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As cores de Laurinha Pedro Bandeira e Walter Ono 1. O presente O dia das mães estava próximo e Laurinha queria comprar um presente especial para a mamãe. Tinha visto uma linda bolsa em uma vitrina. Era uma de festa, dessas douradas, com uma correntinha como alça. Mas a bolsa era caríssima. Mesmo que fosse barata, Laurinha não poderia comprar, porque nem sabia contar dinheiro direito. E, mesmo que soubesse contar, como ia contar? Ela não tinha nem um tostão... Como é que se consegue dinheiro? falava a menina para si mesma. Pode ser trabalhando, como o papai. Mas como é trabalhar?

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As cores de Laurinha

Pedro Bandeira e Walter Ono

1. O presente

O dia das mães estava próximo e Laurinha queria comprar um presente especial

para a mamãe.

Tinha visto uma linda bolsa em uma vitrina. Era uma de festa, dessas douradas,

com uma correntinha como alça.

Mas a bolsa era caríssima. Mesmo que fosse barata, Laurinha não poderia

comprar, porque nem sabia contar dinheiro direito. E, mesmo que soubesse contar, como ia

contar? Ela não tinha nem um tostão...

— Como é que se consegue dinheiro? — falava a menina para si mesma. — Pode

ser trabalhando, como o papai. Mas como é trabalhar?

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O problema crescia na cabeça da menina. Só que ela não podia dividir aquelas

dúvidas com ninguém. Afinal, seu presente seria uma surpresa. Tinha que ser uma grande

surpresa!

— Pode ser vendendo coisas. A gente dá dinheiro para o sorveteiro e ele dá um

sorvete para a gente. Daí, o sorveteiro fica com o dinheiro e pode comprar o que quiser. Isso

até que é fácil. Se eu tivesse uma carrocinha de sorvete...

2. Uma idéia, afinal!

As aulas tinham começado naquela semana. Uma nova série. A primeira! Nada

mais das brincadeiras do prezinho. Agora era sério!

Laurinha sabia que aquela nova professora era quem lhe ensinaria a ler, a

escrever, a somar e a diminuir. Daí, ela ia aprender a entender de dinheiro assim, fácil,

fazendo contas de cabeça, sem precisar de lápis e papel nem usar a calculadora do papai.

Além de tudo, ela estava proibida de brincar com a calculadora.

No dia em que veio a idéia, Laurinha estava voltando bem contente da escola. o

dia tinha sido ótimo. A menina tinha feito um bonito desenho e a professoratinha elogiado

muito o seu trabalho. Chegou até a pregar o desenho na parede da sala com fita adesiva,

para que todos vissem.

Mas, no caminho, os elogios fugiram da cabeça da menina e voltou a preocupação

com o presente da mãe.

Pedir dinheiro ao pai? Ora, isso nem pensar. Se a surpresa era sua, se o presente

era seu, como pedir para o pai comprar a bolsa? Aí, a surpresa ia ser do pai, não ia ser dela.

Além disso, laurinha sabia muito bem que o dinheiro era pouco na sua casa. O pai estava

sem emprego e fazia uma porção de serviços aqui e ali para sustentar a família.

— Ai, ai, ai... como é que eu vou conseguir esse dinheiro? O que eu posso vender?

Eu não sei fazer nada para vender...

Quando já estava quase em casa, a idéia veio-lhe á cabeça, como um clarão:

— Ei! é claro que eu tenho o que vender! É claro que eu sei fazer alguma coisa. Eu

sei desenhar!

Como ela não tinha pensado nisso antes? Se a professora tinha gostado tanto do

desenho dela que tinha até pregado na parede, então todo mundo havia de gostar dos seus

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desenhos.

Afinal, aquela professora era a pessoa mais inteligente do mundo. Ela sabia tantas

coisas...e se a professora tinha gostado, quem não haveria de gostar? E, se todos iam

gostar, todos haveriam também de querer comprar seus desenhos!

