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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
UNIDADE ACADÊMICA ESPECIALIZADA – ESCOLA DE MÚSICA
CURSO DE LICENCIATURA EM MÚSICA
FERNANDA DE OLIVEIRA SILVÉRIO VIÇOSA
PALESTRA PRÉ-CONCERTO:
Formando público pensante
NATAL
2014
FERNANDA DE OLIVEIRA SILVÉRIO VIÇOSA
PALESTRA PRÉ-CONCERTO:
Formando público pensante
Trabalho de conclusão apresentado à
Coordenação do Curso de Graduação em
Música da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, como requisito parcial para
obtenção do Título de Licenciado em Música.
Orientador: Prof. Dr. Marcus André Varela
Vasconcelos
NATAL
2014
AGRADECIMENTOS
Sou eternamente grata à minha família, mesmo os mais distantes, que me amam e
torcem por mim. Aos meus pais, Wilson e Helena, agradeço pelo amor e incentivo, desde as
primeiras aulas de piano, há 15 anos, e por acreditarem que posso ser feliz fazendo o que amo.
À minha irmã Vanessa, por ser uma das maiores incentivadoras desde o começo do curso.
Agradeço ao amor da minha vida, meu marido, companheiro, Maurício. Grata por ser
o motivo da minha alegria todos os dias, por acreditar em mim e não medir esforços para me
ajudar. É por você e pelo nosso filho que eu vivo.
Ao meu querido orientador Prof. Marcus Varela, agradeço pela dedicação, incentivo e
paciência. Obrigada por construir essa pesquisa comigo e acreditar neste projeto desde o
início. Ao meu querido maestro, chefe e amigo, André Muniz, por acreditar e investir em mim
me dando a oportunidade de me descobrir profissionalmente. Ao Prof. Zilmar Rodrigues, pela
confiança em meu trabalho e incentivo. E também ao Prof. Fabio Presgrave, pelas orientações
profissionais e por me motivar sempre.
À Orquestra Sinfônica da UFRN e todos os que fazem a Escola de Música da UFRN.
Vocês fazem parte da minha vida e rotina, agradeço por toda a paciência e ajuda.
Especialmente agradeço a Glauciana e Rosália, por toda ajuda e por tornar minha vida muito
mais fácil. Agradeço também à minha equipe: Flávia, Jonathan, Elindemberg e Rafael, que
facilitam meu trabalho a cada dia.
Aos amigos, agradeço a todos os que me apoiam de alguma forma, mesmo nas
conversas descontraídas. Especialmente à paciência e atenção de Agamenon durante esses
anos. Aos meus amigos melhores: Paulo César, Alex, Bernardo, Carlos, Christina, Cielly,
Cristian, Dora, Emille, Gabriel, George, Jonas, Kalyne, Pollyana, Thiago, Verónica. Sem
vocês minha vida não teria sido tão alegre e serei eternamente grata pelos momentos de
conversas, descontrações e mesmo orientações acadêmicas.
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo mostrar a Palestra Pré-Concerto como uma
ferramenta eficaz de educação na formação de público para música de concerto. A Orquestra
Sinfônica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte realiza sempre em dias de
concertos oficiais palestras que levem ao público um pouco do conteúdo musical e histórico
do repertório executado. Este projeto foi pensado com a intenção de caracterizar o público
presente nas palestras, avaliar seus conhecimentos e gostos musicais, conhecer as influências
musicais e, principalmente, verificar o efeito da palestra durante a apreciação do concerto. O
conteúdo da palestra foi definido a partir da escolha do repertório do concerto e trabalhado a
partir de conceitos musicais e históricos, buscando a interação do público com as peças e
despertando sua curiosidade, gosto e interesse.
Palavras-chave: Formação de público, Palestra Pré-Concerto, Educação Musical, Orquestra
Sinfônica.
ABSTRACT
The objective of this study is to demonstrate the Pre-Concert Lecture as an effective
educational tool in the formation of public for concert music. The Symphonic Orchestra of the
Federal University of Rio Grande do Norte, on official concert days, always holds lectures
which bring to the public a little of the musical and historical content of the music to be
performed. The intention of this project is to characterize the public present in these lectures,
evaluate their musical knowledge and taste, learn their musical influences, and most
importantly, verify the lecture´s effect in terms of concert appreciation. The content of the
lecture was defined based on the chosen concert repertoire and elaborated through the use of
musical and historical concepts, looking to stimulate an interaction between the public and the
pieces, igniting their curiosity, taste, and interest.
Keywords: Formation of public, Pre-Concert Lecture, Music Education, Symphonic
Orchestra.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Exemplo musical do motivo no 1º tema – Concerto para Clarinete e Orquestra de L.
Spohr ......................................................................................................................................... 17
Figura 2 - Exemplo musical do motivo no 2º tema - Concerto para Clarinete e Orquestra de L.
