Panorama de Alfabetização - Prêmio Victor Civita 2011

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Relatório da selecionadora Beatriz Gouveia, da área de Alfabetização, sobre os trabalhos enviados ao Prêmio Victor Civita Educador Nota 10 de 2011.

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Prêmio Victor Civita Educador Nota 102011

ALFABETIZAÇÃORelatório analítico do processo de seleção de trabalhos

Selecionadora: Beatriz Gouveia

“Qual é o desafio? O desafio é formar usuários competentes da língua e não sujeitos que

saibam somente “decifrar” o sistema de escrita. (...) Assumir esse desafio significa abandonar

as atividades mecânicas e desprovidas de sentido, que levam as crianças a se distanciarem da

leitura por considerá-la uma mera obrigação escolar; significa, também, criar situações onde ler

determinados materiais se torne imprescindível para o desenvolvimento de projetos em

andamento ou – e se isto é igualmente importante – situações que produzam o prazer que é

inerente ao contato com textos verdadeiros e de qualidade.”

Delia Lerner

1) Quadro geral dos trabalhos encaminhados:

Este relatório refere-se à leitura de 247 trabalhos da área de Alfabetização.

Grande parte dos trabalhos foi desenvolvida por professoras (95% dos participantes

são do sexo feminino) que têm curso superior completo ou de pós-graduação, em

escolas públicas situadas em zonas urbanas do país. Os dois gráficos abaixo mostram

as áreas de procedência e a categoria da escola em que atua o(a) professor(a):

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Quanto à formação dos participantes, nota-se que 53% dos(as)

professores(as), que concorreram nesta edição do Prêmio, têm experiências em

cursos de pós-graduação e 36% curso superior completo.

Os números relativos à formação acadêmica são os seguintes:

Vale destacar que a maioria dos trabalhos encaminhados é da região Sudeste

(52%), com destaque para os estados de São Paulo (79 trabalhos) e de Minas Gerais

(29 trabalhos). A região Sul aparece em segundo lugar (29%), com destaque para os

estados do Rio Grande do Sul (35 trabalhos) e do Paraná (21 trabalhos). Depois vem

a região Nordeste (8%), seguida pela região Centro-Oeste (7%), com destaques para

Mato Grosso do Sul (com 9 trabalhos), e Mato Grosso (com 5 trabalhos), e pela região

Norte (4%). Segue abaixo o gráfico das regiões:

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2) Os trabalhos analisados

Foram recebidos 247 trabalhos na área de Alfabetização. Deste montante, 31

foram desclassificados, 204 não classificados, 12 seguiram no processo de seleção

(para novas leituras), 5 foram selecionados (entre os 50 melhores). Veremos a seguir

os principais motivos da desclassificação e da não classificação.

Sobre a desclassificação

Os 31 trabalhos foram desclassificados por não respeitarem algum dos itens

propostos pelo regulamento:

• 16 trabalhos enviados ainda não haviam sido concluídos;

• 5 trabalhos foram desenvolvidos fora do período indicado no regulamento;

• 1 trabalho ultrapassou em muito os limites estabelecidos;

• 2 trabalhos não foram feitos e/ou inscritos por um professor em exercício;

• 1 trabalho foi realizado em uma instituição de educação não formal;

• 2 trabalhos foram encaminhados com produções de alunos;

• 4 trabalhos não apresentaram a descrição da experiência ou sequência

desenvolvida em sala de aula. E sim, plano de intenções, partes de teses,

monografias, entrevistas, coletânea de atividades, reflexões sobre temas

específicos, relatos de estágios, entre outros.

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Sobre a não classificação

Para a leitura e avaliação de cada trabalho foram elaborados critérios gerais e específicos de Alfabetização para a não classificação e para a classificação. Os critérios foram os seguintes:

Critérios Gerais para não classificação Critérios de Alfabetização para não classificação

1. A apresentação do projeto é

evasiva não esclarece a

metodologia e os resultados

obtidos.

2. Apreciação do material não

demonstra o que as crianças

aprenderam.

3. Concepção redutora de

interdisciplinaridade que

compromete o foco do trabalho.

