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PERCEPÇÃO DO ESTRESSE OCUPACIONAL POR COMISSÁRIOS DE BORDO: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO ANDRÉ ACIOLI DE LIMA Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Instituto de Pós Graduação em Administração – COPPEAD Mestrado em Administração Orientadora: Anna Maria Campos DPA Rio de Janeiro 1999

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PERCEPÇÃO DO ESTRESSE OCUPACIONAL POR COMISSÁRIOS DE BORDO:UM ESTUDO EXPLORATÓRIO

ANDRÉ ACIOLI DE LIMA

Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJInstituto de Pós Graduação em

Administração – COPPEAD

Mestrado em Administração

Orientadora: Anna Maria CamposDPA

Rio de Janeiro

1999

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PERCEPÇÃO DO ESTRESSE OCUPACIONAL POR COMISSÁRIOS DE BORDO:UM ESTUDO EXPLORATÓRIO

ANDRÉ ACIOLI DE LIMA

Dissertação submetida ao corpo docente do Instituto de Pós em

Administração – COPPEAD, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como

parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.).

APROVADA POR:

__________________________________________ Profa. Anna Maria Campos – D.P.A. IMS/UERJ – Presidente da Banca

_____________________________________________ Profa. Sylvia Constant Vergara – D.SC. PUC/RJ

______________________________________________ Prof. Donaldo Souza Dias – D.SC. UFRJ/COPPEAD

Rio de Janeiro1999

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Lima, André Acioli

Percepção do estresse ocupacional por comissários de bordo:

um estudo exploratório/ André Acioli de Lima. Rio de Janeiro:

UFRJ/COPPEAD, 1999.

xi, 116p. ; il.

Tese – Universidade Federal do Rio de Janeiro,

COPPEAD, 1999.

1. Percepção. 2. Estresse Ocupacional. 3. Tese (Mestr. –

UFRJ/COPPEAD). I. Título

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À Mônica minha mulher, amiga,companheira, conselheira e cúmplice,cuja obstinação me serve de exemplo

por toda a vida.

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v

AGRADECIMENTOS

À querida Anna Maria, minha amiga e orientadora, pela dedicação, carinho esubstanciosa colaboração para a elaboração deste trabalho.

À amiga e colega Angela Musiello pelo trato que motivou-me ainda mais a cumprir esta

empreitada.

À amiga Fabíula Rocha que não mediu esforços no sentido de incentivar-me a escrever este

trabalho.

Ao amigo Maurício Paiva pelas orientações bibliográficas e conceituais sobre a área de

psicologia.

À amiga e colega Karina Prince por ter-me permitido utilizar o material colhido em sua

pesquisa de campo.

Ao amigo Guilherme Castro pelo material de consulta disponibilizado e seu otimismo

contagiante.

Aos comissários que gentilmente cederam parte do seu tempo para a execução dos

questionários e das entrevistas.

A todos os comissários da VARIG pela troca de experiências que me motivaram afazer este trabalho de pesquisa.

À Mônica, por não desistir, jamais, da vitória.

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LIMA, André Acioli. Percepção do estresse ocupacional por comissários de bordo:

um estudo exploratório. Orientador: Anna Maria Campos. Rio de Janeiro: UFRJ/

COPPEAD, 1999. Dissertação. (Mestrado em Administração)

O trabalho busca constatar a ocorrência de agentes estressores no exercício da

profissão de comissário de bordo. A partir de revisão da literatura sobre estresse

ocupacional, psicopatologia do trabalho e saúde do aeronauta, foi desenvolvida pesquisa

exploratória junto a profissionais da categoria. A análise do discurso dos entrevistados

aponta para baixos níveis de percepção da presença de agentes estressores preconizados na

literatura ou baixo reconhecimento dos efeitos estressantes, em que pese a evidência

oferecida por análise de pesquisa anterior extensiva à categoria.

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LIMA, André Acioli. Percepção do estresse ocupacional por comissários de bordo:

um estudo exploratório. Orientador: Anna Maria Campos. Rio de Janeiro: UFRJ/

COPPEAD, 1999. Dissertação. (Mestrado em Administração)

The study aims to point out the streess agents to which flight attendants are

exposed in their work. From the litterature review on occupational stress, labor

psycopathology and flight crew’s health this exploratory research was developed using

brazilian flight attendants. The analysis of the flight attendants’ speech indicates either

low perception levels concerning the presence of stress agents – contrary to what is

stated in the studied litterature – or poor knowledge about the effects of stress, in spite

of the evidence offered by the analysis of previous research towards this professional

category.

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SUMÁRIO

pág.

1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 1

1.1. Apresentação ..................................................................................................... 1

1.2. O Problema ..................................................................................................... 2

2. O ESTUDO .......................................................................................................... 5

2.1. Objetivo ..................................................................................................... 5

2.1.1. Refazendo a rota .................................................................................. 5

2.1.2. Questões a serem investigadas ............................................................... 7

2.2. Delimitação do estudo ....................................................................................... 7

2.3. Relevância do estudo ....................................................................................... 7

2.3.1. Para as empresas aéreas ......................................................................... 8

2.3.2. Para os profissionais da categoria ........................................................... 9

2.4. Tipo de pesquisa .............................................................................................. 9

2.5. Metodologia ..................................................................................................... 10

2.5.1. Coleta de dados ....................................................................................... 11

2.5.2. Análise dos dados .................................................................................. 12

2.5.3. Apresentação dos resultados .................................................................. 13

3. SOBRE AS EMPRESAS DE AVIAÇÃO E OS COMISSÁRIOS ....................... 13

3.1. Entre o glamour e a tensão .............................................................................. 13

3.2. Índices de acidentes de trabalho .................................................................... 16

3.3. A VARIG .......................................................................................................... 17

3.3.1. Os comissários da VARIG e sua história ............................................... 20

3.3.2. A composição do quadro de comissários da VARIG ............................ 25

4. AS DEFINIÇÕES ..................................................................................................... 28

4.1. A compreensão da percepção ......................................................................... 28

4.2. A compreensão do estresse .............................................................................. 31

5. AS TEORIAS ............................................................................................................ 38

5.1. As teorias do estresse ocupacional e a psicopatologia do trabalho .............. 38

5.2. A psicopatologia do trabalho ........................................................................... 40

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5.3. O indivíduo, o trabalho e a psique .................................................................. 42

5.4. O trabalho como fonte de prazer ou sofrimento .......................................... 44

5.5. As defesas .......................................................................................................... 45

5.6. A teoria do estresse ocupacional .................................................................... 46

5.7. O tipo de comportamento e as pessoas ........................................................... 47

5.8. As estratégias de combate ................................................................................ 49

5.9. O estresse ocupacional e a psicopatologia do trabalho:

uma análise comparativa ......................................................................... 51

6. OS EFEITOS DO ESTRESSE .................................................................................. 55

6.1. A sintomatologia do estresse ........................................................................... 55

6.1.1. A fisiologia do estresse ......................................................................... 57

6.2. O estresse em aviação ....................................................................................... 60

7. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS ........................................ 72

7.1. Percepção do estresse ....................................................................................... 74

7.2. Fatores de estresse ............................................................................................ 78

7.3. Análise dos dados .............................................................................................. 87

8. CONCLUSÕES .......................................................................................................... 91

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 95

10. ANEXO ...................................................................................................................... 102

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x

LISTA DE TABELAS

pág.

TABELA 1: Relações entre a indústria da aviação civil e os demais setores quanto aos casos de acidentes de trabalho, acidentes de trabalho com afastamento e dias de afastamento .......................................... 16

TABELA 2: Prevalência de invalidez permanente entre aeronautas brasileiros de brasileiros de 1990 a 1995 ................................................. 17

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xi

LISTA DE FIGURAS

pág.

FIGURA 1: Composição dos comissários da VARIG por sexo .................. 26

FIGURA 2: Composição dos comissários da VARIG por idade ................ 27

FIGURA 2: Composição dos comissários da VARIG por tempo de vôo .... 27

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1. INTRODUÇÃO

1.1. Apresentação

Esta dissertação aborda de forma exploratória a questão do estresse ocupacional entre

comissários de bordo.

É relacionada à vivência profissional do autor, até recentemente em atividade como

comissário, e pela sua motivação para contribuir para o entendimento do problema do

estresse ocupacional para redução do seu impacto na qualidade de vida dos

trabalhadores da área focalizada.

Ao longo da trajetória, alguns caminhos se fecharam e outros se abriram, o que em si

constituiu importante oportunidade de aprendizagem a este noviço pesquisador.

Estruturada em 8 capítulos, neste primeiro o leitor tem contato com a realidade do

comissário e o problema a ser discutido.

No capítulo 2 são apresentadas a delimitação do estudo, a relevância do estudo e seus

objetivos. Apresenta-se ainda o tipo de pesquisa, os métodos usados para coleta, o

tratamento e análise dos dados.

No capítulo 3 são apresentadas algumas informações sobre a profissão de comissário e a

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empresa em cujo ambiente se deu o estudo.

Os capítulos 4, 5 e 6 apresentam o conteúdo teórico encontrado na literatura. No

capítulo 4 são apresentados os conceitos referentes às palavras-chave do tema em

estudo. No capítulo 5 é apresentada a revisão bibliográfica pertinente à questão

focalizada: estresse ocupacional e psicopatologia do trabalho. No sexto capítulo são

apresentados estudos específicos disponíveis na literatura sobre a saúde do aeronauta.

No capítulo 7 são apresentados e analisados os dados colhidos, ilustrados com o

discurso dos próprios entrevistados.

No capítulo 8 são trazidas as conclusões e feitas sugestões para exploração de novos

estudos a partir desta exploração preliminar.

Finalmente, apresentam-se as referências bibliográficas e o anexo.

1.2. O Problema

Se fosse perguntado a várias crianças qual a profissão que desejariam ter quando

crescessem certamente muitas delas responderiam “aeromoça”, “comissário de bordo”

ou simplesmente, “trabalhar no avião.”

Assim como algumas outras carreiras exercem fascínio pelo heroísmo, pela

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remuneração ou por pelo status, a carreira de comissário de bordo conquista

admiradores (não só infantis) pelo seu glamour. Jovens acreditam que viajarão, se

divertirão e enriquecerão com a profissão.

Existem hoje, no Brasil, cerca de 10.000 comissários de bordo empregados. Além deles,

outras centenas, motivados pelo apelo da própria profissão, se formam anualmente nas

diversas escolas de formação de comissários de bordo espalhadas pelo Brasil. Essas

pessoas, assim como quaisquer outras que se sujeitam a cursos profissionalizantes,

talvez não tenham consciência das dificuldades que ainda terão em conseguir emprego

na nova profissão e, muito menos ainda, das dificuldades inerentes ao exercício da

profissão.

Comissário de Bordo é, aos olhos da maioria não informada, um profissional que tem

no dia-a-dia, o que outras pessoas têm como lazer. O comissário viaja muito, conhece

grande parte do mundo, se hospeda em bons hotéis, veste-se bem, fala vários idiomas e

tem cultura geral ampla.

Na realidade poucas pessoas externas ao meio sabem o que de fato é a carreira de

comissário de bordo. Os profissionais da aviação estão sujeitos a condições de trabalho

únicas. Sobre eles atuam diversos fatores externos não encontrados normalmente nas

profissões em terra.

Tão complexas são as condições de trabalho dos aeronautas (pilotos, mecânicos de vôo

e comissários) que, no Brasil foi desenvolvida uma regulamentação profissional

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específica para a categoria (Anexo 1). Nela são estabelecidos limites mínimos e

máximos para os profissionais. Talvez seja a regulamentação profissional o primeiro

contato do comissário em treinamento com a dura realidade da profissão escolhida,

embora o momento ainda seja de euforia: a consciência a respeito do que vai passar a

ser vivenciado a partir de então é ofuscada pelo fascínio do começo.

Com o passar dos anos o comissário constata que muito daquilo que foi motivo de

alegria acaba se transformando, na maior parte das vezes, em desespero; o que parecia

independência se revela como solidão e o que talvez fosse uma simples comemoração

pode ter se transformado em vício.

As premissas básicas que orientaram este espaço de pesquisa são que (a) a profissão de

comissário de bordo é prenhe de fatores caracterizados na literatura como estressantes;

(b) a capacitação profissional e o treinamento não contemplam adquadamente o estresse

ocupacional inerente à profissão. Esperava-se, de fato, deparar com um ambiente de

trabalho reconhecidamente farto de agentes estressores pelos respondentes.

No exercício de seu trabalho os comissários de bordo estão indiscutivelmente sujeitos a

situações que desafiam o encanto atribuído à profissão. No contínuo exercício da

atividade o estresse acaba se instalando como resposta a uma soma de fatores inerentes à

profissão.

A pressão do mercado competitivo por níveis crescentes de produtividade tem agravado

a situação. Os comissários de bordo podem ser submetidos a escalas de trabalho cada

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vez mais “otimizantes” sob o ponto de vista empresarial. Ou seja, são pressionados a

voar mais, descansar menos, atravessar fusos positivos num dia e negativos no outro,

trocar o dia pela noite.

Os desgastes físico e psicológico dos comissários de bordo não têm sido alvo de maiores

estudos ao redor do mundo; principalmente porque, na maioria dos países, o comissário

de bordo não é considerado um aeronauta. No Brasil, pode-se encontrar alguns poucos

estudos sobre o assunto, quase sempre relacionados à Medicina Aeroespacial ou à

relação entre motivação e produtividade. Estes últimos encomendados sob a forma de

pesquisa, na maioria das vezes pelas próprias empresas aéreas.

2. O ESTUDO

Neste capítulo são apresentados um breve histórico da pesquisa, a delimitação e a

relevância do estudo, o tipo de pesquisa e a metodologia aplicada.

2.1. Objetivo

O objetivo que orienta esta pesquisa é identificar, a partir da percepção dos comissários

de bordo, a ocorrência de estresse no desempenho de suas funções.

2.1.1. Refazendo a rota

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Em sua primeira formulação, a pesquisa pretendeu, a partir da ordem de importância dos

agentes estressores identificados pelos comissários de bordo questionados, propor

reformulação nos conteúdos programáticos de formação e de treinamento desses

profissionais.

Tomando como referência os fatores apontados na literatura, pretendia-se pedir aos

respondentes para ordenar os agentes ou fatores estressores pelo grau de importância,

com vistas a propor prioridades de enfoque para treinamentos.

À luz dos fatores estressores apontados na literatura, procedeu-se a um piloto do

questionário. Descobriu-se, no entanto, que os comissários de bordo tendem a negar a

presença de fatores estressores e ou dissimular seus efeitos, impossibilitando a tentativa

de pesquisa em ordenar os agentes estressores por ordem de importância.

Partiu-se então para a reformulação das questões de pesquisa, a fim de alcançar por “via

indireta” a percepção dos comissários sobre agentes estressores no seu trabalho.

Certamente o foco deslocado para a “percepção do estresse” demandou uma

reformulação do método de coleta dos dados. Em termos metodológicos representou o

descarte dos questionários e a opção pela realização de entrevistas “descontraídas” nas

quais se buscou maior profundidade, com vistas a alcançar o novo objetivo proposto.

Paralelamente, outra pesquisa de campo (PRINCE, 1999) voltada para a questão do

treinamento para profissionais da linha de frente desvendou a presença de altos níveis de

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estresse entre os comissários de bordo entrevistados. O pesquisador teve

disponibilizados esses dados, que foram também usados para iluminar esta pesquisa.

2.1.2. Questões a serem investigadas

Na proposta reformulada, as seguintes questões orientaram a pesquisa:

a) Que agentes estressores (internos e externos) são percebidos como tal pelos

comissários de bordo no exercício de suas funções?

b) Que grau de importância é atribuído pelos comissários aos agentes estressores?

2.2. Delimitação do estudo

A pesquisa por razões operacionais foi limitada à percepção dos comissários quanto à

presença de agentes estressores com vistas a iluminar a formulação de outras questões a

serem pesquisadas futuramente. Para fazer face à premência de tempo, limitou-se o

campo de pesquisa a uma empresa aérea: VARIG.

2.3. Relevância do estudo

O estudo em questão é de grande importância tanto para empregadores como para

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empregados do segmento da aviação comercial brasileira.

2.3.1. Para as empresas aéreas

O grande diferencial hoje observado nas empresas prestadoras de serviços é a qualidade

do atendimento ao cliente. Nos serviços de transporte aéreo o “atendimento ao cliente”

parece ter sido detectado, em nível mundial, como fator relevante na diferenciação de

uma empresa para outra.

O aumento da concorrência nivelou via informatização todos os atendimentos efetuados

em terra; o benchmarking nivelou os itens de segurança e alimentação a bordo e a

padronização das aeronaves, a atuação dos pilotos.

Há autores, como Berry e Parassuramann (1992), por exemplo, cujo discurso corrobora

com o acima exposto. Para os autores, o fator que distingue uma empresa aérea das

demais é a atitude dos seus funcionários de linha de frente, haja vista que todas, de um

modo geral, utilizam os mesmos tipos de aviões, voam para os mesmos aeroportos e

oferecem serviços agregados bastante similares.

Apesar da notória necessidade de maior capacitação profissional do comissário de

bordo, para melhor atendimento aos passageiros, as empresas brasileiras têm submetido

seus profissionais a treinamentos padronizados e impessoais. Formam-se, assim,

profissionais pouco criativos, oprimidos e incapazes de lidar com os efeitos estressantes

do exercício da função.

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A desvendar a baixa percepção dos agentes estressores ou a baixa incidência de sua

presença no discurso dos comissários de bordo, a pesquisa pode contribuir para uma

abordagem diferente à questão do estresse ocupacional nos programas de treinamento.

2.3.2. Para os profissionais da categoria

Dos estudos de Schneider (1980), Sutton e Rafaeli (1988), Berry (1992), Rogers; Clow e

Kash (1994), Gröonros (1995), Heskett; Sasser e Hart (1997) e Shamir (1980) constata-

se que os funcionários da linha de frente são os mais propensos dentro da estrutura de

um empresa de serviço a enfrentar conflitos, situações de angústia, estresse e frustração.

Os efeitos de agentes estressores sobre o profissional podem resultar em alterações do

seu equilíbrio físico e psíquico, levando a variações negativas do seu desempenho e com

conseqüências para sua vida em outros espaços não profissionais e em outros tempos - a

possível relação entre estresse, cortisol e Mal de Alzheimer (KHALSA, 1997).

O tratamento do tema nos programas de formação e treinamento traria inegáveis

benefícios aos profissionais da categoria.

2.4. Tipo de pesquisa

O presente trabalho se trata de uma pesquisa de campo exploratória de natureza

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qualitativa na qual os dados primários foram colhidos junto a comissários de bordo da

VARIG. Pelas próprias características do trabalho de pesquisa ora apresentado, para sua

consecução não foram associados quaisquer testes estatísticos para validação de

resultados

“Pesquisas exploratórias são desenvolvidas com o objetivo de proporcionar visão geral,

de tipo aproximativo, acerca de determinado fato. Este tipo de pesquisa é realizado

especialmente quando o tema escolhido é pouco explorado e torna-se difícil sobre ele

formular hipóteses precisas e operacionalizáveis” (GIL, 1989, p.45).

Com Gil (1989) concorda Vergara (1997, p.45) para quem “a investigação exploratória

é aquela realizada em área na qual há pouco conhecimento acumulado e sistematizado.

Por sua natureza de sondagem não comporta hipóteses que, todavia, poderão surgir

durante ou ao final da pesquisa.”

A opção da pesquisa exploratória, portanto, se coaduna com a necessidade de

investigações complementares que venham a se realizar no futuro. O autor deste

trabalho, de forma alguma, pretendeu trazer certezas ou verdades absolutas em qualquer

momento do seu discurso.

2.5. Metodologia

O esforço de pesquisa voltou-se para ampliar a compreensão do autor através do

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encontro com outros atores valendo-se, para isso, de entrevistas em profundidade.

A pesquisa bibliográfica clarificou os conceitos gerais pertinentes ao assunto. A

pesquisa de campo foi realizada através de dez entrevistas em profundidade com

comissários de bordo de ambos os sexos e diferentes faixas etárias e tempos de vôo,

centradas na experiência individual de cada respondente.