Spohr ......................................................................................................................................... 18
Figura 3 - Formação musical dos participantes da Palestra Pré-Concerto ............................... 23
Figura 4 - Nível de conhecimento musical dos participantes da Palestra Pré-Concerto .......... 24
Figura 5 - Frequência em concertos dos participantes da Palestra Pré-Concerto ..................... 25
Figura 6 - Pessoas sem nenhuma formação musical x Em uma escala de 1 a 7, em que nível a
palestra contribuiu para tornar o concerto mais agradável? ..................................................... 27
Figura 7 - Pessoas com poucas aulas de música ou curso livre x Em uma escala de 1 a 7, em
que nível a palestra contribuiu para tornar o concerto mais agradável? ................................... 28
Figura 8 - Frequência aos concertos x Classe Social................................................................ 30
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Caracterização do Público ....................................................................................... 21
Tabela 2 - Conhecimento musical ............................................................................................ 22
Tabela 3 - Palestras ................................................................................................................... 26
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 10
2 MÉTODO ....................................................................................................................................... 14
2.1. PALESTRA PRÉ-CONCERTO ..................................................................................................................... 14 2.1.1. FORMAS DE OUVIR ................................................................................................................................. 15 2.1.2. ESTRUTURA ............................................................................................................................................. 16 2.1.3. MOTIVO ..................................................................................................................................................... 17 2.1.4. CURIOSIDADES HISTÓRICAS ............................................................................................................... 18
2.2. QUESTIONÁRIO .......................................................................................................................................... 18
2.3. PARTICIPANTES ......................................................................................................................................... 19
2.4. PROCEDIMENTOS....................................................................................................................................... 19
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................................... 21
3.1. CARACTERIZAÇÃO DO PÚBLICO ........................................................................................................... 21
3.2. CRUZAMENTO DE DADOS ....................................................................................................................... 27
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 31
REFERÊNCIAS............................................................................................................................... 32
APÊNDICE ....................................................................................................................................... 34
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO ...................................................................................................................... 34
ANEXOS ............................................................................................................................................ 36
ANEXO A – Cartaz do Concerto e Palestra Pré-Concerto – 15/03/2014 .............................................................. 36
ANEXO B - Cartaz do Concerto e Palestra Pré-Concerto – 27/09/2014 ............................................................... 37
ANEXO C – Foto da 1ª Palestra Pré-Concerto – 15/03/2014 ............................................................................... 38
ANEXO D – Foto da 2ª Palestra Pré-Concerto – 27/09/2014 ............................................................................... 39
10
1 INTRODUÇÃO
A música é uma importante forma de expressão e comunicação humana e é fator
importante para a construção das práticas culturais da sociedade em seus variados contextos
(QUEIROZ, 2005, p.51).
O conceito de cultura tem sido amplamente discutido e vem sofrendo diferentes
conotações. Pesquisadores e autores têm se dedicado à busca de uma definição do termo e um
dos principais, Tylor (1832-1971) define como um conjunto que abrange conhecimentos,
crenças, arte, moral e costumes adquiridos pelo homem enquanto membro de uma sociedade.
Segundo Cultura (1999, p.591) entende-se como cultura: “conjunto dos conhecimentos
adquiridos, instrução, saber; são manifestações intelectuais e artísticas que caracterizam uma
sociedade”. Pode ser também um “conjunto de fatos ideológicos comuns a um grupo de
pessoas consideradas fora das distinções de estrutura social e difundidos em seu seio por meio
de técnicas industriais”. WILLIAMS (1992) em seu livro Cultura, ao definir o termo cultura,
destaca a “ênfase no espírito formador de um modo de vida global, manifesto por todo o
âmbito das atividades sociais, porém mais evidente em atividades „especificamente culturais‟
– uma certa linguagem, estilos de arte, tipos de trabalho intelectual”. O autor também destaca
a importância do papel social do artista como formador de opinião, como facilitador do acesso
à cultura e até mesmo à educação, através da arte.
Ao falarmos de educação e música, precisamos pensar em um conceito chave:
formação de público para música de concerto. É importante, em primeiro lugar, pensarmos na
intenção dessa formação: queremos apenas lotar teatros e espaços como forma de subsidiar
esse setor ou também pensamos na formação humana das pessoas que compõem esse público?
Ao respondermos essa questão podemos então definir o objetivo dos projetos para a formação
desse público: se for para lotar, a ênfase no marketing deve ser maior, mas se o foco é a
formação do público, a educação ainda é o melhor caminho.
As políticas públicas para democratização da cultura ainda não são eficientes, embora
tenham melhorado bastante nos últimos 5 anos. Leis de incentivo à cultura como a Lei
Rouanet, na qual empresas e pessoas físicas investem parte do seu Imposto de Renda em
projetos culturais, têm aumentado a produção cultural em todo o país, mas orquestras e grupos
de música erudita têm encontrado pouco apoio. A música de concerto, como produção
cultural, ainda é considerada pela maioria da população como uma produção feita apenas para
elite e apreciada apenas por quem tem algum conhecimento musical. Tobias (2012) afirma
11
que essa música é elitizada por não pertencer às tradições folclóricas. Isso afeta o momento da
captação de recursos, pois empresas querem ver suas marcas em grandes eventos e os
concertos não são vistos como populares.
A Orquestra Sinfônica da UFRN é um projeto que conta com investimentos além dos
da própria Universidade, como é o caso da parceria com o SESC/RN e outros projetos
aprovados em editais como a FUNARTE (prêmio de apoio a orquestras para compra de
instrumentos musicais) e BNB (circulação de concertos didáticos com repertório brasileiro).
A OSUFRN é um projeto de extensão da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte e é formada por alunos dos cursos técnico, graduação e pós-graduação. É um projeto de
caráter pedagógico, visando a formação dos músicos para o mercado de trabalho. Dentro da
perspectiva pedagógica, ainda é requisito a formação de público para música de concerto,
através dos concertos didáticos realizados durante toda a temporada, atendendo aos alunos das
escolas públicas e privadas da cidade de Natal. A orquestra tem atuado diretamente em 3
frentes:
a) Concertos Didáticos: Através de projetos didáticos pode-se articular a interação do
público com a orquestra, despertando a curiosidade, o interesse e o gosto pelo repertório. A
OSUFRN realiza concertos didáticos todos os anos, voltados para o público infantil, em que
toda a apresentação é voltada para mostrar o universo da orquestra para as crianças. O
processo de educação musical acontece quando elas entram na sala de concerto e escutam as
peças, aprendem sobre cada um dos instrumentos e o repertório, tendo espaço para perguntas
e para a experiência de reger o grupo.
b) Projeto Parcerias Sinfônicas: Difundir a música de concerto neste cenário cultural
tem sido um desafio para os que atuam na área. Alguns projetos de difusão da música de
concerto usam estratégias diferenciadas quando conseguem recursos para tal. É o caso do
Projeto “Parcerias Sinfônicas” do SESC/RN. A primeira edição do projeto foi feita em
parceria com a Orquestra Sinfônica da UFRN (OSUFRN) no ano de 2011 com um repertório
de clássicos da música popular brasileira. Nos dois anos seguintes outras duas edições
levaram ao público músicas de Luiz Gonzaga (Parcerias Sinfônicas 2012) e Vinícius de
Moraes (Parcerias Sinfônicas 2013), com uma orquestra sinfônica executando esse repertório
acompanhada de cantores e de uma banda base1. Tal projeto é uma proposta para chamar a
atenção do público para a orquestra e, consequentemente, para a música de concerto. Ao
1 Banda Base é uma banda formada para acompanhar a orquestra em repertórios geralmente populares, composta
de instrumentos que normalmente não estão presentes em uma orquestra sinfônica. São eles: teclado, contrabaixo
elétrico, bateria e guitarra elétrica.
