Padrões de Mobilidade e Crescimento Urbano · Taxa de motorização e consumo de combustíveis ......
Transcript of Padrões de Mobilidade e Crescimento Urbano · Taxa de motorização e consumo de combustíveis ......
Padrões de Mobilidade e Crescimento Urbano
Análise Comparativa entre Lisboa e Florianópolis
Madalena Sottomayor Machado Costa e Silva
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Engenharia Civil
Orientador: Professor Doutor Fernando José Silva e Nunes da Silva
Júri
Presidente: Professor Doutor João Torres de Quinhones Levy
Orientador: Professor Doutor Fernando José Silva e Nunes da Silva
Vogal: Professor Doutor Filipe Manuel Mercier Vilaça e Moura
Julho de 2015
I
Agradecimentos
A realização deste trabalho só foi possível com o apoio de várias pessoas, às quais gostaria de
expressar os meus sinceros agradecimentos, em particular:
Ao Professor Doutor Fernando Nunes da Silva, meu orientador neste trabalho, por todo o apoio,
disponibilidade, motivação e positivismo transmitidos. Pelo seu valioso conhecimento e
conselhos transmitidos ao longo da realização deste trabalho.
Ao Professor Doutor Acires Dias, Professor Titular de Engenharia Mecânica na Universidade
Federal de Santa Catarina, por todo o apoio, disponibilidade e simpatia demonstrados durante a
minha estadia em Florianópolis.
À Professora Doutora Dora Orth, Professora Associada na Universidade Federal de Santa
Catarina, pela ajuda e informação disponibilizada que tanto me ajudou durante este trabalho.
Ao Engenheiro Gonçalo Caiado, da Câmara Municipal de Lisboa pelos dados disponibilizados e
apoio na compreensão da mobilidade em Lisboa.
À minha família e amigos por todo o apoio dado.
III
Resumo
Ao longo do presente trabalho pretende-se estudar a mobilidade em duas cidades
bastante distintas, Lisboa e Florianópolis, comparar os seus padrões de mobilidade, retirar
algumas conclusões quanto aos caminhos a prosseguir e verificar se é possível aproveitar alguns
ensinamentos do passado recente, se uma cidade de um país emergente pode retirar exemplos
da história de uma cidade antiga europeia. Começa-se por identificar as características
demográficas e socioeconómicas de cada cidade, analisar os padrões de mobilidade, a rede
viária e o seu desempenho, a rede de transportes coletivos e a comparação entre estes aspetos
das duas cidades. No final pretende-se sugerir algumas orientações para o futuro ou propor
soluções que possam ser usadas como base para a melhoria das condições de mobilidade
urbana.
Palavras-Chave
Mobilidade urbana, Lisboa, Florianópolis, Transportes, Cidades
V
Abstract
Throughout this research we will study the mobility in two very different cities, Lisbon and
Florianopolis, compare their mobility patterns, draw some conclusions about the future and see if
you can take some lessons from the recent past, if a city of an emerging country can take
examples from the history of a European old city. We begin by identifying the demographic and
socio-economic characteristics of each city, analyzing the mobility patterns, the road network and
its performance, the network of public transport and compare these aspects of the two cities. In
the end it is intended to suggest some directions for the future and to propose solutions that can
be used as a basis for improvement of urban mobility.
Keywords
Urban Mobility, Lisbon, Florianopolis, Transports, Cities
VII
Lista de Abreviaturas
AMF – Área Metropolitana de Florianópolis
AML – Área Metropolitana de Lisboa
CML – Câmara Municipal de Lisboa
CREL – Circular Regional Exterior de Lisboa
CRIL – Circular Regional Interior de Lisboa
Detran/SC – Departamento Estadual de Trânsito de Santa Catarina
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
IMT – Instituto da Mobilidade e dos Transportes
INE – Instituto Nacional de Estatística
IPUF – Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis
PIB – Produto Interno Bruto
TC – Transporte Coletivo
TI – Transporte Individual
TMDA – Tráfego Médio Diário Anual
TP – Transporte Público
IX
Índice Geral
1 - Introdução .......................................................................................................................... 1
Enquadramento e pertinência do tema ......................................................................... 1
Objetivos ........................................................................................................................ 2
Estrutura da dissertação ............................................................................................... 3
2 - Metodologia e Ponto de Partida ........................................................................................ 4
Metodologia ................................................................................................................... 4
Questões essenciais da mobilidade urbana ................................................................. 4
Evolução urbana e sistemas de acessibilidades ........................................................... 6
2.3.1 - Lisboa .................................................................................................................... 6
2.3.2 - Florianópolis .......................................................................................................... 9
3 - A procura de transportes ................................................................................................. 11
Caracterização demográfica e socioeconómica ......................................................... 11
3.1.1 - Evolução da população e densidades ................................................................. 11
3.1.2 - Emprego e pólos geradores de tráfego ............................................................... 16
Taxa de motorização e consumo de combustíveis ..................................................... 19
Repartição Modal ........................................................................................................ 22
Utilizadores do TC e evolução da procura .................................................................. 25
Modos Suaves ............................................................................................................. 26
4 - A oferta de transportes .................................................................................................... 34
Rede rodoviária e estacionamento .............................................................................. 34
4.1.1 - As redes rodoviárias e a sua cobertura espacial ................................................ 34
4.1.2 - Desempenho das redes ...................................................................................... 42
4.1.3 - Estacionamento ................................................................................................... 48
Redes de transporte coletivo ....................................................................................... 53
4.2.1 - As ligações metropolitanas/regionais .................................................................. 53
4.2.2 - Organização das redes de TC urbanas .............................................................. 56
4.2.3 - Entidades Reguladoras e Sistema Tarifário ........................................................ 61
4.2.4 - Desempenho das Redes ..................................................................................... 63
5 - Comparação dos dois casos de estudo .......................................................................... 66
X
O Sistema de Acessibilidades e a Evolução do Espaço Urbano ................................ 66
5.2 - Principais Problemas ................................................................................................... 71
Possíveis soluções ...................................................................................................... 75
6 - Conclusões ...................................................................................................................... 81
Referências Bibliográficas ........................................................................................................... 86
XII
Índice de Figuras
Figura 2-1: Formação inicial de Lisboa na colina de S. Jorge 6
Figura 2-2: Crescimento da cidade de Lisboa 7
Figura 2-3: Pormenor da Baixa Pombalina do lado esquerdo, de malha ortogonal, com a zona do
Castelo, de malha irregular 8
Figura 2-4: Variação da população residente nos municípios da AML entre 2001 e 2011 8
Figura 2-5: Crescimento da cidade de Florianópolis 9
Figura 2-6: Mancha urbana da AMF com destaque para a zona do Centro e do Campeche 10
Figura 2-7: Pormenor da malha urbana no Centro de Florianópolis 10
Figura 2-8: Pormenor da malha urbana na zona do Campeche 10
Figura 3-1: Divisão do concelho de Lisboa por freguesias (Fonte: CML) 11
Figura 3-2: Divisão do município de Florianópolis em distritos 11
Figura 3-3: Distribuição da população residente nas freguesias de Lisboa (adaptado pela autora)
12
Figura 3-4: Distribuição da população residente nos distritos de Florianópolis (adaptado pela
autora) 12
Figura 3-5: Gráfico da evolução da população em Lisboa e Florianópolis 13
Figura 3-6: Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade, em Florianópolis
(Fonte: IBGE, 2010) 15
Figura 3-7: Distribuição da população por sexo, segundo a idade, em Lisboa (Fonte: INE, 2011)
15
Figura 3-8: Densidade populacional de Florianópolis (adaptado pela autora) 16
Figura 3-9: Densidade populacional de Lisboa (adaptado pela autora) 16
Figura 3-10: Gráfico da evolução do emprego em Lisboa entre 1995 e 2011 17
Figura 3-11: Gráfico da evolução do PIB em Lisboa entre 1995 e 2011 17
Figura 3-12: Evolução do emprego em Florianópolis entre 1991 e 2005 17
Figura 3-13: Gráfico da evolução do PIB em Florianópolis entre 2002 e 2010 17
Figura 3-14: Rota da Inovação que inclui aeroporto, universidades, parques tecnológicos, centros
empresariais e órgãos do governo 18
Figura 3-15: Localização dos principais pólos geradores de tráfego e atividades económicas
(Fonte: Floripa 2030) 18
Figura 3-16: Principais pólos geradores de tráfego em Lisboa 19
Figura 3-17: Evolução da taxa de motorização em Lisboa e na AML 20
Figura 3-18: Evolução da frota de veículos na Grande Florianópolis 20
Figura 3-19: Evolução do consumo de combustível no transporte rodoviário de passageiros em
Santa Catarina (Fonte: SINDICOM, 2012) 21
Figura 3-20: Venda de combustíveis em Portugal (Fonte: PORDATA, 2012) 21
Figura 3-21: Repartição modal em Florianópolis (Fonte: Plamus, 2014) 24
Figura 3-22: Percentual do automóvel no total de viagens em várias cidades 25
XIII
Figura 3-23: Tempo de viagem por distância percorrida por modo (Fonte: EC, 2000) 26
Figura 3-24: Mapa de Potencial Pedonal de Lisboa (Fonte: CML, 2013) 27
Figura 3-25: Identificação das zonas com maior potencial pedonal em Florianópolis 28
Figura 3-26: Mapa de Potencial Pedonal de Lisboa (Fonte: CML, 2013) 28
Figura 3-27: Avenida da Liberdade, um exemplo de boas condições para o modo pedonal (Fonte:
http://expatinlisbon.com/2011/10/28/lisbon-random-photos-and-memories/) 29
Figura 3-28: Avenida Mauro Ramos 30
Figura 3-29: Rua Dep. Antônio Edu Vieira, junto à UFSC 30
Figura 3-30: Rede de Percursos e Corredores em Lisboa (Fonte: CML, 2013) 30
Figura 3-31: Avenida Duque de Ávila 31
Figura 3-32: Rede Ciclável de Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015) 31
Figura 3-33: Raio alcançável por modos pedonais e de bicicleta no Centro de Florianópolis 32
Figura 3-34: Raio alcançável por modos pedonais e de bicicleta no centro de Lisboa (Fonte:
Google Maps, 2008, adaptado pela autora) 32
Figura 4-1: Variação do TMDA entre 2009 e 2013 nos principais eixos de acesso a Lisboa (nos
dois sentidos, todos os dias) 35
Figura 4-2: Rede viária da cidade de Lisboa (Fonte: CML, 2012) 37
Figura 4-3: Variação do tráfego médio horário (Fonte: Brito, J.M. (2010). Caracterização da
flutuação do tráfego na cidade de Lisboa, FCT) 38
Figura 4-4: Relação entre municípios vizinhos e Florianópolis 39
Figura 4-5: Volume de entrada em Florianópolis através das pontes (nos dois sentidos, durante
todo o dia) (Fonte: Plamus, 2015) 40
Figura 4-6: Matriz Origem-Destino dos movimentos pendulares nos quatro maiores municípios
da AMF 40
Figura 4-7: Distribuição horária das viagens por modo em Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015)
41
Figura 4-8: Hierarquização da rede viária de Florianópolis (Fonte: PDM de Florianópolis) 41
Figura 4-9: Principais carências na rede viária de Lisboa (adaptado pela autora) 43
Figura 4-10: Principais carências na rede viária de Florianópolis (adaptado pela autora) 44
Figura 4-11: Nível de Saturação da rede viária de Lisboa na hora de ponta da manhã 45
Figura 4-12: Pormenor do Nível de Saturação da rede viária no centro de Lisboa na hora de ponta
da manhã 45
Figura 4-13: Nível de Saturação da rede viária de Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015) 46
Figura 4-14: Pormenor dos Níveis de Saturação da rede viária no centro de Florianópolis 47
Figura 4-15: Repartição modal em função da disponibilidade de estacionamento no local de
trabalho 49
Figura 4-16: Evolução da procura diária de estacionamento ao longo do dia em Lisboa (Fonte:
TIS, Inquérito à mobilidade 2003/2004) 49
Figura 4-17: Tarifários na via pública: zona verde, amarela e encarnada 50
XIV
Figura 4-18: Localização do Sistema Zonal Azul em Florianópolis (Fonte: minhavaga.com.br) 51
Figura 4-19: Área de influência das principais operadoras de TC na AMF 54
Figura 4-20: Linhas ferroviárias com ligação a Lisboa (Fonte: CP, 2010) 55
Figura 4-21: Linhas de transporte fluvial com ligação a Lisboa 56
Figura 4-22: Evolução da procura no Metro e Carris entre 2004 e 2012 (Fonte:Transportes de
Lisboa, 2012) 57
Figura 4-23: Mapa das linhas de Metro em Lisboa 57
Figura 4-24: Mapa da rede de autocarros em Lisboa (Fonte: CARRIS, 2015) 58
Figura 4-25: Localização dos terminais de integração e das principais linhas de autocarros 59
Figura 4-26: Organização institucional dos transportes em Portugal 61
Figura 5-1: Modelo de transição da mobilidade individual 66
Figura 5-2: Desenvolvimento metropolitano nas aglomerações urbanas (Fonte: TAAFFE et al.,
1996: 178) 69
XV
Índice de Quadros
Quadro 3.1: Evolução da população em Florianópolis, AMF e no Brasil entre 1990 e 2010 ..... 13
Quadro 3.2: Evolução da população em Lisboa, AML e em Portugal entre 1991 e 2011 .......... 13
Quadro 3.3: Repartição modal das deslocações na AML por motivo de emprego e estudo...... 23
Quadro 4.1: Evolução do TMDA de 2009 a 2013 nos principais eixos de acesso a Lisboa (nos
dois sentidos, todos os dias) ....................................................................................................... 36
Quadro 4.2: Matriz Origem-Destino dos movimentos pendulares na AML em 2011 ................. 36
Quadro 4.3: Repartição modal das deslocações interconcelhias e intraconcelhias na AML por
motivo de emprego e estudo (Fonte: INE 1991, 2001 e 2011, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo
Caiado da CML) .......................................................................................................................... 37
Quadro 4.4: Tarifário em vigor em cada zona de estacionamento por período de tempo (Fonte:
EMEL, 2015) ................................................................................................................................ 50
Quadro 4.5: Principais características das operadoras de TC na AML (Fonte: AMTL, 2010) ... 53
Quadro 4.6: Parâmetros operacionais do Sistema de Transporte Coletivo em Florianópolis .... 60
Quadro 5.1: Principais indicadores de comparação da mobilidade urbana nas duas cidades .. 74
1
1 - Introdução
Enquadramento e pertinência do tema
Entre 1850 e 1900, cerca de 60 milhões de pessoas migraram da Europa para a América
do Sul, fazendo com que a população brasileira crescesse exponencialmente. Na década de
1970 o Brasil apresentava uma população de 90 milhões de habitantes, sendo que em 35 anos
esse valor mudou para o dobro e, só entre 2000 e 2005, aumentou em 10 milhões de pessoas.
É pertinente colocar a questão do que teria acontecido com o sistema urbano europeu se esta
migração não tivesse ocorrido. Livi Bacci (1999) aborda este assunto, fazendo a seguinte
afirmação:
“¿Que habría sido de Europa sin América, y qué habría sido de América sin Europa? Que
quede bien claro que es una pregunta que un estudioso no debería plantearse nunca...”
Enquanto que em 1900 a população europeia representava 25% da população mundial,
atualmente ambos os continentes estão quase par a par. Assim, quando se compara o espaço
latino-americano com o europeu é possível identificar semelhanças e diferenças existentes entre
os dois, como por exemplo a influência que as reformas de Haussmann em Paris tiveram nas
cidades brasileiras, ou como os poderes públicos brasileiros tentaram imitar e construir espaços
à semelhança das cidades europeias através da imposição de grandes planos (Medrano, 2006).
Apesar de existirem variadas publicações e produções sobre o crescimento e mobilidade
urbana tanto do Brasil como da Europa, ainda há uma grande carência de estudos comparativos
entre cidades.
A comparação de duas cidades permite encontrar as generalidades que caracterizam
um sistema de mobilidade e avaliar e comparar os modelos em ambas as cidades, identificando
vantagens e desvantagens de ambos.
Deste modo, ao promover um estudo que englobe países inseridos em contextos tão
distintos como é o caso de Brasil e Portugal, procura-se compartilhar as experiências de ambos
no processo de desenvolvimento e gestão da mobilidade urbana. A experiência de Portugal no
contexto da União Europeia, onde a implementação do conceito de mobilidade sustentável já se
encontra bastante desenvolvido, pode ser uma grande valia para a realidade brasileira, onde
este ainda é pouco explorado. O Brasil, por outro lado, pode contribuir com a sua experiência na
gestão de cidades médias que têm experimentado um rápido crescimento em pouco tempo, além
do conhecimento de questões relacionadas com a metropolização de centros urbanos,
contribuindo para o diagnóstico e antecipação de soluções para problemas ainda não
observados nas cidades portuguesas (Costa, 2003).
Pretende-se assim mostrar o interesse na análise comparativa da mobilidade entre
Florianópolis e Lisboa. Ao analisar a história de uma cidade europeia tem-se uma ideia da
2
evolução da mobilidade nas cidades e quais os exemplos a seguir ou não, pois foi aqui que a
força do movimento sindical do pós-guerra e as ideias dos governos conduziram ao progressivo
desenvolvimento de políticas públicas de transportes e mobilidade que nunca deixaram de ter
em conta o seu caráter social e, portanto, de se orientarem para satisfazer as necessidades
básicas de deslocação da população.
No entanto, tentar transpor para os países emergentes as mesmas estratégias que estão
atualmente em curso nos países onde as diferenças sociais e de rendimento não são tão
extremadas, onde a motorização individual ultrapassou já a fase de “deslumbramento” pelo
automóvel e onde a consciência coletiva dos seus impactos propicia o desenvolvimento de
políticas de mobilidade mais equilibradas e mais atentas aos problemas ambientais e à coesão
social, só poderá esbarrar na oposição da maioria dos decisores públicos e deixar ao setor
privado a organização e exploração da oferta do transporte público.
Os resultados deverão contribuir para avaliar o estado do sistema de mobilidade urbana
de cada uma destas cidades e ser uma ferramenta de apoio a possíveis soluções no futuro desta
área.
Objetivos
Os objetivos da presente dissertação são:
Contribuir para a identificação dos principais elementos caracterizadores e atributos
relacionados com a mobilidade urbana;
Caracterizar o sistema de mobilidade da cidade de Florianópolis e de Lisboa;
Promover um estudo comparativo, avaliando o nível de informação sobre os contextos
urbanos (ou seja, dados estatísticos e informações que caracterizem aspetos
geográficos, demográficos, socioeconómicos ou ambientais);
Equacionar soluções para as áreas de estudo que possam contribuir para o
desenvolvimento de um sistema de mobilidade e transportes mais sustentável;
Exemplificar como duas cidades opostas podem ilustrar os diversos desafios que a
mobilidade urbana atual enfrenta;
Demonstrar a possibilidade de transferibilidade de soluções de uma cidade para outra.
3
Estrutura da dissertação
A presente dissertação está dividida em seis capítulos.
O primeiro capítulo corresponde à introdução, e neste é efetuado o enquadramento do tema, a
descrição do problema, a enunciação dos objetivos a alcançar e a estruturação da dissertação.
O segundo capítulo refere-se à descrição da metodologia do trabalho, com definição dos
conceitos essenciais da mobilidade urbana e breve exposição da evolução urbana e sistema de
acessibilidades da cidade de Lisboa e de Florianópolis, essenciais para a compreensão da
evolução do sistema de mobilidade em cada uma.
No terceiro capítulo realiza-se uma caracterização da procura de transportes, das características
demográficas e socioeconómicas de ambas as cidades, definindo o zonamento adotado, a
evolução da população, a sua distribuição por grupos etários e espacial e a verificação do
desenvolvimento económico e da taxa de motorização. Revela-se a repartição modal e os traços
dos utilizadores do transporte coletivo e dos modos suaves.
O quarto capítulo diz respeito à análise da oferta de transportes, tanto das redes rodoviárias
como das redes de transporte coletivo. São estudados os principais fluxos e o desempenho das
redes, analisando carências e desempenhando uma leitura crítica do sistema atual.
No quinto capítulo cumpre-se um dos objetivos principais deste trabalho, efetuando a
comparação dos dois casos de estudo, descrevendo-se as similitudes e as grandes diferenças
para todos os temas tratados ao longo do trabalho. É demonstrada como a evolução das
infraestruturas e sistemas de transportes influenciaram a evolução da ocupação urbana nas duas
cidades e apresentam-se hipóteses alternativas a explorar e apreciações críticas do grau de
dificuldade das mesmas, de tal modo que a sua aplicação pode provocar mudanças estruturais
significativas na rede de mobilidade urbana.
O último capítulo contém as conclusões e contribuições para pesquisas futuras.
4
2 - Metodologia e Ponto de Partida
Metodologia
O presente trabalho será desenvolvido primariamente com base em investigação e
análises teóricas e trabalho de campo, nomeadamente entrevistas a personalidades da área e
análise de fontes textuais especializadas.
Tendo em conta os objetivos e finalidades deste estudo, do ponto de vista da abordagem,
optou-se por realizar uma pesquisa de natureza quantitativa, usando modelos estatísticos para
explicar os dados obtidos. Os dados apoiam-se em investigações teóricas, análises sociológicas
e consultas a especialistas.
Visto que em Florianópolis ainda são escassas as fontes textuais e de dados sobre a
mobilidade urbana, para esta cidade os dados recolhidos foram maioritariamente obtidos através
de entrevistas a personalidades especializadas no tema. Em Lisboa, a investigação baseia-se
na obtenção de soluções fiáveis para os problemas expostos, através de recolhas planeadas,
sistemáticas e respetiva interpretação de dados. Deste modo, pretende-se incrementar o
conhecimento no tema a estudar apresentando dados fiáveis.
Ambos os métodos foram apoiados em bibliografia técnica e científica, quando
disponível, para assegurar a cobertura e atualidade do conhecimento mobilizado para a
resolução do problema.
Com base na pesquisa bibliográfica e análise de elementos teóricos sobre a mobilidade
urbana, foram definidos os principais aspetos que a condicionam e caracterizam, desde os
relacionados com o sistema de transportes e acessibilidades, aos urbanísticos e
socioeconómicos. Com base nestes elementos foi identificada uma grelha de análise que
permitiu construir um quadro comparativo das duas cidades em estudo no que se refere ao tema
da mobilidade urbana. A esta fase de caracterização do problema e do contexto em que se
desenvolve, seguiu-se a análise das experiências e soluções propostas para resolver ou minorar
os problemas identificados neste domínio, bem como a avaliação dos resultados obtidos. Tendo
por base o tipo de problema detetado em cada cidade e as soluções que foram adotadas em
Lisboa, procurou-se então analisar de que modo estas poderiam ser replicadas em Florianópolis
e em que condições particulares.
