Pancreatite aguda MONOGRAFIA2

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TRIÂNGULO MINEIRO DEPARTAMENTO DE CIRURGIA PANCREATITE AGUDA Monografia destinada como requisito parcial à conclusão da Residência Médica em Cirurgia Geral, da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, para obtenção do título de especialização em Cirurgia Geral. Por: Paulo Anderson Bertulucci Orientador: Professor Alex Augusto Silva

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Transcript of Pancreatite aguda MONOGRAFIA2

UNIVERSIDADE FEDERAL DO TRINGULO MINEIRO DEPARTAMENTO DE CIRURGIA

PANCREATITE AGUDA

Monografia destinada como requisito parcial concluso da Residncia Mdica em Cirurgia Geral, da Universidade Federal do Tringulo Mineiro, para obteno do ttulo de especializao em Cirurgia Geral. Por: Paulo Anderson Bertulucci Orientador: Professor Alex Augusto Silva

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UBERABA 2008

Ttulo: Pancreatite AgudaBANCA EXAMINADORA TITULAO INSTITUIO MENO ASSINATURA

LOCAL: DATA:

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RESUMO O tratamento da pancreatite leve pouco mudou nos ltimos anos, mas os avanos no tratamento dos casos de pancreatite grave tm sido associados significativamente a reduo da morbidade e mortalidade. Melhorias no reconhecimento da doena grave com sistemas de pontuao e progressos em exames de imagem como a tomografia computadorizada tem permitido a instituio de terapia dirigida precoce. Agressiva ressuscitao fluida inicial e monitorizao hemodinmica so padres no manejo dos casos graves. H tambm um maior reconhecimento do papel dos antibiticos profilticos e, mtodos de imagem associados a puno tem se desenvolvido para diagnosticar a presena de infeco. Embora a indicao da necessidade de agressiva interveno nos casos de necrose pancretica infectada no tenha se alterado, o tratamento conservador inicial na maioria dos pacientes com necrose pancretica estril ganhou ampla aceitao. Alguns pacientes com necrose estril podero exigir desbridamento posterior quer por doena sistmica persistente ou por falta de melhora clnica. Para os pacientes que necessitam de desbridamento, as tcnicas cirrgicas abertas continuam a ser o padro-ouro do tratamento. Avanos tecnolgicos em cirurgia minimamente invasiva so uma promessa como adjuntos aos procedimentos abertos no futuro, especialmente como uma forma de retardar a cirurgia at que a necrose torne-se mais organizada. Descritores: pancreatite, diagnstico, tratamento, suporte nutricional, antibioticos. ABSTRACT The treatment of pancreatitis light has changed little in recent years, but advances in the treatment of severe pancreatitis have been associated with significantly reduction of morbidity and mortality. Improvements in the recognition of serious illness with score systems and progress in image examinations such as computed tomography has allowed the imposition of targeted therapy early. Aggressive fluid resuscitation and hemodynamic monitoring are patterns in management of severe cases. There is also greater recognition of the role of prophylactic antibiotics and methods of image associated with puncture has developed to diagnose the presence of infection. Although the indication of need for aggressive intervention in cases of infected pancreatic necrosis unchanged, the initial conservative treatment in most patients with pancreatic necrosis sterile won wide acceptance. Some patients with sterile necrosis may require subsequent debridement or by persistent systemic disease or lack of clinical improvement. For patients who require debridement, the open Surgeryical techniques are still the gold standard of treatment. Technological advances in minimally invasive Surgeryery is a promise as adjuncts to open procedures in the future, especially as a means to delay the Surgeryery until the necrosis becomes more organized. Keywords: pancreatitis, diagnosis, treatment, nutritional support, antibiotics.

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SUMRIO

1. INTRODUO .....................................................................................................................................................5 2. DEFINIES........................................................................................................................6 3. ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA.................................................................................7 4. DIAGNSTICO .................................................................................................................10 4.1. Histria e sinais clnicos...............................................................................................10 4.2. Exames laboratoriais...................................................................................................11 4.3. Exames de imagem.......................................................................................................12 5. DETERMINAO DA SEVERIDADE/PROGNSTICO............................................15 5.1. Sistemas de escore/tabelas...........................................................................................15 5.2. Marcadores biolgicos.................................................................................................17 6. PRINCPIOS DO TRATAMENTO..................................................................................19 6.1. Reanimao e monitoramento ...................................................................................19 6.2. Suporte nutricional......................................................................................................20 6.3. O papel da colangiografia endoscpica retrgrada .................................................21 6.4. Antibiticos ..................................................................................................................22 6.5. Tratamento cirrgico...................................................................................................24 6.6. Tcnicas minimamente invasivas ..............................................................................26 6.7. Outros tratamentos......................................................................................................27 7. CONCLUSO ....................................................................................................................29 8. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS..............................................................................30

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1. INTRODUO

Monografia de natureza bibliogrfica, aborda um dos temas de maior importncia e incidncia no cotidiano do cirurgio geral. Baseada em reviso literria sobre o tema, abordando, principalmente, as mais recentes alteraes no tratamento da pancreatite aguda, alm de versar sobre as etiologias da doena, seu diagnstico, sinais de severidade e as novidades relacionadas ao assunto.