Era isso! Aí estava a forma de ganhar dinheiro para comprar a bolsa para a mãe.

Fácil! Fácil e gostoso. Laurinha adorava desenhar.

Talvez até a mãe tivesse estranhado um pouco a carinha animada da menina

quando a filha chegou da escola, mas estava ocupada com o almoço e não estranhou nem

quando laurinha engoliu depressa a comida e fechou-se no quarto.

3. Ao trabalho, Laurinha!

Laurinha não era de esperar. O que tinha de ser feito tinha de ser feito logo, e o que

tinha de ser ganho tinha de ser ganho logo.

Agora era preciso fazer muitos desenhos, para conseguir o dinheiro necessário.

Amontoou uma porção de folhas de papel em branco no chão e estendeu-se de

bruços no tapete, que era a sua posição predileta.

Em primeiro lugar, tinha de fazer os desenhos com lápis comum. Só depois que

tudo estivesse do jeitinho certo é que ela usaria os lápis de cor.

Abriu o estojo e pegou o lápis. Mas, quando aproximou a mão da primeira folha, o

danado do lápis pulou de seus dedos e saiu correndo!

— Ei, lápis! Aonde você vai?

O lápis sumiu por baixo da cama, como um ratinho!

Que história era aquela?

Laurinha enfiou-se por onde tinha sumido o lápis, mas nem sinal dele! O que podia

Ter acontecido com o lápis para fugir daquela maneira?

A menina gastou um tempão tentando descobrir onde o lápis tinha se escondido.

Procurou por todos os cantos do quarto, revirou a mochila várias vezes, fuçou pelas

gavetas e nada do lápis!

Até que, no fundo de uma estante, atrás de uns livrinhos coloridos que a menina

ainda não podia ler, mas conhecia cada detalhe dos desenhos, embaixo de uma boneca,

descabeçada, no meio de uma pilha de figurinhas, um ioiô sem barbante e três peças de

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jogo de damas que laurinha havia perdido há muito tempo, lá estava ele.

— Ufa! Até que enfim!

Mas foi só tirar de cima aquela bagunça toda e esticar a mão para pegar o lápis, lá

veio aquela vozinha:

— Não, não, não! Não me tire daqui!

4. O lápis chorão:

Laurinha não estranhou que o lápis falasse. Mas é que nunca tinha visto um lápis

daquele jeito. Estava tremendo, apavorado.

— Por favor, tenho de ficar escondido, senão ela me encontra!

— Ela? Mas quem é ela? — perguntou Laurinha.

— Ela me persegue, ela quer acabar comigo! — queixou-se o lápis, como se nem

tivesse ouvido a pergunta da menina. — ela não me deixa fazer nada, destrói tudo o que eu

fiz com o maior esforço. Assim não é possível viver, assim não dá pra trabalhar!

A menina ficou preocupada. Afinal, como é que ela ia fazer seus desenhos com um

lápis tão neurótico? Mas tinha ouvido dizer que, para ajudar uma pessoa nervosa, é melhor

ficar calada e deixar que a pessoa fale tudo o que quiser. Se isso serve para as pessoas,

deve servir para os lápis também.

— Eu sou um fracassado... — continuou o lápis, derramando lágrimas de grafite.

— àsvezes eu chego a pensar loucuras. Da morte não tenho medo. Sei que ela chegará um

dia. O que não aguento é ver meu trabalho destruído. Chego mesmo a pensar que a única

solução é entregar-me ao apontador e deixar que o apontador acabe logo com essa vida de

perseguições...

Aí Laurinha achou que já era demais e resolveu falar:

— Ora, que coisa mais ridícula! Você tem uma missão a cumprir. Uma missão

muito importante!

— Ma-mas...

— Eu preciso fazer uma porção de desenhos para ganhar dinheiro e comprar o

presente da mamãe. Até que você vire um toquinho, ainda tem muito que escrever, muito

que desenhar!

— Eu? Mas...

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Laurinha resolveu parar de brigar, pois o lápis estava ficando cada vez mais

nervoso.