Questões essenciais da mobilidade urbana
Os transportes têm sempre estado interligados ao desenvolvimento urbano, sendo uns
dos principais promotores do crescimento das cidades, de atividades comerciais, do acesso aos
serviços de saúde e da educação e lazer. Contribuem para a correção das assimetrias sociais
no acesso a bens e serviços e do ordenamento do território, permitem uma maior equidade
territorial no acesso aos equipamentos não situados nos locais de procura, uma melhor e mais
5
rápida mobilidade de pessoas, bens e serviços e contribuem para a redução das assimetrias
socioeconómicas regionais.
Costa (2003) destaca a relação entre a mobilidade, o desenvolvimento económico e a
sustentabilidade socio ambiental do contexto urbano, referindo alguns dos aspetos essenciais
para um sistema de mobilidade sustentável: equilíbrio entre meios motorizados e não
motorizados, o planeamento sobre a demanda e oferta de transporte, a integração do sistema
de transporte com o plano de ocupação e uso do solo, entre outros.
Segundo a LEI N.º 12.587 da Política Nacional de Mobilidade Urbana do Brasil, a
mobilidade pode, então, ser entendida como a possibilidade de deslocação de um local para o
outro, ou seja, as condições em que se realizam as deslocações de pessoas e cargas no espaço
urbano. A mobilidade urbana pode ser considerada como um conjunto estruturado de modos,
redes e infraestrutura, constituindo um sistema complexo. Assim, um facto determinante para a
performance do sistema é o modo como as diversas partes constituintes se interligam, o que
está diretamente relacionado com o nível de interação e compatibilidade entre agentes e
processos intervenientes no sistema (Macário, 2004).
A mobilidade urbana adequada é obtida por meio de políticas de transporte e circulação
que visam a melhoria da acessibilidade e mobilidade das pessoas e cargas no espaço urbano,
através da priorização dos modos de transporte coletivo e não motorizados de maneira eficiente,
socialmente inclusiva e ecologicamente sustentável (Gollnick, 2010).
A melhoria da mobilidade é um dos instrumentos mais importantes de que se dispõe para
conseguir criar um ambiente de maior justiça social e equilíbrio territorial. A maior ou menor
facilidade de realizar deslocações para as diversas atividades diárias, bem como o acesso a
mercadorias e serviços, reflete diretamente na satisfação das pessoas quanto ao nível de
desenvolvimento econômico e social da sociedade na qual estão inseridas (Ferraz & Torrez,
2005).
Os Poderes Públicos, as Universidades, as empresas, as entidades representativas,
profissionais, setoriais e todos os envolvidos, devem trabalhar em conjunto para se poder
alcançar uma harmonia nas relações pessoais, graças à disponibilidade de condições para uma
“Mobilidade eficiente” (RUITEM-IFHP, 2014). No entanto, é necessário estar consciente que as
mudanças ao longo do tempo não se produzem todas ao mesmo ritmo, nem para todas as
pessoas e muito menos para todos os lugares. As mudanças são próprias de cada situação, de
cada contexto, assim como a sua velocidade de implementação.
A definição de uma política de mobilidade urbana é um tema complexo dado que está
relacionado com as características específicas do local e das respetivas prioridades políticas,
que podem variar entre localidades dentro do mesmo país e até entre comunidades servidas
pelo mesmo sistema de mobilidade. A política de mobilidade urbana funciona melhor quando é
dada pelo resultado de diferentes experiências de modelos regulamentares e organizacionais e
6
até mesmo quando é do domínio das várias entidades que providenciam os serviços de
mobilidade (Macário, 2004).
Com este aspeto em vista, antes de ser efetuada qualquer alteração no paradigma de
deslocações numa cidade é necessário conhecer como a mesma funciona, por que tipo de
pessoas é composta, quais as deslocações que estas efetuam e qual o futuro previsto para a
cidade. Não é possível pensar na modificação da mobilidade urbana sem antes conhecer todo o
comportamento da cidade.
Tanto o traçado como a disposição das ruas afetam a mobilidade e a dinâmica
socioeconómica. Assim, torna-se necessário analisar o traçado e desenvolvimento urbano das
duas cidades. Segundo Medeiros, cidades com baixo nível de integração espacial tendem a
enfrentar problemas, como maior disparidade social, transporte caro e queda no nível de
produtividade, pois gasta-se mais tempo na deslocação do que na geração de riquezas.
Evolução urbana e sistemas de acessibilidades
2.3.1 - Lisboa
Lisboa nasceu na colina do castelo de S. Jorge pelas mãos do povo romano. A sua
função de defesa estratégica resulta do reflexo do terreno e da proteção natural perante o
estuário do Tejo e o braço deste rio que então se desenvolvia a ocidente e penetrava
profundamente no território, como se observa na Figura 2-1.
Com a entrada de D. Afonso Henriques na cidade, esta expande-se para além das
muralhas nascendo então duas das zonas mais importantes da cidade: a Baixa e Alfama. É
também por volta desta altura que o braço do rio desaparece definitivamente.
Lisboa continua a crescer à volta da colina do castelo, começando a ocupar os campos
agrícolas com urbanização, face ao contínuo aumento de população. Surge o Bairro Alto, na
Figura 2-1: Formação inicial de Lisboa na colina de S. Jorge (Fonte: CML)
7
passagem para o séc. XVII, marcando a aquisição de uma consciência urbanística e
arquitetónica (CML, 2015). Esta parte da cidade apresenta uma forma orgânica de malha
irregular.
A cidade, por volta de 1750, tem uma forma grosseiramente retangular alongada no
sentido do rio mas, nos finais do século XIX, esta direção é abandonada em favor da expansão
para Norte.
O processo de expansão, realizado em várias etapas, é desencadeado pela abertura das
chamadas Avenidas Novas, consolidando a ocupação do planalto com traçados ortogonais fruto
de um planeamento prévio (Barata Salgueiro, 2002). A Baixa apresenta também este tipo de
traçado decorrente da sua reconstrução após o terramoto de 1755. As praças têm um papel
fundamental, têm um potencial articulador da malha urbana, estabelecem profundas relações
com o resto da cidade e são tidas como pontos de referência e de chegada de outros focos de
Lisboa. A morfologia do tecido urbano de Lisboa caracteriza-se por uma integração de planos
concebidos de raiz, como o caso da Baixa Pombalina e da Avenida da Liberdade, com uma
malha urbana orgânica resultado do crescimento da cidade.
Depois da segunda guerra mundial a mancha construída estende-se para fora dos limites
administrativos da cidade nomeadamente ao longo das linhas de transporte. O comboio levou a
um crescimento suburbano radial enquanto na margem sul crescem núcleos em torno dos cais
fluviais que asseguram as ligações mais rápidas com Lisboa (Cacilhas, Barreiro, Seixal) e
desenvolvem-se polos industriais (Barata Salgueiro, 2002).
1994 2008
Figura 2-2: Crescimento da cidade de Lisboa (Fonte: Barata Salgueiro (2001). Lisboa, Periferia e Centralidades, Celta, Oeiras, pp.33; adaptado
pela autora)
8
As alterações nas acessibilidades, com a construção de vias rápidas, ponte Vasco da
Gama, comboio na ponte 25 de Abril e outras, traduziram-se na dispersão da metropolização, ou
seja, o município de Lisboa começou a perder população para os municípios em seu redor.
Pela Figura 2-4 verifica-se que o município de Lisboa continua a perder população, cerca
de -3,4%, enquanto os restantes municípios apresentam crescimento, destacando-se, com
variações positivas superiores a 20%, os municípios de Mafra, Alcochete, Montijo, Sesimbra e
Cascais (INE, 2011).
Figura 2-3: Pormenor da Baixa Pombalina do lado esquerdo, de malha ortogonal, com a zona do Castelo, de
malha irregular
Figura 2-4: Variação da população residente nos municípios da AML entre 2001 e 2011 (Fonte: INE, 2011)
9
2.3.2 - Florianópolis
A ocupação de Florianópolis pelos portugueses deu-se por volta de 1600, quando a
população nativa deste local era ainda formada por indígenas.
O modo como a ilha vai sendo habitada obedece ao mesmo padrão de ocupação
portuguesa. Ocorre primeiro junto às fontes de água, estendendo-se na direção da praia da Boa
Vista, atual centro da cidade. As ruas desenvolveram-se perpendiculares ao litoral com ruas de
atravessamento fazendo a ligação entre elas, criando uma malha ortogonal. A Póvoa de Nossa
Senhora do Desterro, primeiro nome da capital do Estado de Santa Catarina, tinha uma função
estratégica militar pois estava localizada entre as duas principais cidades da época: Rio de
Janeiro e Buenos Aires (Caruso, 1983). A maior parte da população residente encontrava-se no
centro da vila, sendo que as restantes residências localizavam-se próximas à costa, mas
espalhadas pela ilha.
No século XVIII Portugal tomou a iniciativa para uma ocupação efetiva da Ilha de Santa
Catarina. O objetivo era assegurar o território conquistado, evitando assim, o domínio espanhol
da área. Entre 1748 e 1756 é registada a chegada de cerca de cinco mil imigrantes ao Desterro,
vindos das Ilhas dos Açores e da Madeira. Muitos imigrantes assentaram no centro, mas outras
famílias estabelecem-se no interior da ilha. As famílias açorianas fundaram diversas freguesias
como, por exemplo: a freguesia do Ribeirão da Ilha no sul da Ilha, a freguesia de São João do
Rio Vermelho no Norte, a freguesia de Santo Antônio de Lisboa no Oeste e a freguesia da Lagoa
da Conceição no Leste (Fuhr & Dal Santo, 2009).
1950 1970 1990
2000 2010
Figura 2-5: Crescimento da cidade de Florianópolis (Fonte: Plamus)
10
O relevo local definiu o traçado da cidade, sendo um elemento definidor das vias e
praças, orientando o crescimento e sua consolidação. A mancha urbana é descontínua, derivada
de feições geomórficas dinâmicas. Como se pode observar pela Figura 2-6, no continente a
mancha urbana é bastante concentrada e pela Figura 2-7 observa-se que tem uma malha
ortogonal. Por outro lado, na ilha a mancha urbana é mais concentrada junto ao litoral, sendo
que no interior não existe urbanização uma vez que é nesse local que o relevo é mais acidentado,
o solo não é propício à construção ou é onde estão situadas as lagoas. Nessas zonas no litoral
a malha urbana é em espinha, caracterizada por várias ruas longas paralelas entre si e que se
ligam a uma rua comum principal perpendicular. Este tipo de malha urbana em espinha pode ser
bem observado na no Campeche (Figura 2-8).
Uma das principais características da Ilha de Santa Catarina é a classificação de 42%
do seu território como Área de Preservação Permanente.
Figura 2-7: Pormenor da malha urbana no Centro de Florianópolis (Fonte: Google Maps (2015))
Figura 2-8: Pormenor da malha urbana na zona do Campeche (Fonte: Google Maps (2015))
Figura 2-6: Mancha urbana da AMF com destaque para a zona do Centro e do Campeche (Fonte: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1642409)
Campeche
Centro
11
3 - A procura de transportes
Caracterização demográfica e socioeconómica
3.1.1 - Evolução da população e densidades
Florianópolis e Lisboa estão situadas em contextos geográficos bastante distintos, no
entanto existem semelhanças na divisão do território para fins político-administrativos sendo que
as diferenças se encontram apenas a nível da nomenclatura. Tais semelhanças podem ser
naturalmente explicadas pelo facto de o Brasil ter sido colónia de Portugal por mais de 300 anos.
Ambas as cidades, consideradas Municípios, constituem níveis de governo já que a sua
administração, em Lisboa, cabe ao Presidente da Câmara Municipal e em Florianópolis cabe ao
Prefeito Municipal. O concelho de Lisboa encontra-se ainda dividido em 24 freguesias (Figura
3-1) enquanto Florianópolis é dividida em 12 distritos administrativos (Figura 3-2). As freguesias
são geridas pelos Presidentes das Juntas de Freguesia, enquanto que os distritos no Brasil são
geridos pela mesma administração que os municípios.
Ao realizar a análise da população residente em cada freguesia no concelho de Lisboa
(Figura 3-3) é notória a grande distribuição de população nos limites do concelho, ou seja, as
freguesias do centro estão bastante menos povoadas e é preocupante a desertificação destas
áreas da cidade. Esta ocorrência pode ser explicada pelo facto de estas freguesias, como as
Avenidas Novas, Campolide ou Santo António, comportarem mais edifícios para serviços ou
comércio e serem pólos de emprego ou pela razão de possuírem edifícios mais antigos e em
estado de degradação, com menores condições de habitabilidade e de difícil acesso em
automóvel, como é o caso de Santa Maria Maior, a nova freguesia que agrupou as antigas
pequenas freguesias do centro medieval de Lisboa.
Figura 3-1: Divisão do concelho de Lisboa por freguesias (Fonte: CML)
Figura 3-2: Divisão do município de Florianópolis em distritos
(Fonte: Prefeitura Municipal de Florianópolis)
12
Por outro lado, ao realizar a mesma comparação para o município de Florianópolis
(Figura 3-4) as diferenças são evidentes. Neste caso mais de 50% da população residente no
município encontra-se concentrada no distrito Sede, isto é, mesmo no centro da cidade. É neste
local que se localizam os serviços mais importantes e os pólos de emprego, sendo que este
distrito se encontra mais desenvolvido que os restantes, tanto em termos de serviços disponíveis
como de transportes.
Figura 3-3: Distribuição da população residente nas freguesias de Lisboa (adaptado pela autora)
2
Figura 3-4: Distribuição da população residente nos distritos de Florianópolis (adaptado pela autora)
13
A grande diferença a nível da população entre as duas cidades é a sua evolução.
Enquanto em Florianópolis a população, desde 1990 até 2010, aumentou quase 65% (IBGE,
2010), em Lisboa no mesmo período houve uma diminuição na população de -18% (INE, 2011),
ou seja, Lisboa tende a perder população enquanto Florianópolis tende a ganhar e em grande
escala. Atualmente Lisboa conta com uma população de cerca de 550 mil habitantes enquanto
que em Florianópolis este número é de 420 mil. Prevê-se que, por volta de 2035, a população
em Florianópolis seja de cerca de 800 mil pessoas, sendo uma expressiva parcela de pessoas
com idade superior a 60 anos, quase triplicando os habitantes acima desta idade.
População
1990 2000 2010
Florianópolis 255 390 342 315 421 203
+34% +23%
Área Metropolitana de Florianópolis
701 346 909 105 1 140 634
Brasil 146 917 459 169 590 693 190 755 799
Quadro 3.1: Evolução da população em Florianópolis, AMF e no Brasil entre 1990 e 2010 (Fonte: IBGE 1990, 2000 e 2010)
População
1991 2001 2011
Lisboa 663 394 564 657 547 733
-15% -3%
Área Metropolitana de Lisboa
2 535 679 2 661 850 2 821 876
Portugal 9 862 540 10 356 117 10 562 178
Quadro 3.2: Evolução da população em Lisboa, AML e em Portugal entre 1991 e 2011 (Fonte: INE 1991, 2001 e 2011)
Nos quadros e gráfico acima (Quadro 3.1, Quadro 3.2 e Figura 3-5) podemos ver as
diferenças significativas da evolução da população nas duas cidades. Apesar de Lisboa ainda
ter maior número de habitantes, se a tendência dos últimos anos se mantiver, prevê-se que que
o número de habitantes em Florianópolis seja bastante mais elevado que em Lisboa. Uma análise
250000
350000
450000
550000
650000
1991 1996 2000 2003 2005 2006 2007 2009 2010
Po
pu
laçã
o (
pe
sso
as)
Ano
Evolução da população entre 1991 e 2010
Florianópolis
Lisboa
Figura 3-5: Gráfico da evolução da população em Lisboa e Florianópolis
14
aprofundada revela que desde os anos 70 Lisboa tem vindo a perder população de forma
aproximadamente constante mas é notável a mudança ocorrida de 2009 para 2010, onde esta
tendência se inverteu e o ritmo de perda reduziu muito. Entre 1991 e 2001 a cidade portuguesa
perdeu 100 mil habitantes, enquanto que nesta última década perdeu apenas 15 mil.
Pelo contrário, na cidade brasileira a tendência para o crescimento da população tem
sido bastante acentuada, com crescimentos por década à volta dos 30%. Estudos apontam
também que esta cidade cresceu o dobro da média brasileira entre 2000 e 2010. Este incremento
pode ser explicado por dois movimentos migratórios: os de pessoas que vão do interior do estado
de Santa Catarina, atraídas pelo título de Capital, e os de moradores de outros estados do Brasil
que são seduzidos pela propaganda da cidade, como Capital brasileira que tem qualidade de
vida e que se situa no litoral.
Existe ainda outro acontecimento em Portugal que contribui para esta perda de
população, principalmente jovem, na cidade de Lisboa: a crise económica desencadeada em
2008. As previsões da Comissão Europeia apontam para uma redução acumulada de 1,3%
(cerca de 130 mil pessoas) resultante do crescente desemprego e falta de qualidade de vida. Há
menos estrangeiros a chegar a Portugal e muitos mais portugueses a sair do país, contribuindo
também para o envelhecimento da população. Se há 20 anos se assistia a uma forte imigração
de brasileiros para Portugal, hoje em dia ocorre precisamente o contrário e são os portugueses
que procuram melhores condições de vida no maior país da América do Sul.
Segundo o INE, tem-se assistido a perdas populacionais no centro urbano de Lisboa (-
2,9%) entre 2001 e 2011, em detrimento dos municípios circundantes que integram a área
metropolitana. No caso destes municípios registou-se um crescimento populacional expressivo
em Mafra (mais 41,1%), Alcochete (35%), Sesimbra (31,8%), Montijo (30,8%) e Cascais (20,9%).
Este crescimento pode ser explicado pela melhoria ou construção de novas vias de acesso, como
é o caso da Ponte Vasco da Gama ou ligação da autoestrada A5 a pólos tecnológicos, e pelo
menor custo de vida apresentado nestes locais em comparação com o município de Lisboa.
Segundo dados do IGBE (2010), tanto Florianópolis, como a sua Área Metropolitana
continuam com crescimento populacional tal que o município apresentou um crescimento de 23%
enquanto para a área metropolitana esse valor é de 25,5%. Esta grande procura deve-se à
qualidade de vida aqui existente aliada às belezas naturais. O Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento classificou a cidade de Florianópolis em 2013 com um Índice de
Desenvolvimento Humano de 0,847, tornando esta a capital brasileira com o melhor IDH. Este
índice é calculado com base em três dimensões: uma vida longa e saudável, acesso ao
conhecimento e um padrão de vida decente.
A partir de 1990 a população local de Florianópolis e os turistas cresceram de forma
expressiva, o que resultou em grandes e rápidas alterações nos padrões de uso e ocupação do
solo, mas sem o planeamento necessário. Florianópolis consolidou-se como um centro turístico
de renome da América Latina, em grande parte pelas belezas naturais e pelo incentivo político e
económico realizado pelos governantes e empreendedores locais. A partir do ano 2000, além de
15
ser um centro político e um centro turístico, Florianópolis transformou-se também num centro
tecnológico importante.
Uma das características mais importantes de Florianópolis, e que não pode deixar de ser
referida, é a população flutuante que esta comporta nos meses de Verão. A cidade recebe 1
milhão de turistas na temporada (Ministério do Turismo, 2013), mais de duplicando a sua
população normal, enfrentando dificuldades relacionadas com os serviços básicos, tal como,
tratamento de esgotos, abastecimento de água, eletricidade e trânsito. Esta elevada afluência à
cidade deve ser prevista nos planos de mobilidade e devem ser pensadas soluções para esses
meses. Da mesma maneira Lisboa recebe 1,4 milhões de turistas na temporada de verão
(Turismo de Portugal, 2013) no entanto, a cidade está um pouco mais preparada para os receber
com melhores facilidades e infraestrutura.
Pela análise das pirâmides etárias nas duas cidades as diferenças são óbvias.
Lisboa mantém a tendência de envelhecimento demográfico traduzido quer no topo da
pirâmide etária pelo seu alargamento, que corresponde ao acréscimo das pessoas idosas,
devido ao aumento da esperança de vida, quer pelo estreitamento na base da pirâmide
correspondente à baixa da natalidade (Figura 3-7).
Entre 2001 e 2011, a proporção de jovens e de indivíduos em idade ativa decresceu
aproximadamente 1% da população residente total, mas ocorreu um aumento da percentagem
de idosos fazendo com que o índice de envelhecimento aumentasse para 128 idosos por cada
100 jovens. O grupo etário com maior representatividade são os adultos entre os 35 e os 40
anos.
Em Florianópolis, apesar de começar a ocorrer um envelhecimento da população de
forma lenta, os jovens adultos (entre 25 e 29 anos) ainda são o grupo etário com maior
representatividade e a pirâmide etária apresenta maior concentração da população nas camadas
mais jovens, onde os jovens representam 34% da população, os adultos 57,5% e os idosos
apenas 8,5% (Figura 3-6). Nesta cidade, a taxa de envelhecimento, razão entre a população de
65 anos ou mais de idade em relação à população total, é de 7,5%.
Florianópolis Lisboa
Figura 3-7: Distribuição da população por sexo, segundo a idade, em Lisboa (Fonte: INE, 2011)
Figura 3-6: Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade, em Florianópolis (Fonte: IBGE, 2010)
2010 2000
16
As diferenças entre Florianópolis e Lisboa não estão apenas limitadas às condições
geográficas sendo evidentes também em termos de escala. Enquanto mais de 420 mil habitantes
distribuem-se em uma área de 436,5 km2 em Florianópolis, os cerca de 550 mil habitantes de
Lisboa ocupam uma área equivalente a 100 km2. No entanto, Florianópolis apresenta uma área
significativa de zonas verdes e protegidas, ou seja, a área urbana efetiva é bastante menor, de
cerca de 300 km2. Como resultado tem-se uma densidade não uniformemente distribuída de
cerca de 14 habitantes/ha para Florianópolis e de 55 habitantes/ha para Lisboa.
3.1.2 - Emprego e pólos geradores de tráfego
Na primeira década deste século, o crescimento económico não acompanhou o
crescimento demográfico de Florianópolis. O crescimento do PIB no ano de 2009 foi de 15%, ou
seja, mesmo verificando-se o aumento do Produto Interno Bruto, a população ampliou-se em
ritmo mais acelerado. Tradicionalmente, a economia da Cidade baseou-se em quatro setores
principais: a administração pública, os serviços, o comércio e a construção civil. Mas tais
segmentos têm vindo a perder peso para novas atividades, com destaque para o turismo, a
aquacultura e a indústria ligada às novas tecnologias.