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2. DEFINIES

A pancreatite aguda pode variar em gravidade, desde leve inflamao da glndula com processo autolimitado a necrose pancretica com altos ndices de morbidade e mortalidade. Na maioria dos casos, cerca de 80%, o processo limitado a leve edema parenquimatoso sem disfuno de rgos distantes e geralmente com recuperao total. A taxa de mortalidade global na pancreatite aguda varia de 2 a 10%, e est diretamente relacionado aos pacientes com a apresentao mais grave da doena. Aproximadamente 10 a 30% dos pacientes com doena pancretica grave evoluiro para necrose pancretica e peripancretica. A gravidade da resposta local pode conduzir ao desenvolvimento da sndrome da resposta inflamatria sistmica (SIRS), podendo inclusive cursar com falncia de mltiplos rgos, apresentando considervel morbidade e mortalidade. O tratamento dos doentes com pancreatite aguda leve geralmente bem definido e essencialmente limitado a identificao e gesto de fatores etiolgicos, ressuscitao fluda, cuidados e apoio. Doentes com pancreatite necrotizante grave exigem terapia intensiva, incluindo, possivelmente, desbridamento cirrgico agressivo de necrose pancretica infectada ou procedimentos para abordar outras complicaes locais da doena. As indicaes precisas para a cirurgia nestes pacientes so ainda controversas, embora nos ltimos anos muitos pesquisadores tenham adotado uma postura mais conservadora em relao interveno precoce .1,2

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3. ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

Cerca de 70 a 80% dos casos de pancreatite esto relacionados a litase biliar e uso de lcool. Em sua maior parte, o abuso de lcool por perodos prolongados est associado a pancreatite crnica com episdios de agudizao, enquanto a litase biliar est relacionada a episdios agudos. Em 10 a 15% dos casos h uma grande variedade de etiologias possveis (quadro 1). Em outros 10 a 15%, nenhuma etiologia pode ser identificada.

Quadro 1. Etiologias de pancreatite aguda Litase biliar Abuso de lcool Drogas CPRE Hipercalcemia Hiperlipidemia Idioptica Infeces Isquemia Parasitas Ps-operatria Picadas de escorpio Trauma Tumor pancretico Pncreas divisium Gestao Transplantes Infeco viral Cirurgia de abdmen superiorCPRE, colangiografia endoscpica retrgrada.

A litase biliar est relacionada a ocorrncia de pancreatite aguda quando um clculo responsvel por causar obstruo do ducto pancretico levando a hipertenso ductal e precipitando a pancreatite. A teoria do refluxo biliar, tambm conhecida como teoria do

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canal comum, que antes se acreditava estar relacionada a ocorrncia de pancreatite, tem sido questionada por experimentos que lanam dvidas sobre sua validade. Vrias teorias tem sido propostas para explicar os mecanismos pelos quais o abuso prolongado de lcool deva causar leso pancretica. Uma delas refere que o consumo de lcool promove hipertrigliceridemia e gerao de cidos graxos, assim como seus metablitos etilster que podem lesar o pncreas. Outra teoria sugere a formao de radicais livres intrapancreticos derivados do oxignio sendo capazes de produzir dano pancretico. Outros acreditam na leso direta do lcool sobre as clulas pancreticas acinares ou que isto promova secreo de suco pancretico com contedo elevado de enzimas proteolticas e baixo contedo de inibidores enzimticos. Isso poderia levar a precipitao protica com formao de rolhas intraductais, causando obstruo e hipertenso intraductal desencadeando a pancreatite. Tambm relata-se a ingesto etlica como causa de espasmo do esfncter de Oddi, podendo dessa forma desencadear pancreatite. Apesar de vrios estudos e teorias, ainda permanecem incertos os mecanismos pelos quais o abuso de lcool possa promover pancreatite. A exposio a determinadas medicaes pode ser descrita como talvez a terceira causa mais freqente de pancreatite. Entretanto os mecanismos pelos quais essas drogas causariam a pancreatite no so claros, e tambm podem ser divididas em grupos, como causas definidas de pancreatite, consideradas como provveis causadoras e como suspeitas de causar pancreatite (quadro 2).

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Quadro 2. Drogas associadas a pancreatite Causas definidas 5-aminossalicilatos 6-mercaptopurina Azatioprina Arabinosdiocitosina Dideoxinosina Diurticos Estrognios Furosemida Metronidazol Pentamidina Tetraciclina Tiazida Sulfametoxazol-trimetroprim cido valprico Causas provveis Acetaninofeno Alfa-metil-dopa Isoniazida L-asparaginase Fenformin Procainamida Sulindac

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4. DIAGNSTICO

Apesar dos avanos na compreenso da fisiopatologia da pancreatite e melhorias tecnolgicas diversas, as modalidades de diagnstico da pancreatite aguda no mudaram muito nos ltimos anos.