12
contrário do que se espera do público que assiste a esse tipo de espetáculo, por meio deste
projeto, muitos buscaram conhecer a OSUFRN em concertos com repertório erudito.
A Orquestra Sinfônica da UFRN, em parceria com o SESC/RN, através do projeto
Parcerias Sinfônicas, vem realizando uma série de Concertos ao longo dos últimos 3 anos.
São espetáculos de música popular que levam o universo de uma orquestra sinfônica ao
público, com um repertório popular. O projeto, que já rendeu prêmios por voto popular e
aproximou o público da orquestra, trazendo-o para os concertos com repertório erudito.
Tobias (2012) afirma em seu artigo: “Música erudita: a formação de um novo público” que
esta é uma forma de hibridação, em que o erudito e o popular andam juntos, pensado por
alguns como um “poder inovador”. Existe uma preocupação em difundir o erudito e o
popular. Deve-se levar em conta que ao colocar os dois em diálogo nem um perde sua
referência: o erudito não deixa de ser tradicional e o popular não perde sua força, mas os dois
ganham ao trabalhar em conjunto, inserindo a música em um cenário mais democrático.
Canclini (2003, pg.19) (apud TOBIAS, 2008, p. 16) define o hibridismo: “Entendo por
hibridação processos socioculturais nos quais estruturas ou práticas discretas, que existiam de
forma separada, se combinam para gerar novas estruturas...”. Como o Projeto Parcerias
Sinfônicas já utiliza esse viés da hibridação, que traz um repertório popular sendo executado
por uma orquestra sinfônica, decidimos seguir o da educação, que nos permite levar ao
público conteúdos musicais de forma mais direta, utilizando a Palestra Pré-Concerto como
ferramenta de educação musical.
c) Concertos Oficiais: São concertos que acontecem durante toda a temporada,
trazendo para o público um repertório apenas de música erudita e contando com solistas e
maestros convidados.
Considerando que não se pode pensar apenas no público infantil, mas sem desvalorizar
o trabalho feito com o mesmo, o maestro e professor da UFRN, André Muniz, pensou e
colocou em prática outro projeto: a Palestra Pré-Concerto. São palestras realizadas sempre
uma hora antes dos concertos oficiais da orquestra e que trazem ao público uma aula de
apreciação musical sobre o repertório executado no concerto. Essas palestras mostram uma
parte do universo musical dentro de perspectivas históricas e musicais, contextualizando as
obras e seus compositores, aproximando assim crianças, jovens e adultos desse repertório,
provocando curiosidade, interesse, gosto e conquista (TOBIAS, 2012).
Dentro dessa proposta de educação musical, iniciou-se o projeto da Palestra Pré-
Concerto, com o objetivo de levar ao público uma mostra do repertório executado em cada
concerto através de palestras de apreciação musical, nas quais o público interage com os
13
aspectos musicais e históricos do repertório pré-determinado para o concerto. Swannwick
(2002) mostra a necessidade de identificar quando se está ouvindo música apenas como fundo
musical ou a música por ela mesma, entendendo a apreciação musical como ferramenta de
formação de ouvidos críticos e reflexivos. Essa pesquisa foi conduzida nesse sentido,
utilizando a palestra como ferramenta de educação musical na intenção de despertar as
mesmas curiosidades, os mesmos interesses e gostos que as crianças têm a oportunidade de ter
nos concertos didáticos.
De acordo com Queiroz (2005), a educação musical tem passado por um processo de
(re)definição e isso tem colaborado para que as práticas pedagógicas se relacionem com a
produção da música enquanto expressão artística e cultural. Podemos então destacar o papel
do educador musical atuando juntamente com artistas e orquestras com o intuito de formar um
público consciente musicalmente, trazendo ferramentas de educação que despertem o
interesse destes.
A pesquisa tem como objetivo testar a eficiência da Palestra Pré-Concerto como
ferramenta de educação para a formação de público, utilizando o questionário aplicado logo
após o concerto como método de avaliação.
14
2 MÉTODO
Ao pensarmos esta pesquisa nos deparamos com várias perguntas importantes para o
andamento do trabalho: qual será o público alvo? Como chegaremos neste público? Como
faremos a avaliação? Diante dessas perguntas decidimos incluir o público que frequenta os
concertos da Orquestra Sinfônica da UFRN e assiste às palestras. Aproveitamos dois
concertos oficiais: um realizado no dia 15 de março de 2014 e o outro no dia 27 de setembro
do mesmo ano.
As palestras foram estruturadas a partir do repertório escolhido para os concertos e o
público presente foi de 129 pessoas das 500 que assistiram à apresentação. Para a avaliação da
eficácia da palestra foi elaborado um questionário para a caracterização do público, incluindo
sua formação musical e sua auto-percepção em termos de conhecimentos musicais e o
impacto da palestra durante a apreciação do concerto. As duas primeiras partes foram
respondidas ainda antes do concerto e, ao final deste, a parte de avaliação da palestra.
