and continues with them on a regular basis they’re probably becoming a very tight unit, able to work very well with each other and that can only be an advantage to the organization. I think the main advantage is that the South-South, they’re looking at a different way of doing things as a grouping, they’re not as western based. And in terms of the West they’ve got a different slant to what they need to do, and they’re all thinking along the same lines, I think they’re pushing in the same direction, they understand what needs to be done.

I think South Africa’s advantage within the BRICS is the fact that we have a lot of mineral wealth in South Africa and that’s a strength for us. Recently the US based Citibank group ranked South Africa as the World’s richest country In terms of its mineral reserves, worth an estimated 2.5 Trillion Dollars; that’s about a third of the US’S debt, which is not bad. We are the world’s largest producer of platinum, chrome, vana-dium, manganese. We’re the third largest gold miner. We have highly sophisticated mining related profes-sional services and that is a contributing factor to the BRICS resource pool. And I think the other advantage that South Africa has is that we are really recognized globally as a dedicated and committed regional player. We play a constructive role in governance structures in the world and our position within organizations of the south, especially the African Union, the G77, in BRICS, we’re pretty much respected because we’re not given to making wild allegations or promises or wild statements that are not based in reality. We’re a fairly quite thoughtful country in terms of the state-ments that we make and we tend to be supportive of peace and reconciliation. When we ask for a reform of institutions we do it in a respectful way and I think we are largely on the moral high ground in many things, in many positions that we take. That does not mean to say that South Africa hasn’t made mistakes or doesn’t take positions that are liked, but at least we have been pretty consistent in terms of our reconciliation and peace which we talk about quite a lot, and the reason I think we are respected, it is because we preach what we have lived as a society. We came to being of to 1994 on the bases of reconciliation and forgiveness and I think that principle that we actually put in to action as a peo-ple as given us the higher moral ground when we talk about it and try to encourage other people to take that course if they possibly can. . Obviously everybody has differences in terms of their different countries and histories, but at least it is always a starting point, isn’t it? If you can try to build dialogue between people in

ENTREVISTA

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order to achieve lasting peace, so that is something that we take pride in and I think that is helped us as we go along on this path of nation building, econom-ic growth and trying to give people a better qual-ity of life and that is what we bring to the BRICS.I think the whole issue of the BRICS is very interest-ing and a lot of people are interested in it, and may-be some countries have not yet worked out politically where they stand in terms of the BRICS, some coun-tries don’t quite understand what the BRICS is about, but I think it is because they are so used to Western In-stitutions lead by largely Western countries with for-mer colonies being pulled along to join in but I think the difference with the BRICS it is a little bit a mixture, you have got Latin America – Brazil the largest power house and it has connection with Portugal. I wish it was important for us because we have a large Portuguese population, about a million in South Africa, which is descendent from the Portuguese. And then you have got India, which is very special for us because we have a very strong historical connection with India, because Indians where brought to South Africa by the British, and then you have Russia which has a very strong connection with our liberation movement and other

liberation movements around the front line states, and so we understand Russia because a lot of our former leaders engaged with Russia during the time of liber-ation. You have China, which again, a lot of the lib-eration movements engaged with, and so it is quite an interesting history of relationships between these countries, which is a bit different from the history be-tween the Western countries and the former colonies. I think it brings a different mix to the global institu-tions and possibly it may succeed in achieving some of the goals that these countries, especially the African countries want to achieve. Where they have largely possibly failed in being part of the other groupings, but that is something that is debatable and it is a mat-ter for analyses to look at the former British colonies, French colonies, Portuguese colonies, and look at those relationships, and those global groupings that came out of with like British Commonwealth, CPLP, joining the UN as independent countries, getting loans from the IMF, World Bank (some of them became highly indebted countries), and then looking now at this new grouping and seeing how that is going to pane out in the next 20 or 30 years, I think it would be a quite interesting comparator going forward.

INFORMAÇÕES RÁPIDAS

Regime Político: Democracia

Capital: Cidade do Cabo (capital legislativa); Pretória (capital administrativa); Bloemfontein (capital judiciária).

Região Geográfica: Extremo Sul do continente africano

Línguas Oficiais: Africâner, Inglês, Ndebele, Sesotho do Norte, Sesotho do Sul, Swazi, Tswana, Tsonga, Venda, Xhosa e Zulu.

