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UFRJDEPARTAMENTO DE ENGENHARIA INDUSTRIAL

Disciplina

PLANEJAMENTO E CONTROLE DA PRODUO I prof. Eduardo G. M. Jardim prof. Leonardo A. Guimares (apoio)

PLANEJAMENTO E CONTROLE DA PRODUOPARA A COMPETITIVIDADE

Autores: Ricardo Sarmento Costa Eduardo G. M. Jardim

Planejamento e controle da produo para a competitividade

Contedo1. A manufatura como fonte de vantagens competitivasO papel estratgico do cho-de-fbrica

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2.

Fatores de competitividade e estratgias de competioFatores qualificadores e ganhadores de encomendas no mercado Estratgias focada e onidirecional

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3.

Objetivos estratgicos da ManufaturaCompetio baseada em pontualidade e rapidez

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4.

Estratgia de ManufaturaO conceito de foco Decises no contexto da Manufatura Decises estruturais e relativas ao funcionamento da infraestrutura

1212 13 14

5. 6.

O papel estratgico das decises de curto prazo Sntese e concluses

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Ricardo Sarmento Costa e Eduardo G. M. Jardim

1.

A Manufatura como fonte de vantagens competitivas1

Como na fbula da "Galinha dos Ovos de Ouro" - onde o dono mata a ave que lhe traz riqueza para retirar o ouro que supunha existir em sua barriga muitas vezes, na vida

real, a nsia de maximizar resultados financeiros deixa de lado alguns dos aspectos mais estruturais das questes. No contexto da gesto industrial, por exemplo, comum o foco das atenes gerenciais deslocar-se da essncia do processo produtivo para a esfera das decises de curtssimo prazo, de natureza puramente conjuntural. De fato, numa poca onde: o processo de tomada de deciso cada vez mais veloz; o ciclo de vida dos produtos reduz-se vertiginosamente; os recursos materiais ficam cada vez mais escassos; os mercados tornam-se mais e mais competitivos e a quantidade de

conhecimentos disponveis se multiplica numa variedade imensa de tcnicas, mtodos e possibilidades de ao, compreende-se as dificuldades encontradas pelas empresas para

definir uma rota estratgica que conduza posies de mercado competitivas e sustentveis. No caso brasileiro, por exemplo, onde a essas circunstncias somam-se ainda dificuldades ligadas ao ambiente econmico instvel, as preocupaes com a lucratividade frequentemente se restringem ao universo de alquotas, taxas de juros, impostos e outros itens de mesma natureza. Tome-se ainda a perspectiva da pequena e mdia empresa, cuja capacidade de financiamento e poder de barganha junto aos clientes e fornecedores so restritos, e a discusso de competitividade acaba quase sempre reduzida a anlises de fluxos de caixa e estratgias de sobrevivncia.

Usaremos os termos Manufatura, Marketing e Finanas, dentre outros, para designar as principais funes relacionadas a gesto de uma corporao. Em particular, o termo Manufatura estar aqui se referindo funo fabril propriamente dita, responsvel pelo ciclo de transformao dos insumos e materiais em produtos acabados .

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Do ponto de vista da empresa industrial, entretanto, (como na fbula dos ovos de ouro) no h, fora do cho-de-fbrica, processo de gerao de riqueza que seja sustentvel ao longo do tempo. Uma boa estratgia de marketing no ser capaz de garantir o sucesso estvel de uma empresa no mercado se no estiver sintonizada com as foras e limitaes do sistema produtivo existente. Do mesmo modo, aplicaes especulativas de alta rentabilidade podem aumentar a lucratividade de uma empresa num certo momento mas no necessariamente garantem a sua posio competitiva no tempo. O cenrio de atuao da empresa industrial a produo e venda de bens e servios no mercado. E por mais adversas que sejam as condies macroeconmicas, ou por mais

sedutoras que sejam as oportunidades de curtssimo prazo, na gesto estratgica do chode-fbrica que se encontram alguns dos elementos mais decisivos para a competitividade. De fato, foi a partir dessa constatao to simples que empresas japonesas e alems conceberam estratgias bem sucedidas de competitividade nas ltimas dcadas. Em

particular, as firmas japonesas penetraram em mercados j existentes com produtos melhores e mais baratos, alcanando esses resultados fundamentalmente a partir do uso de modernas tecnologias de gesto de cho-de-fbrica.