Não houve preocupação com a representatividade estatística dos entrevistados. A

experiência profissional do pesquisador (11 anos como comissário de bordo) foi um

recurso adicional no alcance e seleção dos entrevistados, bem como no estabelecimento

do clima de informalidade que caracterizou o trabalho de campo.

2.5.1. Coleta de dados

O instrumento de coleta de dados, como era de se esperar, não foi padronizado. Os

encontros observaram uma “agenda aberta”, de forma a criar espaços à espontaneidade

do entrevistado.

Segundo Lodi (1983, p.16),

“A entrevista não padronizada (ou não estandardizada) incluiuma variedade de tipos de entrevista, nos quais o entrevistador não tentaobter o mesmo tipo de resposta usando o mesmo tipo de perguntas. É ummétodo empregado para explorar mais amplamente uma questão,produzir resultados inesperados ou indagar sobre novos temas” .

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Para Mattar apud (PRINCE, 1999, p.59):

“A utilização de entrevistas em profundidade, tambémconhecidas como pesquisas focalizadas, individuais, permite flexibilidadeno grau de questionamento (mesmo seguindo roteiro estruturado), asrespostas são abertas e os entrevistados têm a liberdade e são encorajadosa expressar livremente suas percepções, crenças, valores, opiniões,experiências, atitudes, comportamentos e intenções.”

Cada entrevistado foi deixado livre para expressar suas idéias, interpretações e

sentimentos relacionados à sua experiência de vida como comissário.

2.5.2. Análise dos dados

A análise das entrevistas em profundidade aplicadas foi orientada no sentido de captar

através do discurso dos respondentes, sua percepção sobre a existência de agentes

estressores mais especificamente atuantes no seu relacionamento familiar, no seu

organismo - pelos desgastes físico e psicológico oriundo do trabalho em turnos e pela

permanente interação com os clientes externos, os passageiros.

Numa primeira fase, procurou-se focalizar a experiência profissional de cada

entrevistado. Na fase seguinte, procurou-se identificar “padrões” ou “diferenças” entre

as experiências e sentimentos, relatados pelo conjunto de entrevistados. Finalmente

confrontaram-se os dados colhidos até então com os dados disponibilizados por Prince

(1999) em trabalho de pesquisa realizado junto também a comissários de bordo da

mesma empresa, embora com outro objetivo e em tempo diferente.

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2.5.3. Apresentação dos resultados

Na apresentação dos resultados, sempre que possível, se fará ilustração com a própria

fala do sujeito entrevistado, à semelhança dos estudos etnográficos.

3. SOBRE EMPRESAS DE AVIAÇÃO E COMISSÁRIOS

Neste capítulo serão apresentadas informações referentes ao meio em que se insere o

comissário de bordo. As especificidades do processo para ingresso na profissão, alguns

dados sobre a profissão no Brasil e alguns dados sobre a aviação comercial brasileira.

Num segundo momento, abordar-se-ão aspectos históricos alusivos à empresa da qual os

sujeitos fazem parte e, por fim a sua composição do quadro de comissários de bordo.

3.1. Entre o glamour e a tensão

A demanda para cursos de formação é crescente. O chamariz da profissão é muito

grande, mormente quando o nível de desemprego aumenta.

Para se qualificar como comissário de bordo, o candidato precisa passar por curso de

habilitação, geralmente realizado em escolas de vôo, com duração variável entre três e

oito meses, arcando com os custos da formação.

A idade dos candidatos varia entre 18 e 26 anos. Apesar de critérios estéticos e

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psicológicos serem eliminatórios nas empresas aéreas, poucas escolas adotam processo

de seleção, até mesmo porque financeiramente não lhes interessaria.

O exame médico junto ao Ministério da Aeronáutica é essencial, pois é a primeira das

três licenças necessárias para um comissário exercer a profissão – o Certificado de

Capacitação Física. Anualmente, até completar 40 anos, o exame deverá ser repetido

para que sejam atestadas as condições físicas do comissário para o exercício da

profissão. Após a idade de 40 anos os exames passam a ser semestrais.

Durante o curso, além das disciplinas teóricas, como meteorologia, navegação, etiqueta,

gastronomia e enologia, há aulas sobre segurança de vôo. Este último item recebe

percentual maior das horas de treinamento e tem a carga horária dividida, entre outros,

em módulos de sobrevivência no mar, na selva e combate a fogo - todos com partes

teóricas e práticas.

No final do curso de formação, por encaminhamento da própria escola, o candidato

passa por exame escrito do DAC. Se aprovado, recebe o segundo dos três certificados

exigidos: a Licença de Vôo.

Depois de aprovado no exame teórico do DAC, o comissário precisa ainda de mais uma

licença. Trata-se de habilitação específica para o avião em que irá trabalhar, o

Certificado de Habilitação Técnica (CHT), obtido normalmente após um treinamento

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fornecido pela empresa aérea que o empregar. A própria escola de formação pode

ministrar também mais este módulo. Este certificado tem validade de dois anos. Para

sua renovação o comissário deverá ser submetido a novo exame escrito. Cada empresa

aérea proporciona cursos de reciclagem, normalmente nesta época, a fim de reavivar os

conhecimentos adquiridos no curso de formação e esquecidos pelo não uso.

Até bem pouco tempo, as empresas aéreas ministravam os cursos de formação para os

candidatos aprovados em seus processos seletivos para comissários. Os custos do

treinamento para as empresas incluíam hospedagem em hotéis (quando o candidato não

residia no local do treinamento), alimentação, uniforme, material didático etc..

Aproveitando-se do nicho, muitos profissionais da área do treinamento dos cursos de

formação para comissários das empresas aéreas acabaram fundando suas próprias

escolas. Com isso, as empresas passaram a exigir dos candidatos a comissário de bordo,

a conclusão do curso de formação como pré-requisito para o processo seletivo. Viram-

se, assim, livres das despesas decorrentes da formação de seus comissários.

Os treinamentos periódicos – impostos por lei – continuam a ser ministrados pelas

próprias empresas. Entretanto, nada impede que este treinamento, num futuro breve,

seja também terceirizado.

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3.2. Índices de acidentes de trabalho

A TABELA 1 apresenta resultados de pesquisa realizada nos Estados Unidos da

América (REARDON, 1992), com dados estatísticos de acidentes de trabalho que

comprovam haver riscos ocupacionais para comissários de bordo, maiores do que os da

média dos outros setores.

TABELA 1: RELAÇÕES ENTRE A INDÚSTRIA DA AVIAÇÃO CIVIL EOS DEMAIS SETORES QUANTO AOS CASOS DE ACIDENTES DETRABALHO, ACIDENTES DE TRABALHO COM AFASTAMENTOE DIAS DE AFASTAMENTO

ano casos(IAC/MDS)

casos em que houveafastamento (IAC/MDS)

dias de afastamento(IAC/MDS)

1974 1,38 1,97 1,421978 1,43 2,05 1,481982 1,77 2,17 1,731986 1,65 2,17 1,781988 1,51 1,90 1,71

FONTE: REARDON (1992, P.07)

Legenda: IAC – Indústria da Aviação CivilMDS – Média dos Demais Setores

A TABELA 2 apresenta os dados estatísticos referentes ao afastamento por invalidez

permanente entre aeronautas brasileiros.

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TABELA 2: PREVALÊNCIA DE INVALIDEZ PERMANENTE ENTREAERONAUTAS BRASILEIROS DE 1990 A 1995.

Diagnóstico número de casos (%) sobre o número totalCardiopatia 23 23,47Problemas audiovisuais 21 20,41Transtornos mentais 19 19,39AIDS 12 12,24Câncer 03 3,06Problemas motores 03 3,06Problemas Neurológicos 02 2,04Outros 11 11,23Ignorados 05 5,10Total 99 100,0FONTE: EMPRESAS DE SEGUROS BRASILEIRAS

3.3. A VARIG

Fundada oficialmente em 07 de maio de 1927, a VARIG foi a primeira empresa de

transporte aéreo criada no Brasil. Oficialmente porque já operava em vôos sua aeronave

“Atlântico” - um velho hidroavião comprado a uma empresa mercantil alemã em janeiro

de 1927.

Ao final dos anos 30 a VARIG já servia quase todo o território do Rio Grande do Sul,

com linhas para Bagé, Livramento, Uruguaiana, Santa Cruz do Sul, Torres, Cruz Alta,

Santa Maria, Santo Ângelo e outras cidades.

Quando o Brasil toma posição na II Guerra Mundial ao lado dos aliados contra a

Alemanha. Temendo represálias por sua origem alemã, o primeiro e então presidente da

VARIG, Otto E. Meyer, pede demissão em 1941. Em seu lugar é eleito Ruben Berta.

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Ruben Berta traça novos planos de rotas domésticas e internacionais. Em 1942 a

VARIG inaugura sua primeira linha internacional, ligando Porto Alegre a Montevidéu.

Com o fim da II Guerra, a VARIG amplia e moderniza a frota passando a servir cidades

mais distantes tais como Rio de Janeiro, em vôo partindo de Porto Alegre com escalas

em Florianópolis, Curitiba e São Paulo.

Em 1952 a VARIG adquire a AeroGeral e expande seus serviços para o Norte do Brasil.

Um ano depois, amplia a rede internacional pousando em Buenos Aires como

prolongamento da rota para Montevidéu. Exatamente nesse ano a VARIG adquire

aeronaves de maior alcance e faz seu primeiro vôo transoceânico, chegando até Nova

Iorque.

Em 1961 a VARIG incorpora o consórcio Real-Aerovias que lhe abriu nova rota para o

Pacífico até Los Angeles, com escalas em Lima, Bogotá e Cidade do México. Adquiriu

direito também de operar linha para Miami, passando pela costa leste da América do

Sul.

Em 1965, quando a Panair do Brasil cessou suas atividades, o governo brasileiro

atribuiu à VARIG o direito de explorar as rotas para a Europa. Vale salientar que para

todos os vôos internacionais vale o princípio da reciprocidade, ou seja, uma empresa de

qualquer país somente poderá operar determinada rota se outra, do país destino, puder

operar a mesma rota pousando no país da primeira.

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Em 1975 a VARIG incorpora o Grupo da Cruzeiro do Sul, com suas aeronaves e suas

rotas.

Em 1978, com o processo de desregulamentação do transporte aéreo nos Estados

Unidos da América, iniciou-se um árduo processo de concorrência pela preferência do

passageiro brasileiro. A VARIG já não mais se mostrava soberana. Uma guerra tarifária

sem precedentes na história da aviação comercial mundial atingia em cheio os tráfegos

doméstico e internacional em várias regiões do mundo.

Este quadro não mudou ao longo da década de 80. Para agravar ainda mais a situação,

no final dos anos 80 e início dos anos 90, os preços dos combustíveis sofrem grandes

majorações. Estes problemas associados a alguns outros de ordem interna do país,

fizeram com que a VARIG assistisse a quedas consecutivas em seus resultados

financeiros. O primeiro capítulo da crise que persiste até hoje e fez com que, na

indústria da aviação comercial brasileira, 50 aeronaves fossem devolvidas a seus lessors

e mais de 10.000 funcionários fossem dispensados, durou até a entrada do Plano Real.

Apesar da crise na indústria da aviação comercial brasileira não ser de agora, a

implantação do Plano Real, em 1994, trouxe um alento, voltando quase todas as

empresas, a apresentar resultados positivos, a parte os passivos muito altos. Entretanto,

a crise asiática em 1997; a acirrada disputa do mercado interno durante o ano de 1988,

após as medidas de liberação do setor aéreo pelo DAC, em especial a que trata dos vôos

diretos aos aeroportos centrais; a crise da Rússia; e, finalmente, a grande crise na qual

mergulhou o Brasil a partir de janeiro de 1999, com a desvalorização do real,

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contribuíram decisivamente na instalação das sérias dificuldades por que passa o

segmento.

Quanto a este aspecto, Gandra (1999) diz:

“ Voltando à trágica imagem do acidente aéreo, a desvalorizaçãodo real significou para a aviação comercial brasileira um impacto daaeronave com o solo (...) A ‘aeronave’, entretanto, embora avariada pelochoque, não está destruída. A recuperação plena desta ‘aeronave’(aviação nacional) dependerá, sobretudo, da habilidade de seuscomandantes (direção das empresas) e também das imprescindíveismedidas governamentais para o setor, tanto de ordem conjuntural comode ordem estrutural. Se nada mudar, o que teremos será a inevitávelsubstituição dessa nossa querida ‘aeronave’ por uma vistosa ‘aeronave’estrangeira (absorção de nossas empresas aéreas por empresasinternacionais)” (p.7).

Esta crise vem fazendo com que a VARIG promova sucessivas medidas de contenção de

custos, renegociando dívidas, procurando novos parceiros e fornecedores e reduzindo

seu quadro funcional. O número de funcionários da VARIG já chegou a 25.000; hoje

não passa de 18.000. A frota da VARIG é composta por 83 aviões com idade média de

12 anos. A situação atual da VARIG foi assim resumida por Costa (1999):

“Há aluguéis de aviões atrasados e debêntures que venceram emnovembro e não foram pagas. Além disso, as perspectivas para 1999 sãoruins. O cenário mais brando é que o mercado se contraia em 5%. Nessecaso, a empresa terá que devolver aviões, cortar pessoal e eliminar asrotas rentáveis. Tudo isso é muito traumático e difícil para uma empresado tamanho da VARIG, que não tem mostrado a agilidade necessária paraenfrentar a crise!” (p. 112).

“Em 1995 cerca de 19.000 pessoas trabalhavam na VARIG.Hoje trabalham 17800” (p. 113).

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“Não há mágicas. A empresa vai ter que passar por redução decustos que envolvem medidas duras: corte de pessoal, fechamento derotas, reescalonamento da dívida. Em qualquer empresa a solução dosproblemas seria dificílima. Na VARIG, com seu espírito estatal, o cenáriofica ainda mais complicado” (p.114).

3.3.1. Os comissários da VARIG e sua história

A primeiro comissário a voar regularmente em uma empresa de transporte aéreo

comercial foi a enfermeira norte-americana Ellen Church, contratada pela Boeing Air

Transport (posteriormente absorvida pela United Airlines) em maio de 1930. No Brasil,

o conceito de comissário de vôo, na terminologia da época, tardou um pouco a ser

adotado, cabendo a Panair do Brasil, na época uma subsidiária da Pan American

Airways, introduzi-lo.

A VARIG, demorou um pouco para adotar a presença de comissários em seus vôos. Até

1945, os aviões utilizados pela VARIG não dispunham de um assento específico para

um comissário e tampouco possuíam algo remotamente parecido com uma galley

(cozinha do avião). Sacrificar um assento destinado a passageiro seria um procedimento

economicamente improdutivo. Ademais, as viagens nas distintas linhas da VARIG na

década de 30 e primeira metade do decênio seguinte eram bastante curtas, não

justificando a adição de mais um membro à tripulação. Todo o serviço era feito pelos

pilotos e rádio operadores, que distribuíam café, água, sanduíches e até chimarrão,

durante intervalo em suas funções.

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A chegada dos primeiros comissários à VARIG aconteceu quando a empresa recebeu

seus primeiros Douglas C-47B, em dezembro de 1945. Inicialmente configurados para o

transporte de 21 passageiros e equipados com uma modesta galley, esses aviões

permitiram à VARIG ultrapassar os limites do estado do Rio Grande do Sul e alcançar

os grandes centros do Sul e Sudeste do Brasil. A partir de então, podendo realizar vôos

para outros estados cuja duração ia além das duas horas e, contando com um tipo de

aeronave que oferecia condições necessárias à incorporação de comissários de vôo, a

VARIG recrutou dentro do próprio quadro de funcionários, seus primeiros profissionais

do atendimento a bordo. A única exigência para ingresso na profissão era a aprovação

no exame médico realizado pela antiga Diretoria de Aviação Civil do Ministério da

Aeronáutica.

Ao contrário do que ocorria em outras empresas, a VARIG se manteve obstinadamente

contra a idéia de contratar mulheres para desempenhar a função de comissárias de bordo

– fruto do conservadorismo e machismo do então presidente, Ruben Berta. Assim, a

primeira turma de comissários da VARIG era composta somente por homens. Esses

profissionais não receberam qualquer treinamento para desempenhar suas funções; cabia

a cada um valer-se do próprio bom senso para executar o seu trabalho e seguir fielmente

as instruções dadas pelo comandante. As atribuições desses primeiros comissários eram

aliviar diversos encargos da tripulação técnica, além de zelar pelo conforto e bem estar

dos passageiros.

Os comissários se apresentavam bem antes dos demais membros da tripulação. A eles

cabia uma ampla gama de tarefas: peso e balanceamento da aeronave, distribuição de

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bagagem no interior dos porões de carga e o controle da documentação necessária para o

vôo eram algumas das atribuições do comissário da década de 40, sem mencionar todos

os trabalhos diretamente relacionados ao conforto do passageiro. Os conhecimentos

colhidos através da experiência eram passados para a geração seguinte via conversas

informais após os vôos. Este era o tempo em que se distribuíam aos passageiros

chumaços de algodão e gomas de mascar; algodão para reduzir o ruído dos motores e a

goma de mascar para atenuar os problemas decorrentes do diferencial de pressão durante

o vôo.

Com a chegada dos Constellation na década de 50, as aeronaves passaram a dispor de

condições para o aquecimento de refeições. Este foi o primeiro grande divisor de águas

na área do serviço de bordo e, conseqüentemente, no trabalho dos comissários.

O segundo grande passo aconteceu com a chegada dos Super Constellation. A VARIG

fazia seu primeiro vôo transoceânico: Porto Alegre-Nova Iorque, com escalas no Rio de

Janeiro, São Paulo, Belém, Port of Spain e Ciudad Trujillo. Além da galley capaz de

aquecer as refeições, este tipo de aeronave dispunha, ainda, de oito camas tipo beliche e

luxuosas poltronas para o total de 66 passageiros. A pressão da concorrência fez com

que a VARIG revisse sua posição e adotasse a presença de comissárias a bordo de suas

aeronaves. As equipes passavam a ter composição mista de homens e mulheres.

Com o início do vôo para Nova Iorque, a VARIG tratou de organizar novos serviços de

bordo e treinamento para os profissionais que atuariam na rota. Para tanto contratou

maitres e chefs de cuisine no Brasil para realizar os serviços a bordo. O fato contribuiu

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sobremaneira para criar associação direta entre comissários de bordo e garçons.

Após este período surgiram oportunidades em novas rotas e conseqüentemente, novos

aviões. Primeiro os Caravelle, depois os Boeing 707, nos idos de 60, de lá até o final da

década de 70 a VARIG mostrou-se uma empresa próspera. É reconhecida como um dos

melhores serviços de bordo do mundo. Dá-se maior incremento ao treinamento de

comissários.

Cada aeronave, em cada vôo, dispõe de um número exato de comissários. Nos aviões da

VARIG variam de quatro - nos menores (B-737) a 18 comissários de bordo - nos

maiores (B-747).

Os comissários de hoje em pouco lembram os do passado. Suas vidas são regidas por

um pequeno papel emitido mensalmente que informa os dias e horários dos vôos,

reservas e sobreavisos a serem cumpridos pelo profissional: sua escala.

Ao contrário da grande maioria dos brasileiros que trabalha de segunda a sexta-feira, das

09:00 às 17:00 horas, a noção de fim de semana, feriados e horários regulares é

praticamente desconhecida pelos comissários. Para aqueles que estão voando nas linhas

domésticas da VARIG, um vôo pode significar um pernoite em alguma cidade distante

da sua base (Rio de Janeiro, São Paulo ou Porto Alegre) ou vôo de ida e volta no mesmo

dia - conhecido no meio como “bate e volta” - e cujo regresso pode ocorrer nas últimas

horas da noite. Para os que estão voando nas linhas internacionais, o número mensal de

vôos é menor; em contrapartida, a duração dos vôos é bem maior e os pernoites fora de

casa mais longos. Assim, as circunstâncias ditadas pela escala de vôo não permitem que

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esses profissionais tenham rotinas de vida sequer parecidas com as de outros milhões de

brasileiros. Coisas comuns como acompanhar uma novela ou tomar um chope no final

do expediente de sexta-feira são coisas quase impossíveis de serem realizadas. Para os

casados e com filhos, corre-se o sério risco de estar ausente em alguma data familiar ou

evento importante.

