Parente e Pinheiro

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ISSN 1809-5860 Cadernos de Engenharia de Estruturas, São Carlos, v. 10, n. 47, p. 75-95, 2008 PLÁSTICOS RECICLADOS PARA ELEMENTOS ESTRUTURAIS Ricardo Alves Parente 1 & Libânio Miranda Pinheiro 2 Resumo Apresenta-se uma reunião da literatura existente, enfocando o estado da arte e os avanços obtidos no emprego do plástico, reciclado ou não, com função estrutural, na construção civil. São discutidos alguns aspectos pertinentes a um projeto de Engenharia e, posteriormente, apresentados alguns conceitos e considerações específicos a um projeto de estruturas de material plástico. Ao fim deste trabalho, pode- se concluir que o mercado dos elementos estruturais de plástico reciclado é um nicho a ser explorado e, como a pesquisa sobre o tema é ainda incipiente, há muito a ser estudado, pesquisado e, posteriormente, desenvolvido. Pode-se afirmar que a baixa rigidez do plástico reciclado frente aos materiais de construção tradicionais é a sua maior deficiência. O seu comportamento viscoelástico, dependente do tempo, e a sua sensibilidade à variação de temperatura tornam complexo o dimensionamento com esse material, desencorajando o seu emprego pelos projetistas de estruturas. Desde que sejam desenvolvidas formas de se contornar essas deficiências, como a adição de fibras, o emprego de armaduras de protensão nos elementos estruturais e a aplicação de aditivos, o plástico reciclado como elemento estrutural mostra-se não só tecnicamente viável, é também bastante promissor. Palavras-chave: plásticos reciclados; propriedades; elementos estruturais; projeto. 1 INTRODUÇÃO É difícil imaginar o mundo moderno sem o uso dos plásticos. Desde a descoberta do primeiro plástico sintético, no início do século XX, eles vêm sendo aperfeiçoados e aplicados com sucesso, nas mais diversas atividades do ser humano. Formados a partir de longas cadeias de macromoléculas, ou polímeros, eles possuem propriedades que os tornam atrativos em relação a outros materiais: são leves, resilientes (resistem ao impacto sem se deformar definitivamente), indiferentes à deterioração por decomposição e por ataque de microorganismos, resistentes à corrosão, de fácil processamento e de reduzido custo de manutenção. Segundo Nielsen e Landel (1994), a maioria dos plásticos é aplicada em função das características mecânicas e do custo. Por essa razão, as propriedades mecânicas

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    Cadernos de Engenharia de Estruturas, So Carlos, v. 10, n. 47, p. 75-95, 2008

    PLSTICOS RECICLADOS PARA ELEMENTOS ESTRUTURAIS

    Ricardo Alves Parente1 & Libnio Miranda Pinheiro2

    R e s u m o

    Apresenta-se uma reunio da literatura existente, enfocando o estado da arte e os avanos obtidos no emprego do plstico, reciclado ou no, com funo estrutural, na construo civil. So discutidos alguns aspectos pertinentes a um projeto de Engenharia e, posteriormente, apresentados alguns conceitos e consideraes especficos a um projeto de estruturas de material plstico. Ao fim deste trabalho, pode-se concluir que o mercado dos elementos estruturais de plstico reciclado um nicho a ser explorado e, como a pesquisa sobre o tema ainda incipiente, h muito a ser estudado, pesquisado e, posteriormente, desenvolvido. Pode-se afirmar que a baixa rigidez do plstico reciclado frente aos materiais de construo tradicionais a sua maior deficincia. O seu comportamento viscoelstico, dependente do tempo, e a sua sensibilidade variao de temperatura tornam complexo o dimensionamento com esse material, desencorajando o seu emprego pelos projetistas de estruturas. Desde que sejam desenvolvidas formas de se contornar essas deficincias, como a adio de fibras, o emprego de armaduras de protenso nos elementos estruturais e a aplicao de aditivos, o plstico reciclado como elemento estrutural mostra-se no s tecnicamente vivel, tambm bastante promissor. Palavras-chave: plsticos reciclados; propriedades; elementos estruturais; projeto.

    1 INTRODUO

    difcil imaginar o mundo moderno sem o uso dos plsticos. Desde a

    descoberta do primeiro plstico sinttico, no incio do sculo XX, eles vm sendo

    aperfeioados e aplicados com sucesso, nas mais diversas atividades do ser humano.

    Formados a partir de longas cadeias de macromolculas, ou polmeros, eles

    possuem propriedades que os tornam atrativos em relao a outros materiais: so

    leves, resilientes (resistem ao impacto sem se deformar definitivamente), indiferentes

    deteriorao por decomposio e por ataque de microorganismos, resistentes

    corroso, de fcil processamento e de reduzido custo de manuteno.

    Segundo Nielsen e Landel (1994), a maioria dos plsticos aplicada em funo

    das caractersticas mecnicas e do custo. Por essa razo, as propriedades mecnicas

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    so as mais importantes das propriedades fsicas e qumicas consideradas.

    Projetar elementos de plstico exige, ao menos, um conhecimento elementar do

    comportamento mecnico e de que forma esse comportamento pode variar em funo

    de fatores estruturais que podem ser modificados nos polmeros.