4.1. Histria e sinais clnicos

O diagnstico tem baseado-se na histria clnica e nveis sricos elevados das enzimas pancreticas. Sinais e sintomas clnicos, tais como dor em abdmen superior com irradiao para o dorso, geralmente do tipo descrito como faixa, de inicio abrupto e que se torna constante, podendo haver melhora com decbito lateral com joelhos fletidos ou ao inclinar o corpo para frente, e ainda vmitos, febre e taquicardia, so relativamente inespecficos. Os pacientes geralmente apresentam-se agitados, procurando uma posio mais confortvel. Taquipnia, taquicardia e hipotenso podem estar presentes e esto relacionados a hipovolemia causada pela perda de lquidos para o terceiro espao devido a influncia dos fatores inflamatrios. A dor abdominal e a dor pleurtica causada por contigidade podem levar a ocorrncia de atelectasias. Derrames pleurais tambm podem ser encontrados, sendo mais comum esquerda. Nos casos mais graves pode haver o desenvolvimento de leso pulmonar aguda, que pode se apresentar clinicamente como sndrome do desconforto respiratrio do adulto (SDRA). Ictercia pode estar presente nos casos de etiologia biliar por obstruo por clculos, ou ainda ocorrer pela prpria inflamao pancretica com compresso ductal ou por colestase pela prpria gravidade da doena. Sinais inflamatrios com irritao

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peritoneal podem ser percebidos. A ocorrncia de distenso abdominal com timpanismo devida ao leo paraltico associado a doena. palpao pode ser percebida massa abdominal epigstrica podendo refletir o pncreas inflamado e os tecidos adjacentes. A presena de hematomas periumbilical e de flanco pode ser observada na pancreatite necro-hemorrgica (sinais de Cullen e Grey-Turner respectivamente) mas so pouco freqentes e inespecficos para qualquer etiologia particular. O diagnstico em geral, depende de um alto nvel de suspeio clnica e demonstrao de elevadas concentraes plasmticas de enzimas pancreticas.

4.2. Exames laboratoriais

Os nveis de amilase e lipase tem pico dentro das primeiras 24 horas do incio dos sintomas, e a amilase tem uma meia-vida um pouco mais curta no plasma. Como resultado,os nveis de lipase tm uma sensibilidade um pouco maior que os nveis de amilase, particularmente quando medidos mais tarde, cerca de aps um dia do incio dos sintomas. 3 Entretanto, a hiperamilasemia no nem especfico para pancreatite,4 nem perfeitamente sensvel, pois tem sido descrita normoamilasemia5 na pancreatite aguda, at 10% dos pacientes com pancreatite letal podem apresentar amilase normal ou discretamente aumentada. Assim como pode estar elevada em uma srie de outras afeces (colecistite aguda, vscera oca perfurada, obstruo intestinal e infarto mesentrico). Elevaes persistentes aps uma semana podem indicar a presena de complicaes locais como pseudocisto, abscesso ou ascite pancretica. Outras enzimas pancreticas no demonstraram ter alguma vantagem a mais que a amilase e lipase para fins de diagnstico. Os nveis plasmticos de enzimas pancreticas servem puramente para diagnstico e no tem um papel prognstico; nveis absolutos no tm correlao direta com a gravidade da doena.

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4.3. Exames de imagem

Os exames de imagem podem ser auxiliares no diagnstico e podem revelar tambm outras causas para os sintomas dos doentes. Em cerca de 60% dos casos a radiografia simples de abdmen pode apresentar-se como normal. O achado mais freqente consiste na dilatao de segmento isolado de intestino delgado (ala sentinela). A presena de calcificaes pancreticas pode ser observada ocasionalmente. A radiografia de trax pode apresentar derrame pleural, mais comum esquerda, alm de freqentemente revelar atelectasia de bases e elevao diafragmtica por restrio respiratria. A ultrassonografia pode evidenciar a presena de litase biliar, podendo desse modo sugerir uma das possveis etiologias da doena. Tambm pode demonstrar alteraes pancreticas e presena de complicaes locais como colees fluidas, podendo inclusive, permitir seguimento seriado. O exame pode ser dificultado ou at inviabilizado quando h interposio gasosa devida ao leo que geralmente est associado aos quadros mais importantes de pancreatite. A tomografia computadorizada (TC) um importante adjuvante na determinao da gravidade da pancreatite aguda e particularmente til nos casos duvidosos.6 Achados tomogrficos em pancreatite incluem o aumento glandular com borramento da gordura peripancretica, reas de densidade diminuda e, ocasionalmente, a presena de colees fluidas. A presena de inflamao pancretica, peripancretica e colees fluidas foram incorporadas em sistemas de classificao, como o sistema de Balthazar, e estes resultados tm sido correlacionados com morbidade e mortalidade.7 O uso de contraste venoso bastante til na demonstrao de necrose pancretica, estando as reas sem reforo de contraste, relacionadas com necrose. A TC com contraste pode ser contra-indicada na presena de