3.3.2. A composição do quadro de comissários da VARIG

Os comissários da VARIG são em número de 3.672. Estão divididos em dois grandes

grupos de acordo com as rotas voadas: Continentais e Intercontinentais.

O grupo de comissários que pertence ao quadro das rotas Continentais conta com

aproximadamente 1.500 profissionais que efetuam vôos por todo o Brasil e pela

América do Sul. Em sua maioria é composto por comissários mais jovens, com menor

tempo de vôo. Nas aeronaves há sempre um comissário responsável que, nas aeronaves

destas rotas (B-737 e B-767), denomina-se coordenador.

Os comissários das rotas Intercontinentais são mais velhos e têm mais experiência de

vôo. O grupo a que pertencem conta com pouco mais de 2.100 comissários. Nos vôos

destas rotas, as aeronaves têm maiores autonomia e porte. Em cada vôo intercontinental

existem chefe de equipe e supervisores de cabine, que são os coordenadores das

atividades a bordo.

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Dos 3.672 comissários de bordo da VARIG, existe um número maior de mulheres na

função, apesar de seu ingresso na carreira ter se dado posteriormente. A idade média do

comissário da VARIG é de 34 anos e as idades variam entre 19 e 54 anos. Quanto ao

tempo de vôo dos comissários da VARIG, pode-se dizer que são profissionais

experientes. A maior concentração está acima dos dez anos de vôo. Há cerca de 180

profissionais com menos de um ano de vôo (cerca de 5% do total).

As figuras 1, 2 e 3 apresentam a composição percentual dos comissários da VARIG,

respectivamente quanto ao sexo, faixa etária e tempo de vôo.

FIGURA 1: COMPOSIÇÃO DOS COMISSÁRIOS DA VARIG POR SEXO

FONTE: VARIG - GERÊNCIA GERAL DE COMISSÁRIOS

42%

58%MASCULINOFEMININO

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FIGURA 2: COMPOSIÇÃO DOS COMISSÁRIOS DA VARIG POR IDADE

FONTE: VARIG - GERÊNCIA GERAL DE COMISSÁRIOS

FIGURA 3: COMPOSIÇÃO DOS COMISSÁRIOS DA VARIG POR TEMPO

DE VÔO

FONTE: VARIG - GERÊNCIA GERAL DE COMISSÁRIOS

17%

29%19%

25%10%

ATÉ 25 ANOS26 A 30 ANOS31 A 35 ANOS36 A 40 ANOSACIMA 40 ANOS

17%

41%

10%

7% 8%

17%

ATÉ 5 ANOS

6 A 10 ANOS

11 A 15 ANOS

16 A 20 ANOS

20 A 25 ANOS

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4. AS DEFINIÇÕES

Este capítulo apresenta os conceitos referentes aos termos usados no título da

dissertação: percepção e estresse.

4.1. A compreensão da percepção

Etmologicamente, percepção está identificada ao ato de recolher e significa apreensão.

Em tempos passados, o termo “percepção” era usado para indicar todas as atividades

psíquicas. Atualmente, percepção está relacionada à objetivação das sensações em

relação a objetos exteriores e à apreensão de noções, reportando-se neste caso a

realidades mentais (EPB, 1996) .

A idéia de que os sentidos espelham perfeitamente o mundo exterior - imagens (cópias

da realidade), captadas através dos nervos, para um espécie de central, onde seriam

projetadas numa tela de consciência - já não se sustenta.

Contemporaneamente entende-se que o processo de perceber o mundo exterior não se

explica inteiramente pela captação através dos sentidos. Motivações, necessidades e

expectativas exercem uma influência bastante grande nas experiências sensoriais.

Quando se tem fome, por exemplo, fica-se predisposto a sentir o cheiro de comida. Esta

pré-disposição a perceber determinados estímulos é o que se chama em psicologia de

prontidão perceptual.

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Dentre as diversas linhas teóricas existentes na psicologia que se preocuparam com o

estudo da percepção - o gestaltismo (Gestalt: ‘configuração’), forneceu o maior número

de elementos para compreender o fenômeno da organização perceptual. Seus fundadores

Max Wertheimer, Kurt Koffka e Wolfgang Koehler, aceitavam o princípio da

determinação relacional, sustentando que as propriedades das partes dependem da

relação que estas mantiverem com o todo, ou seja, dependem do lugar e da função que

desempenham no todo.

Percepção segundo os gestaltistas é o processo através do qual se apreendem as

estruturas que integram o meio comportamental ou fenomenal. Trata-se, para esses

psicólogos, de um processo cognitivo básico, cujas leis valem para os demais processos

destinados à obtenção e ao armazenamento de informações (Campos, 1996).

Numa perspectiva neuropsicológica, Hebb (apud PENNA, 1987) define a percepção

como a atividade dos processos de medição, diretamente desencadeada pela sensação.

Propõe, assim, a distinção entre sensação e percepção, além de se promover a

aproximação dos processos perceptivos e dos processos operacionais ou do pensamento.

Para HEBB, a sensação seria processo de um só estágio, isto é, o mesmo estímulo

deverá produzir sempre os mesmos efeitos. No caso da percepção, segundo o autor, a

mesma estimulação pode desencadear processos diferentes.

Bruner (apud PENNA, 1987) define a percepção como processo de categorização de

estímulos, ou seja, o processo através do qual se promove a inclusão de um estímulo

numa classe ou categoria, identificando-o. Tal processo envolve condição decisória,

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além de supor a formação de hipóteses prévias acerca da natureza do estímulo em

processo de categorização.

Forgus (apud PENNA, 1987) conceitua percepção como um processo destinado à

extração de informações. Trata-se de processo cognitivo básico, a ele se subordinando

tanto o pensamento quanto a aprendizagem. A percepção seria um superconjunto, e a

aprendizagem e o pensamento seriam subconjuntos subordinados ao processo

perceptivo. A aprendizagem aperfeiçoaria a discriminação e a seleção perceptiva.

Para Piaget (apud PENNA, 1987) a percepção é definida como um processo que lida

com os aspectos figurais dos objetos. Não seria propriamente um fenômeno cognitivo,

desde que não se revela como processo operacional, isto é, não determina mudanças no

mundo dos objetos.

Na perspectiva holista de Wapner e Werner (apud CAMPOS, 1996), a percepção

constitui processo subordinado não só aos órgãos dos sentidos, mas às condições

momentâneas dominantes em todo o organismo. Trata-se de perspectiva organísmica,

definida como senserotônica. Pelo termo senserotônico designam a interação, geral na

função perceptiva, das estimulações exteropróprias e interoceptivas. A tese central dos

dois autores é a de que não existiria percepção de objetos exteriores sem uma referência

ao organismo do percebedor e, inversamente, a de que não poderia haver percepção do

corpo sem um marco de referência ambiental.

Segundo a teoria metapsicológica de Freud (apud LAPLANCHE, PONTALIS, 1988), o

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sistema percepção-consciência está situado na periferia do aparelho psíquico, recebendo

ao mesmo tempo as informações do mundo exterior e as provenientes do interior, isto é,

as sensações que se inscrevem na série prazer-desprazer e as lembranças que guarda na

memória.

Para fins deste trabalho, conceitua-se percepção como o processo pelo qual a

informação do ambiente é captada e interpretada pelo sujeito.

4.2. A compreensão do estresse

Hunsaker (1986, p.231) afirma: “Todos experimentam certa dose de estresse em suas

vidas.”

De um modo geral, estresse é definido como conseqüência, como reação do organismo

humano a estímulos externos.

O próprio Hunsaker (1986, p.252), apresenta uma definição de caráter amplo para

estresse, relacionando-o a demandas não específicas sofridas pelo homem: .”.. uma

resposta não específica do corpo humano a qualquer demanda feita sobre este.”

Com ele também concordam Herllriegel, Slocum e Woodman (1986, p.516), para quem

“estresse é uma conseqüência ou uma resposta geral a uma ação ou situação que impõe

demandas físicas ou psicológicas, ou ambas, a uma pessoa.”

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Robbins (1989, p.501) apresenta um conceito dinâmico para estresse e relaciona-o,

também, a oportunidades e restrições, não apenas a demandas. “Estresse é uma

condição dinâmica na qual um indivíduo é confrontado com uma oportunidade, restrição

ou demanda, relacionada com o que ele deseja e para qual o desfecho é percebido como

sendo incerto e importante.”

Lussier (1990, p.35), relaciona estresse ao ambiente definindo-o como “uma reação

emocional e ou física às atividades e eventos do ambiente.”

Griffin e Moorhead (1986, p.229) estabelecem uma correlação entre estresse e trabalho.

Para os autores, o estado de estresse é latente e existe no interior de todos os homens

sujeitos ao ambiente organizacional ou de trabalho. “Estresse é uma mobilização geral,

inconsciente, padronizada de uma energia individual quando confrontada com uma

demanda organizacional ou de trabalho.”

De acordo com Donovan e Kleiner (1994, p.19) existem várias definições de estresse

sendo que a melhor delas o descreve como uma “reação de luta ou de fuga” (fight or

flight response). A fim de que melhor se compreenda tal conceito, deve-se traçar um

paralelo entre a Idade da Pedra e os dias de hoje. Poder-se-ia estar, na Era Primitiva,

diante de um terrível animal, onde as duas hipóteses de reação para sobrevivência

seriam as de lutar ou fugir. Trazendo-se o mesmo conceito à Era Atual, dizer-se-ia que o

terrível animal é o estresse.

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Donovan e Kleiner (1994) afirmam que o estresse surge segundo três naturezas básicas:

física, mental e situacional. A física está relacionada a excesso de trabalho, pouco

descanso e má alimentação. A mental está relacionada aos desejos, medos e tristezas do

dia-a-dia.

“Uma mudança no nível de pressão pode trazer associada, umaalteração no padrão de pensamento da pessoa. Algumas reações comunssão as de encontrar dificuldade em estabelecer prioridades, hesitação,confusão e falta de raciocínio lógico. Todas elas, indistintamente, causammuita aflição em atividades que exijam pensamento racional.”(DONOVAN, Kleiner, 1994, p.12)

A situacional está relacionada à interação com o mundo - papéis e relações com os

progressos da vida moderna.

Pode-se interpretar o discurso de Dejours (1988) à luz da natureza situacional proposta

por Donovan e Kleiner (1994). Dejours (1988, p. 133), para quem o trabalho pode ser

percebido como sofrimento quando há conflitos de interesses pessoais e organizacionais

afirma:

“Em certas condições, emerge um sofrimento que pode seratribuído ao choque entre uma história individual, portadora de projetos,de esperanças e de desejos, e uma organização do trabalho que os ignora.Este sofrimento, de natureza mental, começa quando o homem, notrabalho, já não pode fazer nenhuma modificação na sua tarefa no sentidode torná-la melhor às suas necessidades fisiológicas e a seus desejospsicológicos – isso é, quando a relação homem-trabalho é bloqueada.”

Existe uma forte relação entre estresse e pressão. Arroba e James (1988) preconizam

haver dosagens de pressão favoráveis ao desempenho das pessoas no ambiente de

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trabalho. Sabedores de que todas as pessoas têm limites para suportar o estresse, os

autores afirmam que quando a pressão não está no nível favorável, o resultado é o

estresse. No nível pessoal, julgam que o estresse possa significar desconforto, doença ou

morte prematura; para a organização, o estresse significa desempenhos fracos,

ineficiência e eficácia reduzida.

Com eles concorda Albrecht (1979), que por sua vez, afirma que determinadas variáveis

do ambiente de trabalho, se mantidas sob o mínimo de controle e gerenciamento, podem

otimizar o desempenho do trabalhador. A chamada zona de conforto contempla algumas

dimensões específicas tais como: as cargas física e mental do trabalho; as condições

físicas, químicas e biológicas nas quais as tarefas são executadas; o valor e o conteúdo

do trabalho; a utilização das habilidades individuais na consecução das tarefas; as

relações interpessoais e o papel do indivíduo na organização.

Pode-se, em síntese definir pressão por um conjunto de todas as exigências colocadas

sobre determinada pessoa. Essas exigências podem ser de natureza física, como aquelas

que agem sobre o corpo quando se corre, quando se está gripado, quando o barulho é

extremo ou quando se tem que acostumar com diferentes temperaturas durante uma

viagem ao exterior, por exemplo. A pressão pode, também, ser vista sob a forma de

exigências psicológicas, como no exercício do trato com pessoas de difícil

temperamento, pelo recebimento de uma promoção ou pelo muito trabalho a se fazer.

Algumas exigências são agradáveis, outras, nem tanto, mas de certa forma todas

aumentam a pressão exercida sobre o sujeito.

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Segundo Cooper, Sloan e William (1988), todo trabalho possui agentes potencialmente

estressores. Estes agentes, comuns a todas as profissões, podem ser divididos em seis

categorias:

• os fatores intrínsecos e extrínsecos ao trabalho, fundamentados na natureza do próprio

trabalho. Tais como: condições de salubridade, jornada de trabalho, ritmo, riscos

potenciais à saúde, sobrecarga de trabalho, introdução de novas tecnologias, natureza e

conteúdo do trabalho;

• o necessário desempenho dos papéis do indivíduo na organização. Considerando a

presença das ambigüidades, expectativas externas sobre comportamentos individuais,

por exemplo;

• os relacionamentos interpessoais com os superiores, colegas e ou subordinados;

• a expectativa de carreira e auto-realização;

• a estrutura e o clima organizacionais. As possíveis ameaças à integridade do indivíduo,

sua autonomia e identidade pessoal;

• o desempenho dos outros papéis fora da organização. A interação casa-trabalho e os

aspectos relacionais do estresse ocupacional e eventos pessoais fora do trabalho; a

dinâmica psicossocial do estresse.

Fraser (1983) assinala que o ambiente organizacional é um sistema interativo e que o

estresse ocupacional estaria presente, neste contexto, ao longo dos componentes desse

macrossistema produtivo. Segundo o autor, os possíveis agentes estressores poderiam

estar sob a forma de elementos específicos como calor, o barulho e diversas outras

condições físicas e psicossociais que fugissem aos limites individuais de tolerância.

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Alguns importantes fatores e estímulos pré-disponentes às fadigas física e mental,

presentes no ambiente laborativo foram relacionados por estudiosos como por exemplo

Burt e Miller (apud COUTO, 1987). Para os autores, os principais elementos indutivos

nos processos de fadiga e, por extensão, estresse ocupacional seriam: os intervalos

insuficientes para o descanso regular do empregado, a posição estática do trabalhador

em seu posto de trabalho e as más condições de salubridade e adequabilidade do

ambiente de trabalho.

O trabalho e as organizações exigem intenso investimento de energia para adaptação

mútua. Por isso, os sintomas de somatização, além de sinalizarem necessidade de

mudança na vida pessoal, também são potentes indicadores de necessidades de

mudanças grupais e organizacionais. As empresas têm expectativas sobre as pessoas e

vice-versa.

“ ... a necessidade de ajustar-se a um trabalho, à política da empresa, ao programa

salarial ou ao supervisor é inevitável desde que a pessoa entre para a organização”

(GIBSON, 1981, p.103).

Quando as expectativas entre as pessoas e a empresa não estão em sintonia, surgem

sinais dos dois lados. Estes sinais aparecem nos problemas de desempenho, como erros

e omissões no trabalho, acomodação e má vontade. Aparecem também na perda de bons

funcionários, nas faltas sem motivo aparente e nas queixas de problemas de saúde. São

as saúdes pessoal e da empresa que ficam comprometidas quando o contrato psicológico

não está em sintonia.

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Limongi e Rodrigues (1994) em seu discurso, apresentam duas formas de adaptação do

indivíduo ao trabalho. A primeira que denominaram de ajuste ativo, apresenta como

características:

− a expressão do desejo de mudança na estrutura a que está submetido, por parte do

indivíduo;

− o afastamento voluntário ou a solicitação de transferência no serviço e;

− a participação em movimentos de interesse da categoria profissional a que pertence.

A segunda, que chamaram de ajuste passivo se configura por:

− depreciação do trabalho por parte do indivíduo. O trabalhador passa a senti-lo como

um peso e não como uma fonte de satisfação. Seu objetivo é tão somente a

remuneração e a manutenção de suas condições físicas e de higiene;

− desinteresse e não envolvimento com o trabalho; a satisfação é somente encontrada

fora do ambiente laborativo;

− absenteísmo e;

− uso abusivo de medicamentos, álcool e drogas.

Os efeitos do estresse na saúde da empresa, ainda segundo Limongi e Rodrigues (1994),

podem ser:

− econômicos: queda de produção, aumento do turn over;

- choques hierárquicos e crises pessoais;

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- ambientais: sintomas típicos por função e vínculos com pares e grupos e;

- culturais: critérios de saúde e modos de tratamento.

Deve-se salientar que agentes estressores presentes no ambiente de trabalho não atingem

da mesma forma, necessariamente, todas as pessoas. As pessoas diferem umas das

outras e estas diferenças se traduzem na percepção de cada indivíduo à existência dos

agentes estressores a que estão submetidos.

No estudo da ação de agentes estressores no ambiente de trabalho, percebe-se a

existência de duas teorias. A primeira é a Teoria do Estresse Ocupacional, que tem em

Cooper (1988) um de seus maiores expoentes e a segunda é a Teoria da Psicopatologia

do Trabalho, na qual Dejours (1988, 1992, 1994) é o principal autor.

5. AS TEORIAS

Neste capítulo são apresentadas a revisão de algumas contribuições teóricas sobre o

estresse ocupacional e o sofrimento no trabalho, bem como uma análise comparativa

entre as duas teorias.

5.1. As teorias do estresse ocupacional e a psicopatologia do trabalho

O trabalho humano, quando executado sob condições insalubres ou inseguras, tem efeito

direto sobre o bem estar físico e psíquico do homem, motivo pelo qual muitos

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pesquisadores e profissionais ligados à questão da saúde e do trabalho humano estão

interessados em investigar as formas mais sutis com que o trabalho impacta o

funcionamento psíquico do indivíduo. Essas investigações favorecem a compreensão até

mesmo de algumas doenças ocupacionais clássicas, anteriormente explicadas somente

pela verificação das cargas físicas, químicas, biológicas e fisiológicas da cena do

trabalho.

As abordagens aos temas estresse ocupacional e psicopatologia do trabalho representam

duas correntes disciplinares que analisam de que forma a dinâmica e a natureza das

exigências do trabalho atuam sobre a saúde mental e física dos trabalhadores,

desencadeando diferentes psicopatologias e manifestações de caráter psicossomático

(COOPER, 1988; DEJOURS, 1994).

A abordagem ao estresse ocupacional, de tradição anglo-saxônica, descreve o fenômeno

como um processo de perturbação ocasionado principalmente pela mobilização

excessiva da energia adaptativa do indivíduo diante das solicitações do meio. Já a

perspectiva da psicopatologia do trabalho, bem mais recente, tornou-se conhecida a

partir dos trabalhos de Dejours (1988, 1992, 1994) que, ao contrário da corrente

anterior, retira da psicanálise e da menção ao inconsciente as suas referências

fundamentais.

A comparação entre as duas disciplinas demonstra uma convergência com relação ao

foco de seus estudos e contribuições. Mesmo partindo de caminhos aparentemente

opostos, interessam-se pelas mesmas questões ligadas à tensão no trabalho, ao

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desencadeamento da ansiedade e ao sofrimento do trabalhador. Da mesma maneira, têm

como elementos de especial interesse as fadigas psíquica e física da força de trabalho, as

disfunções orgânicas de caráter psicossomático e os mecanismos individuais e coletivos

de defesa dos trabalhadores.

5.2. A psicopatologia do trabalho

As primeiras pesquisas relacionadas à psicopatologia do trabalho buscavam relacionar o

trabalho a perturbações psíquicas Le Guillant et al. (apud DEJOURS, 1992) tomando

por base o modelo teórico da psicofisiologia pavloviana.

Os estudos da psicopatologia do trabalho manteve-se estacionário durante muitos anos,

principalmente por tentar analisar doenças mentais do trabalho tomando por base os

modelos médicos clássicos: medicina do trabalho e patologia profissional. Os estudos

buscavam encontrar trabalhadores que apresentassem problemas mentais ou distúrbios

do comportamento no próprio ambiente laborativo sem se aperceber que sobre estes

sujeitos atuava, sempre, um processo seletivo que os eliminavam da empresas. A

pesquisa, portanto, era decepcionante e inconclusiva Dejours (1992, p.152).