Figura 3-9: Densidade populacional de Florianópolis (adaptado pela autora)
Figura 3-8: Densidade populacional de Lisboa (adaptado pela autora)
17
1500
3500
5500
7500
9500
2002 2004 2006 2008 2010
Milhões de Reais
PIB
Por outro lado, Lisboa tem assistido, na última década, a uma falta de crescimento da
economia, refletindo-se na queda sistemática do investimento privado, com natural impacto na
evolução desfavorável da produtividade e do nível de competitividade externa. O desemprego
em 2013, segundo um estudo do Eurostat, foi de 18,5% e o crescimento do PIB foi de apenas
1,4%. Os principais setores da economia são os serviços, o comércio e o turismo. Lisboa tem o
porto marítimo mais ativo da costa atlântica europeia e a maioria das sedes multinacionais
existentes em Portugal estão situadas nesta cidade. A economia neste local é também muito
apoiada na indústria com refinarias de petróleo, indústrias têxteis, estaleiros, siderurgia e
pesca. O turismo tem sido um dos suportes da economia na Europa durante a crise económica
e tem-se também apostado na economia criativa, com o design, artes e cultura.
Na cidade brasileira em 2010, da população ativa, 67% trabalhava no setor de serviços,
16% no comércio e os restantes dividiam-se por setores de utilidade pública, indústria de
transformação e sector da construção (IBGE, 2010). O setor terciário é o mais expressivo da
capital de estado, sendo integrado pelas sedes do governo estadual, representações de órgãos
e entidades federais, atividades bancárias, educacionais, saúde e turismo. Sendo assim, é
possível concluir que os principais pólos geradores de tráfego são os locais com maior
concentração de serviços e tecnologia, isto é, o centro da cidade, parques tecnológicos e
universidades, como se pode observar na Figura 3-15. Os principais pólos tecnológicos situam-
1 250
1 300
1 350
1 400
1 450
1 500
1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011*
Milhares de pessoas
30 000
40 000
50 000
60 000
70 000
1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011
Milhões de euros PIB
Figura 3-11: Gráfico da evolução do PIB em Lisboa entre 1995 e 2011 (Fonte: http://www.cm-lisboa.pt/investir/investimento/lisboa-em-
numeros/economia-de-lisboa-em-numeros)
Figura 3-10: Gráfico da evolução do emprego em Lisboa entre 1995 e 2011
(Fonte: http://www.cm-lisboa.pt/investir/investimento/lisboa-em-numeros/economia-de-lisboa-em-numeros)
Figura 3-13: Gráfico da evolução do PIB em Florianópolis entre 2002 e 2010
(Fonte: http://necat.ufsc.br/files/2011/10/Lucas-Correa-de-Souza.pdf)
Figura 3-12: Evolução do emprego em Florianópolis entre 1991 e 2005
(Fonte:www.apec.unesc.net/I%20EEC/sessoes_tematicas/Eco_Social_trabalho/artigo7a.pdf)
18
se ao longo da Rodovia SC 401 (Figura 3-14). O centro de Florianópolis, a UFSC e a Avenida
Beira Mar são os pólos de emprego mais importantes e que mais tráfego geram.
Com a atual conjuntura económica em Portugal, a capital nacional começou a apostar
em sectores não tradicionais de economia como a economia criativa, economia do mar, saúde,
economia digital e comércio. Apesar disso, os setores com mais expressão nesta cidade são
ainda os serviços e comércio assim como a investigação e desenvolvimento, à semelhança de
Florianópolis.
Figura 3-15: Localização dos principais pólos geradores de tráfego e atividades económicas (Fonte: Floripa 2030)
Figura 3-14: Rota da Inovação que inclui aeroporto, universidades, parques tecnológicos, centros
empresariais e órgãos do governo (Fonte: http://www.sapiensparque.com.br/)
19
Figura 3-16: Principais pólos geradores de tráfego em Lisboa (Fonte: DMMT - CML, 2011)
É possível verificar que, em Lisboa, grande parte dos Pólos Geradores se encontram
concentrados desde a Baixa, pelas Avenidas Novas até ao Campo Grande. Com a criação de
uma nova centralidade no Parque das Nações, este passou também a ser um pólo gerador de
tráfego devido ao elevado número de empresas e serviços que aí se situam.
Taxa de motorização e consumo de combustíveis
Segundo o INE, em 2011, 98% do parque automóvel de Portugal era constituído por
veículos ligeiros, menos 0,01% que no ano anterior. Verificou-se uma quebra generalizada em
todos os tipos de veículos, com exceção dos ligeiros de passageiros que cresceram 0,08%, um
crescimento muito pouco significativo. Os veículos de passageiros representavam cerca de 78%
do parque de ligeiros, sendo que a taxa de motorização em Portugal era de 443 veículos ligeiros
de passageiros por 1 000 habitantes.
No total de veículos, a taxa de motorização em 2007 no concelho de Lisboa era de 601
veíc./1.000 hab. Na Figura 3-17 mostra-se a evolução da taxa de motorização em Lisboa, que
apesar de ter sofrido algumas quebras em determinados anos, nos últimos anos tem vindo a
aumentar.
20
Segundo dados do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), em cinco anos, o
número de veículos ligeiros aumentou 22% e o de motos 51%, o equivalente a 23 novos veículos
por dia em Florianópolis, como se observa na Figura 3-18.
Segundo o IBGE, em 2010, 68% da frota automóvel de Florianópolis era constituído por
veículos ligeiros, sendo que no total a taxa de motorização é de 428 veíc./1.000 hab, bastante
menor quando comparada com Lisboa. A grande diferença entre as duas cidades é, ainda, o
número de veículos na temporada de verão que em Florianópolis é quase o dobro do que no
resto do ano.
Figura 3-17: Evolução da taxa de motorização em Lisboa e na AML (Fonte: Instituto de Seguros de Portugal, 2008)
Figura 3-18: Evolução da frota de veículos na Grande Florianópolis (Fonte: Plamus, 2014)
21
Segundo dados da Petrobras, no ano de 2011 o consumo de gasolina no Brasil teve um
crescimento de 23% em relação a 2010, enquanto que entre 2009 e 2010 essa diferença tinha
sido de 18%. O consumo de combustível em Florianópolis tem vindo a crescer de ano para ano,
acompanhando a taxa de motorização, como mostrado na Figura 3-19.
A partir de 2005 houve uma quebra contínua no consumo de combustível em Portugal
(Figura 3-20), sendo que em 2011 o consumo de gasolina apresentou um decréscimo de 9% e
o de gasóleo de 6%, maioritariamente devido à conjuntura económica do país. Esta tendência
mostra a procura de novas alternativas mais económicas e ecológicas em comparação com os
combustíveis tradicionais.
À semelhança do que acontece em outras cidades europeias, a descentralização
populacional é cada vez mais uma realidade em Lisboa, tanto da zona central do concelho para
os seus limites como da cidade em direção a outros concelhos da Área Metropolitana. No centro
Figura 3-19: Evolução do consumo de combustível no transporte rodoviário de passageiros em Santa Catarina (Fonte: SINDICOM, 2012)
Figura 3-20: Venda de combustíveis em Portugal (Fonte: PORDATA, 2012)
22
os espaços estão a ficar vazios de residentes, estando mais focados para a área de serviços e
emprego, e a progressão do envelhecimento manifesta um grau particularmente intenso. Pelo
contrário, os concelhos periféricos manifestam elevados acréscimos populacionais mantendo
uma taxa jovem aproximadamente constante.
A taxa de motorização não tem apresentado crescimentos significativos mas o consumo
de combustível tem vindo a diminuir, dando lugar a novas alternativas mais sustentáveis.
Florianópolis apresenta uma situação comparável à de muitas cidades em países
emergentes, com um crescimento de população acentuado. Esta população é jovem,
maioritariamente em idade ativa e encontra-se concentrada no centro da cidade. Os municípios
em volta manifestam também um incremento demográfico, ainda que a um ritmo menos
acelerado. É uma cidade em crescimento, tanto no que se refere à economia e evolução de
emprego como à taxa de motorização e consumo de combustível.
Repartição Modal
A repartição modal pode ser definida como a divisão do total de viagens realizadas pelas
pessoas entre diferentes modos de transporte, ou seja, a alocação das viagens pelos diferentes
meios. Havendo opção de escolha para os utilizadores, a determinação do número de viagens
realizadas através de cada modo disponível permite dimensionar as frotas de modo a atender a
procura.
A análise deste indicador é importante, não só a nível interno da cidade como na
comparação entre as duas cidades, pois permite avaliar as decisões dos usuários e a qualidade
do serviço oferecido.
O fluxo com maior expressão no concelho de Lisboa é o fluxo de entrada de veículos.
Das 364.500 entradas registadas, mais de metade são realizadas em transporte coletivo e 46%
em transporte individual. Este facto pode ser explicado pelo menor poder de compra da
população que reside nos concelhos em torno de Lisboa e pela relação custo-tempo dessa
deslocação que se verifica mais atrativa para o uso do transporte coletivo.
Pelo contrário, das viagens realizadas internamente em Lisboa, o meio de transporte que
assume maior expressão é o individual, seguido logo pelo transporte coletivo. É também dentro
do concelho que o modo pedonal é mais utilizado. O tempo médio de viagem (até 30 minutos) é
bastante menor que para viagens de entrada em Lisboa (entre 30 e 60 minutos).
Nos movimentos de saída de Lisboa o transporte individual tem maior representatividade.
Estes movimentos são realizados para concelhos próximos e, como são no contra fluxo do
tráfego, o tempo de viagem é relativamente baixo, menos de 30 minutos.
Pela comparação da repartição modal entre 1991 e 2011 constata-se que tem havido
uma maior utilização do transporte individual e que o transporte coletivo tem vindo a perder
relevância. Enquanto que em 2001, 35% das viagens internas em Lisboa eram realizadas com
recurso ao transporte individual, em 2011 esse valor era já de 45%, enquanto que esses valores
23
para o transporte coletivo diminuíram de 40% para 35%. Os modos suaves ainda têm pouca
representatividade na mobilidade da população. Esta situação pode ser analisada no Quadro
3.3.
A melhoria de acessos ao concelho de Lisboa e da rede interconcelhia, nomeadamente
o aumento e melhoria da rede de autoestradas, a urbanização de terrenos agrícolas e a
construção de infraestruturas básicas, conduziu à disseminação generalizada da população pela
AML e a uma maior utilização do TI. A procura de novas localizações de residência e de emprego,
assim como as alterações demográficas, originam transformações ao nível da procura de
transporte e das características da mobilidade metropolitana.
1991 2001 2011
Internos em Lisboa
301 567 283 400 267 722
Repartição Modal TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta
22% 50% 25% nd 35% 40% 23% nd 45% 35% 19% 0,21%
Duração (min.) ≤ 15
16 - 30
31 - 60 ≥ 61
> 90
≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60 ≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60
33% 35% 26% 6% 39% 39% 19% 3% 42% 40% 16% 1%
De entrada em Lisboa
291 383 382 030 364 523
Repartição Modal TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta
26% 64% 0,59% nd 42% 54% 0,47% nd 46% 53% 0,69% 0,05%
Duração (min.) ≤ 15
16 - 30
31 - 60 ≥ 61
> 90
≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60 ≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60
2% 13% 46% 40% 4% 22% 49% 25% 5% 25% 52% 16%
De saída de Lisboa
27 664 35 326 38 719
Repartição Modal TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta
35% 49% 1,87% nd 65% 32% 1,57% nd 74% 24% 1,03% 0,06%
Duração (min.) ≤ 15
16 - 30
31 - 60 ≥ 61
> 90
≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60 ≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60
9% 26% 37% 28% 12% 40% 34% 14% 14% 46% 32% 6%
Quadro 3.3: Repartição modal das deslocações na AML por motivo de emprego e estudo1 (Fonte: INE 1991, 2001 e 2011, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)
Em Florianópolis é o transporte individual o meio mais utilizado e o fluxo com mais
expressão é o de entrada na ilha, tal que a atração de viagens é bastante maior que a produção,
ou seja, os movimentos continente-ilha são os mais importantes a estudar. O transporte individual
representa 48% do transporte total utilizado nas viagens internas em Florianópolis, praticamente
o mesmo que em Lisboa. Para viagens de entrada na cidade, há uma grande discrepância com
Lisboa, dado que 88% das mesmas são realizadas com recurso a transporte individual
(automóvel e motociclo) e só 3% com recurso a transporte coletivo. Note-se que o único ponto
de entrada na ilha de Santa Catarina são as pontes Colombo Salles e Pedro Ivo Campos.
1 Nos anos de 1991 e 2001 não foi incluído o concelho da Azambuja; o TI não inclui motociclos; os movimentos
de entrada em Lisboa apenas contemplam os que têm origem noutros concelhos da AML da mesma forma que
os de saída de Lisboa apenas incluem os que têm como destino outros concelhos da AML
24
48%
26%
26%
TransporteIndividual
TransporteColectivo
Transporte NãoMotorizado
A maior diferença na repartição modal entre as duas cidades é na utilização do transporte
coletivo e do meio pedonal e bicicleta, que em Florianópolis é igual nos dois casos enquanto em
Lisboa as viagens realizadas por meios não motorizados ainda não têm grande expressão.
Para a cidade brasileira não é possível fazer a comparação da repartição modal com
anos anteriores dada a falta de dados disponíveis. No entanto, analisando a taxa de motorização,
que sofreu um grande crescimento nos últimos tempos, é possível concluir que não só o
transporte coletivo tem vindo a ser substituído pelo privado, como há mais população a trabalhar
no centro da cidade e a deslocar-se de automóvel.
A principal razão para a grande utilização do transporte individual em Florianópolis é a
fraca qualidade do transporte coletivo, o facto de o automóvel ainda ser visto como um sinal de
estatuto social, a grande melhoria das vias de comunicação e principalmente o custo direto da
viagem2, que é menor para o automóvel. Aliadas a estas razões ainda se conta o tempo de
viagem, que para o transporte coletivo (60 minutos) é o dobro do privado (30 minutos).
Na comparação de Lisboa e Florianópolis com outras cidades mundiais na utilização do
automóvel no total de viagens (Figura 3-22), verifica-se que estão ambas entre as cidades que
mais utilizam este meio de deslocação, um problema que deve ser rapidamente solucionado.
2 Entenda-se por custo direto de viagem de automóvel o custo da gasolina, do estacionamento e de portagens quando aplicável.
Figura 3-21: Repartição modal em Florianópolis (Fonte: Plamus, 2014)
25
Utilizadores do TC e evolução da procura
Dos 2.383.995 residentes na AML com 15 e mais anos, 43% é utilizador frequente de
transporte público, 16% são ex-utilizadores e 41% não utilizam este meio de transporte. É na
idade adulta (dos 35 aos 64 anos) que os TC são menos utilizados, enquanto são os jovens que
mais utilizam, assim como é na classe social mais baixa que se verifica a maior percentagem de
utilizadores.
Quando questionados sobre os motivos porque não utilizam os transportes coletivos, as
principais razões apontadas foram o tempo e o custo de deslocação quando comparado com o
transporte individual, assim como a comodidade/qualidade do sistema de transportes públicos.
60% dos não utilizadores ainda referiram que de certeza não virão a utilizar o TC, ou seja,
quaisquer que sejam as melhorias feitas no TC esta grande parte da população não irá substituir
o TI como meio de eleição (AMTL/ISCTE, 2014).
Os utilizadores do TC da AML têm uma ideia globalmente positiva destes transportes e
afirmam que o principal motivo para a utilização é económico. As barreiras à sua utilização são
o cansaço e fadiga psicológica, incumprimento de horários e o conforto e logística.
A principal razão apontada para a utilização do transporte coletivo na cidade brasileira é
por ser a única opção disponível. Se o transporte coletivo oferecesse as condições certas, como
boa relação custo-benefício, maior frequência ou mais rápidos, 82% dos usuários do automóvel
dizem estar dispostos a utilizar o transporte coletivo, uma grande diferença em comparação com
Lisboa (onde apenas 40% declaravam essa possibilidade).
Relativamente à procura de TC em Lisboa, verifica-se um decréscimo acentuado ao
longo dos anos justificado pela redução da mobilidade da população, devido à conjuntura
económica do país e à manutenção de uma elevada taxa de desemprego. A melhoria dos
acessos rodoviários é também um fator justificativo.
0% 20% 40% 60% 80% 100%
Melbourne
Chicago
Florianópolis
Lisboa
Londres
Barcelona
Nova Iorque
Paris
Madrid
Hong Kong
Figura 3-22: Percentual do automóvel no total de viagens em várias cidades
26
Também em Florianópolis a procura do transporte coletivo tem vindo a diminuir.
Enquanto em 2011, 34% da população utilizava esse meio de transporte, em 2014 esse valor é
já de 26%. Isto é consequência direta da perda de produtividade e atratividade do TC e aumento
crescente do preço da tarifa. Soma-se ainda a facilidade cada vez maior na aquisição de um
veículo particular.
Modos Suaves
Atualmente uma das principais dificuldades da mobilidade nas cidades é a falta de
sustentabilidade do sistema de transportes. Tem sido colocado um ênfase especial nos modos
pedonais e cicláveis como parte da solução para problemas típicos do tráfego automóvel nas
cidades, como os congestionamentos, desertificação do centro urbano e obesidade infantil. É
necessária uma abordagem interdisciplinar de profissionais da área para criar comunidades
saudáveis, sustentáveis e habitáveis.
A FHWA (2006) identificou um vasto conjunto de benefícios na utilização de modos
suaves como meio de transporte, que vão desde aspetos ambientais até melhorias no
funcionamento do sistema de transportes. Promovem a coesão social e a equidade, ganha-se a
consciência do “outro” e da comunidade, gerando interação social. Tornam a cidade mais segura
com a vigilância natural dos espaços públicos e ajudam a economia local, uma vez que as
pessoas são mais atraídas para o comércio de rua. Vantagens em termos do sistema de
transportes estão relacionadas com a diminuição dos congestionamentos de tráfego, a melhoria
da qualidade do ar e a diminuição dos custos de transportes.
De acordo com a Figura 3-23, os modos de transporte mais eficientes em termos de
tempo percorrido por quilómetro para viagens de curta duração são os modos suaves,
especialmente o modo ciclável. A bicicleta tem vindo a conquistar o seu espaço na atualidade
como uma alternativa ao transporte particular e um complemento ao transporte público, em
percursos de curta distância (até 6km).
Figura 3-23: Tempo de viagem por distância percorrida por modo (Fonte: EC, 2000)
27
Os modos suaves têm vindo a aumentar a sua relevância nos últimos anos, sendo que,
atualmente, são considerados o modo de transporte ao qual deve ser dada mais importância
para uma mobilidade sustentável.
Na cidade de Lisboa tem-se observado um desenvolvimento notável da infraestrutura
dedicada aos modos suaves no centro da cidade, no entanto, não se verifica ainda um aumento
da utilização dos mesmos. A utilização do modo pedonal na última década, diminuiu de 23% para
19% e o uso da bicicleta tem uma representação de apenas 0.21% para movimentos dentro do
concelho.
Também no Brasil os projetos relacionados com mobilidade sustentável ganham uma
nova relevância, sobretudo aqueles cujo objetivo passa por mudar a mentalidade dos cidadãos
brasileiros no que toca a este tema. Só em 2014 foi lançado um estudo sobre a sinalização
urbana voltada para pedestres e ciclistas que concluiu que as cidades brasileiras têm 90% dos
sinais de trânsito voltados apenas para os condutores de veículos motorizados.
Apesar de a infraestrutura para modos suaves ainda não estar muito desenvolvida em
Florianópolis, a utilização destes modos representa 26% do total de viagens, sendo o modo
pedonal o mais utilizado.
Tanto na generalidade do município português como no brasileiro, a rede de transporte
pedonal apresenta um ambiente hostil para os seus utilizadores, consequência da falta de
planeamento.
Quanto a projetos em curso nos respetivos municípios, encontra-se em fase de execução
o Plano de Acessibilidade Pedonal de Lisboa por parte da CML que prevê a adaptação de
espaços já existentes e novas medidas de apoio à mobilidade suave a pé. Quanto a Florianópolis,
o Plamus propõe algumas soluções para os modos suaves, nomeadamente a criação de zonas
30 e desenvolvimento de ciclovias.
Tem sido convicção generalizada que em Lisboa, a “cidade das sete colinas”, a maior
parte das ruas tem uma inclinação longitudinal elevada, dificultando o acesso pedonal. Segundo
a CML (2014), a situação não é tão complexa como se pensava. Apesar de as características
orográficas da cidade tornarem o planeamento mais complicado, os declives em mais de 70%
das ruas não ultrapassam os 5%, ou seja, a acessibilidade a pé no espaço público é
perfeitamente aceitável e deve ser promovida. Outra das características do território do concelho
de Lisboa é o facto de este ser maioritariamente consolidado, implicando que a melhoria das
condições de acessibilidade passa pela adaptação da edificação existente.
Também Florianópolis possui uma orografia complexa com diversos morros, mas entre
eles as zonas planas são extensas, como por exemplo o centro da cidade. Ultrapassando essas
dificuldades de elevada inclinação, a solução torna-se mais simples. Na Figura 3-25 é possível
localizar as zonas com maior potencial pedonal.
28
A análise do Mapa de Potencial Pedonal de Lisboa (Figura 3-26) revela que o centro
concentra a maior parte do potencial pedonal, nomeadamente a Baixa, colinas e zona
consolidada das Avenidas Novas até Entrecampos e Alvalade. Os pólos geradores do Parque
das Nações, Benfica, Alta de Lisboa e Alcântara têm também grandes concentrações de
potencial pedonal. Na Baixa e centro histórico existem diversas ruas dedicadas aos pedestres, a
Avenida da Liberdade (Figura 3-27) é também um bom exemplo de incentivo aos modos suaves
e os corredores verdes existentes permitem atravessar a pé ou de bicicleta quase a totalidade
da cidade.
Figura 3-25: Identificação das zonas com maior potencial pedonal em Florianópolis
(Fonte: Google Maps, 2015, adaptado pela autora)
Figura 3-26: Mapa de Potencial Pedonal de Lisboa (Fonte: CML, 2013)
29
Na generalidade do território de Lisboa existem diversos problemas na rede pedonal:
excessivo mobiliário urbano nos passeios; inadequação na provisão, dimensionamento e
sinalização de travessias pedonais; dimensionamento inadequado dos tempos de verde para os
peões, informação sinalizada deficiente e reduzida largura dos passeios. Uma das principais
causas de acidentes na rede pedonal, excluindo atropelamentos, é o revestimento dos passeios:
a típica calçada portuguesa não é o material mais adequado para promover uma mobilidade
segura, uma vez que, com falta de manutenção, potencia quedas e escorregamentos, sendo
mais gravoso em locais com inclinação.
O centro de Florianópolis tem ruas exclusivamente pedonais com diversos serviços
comerciais sediados no andar térreo dos edifícios históricos, como o Calçadão da Rua Felipe
Schmidt. A Avenida Beira-Mar Norte, que liga o centro da cidade à UFSC, possui na sua extensão
um calçadão e ciclovia de 8km. Estas infraestruturas são muito utilizadas pela população
residente tanto para atividades recreativas como para deslocação, no entanto, a falta de sombra
e a sua proximidade à rede viária com 3 vias por sentido são fatores negativos para a sua
utilização. Estas ruas são exceção comparativamente ao resto da ilha, pois no geral os passeios
têm uma largura reduzida e são cercados por condomínios privados, desincentivando o sentido
de comunidade, como se pode observar nas Figuras 3.28 e 3.29. Apresenta também os mesmos
problemas descritos para Lisboa, sendo neste caso mais gravosa a falta de sinalização para
pedestres.
