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1 Palestra em Findhorn (Norte da Escócia) por Eckhart Tolle em 2004 ______________________________________________________ O livro que acompanha os 2 DVDs da Palestra Nota da tradução: As frases de cor azul estão associadas a lindíssimas fotografias sobre a natureza, tiradas pelo autor e que infelizmente não foi possível inserir aqui. As imagens incluídas nalgumas páginas são da autoria da tradução (locais: Madalena – Gaia e Avioso - Maia). Introdução A comunidade de Findhorn na Escócia apareceu nos anos sessenta, tendo como objectivo o relacionamento profundo entre os seres humanos e o reino da natureza. Criar uma nova relação com a natureza é um aspecto essencial do despertar da consciência humana. Na nossa civilização, baseada no ego, é comum a alienação da natureza e este factor está acompanhado pela alienação de nós próprios e dos outros. Quando nos juntamos para um retiro de fim de semana no ambiente mágico de Findhorn, os pássaros, as árvores, as flores, o vento, o mar, florestas e rios começam a ser os nossos professores. Professores do momento presente, de entrega ao AGORA. Professores do Ser. Incluí neste livro não só frases do retiro, mas também as minhas fotos favoritas de aspectos da natureza que tenho vindo a tirar já há alguns anos, em Inglaterra, Colômbia Britânica e Oregão. Procure olhar para estas fotografias com o mínimo ou nenhum pensamento. Tente não pensar. Em vez do pensamento, preste atenção integral ao acto de olhar, isto é, à percepção propriamente dita. Se os pensamentos surgirem, não se deixe envolver por eles. Olhe-os como meras nuvens que passam. Quando for para a natureza, aplique, o melhor que puder, esta forma de percepcionar. Veja as formas e as cores. Cheire o ar, ouça o roçar das folhas e o canto dos pássaros. Use completamente os seus sentidos e deixe o alerta da serenidade dentro de si ser o observador em vez da sua mente. Percepções sentidas não são mais do que fenómenos superficiais, porém elas podem abrir-nos para a dimensão da profundidade, do verdadeiro espírito. Quando se apercebe sem pensamento abre-se para o que não tem nome, o mistério profundo que prevalece a tudo o que existe, a presença do divino. Quando se apercebe dessa Presença, toma consciência que ela é una com a sua própria Presença como ser humano – para além da forma. É o que Jesus queria dizer no evangelho de S. Tomás: “Parte um pedaço de madeira. Eu estou lá. Levanta uma pedra e encontrar-me-ás lá”. Isto não significa que o homem-jesus esteja na madeira ou debaixo da pedra, mas sim o EU SOU, a essência mais profunda. O Ser dentro de todos os seres, uma Vida que está para além das formas que só é perceptível através dos sentidos. Quando acordas, a natureza acorda também.

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Palestra em Findhorn (Norte da Escócia) por Eckhart Tolle em 2004 ______________________________________________________ O livro que acompanha os 2 DVDs da Palestra Nota da tradução: As frases de cor azul estão associadas a lindíssimas fotografias sobre a natureza, tiradas pelo autor e que infelizmente não foi possível inserir aqui. As imagens incluídas nalgumas páginas são da autoria da tradução (locais: Madalena – Gaia e Avioso - Maia).

Introdução A comunidade de Findhorn na Escócia apareceu nos anos sessenta, tendo como objectivo o relacionamento profundo entre os seres humanos e o reino da natureza. Criar uma nova relação com a natureza é um aspecto essencial do despertar da consciência humana. Na nossa civilização, baseada no ego, é comum a alienação da natureza e este factor está acompanhado pela alienação de nós próprios e dos outros. Quando nos juntamos para um retiro de fim de semana no ambiente mágico de Findhorn, os pássaros, as árvores, as flores, o vento, o mar, florestas e rios começam a ser os nossos professores. Professores do momento presente, de entrega ao AGORA. Professores do Ser. Incluí neste livro não só frases do retiro, mas também as minhas fotos favoritas de aspectos da natureza que tenho vindo a tirar já há alguns anos, em Inglaterra, Colômbia Britânica e Oregão. Procure olhar para estas fotografias com o mínimo ou nenhum pensamento. Tente não pensar. Em vez do pensamento, preste atenção integral ao acto de olhar, isto é, à percepção propriamente dita. Se os pensamentos surgirem, não se deixe envolver por eles. Olhe-os como meras nuvens que passam. Quando for para a natureza, aplique, o melhor que puder, esta forma de percepcionar. Veja as formas e as cores. Cheire o ar, ouça o roçar das folhas e o canto dos pássaros. Use completamente os seus sentidos e deixe o alerta da serenidade dentro de si ser o observador em vez da sua mente. Percepções sentidas não são mais do que fenómenos superficiais, porém elas podem abrir-nos para a dimensão da profundidade, do verdadeiro espírito. Quando se apercebe sem pensamento abre-se para o que não tem nome, o mistério profundo que prevalece a tudo o que existe, a presença do divino. Quando se apercebe dessa Presença, toma consciência que ela é una com a sua própria Presença como ser humano – para além da forma. É o que Jesus queria dizer no evangelho de S. Tomás: “Parte um pedaço de madeira. Eu estou lá. Levanta uma pedra e encontrar-me-ás lá”. Isto não significa que o homem-jesus esteja na madeira ou debaixo da pedra, mas sim o EU SOU, a essência mais profunda. O Ser dentro de todos os seres, uma Vida que está para além das formas que só é perceptível através dos sentidos. Quando acordas, a natureza acorda também.

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O Retiro de Findhorn Estes ensinamentos não são baseados no conhecimento, nem em novos factos interessantes, nem sequer é uma informação nova. O mundo já está repleto destas coisas. Pressiona um botão em qualquer dos aparelhos que possui e recebe informação. Está-se a afogar em informação. E ultimamente qual é o propósito de tudo isso? Mais informação, mais coisas, mais disso, mais daquilo. Iremos encontrar a plenitude da vida através de mais coisas e em centros comerciais cada vez maiores e grandiosos? Iremos encontrar-nos ao melhorar a nossa habilidade de pensar e analisar, ao acumularmos mais informação, mais tralha? Esse “mais” irá salvar o mundo?

A nuvem angélica, o lago, o peixe, as ondulações na superfície da água... e a consciência da percepção criando a forma deste momento.

No estado egocêntrico o amor confunde-se com a forma, por isso você pensa que o seu amor está na forma, na outra pessoa. Não reconhece que o amor verdadeiro é o reconhecimento da não forma no outro – que é o reconhecimento de si próprio no outro. Reconhecerá isso mais facilmente nas coisas naturais. Aproxime-se primeiro do mundo da natureza e relacione-se com ela o mais que puder através da serenidade, através da Presença. Depois, gradualmente, traga isso para as suas relações com as outras pessoas. Deixe Ser. Esteja sereno com as outras pessoas, como está com a natureza. Sinta o campo de atenção que flui para o exterior na direcção delas. Ouça, e enquanto está a ouvir sinta-se a si próprio como o observador, a Presença, o Ser. Você é o céu. As nuvens são aquilo que acontece,

aquilo que vai e que vem.

Quando está preso ao momento, quebra a continuidade da sua estória, do passado e do futuro.

É quando a verdadeira inteligência surge, assim como o amor. A única maneira de o amor aparecer na sua vida não é através da forma, mas através do espaço interior que é a Presença. O amor não tem forma. Quando a mente perde a sua densidade, você torna-se translúcido como a flor. O espírito – aquilo que não tem forma – brilha através de si para este mundo.

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Nunca poderá consegui-lo no nível da forma. Nunca poderá colher e acumular todas as formas que pensa serem necessárias para encontrar a plenitude. Algumas vezes conquista todas essas coisas. Vê que tudo na sua vida está a funcionar perfeitamente: a sua saúde está boa; os seus relacionamentos estão bons; tem dinheiro, bens, amor e respeito das outras pessoas. Porém, em pouco tempo algo começa a ruir aqui e ali. São as finanças, ou os relacionamentos, a saúde, o seu trabalho ou a sua de vida em geral que apresentam ruptura. É esta a natureza do mundo da forma. Nada permanece fixo, unido por muito tempo, começando a separar-se novamente. As formas dissolvem-se. Novas formas surgem. Observe as nuvens. Elas ensiná-lo-ão sobre o mundo da forma.

Os meus pensamentos costumavam pesar-me, até que tomei consciência do intervalo entre eles, por mais pequeno que fosse...

O Sol nunca se põe. Trata-se apenas de uma aparência devido à perspectiva limitada do observador.

E contudo, que ilusão sublime!

Quando não coloca compulsivamente nomes nas coisas, quando deixa ir embora o apego à sua própria estória, torna-se vivo no momento presente. A Presença, o Ser surge e substitui o conceito conceptual do ser.

Você torna-se muito simples. A necessidade de se tornar especial desaparece. Torna-se uma pessoa comum. Não necessita mais de projectar um sentido de especialidade e encontra a sua identidade nisso. Que liberdade vem até si quando não precisa mais de ser especial para ter conhecimento da sua identidade! Que liberdade sente quando está em contacto com a preciosidade que é a sua essência. Quando ouve um pássaro, há um momento de audição pura antes da mente dizer uma palavra sobre isso. Se conseguir estar atento a si próprio sempre que algo novo entra na sua consciência, fica apto a captar esse primeiro momento. E aí esta ela: a serenidade, a imutabilidade, o conhecimento de si próprio. Quando toma consciência disso, verificará que o espaço do silêncio tornar-se-á maior. A serenidade que é o plano de fundo para sentir as percepções torna-se mais vasto. É sempre vasto, mas você ainda não sabia. A serenidade do seu interior expande-se, e depois, conforme vai experienciando a sua vida, esse estado de consciência fluirá para tudo o que fizer.

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Tão sereno é o lago! Quase se dissolve no nada...

A voz na cabeça, que nunca pára de falar, torna-se numa civilização que está obcecada com a forma e assim não sabe nada sobre a dimensão mais importante da existência humana: o sagrado, a serenidade, a não forma, o divino. “Que lucrará, se ganha o mundo e se perde a si próprio?” Entre no portal do Agora.

Há uma linda estória sobre a visão da autora do “Curso em Milagres” antes de ter recebido o “ditado” para escrever este curso. Na sua visão ela encontrou um rolo de pergaminho numa caixa velha. Era antigo e logo que ela começou a desenrolá-lo para ambos os lados, reparou nuns símbolos escritos do lado esquerdo e outros do lado direito. Uma voz disse-lhe: “Se leres o que está no lado esquerdo, conhecerás o passado, se leres o que está no lado direito, conhecerás o futuro.” Ela olhou para ambos os lados e depois enrolou, outra vez, o rolo até ao início, onde, no centro, estava escrito: “Deus é”. Ela afirmou: “É tudo o que me interessa. Não quero mais nada”. A Voz respondeu: “Parabéns! Conseguiste, desta vez”. O ponto de focagem dela tornou-se no momento presente. A forma deste momento é o portal de acesso à dimensão sem forma. É a porta estreita, de que Jesus fala, que leva à vida. Exactamente. É muito estreita. É apenas este momento. Para a encontrar, necessita de enrolar o rolo da sua vida na qual a sua estória está escrita, o passado e o futuro. Antes de existirem os livros havia os rolos que eram enrolados, em cada ponta, quando a tarefa terminava. Da mesma forma, coloque a sua estória de parte. Não é quem você é. As pessoas usualmente vivem transportando cargas do passado e do futuro, uma carga da sua estória pessoal, com a qual esperam preencher-se no futuro. Isso não irá acontecer. Enrole esse velho rolo. Considere-o acabado.

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Procure uma árvore e deixe-a ensinar-lhe a serenidade dela.

A razão original da arte é o sagrado. Ser um portal, um ponto de acesso para o sagrado. Quando a vê ou a vive, experiencia-se a si próprio. Nela vê-se a si próprio reflectido. Na arte verdadeira, a não forma brilha através da forma. Actualmente, o propósito final de toda a gente não deverá ser criar arte. É mais importante tornar-se numa obra de arte. Toda a sua vida, o seu próprio ser, torna-se transparente para que a não forma possa brilhar através dele. Isso acontece quando não está mais totalmente identificado com o mundo da forma. Isso acontece quando tem acesso ao reino da serenidade dentro de si. Então alguma coisa emana através da forma, que não é forma.

Você é a luz na qual as formas aparecem. A natureza da árvore: quieta, contudo activa e interessantemente viva, crescendo em direcção ao céu.

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A mente pode perceber uma paisagem campestre, mas a floresta é demasiado caótica. Contém uma ordem maior que não pode ser percebida através do pensamento.

Todavia, poderá sentir essa ordem quando fica sereno. Você é uma parte disso, parte desse sagrado.

Os seus problemas não são resolvidos na actividade do pensamento. Cria, em vez disso, problemas ao pensar. A solução aparece sempre quando sai do pensamento e fica sereno e absolutamente presente, mesmo que seja por um momento. Então, um pouco mais tarde, quando o pensamento retorna, surgirá de repente uma intuição criativa que não estava lá antes. Abandone o pensamento excessivo e veja como tudo muda. Os seus relacionamentos mudam porque, não exige que a outra pessoa faça alguma coisa para si para que você ganhe o seu sentido do Eu, não se compara com os outros ou tenta ser mais do que o outro para fortalecer o seu sentido de identidade. Permite a toda a gente ser quem é. Não necessita de mudá-los. Não necessita deles para se comportar de forma diferente para ser feliz. Cada pensamento na sua mente sobre o qual está inconsciente tem um sentido de ser em si. Um sentido de eu sou. Se se identifica com o movimento do pensamento é a essência da vida inconsciente. E é por essa razão que as pessoas vivem continuamente para o futuro – nos seus pensamentos do futuro, elas esperam completar a sua insuficiência do eu. Elas esperam encontrar o final feliz da sua estória de vida, uma construção mental que elas confundem com a sua identidade. Neste contexto, a procura compulsiva da busca por “mais” tornou-se o dilema da existência humana. O fotógrafo levantando a mão para saudar o Sol tal como o seu próprio reflexo numa bolha de

ar de uma poça de água na praia. Mais alguns segundos, um pouco mais de anos, um pouco mais de “aeons” – e todos terão

desaparecido.

O espaço exterior e o interior são, no final, apenas um.

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“Parte um pedaço de madeira. Eu estou lá. Levanta uma pedra e encontrar-me-ás lá” S. Tomás.

Diz-se que há duas formas de se ser infeliz: não conseguindo o que se quer, e conseguindo o que se quer. Quando as pessoas atingem o que o mundo diz que é desejável – riqueza, reconhecimento, propriedade, realizações – continuam ainda infelizes. Não estão em paz consigo mesmas. Não sentem segurança, nem a sensação de que finalmente chegaram. As suas conquistas não lhes providenciaram o que elas realmente estavam à procura – elas próprias. Estas coisas não lhes deram a certeza de estar bem enraizados na vida, ou como Jesus chama, na plenitude da vida. Um animal não perdeu a sua unidade com a totalidade. Não está sobrecarregado com uma carga contínua de corrente de pensamentos. Está profundamente enraizado no Ser. Não cria um mundo de problemas. É uno com a vida.

Não espero a chegada da Primavera. Eu sei que há um tempo para a acção e um tempo de retraimento da acção. Estou rendido ao momento presente. Sou uno com a vida.

Tal como a luz é filtrada pelas nuvens, a consciência é filtrada através dos pensamentos. Embora eu pense, eu sei ainda quem sou. Não há nada de errado em fazer coisas novas, perseguir novas actividades, explorar novos países, encontrar novas pessoas, adquirir conhecimento e especialização, desenvolver as suas capacidades e habilidades físicas e mentais e criar aquilo que sente ser chamado a fazer neste mundo. É belo criar neste mundo e haverá sempre mais coisas que poderá fazer. Agora a questão é: está a olhar para si mesmo naquilo que faz? Está a tentar acrescentar mais àquilo que é? Está compulsivamente lutando pelo momento seguinte, e pelo seguinte, e pelo seguinte, esperando encontrar algum sentido de completude e plenitude?

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Isto também irá passar...

A mente não pensa sobre a serenidade assim: “Oh! Isto é interessante, vou recordá-lo.”, porque a serenidade não é interessante. “Interessante” é aquilo que a mente pode pensar sobre, mas isso não é final. Observe uma árvore, ou uma flor, ou um pôr do Sol. No momento em que os analisa, junta uma legenda mental e essa coisa torna-se interessante, contudo a sua profundidade e a sua vivência ficam perdidas. Se olhar verdadeiramente para um carvalho, ou um pôr do Sol, aquilo para o qual está a olhar vai muito além do facto de ser interessante. Fique apenas com isso, contemple-os e será espantosamente inspirador. Há uma profundidade aí que desafia a análise da mente. Nenhuma forma é eterna, mas o eterno brilha através das formas. As formas tornam-se transparentes. Você não é eterno como forma, porém existe uma transparência em si. Isso é o que está para além da forma, independente do que lhe quiser chamar – serenidade, Presença, uma profunda sensação do Eu Sou. Anteriormente estava misturado com a estória do eu, com construções mentais. A preciosidade do Ser é a sua verdadeira especialidade. Aquilo que o eu egocêntrico estava a procurar no nível da estória – eu quero ser especial – obscureceu o facto de que não poderia ser mais especial do que é agora na realidade. Não é especial porque é melhor ou mais correcto do que qualquer outra pessoa, mas porque pode sentir a beleza, uma preciosidade e vivência profunda no interior. Independentemente do tamanho de que o seu caminho possa ter, nunca haverá mais do que: um passo, uma respiração, um momento – Agora.