    No entanto, essa liberdade possibilitada pelos plsticos vista como uma

    confusa complexidade (NIELSEN e LANDEL, 1994). necessria uma avaliao dos

    diversos aspectos que afetam o comportamento estrutural, bem como a reunio e a

    organizao do conhecimento existente e o estado da arte. Dessa maneira, algumas

    contribuies deste trabalho so a desmistificao e a divulgao dos elementos

    estruturais de termoplsticos reciclados, junto s comunidades tcnica e acadmica.

    Nas propriedades mecnicas, a dependncia do tempo e da temperatura

    bastante acentuada. Isto se deve natureza viscoelstica, que implica no

    comportamento dual de um lquido viscoso e de um slido elstico. Nos sistemas

    viscosos, o trabalho dissipado sob a forma de calor, enquanto que nos sistemas

    elsticos, acumulado sob a forma de energia potencial (NIELSEN e LANDEL, 1994).

    funo do engenheiro de estruturas o estudo dos materiais que constituem a

    estrutura a ser projetada, para que haja uma concepo racional e uso otimizado dos

    recursos disponveis. Em paralelo, com o avano da cincia dos materiais e com o

    empenho do homem em buscar melhorias, novos materiais foram desenvolvidos. Com

    essa diversidade, a escolha do material tem se tornado, no projeto, um aspecto crtico

    na busca pela soluo estrutural mais adequada.

    Este artigo baseado na dissertao de mestrado de Parente (2006), na qual

    podem ser encontrados maiores detalhes sobre os assuntos aqui tratados.

    2 FUNDAMENTOS TERICOS

    Um projeto estrutural exige o conhecimento das propriedades mecnicas para

    definir o comportamento e adequar, com mais preciso, tcnicas e mtodos de anlise

    e de previso do desempenho do material, sob as aes de projeto.

    Os plsticos se comportam de maneira diferente da madeira, do ao e do

    concreto. Quando se objetiva viabilizar o plstico como material estrutural,

    importante tratar minuciosa e claramente os fundamentos tericos que tratam das

    suas propriedades mecnicas e dos seus modelos preditivos.

    2.1 Tipos de comportamento

    A figura 1 ilustra a diferena do diagrama da deformao ao longo do tempo para

    materiais elstico, viscoso e viscoelstico, quando sujeitos a tenso constante. Essa

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    tenso aplicada no tempo t 0= e mantida constante em um tempo 1t (figura 1a). Como mostrado na figura 1b, a resposta da deformao de um corpo-de-prova

    elstico tem a mesma forma da tenso aplicada. Na aplicao da fora, a deformao

    alcana, instantaneamente, certo valor 0 e permanece constante.

    Figura 1 - Comparao da deformao para os materiais elstico, viscoso e viscoelstico submetidos a uma tenso constante durante o tempo t1. Fonte: HADDAD, 1995.

    Para um fluido viscoso (figura 1c), o material flui a uma taxa constante e a

    resposta da deformao proporcional ao tempo.

    J para o corpo-de-prova viscoelstico (figura 1d), existe um aumento

    relativamente rpido nas deformaes, para pequenos valores de t , imediatamente aps a aplicao da fora. Com o aumento de t , a inclinao da tangente curva diminui e aproxima-se de zero ou de um valor finito, mantida uma tenso constante.

    Com a remoo da fora no tempo 1t , as deformaes recuperar-se-o das

    maneiras mostradas na figura 1.

    O slido perfeitamente elstico recuperar-se- instantaneamente (figura 1b).

    Entretanto, com a remoo da fora, o corpo-de-prova viscoelstico recuperar

    rapidamente a sua deformao elstica; no entanto, a parte retardada da resposta

    necessitar de mais tempo para se recuperar (figura 1d).

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    Num estado de tenso constante, a deformao de um material viscoelstico

    por fluncia pode ser dividida, com referncia figura 2, em trs componentes

    (LETHERSICH, 1950 apud HADDAD, 1995):

    Figura 2 - Deformao de um material viscoelstico submetido a uma tenso constante durante

    o tempo t1. Fonte: HADDAD, 1995.

    (a) Deformao elstica instantnea ( )e 0+ . Essa parcela atribuda s deformaes das ligaes moleculares, incluindo a deformao das ligaes fracas de

    Van de Waals entre as cadeias moleculares. Essa deformao reversvel.

    (b) Deformao elstica retardada ( )d t . A taxa de crescimento dessa parcela da deformao diminui rapidamente com o tempo. Tambm elstica, mas, depois da

    remoo da fora, requer um tempo para uma completa recuperao. , geralmente,

    chamada de fluncia primria ou efeito elstico posterior.

    (c) Fluidez viscosa ( )v t . Esse um componente irreversvel da deformao, que pode ou no aumentar linearmente com a aplicao das tenses. Num material

    polimrico, caracterstico do escorregamento intermolecular. No descarregamento do

    corpo-de-prova viscoelstico no tempo 1t , a resposta elstica instantnea ocorre

    rapidamente e a resposta elstica retardada manifesta-se gradualmente, mas a fluidez

    viscosa permanece (WARD, 1983 apud HADDAD, 1995).