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O papel estratgico do cho-de-fbrica

As atividades de cho-de-fbrica reassumem hoje em todo o mundo, relevncia semelhante que desfrutaram no perodo que se seguiu Revoluo Industrial. Naquela

poca as preocupaes gerenciais focavam prioritariamente os processos fabris como decorrncia do fato de que os mercados estavam incipientemente explorados e a capacidade de produo era ainda muita restrita. Praticamente tudo o que se fabricava, vendia-se. Na altura dos anos 60, entretanto, medida em que essa relao demanda/capacidade se alterava, a busca de novos mercados e a disputa dentro dos j existentes trouxe ao centro da cena empresarial as funes de Marketing. Em muitos casos, os diretores de Marketing vieram a se tornar os diretores das empresas e a tomada de deciso estratgica passou a se vincular diretamente a essa funo. O momento seguinte, j na dcada de 70, foi marcado pela ascenso da funo de Finanas energtica. Paradoxalmente, aps ter ficado durante tantos anos relegada a um papel apenas reativo, agora quando a competio nos mercados mundiais torna-se cada vez mais ao centro das decises, como decorrncia das recesses mundiais e da crise

acirrada, a funo fabril recolocada na ordem do dia. Diferentemente dos primrdios da Revoluo Industrial, porm, o que est em jogo no mais o aumento puro e simples dos volumes de produo. Nesse novo tempo, a definio de que preos cobrar, que prazos

prometer e com qual qualidade fabricar foge ao controle puro e simples do fabricante e tornase um fato externo fbrica, especificado pelos clientes no mercado.

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Em decorrncia,

a gesto do cho-de-fbrica passa a conjugar preocupaes

tradicionais ligadas eficincia do processo e reduo de custos com aspectos mais diretamente relacionados satisfao dos clientes, como qualidade do produto, cumprimento de prazos, dentre outros. No nvel estratgico, a correspondncia desses fatos a paulatina reintegrao da funo de Manufatura no processo de definio das estratgias corporativas. Trata-se de um fenmeno hoje observado nas grandes empresas industriais de todo o mundo e preconizado na literatura por autores que chamam a ateno para a necessidade de tornar a Manufatura uma funo proativa, de contedo estratgico. No Brasil, essa mudana de atitude ganhou fora a partir da dcada de 90 com a abertura da economia e a consequente necessidade de competir em mercados regulados pela lgica e padro internacional. Entretanto, especialmente no contexto da pequena e mdia empresa, a Manufatura parece encontrar-se ainda relegada a um papel secundrio, apenas reativo, respondendo como pode a polticas corporativas definidas, em geral, sem a sua participao efetiva. H uma srie de razes histricas, prticas e subjetivas que de algum modo explicam essa situao, no s a nvel do Brasil, como de resto em todo o mundo industrializado. Mas Surge uma questo cuja obviedade chega a ser devastadora: como possvel que a funo que rene a vasta maioria dos recursos humanos, materiais e financeiros da empresa e que, em ltima anlise, a maior responsvel pela gerao da riqueza produzida pela companhia, no seja chamada a compartilhar o processo de tomada de deciso sobre a estratgia da corporao?

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2.

Fatores de competitividade e estratgias de competio

Pensar a manufatura de forma estratgica procurar entender como a fbrica pode contribuir para o sucesso da empresa no mercado. Trata-se de examinar o funcionamento e as caractersticas do ambiente em que a empresa compete para ento decidir, de forma

coordenada e consistente, quais processos, procedimentos e mtodos de gesto so capazes de prover vantagens competitivas nos fatores que efetivamente decidem a obteno de um pedido de cliente. O ponto de partida para essa anlise o mercado. Isto , entender os critrios que levam um cliente tpico a escolher uma marca em lugar de outra, ou encomendar um servio a um fornecedor em detrimento de outros. Sem pretender fazer uma anlise exaustiva do

assunto, a figura 1 enumera uma srie de razes que influenciam essa deciso.