População: 52.98 milhões de habitantes (trading economics; 2014)

Moeda Nacional: Rand

PIB per capita: 5916 USD, (trading economics; DEC/2013)

REPÚBLICA DA ÁFRICA DO SUL

CONTINUAÇÃO ...

ENTREVISTA

PACTA: Quais os principais desafios políticos e sociais que se colocam ao Brasil?

Conselheiro António César: Acabámos de passar por um processo eleitoral [dia anterior ao dia em que foi re-alizada a entrevista], em que ficou evidente que ainda existem desafios sociais importantes, apesar de todo avanço que tivemos nos últimos anos em termos de in-clusão. Ainda existe uma camada da população que pre-cisa de mais acesso a direitos económicos e sociais. E ao lado disso, contribuindo para que esse desafio se torne mais desafiador, é preciso garantir que o país continue a crescer. O contexto internacional, hoje, é desfavorável e é preciso que de alguma maneira o país se sinta unido em torno desses objetivos. Essa eleição demonstrou que há clivagens políticas e sociais, que talvez excedem o que seria desejável. Em termos de embate político existem clivagens que podem, de certa forma, ir contra o desen-volvimento óptimo do país. E é uma tarefa de toda a classe política e de toda a sociedade tentar gerir todo esse proces-so eleitoral e traçar estratégias para os próximos anos que permitam que a gente continue no bom caminho, que su-pere os novos desafios que surjam e que continue a com-bater contra os antigos. Um outro dado importante é criar um consenso para a agenda política e económica do país. Os últimos anos são uma demonstração de um país com muito potencial, que caminhámos e conseguimos. Esse foi um ano, enfim, antes das eleições, de muita exposição para o Brasil. A população reivindicou mudanças, e antes das eleições, até mesmo com a organização da Copa do Mun-do o saldo foi positivo. Houve a percepção geral de que o Brasil conseguiu usar o evento para que o mundo con-hecesse melhor o país e tivesse uma imagem positiva dele.

PACTA: E quais os desafios que os BRICS, enquanto blo-co, enfrentam?

Conselheiro António César: Acho que o desafio que de certa forma une os países e que contribuiu para a definição do acrónimo é, ao mesmo tempo, um desa-fio e uma característica, e isso é o desenvolvimento.

É a busca de um novo patamar de inserção no mundo e a constatação de que os países estão-se tornando cada vez mais relevantes, do ponto de vista económico e político e até cultural e de presença internacional. Esse é um desafio comum e a partir daí qualquer análise vai abrindo com-partimentos praticamente infindáveis, você vai detalhando e vai encontrando diferenças e particularidades regionais, históricas e no meio dessas diferenças encontra, também semelhanças, como é natural. Mas, enfim, como são países populosos e com posições, em geral, em que se apresenta desigualdade social, eu diria que ao lado da questão pura-mente do desenvolvimento vem o desafio da inclusão social em todos estes países. E um desafio, o terceiro desafio que acompanha os outros dois, não é um privilégio ou exclusiv-idade destes países, é do mundo inteiro: garantir o desen-volvimento com inclusão e preservação do meio ambiente. Tudo isto decompõe então a questão do desenvolvimento.

PACTA: Qual a importância, para o Brasil, da cooper-ação com os BRICS em termos de importações e expor-tações?

Conselheiro António César: Eu diria que a importância é tomada em conjunto, é evidente. São países, todos eles, com os quais o Brasil mantém elevados níveis de trocas comerciais com pautas distintas para cada país, com maior ou menor grau de complementaridade ou de competição, mas todos são importantes. Com a China, por exemplo, como todos sabem, é uma composição muito concentrada, para o lado das exportações brasileiras no sector mineral. Também, enfim, o sector primário corresponde ao prin-cipal item na pauta com a Rússia. Com a África do Sul talvez seja um bocado mais diversificado. Mas é, enfim, uma parte importante. Em termos percentuais é uma par-te importante, mas não acho que seja um recorde muito comum nas análises da nossa pauta., é mais comum ser por país ou por região. Mas é inegavelmente importante.

PACTA: Tendo em conta a actual situação económica, os BRICS poderão ser vistos como um “pilar” da economia mundial?