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Apenas quando o aspecto transitório de todas as formas é reconhecido e aceite poderá o

mundo ser gozado pelo que é:” Leela”, o divino jogo da canção de Tao. O silêncio testemunha. O pensamento cede quando acaricia o seu cão de estimação ou tem um gato a ronronar no seu colo. Apenas o facto de observar um animal poderá levá-lo a “ficar de fora” da sua mente. O animal está mais profundamente ligado com a fonte da vida do que a maioria dos seres humanos e aquele desenraizamento do ser transmite-se a si. Milhões de pessoas, as quais de outra forma estariam completamente perdidas na realidade conceptual da mente, mantêm-se sãs ao viver com um animal.

Se a sua mente está serena, poderá sentir uma sensação de paz que emana da Terra.

Estamos aqui para encontrar aquela dimensão dentro de nós próprios que é mais profunda que o pensamento.

Quão insignificantes parecemos ser comparados com a vastidão! E contudo, aquela vastidão, aquela profundidade infinita está dentro de nós, inseparavelmente do que é. Forma e espaço interpenetram-se de fora para dentro e de dentro para fora.

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Palestra de Eckhart Tolle em Findhorn (Norte da Escócia) Nota da tradução: Houve a tentativa de manter fidelidade quanto à forma simples e repetitiva de comunicar do autor. Eckhart Tolle usa sons fonéticos, expressões faciais e mímica que expressam com mais clareza aquilo que quer transmitir do que as próprias palavras. O texto, para ser bem compreendido, deverá ser lido muito pausadamente, parando em cada ponto final, tal qual a apresentação do palestrante. Para além do discurso, deixe a serenidade ecoar dentro de si... porque é isso o que o autor pretende.

VOLUME I Bem-vindos a este retiro de fim de semana neste lindíssimo lugar sagrado. ... O tema desta palestra é SERENIDADE, a qual é inseparável daquilo que você é, na profundidade do seu Ser. Poderíamos dizer que todos já somos serenos. A serenidade já lá está. Não necessita de ser encontrada. Com certeza ela não necessita de ser criada, porque já lá está. A única coisa é que ainda pode não ter reparado nela. Se existe muito ruído mental, então ainda não reparou nela. Mas ela lá está. Também não notou que a dimensão dentro de si próprio é muito mais profunda do que o movimento dos seus pensamentos. Toda a sua identidade está amarrada ao movimento dos pensamentos. A mente criou a interpretação do eu. Uma estória pessoal e nada mais, que brevemente terminará, daqui a muito pouco tempo, talvez 10, 40 ou 50 anos. Aquilo que você é e a serenidade são o mesmo. Se ainda não ficou completamente louco neste mundo de loucos, significa que tem algum acesso à serenidade dentro de si próprio. Poderá não se recordar dela, afinal ela não é memorizável uma vez que a serenidade é intemporal e por isso a mente não pode memorizá-la ou pensar “Isto é interessante, vou recordá-lo!”. A serenidade não é interessante, porque o “interessante” é uma coisa mental. Tal como o nosso fim de semana não irá ser interessante. Já devem ter reparado nisso (risos). Mas o facto de ser “interessante” não é o definitivo, uma vez que esse definitivo é-o apenas para a mente. Se sair para o exterior e olhar para um carvalho, uma flor, ou um pôr do Sol, poderá dizer “Este pôr do Sol é interessante” mas só se quiser escrever uma tese sobre pores do Sol (risos). Terá de analisá-lo, assim como ao carvalho, que se torna “interessante” quando estiver a estudá-lo mentalmente. A dimensão da mente tem o seu lugar, contudo, se ficar preso a ela tem de separar as coisas em pequenas partes para poder efectuar a análise... A propósito disso, a maior parte das análises obriga a que aniquile o objecto antes da observação ou então durante o processo a coisa acaba por morrer mesmo (risos). Porém, se apenas for (ser, tornar-se) o carvalho, o contemplar, olhá-lo verdadeiramente, então o que está a olhar irá para além do “interessante”, será muito mais profundo do que “interessante”. Como o pôr do Sol, onde não há nada de “interessante” nele e todavia vai muito além disso. É espantosamente inspirador. É profundo, há uma profundidade aí que desafia o conhecimento da mente. No momento em que o analisou, reduziu-o a algo sem vida. A maioria das pessoas na nossa civilização - e isto já dura há muito tempo - estão encurralados nessa dimensão onde vão compulsivamente através da vida, analisando, interpretando e rotulando as coisas logo que elas entram no seu campo consciência. Fazem-no às pessoas, às situações que encontram, reagindo de imediato ao relacionamento pessoal que têm com elas.

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Fazem-no também com a natureza e por isso não conseguem perceber o sagrado que se encontra nela, dado que fazem apenas uma aproximação com o pensamento. É um presente medonho para se encontrar. O presente da vossa própria mente. É assim que comunicam com toda a vida, apenas desta forma. Toda a vossa vida acaba por ser reduzida a uma realidade conceptual da vossa cabeça, consistindo dos pensamentos que têm sobre as coisas, gerando pontos de vista, opiniões e mesmo o chamado conhecimento. O conhecimento é um pensamento, um rótulo que lhe dá a ilusão de que sabe, mas é apenas isso. É um pensamento que colocou em algo. É nessa altura que perde a sua profundidade e vivacidade. Começa a relacionar-se através do véu do pensamento. Relaciona-se também consigo próprio através do véu do pensamento. Neste sentido, começa a identificar-se a si próprio com uma base conceptual do pensamento. Um eu egocentrico. Um eu com a sua estória pessoal incompleta, com os seus desejos, medos e frustrações e com a esperança de que irá encontrar o preenchimento do seu não preenchido eu, baseado numa estória do futuro. Que é, outra vez, o pensamento-forma. É tudo o que o futuro é. Nunca ninguém o “encontrou” a não ser como um pensamento. Contudo, a maior parte das pessoas vive inconscientemente como se o momento seguinte, e os que se lhe seguem são mais importantes do que este momento, o único que verdadeiramente é. Este único momento do qual não poderá escapar, nunca escapou e também não escapará jamais é inseparável da vida que você é e também inseparável da serenidade. Logo que entra no Agora com a sua atenção, a serenidade emerge. A essência do momento presente, independentemente da loucura que possa aparecer na superfície, é sempre serenidade e é também de carácter sagrado. O único lugar onde a dimensão do sagrado pode ser encontrada é no Agora, no momento presente. Tem de despertar neste momento para reconhecer a sua sacralidade. Quando está perdido em pensamentos, o sagrado não tem sentido, poderá tornar-se num dos muitos conceitos com os quais está habituado a brincar e até pode escrever uma tese sobre isso, sem nunca ter tido alguma vez o privilégio de encontrar essa sacralidade. A profundeza do Agora é inseparável do seu verdadeiro Ser, da sua vida real e é sagrada. É por isso que estamos aqui (seres humanos). Para aprofundar a nossa lucidez nesta dimensão. E o sagrado aparece em todo o lado. Se você estiver realmente presente, encontrará o sagrado em tudo. É mais fácil aqui, em Findhorn, assim como nos locais que são considerados sagrados, porque há menos densidade nas estruturas, nas estruturas físicas, nas formas. Aí há uma transparência na maior parte da matéria. Algo brilha através das formas. É por isso que nós chamamos a esses locais sagrados. Porém, mesmo aqui há algumas pessoas que não conseguem sentir isso, porque elas ainda não estão suficientemente presentes quando passeiam nos jardins. Têm ainda na cabeça pensamentos sobre o que irão fazer depois de amanhã e a acumulação de problemas, que são pensamentos-forma, uma parte da sua interpretação do eu. “Tenho problemas muito importantes para resolver!” (risos). Ocasionalmente têm vislumbres. Três segundos nos quais esporadicamente dizem extasiados “Ooh!” e imediatamente vem o movimento dos pensamentos, um “ok” (resignado) e continuam a andar submersos neles. Embora haja aqui quem não possa estar presente, a maioria consegue. Os que não estão ainda no Agora irão aprofundar e descobrir como é fácil estar no presente e o quão difícil é não estar presente.

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Normalmente as pessoas dizem-me o oposto “É tão difícil estar no presente!”. É nisso que a mente acredita. Mas o contrário é que é verdadeiro: não estar presente no Agora é difícil. Viver encurralado na sua mente é difícil. Torna a vida em algo que é uma luta, um esforço permanente e nunca consegue chegar “lá”. Nunca consegue, porque vive para o futuro, que é apenas um pensamento-forma. É outro aspecto de viver encurralado em pensamento. Com todo o seu sentido do eu amarrado em pensamentos, esperando que em algum momento se vá encontrar a si próprio, se possa completar ou pensar que tudo irá correr bem no final. Contudo, no reino da mente isso não poderá resultar, dado que toda a forma morre e toda a estrutura acabará por se dissolver outra vez. A mente apenas pensa em termos de formas e estruturas e espera que a vida funcione nesse nível. Porém é desanimador, porque não pode. O milagre é que a Vida já está a funcionar neste preciso momento. Já está a acontecer tudo como deveria ser neste mesmo momento. Todos nós já chegamos ao local da sacralidade, neste momento. É mais fácil ver isso, sentir isso aqui, neste lugar, e mais difícil sentir essa sacralidade quando se encontra em Picadilly Circus ou em Times Square onde necessitará de ser muito iluminado, o que significa estar muito presente, para ver, por exemplo, o sagrado no anúncio da Coca Cola em Picadilly Circus (risos). E terá de ser um Buda para ver a sacralidade num campo de prisioneiros. Se alguém disser que vê o sagrado num sítio desses será prematuramente mal interpretado e não fará sentido a não ser que saiba dentro de si próprio que isso está para além da forma... A única vida, a da não forma, que é indestrutível. Pessoas que viveram nesses campos experienciaram isso por si próprias. Estamos aqui (seres humanos), então, para descobrir essa dimensão que é mais profunda do que o pensamento dentro de nós próprios, que não tem nada a ver com o tempo. Algumas pessoas, perguntam, por vezes “Como aquieto a minha mente? Como encontro a serenidade?”. Há alguns bons métodos de meditação, mas a certa altura também eles terão de ser abandonados, porque senão ficarão no intervalo daquilo que é, isto é, no espaço entre o eu e o Ser. E todos os métodos acabam por ter de ser deixados. Não precisará mais deles. Este ensino, em particular, não utiliza qualquer método, contudo, se está nalgum, muito bem, continue, use-o até não precisar mais dele. Todo o pensamento na sua mente, quando não está ciente dele como um pensamento, tem um sentido de ser nele, tem um sentido do eu sou. Você identifica-se com o movimento do pensamento. Essa é a essência da vida inconsciente. É por isso que as pessoas vivem continuamente para o futuro. O pensamento-forma do futuro onde esperam completar aí o sentido da insuficiência do ser. O final feliz da minha estória. Não quer dizer que não deva perseguir certas actividades, aprender coisas novas, explorar novos países, encontrar novas pessoas, adquirir novos conhecimentos, especializar-se aqui e ali, desenvolver as suas habilidades físicas e mentais. Criar o que foi chamado a criar neste mundo. É maravilhoso criar neste mundo. E nesse nível é claro que há sempre mais para fazer. Contudo, conforme vai envelhecendo há certas coisas que não é capaz de fazer mais. Gradualmente, no nível da forma, a vida começa a ficar reduzida. Há muitas coisas das quais será improvável eu poder fazer. Não vou ganhar o título em Wimbledon e seria um milagre se o conseguisse. Não é totalmente impossível, mas nem vou tentar...(risos). E há muitas outras coisas para as quais olho e digo “É demasiado tarde”. É claro que sim! No nível da forma eu não poderei ser um campeão de box. Não só é demasiado tarde como me foi talvez sempre impossível (risos - o palestrante tem uma estrutura frágil).

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Assim, no nível da forma, dependendo de onde se encontra na faixa etária, haverá muitas coisas que poderá acrescentar ao que pode fazer e ao que não pode fazer. Ou ainda, estará já com a idade muito avançada e aí as possibilidades serão mais reduzidas. Está tudo bem, também. Agora, a questão é: Está a olhar para dentro de si próprio quando tenta acrescentar algo àquilo que é? Este é o dilema da existência humana. Há uma procura compulsiva para mais. Não está errado conhecer coisas novas, porém há uma luta para o momento seguinte e o seguinte e o seguinte... esperando acrescentar mais àquilo que eu sou. Pensamentos-forma. Bens, conquistas, reconhecimento dos outros. Tudo pensamentos-forma. “Puxa! Não tenho o suficiente ainda. Não me sinto suficientemente seguro. Só tenho 5 casas e 3 carros e ainda não me sinto seguro. As casas não são suficientemente grandes, deve ser essa a razão.” (sorrisos) Ou escrevem sobre mim nos jornais e... A propósito, não tenho 5 casas, foi só um exemplo (risos). Escrevem, então, sobre mim, reconhecendo-me e eu penso “Finalmente! Fui reconhecido. Eles pensam que eu sou grande.” Deram-me a sensação de que agora eu tive o reconhecimento universal daquilo que eu penso que sou. Muitas pessoas esforçam-se por isso, pensando “Quando é que me irão descobrir também?”.(risos) “Quando é que os outros irão perceber de que eu sou especial?” É provável que nunca o venham a fazer (risos). Há uma busca para a especialidade no eu construído pela mente que nalguns casos é preenchida, mas na maioria das vezes não é concretizável, no nível onde estão a procurar. Assim, em qualquer um dos casos, essa sensação de especialidade tem a ver com o que vou dizer: “Há duas formas de se ser infeliz. Não ter o que se quer... e ter o que se quer.” (risos). Todas as pessoas que conseguiram o reconhecimento universal em qualquer área, não são também felizes. Não estão felizes consigo próprias. Não sentem segurança. Não têm a sensação de que finalmente chegaram. Antes de terem o reconhecimento, elas associaram essa ideia ao facto de serem aceites. “Quando for reconhecido vou ter a sensação de que cheguei!” Chegou o momento e a princípio sentem-se bem, mas depois começam a notar que a opinião das outras pessoas sobre elas não passam de pensamentos-forma, imagens criadas pela mente ou ainda, como bem sabem, os media (meios de comunicação social) criam a ficção que tem o seu nome. Lê sobre si no jornal e pensa “ Quem é este fulano? Não tem nada a ver comigo!” Desta forma muitas pessoas tornam-se mais infelizes depois de terem atingido esse reconhecimento. O mundo diz-lhes que são especiais e contudo, não se sentem nada especiais. Pensam que é tudo uma ilusão. Isto não sou eu, é apenas uma imagem criada pela mente humana. Assim, essas pessoas passam para além do conhecimento de todas as identidades criadas pela mente, porque atingiram aquilo que o mundo lhes disse que era desejável, riqueza, bens, realizações, reconhecimento, conquistas por todo o lado e contudo isso não lhes providenciou aquilo de que estavam à procura. Eu próprio. A sensação de estar enraizado na vida. A plenitude da vida, tal como Jesus lhe chama. É por isso que há muitas pessoas famosas que tomam drogas.