O mesmo autor reputa o sucesso da teoria do estresse ocupacional à facilidade que esta

teve em analisar os efeitos mentais sofridos pelo trabalhador, que não fugia à

normalidade, no próprio ambiente de trabalho.

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Ciente da impossibilidade de responder à questão central do problema junto aos sujeitos

selecionados, a teoria promoveu uma mudança epistemológica. A causa desta

reorientação foi a constatação de que a doença nem sempre se manifestava de forma

visível e objetiva nos contextos de trabalho. Passou, então, a buscar identificar as

estratégias que os trabalhadores elaboravam para manter-se nos limites da normalidade

quando no ambiente de trabalho.

Apesar da divergência quanto ao foco, pode-se dizer que tanto a teoria do estresse

ocupacional como a teoria da psicopatologia do trabalho interessam-se pelas mesmas

questões ligadas à tensão no trabalho, ao desencadeamento da ansiedade e ao sofrimento

do trabalhador, tais como, as fadigas psíquica e física da força de trabalho, as disfunções

orgânicas de caráter psicossomático e os mecanismos individuais e coletivos de defesa

dos trabalhadores. Sofrimento aqui entendido como: “o espaço de luta que cobre o

campo situado entre, de um lado o ‘bem estar’ e, de outro, a doença mental ou a

loucura” (DEJOURS, 1992, p.153) .

Neste aspecto, a psicopatologia do trabalho, corrente que hoje, assume uma postura de

ciência interdisciplinar, se vale das contribuições de diversas áreas do conhecimento

humano, especialmente da psicologia e das teorias psicanalíticas (SELIGMANN-

SILVA, 1993).

A importância dos agentes estressores de natureza psicossocial é hoje reconhecida pela

imensa maioria dos médicos. Sabe-se que são tão potentes quanto os microorganismos

ou a insalubridade, no desencadeamento de doenças. A Organização Mundial de Saúde,

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em relatório datado de 1986, afirma que há uma multiplicação de manifestações de

doenças decorrentes de desequilíbrios psicossociais, sendo esta a mais freqüente razão

de consultas médicas. Estima-se que chegue a 50% (cinqüenta por cento) nas regiões

mais desenvolvidas, afetando indiferentemente as mais variadas classes sociais.

De acordo com a teoria da psicopatologia do trabalho, da forma como a atividade

laborativa está organizada resultam pressões potencialmente capazes de por em risco o

equilíbrio psíquico e a saúde mental do indivíduo. O papel da organização do trabalho

passa a ser então, determinante na discussão do prazer e do sofrimento no ambiente de

trabalho, dado que contempla a possibilidade de o trabalho tornar-se equilibrante ou

fatigante, fonte de realização ou de alienação para aquele que o realiza.

Uma tarefa monótona e repetitiva, por exemplo, que exija altos níveis de atenção e

concentração do executor, pode fazer com que efeitos negativos sejam potencializados.

Analogamente, um trabalho executado sob condições ambientais de alto risco exerce,

provavelmente, maior impacto sobre a saúde mental do trabalhador, caso essas mesmas

condições estejam associadas a jornada e a ritmo de trabalho fatigantes.

5.3. O indivíduo, o trabalho e a psique

Dejours (1994) propõe separar-se a carga de trabalho mental em duas ordens de

fenômenos distintas, pois acredita que seja composta tanto por fatores de natureza

racional e cognitiva quanto por aqueles vinculados à dimensão afetiva e relacional do

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indivíduo.

O entendimento da carga psíquica do trabalho depende da compreensão do

funcionamento psíquico do indivíduo; único e característico a cada personalidade. Os

estímulos recebidos - tanto exteriores (sensoriais) como interiores (pulsionais) são

decodificados pelo aparelho psíquico e ali, sob a forma de energia pulsional,

armazenados à luz da própria história do indivíduo.

Esta energia dispõe de três vias para ser descarregada: a psíquica, a motora e a visceral.

Se não for despendida sob as duas primeiras formas, a energia pulsional é acumulada no

aparelho psíquico como uma carga psíquica, originando o que comumente se chama de

tensão psíquica.

Não é possível, à tensão, permanecer por tempo indeterminado no aparelho psíquico.

Assim, se as vias psíquica e motora não forem utilizadas para a descarga da tensão, a

visceral será, então, acionada. É exatamente através desta via que, num primeiro

momento, a fadiga que até então se apresente pode evoluir para condições de astenia e

patologia.

Dejours (1994) defende que as características pessoais e o grau de evolução da

personalidade do indivíduo desempenham papel muito importante na escolha das vias

de descarga da energia pulsional. Para o autor, o trabalhador é dono de uma história

pessoal regida pelas aspirações, desejos, motivações e necessidades psicológicas

integrantes da sua própria história. Isso assegura a cada indivíduo características várias e

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pessoais que participam diretamente na modelagem da sua personalidade.

5.4. O trabalho como fonte de prazer ou sofrimento

O trabalho humano pode ser fonte de prazer ou sofrimento para o trabalhador,

dependendo da forma como está organizado e das características intrínsecas que

apresenta.

O fenômeno da ressonância simbólica apontado por Dejours (1992) aponta para o fato

de que o trabalho é equilibrante quando permite a retomada, por parte do indivíduo, de

suas aspirações e seus desejos mais profundos, contribuindo para a estruturação da sua

personalidade, ajudando-o na auto-realização. O autor define tal evento da seguinte

maneira:

“Quando existe a ressonância simbólica (...) o sujeito aborda asituação concreta sem ter que deixar sua história, seu passado e suamemória ‘no armário’. Ao contrário, ele confere à situação de trabalho opoder de engajamento para realizar através do trabalho sua curiosidade esua epistemofilia. O trabalho parece oferecer-lhe de alguma maneira umaocasião suplementar de perseguir seu questionamento interior e de traçarsua história” (DEJOURS, 1992, p.157).

O trabalho equilibrante traz prazer e é mentalmente saudável. Ele permite a contínua

descarga da tensão psíquica do indivíduo. Ao trabalhador é facultada a livre-atividade

do aparelho psíquico. Entretanto, o trabalho pode distanciar-se da intenção, da vontade

pessoal e do próprio controle do trabalhador; opondo-se, desta forma, à liberdade. O

trabalho fatigante não comporta a livre-atividade do aparelho psíquico. A tensão

psíquica é acumulada, o que repercute de forma negativa sobre a mente e o corpo do

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trabalhador.

Atividades que exijam altos graus de atenção e concentração, nas quais haja rígida

prescrição e normalização, inibem quaisquer oportunidades de afloramento da

imaginação e da criatividade do trabalhador.

Este mecanismo de defesa individual contra o sofrimento no trabalho é entendido como

repressão pulsional (DEJOURS, 1992). Como reação acaba promovendo o

aparecimento de doenças somáticas ou do corpo em respostas às pressões

organizacionais.

“De maneira que uma parte da investigação foi transferida para oestudo da psicossomática no campo do trabalho e sugere que as pressõespsíquicas do trabalho não se limitam à saúde mental, mas põem em causatambém a saúde física.” (DEJOURS, 1992, p.154)

5.5. As defesas

As estratégias de defesa - individuais e coletivas, que surgem naturalmente em

contextos profissionais, são responsáveis por grande parte da regulação física e

emocional dos trabalhadores.

As experiências acumuladas de cada trabalhador estabelecem as reações de defesa

individuais. Por meio da dimensão psicossocial do trabalho, no entanto, estas reações

atingem a instância coletiva, onde no espaço para as interações sociais, são articuladas

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as estratégias defensivas constituídas ou organizadas coletivamente.

Os mecanismos psicológicos de defesa individuais e coletivos buscam tornar possível a

permanência do trabalhador em uma realidade concretamente permeada pela pressão e

pela rigidez. Assim sendo, pode-se dizer que essas estratégias estariam direcionadas

para, sobretudo, minimizar as percepções individual e coletiva desses trabalhadores

diante da agressão permanente das situações de trabalho.

Seligmann-Silva (1993) afirma que um dos mecanismos psicológicos de defesa mais

encontrados nos ambientes de trabalho é a negação. As situações de perigo ou

potencialmente nocivas à saúde individual ou do grupo, por exemplo, acabam sendo

descaracterizadas. O trabalhador adota o recurso de menosprezar o perigo, chegando às

raias de ridicularizá-lo. Este mecanismo de defesa permite que o trabalhador conclua

muitas tarefas que de outra foram não seriam executadas. Ao agir sob efeito de

determinados mecanismos de defesa, o trabalhador acaba desafiando os objetivos

imediatos de setores como os da medicina e da segurança no trabalho.

5.6. A teoria do estresse ocupacional

O estresse ocupacional é um fenômeno reativo, tipicamente ligado às relação entre o

indivíduo e as demandas do seu ambiente de trabalho.

Ao serem percebidos pelo indivíduo como pressões, os estímulos psíquicos e físicos

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podem (ou não) alterar seu equilíbrio e a homeostase do seu corpo. A resposta é

imediata; vários mecanismos psico-físicos são acionados, seja para restabelecer a

condição de equilíbrio, seja para melhor ajustar o organismo às pressões percebidas.

Rio (1995) em seu discurso define estresse como sendo o conjunto destas respostas

adaptativas. Segundo o autor, estas respostas podem envolver componentes

comportamentais, afetivos, cognitivos e fisiológicos.

Percebe-se, então, que os estímulos internos ou externos ao indivíduo, não são por si só

suficientes para caracterizar-se como pressão, para alterar o equilíbrio do organismo e

para desencadear uma resposta ao estresse. Ainda, o organismo buscará retomar seu

estado normal sempre que perceber qualquer desequilíbrio.

A literatura é vasta em relação ao estudo do estresse. Dentre os estudos pode-se citar:

• autores que relacionam as organizações ao estresse no trabalho (COOPER,

MARSHALL, 1976; WATTS, KELLY, 1987; COOPER, 1988; SUTHERLAND,

COOPER, 1988);

• autores que abordam as relações entre a natureza do trabalho e o estresse, e as

estratégias ou mecanismos de defesa - coping (DEWE, 1992; NEWTON, 1989);

• Jamal (1990) descreve sobre os tipos de comportamento individual e as

manifestações de estresse;

• Lazarus e Folkman (1984) estabelecem as relações entre o coping e a saúde mental;

• as relações entre o trabalho e a saúde mental são muito bem retratadas por Dejours

(1994).

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5.7. O tipo de comportamento e as pessoas

Dois fatores são considerados para explicar a maior ou menor vulnerabilidade das

pessoas à manifestação do estresse: o tipo de comportamento e a capacidade de controle

do indivíduo (locus de controle).

Os cardiologistas norte-americanos Friedman e Rosenman (apud DONOVAN,

KLEINER, 1994) desenvolveram o conceito de tipos de comportamento. Os autores

sugerem haver dois tipos de comportamento em função do grau de estresse: o tipo A

(alto grau de estresse) e o tipo B (baixo grau de estresse).

O comportamento do tipo A é caracterizado por “intenso, direcionado para as

realizações pessoais e elevadas metas de desempenho” (DONOVAN, KLEINER, 1994,

p.5). A natureza das pessoas que apresentam o padrão de comportamento do tipo A é

perfeccionista, impaciente quanto aos resultados, emocionalmente inconstante,

competitiva e em permanente estado de tensão. Omitir-se-ão neste trabalho, maiores

detalhes sobre indivíduos cujo comportamento é classificado como do tipo B;

conceitualmente, menos vulneráveis à ação de agentes estressores.

Estudos apresentam estreita relação entre o comportamento do tipo A e os sintomas

cardíacos, fruto de exposição a agentes estressores (FRIEDMAN, ROSENMAN, 1975;

JAMAL, 1990).

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Os estímulos do meio não afetam igualmente todas as pessoas. Normalmente, a

interação indivíduo-ambiente influencia diretamente sua resposta a eventos e pressões

potencialmente atuantes. Desta forma, o significado atribuído aos eventos pode

desempenhar importante papel na possibilidade de instalação de um quadro de estresse.

Há pessoas que acreditam que através de seus atos e decisões, possam direcionar os

rumos e conseqüências das próprias vidas. São pessoas com orientação interna do locus

de controle. A presença da orientação interna quanto ao locus de controle está

diretamente relacionada à capacidade do indivíduo em adaptar-se a ambientes com

níveis de pressão presentes.

Outras apresentam o locus de controle orientado externamente. São pessoas que não

crêem poder alterar os destinos traçados, creditando à sorte ou ao acaso, os resultados

dos acontecimentos de suas vidas.

Estudos de Cooper e Rees (1991) evidenciam que as reações crônicas ou permanentes

de estresse nos indivíduos estão associadas ao comportamento do tipo A e à orientação

externa quanto ao o locus de controle.

5.8. As estratégias de combate

Uma vez percebida uma situação ou evento como perigo à integridade física e ou

mental, entende-se uma estratégia de combate como parte da interação entre o indivíduo

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e o ambiente.

Aldwin, Coyne e Lazarus (1981) entendem a estratégia de combate ao estresse como um

esforço de natureza cognitiva e comportamental que visa ao equilíbrio entre o ambiente

e as demandas internas individuais que aflijam a uma pessoa.

Lazarus e Folkman (1984) classificam as estratégias também em função da sua

orientação: para o problema ou para a emoção. A primeira tem foco no problema e

busca modificar a situação. A segunda trata de direcionar esforços para a regulação

emocional do indivíduo. Os mesmos autores preconizam que as estratégias orientadas

para o problema tendem a minimizar os efeitos dos agentes estressores sobre as pessoas.

Em contrapartida asseguram que as estratégias orientadas para a regulação emocional

acabam prolongando a exposição dos indivíduos aos agentes estressores; o que,

fatalmente, potencializaria os sintomas do estresse.

Dewe (1992) caracteriza as estratégias de combate como tentativas de resposta a

determinada situação ameaçadora. O objetivo da estratégia - ativa ou passiva - adotada

inconscientemente pelo indivíduo uma vez detectada a ameaça ou desconforto, é

eliminá-lo o mais rapidamente possível. Suas pesquisas indicam que a opção por

estratégias orientadas para o problema está relacionada à percepção de que o esforço

poderá trazer, a curto prazo, o gerenciamento ideal para as pressões atuantes sobre o

indivíduo. No caso da opção pelas estratégias orientadas para a regulação emocional,

leva-se em consideração, principalmente, a necessidade da aceitação das circunstâncias

impostas e as limitações em função desta necessidade.

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As estratégias adotadas apresentam estreita relação com o tipo de pressão a que está

submetido o indivíduo e com o seu próprio tipo de personalidade. Assim, pode-se supor

que determinadas fontes de pressão interfiram na opção da estratégia a ser adotada. O

mesmo pode-se dizer para o locus de controle e o tipo A de comportamento.

Ladeira (1996) adota, também, uma classificação das estratégias de combate ao estresse

quanto ao método. Diz, ele:

“Quanto ao método, as estratégias de combate ao estresse podemse dar tanto no plano cognitivo quanto no comportamental. Podem secaracterizar como de natureza pró-ativa (com planejamento de uma açãoou esforço por pensamentos positivos) ou tipicamente de escape (fuga deuma situação particular). As estratégias também podem assumiridentidade solitária ou social, dependendo do uso ou não do suportesocial, dos amigos, dos familiares, e especificamente, do cônjuge.Embora seja possível encontrar estratégias de combate solitárias no planocomportamental, estas estão ligadas diretamente à dimensão cognitiva, oque já não acontece com relação à identidade social das estratégias decombate, exclusivamente comportamentais.”

A bibliografia pesquisada não possibilita perfeita compreensão sobre a eficácia ou

ineficácia dos mecanismos de combate. Entretanto, algumas estratégias têm-se mostrado

efetivas em determinadas situações, grupos ou ambientes de pressão.

Arroba e James (1988), por exemplo, fazem menção a técnicas direcionadas a

indivíduos com o locus de controle orientado externamente. Baseiam-se,

principalmente, em técnicas de relaxamento que buscam melhor convivência do

indivíduo com a situação-problema.

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5.9. O estresse ocupacional e a psicopatologia do trabalho:

uma análise comparativa

A abordagem da teoria do estresse ocupacional é bastante criticada por Dejours (1992)

para quem a perspectiva não está relacionada, de fato, à natureza psicopatológica.

Segundo o autor, a metodologia empregada nas diversas pesquisas da teoria do estresse

ocupacional não permite que se observem a satisfação ou desprazer no ambiente de

trabalho – o prazer ou o sofrimento dos trabalhadores. Dejours (1988, 1992 1994) não

invalida a teoria clássica do estresse nas organizações, apenas traz à tona a

inapropriedade na identificação de certos mecanismos psíquicos do trabalhador que se

colocam entre sua dimensão psíquica e as situações de trabalho.

“De fato, os critérios de avaliação nesse caso sãoprincipalmente critérios somáticos e biológicos. E se medirmos a variaçãoda freqüência cardíaca ou do cortisol plasmático, essas variáveis não sãoespecíficas e não permitem uma aproximação com as questões relativas àsignificação nem à vivência subjetiva dos trabalhadores.” (DEJOURS, 1992,p.152)

As pesquisas da teoria da psicopatologia do trabalho buscam decifrar o grande enigma

existente com relação ao que Dejours (1992) chama de estado de “aparente

normalidade” da força de trabalho. Os sintomas associados à doença são relegados a um

segundo plano. Busca-se entender os mecanismos pelos quais se apresenta um equilíbrio

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psico-fisiológico entre os trabalhadores, apesar de sabidamente existirem pressões em

qualquer ambiente de trabalho.

“Agora a normalidade é considerada um enigma [o grifo é dopróprio autor]. Como os trabalhadores, em sua maioria, conseguemapesar dos constrangimentos da situação do trabalho, preservar umequilíbrio psíquico e manter-se na normalidade?” (DEJOURS, 1992,p.152)

A orientação da abordagem da psicopatologia do trabalho não está orientada

exclusivamente, portanto, para a investigação dos efeitos diretos do trabalho sobre a

saúde dos trabalhadores. Ao contrário, busca melhor compreender as estratégias e

mecanismos de defesa estruturados pelos próprios trabalhadores em resposta às pressões

demandadas pelo ambiente laborativo. As estratégias e os mecanismos de defesa

apresentam, pois, fundamental importância neste processo de regulação individual e ou

coletivo; processo, este, que é normal a qualquer indivíduo no ambiente de trabalho.

O objeto central da análise na qual a teoria da psicopatologia do trabalho discute o

impacto do trabalho sobre o indivíduo está relacionado a organização do trabalho e seus

desdobramentos que levam o indivíduo ao prazer ou ao sofrimento no trabalho.

Para Veer (apud SCHEIDER, 1973), a característica de um trabalho desqualificante,

parcializado, gera tensão e sofrimento que, não raro, pode assumir diversas

configurações, entre elas a fadiga, a depressão, os distúrbios ou as manifestações de

caráter psicossomático, ou seja, em linhas gerais, manifestações típicas aos quadros de

estresse.

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A valorização da percepção do indivíduo acerca da situação e da realidade ocupacionais

é característica comum às investigações no campo da psicopatologia do trabalho. A

valorização da percepção objetiva resgatar a subjetividade, a individualidade

normalmente presentes no discurso dos próprios trabalhadores. A natureza da

abordagem é qualitativa e, portanto, desejos, prazer, medos, pressões e sofrimento em

situações de trabalho são melhor explicitados. Desta forma, as dinâmicas psicossociais

encontradas nos grupos e ambientes de trabalho podem ser melhor compreendidas.

Tanto a perspectiva anglo-saxônica do estresse ocupacional, quanto da tradição francesa

da psicopatologia do trabalho, têm acompanhado a miúde o levantamento das atividades

exercidas pelo trabalhador na descrição das condições ambientais e dos postos de

trabalho.

Pode-se notar que os estudos mais recentes, independentemente de serem desenvolvidos

sob a ótica da teoria do estresse ocupacional ou da psicopatologia do trabalho, buscam,

em essência, o significado, o conteúdo e a natureza das atividades do trabalhador a fim

de nortear a discussão sobre as patologias relacionadas às atividades laborativas.