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insuficincia renal ou uma histria de reao alrgica ao contraste intravenoso; embora TC sem contraste fornea informaes importantes, dados recentes apiam o uso da ressonncia nuclear magntica (RNM) como uma alternativa. Ressonncia nuclear magntica e tomografia possuem sensibilidade e especificidade comparveis para pancreatite aguda, 8 porm ainda no se determinou se a RNM mais prtica para doentes crticos. O momento de realizao do exame fonte de discusses, no havendo consenso sobre a hora mais oportuna de sua realizao. Exames precoces podem no identificar desenvolvimento de necrose at que essas reas sejam melhor demarcadas, freqentemente ocorrendo somente 2 a 3 dias aps a primeira manifestao clnica. No h dados que apiem a utilizao de TC para diagnosticar necrose ou predizer gravidade da doena dentro das primeiras 24 horas. Evidncias experimentais limitadas e contraditrias sugerem que o contraste intravenoso pode exacerbar a necrose pancretica precoce,9 embora faltem evidncias clnicas para apoiar este fenmeno em humanos. A sensibilidade para o diagnstico de necrose pancretica aproxima-se de 100% aps 4 dias do diagnstico. Em geral, os pacientes com clnica e bioqumica caracterstica de pancreatite aguda, que no melhoram com tratamento conservador devem ser submetidos a uma TC abdominal com contraste oral e venoso. Tomografias de seguimento podem ser realizadas a qualquer sinal de deteriorao clnica. Embora a adoo de condutas mais conservadoras no tratamento da necrose pancretica estril, continua a infeco, ser uma indicao absoluta para interveno. O diagnstico precoce e preciso de necrose pancretica infectada portanto, desejvel. Caractersticas clnicas e laboratoriais de necrose pancretica infectada, como significativa leucocitose e febre, tambm so observados em necrose estril grave. Evidncias radiogrficas de infeco, ou pancreatite enfisematosa, so incomuns. A utilizao de puno percutnea com aspirao guiada por exame de imagem para diagnosticar infeco em pacientes com necrose pancretica que no esto melhorando clinicamente, tem mostrado-se como um grande avano, e alguns centros tm utilizado

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rotineiramente, inclusive com punes seriadas nos casos duvidosos. A sensibilidade e especificidade para deteco da infeco so relatadas como 96,2% e 99,4%, respectivamente, com um valor preditivo positivo de 99,5% e valor preditivo negativo de 95,3%.10 As amostras so enviadas para cultura de aerbios, anaerbios e fungos. O intervalo de apresentao inicial de infeco e ou necrose so variveis e tendem a aumentar em at 3 semanas. Por esta razo, repetidas aspiraes guiadas por TC so freqentemente necessrias.

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5. DETERMINAO DA SEVERIDADE/PROGNSTICO

Uma das primeiras metas do manejo consiste em identificar pacientes com pancreatite grave para instituir terapia dirigida no incio do curso da doena. Embora progressos tenham sido feito neste domnio, uma medida objetiva e reprodutvel da gravidade da doena no foi amplamente aceita. A avaliao clnica no inicio do quadro nem sempre fcil de compreender e indicar gravidade. Os sinais e sintomas iniciais na pancreatite necrotizante diferem, muitas das vezes sutilmente, apenas em grau na pancreatite edematosa, de igual modo, formas severa e leve da doena compartilham as mesmas etiologias. Apesar de considerveis esforos experimentais para identificar diferenas na patognese das pancreatites edematosa e necrotizante, estes no tm resultado em um modelo bem sucedido de predio de quais pacientes que, em uma apresentao inicial, vo avanar para doena grave.

5.1. Sistemas de escore/tabelas

Sistemas de escore clnico especficos para pancreatite, como as escalas de Ranson11 e Glasgow,12 tm demonstrado prever os resultados dos grupos de pacientes com pancreatite aguda, mas exigem cerca de 48 horas aps a admisso para uma avaliao completa. Alm disso, embora altos escores sugiram pior evoluo, estes sistemas no permitem reavaliaes para refletir melhorias substanciais nos cuidados crticos dos pacientes.13

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Quadro 3 - Critrios de Ranson de gravidade da pancreatite aguda Na admisso: Idade > 55 A Leuccitos > 16000/mm3 Glicose > 200 mg/dL Lactato-desidrogenase srica > 350 UI/L Aspartato aminotransferase > 250 UI/L s 48h: Queda do hematcrito > 10 % Aumento da ureia plasmtica > 10mg/dL Ca2+ srico < 8 mg/dL PaO2 < 60 mm Hg Dfice de bases > 4 mEq/L Reteno de fluidos > 6 L

Supe-se que pacientes com menos de trs critrios diagnsticos apresentaro um episdio leve com baixas taxas de morbidade e mortalidade de menos de 1%. Por outro lado, com a presena de mais fatores prognsticos, pode ser esperado um aumento da morbidade e mortalidade, ento, com trs ou quatro critrios de Ranson, a taxa de mortalidade pode alcanar 15% e 50% dos pacientes podem necessitar de tratamento em unidade de terapia intensiva. Muitos pacientes com cinco ou seis sinais vo requerer cuidado intensivo, com sete ou oito dos sinais de Ranson, a taxa de mortalidade pode chegar a 90%. O escore Acute Physiology And Chronic Health Evaluation (APACHE II), embora no seja especfico para pancreatite e seja um pouco complexo, to preciso s 24 horas como so outros sistemas s 48 horas e, portanto, pensa-se ser o melhor escore para avaliar a severidade da doena.14 Diferentemente de outros sistemas, o APACHE II pode ser continuamente recalculado atravs do curso da doena. A escala de APACHE II tambm foi identificada como um preditor independente do resultado aps desbridamento pancretico.15

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O sistema mais recente, APACHE III, utiliza mais cinco variveis fisiolgicas para melhorar a preciso, embora a verso mais recente do sistema possa ser menos til do que o APACHE II na distino de pancreatite leve da grave.16 Uma recente alterao do sistema APACHE II, que inclui uma avaliao clnica da obesidade (APACHE-O escore), foi sugerido tambm para melhorar a preciso preditiva, com um valor preditivo positivo de 74%.17 Achados tomogrficos tambm foram propostos por Balthazar18 na avaliao da gravidade da doena (tabela 1). A presena de graus D + E indicam maior gravidade e mortalidade.