Qualidade do servio ps-venda Rapidez de entrega Pontualidade na entrega

Qualidade do produto: Preo Performance Confiabilidade Atuao do vendedor Durabilidade Aparncia Linha de produtos: Cores Tamanhos Modelos

Fidelidade a uma escolha anterior

Condies de pagamento Novidade Moda Imagem ou reputao social do fabricante Influncia da famlia e de amigos Convenincia ou facilidade da compra

Figura 1: Fatores que afetam a escolha de um produto (ponto de vista do consumidor)

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Fatores qualificadores e ganhadores de encomendas no mercado

Dependendo do negcio em questo,

a forma como cada um dos fatores de

competitividade citados na figura 1 influi na deciso de compra do cliente diferenciada. H mercados onde o baixo preo tende a ser o fator decisivo como, por exemplo, na comercializao de bens de consumo popular. J em outras situaes - na produo de

automveis de luxo, por exemplo - o preo relativamente menos importante e a qualidade intrnsica do produto ganha fora como um aspecto decisivo no comportamento do cliente. Para estruturar essa reflexo, pode-se adotar duas categorias de anlise, quais sejam: (a) o grau de influncia que o fator desempenha na efetiva obteno de encomendas no mercado e (b) a contribuio do fator na qualificao da empresa para participar do processo de concorrncia. Distinguem-se assim, para cada negcio e/ou pblico-alvo, fatores de competitividade que so ganhadores e fatores que so apenas qualificadores. Um exemplo bem simples: numa concorrncia entre duas lojas de fast-food com produtos similares, se o pblico-alvo o profissional liberal que deseja fazer um lanche rpido na hora de almoo, a presteza do atendimento tende a ser mais decisiva do que pequenas variaes no preo e na prpria qualidade do sanduiche, para efeito da escolha feita pelo cliente. Saliente-se que se o po ruim ou o preo do sanduiche o mesmo de um jantar sofisticado, a loja nem ser lembrada quando o cliente decidir fazer seu lanche (isto , o preo e a qualidade qualificam a loja para a concorrncia.). Mas o tempo de atendimento que, provavelmente, determinar a escolha final (nesse caso a rapidez de entrega atua como o fator ganhador). O mesmo exemplo pode resultar numa anlise totalmente diversa se o pblico alvo, ao invs de executivos, composto de assalariados de baixa renda. Nessa hiptese, a

tendncia que o preo do sanduiche passe a ser decisivo deixando a rapidez da entrega relegada a um papel ainda importante, mas apenas qualificador.

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Estratgias focada e onidirecional

Identificados quais so os fatores ganhadores e qualificadores, dois caminhos so usualmente mencionados na definio de uma estratgia de competio. O primeiro deles d conta de uma abordagem onidirecional, isto , a empresa tenta superar seus concorrentes em todos ou quase todos os fatores de competitividade relevantes, simultaneamente (e.g. preo, qualidade, rapidez de entrega, pontualidade e flexibilidade). Em contraste, a segunda estratgia selecionar um ou alguns dos principais fatores ganhadores de pedidos e focar as atenes gerenciais nesses objetivos buscando estabelecer uma diferenciao positiva em relao aos competidores (ainda que se situando em posio ligeiramente inferior concorrncia nos demais fatores). idia. A figura 2 ilustra essa

Estratgia OnidirecionalQualidade

Estratgia FocadaQualidade

Preo

Pontualidade

Preo

Pontualidade

Rapidez

Rapidez

Performance do principal competidor Performance desejada para a empresa

Figura 2: Estratgias de competio

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A justificativa da estratgia focada que, diante do acirramento da competio e da velocidade de inovao nos mercados atuais, dificilmente uma empresa poder alcanar e sustentar uma posio de excelncia em todos os fatores de competitividade, ao mesmo tempo. Nessas circunstncias, a estratgia focada possivelmente a melhor forma de

alavancar a posio competitiva da empresa ampliando-se a fatia de mercado ocupada2. Trata-se de uma abordagem ofensiva que visa persuadir clientes que usam produtos de outros fabricantes a refazer suas opes em favor dos produtos da empresa em questo. Para alterar o comportamento desses consumidores necessrio alcanar graus ntidos de diferenciao em pelo menos algum dos fatores que so decisivos na sua atitude em relao compra do bem ou servio considerado. Segundo autores que estudaram as estratgias empresariais adotadas por firmas japonesas, a definio de uma estratgia focada buscando obter uma diferenciao positiva nos fatores ganhadores de encomendas deve considerar as seguintes aes: 1. Evitar que a performance da empresa em algum dos fatores qualificadores caia abaixo