Ambas as teorias estão também atentas à observação e ao dimensionamento adequados

da carga psíquica do trabalho.

Há muita familiaridade entre as estratégias defensivas, de caráter coletivo ou individual,

propostas por Dejours (1988, 1992, 1994) e outros autores ligados à teoria da

psicopatologia do trabalho e as estratégias de combate ao estresse propostas por autores

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adeptos da teoria do estresse ocupacional. A diferença entre as duas abordagens

relaciona-se muito mais à forma de organização destas estratégias (coletiva ou

individualmente) do que às suas origens.

Apesar das diferenças existentes entre os discursos da teoria do estresse ocupacional e

da psicopatologia do trabalho, nesta dissertação serão indistintamente tratadas,

dispensando-se o autor de fazer alusões à autoria da idéia exposta. Os discursos, na

verdade, não parecem antagônicos em termos das conseqüências para o trabalhador.

6. OS EFEITOS DO ESTRESSE

Neste capítulo serão apresentadas a sintomatologia do estresse e, por fim, uma seção

onde se aborda especificamente o estresse relacionado às condições de trabalho na

aviação comercial.

6.1. A sintomatologia do estresse

Do ponto de vista individual, o estresse custa bastante em termos psicológico e físico. A

amplitude dos sintomas pode variar do simples desconforto à morte, das dores de cabeça

aos problemas coronarianos, da indigestão às úlceras gástricas, da fadiga à hipertensão

arterial (SELYE, 1956, 1974; ALBRECHT, 1979).

Se a curto prazo o estresse é caro, a longo prazo ele pode levar à falência. A moeda em

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que é feita a transação do estresse é o que Rio (1995) chama de energia adaptativa.

Todos têm estoques de energia adaptativa que é esvaziado pelo desgaste natural do dia-

a-dia.

Quando se está sob estresse, aumenta muito a quantidade de energia despendida e o

estoque de energia adaptativa se reduz. Infelizmente, este estoque é finito. Quando todo

o estoque tiver sido usado, o corpo se tornará incapaz de reagir. Antes que esta situação

se torne fatal, o corpo dará sinais de alerta para a pessoa: no início pode ser uma dor de

cabeça ou tensão muscular; a continuar a utilização da energia adaptativa, outros sinais,

desta vez mais fortes indicarão que algo está errado com aquele organismo. Os sistemas

de adaptação falharão temporariamente. O sinal disto é, geralmente, uma doença.

Não faz muito tempo, o estresse ocupacional era percebido como uma doença exclusiva

dos executivos de grandes empresas. Estresse era revestido, curiosamente, de

significados diversos, todos relacionados a status e poder. Os diversos estudos

desenvolvidos constataram, contrariamente, que o problema se apresenta em todos os

contextos de trabalho, em qualquer nível organizacional. O estresse pode manifestar-se

indiferentemente em qualquer indivíduo na organização.

O custo do estresse para as empresas pode ser calculado. Neste cálculo há que se

considerarem os custos físicos, psicológicos e econômicos do estresse. Suas

conseqüências econômicas nas organizações podem ser observadas pelos elevados

níveis de absenteísmo, no aumento do turn over e da insatisfação, na redução da

produtividade, no aumento do incidência de erros e acidentes de trabalho. Sua presença

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também pode ser diagnosticada em apatia, fadiga, ansiedade e baixa motivação da força

de trabalho. (LIMONGE, RODRIGUES, 1994)

O estresse não é visto, desta forma, à luz da realidade distante dos conceitos de

racionalidade, eficácia e lucro. Grande parte das empresas já percebeu que um melhor

desempenho organizacional pode estar vinculado à maior humanização do ambiente,

métodos e processos desempenhados.

Diante das diferenças individuais, é impossível determinar com precisão o impacto das

fontes de pressão no trabalho sobre todos os indivíduos de uma organização. A

generalização, apesar de todo conhecimento adquirido sobre o assunto, ainda deve ser

evitada, pois as habilidades e capacidades de interação com o ambiente laborativo

diferem de um para outro indivíduos.

Jamal (1990), endossa este ponto de vista e vê o estresse no trabalho como uma reação

do indivíduo às características percebidas como ameaçadoras do seu ambiente

profissional. Para o autor, estas ameaças ou agentes estressores caracterizariam uma

relação desequilibrada entre a capacitação do indivíduo e o seu ambiente de trabalho, ou

seja, haveria hiperdimensionamento da capacidade produtiva do trabalhador ou o

mesmo não seria capacitado profissionalmente.

Assim, os sintomas de estresse diferem de pessoa para pessoa, variando com as lentes

através das quais os agentes estressores são percebidos. Diferentes estratégias de

combate ao estresse serão adotadas, não só em função do estado geral e das

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características de cada organismo, mas também em função do seu estilo de vida, do

momento vivido no presente e da qualidade e intensidade das pressões que atuam sobre

ele.

6.1.1. A fisiologia do estresse

Segundo Donovan e Kleiner (1994), fisiologicamente, após o estímulo, ocorre uma série

de reações que se inicia no cérebro. O cérebro alerta o corpo para a necessidade de ação,

disparando estímulos nervosos que se originam no sistema nervoso central. Esses

estímulos destinam-se a equipar a pessoa com tudo o que é necessário à tomada de

decisão entre o lutar e o fugir. Uma virtual orquestra química é acionada. O sistema

endócrino é uma das principais maneiras de se levar as mensagens através do corpo e

quando o hipotálamo alerta a glândula ptuitária, na base do cérebro, de que algum

grande animal foi visto por perto, a orquestra química começa a tocar. As glândulas

supra-renais desempenham o papel principal e liberam mais adrenalina na corrente

sangüínea, assim como corticóides. Ambas as secreções têm um papel vital, não apenas

na preparação a curto prazo para lutar ou fugir, mas também em alguns dos problemas

que podem ocorrer a longo prazo como resultado da constante luta contra esses animais.

As respostas imunológicas e inflamatórias são inibidas enquanto a atenção se concentra

na ameaça iminente. Os hormônios agem primeiramente para aumentar o nível de

estímulo do corpo. Ele agora está em “pé de guerra”, alerta à ameaça e preparando-se

para dela cuidar.

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A atenção se volta então, segundo Donovan e Kleiner (1994), para o principal sistema

de transporte, a corrente sangüínea; que leva não apenas os mensageiros químicos, mas

também o “combustível” que os músculos precisam para a ação. O depósito mais

acessível de “combustível” é o fígado, que libera seu suprimento de glicogênio para

transformação em energia. A musculatura corporal necessita de uma grande quantidade

de glicose, por isso a freqüência cardíaca aumenta e a pressão sangüínea sobe. O sangue

é direcionado, então, para as partes onde o corpo julgar que ele é mais necessário. Para

acelerar a queima da glicose a quantidade de oxigênio aumenta através da hiperpnéia

(aumento na velocidade da respiração). Enquanto a ação está concentrada em equipar a

musculatura, as vísceras e o sistema digestivo como um todo deixam de ser atendidos

plenamente pelo fluxo sangüíneo. O corpo não pode conviver com o processo normal de

digestão e, por isso, a digestão se torna mais lenta. O efeito final do campo de guerra é

ativar o sistema de “refrigeração”, aumentando a sudorese.

Segundo os dois autores, toda essa reação acontece muito rapidamente e eficientemente

para preparar a pessoa para enfrentar uma ameaça que, para o organismo, é de vida ou

morte. A convivência constante com os “terríveis animais” do dia-a-dia, onde um

aparece antes do outro ter sumido, desestruturam toda a fisiologia do corpo, fazendo

com que, na prática, as sucessivas reações sejam na verdade uma, e apenas uma grande

reação.

Donovan e Kleiner (1994) relatam que, desta forma, o coração, por exemplo, fica sujeito

a um excesso de batimentos, fruto de suas constantes e aceleradas contrações; resultado:

hipertensão. Esse é um elo importante na relação estresse e doenças cardíacas.

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Analogamente, a hiperventilação pode levar a problemas de ordem respiratória,

estabelecendo-se, aí, um elo na relação estresse e doenças do aparelho respiratório. A

liberação prolongada de corticóides afeta a capacidade de resposta do sistema

imunológico. A ação contínua da cortisona deixa o organismo debilitado para agir na

inibição à invasão de substâncias estranhas. Este efeito no sistema imunológico é um

dos elos conhecidos entre estresse e câncer. A tensão muscular prolongada leva à dor,

principalmente no pescoço, ombros e costas. A mudança na resistência da pele, fruto do

excesso de suor, torna-a suscetível a erupções e doenças cutâneas.

Nem sempre todos os sintomas estão associados. Podem-se apresentar um, dois ou mais;

o corpo entra em colapso nos seus pontos mais fracos - podem aparecer sintomas sequer

aqui descritos. Dois fatores são importantes na localização desses pontos fracos: os

traços fisiológicos individuais (fruto de herança genética) e o estilo de vida.

6.2. O estresse em aviação

Sobre o estresse em comissários de bordo, o inglês Stuart Howard (apud Castro, 1997,

p.6), secretário do Departamento de Aviação Civil da ITF (Federação Internacional dos

Trabalhadores de Transporte) afirma:

“Um dos fatores que colaboram para isso é a grande tendência que as companhias aéreas

têm de obrigar o comissário a ultrapassar o limite de horas de trabalho.”

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O comissário de bordo, como aeronauta que é, está exposto a múltiplos agentes

prejudiciais à saúde e potencialmente estressores durante sua atividade de trabalho.

Como resultados da percepção destes agentes como estressores, haverá reflexos

negativos na qualidade do desempenho de suas funções, no seu convívio sócio-

profissional e na sua produtividade.

Reardon (1992) apresenta resultados de pesquisas realizadas nos Estados Unidos da

América que comprovam haver fatores de estresse adicionais na vida dos comissários de

bordo se comparados à média dos profissionais que exercem atividades em terra.

Segundo Barbosa (1996), os principais agentes potencialmente estressores encontrados

no ambiente de trabalho do comissário de bordo são:

a) Vibrações e ruídos

b) Qualidade do ar

c) Radiações

d) Condições de pressão atmosférica no interior da aeronave

e) Fatores ergonômicos

f) Fatores relacionados à organização do trabalho

g) Aspectos específicos do vôo

h) Fadiga de vôo

a) Vibrações e ruídos

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Pessoa (1992) entende vibração como movimento constante de baixa amplitude e alta

velocidade que alterna repetidamente a direção de um corpo ou de uma partícula.

Ruído é genericamente entendido como qualquer som. Para efeitos do estudo em

questão considerar-se-á ruído, aquele que apresentar a médio ou longo prazos, efeitos

nocivos, sob quaisquer aspectos, ao organismo humano.

O desenvolvimento tecnológico da indústria aeronáutica vem tentando reduzir o

problema das vibrações a bordo. Hoje as vibrações ainda existentes têm intensidade

infinitamente menor do que em tempos passados; mas ainda não conseguiram ser

exterminadas.

Uma aeronave em vôo está sujeita a vibrações de duas origens distintas: a primeira,

causada pelo atrito do ar externo com o avião e a segunda proveniente do

funcionamento dos motores. As vibrações muito comumente causam tontura, mal estar e

vômitos. Estudos de Gauthier et. al. (apud BARBOSA, 1996) demonstram alterações

motoras e neurológicas entre aeronautas e associam o achado à exposição destes

profissionais a microvibrações - vibração de altíssima velocidade oscilatória e

característica contínua.

Os ruídos já são percebidos com maior clareza por quem viaja no interior de uma

aeronave. Pode-se citar diversos. Dentre eles: o do funcionamento dos motores, o do

sistema de exaustão, os do atrito da aeronave com o ar durante o deslocamento e outros

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menos freqüentes mas não menos importantes para quem deles é vítima, tais como um

painel mal fixado, o som de acionamento de uma válvula de descarga, o ranger de uma

porta de toalete etc.. Há consenso (Organização Mundial da Saúde apud PESSOA,

1992) que níveis de ruído acima de 65 decibéis geram distúrbios psicossomáticos como

irritabilidade, nervosismo, alterações do sono e até mesmo tontura e vertigens.

Segundo Pessoa (1992), são muitas as alterações que a exposição prolongada ao ruído

pode causar no organismo humano. Destacam-se neste particular, a perda da audição e a

aparição de sintomas relativos ao comprometimento do sistema neuro-psicológico como

insônia, irritabilidade e estresse.

b) Qualidade do ar

A temperatura no interior de uma aeronave pode ser regulada automaticamente ou pelos

próprios pilotos. Já a umidade não. Ela permanece em níveis extremamente baixos a fim

de evitar possíveis danos que possa causar nos equipamentos eletrônicos da aeronave.

Com isso, toda a aeronave fica sujeita às mesmas condições de umidade. Gartman

(1988) confirma a baixa umidade do ar principalmente em vôos de longa distância.

Sims (1994) afirma que a qualidade do ar na cabine de passageiros é péssima. Segundo

a autora, aproximadamente 50% (cinqüenta por cento) do ar dessa cabine é reciclado. O

ar da cabine é saturado por dióxido de carbono, não importando em que lugar dela se

esteja, estar-se-á sujeito a infecção por doenças.

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O principal motivo disto está no fato da renovação do ar não se dar por completo. O

sistema de circulação não efetua a troca de todo o ar aspirado da cabine da aeronave.

Grande parte do ar circulante tem origem na própria cabine de passageiros. Neste

processo, o ar exterior é sugado pelos motores, mistura-se ao que ar captado do interior,

sofre processo de resfriamento e é injetado novamente na cabine.

“O ar seco leva a um ressecamento da pele e mucosas, além de estimular a

irritabilidade.” Silva (1991, p.24)

Além do ressecamento da pele e da conjuntiva - efeitos observáveis muito

freqüentemente em usuários do transporte aéreo, Coelho (1991) indica que os

comissários, pela maior exposição à situação, têm maior probabilidade de formação de

litíase renal (cálculo renal) pois, pela baixa umidade do ar, a urina eliminada tende a ser

mais concentrada, com maior aglutinação de cristais.

c) Radiações

O homem está exposto no seu dia-a-dia a radiações de origens terrestre, cósmica e solar.

A radiação terrestre é composta por materiais radioativos encontrados no solo e nas

pedras. A radiação cósmica origina-se no espaço (galáctico), sendo que as pessoas que

se encontram ao nível do mar estão sujeitas a menor quantidade de radiação cósmica do

que as que se encontram em diferentes altitudes. A radiação solar, por fim, se compõe

de partículas de baixa energia, principalmente prótons e nêutrons a que todos, desde que

expostos à luz solar, estão sujeitos.

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Segundo o National Council for Radiation Protection - Comitê Internacional de

Controle de Radiações (apud BARBOSA,1996) os aeronautas, independentemente da

altitude do vôo, são considerados como profissionais ocupacionalmente expostos a

radiações.

O Society of Automotive Engineers e o Behavior Engineering Technology (apud

BARBOSA, 1996), duas outras entidades que estudam a questão, relacionam

proporcionalmente o risco à saúde com a altitude voada pelo aeronauta. Maiores

altitudes tendem a elevar também a dose de radiação recebida. Segundo a análise, os

profissionais de vôo apresentam maior probabilidade do desenvolvimento de câncer do

que a população em geral.

Convém mencionar que a radiação produzida por ondas eletromagnéticas, apesar dos

efeitos nocivos sabidamente causados ao organismo quando da sua exposição

prolongada (potencialmente causadora de neoplasias), não é citada na literatura, até o

momento, como fator pré-disponente de doenças ocupacionais em comissários.

d) Condições de pressão atmosférica no interior da aeronave

Na medida em que se aumenta a altitude diminui-se a pressão atmosférica e, por

conseqüência, a pressão parcial de oxigênio - o que leva a sérias conseqüências

fisiológicas devido à hipóxia (diminuição do volume de oxigênio nas células).

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Quanto mais baixa a concentração de oxigênio a que é submetida uma pessoa, mais

sérios os danos observados em seu organismo. Os danos causados podem variar desde

uma taquicardia (aumento da freqüência de batimentos cardíacos) ou uma taquipnéia

(aumento da freqüência respiratória) até a ocorrência de convulsões e coma, em níveis

mais elevados de altitude (acima de vinte mil pés), dependendo do tempo de exposição.

Do nível do mar até seis mil ou oito mil pés, o valor da pressão atmosférica não varia

significativamente. A faixa criada entre o nível do mar e o intervalo entre seis e oito mil

pés (dependendo do ponto no globo terrestre) é denominada como zona de indiferença,

visto não serem também observadas alterações orgânicas relevantes em indivíduos

submetidos a variações de altitudes neste intervalo.

O sistema de pressurização da aeronave mantém o interior da cabine em nível abaixo

dos oito mil pés; ou seja, o interior da cabine fica submetido a uma pressão interna

correspondente à altitude não maior do que oito mil pés.

Qualquer pessoa em plena condição de saúde não sofre qualquer alteração devido à

pressurização da cabine. Já os aeronautas, por se exporem continuamente à ela, tendem

a desenvolver um quadro de hipóxia hipobárica crônica, que segundo Pessoa (1992) é

considerado um fator estressante às atividades de vôo.

Estudos realizados pelo CINEPA (apud SILVA, 1991) indicam que o aeronauta está

sujeito, também, à aerodilatação e ao bloqueio auditivo.

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A aerodilatação se traduz pela expansão dos gases contidos nas cavidades devido à

diferença das pressões interna (do corpo) e externa (da cabine). Já o bloqueio auditivo,

segundo estatísticas do CINEPA (apud SILVA, 1991), doença ocupacional mais comum

na indústria da aviação brasileira, se caracteriza pela obstrução da Trompa de Eustáquio

(única via de saída de ar do ouvido), decorrente das diferenças de pressão.

Ledoux et al. (1983) realizaram estudo sobre a freqüência de barotrauma entre

profissionais de vôo de empresa aérea francesa. Encontraram-se 419 casos da patologia,

todos considerados como doença adquirida no desempenho da atividade profissional.

e) Fatores ergonômicos

Os esforços físicos a que se submetem os comissários de bordo durante a jornada de

trabalho são os principais problemas ergonômicos encontrados em sua atividade. Muito

freqüentemente o comissário de bordo se vê obrigado a levantar cargas tão pesadas que

às vezes superam seu limite máximo recomendável ou a percorrer grandes distâncias nas

incontáveis idas e vindas pelos corredores do avião.

As posturas inadequadas, os esforços físicos, os movimentos bruscos e outros excessos

contribuem para o prejuízo à saúde do comissário de bordo. As queixas mais freqüentes

estão relacionadas, principalmente, à coluna vertebral. Não raras são as queixas de

dores, fadiga e mal estar que poderão ser fortes indícios para a instalação de doenças

mais graves tais como hérnia de disco e bursite crônica, por exemplo.

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Vale ressaltar que as articulações da coluna, do joelho e do tornozelo, principalmente,

são submetidas a cargas diferenciadas pelo fato de toda aeronave ter, em vôo, uma

inclinação em relação ao solo. A inclinação varia de modelo para modelo e, quanto

maior, mais nocivos os efeitos causados sobre as articulações.

f) Fatores relacionados à organização do trabalho – turnos e fusos

Como de qualquer outro aeronauta, a profissão de comissário de bordo é caracterizada

pela irregularidade de horários de trabalho; o que se pode observar pela escala mutável

de vôos, trabalhos noturnos, variações climáticas e outros. Esta irregularidade, além dos

efeitos sobre a saúde, pode trazer sérios problemas sócio-familiares.

Para Couto (1987) os agentes estressores começam, de fato, no próprio meio familiar:

desajustamentos conjugais, conflitos com a esposa, com os filhos, conflito de valores

etc.. Particularmente importantes, principalmente em épocas de crise e achatamento

salarial, são as expectativas da família em relação ao que se deve consumir. Este tipo de

pressão é muitas vezes veiculada pela propaganda (compre isso, compre aquilo) e é

capaz de exercer pressão no meio familiar quando alguém tenta estabelecer limites para

consumo. A pressão exercida sobre ele pela organização a que pertence como

empregado o força a relegar a segundo plano problemas familiares que, uma vez não

corrigidos, vão se avolumando com o tempo.