— Olhe, lápis. Pensando bem, os lápis não morrem nunca. Já pensou nisso?

Quando você já estiver totalmente apontado, sua grafite vai continuar existindo para

sempre em tudo o que eu desenhei, em tudo o que eu escrevi!

5. As razões do lápis:

O lápis parou de chorar e encarou a menina de frente, sério.

— Olhe aqui, minha dona, eu sei de tudo isso. Fui fabricado como um lápis

idealista e idealista continuo até hoje. E olhe que eu fiquei muito feliz quando cheguei na

sua casa...

— Obrigada...

— Sempre ouvi falar de companheiros meus que caíram nas mãos de outros

meninos e meninas que não tiveram o menor respeito por eles. Muitos deles, ainda moços,

foram perdidos, sepultados para sempre em vãos de sofá, caídos em bueiros, esquecidos

atrás de orelhas de balconistas.

— Puxa, que tristeza...

— Mas o que mais me apavorava era ouvir falar da tortura.

— Tortura?

— Você nem pode imaginar, minha dona. Há lápis que caem nas mãos de cada

menino, que nem é bom falar! Há alguns que torturam meus companheiros mascarando os

lápis devagarinho, machucando aos poucos, dilacerando, até que deles só reste uma

metade reduzida a uma polpa nojenta de madeira mastigada!

Laurinha não entendeu muito bem mas, pelo jeito, o que o lápis dizia era

apavorante. — mas isso não acontece com você. Eu nem rôo as unhas!

— Desculpe, minha dona, mas com você é até pior. Porque a culpa não é sua. A

culpa é dela!

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6. A grande inimiga:

Laurinha espantou-se com aquele ela. Parecia até que o lápis estava falando da

terrível bruxa da branca de neve. Será que tem bruxa no mundo dos lápis?

— Mas quem é ela? — perguntou a menina. — O que ela faz de tão terrível?

— Ela me persegue, destróitudo o que faço. Por mais que eu capriche, lá vem ela

atrás, apagando tudo o que eu fiz com tanto esforço! Você não sabe como é duro, como dói

na alma, olhar para trás e ver tudo o que a gente desenhou apagado cruelmente pela

impiedosa!

Os olhos de Laurinha se arregalaram:

— Você... você quer dizer... quer dizer que está com medo da borracha?

— Psiu, não fale esse nome! Não chame a desgraçada, senão ela aparece!

Laurinha soltou aos poucos o ar, num longo suspiro. Era preciso acalmar o lápis.

Explicar para ele a verdadeira missão de um lápis que pertence a uma menina de escola. O

lápis era muito novo, muito inexperiente, e não entendia as coisas da vida. A menina

começou a falar com muito jeito, para não aumentar o nervosismo do Lápis:

— Escute, Lápis, você precisa entender certas coisas. Em primeiro lugar, eu

preciso confessar uma coisa. Não é você que erra. Sou eu...

— Você?!

— Eu e só eu. Mas pense no que é melhor: apagar em tempo um erro que a gente

cometeu ou deixar que o erro seja descoberto pela professora? E, depois, nem sempre o

que a gente apaga são erros. São coisinhas que até podem estar certas, mas a gente quer

fazer melhor, quer deixar mais bonito!

— É?

— Quando a gente erra, ela é muito necessária. Sem ela, a gente não teria o direito

de se arrepender, de pensar duas vezes. E a gente tem o direito de errar, não é? A gente

tem de experimentar sem medo, a gente tem o direito de voltar atrás. É errando que a gente

busca acertar, no final...

Até Laurinha ficou espantada consigo mesma. Tinha conseguido falar com o lápis

feito gente grande, feito mãe quando quer fazer a gente parar de chorar.

Continuou falando suavemente, sorrindo, foi acalmando o lápis aos poucos, até

que ele parou de tremer. Daí, Laurinha pegou o lápis com delicadeza e começou a trabalhar

no papel.