Entrevista ao Chefe do Sector Político da Embaixada da República Federativa do Brasil - Senhor Conselheiro António Augusto Martins César

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Conselheiro António César: Sobre a questão dos BRICS poderem ser vistos como um pilar na economia mundi-al, eu acho que são crescentemente vistos como um pi-lar ou uma pilastra, um elemento estrutural de um grande edifício em que, às vezes, os pilares se mexem e se in-terligam. Mas é, sem dúvida, um núcleo e talvez tenha, na última cúpula, adquirido contornos institucionais mais evidentes que dão cara e rosto a este núcleo. Obviamente estou falando deste novo banco de desenvolvimento e do arranjo de crédito, do arranjo emergencial. E, ao lado de-sta parte mais de contorno e de rosto, estatisticamente os últimos anos demonstraram que a partir da crise, os países dos BRICS responderam por grande parte do crescimento que ainda se verificou na economia mundial e são partic-ipantes importantes do G20. A Rússia presidiu há pouco o G20, o que também acredito que ajudou a dar a con-hecer ao mundo a importância económica destes países. Acho que esta realidade, que foi muito presente até agora, a partir da crise tende a continuar a existir, a ser verdadeira. Apesar de, como sabemos, ter ahvido um decréscimo, ou seja, a diminuição do crescimento chegou até aos países dos BRICS, é uma situação desafiadora nos próximos anos para todos eles. Mas a característica da sociedade, tanto a composição dos mercados como as características demográficas e os fundamentos das economias, permitem ter alguma segurança de que se não há motivo para op-timismo, há motivos para, dentro de um certo realismo, ver que estes países continuarão a ganhar importância nas trocas internacionais, claro que com solavancos a que to-dos estão sujeitos e continuarão a estar. Mas para superar estes solavancos, muitas estratégias vêm sendo traçadas e a maioria delas passando por uma certa clareza nas re-gras do comércio internacional, uma tentativa de algum balizamento dos mercados financeiros para evitar o que aconteceu no final da primeira década do século XXI e, naturalmente, a importância de superar crises políticas que surgem aqui e ali e que põem em risco esse processo.

PACTA: Quais as principais vantagens e desvantagens de uma maior consolidação e formalização do bloco BRICS?

Conselheiro António César: Eu acho difícil definir assim com muita exactidão as vantagens e desvantagens, porque para respondermos a essa pergunta a gente tem que fazer um exercício de imaginação que é possível mas não sei se é muito desejável porque é um pouco de lucubração em cima de coisas novas, ou compara os BRICS com outas coisas parecidas e eu tenho impressão que também é muito difícil essa segunda opção. Eu não consigo pes-soalmente, acho que isso tenha sido uma questão que terá ocupado outras pessoas, mas a minha sensação é que os BRICS são uma coisa à parte e não uma caracterização como bloco. De vez em quando dá sempre a sensação que se fala dos BRICS da mesma maneira que se fala de grupos que obedecem a lógicas muito mais imediatas de conformação a partir de uma região ou de uma história em comum, de uma herança ou de uma afinidade em torno de um objectivo muito específico como tantas organizações internacionais. Os BRICS são um pouco de tudo isso, um pouco da história, da geografia, da demografia, das carac-terísticas físicas dos países, mas são vários os critérios que tornam a comparação com outras histórias que já percorre-ram mais caminho ou que existem há mais tempo difícil. A gente pode fazer projecções mas com muitos parênteses, pela via da imaginação a gente pode fazer, a gente vai usar categorias que já tem. Por exemplo uma desvantagem ób-via é a questão das burocracias, das disputas politicas, na-cionais e regionais se quiserem criar um banco e definir a sua sede. Isso é parte da vida dos BRICS, acho que se pode encontrar caminhos igualmente novos assim como as car-acterísticas do bloco e pode-se encontrar soluções mais ou menos criativas que talvez venham a suavizar essa que a gente vê como desvantagem. Eu acredito que até ao momento não chegou à superfície, ou não chegou assim a conhecimento geral, nenhuma grande ou paralisante dificuldade que esse processo de criação de instâncias ou de alguma institucionalização tenha trazido consigo, ao passo que se pensarmos nas vantagens, eu acho que é inegável que as cúpulas periódicas e agora a ex-istência de essas instituições ou proto-instituições tem um efeito mediático que a gente só chama de mediático porque é o revestimento externo desse efeito porque vai além do

Entrevista ao Chefe do Sector Político da Embaixada da República Federativa do Brasil - Senhor Conselheiro António Augusto Martins César