Figura 3-27: Avenida da Liberdade, um exemplo de boas condições para o modo pedonal
(Fonte: http://expatinlisbon.com/2011/10/28/lisbon-random-photos-and-memories/)
30
A mobilidade por bicicleta só nos últimos anos começou a ter relevância e Lisboa tem já
projetos de investimento nesta rede de transporte. A rede de Percursos e Corredores (Figura
3-30), com mais de 40 km, liga os principais parques e áreas verdes da cidade por vias cicláveis
e pretende ser um complemento ao sistema de transportes local e regional. Possui mais de 40
equipamentos de apoio ao uso da bicicleta, particularmente para estacionamento das mesmas,
localizados nos mercados municipais, aeroporto, terminais ferroviários e fluviais ou perto das
estações de metropolitano.
A rede de mobilidade ciclável é bastante percetível, principalmente em parques urbanos
para atividades recreativas, como Monsanto, no entanto, notam-se descontinuidades
significativas. No futuro espera-se uma rede ciclável contínua de malha fechada, articulada com
Figura 3-28: Avenida Mauro Ramos (Fonte: Google Street View, 2008)
Figura 3-29: Rua Dep. Antônio Edu Vieira, junto à UFSC (Fonte: Google Street View, 2008)
Figura 3-30: Rede de Percursos e Corredores em Lisboa (Fonte: CML, 2013)
31
Figura 3-32: Rede Ciclável de Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015)
os transportes públicos e com o património ecológico e cultural. A Avenida Duque de Ávila (Figura
3-31) apresenta uma ciclovia recente, um bom exemplo que pode ser extrapolado para a restante
cidade.
A rede ciclável em Florianópolis (Figura 3-32) tem uma extensão de 43 km, mas estão já
propostos para construção mais 250km de modo a promover a ligação entre o norte, este e centro
do município. Está previsto um sistema de aluguer de bicicletas para o próximo ano que contará
com 85 estações e 850 bicicletas. Atualmente o maior problema da rede de modos suaves em
Florianópolis é a falta de continuidade das vias de passeio e ciclovias e as diferentes dimensões
de um mesmo passeio.
Figura 3-31: Avenida Duque de Ávila (Fonte: http://blog.streetics.com/2012/06/avenida-duque-de-avila-estabelece-um.html)
32
3.2 km
Figura 3-33: Raio alcançável por modos pedonais e de bicicleta no Centro de Florianópolis (Fonte: Google Maps, 2008, adaptado pela autora)
A distância média que um pedestre está disposto a percorrer antes de optar por utilizar
o automóvel depende de diversos elementos, mas é aceite uma distância até 800 metros. Ao
analisar esta distância para o centro de Florianópolis verifica-se que toda a parte central está
incluída nesta extensão, ou seja, é possível percorrer grande parte da área a pé. Considerando
a distância ideal a percorrer de bicicleta até 6 km, verifica-se que, com apenas 1.2km, alcança-
se também todo o centro, fazendo a conexão com a UFSC e a parte continental. Conclui-se que
estão reunidas todas as condições para promover a adoção de modos suaves, só é preciso
providenciar a infraestrutura ideal para isso. Na Figura 3-33 é possível identificar esta
oportunidade.
Fazendo a mesma análise em Lisboa, também é possível cobrir todas as áreas centrais
e onde os volumes de tráfego são maiores, utilizando a bicicleta, como se vê na Figura 3-34. É
urgente pensar medidas que permitam a troca do automóvel pela bicicleta, seja pela permuta
total ou pelo complemento do TI com esta. Só estas medidas seriam responsáveis por uma
grande diminuição dos congestionamentos verificados naquelas áreas.
6 km
Figura 3-34: Raio alcançável por modos pedonais e de bicicleta no centro de Lisboa (Fonte: Google Maps, 2008, adaptado pela autora)
33
As ações postas em prática ao longo do tempo no sentido de melhorar o sistema de
transportes nas duas cidades, focadas na gestão e melhoria do tráfego e com vista ao aumento
da velocidade de circulação, resultaram por vezes na degradação da qualidade e segurança das
deslocações em modos suaves.
O que a experiência de Lisboa demonstra, e que pode ser extrapolado para Florianópolis,
é que sem um plano é difícil ou impossível planear modificações imprescindíveis, projetar
financiamentos, aproveitar oportunidades e prevenir a deterioração da situação. Sem um plano,
a câmara municipal não consegue ter uma ação eficaz e o processo será mais oneroso.
34
4 - A oferta de transportes
Rede rodoviária e estacionamento
4.1.1 - As redes rodoviárias e a sua cobertura espacial
A metodologia de planeamento e coordenação da mobilidade, especialmente no
transporte individual, tem adotado soluções contínuas de construção de novas infraestruturas
para responder ao aumento da procura de transporte. Esta abordagem “Predict and Provide”3
acarreta como consequência o crescimento acentuado da utilização do veículo automóvel,
promovendo um sistema de mobilidade insustentável do ponto de vista energético.
A rede viária deve ser planeada considerando a sua interação com as restantes redes
de transporte e com o estacionamento.
A análise da rede viária de uma cidade é essencial para definir a acessibilidade que pode
proporcionar, sendo que para isso começa por analisar-se a sua distribuição, densidade,
potencialidades e debilidades. Pretende-se desse modo, possibilitar a proposta de novas
medidas capazes de melhorar a acessibilidade, num contexto de desenvolvimento sustentável.
Na última década a taxa de motorização em Portugal passou de 224 para 435
veículos/1000 habitantes (ACAP, 2009), um aumento anual de aproximadamente 5%. Com esta
ocorrência, verificou-se um elevado crescimento da utilização do automóvel nas deslocações
diárias da população da AML.
Em Florianópolis, no mesmo período, a população residente cresceu cerca de 20%, no
entanto a frota de veículos aumentou para o dobro devido à facilidade de aquisição de veículos,
de financiamento e de subsídios. Apesar do crescimento da frota observado, a cidade
praticamente não mudou o perfil da sua infraestrutura urbana. Estes factos, aliados a uma falta
de planeamento urbano e de desenvolvimento dos transportes coletivos, trouxeram diversas
mudanças na mobilidade da população, sendo a mais gravosa a grande utilização do transporte
individual.
Este uso excessivo do transporte individual acarreta consequências óbvias, tanto a nível
da saúde da população como na mobilidade urbana. As taxas de saturação das vias de
comunicação são cada vez mais elevadas, sobrecarregando o sistema; os espaços públicos são
ocupados por veículos, diminuindo a qualidade de vida da população; e a produtividade diminui
como resultado dos tempos elevados de deslocação. Tem ainda contribuído para a difícil
sustentabilidade económica dos sistemas de transporte coletivo.
Neste capítulo pretende-se, após a caracterização das redes viárias das duas cidades,
realizar a respetiva análise do desempenho.
3 Previsão e Provisão, traduzido
35
Figura 4-1: Variação do TMDA entre 2009 e 2013 nos principais eixos de acesso a Lisboa (nos dois sentidos, todos os dias) (Fonte: IMT, 2013, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)
O concelho de Lisboa é limitado pelo rio Tejo e pelo estabelecimento de relações entre
este e a zona Norte e Sul da sua área metropolitana.
A AML apresenta uma rede rodoviária estruturada com base em quatro eixos principais
a Norte, dois corredores de acesso a Lisboa a Sul e duas circulares a Norte de Lisboa (CRIL e
CREL).
Numa primeira análise estabelece-se a relação entre Lisboa e os restantes concelhos da
AML. Esta relação é traduzida por corredores de ligação nomeadamente:
- Cascais (A5);
- Sintra/Amadora (IC19 e IC16);
- Amadora/Loures (IC22)
- Corredor Oeste (A8)
- Corredor Norte (A1 e IC2);
- Ponte Vasco da Gama (A12);
- Ponte 25 de Abril (A2).
36
Pela análise da variação do TMDA entre 2009 e 2013 (Quadro 4.1) podem-se tirar
algumas conclusões:
- Em mais de 60% corredores de ligação houve uma diminuição do TMDA;
- Estima-se que, nos principais acessos a Lisboa, circulem diariamente 647.231 veículos nos
dois sentidos, representando uma diminuição de 4% em relação a 2009 e de 22% em relação a
2003;
- 364.500 veículos têm como destino o município de Lisboa, sendo os corredores Norte, de
Cascais e da Ponte 25 de Abril os principais geradores de tráfego, responsáveis por mais de
50% do tráfego total;
- Mais de 20% do tráfego de entrada provém da margem Sul;
2009 2010 2011 2012 2013
A1 (Sacavém - S.João da Talha) 91.334 91.435 93.099 91.564 89.784
A2 (Ponte 25 de Abril) 152.578 148.833 143.406 138.937 136.263
A5 (Viaduto Duarte Pacheco - Cruz das Oliveiras) 141.067 137.556 129.532 121.726 125.947
A8 (CRIL - Frielas) 43.590 45.496 45.178 44.002 48.094
A12 (Ponte Vasco da Gama) 64.985 64.183 60.341 nd 53.443
A16 (Idanha - CREL) 25.628 34.768 14.564 12.214 11.510
IC19 (Estado Maior - Damaia) 59.711 86.035 90.683 87.915 88.745
IC22 (Olival Basto - Ramada) 38.886 40.793 41.291 36.790 45.267
IC2 (Portela - Bobadela) 54.199 50.569 56.194 50.410 48.178
TOTAL 671.978 699.668 674.288 583.558 647.231
Quadro 4.1: Evolução do TMDA de 2009 a 2013 nos principais eixos de acesso a Lisboa (nos dois sentidos, todos os dias) (Fonte: IMT, 2013, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)
Quadro 4.2: Matriz Origem-Destino dos movimentos pendulares na AML em 2011 (Fonte: INE 2011, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)
37
1991 2001 2011
Interconcelhios na AML
436 975 627 691 645 538
Repartição Modal
TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta
28% 60% 1,22% nd 50%
46% 0,88% nd 58%
41% 0,96% 0,09%
Duração (min.) ≤ 15
16 - 30
31 - 60 ≥ 61
> 90
≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60 ≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60
5% 18% 42% 35% 7% 27% 43% 23% 10%
33% 43% 12%
Intraconcelhios na AML
805 556 1 002 603 1 030 098
Repartição Modal
TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta TI TC Pedonal Bicicleta
20% 37% 36% nd 38%
28% 32% nd 52%
23% 25% 0,29%
Duração (min.) ≤ 15
16 - 30
31 - 60 ≥ 61
> 90
≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60 ≤ 15
16 - 30
31 - 60 > 60
49% 32% 15% 4% 55%
31% 11% 3% 59%
30% 9% 1%
Quadro 4.3: Repartição modal das deslocações interconcelhias e intraconcelhias na AML por motivo de emprego e
estudo (Fonte: INE 1991, 2001 e 2011, disponibilizado pelo Eng. Gonçalo Caiado da CML)
Verifica-se que entram mais veículos em Lisboa do que aqueles que já existem dentro
do concelho, o que indica a importância do volume de emprego na cidade.
Entre 1991 e 2011 houve um aumento dos movimentos interconcelhios na AML e o
aumento dos movimentos intraconcelhios não teve tanta expressão, reflexo de uma maior
complexidade do quadro funcional.
Entre os movimentos interconcelhios da AML, Lisboa apresenta-se como o principal
destino para todos os municípios da AML. Pela análise da matriz origem/destino confirma-se que
o maior centro gerador de viagens com destino a Lisboa é Sintra, seguido de Loures e Amadora.
Por outro lado, o maior pólo atractor de viagens que têm como origem Lisboa é o concelho de
Oeiras, provavelmente derivado da ligação da estrada A5 com pólos terciários que se localizaram
próximo dos nós da A5.
Relativamente à rede viária do município esta pode dividir-se em rede fundamental (rede
estruturante e de distribuição principal - 1º e 2º nível) e rede local (rede de distribuição
secundária, de proximidade e de acesso local – 3º e 4º nível).
Figura 4-2: Rede viária da cidade de Lisboa (Fonte: CML, 2012)
38
A rede fundamental deve assegurar os principais atravessamentos da cidade e a
distribuição dos maiores fluxos de tráfego. A rede de distribuição secundária deve assegurar a
distribuição próxima e a rede de 4º nível possibilita o acesso aos bairros onde o elemento
principal é o peão.
A rede viária total da cidade tem uma extensão de 1600 km. Apesar das redes de 1º e
2º nível terem menor extensão (510km) que as redes de 3º e 4º nível (1090km), absorvem mais
de 70% do tráfego rodoviário.
Pela análise do gráfico da variação do tráfego médio horário (Figura 4-3) é evidente dois
picos de tráfego nas horas de ponta 8h-10h e 17h-20h, enquanto que o tráfego é bastante
reduzido entre a 1h e as 7h.
O município de Florianópolis é composto pela ilha de Santa Catarina e uma parte
continental, sendo que é nesta parte que se estabelece a única relação entre este município e
os restantes da área metropolitana.
Na análise da relação entre Florianópolis e os restantes municípios da RMF verifica-se
que existe um movimento pendular diário entre as cidades de Biguaçú e Palhoça em direção a
São José, e desse para Florianópolis.
O principal acesso da cidade brasileira é a BR-101, através dos primeiros 5km da BR-282.
Esse trecho é constituído por uma via expressa de pista dupla. Existe também o acesso através
das vias urbanas ao norte e sul da região continental mas estas são, em geral, congestionadas
e com baixo nível de serviço.
O único ponto de entrada na ilha são as duas pontes que ligam o estreito canal que a
separa do continente, condicionando todo o fluxo de veículos proveniente da região
metropolitana, do tráfego intraurbano e até mesmo interestadual, como se observa na Figura 4-4.
A via BR-282 é a principal responsável por conduzir o tráfego entre São José e
Florianópolis e as pontes Pedro Ivo Campos e Colombo Salles fazem a ligação entre a ilha e o
continente.
Figura 4-3: Variação do tráfego médio horário (Fonte: Brito, J.M. (2010). Caracterização da flutuação do tráfego na cidade de Lisboa, FCT)
39
Por dia cruzam as pontes Ilha/Continente 196.700 veículos nos dois sentidos, sendo
8.660 veículos somente na hora de pico da tarde. Segundo dados do IPUF, em 2003 passavam
pela ponte cerca de 180.000 veículos/dia, o que representa um crescimento de 10% entre 2003
e 2014, contrastando com os 23% de diminuição de tráfego na cidade de Lisboa.
Em termos de volume, o tráfego de entrada em Florianópolis é três vezes menor que o
volume de entrada em Lisboa, no entanto, neste caso, realiza-se apenas através de um único
acesso.
Um dos dados caracterizadores deste tráfego médio diário é a sua repartição modal, tal
que 88% das viagens é realizada com recurso ao transporte individual, transportando 11.000
pessoas por hora, e apenas 3% de transporte coletivo, transportando 10.000 pessoas/hora
(Plamus, 2015).
Segundo estatísticas do Instituto MAPA (2012), 52% dos estudantes de todos os níveis
de ensino utilizam o automóvel para se deslocar diariamente, sejam condutores ou apenas
passageiros, um dado que chama a atenção dado que este é um sector que tradicionalmente
utiliza o transporte coletivo.
Uma das justificações para este facto, além da falta de oferta de transporte, é o preço da
tarifa do TC, considerado alto, o que faz com que seja economicamente preferível o transporte
individual pois apresenta um custo direto menor.
Figura 4-4: Relação entre municípios vizinhos e Florianópolis (Fonte: Google Maps 2015, adaptado pela autora)
40
A maior parte das deslocações ocorrem dentro dos próprios municípios, mas cerca de 10% do
dos movimentos intermunicipais têm como destino Florianópolis.
Pela análise da matriz origem/destino (Figura 4-6) confirma-se que tanto o maior pólo
gerador como atractor de viagens com destino ou origem em Florianópolis é São José.
Na análise da geração e atracção por parte de cada município, Florianópolis apresenta
862.142 viagens produzidas por dia enquanto que atrai 1.125.382 viagens, ou seja, a maior parte
do tráfego na capital é proveniente de outros municípios.
O interior da Ilha é constituído por um conjunto de rodovias estaduais, integralmente
dentro do território municipal, e por uma série de vias urbanas principais e coletoras que formam
uma estrutura hierarquizada e funcional, definida pelo Plano Diretor.
Figura 4-5: Volume de entrada em Florianópolis através das pontes (nos dois sentidos, durante todo o dia) (Fonte: Plamus, 2015)
Figura 4-6: Matriz Origem-Destino dos movimentos pendulares nos quatro maiores municípios da AMF (Fonte: Plamus, 2015)
41
Figura 4-7: Distribuição horária das viagens por modo em Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015)
Relativamente à rede viária do município esta pode dividir-se em vias arteriais, que ligam
diferentes sectores da cidade, vias setoriais, que conectam áreas inteiras da cidade com as
arteriais, e vias locais, que dão acesso aos bairros. A hierarquização da rede viária pode ser
observada na Figura 4-8.
A rede viária total da cidade tem uma extensão de 1.809 km, sendo cerca de 60 km vias
arteriais. Grande parte da malha viária tem uma configuração espacial conhecida como “espinha
de peixe”, em que longas vias estão conectadas a apenas uma via principal, com muito poucas
conexões diretas entre elas. As distâncias entre as conexões na via principal são curtas mas as
distâncias no outro sentido (perpendicular à via principal) podem chegar a mais de um quilómetro.
No eixo centro-universidade existe uma alta concentração de serviços básicos que,
juntamente com a população residente, geram alta movimentação de pessoas e veículos no
local. Este eixo concentra 30% da população da cidade (126.767 pessoas).
Na análise da distribuição horária das viagens (Figura 4-7) é evidente a alta concentração
de tráfego nas horas de ponta, especialmente no modo rodoviário.
Figura 4-8: Hierarquização da rede viária de Florianópolis (Fonte: PDM de Florianópolis)
42
4.1.2 - Desempenho das redes
A malha viária da cidade de Lisboa apresenta uma estrutura do tipo radio concêntrico e
incompleto, pois, por um lado, é constituída por eixos radiais e eixos concêntricos e por outro
porque estes eixos apresentam algumas descontinuidades. Estas descontinuidades não são
apenas carências a nível físico mas também descontinuidades de capacidade.
Nos últimos anos foram realizadas diversas intervenções que contribuíram para uma
grande melhoria na malha rodoviária e respetiva mobilidade, nomeadamente a conclusão do
fecho da CRIL e o prolongamento do Eixo Norte-Sul até à CRIL, que constituem uma alternativa
à 2ª Circular e reduz a carga sobre a rede de distribuição principal da cidade, quer do tráfego de
atravessamento, quer do tráfego com origem e destino na cidade.
Tanto Florianópolis como Lisboa têm novos Planos Diretores que introduziram uma
melhoria significativa na hierarquização da rede, tanto na de distribuição principal como na de
distribuição secundária. Esta melhoria da rede foi acompanhada pelo aumento da utilização do
transporte individual.
Apesar destas melhorias, ainda existem zonas com cobertura deficiente da rede de
distribuição principal em Lisboa, nomeadamente nas zonas da Ajuda, núcleo histórico envolvente
à Baixa, Chelas/Marvila/Beato, e Coroa Periférica Norte (Lumiar-Carnide), embora os dois
últimos sejam zonas menos edificadas.
Foram identificadas as seguintes ligações em falta, identificadas na Figura 4-9:
(1) Via de distribuição principal na zona da Ajuda que se desenvolva na direção Oriente-Ocidente
de forma a ligar as vias norte-sul existentes.
(2) Via de distribuição principal, prevista no PDM, na zona de Carnide Norte, Lumiar Norte e
Charneca, complementada por vias de distribuição secundária, de modo a promover a ligação
entre vias estruturantes, como a Calçada de Carriche, e servir de elemento base para um
ordenamento urbanístico destes bairros.
(3) Desenvolvimento da malha viária em Chelas até Xabregas de modo a promover uma
cobertura espacial eficaz;
(4) Vias de distribuição local no núcleo histórico envolvente à Baixa, nomeadamente na colina
do Castelo e bairro da Graça, para reforçar a cobertura deste local e providenciar orientação
circular.
43
Embora a rede de Lisboa se encontre em fase avançada de consolidação, a implementação
destas ligações assegurará uma eficiência substancialmente superior da rede.
A malha viária de Florianópolis apresenta um modelo radial em que todo o tráfego deriva de
um ponto circulando pelo resto da ilha. Notam-se grandes descontinuidades na rede, de tal
maneira que o tráfego é encaminhado para os extremos mas não apresenta saídas alternativas,
criando pontos de acumulação.
A falta de conexão das longas vias entre si dificultam ou até mesmo inviabilizam as
deslocações pedonais entre elas, resultando numa canalização de todo o tráfego para a via
principal. Como consequência, esta via tende a ficar saturada e a concentrar uma maior
diversidade de usos, nomeadamente o de serviços e comércio.
Uma das principais dificuldades a ultrapassar em relação ao sistema viário são as
características geográficas da ilha que, com os morros, montanhas, lagoas e dunas, propicia
uma malha fragmentada e com falta de conexões entre bairros.
A dispersão da população pelo município é também um elemento incentivador do uso do
transporte individual e da fraca conectividade da malha viária.
4
3
2
1
Figura 4-9: Principais carências na rede viária de Lisboa (adaptado pela autora)
44
O município de Florianópolis apresenta as seguintes ligações em falta, identificadas na
Figura 4-10:
(1) Via Sectorial no Centro fazendo a ligação entre a Avenida Prof. Henrique da Silva Fontes e a
Avenida Osvaldo Rodrigues Cabral, tal que para isso é necessário ultrapassar o Morro da Cruz;
(2) Desenvolvimento da Avenida Mauro Ramos para via sectorial;
(3) Via Sectorial na parte continental apresentando uma alternativa à BR-282;
(4) Via subterrânea entre o Córrego Grande e a Lagoa da Conceição, promovendo um acesso
direto a estes bairros e a utilização de modos suaves que atualmente é impedida devido à
barreira do morro;
(5) Vias locais conectando as vias perpendiculares às vias principais, suavizando a configuração
de “espinha de peixe”.
A análise dos níveis de saturação é feita de uma forma visual que permite uma
interpretação rápida e simplificada das zonas de maior concentração de tráfego na cidade.
Permite identificar os troços mais carregados e onde ocorre o congestionamento nas horas de
ponta. Troços com saturações superiores a 90% indicam uma circulação condicionada e muito
instável e estão representados no mapa como sendo trânsito lento (vermelho).
1 2
3 4
5
Figura 4-10: Principais carências na rede viária de Florianópolis (adaptado pela autora)
45
Nas figuras 4.11 e 4.12 está representado o grau de saturação da malha viária de Lisboa
no período de ponta da manhã.