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Elas necessitam de estupidificar a terrível infelicidade que sentem dentro de si próprias, porque mesmo a ilusão de “mais” no futuro, que a maioria ainda vai vivendo, já não funciona. Se se já tem tudo, a ilusão de que se irá ter mais no futuro para ser feliz já não os convence. Que terrível destino! (sorriso do palestrante) Já não podem olhar mais para o “mais” porque isso não os satisfaz. Desta forma, sentem-se ainda mais infelizes, porque é impossível fugir do momento que se segue. Tomam drogas para terem uns momentos em que pensam “Agora estou a sentir-me melhor”. Destes, muito poucos conseguem entrar num nível mais profundo do seu ser e tomam consciência de que essa sensação de especialidade no nível de ser melhor do que, ou mais do que, era uma ilusão. Se a perseguirem, ela levá-los-á a sítio nenhum. Nunca poderá preenchê-lo, porque é um pensamento-forma. Eu, o ser especial que queria incorporar na estória do eu. Essa é a base da sua identidade, se estiver apenas encurralado nos pensamentos. Eu o ser especial. Algumas pessoas têm a ficção na sua cabeça, pensando que – e isto é um exemplo – numa vida passada foram Napoleão (risos). Esta estória dá-lhes uma sensação de especialidade, contudo deriva somente do movimento dos pensamentos, de imagens. Alguns mantêm-se satisfeitos com esta ilusão. Ninguém concorda consigo que é Napoleão, mas temporariamente até resulta. Claro que tem de estar sempre a pensar nisso e a contar essa estória aos outros, e alguns até ficam convencidos. Isto é apenas baseado no movimento dos pensamentos e nas emoções que daí advêm, produzindo toda uma identidade que se fundamenta nessa estória. É muito pouco! Não irá durar muito. O problema dessa pessoa irá revelar-se brevemente. Poderemos dizer que ninguém pode predizer a morte. Todavia, a morte de todos nós é quase eminente uma vez que o período de 1 ou 30 anos acontece muito rápido. Será no Agora que irá acontecer e não no amanhã. Estar agrilhoado a esta interpretação do ser, a esta realidade conceptual é um destino amedrontador. É uma constante desnecessidade. Mesmo que o traduzam para um conceito espiritual, logo que tomem consciência de que se desapegaram das posses... cuidado aqui com outros pensamentos-forma que chegam para substituir. Por exemplo, levou 20 anos a realizar riqueza e diz “Muito bem, chegou o momento de dar o meu BMW e vou comprar uma bicicleta porque sou espiritual” (risos). Irei só usar roupas espirituais. Isto e aquilo...”. Vou, então, na minha bicicleta e olho para o lado e vejo aquela pessoa que ainda vai tão “inconscientemente” no seu BMW (risos) e penso no quanto mais superior sou na minha espiritualidade. É claro que é provável que transporte agora consigo um pensamento-forma muito mais denso do que o da pessoa do BMW (risos). O seu sentido do eu tornou-se mais pesado do que o da outra pessoa que está a julgar. Por isso cuidado com o modo como a mente puxa outra estória para si, para ter sempre a sensação “do mais do que” seja de que maneira for. Isto resulta apenas por comparação. Tenho uma imagem de quem eu sou e tenho de comparar com o que eu penso que o outro é. Imponho imagens a mim mesmo, conceitos mentais, e imponho-o aos outros, comparando a minha imagem com a imagem do outro. “Ok. Sou mais espiritual” ou “ Ele é mais espiritual. Já está nisto há mais tempo do que eu” (risos). E assim prossegue com o que sabe. O conhecimento é outra escravidão. Sabe coisas, através do seu grande armazém de conhecimento, que por acaso transmite aos outros, eles ficam abismados e é óbvio de que sabe mais do que eles... Dá-lhe então a sensação de que “Aah! “ (sou o melhor!) Acontece com pequenas coisas. É sempre muito precário este sentido do eu. E só resulta se eu estiver certo e para isso os outros têm de estar errados.

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Sente-se, então, momentaneamente engrandecido. “Aah! Sou brilhante!”. É sempre a ficção do fortalecimento do eu. A ficção de mim próprio. De mim e da minha estória. As pessoas percorrem a vida procurando isso. É o propósito das suas vidas. O fortalecimento da ficção de mim próprio (risos). Esta é a força motivadora por detrás das acções, de tudo o que fazem. É sempre um coisa instável, devido ao facto de muitas vezes se sentirem menos do que os outros. Por isso têm de compensar. “Sou menos especial do que ele. Ele sabe mais, mas por outro lado eu tenho melhor aparência! (risos). Se as pessoas não conseguem atingir a especialidade da forma que o mundo lhes diz para o fazer chegam a uma especialidade oposta sentindo-se tratadas injustamente pela vida. Sentindo que são vítimas de algumas pessoas ou situações e nesse pensamento-forma de ser uma vítima, sentem-se muito especiais. Podem ganhar sempre, mesmo que percam (risos). A mente é muito inteligente. A identidade de vitimização está fortemente alojada na mente de algumas pessoas. Conhecemo-los e 5 minutos depois já estão a contar a sua estória. “Sabe o que me aconteceu há 25 anos atrás...” É claro que coisas desconfortáveis aconteceram há 25 anos atrás e estão também a acontecer agora, neste mundo louco. Construir uma identidade em algo terrível que aconteceu uma vez no passado ou que se repete constantemente neste mundo louco onde o sofrimento é inevitável, criar uma situação de especialidade à volta disso, coloca-o numa medonha prisão criada por si, mas pelo menos “sabe” quem é, tem uma estória... “Que bom já tenho uma estória! A minha vida tratou-me mais injustamente do que às outras pessoas. Então posso sentir mais do que os outros.” Qualquer que seja a coisa, a mente irá encontrar sempre algo para dar a si mesma uma identidade, uma identidade conceptual e fica com muito medo de perder a estória, de abandoná-la, de passar para além dela. A estória necessitaria de se tornar muito desagradável para que a pessoa fosse empurrada para fora dela, porque num sentido, a estória é um sonho. Um sonho de quem eu sou. Se um sonho se torna muito desagradável vai querer acordar. Se esse sonho sobre o meu eu não for totalmente desagradável haverá sempre alguns mais desagradáveis do que outros... Veja como o eu conceptual tenta continuamente sobreviver, não só sobreviver, mas também proteger-se a si próprio dos outros e usar os outros em seu benefício de uma forma ou de outra. É nesse grau que muitos seres humanos se relacionam. Aqueles que ainda não conseguiram ultrapassar isso, querendo usar o outro ou necessitando de se proteger dele. Estas são as duas coisas que governam o relacionamento entre duas pessoas no estado do ego. Usa ou teme o outro ser humano. Precisa dele ou teme-o. Às vezes ambas as coisas ao mesmo tempo. Deste modo, obviamente, mostra que não existe realmente nenhum relacionamento. Fica distorcido, porque não sabe quem é. Tem apenas uma imagem na cabeça, que tenta ficar mais forte porque ainda não o é suficientemente. “Ainda não sou suficiente”. Para algumas pessoas o significado de especialidade é atingido por queixas frequentes, não só na cabeça, mas também verbalmente. Queixam-se da vida, das pessoas, das situações. “Isto não deveria estar a acontecer... Deveriam fazer algo sobre isto. É realmente muito mau...” (risos). Estão permanentemente a queixar-se e a reclamar. O ego adora isso porque você torna-se certo. Quando se queixa de alguém ou de alguma coisa sente que está certo e o outro errado. Não estou falar num sentido prático, por exemplo, devolve um objecto que comprou e que não está funcionar. Tudo bem. É prático e está a fazer algo para resolver.

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As queixas a que me refiro são as estórias contínuas que a mente está a contar e que não têm qualquer sentido prático, causando sistematicamente um conflito nos relacionamentos com o momento presente. Há algo que está sempre errado e por isso queixa-se. Pode acontecer queixar-se também porque algo acabou de acontecer ou mesmo porque algo ainda não aconteceu (risos). A pessoa sente que não pode ser ela própria ou estar verdadeiramente em paz consigo mesma por duas razões: devido a algo que aconteceu que a impede de ser ela mesma, e por causa do que ainda não aconteceu o que a impossibilita de ser ela mesma (risos). Não é estranho? Preciso de algo para ser eu próprio! Estamos a falar sobre as diferentes facetas dos medos, para que possa reconhecê-los em si próprio. É um padrão universal em cada pessoa. É o que herdamos da mente humana colectiva. É um estado egocêntrico e inconsciente que opera sempre dessa forma, mantendo-o encurralado na superfície do ser, na pequena faixa de ondulação, no movimento superficial da vida, onde actuam apenas os pensamentos-forma. É no nível das formas que estão os pensamentos-forma, as formas primordiais que vêm à sua cabeça sem cessar. Depois de cada um deles vem logo a seguir outro e mais outro, ininterruptamente. É uma corrente chamando continuamente a sua atenção, durante todo o dia, parecendo electrizado (risos). Ocasionalmente vai tendo pequenos vislumbres que o mantêm são, e assim vai sobrevivendo, impedindo-o de cometer suicídio ou de ficar completamente desorientado ou louco. Vai tendo alguns momentos de sanidade (risos). Pode ter a certeza de que eles o mantêm vivo. Há aqui pequenos intervalos de alegria que se infiltram das profundezas do seu Ser, através das camadas mais densas da sua mente. Existem pequenas fendas aqui e ali. Se elas não existissem ficaria completamente perdido e não estaria sentado aqui (risos). Estes momentos surgem talvez quando se depara com algo extremamente belo ou quando está em perigo, acordando da voz contínua da sua cabeça. Subitamente uma vivacidade mais intensa vem à sua presença, mas de novo voltam os pensamentos. Para algumas pessoas o perigo pode vir na forma de alguma doença, que o faz despertar, fazendo-o ver que todos os pensamentos que perseguia agora não têm importância nenhuma, não interessam mais. Aqui algo entrou em colapso no nível do pensamento. Tudo o que importava, já não tem mais contexto. Essa doença pode ser útil para alguns, porque é um despertar. Outras pessoas mantêm-se sãs por causa de um animal, porque é a única maneira de se manterem relacionadas com outro ser, um ser não conceptual. Quando se encontram com outros humanos ficam encurraladas nos conceitos que têm sobre todos os humanos que encontram. Impõem conceitos mentais e imagens na sua forma de pensar. Eles sabem exactamente o que pensar sobre si. Eles não se relacionam consigo, mas sim com os pensamentos que têm de si. A maioria faz isso uns com os outros. Há apenas duas entidades de pensamento a tentarem relacionar-se. Ambos necessitando-se e temendo-se. Por isso os relacionamentos são tão problemáticos, hoje em dia. Por essa razão muitas pessoas preferem relacionar-se com os animais para se manterem sãs. Os animais de estimação têm uma função muito importante na sanidade humana e que ainda não foi devidamente reconhecida. Ao tocar o cão ou o gato ou outro animal, embora alguns até aí ainda o façam com o ego, permite-se ser você próprio. Não tem de se projectar psicologicamente no animal ou tentar ganhar algo com isso. Simplesmente é. Algo se transmite para si próprio porque o animal vive mais profundamente ligado à fonte da vida do que a maior parte dos humanos. Eles estão menos afastados, ou melhor, a ilusão do eu como entidade separada do resto do universo não “cresceu” neles tão assustadoramente. Os animais ainda não perderam a unidade com a totalidade. Estão profundamente enraizados no Ser, por isso não criam um mundo de problemas. São unos com a vida.

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Os humanos separam-se da vida. A sua imagem conceptual apresenta-se como: aqui estou eu e ali está o resto do mundo. Há uma barreira e há o outro, o outro ser humano. Que conceito mais medonho: o outro. Necessitando e temendo os outros pela vida fora. O outro não passa de um conceito mental. Quanto mais forte está encurralado no seu eu egocêntrico, mais irá enfatizar a diferença com os outros. Os outros irão ficar sempre reduzidos a caricaturas ambulantes, porque os sentimentos que tinha em relação a eles, foram reduzidos. Eles são quase todos basicamente caricaturas. Se ouvirem alguém falar de outra pessoa referindo-se a ela como estúpida, fazendo uma série de julgamentos, reparem como esse indivíduo está a fazer uma caricatura de um ser humano estranho e distorcido. Quando se encontram com essas “caricaturas” ficam espantados: “Era esta a pessoa de que estavam a falar?” O animal, pelo contrário, não está sobrecarregado por esta corrente contínua de pensamento, ele não tem uma identidade conceptual, como os humanos. Não se separou, por essa razão poderá ser um ponto de acesso de alguns humanos para o Ser. A única forma de algumas pessoas conseguirem colocar os pensamentos afastados é ao acariciar um gato no peito, sentindo que ao fazê-lo ficam mais tranquilos, encontrando um lugar de serenidade. Sentem, então, o gato no peito: rooooooooommm (risos). Ou, então, simplesmente observando um animal. Poderá verdadeiramente afastar os pensamentos, tornando-se presente porque o animal está presente. Acontece o mesmo com a natureza que o rodeia, as árvores, as flores, as lâminas da erva. Eles estão todos presentes. Eles estão todos rendidos à vida. São unos com a vida, uma expressão belíssima e temporal da vida. Assim, para alguns humanos é o único ponto de acesso, para outros nem isso funciona mais. Conheci alguém com um ego muito forte e que tinha lutas egocêntricas com o seu gato (risos). Ela tinha a janela da cozinha aberta. Se o gato não viesse à noite a tempo, fechava-o lá fora. “Se ele não me quer ver, eu também não o quero ver!” e o pobre gato ficava lá fora toda a noite. Isso também pode acontecer. Algumas pessoas nem com os animais se podem relacionar. Vemos milhões e milhões de humanos numa pseudo realidade, numa interpretação do eu que é realmente uma ficção, sentido-se sempre insatisfeitos, com uma sensação de carência, precisando sempre de mais, alguns necessitando de criar inimigos para se afirmarem, definirem como eu e o outro. Procurando qualquer tipo de conflito para ter uma sensação do eu que continua intacto. “Com quem poderei estar em conflito hoje?” (risos) “Sobre o quê me devo hoje queixar, para sentir-me um pouco mais como eu? Ah! Aqui está!” Quando milhões de humanos vivem assim, o resultado está no que lemos da história humana. Um terrível conto de incrível sofrimento que os humanos infligem entre si e nas outras formas de vida do planeta. Nas notícias, à noite, quando liga a sua televisão vê como é louca a consciência colectiva no nível presente da sua evolução e, contudo, aqui estamos nós e reconhecemos que tudo isso é uma forma colectiva de doença mental que a humanidade está agora a sofrer. Alguém pode perguntar: como é que Deus permite que as espécies se tornem mentalmente doentes? (risos) Ouvi esta pergunta uma vez na mente de uma pessoa. E é claro, poderá fazer a mesma pergunta num nível mais próximo. “Como é que Deus permite que eu tenha esta doença?” “Como é que Ele/Ela (Deus) se atreve a permitir que eu esteja doente e sofrer?” Na grande totalidade tudo tem os seus caminhos. Tudo está como deveria estar incluindo a sua doença pessoal para o momento, não quer dizer que a cura não venha

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a acontecer. Mas há muitos humanos aqui em Findhorn que não teriam vindo se não tivessem sofrido qualquer disfunção nas suas vidas. Talvez doença física ou alguma grande perda. Assim, no vosso nível pessoal e no vosso sofrimento físico já podem observar, seja ele qual for, que nalgum grau começaram a dissolver as estruturas do ego na vossa mente. Abanaram e soltaram essas estruturas para que algo mais entrasse. Subitamente começaram a interessar-se por estar presentes, Agora, e acabaram aqui. Seja qual for a vossa estória, e embora alguns ainda possam pensar que foi tudo um grande erro. “A minha estória foi apenas um grande erro!” Estão aqui, Agora! É uma coisa espantosa o estar aqui, agora e verem que o resultado de todo esse grande erro foi o de estarem a sair disso e a ficar cientes de que no nível da forma foi o modo como a vossa vida se desenrolou. Deixem-me falar pessoalmente por um momento. Posso facilmente olhar de volta para toda a minha vida até o mundo afirmar que eu passei a ser uma pessoa importante – isso aconteceu há alguns anos atrás, (risos) antes ninguém me disse que eu era importante – até esse ponto a minha vida foi um completo desastre. Nada funcionava. Experimentei várias coisas antes de entrar para a Universidade onde fiz o meu doutoramento e fartei-me. Depois andei à deriva durante 2 anos, a seguir fiz isto e aquilo, etc. tentei muitas coisas e a minha mãe disse-me “Tens 45 anos e que é que realizaste? (risos) Outros montaram os seus grandes negócios... E assim no nível da estória fui um grande desastre, contudo, felizmente, nalgum ponto eu já tinha desistido da identificação com a estória. A estória foi a minha identidade até eu fazer 29 anos e fui muito infeliz até aí, mesmo com o sucesso obtido na minha graduação universitária, que para mim durou talvez apenas 2 semanas (risos). Não é estranho como uma estória falhada pode produzir uma flor? A flor da consciência. Talvez a flor necessite da lama para crescer. Temos uma imagem lindíssima no budismo na qual uma flor de lótus, que é o símbolo do budismo, tem as suas raízes na lama e cresce saindo da lama. Não há nada mais bonito numa vida humana do que uma estória falhada. “Aaahh!” (risos). As boas notícias são: todas as estórias acabam por falhar mais tarde ou mais cedo, porque são baseadas nas formas, identificam-se com as formas e nenhuma forma dura tanto tempo. Os edifícios não duram assim tanto tempo, acabam por ruir. Todas as formas são temporárias e são belas, porém é a essência que se esconde em cada forma, a vida da não forma, que é indestrutível. Esta lindíssima estrutura de Findhorn também não é eterna como forma, mas o eterno brilha através desta forma, porque a forma é transparente. Vocês também não são eternos como forma mas a transparência está a acontecer a quem está sentado aqui. Ela está para além da forma, não interessando o que lhe vamos chamar, serenidade, Presença, Ser, um profundo sentido do Eu, que antes estava misturado com a estória do eu. A preciosidade de Ser, é que é a vossa verdadeira especialidade. Aquilo que o eu egocêntrico estava a procurar a nível da estória: “Eu quero ser especial!” Este mesmo pensamento obscureceu o facto de que já não pode ser mais especial do que é Agora. Aqui este termo “especial” não é no sentido egocêntrico de ser mais do que ele ou ela, mas no sentido de dizer que é uma maravilha e preciosidade a essência do seu Ser e isso é o que poderá sentir profundamente. Mesmo que seja uma das pessoas mais identificadas com a sua estória e com o eu conceptual, conseguirá sentir que algures há algo de muito precioso que Sou Eu, mas que confunde com as formas e com os pensamentos-forma. Essa essência do Ser que é sem forma e intemporal mistura-se com a forma, com o pensamento e a estória na cabeça.