4. Conteúdo temático interessante,

mas desenvolvido de forma

intuitiva e pouco consistente.

5. Conteúdos não articulados aos

objetivos e metodologia.

6. Equívoco conceitual quanto a

conteúdos tratados e

procedimentos.

7. Fundamentação teórica não

compatível com os objetivos e

metodologia proposta.

8. Metodologia não dialoga com

objetivos propostos.

9. Metodologia não esclarece como

o professor preparou os

encaminhamentos.

10. Não selecionou conteúdos para o

1. A descrição não permite análise

dos conteúdos selecionados,

metodologia e resultados obtidos

com o projeto.

2. Conteúdos da alfabetização

apresentados de forma genérica,

ou transcritos de programas de

formação sem especificação do

tratamento dado a ele.

3. Objetivos não se relacionam com

a justificativa e conteúdos de

alfabetização selecionados.

4. Visão simplificadora dos

conteúdos da alfabetização /

desconhecimento dos processos

de aprendizagem das crianças

sobre a leitura e a escrita.

5. Ausência de avaliação e/ou

descrição do impacto na

aprendizagem dos alunos.

6. Não esclarece o trabalho de

alfabetização realizado.

7. O ponto de partida para os

trabalhos é desarticulado da

proposta curricular das escolas.

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projeto.

11. Não relaciona estratégias

escolhidas aos objetivos de

aprendizagem.

12. O propósito social se sobrepõe ao

propósito didático.

Os trabalhos que superaram essas questões seguiram para uma nova leitura balizada por critérios gerais e específicos da Alfabetização para classificação:

Critérios Gerais para classificação Critérios de Alfabetização para classificação

1. As estratégias metodológicas

propostas são adequadas, apesar

de não serem inovadoras.

2. O trabalho foi desenvolvido com

as crianças valorizando os

conhecimentos de cada uma.

3. Projeto com boa incidência na

aprendizagem das crianças.

4. Projeto coerente em todas as

partes.

5. Projeto simples, desenvolvido

com as crianças e valorizando o

conhecimento didático.

6. Presença da avaliação.

1. Considera os processos de

aprendizagem dos alunos sobre a

leitura e a escrita.

2. Importância do projeto para a

inclusão dos alunos nas práticas

sociais de leitura e escrita.

3. Projeto simples considerando os

conhecimentos dos alunos sobre o

sistema de escrita e sobre a

linguagem escrita para o

planejamento das propostas.

4. Presença da avaliação e/ou

descrição da incidência na

aprendizagem dos alunos.

5. Responsabilidade e/ou

compromisso com a formação de

leitores e escritores competentes

no seu grupo.

Os principais motivos para a não classificação foram:

1. a descrição não permitiu a análise dos conteúdos selecionados, da

metodologia e resultados obtidos com o projeto;

2. uma visão redutora da interdisciplinaridade;

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3. uma visão simplificadora dos conteúdos da alfabetização e desconhecimento

dos processos de aprendizagem das crianças sobre a leitura e a escrita.

4. outros.

Aproximadamente 50% dos projetos não classificados não esclareceram o

trabalho realizado na área de alfabetização. Eles apresentaram propostas de outras

áreas, fizeram alguma referência ao trabalho de alfabetização, no entanto não

aprofundaram, descrevendo, de fato, o que foi feito na área. Isto é, para conhecermos

o trabalho realizado pelo(a) professor(a) precisamos que nos conte o que pretendia

ensinar, que procedimentos escolheu para fazê-lo, que condições didáticas ofereceu,

que situações didáticas planejou e propôs e o que seus alunos aprenderam. Ou seja, é

preciso descrever o passo a passo, fazer uma descrição metodológica, sem perder de

vista o foco do trabalho. Se for alfabetização, é preciso contar o que, de fato, foi feito

nesta área e o que os seus alunos aprenderam. O relato fica completo quando

podemos compreender, pela leitura, o que o professor propôs, como fez para realizar

o projeto ou a sequência e assegurar as aprendizagens dos alunos. A apresentação

genérica não permite conhecermos como o trabalho foi pensado, proposto e como

incidiu na aprendizagem das crianças.