Figura 4-11: Nível de Saturação da rede viária de Lisboa na hora de ponta da manhã (Fonte: Google Maps, 2015)
Figura 4-12: Pormenor do Nível de Saturação da rede viária no centro de Lisboa na hora de ponta da manhã (Fonte: Google Maps, 2015)
46
Através da análise do mapa de saturação da rede viária de Lisboa na hora de ponta da
manhã, constata-se que as vias com saturação superior a 90% são as que dão acesso ao centro
de Lisboa nomeadamente IC19, A5, 2ª Circular e Ponte 25 de Abril. Dentro do município as vias
mais saturadas são as mais próximas dos pólos de emprego, ou seja, as vias de distribuição
para o centro, como Avenidas Novas, Avenida Almirante Reis e Av. Infante Dom Henrique.
No período de ponta da tarde ocorre a mesma situação, mas neste caso para sair de
Lisboa. Verifica-se que os níveis de saturação são mais baixos que de manhã e existe um menor
número de vias saturadas.
Nas figuras seguintes está representado o grau de saturação da malha viária de
Florianópolis nos períodos de ponta da manhã e da tarde.
Segundo dados do Detran/SC (2012), a capacidade das Pontes Colombo Salles e Pedro
Ivo Campos é de 40 mil veículos por dia. No entanto, verifica-se que a sua utilização é de 197
mil veículos por dia, ultrapassando a sua capacidade em 5 vezes. Isto significa que para as duas
pontes funcionarem para a capacidade que foram projetadas, seriam necessárias mais três
pontes iguais a essas, ou seja, uma solução inviável e que na prática atrairia mais tráfego
automóvel.
Mais de 40 vias da capital operam acima da sua capacidade nos horários de pico e
apresentam elevados níveis de saturação, entre os 80% e os 100%. Aqui, as velocidades
praticadas são baixas e apresentam congestionamentos.
Na temporada de Verão os congestionamentos são bastante superiores, principalmente
nas vias de acesso às praias, visto que no horário de pico da tarde, dos 14 mil banhistas, 60%
Figura 4-13: Nível de Saturação da rede viária de Florianópolis (Fonte: Plamus, 2015)
47
se desloca de transporte individual. Neste período, as filas ultrapassam facilmente os 30 minutos
de espera. Considerando a vocação turística da cidade e a economia gerada por essa atividade,
a questão do congestionamento torna-se ainda mais crítica.
Dos R$543.8 milhões investidos na expansão viária entre 2000 e 2011, 40% foi aplicado
na recuperação da Ponte Hercílio Luz, uma via onde não transita nenhum tipo de veículo ou
pedestre e que, de momento, tem um valor meramente patrimonial.
Através da análise do mapa de saturação da rede viária de Florianópolis na hora de
ponta da tarde (Figura 4-14), tal como acontece em Lisboa, constata-se que as vias com
saturação superior a 90% são as que dão acesso ao centro da cidade e que, dentro do município
as vias mais saturadas são as mais próximas dos pólos de emprego. Assim tem-se as pontes, a
SC-404 e SC-405 e dentro do município a Avenida Mauro Ramos, Av. Beira Mar e Av. Prof.
Henrique da Silva Fontes.
Tanto Lisboa como Florianópolis são pólos atractores de tráfego estando rodeadas por um
conjunto de concelhos que diariamente geram tráfego de entrada nas cidades.
Nos últimos anos, na maior parte dos corredores de acesso a Lisboa assistiu-se a uma
diminuição dos volumes de tráfego, consequência do aumento de desemprego, perda de poder
económico e de qualidade de vida. A este facto aliou-se um aumento da utilização do transporte
Figura 4-14: Pormenor dos Níveis de Saturação da rede viária no centro de Florianópolis (Fonte: Google Maps, 2015)
48
individual em detrimento do transporte coletivo e dos modos suaves, o que, parecendo
contraditório, tem a sua possível explicação no elevado valor das tarifas de TC.
Por outro lado, em Florianópolis os volumes de entrada têm aumentado continuamente e
o transporte individual ainda é o modo mais utilizado, não havendo grandes benefícios na
utilização do transporte coletivo. Como a capacidade do sistema viário é limitada e não
acompanha o incremento da procura, congestionamentos e aumentos nos tempos de viagens
são cada vez maiores e mais frequentes.
O tráfego de atravessamento em Lisboa, que diariamente era cerca de 1/3 do tráfego total,
era também um dos grandes problemas que afetava a cidade, mas que com a conclusão da
CRIL e do eixo N-S diminuiu significativamente.
O aumento da utilização do transporte individual em relação a outros modos de transporte
é também uma questão problemática na mobilidade urbana. A procura de soluções para os
problemas de congestionamento ainda concentra esforços na expansão do sistema viário a fim
de adequar a capacidade ao volume crescente de veículos motorizados. Elevados recursos são
gastos pelo poder público na construção de viadutos, rodovias em áreas urbanas e outras obras
viárias. Esta prática é limitada ao longo do tempo pois acaba por atrair mais veículos e atingir a
sua taxa de saturação num curto espaço de tempo.
4.1.3 - Estacionamento
O estacionamento é um elemento essencial nos planos de mobilidade pois está
diretamente relacionado com a acessibilidade, uso do espaço público e, principalmente, como
regulador da repartição modal, pelo condicionamento da acessibilidade em transporte individual.
Representa um papel importante na solução para os engarrafamentos, visto que cerca de 20 a
30% dos automóveis que circulam pelas ruas de uma cidade a qualquer momento procuram um
espaço livre para estacionar.
A existência de estacionamento no local de destino da viagem e a sua gestão são
elementos condicionadores na escolha do transporte individual pois tem um impacto direto no
custo associado à utilização do automóvel.
A maior parte das viagens onde se utiliza o transporte individual é o percurso casa-
trabalho-casa, o que implica que o automóvel fica parado 90% do tempo, ocupando espaço
privado e público, mesmo este sendo limitado nas áreas com maior exigência de espaço de
estacionamento, como nas áreas centrais da cidade.
Verifica-se, na Figura 4-15, que quanto maior a disponibilidade de estacionamento no
local de trabalho, maior irá ser a utilização do transporte individual, sendo imperativo a
apresentação de soluções para este problema.
49
Figura 4-15: Repartição modal em função da disponibilidade de estacionamento no local de trabalho (Fonte: Les politiques de stationnement après la loi SRU, Pourquoi? Comment?, CERTU, 2003)
A oferta de estacionamento pode ser decomposta em função dos regimes de acesso
(público ou privado), do regime de pagamento (gratuito ou pago) ou da sua localização (na via
ou fora desta).
Todos os dias 600 mil automobilistas disputam 350 mil lugares de estacionamento na
cidade de Lisboa. Em 2003, estimou-se que cerca de 30% do número de veículos total
permaneciam imóveis durante todo o dia, criando uma grande necessidade de estacionamento.
Essa procura diária encontra-se exposta na Figura 4-16.
Figura 4-16: Evolução da procura diária de estacionamento ao longo do dia em Lisboa (Fonte: TIS, Inquérito à mobilidade 2003/2004)
50
O estacionamento em Lisboa encontra-se a cargo da EMEL (Empresa Municipal de
Mobilidade e Estacionamento de Lisboa).
Acerca do estacionamento na via pública (Figura 4-17), estão disponíveis 150 mil lugares
sendo 45 mil tarifados. Os lugares tarifados da via pública, maioritariamente concentrados nas
áreas centrais, são de curta duração e com limites máximos de tempo de estacionamento,
divididos em três zonas:
- Zona verde, nas zonas menos centrais e com um custo por hora mais económico;
- Zona amarela, na zona central da cidade, bem servida de transportes públicos e com
um custo mais elevado que a tarifa verde,
- Zona encarnada, nos principais eixos da cidade, com um custo duas vezes superior ao
verde, sendo apenas permitido o estacionamento por um período máximo de 2 horas.
O pagamento do estacionamento pode ser feito nos diversos parquímetros existentes,
com títulos de estacionamento previamente adquiridos ou através da aplicação da EMEL na
Internet. No Quadro 4.4 apresenta-se o tarifário em vigor para cada zona de estacionamento.
Os residentes e os comerciantes da cidade podem solicitar um cartão que os isenta do
pagamento do estacionamento, o dístico de residente. Atualmente existem 43 mil dísticos de
residentes em Lisboa.
00h15 00h30 1h00 1h30 2h00 2h30 3h00 3h30 4h00
Zona Verde € 0.25 € 0.40 € 0.80 € 1.20 € 1.60 € 2.00 € 2.40 € 2.80 € 3.20
Zona Amarela € 0.35 € 0.60 € 1.20 € 1.80 € 2.40 € 3.00 € 3.60 € 4.20 € 4.80
Zona Vermelha € 0.45 € 0.80 € 1.60 € 2.40 € 3.20
Quadro 4.4: Tarifário em vigor em cada zona de estacionamento por período de tempo (Fonte: EMEL, 2015)
Figura 4-17: Tarifários na via pública: zona verde, amarela e encarnada (Fonte: EMEL, 2015)
51
Devido à falta de dados sobre o estacionamento em Florianópolis não é possível saber ao
certo o número de lugares de estacionamento existente na cidade. No entanto em Florianópolis a
questão do estacionamento é mais gravosa que em Lisboa, visto que o transporte público tem uma
qualidade menor e há uma maior utilização do transporte individual.
Foi posto em prática, ainda no ano corrente, um sistema de estacionamento rotativo com
parquímetros eletrónicos através do Programa Zona Azul, concessionado pela empresa privada Dom
Parking Estacionamentos Ltda.. Os serviços da Zona Azul contam com 5 mil lugares tarifados na via
pública, maioritariamente concentrados nas áreas centrais (Figura 4-18), de curta duração e com
limites máximos de tempo de estacionamento, à semelhança do existente em Lisboa. Na primeira fase
de implantação, apenas foi abrangido o Centro de Florianópolis, mas numa segunda fase será
estendido ao Continente, Trindade e Beira Mar Norte.
A tarifa é igual em todas as zonas, com um valor horário de R$ 2 para automóveis e R$ 1 para
motociclos. Tal como na aplicação da EMEL, este sistema de pagamento funciona via internet, e não
é necessário colocar o recibo dentro do automóvel, tal que o motorista paga apenas o tempo utilizado.
Além dos lugares na via pública, em Lisboa existem 150 parques de estacionamento de
acesso público em funcionamento, os quais totalizam mais de 80 mil lugares, distribuídos por
parques de rotação ou de curta duração, parques de longa duração que podem funcionar como
parques de Park & Ride e parques de centros comerciais.
Em Lisboa começou agora a ser adotado o sistema Park & Ride, tal que para isso foi
criado um título integrado Park & Ride que combina Carris, Metro e estacionamento em parque
por 30 dias. Este título tem um preço de 51.5€ e concede ao utilizador o direito ao transporte na
Carris e Metropolitano de Lisboa e a estacionar nos 9 parques aderentes da EMEL e EMPARK
situados em pontos vitais.
Figura 4-18: Localização do Sistema Zonal Azul em Florianópolis (Fonte: minhavaga.com.br)
52
A capital catarinense possui mais de 40 parques de estacionamento tarifados de acesso
público, um número bastante reduzido comparado com Lisboa, e ainda não é discutido o conceito Park
& Ride.
Alguns dos bairros históricos de Lisboa, como Alfama, Bairro Alto, Castelo e Santa
Catarina/Bica, são zonas de acesso automóvel condicionado de modo a contrariar o
estacionamento desordenado de veículos e privilegiando o modo pedonal, aumentando a
segurança dos residentes, comerciantes locais e visitantes.
O número de lugares de estacionamento ainda não é suficiente para a demanda do transporte
individual em Florianópolis. Por toda a cidade observam-se situações de incumprimento das regras de
tráfego, principalmente por estacionamento abusivo.
Um dos problemas mais marcantes é a grande oferta de estacionamento num dos principais
pólos atractores de tráfegos, a UFSC. Grande parte da área da universidade federal é ocupada por
parques de estacionamento grátis, o que leva a uma grande utilização do transporte individual por
parte de estudantes.
A solução para o problema de estacionamento na cidade brasileira não passa por criar uma
maior oferta de lugares, pois isso apenas iria atrair um maior número de automóveis, mas por melhorar
as condições do transporte público e modos suaves principalmente nos acessos a zonas de
concentração de comércio, lazer e serviços. A par com a intervenção nos outros modos de transporte,
o estacionamento deve ser submetido a uma fiscalização rígida e pode haver um maior número de
lugares sujeitos a tarifa.
Apesar da notável evolução que o sistema e gestão de estacionamento foi submetido
nos últimos anos, a taxa de utilização do transporte individual ainda representa a maior parcela
da repartição modal na cidade de Lisboa.
O estacionamento pode ter um importante papel nesta situação e para isso podem ser
tomadas diversas medidas em ambas as cidades:
- Fiscalização contínua que garanta o respeito pelas regras de estacionamento e que
evite infrações;
- Promoção de estacionamento na zona periférica dos municípios, junto às interfaces de
transporte público, como parques de Park & Ride.
- Desincentivar o estacionamento junto a estações de metro (em Lisboa) no centro da
cidade através da aplicação de tarifas mais elevadas e incentivando dessa forma a utilização do
metropolitano nas deslocações no interior da cidade;
- Tarifas mais elevadas nos estacionamentos na via pública quando situados junto a
parques de estacionamento públicos tarifados.
- Dimensionamento da oferta de estacionamento, tendo em consideração a
acessibilidade em modos de transporte mais sustentáveis (transporte público e modos suaves)
e a necessidade de proteger determinadas áreas da cidade.
53
A diferença mais marcante nas duas cidades é o número de lugares pagos de
estacionamento. Enquanto que a probabilidade de estacionar num lugar pago no centro da
cidade é de 10% nas cidades brasileiras, esse valor aumenta para 70% nas cidades europeias.
Além disto, é ainda bastante evidente que em Florianópolis os motoristas dão por assegurado o
estacionamento, mas como Enrique Peñalosa refere, o “estacionamento não é um direito
constitucional em lugar algum; é uma questão privada que deveria ser resolvida em espaços
privados, com fundos privados”.
No estudo do sistema de estacionamento em qualquer cidade deve ser tida em conta
que este é bastante complexo e um instrumento fundamental das políticas urbanas e de
mobilidade. Numa cidade existem diversas dinâmicas associadas quer à sua localização quer
aos múltiplos atores envolvidos. Esta diversidade de situações implica a necessidade de
implementação de políticas diferenciadas de estacionamento.
Redes de transporte coletivo
4.2.1 - As ligações metropolitanas/regionais
A ligação entre a AML e Lisboa por transporte coletivo é realizada em três modos de
transporte: autocarro, comboio e barco. Atualmente existem 15 empresas de transporte a
operarem na AML, mas as principais operadoras responsáveis por esse transporte são:
- CP, Fertagus e Metropolitano de Lisboa, para o modo ferroviário;
- Transtejo e Soflusa, para o modo fluvial.
- TST, CARRIS, TCB, Sulfertagus, Setubalense, Barraqueiro, RL, Scotturb e Vimeca, entre
outras, para os autocarros;
No Quadro 4.5 apresentam-se as principais características de algumas das operadoras.
Rede (km) Nr. Estações Percurso
médio/pass.
Passageiros Transportados
(2010)
CP 143 143 15.7 94 711 885
Fertagus 54 14 17.13 22 927 510
Metro 43.2 55 4.74 182 781 204
Transtejo/SL 38.91 9 9 28 531 369
Carris (autocarros) 678 2106 3.4 220 554 380
TST 3418 3790 7.24 72 364 373
Vimeca 1490 2153 5.97 53 807 245
Quadro 4.5: Principais características das operadoras de TC na AML (Fonte: AMTL, 2010)
54
De uma forma geral, com exceção dos operadores ferroviários que atravessam diversos
concelhos da AML, a maioria dos operadores apresenta áreas de exploração relativamente bem
definidas e onde atuam praticamente sem concorrência.
Em Florianópolis os únicos meios de transporte coletivo são os autocarros e
semicolectivos, tanto dentro do município como na ligação entre este e a respetiva área
metropolitana. São 7 os operadores principais de transporte coletivo que atuam na Área
Metropolitana de Florianópolis, sendo que 3 fazem a ligação entre Florianópolis e os outros
municípios, todas elas de autocarros:
- Jotur, que faz a ligação entre São José e Florianópolis;
- Estrela, ligando o Norte de São José e Florianópolis;
- Biguaçu, que atende os municípios de Florianópolis, Biguaçu, Antônio Carlos, Governador
Celso Ramos e Tijucas.
As empresas que atuam na ilha são Canasvieiras, Transol e Insular enquanto que as
empresas que atuam na parte continental são a Emflotur e Estrela.
A maneira mais simples de quantificar o número de pessoas que entram em Florianópolis
através de transporte público é analisando os movimentos nas pontes. Assim, verificou-se que,
de todo o tráfego que atravessa a ponte apenas 3% é de autocarros, transportando 10 mil
pessoas por hora e ocupando 1% da capacidade da ponte. Estes números correspondem a 240
autocarros no sentido do continente para a ilha que, na hora de pico, teriam capacidade para
transportar 18 mil pessoas e que poderiam tirar da ponte 12 000 automóveis por hora,
considerando que a taxa de ocupação por automóvel é de 1.5 passageiros.
Figura 4-19: Área de influência das principais operadoras de TC na AMF
55
Azambuja
Sintra
Cascais Sado
Na AMF, as áreas de exploração dos diferentes operadores sobrepõem-se em diversas
áreas, principalmente no centro da cidade junto às pontes, na parte continental e insular.
Existem três tipos diferentes de contratos celebrados entre o Estado e os operadores de
transporte: (1) concessão de serviço público, onde o operador é remunerado total ou
parcialmente através das tarifas cobradas e a assunção maioritária do risco de exploração cabe
ao operador; (2) prestação de serviço público, onde as receitas tarifárias são alocadas ao Estado
e não há transferência do risco de exploração para o operador; (3) misto.
Pelo menos 10 operadores em Lisboa são privados com serviços concessionados por
linha (mais de 12.000 kms) e pelo prazo de 10 anos renováveis de cinco em cinco. Acresce a
exploração do comboio suburbano (Fertagus), atravessando a Ponte sobre o Tejo, numa
contratualização a 30 anos (renovável). Como operadores públicos há a Carris, Metro, CP,
Transtejo e Soflusa.
Dos operadores da AML, a CP é a mais utilizada para a entrada em Lisboa devido à sua
operação alargada, abrangendo concelhos bastante populosos. No entanto, quando comparada
com a Fertagus, a sua imagem percebida não é muito positiva, sobretudo devido à falta de
investimento nas vias, estações e carruagens, ao que acrescem problemas de segurança
nalgumas linhas.
A oferta ferroviária em Lisboa é ao nível da exploração realizada em 5 linhas: Linha da
Azambuja, Linha de Sintra, Linha de Cascais, Eixo Norte-Sul, Linha do Sado. A oferta varia de
linha para linha, localizando-se os troços mais carregados na Linha de Sintra entre Queluz/
Massamá e Campolide e na Linha de Cascais entre Oeiras e Cais do Sodré, todos eles com uma
oferta acima das 20 circulações/ hora.
Relativamente ao transporte fluvial este é totalmente explorado pela Transtejo e Soflusa,
estabelecendo a ligação entre as duas margens utilizando 11 terminais, sendo 5 na margem
norte (Cais do Sodré, Belém, Parque das Nações e 2 no Terreiro do Paço) e 6 na margem sul
(Barreiro, Cacilhas, Seixal, Montijo, Trafaria e Porto Brandão).
Fertagus
Figura 4-20: Linhas ferroviárias com ligação a Lisboa (Fonte: CP, 2010)
56
O principal ponto de concentração da oferta é o Cais do Sodré, com cerca de 300
serviços diários (em ambos os sentidos), seguindo-se o Terreiro do Paço com 154 serviços.
Relativamente ao transporte rodoviário a oferta entre os municípios da AML e Lisboa é
realizada através de um grande número de operadores, que de uma forma geral possuem
concessão de áreas de exploração diferenciadas, exceto nas vias rápidas ou nos eixos de
entrada na cidade. As áreas com maior oferta deste tipo de transporte são as que não estão
servidas por outro tipo de transporte coletivo. O rebatimento destas carreiras é feito sobre as
principais interfaces de transporte coletivo suburbano.
Todas as empresas de transportes a operar na Grande Florianópolis são privadas com
concessão de serviço público. No município, a gestão dos transportes coletivos por autocarros
está a cargo do Consórcio Fênix, determinando a operação do sistema por um único
concessionário. Este Consórcio incluiu as empresas Canasvieiras, Emflotur, Estrela, Insular e
Transol.
4.2.2 - Organização das redes de TC urbanas
No concelho de Lisboa existem apenas três operadores de transporte coletivo: a Carris,
o Metropolitano de Lisboa e a CP, através da linha de Cintura, que no entanto não apresenta
procuras elevadas para viagens urbanas.
Nos últimos anos tem-se assistido a uma contínua melhoria dos transportes coletivos na
área do município, nomeadamente em relação à cobertura da rede e integração com diferentes
redes, no entanto a procura e a utilização do TC têm diminuído ao longo dos anos. A utilização
do TC nos movimentos internos em Lisboa era de 50% em 1991, 40% em 2001 e em 2011
diminuiu para 35%. O rápido crescimento na aquisição de automóvel é a principal razão para
esta redução da quota do TC na repartição modal, já que veio substituir os outros meios
motorizados, a sua introdução na cidade não veio acompanhada por restrições de utilização e
entrada em Lisboa e não houve um desenvolvimento correspondente por parte do TC, como
também está a acontecer em Florianópolis.
Figura 4-21: Linhas de transporte fluvial com ligação a Lisboa (Fonte: Transtejo)
57
Figura 4-23: Mapa das linhas de Metro em Lisboa (Fonte: Metropolitano de Lisboa, 2015)
Metropolitano de Lisboa
O Metropolitano de Lisboa conta com quatro linhas autónomas, com cerca de 43.2 km
de comprimento e 55 estações, sendo que a distância média entre elas é de 770 metros. O
intervalo entre passagens de comboios tem uma média de 6 minutos, sendo ajustado conforme
o horário e linha, e a velocidade comercial é de 27km/h.
Apresenta bons níveis de oferta, com intervalos entre comboios inferiores a 4 minutos
nas horas de ponta e até 12 minutos nos períodos de menor procura.
O sistema de metro tem o custo mais elevado de implantação, no entanto, permite
transportar o maior número de passageiros, cerca de 80 a 90 mil passageiros por hora. Este
sistema não ocupa o espaço urbano e permite a sua requalificação, atenua problemas de
congestionamento e reduz a pressão sobre o estacionamento. É responsável pela distribuição
dos fluxos suburbanos que chegam diariamente à cidade. Só em 2013, o Metropolitano de Lisboa
transportou mais de 135 milhões de passageiros. As estações de Metro que movimentam mais
passageiros são as estações da Baixa/Chiado, Marquês de Pombal, Campo Grande e Alameda,
todas elas estações de cruzamento de linhas.