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simples facto de sair no jornal e chamar a atenção das pessoas. Acho que pelo meio disso, pelo meio des-sa capa externa, está de certa forma descrevendo um fenómeno que é mais profundo, que é o potencial catal-isador que essas coisas têm e que inegavelmente sendo um arranjo tão novo e de uma geometria tão nova, pre-cisa desses marcos dessas cúpulas, desses grandes pro-jectos conjuntos. Essas coisas são necessárias para dar algum tipo de balizamento para esse grupo ou para um grupo dessa natureza, e que acho que é necessário para qualquer grupo em que as coisas acontecem de uma for-ma mais óbvia ou historicamente mais compreensível, como a União Europeia ou o MERCOSUL. É necessário ter esses balizamentos, então eu acho que no momen-to diria que há mais vantagens do que desvantagens. Acho que com isto eu encerro o meu raciocínio sobre esta questão. Também digo que esse cálculo pessoal é um cálcu-lo deste momento. Acho que à medida que a história deste grupo caminhar, esse cálculo vai variar, vão entrar novos elementos neste conto que a gente terá que ter presente para ter outro resultado e um deles é obviamente que você vai criando marcos, balizando um crescimento institucional, você vai ter que alimentar essas instituições, esses projectos, haverá cobranças para os resultados, é uma coisa dinâmica. O equilíbrio que essa “criatura” vai ter não dá para prever,

não vai dar para prever qual vai ser o equilíbrio em cada momento. Isso vai ser um exercício no qual os países membros vão estar perenemente envolvidos.

Segundo Secretário André Pacheco: Uma vantagem mais imediata, menos relacionada com a formalização, é esse fórum constante de diálogo entre esses países dado esse carácter global, não só da economia como de todos os fenómenos hoje em dia (de saúde, económi-cos, comerciais), e essa consertação constante ajuda a afinar as respostas politicas e económicas dos própri-os países, individualmente, e também enquanto bloco. Eu acho que é uma vantagem para o Brasil, e acredito que é uma ideia que os BRICS defendem. Se a gente acredita no multilateralismo e num mundo que caminha para algum tipo de multipolaridade e no investimento num projecto, numa aventura como a dos BRICS é inegavelmente impor-tante e estimulante para todos esses países que enxergam dessa maneira, como um elemento importante dentro de uma visão maior. E com todas as interacções e transversal-idades dessa visão multipolar e multi-organizacional, claro que esses países actuam em cada organização internacional da qual fazem parte e consideram a ONU “a grande orga-nização”. Vão navegando mas felizmente, no nosso ponto de vista, tendo presente essa dimensão que são os BRICS.

INFORMAÇÕES RÁPIDAS

Regime Político: Democracia

Capital: Brasília

Região Geográfica: América do Sul

Línguas Oficiais: Português

População: 201.03 milhões de pessoas (trading economics; JAN/2014)

Moeda Nacional: Real

PIB per capita: 5823.04 USD (trading economics; 2014)

REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

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A designação BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) surgiu pela primeira vez num Relatório da Goldman Sachs datado de outubro de 2003, que identificava es-tes quatro Estados como apresentando potencial para se tornarem numa grande força na economia mundi-al. Desde 2011 incluindo também a África do Sul, os BRICS tornaram-se um grupo que partilha uma agenda comum e que tem vindo a institucionalizar a sua interação em Cimeiras anuais (que têm acontecido desde 2009), bem como noutros formatos de diálogo mais continuado. Apesar dos diferenciais existentes entre os 5 estados, a identificação de um denominador comum associado ao desenho de uma ordem alterna-tiva tem permitido o adensar das relações. “Alargar a cooperação multidimensional, e fortalecer a confiança e entendimento mútuos” são elementos estruturantes na definição deste denominador comum, nas palavras do presidente russo Vladimir Putin. Com um alinha-mento claramente económico nas suas fundações, esta deve ser a dimensão prevalecente em termos de coop-eração estratégica intra-grupo e a forma de prosseguir com os objetivos de mudança do status quo a nível económico e financeiro dominado por um conjunto es-pecífico de instituições ocidentais, como mencionado repetidas vezes pelos líderes individuais destes países, bem como no quadro da atuação multilateral BRICS. Uma das traves mestras da ação destes estados pren-de-se, deste modo, com a necessidade de reforma do sistema de governação global, assente em estruturas descritas como hegemónicas, como o Banco Mundi-al ou o Fundo Monetário Internacional. De acordo com os estados BRICS, estas estruturas financeiras ao serviço de grandes potências ocidentais, em par-ticular os Estados Unidos da América (EUA), servem apenas os interesses de alguns, revelando-se injus-tas e desiguais nos seus propósitos e atuação. Deste modo, a proposta alternativa que emergiu no seio dos BRICS revela a constituição de um sistema económi-co-financeiro alternativo, que se espelha na decisão1 Wilson, Dominic e Purushothaman, Roopa (2003) Dreaming with the BRICs: the path to