Quadro 4. Critrios de Balthazar. Tomografia de abdmen Grau A Pncreas normal B Aumento de volume do pncreas C Inflamao pancretica ou peripancretica D Coleo lquida nica E Duas ou mais colees lquidas

5.2. Marcadores biolgicos

Alm de mltiplos sistemas de pontuao, vrios indicadores isolados de prognstico foram sugeridos. Brown et al.(2000) e Lankisch et al.(2001) demonstraram que hemoconcentrao pode predizer pancreatite necrotizante e falncia orgnica.19,20.

Alguns

marcadores biolgicos tm sido estudados como marcadores prognsticos, tanto laboratoriais quanto clnicos; nenhum ainda ganhou ampla aplicabilidade clnica. Protena C reativa (PCR), facilmente acessvel e sobe com a gravidade da doena, contudo, til para identificar doena grave apenas 48 horas aps o incio dos sintomas.21 Mediadores inflamatrios como a interleucina IL-8 e IL-6 prometem mostrar-se como indicadores precoces de gravidade da

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doena, mas aguardam maior disponibilidade e mais estudos clnicos as validando.22 Outros marcadores de resposta inflamatria como o fator de necrose tumoral alfa (TNF- ), fosfolipase, elastase e quimioprotease aumentam na pancreatite, mas ainda aguardam validao clnica em estudos mais amplos e maior disponibilidade. Vrios outros marcadores de inflamao vem sendo investigados, como procalcitonina srica, receptores solveis para IL-2, e E-selectina,23 e necessitam de maior pesquisa. Um crescente corpo de literatura sugere que o peptdeo para ativao do tripsinognio pode ser um marcador til de gravidade da doena, sendo evidenciados nveis elevados na urina de pacientes com pancreatite aguda.

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6. PRINCPIOS DO TRATAMENTO

6.1. Reanimao e monitoramento

A teraputica mdica para pancreatite aguda tornou-se cada vez mais padronizada nos ltimos anos.24, 25, 26 O ponto fundamental do tratamento inicial a agressiva ressuscitao fluida para reconstituir as perdas para o terceiro espao, freqentemente de grande volume. Lquidos intravenosos em taxas superiores a 200 ml/h podem ser necessrias para restaurar e manter o volume intravascular. O acompanhamento de perto de alteraes respiratrias, cardiovasculares e na funo renal necessrio para detectar e tratar complicaes precoces de hipovolemia. Reanimao fluida inadequada no s predispe a complicaes sistmicas, especialmente a insuficincia renal aguda, mas tambm foi recentemente mostrado representar um significativo risco de novas leses pancreticas pela diminuio na irrigao do rgo. Brown et al.27 demonstraram que, embora a reanimao agressiva de fluidos no necessariamente impea a progresso para necrose pancretica, doentes com reanimao insuficiente tm um maior risco de desenvolver necrose pancretica. O acompanhamento adaptado gravidade. Todos os pacientes requerem uma estreita avaliao do balano lquido, com aferio rigorosa de oferta e perdas lquidas. O acometimento do sistema respiratrio pode ser observado com freqncia nos casos mais graves sendo necessrio acompanhamento rigoroso. Tambm por envolver grandes quantidades de fluidos comum a apresentao de desequilbrio eletroltico. O envolvimento de vrios sistemas na doena grave torna os pacientes potenciais clientes para as unidades de terapia intensiva com acompanhamento de

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presso arterial e saturao de oxignio contnua. Narcticos intravenosos muitas vezes so essenciais para o controle da dor nestes pacientes, comumente de difcil controle. O uso de morfina e seus derivados pode ser preterido em favor da meperidina devido a possibilidade de causar espasmo do esfncter de Oddi. Nenhum dado fornece apoio a utilizao de drenagem nasogstrica para reduzir a gravidade da pancreatite, embora possa ser til no tratamento e preveno de pneumonia por aspirao e evitar leses agudas da mucosa gastroesofagiana (sndrome de Mallory-Weiss).