2.1. PALESTRA PRÉ-CONCERTO
As Palestras Pré-Concerto foram realizadas respectivamente nos dias 15 de março e 27 de
setembro de 2014, às 19h, uma hora antes dos concertos Oficiais da Orquestra Sinfônica da
UFRN na temporada de 2014. Desde o início do projeto das palestras, os responsáveis em
preparar o material e ministrar as palestras sempre foram o maestro e diretor artístico André
Muniz e seus assistentes de regência. Ao escolhermos a palestra como ferramenta desta
pesquisa foi me dada a oportunidade de elaborar e ministrar as palestras, como parte
importante no processo da minha formação como educadora musical. Aproveitamos como
ferramentas na palestra alguns áudios das obras e também contamos com a presença dos
solistas executando um trecho do repertório. Outro momento bem importante foi a presença
da compositora, Professora Heather Dea Jennings, que pôde explicar um pouco dos elementos
da sua obra.
O primeiro momento foi, através da decisão do repertório pela comissão artística da
orquestra, pesquisar o material para a palestra. O repertório do primeiro concerto foi: Sinfonia
nº 5 de L.V. Beethoven, Abertura da Ópera “Cosi fan tutti” de Mozart e o Concerto nº1 para
piano e orquestra, também de Beethoven. O segundo concerto teve as peças: Concerto para
Clarinete e Orquestra de L. Spohr, Capricho Italiano de P. I. Tchaikovsky e a estreia da peça
Scintillations, da professora da Escola de Música da UFRN, Heather Dea Jennings. As
abordagens escolhidas foram:
15
Formas de ouvir (corpo, sentimento, razão);
Estrutura (repetição x contraste);
Motivo (células da música);
Curiosidades históricas.
2.1.1. FORMAS DE OUVIR
MORAES (1991) nos apresenta três principais formas de ouvir música. Utilizamos
essas formas para iniciar cada uma das palestras:
a) Ouvir com o corpo, que é quando empregamos não só os ouvidos, mas todo o
nosso corpo, que “vibra ao contato com o dado sonoro”. Quando ouvimos ritmos
como o forró ou samba temos nosso corpo geralmente impulsionado a dançar,
transformando a música em movimento que pode ser visto. É um modo de ouvir
música sem muitas vezes escutá-la diretamente.
b) A segunda forma de ouvir é a emocional, deixamos de lado a sensação corporal e
entramos no campo das emoções. Algumas músicas nos remetem a lembranças e
sentimentos. Podemos ouvir uma música que nos deixa triste ou alegre ao ser
associada a alguma memória. Como diz Moraes, “ouvir emotivamente, no fundo,
não deixa de ser ouvir mais a si mesmo do que propriamente a música.”
(MORAES, 1991, p.65).
c) Ouvir música intelectualmente é entendê-la como linguagem que não
necessariamente quer expressar nada além de sua própria estrutura. É entender
que ela tem uma estrutura, uma maneira de organizar seus elementos, e uma
forma, sendo essa a soma dos aspectos gerais da estrutura musical. Entender o
funcionamento dessa linguagem pode provocar o prazer estético, um tipo de
emoção diferente que nos faz atentar para essa construção musical. (MORAES,
1991, p. 68).
Essas três formas de ouvir apresentadas proporcionam uma visão ao público de que
podemos ter prazer em cada uma ou nas três formas ao mesmo tempo durante a apreciação de
uma música, sendo ela popular ou erudita. A palestra reforça a dimensão do prazer racional,
despertando a conscientização da coerência interna do discurso musical. Ao apresentarmos a
estrutura das obras executadas, bem como seus movimentos, despertamos o ouvido do público
a pensar durante a apreciação. Não que ouvir apenas não seja proveitoso, mas despertar esse
interesse por músicas mais densas e com uma estrutura mais complexa pode trazer esse prazer
16
antes desconhecido. “Uma escuta concentrada e dirigida seguramente desvenda muito do que
está escondido, e leva a uma maior satisfação em ouvir, além de auxiliar na construção do
conhecimento musical.” (ZAGONEL, 2008, p. 15).
Notamos essas formas de ouvir nas peças apresentadas nos concertos. Na Sinfonia nº
5, por exemplo, o primeiro movimento é o que exige um pouco mais de esforço do ouvinte
para entender sua estrutura, usando bastante da forma racional de ouvir a música. O segundo
movimento é mais lento, mais contemplativo. Ajuda o ouvinte a descansar um pouco sua
mente e trabalha mais com a emoção. Já o terceiro movimento remete ao ouvinte uma dança
ou brincadeira, mostrando um pouco da forma de ouvir música com o corpo. Podemos notar a
mesma situação no Concerto para Clarinete e Orquestra de L. Spohr.
2.1.2. ESTRUTURA
Em música entendemos forma como a maneira que o compositor busca o equilíbrio
em suas ideias musicais. Seria a maneira como o compositor projeta e constrói sua música
(BENNETT, 1986).
Um compositor dificilmente usa apenas uma ideia na construção de sua obra. Já uma
música com uma sequência de ideias, cada uma diferente da outra, se torna cansativa.
Podemos perceber que a música usa muito da nossa memória e é quando o compositor
encontra o equilíbrio entre a repetição de uma ideia com ideias novas, contrastantes, que ela
realmente tem um efeito no ouvinte.
Especialmente nos terceiros movimentos do Concerto nº1 para piano e orquestra de
Beethoven e do Concerto para Clarinete e Orquestra de L. Spohr, apresentamos a forma
Rondó. Vimos a relação entre a repetição e o contraste quando nesta forma temos uma ideia
principal (A), que fica sempre retornando em contraste com ideias novas (B e C).
Nos primeiros movimentos da Sinfonia nº 5 de L.V. Beethoven e do Concerto para
Clarinete e Orquestra de L. Spohr, transmitimos uma introdução à forma-sonata. Esse termo
foi emprestado do gênero sonata para os primeiros movimentos de sinfonias e concertos. É
uma estrutura que permite sustentar o interesse do ouvinte por um período de tempo maior.