2050. Global Economic Paper 99. New York: Goldman Sachs.2 Putin, Vladimir (2014) Speech at BRICS Summit plenary session”, 16 julho, disponível em

http://www.embrussia.ru/node/355.

de criação de um Novo Banco de Desenvolvimen-to (acordado na 6ª Cimeira BRICS, em julho deste ano ), bem como de um Fundo de Contingência que permita liquidez a curto-prazo e consequen-temente assegure maior estabilidade financeira. A Rússia (o ‘R’ nos BRICS) tem sido um ator ativo neste projeto, em particular desde o outono de 2013 quando os acontecimentos na Ucrânia colocaram a descoberto as cisões e fricções existentes nas relações com a União Europeia (UE) e os EUA. O adensar da tensão nestas relações e a decisão de adoção de sanções por ambas as partes promoveu uma maior aproximação da Rússia a este grupo de estados numa lógica de alternativa necessária em termos de merca-dos, mas também de apoios políticos. Os novos acor-dos energéticos com a China, por exemplo, encaixam nesta política de recentragem de equilíbrios, sendo no entanto de salientar que esta não se assume como um parceiro verdadeiramente alternativo à UE, pelo menos nesta fase em que a União Europeia continua a ser o grande parceiro comercial da Rússia em ter-mos energéticos – as dependências mútuas UE-Rússia nesta matéria são conhecidas. Além do mais, é inter-essante notar o posicionamento dos estados BRICS face à questão da Ucrânia, e se não uma manifestação explícita de apoio, implicitamente a mesma tem sido veiculada, permitindo à Rússia encontrar um esteio de apoio num contexto difícil. Este não é um desen-volvimento surpreendente dado que um dos elementos aglutinadores deste grupo tem sido a contraposição ao ocidente e à ordem que este promove, pelo que esta é mais uma forma de resistência e de expressão de descontentamento (visível na reunião da Assem-bleia Geral das Nações Unidas neste outono de 2014).A Rússia tem-se assumido como um estado revi-sionista no sistema internacional, com a Ucrânia, 3 VI BRICS Summit, “Agreements”, 2014, disponível em http://www.brics6.itamaraty.gov.

br/agreements.4 Ver por exemplo Keck, Zachary (2014) “Why did BRICS back Russia on Crimea?”, The

Diplomat, 31 março.

DE FORA

O ‘R’ nos BRICS: Revisionismo, Resistência e Reafirmação

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e em particular a anexação da Crimeia, a constituir um exemplo claro da postura de maior assertividade das políticas russas. Este posicionamento revela duas facetas: por um lado resistência face a uma ordem que a Rússia considera como excludente, nomeadamente uma ‘Europa alargada’ onde a Rússia não se sente um parceiro de pleno direito. O apelo a uma ‘Euro-pa multipolar’, isto é, onde UE, Rússia e Turquia se inter-relacionem num registo de parceria, surge em paralelo ao reconhecimento da ordem internacional como policêntrica, onde desde logo a posição hege-mónica dos EUA em particular, é diminuída. No con-texto da Cimeira de Fortaleza de 2014, o presidente do Comité de Assuntos Internacionais da Duma, Alexei Pushkov comentava que “quando no ocidente se fala de que há um tipo de comunidade mundial que nos condena, querem na realidade dizer 28 estados mem-bros da Aliança Atlântica e da UE. Contudo, isto não é o mundo, mas o ocidente, a comunidade Euro-At-lântica. E é, com todo o seu peso, não toda a comu-nidade mundial, mas apenas uma parte desta”. Por outro lado, e relacionado com este ponto, assistimos a uma política de reafirmação da Rússia neste sistema internacional, e que passa não só pelo reconhecimento do seu estatuto enquanto grande potência, mas tam-bém pelo reforço deste nesta proposta de uma ordem

internacional alternativa, descrita como mais equita-tiva. No entanto, deve ser sublinhado que apesar do apoio mais ou menos explícito veiculado pelos esta-dos BRICS à Rússia no contexto da crise na Ucrânia, este não significa uma alteração nos alinhamentos ‘so-beranistas’ nestes estados, incluindo na própria Rús-sia. Ou seja, a normatividade implícita nas políticas e ações da Rússia em termos do seu alinhamento com princípios de respeito de soberania e integridade ter-ritorial, não ingerência, indivisibilidade da segurança e princípios fundamentais em termos de segurança internacional como plasmados na Carta das Nações Unidas é mantida como central à sua atuação. Assim, revisionismo, resistência e reafirmação são termos que coexistem nas políticas russas e que traduzem quer os seus objetivos fundamentais de política exter-na de forma mais genérica, quer os objetivos que esta promove no seio dos B‘R’ICS, de forma mais partic-ular. Sublinham ainda continuidade em termos dos alinhamentos fundamentais da política externa russa.