Outro motivo para a não classificação (30%) diz respeito a questões

relacionadas à concepção. Ou seja, a uma visão simplificadora dos conteúdos da

alfabetização e desconhecimento dos processos de aprendizagem das crianças sobre

a leitura e a escrita. É possível notar o esforço do professor em alfabetizar seus

alunos. O grande desejo de um professor alfabetizador é que seus alunos saibam ler e

escrever convencionalmente, que possam atribuir sentido aos diferentes textos,

reconhecer suas funções comunicativas, reconhecer os diferentes movimentos que

animam cada um deles. Para tanto, os professores buscam informações, livros,

formações e parcerias. Buscam apoio para realizar sua tarefa de forma bem sucedida.

O desejo subjacente aos trabalhos é o de formar alunos leitores e escritores.

No entanto, o que aparece e merece ser explorado é o desconhecimento dos

professores sobre o processo de aprendizagem dos alunos e das condições didáticas

de ensino.

Há trabalhos em que os professores afirmam que a escrita é um sistema de

representação, no entanto as propostas apresentadas reduzem a alfabetização à

aprendizagem de um código.

As questões importantes para os professores refletirem são:

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• A escrita é um sistema de representação ou um código?

• As crianças têm ideias, representações sobre a escrita antes de serem

escritores convencionais?

• Como as crianças aprendem a escrever?

• Como o professor pode ajudá-las para serem leitoras e escritoras

convencionais?

• O que é ser alfabetizado?

As práticas de alfabetização estão estreitamente relacionadas com a forma

como a escrita é concebida. A escrita pode ser considerada como um sistema de

representação ou como um código de transcrição gráfica. A forma como a escrita é

conceitualizada traz implicações pedagógicas. Conceitualizar a escrita como

codificação é tratá-la como uma técnica que precisa ser transmitida aos alunos. Nesta

perspectiva, o ensino da escrita é reduzido a uma transmissão de um código e o aluno

atua passivamente em seu processo de aprendizagem. Por outro lado, conceitualizar a

escrita como um sistema de representação é tratá-la como um conteúdo de natureza

conceitual, que para ser compreendido exige análise e reflexão sobre seu

funcionamento e suas regras de geração. Nesta perspectiva, o aluno é entendido

como um sujeito intelectualmente ativo, que formula hipóteses na busca de

compreender o que a escrita representa e como um sujeito que aprende através de

suas ações sobre os objetos do mundo.

Conceber que a escrita é um sistema de representação implica em reconhecer

dois processos para a aprendizagem da leitura e da escrita:

1. compreender a natureza do sistema alfabético de escrita (a representação

gráfica da linguagem) – as relações entre letra-som, a segmentação entre as

palavras, as restrições ortográficas;

2. compreender o funcionamento da linguagem escrita – suas características

específicas, suas diferentes formas, gêneros e discursos.

Estes dois processos acontecem simultaneamente, ou seja, ao mesmo tempo

que o aluno reflete e aprende sobre o sistema alfabético de escrita, ele aprende como

a língua escrita é utilizada socialmente.

Isso quer dizer que não basta ensinar aos alunos as características e o

funcionamento da escrita, pois esse tipo de conhecimento não os habilita para o uso

da linguagem em diferentes situações comunicativas. E, por outro lado, não basta

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colocar os alunos diante das mais variadas situações de uso da linguagem para que

aprendam o funcionamento da escrita. Isso significa dizer que o trabalho pedagógico

de alfabetização precisa articular as atividades de uso da linguagem com as atividades

de reflexão sobre a escrita. Portanto, a aprendizagem inicial da leitura e da escrita não

pode dar-se sem a presença da cultura escrita.

O outro motivo para a não classificação foi a visão redutora da

interdisciplinaridade (10%). Há uma definição do conteúdo de alfabetização, e em

seguida, a articulação com as outras áreas de conhecimento. O problema é que,

muitas vezes, não existe uma real integração do conteúdo com as outras áreas e nem

a clareza de como trabalhar com cada uma delas respeitando sua especificidade. O

resultado é que muitos trabalhos não conseguem aprofundar o ensino dos conteúdos

eleitos, pois acabam abordando superficialmente as diferentes áreas, sem garantir

aprendizagens efetivas, transformadoras. A necessidade de assegurar a presença de

várias áreas de conhecimento em um trabalho gera, muitas vezes, um tratamento

superficial e artificial dos conteúdos e uma abrangência que não incide na

aprendizagem dos alunos.