    2.2 Propriedades mecnicas Uma particularidade dos plsticos seu carter viscoelstico: suas propriedades

    mecnicas agregam caractersticas dos lquidos viscosos e dos slidos elsticos.

    Essa natureza explica o seu comportamento complexo dependente do tempo,

    da temperatura e da taxa de deformao.

    Os fenmenos da fluncia e da relaxao das tenses tambm so verificados

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    nos plsticos, como conseqncia da sua natureza viscoelstica. A fluncia a

    denominao dada ao aumento das deformaes para um nvel de tenses constante.

    O comportamento restaurador dos plsticos, quando descarregado, tem sua

    explicao a partir do mesmo princpio da fluncia. Na relaxao, ou seja, admitida

    uma deformao constante ao longo do tempo, as tenses necessrias para mant-la

    reduzem-se ao longo do tempo (CRAWFORD, 1987).

    Conforme ilustra a figura 3, quando se aplica uma fora, ocorre uma primeira

    deformao, instantnea, que representa a parcela elstica (intervalo OA). Com a

    manuteno das tenses, ocorre o fenmeno da fluncia, que aumenta as

    deformaes, representando a parcela viscoelstica (intervalo AB). A restaurao

    das deformaes, quando se descarrega o material, ocorre de maneira similar. Tem-

    se, inicialmente, uma parcela de restaurao elstica (intervalo BC) e, ao longo do

    tempo, a restaurao viscoelstica (intervalo CD).

    Figura 3 - Fluncia e recuperao de um material plstico. Fonte: CRAWFORD, 1987.

    Assim como para os metais, a fadiga dos plsticos tambm deve ser

    considerada. O carregamento cclico pode provocar a degradao do material,

    fazendo-o chegar ruptura com foras inferiores de um carregamento esttico. A

    fluncia pode tambm levar o material ruptura, como conseqncia das deformaes

    excessivas. Esse fenmeno conhecido como fadiga esttica (CRAWFORD, 1987).

    As propriedades mecnicas supracitadas, no entanto, podem variar em funo

    de vrios fatores, tanto externos como intrnsecos ao material. A tabela 1 sumariza

    algumas causas e os efeitos no mdulo de elasticidade e na dutilidade.

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    Tabela 1 - Relaes entre a rigidez e a dutilidade. Fonte: CRAWFORD, 1987.

    Efeito Causa

    Mdulo de Elasticidade Dutilidade

    Reduo da temperatura aumenta diminui Aumento da taxa de deformao aumenta diminui Campo multiaxial de tenses aumenta diminui Incorporao de plastificante1 diminui aumenta Incorporao de material emborrachado diminui aumenta Incorporao de fibras de vidro aumenta diminui Incorporao de material particulado aumenta diminui

    1- Substncia adicionada ao plstico com a funo de torn-lo mais flexvel.

    3 ESTADO DA ARTE

    O uso dos materiais polimricos tem se intensificado nas ltimas dcadas,

    principalmente devido ao avano da cincia dos materiais, s melhorias agregadas ao

    processamento dos plsticos e ao desenvolvimento dos materiais compsitos.

    Desde 1988, nos Estados Unidos, pesquisas tm sido desenvolvidas com o

    intuito de entender o comportamento do plstico reciclado, para a substituio em

    diversas aplicaes na construo civil que, anteriormente, eram exclusivas da

    madeira.

    O progresso obtido reflete-se nas normas da ASTM, nos mtodos de ensaios

    desenvolvidos e nos diversos produtos que surgiram: moures, postes, dormentes de

    ferrovias e estruturas de portos, marinas e pontes (LAMPO e NOSKER, 2001).

    Krishnaswamy et al. (1997), a pedido do Departamento de Recursos Naturais de

    Ohio, nos Estados Unidos, realizaram ensaios em paletes de plstico reciclado (PPR).

    No relatrio que descreve desde a concepo da forma do palete, a sua comparao

    com outros materiais, a anlise do comportamento mecnico e o estudo de viabilidade

    econmica, Krishnaswamy et al. obtm as seguintes concluses:

    Os PPRs so uma opo vivel e, dependendo da capacidade de carga requerida no projeto, podem ser dimensionados para casos particulares;

    O desempenho dos PPRs em laboratrio e em campo alcana e at excede o de paletes de madeira e de ao galvanizado. A integridade estrutural e as

    caractersticas de durabilidade so excelentes;

    Apesar de o custo inicial ser maior que o dos outros materiais, o desempenho e a vida til viabilizam os PPRs, tornando-os comercialmente aceitveis.

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    Sullivan e Wolfgang (1999) desenvolveram um compsito polimrico a partir de

    plstico reciclado, um componente polimrico emborrachado e um de preenchimento

    contendo mica.

    O material resultante sugerido para diversos usos na construo: dormentes

    de ferrovias, meio-fios de estacionamentos e estacas em marinas. Ainda, segundo os

    autores, um dos benefcios do uso do plstico a combinao de baixo peso e

    adequada resistncia. As propriedades qumicas, eltricas e fsicas podem ser

    modificadas de acordo com o critrio de utilizao dos materiais componentes.