do nvel tolerado pelo mercado; 2. Tomar como aceitvel a situao onde a performance da empresa nos fatores

qualificadores ligeiramente inferior concorrncia desde que essa inferioridade se situe numa zona de indiferena, sem prejuzos para a presena no mercado; 3. Buscar decididamente superioridade em relao concorrncia em pelo menos um dos

fatores ganhadores de ordens; 4. Manter essa superioridade num patamar visvel mas no excessivo, isto , evitar gastos

desnecessrios para melhorar a performance de critrios ganhadores quando a diferenciao nesses critrios j existe.

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Apenas a ttulo de registro, cabe mencionar que em situaes onde a empresa lder de mercado e o objetivo estratgico no obter uma diferenciao adicional mas sim manter uma posio j conquistada, estratgias onidirecionais podem eventualmente tambm ser indicadas decidindo a empresa, nesses casos, atuar em vrios fatores simultaneamente de acordo com as presses e ameaas dos vrios concorrentes.

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3.

Objetivos estratgicos da Manufatura

As observaes feitas na Parte 1 deste texto (que consta no Informativo TGPS n 6) referem-se no apenas Manufatura, mas empresa como um todo. Com efeito, observandose a natureza dos fatores de competitividade citados (Fatores que influenciam o consumidor na escolha de um produto), constata-se que a obteno de uma diferenciao positiva nesses fatores fruto no do desempenho de um setor isolado da empresa, mas sim do esforo conjunto e integrado de suas vrias funes (e.g. marketing, finanas, manufatura, dentre outras). A figura 3 apresenta um quadro que serve como referncia para a reflexo sobre a contribuio que cada rea funcional tem a dar na melhoria de performance dos vrios elementos de competitividade. Dois aspectos devem ser notados. Primeiro, as linhas da matriz contm os fatores identificados como relevantes para o negcio em questo. Segundo, nem todos os fatores relevantes so igualmente potencializveis pelas vrias funes da empresa.

\

Funo => \ ________________ Fatores de \ competitividade \

P&D

Manufatura

Marketing

Finanas

Pessoal

Outros

Qualidade do produto Linha de Produtos Preos Rapidez de entrega Pontualidade Servio ps venda ------Convenincia da compra Condies de pagamento Desempenho do vendedor Imagem social da empresa

Figura 3: Matriz para discusso de uma estratgia competitiva integrada

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Por exemplo, tomando-se para anlise a funo manufatura e objetivos como baixo preo e qualidade do produto, pode-se supor que a contribuio dessa funo para a performance global da empresa , diante desses objetivos, clara e decisiva. J no que toca a fatores como o servio ps-venda, a convenincia de compra e a imagem social da empresa, o papel estratgico da manufatura tende a ser apenas de suporte indireto, sendo mesmo quase nulo quando o critrio de deciso dos clientes est relacionado a condies de pagamento, atuao dos vendedores e demais itens dessa natureza. Pode-se apontar o baixo custo, a qualidade do produto, a rapidez de entrega, a pontualidade e a flexibilidade como os fatores de competitividade mais citados na literatura como prioridades competitivas da atividade fabril, com impacto direto na competitividade da empresa. O quadro apresentado na figura 4 ilustra resumidamente essa idia.

Preo Qualidade Rapidez Pontualidade

A vantagem de fazer barato A vantagem de fazer certo A vantagem de fazer rpido A vantagem de fazer no tempo A vantagem de saber lidar com a mudana

Flexibilidade

Figura 4: Vantagens competitivas potencializveis pela atividade de manufatura

Pode-se desdobrar o conceito em quatro categorias distintas, quais sejam: (i) a flexibilidade de produto, que trata da capacidade de introduzir novos produtos ou de modificar aqueles em produo; (ii) a flexibilidade de mix, que se refere a

capacidade de mudar a variedade de produtos que est sendo fabricada num determinado perodo; (iii) a flexibilidade de volume, relacionada alterao do nvel

agregado de produo e (iv) a flexibilidade de entrega, cuja idia est associada capacidade de refazer os planos para acomodar novas prioridades ou datas de entrega.