Noto que, por vezes, o professor parece receoso em realizar um projeto, ou

uma sequência, focados em apenas uma área de conhecimento. É como se tivesse

que sempre incluir várias áreas a partir de um tema. A intencionalidade do professor

do que quer que seus alunos aprendam sobre cada conteúdo é fundamental para

promover aprendizagem.

Por fim, 10% dos trabalhos não foram classificados por causa de outros

motivos como:

• inadequação dos conteúdos, como por exemplo: temas de adultos (como

drogas), músicas propostas que não ampliam universo cultural, mas ficam

restritas ao que se apresenta na TV, regras de trânsito como se fossem os

motoristas, ... enfim conteúdos muito desajustados às necessidades de

aprendizagem das crianças.

• ideia de que os alunos aprendem brincando, isto é, o sentido da

aprendizagem está no lúdico. Seria importante desmistificar esta teoria que

professa duas premissas equivocadas: a de que as crianças só aprendem se

estiverem inseridas em um contexto lúdico e de que, realmente, é muito fácil

aprender, de que tudo se aprende brincando (sem perturbações, angústias ou

dificuldades). É uma fronteira muito delicada entre a criação de uma situação

contextualizada de ensino e aprendizagem para as crianças (e que pode ter

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ludicidade) e ter a brincadeira como pré-requisito para a aprendizagem de

qualquer conteúdo.

• ausência da interdependência entre os propósitos sociais e didáticos – a

maioria dos trabalhos lidos elege o projeto como modalidade organizativa. O

projeto é uma prática social real que contextualiza a aprendizagem. Ele coloca

a língua na sua função comunicativa, por isso é uma ótima forma de realizar a

transposição didática das práticas sociais de leitura e escrita. O projeto articula

dois propósitos: o propósito social e o didático. O propósito didático é o que

promove aprendizagem, pois desvela a intenção de ensino e aprendizagem. O

propósito social traz mais sentido para os alunos, pois define uma intenção

comunicativa para os textos que serão escritos e os alunos articulam os

conteúdos com sua prática social. Em parte dos trabalhos descritos não

aparece a interdependência entre propósitos sociais e didáticos – há uma

valorização excessiva e uma sobreposição do propósito social em relação aos

didáticos. Há trabalhos em que praticamente 80% é dedicado à descrição dos

procedimentos para produzir o produto final que, em sua maioria, é uma festa,

uma exposição, um sarau – descreve-se a montagem do palco, do convite, da

música, mas não há referência da aprendizagem dos alunos, da transformação

do conhecimento em relação à leitura e à escrita.

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Dados: não-classificação

50%

30%

10%

10%

Não esclareceu o trabalho realizado em alfabetização

Visão simplificadora e desconhecimento dos processos deaprendizagemVisão redutora da interdisciplinaridade

Outros

Sobre a classificação e os projetos indicados

Um aspecto notável é o aumento do número de avaliações iniciais e finais das

produções das crianças. Estas avaliações são importantes para os(as) professores(as)

saberem como seus alunos chegam naquela série, isto é, com que saberes eles

iniciam o ano e que tipo de ajuda e intervenções eles precisarão para avançar. Em um

processo de alfabetização é necessário propor diariamente atividades de leitura ou

escrita, pois para avançar é preciso que haja constância e regularidade na reflexão

sobre o funcionamento do sistema de escrita. Ao propor diariamente as atividades,

o(a) professor(a) sabe o que pensam seus alunos e pode planejar as melhores

intervenções. No entanto, as avaliações iniciais (no início de trimestres, por exemplo)

são interessantes do ponto de vista institucional, para que os(as) coordenadores(as) e

diretores(as) das escolas possam acompanhar as aprendizagens junto com os(as)

professores(as). Este acompanhamento permite também que se alinhem os melhores

encaminhamentos para que todos possam avançar e aprender, e para que a liderança

pedagógica da escola conheça os desempenhos de cada criança e possa se

corresponsabilizar pelos resultados da aprendizagem de todos. Quando os resultados

não são favoráveis ao final de um trimestre, por exemplo, é necessário planejar novas

propostas, intervenções e agrupamentos, para que no trimestre seguinte eles possam

avançar. Prioritário é que haja aprendizagem!

