Paleografia - Profº Marcos Rezende

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PROFESSOR MARCOS REZENDE - PALEOGRAFIA 1 PALEOGRAFIA A – Definição: O nome é um composto grego de “Palaiós” (velho, antigo) e “graphia” (escrita). É a ciência que estuda o material escriptográfico e as letras antigas, bem como a sua evolução. B – O Material: a) O PAPIRO : Nas margens do Nilo crescia, na Antiguidade, uma planta palustre, o papiro, que às vezes atingia a altura de três metros. Seu caule é mais ou menos triangular e contém uma medula que dá excelente material para escrever. Os egípcios cortavam-na em tiras muito finas, que depois eram enxugadas ao sol. Vários desses pedaços eram uns ao lado de outros, e a folha, assim obtida, era posta em cima de outra folha, cujos nervos corriam perpendicularmente aos da primeira. O produto era muito apreciado e exportado para todos os países civilizados do Mundo Antigo. Já era vendido em Atenas nos mesdos do século V a.C.. Um dos reis helenísticos, talvez Ptolomeu V (século II a.C.), querendo prejudicar o desenvolvimento da biblioteca rival em Pérgamo, proibiu a exportação do papiro, medida essa que depois, ao que parece, foi revogada. Até o século VII d.C., quando os árabes invadiram o Egito, havia uma indústria florescente de papiro no Delta do Nilo. No início da Idade Média, o planeta foi levado também para as margens do Rio Anape, na Sicília. A Chancelaria Papal continuou a usar o papiro até o século XII. b) O PERGAMINHO : O pergaminho é fabricado da pele de carneiro, cabrito ou bezerro, e dá material quase indestrutível. Já o conheciam os persas e jônios da Ásia Menor. Deve-se seu nome a Pérgamo, não que esta cidade tenha inventado o pergaminho como assim se pensa geralmente, mas por ter melhorado e aumentado a sua fabricação o rei Eumenes II de Pérgamo (197 – 158 a.C.), quando os Ptolomeus estavam dificultando a exportação do papiro. c) OS HINDUS : escreviam em folhas de palmeiras, os babilônicos e os Assírios usavam tijolos de barro cozido. Os romanos primitivos utilizavam do córtico a faia. Os atenienses votavam nas assembéias do povo, em cacos de cerâmica (óstraka). d) Nos tempos clássicos, os gregos e romanos usavam também codicilli , ou tabulas , quer dizer, tabuinhas de madeira reconertas de cera, em que se gravavam letras que depois podiam ser facilmente apagadas. Havia tábuas simples, duplas (dípticos), tríplices (trípticos), etc. Serviam para fazer rascunhos, testamentos, exercícios escolares e para escrever cartas.

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PALEOGRAFIA A – Definição: O nome é um composto grego de “Palaiós” (velho, antigo) e “graphia” (escrita).

É a ciência que estuda o material escriptográfico e as letras antigas, bem como a sua evolução.

B – O Material:

a) O PAPIRO: Nas margens do Nilo crescia, na Antiguidade, uma planta

palustre, o papiro, que às vezes atingia a altura de três metros. Seu caule é mais ou menos triangular e contém uma medula que dá excelente material para escrever. Os egípcios cortavam-na em tiras muito finas, que depois eram enxugadas ao sol. Vários desses pedaços eram uns ao lado de outros, e a folha, assim obtida, era posta em cima de outra folha, cujos nervos corriam perpendicularmente aos da primeira. O produto era muito apreciado e exportado para todos os países civilizados do Mundo Antigo. Já era vendido em Atenas nos mesdos do século V a.C.. Um dos reis helenísticos, talvez Ptolomeu V (século II a.C.), querendo prejudicar o desenvolvimento da biblioteca rival em Pérgamo, proibiu a exportação do papiro, medida essa que depois, ao que parece, foi revogada. Até o século VII d.C., quando os árabes invadiram o Egito, havia uma indústria florescente de papiro no Delta do Nilo. No início da Idade Média, o planeta foi levado também para as margens do Rio Anape, na Sicília. A Chancelaria Papal continuou a usar o papiro até o século XII.

b) O PERGAMINHO: O pergaminho é fabricado da pele de carneiro,

cabrito ou bezerro, e dá material quase indestrutível. Já o conheciam os persas e jônios da Ásia Menor. Deve-se seu nome a Pérgamo, não que esta cidade tenha inventado o pergaminho como assim se pensa geralmente, mas por ter melhorado e aumentado a sua fabricação o rei Eumenes II de Pérgamo (197 – 158 a.C.), quando os Ptolomeus estavam dificultando a exportação do papiro.

c) OS HINDUS: escreviam em folhas de palmeiras, os babilônicos e os

Assírios usavam tijolos de barro cozido. Os romanos primitivos utilizavam do córtico a faia. Os atenienses votavam nas assembéias do povo, em cacos de cerâmica (óstraka).

d) Nos tempos clássicos, os gregos e romanos usavam também codicilli, ou tabulas, quer dizer, tabuinhas de madeira reconertas de cera, em que se gravavam letras que depois podiam ser facilmente apagadas. Havia tábuas simples, duplas (dípticos), tríplices (trípticos), etc. Serviam para fazer rascunhos, testamentos, exercícios escolares e para escrever cartas.