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Procurou caprichar no primeiro desenho, para que este, pelo menos, não tivesse

que ser apagado logo em seguida. Fez o melhor que pôde. Daí, passou para o segundo,

devagar.

Ao completar o segundo desenho, viu que o lápis olhava para trás. E percebeu um

certo sinal de alívio na expressãozinha dele...

7. Desta vez quem chora é Laurinha:

Laurinha olhou com orgulho para os primeiros cinco desenhos. Um palhaço que já

parecia engraçado, só de olhar. O mar, com todos os seus peixes e com todos os seus

barcos. Uma paisagem de fazenda, com morro, casinha, caminho, rio e árvore. Uma cidade

com casas, pássaros, carros, caminhões e até um avião, bem lá no alto. Por fim, estava

pronto um parque, cheio de crianças e até um cachorrinho fazendo xixi numa árvore.

— Estão lindos! Vou conseguir vender estes desenhos por um bom dinheiro!

Agora, vamos colorir!

Procurou a caixa de lápis-de-cor na mochila e abriu.

— O quê?!

A caixa estava quase vazia!

— O que e´que aconteceu com os meus outros lápis? Eram vinte e quatro, eu me

lembro muito bem. Já sei contar até cem, ora essa! Vinte e quatro lápis de todas as cores.

Um mais um, dois. Dois mais um, três. Três mais um quatro. Com mais vinte, vinte e quatro!

É. Era uma maravilhosa caixa com vinte e quatro lápis-de-cor, novinhos, Laurinha

lembrava muito bem. Como só tinha quatro agora?

Só tem o vermelho, o amarelo, a azul e o preto. Ai, ai, ai, o que eu vou fazer?

Como é que eu vou pintar folhas e folhagens sem o verde? Como é que eu vou

pintar as laranjas das árvores, sem o cor de laranja? Como é que eu vou pintar aterra sem o

marrom?Ai devo Ter deixado oslápis lá na escola. E hoje é Sexta-feira. Só vai Ter aula de

novo naSegunda-feira. E o dia das mães é no Domingo que vem. Como é que eu vou poder

fazer todos os desenhos e vender durante a semana, com a escola e com tudo mais? Como

é que eu vou poder comprar a bolsa da mamãe?

E Laurinha começou a chorar...

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8. Todo mundo tem pena de Laurinha...

Olha, até eu fiquei triste nessa hora. Quem não ficaria triste vendo a decepção tão

grande de Laurinha? O plano dela era tão bonito, tinha de dar certo. Mas não fui só eu quem

ficou triste. Os lápis também ficaram.

Primeiro, foi o lápis-comum, que ainda estava agradecido porque a menina o tinha

animado e feito com que ele esquecesse o medo da borracha.

— Não chore, Laurinha... por favor!

Em seguida, os outros quatro lápis levantaram-se do tapete, onde estavam caídos,

e vieram para o lado da menina.

O pretão-pai-de-todos estava de pezinho, bem em frente ao rosto em lágrimasde

Laurinha e disse:

— Laurinha, todos nos sabemos do seu problema...

— É isso — apoiou o vermelhão. — E ficamos muito emocionados com a sua idéia!

— Mais que emocionados! — juntou o amarelinho. — não é qualquer criança que

tem uma idéia como a sua...

— Imagine... — completou o azulzinho. — Imagine pensar em trabalhar para

ganhar dinheiro para um presente para a sua mãe, na sua idade!

Laurinha ergueu-se, espantada. Não com o fato de os lápis falarem, mas porque

eles até sabiam dos seus planos. E ela não tinha falado dos seus planos para ninguém!

Como podia ser aquilo?

— Vocês sabem de tudo isso? Mas como descobriram?

O pretão sorriu:

— Ora, Laurinha. Nós somos os seus lápis. Sabemos tudo de você.

A menina baixou os olhos.

— Então... então devem saber também que a minha idéia não vai dar certo...

— Não vai dar certo?! — protestou o Pretão. — É claro que vai!

— Vai sim! Ora, se vai! — confirmou o Amarelinho.