As contínuas modificações do ritmo biológico, decorrentes de alterações do ciclo sono-

vigília, encontradas em trabalhadores com horário de trabalho noturno, induzem um

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estado de desgaste que pode afetar sua eficiência no trabalho, sua saúde física e

psicológica, e sua vida familiar e social (FISCHER, RUTEFRANZ, KNAUTH, 1989).

Fischer, Rutefranz e Knauth (1989) consideram que escalas de trabalho que obrigam o

início do vôo ou a continuidade do trabalho em horários noturnos, onde o natural seria o

repouso, provocam fadiga acompanhada de alterações nos ritmos biológicos do

indivíduo, além do que podem ser importantes agentes estressores. Estudos dos autores

demonstram alterações de lapso na vigília (alerta) durante jornadas de trabalho noturno

entre aeronautas. Além disso, os mesmos autores apresentam outros estudos

comprobatórios da maior morbidez de trabalhadores que trabalham em turnos do que a

população em geral. De um modo geral, também, estão mais propensos a problemas

gastrointestinais (dispepsia, úlcera e diarréia), distúrbios psicossomáticos (dores de

cabeça, fadiga e náuseas) e têm aumentado o risco de doença cardiovascular.

g) Aspectos específicos do vôo

Todas as pessoas estão sujeitas a diferentes ritmos ao longo do dia. Neste período de 24

horas, acontecem o sono, a vigília, alterações nos níveis hormonais etc.. Ao conjunto de

variações de ritmo que acontecem no período de 24 horas, denomina-se ritmo

circadiano.

As alterações no ritmo circadiano levam algum tempo para restabelecerem os níveis

normais no seu ciclo. Nos casos de alterações, todos os ciclos estarão procurando se

ajustar às novas condições. Isso significa que cada ritmo biológico procurará adaptar-se

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independentemente, ou seja, haverá dois tipos de dissincronização: uma referente aos

ciclos endógenos e a natureza, o meio externo, a percepção dia/noite, os horários das

refeições e outra, dos próprios ciclos entre si. Haverá momentos do dia em que a

temperatura do corpo estará dissincronizada do meio externo. Por exemplo, o organismo

ainda mantendo seu ciclo normal, terá momentos de hipotermia – normalmente

ocorridos no meio da madrugada – em horário local não correspondente em função de

fusos horários atravessados.

Este distúrbio ou desajuste resulta em mal estar generalizado conhecido por

dissincronose ou Síndrome do Jet Lag (HAUGLI, 1994). A performance é

comprometida principalmente pelas alterações orgânicas sofridas. Ocorrem insônia,

falta de memória, falta de concentração, dificuldades psicomotoras, distúrbios

gastrointestinais ou menstruais além de diversos outros sintomas.

Poiret (apud SILVA, 1991, p.26) afirma que “a dissincronose pode levar à psicose,

depressão e outras perturbações psicopatológicas.”

h) Fadiga de vôo

Segundo Pessoa (1992), em situações de estresse, o organismo desencadeia uma série de

reações, subdivididas em fases distintas. Inicialmente, o organismo se coloca em “estado

de alerta”; a situação pode ser resolvida rapidamente e o organismo retornará ao seu

nível normal. Entretanto, esta fase pode se prolongar por muito tempo - o organismo

permanece em constante “estado de alerta” e entra, após algum tempo, em esgotamento,

com descompensação do seu quadro psico-fisiológico normal.

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A presença das diversas condições adversas mencionadas anteriormente no ambiente de

trabalho do comissário de bordo pode fazer com que se desenvolva um quadro clínico

caracterizado como “Fadiga de Vôo.” Este quadro se instala pela incapacidade do

organismo conseguir recuperar-se completamente após uma reação de alarme.

Em diversos países a Fadiga de Vôo já é considerada como doença profissional de

aeronautas. Num estágio inicial, caracteriza-se pela presença de cansaço, diminuição da

concentração e da atenção. Nesta fase, normalmente, um período mais prolongado de

sono acaba revertendo o quadro. Caso isto não aconteça, porém, “um processo de fadiga

crônico cumulativo se instala com a presença de irritabilidade, insônia, astenia, podendo

chegar a um grau avançado de neurose de ansiedade ou neurose fóbica, com

repercussões sobre a vida familiar e social do aeronauta.” (PESSOA, 1992)

Sobre o tema Dejours (1992, p.163) diz:

“A repressão do funcionamento psíquico poderia terconseqüências não só sobre o próprio trabalhador mas, fora da empresa,sobre as pessoas próximas. Com efeito, o sujeito em estado de repressãopsíquica mostra-se pouco inclinado a desempenhar um papel ativo naeconomia das relações afetivas familiares.”

Cooper (1985), em seus estudos, comprova a alta incidência da Fadiga de Vôo entre

comissários de bordo.

Em 1979 foi criada a Comissão Especial de Estudo da Fadiga de Vôo da qual fazem

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parte Brasil, Argentina, Portugal e Espanha. Diversos estudos vêm sendo desenvolvidos

desde então, cujos principais resultados podem ser assim resumidos:

• A fadiga de vôo aparece como um processo de causas múltiplas, sendo que as horas

de vôo aparecem como fator de grande relevância, possivelmente pelas alterações e

interferências durante o período de sono;

• O aparecimento do quadro de Fadiga do Vôo tem estreita relação com processos

fisiológicos de adaptação. Há evidências de altos graus de irritabilidade e nervosismo

entre os profissionais da aviação - sinais claros de fadiga aguda;

• Tem-se demonstrado relação entre o vôo e o aumento do lactato no sangue, com

conseqüente aparição de patologias como dores e tensão muscular, distúrbios do

sono, problemas cardíacos, hipertensão arterial, disfunções metabólicas dentre outras

e;

• Exames específicos (psicométricos) tendem a detectar perdas da capacidade mental e

ou motora em aeronautas associadas à Fadiga de Vôo.

Barçante (1994) em seu trabalho apresenta ainda os seguintes fatores como estressores

para os comissários de bordo:

• Escala de Vôo – percebido como o fator de maior insatisfação pelos comissários

respondentes à pesquisa;

• afastamento da família;

• insatisfação com a administração do nível hierárquico imediatamente superior;

• falta de respaldo às decisões, principalmente no que tange questões ligadas a

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passageiros;

• outros tripulantes.

7. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Neste capítulo serão apresentados e analisados fragmentos do discurso dos comissáriosde bordo entrevistados no trabalho de campo, à luz da revisão bibliográfica do tema.

O grupo de entrevistados foi composto por cinco comissários e igual número de

comissárias. A faixa etária do grupo varia entre 29 e 53 anos. Quanto ao tempo de vôo,

os entrevistados tinham na ocasião da entrevista experiências entre oito anos e meio e 25

anos e quatro meses, todos sempre como comissários da VARIG. Dos dez entrevistados,

oito eram casados, seis dos quais com filhos; um solteiro e um divorciado.

Todos os entrevistados tinham ciência de que este trabalho de pesquisa estava

relacionado a estresse em comissários de bordo. Não sabiam que etapa anterior havia

sido executada e descartados seus resultados pela dificuldade de se conseguir dos

entrevistados uma ordenação dos agentes estressores por ordem de importância. Tendo

em mente as dificuldades enfrentadas, o pesquisador optou por entrevistas de caráter

mais “informal” nas quais pudesse ser observada a percepção do estresse negada na

etapa anterior.

O trabalho de campo desenvolveu-se nos meses de janeiro e fevereiro de 1999. Das dez

entrevistas realizadas, oito tiveram lugar nas dependências da VARIG: umas na sala de

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tripulantes do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, outras no prédio da empresa

anexo ao Aeroporto Santos Dumont. Duas aconteceram nas residências dos

entrevistados.

Ao longo da apresentação dos resultados, sempre que pertinentes, serão feitas

referências a outra pesquisa de campo desenvolvida por Prince (1999), gentilmente

disponibilizadas a este autor. Prince (1999) encontrou nos discursos dos comissários de

bordo entrevistados, grande número de menções explícitas à existência de fatores

percebidos como estressores. O trabalho de Prince (1999) versa sobre treinamento na

linha de frente. Os dados referenciados foram colhidos em 23 entrevistas abertas com

comissários de bordo da VARIG no ano de 1996. Serão também referenciados, quando

oportuno, os resultados da pesquisa de clima estudada por Barçante (1994) a partir dos

dados colhidos em 1993.

Os resultados obtidos por Prince (1999) e Barçante (1994) serão apresentados, sempre

que possível, imediatamente após os resultados desta pesquisa de campo. A intenção foi

permitir ao leitor comparação entre os discursos constatados em uma e outra pesquisas

de campo, ressaltando-se, no entanto, os diferentes tempos em que foram colhidos os

dados.

7.1. Percepção do estresse

Um dos questionamentos feitos a todos os dez entrevistados visou à definição do

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estresse. Constatou-se dificuldade por parte dos entrevistados em defini-lo. De modo

geral, os conceitos apresentados pelos entrevistados tenderam a descrever o estresse

como sinônimo de incômodo. Mais ainda, a menos que estimulados pelo pesquisador,

restringiam a incômodo predominantemente de natureza psíquica.

“Estresse pra mim é tudo aquilo que me deixa agoniado.”

“Estresse é uma coisa que te perturba.”

“Sabe quando alguma coisa não vai bem na sua vida? Sei lá, você fica irritado, sem

paciência? Isso, no meu ponto de vista é estresse.”

“Estresse é tudo aquilo que me tira do sério. É o que altera o meu humor, me deixa com

raiva. Mais ou menos por aí.”

Estresse era percebido, também, como patologia associada ao ambiente de trabalho:

“Estresse ... estresse é você não fazer o que gosta. É você sofrer no seu trabalho; é você

não se sentir bem no lugar que você está e que você trabalha. Eu acho que estresse está

muito relacionado a trabalho. Eu não vejo estresse de outra forma.”

O discurso dos entrevistados é confirmado nos trabalhos de Dejours (1988, 1992 e

1994), que em diversos momentos faz menção ao sofrimento no trabalho. Constata-se o

“sofrer” como recorrente no discurso dos comissários.

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Apesar de não definirem com precisão o que seja o estresse, os comissários revelaram

conhecimento da associação entre estresse e diversos sintomas associados à doença:

“Estresse dá úlcera, dá gastrite, faz mal pro coração....”

“ No corpo? Não sei, eu acho que por ficar muito tempo em pé, eu tenho varizes e a

minha coluna dói depois de um vôo muito longo.”

“ Minha roupa é um número acima. Eu incho feito um balão no vôo. Se eu resolvo tirar

o sapato não vou conseguir calçar nem por um decreto. Incha-desincha, incha-desincha,

com certeza deve fazer muito mal” [sobre os efeitos da aerodilatação].

A característica de individualidade na percepção de agentes estressores é também

identificada por comissários, conforme fala de um dos entrevistados:

“ [O estresse] .. Varia de pessoa pra pessoa. Por exemplo: tem coisas que podem ser

estressantes pra você e nem me incomodar. Outras são estressantes para mim e não para

você.”

Embora a pesquisa de Prince (1999) não versasse sobre estresse, os comissários por ela

entrevistados percebiam a profissão como farta em agentes estressores, principalmente

de natureza psíquica; o que pode ser notado através das seguintes falas:

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“É uma profissão que precisa ter apoio psicológico.”

“Não estava preparada para essa vida, mexe com o emocional, o psiquismo.”

“Na seleção [o candidato] deveria passar por testes psicológicos para saber se vai se

adaptar à vida de tripulante.”

“Deveria ter um psicólogo para ajudar neste lado psicológico, já que eles só aparecem

quando você já pirou.”

“Tem gente que fica com pavor de voar em função de tanto estresse.”

“O estresse leva até a síndrome do pânico; achar que o avião vai explodir.”

“Hoje as pessoas tomam bola pra dormir e bola pra acordar.”

“Eu saí do interior para a cidade grande, sozinha. Isso dá a maior solidão; muitos

recorrem à psiquiatria....”

Os entrevistados por Prince (1999) reconheceram também as seguintes relações entre a

atividade de bordo e as manifestações físicas do estresse:

“Aviação dá problemas gastrointestinais.”

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“Tem gente que muda o ciclo menstrual depois que começa a voar.”

“Apareceram sinusite e alergias respiratórias.”

“Sinusite é muito comum.”

“A aviação é ruim para a saúde: não se dorme, tem o problema da pressurização, as

diferenças climáticas, varizes, altitude, problemas fisiológicos.”

“Mexe com a estrutura física.”

“Quando eu entrei não sabia que abalava tanto a saúde: coluna, sinusite, prisão de

ventre, alcoolismo, varizes; os mais velhos têm problemas de coração e pressão, úlcera e

gastrite, por causa da má alimentação.”

“Quer problema físico mais visível do que as varizes?”

7.2. Fatores de estresse

Dois fatores foram inequivocadamente reconhecidos como estressores pelos comissários

de bordo entrevistados: a escala de vôo e o afastamento da família. Vale mencionar que

por vezes o entrevistado revelava contradição a este respeito. Numa fala apresentava

como seu o discurso da organização, para em seguida, com o desenrolar da entrevista,

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talvez pelo clima de descontração que se estabelecia, revelar percepções que

contradiziam o discurso inicial.

Vale ressaltar que a percepção da escala de vôo e o afastamento da família como fatores

estressores confirmam os resultados de Barçante (1994) e Prince (1999).

Sobre a escala, os comissários entrevistados na pesquisa relatam:

“Eu acho que receber a escala já é um estresse. A escala de bordo é um estresse. Você

não sabe o que vai acontecer no trigésimo primeiro dia do teu mês.”

“Escala é um horror!”

Um dos comissários entrevistados percebe como grande agente estressor a desigualdade

existente no tratamento de comissários por parte das áreas de planejamento e execução

de escalas de vôo:

“Agora, me gera estresse saber que eu estou fazendo um vôo de sete dias e fico dois dias

em casa e tem pessoas com dois e quatro dias em casa. Escala de um modo geral é um

problema grave para o comissário de bordo. (...) O que existe hoje em dia são muitas

amizades. Que amizade é uma coisa positiva, extremamente positiva. Mas as pessoas

não podem misturar profissionalismo com amizade. Então existe favorecimento. E se o

favorecimento é para alguns, alguns outros estão desfavoráveis neste processo. Isto

quebra uma cadeia de produtividade, de satisfação. Todo mundo quer trabalhar

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igualmente.”

Quanto a escalas de vôo, o trabalho de pesquisa de clima estudado por Barçante (1994)

apontou resultados que indicavam grande insatisfação geral com a escala de vôo; tanto

em seu aspecto gerencial quanto em seu aspecto operacional (de elaboração).

Na oportunidade foi recomendada à empresa pelo grupo de análise maior divulgação

dos critérios de elaboração de escala, pedidos de folgas, trocas de programações, avisos

de faltas e apresentação de dispensas médicas.

Em 1998, passou-se a estabelecer rotas mensais para cada comissário. Desta forma um

comissário efetua vôos para uma mesma área, ou seja, todos os vôos no mês para a

Europa ou para a América do Norte. Isso reduziu o índice de absenteísmo.

Entretanto, constata-se neste trabalho que escala de vôo ainda é percebida como agente

potencialmente estressor por grande parte dos comissários, como comprovam as

afirmações abaixo:

“É aquilo que eu te falei. Faz parte da profissão, goste ou não” (sobre as escalas de

vôos).

“Pô parece que você quer que eu diga que tem alguma coisa que me estressa. eu já te

falei o que me estressa. Essas coisas todas, escala, vôo, altitude; tudo isso é

característico da profissão. Não pode ser considerado como estressante. Se não é melhor

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o cara sair.”

“Não, estresse não. Isso não me incomoda tanto assim. São ossos do ofício. Quem voa

tem que estar sujeito a isso. Se a pessoa se estressa com isso é melhor procurar outra

profissão” [sobre o fato de se atravessarem fusos durante os vôos intercontinentais].

A seguir algumas falas que denotam o afastamento da família como fator de estresse:

“Nessas horas é que dá raiva da profissão (...) deixar os filhos dói muito.”

“Eu acho que o ser humano não pode entrar numa profissão dessas e ficar insatisfeito

com essas permanências fora de casa.” ... “ O fato de você ter um pessoa do seu lado (...)

eu saio estressado e volto estressado. Só vou relaxar, saber o que realmente está

acontecendo no momento em que eu chego e digo: está tudo bem? Mas do até logo até o

tudo bem é um tempo muito grande e um fator estressante bem grande para esse período

em que você fica uma pilha de nervos.”

“Fica meio complicado acompanhar o crescimento dos filhos.”

“Porque a aviação tem isso. Você perde o pai e no terceiro dia depois você já está

voando. Isto é um gerador de estresse.”

“E o pediatra disse: V. da próxima vez traz a avó deles porque você não sabe dizer bem

o que ele tem (...) aquilo me deixou arrasada.”

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“Meus filhos são a coisa mais importante do mundo pra mim. Ficar longe deles é

sempre muito ruim. Hoje eu já me acostumei e eles também. Não fico estressada por

deixá-los em casa e ir voar. Eles ficam com o meu marido que não voa. Mas tem épocas

que dá a maior saudade. Você acaba deprimida, chora (...) tem vezes em que eu nem

saio do quarto. Fico o tempo todo no quarto do hotel.”

Quanto à percepção de agentes estressores especificamente relacionados à família e ou

vida social os comissários entrevistados por Prince (1999) relatam:

“Precisamos ser abnegados, pois deixamos nossa vida pessoal de lado, sempre.”

“Você não tem vida social.”

“Quem trabalha em terra tem uma vida mais normal; nossa vida é extraterrestre.”

“A gente vê pouco a família. Passamos muitas datas importantes longe dela.”

“A vida de comissário é muito solitária, te deixa ausente da família, de casa.”

“Já tive muita vontade de parar. Tenho uma filha de quatros anos, marido....”

“Gostaria de ir para a Ponte Aérea. Às vezes choro quando tenho que sair para viajar.”

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“Você deve esquecer de você e viver para quem está na sua frente, paciência (...) Você

deve adequar sua vida particular à profissional.”

“O que adianta ser muito expansivo e ter crise por passar o Natal longe de casa? Acaba

gerando raiva da empresa, da profissão....”

“É difícil passar no palco sendo profissional e fingir que está sem um parente doente,

mostrando um semblante tranqüilo.”

“A gente tem que ser muito desprendido de tudo, como espíritas, desprendidos das

coisas....”

“Não pode ser apegada à família, vida social – cansei de viajar chorando por causa

disso. Você não se sustenta muito tempo assim....”

“Qualidade de vida ruim (...) solidão por ficar afastada da família; é preciso ter uma

base familiar muito sólida.”

Além da escala de vôo e do afastamento da família, que se destacam como fatores de

estresse, o discurso aponta ainda outros estressores relacionados ao ambiente de

trabalho: os passageiros, os colegas de profissão, a jornada de trabalho e as condições

insalubres.

Quanto aos passageiros, um comissário que atua no B-737, avião cuja ocupação varia de

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109 a 134 passageiros, assim se manifestou quanto ao cliente como agente estressor:

“Um monte. Só no 37 são mais de cem!”

Outro assim se referiu aos passageiros:

“Tem passageiro que é o estresse em pessoa! Você sai do vôo querendo a morte (...) Eu

sei que é ele que paga o meu salário, sei que ele sempre tem razão, sei que a gente está

lá para servi-lo. Mas tem limites. Aturar desaforo, nem do meu marido!”

Esta percepção foi também constatada por Prince (1999) em sua pesquisa, como pode

ser observado nas seguintes transcritas:

“Tem alguns ‘espíritos de porco’ que nos tratam como serventes e não somos.”

“Eles acham que podem tudo.”

“Às vezes o passageiro vai lá pra trás para conversar. É um saco!”

“O brasileiro é muito mal educado; ‘por favor’ e ‘obrigado’ para ele não existem.”

“Recebendo as pessoas, vendo os assentos, vendo as bagagens, é o maior estresse”

[sobre o embarque de passageiros].

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Os dados colhidos também confirmam o relatório de pesquisa de clima realizada em

1993 (Barçante, 1994) onde se alerta sobre o fato de comissários perceberem

passageiros como agente estressores.