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e) O papel feito de trapos é uma invenção do chinês T’sai Lun (cerca de 100 d.C.). O segredo da sua fabricação chegou, via Samarcanda, a Bagdá, durante o califado de Harum-al-Ras-chid (786-809) e, em seguida conquistou o mundo ocidental, principalmente nos tempos das Cruzadas. Desde o século XIII havia fábricas de papel na Europa, que se desenvolveram, sobremaneira, depois da invenção da tipografia. Hoje também é feito de outras substâncias: palha, alfafa, fibras de madeira, etc.

C – Os Instrumentos:

Os instrumentos para escrever sobre papiro ou pergaminho eram: o cálamo ou

arcana (latim – calamus), e desde o século VI d.C. a pena de ganso (latim – pinna). Para as tabuinhas enceradas eram usadas estiletes de ferro (latim – stili). O lápis moderno é invenção do francês N.J. Conte (1795). A tinta usada na Antiguidade e na Idade Média, era, geralmente, preta ou vermelha. Os títulos dos capítulos do direito canônico e civil, como também as indicações das cerimônias litúrgicas nas missas eram originariamente escritos em letras vermelhas (em latim – litteras rubricae): daí a expressão rubricas.

D – Os Livros:

A palavra latim líber, que deu o vocábulo português livro, significa originariamente a parte interior do córtice. É possível que a palavra inglesa book seja também relacionada com beech que é igual à fáia.

1 – Do papiro faziam-se, preferencialmente, volumina que é igual à manuscritos

feitos de apenas uma folha, enrolados em volta de um pau cilíndrico, o chamado umbilicus (rolo), fabricado de madeira, marfim, chifre, etc. Suas duas extremidades eram enfeitadas de botões (cornus) e a uma delas se prendia uma tira de papiro, indicando o título. Geralmente, os volumina eram conservados em estojos cilíndricos. Não havia – como não há hoje – um formato uniforme do livro. Segundo alguns, a biblioteca de Alexandria teria normalizado o tamanho em 7 a 10 metros de comprimento por 15 a 25 centímetros de largura.

Até o século IV d.C. o volumina permaneceu a forma predileta de editar os autores clássicos; daí em diante foi sendo suplantado pelo códice, forma mais barata e mais prática.

A palavra volumen (plural: volumina) está ligada a volvere que significa enrolar.

2 – O codex (em latim codex ou caudex que significa tronco de árvore), a forma do livro atual, representa uma fase de evolução dos codicilli: sendo mais manejável e mais prático, deveu prevalecer e assim aconteceu sobre o volumen. Na Idade Média , muitos códices antigos, feitos de pergaminho, eram utilizados mais de uma vez, raspava-se o texto original, para escrever nas folhas recuperadas um texto novo. São os chamados “palimpsestos”.

E – A Escrita:

O que daremos é um breve e rápido resumo, sem nenhuma pretensão de ser nem mesmo esquemático.

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a) A PICTOGRAFIA: é uma fase anterior ao nascimento da escrita propriamente

dita. Representa um complexo de acontecimentos (por exemplo: uma guerra, uma caçada) por meio de desenhos realistas ou simbólicos, cujo sentido não se lê, mas se interpreta ou se adivinha.

Ainda hoje se encontra esse sistema entre tribos primitivas da Sibéria, África e América.

b) A IDEOGRAFIA: foi um passo importante. Nela cada uma das palavras, ou, pelo

menos, todas as palavras essenciais de uma frase ficam com o seu símbolo individual e fixo. O exemplo clássico do sistema ideográfico é a escrita chinesa que dispõe de mais ou menos 49000 símbolos diferentes, dos quais alguns admitem 5 ou 8 significações diferentes; palavras homônimas são representadas por símbolos diversos. O sistema complica-se ainda pelo fato de serem possíveis várias combinações dos símbolos individuais, cada uma das quais tem o seu significado particular. A ideografia só vale para a comunidade que a realizou.