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9. A dança das cores misturadas:

Laurinha estava achando muito gostoso Ter descoberto aqueles novos amigos,

mas sabia que nunca poderia comprar aquela bolsa para a mãe, sem todos os lápis-de-cor.

— Obrigada, pessoal... vocês são maravilhosos. Mas, o que adianta? Como eu

vou poder colorir os meus desenhos sem o verde, sem o laranja, sem o marrom, sem o

roxo, sem o ocrinho, sem todos os meus vinte e quatro lápis?

O lápis-comum sorriu e os quatro riram gostosamente.

— Mas você tem todas as cores, Laurinha! — revelou o Pretão.

— Tenho, mas esqueci na escola. Quando eu voltar lá, na Segunda-feira, não vai

dar mais tempo de fazer todos os desenhos que eu preciso para comprar a bolsa da

mamãe...

— Não foi isso o que eu quis dizer — continuou o pretão, com uma enorme

paciência. — Você tem todas as cores. Nós quatro somos todas as cores!

Laurinha arregalou os olhos:

— Como?!

— Quer ver? Hum... Você poderia tocar uma música, assim ajudaria a gente...

— Uma música? É pra já!

Laurinha ligou o radinho e escolheu uma música bem alegre.

Na mesma hora, o amarelinho cumprimentou o azulzinho e convidou-o para

dançar.

E lá saíram os dois, abraçadinhos, dançando sobre o papel onde Laurinha tinha

desenhado uma paisagem!

10. Laurinha tem mil cores!

Que coisa incrível! Além de aqueles dois dançarem direitinho, muito melhor do que

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as pessoas, por onde eles passavam os traços que o amarelinho fazia no papel

misturava-se com os traços do azulzinho e aparecia um verdinho perfeito, colorindo todas

as folhas, todos os matos, todas as folhagens!

— Que maravilha! — gritou Laurinha. — amarelinho com azulzinho dá verdinho!

— Isso mesmo! — disse o pretão. — se você quiser um verde mais forte, basta pôr

mais azul. Se quiser um verde mais claro, ponha mais amarelo e pronto!

Neste momento, o vermelhão chegou-se aos dois dançarinos e tirou o amarelinho

para dançar. E saíram os dois aos pulinhos, numa dança bem maluca e muito engraçada.

E pronto! Em cada pulo dos dois, suas cores misturavam-se e as laranjas da

árvore que laurinha tinha desenhado ficaram perfeitas!

Laurinha ajoelhou-se no tapete e pegou seus quatro lápis. Tinha entendido

tudinho. Escolheu uma folha em branco para treinar. Ficou experimentando uma cor sobre a

outra e, aos poucos, conseguiu criar todas as cores que queria e muitas mais!

— Que delícia! Agora eu não tenho só vinte e quatro cores. Posso inventar mil!

Posso inventar tudo o que eu quiser!

11. Como vender os desenhos?

Laurinha trabalhou incansavelmente durante todo aquele resto de Sexta-feira e

durante todo o Sábado. Para os pais, disse que estava estudando no quarto e deixou os

dois muito felizes ao verem sua filha estudar tanto já na primeira semana de aulas da

primeira série.

Quando o Sábado começou a anoitecer, Laurinha disse “ufa”!

— Ufa! Acho que já chega.

Espalhou tudo o que tinha feito pelo quarto.

Os desenhos cobriam todo o tapete, todo o chão e espalhavam-se até por cima da

cama.

A menina estava exausta, mas estava feliz.

Começou a contar os desenhos:

— Vinte oito, vinte e nove, trinta, trinta e um, trinta e... — de repente, outro

problema dos grandes veio á cabeça de Laurinha:

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— Ai! E como é que eu vou vender estes desenhos? Para quem? A mamãe não vai

deixar sair pela rua, com os desenhos debaixo do braço, vendendo desenhos como as

pessoas vendem batata na feira. Como é que os meus fregueses vão ficar sabendo que eu

tenho lindos desenhos para vender, aqui, fechados dentro do meu quarto?