    Pesquisadores da AMIPP, Centro de Materiais Avanados via Processamento de

    Polmeros Imiscveis, da Universidade Rutgers em New Jersey/EUA, tm conseguido

    sucesso no desenvolvimento e na aplicao de materiais plsticos em estruturas.

    Nosker e Renfree so exemplos da inovao na AMIPP.

    Eles desenvolveram uma blenda, composta por 35% de poliestireno, PS, e 65%

    de polietileno de alta densidade, PEAD, obtendo um material mais resistente que o

    PEAD e mais rgido que o PS. A grande rigidez deve-se densa estrutura molecular,

    resultado da interconexo do PS com o PEAD (GUTERMAN, 2003).

    A descoberta da blenda, a partir de dois polmeros imiscveis, ocorreu em 1988,

    havendo pouco reconhecimento da comunidade cientfica por, aproximadamente, uma

    dcada. Em 1996, Nosker e Renfree iniciaram a construo de pequenas pontes, com

    o material desenvolvido. Em 1999, construiu-se uma ponte mista, de plstico e ao, no

    Missouri (EUA) e, dois anos depois, uma em New York, de plstico e fibra de vidro.

    Nosker e Renfree (1999a) desenvolveram um dormente para ferrovias a partir de

    um compsito de plstico reciclado. De acordo com esses autores, vrios fatores

    limitam o uso dos dormentes tradicionais de madeira: a reduzida vida til, devido

    ao de microorganismos e da umidade; a maior rigidez das normas de controle e

    preservao, pois grandes reas de florestas so necessrias para suprir o mercado

    de dormentes, alm do uso de preservativos qumicos na madeira.

    O dimensionamento do dormente com plstico reciclado (DCPR) baseou-se nas

    propriedades do tradicional dormente de madeira. Apesar do desempenho

    comprovado empiricamente atravs dos tempos, foi considerada a possibilidade de

    que as propriedades mecnicas da madeira no fossem otimizadas. Ensaios de flexo

    foram realizados com o DCPR e a resistncia ltima e o mdulo de elasticidade foram

    28MPa e 2069MPa, respectivamente.

    Os DCPRs foram instalados em vrias ferrovias, com resultados satisfatrios,

    sem evidncias de fraturas, laminao ou quaisquer outros sinais de degradao.

    A empresa Polywood Plastic Lumber, de New Jersey/EUA, est utilizando a

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    tecnologia desenvolvida pela AMIPP, na fabricao de dormentes e de outros

    elementos estruturais. A figura 5 mostra os dormentes produzidos.

    Figura 5 - Dormentes de plstico reciclado produzidos pela Polywood Plastic Lumber.

    Alm da Polywood, mais duas empresas esto investindo na fabricao de

    dormentes de plstico reciclado: TieTek e U.S. Plastic Lumber, ambas nos EUA.

    A produo das trs empresas difere, mas todas partem do polietileno de alta

    densidade reciclado, misturado e no lavado, utilizam um sistema de extruso e

    realizam uma moldagem sob presso em moldes fechados, com a finalidade de evitar

    vazios no interior dos dormentes.

    A maioria dos processos utiliza maquinrio pesado e so bastante lentos. Aps o

    preenchimento dos moldes, eles so levados para uma banheira de resfriamento e,

    posteriormente, so desmoldados hidraulicamente e deixados ao ar livre para o

    resfriamento total.

    A partir do projeto e da fabricao de dormentes de compsito de plstico

    reciclado, Nosker e Renfree (1999b) continuaram a estudar as diversas aplicaes

    desse material como substituto da madeira. Compararam-se as propriedades

    mecnicas dos elementos estruturais de plstico com as relativas aos de madeira, e

    observou-se que o mdulo de elasticidade do plstico ainda bastante deficiente. Isso

    evidenciado quando se comparam os mdulos de elasticidade do pinho, cerca de

    8.300MPa a 11.000MPa, com o mais alto valor obtido com o plstico, de 2.000MPa.

    A soluo encontrada foi a adio de fibras de vidro dispostas de forma

    aproximadamente orientada, obtendo melhores resultados: aumento mximo de 68%

    na resistncia e de at 176% no mdulo de elasticidade.

    Albano e Sanchez (1999) estudaram as propriedades mecnicas e trmicas da

    blenda composta por polipropileno (PP) virgem e polietileno de alta densidade (PEAD),

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    sendo este ltimo reciclado ou no.

    Verificou-se que, para o mdulo de elasticidade, h um pequeno sinergismo

    entre os materiais constituintes. Observou-se, com microscpio eletrnico, que a

    grande quantidade de molculas interligadas na interface, resultado da adio do

    PEAD, somado ao processo de decomposio do PEAD (ruptura e conseqentes

    reaes de intertravamento), tornam a blenda mais rgida. Os autores mostraram a

    possibilidade do aproveitamento do resduo plstico, desde que fosse verificada a

    influncia da proporo dos plsticos constituintes, nas propriedades trmicas e

    mecnicas.