6.2. Suporte nutricional

O ensino clssico no tratamento da pancreatite determina a limitao da alimentao por via oral, teoricamente para evitar a estimulao do pncreas excrino e, assim, evitar mais leses pancreticas por liberao de enzimas proteolticas. Em apresentaes brandas da pancreatite, breves perodos sem ingesto oral podem ser suportados e esperados, sendo possvel a evoluo para uma dieta completa em alguns dias com a diminuio ou resoluo da dor. Casos graves podem ter um longo curso, apresentando estado hipercatablico, e leo paraltico, o que levou a uma utilizao generalizada da nutrio parenteral nestes pacientes. 28 Nos ltimos anos, tem-se acumulado evidncias que sugerem que a nutrio enteral pode ser vivel e segura, mesmo para os casos de pancreatite grave. 29 Alm de evitar o custo do cateter e as complicaes associadas com nutrio parenteral total (NPT), a nutrio enteral pode evitar as alteraes da permeabilidade da barreira e funo intestinal. Fato percebido em estudos comparativos entre NPT e alimentao nasoenteral, com significativamente menos casos de sepse e complicaes.30 H tambm estudos que demonstraram apenas vantagem na questo do custo da dieta enteral em relao a NPT, chegando a ser at 4 vezes mais barata.31 Outros estudos evidenciaram melhora significativa nos nveis de marcadores sricos como

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PCR e IL-6, alm de melhora no escore APACHE II.32,

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Alguns desses estudos incluem

inclusive a utilizao de sonda nasogstrica na oferta da dieta apresentando bons nveis de tolerncia na maioria dos pacientes. Se este mtodo vivel e prev suficiente apoio calrico carece ainda de uma investigao mais aprofundada. Teoricamente a nutrio enteral exerce um efeito trfico na mucosa enteral e colnica diminuindo a ocorrncia de translocao bacteriana. A alimentao enteral precoce deve ser considerada para pacientes que no iro retomar ingesto oral no incio do curso de sua doena. A NPT continuar a ter um papel importante na pancreatite grave, especialmente nos casos com leo prolongado. O momento para indicar sua introduo ainda permanece controverso, em mdia prefere-se aguardar at cerca de 5 dias devido ao intenso processo inflamatrio no inicio do curso da doena, evitando maiores complicaes. A adio de glutamina na dieta enteral demonstrou ser capaz de reduzir o tempo de uso da dieta parenteral.34

6.3. O papel da colangiografia endoscpica retrgrada

Clculos so cada vez mais reconhecidos como a principal causa da maioria dos casos agudos de pancreatite. O papel da colangiografia endoscpica retrgrada (CPRE) como modalidade diagnstica e potencialmente teraputica na pancreatite aguda tem sido objeto de algum debate. Embora a CPRE precoce no seja utilizada em casos leves, o seu papel na pancreatite aguda biliar com obstruo biliar ou colangite no contestado. Entretanto a utilizao da CPRE e papilotomia precoce na pancreatite aguda biliar sem obstruo permanece controversa.35, 36 Um estudo multicntrico randomizado,37 demonstrou aumento de complicaes e mortalidade no grupo CPRE. Foi sugerido que, por conseguinte, CPRE precoce pode ser prejudicial na ausncia de obstruo, devido a uma alta incidncia de

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complicaes infecciosas. Muitos especialistas favorecem a interveno endoscpica precoce (menos de 48 horas do incio dos sintomas) na pancreatite biliar grave, mas so necessrios mais estudos validando essa indicao. 6.4. Antibiticos

A maioria das mortes que ocorrem no curso da pancreatite advm de complicaes infecciosas locais e sistmicas. A infeco local ocorre mais comumente em pacientes com maiores reas de necrose pancretica, sendo mais observada em uma fase tardia do curso da doena. A necrose pancretica infectada geralmente envolve microrganismos aerbios e anaerbios da flora gastrintestinal, e podem ser monomicrobianas ou polimicrobianas. Em uma srie de cerca de 1100 casos os microrganismos mais comumente envolvidos foram Escherichia Coli (35%), Klebsiella pneumoniae (24%), Enterococcus (24%), Staphylococcus (14%) e Pseudomonas (11%).38 A exposio a antibioticoterapia de largo espectro demonstrou alterar a flora bacteriana das infeces pancreticas, com tendncia a desenvolver resistncia e presena de infeces fngicas associadas.39 A clara associao da infeco pancretica com altos ndices de mortalidade tem impulsionado o uso disseminado de profilaxia antibitica na necrose pancretica. O uso de antibiticos para prevenir ou evitar as infeces pancreticas tem sido amplamente investigado. Numerosos estudos animais tm demonstrado um benefcio na administrao precoce de antibiticos na pancreatite. Vrios esforos tem sido realizados na inteno de se definir a penetrao de diversos antibiticos no tecido pancretico, e desta forma avaliar a eficcia na preveno e tratamento das infeces nos casos de necrose pancretica, entretanto ainda no h uma definio concreta sobre isso.40 Alguns estudos realizados na dcada de 1990 indicaram que antibiticos profilticos so teis no tratamento de pacientes com pancreatite grave, mas no foi observado benefcio quando antibiticos profilticos eram administrados a pacientes com pancreatite leve. Nos