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Um outro aspecto a destacar é a necessidade de atrelar mais as atividades de

reflexão sobre o sistema de escrita à prática social da escrita e leitura, a cultura

escrita. Isto é, buscar sentido para situações onde resulte a possibilidade de reflexão

sobre o sistema. Isso quer dizer que a língua deve entrar na escola da mesma forma

que existe vida afora, ou seja, pelas práticas sociais de leitura e escrita: ler por prazer,

para se divertir, para buscar alguma informação específica, para compartilhar

emoções com outros, para contar para os outros, para recomendar... ; escrever para

expressar as ideias, para organizar os pensamentos, para aprender mais, para

registrar e conservar como memória, para informar, para expressar sentimentos, para

comunicar-se à distância, para influenciar os outros... (Beatriz Gouveia e Miriam

Orensztejn). E ao colocar os alunos em contato com estas práticas, é possível planejar

atividades sobre o sistema de escrita, dessa forma, ele pode atribuir muito mais

sentido e participar de práticas mediadas pela escrita.

Esta concepção descrita acima se opõe ao contexto em que as atividades de

alfabetização são propostas de uma forma mecânica e sem sentido, o que poderia ser

quase um insulto, ao considerarmos nossos alunos sujeitos intelectualmente ativos e

reflexivos. Além de afastarem-nos das práticas sociais mediadas pela escrita.

A escola deve ser um espaço de inclusão, portanto cabe à escola se esforçar

para incluí-los socialmente como leitores e escritores. Uma condição para esta

inclusão é tratar os alunos considerando sua capacidade intelectual. A aprendizagem

é influenciada pelo ensino, mas não é criada por ele.

A busca é por uma escola que convide a pensar, que apresente informações

relevantes, que reconheça sua responsabilidade diante das estatísticas do

analfabetismo e que consiga arrebatar seus alunos para o conhecimento, para a

leitura, a ponto de não conseguirem sobreviver sem eles. Para tanto é preciso que os

professores ajudem as crianças a encontrarem o sentido de ler e escrever, reconhecer

a função comunicativa da língua escrita (há crianças que não sabem ler e escrever

porque não sabem para que serve ler e escrever). O ato de intervir do professor

aquece, fundamenta, promove e impulsiona a aprendizagem. O professor é o agente

para os alunos perceberem o quanto é gostoso e excitante o caminho da palavra

escrita.

O compromisso político é alfabetizar, no sentido de tornar os alunos leitores e

escritores competentes, que saibam reconhecer os diferentes movimentos que

animam cada texto.

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Comentarei, brevemente, a seguir, os aspectos mais relevantes dos cinco

trabalhos indicados entre os 50:

Trabalho 1

Título do trabalho: Contos ao Redor da Fogueira

Professora: Eliane Werner

Cidade: Ariquemes

Estado: Rondônia

É um projeto de reescrita de contos. Ele foi realizado com uma sala de 2º ano e

tinha como objetivo principal aproximar os alunos da linguagem escrita e da prática de

produção de textos. A escolha da reescrita foi, também, por entender que é uma boa

proposta para ajudar as crianças a desenvolverem comportamentos escritores: ler,

reler, reescrever, revisar.

A professora inseriu os alunos nas práticas de produção de textos e ajudou no

desenvolvimento dos comportamentos escritores. Ela ofereceu desafios ajustados às

necessidades de aprendizagem do grupo: reescrita de contos e atividades de reflexão

sobre o funcionamento do sistema de escrita. As crianças puderam se apropriar do

processo de produção de textos, de termos específicos da linguagem escrita e

ampliaram o repertório literário.

As crianças aparecem como protagonistas do trabalho, além de ouvirem os

textos lidos pela professora, participaram ativamente da reescrita coletiva, da revisão

coletiva e por fim, da escrita em duplas. Houve uma preocupação importante da

professora em, primeiro, propor reescritas no coletivo, sendo ela a escriba para

modelizar comportamentos escritores e oferecer mais recursos sobre o processo de

produção de texto para, depois, propor as duplas.