0
50
100
150
200
250
300
2004 2006 2008 2010 2012
Pas
sage
iro
s Tr
ansp
ort
ado
s (m
ilhõ
es)
Evolução da procura
Metro
Carris
Figura 4-22: Evolução da procura no Metro e Carris entre 2004 e 2012 (Fonte:Transportes de Lisboa, 2012)
58
CARRIS
A Carris possui a concessão exclusiva dos serviços de transporte coletivo de superfície
de Lisboa, os quais são explorados através de 745 autocarros, 54 elétricos, 3 ascensores e 1
elevador.
A rede de autocarros percorre uma extensão de 667 km e tem 78 carreiras, abrangendo
praticamente toda a área do concelho. A idade média da frota é de 7.58 anos e a velocidade
comercial é de 14.6km/h.
Em 2013, a Carris foi a operadora que transportou mais passageiros na AML. Esse
número foi de mais de 170 milhões de passageiros transportados, uma quebra face a 2012, ano
em que transportou 180 milhões de passageiros.
Apesar da cidade de Lisboa contar com mais de 80 km de corredores BUS e ter um
sistema que prioriza o TC nos cruzamentos semaforizados, não se verificou uma melhoria nas
condições de circulação dos autocarros, isto é, a velocidade praticada tem-se mantido constante
nos últimos anos. Este desempenho traduz-se na perda de passageiros para outros meios de
transporte, facto esse acentuado nos últimos anos por um grande aumento nas tarifas (cerca de
25%) e redução de linhas e serviços (na ordem dos 20% por km percorridos) devido às
orientações do governo quanto à redução do défice de exploração da empresa.
Figura 4-24: Mapa da rede de autocarros em Lisboa (Fonte: CARRIS, 2015)
59
No que respeita à oferta total, esta varia conforme as carreiras. Verifica-se que nos
períodos de maior procura, os intervalos entre serviços são, em média, de 10 minutos, e que nos
restantes períodos esse tempo é o dobro.
Consórcio Fênix
No município de Florianópolis os transportes coletivos funcionam num Sistema Integrado
de Transportes, gerido pelo Consórcio Fênix. As seis empresas que fazem parte do Consórcio
são independentes e encontram-se interligadas a um sistema de transporte estabelecido a partir
de seis terminais de integração operando através de bilhetagem eletrónica. Os passageiros
podem fazer qualquer transbordo dentro dos terminais sem que lhes seja cobrado mais um título
de transporte, ao contrário do que sucede em Lisboa.
Os seis terminais de integração (TICEN, TITRI, TILAG, TIRIO, TISAN, TICAN) estão
distribuídos pela ilha, conforme indicado na Figura 4-25, sendo o principal o TICEN (terminal de
integração do Centro de Florianópolis) onde todas as linhas são conectadas, seja do lado da ilha
seja do continente. Este terminal do Centro concentra 70% das viagens realizadas.
Figura 4-25: Localização dos terminais de integração e das principais linhas de autocarros
(Fonte: Mobfloripa, 2014)
60
Os terminais TISAC e TIJAR estão desativados desde 2003, enquanto que o TICAP
nunca foi utilizado, ou seja, do lado do continente não existe nenhum terminal em utilização, o
que faz com que todo o tráfego se concentre no TICEN.
O Consórcio Fênix possui atualmente um total de 524 veículos, com uma idade média
de 5,4 anos. A rede tem mais de 200 carreiras, incluindo Executivos (autocarros de maior
qualidade que param em qualquer ponto do percurso que o passageiro escolher) e Madrugadões
(que fazem o percurso no início da manhã), e dividem-se em linhas: alimentadora, principal
expressa, principal paradora, principal semi-expressa, complementar circular, complementar
periférica e periférica. A velocidade média a que os autocarros circulam nas horas de ponta é
bastante baixa, apenas 8km/h, visto que estão sujeitos ao mesmo congestionamento que o
transporte individual. Existem 1019 paragens e a distância entre elas está entre os 200 e os 400
metros.
No Quadro 4.6, são apresentados os principais parâmetros operacionais do Sistema de
Transportes de Florianópolis para cada empresa de autocarros. No geral observa-se que há uma
procura de 54 milhões de passageiros por ano, cerca de ¼ do verificado na CARRIS em Lisboa.
No estudo realizado pelo Plamus (2015), verificou-se que a distribuição horária de
embarques está toda concentrada nos horários de pico, ou seja, 70% dos embarques ocorrem
tanto na hora de pico da manhã como na de tarde.
No que respeita à oferta total esta varia conforme as carreiras. Verifica-se que nos
períodos de maior procura, os intervalos mínimos entre serviços são de 10 minutos para carreiras
com muita procura, mas em média esse tempo é de 20 minutos.
No município existem ainda duas linhas hidroviárias que ligam a Lagoa da Conceição à
Costa da Lagoa, por não existir nenhuma ligação terrestre para veículos automóveis com esta
comunidade.
Quadro 4.6: Parâmetros operacionais do Sistema de Transporte Coletivo em Florianópolis (Fonte: Secretaria Municipal de Transportes, Mobilidade e Terminais / Prefeitura Municipal de Florianópolis –
SMTMT/PMF, 2011)
61
4.2.3 - Entidades Reguladoras e Sistema Tarifário
Em Lisboa, a organização institucional em relação aos transportes é a apresentada na
Figura 4-26. Os decisores políticos estão no topo da cadeia, assim como em Florianópolis,
seguindo-se a Autoridade Reguladora Nacional (IMT) que tem o poder de decisão a nível do
território nacional, para a área metropolitana de Lisboa a Autoridade Metropolitana de
Transportes e, ao nível do município, o poder decisivo cabe às Câmaras Municipais, exceto no
caso de Lisboa onde é o governo nacional que tutela diretamente as empresas públicas.
O sistema tarifário aplicado em cada rede de transportes deve ter em conta a situação
atual da cidade e dos operadores de transportes, na medida em que a sua modelação deve
promover a utilização dos transportes coletivos numa ótica intermodal e ser financeiramente
equilibrado, com uma adequada remuneração dos diferentes modos e operadores de transportes
públicos.
Ao nível do concelho de Lisboa, o sistema tarifário permite a articulação modal entre a
Carris, o Metropolitano e os comboios dentro da área do município.
Os principais títulos de transporte em vigor em Lisboa são:
- Para viagens únicas: o bilhete simples, com um custo de 1.40€ para toda a área do
concelho, que pode ser usado nos autocarros ou no metro. É um cartão que pode ser reutilizado
até ao seu prazo de validade.
- Para viagens multimodais: o bilhete Zapping, um bilhete recarregável onde o valor da
viagem vai sendo descontado ao saldo remanescente do cartão, consoante a tarifa e as
condições de utilização de cada operador. Pode ser utilizado na Carris, Metro, comboios e
barcos. O valor de uma viagem com Zapping Carris ou Metro tem o custo de 1.25€.
- Para tarifas mensais: os passes Navegante, válidos no Metro, Carris e percursos
urbanos de Lisboa da CP, durante 30 dias consecutivos; ou os passes mensais, válidos nos
Figura 4-26: Organização institucional dos transportes em Portugal (Fonte: IMT, 2010)
62
modos de transporte que operam nas diferentes zonas que integram a estrutura de coroas da
Área Metropolitana de Lisboa.
Todos estes bilhetes são do tipo bilhética sem contacto. Existem bastantes mais títulos
de transporte na área metropolitana de Lisboa, dependendo de cada operador e das
combinações entre operadores diferentes, mas para circular dentro do concelho de Lisboa, os
títulos apresentados acima são os essenciais. Existe ainda um sistema de tarifas reduzidas
aplicáveis a crianças, idosos ou pessoas com rendimentos reduzidos, geralmente entre os 25 e
os 50% de desconto.
A comparação dos custos entre o utilizador de transportes públicos e o do automóvel é
complexa, independentemente do critério aplicado.
Utilizando a metodologia de Silvestre (2013) considerou-se um custo4 para o automóvel
de 0.15€/km. Este valor foi obtido considerando o consumo médio 7 l/100km, com a gasolina a
1,7 €/l. Isto origina um valor de 0,12 €/km. Os restantes 0,03 €/km são os custos periódicos das
mudanças de óleo, revisões, mudanças de pneus, etc.
O utilizador do TC possui passe, originando o custo de 35 € ao mês, por pessoa. Em
média, em Lisboa cada pessoa faz 2 viagens por dia (CML, 2009), tal que em 30 dias paga 0,60
€ por viagem. Se cada viagem é de 5km (INE, 2012), o utilizador de transporte coletivo suporta
um custo de 0.12€/km.
Verifica-se que o custo de utilização do transporte individual é muito semelhante ao custo
do transporte coletivo, ou seja, utilizando apenas o critério do custo da viagem o automóvel
mostra-se mais atrativo. No entanto, não se está a considerar nestes cálculos o custo do
estacionamento, das portagens nas pontes e nas autoestradas que ligam Lisboa aos concelhos
vizinhos ou o tempo de viagem. Se estes indicadores fossem introduzidos, o custo do automóvel
seria mais elevado.
No Brasil, após os decisores políticos segue-se a Secretaria Nacional de Transporte e
da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades para a regulação dos transportes. Ao nível do
Estado de Santa Catarina a Agência Reguladora de Serviços Públicos de Santa Catarina
assegura, entre outros, a prestação de serviços de transportes pelos concessionários adequados
e, no município de Florianópolis, o serviço de transporte coletivo é administrado pela Prefeitura
Municipal através da Secretaria Municipal de Transportes e Terminais. O transporte público em
Florianópolis tem vindo a ser estabelecido a partir de acordos construídos ao longo do tempo
entre operadores privados e poder público.
A implantação do Sistema Integrado de Transporte possibilitou a integração tarifária,
criando o Passe Rápido, um sistema de bilhetagem eletrónico que utiliza um cartão sem contacto
4 Os cálculos foram realizados para uma taxa de ocupação do automóvel de 1 pessoa por veículo. É necessário ter em atenção que, se o veículo for ocupado por mais passageiros, o custo da viagem por automóvel vai ser mais baixo.
63
à semelhança do existente em Lisboa. Funciona com a Tarifa Única, cujo valor é de R$2.98
(0.88€) para cartão pré-pago, e são aplicados descontos a estudantes, idosos e cidadãos de
baixo rendimento. Não é aplicado um sistema de passes mensais, ou seja, o passageiro paga
sempre o mesmo valor por viagem independentemente de comprar um ou mais bilhetes.
O custo para o automóvel é de R$0.24/km (0.07€/km), considerando um consumo médio
de 7 l/100km, a gasolina ao preço de R$3/l e R$0.03/km para custos periódicos. Este valor é
cerca de metade do verificado para Lisboa.
O custo para o utilizador de transporte coletivo é de R$0.43/km (0.12€/km), tendo em
conta que uma viagem custa 2.98R$ e a distância média por viagem é de 7km5. É exatamente o
mesmo custo que em Lisboa, mas para uma cidade brasileira este valor deveria ser mais baixo.
Com esta grande diferença de custos, o dobro para o transporte coletivo, é justificável a
repartição modal observada para Florianópolis.
4.2.4 - Desempenho das Redes
Assim como acontece na rede viária, também para o TC em Lisboa, a procura concentra-
se nos eixos tradicionais de serviços, como a Baixa, Avenida da Liberdade, Av. Almirante Reis,
Av. Da República… A coincidência dos principais eixos de oferta da Carris com os do
Metropolitano traduz a falta de articulação multimodal da rede de transportes no concelho.
A oferta de serviços da Carris no corpo do dia, entre as 10h e as 17h, é considerada
insuficiente por parte dos utilizadores da mesma, sendo que os intervalos de passagem são
superiores a 15 minutos. Esta situação também se verifica, e é mais gravosa, nas novas
centralidades, como o Parque das Nações ou a Alta de Lisboa, zonas que deveriam ser bem
servidas de TC para propiciar o seu desenvolvimento.
Os problemas apresentados pela operadora de transporte terrestre decorrem da sua falta
de inovação e adaptação aos tempos modernos, não garantindo fiabilidade e regularidade na
oferta. O facto de os corredores BUS apresentarem descontinuidades em pontos críticos e de as
distâncias entre paragens serem pequenas (200 metros) contribuem também para a baixa
velocidade comercial praticada. O aumento de 1km/h na velocidade comercial significaria uma
poupança de 5 milhões de euros por ano.
Nos últimos anos, devido à diminuição da utilização do transporte público, a Carris
diminuiu a cobertura da sua rede, de modo a diminuir os custos operacionais, mas por outro lado,
investiu em inovações tecnológicas como internet a bordo, piso rebaixado e serviço de
mensagens de telemóvel que indicam em tempo real o tempo de espera em cada paragem e
para cada linha.
5 Valor deduzido pela autora, considerando que a maior parte das deslocações são realizadas no centro da cidade.
64
Uma das adversidades que as empresas públicas, como a Carris e o Metropolitano, têm
tido mais dificuldade em ultrapassar é o crescente endividamento, os elevados défices
operacionais e, no geral, uma situação económica bastante desfavorável.
O desempenho da rede de transporte coletivo em Florianópolis fica muito aquém do
desejado. A principal dificuldade é a diminuta velocidade comercial do transporte coletivo,
consequência dos congestionamentos constantes na cidade. A não existência de pistas
exclusivas de autocarros é o principal fator contribuinte para esta situação pois não potencia uma
alternativa ao transporte individual, já que estão sujeitos aos mesmos congestionamentos, ou
seja, mesmo tempo de viagem e ainda apresenta um maior custo que o automóvel. A estrutura
do transporte coletivo não evoluiu a par da procura da cidade e a população não utiliza o sistema
pois não apresenta vantagens quando comparado com o transporte individual.
O agravamento do congestionamento dos principais eixos reduz a eficiência do sistema,
dado que mais veículos são necessários para prestar o mesmo serviço mas com menos
qualidade.
A falta de integração entre modais e sistemas é também uma questão na mobilidade da
cidade, como por exemplo a integração com o sistema intermunicipal.
O maior problema que os transportes coletivos enfrentam nas duas cidades é a
capacidade política para intervir. Muitos intervenientes políticos apontam soluções para as
dificuldades mas a capacidade real para fazer diferença é pouca ou nenhuma. As empresas
operadoras no concelho são dependentes do Estado e o poder reivindicativo da Câmara
Municipal não se tem mostrado eficaz nas ações realizadas, não proporcionando a visão de qual
a real capacidade de atuação e quais as competências do município nesta matéria.
Nenhum destes problemas pode ser resolvido se não houver uma mudança na lógica do
sistema. Em Florianópolis, com a concessão do serviço de transporte coletivo ao Consórcio
Fênix, as mesmas empresas continuam a operar o sistema e se a Prefeitura não interceder pelos
interesses públicos o sistema continuará precário, caro e ineficiente.
A mudança de lógica da operação do transporte coletivo requer uma separação dos
poderes políticos, que são instáveis, e uma aposta num órgão forte e independente de
planeamento e gestão dos transportes onde existe um profundo conhecimento técnico na área.
Uma das soluções mais acessível para pôr em prática é a criação e aumento de
corredores BUS, negociações com os principais operadores de TC da cidade e financiamento do
custo dos títulos de transporte, à semelhança do que acontece noutros países europeus. Um
melhor e mais regular serviço de TC, a um preço mais atrativo, aliado a uma política de
estacionamento mais eficaz e dissuasora de longa duração na área central, conduz a uma
transferência modal na ordem dos 15 a 20%.
65
A crise económica sentida em Portugal nos últimos anos trouxe diversas consequências
a nível dos transportes, principalmente no aumento dos tarifários e na redução da oferta dos
transportes públicos. A elevada diminuição do poder de compra da população e a forte subida
do desemprego levaram também a uma quebra de procura do transporte coletivo. Por outro lado,
a desvalorização do euro face ao dólar e os mercados mundiais do petróleo foram a causa dos
preços mais elevados de sempre dos combustíveis.
No Brasil, o contínuo aumento demográfico, que não é acompanhado pelo
desenvolvimento da infraestrutura e operação dos transportes, tem levado a um sistema precário
e instável que não apresenta vantagens face ao transporte individual. Falta uma visão de
continuidade, de integração de políticas, de aprimoramento tecnológico e de reservas de capital.
Os programas apresentados pelo governo têm dificuldades na sua aplicação prática por falta de
competência administrativa e técnica.
No futuro dos transportes coletivos têm de ser previstos fortes ganhos de eficiência
operacional e tem de ser definida e assumida uma exigente orientação estratégica relativa ao
uso do transporte individual em áreas urbanas. É necessário um maior envolvimento dos
municípios na definição das redes de transporte coletivo e na oferta de novas soluções, com
custos mais reduzidos que as soluções atuais e com melhor ajuste entre a oferta e a procura.
66
5 - Comparação dos dois casos de estudo
O Sistema de Acessibilidades e a Evolução do Espaço Urbano
A composição do espaço urbano deriva de uma diversidade de fatores, entre eles a
economia, as relações sociais e as opções institucionais que decorrem num dado local e período.
Estes fatores influenciam a disposição urbana na medida em que a ocupação do solo com
diversas atividades, a sua intensidade e padrão de ocupação, as deslocações da população e o
sistema de transportes, se vão modificando consoante a situação nesse período.
Os transportes têm tido um papel decisivo na evolução do crescimento urbano,
principalmente na localização dos centros urbanos, na sua expansão e no seu desenvolvimento
interno (Vuchic, 1981). As acessibilidades e a evolução do espaço urbano apresentam uma
relação bilateral, na medida em que tanto o sistema de transportes e respetivas infraestruturas
influenciam o modo como a cidade vai crescendo, como esta evolução implica adaptações de
transportes por parte da população. Deste modo é inviável delinear um sistema de transportes
numa cidade sem ter em conta o respetivo planeamento urbano.
Historicamente existe uma relação entre as diferentes tecnologias de transporte urbano e
a forma de crescimento urbano (Hall, 1969). A organização do espaço urbano e o seu
desenvolvimento estiveram a par com o progresso tecnológico do sector dos transportes.
A mudança das relações económicas e do desenho urbano manifestaram-se em
alterações das condições de mobilidade individual (Figura 5-1). Numa primeira fase, as
deslocações são geralmente individuais, de pequena distância e recorrendo ao modo pedonal,
evidenciando a concentração das atividades residenciais e de emprego e do fraco poder
económico da população nessa altura.
Figura 5-1: Modelo de transição da mobilidade individual (Fonte: adaptado de (Rodrigue et al., 2004))
67
Em Lisboa esta fase ocorre com o início da revolução industrial, no século XIX, e
consequente aumento demográfico exponencial. Até esta data, Lisboa estava concentrada junto
ao rio Tejo, expandindo-se sempre ao largo deste, evidenciando a importância do transporte
fluvial na economia da cidade. Com a revolução industrial, surgem bairros operários de tal forma
que a cidade começa a estender-se para norte.
Em Florianópolis não se sentiu os efeitos da revolução industrial, até porque esta cidade
não desenvolveu essas atividades, portanto até 1950 a maior parte da população encontra-se
no centro da cidade.
Esta limitação na mobilidade nas duas cidades conduziu a uma configuração urbana
compacta, onde os diferentes usos e funções se reuniam no centro da cidade.
Começou depois a expansão das áreas residenciais para locais cada vez mais afastados
do centro, resultante do aumento do rendimento, da valorização das áreas mais centrais das
cidades e da disponibilização de modos de transporte mais rápidos e acessíveis. Aumentou,
assim, a importância das deslocações motorizadas, recorrendo aos transportes coletivos. Este
segundo ciclo é dominado pela introdução do elétrico, em Lisboa em 1900, e dos bondes de
tração animal em Florianópolis em 1915.
Os primeiros subúrbios em Lisboa refletem, na sua posição e forma, o transporte que
lhes esteve na origem. O elétrico e os primeiros autocarros para as principais portas da cidade
explicam o desenvolvimento precoce de núcleos de porta como são Algés, Venda Nova ou
Moscavide (Barata Salgueiro, 2002).
Surge o modo ferroviário que promove o mesmo desenvolvimento urbano, mas neste
caso, os núcleos são formados em torno das estações. Com estas novas acessibilidades
aparecem eixos industriais, tanto a norte do Tejo ao longo da linha férrea, como na margem sul
junto aos cais fluviais.
A cidade adota uma forma radial, tal que as novas urbanizações se desenvolvem ao
longo destas linhas de transporte.
Com a utilização dos modos rodoviários, nomeadamente o automóvel, inicia-se uma fase
muito importante no desenvolvimento urbano. A maior flexibilidade deste modo permitiu o
preenchimento dos espaços intersticiais entre os eixos radiais definidos pelos transportes
ferroviários, configurando-se uma forma urbana mais uniforme e concêntrica (Marques da Costa,
2007). Em Lisboa, o automóvel assumiu grande importância após a segunda guerra mundial e
propiciou a ligação dos núcleos suburbanos com o centro, estendendo a urbanização em mancha
de óleo.
Numa última fase, as alterações nas acessibilidades, nomeadamente o desenvolvimento
de vias rápidas para circulação automóvel, traduziram-se na extensão da metropolização,
facilitando a maior dispersão do povoamento periférico, aumento das residências secundárias e
diversidade da ocupação dos territórios periurbanos. Esta forte diferenciação espacial trouxe,
mais uma vez, uma forma urbana radial.
68
Nas duas cidades, este facto foi evidente com a construção das pontes, a ponte 25 de
Abril em Lisboa em 1965, e a ponte Hercílio Luz em Florianópolis em 1926.
Em Lisboa, a nova ponte implicou verdadeiras explosões demográficas na margem sul.
A construção de outras vias rápidas, ponte Vasco da Gama e comboio na ponte 25 de Abril,
tiveram como resultado uma alta especulação imobiliária ao longo destes eixos e permitiram o
crescimento económico e turístico de zonas que antes não eram tão acessíveis, como por
exemplo, a região do Algarve.
Com a ponte Hercílio Luz em Florianópolis apareceram também as empresas de
autocarros coletivos que faziam a ligação entre a ilha e o continente. Esta ligação desempenhou
um papel importante na urbanização da cidade, na medida em que fomentou uma grande
expansão imobiliária do lado do continente, nomeadamente Estreito e Coqueiros, de tal maneira
que a população de classe mais alta transferiu a sua área residencial para esse local, o que
perdurou até ao início da década de 1950.
A partir de 1950 assistiu-se a uma transformação notável na cidade de Florianópolis,
iniciada com a transferência da sede da Eletrosul para o centro da ilha. A cidade começou a
entrar num ciclo acelerado de crescimento económico e de reformas urbanas: ponte Colombo
Salles, Beira Mar Norte, implementação de propaganda turística, criação da UFSC e
urbanização.
Construiu-se a via rápida SC-401 que ligou o centro ao norte da ilha, criando aí, no início
um importante ponto turístico que depois se transformou em zona residencial, a zona de
Canasvieiras. Ao longo do eixo desta via desenvolveram-se pólos de empreendimentos e houve
uma explosão imobiliária. O mesmo aconteceu com a construção da SC-406 que liga o norte ao
sul da ilha, mas neste caso, houve um maior desenvolvimento da atividade residencial em vez
de serviços. É bastante percetível nesta cidade um desenvolvimento urbano pelo crescimento
tentacular ao longo das principais vias radiais.