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casos de pancreatite grave foi observado beneficio nos casos tratados com imipenem e cefuroxima. Pederzoli Et al.(1993) em um estudo randomizado com 74 pacientes com pancreatite necrotizante observada em TC, promoveu a comparao no uso de imipenem por 14 dias versus grupo placebo. Observou diminuio na infeco pancretica em relao ao grupo controle (12% versus 30%), e taxa de mortalidade de 7% no grupo antibitico versus 12% no grupo placebo. No houve diferena nas taxas de complicaes sistmicas ou necessidade de cirurgia. Notou-se que o uso do antibitico foi particularmente til nos casos de necrose inferior a 50% do rgo.41 Saino et al.(1995) mostraram uma diminuio nas complicaes infecciosas, nmero de intervenes cirrgicas e taxa de mortalidade com a utilizao de cefuroxima por 14 dias ou at a normalizao da PCR num estudo randomizado de pancreatite necrotizante alcolica em 60 pacientes. Entretanto no houve diferena nas taxas de infeco pancretica.42 Dois outros pequenos estudos com 23 e 26 pacientes respectivamente compararam o uso de ceftazidima, amicacina e metronidazol por 10 dias e o uso de ofloxacina e metronidazol por 10 dias com grupos controle tambm apresentando menores taxas de mortalidade para o grupo antibitico.43,44

Entretanto no primeiro trabalho nem todos os

pacientes apresentavam necrose pancretica e no segundo no houve mudana no nmero de casos com infeco pancretica. As incoerncias entre esses estudos podem ser resultado do pequeno nmero de pacientes, apresentando desta forma limitaes estatsticas. Associado a esse fato tambm se observa considervel heterogeneidade nos critrios de seleo de pacientes, nos antimicrobianos utilizados e em diferenas nas condutas do tratamento global. Em um estudo duplo cego mais recente envolvendo 114 pacientes realizado por Isenmann et al.(2004), foi comparado o uso de ciprofloxacina e metronidazol por 14 a 21 dias no sendo observada diferenas nas taxas de infeco da necrose pancretica, complicaes sistmicas

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ou mortalidade. Com uma melhor qualidade metodolgica este trabalho traz mais discusso a respeito do tema. 45 Embora no haja ainda um consenso no uso de antibiticos, tem prevalecido a tendncia na aplicao dos antimicrobianos de largo espectro nos pacientes com sinais de SEPSE, SIRS, falncia de mltiplos rgos ou infeco comprovada. Os riscos de superinfeco com fungos ou organismos resistentes a antibiticos bem reconhecido,46 e durao do tratamento , portanto, tipicamente limitado. A durao do tratamento ainda no foi definida, mas a maioria dos autores limitam o tratamento a 14 dias. Dada a origem gastrintestinal de bactrias causadoras de infeco na necrose pancretica, teoricamente a reduo da flora bacteriana intestinal poderia reduzir o nmero de casos de necrose infectada, porm a prtica da descontaminao aguarda mais estudos. O papel da profilaxia antifngica tambm est indefinido, embora a mortalidade seja alta na coinfeco fngica. Alguns grupos tm recomendado o uso de fluconazol a todos os doentes que recebam terapia antibitica para pancreatite necrotizante.39

6.5. Tratamento cirrgico

A maioria dos casos de pancreatite aguda restringe-se a um processo limitado, com edema parenquimatoso sem a presena de necrose. Nestes casos, a teraputica cirrgica esta geralmente restrita ao tratamento de complicaes tardias como a presena de pseudocistos e na realizao de colecistectomia para evitar novos quadros nos casos de pancreatite biliar. Cerca de 10% a 30% dos pacientes podem desenvolver doena grave, cursando com necrose pancretica e peripancretica, alm de, nestes casos, ser comum a apresentao de SIRS com elevada morbidade e mortalidade.47 Nestes casos pode ser necessrio desbridamento cirrgico ou outra interveno agressiva durante a fase aguda da doena. Nos ltimos anos tem sido

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crescente o nmero de servios que optam por uma abordagem cirrgica mais conservadora inicial, geralmente aguardando cerca de duas semanas da abertura do quadro para se indicar a realizao de desbridamento. Entretanto o momento de proceder ao desbridamento e as indicaes para isso ainda so controversos. Os doentes com necrose pancretica infectada representam a maioria dos bitos por pancreatite aguda, deste modo a necessidade de desbridamento geralmente aceita. Estudos recentes tem apontado que a realizao de interveno cirrgica nos casos de necrose pancretica infectada pode reduzir a taxa de mortalidade que varia de 20% a 40%, para algo em torno de menos de 15%. 1, 48, 49, 50 A taxa de mortalidade na necrose pancretica infectada de praticamente 100% quando no se realiza desbridamento. O diagnstico de necrose pancretica infectada um ponto chave no adequado manejo dos casos graves, entretanto sua realizao pode nem sempre ser fcil. Sinais radiogrficos de infeco pancretica tais como a presena de enfisema so vistos apenas numa minoria dos casos. A utilizao de puno guiada por tomografia normalmente necessria para diagnosticar infeco, sendo comum a necessidade de mais de um procedimento para evidenciar sua ocorrncia. As opinies sobre o tratamento cirrgico da necrose estril variam desde aqueles que defendem uma abordagem precoce e ampla aos que preferem um manejo conservador, deixando a abordagem cirrgica restrita aos casos de necrose estril que no respondem clinicamente. Corrobora ainda para o manejo conservador a maior ocorrncia de infeco local aps o procedimento cirrgico. Aqueles que optam pelo tratamento agressivo afirmam que a remoo do tecido necrtico reduz a morbidade e acelera a recuperao.51