Segundo ROSEN (1988), podemos pensá-la como uma trama com ideias musicais, divida em
três momentos:
a) Exposição: o compositor nos apresenta um conflito entre dois temas em tonalidades
diferentes.
17
b) Desenvolvimento: momento em que esse conflito é intensificado. O compositor utiliza
de estratégias que alteram os temas (fragmentação, variação, modulação) gerando
tensão.
c) Reexposição: os temas são apresentados na mesma tonalidade, resolvendo assim o
conflito.
Proporcionar informações como essas ao público pode transformar seu momento de
apreciação do concerto, fazendo-o perceber ativamente a estrutura da música.
2.1.3. MOTIVO
O motivo na música é um fragmento, uma célula musical que dá coerência aos temas e
a toda a obra, porque se repete constantemente Na Sinfonia nº 5 de L.V. Beethoven, percebe-
se isso com uma clareza ímpar, uma vez que o compositor constrói todo o primeiro
movimento com uma única célula musical.
Também no primeiro movimento do Concerto para Clarinete e Orquestra de L. Spohr,
notamos o motivo, mas ele faz algo diferente: cria os dois temas com base nesse mesmo
motivo, que é um trecho com 5 notas presentes no primeiro (figura 1) e segundo (figura2)
temas. Podemos notar as diferenças sutis entre os dois motivos: as duas últimas notas do
primeiro em movimento descendente e as duas últimas do segundo em movimento ascendente
e a tonalidade dos dois. Vale salientar que o trecho do segundo motivo se trata do que foi
escrito para o clarinete, que soa um tom abaixo.
Figura 1 - Exemplo musical do motivo no 1º tema – Concerto para Clarinete e Orquestra de L. Spohr
Fonte: L. Spohr . Concerto para Clarinete e Orquestra (cc. 15 e 16, violino 1).
18
Figura 2 - Exemplo musical do motivo no 2º tema - Concerto para Clarinete e Orquestra de L. Spohr.
Fonte: L. Spohr . Concerto para Clarinete e Orquestra (cc. 93 4 94, clarinete solo)
2.1.4. CURIOSIDADES HISTÓRICAS
A Abertura da Ópera “Cosi fan tutti” de Mozart nos traz um material histórico bem
interessante. É importante saber que, na época do compositor, as aberturas de óperas eram
feitas descrevendo os principais personagens, mas nesse caso específico, a abertura era
utilizada para avisar os ouvintes de que a ópera estava para começar e que eles deviam tomar
seus lugares. Foi também uma das últimas óperas de Mozart.
Uma curiosidade também interessante é sobre o Concerto para Clarinete e Orquestra
de L. Spohr. Ele escreveu 4 concertos para clarinete e esse foi o primeiro. Na época era
praticamente impossível a execução deste concerto, pois o instrumento não tinha chaves
suficientes para todas as notas. Spohr era violinista e isso pode ter influenciado a sua escrita
para o clarinete, percebendo-se pouco espaço para o solista respirar. O público pode ter uma
pequena amostra do que seria para o solista executar um trecho da obra, mostrando a
dificuldade de respiração que o clarinetista tem em uma obra escrita por um violinista, que
não usa diretamente sua respiração para tocar seu instrumento. Spohr escreveu trechos longos
com várias notas sem espaço para o solista respirar, exigindo bastante estudo e preparo do
mesmo.
2.2. QUESTIONÁRIO
A formação do educador musical engloba várias competências, entre elas a capacidade
de organizar e dirigir as situações de aprendizagem (PERRENOUD, 2000, p. 21 e 22), sejam
elas em sala de aula da educação básica ou mesmo em palestras de apreciação musical, como
é o caso da Palestra Pré-Concerto. Seguindo este pensamento, a organização deste trabalho,
assim como a elaboração da palestra, foram pensadas de forma a criar situações de
19
aprendizagem eficazes com explicações sobre o repertório e utilizando as perguntas do
questionário como instrumento avaliador deste processo.
Ao aplicarmos o questionário ao fim do concerto, depois de o púbico ter colocado em
prática alguns dos ensinamentos aprendidos na palestra, foi possível avaliar se a mesma teve o
efeito desejado, que é o de contribuir com a formação musical deste público.
O questionário foi pensado e elaborado em 2 partes:
Caracterização do público e seus conhecimentos musicais;
Influência da Palestra.
A primeira parte consistiu em classificar o público nos seguintes aspectos: sexo, faixa
etária, escolaridade e classe social. Este último item foi baseado na tabela da ABEP
(Associação Brasileira de Estudos Populacionais) 2012.
Os conhecimentos musicais foram avaliados com perguntas sobre a formação musical,
qual a origem do interesse por música, qual a frequência que assiste a concertos, qual o nível
de conhecimento musical e quais tipos de música mais gosta de ouvir.
Por último o questionário visava avaliar de qual modo a palestra influenciou a relação
do público com o concerto, o quanto a palestra contribuiu para tornar o concerto mais
agradável, quais os aspectos da palestra foram mais úteis durante o concerto e de como eles
avaliaram a apresentação geral da palestra.
2.3. PARTICIPANTES
Os participantes desta pesquisa foram aqueles que compareceram voluntariamente às
palestras, sem qualquer segmentação prévia de perfil, tendo respondido posteriormente aos
questionários. Contamos com a presença de 82 pessoas assistindo a primeira palestra, mas a
quantidade de questionários válidos (respondidos de forma correta e completa) foi de 74. Já
na segunda palestra contamos com a presença de 59 pessoas com 55 questionários válidos,
somando um total de 129 questionários.