Maria Raquel Freire é professora auxiliar com agregação de Relações Internacionais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra

e investigadora do Centro de Estudos Sociais. É atualmente subdire-tora da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Os seus interesses de investigação centram-se em questões de política externa,

segurança internacional, estudos para a paz, Rússia e espaço pós-So-viético.

INFORMAÇÕES RÁPIDAS

Regime Político: Democracia Federal

Região Geográfica: Norte da Eurásia

População: 143.70 milhões de habitantes (trading economics; 2014)

Moeda Nacional: Rublo

PIB per capita: 6923 USD, (trading economics; DEC/2013)

Capital: Moscovo

Línguas Oficiais: Russo e 31 línguas co-oficiais

REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

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CRONOLOGIA10SET“Reino Unido: governo e oposição desembarcam na Escócia para tentarem evitar a independência”.

Euronews11SET“Russia faces new U.S., EU sanctions over Ukraine crisis”.

Reuters

13SET“EUA declaram-se em guerra contra o Estado Islâmico”.

Diário de Notícias

15SET“UN Takes Over C. African Republic Peacekeeping”

The Washington Post

16SET“EUA fazem 1º ataque ao Estado Islâmico perto de Bagdade”.

Diário de Notícias

18SET“Ultima sondagem dá vitória ao “não” no referen-do escocês”.

Público

19SET“Parlamento Europeu apoia coligação contra EI”.

Diário de Notícias

22SET“Estudantes Hong Kong boicotam aulas em protesto contra limitação à democ-racia”.

Público

Islamabad, Pakistan

“A displaced teenager sleeps outdoors to escape the heat in his home.”

Photograph: Muhammed Muheisen/AP

24SET“At U.N., Obama calls for unified approach to tack-le Islamic State, Ebola, Ukraine crisis”.

The Washington Post

25SET“Novo executivo palestinia-no vai finalmente governar a Faixa de Gaza”.

Público

30SET“Caças Britânicos lançam primeiro ataque contra posições islamitas no norte do Iraque”.

Euronews

Picture: REUTERS/Pilar Olivares“A boy throws electoral leaflets as residents wait in line to vote at the Rocinha slum in Rio de Janeiro October 5, 2014. Brazilians vote in the first round of general elections on Sunday.”

3OUT“Nine UN Peacekeepers from Niger killed in am-bush by rebels in Mali”.

The Guardian

7OUT“Conflict Armament Research: Armamento do Estado Islâmico vem dos EUA e da China”.

Diário de Notícias

9OUT“Ebola challenge ‘biggest since AIDS’”.

BBC News

13OUT“Se a Turquia não ajudar Kobani, curdos ameaçam romper negociações de paz”.

Público

14OUT“Rússia e China reforçam aliança contra o dólar e o euro”

Euronews

16OUT“Putin ameaça reduzir abastecimento de gás à Europa”

Euronews

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21OUT“Turquia cede o mínimo e insiste que os EUA estão a armar curdos ‘terroristas’”

Público

23OUT“Ébola já matou quase 5000 pessoas”

24OUT“Egypt declares state of emergency in Sinai”

AlJazeera

29OUT“NATO alerta para «níveis incomuns» de manobras militares russas no espaço europeu”

Público

02NOV“ONU lança ‘ultimato’ climático: o mundo tem 86 anos para reduzir a zero as emissoões poluentes”

Euronews

07NOV“Obama autoriza envio de mais 1500 militares para treinar curdos e iraquianos”

Diário de Notícias

11NOV“Guerras no Iraque e na Síria já fizeram 13,6 mil-hões de deslocados”

Diário de Notícias

“Cimeira dos países da região Ásia-Pacífico apro-funda integração económi-ca”

Euronews

14NOV“UN: ISIL committing war crimes in Syria”