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Foi o que Buda chamou de o eu fictício. O eu, que Buda há 2.600 anos reconheceu como uma ilusão. Um enorme rasgo de intuição (insight). Talvez um dos maiores de toda a humanidade, quando reconheceu de que o eu é uma ilusão. E com isso ele quis dizer o eu que é identificado com qualquer forma, pensamento-forma, forma física, qualquer um deles. Isto é a ilusão: o de nos usarmos em qualquer forma. A preciosidade do Ser, que é a intemporal essência da não forma em todo o ser humano e em todas as formas de vida, encarna, poderemos dizer, na forma. Não tem mal nenhum encarnar na forma desde que saiba que você é a essência para além da forma. Todavia, se se perde a si mesmo na encarnação - e afinal tinha de fazer isso mesmo, pois fazia parte do plano, de como as coisas tinham de funcionar, na totalidade - é o que o Buda chamou de sofrimento. Sofre porque já não sabe quem é. Está a procurar a si mesmo numa forma qualquer, um pensamento-forma, uma forma física com a qual se identifica e que também não passa de um pensamento-forma. Todos os seres humanos estão a olhar para a essência do seu próprio Ser, não sabendo que a especialidade que procuram é já a essência daquilo que são. Só irão descobrir isso quando deixarem de olhar para si próprios no futuro, onde querem sempre mais. Encontrar o lugar especial é como um jogo estranho. O único lugar onde realmente poderá encontrar-se a si próprio é para onde nunca olha... É o momento presente! Olham para si próprios lá, no futuro, e dizem “Quero ser mais!” É verdade que no nível da forma podem, temporariamente, ser mais. Depois essas coisas dissolvem-se outra vez. Porém há um nível dentro de si mesmo onde o mais não funciona. Não necessita de ser mais porque já é a expressão plena da vida única. Já é completo no nível do intemporal, da essência do seu Ser. A única razão porque necessita de tempo, é para estar preparado para ouvir estas verdades e reconhecê-las como tal. Para isso poderemos dizer que necessita de tempo. Porém, para ouvir a mensagem de Ser quem é não necessita de tempo. O paradoxo é que há ainda muitos humanos para os quais isto é sem sentido e por isso não vêem aqui (palestra, Findhorn). Por outras palavras, eles necessitam de mais tempo. Necessitam de continuar a olhar para si próprios e necessitam de continuar frustrados na busca. Faz parte dos desígnios maiores. A frustração é construída dentro da existência humana e é para tudo isso que o mundo existe. O mundo está aí para o frustrar (risos) e tentar levá-lo cada vez mais profundamente para a identificação com a forma, porque de cada vez que se identifica com a forma é tão frustrante!! E nunca chega lá. Nunca conseguirá reunir todas as formas que pensa que precisa para ser você próprio, embora sinta que pode consegui-lo por alguns breves espaços de tempo. Pode dizer “Tudo está a funcionar na minha vida. A minha saúde está boa. As meus relacionamentos estão óptimos. Muito dinheiro, muitas posses, toda a gente gosta de mim e a dar-se bem comigo. Tudo funciona! O meu emprego, a minha situação de vida, as minhas finanças, a minha saúde, os meus relacionamentos. Maravilha!” Contudo daí a pouco tempo algo começa a ruir aqui e ali, serão as finanças ou os relacionamentos, a situação de vida... É essa a natureza do mundo da forma. Nada permanece o mesmo por muito tempo e começa a desmoronar-se outra vez. Agora que estava a correr tudo bem (risos). Por isso a experiência humana é uma série de frustrações. “Porque é que não funciona?!” Não funciona porque está a olhar para si próprio aí. Estão a exigir que o mundo das formas os faça completos.

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“Exijo que o mundo complete aquilo que eu sou, que me dê o meu sentido do eu! Eu necessito disto e daquilo e mais disto e... é tudo!” É o que eu exijo, porém não está a acontecer... Há algo de errado aqui, a vida não está a funcionar. Parece funcionar para os outros mas não para mim. Leio nas revistas sobre todas estas pessoas cheias de glamour e parece que está a resultar para elas (risos). Porém, isso acontece quando lê sobre estas pessoas nas revistas, mas se for visitá-las, verifica que não está a resultar para eles também. A vida aqui é construída para a frustração. É para ser frustrante. Há um propósito, mas as pessoas não viram isso. Assim, é um alívio reconhecer que, primeiro que tudo o mundo não me pode fazer feliz. Exigir que situações, pessoas, lugares e realizações devam completar-me ou tornar-me feliz, será sempre frustrante, caso as consigam ou caso não as consigam. “O.k. Isto parece muito negativo, não é?” (risos) É por isso que quando não aprofunda mais e fica a ver a superfície diz ”Ooh!” (desanimado). Segundo um profeta do Antigo Testamento: “Tudo é inútil, uma variedade de inutilidades, tudo é em vão. Vi tudo... (não me lembro das palavras exactas, mas vou dar uma tradução livre (risos)) vi tudo, fiz tudo e tudo é completamente sem significado.” Provavelmente terá sido um homem idoso que tentou mesmo tudo. Porque é que está na Bíblia uma afirmação tão negativa de que a vida é completamente vã, de que tudo o que poderá realizar é inútil? Colocaram-na lá, porque quando você vê a verdade contida nela já se libertou, vendo a incapacidade do mundo para o fazer feliz e vendo a natureza pouco duradoura de qualquer forma que encontre na sua vida. O que é que em si é capaz de ver esta verdade e dizer “Aahh!” (entendi) e até rir? Antes disso, era uma situação terrível e frustrante, mas Agora você saiu da sua própria estória e passou a ver que a sua estória frustrante não é o seu dilema pessoal, mas sim a da condição humana (riso do autor) e deixa que a sua interpretação do Eu derive daí. Não é nada de pessoal é a condição humana. É a condição humana no seu estado inconsciente. É um estado de não iluminação. E foi a esse eu pessoal ao qual se apegou. E agora dá um passo para fora vendo isso simplesmente. O ver significa que algo está a emergir que não faz parte dessa inconsciência. Foi por isso que colocaram aquela afirmação na Bíblia, porque quando a vê verdadeiramente, pode testemunhar em si mesmo a natureza impermanente de todas as formas. O carácter fictício da estória construída pela mente. O que é que há em si que é capaz de olhar para isso e ver verdadeiramente? Não é o pensamento, é a habilidade de estar ciente, de segurar o espelho da testemunha e simplesmente ver. Ou melhor dizendo, a luz da consciência brilha através disso. Ela vê o que anteriormente vos encurralava: a estória frustrante da minha vida. Contudo não há vida frustrante. Ela perde a frustração quando não olha mais para o mundo visando a sua satisfação, buscando algo para si. Quando desiste de exigir que as pessoas e situações o tornem feliz, o preencham, subitamente a habilidade de ver surge permitindo que as formas sejam tal como são, porque a vida neste momento, já e sempre, é como é. É a simplicidade da qual não pode duvidar, quaisquer que sejam as formas que apareçam no momento presente, sempre é como é. A maioria dos humanos está em constante conflito com a simplicidade da vida. Internamente fogem dela, rejeitam-na, criticam-na, queixam-se dela ou olham para outro lado. “Não quero a simplicidade disto, quero antes aquilo”. Quando descobre o que o mundo não pode fazer por si, deixa a exigência de parte, uma vez que é absurdo exigir algo do mundo que ele não pode dar. Apenas pode ser com o que é. O “é” e este momento são inseparáveis, claro! Tudo o que é, neste momento, é como é.

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Se vieram para cá com a exigência de que Findhorn os torne felizes provavelmente experienciaram frustração. Nenhum lugar é capaz de fazê-lo sozinho! Ou até fazê-lo de todo. Vêm para cá e dizem “Oh! Isto não deveria estar aqui! Há uma base aérea Real mesmo na vizinhança deste centro espiritual. Não faz sentido!” (risos) Queixa-se dizendo “Vim procurar paz e afinal encontro “gritantes” aviões a jacto. Vou para casa!” E isto é apenas uma coisa e encontrará muitas mais. “O meu companheiro ressona. Tenho de esperar para ir à casa de banho. Não há Sol, estamos em finais de Maio! Não deveria ter vindo para a Escócia, os escoceses são...” (risos) São pequenos exemplos. Se espera que eles o preencham não é possível, mesmo que estivesse numa ilha do Pacífico, haveria sempre alguma coisa que não estaria muito bem, fosse o que fosse. “O Sol, todos os dias, é demasiado forte! Os mosquitos incomodam toda a noite, as brochuras das agências de viagem não mencionavam isso.” Aqui está uma oportunidade para abandonar a exigência de que um sítio determinado deveria fazê-lo feliz ou dar-lhe paz ou fazê-lo encontrar-se a si próprio. Dê simplesmente um “sim” a qualquer forma que este momento lhe proporcione. Em vez de exigir que a forma deste momento deva ser diferente para o satisfazer, traga um alinhamento interno na sua relação com o momento presente de maneira a que se relacione com a vida, que é sempre no Agora. A forma como se relaciona com a vida, que é sempre Agora, apenas Agora, faz com que surja um alinhamento interior com o Agora. Assim, internamente não se separa do Agora, que é a vida - a vida e o Agora são um – de outra maneira ela é uma fonte de grande frustração e de sofrimento. Aceite qualquer que seja a forma que este momento tenha, um avião a jacto que passa, está a chover, depois algum Sol aparece por entre as nuvens, coisas que a mente poderá chamar boas ou más, porém não passam de coisas que são como são neste momento. Uma enorme liberdade surge na sua vida quando abandona a exigência de que isto deveria ser diferente do que é. Não mais irá exigir que as coisas o tornem feliz ou lhe dêem felicidade. Cada momento é como é, um passo de cada vez para qualquer lado que vá, olha em volta, fica de pé, senta-se, pessoas que vêem, outras que partem, coisas aqui, coisas acolá. Subitamente, ao alinhar-se com o Agora, algo emerge dentro de si que não tem nada a ver com a forma que este momento toma. Emerge porque permite a forma, que este momento toma, de ser tal qual é. Ao permitir internamente a forma que este momento toma, abraçando-o, dizendo “É melhor dizer sim, porque é a vida, porque é o único momento que existe. O Agora. É melhor aceitá-lo como é.” Não reduz a sua habilidade de mudá-lo se algo precisa de ser mudado. A acção surge fora do alinhamento com o que é. Pode estar alinhado com algo que não está bem, por exemplo, a sua refeição está fria e leva-a de volta à cozinha dizendo “Esta comida está fria e precisa de ser aquecida outra vez, se possível.” Não há nada de errado nisto. A acção vem fora do alinhamento. Por outro lado, a mesma acção poderá sair da resistência do que é e imediatamente o eu começa a queixar-se e é respondido pelo mesmo eu que se queixa. Aqui é a mesma acção, mas com um fundamento de energia diferente e por isso vai à cozinha dizendo “Que é isto? Não aquecem a comida aqui? Deveriam...” Esta acção já é para se engrandecer a si próprio. Tornar o eu correcto, fortalecer o meu eu. E fá-lo a outro humano e o outro humano defende-se e tenta reagir para resistir à diminuição do seu eu. É o que o ego tenta fazer. Se diz “Estás errado!” tenta reduzir o eu da outra pessoa, o outro defende-se, fica com uma maior agressividade e grita-lhe de volta tentando defender a diminuição do seu eu, que não passa de uma ficção.

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Que mundo! (risos) Quando vive em alinhamento com o que é, a inteligência emerge na sua vida que é muito maior do que o conhecimento acumulado da mente ou da habilidade da mente de analisar ou resolver problemas de QI ou quebra-cabeças de palavras cruzadas, pois não são mais do que pequenas formas de inteligência. Não têm nada de mal, contudo são pequenas. É isto que o mundo chama de inteligência, memorizar, analisar, ser rápido nas respostas, manipular pensamentos, manter o maior número de pensamentos na cabeça. (risos com a gesticulação do autor) Todavia, há uma inteligência muito mais profunda da qual a nossa civilização nada sabe. É daqui que a verdadeira criação nasce, a criatividade emerge. Isto é acessado quando traz um sim - não mais do que isso - ao presente momento. A propósito, isso inclui o passado. Há pessoas que transportam uma grande angustia ou um grande ressentimento ligado a algo que aconteceu no passado, causado por alguém ou por outros factores. Como é que isso funciona quando eu digo para aceitar o momento presente? O momento presente da forma como é agora inclui aceitar o passado. Essa aceitação é aplicada apenas porque acredita que algo que lhe aconteceu está a interferir, de algum modo, com a habilidade de estar vivo ou de ser totalmente você próprio neste momento. Poderão dizer, tudo bem, mas talvez tenham perdido um membro do seu corpo. Alguém o cortou há dez anos e carrega consigo sofrimento. Como pode aceitar o momento presente com o que lhe aconteceu no passado? Um membro falta e isso é como é, é essa a forma que este momento lhe traz. Bem, quando aceita que isto é como é, não terá a referência do passado que lhe causou isso. É claro que no nível da forma é uma incapacidade, impede-o de ganhar a taça em Wimbledon este ano. No nível da forma isto impõe algumas limitações na sua vida. Porém o mundo está repleto de limitações que são inerentes à forma. Se não encontra um conjunto de limitações encontrará outro conjunto de limitações. Nunca deixará de haver alguns momentos que não tragam determinadas limitações. Mesmo o ruído que vem ocasionalmente da base aérea aqui vizinha, poderá ser considerada uma espécie de limitação. Ou não ter dormido porque o seu companheiro de quarto ressonou é também uma limitação, embora considere que é relativamente menor na sua vida. Todas as limitações, grandes ou pequenas, têm a ver unicamente com o nível da forma. Este é o nível da forma. Poderá mudar algumas limitações, melhorar a sua vida no nível da forma, o que não está errado, desde que não se identifique com isso. É lindo brincar com as formas na sua vida, “Muito bem, vou ganhar muito dinheiro!” se não pensar que só quando o concretizar é que vai ser alguém. Se não é alguém já no Agora, não irá sê-lo através do dinheiro, ou do futuro. Pode brincar com o mundo da forma, e o milagre é que quando abandona as exigências no mundo da forma que o deveriam fazer feliz, encontrar-se-á, seja qual for a situação, pessoa ou lugar, perfeitamente satisfeito, porque tocou em algo dentro de si que é mais profundo do que o pensamento, mais profundo do que a forma. Então o gesto simples de dizer internamente “sim” a este momento é tudo? É. Contudo, para poder fazê-lo requer um certo grau de Presença. É estar apto para dizer que ele é como é em vez de querer ser controlado pelo padrão reactivo antigo que tem a ver com o eu fictício que afirma que essa situação não se encaixa na estória do eu. “Isto não completa a minha estória. Deveria estar fora da minha estória. Sai daí!” (risos) Algumas pessoas, que são estórias ambulantes, não querem encontrar outras estórias ambulantes e dizem “Sai da minha estória! Não devias estar aqui. Quero outra pessoa aqui.” Quando uma vez mais, passa para além do movimento do pensamento, a serenidade e a paz emergem no momento em que se torna amigo do que o Agora é. É tudo. Ficar

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amigo do que é. Não interessando a forma que este momento tome. Ele vai mudar de qualquer maneira, daqui a pouco. As pessoas que estão prisioneiras do seu eu, durante anos, têm uma resistência na cabeça que as está sempre a colocar na mesma situação e o padrão de resistência diz “Quero sair deste lugar horrível onde me encontro!”. Vão todos os dias ao escritório, sentindo permanentemente a mesma resistência, a mesma energia negativa e quando atendem o telefone dizem (mal humorados) “Sim!!?” (risos). Por isso há os tradicionais empregados do estado descarregando a frustração no público. Não sei se é em toda a parte, provavelmente é. Estas pessoas pensam “Porque é que estou aprisionado a este aborrecido trabalho!! Com todas estas pessoas horríveis que querem algo de mim!”. Vinte e cinco anos depois continuam aprisionados nas mesmas lamentações. Então ouvem a mensagem de que é possível viver de maneira diferente. É possível dizer sim. Não o sim a uma estória, não ao facto de dizer “O.k., posso ter passado 25 anos neste escritório medonho e vou passar mais 10 anos neste escritório medonho, mas é melhor dizer sim porque li isso num livro algures.” (risos). Portanto, não é dizer sim a uma estória qualquer na sua vida. Como, por exemplo, está na prisão e diz “O.k., tenho de aceitar que tudo é destino na minha vida. Estive aqui 20 anos e vou continuar mais 50. É melhor aceitar que sou um falhado miserável.” É dizer sim, aceitar apenas o momento presente e não uma estória. Quer dizer que o leva para fora da estória. É vital na sua vida espiritual agora, na sua prática espiritual, tanto quanto possível, quebrar a continuidade entre o passado e o futuro. “Venho de lá e vou para ali... estou muito atarefado a chegar lá... quero terminar isto depressa... vou no meu caminho para lá, não me interrompam.” (risos). Então quanto a este momento? Onde está neste momento? “Neste momento estou... aqui... não, ali... não, acolá... (risos) Ooh! Ah!” De repente acorda desta corrente de passado-futuro, deste sempre velho e igual condicionamento, sempre o mesmo, sempre o mesmo, por mais que se queixe é sempre o mesmo, sempre o mesmo e quanto mais se queixa, mais se aprisiona. Ao retirar o momento presente para fora da estória, acorda e de repente uma luz surge. Poderá ser, por exemplo, ao caminhar, ouvir um pássaro a cantar e reparar com é bonito. Sente-se respirar, sente vida no seu corpo, todas as células estão vivas, a vida que você é, as quais animam o seu corpo. Á medida que sente esta Vida, começa a ficar atento à serenidade à sua volta e também presta atenção a esse “ invólucro” donde parte esse som incrivelmente bonito que este serzinho (pássaro) produz, que é a celebração da vida a todo o momento... Você saiu da estória para dentro da vida do momento presente... Contudo, poderá continuar a lidar com as coisas, poderá continuar a andar para o lugar que pretende e quando chega lá encontra-se com outro ser humano e pode continuar a estar Presente. Há cada vez mais Presença em vez de tempo. É a reversão do que era antes, onde estava dominado pelo tempo. Ainda está a usar o tempo, mas permite que a Presença entre. Por isso quebre a estória o maior número de vezes que puder e entre na vida do momento presente. Aí, uma inteligência mais poderosa, o riso, a alegria, tudo o que só conseguia imaginar sem experienciar, tudo isso vem subitamente e transformam-no não só a si, mas também à sua própria estória! Isso não quer dizer que as estórias venham a ser continuamente maravilhosas, pois no nível da forma nada é permanente, tudo vai e vem, mas porque já não está dependente das formas da sua vida, das circunstâncias da sua vida, tem acesso à Vida que está para além da forma. Porém é você mesmo, a serenidade, a Vida, o Eu Sou que é mais profundo do que eu sou isto ou aquilo. Toda a beleza, a vivacidade e a alegria, mesmo que as formas se desmoronem, estão lá.