Ainda relacionado ao ambiente de trabalho, foi constatado que os colegas podem ser

vistos como agentes estressores, como por exemplo:

“Você está lá trabalhando e vem um pra falar mal da empresa, pra dizer que estudou sei

lá o quê e não sabe o que está fazendo ali, segurando bandeja.”

Barçante (1994), na discussão da pesquisa de clima, identificou a heterogeneidade dos

comissários da empresa quanto à formação, idades, expectativas, dentre outros fatores.

A percepção de agentes potencialmente estressores relacionados às condições desalubridade no ambiente de trabalho, muitos dos quais citadas por Barbosa (1996),podem ser observadas na análise das entrevistas realizadas por Prince (1999):

“Existem problemas decorrentes da pressurização; o ar é viciado.”

“A gente trabalha dentro de uma máquina.”

“O comissário vive em ambientes inóspitos” [referindo-se às condições do ar da cabine].

“Passar noites em claro; acordar e dormir em horas impróprias.”

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No que se refere à jornada de trabalho, os comissários entrevistados por Prince (1999)

percebiam o trabalho em turnos e o grande número de horas voadas como estressores.

Fatores que, segundo Barbosa (1996) são potencialmente estressores para os comissários

de bordo. Os seguintes discursos exemplificam o exposto:

“Não temos tempo para descansar. Dormimos pouco na hora do descanso.”

“Chegamos a passar seis dias fora e dois dias em casa.”

“Temos que voar cerca de 85 horas por mês e economizar diárias para pagar as contas”

(o que corresponde ao máximo permitido como horas/mês para tripulantes, Anexo,

Artigo 30, item b).

Nas falas dos entrevistados por Prince (1999) há menções de agentes percebidos como

estressores relacionados à auto-realização, à organização e à remuneração, o que ratifica

observações anteriores de Barçante (1994). Estes agentes não foram mencionados nas

dez entrevistas realizadas para consecução deste trabalho. Sobre os assuntos, os

entrevistados por Prince (1999) relataram:

“Dormir sentado, ganhar $ 800 e deixar o filho com a empregada analfabeta....”

“Fico trabalhando no galley. É um trabalho burro, mecânico, só sirvo a comida quente e

nem dá tempo de conversar.”

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[Serviço de bordo]: “Não gosto de fazer isso nem na minha casa! No início eu ficava

com o orgulho ferido e lembrava do meu pai : ‘estudou tanto tempo’....”

“O café da manhã é fila nos banheiros e cheiro de omelete.”

“Ter que fazer duty free? Não gosto de vender! Não sou muambeira!”

“Serviço de bordo é uma estiva. Só exige boa disposição física. Quem quer ser

engenheiro dentro do avião ‘bandejando’? Qualquer um faz o serviço de bordo; por isso

eles [a administração da organização] acham uma coisa menor.”

“Falta em primeiro plano reconhecimento financeiro; em segundo plano,

reconhecimento do recurso humano que ela tem.”

“Apesar de não ter salário bom....”

“Acho que falta a companhia reconhecer mais o trabalho de seus profissionais.”

“Na época que eu entrei o dinheiro era bom.”

“A VARIG não acordou para o fato de que somos ‘o cartão de visitas’ para o passageiro.

Eles falam isso mas os salários que nos pagam não reproduz isso.”

“Os carrinhos não andam em linha reta; boiler e fornos não esquentam; não há material

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com condições de trabalho. Sorrio e empurro o carrinho ‘capenga’... Total Quality

Control? Só se for do meu sorriso! E o salário também: como sorrir ganhando mal?”

“O emprego é seguro, mas o salário é baixo.”

“O salário em primeiro lugar. As melhores companhias são as que têm melhores

salários; melhor salário, menos estresse.”

7.3. Análise dos dados

O fato de agentes estressores terem sido enumerados em menor número (absoluta e

relativamente) pelos comissários entrevistados nesta pesquisa do que os apontados pelos

entrevistados de Prince (1999) leva à formulação de especulações. A primeira

relacionada à possibilidade de que alguns comissários possam ter-se valido de

mecanismos de defesa ocultando em seu discurso a percepção do estresse. A segunda

relacionada ao receio de serem expostos a retaliação por parte da empresa, sobretudo

pelo fato de o autor ainda ser funcionário da VARIG.

Segundo Lopes (1980, p.32), os mecanismos de defesa atuam como castradores das

fontes de insatisfação ou de frustração com a profissão. O autor enumera oito

mecanismos básicos de defesa: retirada (ou renúncia), agressão, substituição,

compensação, repressão, regressão, projeção e racionalização. Quatro - agressão,

compensação, repressão e projeção puderam ser identificados em diversas falas dos

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comissários entrevistados.

A agressão, mecanismo em que ocorre o ataque direto à fonte, pode ser observada, por

exemplo, nas seguintes falas:

“Aturar desaforo, nem do meu marido!”

“Não tem passageiro pior do que o argentino! Depois dele é o gaúcho! Ele se sente dono

da VARIG.”

“Tem passageiro que é o estresse em pessoa.”

O mecanismo de compensação se caracteriza por se ir além dos limites normais em dada

atividade a fim de compensar as deficiências em outra. Este mecanismo de defesa,

apesar de referir-se a terceiro, é explícito no discurso abaixo:

“Rola como se fosse um mecanismo de compensação. Já que o cara não pode estar em

casa o tempo todo, toda vez que viaja acaba trazendo um presente. Tem colegas que

dizem que chegam em casa e a criança já corre para a mala!”

A repressão, que se caracteriza pela omissão (ou negação) da percepção do problema,

pode ser verificada em alguns dos discursos:

“De repente eu nem sou a pessoa ideal para você entrevistar. Não há nada que me cause

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estresse.”

“Pra mim, não! Eu não me estresso com nada” [sobre a existência de fatores estressores

na profissão].

“Pô, parece que você quer que eu diga que tem alguma coisa que me estressa. Eu já te

falei o que me estressa.”

Projeção é o mecanismo de defesa pelo qual o indivíduo atribui a outra pessoa seus

próprios sentimentos ou desejos. Ao longo do discurso de alguns comissários, pode-se

perceber, até mesmo em função do conjunto de respostas apresentado por cada um,

algumas situações que caracterizaram a presença da projeção:

“Tem gente que trata passageiro que nem bicho. Tem gente que diz que passageiro é

inimigo!”

“Já vi colegas com úlceras, gente que fica se roendo na galley. Eu não” [sobre

passageiros percebidos como mal educados].

“Pra mim não, mas tem gente que se aborrece” [sobre a possibilidade de passageiro ser

agente estressor].

A segunda especulação sobre a menor incidência de agentes estressores enunciados

pelos respondentes desta pesquisa contempla os seguintes fatores: a ameaça de demissão

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e a situação do pesquisador na empresa.

Houve grande número de demissões em todas as áreas da empresa, principalmente após

o ano de 1997. O mercado da aviação civil, não só no Brasil, vem sofrendo com a

recessão mundial. Há muito maior oferta de assentos do que a quantidade demandada

pelos passageiros. As empresas não têm medido esforços no sentido de conseguir a

preferência do cliente. Os programas de fidelidade oferecem benefícios cada vez

maiores aos associados. Com isso, quanto menor a empresa, menores suas chances de

sobrevivência.

A VARIG, apesar de ser a maior empresa da América Latina do setor, sequer figura

entre as 20 maiores empresas do mundo no segmento da aviação comercial. No seu caso

específico, diversas rotas têm-se apresentado deficitárias. A receita gerada pelos

passageiros embarcados não tem sido, muitas vezes, suficiente sequer para igualar os

custos operacionais dos vôos. A VARIG, paralelamente à realização desta pesquisa,

vinha estudando o cancelamento (mesmo que temporário) de algumas rotas. Assim,

cogitava-se de que algumas aeronaves passariam a voar menos, não afastando o risco de

serem devolvidas aos respectivos lessors. Com menor número de rotas e aeronaves, não

haveria necessidade de manter-se o número de comissários no quadro funcional. A

demissão de muitos se configurava nesse cenário como praticamente certa.

Se, por um lado, o autor ter experimentado a profissão foi algo extremamente vantajoso

para a aproximação com os entrevistados, por outro, o fato de ainda pertencer ao quadro

funcional da empresa pode ter gerado desconfiança por parte de alguns respondentes.

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Por mais que tenha sido assegurado o sigilo das informações e a incognoscibilidade dos

entrevistados, o pesquisador pode não ter sido acreditado em seu discurso: o medo da

demissão falou mais alto.

8. CONCLUSÕES

Neste capítulo são apresentadas as conclusões do presente trabalho, assim como suas

limitações e recomendações.

Após o deslocamento do foco da pesquisa, processaram-se as dez entrevistas em

profundidade com os comissários de bordo; sendo que o grupo de entrevistados era

composto por igual número de homens e mulheres. Não houve preocupação, de fato,

com a representatividade da amostra, entretanto, todos os comissários entrevistados

exerciam a profissão há mais de oito anos. Vale ressaltar que na empresa pesquisada,

raros são os profissionais desta categoria com menos de oito anos de experiência.

As entrevistas transcorreram em clima de informalidade. Para isso muito contribuiu a

experiência pregressa do autor como comissário de bordo da VARIG. Fator este que, em

parte, acabou se transformando em complicador para a externalização da percepção

acerca dos agentes estressores pelos entrevistados como será melhor descrito pouco

mais adiante.

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A pesquisa identificou a ocorrência do estresse no desempenho da profissão de

comissário de bordo, partindo da percepção dos próprios sujeitos, atingindo, desta

forma, o objetivo proposto. Entretanto, a expectativa do autor fundamentada na sua

experiência acumulada na função e no conhecimento profundo do grupo de comissários

da VARIG, não se confirmou na mesma intensidade na análise do discurso dos

respondentes como era esperado ao início do trabalho. Diversos agentes estressores

preconizados como tal na literatura, sentidos por ele próprio durante 11 anos de

profissão, não pareceram igualmente percebidos pelos entrevistados.

As respostas dadas pelos comissários entrevistados aos questionamentos colocados pelo

autor não lhe permitem aferir o grau de importância atribuído aos agentes estressores

pelos entrevistados. Escala de vôo, afastamento da família e comportamento dos

passageiros, no entanto, são percebidos com freqüência como agentes potencialmente

estressores pela maioria dos comissários, o que endossa em parte as observações de

Barçante (1994).

No contexto de alta competição por que passa a aviação comercial a referência é a

produção, o lucro, a segurança da aeronave e a imagem da empresa, ainda que com

custo para a saúde do trabalhador. Percebe-se no discurso dos entrevistados

ressentimentos pelas constantes ausências no ambiente sócio-familiar, fruto da busca

pela maior produtividade do “recurso humano.” Contudo, por parte de alguns dos

respondentes, a exploração sofrida é tida como normal e esperada, fazendo-os creditar

este “sofrimento” como parte integrante da profissão.

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Nota-se certa insatisfação de alguns comissários com o planejamento das escalas de vôo.

Uma área de escala de vôos cujos critérios de planejamento e execução fossem

transparentes provavelmente reduziria o estresse sem qualquer aumento de custos para a

empresa.

A percepção pelos comissários de passageiros como agentes estressores deve ser motivo

de grande preocupação por parte da VARIG. Não se concebe que em segmento tão

competitivo, mormente a crise pela qual passam todas as empresas de aviação comercial

do Brasil, o cliente seja percebido desta forma.

Sugere-se à empresa supra que reveja o conteúdo do treinamento destes profissionais de

linha de frente a fim de reforçar o entendimento da importância do passageiro como

alvo da atividade da empresa.

Os discursos dos entrevistados busca ocultar, muitas vezes, a percepção do respondente

acerca da presença de agentes estressores, refletindo uma possível preocupação em

preservar os próprios empregos.

Devido à natureza exploratória e ao pequeno número de entrevistas realizadas e, por

contemplar apenas uma empresa do segmento da aviação comercial brasileira, os

resultados deste trabalho não podem ser generalizados para outros universos. Acredita-

se que o tema mereça pesquisas mais aprofundadas com maior número de entrevistados

e diversidade de empresas. Recomenda-se que nos trabalhos futuros os pesquisadores

observem as influências da conjuntura sobre as expectativas dos respondentes.

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Pesquisadores interessados no tema poderiam discorrer sobre a relação entre o estresse

e outras variáveis, tais como: tempo de vôo, idade etc.. Seria também recomendável que

pesquisas futuras confrontassem os discursos organizacional e da área de treinamento

com a percepção dos comissários sobre a importância dos passageiros.

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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10. ANEXO

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A REGULAMENTAÇÃO PROFISSIONAL

A Regulamentação Profissional é o instrumento pelo qual os aeronautas (pilotos,

mecânicos de vôo e comissários) têm assegurados os limites para horas de vôo, reservas,

sobreavisos, repousos e folgas. Além disso, a regulamentação dispõe sobre diversos

outros pontos importantes no dia-a-dia dos aeronautas. Ele, por si só, apesar de ainda

falha e dúbia em diversas situações, é uma grande conquista da categoria.

ÍNDICE

CAPÍTULO I - Das Disposições Preliminares

CAPÍTULO II - Do Regime de Trabalho

CAPÍTULO III - Da Remuneração e das Concessões

CAPÍTULO IV - Das Transferências

CAPÍTULO V - Das Disposições Finais

REGULAMENTAÇÃO PROFISSIONAL

Lei Nº. 7.183,

DE 05 DE ABRIL DE 1984

Regula o exercício da profissão de aeronauta e dá outras providências. O Presidente daRepública Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

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CAPÍTULO IDas Disposições Preliminares

SEÇÃO I - Do Aeronauta e sua ClassificaçãoSEÇÃO II - Das Tripulações

SEÇÃO IDo Aeronauta e da sua Classificação

Art. 1 - O exercício da profissão de aeronauta é regulado pela presente Lei.

Art. 2 - Aeronauta é o profissional habilitado pelo Ministério da Aeronáutica, queexerce atividade a bordo de aeronave civil nacional, mediante contrato de trabalho.

Parágrafo Único - Considera-se também aeronauta, para os efeitos desta Lei, quemexerce atividade a bordo de aeronave estrangeira, em virtude de contrato de trabalhoregido pelas leis brasileiras.

Art. 3 - Ressalvados os casos previstos no Código Brasileiro do Ar, a profissão deaeronauta é privativa de brasileiros.

Parágrafo Único - As empresas brasileiras que operam em linhas internacionais poderãoutilizar comissários estrangeiros, desde que o número destes não exceda a 1/3 (um terço)dos comissários existentes a bordo da aeronave.

Art. 4. - O aeronauta no exercício de função específica a bordo da aeronave, de acordocom as prerrogativas da licença de que é titular, tem a designação de tripulante.

Art. 5 - O aeronauta de empresa de transporte aéreo regular que se deslocar, a serviçodesta, sem exercer função a bordo de aeronave, tem a designação de tripulante extra.

Parágrafo Único - O aeronauta de empresa de transporte aéreo não regular ou serviçoespecializado tem a designação de tripulante extra somente quando se deslocar emaeronave da empresa, a serviço desta.

Art. 6 - São tripulantes:a) COMANDANTE: piloto responsável pela operação e segurança da aeronave -

exerce a autoridade que a legislação aeronáutica lhe atribui;b) CO-PILOTO: piloto que auxilia o comandante na operação da aeronave;c) MECÂNICO DE VÔO: auxiliar do comandante, encarregado da operação e controle

de sistemas diversos conforme especificação dos manuais técnicos da aeronave;d) NAVEGADOR: auxiliar do comandante, encarregado da navegação da aeronave

quando a rota e o equipamento o exigirem, a critério do órgão competente doMinistério da Aeronáutica;

e) RADIOPERADOR DE VÔO: auxiliar do comandante, encarregado do serviço de

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radiocomunicações nos casos previstos pelo órgão competente do Ministério daAeronáutica; e

f) COMISSÁRIO: é o auxiliar do comandante, encarregado do cumprimento dasnormas relativas à segurança e atendimento dos passageiros a bordo e da guarda debagagens, documentos, valores e malas postais que lhe tenham sido confiados pelocomandante.

Parágrafo 1O - A guarda dos valores fica condicionada à existência de local apropriado eseguro na aeronave, sendo responsabilidade do empregador atestar a segurança do local.

Parágrafo 2O - A guarda de cargas e malas postais em terra somente será confiada aocomissário quando no local inexistir serviço próprio para essa finalidade.

Parágrafo 3O - Consideram-se também tripulantes, para os efeitos desta Lei, osoperadores de equipamentos especiais instalados em aeronaves homologadas paraserviços aéreos especializados, devidamente autorizados pelo Ministério daAeronáutica.

SEÇÃO IIDas Tripulações

Art. 8 - Tripulação é o conjunto de tripulantes que exercem função a bordo de aeronave.

Art. 9 - Uma tripulação poderá ser: mínima, simples, composta e de revezamento.

Art. 10 - Tripulação mínima é a determinada na forma de certificação de tipo deaeronave e a constante do seu manual de operação, homologada, pelo órgão competentedo Ministério da Aeronáutica, sendo permitida sua utilização em Vôos locais deinstrução, de experiência, de vistoria e de translado.

Art. 11 - Tripulação simples é a constituída basicamente de uma tripulação mínimaacrescida, quando for o caso, dos tripulantes necessários à realização do vôo.

Art. 12- Tripulação composta é a constituída basicamente de uma tripulação simples,acrescida de um piloto qualificado a nível de piloto em comando, um mecânico de vôo,quando o equipamento assim o exigir, e o mínimo de 25% (vinte e cinco por cento) donúmero de comissários.

Parágrafo Único - Aos tripulantes acrescidos à tripulação simples serão asseguradas,pelo empregador, poltronas reclináveis.

Art. 13 - Tripulação de revezamento é a constituída basicamente de uma tripulaçãosimples, acrescida de mais um piloto qualificado a nível de piloto em comando, um co-piloto, um mecânico de vôo, quando o equipamento assim o exigir, e de 50 (cinqüentapor cento) do número de comissários.

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Parágrafo Único - Aos pilotos e mecânicos de vôo acrescidos à tripulação simples serãoasseguradas pelo empregador, acomodações para o descanso horizontal e, para oscomissários, número de assentos reclináveis igual à metade do seu número comaproximação para o inteiro superior.

Art. 14 - O órgão competente do Ministério da Aeronáutica, considerando o interesse dasegurança de vôo, as características da rota de vôo, e a programação a ser cumprida,poderá determinar a composição da tripulação ou as modificações que se tornaremnecessárias.Art. 15 - As tripulações compostas ou de revezamento só poderão ser empregadas emvôos internacionais e nas seguintes hipóteses: a) - mediante programação; b)- paraatender a atrasos ocasionados por condições meteorológicas ou por trabalhos demanutenção; e c) - em situações excepcionais, mediante autorização do Ministério daAeronáutica. Parágrafo único - Uma tripulação composta poderá ser utilizada em vôosdomésticos para atender a atrasos ocasionados por condições meteorológicosdesfavoráveis ou por trabalhos de manutenção.

Art. 16 - Um tipo de tripulação só poderá ser transformado na origem do vôo e até olimite de 3 (três) horas, contadas a partir da apresentação da tripulação previamenteescalada. Parágrafo único - A contagem de tempo para limite da jornada será a partir dahora da apresentação da tripulação original ou do tripulante de reforço, considerando oque ocorrer primeiro.

CAPÍTULO IIDo Regime de Trabalho

- SEÇÃO I - Da Escala de Serviço

- SEÇÃO II - Da Jornada de Trabalho

- SEÇÃO III - Do Sobreaviso e Reserva

- SEÇÃO IV - Das Viagens

- SEÇÃO V - Dos Limites de Vôo e Pouso

- SEÇÃO VI - Dos Períodos de Repouso

- SEÇÃO VII - Da Folga Periódica

SEÇÃO I - Da Escala de Serviço

Art. 17 - A determinação para a prestação de serviço dos aeronautas, respeitados osperíodos de folgas e repousos regulamentares, será feita:

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a) por intermédio de escala especial ou de convocação, para realização de cursos,exames relacionados com o adestramento e verificação de proficiência técnica;

b) por intermédio de escala no mínimo semanal, divulgada com antecedência mínimade 2 (dois) dias para a primeira semana de cada mês e 7 (sete) dias para as semanassubsequentes, para os vôos de horário, serviços de reservas, sobreaviso e folga; e

c) mediante convocação, por necessidade de serviço.