A evolução dos modos de transporte influenciam tanto o crescimento como a forma
urbana e cada modo de transporte vai deixando a sua marca na configuração das aglomerações
urbanas. A introdução de novos meios de transporte conduzem à transformação do uso do solo
e adaptação do seu espaço às suas características e capacidades, num sistema dinâmico.
Segundo Van Wee (2002), o padrão de mobilidade é definido pela interação entre a
localização de atividades, necessidades da população e facilidade de deslocação. O aumento
da intensidade de ocupação do solo traduz-se na redução da procura de transporte, pois as
origens e destinos das viagens ficam mais próximas. Uma alteração num dos três componentes
provoca um desequilíbrio do sistema, de tal forma que este procurará um novo ajustamento.
A diversificação dos usos do solo tem um efeito direto na procura de transporte, uma vez
que, misturando atividades residenciais, de emprego e serviços na mesma área, as distâncias a
percorrer tornam-se menores. Esta ação permite também uma melhoria da acessibilidade ao
transporte coletivo, contribuindo para a alteração da repartição modal.
69
O que se verifica em Florianópolis é uma fraca diversificação dos usos do solo, já que
no Centro estão concentradas maioritariamente atividades de emprego e serviços e que as
funções residenciais se encontram espalhadas por toda a ilha. Esta característica é responsável
por fluxos de tráfego todos no mesmo sentido e consequentes congestionamentos na hora de
ponta.
Em Lisboa, apesar de também haver uma certa tendência para a pouca diversificação
do uso do solo, esta não é tão acentuada e, atualmente, a função residencial começa a ganhar
mais uma vez importância no centro da cidade.
Na Figura 5-2 observa-se a evolução da ocupação urbana com o desenvolvimento dos
transportes, nas suas diversas fases.
A forma urbana é uma das características das cidades que apresenta grande relevância
ao estudar a sua mobilidade. Esta vai variar de cidade para cidade consoante a sua história de
crescimento e desenvolvimento e, em grande parte das vezes, é uma condicionante no modo de
deslocação da sua população.
A forma urbana vai ter um papel preponderante no consumo energético e respetiva
participação na realização dos objetivos de sustentabilidade ambiental, económica e social dos
sistemas urbanos. Distinguem-se duas formas urbanas principais: a forma dispersa e a forma
compacta.
A forma compacta apresenta elevada densidade, usos mistos do solo urbano e elevado
dinamismo, populacional, económico e do próprio processo de densificação populacional. Este
aumento da compacidade contribui para a redução do consumo de recursos energéticos e dos
níveis de emissão de poluentes, visto que as residências e o emprego se situam mais próximos
e as distâncias a percorrer são menores, dando oportunidade à utilização de modos suaves de
transporte.
Figura 5-2: Desenvolvimento metropolitano nas aglomerações urbanas (Fonte: TAAFFE et al., 1996: 178)
70
Lisboa apresenta características de uma cidade compacta, onde os diferentes usos do
solo se misturam e existe uma maior facilidade, não só de mobilidade, mas também de eficiência
dos transportes coletivos. Com a procura de transportes mais concentrada num local é possível
prever facilitadamente a demanda e não é necessário percorrer distâncias elevadas para
responder à maior parte da procura.
A forma dispersa está relacionada com baixas densidades urbanas, que se estende até
aos limites das metrópoles, pelo elevado consumo de solo, por usos de solo localizados de forma
aleatória, descontínua e compartimentada, pela proliferação de espaços mono funcionais e
essencialmente dependentes da utilização do automóvel (Camagni, Gibelli, & Rigamonti, 2002).
Em relação à mobilidade nestas condições, apresenta-se mais complexa uma vez que os
padrões de acessibilidade às infraestruturas são deficietários e descontínuos.
Neste caso, a relação entre a densidade populacional e o consumo de combustivel é
inversamente proporcional, uma vez que quando a densidade diminui as deslocações usando
modos motorizados aumentam.
Esta forma é característica da cidade de Florianópolis, onde as diversas urbanizações se
encontram dispersas pela ilha, com grandes áreas verdes naturais entre elas. Há um aumento
da procura de transportes, em particular do automóvel, pois o transporte público apresenta-se
economicamente pouco atractivo nestas áreas de baixa densidade de procura. Deste modo
aumenta o congestionamento em direcção ao centro, onde estão localizados os usos de emprego
e serviços, tanto devido à ausência de alternativas de transporte colectivo de qualidade como
pela dificuldade de integração desse transporte com o individual. Estes congestionamentos, em
determinadas horas do dia, vão sendo cada vez mais prolongados e frequentes, contribuindo
para o aumento dos custos médios de deslocação e negativamente para a eficiência e
sustentabilidade da economia urbana.
A morfologia do sistema urbano é um dos elementos para a sua diferenciação e
consequente capacidade competitiva, já que a sustentabilidade das cidades é condição para a
competitividade entre as diferentes aglomerações urbanas (Marques da Costa, 2007).
Algumas das soluções propostas para uma adequação dos usos do solo com os
transportes passam pela promoção e revitalização dos centros das cidades, promoção do
desenvolvimento urbano em torno das interfaces principais existentes, o desencorajamento da
dispersão urbana e a extensão do serviço de transporte público a zonas mais isoladas. A forma
da cidade deve ser desenvolvida segundo núcleos urbanos de elevada densidade ligadas entre
si por um sistema de transporte público de grande capacidade e rodeados por áreas de menor
densidade, garantido-se de igual forma o serviço público nessas áreas.
71
5.2 - Principais Problemas
Lisboa e Florianópolis são cidades com histórias de ocupação marcadamente distintas, mas
com características físicas e sociais semelhantes, nomeadamente no que se refere à existência
de um rio/mar que separa o centro principal da restante área metropolitana, uma oferta de TC
muito dependente do serviço em autocarro, uma dimensão demográfica semelhante e uma
segregação social espacial entre centro e periferia idêntica. Ambas são centros urbanos que
enfrentam grandes desafios para a inter-relação entre os diversos sistemas que a constituem.
A análise comparativa entre duas cidades, situadas em continentes muito diferentes,
permite a partilha de experiências no processo de desenvolvimento e gestão da mobilidade
urbana. Este não é um problema recente, é um desafio que permanece e se modifica, embora
alguns dos seus elementos principais sejam constantes ao longo dos tempos mais recentes.
Pretende-se ao longo do presente capítulo analisar as carências e vantagens de cada
cidade ao nível da mobilidade urbana de modo a apresentar possíveis soluções.
Lisboa apresenta uma área quatro vezes menor que Florianópolis, sendo percetíveis as
diferenças na densidade populacional em cada cidade. Não obstante, ambas têm uma morfologia
semelhante, com os seus morros e colinas e a sua proximidade ao mar/rio.
Uma diferença marcante entre Lisboa e Florianópolis é a evolução de cada uma ao longo
do tempo: enquanto que a primeira apresentou um crescimento negativo na última década,
crescendo apenas na sua periferia e mantendo pouco alterado o tecido urbano central, a segunda
iniciou um ciclo de crescimento exponencial característico dos países emergentes. Numa
década, o município de Lisboa perdeu cerca de 15% da sua população, mas por outro lado o
município brasileiro aumentou a sua população em 35%.
Lisboa tem sofrido uma certa desertificação (menos 300 mil habitantes desde 1970),
onde a população tem saído do centro para os municípios da periferia, o que acarreta como
consequência a falta de diversificação do uso do solo, concentrando atividades de emprego e
serviços no centro. Florianópolis começa a acompanhar este percurso, na medida em que há
uma centralização dessas mesmas atividades, deixando para áreas periféricas a função
residencial. Apesar disso, o distrito Sede, continua a ser o que apresenta maior densidade
residencial, com mais de metade da população do município a residir nesse local, principalmente
do lado continental.
A análise da pirâmide etária de cada cidade apresenta resultados evidentes, tal que a
população de Florianópolis é bastante mais jovem que a de Lisboa. Lisboa exibe um
comportamento típico das antigas cidades europeias, com uma população envelhecida, ao
contrário das cidades em países emergentes.
Floripa, assim denominada pelos locais, está em contínuo crescimento em todos os
aspetos, desde o PIB, à economia, ao emprego e taxa de motorização, não se podendo dizer o
mesmo em relação a Lisboa.
72
Em relação ao sistema de transportes, a repartição modal é semelhante nas duas
cidades, com uma grande percentagem do transporte individual. Esta situação não é aceitável
em Lisboa pois esta possui um sistema de transporte coletivo bem desenvolvido, com diversas
opções e com um custo direto menor que o do automóvel. Em Florianópolis já não é esse o caso,
existindo apenas uma opção de transporte coletivo, os autocarros, que têm um custo superior ao
do transporte individual. Uma das ocorrências comuns é ainda a elevada taxa de ocupação do
transporte coletivo nas horas de ponta em contraste com o restante corpo do dia que essas taxas
mostram-se insuficientes para uma atividade economicamente eficiente.
Os modos suaves têm maior representatividade na cidade brasileira (26%) em
comparação com a cidade portuguesa (20%).
Ambas são pólos atractores de tráfego na sua região metropolitana, mas enquanto que
Florianópolis tem vindo a apresentar um aumento dos volumes de entrada de tráfego, esses
volumes em Lisboa têm vindo a diminuir. Isto traduz-se numa aposta financeira mais elevada na
rede viária na capital catarinense em contraste com uma recente aposta nos modos suaves na
capital portuguesa, o que associado aos efeitos da crise económica explica a menor utilização
do TI.
Em termos de estacionamento ainda há diversas medidas que podem ser tomadas.
Florianópolis tem pouco estacionamento tarifado, apesar das novas ações nesse sentido, mas
os pólos geradores de tráfego ainda não se encontram inseridos nesse esquema, o que seria
essencial para uma diminuição da utilização do automóvel. Lisboa é bastante forte neste tema,
com lugares tarifados nas áreas centrais mais importantes.
Onde se encontram bastantes semelhanças entre as duas aglomerações urbanas é nas
suas características geográficas. Ambas possuem declives acentuados em diversos locais, com
colinas ou morros, e têm o centro delimitado por uma barreira hídrica, o rio Tejo no caso de
Lisboa e as Baías Norte e Sul em Florianópolis. Isto significa que os sistemas de acessibilidades
têm de conseguir não só ultrapassar estas barreiras mas encontrar a melhor relação com as
mesmas, isto é, um desenvolvimento eficiente e de qualidade. Com as suas formas radiais, o
tráfego é encaminhado para os mesmos lugares onde não há alternativas de fuga, sendo
inevitável a procura de soluções para a sua dispersão.
Em termos de governança de transportes este é um ponto crítico, pois, por mais
mudanças e investimentos que se façam em todo o sistema de mobilidade de uma cidade, uma
gestão eficiente é essencial para o seu bom funcionamento. Um fator comum a ambas as cidades
é a dispersão do poder dentro das organizações, neste caso, as câmaras municipais. A
responsabilidade pela mobilidade e transportes na CML encontra-se distribuída por áreas onde
os problemas de comunicação podem ser uma constante. Do mesmo modo funciona a prefeitura
de Florianópolis onde o poder é difuso e não se tem uma ideia clara de quem defende os
interesses públicos em relação aos transportes.
73
Os problemas de mobilidade e transportes tanto em Lisboa como em Florianópolis
assumem uma função crítica no funcionamento das cidades e na qualidade de vida dos cidadãos,
sendo consensual que estes problemas não são resolúveis pela simples construção de mais
infraestruturas.
O grande desafio destas cidades não é a aposta na ampliação da rede viária, mas a
gestão integrada dos usos do solo e dos vários sistemas de transportes, num relacionamento
intermodal e que ofereça aos seus utilizadores a possibilidade de escolha do modo de transporte
a utilizar, com a qualidade desejada.
Para o transporte coletivo existe claramente uma falta de infraestruturas, especialmente
na cidade brasileira, de modo a colmatar as falhas de cobertura de território e de serviço a
funções urbanas.
Deste modo, identificam-se de seguida os principais problemas relativos ao sistema de
mobilidade da cidade portuguesa e da brasileira, cuja solução permitirá uma mudança estrutural
no sentido de uma mobilidade mais sustentável.
Lisboa
1) Grande volume de entrada de tráfego em Lisboa, apesar de ter vindo a diminuir nos últimos
anos. Os principais eixos de entrada são a Ponte 25 de Abril, a A5 e o IC19, responsáveis por
40% do tráfego total.
2) Grande utilização do automóvel quando comparado com os outros modos, sendo que este
valor tem vindo a aumentar de modo sustentado nas últimas décadas.
3) Baixa velocidade comercial dos autocarros (menos de 15km/h), de tal modo que este
transporte não se mostra atrativo para os utilizadores de TI.
4) Pouca utilização dos modos suaves, principalmente da bicicleta.
5) Gestão dos transportes dividida entre as autarquias e o Estado, obrigando a soluções de
colaboração e compromisso que não se têm verificado.
Florianópolis
1) Grande utilização do automóvel. Na travessia das pontes Pedro Ivo e Colombo Salles: 85%
das viagens são de pessoas que moram no continente e trabalham ou estudam na ilha, e mais
de metade dessas pessoas fazem esse percurso de automóvel.
2) Pouca utilização dos TC. Sistema de autocarros está subutilizado, operando apenas a 60%
da sua capacidade devido à sua fraca qualidade (irregularidade nos horários, baixa frequência e
indução de deslocações desnecessárias).
3) Rede viária saturada. A taxa de ocupação das pontes é de 99%, estando completamente
saturadas nas horas de ponta.
4) Fraca qualidade da infraestrutura pedonal
74
5) Grande concentração de empregos e serviços no Centro, provocando movimentos pendulares
de grande volume.
No quadro seguinte sintetizam-se os principais indicadores de comparação utilizados.
Lisboa Florianópolis
Caracterização demográfica e
socioeconómica
População (habitantes) 547 733 421 203
Superfície (km2) 100 436.5
Densidade (hab/ha) 55 14
Estratos etários (%)
≤ 19 anos 15 34
20 a 65 anos 61 57.5
> 65 anos 24 8.5
Taxa motorização (veic/1000hab) 601 428
Nº médio de viagens por habitante por dia
Todos os modos
2.76 1.8
Só transporte motorizado
2.2 1.3
Distância média percorrida (km) por habitante por dia
5 7
Rede Viária Repartição modal (%)
TI 45 48
TC 35 26
Modos suaves 20 26
TMDA (veic/dia) 647 231 196 700
Transporte Coletivo
Modos em operação 2 (rodoviário, ferroviário)
1 (rodoviário)
Nº operadores6 7 1
Autocarros
Nº autocarros 745 524
Nº carreiras 78 200
Idade média (anos)
7.6 5.4
Velocidade comercial
(km/h) 14.6 8
Passageiros transportados
por ano (milhões pessoas)
170 54
Tarifário Nº bilhetes disponíveis
4 1
Custo TC 0.12 €/km 0.43 R$/km
Custo TI 0.15 €/km 0.24 R$/km
Estacionamento Nº lugares tarifados na via pública 45 000 5 000 Quadro 5.1: Principais indicadores de comparação da mobilidade urbana nas duas cidades
6 Considerando empresas que operam na área metropolitana mas também oferecem serviços ao nível do município.
75
Possíveis soluções
A gestão estratégica dos sistemas de mobilidade de um centro urbano assume-se como
uma questão complexa que envolve a participação de diversos agentes e a sua resolução
depende de vários fatores. As futuras políticas de mobilidade sustentável devem incorporar os
novos desafios que diariamente surgem nas cidades.
Apenas a intervenção equilibrada entre o planeamento e a gestão do território e a definição
de um plano de mobilidade na escala metropolitana, poderão contribuir para a diminuição da
necessidade de transporte e para um modelo de mobilidade sustentável.
Não só é essencial a integração da mobilidade na gestão do território mas também a
recolha de dados e análise dos mesmos de modo a servir de suporte à tomada de decisão. Não
é possível a apresentação de soluções para um determinado sistema de mobilidade sem ter o
conhecimento prévio de todos os elementos que o constituem e o seu modo de funcionamento,
pois medidas que funcionam numa aglomeração urbana podem não apresentar resultados
favoráveis noutra, simplesmente pelo facto de a cultura ser diferente.
Ao longo do presente capítulo pretende-se apresentar algumas hipóteses alternativas ao
sistema atual de mobilidade em ambas as cidades, de tal forma que os principais problemas
possam ser ultrapassados. Não se pretende assumir que todas sejam de fácil aplicabilidade, mas
antes que sejam uma indicação para o futuro, dado o seu comprovado sucesso em sistemas
semelhantes.
“A mobilidade sustentável é a capacidade de dar resposta às necessidades da sociedade
em deslocar-se livremente, aceder, comunicar, negociar e estabelecer relações, sem
sacrificar outros valores humanos e ecológicos hoje ou no futuro”.
Fonte: World Business Council for Sustainable Development
De acordo com a definição sobre mobilidade sustentável é evidente que hoje em dia não se
cumprem os objetivos definidos, tanto em Lisboa como em Florianópolis. Faltam recursos para
responder às necessidades de deslocação da população, principalmente ao nível do transporte
coletivo, e na maior parte das vezes sacrifica-se a qualidade de vida em comunidade pelo
interesse individual.
A qualidade da mobilidade proporcionada por uma cidade pode medir-se segundo dois
critérios:
- A sua multimodalidade, ou seja, a existência de diferentes modos de transporte na cidade;
- A intermodalidade, a relação estabelecida entre esses diferentes modos de transporte e a
facilidade com que os utilizadores passam de um modo para o outro.
Apostando nestes dois eixos está encontrado o caminho para a mobilidade sustentável
que as cidades anseiam e precisam.
76
Lisboa
A primeira medida a ser tomada com vista à melhoria das condições de mobilidade em
Lisboa está relacionada com a intervenção ao nível do transporte individual. Este é o modo de
transporte que ocupa mais espaço na cidade, espaço público que deveria ser aproveitado para
outras atividades em benefício da qualidade de vida em sociedade. Não é justificável que, com
a grande oferta de transporte coletivo existente em Lisboa, a maior parcela da repartição modal
seja do transporte individual.
Uma das primeiras medidas a serem tomadas passa pela tarifação do uso do automóvel.
Visto que em Lisboa a tarifação do estacionamento está bem desenvolvida é preciso aumentar
a eficácia da fiscalização do mesmo, visto que essa é uma maneira de reduzir a sua utilização
por grandes períodos de tempo, dificultando e desincentivando a utilização do automóvel para
deslocações regulares, com o veículo a estar parado no mesmo lugar ao longo de quase todo o
dia. Esta medida não implica uma elevada utilização de recursos financeiros, nem de recursos
humanos, logo a sua aplicabilidade é imediata e apresenta resultados a curto prazo.
Como já observado noutras cidades, como por exemplo em Londres, é possível a
tarifação da entrada do automóvel no centro urbano, com a denominada taxa de
congestionamento. Esta taxa é cobrada em quase todos os veículos motorizados numa
determinada área pré-definida, entre as 7h e as 18h nos dias úteis, e tem como objetivo a redução
do volume de tráfego nas áreas centrais e a recolha de fundos para investir no transporte coletivo.
Os resultados em Londres apontam para uma diminuição de 20% nos volumes de tráfego na
última década, numa receita de 1.2 bilhões de libras investidos no transporte público, rede viária
e rede de modos suaves, num aumento da utilização de transporte público em 25% e das
bicicletas em 49%, confirmando mudanças significativas nos padrões de mobilidade. Conclui-se
que é possível a aplicabilidade desta medida com sucesso e é expectável que, nos primeiros
tempos, esta não seja tão bem aceite pela população, o que implica uma forte força política.
Implica, inicialmente, o investimento em material e recursos humanos, mas que ao longo do
tempo serão recompensados pelas receitas obtidas com esta medida.
A par das medidas dissuasoras da utilização do automóvel encontram-se as medidas de
promoção dos restantes modos de transporte. Numa situação ideal, a população deslocar-se-ia
por modos suaves quando a distância a percorrer fosse inferior a 6 km e de transporte coletivo
para distâncias maiores.
Para a utilização de modos suaves é imperativo a melhoria da qualidade da
infraestrutura, isto é, aumento da largura dos passeios, pavimento propício ao modo pedonal,
vias cicláveis em todas as ruas principais, aposta nas zonas 30 para diminuição da velocidade
de circulação dos automóveis, e no geral, ambiente propício e que incentive a caminhada, com
sombras, comércio e vida local. A única contrariedade que se pode colocar face a estes desafios
é a falta de recursos financeiros, justificável pelo ambiente de crise em que Portugal se encontra.
77
Não obstante, é possível encontrar alternativas a esse problema como a utilização das receitas
provenientes das medidas dissuasoras de utilização do automóvel.
Na questão dos transportes coletivos trata-se de oferecer a melhor relação qualidade-
preço. A principal questão apontada pelos utilizadores deste modo de transporte é o tempo de
viagem que é considerado elevado quando comparado com o TI. Uma solução passa por
aumentar a velocidade comercial dos autocarros, com a delimitação de vias dedicadas a estes
numa área de maior abrangência da atualmente existente e maior distância entre paragens. Para
melhorar a qualidade dos autocarros pode-se apostar nos serviços de informação aos
passageiros, tanto nas paragens como a bordo dos veículos ou mesmo utilizando aplicações
móveis, de modo a possibilitar a informação em tempo real da localização dos veículos ou do
tempo de espera. A pontualidade é outro dos problemas apontado pelos utilizadores que pode
ser melhorado com um maior número de faixas BUS.
A extensão do metropolitano de Lisboa a novas polaridades e áreas com pouca cobertura
da rede de TC é essencial na mobilidade dos residentes e na promoção de comportamentos tipo
Park & Ride. Além disso, também a melhoria da qualidade do serviço pode dar frutos neste
contexto, ajustando a oferta à procura, articulando com outros transportadores e a dinamizando
zonas comerciais nas diversas estações da rede, como fator de captação e fidelização de
passageiros.
Sendo o maior volume de entrada de tráfego na cidade proveniente da ponte 25 de Abril
é impreterível a promoção dos transportes coletivos nesse trajeto. A Fertagus, empresa de
comboios responsável por essa ligação, passa uma imagem bastante positiva aos utilizadores
pelo que, para uma maior aderência da população, pode apostar na divulgação de informação
por planos de marketing. O transporte fluvial pela Transtejo representa uma parcela importante
desse volume de entrada, no entanto, tem vindo a perder passageiros. Requere um serviço mais
eficiente e eficaz, com a adaptação da oferta à procura, seja em número ou tamanho das
embarcações.
A oferta dos transportes públicos que servem Lisboa deve ser estruturalmente ajustada
e adaptada para responder aos padrões de mobilidade e à dinâmica da cidade. O seu
planeamento e gestão devem ser competência pública e o município deve ter um papel ativo no
planeamento, gestão e operação das empresas de transporte público, defendendo o interesse
coletivo.