O lápis-comum, que já tinha perdido completamente o medo da borracha e até

estava batendo um papinho com ela, ouviu a nova preocupação da laurinha e veio com um

sorriso:

— Laurinha, a solução é a propaganda!

— Propaganda?

— Isso. Todo mundo, quando quer vender alguma coisa, coloca anúncio na

televisão, no rádio, nos jornais e nas revistas. Pregam até cartazes pelas ruas, para que as

pessoas fiquem sabendo o que há para comprar.e, daí, todo mundo compra, se quiser e se

tiver dinheiro!

Laurinha coçou a cabeça:

— Puxa... e como é que eu vou fazer um anúncio na televisão?

— Na televisão não dá, nem é preciso. — intrometeu-se o vermelhão.

— Nem no rádio?

— Nem no rádio, nem nos jornais, nem nas revistas. No seu caso, o meu conselho

é fazer um cartaz.

Laurinha pulou:

— Ótima idéia! Um cartaz! É só escrever nele: “Você quer comprar desenhos? Fale

com a Laurinha! Que tal?

— Muito bom, muito bom! — aplaudiu o amarelinho. — faça um cartaz bem grande

e pregue no muro em frente a sua casa!

Laurinha tratou logo de pegar quatro folhas de papel em branco. Colou uma na

outra, pelas beiradinhas, com fita adesiva. Pronto, estava um cartaz de bom tamanho.

— Agora vamos lá — começou a menina, pegando o lápis comum. — É melhor

começar com você. Depois eu reforço tudo com o pretão-pai-de-todos, pra que todo mundo

possa ler o cartaz, até de longe.

Nessa hora, a alegria da menina apagou-se.

— Ler?! Mas eu não sei nem escrever!

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12. Um lápis alfabetizado:

Na verdade, Laurinha já sabia escrever “Laurinha”, mas era só. Não tinha a menor

idéia de como escrever no cartaz “você quer comprar lindos desenhos? Fale com a

Laurinha!”.

A menina estava desconsolada. Depois de tanto trabalho, não havia saída para

realizar seu lindo plano. Adeus, surpresa! Adeus, bolsa da mamãe!

A expressão do lápis-comum, ao contrário, era de contentamento. Primeiro,

porque estava conseguindo fazer favores aLaurinha, como pagamento pela ajuda que ela

tinha dado, fazendo com que ele perdesse o medo da borracha. Segundo, porque estava

ajudando Laurinha, a sua querida dona, que jamais o havia mordido.

— Laurinha, Laurinha... Não se preocupe. É só me pegar. Você não sabe escrever,

mas eu sei!

— Você... você sabe escrever?

— É claro que eu sei escrever. Sou um lápis, e como um lápis, nasci sabendo

escrever!

— Verdade?

— Bem, mais ou menos. Na verdade, eu não nasci, eu fui fabricado. Mas eu fui

fabricado para escrever. E como eu iria escrever se não soubesse?

— Então...

— Então é só me pegar. Vamos escrever logo esse cartaz!

E assim foi feito. Normalmente, a mão de quem escreve é que guia o lápis sobre o

papel. Mas, daquela vez, era o lápis que guiava a mão deLaurinha. Um milagre. Era como

ver um cego ajudando o seu guia a encontrar o caminho.

Assim, guiando a mão da menina, o lápis-comum foi traçando as letras sobre o

papel, uma a uma. No fim, as letras saíram meio tremidas, mas o cartaz ficou muito bom.

Laurinha reforçou as letras com o pretão-pai-de-todos, deixando as letras bem

grossas, para todo mundo ver.

Já era tarde, hora de dormir, quando todo ficou pronto.

— Boa noite, lápis comum. Boa noite, pretão, vermelhão, amarelinho e azulzinho.

Amanhã, bem cedo, vamos começar os negócios!

Laurinha e os lápis adormeceram na hora. O dia seguinte era Domingo, mas não

haveria descanso para eles naquele Domingo.