J os que

preferem o tratamento no-cirrgico baseiam-se no fato de que a maioria dos pacientes evolui com boa recuperao. Vrios estudos tem sido realizados na tentativa de se identificar

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critrios para indicao de desbridamento, com exceo da necrose infectada. 52, 53 Entretanto nenhum ainda conseguiu base suficiente para determinar critrios de indicao.54 Vrias tcnicas so descritas para desbridamento e drenagem de necrose pancretica, tais como: desbridamento com drenagem externa sob suco direta do local; desbridamento com colocao de drenos para irrigao contnua e drenagem; desbridamento agressivo com confeco de peritoneostomia e reexplorao planejada; desbridamento com fechamento da cavidade e reintervenes planejadas. H tambm abordagens no convencionais como: tratamento somente com uso de antibiticos; antibioticoterapia e drenagem percutnea; antibioticoterapia e drenagem endoscpica; terapia antibitica e drenagem cirrgica sem desbridamento; desbridamento por cirurgia minimamente invasiva e antibiticos.50, 51, 55, 56

6.6. Tcnicas minimamente invasivas

A cirurgia aberta permanece como o mtodo padro ouro no tratamento da necrose pancretica, com ou sem infeco, entretanto, nos ltimos anos vrios estudos tem sido publicados descrevendo o uso de tcnicas minimamente invasivas no tratamento de alguns casos de pancreatite necrotizante. A drenagem percutnea apresenta-se como um desses mtodos. Pela aumentada viscosidade da necrose pancretica acreditava-se que somente a drenagem no seria capaz de retirar todos os detritos de maneira adequada. Entretanto, pelo menos um estudo apresentou resultados satisfatrios com este tipo de tratamento, 16 de 34 doentes obtiveram melhora apenas com este tratamento, em outros 9 permitiu que a cirurgia aberta fosse protelada, o que pode tornar esta, uma alternativa atraente pois permitiria esperar o processo de necrose tornar-se mais organizado.57 Outra possibilidade est no uso da endoscopia para drenagem transmural de colees na proximidade da parede gstrica.58 Quarenta e quatro pacientes com necrose pancretica foram tratados por esse mtodo, sendo

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bem sucedida em 31 (72%) dos pacientes com necrose pancretica, 9 (29%) sofreram recorrncia e 16 (37%) sofreram complicaes. Tcnicas laparoscpicas tambm tm sido descritas para o desbridamento direto da necrose pancretica, no entanto carecem de mais estudos para comprovar sua eficcia.

6.7. Outros tratamentos

O uso do octreotide inicialmente mostrou-se benfico nos primeiros trabalhos produzidos a seu respeito, entretanto estudo mais recente e com metodologia mais apurada veio demonstrar que no houve benefcios em diversos parmetros clnicos observados na pesquisa em comparao ao grupo controle.59 Outros agentes anti-secretores como, antagonistas de citocinas e anti-proteases tambm no tem demonstrado beneficio no tratamento e evoluo dos casos de pancreatite aguda. 60, 61 Igualmente ao que vem sendo observado no tratamento de pacientes crticos por outras afeces, o controle glicmico rigoroso, inclusive com uso de insulina endovenosa contnua, deve sempre ser buscado. Trabalhos tem demonstrado menor nmero de complicaes infecciosas e renais nos pacientes com nveis glicmicos entre 110 e 150 mg/dl. 62 Outra linha de pesquisa que vem sendo desenvolvida diz respeito ao uso de

microorganismos probiticos associados nutrio enteral precoce. Estudos de pequenas dimenses tem sido contraditrios. Um primeiro estudo aleatrio, realizado em pacientes com pancreatite grave, observou taxa de infeco de 4,5% no grupo que recebeu lactobacilos vivos e de 30% no grupo que recebeu lactobacilos inativados.63 Na busca por uma melhor definio sobre o tratamento com probiticos um grupo holands desenvolveu um estudo duplo-cego multicntrico randomizado, PROPATRIA.64 Entretanto um inesperado e elevado nmero de mortes foi observado no grupo que foi tratado com o uso dos probiticos.

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A lavagem peritoneal recomendada a pacientes com critrios de gravidade que evoluem mal a despeito dos cuidados intensivos. Existe ainda controvrsias em relao a melhoria dos ndices de mortalidade, porm observa-se uma menor incidncia de complicaes cardio-pulmonares com o seu uso.

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7. CONCLUSO

A pancreatite aguda grave permanece como um dos principais desafios para o cirurgio apesar dos grandes avanos no seu manejo nos ltimos anos. Tais progressos podem ser resumidos principalmente na introduo do suporte nutricional precoce, representado pela nutrio enteral, na reposio volmica agressiva com adequada monitorizao

hemodinmica, no tratamento intensivo da falncia de rgos, no uso de antibiticos profilticos para evitar a infeco de focos de necrose pancretica e na estratificao precoce da gravidade. De mesmo modo, o tratamento cirrgico da pancreatite severa tambm vem sofrendo alteraes, estando a interveno cirrgica indicada na fase tardia do processo e na ocorrncia de necrose infectada. Nos casos de colangite e obstruo biliar a papilotomia endoscpica tambm est bem estabelecida.

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