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Estaria a perder, ao divagar continuamente na sua mente e não ouvir sequer o pássaro, ou ouvi-lo-ia, por segundos, e depois voltaria “O.k., os meus problemas... Quais são os meus problemas?...” (risos). Sempre que pensa que tem problemas a melhor pergunta é “Qual é o problema Agora?”. “Bem, ã... estou ... estou a tentar ver o meu advogado sobre a minha falência. Necessito de ver o meu advogado.” “Qual é o problema, Agora!?” “Agora?... ã... mm... (risos com a mímica do autor) Não há problema. Estou sentado aqui, respirando, ouvindo um canto bonito de um pássaro. Serenidade... Espaço... A vivacidade que sinto dentro de mim. Todas as células estão vivas. Realmente, não há nenhum problema Agora... Mas talvez haja um amanhã!” (risos). E claro, quando o amanhã chegar terá de fazer a mesma pergunta. O advogado diz-lhe: “Assine aqui, por favor. Vai declarar falência!” (risos com a entoação do autor) “Qual é o problema Agora?” Aqui está um pedaço de papel e uma caneta rabiscando no papel... shkshkshk... pousa a caneta, ouve o pássaro, vê a árvore, a flor, olha para dentro de si e diz “Ainda estou vivo!” Assim, a ideia de falência não lhe dará mais o sentido do eu, porque o significado do eu vem da vida que você é, da vivacidade do seu Ser e “O.k. no nível da forma tive de declarar falência, mas continuo a respirar e o pássaro está a cantar. Milhares de pessoas antes de mim sobreviveram a esta situação.” É só um exemplo. Outro exemplo mais extremo foi experienciado por uma amiga minha, uma professora espiritual, que estava a visitar uma senhora no hospital com um cancro avançado, quando chegou ao quarto da doente que apresentava um estado de muita infelicidade disse-lhe “Eu não vejo o problema.” A mulher, ainda mais infeliz, respondeu “Não vê o problema? Eu mostro-lho!” retirou os cobertores e mostrou uma das pernas inchada ao ponto de parecer 2 ou 3 vezes mais larga do que a outra. “Isto é o problema!”. A minha amiga respondeu “Oh! Então o seu problema é por pensar que a sua perna direita deveria ter o mesmo tamanho da sua perna esquerda?”. Nesse momento a doente desatou a rir. Ela dissociou-se do pensamento-forma. Saiu do pensamento que estava a julgar esta forma como errada, aquele pensamento, anteriormente investido no sentido do eu, que a mantinha aprisionada no que não deveria ser. É vital sair da estória, a qual tem um momento onde irá re-acertar-se a si própria, uma e outra vez. Assim é o momento da mente. Não estou a afirmar que deixem de conviver e gerir as coisas no vosso dia a dia. Vão lidar com elas de modo mais eficaz quando têm acesso à dimensão mais profunda aonde a verdadeira inteligência reside. Ela irá fluir para as coisas com as quais estarão a lidar no nível da forma. A sua estória irá desenrolar-se muito mais harmoniosamente uma vez que já não exige que ela o faça feliz ou algo mais por si. A necessidade desapareceu, porque já não procura que ela lhe dê o seu sentido do eu, aquilo que é vem da sua Vida e profundeza do seu Ser, neste momento. Então sair da estória e entrar no Agora sempre que possa é vital. “OK. Onde é que está o Agora, neste momento?” Especialmente quando está aborrecido perde-se em movimentos do pensamento e pode ajudar outros se fizer um acordo com o seu companheiro ou amigo estabelecendo que quando um de vocês se perder em pensamentos, o outro lhe dê o alerta. Não está a resolver os problemas no movimento dos pensamentos, está a criá-los ao pensar. A verdade vem sempre que sai do pensamento e fica quieto, presente e vivo. Quando o pensamento voltar, muitas vezes um pouco mais tarde, virá um rasgo de intuição

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(insight) que antes não estava lá. Veio porque essa dimensão funcionou na sua vida, e terá cada vez mais essa possibilidade. Tudo muda nos relacionamentos, dado que não exige que outra pessoa faça alguma coisa por si. Não engrandece o seu sentido do eu com ela. Não compara o seu eu às outras pessoas tentando ser “mais do que”, para fortalecer o seu sentido do eu. Permite que os outros sejam como são e não precisa de mudá-los “Se ele/ela se comportarem de maneira diferente serei feliz...” Se ele/ela se comportar de modo diferente serei feliz, mas entretanto vou ser muito infeliz! E vou mostrar que estou muito infeliz. (risos) para te comportares de outra maneira. Só assim ficarei feliz!” Muitas relações funcionam desta maneira. Os parceiros mostram-se muito infelizes para conseguirem que os outros mudem e claro que pela infelicidade deles fortalecem o mesmo padrão, que se repetirá. Especialmente neste maravilhoso sítio, não poluam o jardim de Findhorn sendo uma estória ambulante que é pesada. Os vosso passos ficam pesados. E aonde uma estória ambulante pisa, não nasce mais erva. (risos) A humanidade tem actualmente no planeta um grande peso. Desceu sobre a Terra e chama-se “mente colectiva”. Esta acumulou uma enorme quantidade de negatividade e uma terrível ilusão. É essa carga que pesa também sobre a natureza. Todas as formas de vida sentem essa dor. Então, aqui, pisem levemente, não carreguem o peso do vosso eu com vocês, que é o vosso passado e o vosso futuro problemático. Sejam por isso leves, dando um passo de cada vez, sendo a Presença na qual percepcionam. Estejam lá, em cada passo, para quando percepcionarem a árvore, a flor, consigam fazê-lo com o plano de fundo da serenidade. Não criem uma barreira de conceitos entre vocês e a natureza. A unidade emerge, um campo uno, entre a natureza e você. Assim, a natureza será muito cooperativa em ensiná-lo a ser uno com a vida, a ser sereno. Observe qualquer árvore e veja como é serena. No momento em que sentiu o quanto a árvore é serena, viva e entregue à vida, reparou também naquela parte sua que percebeu isso. E essa parte dentro de si foi a serenidade. Senão não conseguiria ver a serenidade lá na árvore. Se se projectasse apenas com o pensamento, teria algo de pessoal a fazer com a natureza. “Esta árvore ficaria muito bem no meu jardim!” Não se sinta culpado se essa forma atravessou o seu pensamento (risos). Ou ainda pior, se quisesse apanhar uma flor – não o faça aqui (risos) – “Tenho de ter isto! É minha agora!” Mesmo nesse nível o eu pessoal pode aparecer. “Esta árvore é igualzinha à da minha tia Maria! (autor baixando cada vez mais de volume) Ela tem-na no jardim.... Será que ainda está lá?... Mnham,mnham... Que pássaros e pessoas estranhas passam por lá...” (risos) Para estar verdadeiramente presente, é como um campo de alerta presente passeando. Talvez aconteça que em adição à beleza que vê aí, prestando atenção à arvore, à flor e por um momento ser com ela, não querendo nada, apenas estar, Ser com a natureza, consiga reparar no plano de fundo, a Presença que você é. A luz da consciência com a qual esta árvore aparece. A Presença, a serenidade que é, como um plano de fundo daquilo que percepciona. O canto dos pássaros, árvores, flores, diferentes sons da natureza. Aparece a forma e há o espaço que permite à forma aparecer, é o espaço que você mesmo é, o espaço do Agora, o espaço da consciência. A consciência una, a luz da consciência na qual a forma surge. Aqui, sentados, poderão sentir que em segundo plano há esta sala, esta voz, as formas e as cores e em primeiro plano, aquilo que torna tudo isto possível existir, o Ser o que é antes de ser alguma coisa, é a Vida única, a consciência única que você é sob a forma. Poderíamos dizer que você existe em duas dimensões, não forma e forma.

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Pratiquem essa experiência na natureza. A natureza não é um desafio, pois podemos estar presentes facilmente com a árvore ou com a flor. Os seres humanos, esses sim, são mais um desafio, porque eles empurram-no outra vez para a identificação com a forma, o pensamento, a acção. Este desafio deve-se ao facto de a maioria dos humanos ser pensamento. São entidades de pensamento e querem que você contribua para o universo deles “Dê-me mais pensamento, confirme que a minha estória é importante e assim pode contar-me a sua, vou fazer o mesmo por si.” (risos). Aqui à noite, na cama, quando se deita poderá sentir a sua mente a querer arrastá-lo uma vez mais para pensar “Muito bem. Tenho mais um ou dois dias, ou o que for, para pensar sobre as coisas que tenho de fazer quando chegar a casa. Pois, eu vou ter de... blá, blá...” (risos) De repente lembra-se “Ah! O Agora. É tudo o que existe, este momento. Onde está?”. É claro que não pode vê-lo, porém acontece às vezes que as suas percepções acordam, sente a Vida no seu corpo. Pode ficar deitado na sua cama sentindo a Vida em si, que permeia o seu corpo de um modo muito subtil. Assim, não terá de pensar tanto, os seus pensamentos abrandarão, apenas Será um sentimento de uma Presença alerta. Talvez possa ouvir alguns sons que provêm da natureza. E se por acaso for o companheiro do seu quarto a ressonar, está bem também. É o que é. Continue Sendo. Se tiver de se mudar de quarto, ou se tiver de atirar-lhe alguma coisa (risos) também está bem. A habilidade de entrar em acção não fica diminuída quando se rende. Somente significa que está rendido àquilo que é. Posso tentar ver se ele acorda ao atirar-lhe algo. Continua a ressonar, tudo bem (risos). Vê que antes o que lhe criava frustração, aborrecimento, raiva, coisas que acontecem frequentemente na vida das pessoas, agora fazem simplesmente parte da actividade do momento presente. Cria, assim, um espaço à sua volta. Aceita. Isto é a base do Presente. Digamos que começa a conhecer-se como o espaço à volta das coisas. Já não é a coisa em si, mas o espaço que permite que a coisa aconteça e depois desapareça para surgir outra em sua substituição. Isto é o Agora. O significado profundo do Agora é o espaço no qual tudo acontece. É assim que o Agora e você são a mesma coisa. E o poder do Agora força o poder da Vida, do Ser que você próprio é. Quando digo você próprio é claro que não quero dizer aquele eu fictício, da estória ou do pensamento que se baseia na forma, mas o Ser profundo que você é. Em última instância, trata-se da liberdade no mundo, pois ele tornar-se-á um lugar muito aprazível para si, deixando de ser frustrante a partir de agora. As coisas continuam a acontecer, dor e perdas, a morte continua a suceder e é o que é. Há uma paz subjacente e essa paz é inseparável de quem você é. .... (autor fechou os olhos por momentos incitando a uma pausa) Vamos todos praticar, este fim de semana, da única forma na qual podemos viver a nossa vida. Que por sinal não é a nossa vida, é simplesmente a Vida vivendo-nos a nós. A Vida a viver através de nós. Não temos uma vida, porque não há o eu e a vida. Não é possível. Nós somos a Vida. A única Vida na qual muitas formas nascem e morrem continuamente. A única consciência, a única Vida. Assim, a Vida pode viver livremente através de si e pode florescer. Esse florescimento poderá também tomar uma forma como a criação ou permanecer apenas como uma emanação que vem através dessa forma. A essa emanação poderemos chamar Amor. Não me refiro ao amor do ego, que diz “Quero-te, ficas aqui. Necessito de ti. Desejo-te” ou melhor “Faz-me feliz. Assina aqui, nesta linha!” (risos), mas o verdadeiro Amor, aquele que é o reconhecimento da unidade como uma emanação. Isso é o florescimento. ... .... (autor fechou os olhos por momentos incitando a uma pausa)

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Sugiro que permaneçam um pouco mais, fiquem com a serenidade que está aqui... o campo sagrado... o espaço sagrado... até sentirem que é altura de se moverem. Obrigado. “O amor é o reconhecimento da não forma no outro” Eckhart Tolle

VOLUME II (Ouvem-se os pássaros a cantar no jardim, no exterior) Certamente serão os pássaros muito melhor professores do que eu (risos). Com certeza estavam errados quando afirmaram que S. Francisco dava as suas prelecções aos pássaros... É claro que era ele quem ouvia os pássaros, pois eles não precisavam de lições (risos.) Um som tão divino, e que extraordinário equilíbrio entre a serenidade e o som... ... Este pássaro sabe sobre equilíbrio. Há periodicamente um intervalo longo e depois o novo som vem da serenidade sendo sempre fresco e novo, nunca é uma repetição do último som. Por isso é tão espantoso. ... Isto que o rodeia seria o suficiente para ser o seu professor. De que é que precisa mais? O pássaro ensina o equilíbrio entre a forma e a não forma, que é a arte de viver. Viver nas duas dimensões. Som e serenidade. Forma e não forma. Coisas e não “coisidade” (thingness). Neste ensinamento (o do autor), a dimensão de quietude da não forma é enfatizado, porque a nossa civilização perdeu-se na forma, nos pensamentos. Toda a civilização está perdida nesta dimensão das coisas, o que inclui o pensamento. É essa a razão pela qual há uma ênfase, neste ensinamento, sobre o que está a faltar. O equilíbrio tem de se re-estabelecer outra vez pois nenhuma civilização poderá sobreviver entre a forma e a não forma. Como toda a gente já tem forma que chegue, é por isso que este ensinamento não é baseado em novos conhecimentos ou factos novos, interessantemente novos, ou nova in(dentro de)formação (risos). O mundo está repleto disso, pode manusear os diversos botões dos seus inúmeros aparelhos e obter in(dentro de)formação. Está afogado em informação até que repara finalmente “Para que é que isso serve?” Mais disso irá salvar o mundo? Mais informação ou mais coisas? Iremos encontrar a plenitude da vida com mais coisas? Construir centros comerciais cada vez maiores? A forma outra vez.