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Boa noite, Laurinha...

13. A primeira freguesa:

No dia seguinte, com todos os seus cinco lápis no bolso da blusa, e uma pasta com

os desenhos debaixo do braço, Laurinha foi para frente da casa, levando também o cartaz e

um rolo de fita adesiva.

No muro, bem ao lado do portão, pregou o cartaz o mais alto que pôde, ficando na

pontinha dos pés. Depois, sentou-se na soleira do portão e ficou quietinha, à espera dos

fregueses.

Só que os fregueses demoravam a aparecer.

A menina pegou o vermelhão e desenhou uma flecha que apontava direitinho para

o lugar onde ela ficava sentada. Com a ajuda do lápis-comum e do pretão-pai-de-todos,

escreveu mais uma frase, bem no começo de onde partia a flecha:

“Laurinha é esta”.

Mas nem isso ajudou os seus negócios. Pouca gente passava pela calçada, e os

poucos que passavam nem olhavam para o cartaz.

A menina já estava ficando preocupada quando uma senhora idosa veio chegando

lentamente.

Quando passava pela menina, Laurinha cumprimentou:

— Bom dia!

A senhora parou, sorriu, voltou-se para a menina e respondeu:

— Bom dia, menina.

Ao olhar para Laurinha, viu o cartaz. Sorriu de novo.

— Você quer vender desenhos, é? Posso ver?

— Claro! — respondeu Laurinha estendendo-lhe a pasta com os desenhos.

A senhora idosa folheou todos.

— Estão muito bonitos, menina. E por que você quer vender esses desenhos tão

bonitos?

— Para comprar uma bolsa de presente de dia das mães para a minha mãe. É uma

bolsa linda. Minha mãe vai adorar!

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A senhora puxou um lenço do bolso e esfregou nos olhos. Os olhos estavam

vermelhos, aquela senhora devia estar resfriada.

— E a sua mãe sabe que você está vendendo os seus desenhos para comprar um

presente para ela?

— Não. É surpresa...

A senhora suspirou e seu resfriado pareceu piorar um pouco. Abriu a bolsa.

— Quanto custa esse desenho da fazenda?

Laurinha arregalou os olhos. O preço! Não tinha pensado nisso!

— Quanto custa? Eu... eu não sei...

— Então vamos ver se eu consigo ajudar. Você se lembra quanto custa a bolsa?

Laurinha lembrava e disse o preço para a senhora.

— E quantos desenhos você tem para vender?

— Trinta e oito...

— Então, vamos ver... — disse a senhora, fazendo um cálculo de cabeça. —

Dividindo o preço da bolsa por trinta e oito vai dar exatamente...

Mexeu na bolsa, tirou duas notas e estendeu-as para a menina.

— Proponho que você venda cada desenho por este preço. Quando você vender

todos, vai dar certinho para comprar a bolsa da sua mãe.

— Puxa, obrigada, dona! — disse Laurinha pegando o dinheiro e entregando o

desenho da fazenda para ela.

E a senhora idosa foi embora, com aquele passinho miúdo, esfregando o lenço nos

olhos.

Como estava resfriada, coitadinha!

14. A bolsa dourada

Não demorou nem meia hora e os fregueses começaram a aumentar.

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Chegou uma senhora mais nova, dizendo que era a filha da senhora mais velha

que tinha comprado um desenho ainda há pouco. Comprou mais um e foi-se embora. Tinha

também os olhos vermelhos.

Assim foi naquele Domingo e assim continuou pelos outros dias da semana.

Laurinha chegava da escola, almoçava e lá ia ela sentar-se no portão, debaixo do

cartaz.

Os desenhos foram sendo vendidos, um a um.

Laurinha achava estranho que quase todos os seus compradores estavam

resfriados.

Devia ser uma epidemia. Tomara que o resfriado não a pegasse também, senão a

mamãe ia querer que ela tomasse colheradas daquele xarope horrível..

Quando começou a anoitecer na Sexta-feira, só restavam quatro desenhos para

vender.