2.4. PROCEDIMENTOS
As Palestras aconteceram nos dia 15 de março de 2014, às 19h e no dia 27 de setembro
de 2014, também às 19h, na Escola de Música da UFRN. O público foi convidado através do
cartaz de divulgação2 do concerto da Orquestra Sinfônica da UFRN, feita através de redes
2 Ver cartaz de divulgação dos concertos nos Anexos.
20
sociais (lista de e-mails, Facebook) e meios de comunicação, como televisão e rádio, em que
constava data, horário e local da palestra. Ao chegar à Escola de Música, o público foi
direcionado à sala 24, onde ocorreu a palestra.
No primeiro momento o maestro André Muniz fez a apresentação da pesquisadora e
da pesquisa, para que o público soubesse qual o objetivo final da palestra. As palestras foram
apresentadas e ao final a forma de responder o questionário foi explicada: a primeira parte do
questionário (frente) deveria ser respondida antes de começar o concerto e a segunda parte
deveria ser respondida ao final do concerto. Portanto, o público deveria levar o questionário
consigo e, ao final, responder as questões que diziam respeito à palestra e influência desta
durante o concerto. Notamos que a resposta do público à pesquisa foi bastante favorável
quando, ao final dos concertos, 129 pessoas devolveram seus questionários preenchidos.
21
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. CARACTERIZAÇÃO DO PÚBLICO
A Tabela 01 abaixo nos traz os dados gerais do público participante desta pesquisa.
Para a definição da classe social utilizamos a tabela da ABEP (Associação Brasileira de
Estudos Populacionais) 2012.
Tabela 1 - Caracterização do Público
PALESTRA 01 - 15/03/2014
74 Participantes
PALESTRA 02 - 27/09/2014
55 Participantes
Sexo
Masculino 40 (54%) 27 (49%)
Feminino 34 (46%) 28 (51%)
Faixa Etária
0 a 13 anos 4 (6%) 6 (11%)
14 a 20 anos 11 (15%) 3 (5%)
21 a 39 anos 35 (50%) 26 (47%)
40 a 59 anos 17 (24%) 16 (30%)
60 anos ou mais 3 (5%) 4 (7%)
Escolaridade
Ensino fundamental incompleto 4 (6%) 7 (13%)
Ensino fundamental completo 3 (4%) 2 (3%)
Ensino médio incompleto 4 (6%) 0%
Ensino médio completo 10 (13%) 6 (11%)
Nível superior incompleto 18 (24%) 12 (22%)
Nível superior completo 35 (47%) 28 (51%)
Classe Social
A1 3 (4%) 9 (16%)
A2 9 (12%) 3 (6%)
B1 15 (21%) 9 (16%)
B2 26 (35%) 12 (22%)
C1 12 (16%) 14 (25%)
C2 3 (4%) 6 (11%)
D 4 (5%) 2 (4%)
E 2 (3%) 0%
22
Quanto aos conhecimentos musicais, verificamos dados importantes que nos ajudaram
a caracterizar este público. Podemos verificar a Tabela 02 a comparação entre os participantes
das duas palestras.
Tabela 2 - Conhecimento musical
PALESTRA 01 -
15/03/2014
PALESTRA 02 -
27/09/2014
Qual a sua formação
musical?
Nenhuma formação 37 (50%) 28 (51%)
Poucas aulas de música 12 (16%) 11 (20%)
Curso livre 18 (24,5%) 5 (9%)
Curso técnico 4 (5,5%) 7 (12%)
Curso Superior 3 (4%) 4 (8%)
Qual a origem do seu
interesse por música? (várias
marcações por participante)
Amigos/Família 33 34
Mídias (TV, Internet) 27 12
Bandas de música 25 16
Igreja 16 14
Outros 10 8
Numa escala de 1 a 7, como
você avalia seus
conhecimentos musicais?
1 17 (23%) 11 (20%)
2 9 (13%) 8 (14,5%)
3 17 (23%) 16 (29%)
4 23 (30%) 13 (24%)
5 4 (5%) 2 (4%)
6 2 (3%) 2 (4%)
7 2 (3%) 2 (4%)
Com que frequência você vai
a concertos?
Essa foi a 1ª vez 15 (21%) 7 (12%)
Menos de 2 vezes por ano 26 (35%) 12 (22%)
De 2 a 5 vezes por ano 23 (30%) 25 (44%)
Mais de 5 vezes por ano 10 (14%) 12 (22%)
23
Que tipo de música você
gosta de ouvir? (várias
marcações por participante)
MPB 46 37
Clássica 43 40
Rock 39 30
Jazz 23 22
Cultura popular 14 18
Outro (gospel, eletrônica) 12 8
Forró 9 14
Samba/Pagode 7 10
Sertanejo 5 6
Funk 2 1
Algumas informações importantes sobre os participantes foram destacadas nos
gráficos abaixo.
Sobre a formação musical podemos destacar no gráfico abaixo que 50% das pessoas
não possuía nenhuma formação, conforme a figura 03. O restante foi distribuído desde cursos
livres até o ensino superior. O gráfico representa a junção dos dados das duas palestras.
Figura 3 - Formação musical dos participantes da Palestra Pré-Concerto
Fonte: A autora (2014)
24
Ao verificarmos a origem do interesse por música, percebemos que várias pessoas
marcaram mais do que uma opção. Mesmo esperando apenas uma marcação, optamos por
considerar a questão como fator importante sobre o público presente, que mostrou que
amigos/família e as mídias têm influenciado seu interesse pela música de concerto, sem
desconsiderar outros ambientes importantes, como as bandas de música e igrejas.
Outro fator verificado foi o nível de conhecimento musical dos participantes, na forma
de autoavaliação, situando em uma escala de 1 a 7 o seu nível de conhecimento musical.
Notamos, na figura 04 que a maioria avalia seu conhecimento nos níveis de 1 a 4, com 30%
marcando o nível 4. O gráfico representa a junção dos dados das duas palestras.
Figura 4 - Nível de conhecimento musical dos participantes da Palestra Pré-Concerto
Fonte: A autora (2014)
Ao avaliarmos a frequência aos concertos podemos verificar na Figura 05 que 17%
das pessoas estavam assistindo a um concerto pela primeira vez e também 17% frequentam
concertos mais de 5 vezes ao ano. O gráfico representa a junção dos dados das duas palestras.