Art.18 - A escala deverá observar, como princípio, a utilização do aeronauta em regimede rodízio e em turnos compatíveis com a higiene e segurança do trabalho.Art.19 - É de responsabilidade do aeronauta manter em dia seus certificados dehabilitação técnica e de capacidade física estabelecidos na legislação em vigor, cabendo-lhe informar o serviço de escala, com antecedência de 30 (trinta) dias, as respectivasdatas de vencimento, a fim de que lhe seja possibilitada a execução dos respectivosexames.

SEÇÃO IIDa Jornada de Trabalho

Art. 20 - Jornada é a duração do trabalho do aeronauta, contada entre a hora daapresentação no local de trabalho e a hora em que o mesmo é encerrado.

Parágrafo 1º - A jornada na base domiciliar será contada a partir da hora de apresentaçãodo aeronauta no local de trabalho.

Parágrafo 2º - Fora da base domiciliar, a jornada será contada a partir da hora deapresentação do aeronauta no local estabelecido pelo empregador.

Parágrafo 3º - Nas hipóteses previstas nos Parágrafos anteriores, a apresentação noaeroporto não deverá ser inferior a 30 (trinta) minutos da hora prevista para o início dovôo.

Parágrafo 4º - A jornada será considerada encerrada 30 (trinta) minutos após a paradafinal dos motores.

Art. 21 - A duração da jornada de trabalho do aeronauta será de:

a) 11 (onze) horas, se integrante de uma tripulação mínima ou simples;b) 14 (quatorze) horas, se integrante de uma tripulação composta; ec) 20 (vinte) horas, se integrante de uma tripulação de revezamento.

Parágrafo 1º - Nos vôos de empresa de Táxi-aéreo, de serviços especializados, detransporte aéreo regional ou em vôos internacionais regionais de empresas de transporteaéreo regular realizados por tripulação simples, se houver interrupção programada daviagem por mais 4 (quatro) horas consecutivas, e for proporcionado pelo empregadoracomodações adequadas para repouso dos tripulantes, a jornada terá a duração acrescidada metade do tempo de interrupção, mantendo-se inalterados os limites prescritos na

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alínea "a" do art. 29 desta Lei.

Parágrafo 2º - Nas operações com helicópteros, a jornada poderá ter a duração acrescidade até 1 (uma) hora para atender exclusivamente a trabalhos de manutenção.

Art. 22 - Os limites da jornada de trabalho poderão ser ampliados de 60 (sessenta)minutos, a critério exclusivo do comandante da aeronave e nos seguintes casos:

a) inexistência, em local de escala regular, de acomodações apropriadas para o repousoda tripulação e dos passageiros;

b) espera demasiadamente longa, em local de espera regular intermediária, ocasionadapor condições meteorológicas desfavoráveis ou por trabalho de manutenção; e

c) por imperiosa necessidade.

Parágrafo 1º - Qualquer ampliação dos limites das horas de trabalho deverá sercomunicada pelo comandante ao empregador, 24 (vinte e quatro) horas após a viagem, oqual, no prazo de 15 (quinze) dias, a submeterá à apreciação do Ministério daAeronáutica.

Parágrafo 2º - Para tripulações simples, o trabalho noturno não excederá de 10 (dez)horas.

Parágrafo 3º - Para as tripulações simples nos horários mistos, assim entendidos os queabrangem períodos diurnos e noturnos, a hora de trabalho noturno será computada comode 52 (cinquenta e dois) minutos e 30 (trinta) segundos.

Art. 23 - A duração do trabalho do aeronauta, computados os tempos de vôo, de serviçoem terra durante a viagem, de reserva e de 1/3 (um terço) do sobreaviso, assim como otempo do deslocamento, como tripulante extra, para assumir vôo ou retornar à base apóso vôo e os tempos de adestramento em simulador, não excederá a 60 (sessenta) horassemanais e 176 (cento e setenta e seis) horas mensais.

Parágrafo 1º - O limite semanal estabelecido neste artigo não se aplica ao aeronauta queestiver sob o regime estabelecido no art. 24 desta Lei.

Parágrafo 2º - O tempo gasto no transporte terrestre entre o local de repouso ou daapresentação, e vice-versa, ainda que em condução fornecida pela empresa, na base doaeronauta ou fora dela, não será computado como de trabalho para fins desta Lei.

Art. 24 - Para o aeronauta pertencente à empresa de táxi-aéreo ou serviçosespecializados, o período máximo de trabalho consecutivo será de 21 (vinte e um) dias,contados do dia de saída do aeronauta de sua base contratual até o dia do regresso àmesma, observado o disposto no art. 34 desta Lei.

Parágrafo único - O período consecutivo de trabalho, no local de operação, não poderáexceder a 17 (dezessete) dias.

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SEÇÃO IIIDo Sobreaviso e Reserva

Art. 25 - Sobreaviso é o período de tempo não excedente a 12 (doze) horas, em que oaeronauta permanece em local de sua escolha, à disposição do empregador, devendoapresentar-se no aeroporto ou outro local determinado, até 90 (noventa) minutos apósreceber comunicação para o início de nova tarefa.

Parágrafo 1º - O número de sobreavisos que o aeronauta poderá concorrer não deveráexceder a 2 (dois) semanais ou 8 (oito) mensais.

Parágrafo 2º - O número de sobreavisos estabelecidos no parágrafo anterior não seaplica aos aeronautas de empresas de táxi-aéreo ou serviço especializado.

Art. 26º - Reserva é o período de tempo em que o aeronauta permanece, pordeterminação do empregador, em local de trabalho à sua disposição.

Parágrafo 1º - O período de reserva para aeronautas de empresas de transportes aéreoregular não excederá de 6 (seis) horas.

Parágrafo 2º - O período de reserva para aeronautas de empresas de táxi aéreo ou deserviços especializados não excederá de 10 (dez) horas.

Parágrafo 3º - Prevista a reserva, por prazo superior a 3 (três) horas, o empregadordeverá assegurar ao aeronauta acomodações adequadas para o seu descanso.

SEÇÃO IV Das Viagens

Art. 27 - Viagem é o trabalho realizado pelo tripulante, contado desde a saída de suabase até o regresso à mesma.

Parágrafo 1º - Uma viagem pode compreender uma ou mais jornadas.

Parágrafo 2º - É facultado ao empregador fazer que o tripulante cumpra umacombinação de vôos, passando por sua base, sem ser dispensado do serviço, desde queobedeça à programação prévia, observadas as limitações estabelecidas nesta Lei.

Parágrafo 3º - Pode o empregador exigir do tripulante uma complementação de vôo paraatender à realização ou à conclusão de serviços inadiáveis, sem trazer prejuízo da suaprogramação subsequente, respeitadas as demais disposições desta Lei.

SEÇÃO VDos Limites de Vôo e de Pouso

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Art. 28 - Denomina-se "hora de vôo" ou "tempo de vôo" o período compreendido entreo início do deslocamento, quando se tratar de aeronave de asa fixa, ou entre a "partida"dos motores, quando se tratar de aeronave de asa rotativa, em ambos os casos para finsde decolagem até o momento em que respectivamente, se mobiliza ou se efetua o"corte" dos motores, ao término do vôo (calço-a-calço).

Art. 29 - Os limites de vôo e pousos permitidos para uma jornada serão os seguintes:

a) 9 (nove) horas e 30 (trinta) minutos de vôo e 5 (cinco) pousos, na hipótese deintegrante de tripulação mínima ou simples;

b) 12 (doze) horas de vôo e 6 (seis) pousos, na hipótese de integrante de tripulaçãocomposta;

c) 15 (quinze) horas de vôo e 4 (quatro) pousos na hipótese de integrante de tripulaçãode revezamento e,

d) 8 (oito) horas sem limite de pousos, na hipótese de integrante de tripulação dehelicópteros.

Parágrafo 1º - O número de pousos na hipótese da alínea "a" deste artigo poderá serestendido a 6 (seis), a critério do empregador; neste caso o repouso que precede ajornada deverá ser aumentado de 1 (uma) hora.

Parágrafo 2º - Em caso de desvio para alternativa, é permitido o acréscimo de mais 1b(um) pouso aos limites estabelecidos nas alíneas "a", "b" e "c" deste artigo.

Parágrafo 3º - As empresas de transporte aéreo regional que operam com aeronavesconvencionais e turbo-hélice poderão acrescentar mais 4 (quatro) pousos aos limitesestabelecidos neste artigo.

Parágrafo 4º - Os limites de pousos estabelecidos nas alíneas "a", "b" e "c" deste artigonão serão aplicados às empresas de táxi-aéreo e de serviços especializados.

Parágrafo 5º - O Ministério da Aeronáutica, tendo em vista as peculiaridades dosdiferentes tipos de operação, poderá reduzir os limites estabelecidos na alínea "d" desteartigo.

Art. 30 - Os limites de tempo de vôo do tripulante não poderão exceder em cada mês,trimestre ou ano, respectivamente:

a) em aviões convencionais: 100 - 270 - 1000 horasb) em aviões turbo-hélice: 100 - 255 - 935 horasc) em aviões a jato: 85 - 230 - 850 horas; ed) em helicópteros: 90 - 260 e 960 horas.

Parágrafo 1º - Quando o aeronauta tripular diferentes tipos de aeronave será observado omenor limite.

Parágrafo 2º - Os limites de tempo de vôo para aeronautas de empresas de transporte

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aéreo regular, em espaço inferior a 30 (trinta) dias, serão proporcionais ao limite mensalmais 10 (dez) horas.

Art. 31 - As horas realizadas como tripulante extra serão computadas para os limites dejornada semanais e mensais de trabalho, não sendo as mesmas consideradas para oslimites de horas de vôo previstos no art. 30 desta Lei.

SEÇÃO VIDos Períodos de Repouso

Art. 32 - Repouso é o espaço de tempo ininterrupto após uma jornada em que otripulante fica desobrigado de prestação de qualquer serviço.

Art. 33 - São assegurados ao tripulante, fora de sua base domiciliar, acomodações paraseu repouso, transporte ou ressarcimento deste, entre o aeroporto e local de repouso evice-versa.

Parágrafo 1º - O previsto neste artigo não será aplicado ao aeronauta de empresa de táxiaéreo ou de serviços especializados quando o custeio do transporte e hospedagem, ousomente esta, for por elas ressarcido.

Parágrafo 2º - Quando não houver disponibilidade de transporte ao término da jornada,o período de repouso será computado a partir da colocação do mesmo à disposição datripulação.

Art. 34 - O repouso terá a duração diretamente relacionada ao tempo da jornada anterior,observando-se os seguintes limites:

a) 12 (doze) horas de repouso, após jornada de até 12 (doze) horas;b) 16 (dezesseis) horas de repouso, após jornada de mais de 12 (doze) horas e até 15

(quinze) horas; ec) 24 (vinte e quatro) horas de repouso, após jornada de mais de 15 (quinze) horas.

Art. 35 - Quando ocorrer o cruzamento de três ou mais fusos horários em um dossentidos da viagem, o tripulante terá, na sua base domiciliar, o repouso acrescido de 2(duas) horas por fuso cruzado.

Art. 36 - Ocorrendo o regresso de viagem de uma tripulação simples entre 23:00 (vinte etrês) e 06:00 (seis) horas, tendo havido pelo menos 3 (três) horas de jornada, o tripulantenão poderá ser escalado para trabalho dentro desse espaço de tempo no período noturnosubsequente.

SEÇÃO VIIDa Folga Periódica

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Art. 37 - Folga é o período de tempo não inferior a 24 (vinte e quatro) horasconsecutivas em que o aeronauta, em sua base contratual, sem prejuízo da remuneração,está desobrigado de qualquer atividade relacionada com seu trabalho.

Parágrafo 1º - A folga deverá ocorrer, no máximo após o 6( (sexto) período consecutivode até 24 (vinte e quatro) horas à disposição do empregador, contando a partir da suaapresentação, observados os limites estabelecidos nos arts. 21 e 34 desta Lei.Parágrafo 2º - No caso de Vôos internacionais de longo curso, que não tenham sidopreviamente programados, o limite previsto no Parágrafo anterior, poderá ser ampliadode 24 (vinte e quatro) horas, ficando o empregador obrigado a conceder ao tripulantemais 48 (quarenta e oito) horas de folga além das previstas no art. 34 desta Lei.

Parágrafo 3º - A folga do tripulante que estiver sob o regime estabelecido no art. 24desta Lei será igual ao período despendido no local da operação, menos 2 (dois) dias.

Art. 38 - O número de folgas não será inferior a 8 (oito) períodos de 24 (vinte e quatro)horas por mês.

Parágrafo 1º - Do número de folgas estipulado neste artigo, serão concedidos doisperíodos consecutivos de 24 (vinte e quatro) horas devendo pelo menos um destesincluir um sábado ou um domingo. Parágrafo 2º - A folga só terá início após a conclusãodo repouso da jornada.

Art. 39 - Quando o tripulante for designado para curso fora da base, sua folga poderá sergozada nesse local, devendo a empresa assegurar, no regresso, uma licença remuneradade 1 (um) dia para cada 15 (quinze) dias fora da base.

Parágrafo único - A licença remunerada não deverá coincidir com sábado, domingo ouferiado se a permanência do tripulante fora da base for superior a 30 (trinta) dias.

CAPÍTULO IIIDa Remuneração e das Concessões

- SEÇÃO I - Da Remuneração

- SEÇÃO II - Da Alimentação

- SEÇÃO III - Da Assistência Médica

- SEÇÃO IV - Do Uniforme

- SEÇÃO V - Das Férias

SEÇÃO I

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Da Remuneração

Art. 40 - Ressalvada a liberdade contratual, a remuneração do aeronauta corresponderá àsoma das quantias por ele percebidas da empresa.

Parágrafo único - Não se consideram integrantes da remuneração as importâncias pagaspela empresa a título de ajudas de custo, assim como as diárias de hospedagem,alimentação e transporte.Art. 41 - A remuneração da hora de vôo noturno, assim como as horas de vôo comotripulante extra, será calculada na forma da legislação em vigor, observados os acordos econdições contratuais.

Parágrafo 1º - Considera-se vôo noturno o realizado entre o pôr e o nascer do sol.

Parágrafo 2º - A hora do vôo noturno para efeito de remuneração é contada à razão de52'30" (cinqüenta e dois minutos e trinta segundos).

Art. 42 - As frações de hora serão computadas para efeito de remuneração.

SEÇÃO IIDa Alimentação

Art. 43 - Durante a viagem, o tripulante terá direito à alimentação, em terra ou em vôo,de acordo com as instruções técnicas dos Ministérios do Trabalho e da Aeronáutica.

Parágrafo 1º - A alimentação assegurada ao tripulante deverá:a) quando em terra, ter a duração mínima de 45' (quarenta e cinco minutos) e a máxima

de 60'(sessenta minutos); e

b) quando em vôo, ser servida com intervalo máximo de 4 (quatro) horas.

Parágrafo 2º - Para tripulante de helicópteros a alimentação será servida em terra ou abordo de unidades marítimas, com duração de 60 (sessenta minutos), período este quenão será computado na jornada de trabalho.

Parágrafo 3º - Nos vôos realizados no período de 22:00 (vinte e duas) às 06:00 (seis)horas, deverá ser servida uma refeição se a duração de vôo for igual ou superior a 3(três) horas.

Art. 44 - É assegurada alimentação ao aeronauta na situação de reserva ou emcumprimento de uma programação de treinamento entre 12:00 (doze) e 14:00 (quatorze)horas, e entre 19:00 (dezenove) e 21:00 (vinte e uma) horas, com duração de 60'(sessenta minutos).

Parágrafo 1º - Os intervalos para alimentação não serão computados na duração dajornada de trabalho.

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Parágrafo 2º - Os intervalos para alimentação de que trata este artigo não serãoobservados, na hipótese de programação de treinamento em simulador.

SEÇÃO IIIDa Assistência Médica

Art. 45 - Ao aeronauta em serviço fora da base contratual, a empresa deverá assegurarassistência médica em casos de urgência, bem como remoção por via aérea, de retorno àbase ou ao local de tratamento.

SEÇÃO IVDo Uniforme

Art. 46 - O aeronauta receberá gratuitamente da empresa, quando não forem de usocomum, as peças de uniforme e os equipamentos exigidos para o exercício de suaatividade profissional, estabelecidos por ato da autoridade competente

SEÇÃO VDas Férias

Art. 47 - As férias anuais do aeronauta serão de 30 (trinta) dias.

Art. 48 - A concessão de férias será participada ao aeronauta, por escrito comantecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo o empregado assinar a respectivanotificação.

Art. 49 - A empresa manterá atualizado um quadro de concessão de férias, devendoexistir um rodízio entre os tripulantes do mesmo equipamento quando houver concessãonos meses de janeiro, fevereiro, julho e dezembro.

Art. 50 - Ressalvados os casos de rescisão de contrato, as férias não poderão seconverter em abono pecuniário.

CAPÍTULO IVDas Transferências

Art. 51 - Para efeito de Transferência, provisória ou permanente, considera-se base doaeronauta a localidade onde o mesmo está obrigado a prestar serviços e na qual deveráter domicílio.

Parágrafo 1º - Entende-se como:

a) transferência provisória, o deslocamento do aeronauta de sua base, por período

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mínimo de 30 (trinta) dias e não superior a 120 (cento e vinte) dias, para prestaçãode serviços temporários, sem mudança de domicílio, à qual retorna tão logo cesse aincumbência que lhe foi atribuída; e

b) transferência permanente, o deslocamento do aeronauta de sua base, por períodosuperior a 120 (cento e vinte) dias, com mudança de domicílio.

Parágrafo 2º - Após cada transferência provisória o aeronauta deverá permanecer na suabase pelo menos 180 (cento e oitenta) dias.

Parágrafo 3º - O interstício entre transferências permanentes será de 2 (dois) anos.

Parágrafo 4º - Na transferência provisória serão assegurados ao aeronauta acomodações,alimentação e transporte a serviço e, ainda, transporte aéreo de ida e volta, e no regressouma licença remunerada de 2 (dois) dias para o primeiro mês, mais 1 (um) dia para cadamês ou fração subsequente, sendo que no mínimo 2 (dois) dias não deverão coincidircom o sábado, domingo ou feriado.

Parágrafo 5º - Na transferência permanente serão assegurados ao aeronauta pelaempresa:a) uma ajuda de custo, para fazer face às despesas de instalação na nova base, não

inferior a quatro vezes o valor do salário mensal, calculado o salário variável por suataxa atual multiplicada pela média do correspondente trabalho, em horas ouquilômetros de vôo, nos últimos 12 (doze) meses;

b) o transporte aéreo para si e seus dependentes;c) a translação da respectiva bagagem;d) uma dispensa de qualquer atividade relacionada com o trabalho pelo período de 8

(oito) dias, à empresa, dentro dos 60 (sessenta) dias seguintes à sua chegada à novabase.

Parágrafo 6º - Na forma que dispuser o regulamento desta Lei, poderá ser a transferênciaprovisória transformada em transferência permanente.

Art. 52 - O aeronauta deverá ser notificado pelo empregador com a antecedência mínimade 60 (sessenta) dias na transferência permanente e 15 (quinze) dias na provisória.

CAPÍTULO VDas Disposições Finais

Art. 53 - Além dos casos previstos nesta Lei, as responsabilidades do aeronauta sãodefinidas no código Brasileiro do Ar, nas leis e regulamentos em vigor e no que decorrerdo contrato de trabalho, acordos e convenções internacionais.

Art. 54 - Os tripulantes das aeronaves das categorias administrativas e privadas deindústria e comércio ficam equiparados, para os efeitos desta Lei, aos de aeronavesempregadas em serviços de táxi-aéreo.

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Art. 55 - Os Ministros de Estado do Trabalho e da Aeronáutica expedirão as instruçõesque se tornarem necessárias à execução desta Lei.

Art. 56 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 57º - Revogam-se asdisposições em contrário.

Brasília, em 05 de abril de 1984; 163( da Independência e 96( da República. JoãoFigueiredoDélio Jardim de Mattos

Murillo Macedo

(Publicada no Diário Oficial da União - (Seção I - Parte I), de 6 de abril de 1984).