Durante o projeto, a professora propôs uma série de atividades voltadas à

reflexão sobre o sistema de escrita, considerando as necessidades de aprendizagem

da maioria do grupo, ainda não alfabético. As atividades eram articuladas ao contexto

das reescritas dos contos, como por exemplo, escrita de lista de comidas típicas da

África (pois os contos escolhidos foram de uma coletânea de contos africanos).

Um outro aspecto a destacar é que a professora valorizou as interações entre

as crianças durante o trabalho. Ela entende que pensar na composição de cada grupo

também é uma estratégia para que os alunos possam trocar mais, para potencializar

aprendizagens, para que um possa impulsionar um conhecimento que está em

formação no outro. As reescritas foram propostas em duplas e ela planejou

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considerando os saberes de cada um, especialmente, o conhecimento sobre o sistema

de escrita.

Trabalho 2

Título do trabalho: Contos de Fadas – Para Escrever e Ler

Professora: Maria Lucy Ribeiro Pinto

Cidade: Lorena

Estado: São Paulo

Este trabalho foi realizado com crianças de 6 anos em uma classe de 1º ano. A

professora propôs uma série de atividades de leitura e escrita dentro do contexto dos

contos de fadas. Ela lançou mão do conhecimento dos alunos sobre os contos (depois

de um trabalho que fez chamado bolsa de leitura) para propor as atividades e no final

propôs as reescritas. As reescritas foram realizadas, primeiro no coletivo e depois em

duplas.

A professora descreveu conteúdos, objetivos e metodologia absolutamente

coerentes. Os conteúdos elencados foram ajustados às necessidades de

aprendizagem das crianças e o projeto contribuiu para que os alunos tivessem a

oportunidade de refletir sobre o funcionamento do sistema de escrita e aprender mais

sobre a linguagem escrita presente nos textos e sobre o processo de produção de

textos.

As propostas de análise e reflexão sobre o sistema de escrita eram do contexto

dos contos de fadas, como por exemplo: escrita e leitura de lista dos contos lidos,

leitura de listas de personagens ou de características de personagens, leitura de

descrições de personagens, escrita de continuação de diálogos entre os personagens

dos contos lidos e reescrita de pequenos trechos.

Ela trabalhou as questões do sistema dentro do contexto dos contos

conhecidos pelos alunos, articulando-as com as questões da linguagem.

Um outro aspecto a destacar em seu trabalho é o resultado na aprendizagem

dos alunos: dos 21 alunos, 15 terminam o ano com escrita alfabética, 4 com escrita

silábico-alfabética e 2 silábica com valor sonoro pertinente. Observando o mapa da

classe nota-se avanços importantes nos resultados de todas as crianças da sala –

nenhum a menos!

Um outro ponto observado é que Maria Lucy valorizou as interações entre as

crianças durante o trabalho de forma muito adequada. As atividades de leitura e

escrita foram feitas individualmente e, em duplas, pois nas palavras da professora:

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“optei pelo trabalho em duplas, pois elas se ajudam na construção do conhecimento”.

Os agrupamentos foram planejados de forma bem criteriosa, considerando os saberes

dos alunos e as atividades.

Trabalho 3

Título do trabalho: Indicação Literária e Produção Escrita de Bilhete na Alfabetização

Professora: Érica Rodrigues do Nascimento Augustini

Cidade: Ibitinga

Estado: São Paulo

É um trabalho de escrita de bilhetes em pequenos grupos em que os

conteúdos foram leitura e indicações literárias. O trabalho foi realizado com uma sala

de 2º ano e tinha como objetivo principal aproveitar a familiaridade dos alunos com a

escrita de bilhetes para promover atividades de análise e reflexão sobre o sistema de

escrita e aproximá-los do processo de composição de um texto.