25
Figura 5 - Frequência em concertos dos participantes da Palestra Pré-Concerto
Fonte: A autora (2014)
Por último, perguntamos ao público qual o tipo de música eles mais gostavam,
podendo marcar até 03 opções. MPB, Música Clássica e Rock foram as mais marcadas.
A última Tabela 3, nos mostra as respostas do público sobre a Influência das Palestras
e os aspectos que mais lhe foram úteis, além de avaliar a apresentação da palestra.
26
Tabela 3 – Palestras
PALESTRA 01 -
15/03/2014
PALESTRA 02 -
27/09/2014
De que modo a palestra
influenciou a sua relação com o
concerto?
Dificultou minha relação com a
música 0 0
Não fez diferença 2 (1,5%) 3 (5,5%)
Melhorou minha relação com a
música 72 (98,5%) 52 (94,5%)
Em uma escala de 1 a 7, em que
nível a palestra contribuiu para
tornar o concerto mais agradável?
1 0 1 (1,5%)
2 0 1 (1,5%)
3 3 (4%) 3 (5,5%)
4 10 (14%) 9 (16,5%)
5 24 (32%) 13 (23,5%)
6 14 (19%) 13 (23,5%)
7 23 (31%) 15 (28%)
Quais aspectos mencionados na
palestra lhe foram mais úteis
durante o concerto? Marque no
máximo 2.
Formas de ouvir (corpo,
sentimento, razão) 44 35
Forma (ideias repetidas x novas /
repetição x contraste) 42 27
Curiosidades Históricas 27 16
Motivos (células da música) 18 11
Como você avalia a apresentação
da palestra?
Péssima 0 0
Ruim 0 0
Regular 1 (1%) 2 (3,5%)
Boa 18 (25%) 11 (20%)
Ótima 26 (35%) 20 (36,5%)
Excelente 29 (39%) 22 (40%)
27
3.2. CRUZAMENTO DE DADOS
Ao avaliarmos os dados gerados pela pesquisa, podemos perceber a caracterização do
público presente na palestra, seus conhecimentos e gostos musicais. Alguns fatores se
destacaram, nos ajudaram a verificar quais aspectos da palestra foram mais importantes e
quais podem ser melhor trabalhados em palestras futuras.
Um fator muito importante para esta pesquisa foi saber qual a origem do interesse por
música do público. Ter esse conhecimento ajuda a mostrar quais áreas ainda merecem a
atenção quanto à divulgação dos concertos e palestras, a fim de atingir um público maior e
diversificado. Amigos e familiares dos músicos que compõem a orquestra são maioria, e isso
é importante, mas buscarmos alternativas para atingir outros públicos ajudará na
democratização do acesso à cultura, especialmente à música de concerto, que ainda é pouco
conhecida e apreciada.
Uma análise especial foi o cruzamento das seguintes perguntas do questionário: Qual a
sua formação musical? x Em uma escala de 1 a 7, em que nível a palestra contribuiu para
tornar o concerto mais agradável? Para fazermos essa análise o público foi divido em 3
grupos: a) pessoas com nenhuma formação musical; b) pessoas com poucas aulas de música e
com curso livre de música; c) pessoas com curso técnico e superior em música. Na figura 06
temos o seguinte gráfico:
Figura 6 - Pessoas sem nenhuma formação musical x Em uma escala de 1 a 7, em que nível a palestra
contribuiu para tornar o concerto mais agradável?
Fonte: A autora (2014)
28
Podemos perceber pela Figura 06 que a maioria das pessoas que disseram não ter
nenhum conhecimento musical marcou que a palestra influenciou de forma positiva sua
relação com o concerto, ajudando-os a entender e apreciar melhor o repertório executado.
Dentro da escala de 1 a 7, 48 pessoas marcaram do nível 5 ao 7, mostrando um resultado
positivo nessa amostra do público pesquisado. Sendo o objetivo da pesquisa trabalhar a
formação de público para a música de concerto, verificar que parte do público formado por
pessoas leigas musicalmente teve uma boa resposta à palestra nos mostra que é uma
ferramenta útil e eficaz para este objetivo.
Koellreutter (1998, p.39-45) nos traz a seguinte reflexão sobre a importância da
educação musical não direcionada apenas para a profissionalização de musicistas, que é um
dos objetivos da palestra:
...aceitando a educação musical como meio que tem a função de desenvolver a
personalidade do jovem como um todo; de despertar e desenvolver faculdades
indispensáveis ao profissional de qualquer área de atividade, como, por exemplo, as
faculdades de percepção, as faculdades de comunicação, as faculdades de
concentração (autodisciplina) [...] as faculdades de discernimento, análise e síntese,
desembaraço e autoconfiança, a redução do medo e da inibição causados por
preconceitos, o desenvolvimento de criatividade, do senso crítico, do senso de
responsabilidade, da sensibilidade de valores qualitativos e da memória,
principalmente, o desenvolvimento do processo de conscientização do todo, base
essencial do raciocínio e da reflexão.
No segundo gráfico percebemos, conforme a figura 10, a relação das pessoas que
fizeram poucas aulas de música ou curso livre com a palestra. A palestra também teve efeito
positivo para esse grupo. A maioria marcou entre o nível 5 e o nível 6.
Figura 7 - Pessoas com poucas aulas de música ou curso livre x Em uma escala de 1 a 7, em que nível
a palestra contribuiu para tornar o concerto mais agradável?
Fonte: A autora (2014)
29
E por último, avaliamos a relação que pessoas com curso técnico ou superior em
música tiveram com a palestra. Vale salientar que essas pessoas representam 14% do público
presente nas palestras, mas ainda assim 15 das 18 pessoas mostraram que a influência foi
positiva, considerando seus conhecimentos musicais e marcando dos níveis 5 ao 7.