Exemplo:

Boca Homem Grande (homem de braços abertos)

Dizer Coração (boca aberta) (Dois pontos à Pequeno

esquerda do homem) (homem com braços abaixados)

Palavra Coração Fio (boca falando) (forma escrita) (cordão pequeno)

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A M O R c) Em todas as línguas há homônimos (palavras pronunciadas da mesma maneira,

embora lhes sejam diferentes a etimologia e o significado). Por exemplo: em português, cesto e sexto são homônimos, e a palavra canto pode significar “esquina” e “canção”. A representação figurada de um cesto e de um canto (esquina) pode dar sentido de “Sexto canção”. Neste princípio – usado nas cartas enigmáticas – baseia-se na escrita dos Astecas do México.

d) Em todas as línguas é relativamente pequeno o número de sílabas. Ora, alguns

símbolos, que originalmente, indicavam certos objetos concretos ou representavam certas ações, passaram a designar sílabas muito usadas, ou então grupos de sílabas, independentemente da significação da palavra em que ocorriam. Por exemplo: a palavra portuguesa pano poderia ser representada por dois símbolos – uma pá e um nó. É este o sistema silabográfico, que no fundo é uma variação do sistema anterior. A escrita dos antigos cipriotas e cretenses eram igualmente silabográficas.

e) O aperfeiçoamento da silabografia pode resultar na Fonografia ou Sistema Fonético, isto é, cada um dos sons, ou quase todos eles, são representados por um símbolo individual. Na Fonografia baseia-se a escrita moderna que remonta aos fenícios (por volta dos séculos XVI ou XV a.C.), discípulos por sua vez dos egípcios. A palavra Aleph significa touro e possuía como as outras palavras um símbolo individual no sistema ideográfico:

Aleph - Touro:

AAAA

Beth – Casa:

B

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A originalidade da escrita fenícia consiste em empregar o símbolo Aleph para representar certo som gutural; o Beth para B; o Guimel para G e assim por diante. Em outras palavras, os fenícios faziam completa abstração do significado original de um símbolo ideográfico para exprimir, mediante ele, apenas o som inicial do mesmo. O alfabeto fenício, que não registra as vogais, remonta muito provavelmente à escrita egípcia.

AS ESCRITAS ORIENTAIS

A) A Escrita Egípcia:

A egiptologia moderna foi fundada pelo sábio francês J.F. Champollion (1790 – 1832) que, em 1822, após extensos estudos preparatórios, conseguiu decifrar a célebre pedra Roseta, descoberta em 1799 por ocasião de uma expedição militar de Napoleão, no Egito, dando um golpe mortal às interpretações “místicas”, da escrita egípcia.

Esta, no que diz respeito à grafia dos símbolos, conhece três formas: Os hierogrifos, usados em inscrições de pedra; Os hieráticos, empregados em papiros; Os demóticos (desde o início do I milênio a.C.), usado em papiros e inscrições. Os demóticos são um tipo de taquigrafia.

Quanto à essência, os três sistemas são igualmente complicados e, ao contrário

do que se pensa muitas vezes, as três formas de escrita não apresentam três fases sucessivas de simplificação progressiva, mas evoluem, no decurso dos séculos, no sentido de uma complexidade cada vez mais crescente.

O que nos parece de certa forma curioso é que a escrita egípcia, ao se aproximar do sistema fonográfico, ao invés de dar o passo decisivo para ele, complicou-se ainda mais, com um acréscimo incontável de símbolos mudos.

B) A Escrita Cuneiforme:

Na Mesopotâmia, na Ásia Menor, na Pérsia, na Síria e – em certa época, até no Egito – eram usados os chamados cuneiformes, inventado pelos sumérios (III milênios a.C.) e, depois, adotados por vários povos de falas diferentes. Para material de escrever serviam-se principalmente de barro mole, em que gravavam os sinais mediante um estilete de madeira com ponta triangular.

Os cuneiformes, por mais diferentes que sejam as suas formas dos símbolos egípcios, são muito semelhantes a eles quanto ao sistema da escrita: originalmente, eram ideogramas, logo acompanhados de silabogramas e de determinativos. Nunca, porém, representavam consoantes isoladas e, muito menos vogais. Só os persas sob o reinado de Dario (569-529 a.C.) chegaram a desenvolver certo tipo de escrita alfabética (36 sinais, com restos de silabografia).

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C) Escrita Semítica:

Das diversas escritas semíticas assinalamos apenas a hebraica. O alfabeto hebraico, que remonta aos meados do IIº milênio a.C., consiste de 22 (mais tarde 23) símbolos, não possui vogais, e é conhecido em duas fases: a canaítica (conservada só em inscrições) e a aramaica (adotada pelos judeus depois do Cativeiro de Babilônia). Esta última deu origem a uma semi-cursiva. Para facilitar a pronúncia da Bíblia hebraica, foram inventadas, nos séculos VII d.C., vários sistemas de vocalização (traços e pontos), dos quais o “tiberiense” (que remonta ao gramático Ben Archer de Tibérias, século X) foi adotado nas edições atuais da Bíblia. A escrita hebraica, juntamente com a língua hebraica são, hoje, de praxe oficial no Estado de Israel.