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Ou vamos encontrar a nossa habilidade em pensar e analisar e resolver analiticamente os problemas que criamos pelo excesso de pensamento que tivemos previamente? (risos) Conforme Karl Yung afirmou: “Não poderá resolver um problema no mesmo nível da consciência com que o criou”. Assim, o que criou o problema na nossa civilização foi o facto dos humanos terem perdido o contacto com a dimensão da não forma, ou como poderemos chamar-lhe o espírito ou o sagrado ou, caso ainda não esteja tão em desuso para si, Deus – porém, não irei chamar-lhe isso (autor sorri). Segundo Jesus “O que poderás ganhar se te perdes a ti próprio, à tua alma?” Ele já via a tendência do mundo, para onde este estava a caminhar. A forma também inclui tempo, consequentemente, não podemos negar que o tempo é, ou parece ser, mais real na superfície da vida porque está em todo o lado. No que diz respeito às formas, o tempo parece fazer-lhes qualquer coisa. É estranho, visto que gradualmente tritura as formas, vai arredondando-as, faz-lhes algo. Podemos ver o tempo como uma terrível doença que é infligida a todos. Sofremos, sem excepção, de uma doença letal. O que virá é o final da forma, é só uma questão de “Quando?”. Por isso nós a vemos, como o meu pai que agora tem 87 anos diz, “Os espelhos já não têm a mesma qualidade que tinham anteriormente!” (risos). Assim, a arte é: vivermos neste mundo onde o tempo parece estar, por um lado, em toda a parte controlando tudo e, por outro, em oposição, ser reconhecido como uma ilusão, visto que se olharmos mais profundamente verificamos que não existe, apenas há este momento. Esse é o portal para a dimensão da não forma. A porta estreita, de que Jesus falava e que conduz à Vida. É muito estreita e para a encontrar - Jesus dizia “Poucos a encontrarão” – precisam de desenrolar o rolo da vossa vida na qual a vossa estória está escrita,...o passado e... o futuro, muito pouco claro não conseguindo ver o que é. As pessoas caminham levando uma carga, mais pesada para umas do que para outras. Transportam o peso do passado, eu e a minha estória, esperando ou temendo dependendo para onde vou - esperança ou medo – caminhando com o eu baseado no eu-forma-pensamento-tempo. Há um peso aqui, à medida que caminha no tempo, do passado para o futuro, pensando nele, falando dele, referindo-se a ele como o seu sentido do eu, dando-lhe no passado uma identidade de si mesmo ou, no futuro, esperando encontrar-se a si mesmo. Fica, então, perdido na forma, porque tudo isto são pensamentos-forma. O tempo e a forma vão juntos. Necessita de enrolar o rolo... Sabe como é? Aqueles rolos antigos que apareceram antes do livros... Shesheshseeee... (mímica de desenrolar e enrolar um rolo para ambos os lados - risos). Há uma linda estória sobre a visão da autora do “Curso em Milagres” antes de ter recebido o “ditado” para escrever este curso. Na sua visão ela encontrou um rolo de pergaminho numa caixa velha. Era antigo e logo que ela começou a desenrolá-lo para ambos os lados, reparou nuns símbolos escritos do lado esquerdo e outros do lado direito. Uma voz disse-lhe: “Se leres o que está no lado esquerdo, conhecerás o passado, se leres o que está no lado direito, conhecerás o futuro.” Ela olhou para ambos os lados e depois enrolou, outra vez, o pergaminho até ao início onde, no centro do rolo, estava escrito: “Deus é”. Ela afirmou: “É tudo o que me interessa. Não quero mais nada”. A Voz respondeu: “Parabéns! Conseguiste, desta vez”. O ponto de focagem dela tornou-se no momento presente. Se ela não se tivesse concentrado no momento presente, a “estreiteza” que era necessária para a sabedoria atravessa-la e sair da não forma, à qual foi depois dada forma pela mente, não existiria. Esse espaço/intervalo não estaria lá se ela dissesse “Que interessante! Vou espreitar o futuro.” e anos depois estaria ainda a ver o futuro. “O passado também é muito interessante...” (risos) Deus é a facilidade do Agora e só isso.

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Podem usar esta imagem para a vossa vida. Sempre que possam, procurem estar interessados no centro do rolo, o presente. É aquilo a que chamamos sair da corrente, a continuidade entre o passado e o futuro, quebrar sistematicamente isso, criar espaço como se tivesse uns véus que reconhecesse serem a sua vida e os afastasse para poder espreitar e colocar a sua cabeça noutra dimensão, como vemos nos filmes... (mímica do autor - risos). É o despertar no Agora. Com isto, somos humanos em transição neste nível de evolução da humanidade. Muitos humanos actualmente são humanos transitórios. São disfuncionais com as manifestações da velha consciência, uma vez que ela é totalmente identificada com a mente, forma e tempo. Tendo governado a humanidade durante milhares de anos está a chegar ao fim, não poderá sobreviver muito mais. Desta forma, todo o ser humano transporta essa velha consciência dentro de si ainda. Muitos seres humanos aqui presentes nesta sala e muitos mais estão na fase de transição, isto significa que ainda têm momentos da velha consciência enquanto a nova está a emergir. Eu chamo-lhe nova, porém é intemporal não é nova em tempo, digamos que vi o nome numa loja moderna de artigos usados que dizia “Nova para si” (risos). Realmente, não há palavras que consigam expressar correctamente a verdade. Têm de estar cientes para o facto de que a linguagem nunca está certa, especialmente quando começamos a falar da verdade espiritual, a não forma, porque cada palavra é forma e só funciona se exprimir algo que está ao nível da forma, tornando-se inútil quando queremos expressar algo que está para além dela. Por isso Jesus usava parábolas, ele nunca disse: “Isto é o Reino dos Céus!”, ele dizia “O Reino dos Céus é como... ou um pouco como ... etc.” e contava-nos estóriazinhas. Desde que não fique enredado na forma das palavras afirmando que “É assim!”, permitindo que as palavras apontem como postes de sinalização, poderá resultar. Todavia, se disser “Esta é que é a verdade!”. Não é. A verdade nunca está na palavra. E é especial em “desfazer” a espiritualidade. A verdade é para onde a palavra aponta. Ela está para além da palavra. Aprendemos assim a trazer o equilíbrio às nossas vidas, entre o tempo e o intemporal, e não só a gerir isso no mundo das coisas, nas situações, com os objectos, como também a evitar perdermo-nos nas coisas, isto é, no mundo. Este mundo não é só o externo, mas também o interno que carrega na sua mente, o mundo construído pela mente. Uma vez que este último (o da mente) cria o primeiro (o externo). O mundo feito pelos humanos, o chamado mundo externo, e o estado interior de consciência são, claro, a continuação um do outro. O exterior reflecte o interior. Assim, no nível externo temos uma civilização que é extraordinariamente ruidosa. Se alguém voltasse do passado, à cerca de 2.000 anos atrás, chegaria actualmente a uma cidade, ou mesmo a uma pequena cidade e diria “O que se passa com este ruído ensurdecedor que há por todo o lado? Estas máquinas fazem tanto barulho!” Mesmo que não haja essas máquinas as pessoas fazem ruídos “pelo bem do ruído”! Muita da música que ouvimos nos restaurante, não sei aqui, mas na América do Norte é tocada em alto volume. É assim em quase todos os restaurantes. Abre a porta, põe a cabeça dentro e volta a sair outra vez. Tudo isso é com o propósito de fazer barulho, ao qual chamamos música. (risos). Há excepções, claro, alguma música tem um efeito divino, é aquela música que vem da quietude. Ao ouvir música que foi gerada na serenidade, seja qual for o compositor, tocada ou cantada, percebe que ela veio desse estado de consciência que assumiu uma forma. Por isso é fresca e nova, onde a serenidade está acoplada como uma fragrância, ainda emana isso, mesmo que seja na forma de som. É essa a beleza de toda a arte, porque reflecte esse estado interior de consciência. Existe muita pseudo-arte neste mundo onde as mentes espertas tentam ser ainda mais espertas, pensando em algo novo, “O que podemos fazer mais aqui? Vamos ver, talvez isto poderia ir aqui ou ali... Isto é ser inteligente!” É a chamada arte, mas falta algo, porque está totalmente encurralada na forma, apenas manipulando formas velhas. Não trouxe nada de novo, nem nada que o levasse à não forma que é a razão original para toda a

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arte. É o sagrado. Ser um portal, um acesso para o sagrado. Quando a vê ou a experiencia, experiencia-se a si próprio. Nela vê-se a si próprio reflectido. A não forma reflectida, ou melhor, brilhando através da forma. Essa é a verdadeira arte. Tem sempre mais do que pode ver ou ouvir e isso brilha através da forma. É o que pode acontecer-lhe, ou antes, é o está a acontecer a si, neste momento. Não é o propósito de toda a gente criar obras de arte. Alguns fazem-no, porém o mais importante, de longe, é que todos se tornem uma peça de arte. Toda a vida e o seu próprio ser ficam transparentes para que a não forma possa atravessar e brilhar. É o que acontece quando já não está totalmente identificado com o mundo da forma. Isso tem lugar quando tem acesso ao reino de serenidade dentro de si próprio. Algo emana da forma que não tem nada a ver com a forma. Pode ser uma emanação silenciosa e não assumir nenhuma forma, como as pessoas iluminadas que existiram no passado, por exemplo, na Índia. Cada geração teve sempre alguns iluminados, homens ou mulheres, que nunca fizeram nada. O que é muito raro acontecer como as outras pessoas. “O que é que eles criaram? O que fizeram?” e eles não fizeram nada, apenas ficaram para lá sentados (risos). O Ocidente pensa “Que existência inútil! Vamos lá, tenha um emprego! Trabalhe!” Quando está apanhado na forma falta-lhe completamente o entendimento, pois tudo o que vê são formas inúteis, para ali sentadas. “Eles são parasitas na sociedade! Permitem-se ser alimentados pelos outros. Trazem-lhes a comida! Deviam estar a trabalhar pela sobrevivência. Tal como eu!”(risos). É quando a mente, que não sabe nada para além da forma, olha para a forma e não entende nada. O belo é que na Índia reconhecem sempre isso, porque eles ainda não perderam completamente o contacto, de facto eles podem ter ido demasiadamente longe na direcção oposta, pois perderam o interesse na forma, dirigiram-se só para o Ser. Actualmente a Índia tem vindo a ficar ocidentalizada, quanto mais lê sobre este país verifica que eles já estão na era do computador, etc. Está tudo bem também. A questão está, aonde encontrar um equilíbrio? Eu perdi-me completamente, tal como a maioria, na forma e então aconteceu uma mudança. Afastei-me na direcção oposta do alinhamento/equilíbrio voltando a perder-me outra vez completamente, mas na não forma. É claro, que não podemos perder-nos na não forma, é apenas uma forma de colocar isso, pois a não forma é essencialmente quem você é e contudo numa perspectiva mais inferior (na da mente), pareceu como se eu tivesse perdido a cabeça (risos). Eu era alguém que tinha uma carreira promissora e que passou a sentar-se nos bancos de jardim, não fazendo nada mais, apenas Sendo e saboreando continuamente o sentimento de Ser, a beleza, a doçura de estar Vivo. A alegria de apenas Ser, olhando o mundo e vendo-o reflectido em todas as formas de vida que por sua vez reflectem a alegria do Ser. As árvores, os pássaros, e mesmo os Humanos atarefados correndo como loucos, mas eu sabia que dentro deles estava também o mesmo, Ser. Da perspectiva externa a habilidade de gerir as formas, de manipular o mundo da forma desapareceu por algum tempo, tendo gradualmente se re-estabelecido. A partir daqui passei a estar apto a fazer e a Ser ao mesmo tempo. Este não é o destino de cada um de vocês, o mudar completamente para o Ser e ficar incapaz de movimentar-se no mundo da forma que o rodeia. Acontece ocasionalmente, mas não para a maioria, as pessoas que tiveram uma mudança traumática de um nível para outro, como eu, parecem, por algum tempo, terem “enlouquecido”. Aqui cito o sutra (aforismo) lindíssimo de Buda: “Foi, foi, foi para a costa mais longínqua...” shshshsh (afastou-se) e shummmm (encontrou-se). Parece que é o nosso destino aqui (planeta), enquanto forma balancear/equilibrar com a não forma, por isso estamos aqui. A maioria de vocês está na transição para um novo estado de consciência... Qual é o novo estado de consciência que está a emergir? É o estado que está equilibrado entre

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as duas dimensões, o manifestado e o não manifestado. Este é o equilíbrio num ser humano. Esta transformação é tão radical, que alguns humanos vivem dessa maneira tornando-se numa obra de arte, transparente para a não forma, o divino. Isto irá mudar o mundo inteiro, aquilo que experiencia como o mundo construído pela mente mudará completamente. Não necessitamos de especular, como o mundo irá ficar quando o número suficiente de humanos estiver na nova consciência, não é importante por agora. O que é importante é que cada um de nós entre nesse novo estado de consciência. Em consequência disso não sabemos o que fará à sua estória, como irá mudar a estória que se desenrola no tempo, o que irá fazer no seu mundo exterior, como é que isso irá afectar o modo de vida que leva. Não pode predizer, nem precisa. Irá tornar-se num grande artista? Ganhará Wimbledon? Mantenha em mente que grandes artistas e jogadores de ténis não são mestres iluminados. Aqueles têm acesso ao que é maior do que a mente humana na pequena área da sua actividade. A maioria, mesmo que tenham atingido a mestria, serão tão loucos como todos os outros (risos), talvez ainda mais loucos. Por vezes a entidade construída pela mente entra, olha para o que eles fizeram e diz “Eu fiz isto! Fui eu!”. A grande ilusão. É claro que se sentirá muito especial, o ego identifica-se com o que for que veio do estado de não ego, começando a bajula-lo a si dizendo que é o maior. Ele projecta a imagem da especialidade em você, “Ah! A grande estrela pop!” ou o que for... E algumas dessas estrelas tiveram nas suas composições um vislumbre da Vida, da frescura. Algo está lá de facto. A personalidade, a pessoa volta do acto de criação ou da actuação e retorna ao antigo eu, o que por vezes traz uma carga muito pesada. A habilidade veio do reino da não personalidade e ficou integrada na pessoa. Ela não entende que a inspiração não é do eu dela, mas sim do Ser, achando-se, assim, muito especial. Por isso gera-se um enorme conflito entre o poder que vem da não forma e a própria pessoa que é limitada. Não interpreta correctamente e reclama para ela a especialidade. A magia que vem do reino da não forma para a sua vida é quando olha para a nossa civilização e parece que desapareceu completamente, porque ela é quase totalmente não sagrada, é profana. É uma lúgubre e pesada estrutura que os humanos criaram (riso do autor). Quando olha para a corrente principal da civilização... Sem palavras... Quando viaja para qualquer parte do mundo observa que os humanos parecem estar cansados e aborrecidos. Há um tédio que carregam, fruto da civilização que aparenta estar a triturá-los, “Mais um dia de actividade monótona, de vã corrida para um lado e para outro!”. Os que estão a correr atarefados sabem no seu íntimo que ela é inútil, “Para quê?”. Se perguntarem aos executivos das grandes empresas porque é que estão a correr para todo lado, como loucos, eles não conseguirão dar-lhe uma resposta, excepto “Bem, nós estamos a expandir! A organização está a crescer. (risos) Estamos a engolir outras organizações e é a nossa razão para existirmos, crescer, ficar maiores, acumular mais, e é por isso que, blá,blá...”. Esta explicação é totalmente sem significado, razão pela qual a nossa civilização está a entrar em colapso. Uma delas é que os humanos que ainda estão a sustentá-la não conseguem carregar o peso da estrutura que criaram. O complicado mundo global que criaram, de absurda complexidade gerada só pela complexidade em si, é pesado demais para o carregarem. Já não conseguem carregar a sua criação! Isto é só um reflexo do seu estado de consciência no qual não há nenhum intervalo na corrente de formas, umas atrás das outras, de pensamentos, uns atrás dos outros. A voz na cabeça que nunca pára de falar, tornou-se a civilização que é obcecada pela forma, pelas coisas. E portanto, nada sabe do que é a mais importante dimensão da existência humana, o sagrado, a serenidade, a não forma, o divino. Tudo isto se tornou sem significado na nossa civilização. Todavia, muitos humanos estão a ficar cientes do que se passa. Há muita investigação para algo mais e esse número de humanos está a crescer a cada dia que passa. E isto é a beleza dessa situação.