Outro dado importante que verificamos no questionário foi a frequência em concertos
do público que compareceu à palestra. Notamos, principalmente, que pessoas com nenhuma
formação musical dizem manter uma frequência de assistir até 2 concertos por ano, em sua
maioria. Mas também uma quantidade considerável estava ali pela primeira vez. A Palestra
Pré-Concerto tem aumentado seu público estreante em concertos de forma considerável,
aproximando as pessoas da música de concerto e da própria orquestra. Ao compararmos a
frequência aos concertos das pessoas sem nenhuma formação musical com a das pessoas que
têm pouco conhecimento, curso livre, técnico ou superior, podemos ver que a frequência
destes últimos aumenta consideravelmente, mostrando que a maioria vai a concertos até 5
vezes por ano e que o número de pessoas que vão mais do que 5 vezes é o dobro comparado
às pessoas sem formação musical.
Um dos maiores desafios do educador musical é deselitizar o acesso à música e ao
ensino da mesma para que se chegar a uma educação inclusiva. A música erudita sempre foi
de difícil acesso às classes mais baixas, considerada de elite por não fazer parte das
manifestações populares. Tobias (2008) nos alerta para um novo fenômeno: a ampliação do
acesso das classes menos favorecidas a esse mundo, antes restrito às classes mais favorecidas.
Um cruzamento de dados importante desta pesquisa nos mostra isso. Ao analisarmos a
frequência aos concertos comparando as classes sociais dos participantes, notamos que apesar
das pessoas das classes mais favorecidas frequentarem mais de 5 concertos por ano e ser o
grupo de maior destaque, o grupo de pessoas das classes mais baixas tem tido uma frequência
de até 5 concertos por ano, superando a quantidade de pessoas a estarem ali pela primeira vez.
Embora o gráfico nos mostre que ainda temos uma grande parcela da elite a frequentar estes
eventos o número de pessoas das classes C, D e E presentes na segunda palestra foi 15%
maior do que na primeira.
30
Figura 8 - Frequência aos concertos x Classe Social
Fonte: A autora (2014)
A escolaridade dos participantes em comparação com os aspectos da palestra que
foram mais úteis durante o concerto se destacou como um dado interessante. A porcentagem
de pessoas que marcaram que os Motivos foram mais úteis foi de 16% enquanto apenas 6%
das pessoas com nível fundamental e médio marcaram essa opção. Mais pessoas também com
nível superior marcaram que a estrutura da música (repetição x contraste) foi mais importante
durante a apreciação do concerto, com 39% das marcações. As formas de ouvir, conteúdo
mais próximo do cotidiano e, portanto, de mais fácil compreensão, foram mais importantes
para as pessoas com nível fundamental e médio, com 48%. Podemos entender que pessoas
com acesso a uma educação universitária, com uma formação mais crítica e reflexiva de
conteúdos tendem a considerar aspectos técnicos e complexos mais importantes.
Importante notar também que, mesmo com nível superior em diversas áreas, boa parte
deste grupo, 42%, declarou não ter nenhuma formação musical anterior.
31
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao discutirmos sobre qual o propósito da formação de público, podemos perceber que
essas palestras têm o objetivo de trabalhar a formação humana desse público, contribuindo
para torná-los ouvintes ativos e críticos. A busca pela palestra por um público em sua maioria
sem nenhuma formação musical aponta que a sua curiosidade foi de alguma forma despertada
e deve ser aproveitada da melhor forma possível.
Apesar de trabalharmos com um público não controlado, contando apenas com as
pessoas que compareceram aos concertos, tivemos uma amostra significativa ao realizarmos a
pesquisa em duas palestras. O repertório do concerto foi pré-determinado, o que não impediu
a elaboração de uma palestra com conteúdo musical importante para os participantes. A
Palestra Pré-Concerto pode se tornar projeto efetivo também de outras apresentações
realizadas na Escola de Música, não apenas as da Orquestra Sinfônica, pensando em articular
os conteúdos com a prática dos alunos dos cursos de Licenciatura, Bacharelado e Pós-
Graduação da UFRN. Outro fator importante foi que, a parte do questionário em que
avaliamos a palestra deveria ser respondida após o concerto, o que poderia causar a não
entrega dos questionários, debilitando a pesquisa. Apesar disso, as respostas aos questionários
foram bem aproveitadas e tivemos um público na palestra que foi de 1/3 dos que assistiram ao
concerto, com 129 das 141 presentes devolvendo o questionário devidamente respondido.
A interação do educador musical nesse contexto pode ser bem aproveitada trazendo
ferramentas da educação musical para o universo orquestral e atuando diretamente com o
público.
Podemos então concluir que a Palestra Pré-Concerto é uma ferramenta de educação
eficaz, despertando a atenção de um público anteriormente distante da música de concerto,
provocando a vontade de interação maior com esse repertório e ampliando seus
conhecimentos musicais.
32
REFERÊNCIAS
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Janeiro: Jorge Zahar Ed,. 1986.
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aprendizagem musical para formação de plateia. Trabalho de Conclusão de Curso
(Graduação) Curso de Licenciatura em Música à distância. Universidade de Brasília, 2011.
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musical. São Paulo: Peirópolis, 2001.
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dicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p.591
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diferentes espaços. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 2005 p. 49-65.cap.2.
ROSEN, Charles. Sonata Forms. New York: Norton & Company, 1988.
SWANWICK, K. Ensinando Música Musicalmente. São Paulo: Moderna, 2003.
TOBIAS, Amanda. Música erudita: a formação de um novo público. Artigo (Pós-
Graduação). Centro de Estudos Latino-Americanos sobre cultura e comunicação,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.
WILLIAMS, Raymond. Cultura. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
33
ZAGONEL, Bernadete. Pausa para ouvir música: um jeito fácil e agradável de ouvir música
clássica. Curitiba: Instituto Memória, 2008.