    Produtos poliolefnicos reciclados com desempenho superior ao dos materiais

    virgens correspondentes foram obtidos por Martins et al. (1999). Utilizando as palavras

    dos autores: O balano das reaes de reticulao e ciso em cadeias poliolefnicas,

    quando expostas a condies ambientais de radicais livres, pode resultar em boas

    propriedades e novas aplicaes.

    O comportamento mecnico da madeira plstica por eles desenvolvida,

    denominada IMAWOOD (constituda basicamente por polietileno), foi melhorado por

    efeito da radiao gama. Outro produto desenvolvido, o IMACAR (constitudo de pra-

    choques descartados de carros), revelou alta resistncia ao impacto, muito superior

    do material virgem de composio correspondente.

    Uma explicao para esse comportamento que a exposio de polmeros s

    radiaes ionizantes altera a sua estrutura molecular e as suas propriedades. Ocorre a

    formao de ligaes cruzadas entre as cadeias, paralelamente ciso entre tomos.

    A reticulao provoca um aumento do peso molecular, que geralmente ocasiona

    melhoria das propriedades, enquanto que a ciso de cadeias reduz o seu peso, tendo

    como resultado a deteriorao das propriedades. Como o polietileno apresenta

    reticulao aps a irradiao, pode-se esperar uma melhoria nas suas propriedades

    mecnicas (MARTINS et al., 1999).

    Aps a irradiao ao ar em intensidade crescente de exposio, o IMAWOOD

    apresentou um aumento em torno de 15% na resistncia trao e uma diminuio da

    ordem de 80% no alongamento de ruptura.

    Houve tambm um aumento crescente no mdulo de elasticidade no ensaio de

    compresso, o que indica maior rigidez do plstico reciclado, com o aumento do tempo

    de exposio (MARTINS et al., 1999).

    Carroll et al. (2001) estudaram as propriedades estruturais dos elementos de

    plstico reciclado, com adio de farinha de madeira. Os autores concluram que o

    material estruturalmente satisfatrio, mas no se deve simplesmente substituir o

    elemento de madeira pelo de plstico, com as mesmas dimenses.

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    Eles enfatizam que as estruturas de compsitos plsticos devem ser

    projetadas como tal, e no utilizando parmetros e conhecimentos tericos e

    empricos, vlidos para outros materiais.

    Krishnaswamy et al. (2001a) desenvolveram um compsito polimrico e

    projetaram e construram uma ponte sobre o rio Hudson, em New York/EUA. O

    comprimento total e a largura da ponte so, respectivamente, 9m e 3,35m.

    O projeto consumiu um total de 5.000kg de plstico (polietileno de alta

    densidade) reforado com fibra de vidro e 2.500kg de ao para as conexes e os

    tirantes utilizados (KRISHNASWAMY, 2001b). A figura 6 mostra a ponte j construda.

    O monitoramento da ponte sob a ao das cargas de projeto feito

    continuamente, por meio de dez pontos de observao. Utilizando uma referncia fixa,

    so medidos os deslocamentos, por meio de uma estao total, com GPS (Sistema de

    Posicionamento Global) (KRISHNASWAMY, 2001b).

    Figura 6 - Ponte sobre o rio Hudson construda com plstico reforado com fibra de vidro.

    Por meio de teste de carga padronizado pela AASHTO (American Association of

    State Highway and Transportation Officials), em abril de 2001, a uma temperatura de

    13C, o maior deslocamento, medido na parte inferior da ponte, foi de 32,5mm,

    denunciando a baixa rigidez do material utilizado, cerca de 20% a 30% da rigidez da

    madeira (KRISHNASWAMY, 2001b).

    De acordo com Krishnaswamy (2001b), os elementos estruturais de plstico

    reciclado reforado com fibras, como os utilizados na ponte, oferecem uma alternativa

    economicamente vivel para pequenos vos.

    As vantagens so: no um material biodegradvel e no sofre corroso de

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    qualquer espcie. Materiais ensaiados aps dez anos de utilizao mostraram um

    aumento na rigidez e na resistncia.

    Alm de ser um material ambientalmente responsvel, quando se considera o

    custo em funo da sua vida til, o sistema construtivo torna-se competitivo.

    Em 2002, os pesquisadores da AMIPP, Nosker et al., construram uma ponte

    inteiramente de plstico guarda-corpos, vigas e plataforma , com exceo dos

    pilares, aproveitados da estrutura de madeira anterior. Com 14m de comprimento e

    peso em torno de 14t, estima-se que essa ponte sobre o rio Mullica, em New Jersey,

    construda de material reciclado, tenha consumido 250.000 garrafas plsticas e

    750.000 copos de caf (DOWNS, 2002; JACOBSON, 2003; SAWYER, 2003;

    GUTERMAN, 2003; GALIOTO, 2004). As figuras 7 e 8 ilustram a ponte e sua

    construo.

    Figura 7 - Detalhes das vigas I utilizadas na construo da ponte sobre o rio Mullica.

    Figura 8 - Ponte sobre o rio Mullica construda inteiramente de plstico.

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    As vigas I utilizadas possuem uma seo de 41cm x 43cm (16 x 17). A

    ponte foi projetada para suportar o peso de caminho de at 18t. Alm do apelo

    ecolgico, com a reciclagem dos resduos plsticos, o material constituinte da ponte

    resistente ao da gua, corroso e ao ataque por microorganismos.