AlJazeera“Ucrânia: Putin considera as sancões contra a Rússia ilegais”

16NOV“G20 commits to high-er growth, fight climate change; Russia isolated over Ukraine”

Reuters

20NOV“U.S. increasing non-lethal military aid to Ukraine”

Reuters

21NOV“Canadian vets plan to joint Kurdish fight against Islam-ic State”

Reuters

Picture: Evaristo Sá/AFP

“A “eleição da mudança” deu afinal a reeleição a Dilma Rous-seff A mais imprevisível e emocionante corrida presidencial do Brasil terminou com a vitória da candidata do Partido dos Tra-balhadores, que terá 16 anos consecutivos de governo.”

“U.S. President Barack Obama (C) gestures as he meets with European leaders to discuss the situation in Ukraine, at the G20 in Brisbane.”

Picture: Evaristo Sá/AFP

“A man walks past a graffiti, denouncing strikes by U.S. drones in Yemen, painted on a wall in Sanaa.”

Picture: REUTERS/Khaled Abdullah

Euronews

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Pag. 28 | PACTA

Quando abriram as candidaturas para Erasmus no meu segundo ano de faculdade, não hesitei e fui de imediato ver quais os países disponíveis para a minha licenciatura. Duas ofertas deixaram-me indecisa, mas acabei por fazer uma escolha, e essa escolha foi Itália – mais precisamente, a cidade de Florença. As burocracias começaram um ano antes, em Lisboa, no Iscsp – era necessário fazer o plano de estudos, ar-ranjar equivalências, explorar o site da faculdade de acolhimento… Nesse campo, o gabinete Erasmus do Iscsp foi sempre prestável e facilitou muito esta tarefa. Depois disso, só me restava esperar por 2014. Quando fiz a minha escolha, tive em conta que iria para fora no meu terceiro e último ano de licenciatura, e como se trata de um ano nostálgico (pelo menos para mim), optei por fazer o primeiro semestre em Lisboa e só partir no segundo para Florença. Hoje tenho noção que, se tivesse decidido ir no primeiro semestre, teria prolongado para o ano todo.

O mês de Fevereiro de 2014 chegou a correr e, após as malas e as despedidas (temporárias) terem sido feit-as, rumei àquela que chamam a cidade italiana rena-scentista – Florença. Seria a minha casa durante cinco meses, e posso garantir que realmente se tornou num lar. O mês de Fevereiro de 2014 chegou a correr e, após as malas e as despedidas (temporárias) terem sido feit-as, rumei àquela que chamam a cidade italiana rena-scentista – Florença. Seria a minha casa durante cinco meses, e posso garantir que realmente se tornou num lar. Os primeiros dias foram, meteorologicamente falan-do, terríveis: chuva imensa, dias cinzentos e escuros, frio de rachar. Mas isto não me pôde parar, pois ainda tinha uma casa para arranjar e de descobrir onde fica-va a faculdade, de forma a fazer o “check-in” nesta nova etapa académica. O primeiro contacto com a cidade foi positivo, mas tinha um elemento a meu favor – já sabia o básico da língua italiana. Porque no que toca a clichés, este está comprovadíssimo – em Itália, fala italiano. Florença é uma cidade muito turística e por isso est-ranhei ao início passear pelas ruas e ouvir tudo, menos italiano. Habituados a esta fama, os fiorentinos são muito simpáticos e prestáveis, mas convém falar-se em italiano. Se não for o caso, eles também são muito

EXPERIÊNCIA ERASMUS

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EXPERIÊNCIA ERASMUS

bons em mímica e língua gestual. Habituados a esta fama, os fiorentinos são muito simpáticos e prestáveis, mas convém falar-se em italiano. Se não for o caso, eles também são muito bons em mímica e língua gestual. Quando olho para trás, vejo a minha experiên-cia Erasmus como extremamente positiva, a vários níveis. Porém, no início, nem sempre é fácil. Como fui sozinha para lá, conhecer pessoas foi ligeiramente mais complicado, assim como arranjar casa. O que me chocou mais foi o gabinete Erasmus da faculdade italiana não falar inglês com os seus novos alunos in-ternacionais, dificultando e atrasando imenso toda a burocracia relacionada com o nosso período de estu-dos no estrangeiro. Passado pouco tempo percebi que não me podia ir-ritar com estas “pequenas” falhas burocráticas: bus-cava-se papel numa sala, preenchia-se, entregava-se noutro edifício. Chegava-se ao edifício, já estava fechado, pois só se trabalha três horas por dia, três vezes por semana. Mas isto é que é Erasmus – é conhecer uma nova cultura, novos hábitos, detectá-los, e viver de acordo com eles. “Em Itália, sê italiano”. Não há pressas. No que toca à parte dos estudos, tive muita sorte porque obtive equivalências a todas as cadeiras.