A professora ofereceu desafios ajustados às necessidades de aprendizagem

do grupo: escrever bilhetes usando o computador. Durante a escrita dos bilhetes os

alunos tinham desafios sobre o sistema de escrita, sobre a hiposegmentação e a

hipersegmentação. Neste contexto o computador foi um excelente recurso, pois as

marcas do editor de textos incomodavam e desafiavam as crianças a solucionar os

problemas. A professora foi muito criteriosa para organizar as duplas, considerando os

saberes de cada um e avaliando como poderiam se ajudar. Os bilhetes estavam muito

bem escritos e muito diferentes uns dos outros. Sem dúvida as crianças foram as

protagonistas do trabalho: puderam escolher as suas histórias preferidas para indicar e

participaram ativamente da escrita do bilhete e da revisão.

Trabalho 4

Título do trabalho: Reescrevendo e Aprendendo com os Contos de Fadas

Professora: Elvânia Kufner Debastiani

Cidade: São João

Estado: Paraná

O trabalho foi realizado com uma sala de 1º ano e tinha como objetivo principal

produzir reescritas coletivas e ajudar as crianças a desenvolverem comportamentos

leitores e escritores.

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A professora inseriu os alunos nas práticas de leitura e escrita e ajudou no

desenvolvimento dos comportamentos leitores e escritores. Ela ofereceu desafios

ajustados às necessidades de aprendizagem do grupo: reescrever contos de fadas

conhecidos e atividades de reflexão sobre o funcionamento do sistema de escrita. As

crianças puderam se apropriar do processo de produção de textos, de termos

específicos da linguagem escrita e ampliaram o repertório literário.

As crianças aparecem como protagonistas do trabalho, além de ouvirem os

textos lidos pela professora, puderam escolher os seus contos preferidos para

reescrever, participar ativamente da reescrita e da revisão coletivas e por fim, da

elaboração do livro. Destaco que a elaboração do livro contribuiu para que os alunos

tomassem decisões e expressassem de maneira mais autônoma suas opiniões. Houve

uma preocupação importante da professora em, primeiro, propor reescritas no coletivo,

sendo ela a escriba para modelizar comportamentos escritores e oferecer mais

recursos sobre o processo de produção de texto para, depois, propor as duplas de

trabalho.

Durante o projeto, Elvânia propôs uma série de atividades voltadas para à

reflexão sobre o sistema de escrita, considerando as necessidades de aprendizagem

da maioria do grupo, ainda não alfabéticos. As atividades eram articuladas ao contexto

das reescritas dos contos, como por exemplo, escrita de diálogos conhecidos das

histórias, escrita e leitura de listas de títulos, escrita e leitura de listas de personagens.

Trabalho 5

Título do trabalho: Reescrita de Mitos

Professora: Eudes Aniceta da Silva Alves

Cidade: São Bernardo do Campo

Estado: São Paulo

O trabalho foi realizado com crianças de 6 anos em uma classe de 1º ano. A

professora propôs um trabalho de reescrita de mitos. A maioria das crianças chegou

no 1º ano já escrevendo alfabeticamente (95%) e a proposta da professora era ajudar

as crianças a ganharem mais fluência na escrita, e também que conhecessem as

características da linguagem escrita e que aprofundassem o conhecimento do gênero

mitos.

O projeto contribuiu para que os alunos tivessem a oportunidade de aprender

mais sobre a linguagem escrita presente nos textos e sobre o processo de produção

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de textos. A proposta dos mitos foi muito adequada para inserir as crianças em todo o

processo de escrita de textos e também para que se aproximassem mais dos

comportamentos escritores: ler, reler, escrever, reescrever, revisar e passar a limpo.

A professora trabalhou as questões do sistema de escrita para os alunos não

alfabéticos dentro do contexto do projeto de reescrita de mitos, com atividades de

escrita de listas de personagens, de títulos, de nomes etc.

Um outro aspecto a destacar em seu trabalho é o resultado na aprendizagem

dos alunos: todos avançaram em relação ao conhecimento do sistema de escrita e em

relação aos comportamentos escritores e à produção textual.

Houve um cuidado importante da Eudes em propor as reescritas coletivas (para

socializar comportamentos escritores) e depois em duplas. Os agrupamentos foram

planejados de forma bem criteriosa, considerando os saberes dos alunos e as

atividades.