    A pesquisa aplicada ao desenvolvimento de novos materiais pelo grupo de

    pesquisadores da AMIPP e o sucesso por eles alcanado retratado pelas patentes

    registradas de novos materiais e de novas metodologias de reciclagem de plsticos.

    A primeira delas, n 5.298.214 de 29/03/1994 (United States Patent), trata do

    processamento de plsticos. Ela discorre sobre o mtodo de obteno de compsitos

    de poliestireno (PS) e de outras poliolefinas, a partir de plsticos reciclados.

    Em seguida, as patentes n 5.789.477 de 04/08/1998 e n 5.916.932 de

    29/06/1999 (United States Patent) registram um material compsito destinado

    construo civil, obtido a partir de materiais reciclados. O compsito obtido do

    polietileno de alta densidade reciclado e fibras, como, por exemplo, a fibra de vidro.

    A patente n 5.951.940 de 14/09/1999 (United States Patent) fornece subsdios

    para o processamento adequado dos plsticos reciclados. De acordo com os

    inventores, todo o esforo tem sido direcionado no sentido de tornar economicamente

    vivel o processo de reciclagem do plstico ps-consumo, sem que haja a

    necessidade de uma triagem, ou seja, tornar exeqvel a reciclagem de plsticos

    misturados, poliolefinas ou no, juntamente com as impurezas.

    A construo com elementos de plstico reciclado uma realidade,

    principalmente nos Estados Unidos e, em menor escala, no Canad e na Inglaterra. A

    tecnologia desenvolvida nas universidades j ultrapassou a escala experimental de

    laboratrio e chegou aos ptios das fbricas, com a produo em grande escala.

    Figura 9 - Marina construda com pilares de plstico reciclado desenvolvido na AMIPP.

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    Figura 10 - Deque e per com elementos de plstico reciclado (Plastic Lumber Yard/EUA).

    As figuras 9 e 10 indicam amostras do que est sendo feito no mundo,

    comercialmente, e indicam um cenrio que no deve ser ignorado, a dos elementos

    estruturais de material plstico reciclado.

    Dentre os tipos de processamento, o mais adequado produo de perfis com

    fins estruturais a pultruso. Correia et al. (2005) ensaiaram perfis pultrusados e

    verificaram as mudanas ocorridas nas propriedades fsicas, qumicas, mecnicas e

    estticas, quando submetidos exposio acelerada de umidade, temperatura e

    radiao ultravioleta. O material estudado que compunha os perfis era o polister

    reforado com fibra de vidro (GFRP). A partir dos resultados dos ensaios, concluiu-se

    que a resistncia e a deformao na ruptura diminuram com a umidade, e este efeito

    foi acelerado pelo aumento da temperatura.

    Correia et al. (2005) salientaram que a degradao ocorreu devido a um

    fenmeno fsico, como a plastificao da matriz polimrica, no havendo uma

    degradao qumica passvel de ser considerada. Apesar da reduo dos valores das

    propriedades mecnicas, observados nos ensaios de durabilidade, a pesquisa

    confirmou que os perfis pultrusados de GFRP apresentaram excelente desempenho

    estrutural, indicando durabilidade maior, em comparao com materiais tradicionais.

    4 O PROJETO DE ESTRUTURAS DE MATERIAL PLSTICO

    A proposio de um novo sistema estrutural ou a substituio parcial de

    elementos tradicionais por outros de plstico deve vir seguida do estudo da alterao

    que ser necessria na arquitetura, at para definir em quais solues o plstico pode

    ser aplicado. Talvez um dos fatores mais importantes a se considerar seja o vo que

    pode ser alcanado com essa estrutura. De certa forma, um problema de natureza

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    arquitetnica, e que evidencia a dependncia bvia entre estrutura e arquitetura.

    Alm de manter a estabilidade da obra, o novo material deve tambm atender s

    condies de servio. No caso dos plsticos, talvez o fator mais limitante seja a

    temperatura. Nos materiais viscoelsticos, medida que se aumenta a temperatura,

    diminui-se o mdulo de elasticidade. Em se tratando de materiais estruturais, a perda

    de rigidez torna-se crtica, pois indesejvel que surjam deformaes excessivas,

    causa de desconforto aos usurios e at do colapso da estrutura.

    O uso de materiais combinados ou compsitos polimricos contorna algumas

    deficincias dos plsticos, como a baixa rigidez e a suscetibilidade variao de

    temperatura. Esses compsitos, antes aplicados exclusivamente na indstria

    aeronutica e aeroespacial, passam a ser cada vez mais utilizados na construo civil,

    atendendo aos desafios impostos pela arquitetura cada vez mais arrojada e aos

    requisitos de durabilidade e de alto desempenho.

    O emprego de reforos um conceito que tem sido extensivamente aplicado

    pelos projetistas, e com os materiais plsticos no diferente. Desde o uso pelos

    egpcios de fibras naturais como reforo em estruturas de argila, os materiais

    compsitos atendem s demandas por solues na rea da construo.