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Cada um de nós aqui (Findhorn) é parte desta transformação da consciência que está a acontecer no planeta. Não vai acontecer, está a acontecer. Se ainda não estivesse a acontecer não poderiam estar aqui sentados, seria intolerável sentar aqui. Todavia, deve haver ainda em alguns de vocês algo da velha consciência que não quer estar aqui. Pode ocasionalmente sentir essa resistência emergindo (risos com a mímica do autor). Alguns nem entendem o que está a ser dito, ouvindo só o som das palavras, não conseguem ir até onde as palavras apontam, estão presos à forma, ao som, colados ao pensamento e perguntam “Serenidade, pode-me explicar o que isso significa exactamente? (autor abanando um “não” com a cabeça enquanto formula a pergunta – risos) Este é um bom exemplo onde a palavra é apenas um apontador e você deve saltar para fora da palavra. A palavra serenidade aponta para a serenidade (autor ri), não é algo para ser acreditado. A serenidade está, é claro, já em si. Não é algo que necessitemos de criar, de trazer à superfície para agir correctamente e eventualmente ficarmos serenos ou seguir uma determinada receita, “Se fizer A, B, C e D finalmente ficará sereno”. É muito sedutor, contudo deu algo a si próprio antes de ficar sereno, o que significa antes de Ser você próprio ou de se encontrar a si próprio. É o problema com toda a mensagem, cada mensagem espiritual, não que eu condene qualquer método, mas o perigo com qualquer método é que ele vos dá tempo, “O.k. Vai chegar lá e encontrar-se” (autor ri). Porque não se encontra Agora? Porquê criar algo entre você e Você? (risos) Assim, a serenidade está já, neste momento, plenamente em si. A serenidade a partir da qual os pensamentos surgem. Qualquer pensamento vem e depois volta outra vez. ... (pausa) Sente percepções? Aproxime-se um pouco mais delas. ... (pausa) Quando percepciona... não rotula o que percepciona... e deixa estar, então há a percepção, a forma e depois – vou dar uma analogia, embora elas nunca estejam certas – há a tela onde a percepção é pintada. Há um plano de fundo do espaço da serenidade... Que é você próprio! É a consciência do que é, sem forma. Não a condição consciente das formas que se formam na sua mente, os pensamentos que também estão lá, mas apenas ser capaz de sentir o que está subjacente a tudo o que percepciona ou sinta ou pense. Goethe no início do século XX chamou-lhe “A memória de Si”. Pode ser mal interpretado se tiver de pensar “OK. Deixa-me lembrar quem sou eu. Ei chamo-me fulano.” Não. Ele quis dizer lembrar – nem mesmo lembrar, as palavras nunca estão correctas – conhecer aquele que conhece. Conhecer aquele que conhece isto (mundo). Digamos que sonha e depois acorda afirmando que o sonho não foi real. É claro que não foi totalmente irreal porque algo que emergiu das formas do sonho deve ter estado lá para garantir que essas formas existissem. Deve ter havido uma consciência na qual o sonho se desenrolou. Por outras palavras, deve ter havido um sonhador do sonho, a consciência na qual ele aconteceu. Essa é a dimensão intemporal e da não forma, sem a qual as formas não existiriam. Neste contexto, a nossa existência é mais como um sonho, porque tal como num sonho tudo se dissolve muito rapidamente. Cada situação, tudo. Mesmo a aparente sólida realidade que nos rodeia, não é assim tão sólida. Em primeiro lugar não é nada sólida, apenas parece ser, são apenas campos energéticos em movimento e não irá ficar nessa forma por muito tempo, se puder observar mais profundamente, vê que tudo se está já a dissolver (autor ri). É temporário, emerge na forma e dissolve-se. Os corpos que estão sentados aqui estão-se a dissolver, mesmo esta mesa se a olharmos daqui a 200 anos poderá estar a mesma, mas se conseguíssemos acelerar numa câmara de filmar o que acontecerá nesta sala num período de 3.000 anos, o que é muito pouco numa escala global, veria todos os aparentes objectos sólidos, tal como esta mesa, a desmoronar. Num minuto veria tudo a ficar em pó e a desaparecer. Seria uma coisa chocante e libertadora ao mesmo tempo, poder ver um filme desses, demonstrando o que realmente está a acontecer ao

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aparente sólido mundo que o rodeia. No fundo, é muito libertador verificar como todas as formas têm uma vida curta. O que é que em você vê isso? A natureza limitada do tempo em todas as formas? O que testemunha isso? É a Presença, a serenidade, que está ciente disso. Torna-se cada vez mais sereno à medida em que se vai apercebendo do pouco tempo de vida que todas as formas têm e não foge desse facto. É tão importante para si que você se mantém quieto ao enfrentar a morte na sua vida e que está em toda a parte. A nossa civilização tenta continuamente esconder a morte. “Não há morte. Nunca olhe para um cadáver porque isso não se faz”. Por isso há pessoas que nunca viram um cadáver. Se não é um parente chegado não poderá ver um morto, porque a civilização necessita de esconder a morte. É o mais assustador que há para uma pessoa completamente identificada com a forma. “A morte é a coisa mais terrível que existe, por isso não vamos pensar, nem falar sobre isso...”. Quando se enfrenta com a morte, ou mesmo apenas vendo-a ... Por falar nisso, quando a mesa se dissolve num período de 3.000 anos, também é morte, naquele minuto filmado. Imaginemos que poderia ver um ser humano nesse processo. Alguém mostrou-me um filme tipo anúncio (clip) de um país qualquer, que tem apenas um minuto, vê-se um bebé a sair do útero, disparar como uma bala de canhão até ao céu (risos) gritando todo o tempo, há medida que sobe no céu ele cresce até atingir a sua completa maturidade, depois começa a descer, continuando a gritar (risos), conforme vai ficando um homem idoso aproxima-se do solo com o cabelo a cair e no último grito aterra na sepultura, desfazendo-se em pó. Por baixo a legenda; “A vida é curta” (risos). Não sei, mas penso que os realizadores não sabiam que estavam a fazer um filme espiritual, talvez estivessem a vender cerveja ou outra coisa qualquer (risos). É muito espiritual ver como tudo se dissolve rapidamente e não fugirmos desse facto. E conforme disse ontem, na primeira parte, segundo um profeta “Tudo é inútil, uma variedade de inutilidades, tudo é em vão.” Ver isso é libertador. Se tudo fosse permanente, o que é o mesmo que dizer, se todo o mundo fosse azul, não haveria a cor azul, porque não conseguiríamos diferenciá-la. Assim, se tudo fosse impermanente não saberíamos sequer, porque só o podemos saber se houver algo diferente. Dou-vos isto só para considerarem, não pensar, apenas considerar (risos) que há algo em vocês que reconhece esta natureza impermanente nas coisas, nas formas da vida. Esse algo é a não forma. Quanto mais ficar ciente da impermanência de todas as formas de vida, mais estará ciente da não forma dentro de si. Porém você e a não forma são apenas um. Quando estamos a dizer que estamos cientes da não forma estamos a cometer um pequeno erro, criado pela linguagem, o que realmente significa é que você fica mais preenchido de si mesmo, fica mais consciente de si mesmo, não como dois, mas como um. A consciência de si torna-se mais ciente de si própria. Tenho aqui uma pergunta escrita, de alguém que provavelmente não aprecia falar em público, mais tarde teremos a parte destinada às outras perguntas. “Eu às vezes estou ciente, no Agora, de que estou a expandir. O que significa isto? Parece ser a consciência em si. Se eu estou ciente da consciência em si – dualidade – qual deles sou eu?” É uma boa pergunta. “Eu estou ciente de...” parece que estamos a falar disso. Mas isso não é assim, só quando estamos a colocar em linguagem é que formulamos uma frase com sujeito e objecto. Na realidade tornamo-nos cientes da consciência, que é verdadeiramente o segredo para uma vida humana equilibrada... Tornar-se ciente da consciência... e também das formas. Porém, o que significa isso? Quem é que fica ciente da consciência? A linguagem que usamos cria a ilusão de dualidade, seria muito melhor se refizéssemos a frase dizendo: “ A consciência que eu sou, fica ciente de si própria”. Não dualidade. A consciência, a qual é a essência de quem eu sou, fica ciente de si própria. Esta é uma coisa milagrosa, bela e inacreditável!

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O que tradicionalmente tem sido chamada de “realização pessoal”, trata-se simplesmente de serenidade. Porém, cada palavra minimiza algo que é muito maior. Claro que há um sentido de expansão, tal como a pergunta refere, porque já não se encontra mais encurralado. A sua consciência já não está presa à forma que é a encarnação. É a encarnação da consciência na forma e a realização da consciência enquanto não forma. Por isso muitas tradições espirituais falam de reencarnar muitas vezes, afirmando que reencarnamos até atingirmos o despertar, até ficarmos cientes de quem somos, para além da forma. É a verdade. Nascemos uma e outra vez, mas não que seja algo em que eu acredito, e sim algo que é verdadeiro e para isso só tem de olhar hoje. Como reencarna, hoje. “Como é que isso acontece? Como encarno hoje, ou isso acontece uma vez na vida?” (risos). Conhece aquele autocolante de automóvel que diz “Nascidos uma vez cristãos, nascidos outra vez cristãos.”? Os budistas têm outro a dizer “Nascido outra vez e outra vez e outra vez...” (risos). Como pode reencarnar hoje e quantas vezes os faz? Sempre que se perde num pensamento ou numa emoção ou em algo do mundo exterior que, é claro, também experiencia através do pensamento e da emoção. Digamos que é mais quando está numa situação que o faz ficar aflito “O que se passa aqui? O que está a acontecer?” perdendo-se no padrão reactivo e na interpretação mental “Isto é horrível! Temos de fazer algo!”, ou qualquer coisa do género. Aqui identificou-se com a forma, cada pensamento que veio à sua mente arrastou-o completamente, há uma sensação de eu, inconsciente, obviamente. Quero dizer com isto que se identificou, o seu eu misturou-se com a forma do pensamento ou da emoção. Está, assim, completamente encarnado na forma que surge na sua vida. É deste modo que os humanos percorrem as suas vidas sem saber, sem estar conscientes de que encarnam muitas vezes, pois perdem-se continuamente nas formas. Reagem às formas que os rodeiam. Estão integralmente na reacção. Não há consciência no plano de fundo, um observador dizendo “O.k. Isto é o que se está a passar”. Não há espaço, apenas forma. Não há serenidade, há apenas ruído. Isso significa estar a reencarnar compulsivamente todos os dias, muitas vezes. Mesmo quando se senta sozinho à noite no seu quarto e começa gemer baixinho “Blam,blam,blam...” (risos). Se falasse alto, a voz na sua cabeça com a qual se identifica, seria vista pelos outros como louca: “blam, blam, mas por outro lado se eu... blam,blam, podia fazer, blam,blam... será que se eu, blam,blam... seria terrível se eu, blam,blam...” (risos). Está sempre a reencarnar em novos pensamentos-forma, por isso o budismo quando diz reencarnar até despertar quer dizer não se perder na forma uma e outra vez. Não quer dizer que rejeite todas as formas, algumas tradições vão um pouco mais longe para descobrir a dimensão da não forma, aconselham para não se olhar mesmo para nada belo porque não permanecerá aqui por muito tempo, já se está dissolver “Não olhe para uma flor e certamente para uma mulher bonita é que não deve olhar!”. E ficam cabisbaixos, tipo zombies, mas a espreitar (autor apenas mostrou em mímica – gargalhadas), porque assim perde-se na atracção e terá de reencarnar muitas vezes. Alguns monges não podem entregar algo a uma mulher, só o fazem colocando o objecto numa mesa para ela o apanhar, caso contrário estariam a ter um contacto com ela. A ideia que está por detrás disto é boa tendo como objectivo não se perder na forma, todavia, rejeitar o mundo da forma é talvez perder outra vez referencias no sentido oposto: “Toda a beleza é pó. Tudo para o qual eu olho já se está a dissolver. A flor que hoje está linda, amanhã desaparecerá...”. Nalgumas tradições o mundo inteiro da forma é integralmente rejeitado. Ocasionalmente, aparenta resultar, contudo, na maioria das vezes não funciona. Aqui e ali algumas pessoas despertam nestas tradições, todavia penso que não tem nada a ver com as tradições, aconteceria mesmo se estivessem sentadas no seu escritório, porque estavam preparadas, chegou o momento para elas.

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É sempre problemático considerar se isso se torna ou não num processo natural de desidentificação, se se é forçado a ver essa realidade numa estrutura artificial recriada. Pode resultar se houver um ser humano que possa incorporar as duas dimensões, o estado desperto e a acção. Em muitos casos não há a tradição, há apenas a condição. Habitualmente isso não vos leva lá. Não rejeitar a forma. Trabalho com a forma para ver que há algo escondido, que é uno com a essência que Eu Sou. Não é algo sobre o qual pensar. Ouça os pássaros onde quer que esteja e com tudo o que possa estar em serenidade, para que se sinta a si próprio como o espaço quieto no qual esse objecto ou esse ser é percebido. Irá sentir que essa essência que sente ser você próprio está também lá nesse ser. Mesmo em objectos inanimados. A mesa tem Ser, tem Presença. Alguns indivíduos têm de ingerir “ácido” (droga) para ficarem cientes, na primeira vez, de que a mesa também está viva (risos), mas não é o que recomendo aqui. Só tem de estar presente com o objecto, verdadeiramente alerta e quieto, e depois olhar. No momento em que a mesa está sob a ilusão de que sabe o que é, realmente não sabe. Ela é totalmente desconhecida e misteriosa. Só porque lhe pôs um rótulo não significa que sabe. Apenas teve um pensamento na sua cabeça ou um som saiu da sua boca dizendo o que é. Por isso não consegue ir mais fundo, porque fica acorrentado ao rótulo. Colou o rótulo e ficou também colado a ele “Isto é uma mesa. O.k. O que há a seguir?” Assim não poderá ir mais fundo seja no que for. Apenas cola uma etiqueta atrás da outra. Como só toca a superfície das coisas, a mente acha que terminou e despacha-o para outra tarefa. Esta contínua busca pelo passo seguinte, porque não consegue estar apenas com uma coisa na profundidade que é patente em tudo, impede que o objecto se revele a si. Esta é a ruina da nossa civilização, o estar continuamente a procurar o que se segue. Já vê isso nas crianças pequenas, actualmente, estão sempre em busca de novos estímulos, não conseguindo estar quietas por um momento. Elas estão viciadas pela coisa seguinte, um novo estímulo mental, porque vivem numa civilização que está totalmente na superfície das coisas. Falta a profundidade. Agora vocês poderão trazer profundidade, mesmo às vossas percepções. A percepção está muito mais próxima da não forma ou do Ser do que o pensamento, porque este é muito mais amorfo (menos cristalino), é abstracto. Para muitas pessoas ao tornarem-se presentes - “Oh! Estou perdido...”, perdido em problemas, questões do mundo, e acordam “Mas onde está o problema, Agora?” - a primeira coisa que notam mal entram neste estado são as percepções do ambiente que as rodeia. Não estavam atentas a tudo isso, antes, pois a concentração estava só direccionada para o pensamento. Subitamente, olham para o solo, para a mão, para a mesa, para a luz, e ao olharem está a serenidade. De facto, por estranho que pareça, não consegue olhar para nada sem ser com serenidade, porque mesmo as pessoas que rotulam os objectos compulsivamente, que afinal somos todos, há sempre um momento – estamos a falar apenas no sentido da visão, porém é o mesmo para todas as percepções – há um primeiro momento ao olharmos para algo, a árvore, a flor, a mesa, qualquer coisa, num segundo mais ou menos, no qual há serenidade e só depois é que a mente interpreta ou rotula. Se se conseguir apanhar a si próprio neste primeiro olhar, repara que há um breve momento de não etiquetagem, de outro modo nem sequer veria o objecto. Depois há um retrocesso, isto é, a percepção perde imediatamente a sua acuidade e alacridade uma vez que a etiqueta mental substitui a vivacidade que há lá. “Pum!”, está morta! Olha para o objecto, ou ouve um pássaro onde há um momento de audição pura alguns segundos depois a mente diz, por exemplo, “Deve ser um melro” ou “Não me consigo lembrar do nome deste pássaro!” e lá foi. Se conseguir reparar nesse momento de pureza, quando algo de novo entra na sua consciência, seja pela visão, audição, tacto, olfacto ou paladar, mesmo este último sentido pouco desenvolvido no humano contemporâneo, esteja presente e fique ciente desse primeiro momento onde não há etiquetagem. Há uma serenidade e um alerta.

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Se se tornar consciente disso verificará que irá ficar aí muito mais tempo, pois não precisa de etiquetar automaticamente. A quietude que é o plano de fundo para a percepção torna-se mais vasta, ela é sempre ampla só que você não sabe. É outra forma de expandir a serenidade em si, digamos assim, todas as palavras, na serenidade, são uma forma de dizer... (autor sorri) Movimentar-se-á cada vez mais, na sua vida, dentro deste processo, não apenas quando estiver a percepcionar passivamente, mas também quando trouxer isso para a sua actividade. Esse estado de consciência fluirá naquilo que faz. Irá notar que faz as coisas com mais eficácia se elas forem produzidas num estado de quietude e de Presença, em vez de estar a pensar no que quer alcançar com essa acção ou aonde irá estar no próximo momento. Há serenidade no que percepciona e há quietude que flui para a sua acção. A acção poderá ser muito simples, tal como atravessar a sala, abrir uma janela, abrir uma torneira e sentir a água, ouvir a água. Olhar pela janela de manhã. Abre as cortinas “shshsht (para um lado)...shshsht (para o outro).” e porque será que há o habito de imediatamente chamar algo a esse dia? “Oh não! Outro dia cinzento!”... Deixe-o ser! Há sempre uma profundidade em tudo o que deixou de estar lá quando rotulou, portanto, permaneça com as coisas mais um pouco. Essa profundidade é a sua e a do objecto, que na verdade são ambas a mesma. O mundo que já não é profundamente experienciado - há actualmente um fenómeno do superficial - continua Vivo, pois a profundidade é também a Vida em você. A mudança que está acontecer consigo é que traz para si, este assim chamado novo estado de consciência nas situações do seu dia a dia, quebrando a continuidade da estória, deixando que a inteligência se acerque cada vez mais, assim como o Amor. O único caminho para permitir que o Amor entre na sua vida é através do espaço e não através da forma. O Amor não tem forma. No estado egocêntrico, outra vez, o Amor fica enredado na forma por isso você pensa que só precisa desta determinada forma para amar. Não sabe que o verdadeiro Amor é o reconhecimento da não forma no outro. Que é o reconhecimento de si próprio no outro! Isto é inseparável de olhar para o outro na serenidade. Sem que surja uma forma e dizer o que ele ou ela é. Se as formas emergirem, mesmo assim, na sua mente admite que é apenas um pensamento e que não é como o outro ser humano é realmente. Que belo se puder reconhecer a não forma em toda a forma... Primeiro observa isso nas coisas da natureza, dado que é muito mais fácil, uma vez que a natureza é muito menos desafiadora do que os humanos. Os humanos também eram a natureza, claro, porém tornaram-se...mmm... o que for... (risos). Tente aproximar-se primeiro da natureza e relacione-se cada vez mais com ela através da serenidade e da Presença. Neste contexto, estará gradualmente a trazer isso para as relações humanas. É mais fácil quando se encontram pela primeira vez. Deixe os outros serem o que são. Ouça-os, é vital ser capaz de ouvir o outro ser humano. Não quer dizer que a sua atenção esteja nas palavras que ele profere, ouça apenas como uma espécie de analogia, há um campo de serenidade atenta que flui de si para ele. Poderemos dizer que dá a ele ou ela, espaço. Talvez essa pessoa esteja a dizer palavras nesse espaço e você é como o espaço que permite que as palavras venham. Estará lá como um campo de Presença consciente. Em consequência, as palavras poderão sair subitamente da sua boca, porém a forma de comunicação será muito diferente da chamada interacção normal entre humanos, que é completamente dominada pela mente. Esteja sereno com outro ser humano enquanto ouve e sinta-se a si próprio como a quietude enquanto escuta. Deste modo, alguma da sua atenção está nas palavras e a restante está no Agora. Com os desafiadores seres humanos, deixe o seu corpo ficar Presente em todo o seu campo de energia. Permita que todas as células do seu corpo estejam presentes enquanto ouve. Os outros humanos podem ser muito desafiadores, como são