No meu caso, tinha duas cadeiras leccionadas em ital-iano e três em inglês. Claro que não é fácil aprender Direito ou História Militar em italiano, mas se uma pessoa for às aulas (o que em Erasmus nem sempre é fácil, havendo demasiadas tentações) e se mostrar empenho, os professores têm isso muito em conta. A maior diferença académica foi ao nível das aval-iações. Só tive um exame escrito, e os restantes foram orais – uma tradição italiana. Assusta um bocado ao início, mas por outro lado, despacha-se logo a cadeira e sabe-se imediatamente a nota. Outra diferença é o sistema das notas, que são sobre 30, o que, por vezes, pode dificultar a conversão. Deixando a parte escolar para trás, a experiência vale pela quantidade e diversidade de pessoas que se conhecem. Na mesma cidade, na mesma situação que eu, conheci desde espanhóis, franceses, alemães ou ingleses, a turcos, americanos, e, como não poderia deixar de ser, portugueses.Aquelas pessoas tornaram-se, durante cinco meses, a minha família. Aprendi palavras de diferentes países, costumes diversificados, provei comida de vários sí-tios… Quanto a italianos, aqueles com que mais contacto tive foram os que faziam parte das organizações Eras-mus.

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Estas organizações, para além de planearem festas (baratas, o que em Itália dá muito jeito), também pla-neavam jantares (o aperitivo, uma tradição que nasceu em Milão – que inclui um buffet de petiscos e uma bebida, normalmente generosa, pelo preço máximo de 10 euros) e viagens. A gastronomia é uma parte essencial da cultura de um país, principalmente se esse país for Itália. Escu-sado será dizer que as melhores pizzas que comi na minha vida foram durante estes meses, que as mas-sas são de deixar água na boca e que os gelados são de chorar por mais. Os quilinhos a mais com que re-gressei a Portugal eram quilos que simbolizavam a minha felicidade por ter tido a oportunidade de viver em Florença (ou pelo menos é a desculpa que dou a mim mesma). Pude conhecer tantas cidades italianas, tais como a mítica Veneza, a académica Bolonha, a histórica Roma, a impressionante cidade de Milão, a belíssima ilha da Sicília… Porém, acho que a viagem que me marcou mais, a que mais me surpreendeu foi Cinqueterre – um conjunto de cinco vilas costeiras na Toscânia, caracterizadas pela sua paisagem verde e montanhosa, pelas suas praias azuis e pelas casas col-oridas – uma verdadeira delícia para os olhos. Quanto a Florença, acho que continua a ser a minha cidade italiana favorita. Aliás, é muito difícil

chegar-lhe aos “calcanhares”. Quando se passeia pela rua, podemos perfeitamente imaginar-nos no Renascimento, a viver sob o coman-do da família Medici. É uma cidade rica em arte, ar-quitectura, gastronomia. Os seus palacetes a cada es-quina embelezam qualquer dia menos bom, as pontes ao longo do rio tornam tudo mais agradável, o sino das bicicletas e os músicos derua são banda sonora. Há tanto por onde escolher: museus, jardins, palácios, artesãos, estátuas ao ar livre! E se tudo isto não for o suficiente para alegrar a alma, há sempre uma piz-zaria, uma gelataria artesanal ou um crepe com nutella por perto…Peché la vita è bella! A experiência Erasmus é muito mais do que académi-ca – é uma oportunidade de conhecer um país dif-erente, conhecer novas culturas e novas pessoas, de ultrapassar obstáculos; é aprender a lidar com novos cenários, tanto profissionais como pessoais. É dar a conhecer o meu país lá fora e ter orgulho nisso, é aper-ceber-me que adoro Portugal. Erasmus é crescer para ser mais solidário, mais tolerante, mais rico pessoal-mente. Mas, digam o que disserem, Erasmus é essen-cialmente voltar uma pessoa muito mais feliz.“Erasmus is not a year in your life, but a life in one year”.

Carolina Brito CecílioLicenciada em Relações Internacionais no ISCSP-UL

CONTINUAÇÃO ...

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