    Por exemplo, a combinao de ao e concreto, formando concreto armado, tem

    sido a base para inmeros sistemas estruturais adotados desde o incio do sculo XX.

    Os projetistas, contudo, continuam a utilizar novos materiais, com o intuito de tornar as

    estruturas mais resistentes, maiores, mais durveis, energeticamente eficientes e

    esteticamente agradveis (LOPEZ-ANIDO e NAIK, 2000).

    4.1 Propriedades do plstico

    Para uma correta concepo da estrutura, visando o aproveitamento das

    vantagens do material plstico, certas propriedades devem ser observadas, a

    depender do fim a que se destina a estrutura, pois devem ser levadas em

    considerao as peculiaridades desse material, cujo comportamento bastante

    diferente dos relativos aos metais, madeira e ao concreto.

    As propriedades mais relevantes em um projeto estrutural so:

    Resistncia trao, compresso e flexo; Mdulo de Elasticidade (para diversas temperaturas); Coeficiente de Poisson; Resistncia ao impacto e fadiga; Fluncia; Relaxao;

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    Absoro de gua; Temperatura de transio vtrea - gT ; Coeficiente de expanso trmica.

    O projetista que deseja dimensionar elementos estruturais deve fazer, durante o

    desenvolvimento do projeto estrutural, as seguintes perguntas:

    Qual o nvel de tenses a que o material ser submetido? Qual a solicitao predominante (trao, compresso, flexo, toro)? Qual a vida til esperada para a estrutura? Ser a estrutura submetida ao impacto? Ser a estrutura submetida a um carregamento cclico (fadiga)? Qual a deformao admissvel para a estrutura em questo? Qual a mxima temperatura a que o plstico ser submetido? Ser o plstico exposto umidade e a substncias qumicas?

    4.2 Limitaes de uma estrutura de material plstico

    A seguir so mostradas algumas das principais limitaes do uso do material

    plstico em elementos estruturais.

    a) Inflamabilidade e influncia da temperatura Para que o material plstico possa ser utilizado com segurana em edificaes,

    podem-se utilizar normas especficas que prevejam o cuidado com a inflamabilidade

    das estruturas.

    A adio de produtos qumicos retardantes de chama, durante a manufatura dos

    plsticos, uma forma de se evitar o perigo de incndio em estruturas com elementos

    de material plstico.

    O dimensionamento de uma estrutura de plstico, em funo de sua baixa

    rigidez, dever ser regido pelo estado limite de servio, sendo a deformao o fator

    limitante de projeto.

    A perda da rigidez dos plsticos com a diminuio de seu mdulo de

    elasticidade, medida que se aumenta a temperatura, deve ser considerada em

    projeto.

    Por exemplo, um plstico como o poliestireno possui quatro estgios de

    deformao com o aumento da temperatura, como mostra a figura 11. O impacto da

    variao de temperatura sobre os plsticos , talvez, o maior entrave sua aplicao

    em estruturas, apesar de fibras reduzirem bastante essa influncia.

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    Figura 11 - Mdulo de elasticidade E versus temperatura. Fonte: PRINGLE e BAKER, 2000.

    b) Estabilidade aos raios ultravioletas (UV) Ao ser aplicado em elementos estruturais que, porventura, estaro expostos ao

    sol, deve-se observar a resistncia dos plsticos aos efeitos dessa exposio. Isso

    porque a radiao ultravioleta pode tornar o plstico, antes durvel e resistente, num

    material que se quebra ou se rompe sob uma fora aplicada, e este um processo

    irreversvel (PRINGLE e BAKER, 2000).

    Como a deteriorao em funo dos raios UV bastante lenta, so realizados

    ensaios utilizando luz artificial para acelerar o processo, para se medir essa

    estabilidade. Existem, no entanto, produtos qumicos chamados de estabilizantes que

    retardam o efeito da radiao, minimizando bastante os efeitos malficos que podem

    vir a surgir.

    Os plsticos reciclados podem conter estabilizantes UV, mas no possvel ter

    essa certeza, a no ser que sejam realizados ensaios que possam detectar essas

    substncias, o que no prtico. De qualquer forma, raramente possvel determinar

    a quantidade de estabilizante utilizado e a degradao que o plstico j sofreu. Por

    isso, em algumas aplicaes, para se garantir maior vida til, utiliza-se uma proporo

    de material virgem com o material reciclado (PRINGLE e BAKER, 2000).

    Lynch et al. (2001) verificaram quais foram as mudanas nas propriedades

    mecnicas de elementos estruturais de material plstico reciclado, mais precisamente

    polietileno de alta densidade (PEAD), expostos ao sol e s intempries por 11 anos.

    Os resultados, contudo, mostram um prognstico positivo para a utilizao de plstico

    reciclado, ao menos para o tipo de plstico estudado, o PEAD.

    Houve um clareamento superficial em funo da radiao UV no lado que estava

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    exposto ao sol. A radiao ainda provocou uma minscula degradao da superfcie

    do PEAD, da ordem de 0,075mm/ano. No entanto, o clareamento e a minscula

    degradao superficial no afetaram as propriedades mecnicas do material.