Uma outra estratégia a adotar é a articulação entre transportes e usos do solo, com ação
na política de estacionamento, no desenvolvimento de novas centralidades urbanas associadas
a nós do sistema de transportes e novas linhas de transporte coletivo em sítio próprio.
O problema relativo à mobilidade em Lisboa não é a falta de soluções realistas e
exequíveis social e tecnicamente. O problema são as forças políticas que procuram soluções a
curto prazo que sejam fáceis e rápidas de aplicar, muitas vezes aplicadas sem conhecimentos
técnicos suficientes. Os tempos políticos, marcados pelos calendários eleitorais, interferem na
78
definição das prioridades e, normalmente, relegam para segundo plano as intervenções com
carácter mais estruturante e essenciais para alterar os hábitos e as opções individuais que
condicionam a mobilidade urbana atual.
Florianópolis
Como já se viu ao longo do trabalho, a forte presença do transporte individual é o maior
problema desta cidade em questões de mobilidade. Esta situação é muito semelhante à de
Lisboa nos anos 60/70, quando houve uma massificação do automóvel e começaram a surgir as
grandes preocupações com a segurança da população e crescente poluição atmosférica. A
cidade brasileira vai passando por etapas de evolução semelhantes às que ocorreram em Lisboa
em termos de mobilidade, com a grande diferença que esta evolução acontece num espaço de
tempo bastante mais curto, ou seja, todas as medidas tomadas agora vão ter um impacto
decisivo no futuro da mobilidade urbana em Florianópolis.
Florianópolis está no início de uma grande transformação e tem já verbas e recursos
assegurados para a sua concretização. Ao contrário de Lisboa, cujas soluções para a mobilidade
são pontuais, as soluções em Florianópolis implicam grandes obras de infraestruturas e
mudanças ativas na mentalidade da população.
Para reduzir a dependência do automóvel e a sua pressão no contexto urbano, tem de se
agir simultaneamente através de uma política de restrição de estacionamento e de circulação
automóvel e promover alternativas atrativas ao uso do automóvel. Para isso é indispensável taxar
o uso do automóvel, de modo a que esse custo seja superior ao do transporte coletivo. Assim,
os lugares de estacionamento no centro da cidade têm de ser reduzidos e tarifados, com tarifas
mais exigentes e com uma fiscalização eficaz e consistente. Os campi universitários,
nomeadamente a UFSC, passam a adotar uma política de estacionamento mais restritiva,
introduzindo um pagamento equivalente ao valor dos bilhetes do transporte coletivo. Seria fácil
a Prefeitura levar a que os Reitores adotassem essa medida, bastaria aumentar a tarifa do
estacionamento público na zona envolvente e ser implacável com a sua fiscalização. Face ao
número de estudantes universitários que hoje se deslocam em TI, a adoção de tal medida
contribuiria para a redução de bastantes veículos em circulação na cidade.
Os morros constituem barreiras físicas e psicológicas entre diferentes partes da cidade e
fazem uma divisão do território de tal maneira que as deslocações são desestimuladas. À
semelhança do posto em prática na ilha da Madeira, em Portugal, a construção de túneis
ultrapassa esta dificuldade e aproxima diversas áreas da cidade. Além de permitir encurtar
distâncias e tempos de viagem em automóvel, permite a utilização de bicicletas, o que na
situação corrente não é possível.
O problema mais gravoso em relação ao transporte individual é a entrada ou saída da ilha
através das pontes Colombo Salles e Pedro Ivo Campos. Antes de mais, é óbvia a necessidade
de uma alternativa na entrada na ilha. Porém esta alternativa não deve ser de todo dedicada ao
79
transporte individual, pois isso só iria atrair maior volume de automóveis, saturando ainda mais
uma rede viária finita e sem alternativas.
Deste modo, a criação de uma nova ponte totalmente dedicada ao transporte coletivo seria
uma solução não só viável como desejável para a atração da população para este modo de
transporte. Esta ponte deveria fazer a ligação a uma rodovia de 1ª ordem ligando Florianópolis
aos municípios a norte. As pontes do transporte individual iriam continuar congestionadas,
funcionando como elemento dissuasor do uso do carro, visto que há uma nova alternativa mais
rápida e económica se bem dimensionada. Visto que existe um forte apreço por parte de todo o
município em relação à ponte Hercílio Luz, esta poderia ser a ponte dedicada apenas ao
transporte coletivo. A infraestrutura já existe mas precisa de uma forte remodelação e integração
na rede de transportes já existente, mas é uma solução bastante viável.
Para além dessa nova ligação Ilha-Continente, seria ainda possível incluir um transporte
aquaviário como complemente ao transporte público, tão ou mais eficiente que o mesmo
transporte de Lisboa. Não é possível admitir que numa ilha, numa cidade envolta por água, não
exista um transporte que ultrapassa essa barreira física.
Quanto ao transporte coletivo dentro do município, a Prefeitura iniciou já as obras do anel
viário com corredor exclusivo de autocarros. Este anel viário terá 17 km de vias exclusivas de
autocarros e contornará a região central, passando pelo TICEN, Beira-mar Norte e UFSC e tem
um custo estimado de R$ 150 milhões. Esta é uma das medidas que podem dar a volta ao
sistema de mobilidade de Florianópolis, na medida em que melhorará a rede de transporte
coletivo, apresentando-se como alternativa atrativa ao TI. Espera-se que, no futuro, as vias
dedicadas exclusivamente aos autocarros se estendam por toda a ilha, servindo os principais
pólos geradores de tráfego e criando novas centralidades.
A aposta nos autocarros deve ser feita, não só ao nível da infraestrutura, mas em termos
de qualidade e serviço. A frequência deve ser aumentada e os horários cumpridos, respondendo
aos requisitos de pontualidade.
Se numa fase inicial este sistema de autocarros é o ideal para responder às necessidades
da cidade, no futuro poderá não ser assim, já que esse sistema de BRT tem capacidade limitada.
Com o crescimento demográfico exponencial que se tem vindo a observar em Florianópolis, é
expectável que, com a aderência da população ao transporte coletivo, este deixe de ser suficiente
para responder à demanda. Prevê-se uma mudança do BRT para VLT (veículo leve por trilhos)
sendo para isso necessária apenas a introdução dos carris e outros elementos estruturais, visto
que as vias para esse transporte já existem no terreno.
A promoção dos modos suaves apresenta-se muito fraca nesta cidade brasileira, com
passeios em más condições e automóveis ocupando o espaço público. É urgente a melhoria das
condições da calçada, a expansão das redes de ciclovia, a implantação de zonas 30 e a
revitalização de ruas no Centro. É ainda urgente uma mudança da mentalidade dos condutores
de automóvel, para que o peão passe a ser a prioridade. Para isso pode ser introduzido o sistema
80
de controlo de semáforo integrado, colocada sinalização horizontal e vertical e faixas para
pedestres bem sinalizadas.
Mais importante que a criação de diferentes modos de transporte, é a integração entre
eles. Uma boa intermodalidade tem de ser capaz de proporcionar soluções em cadeira que
permitam a conexão de diferentes modos de transporte, tendo em vista a satisfação de uma
determinada deslocação. Uma forma de fazer isso é com a implementação de um sistema de
gestão e monitorização em tempo real dos diversos sistemas de transporte que permita transmitir
essa informação aos utilizadores da rede.
Nenhuma destas soluções pode ser colocada em prática se não houver recursos humanos
qualificados. É preciso investir em técnicos e em gestão especializada que encontre soluções
para os problemas que vão surgindo, aliados a uma força política com capacidade de atuação.
Tanto em Lisboa como em Florianópolis assiste-se a uma resistência por parte da
população em separar-se do seu automóvel e da ligação estabelecida com este e que continua
a ser um símbolo forte de poder, de realização e de status. A mudança desta mentalidade é
complexa e lenta e aliada à falta de conhecimento sobre a melhoria nas redes de transporte
público, continuam a acreditar que o TC não assegura com conforto, segurança e eficácia muitos
dos trajetos que optam por fazer de carro particular.
Só a promoção dos transportes coletivos, com novas formas mais eficientes e cómodas
de organização, assentes no reforço da intermodalidade e na comodidade das interfaces poderá
vir a constituir uma alternativa sustentável. Este reforço deverá integrar o transporte individual,
que poderá constituir, em muitos casos, uma primeira componente de percursos envolvendo
vários modos.
É essencial que as políticas para a mobilidade urbana assentem numa visão estratégica
de longo prazo, com possibilidade de aliar as perspetivas e objetivos dos diversos agentes
envolvidos, de modo a garantir a sustentabilidade do sistema.
81
6 - Conclusões
Ao longo do presente trabalho foram abordados uma diversidade de temas e de fenómenos
que permitiram concretizar os objetivos propostos no início, originando um conjunto de sugestões
no domínio das políticas de mobilidade sustentável.
Os problemas relacionados com a mobilidade urbana são antigos e acompanham a
história da cidade. A rápida urbanização acarreta consequências graves para o sistema de
mobilidade e é uma tarefa complexa ajustar a rede de transportes às mudanças de necessidades
de deslocação que ocorrem ao longo do processo. Florianópolis é um exemplo destes
acontecimentos, na medida em que o seu crescimento rápido fez com que o perfil da cidade se
transformasse radicalmente e, com isso, também o perfil de mobilidade dos cidadãos. A cidade
apresenta uma situação em múltiplos problemas, dificuldades de integração e baixa qualidade
no serviço de transporte coletivo.
Segundo Jackson & Cameron (1983) as soluções modernas de transporte têm seguido
ao longo do tempo os exemplos europeus de sistemas intermodais, como sendo as alternativas
com mais sucesso para as cidades médias. A existência de diferentes modos de transporte e a
integração inteligente entre eles está presente no caso de Lisboa, ainda que a prática não utilize
todos os avanços tecnológicos conseguidos, carecendo por isso de diversos melhoramentos.
Na primeira parte do trabalho, foram identificadas as principais características de
Florianópolis e Lisboa, destacando as semelhanças e diferenças entre as duas cidades e
metrópoles. Procedeu-se à caracterização sociodemográfica da população, analisando a sua
evolução, distribuição, emprego e crescimento económico.
Com base nestes elementos assumiu-se que seria possível desenvolver um estudo
comparativo entre as duas cidades, uma vez que apresentam semelhanças na divisão do
território e, de certa maneira, têm apresentado comportamentos idênticos no que se refere ao
crescimento e distribuição da população nesses centros urbanos.
Deste capítulo retira-se que a metrópole de Lisboa tem sofrido uma desconcentração,
com perda de população da cidade centro para os concelhos vizinhos e com grande progressão
do seu envelhecimento. Por outro lado, Florianópolis apresenta um crescimento de população
acentuado, maioritariamente jovem e concentrada no centro da cidade.
Nos capítulos seguintes procurou-se responder ao segundo objetivo de caracterização
do sistema de mobilidade, analisando os diversos modos de transporte disponíveis em ambas
as cidades, como o transporte individual, o transporte coletivo e os modos suaves.
Sobre a rede viária retiram-se como principais conclusões que ambas as cidades são
pólos atractores de tráfego e apresentam uma grande utilização do transporte individual. No
entanto, enquanto que em Lisboa o tráfego de entrada tem vindo a diminuir, em Florianópolis
esse volume continua a aumentar. Verificou-se que a taxa de saturação das vias é muito elevada
e continuam a ser aplicados esforços na expansão da rede viária a fim de adequar a capacidade
82
ao volume crescente de veículos motorizados. Esta prática mostra-se inadequada e limitada já
que acaba por atrair um maior número de veículos a curto prazo.
Pelo diagnóstico do transporte coletivo em Lisboa identificaram-se as problemáticas
fundamentais: diminuição da procura, redução da oferta dos transportes, aumento das tarifas e
qualidade do serviço insuficiente para os padrões desejados pelos utilizadores. Em Florianópolis
o caso é bastante pior, visto que há apenas uma alternativa de transporte coletivo, não dando
poder de escolha aos passageiros; o desenvolvimento da infraestrutura não acompanhou o
crescimento da população e, no geral, o sistema de TC não apresenta vantagens em relação ao
transporte individual.
A melhoria das condições dos modos suaves é também essencial. Precisa de se voltar
a repensar nas ruas como espaços sociais, onde estas não são utilizadas apenas para
deslocações mas também para o convívio entre a população e o aproveitamento do espaço que
os rodeia. Pode-se melhorar os passeios, arborizar as avenidas e investir no comércio de rua.
No estudo do sistema de acessibilidades e da sua relação com a evolução do espaço
urbano constata-se que o transporte assume um papel central nos sistemas de produção que
pode, e deve, ser percebido a diferentes escalas, desde o nível global ao nível local, permitindo
ou facilitando as relações entre os diferentes territórios e, simultaneamente, diferenciando-se na
exata medida em que promove diferenças de acessibilidade. Discutiu-se, ainda, a relação entre
o transporte e a configuração urbana, associando-se o papel do transporte ao processo de
urbanização e à forma urbana. Em ambas as cidades confirmou-se uma fraca utilização dos
instrumentos do planeamento e do ordenamento do território, com pouca diversificação do uso
do solo e repartição desequilibrada de infraestruturas.
O capítulo 9 responde ao terceiro objetivo do estudo comparativo, onde, depois na
análise realizada nos capítulos anteriores, se sintetiza as principais conclusões e se identificam
os problemas relativos ao sistema de mobilidade cuja solução permite uma mudança estrutural
para um modelo mais sustentável. O problema mais marcante identificado em ambas as cidades
é a elevada percentagem de utilização do transporte individual e a importância dada a este, tanto
em relação aos seus utilizadores como ao investimento em infraestrutura.
Outro dos problemas que Florianópolis enfrenta é a falta de conhecimento e de dados
relativos ao tráfego e mobilidade. Apesar de atualmente estar em desenvolvimento o Plamus,
Plano de Mobilidade Urbana Sustentável da Grande Florianópolis, que se bem aplicado trará
uma grande evolução ao estudo da mobilidade em Florianópolis, até agora todas as mudanças
realizadas nesta cidade foram efetuadas sem qualquer base científica, sem dados ou
pressupostos que dessem uma indicação do caminho a percorrer. O plano que está em
desenvolvimento não deve ser apoiado apenas nos poderes políticos, uma vez que estes mudam
com cada eleição, mas sim apoiados por instituições independentes e universidades que tenham
o compromisso de continuar a desenvolvê-lo no futuro e o envolvimento da população em geral.
83
Em Lisboa, um dos problemas que deve ser rapidamente encarado é a falta de
mobilidade no conjunto de bairros históricos no centro da cidade. Estes bairros, com perda
acelerada de população e residentes maioritariamente envelhecidos, precisam de programas de
revitalização sem perder o carácter e imagem. Não é possível dotar estes bairros de oferta de
estacionamento como os adotados em novas urbanizações, pelo que a carência de
acessibilidade deve ser suprida com o recurso a um sistema de transporte leve e capaz de vencer
grandes declives. A conjugação desta oferta com o regime de densificação seletiva nas
proximidades das paragens e estações (articulação com o uso do solo) constituem elementos
centrais do que se espera ser uma estratégia de revitalização desses bairros. As redes de
transporte coletivo de superfície devem complementar melhor as redes pesadas (como o metro)
e devem dar maior atenção à cobertura espacial dos bairros. Observa-se também que o
transporte coletivo em toda a cidade, principalmente o metro, desenvolveu-se principalmente ao
longo dos eixos tradicionais de emprego e de serviços, privilegiando zonas ainda não
consolidadas ou bairros periféricos ao município, deixando de atender às necessidades de
mobilidade de alguns dos principais bairros da cidade (como Campo de Ourique/Estrela).
O transporte coletivo enfrenta também um problema novo, na medida em que tem de
atender a duas procuras distintas: por um lado, a dos cidadãos idosos, que existem cada vez em
maior número e frequentemente sem outras opções de mobilidade motorizada; e por outro, a dos
cidadãos com acesso ao automóvel, a quem é necessário oferecer um serviço que lhes seja
suficientemente agradável para poder ser escolhido. Mas os requisitos destes dois segmentos –
proximidade no primeiro caso, frequência e rapidez no segundo – são suficientemente diferentes
para que uma só resposta com segmentação da oferta possa ser eficiente.
Além de todos estes problemas, tanto em Florianópolis como em Lisboa, existem outros
mais que são precisos adereçar e dar atenção. Os principais exemplos que se podem retirar da
mobilidade de Lisboa que podem ser aplicados em Florianópolis são, em primeiro lugar que a
construção de uma nova ponte destinada ao uso do automóvel não é solução, uma vez que a
Ponte Vasco da Gama construída para aliviar o tráfego na Ponte 25 de Abril não resolveu
qualquer problema a esse nível e apenas serviu para fomentar a especulação imobiliária do outro
lado do rio. Em segundo lugar, verifica-se que Florianópolis necessita de uma diversificação dos
meios de transporte e desenvolvimento da rede de autocarros existente, tendo em vista o
conceito de intermodalidade e integração modal. Como em Lisboa o transporte fluvial é
suficientemente eficiente, também na cidade brasileira seria possível adotar um sistema
semelhante mas com especial atenção à sua integração com a rede de autocarros, tanto no lado
da ilha como no lado do continente, e que fosse economicamente atrativo. Por último, um dos
grandes exemplos que se pode retirar da história de Lisboa é a criação de novas centralidades,
como é o exemplo do Parque das Nações (antiga Expo 98), que tanto serve como um centro de
negócios como local residencial. Estas novas centralidades podem ter bastante sucesso se
acompanhadas com um planeamento de mobilidade e transportes de acordo com a futura
demanda.
84
Em todo o caso, a principal conclusão que se pode retirar com o estudo comparativo da
mobilidade nas duas cidades é a urgente necessidade de planeamento, estudo e
acompanhamento por parte da população das ações realizadas no domínio da mobilidade e
melhoria das condições de deslocação.
Os resultados obtidos permitem retirar algumas conclusões relevantes para as
orientações de política com vista a uma mobilidade sustentável. Os sistemas de mobilidade
urbana contribuem para o desenvolvimento equilibrado das cidades, a sua ocupação racional e
adequada para os cidadãos. O contraste entre uma cidade que quase não cresceu no seu núcleo
central no século XX e outra cuja população cresceu exponencialmente, permitiu mostrar como
exemplos tão extremos podem ilustrar alguns dos múltiplos desafios da mobilidade urbana.
86
Referências Bibliográficas
ACAP. (2009). Estatísticas do Sector Automóvel em Portugal. Lisboa: Associação Automóvel
de Portugal.
AMTL/ISCTE. (2014). Área Metropolitana de Lisboa: os transportes públicos aos olhos da
população. Lisboa: AMTL.
Barata Salgueiro, T. (2002). Desenvolvimento Urbano de Lisboa. Revista de Estudos Regionais
nº5, pp. 7-22.
Camagni, R., Gibelli, M. C., & Rigamonti, P. (2002). Forme Urbaine et Mobilité: Les coûts
collectifs des différents types d'extension urbaine dans l'agglomération Milanaise.
Revue d'Économie Régionale et Urbaine, 105-139.
Caruso, M. (1983). O Desmatamento da Ilha de Santa Catarina de 1500 aos Dias Atuais.
Florianópolis: UFSC.
CML. (2009). Relatório do Estado do Ordenamento do Território. Lisboa: Câmara Municipal de
Lisboa.
CML. (2015). História de Lisboa. Obtido em 30 de 03 de 2015, de Câmara Municipal de Lisboa:
http://www.cm-lisboa.pt/municipio/historia
Costa, M. d. (2003). Mobilidade urbana sustentável: um estudo comparativo e as bases de um
sistema de gestão para Brasil e Portugal. Escola de Engenharia de São Carlos. São
Carlos: Universidade de São Paulo.
Ferraz, A., & Torrez, I. (2005). Transporte Público Urbano. São Paulo: Rima.
Fuhr, C., & Dal Santo, M. A. (2009). A expansão urbana na Ilha de Santa Catarina e suas
implicações na comunidade do Santinho. XII Encuentro de Geógrafos de América
Latina. Montevideo.
Gollnick, S. (27 de Abril de 2010). Cidades. Obtido em 30 de 03 de 2015, de Viver
Urbanamente: http://gollnick.blog.terra.com.br/2010/04/27/cidades/
Hall, P. (1969). Transportation. Urban Studies 6, 408-435.
IBGE. (2010). Censo Demográfico. Brasília: IBGE.
INE. (2011). Censos. Lisboa: INE.
INE. (2011). Censos 2011 - Resultados Preliminares. Lisboa, Portugal: Instituto Nacional de
Estatística.
INE. (2012). Mobilidade em cidades médias. Lisboa: Instituto Nacional de Estatística.
Jackson, P., & Cameron, J. R. (1983). System Development. France: Lavoisier.
87
Macário, R. (2004). Integration in Urban Mobility Systems: Quality Upgrading or Competition
Blockade? World Conference on Transport Research. Lisboa, Portugal: CESUR -
Instituto Superior Técnico.
Marques da Costa, N. (2007). Mobilidade e Transporte em Áreas Urbanas. O caso da Área
Metropolitana de Lisboa. Universidade de Lisboa. Lisboa: Faculdade de Letras de
Lisboa.
Medrano, R. H. (2006). Comparação de alguns elementos do traçado urbano nas cidades de
São Paulo e Buenos Aires, na virada do século XIX para o XX. Cadernos de Pós-
Graduação em Arquitetura e Urbanismo. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo.
Ministério do Turismo. (2013). Dados e Fatos. Obtido em 23 de 04 de 2015, de Ministério do
Turismo: http://www.dadosefatos.turismo.gov.br/dadosefatos/home.html
Plamus. (2015). Plano de Mobilidade Urbana Sustentável da Grande Florianópolis.
Florianópolis: Governo de Santa Catarina.
RUITEM-IFHP. (2014). Sintesis y Conclusiones de las Aportaciones realizadas en el Seno del
Grupo de Trabajo "Ciudad y Movilidad". La Movilidad Urbana en Diversas Áreas
Metropolitanas de Latinoamerica. San Salvador: UPC Barcelona.
Silvestre, P. (2013). Sistemas de Transporte Colectivo na cidade de Lisboa. Lisboa: Instituto
Superior Técnico.
Turismo de Portugal. (2013). Os resultados do turismo - 3º trimestre de 2013. Obtido em 15 de
10 de 2014, de Turismo de Portugal:
http://www.turismodeportugal.pt/Portugu%C3%AAs/ProTurismo/estat%C3%ADsticas/a
n%C3%A1lisesestat%C3%ADsticas/osresultadosdoturismo/Anexos/Os%20Resultados
%20do%20Turismo%20-%203%C2%BA%20Trimestre%20de%202013.pdf
Van Wee, B. (2002). Land use and transport: research and policy changes. Journal of Transport
Geography 10, 259-261.
Vuchic, V. (1981). Urban Public Transportation. Systems and Technology. New Jersey:
Prentice-Hall.