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dominados pela mente querem que você contribua para as suas estruturas mentais, para o drama, seja o que for. O “corpo de dor” desses humanos pode estar activo. Penso que todos aqui já ouviram falar do corpo de dor, que é outra maneira de identificação com a forma. A velha emoção que surge e dispara levemente um episódio do corpo de dor, sendo o corpo de dor o conjunto das velhas emoções do passado armazenadas, é sofrimento humano, é dor humana que não desapareceu, parte pertencendo ao indivíduo e parte sendo colectiva, dos seres humanos em geral. No fundo é só dor humana - não é pessoal de todo - que se tornou numa pequena entidade energética e que vive em si, algumas vezes dormente, outras activa e ainda por vezes metade dormente, com um olho aberto esperando por uma oportunidade, um gatilho, para ser disparada. O gatilho poderá ser um comentário que o seu companheiro faz ao qual reage “Acusas-me de...?”, (o companheiro) “O quê? Não disse isso.”, (a sua resposta) “Disseste sim!”(risos) E assim cá vamos nós, o drama que acorda também o corpo de dor do nosso companheiro, alimentando-se um ao outro, reencarnando totalmente na antiga dor. Vive-a. Ela vive através de si. Você não sabe que está a viver outra encarnação. E pode ser um budista deixando vir os pensamentos sobre o desejo de chegar ao final dos ciclos da reencarnação, seguindo alguns conselhos abstractos na sua mente, porém sem saber que reencarna no momento em que discute com a sua mulher/marido (risos). “Tenho de voltar para a minha meditação. Não medito há um dia e uma hora, vou ter de reencarnar muitas vezes, por causa disso!” . “Reparou no que está a fazer Agora?” “Oh!”. A situação mais frequente para as pessoas reencarnarem é a velha emoção que procura alimentar-se na experiência de mais dor e que pretende ser você. Identifica-se com ela a qual ocupa inteiramente o seu espaço. Você alimenta-se da reacção da outra pessoa. Adora essa atitude. “Você”, aqui, significa o seu corpo de dor, porque nesta altura a sua dor e você próprio misturam-se e isso é que é a reencarnação. Finalmente a dor cede e o próximo episódio será daqui a uma semana, assim como o da Oprah (apresentadora de programa americano que incide fortemente sobre o emocional - risos). O corpo de dor pode ser também alimentado só na sua cabeça, porque se não tiver companheiro ele irá buscar alimento ao seu pensamento. “Que horrível é a minha vida. O que ele, ela, eles me fizeram...” O mundo, políticos, pessoas, tudo de que a mente se lembrar como pensamento negativo, a dor adora-o. O corpo de dor é viciado na negatividade que os humanos carregam. É só uma pequena entidade, uma forma de energia. Tudo o que é necessário é vê-la, reconhê-la para não reencarnar outra vez. Mesmo que reencarne é possível, no meio de pensamentos negativos ou no meio de um drama com o seu parceiro, saber subitamente o que está a acontecer. Isso quer dizer que uma parte de si pôs um pé fora da forma e aí está a consciência pura. Antes, estava totalmente encurralado na forma, mas quando viu o que estava a acontecer uma parte da consciência mental saiu da encarnação e lá está como consciência pura, observando. Lá estão vocês, ambas as entidades gritando “Blaaaaa...”, porém não conseguem sustentar isso por mais tempo, porque quando há consciência aí, Presença, que é simplesmente o observador sereno, a dor não se pode renovar por muito mais tempo pois necessita da identificação completa de ambas as partes. Começa, assim, a ceder “O.k. Já foi bom, pelo menos acordei a meio disso!” Alguns acordam depois. “Lá aconteceu. É tarde demais”, contudo não é realmente demasiado tarde pois está acordado Agora, na próxima vez irá apanhar isso um pouco mais cedo. E na próxima vez, apanha a tempo. Repare como um minúsculo evento pode ser usado como desculpa pelo corpo de dor. Apenas uma pequena coisinha, do tipo, batem-lhe com a porta na cara, há logo uma reacção muito maior do que a insignificância do sucedido. Isto é porque a dor estava à

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espera que algo acontecesse. Tudo o que precisa é de fazer brilhar a luz da consciência pura sobre a situação, desse modo não reencarna completamente na dor. Se não está Presente é sempre a mesma coisa, é um ciclo repetitivo. Daqui a 30 anos terá os mesmos episódios como o seu marido ou mulher. Ou poderá ter um novo marido ou nova mulher, mas será igual (risos). O estranho é que olha para alguém dizendo que finalmente conseguiu o divórcio, pensa que já não tem de viver mais com esse corpo de dor - quer dizer aquele com o qual ainda vive (risos) – e afirma que o seu próximo companheiro/a será escolhido por não ter um corpo de dor, que seja uma pessoa consciente. Então encontra alguém que lhe parece ser consciente, fizeram trabalho espiritual durante 25 anos (risos), começam a viver juntos e dentro de 4 semanas encontra um aspecto nessa pessoa que não era suposto estar ali (risos). Este é o desafio. Tenha ou não uma relação, o corpo de dor estará lá. Os relacionamentos são uma boa oportunidade porque são o recreio favorito para a renovação do corpo de dor (risos). Caso o seu corpo de dor não tenha uma relação, ele usará a sua mente. Funcionará na mesma também. Fiquem atentos porque há um momento aí fortíssimo, derivado da enorme quantidade de dor colectiva humana, construída durante muitos e muitos anos. Realmente, tudo o que no seu corpo de dor aparenta ser pessoal é verdadeiramente sofrimento da humanidade. Alguma situação na sua vida pessoal pode ter acrescentado algo a essa dor colectiva, mas ela é basicamente impessoal. Assim como o movimento do pensamento é basicamente impessoal. As emoções são emoções humanas, os pensamentos são pensados pelo colectivo humano e as pessoas pensam “Sou eu!”, contudo é impessoal. Só quando estão identificados com ela é que vos dá a impressão de ser pessoal. Nesta ilusão estão a ser pensados pela mente humana colectiva. Onde está a pessoa então? O estranho é que a serenidade também não é pessoal. Presença, quietude, não são pessoais, todavia, são essencialmente o Ser que você é. Não é pessoal. Pessoal significa aquele coisita pequena que sou e os outros (separados). Em última instância não há nada de pessoal. Nem o inconsciente que se identifica com a forma, nem quando a consciência pura emerge. A essência de quem você é, o Eu Sou, não tem nada de pessoal. Contudo pode vir a estar misturado com o ser pessoal, isto é com as formas nas quais o indivíduo se identifica, aquelas que fazem a sua personalidade. Conforme sabe, o termo personalidade vem do Latim, persona, que significa a máscara que usa. São os papeis que desempenha quando interage com os outros humanos enquanto se identificar com a mente e as emoções. Actua em conformidade com os papeis que são pessoais, segue o guião da sua mente, a condição da sua vida, uma e outra vez. “Nascido outra vez e outra vez e outra vez...” até ter tido o suficiente. Fica farto com o sofrimento a que está vinculado e “AH!” o “estar preparado” advém de sair daí. Este é o fim da reencarnação. ... (Pausa) Antes de passarmos às perguntas... pode já não haver nenhuma... está sempre tudo bem (risos). (autor pega em címbalos e toca uma vez; sai um som metálico, cristalino) ... Conseguem ouvir o som e estar também cientes da consciência que está a ouvi-lo? Por outras palavras, conscientes de vocês próprios como a Presença na qual o som acontece? (Repete o toque) ... ... e tudo o que sobra é espaço... Presença. Forma e não forma. Ouve o som seguindo-o até esmorecer... até à não forma. Porém ele está também morto. Quando ele vai perdendo volume lentamente também vai morrendo – depois da força aérea Real passar (passa um jacto – risos) - siga o som até desaparecer.

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O som morre... A morte significa que a forma se dissolve. O que resta é a não forma, consciência. (Toca outra vez) ... Pode experimentar o mesmo com a respiração. É um método de meditação antiga. Escolha uma simples para não se perder... no tempo. Buda recomendava isso. É talvez a meditação mais directa, pois é natural em si, respirar. A não ser que o meditador entre na sua própria cabeça como um meditador conceptual e pense: “Tenho de melhorar esta função de observar a minha respiração!” (risos). Quando observa o movimento da expiração... a parte final é também uma pequena morte. ... (Pausa) ... Há um momento de serenidade. Qualquer término é útil neste sentido. Porque qualquer final é o final de qualquer forma e é sempre uma espécie de morte. Quando aceita isso completamente gera uma abertura para a não forma. Mesmo o final do nosso retiro pode ser assim. Porque isto também é uma forma. Poderá dizer “Que pena, esta forma está a dissolver...” e quer agarrar-se à forma, a receita para a sua felicidade, não se apercebendo de que a verdadeira razão para este encontro é ser sem significado e que afinal é o fim dele que o pode levar para além da forma. Assim, quando acolhe todos os finais na sua vida... “Adeus... Aah!” Shuuuuum... as formas foram-se... mas a não forma estará lá na sua vida. A entidade egocêntrica trabalha de maneira oposta. Detesta largar. Quer guardar as coisas, porém elas estão a ir... vão... foram-se. Se for suficientemente idoso, de forma a ver a morte física a acontecer em si, pode ser muito belo também aceitar isso, não como pensamento “Vou morrer em breve!” Deixe apenas que isso o torne Presente. Apenas isso. ............. Se há perguntas a fazer... Há ali uma e outra acolá. OK, o microfone voará até si...

- Pode um louco (fool) ter noção da sua iluminação? Obrigado. Pode uma forma...? - Não, um louco. Oh! Questão boa, essa! (risos) Há imagens maravilhosas do louco, pois é uma antiga figura mitológica, a carta do Tarot, o tolo, por exemplo, etc. Louco significa a pessoa cujas capacidades mentais estão subdesenvolvidas. Eu diria que é alguém que não está encurralado nas estruturas comuns de pensamento compulsivo, não porque tenha transcendido o pensamento compulsivo, mas porque não chegou sequer a este pensamento. Neste sentido, esta pessoa já é iluminada, não o estado de iluminação que temos vindo a falar aqui, mas aquele estado de ainda não estar aprisionado do pensamento e que tem muitas semelhanças com a iluminação. Poderemos dizer que ele/ela não necessita de iluminação, dado que na sua própria maneira já o é. Na mitologia contemporânea, que são os filmes (risos), há um belo exemplo na pessoa de Forest Gump, alguém cujas capacidades mentais estão subdesenvolvidas, mas que vive, de uma forma geral tal como uma pessoa iluminada viveria. Primeiro, ele não possui ego, tudo o que necessita vem naturalmente ter com ele. A sua vida desenrola-se naturalmente, não tem de lutar por nada, cada coisa chega no momento certo e ele mesmo assim alcança coisas grandiosas, porém nunca afirmando “Eu fiz isto”, porque o eu ainda não surgiu ainda. Vai para o Vietname e para todo o lado que vai ele é uma força do bem, na guerra ele salva muitas pessoas, tornando-se num grande herói, contudo ele não se vê assim, porque não tem a imagem mental do eu ter feito aquilo. Ele só explica “foi o que aconteceu ...e

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depois?”. Por conseguinte, em geral, ele já está lá e por isso não necessita de alcançar a iluminação. Quanto a nós, não podemos voltar para lá (para o mesmo nível do Forest Gump). Ele não necessita de passar pelo nível do pensamento, ele está bem. Aliás parece ser o destino de alguns humanos estar ligado a algumas civilizações remanescentes, semelhantes a outras muito mais antigas, onde os humanos viviam em êxtase com a natureza e uns com os outros não necessitando do Buda (estado de iluminação). Tal como os animais. Há alguns cães e gatos que sofreram muito ou são muito velhos e já atingiram a iluminação do seu estatuto, como Ser do cão ou do gato. Por exemplo, o gato velhinho que já não se incomoda em caçar pássaros, dado que sabe que é inútil, pois já é velho e olha à sua volta, completamente presente. Há seres que parecem ter preenchido integralmente o propósito da sua existência naquela forma. Ligaram-se à não forma, ela preencheu o propósito deles e a união está lá. Não é o nosso destino retornar, voltar para trás. Todos fomos, somos ou estamos no meio do caminho – aqui a maioria - como prisioneiros da mente, por isso não podemos transformar-nos em tolos outra vez. Porém, quando passamos para além do pensamento e na perspectiva da mente parece que não sabemos mais nada. No ponto de vista conceptual, tornamo-nos também loucos. Há muitas semelhanças entre a maneira como uma pessoa iluminada vive, pois transcendeu o pensamento – já não está encurralada no pensamento – e o modo como vive a pessoa que ainda não atravessou o estado evolucional de ser prisioneira do pensamento. Ela não tinha de experienciar isso. Por alguma razão, a consciência floresceu daí, dessa forma. O que é muito belo! Porém para nós será transcender o pensamento para nos tornarmos, digamos, tolos de novo. Poderemos dizer que não nos tornamos o Forest Gump porque há um conhecimento que aparece quando transcendemos o pensamento. Há uma consciência que não estava lá antes, no estado similar ao da natureza. Há um reconquistar do estado natural anterior, todavia, esse restaurar... A propósito, todas as antigas civilizações falam, por exemplo, do mito da Idade do Ouro, na Índia e em quase todas as civilizações, onde houve um período no qual todos viviam em paz e felizes, o mundo era uma espécie de Paraíso. Isto também está presente no início da Bíblia, portanto deve haver uma verdade antiga aqui. Há um estado natural que os humanos perderam. Aqueles que não o perderam, obviamente não precisam de o conquistar, estão bem. Porém, há um destino para o estado evolucionário da consciência humana de o perder para voltar a ganhá-lo e aqui estamos nós. Então, de alguma maneira, esses humanos, os que transcenderam, olham para os outros humanos que ficam aprisionados no pensamento quando vivem afastados do momento presente, e não rotulam compulsivamente as coisas, não são uma estória ambulante, são bem simples, a necessidade de ser especial cai, tornam-se completamente comuns, pois não precisam de projectar mais a sua especialidade, tentando encontrar a sua identidade lá. Já estão em contacto com a preciosidade que a vossa essência é. Não necessitam mais de procurar a especialidade na forma. Que liberdade surge para nós agora que não precisamos de ser especiais para termos o sentido de quem somos. Assim, tornamo-nos comuns. Vocês têm esta bela expressão nas cenas do “Dowest(?desconhecido para a tradução)”: O total abandono, o pequenino é um livro de sabedoria...” é a expressão da vulgaridade ao ser vulgar, de se ser comum, não se projectando na necessidade de querer ser alguém, pelo contrário, é feliz por ser ninguém. Isto parece bem louco no ponto de vista da nossa civilização. As pessoas podem olhar para si como sendo “ninguém” e isso é maravilhoso! (risos) A única pena - que não é pena... - é de agora eu ter ficado conhecido (publicamente) através do Ser que despontou em mim e que acabou por se

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projectar também em especialidade. Havia tanta beleza em ser totalmente comum e ninguém duvidava que eu era vulgar (risos). As pessoas diziam: ”Deve ir vê-lo, é tão vulgar!” (gargalhadas) Apenas Ser, viver no momento presente, nada poderia ser mais comum do que viver alinhado com o que quer que é Agora. É tudo o que tem de fazer. Um famoso ditado Zen: “cortar lenha, transportando água” tem um significado muito profundo dizendo, os homens captam toda a sua existência, Zen, cortando lenha e transportando água. Duas das actividades mais vulgares para aquele tempo. No nosso caso será diferente, pois a maioria já não corta lenha, actividade excelente, por sinal. Fazemos outras coisas comuns. O que está a fazer neste momento é para fazer neste momento, apenas isso, não há mais. Cortar lenha “Aaah!”, transportar água “Aaah!” só isto. Paz. Vida. Não deixar que a mente interfira e diga “Quantos mais anos terei de cortar esta lenha? (risos) Se não fizer nada continuarei preso aqui mais 10 anos, a cortar lenha! “. ... A ilusão do tempo voltou agora, outra vez, para nós (gargalhadas) Porém apenas no exterior, não aqui (no interior). No lado externo, o relógio continua a clicar “tic, tic,...” ou seja lá o que for nos modelos modernos. Isto não é o fim. Não há fim. Isto não é o fim mesmo no nível da forma. Depois do intervalo voltaremos aqui para ficar algum tempo em silêncio... ... a não ser que algo aconteça... (risos).

Obrigado.