— Ai, ai, ai! — pensava Laurinha. — Tenho de vender estes quatro amanhã de

manhã. Antes que a loja feche.

No Sábado porém, os fregueses diminuíram, e Laurinha só vendeu um desenho. E

agora?

Como ia fazer para conseguir todo o dinheiro antes que a loja fechasse? E a loja de

bolsa fechava ao meio-dia nos sábados!

Faltavam quinze para o meio-dia quando Laurinha correu para a loja, levando o

dinheiro e os três desenhos.

Ela precisava fazer alguma coisa. Faltava muito pouco para o seu plano dar certo.

Um pouquinho só.

Ia decidida a pedir ao dono da loja que esperasse mais um pouco antes de fechar

a loja. Era preciso convencer o homem. Era preciso lutar!

Mas... que horror! Na hora em que chegou à loja, a primeira coisa que Laurinha

notou é que a bolsa dourada não estava mais na vitrina! Que horror! A bolsa tinha sido

vendida para alguma outra pessoa!

Laurinha entrou pela loja com o coração aos pulos.

Lá estava o dono da loja, atrás do balcão.

— Moço, ai, moço... me diga: o senhor já vendeu aquela bolsa dourada que estava

na vitrina?

O homem olhou para ela, sério.

Page 16: As cores de Laurinha - ADA MERRITT K-8 CENTER …adamerritt.dadeschools.net/documents/2013-2014/summer 14/portuguese...presente da mamãe. Até que você vire um toquinho, ainda tem

— Não. A bolsa está guardada. Ouvi dizer que tinha uma menina na vizinhança

vendendo desenhos para comprar essa bolsa para a mãe.

— Pois é, moço. Essa menina sou eu. Que bom que o senhor ainda não vendeu! O

Dia das Mães é amanhã!

O homem sorriu:

— É você, é? Então, veio comprar a bolsa?

— Ainda não. Ainda não consegui vender todos os desenhos. Faltam três para

chegar no preço da bolsa...

— Hum... mas como você vai fazer? — perguntou o dono da loja. — Eu vou fechar

daqui a cinco minutos.

Laurinha fez cara de choro.

— O que eu vou fazer? Não sei..Não vai dar tempo de...

— Bom, menina. Eu posso fazer um desconto no preço da bolsa...

Laurinha pulou:

— Pode, é? Que bom! Como é isso de desconto?

— É tirar um pouco do preço da bolsa. É diminuir o preço.

— Mas eu não sei fazer conta de menos..

— Então eu faço o seguinte. O preço da bolsa fica assim: o dinheiro que você já

conseguiu, mais três desenhos!

Laurinha pulava de contente ao sair da loja, carregando a bolsa embrulhada com

um papel lindíssimo. Tinha deixado para trás o dinheiro conseguido durante toda aquela

semana, os três últimos desenhos e uma beijoca no rosto do dono da loja.

Tudo tinha dado certo! Tudo, tudinho!

O engraçado é que o dono da loja também parecia resfriado enquanto olhava os

três desenhos...

15. O Dia das Mães

Na manhã do Domingo, Laurinha invadiu o quarto dos pais bem cedinho e pulou na

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cama deles, como costumava fazer quando era pequena.

Trazia o pacote colorido, e um sorriso muito mais lindo do que o pacote.

Os pais já estavam acordados quando a menina entrou.

A mãe, de camisola, só se desabraçou da filha para abrir o pacote.

Presentes ao grande momento, estavam lá os lápis de Laurinha, todos enfileirados

no bolso da blusa da menina. Lado a lado, assistiam a tudo. Lá estavam o lápis-comum, o

Pretão-pai-de-todos, o Vermelhão, o Amarelinho e o Azulzinho.

Laurinha baixou disfarçadamente o rosto em direção ao próprio bolso, para os pais

não perceberem que ela estava falando com os lápis:

— Vejam, pessoal! Vejam como a mamãe está contente. Mas porque será que ela

está rindo e chorando ao mesmo tempo?