    A figura 12 permite comparar os lados do elemento estrutural, sendo o de cima o

    exposto ao sol, e o de baixo o que no foi submetido a essa exposio. A figura 13

    mostra a estrutura da passarela, da qual foi retirado o material para os ensaios.

    Figura 12 - Clareamento do PEAD como resultado da radiao UV. Fonte: LYNCH et al., 2001.

    Figura 13 - Passarela de onde foi retirado o material para ensaio. Fonte: LYNCH et al., 2001.

    Lynch et al. (2001) concluram, aps verificar um aumento de 3% no mdulo de

    elasticidade e na resistncia flexo, que as mudanas climticas ao longo dos 11

    anos aumentaram o grau de cristalizao do plstico, e que essa reduo das regies

    amorfas contriburam para o aumento da rigidez e da resistncia do PEAD reciclado.

    c) Resistncia aos solventes Em algumas aplicaes, deve-se verificar se o plstico ser exposto a solventes,

    como, por exemplo, o contato com combustveis ou outros derivados do petrleo, haja

    vista que isso pode comprometer a sua integridade.

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    O mesmo cuidado deve ser dedicado aos plsticos reciclados e, caso

    necessrio, o material deve ser processado de forma a melhorar sua resistncia frente

    aos solventes (PRINGLE e BAKER, 2000).

    5 CONCLUSES

    Ao se introduzir um material estrutural alternativo como o plstico reciclado,

    desmistifica-se para a comunidade cientfica e para a sociedade o seu potencial e as

    suas vantagens que, dentre as vrias, podem-se citar: o forte apelo ecolgico, o baixo

    peso especfico, a indiferena deteriorao por decomposio e por ataque de

    microorganismos, a alta resistncia corroso, o fcil processamento e o reduzido

    custo de manuteno.

    A abundncia de material plstico reciclado a baixo custo uma alternativa a ser

    explorada em estruturas, e no deve mais ser desconsiderada.

    A pesquisa sobre o tema no Brasil incipiente e a escassez de uma bibliografia

    nacional evidencia esse atraso. No entanto, em pases como Estados Unidos, Japo e

    Canad, os avanos na rea so notveis, tornando possvel a construo de pontes,

    passarelas, deques, ferrovias e marinas com elementos estruturais de plstico,

    reciclado ou no.

    Com base no que foi abordado neste artigo, pode-se fazer observaes

    indicadas nos pargrafos seguintes.

    Os materiais plsticos possuem uma baixa rigidez quando comparados com os

    materiais de construo tradicionais, como a madeira, o ao e o concreto.

    A adio de fibras aumenta substancialmente o mdulo de elasticidade. Alm

    disso, a adio de fibras pode ser empregada tambm para atenuar os fenmenos

    dependentes do tempo, como a fluncia e a relaxao.

    A baixa rigidez tambm pode ser compensada com o emprego de armaduras

    protendidas ou com o desenvolvimento de geometrias timas, aproveitando a alta

    relao resistncia/densidade desses materiais.

    Uma das principais vantagens dos plsticos, quando comparados aos materiais

    tradicionais, a sua possibilidade de ser moldado nas mais diversas formas, no

    exigindo soldas ou outros processos de conformao, para a obteno do produto

    final. Enquanto um perfil metlico possui diversas etapas para a sua manufatura, um

    perfil de material plstico pode ser confeccionado numa nica etapa.

    A relao resistncia/densidade para os materiais plsticos, principalmente os

    compsitos polimricos, superior dos materiais tradicionais. Esse peso reduzido

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    permite um melhor aproveitamento da capacidade estrutural do elemento e a

    adoo de um sistema estrutural mais eficiente.

    As caractersticas de um plstico podem ser desenvolvidas a partir das

    necessidades de projeto, sendo esta possibilidade uma diferena bsica perante os

    materiais tradicionais, que normalmente requerem que os projetos sejam adequados

    s propriedades mecnicas disponveis comercialmente.

    Os termoplsticos possuem o comportamento dependente da temperatura e da

    taxa de deformao. A temperatura pode ser considerada um fator limitante.

    Nos materiais viscoelsticos, medida que se aumenta a temperatura, diminui o

    seu mdulo de elasticidade. Em se tratando de materiais estruturais, a perda de

    rigidez torna-se crtica, pois indesejvel o surgimento de deformaes excessivas,

    causando desconforto aos usurios e at mesmo o colapso da estrutura.

    Antes de se projetar uma estrutura de plstico, deve-se observar com que

    intensidade os elementos estruturais estaro expostos ao calor, fazendo-se o

    dimensionamento para a pior condio possvel, ou seja, a maior temperatura.

    A inflamabilidade dos plsticos deve ser considerada. Para que o material

    plstico possa ser utilizado com segurana em edificaes, devem ser utilizadas

    normas que prevejam o cuidado com a inflamabilidade dessas estruturas e, at

    mesmo, o emprego de instalaes especiais de combate ao incndio.

    A adio de produtos qumicos retardantes de chama uma forma de se atenuar

    o perigo de incndio em estruturas com elementos de material plstico.

    Outra soluo a utilizao de uma camada protetora, de material isolante.

    6 AGRADECIMENTOS

    CAPES, pela bolsa de mestrado.

    7 REFERNCIAS

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