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A cada um desses tipos, pode-se adicionar ainda duas dimenses de anlise, a saber: (i) velocidade de mudana, que descreve o quo rpido a empresa capaz de mudar o que feito e (ii) amplitude da mudana, que descreve a magnitude da alterao.

Competio baseada em pontualidade e rapidez

Rapidez, pontualidade e velocidade de mudana (nas quatro categorias de flexibilidade acima citadas) tm sido cada vez mais identificadas como as novas armas estratgicas de competio nos mercados mundiais. Trabalhando com estratgias de

reduo de tempos - que abrangem todas as fases do ciclo de produo, desde a pesquisa e o projeto do produto e do processo, at o processamento dos pedidos, o suprimento de materiais, a fabricao e a distribuio muitas empresas, lderes mundiais nos seus

mercados, conseguiram no s redues de custos, mas tambm abrir e consolidar mercados oferecendo uma linha de produtos diversificada com inovaes constantes. Pequenos tempos de produo aproximam a fbrica do mercado reduzindo o tempo de atendimento ao cliente. Internamente, dentre outros benefcios, reduz-se a necessidade de trabalho com previses, os estoques em processo e os custos indiretos. Alm disso, estratgias de reduo de tempo aplicadas fase de pesquisa e desenvolvimento permitem o aprimoramento contnuo de novos produtos, uma vantagem especialmente importante em mercados muito competitivos onde cada novo produto visto como uma oportunidade para ultrapassar a concorrncia. Tempos curtos favorecem ainda o atendimento dos prazos contratados na medida em que os fatos causadores da baixa pontualidade so, em geral, os mesmos relacionados a longos tempos de produo: filas e atividades que no agregam valor.

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4. Estratgia de Manufatura

Identificadas no mercado as prioridades competitivas da fbrica para a competitividade, a definio de uma Estratgia de Manufatura pode ser entendida como um roteiro estruturado de decises que so tomadas com o propsito de direcionar a atividade fabril para a performance que se deseja alcanar. Diversos autores, mencionam a esse respeito que h uma srie de decises de longo, mdio e curto prazo, relativas ao sistema de manufatura, que afetam diretamente a posio competitiva da empresa no mercado. So questes que vo desde a escolha da localizao das instalaes, identificao da tecnologia do processo mais adequada e do arranjo fsico dos recursos, passam pela filosofia de organizao, pela definio da poltica de recursos humanos, dos sistemas de suprimentos, qualidade e manuteno at alcanar o planejamento de estoques e a programao de atividades.

O conceito de foco

Tomar essas decises de forma integrada, consistente e orientada para as prioridades estabelecidas um desafio, simples de ser enunciado, mas que, na prtica, muito

complexo de ser alcanado pelo nmero e variedade de decises envolvidas. Tal complexidade faz, inclusive, com que alguns dos autores mais proeminentes na rea sugiram a adoo de Estratgias de Manufatura focadas, visando reduzir a dimenso do problema e assim favorecer um melhor desempenho do sistema pela especializao,

aprendizado e eliminao de desperdcios.

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Para tanto propem no apenas a escolha de poucos e claros objetivos (vide seo 2), mas tambm a seleo de um elenco restrito de produtos a fabricar, a escolha e o uso de

tecnologias de processo particularizadas e a adoo de tecnologias de gesto adequadas s caractersticas do negcio.

Decises no contexto da manufatura

Pode-se identificar dez ncleos relacionados implementao de uma Estratgia de Manufatura. Tratam-se de decises relacionadas a: (i) capacidade, (ii) instalaes, (iii) tecnologia, (iv) nvel de verticalizao, (v) recursos humanos, (vi) qualidade, (vii)

planejamento e controle do fluxo de materiais, (viii) organizao, (ix) introduo de novos produtos e (x) medidas de performance, cada um desses ncleos desdobrando-se num

conjunto especfico de decises relacionadas. Os quatro primeiros grupos so, em geral, citados como estruturais compreeendendo um conjunto de decises de mais longo prazo. Tratam-se de escolhas cuja eventual reverso tende a ser muito penosa, envolvendo custos elevados. J os outros seis ncleos agrupam um sem nmero de pequenas decises de nvel ttico e operacional, normalmente envolvendo custos relativamente pequenos e um horizonte de planejamento menor. Na literatura pertinente, essas decises so ditas relativas ao funcionamento da infraestrutura do sistema de produo.

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Decises estruturais e relativas ao funcionamento da infraestrutura

Uma classificao mais simples e direta pode ser vista na figura 5. Como se v as decises estruturais so agora genericamente identificadas pelo termo hardware. De fato, esse tipo de escolha guarda, em geral, relao com aspectos fsicos (instalaes, mquinas, dentre outros) ou parmetros a eles relacionados.

HARDWAREOnde localizar a fbrica ? Qual o porte da planta ? Quais processos utilizar ? Que tipos ou famlias de produtos fabricar ? Qual o nvel de automao ? Com que equipamentos fabricar ? Qual o nvel de verticalizao ? Qual o melhor "lay-out" ?

PEOPLEWAREQue estilo de liderana adotar ?

Descentralizar a tomada de deciso ? Como motivar os recursos humanos ? Como deve ser o sistema de premiao ? Que padres de qualidade adotar ? Desenvolver fornecedores ? Como garantir qualidade ?

SOFTWAREQuanto fabricar de cada produto ? Quando e quanto comprar os materiais ?

Quando e quanto fabricar os componentes ? Com que recursos fazer cada servio ? Fazer horas-extra ? Subcontratar tarefas ? Como acionar a produo Como apontar a produo ? Como reprogramar ?

Figura 5: Algumas das decises de longo, mdio e curto prazo no contexto da Manufatura

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J os aspectos relativos ao funcionamento da infraestrutura do sistema so agora desmembrados em dois ncleos. O primeiro deles, denominado peopleware, agrupa as decises de natureza mais metodolgica ou organizacional, onde os recursos humanos so o objeto principal ou esto de algum modo envolvidos. O segundo grupo rene um elenco de decises relacionadas aos sistemas de programao e controle do fluxo de materiais. Por exemplo: a definio do plano mestre de produo, o planejamento das necessidades de material, o ajuste do nvel de capacidade no curto prazo, a programao das atividades, o acionamento e apontamento das atividades de fbrica, o controle de estoques, dentre outras. Na figura 5 esse grupo de decises identificado pelo termo genrico software. As escolhas relacionadas ao software situam-se, comparativamente, num horizonte de planejamento de menor prazo sendo, em geral, apoiadas pelas tecnologias de gesto da produo, como o MRP, o JIT e o OPT. Tais questes, embora intrinsicamente sejam de natureza ttica e/ou operacional, so vistas como pertinentes definio de uma Estratgia de Manufatura porque o efeito cumulativo das muitas pequenas decises envolvidas faz com que a eventual reverso dessas decises seja to lenta, difcil e dispendiosa quanto as decises estruturais.

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5. O papel estratgico das decises de curto prazo

Se na literatura h um reconhecimento crescente do potencial dos softwares de gesto na competitividade das empresas, na prtica, o contedo estratgico das decises de curto prazo frequentemente negligenciado. Com efeito, seja por julgar que tratam-se de decises meramente operacionais, ou por julgar que o software de gesto apenas uma atividade meio, no uma atividade fim, com repercusso direta no desempenho da empresa no mercado, o fato que a maioria das empresas no leva em questo essa perspectiva estratgica quando decide investimentos em processos e sistemas de controle de produo. Muito raramente faz-se uma anlise criteriosa das caractersticas do processo de produo instalado para subsidiar a escolha do sistema mais adequado. Tampouco avaliado em que medida o sistema de gesto refora (ou enfraquece) a posio competitiva da empresa diante das oportunidades de mercado. No obstante, evidncias sugerem que a perfomance competitiva de uma empresa (em especial no que se refere fatores relacionados ao tempo como pontualidade e rapidez) diretamente afetada por essas decises de curto prazo. Analisando a interligao entre as estratgias competitivas e os sistemas de controle mais utilizados na Manufatura, pode-se afirmar que a escolha dos sistemas de planejamento e controle feita, muitas vezes, mais pelos aparentes benefcios divulgados sobre as

tecnologias do que pela real adequao da soluo ao negcio.

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Cada uma das diversas partes ou mdulos de um sistema de planejamento e controle da produo (como por exemplo o planejamento mestre, o planejamento de capacidade, o planejamento de materiais, compras e o acionamento de cho-de-fbrica) precisa ser avaliado e projetado tendo em mente as necessidades estratgicas e operacionais do tipo de estrutura de produo considerado. Nessa linha de raciocnio, a figura 6 apresenta o que poderia ser uma matriz destinada a orientar a reflexo sobre o projeto de um sistema de controle, analisando-se como cada uma de suas funes deve ser projetada para prover bom desempenho nos fatores de competitividade identificados como relevantes.

Funes de PCP => ________________ Fatores de Competitividade Qualidade Preo Rapidez Pontualidade Flexibilidade

Planejamento mestre

Planejamento da capacidade

Planejamento de materiais

Acionamento da fbrica

Apontamento da produo

Programao das atividades

Figura 6: Matriz para reflexo sobre as caratersticas do projeto de um sistema de controle

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6. Sntese e concluses

Nesse texto, pretendeu-se assinalar as contibuies estratgicas que as atividades de planejamento e controle, de curto prazo, podem trazer para a competitividade das empresas. Buscou-se tambm descrever um roteiro para o desenvolvimento de um sistema de controle que funcione, na prtica, como uma interligao entre os fatores de competitividade identificados no mercado e as decises tomadas no dia-a-dia do cho-de-fbrica. A figura 7 apresenta a linha de raciocnio proposta.

Mercado

Cho-defbrica

Fatores de competitividadde relevantes para o sucesso da empresa no mercado Fatores de competitividade potencializveis pela Manufatura Fatores ganhadores de ordens e fatores qualificadores

reas de deciso no contexto da manufatura

Decises relativas ao funcionamento da infraestrutura do sistema Questes de planejamento e controle da produo (curto prazo)

?Sistema de controle desenvolvido dentro de uma perspectiva estratgica

Figura 7: O ovo em p: roteiro de reflexo para subsidiar o projeto estratgico do sistema de controle

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Seguindo o roteiro descrito na figura, a partir do mercado, identificam-se os aspectos decisivos na atitude dos clientes e consumidores. Em seguida, distinguem-se os fatores de competitividade que podem ser diretamente potencializados pela performance do cho-defbrica daqueles cujo desempenho da empresa est mais relacionado as outras funes da empresa. Dentre os fatores pertinentes fbrica, priorizam-se ento os objetivos analisandose quais referem-se a fatores ganhadores de encomendas qualificadores para a concorrncia. De outro lado, no cho-de-fbrica, identificam-se as reas de deciso gerencial estruturais e aquelas afetas ao funcionamento da infraestrutura do sistema de produo. As questes estruturais referem-se a escolhas de longo prazo tais como a seleo das tecnologias de processo e a localizao das instalaes. Por seu turno, as questes infraestruturais podem ser reunidas em dois grupos. No primeiro, agrupam-se as decises relacionadas a escolha de metodologias e abordagens organizacionais. No segundo grupo, esto as tarefas gerenciais de mdio e curto prazo referentes s funes tpicas de planejamento e controle do fluxo de materiais. O ponto de contato desses dois caminhos o sistema de controle que deve ser escolhido, ou mesmo projetado, para fazer com que as decises tomadas no dia-a-dia do cho-de-fbrica estejam orientadas para os objetivos identificados no mercado. Dependendo do contexto de produo, a escolha ou o projeto do sistema de controle pode ser mais (ou menos) decisiva na competitividade da empresa. caso da produo sob encomenda onde Um exemplo tpico o e quais atuam como

a programao e controle das atividades de

produo , possivelmente, o elemento crucial para uma boa performance em termos de cumprimento de prazos, um aspecto chave para a competitividade nesses mercados. No obstante tal fato, sistemas genricos so frequentemente adotados pelas empresas sem que a especificidade da estrutura de produo em questo seja considerada. Em suma, h um claro espao para pesquisa relacionado interligao dos fatores de competitividade relevantes no mercado com as caractersticas dos sistemas de programao e controle utilizados na fbrica.

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